Brazilian journal 15-B.p65 - Brazilian Journal of Food Technology
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Brazilian journal 15-B.p65 - Brazilian Journal of Food Technology
Produção Piloto de Derivados de Levedura (Saccharomyces sp.) para Uso como Ingrediente na Formulação de Alimentos Pilot Plant Production of Yeast (Saccharomyces sp.) Derivatives for Use as Ingredients in Food Formulations AUTORES AUTHORS Valdemiro Carlos SGARBIERI Izabela D. ALVIM Elke Simone D. VILELA Vera Lúcia S. BALDINI Neura BRAGAGNOLO Instituto de Tecnologia de Alimentos Centro de Química de Alimentos e Nutrição Aplicada Av. Brasil, 2880, CEP 13073-001, Campinas, SP e-mail: [email protected] RESUMO O presente trabalho teve como objetivos: adaptar metodologias para limpeza, desamargamento, autólise e fracionamento do autolisado de levedura de cervejaria. Tanto a biomassa de células íntegras como os derivados foram submetidos à desidratação (spray dryer) e à caracterização química, quanto à composição centesimal e composição em aminoácidos, ácidos graxos e minerais essenciais. Quantitativamente, os componentes mais importantes foram proteínas (33 - 61,5%), sendo o teor mais baixo da fração parede celular e o mais alto do extrato; fibra total (2,7 - 55%), que teve o teor mais baixo no extrato e o mais elevado na parede celular; minerais (4,4 - 12,5%), com o teor mais baixo na parede celular e o mais elevado no extrato. Os perfis de aminoácidos forneceram escores químicos superiores à referência da FAO/WHO, exceto para o autolisado total, cujo escore foi de 85% do padrão de referência, com base nos aminoácidos sulfurados totais. Dentre os ácidos graxos, predominaram os saturados, 49% nas células íntegras e 52% na parede celular. Os monoinsaturados predominaram na parede celular (35%) contra 15% nas células íntegras. O ácido linoléico distribuiu-se igualmente nas células íntegras e na parede celular. SUMMARY The objectives of tthe present investigation were to adapt the methodology for cleaning, debittering, autolysis and fractionation of brewers yeast autolysate. The whole cell biomass and the derivatives were submitted to dehydration (spray dryer) and to a chemical analysis to determine the proximate composition and the amino acid, fatty acid and essential mineral contents. Quantitatively, the most important components were proteins (33-61.5%), the lowest value being for the cell wall fraction and the highest for the extract; total fiber (2.7 - 55.0%), the lowest value being for the extract and the highest for the cell wall fraction; minerals (4.4 12.5%), the lowest being for the cell wall fraction and the highest for the extract. The amino acid profiles gave chemical scores superior to that of the FAO/WHO reference, except for the whole autolysate, which was 85% of the standard reference, based on the total sulphur-amino acids. There was a predominance of saturated fatty acids, 49% in the whole cell biomass and 52% in the cell wall fraction. The monounsaturated fatty acids predominate in the cell wall fraction (35%) as compared to 15% in the whole cell biomass. Linoleic acid was equally distributed in the whole cell biomass and the cell wall fraction. PALAVRAS-CHAVE KEY WORDS Levedura; Autólise; Autolisado total; Extrato; Parede celular / Yeast; Autolysis; Whole autolysate; Extract; Cell wall. Braz. J. Food Technol., 2(1,2):119-125, 1999 119 Recebido / Received: 26/04/1999. Aprovado / Approved: 16/08/1999. V. C. SGARBIERI et al. 1. INTRODUÇÃO Biomassa de levedura (Saccharomyces sp.) tem sido produzida no Brasil em três setores industriais importantes: o setor sucro-alcooleiro, com uma produção anual de cerca de 240 mil ton/ano, como subproduto da produção de etanol (FURCO, 1996); o setor cervejeiro, contribuindo com cerca de 3500 ton/ano; e o setor de panificação, com uma produção brasileira de cerca