Reportagem publicada na revista Produção Áudio
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Reportagem publicada na revista Produção Áudio
Sociedade Portuguesa de Acústica – Sessão de Electroacústica À volta da Electroacústica Por André Pires | Fotografia: Alexandre Baptista Para assinalar o seu 30º aniversário, a Sociedade Portuguesa de Acústica propôs-se organizar um conjunto de sessões temáticas sobre acústica e vibrações ao longo do ano de 2010. A Produção Áudio assistiu no dia 29 de Novembro à 5ª sessão temática que decorreu no auditório do LNEC em Lisboa, dedicada à Electroacústica. De forma simples e informal a SPA organizou um programa abrangente que envolveu oradores vindos da área da acústica e electroacústica, tanto do lado da investigação como do lado da indústria, da sonorização, do fabrico de colunas, do cinema e da música, em que a única dificuldade foi conter a sessão nos limites do tempo disponível. A sessão começou com duas breves intro- evento duções pela voz de Jorge Patrício, presidente da Sociedade Portuguesa de Acústica (SPA) e por Joel Paulo, coordenador da sessão. A coordenação geral das sessões temáticas comemorativas está a cargo de Luís Santos Lopes. Sem mais demoras passou-se à primeira apresentação da tarde da responsabilidade de J. Luís Bento Coelho, Eng. Electrotécnico formado no Instituto Superior Técnico com doutoramento em Acústica pelo Institute of Sound and Vibration Research de Southampton. Acumula ainda várias funções e é membro de diversos organismos e associações nacionais e internacionais da área da acústica, como a SPA, a Ordem dos Engenheiros, o International Institute of Acoustics and Vibration ou o EU Noise Policy WG-AEN. É professor no IST, onde é presidente do Centro de Análise e Processamento de Sinais CAPS-IST assim como coordenador do Grupo de Acústica. A sua apresentação foi precisamente sobre “O papel do CAPS/IST na Electoacústica em Portugal” cujas origens remontam ao Centro de Estudos de Electrónica fundado no IST na primeira metade da década de 50 do século XX. Seguiu-se a apresentação “Medições em Sistemas electroacústicos e de ambientes sonoros” a cargo de António Oliveira da Acutron e presidente da AG da secção portuguesa da AES, que começou por alterar o título da sua intervenção para “O caos nas medidas – Estamos mesmo a medir o que queremos?”, que abriu uma sequência temática intitulada “Medição em sistemas electroacústicos e de ambientes sonoros”. O orador abordou questões relacionadas com as unidades de medida utilizadas em medições eléctricas de sistemas áudio, aspectos relacionados com os próprios sistemas de teste e a sua influência nos resultados, bem como metodologias de recolha de dados. Joel Paulo foi o autor da apresentação seguinte com o título, “Os efeitos da variância temporal e a sua medição”, em que abordou a questão da influência da instabilidade das variáveis ao longo da duração do processo de medição. Exemplos simples são, por exemplo, a oscilação na resposta de um altifalante devido ao aquecimento da sua bobine ao longo do teste ou desvios na frequência de amostragem dos sistemas de sincronismo que adulteram os resultados. Microfones e transdutores Seguiu-se uma intervenção não prevista no programa inicial, da responsabilidade de Augusto Gonçalves da Silva, da Escola Superior de Música, o qual dedicou a sua apresentação à “Tecnologia de microfones de condensador”. O orador abordou as variantes desta tecnologia e retivemos um conceito que fez a ponte perfeita para a apresentação seguinte. 8| | JANEIRO ‘11 Já perto do final dos trabalhos, a actuação de Jaime Reis foi seguida com a maior atenção por uma plateia muito interessada O conceito pode-se resumir à frase “cada vez que um microfone é utilizado, um espaço tridimensional é transformado num ponto unidimensional” e o tema seguinte foi “Identificação de fontes de ruído” e a nova “Tecnologia Beamforming para microfones”. Este tema deveria ter sido apresentado por Luís Soares da Bruel&Kjaer que não pode estar presente, pelo que foi o próprio Joel Paulo a fazê-lo. Nesta apresentação que abriu o tema seguinte “Sistemas transdutores de som inovadores”, foi mostrada a importância da identificação de fontes de ruído, nomeadamente na indústria de electrodomésticos e automóvel. O primeiro caso ilustrado com as medições de ruído de uma máquina de lavar e o segundo com as medições de um automóvel. Este tipo de medições tanto servem para detectar os pontos de um produto que mais necessitam de “tratamento” acústico para reduzir a poluição sonora como são úteis para a “criação” do perfil sonoro de um determinado produto (há um exemplo famoso da indústria automóvel, em que é provável que se tenha recorrido a medições deste tipo, onde a Toyota fez