- Laboratório de Desempenho Logístico (LDL)
Transcrição
- Laboratório de Desempenho Logístico (LDL)
Competências Logísticas: uma revisão da literatura Karla Sousa da Motta (M.Sc.) Professor: Carlos Manuel Taboada Rodriguez (Dr.) Professora: Monica Maria Mendes de Luna (Dr) Disciplina Logística Empresarial Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil Resumo Objetivo – Este artigo tem o objetivo de analisar o surgimento e a evolução das citações à expressão “competências logísticas” na literatura científica especializada na área de engenharia de produção, identificando as posturas e atividades organizacionais que são classificadas como tal. Abordagem metodológica – São analisados sistematicamente dezoito artigos, publicados em uma base de dados em língua inglesa no período entre 1991 e 2008, selecionados conforme os graus de impacto por eles apresentados. O material coletado está organizado em uma estrutura que propicia a discussão sobre o tema, que identifica as competências logísticas citadas em um recorte da literatura, ordena-as cronologicamente quanto aos anos de citação, classifica-as como pertinentes aos níveis intra-organizacional ou interorganizacional e destaca aquelas presentes nas publicações mais recentes. Resultados - As competências identificadas seguem classificadas nos níveis intra-organizacional, inter-organizacional e comuns a ambos os níveis: Intra-organizacional: estratégia de posicionamento em mercados, variedade de produtos, gestão da demanda, seqüenciamento de pedidos, aprovisionamento, gestão de inventário, otimização operacional, cooperação inter-funcional, negociação e pagamentos. Inter-organizacional: parcerias e gestão da cadeia de suprimentos. Comuns aos níveis intra e inter-organizacional: serviço ao cliente, comunicação, integração, gestão de fluxos de produtos, gestão de processos, gestão de requisitos-chave, flexibilidade, velocidade, agilidade, qualidade, consistência, foco, efetividade, custo total e mensuração. As competências logísticas mais mencionadas na totalidade da literatura pesquisada são serviço ao cliente, comunicação e gestão de fluxos de produtos. A literatura recente tem se voltado para as competências logísticas de serviço ao cliente, flexibilidade, velocidade, agilidade, qualidade, consistência, foco, efetividade, otimização operacional e gestão de inventário. A revisão analítica da literatura realizada compõe uma base teórica, a partir da qual futuros estudos podem ser desenvolvidos. Limitações da pesquisa – Poderiam ter sido incluídos ao estudo periódicos e bases de dados adicionais, propiciando maiores amplitude e aprofundamento ao tema em questão. Implicações práticas – Os resultados estimulam os pesquisadores a refletirem sobre a evolução do tema tratado, assim como apresentam aos profissionais da logística as competências em maior evidência na atualidade. Valor e originalidade do tema – Por meio de uma rigorosa análise da pesquisa bibliográfica realizada, este artigo consolida as menções bibliográficas referentes às competências logísticas, mostrando os entendimentos dos autores pesquisados sobre o tema em questão. São sugeridas proposições para futuras pesquisas. Palavras-chave: Competências logísticas, cadeia de suprimentos, serviço ao cliente, comunicação, gestão de fluxos de produtos. Tipo de artigo: Revisão da literatura. 1. Introdução e objetivo Este artigo tem o objetivo de analisar o surgimento e a evolução das citações à expressão “competências logísticas” na literatura científica especializada na área de engenharia de produção, identificando as posturas e atividades organizacionais que são classificadas como tal. Um melhor entendimento dos elementos pesquisados, das suas dimensões e implicações, da sua relevância acadêmica e empírica, poderá contribuir para a construção teórica nas áreas afins. A diferença entre este artigo e seus antecessores identificados, que versam sobre competências logísticas, está em revisar um grande número de publicações que tratam simultaneamente das palavras-chave pesquisadas, focar relações particulares entre estas palavras-chave e utilizar a bibliometria como metodologia de análise. Conforme o contexto de aplicação, um mesmo termo pode assumir diferentes significados, assim como diferentes termos têm a capacidade de propiciar similar compreensão. A definição de “competência” aqui adotada parte das visões de diversos autores, depurada e consolidada conforme o entendimento dos autores deste artigo. Para que uma competência seja identificada como essencial para a organização é preciso que se saiba