de 120 mil ton/ano (PEIXOTO, 1996). A levedura tem sido usada na alimentação humana e animal para diversas finalidades, em diferentes formas: levedura de panificação, utilizada na fermentação de pães, na indústria de panificação; levedura ativa, como catalisador biológico, nas indústrias de cerveja, vinhos e álcool; levedura inativa, como fonte de nutrientes em alimentos naturais ou ingredientes nutritivos, em alimentação humana e animal; derivados de levedura, usados como ingredientes nutritivos e funcionais, em vários setores da indústria de alimentos (DZIEZAK, 1987a, 1987b, HALÁSZ, LÁSZTITY, 1991). Em particular, o extrato de levedura tem sido largamente usado, em vários países, como complemento nutritivo e flavorizante, comumente em substituição ou em combinação com o caldo de carne. Nos setores sucro-alcooleiro e cervejeiro, têm havido um crescente interesse e, até certo ponto, necessidade de diversificação. Um melhor aproveitamento da biomassa de levedura, através de seu fracionamento e produção de derivados com propriedades diferenciadas, deverá abrir um leque de aplicações e agregar valor aos produtos, tornando mais rentáveis esses setores agroindustriais. As células de levedura apresentam alto teor protéico, entre 45-65%, são ricas em vitaminas, particularmente do complexo B, e em minerais essenciais ao organismo animal (HALÁSZ, LÁSTITY, 1991). O valor nutritivo das proteínas é considerado bom, representando, de 70 - 85% do valor da caseína (CABALLERO-CÓRDOBA et al., 1997). O fator considerado limitante na proteína são os aminoácidos sulfurados, metionina mais cistina (KINSELLA, SHETTY, 1978, VANANUVAT, 1977, WALSIEN, 1975). A espessa parede celular e o elevado teor de ácidos nucléicos, particularmente RNA, oferecem certas restrições para o uso da levedura, em alimentação humana e de animais monogástricos em geral (WALSIEN et al., 1970, SHETTY, KINSELLA, 1982). Ingestão de células de levedura secas acima de 30g ou ácidos nucléicos acima de 2g/dia, pode elevar exageradamente a concentração de uratos no sangue e nos tecidos, resultando em cálculos renais e/ou gota, em humanos. Produção Piloto de Derivados de Levedura (Saccharomyces sp.) para Uso como Ingrediente na Formulação de Alimentos Prodesa, Produtos Especiais para Alimentos Ltda., com sede em Campinas, SP. O material foi recebido em suspensão (~30% de células). Recuperação e desamargamento da biomassa. A levedura residual do processo de produção de cer veja apresenta gosto acentuadamente amargo, devido à adsorção superficial de componentes amargos (resinas, taninos, etc.), provenientes do lúpulo, usado na fabricação da cerveja. A suspensão de células foi submetida inicialmente a uma centrifugação a 2500rpm (centrífuga GEDR HEIND mod. 2250), para recuperação das células. A massa de células (biomassa) foi, em seguida, submetida a uma série de lavagens e centrifugação para, finalmente, se obter a biomassa limpa e desamargada (Figura 1). Autólise e fracionamento da biomassa limpa e desamargada. A autólise da biomassa desamargada foi realizada em fermentador (Newbrunswick - IF 250) com capacidade de 250L. No Fluxograma (Figura 2), são descritos os processos e as condições específicas para obtenção de células de levedura íntegras desidratadas e, a partir do autolisado pasteurizado, a obtenção de um autolisado integral desidratado em spray dryer (Niro Atomizer - CB3 104 D), de um extrato bruto e de uma fração insolúvel, contendo a parede celular. O extrato bruto e a fração parede celular foram submetidos a uma purificação parcial, antes da desidratação em spray dryer. RECEBIMENTO DA AMOSTRA em bombonas de 50 litros • Centrifugação (2750-3000rpm) em cesto de lona para eliminação do excesso de água. PERMEADO (recolhido) • Centrifugação para recuperação de células em cesto metálico BIOMASSA Células recuperadas SOBRENADANTE (descartado) BIOMASSA • Ressuspensão em água 1:1 (p/v ) para lavagem das células • Centrifugação para eliminação do excesso de água em cesto metálico Neste trabalho, estão descritos procedimentos para o fracionamento da biomassa de levedura, após ter sido submetida à autólise, além da caracterização química das principais frações obtidas. • Ressuspensão em sol. de NaOH 0,2%. 