um estudo aprofundado sobre o som de bater de porta de um modelo da Mercedes com o intuito de “afinar” o bater de porta dos seus próprios modelos de topo). A tecnologia Beamforming baseia-se em agregados (arrays) de microfones organizados segundo uma matriz que respeita distâncias precisas entre cada um e cujo output conjunto depois de interpretado e manipulado em software permite fazer várias medições de fontes de ruído na área abrangida. Joel Paulo seguiu directamente para a sua segunda apresentação do dia, desta feita sobre “Parametric Loudspeaker Arrays”. Estes agregados de transdutores permitem fazer beamforming no sentido inverso, ou seja criar feixes de emissão sonora de elevada directividade, com aplicações tanto ao nível da criação de zonas de escuta selectiva em espaços públicos, como no meio militar como forma de canalizar informação à distância de forma muito controlada, por exemplo. A assistência teve a oportunidade de ouvir o protótipo de baixa potência construído pelo próprio Joel Paulo no âmbito da sua tese de doutoramento. O sistema funciona com uma frequência portadora ao nível dos ultrasons, que só é desmodulada durante a propagação pelo próprio ar para a gama audível. Por isso, se não estivermos no raio de acção do feixe ou de uma reflexão do mesmo nalguma superfície, não ouvimos absolutamente nada. Dentro do âmbito dos sistemas transdutores, seguiu-se ainda uma outra intervenção que despertou também bastante curiosidade entre os presentes. Ao entrarmos no espaço do auditório do LNEC éramos surpreendidos por uma série de painéis de um material semelhante a MDF Hidrófugo, de cor verde, dispostos como se de colunas se tratassem. Viemos a descobrir que se tratavam realmente de “colunas” com tecnologia NXT, durante a apresentação de António Ferreira da Mediachip, que versou sobre “Integração Arquitectural de Altifalantes: aplicações da tecnologia NXT – tecnologia bending waves”. Joel Paulo, coordenador da sessão de electroacústica, Jorge Patrício presidente da SPA e Jorge Célio Fradique, membro da direcção Foram mostrados vários exemplos de implementações da tecnologia que, em termos práticos, se resume a um excitador que é colocado estrategicamente num painel plano de determinado material que vai ser integrado na arquitectura, como o MDF ou o gesso cartonado. Depois, os painéis podem ser colocados alinhados com os painéis que formam as paredes, tornando-se verdadeiramente colunas “invisíveis”. Devido às dimensões possíveis e ao tipo de radiação das ondas sonoras, este sistema consegue coberturas sonoras muito homogéneas e bem distribuídas. Ao nível da gama de frequências os excitadores já vão dos 100Hz aos 18 000Hz, recorrendo-se a subwoofers para complementar a resposta nos graves. Tivemos a oportunidade de ouvir as “amostras” (painéis simples de MDF com os excitadores acoplados) com um sub convencional desenvolvido para encastramento em espaços reduzidos e, embora o sistema evidenciasse ainda algumas das limitações que seriam de esperar destes materiais ao nível dinâmico e de extensão, foi possível apercebermo-nos do poten- cial em coerência da fonte (todo o painel vibra uniformemente e sem crossovers como é evidente). Sonorização e espacialização A área temática “Aspectos práticos sobre sistemas de sonorização de espaços” abriu com a contribuição experiente de António Correia da CVA-Next Audio, que não resistiu a começar a sua intervenção ser um apelo/reclamação relacionado com a presença portuguesa na recente exposição mundial Shanghai 2010. É que, segundo o próprio, “falou-se muito de que o pavilhão português era coberto a cortiça, mas ao nível do sistema sonoro este era de um fabricante estrangeiro. Ora, o objectivo da participação nas Expos não é a promoção da imagem dos países e não se fala tanto de incorporação tecnológica nas exportações portuguesas? Connosco, ainda somos pelo menos três fabricantes nacionais com capacidade para sonorizar o pavilhão de Portugal!” De facto, a CVA tem provas dadas como a sonorização de estúdios da RTP Porto e RTP Lisboa, para Alguns dos palestrantes e as suas obras, da esquerda para direita: António Ferreira da Mediachip, António Correia da CVA-Next, Jorge Patrício e Joel Paulo. Em cima do palco: Filipe Andrade Santos com a coluna PanBeam em tripé, Jaime Reis, Filipe Oliveira e Paulo Jorge Ferreira da Avantgarde Os três microfones frontais do array de surround estavam equipados com os Acoustic Pressure Equalizer L50B. Estas esferas atenuam a captação acima dos 1000Hz nos sons fora de eixo e aumentam a intensidade na zona grave dos sons no eixo, contribuindo para uma sensação de claridade e presença programas como a “Praça da Alegria”, “Portugal no Coração”, “O Cubo”, “Portugal sem Fronteiras”, entre outros, e