se ela é percebida pelo cliente como um beneficio real, que se verifique se outras empresas têm dificuldade para imitá-la e que se descubra se cria novas oportunidades de negócio (PRAHALAD et HAMEL, 1990). A definição de Day (1994) aponta “competência” como aquilo que não é visível para os clientes e “capacidade” como aquilo que os clientes podem ver e valorar. Zhang et al. (2005) identifica relacionamentos diretos, fortes e positivos entre capacidades e competências logísticas. Deste modo, aqui estão unificados os conceitos de “competência” e “capacidade”, sendo adotado o termo “competência” para ambos, o qual é assumido como aquilo que propicia nível de serviço ao cliente, sendo ou não visível por ele. Para “logística” é adotado o seguinte conceito, oriundo do Council of Logistics Management (2003): “É a administração integrada dos fluxos das informações e dos materiais nas empresas e cadeias produtivas, partindo da demanda do cliente final e indo até à fonte de matéria-prima.” A expressão “competência logística” é utilizada por Bowersox et Closs (2001) como um recurso estratégico essencial para o planejamento da prestação do serviço ao cliente. Segundo os autores, “As empresas que desenvolvem competência logística superior estão estrategicamente colocadas para desfrutar uma vantagem competitiva difícil de ser igualada em desempenho de serviço e custo” (BOWERSOX et CLOSS, 2001, p. 392). Há também a definição de competência logística como sendo a parte dos recursos da empresa, através da qual são concebidas e implementadas estratégias que promovem eficiência e efetividade. (Barney, 1991). Neste artigo, a expressão “competências logísticas” é assumida como as posturas e iniciativas relacionadas à administração integrada dos fluxos das informações e dos materiais nas empresas e cadeias produtivas, que propiciam nível de serviço ao cliente. O artigo está estruturado na seguinte seqüência: a seção 2 apresenta a metodologia adotada para a pesquisa. Na seção 3 estão apresentados os resultados obtidos com a pesquisa, que mostram as competências logísticas citadas em um recorte da literatura. A seção 4 aplica a bibliometria para apresentar a evolução cronológica da menção às competências logísticas. Como resultados da análise e contribuição deste artigo à construção teórica referente ao tema em questão, são apresentadas a classificação das competências como pertinentes aos níveis intra-organizacional, interorganizacional ou a ambos, sendo destacadas aquelas presentes nas publicações mais recentes. O artigo é concluído com a apresentação das limitações da pesquisa e sugere novos caminhos a serem seguidos por pesquisadores interessados no tema. 2. Metodologia adotada para a pesquisa Esta seção aponta os critérios adotados para seleção dos artigos pesquisados, apresenta os termos incluídos na análise realizada e esclarece a forma como estão organizadas as informações, para propiciar sua análise. A revisão da literatura é aqui adotada como uma abordagem para pesquisa, cujo objetivo neste artigo é de identificar a evolução das citações às competências logísticas em artigos que versam sobre o tema. As competências logísticas citadas em um recorte da literatura estão ordenadas cronologicamente quanto aos anos de citação e classificadas como pertinentes aos níveis intra-organizacional ou inter-organizacional, tendo sido destacadas aquelas presentes nas publicações mais recentes. A metodologia para seleção das bases de dados e dos artigos a serem analisados tomou como referência o artigo Supply chain integration and performance: a review of the evidence (Fabbe-Costes et Jahre, 2008). Considerando que a língua inglesa é adotada como padrão para indexação da produção científica mundial, a pesquisa referente à expressão “competências logísticas” em bases de dados se deu a partir dos termos “logistics competences”, “logistics competencies”, “logistics capability” e “logistics capabilities”. Visto que é imprescindível a leitura da íntegra dos artigos pesquisados para efetuar uma revisão de literatura, foram adotados os seguintes critérios para as etapas precedentes, de busca e seleção: • Presença das expressões “logistics competences”, “logistics competencies”, “logistics capability” e “logistics capabilities” no título e/ou nas palavras-chave e/ou no resumo; • Disponibilidade de acesso à íntegra do artigo encontrado. Foi pesquisada a base Emerald Management Xtra, por meio do portal da CAPES (http://www.capes.gov.br), sendo identificados nove jornais que abordam o tema competências logísticas, abaixo nomeados, seguidos