1:1 (p/v) • Homogeneização por 30 min • Centrifugação para eliminação do excesso de soda em cesto de lona PERMEADO (recolhido) Células recuperadas SOBRENADANTE (descartado) • Centrifugação para recuperação de células em cesto metálico SOBRENADANTE (descartado) BIOMASSA LIMPA DESAMARGADA 2. MATERIAL E MÉTODOS Matéria-prima. A levedura (Saccharomyces sp.) utilizada é originária de cervejarias e foi gentilmente cedida pela empresa Braz. J. Food Technol., 2(1,2):119-125, 1999 FIGURA 1. Processo de limpeza (lavagens) e desamargamento da biomassa de levedura (Saccharomyces sp.) proveniente de cervejarias. 120 V. C. SGARBIERI et al. BIOMASSA LIMPA DESAMARGADA • Ressuspensão em água até 10oBrix. Pré-aquecimento: 50oC/5min Secagem em Spray Dryer EXTRATO BRUTO (parte solúvel) • Centrifugação para purificação do extrato em cesto metálico AUTÓLISE: • Preparação da mistura: • Ressuspensão da biomassa, 1:1(p/v) • Adição: etanol 7% NaCl 2% pré-autolisado 15% • Agitação por 24h, 55oC. • Pasteurização: 85oC,15 min CÉLULAS ÍNTEGRAS EXTRATO CLARIFICADO AUTOLISADO PASTEURIZADO • Pré-aquecimento 50oC por 5min • Secagem em Spray Dryer RESÍDUO DE PAREDE CELULAR • Concentração em tacho a vácuo 45-50oC/25min AUTOLISADO INTEGRAL • Adição: amido solúvel 5% maltodextrina 10% • Pré-aquecimento 70oC/5min • Secagem em Spray Dryer PAREDE CELULAR (parte insolúvel) EXTRATO DE LEVEDURA DESIDRATADO FIGURA 2. Fluxograma para obtenção de células de levedura íntegras desidratadas, autolisado integral desidratado, extrato bruto e parede celular. Clarificação e desidratação do extrato de levedura. O extrato bruto, como obtido no fluxograma da Figura 2, ainda contém certa quantidade de material insolúvel, em suspensão, que lhe confere turbidez e gosto amargo. A Figura 3 mostra as operações de clarificação, concentração e desidratação do extrato clarificado em spray dryer. Antes da secagem, fez-se a adição, ao extrato, de amido solúvel (5%) e de maltodextrina (10%), com base nos sólidos totais. Essa formulação é feita para melhorar as características de secagem e também as propriedades sensoriais do extrato desidratado. FIGURA 3. Fluxograma seguido na purificação parcial (clarificação) e desidratação (Spray Dryer) do extrato de levedura. PAREDE CELULAR BRUTA • Lavagem: Ressuspensão em água 1:1 seguida da centrifugação que é feita em cesto metálico. SOBRENADANTE (descartado) Purificação parcial da fração insolúvel (parede celular). A parede celular bruta, como obtida seguindo o fluxograma da Figura 2, apresentou um teor de fibra total ao redor de 45%, apresentando ainda 18% de proteína e 6% de lipídios totais. Como o principal interesse era testar o valor desta fração como fibra dietética, foram aplicados novos tratamentos na fração bruta, com o objetivo de elevar o conteúdo de fibra. A Figura 4 mostra resumidamente os tratamentos aplicados à parede celular bruta, antes da desidratação em spray dryer. Procedimento de lavagem repetido 2 vezes PAREDE CELULAR LAVADA • Purificação: Suspensão 1:1com correção do pH para 9,5 com NaOH 4N. • Centrifugação para eliminação do excesso de soda em cesto metálico • Lavagem feita como descrita acima, para eliminação do resíduo de soda Caracterização química das células de levedura íntegras, do autolisado integral e das frações do autolisado. Feitas as operações de limpeza, autólise, fracionamento, purificação parcial e desidratação, os seguintes produtos foram obtidos e submetidos à caracterização química: células íntegras de