também fora do estúdio em produções como “Verão Total” e “Festa das Vindimas”. Conforme foi destacado, também o PA residente na sala de referência que é o Coliseu do Porto é um sistema de line array Next LA12, existindo dezenas ou mesmo centenas de instalações pelo país fora que utilizam os sistemas desta marca nacional. Esta apresentação de António Correia centrou-se na apresentação da nova série CX da marca Next Audio, parte do universo de soluções da CVA, cuja estreia foi justamente feita na Prolight+Sound 2010 em Frankfurt, conforme a Produção Áudio destacou. A estrela do sistema é a unidade de médios/agudos baseada num motor que conjuga uma unidade de médios que cobre as frequências dos 400Hz aos 8kHz com um tweeter montado coaxialmente que continua dos 8kHz até aos 20kHz, o que, entre outras vantagens, tira o crossover da crítica zona média. Foi com entusiasmo evidente que o responsável da CVA-Next se debruçou sobre todos os detalhes do processo de I&D desta série, desde o desenvolvimen- Tecnologia de vanguarda e tecnologia de trazer por casa. O protótipo de coluna Soundbeam de Joel Paulo e uma simples placa de som de home-studio que serve para o trabalho de campo JANEIRO ‘11 | |9 evento Sociedade Portuguesa de Acústica – Sessão de Electroacústica Os painéis NXT da Mediachip geraram grande curiosidade entre a assistência Pormenor do subwoofer de encastrar da Mediachip A CVA entrou também como parceira da SPA tendo fornecido um sistema completo de oito vias para a audição da música do compositor Jaime Reis, baseado em amplificadores Next MA e colunas da série NSound que surpreenderam pela sua envolvência. Ainda no tema de sistemas de sonorização tivemos a oportunidade de ouvir Filipe Andrade Santos da Audium apresentar e demonstrar o sistema de colunas de alta directividade da marca alemã PanBeam. Cada coluna PanBeam conta com um array vertical de pequenos altifalantes convencionais (o modelo mais pequeno PB08 conta com oito altifalantes de três polegadas e meia) controlados por um potente DSP que vai manipular a resposta temporal e em frequência de cada um, de forma a que o todo possa emitir um feixe o mais definido possível de som que permita focar com grande precisão as áreas onde se quer chegar e evitar ao máximo dispersar energia para zo- A colunas NSound revelaram um sólido som de família que nos permitiu ouvir um palco sonoro surround de grande coerência nas problemáticas, como superfícies reverberantes ou tectos abobadados. Por essa razão são sistemas com grande implantação no mercado de instalação em igrejas e espaços com desvantagens acústicas, como pavilhões desportivos, por exemplo. Som em cinema e multicanal Depois de um curto intervalo para café, nova curva temática, neste caso a apresentação “O som em cinema – Do sincronismo ao Campo Sonoro” por Filipe Oliveira, da Escola Superior de Teatro e Cinema. Foram abordados aspectos tão diversos como a dimensão – não só sonora – que o som sincronizado traz à imagem em movimento, até aspectos técnicos da própria sincronização, desde a clássica claquete aos sistemas actuais por timecode. Foram ainda abordadas questões ligadas à percepção de sincronismo, como a nossa sensibilidade a diferenças de 1 a 2 foto- Se não fosse o cabo de coluna não seria possível suspeitar da real função deste... quadro to do motor coaxial em colaboração com a B&C, parceira habitual da marca de Rio Tinto, até ao desenho tridimensional do guia de onda, desenvolvido pela própria CVA, para uma resposta o mais linear possível e com ângulos de dispersão vertical e horizontal o mais estáveis possível, para facilitar a colocação em array. A atenção ao detalhe estende-se aos amplificadores classe D, ao potente DSP configurável via RS485 e aos sistemas de posicionamento integrados que, no caso desta demonstração, permitiu virar a unidade de médios/agudos directamente ao centro da plateia a partir de uma altura de cerca de três metros do chão, já que o conjunto CX estava poisado sobre o palco do auditório. A audição efectuada a níveis sonoros muito mais baixos do que as CX podem produzir, revelou um som de grande fidelidade, particularmente nos médios e agudos. 