pela quantidade de artigos identificados em cada um deles e ordenados em ordem decrescente deste número de publicações: 1. International Journal of Physical Distribution and Logistics Management (IJPDLM) (8); 2. International Journal of Logistics Management (IJLM) (4); 3. Supply Chain Management: An International Journal (SCM-IJ) (2); 4. International Journal of Operations and Production Management (IJOPM) (1); 5. Benchmarking: An International Journal (1); 6. Business Process Management Journal (1); 7. Journal of Consumer Marketing (1); 8. Logistics Information Management (1). Foram selecionados 18 artigos tomados como referência para a análise aqui apresentada, dentre os 76 contendo as expressões pesquisadas, localizados na base de dados Emerald Management Xtra. A seleção observou a pertinência da abordagem dos artigos pesquisados ao conceito aqui adotado para competência logística. O Quadro 1 apresenta a síntese da seleção efetuada e a distribuição dos artigos em 8 periódicos, no período entre 1991 e 2008. Seguem identificados os periódicos que são avaliados conforme o JVC ou são reconhecidos por outros critérios qualificadores: O fator de impacto JCR 2003 foi 0,547 para IJOPM. Existe nos Estados Unidos o sistema de avaliação Top Ten Gibson et al. (2004) para os periódicos de logística e cadeia de suprimentos, que incluíram o IJLM, SCM-IJ. No ranking da Cranfield University School of Management (2004), IJPDLM, é graduado e recomendado para publicações acadêmicas. Quadro 1 – Bibliografia Selecionada relativa às Competências Logísticas Periódico Autores Ano Artigo Morash, E. A., C. Droge, et al. "Boundary spanning interfaces between logistics, production, marketing and new product 1996 development." Closs, D. J., T. J. Goldsby, et al. "Information technology influences on 1997 world class logistics capability." Evans, K. "The remaining need for localisation of logistics practices and services in 2000 Europe." Mentzer, J. T., S. Min, et al. 2004 "Toward a unified theory of logistics." Closs, D. J., M. Swink, et al. "The role of information connectivity in making flexible logistics programs 2005 successful." Mollenkopf, D. et G. P. Dapiran "World-class logistics: Australia and 2005 New Zealand." International Journal of Physical Distribution & Logistics Management Cho, J. J.-K., J. (8) Ozment, et al. "Logistics capability, logistics outsourcing and firm performance in 2008 an e-commerce market." Capacino, W. C. et F. F. Britt 1991 "Perspectives on Global Logistics." Lowson, R. H. "Retail Operational Strategies in 2001 Complex Supply Chains." Mangan, J. et M. Christopher "Management development and the 2005 supply chain manager of the future." Zhang, Q., M. A. Vonderembse, et al. "Logistics flexibility and its impact on 2005 customer satisfaction." Aquilon, M. "Cultural dimensions in logistics management: a case study from the 1997 European automotive industry." Lin, J.-S. C. et C.-R. Chen "Determinants of manufacturers' 2008 selection of distributors." Benchmarking: An International Journal (1) Gilmour, P. G"Benchmarking supply chain 1998 operations." Business Process Management Journal (1) Jonsson, S. et C. Gunnarsson "Internet technology to achieve 2005 supply chain performance." The International Journal of Logistics Management (4) Supply Chain Management: An International Journal (2) International Journal of Operations & Production Daugherty, P. J. et P. Management (1) H. Pittman "Utilization of time-based strategies: Creating distribution 1995 flexibility/responsiveness." Journal of Consumer Marketing (1) Walters, D. et M. Rainbird "The demand chain as an integral 2004 component of the value chain." Logistics Information Management (1) Wills, G. et M. Wills "Re-engineering knowledge 1997 logistics." 3. Resultados obtidos com a pesquisa A primeira menção às competências logísticas dentre os artigos integralmente encontrados é datada de 1991, conforme Capacino et al, em um estudo da Andersen Consulting que indica seis áreas de oportunidades ou imperativos recomendados como guia para o pensamento dos gestores logísticos na década de 1990, para que desenvolvam suas competências de logística global. O artigo afirma que as capacidades logísticas das empresas determinam os desempenhos de custos e serviços ao cliente, tornando a logística global uma função crítica. Distingue logística de exportação de logística global, dizendo que naquela a empresa define um local de produção e um local de venda, enquanto que nesta a produção e o mercado podem ser no mundo todo. É dito que na logística global as