levedura (LI), autolisado total (AT), extrato de levedura (Ex) e parede celular (Pc). Composição centesimal. Os teores de proteína (N x 5,8), de umidade e de cinzas foram determinados de acordo com os procedimentos descritos no AOAC (1990); lipídios totais foram determinados pelo método de BLIGH, DYER (1959); fibra alimentar, solúvel e insolúvel, foi determinada pelo método de ASP et al. (1983); ácido nucléico (RNA) foi determinado pelo método de HEBERT et al. (1971). Braz. J. Food Technol., 2(1,2):119-125, 1999 Juntado à fração parede celular EXTRATO CONCENTRADO • Centrifugação para separação da fração solúvel e insolúvel em cesto de lona. EXTRATO BRUTO (parte solúvel) Produção Piloto de Derivados de Levedura (Saccharomyces sp.) para Uso como Ingrediente na Formulação de Alimentos PAREDE CELULAR PURIFICADA • Ressuspensão em água da parede celular 1:1 • Pré-aquecimento a 50oC, 5min • Secagem em Spray Dryer PAREDE CELULAR DESIDRATADA FIGURA 4. Fluxograma dos procedimentos para purificação parcial e desidratação da fração insolúvel (parede celular). 121 V. C. SGARBIERI et al. Determinação de aminoácidos. Feita em aparelho HPLC (Dionex Dx), com separação em coluna de troca catiônica e reação pós-coluna com ninidrina. Para quantificação, usou-se mistura padrão de aminoácidos da Sigma. Produção Piloto de Derivados de Levedura (Saccharomyces sp.) para Uso como Ingrediente na Formulação de Alimentos Composição mineral. Foi determinada por espectrometria de emissão de plasma (espectrômetro ICP - 2000 - Baird, versão simultânea). Após mineralização da amostra, por incineração (450o C), os minerais foram solubilizados em solução de ácido nítrico a 5% e diluídos com água desionizada. Os procedimentos para o preparo das amostras e quantificação dos minerais foram segundo ANGELUCCI, MANTOVANI (1986) e IMO INDUSTRIES, INC. (1990). totais ao redor de 3,5%, cinzas entre 5,7-7,9%, fibra alimentar total de 24,5-25%, com uma predominância muito grande de componentes solúveis. Não temos uma explicação definitiva para o fato de o RNA ter sido mais elevado no autolisado total do que nas células íntegras. Dois fatores podem ter influenciado, ou seja: aumento da solubilidade do RNA com a autólise, uma vez que a reação foi feita em extratos, antes e após autólise; variabilidade natural de uma reação colorimétrica feita em extrato complexo, bastante impuro. O extrato apresentou teor mais elevado de proteína (~61,5%), concentração um pouco mais baixa de RNA (6,9%) e de lipídios (1,89%). A concentração de minerais foi mais elevada (12,5%) no extrato que nas células íntegras e/ou autolisado total. O teor de fibra no extrato foi bastante baixo (2,7%), não havendo presença de fibra insolúvel. Quanto à fração parede celular, o teor de proteína foi, em média, de 32,7%, RNA 1,83%, lipídios totais 4,5% e de cinzas 4,4%. O componente principal desta fração são as fibras (55%), representada por 31,6% de componentes solúveis e cerca de 23,5% de fibra insolúvel. Determinação de ácidos graxos. A determinação de ácidos graxos, nos lipídios totais extraídos das amostras foi feita por cromatografia líquido-gasosa, após interesterificação ácida com metanol, de acordo com os procedimentos da AOCS (1990). De um modo geral, a composição apresentada na Tabela 1 para células íntegras de levedura, autolisado total e extrato de levedura, é semelhante ao encontrado na literatura (HALÁSZ, LÁSTITY, 1991; CABALLERO-CÓRDOBA et al. 1997, PACHECO et al., 1997). Determinação do triptofano. O triptofano foi determinado após hidrólise enzimática com pronase, a 40oC, por 24h, seguido de reação calorimétrica com solução de 4dimetilamino benzaldeído (DAB), em ácido sulfúrico 21,2N e leitura a 590nm e a quantificação com base em curva padrão de triptofano, segundo SPIES (1967). 