10 | | JANEIRO ‘11 Pormenor do sistema de fixação integrado do sistema CX da Next, que permite construir blocos fullrange com as “peças” de graves e as médios/agudos e definir a orientação relativa seja voadas ou em “terra”. Na segunda imagem podemos observar a orientação das colunas vista pelo ângulo de trás onde está o painel de ligações Mr B&K, a captação binaural mete respeito Mr B&K e o Jecklin Disc manufacturado por Joel Neto, mas completamente up-to-spec. O suporte de microfone na parte superior é um extra para dar versatilidade no trabalho do dia-a-dia da investigação gramas entre o som e a imagem ou o facto de o tempo de um fotograma (sendo que, em cinema, são 24 por segundo) corresponder a um percurso de cerca de 14 metros para o som, factor que deve ser tido em conta quando se faz a sincronização para que haja uma boa percepção da mesma ao longo de toda a plateia. Finalmente, falou-se da evolução do som mono óptico até aos vários formatos multicanal analógicos e digitais. Por uma espécie de ironia do destino e por causa de um problema técnico em ligar o PC do orador ao sistema de reforço sonoro do auditório, acabámos por ouvir os excertos cinematográficos da apresentação através das colunas Next e com o privilégio de um operador de luxo, nada mais nada menos que o próprio António Correia! O que claro, deu azo a um simpático momento de descontracção na ordem de trabalhos. Infelizmente, por motivos que se prenderam com o avançado da hora optou-se por não se fazer a apresentação de Paulo Ferreira da Audiopro/Avantgarde sobre captação de som estéreo, binaural, surround e soundfield. A Audiopro/Avantgarde foi um dos parceiros em termos logísticos do evento para o qual trouxe um sistema de captação 5.0 da DPA baseado no suporte S5 e cápsulas 4006 omnidireccionais e pré-amplificação Audient. A gravação foi feita para Pro Tools via um de 6 a 9. 4. 2011 discovering new dimensions A Prolight + Sound, que integra o setor Media Systems, constitui a maior feira internacional de tecnologias e serviços para espetáculo e entretenimento. A feira oferece-lhe uma vasta panorâmica de todos os produtos e serviços, desde a tecnologia de palco à integração de sistemas. Mais informações em: www.prolight-sound.com [email protected] Tel. 21 793 91 40 evento Sociedade Portuguesa de Acústica – Sessão de Electroacústica As colunas PanBeam apresentadas por Filipe Andrade Santos da Audium recorrem a complexos processos DSP para atingir altos níveis de directividade Foi pedido a um saxofonista que circulasse em torno dos vários sistemas de captação e posteriormente em redor da plateia para se poderem criar exemplos de captação estereofónica, binaural e surround A descontracção e a informalidade foram uma constante ao longo de um programa intenso Paulo Ferreira da Avantgarde gravou todo o evento com o array DPA para além do apoio constante 12 | | JANEIRO ‘11 interface Digidesign 003 Factory que viria a servir também como superfície de controlo para a actuação de Jaime Reis. No entanto, estava ainda preparada uma actuação de um jovem saxofonista de nome Bernardo Jobling, como forma de demonstrar as virtualidades do som envolvente nas suas várias modalidades. Tal ainda aconteceu, tendo sido pedido ao músico que fosse circulando pela sala enquanto tocava, para se fazer uma gravação que tirasse partido das várias formas de captação presentes na sala. Foram elas o sistema de captação surround da DPA de que já falámos, um torso da B&K para captação binaural e um Jecklin Disc manufacturado por Joel Paulo para o seu trabalho de investigação. Por último, e já em tempo de compensação, não era possível perder a oportunidade de ouvir as peças que Jaime Reis escolheu para apresentar. Foram elas “APHÂR” de João Pedro Oliveira e “Phonopolis” do próprio Jaime. A intensa actuação captou a atenção auditiva da plateia com os vários cruzamentos sonoros que percorreram o sistema de oito colunas fornecido pela NSound. E de facto as colunas Nsound brilharam, não só pelo seu “timbre”, mas pela capacidade que demonstraram em reproduzir um espaço acústico contínuo e estável onde os vários acontecimentos sonoros puderam ter lugar. Isso foi particularmente evidente pelo facto de nos encontrarmos num ponto longe do centro do cír- culo de colunas de onde conseguíamos, mesmo assim, distinguir claramente o palco sonoro circular. Mesmo com a sessão a prolongar-se para lá do horário previsto, ninguém da assistência deu mostras de cansaço quando os trabalhos foram dados por terminados. Como não podia deixar de ser, num ambiente que juntou interessados que são também aficionados, o interesse foi constante. Foi uma sessão para o sentido da audição onde ninguém estranhou ver membros da plateia de olhos fechados ou a deambular pela sala à procura de ouvir determinados fenómenos acústicos em demonstração. O contacto entre o mundo académico e o mundo industrial que se deu a propósito desta sessão sobre eletroacústica deixou portas e pontes abertas que pudemos testemunhar e que poderão ainda vir a dar resultados interessantes. Esperamos poder ver e ouvir os seus frutos num futuro próximo. www.spacustica.pt Patrocinadores oficiais da sessão: Bruel&Kjaer; Mediachip; CVA-NextAudio Apoios logísticos: LNEC; AvantGarde; INET-md / FCSH-UNL; UMinho; DEETC/ISEL; Caps/IST A cabeça B&K foi cedida pela Universidade do Minho