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A composição centesimal das células de levedura íntegras (LI), do autolisado total (AT), do extrato de levedura (Ex) e da fração insolúvel, contendo a parede celular (Pc) é mostrada na Tabela 1. TABELA 1. Composição centesimal aproximada das células de levedura íntegras, do autolisado total, do extrato de levedura e da fração parede celular, todos em base seca1. Componente Células Autolisado Extrato Fração parede (%) íntegras total (Ex) celular (Pc) (LI) (AT) 32,70 Proteína (N x 5,8) 48,74 46,45 61,54 RNA 5,70 7,90 6,90 1,83 Lipídios 3,33 3,30 1,89 4,54 Cinzas 8,55 8,83 12,50 4,43 Fibra total 24,40 25,03 2,70 55,04 Fibra solúvel 22,52 24,76 2,70 31,59 Fibra insolúvel Não determinado 1,88 0,27 0,00 23,45 10,60 10,82 19,20 1,46 1 Resultados de determinações feitas em duplicata As células íntegras e o autolisado total apresentam composição bastante próximas, com um teor de proteínas na faixa de 46,5-49%, ácidos nucléicos (RNA) de 6-8%, lipídios Braz. J. Food Technol., 2(1,2):119-125, 1999 O rendimento em extrato e fração parede celular foi, em média, nos vários processamentos, de 55 - 60% de extrato e de 40-45% de parede celular, convertidos em base seca. A composição em aminoácidos da levedura íntegra (LI), do autolisado total (AT), do extrato de levedura (Ex) e da fração parede celular (Pc) encontra-se na Tabela 2. Os aminoácidos glutâmico, aspártico, leucina, alanina e lisina foram os que se apresentaram em concentrações mais elevadas. A elevada concentração de ácido glutâmico é importante, no autolisado e no extrato, porque o glutamato, juntamente com nucleotídeos, deve ser o principal responsável pelo sabor à carne desses derivados, particularmente do extrato. A elevada concentração de lisina e a concentração mais que adequada de triptofano são importantes, porque tornam os produtos de levedura ideais para misturas com cereais, no sentido de complementar esses aminoácidos essenciais que são, normalmente, deficientes em grãos de cereais. A proteína de levedura é, comumente, citada na literatura como deficiente em aminoácidos sulfurados, metionina mais cistina (MIRIATH, 1981; POÓ, MILLÁN, 1990). Os resultados do perfil aminoacídico não evidencia deficiência de aminoácidos sulfurados totais, em todos os materiais estudados. Embora a LI e o AT tenham apresentado teor baixo de cisteína, a soma, metionina mais cisteína, supera o valor de referência de FAO/WHO (1989), que é de 2,5, exceto para o AT que foi 2,11. Na realidade, a comparação com o perfil de aminoácidos essenciais da FAO/WHO resultou nos seguintes escores químicos: 133,6; 84,4; 102,4 e 120,4% para LI, AT, Ex 122 V. C. SGARBIERI et al. e Pc, respectivamente, com base nos aminoácidos sulfurados totais. Pelo escore químico, apenas o autolisado total (AT) apresentou-se ligeiramente limitante em aminoácidos sulfurados. TABELA 3. Composição mineral da levedura de cervejaria (Saccharomyces sp.): AT, autolisado total; Ex, extrato de levedura; Pc, parede celular de levedura. Elementos TABELA 2. Composição em aminoácidos das células de levedura integral do autolisado total, do extrato e da fração parede celular. Aminoácidos (mg/100mg Proteína) Ácido aspártico Treonina Serina Ácido glutâmico Prolina Glicina Alanina 1/2 Cistina Valina Metionina Isoleucina Leucina Tirosina Fenilalanina Lisina Histidina Arginina Triptofano LI AT Ex1 Pc2 11,98 6,16 6,13 13,15 4,45 4,93 7,07 0,84 6,20 2,50 5,64 8,84 4,68 5,30 7,13 2,06 4,11 1,45 11,11 5,84 6,44 12,53 4,72 4,99 7,59 0,90 5,87 1,21 4,87 7,80 3,57 4,96 9,54 3,15 2,40 1,55 11,81 5,19 5,57 13,40 4,62 5,14 8,97 1,30 6,76 1,26 5,69 8,07 2,17 4,74 8,58 3,01 1,01 1,31 10,14 7,81 9,08 13,88 5,39 4,06 7,19 1,45 5,61 1,56 5,27 7,65 2,21 4,72 8,31 2,24 1,78 - Média de determinações em 3 amostras independentes. amostras independentes. 1 2 Média de determinações em duas Os resultados da análise de macro e microelementos minerais são mostrados na Tabela 3. Dos macroelementos, fósforo e potássio, aparecem em maior concentração no autolisado total e no extrato, enquanto o cálcio aparece em concentração elevada, na fração parede celular (Pc). Na Tabela 3, faz-se ainda uma comparação dos valores encontrados na análise dos derivados, com a ingestão diária (em miligramas) para os vários elementos, segundo NAS (1989). A comparação dos teores encontrados com os índices recomendados mostra que, com exceção de alguns elementos, os derivados de levedura não devem ser considerados fontes muito ricas de minerais, mesmo porque a ingestão desses produtos deve ser limitada a cerca de 30g/dia, em virtude do elevado teor de ácido nucléico. Todavia, podem ser considerados elevados os teores de cálcio, ferro, manganês, cobre e cromo, na fração parede celular (Pc); os teores de sódio, fósforo, potássio, manganês e cromo no extrato (Ex); os teores de fósforo, potássio, ferro, manganês, cobalto e cromo no autolisado total (AT). A NAS não traz recomendação de cobalto, que é muito baixa, uma vez que a única função nutricional conhecida para esse elemento, é como parte estrutural da vitamina B12, cujo requerimento bioquímiconutricional é muito pequeno. A levedura é citada na literatura como rica fonte de selênio. Esse elemento não aparece na Tabela 3 por não dispormos de padrão adequado para sua quantificação. Segundo LEVANDER (1989), o consumo de levedura de cerveja ajuda a prevenir estados carenciais de selênio, caracterizado por queda de cabelos, retardo no crescimento, deficiências reprodutivas, cardiomiopatias, necrose e degeneração do fígado e do pâncreas. Braz. J. Food Technol., 2(1,2):119-125, 1999 Produção Piloto de Derivados de Levedura (Saccharomyces sp.) para Uso como Ingrediente na Formulação de Alimentos Sódio Cálcio Magnésio Fósforo Potássio Ferro Manganês Zinco Cobre Cobalto Cromo Resultados (mg/100g)* AT Ex 605,0 ± 10,0 412,6 ± 12,0 161,8 ± 2,5 1178,5 ± 19,5 1365,5 ± 31,5 10,0 ± 0,1 3,7 ± 0,07 4,0 ± 0,3 0,6 ± 0,03 0,3 ± 0,01 0,3 ± 0,04 1475,5 ± 35,5 99,0 ± 3,6 264,0 ± 9,3 1927,0 ± 33,0 1877,5 ± 56,5 4,5 ± 0,3 5,0 ± 0,1 6,4 ± 0,4 0,6 ± 0,06 0,1 ± 0,02 0,6 ± 0,03 Recomendação diária (humana)** Pc 136,0 ± 883,0 ± 31,4 ± 308,0 ± 173,0 ± 56,0 ± 5,6 ± 6,8 ± 2,8 ± 0,24 ± 1,8 ± 2,0 15,0 0,3 5,0 3,0 6,0 0,5 0,5 0,1 0,03 0,1 2000 1200 350 1200 2500 10 - 15 2-5 10 - 15 2-3 0,2 *Resultados são médias de 3 determinações ± desvios-padrão de duas amostras diferentes. **Requerimento diário, conforme NAS (1989), para adultos jovens. A composição em ácidos graxos da fração lipídica das células íntegras e das três frações derivadas da levedura é dada na Tabela 4. Dos ácidos graxos identificados na biomassa de células íntegras (LI), 44,85% são saturados, 33,58% monoinsaturados e 5,74% poliinsaturados. Nesta amostra, 15,83% dos ácidos graxos não puderam ser identificados por falta de padrões adequados. Dentre os ácidos graxos saturados da amostra LI predomina o palmítico, dos monoinsaturados o palmitoléico e dos poliinsaturados o linoléico. No autolisado total (AT), os ácidos graxos saturados somam 51%, os monoinsaturados 34% e os poliinsaturados 14%. A ordem de predominância dos ácidos graxos saturados, monoinsaturados e poliinsaturados foi a mesma na amostra AT que na LI. No extrato (Ex), os saturados representam 40,6%, os monoinsaturados 43,3% e os poliinsaturados 14,5%, sendo que os ácidos graxos predominantes apresentam-se na mesma ordem anterior para os saturados e os poliinsaturados, porém, há uma inversão dos monoinsaturados, com uma grande predominância do oléico sobre o palmitoléico. Na fração parede celular, os saturados representam 52%, os monoinsaturados 35% e os poliinsaturados apenas 4,3%. A ordem de predominância para os saturados, monoinsaturados e poliinsaturados é a mesma que para as amostras LI e AT. De acordo com KOLL AR et al. (1992), a levedura contém principalmente fosfolipídios distribuídos em lisofosfolipídios (7,2%), fosfatidil colina (26,0%), fosfatidil inositol (40,4%). Segundo esses mesmos autores, os lipídios da parede celular contêm ainda quantidade importante de ergosterol, precursor da vitamina D, podendo ser convertido na vitamina, por irradiação com luz ultravioleta. Seguindo uma metodologia de fracionamento semelhante à adotada nesta pesquisa, Kollar e colaboradores, a partir de 100 kg de Saccharomyces cerevisiae, com 28% de sólidos totais, obtiveram: 156kg de extrato seco, 10,3kg de β-glicana, 0,8kg de fosfolipídio (70% de pureza) e 0,7kg de ergosterol (97% de pureza). 123 V. C. SGARBIERI et al. TABELA 4. Perfil dos principais ácidos graxos nas células íntegras (LI), no autolisado total (AT), no extrato e na parede celular (Pc) de levedura. Ácidos graxos Concentração (% do total) LI AT Ex Pc Caprílico C8:0 0,34 0,30 ND* 0,28 Cáprico C10:0 5,00 2,30 0,60 2,55 Láurico C12:0 1,15 0,80 0,50 0,60 Mirístico C14:0 0,74 0,50 1,40 0,50 Pentadecanóico C15:0 Palmítico C16:0 Esteárico C18:0 0,50 0,50 0,50 ND* 28,80 33,50 27,60 34,83 8,32 13,30 10,00 13,40 Palmitoléico - C16:1 22,14 24,50 8,20 25,55 Oléico C18:1 11,44 9,50 35,10 9,33 5,16 12,60 13,20 3,85 Linoléico C18:2 Linolênico - C18:3 0,58 1,40 1,30 0,50 Não-identificados 15,83 0,80 1,60 8,61 Saturados 44,85 51,20 40,60 52,16 Monoinsaturados 33,58 34,00 43,30 34,88 5,74 14,00 14,50 4,35 Poliinsaturados *ND = Não detectado. 4. CONCLUSÕES Desenvolveu-se uma metodologia para limpeza, desamargamento e produção de derivados de levedura (autolisado total, extrato e parede celular) em nível piloto. O rendimento do processo foi, em média, de 55-60kg de extrato bruto, para 40-45kg de parede celular bruta, a partir de 100kg de autolisado, em base de sólidos totais. A análise centesimal evidenciou que, tanto as células íntegras de levedura como os derivados: autolisado total, extrato e fração parede celular, são excelentes fontes de proteína, minerais e fibra dietética (exceto o extrato). A composição em aminoácidos mostrou-se muito adequada, quando comparada ao padrão teórico da FAO/ WHO, exceto pelo autolisado total, que se mostrou ligeiramente deficiente (limitante) em aminoácidos sulfurados totais. A determinação de elementos minerais revelou que o autolisado total e as frações (Ex e Pc) apresentam composição mineral diferentes, atendendo em boa parte, ou no todo, às recomendações de ingestão diária para macro e microelementos. Cem gramas de amostra ultrapassam as recomendações diárias apenas para o cromo nas três amostras, além do ferro, do manganês e do cobre, na fração parede celular. O perfil de ácidos graxos nas quatro amostras analisadas mostrou um balanço adequado entre saturados e insaturados. Dentre os insaturados houve uma predominância de monoinsaturados. Braz. J. Food Technol., 2(1,2):119-125, 1999 Produção Piloto de Derivados de Levedura (Saccharomyces sp.) para Uso como Ingrediente na Formulação de Alimentos AGRADECIMENTOS Os autores registram seus agradecimentos: à FAPESP, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, pelo suporte financeiro a esta pesquisa; à empresa PRODESA Produtos Especiais para Alimentos Ltda., por ter cedido, gentilmente, a matéria-prima utilizada neste estudo; aos pesquisadores do ITAL: Marcelo Morgano e Jane M. Turatti; o primeiro, pela determinação da composição mineral e o segundo, pela determinação dos ácidos graxos, em algumas amostras. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AOAC - Association of Official Agricultural Chemists, Official Methods of Analysis, 15th edition, Arlington, 1990. AOCS - American Oil Chemists Society, Official Methods and Recommended Practices, 4th edition, Champain, 1990. ANGELUCCI, E., MANTOVANI, D.M.B. 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