distâncias e os ciclos de tempo são maiores, mais atores estão envolvidos, mais dados e maiores conhecimentos são necessários, custos e penalidades por erros são mais elevados. Diante deste cenário, é recomendada a observação dos seguintes princípios para desenvolvimento de competências de logística global: formação de parcerias de infra-estrutura, integração de operações nos canais de distribuição, diferenciação por serviços prestados superiores, aumento da velocidade dos processos logísticos, cooperação e integração inter-funcional e manutenção de relacionamentos de parcerias "ganha-ganha" entre fornecedores, transportadores e clientes. A formação de parcerias apresentada tem o intuito de possibilitar a integração das operações das empresas componentes dos canais de distribuição, que passariam a se diferenciar dos concorrentes pelos serviços prestados, os quais seriam melhores devido ao aumento da velocidade dos processos logísticos, decorrente da cooperação e integração inter-funcional (figura 1). É necessária a manutenção dos relacionamentos de parcerias estabelecidos entre fornecedores, transportadores e clientes, para que esta cadeia de eventos seja duradoura. FORNECEDORES INDÚSTRIAS ATACADISTAS VAREJISTAS PREVISÃO PREVISÃO PREVISÃO PREVISÃO DEMANDA PLANEJAMENTO DA PRODUÇÃO INVENTÁRIO INVENTÁRIO TAXA DE USO INVENTÁRIO INVENTÁRIO TRANSPORTE TRANSPORTE TRANSPORTE SISTEMA DE TRANSPORTE SISTEMA DE INFORMAÇÃO INFORMAÇÃO SUPRIMENTOS COMPRAS PLANEJAMENTO DA PRODUÇÃO SISTEMA DE INFORMAÇÃO SISTEMA DE INFORMAÇÃO PROCESSAMENTO DE ORDENS PROCESSAMENTO DE SUPRIMENTOS ORDEM DE ABASTECIMENTO FATURAMENTO PROCESSAMENTO DE ORDENS FATURAMENTO CONSUMIDORES ABASTECIMENTO DA PRATELEIRA FATURAMENTO Figura 1 – Fluxo de Materiais, Componentes e Produtos na Cadeia de Suprimentos Fonte: Capacino, 1991 (adaptado) Daughtery et Pittman (1995) se apóiam em uma pesquisa realizada com 10 empresas da Fortune 500 para afirmarem que a chave para obter vantagem competitiva se relaciona à adoção de estratégias baseadas na redução dos tempos de processo operacional e na substituição de inventários por informações confiáveis. Apontam a agilidade dos processos, a flexibilidade para atender às diferentes demandas dos clientes e a capacidade de dispor e comunicar informações como competências-chave para o sucesso dos negócios. Isso se deve ao fato das empresas velozes, flexíveis e bem informadas tomarem decisões mais rapidamente, desenvolverem novos produtos mais cedo e entregarem os pedidos dos clientes antes dos concorrentes. É citada como essencial a compressão dos tempos operacionais que proporcione maior agilidade aos processos, notadamente nas seguintes práticas empresariais: processamento de pedidos, produção, operações de manufatura, montagem de pedidos completos, expedição, embarque, distribuição, entrega e comunicação para suporte aos clientes. Os autores Morash, Droge et al (1996) apontam que a logística facilita a integração entre clientes e fornecedores no desenvolvimento de novos produtos, sendo enunciadas como necessárias ao alcance de uma performance de classe mundial. Isto ocorre por sua postura de interface entre as áreas de produção, e marketing, onde são apontadas as competências de serviço ao cliente e qualidade logística no processo de gestão da demanda, e das competências de canal de distribuição e redução de custo total no processo de gestão de suprimentos. PRODUÇÃO LOGÍSTICA GESTÃO DA DEMANDA - Serviço ao Cliente - Qualidade Logística GESTÃO DE SUPRIMENTOS - Canal de Distribuição - Redução de Custo Total MARKETING GESTÃO DA DEMANDA - Serviço ao Cliente - Qualidade Logística GESTÃO DE SUPRIMENTOS - Canal de Distribuição - Redução de Custo Total DESENVOLVIMENTO DE NOVOS PRODUTOS Figura 2 – Ligações das competências e interfaces logísticas com produção, marketing e desenvolvimento de novos produtos. Fonte: Morash, Droge et al, 1996 (adaptado) Serviço ao cliente é definido como a capacidade de ser flexível e responsivo no atendimento das novas necessidades e demandas dos clientes internos e externos, considerando o abastecimento de materiais, componentes e serviços que contribuam para a produção. A qualidade logística é percebida em termos da capacidade de distribuir produtos, materiais ou serviços para os clientes internos e externos, conforme suas necessidades e padrões, sem erros, defeitos, enganos ou outros desvios. As propriedades espaciais, físicas e sistêmicas são competências do canal de suprimentos, referentes à capacidade de distribuir materiais e produtos para mercados selecionados. A redução de custo total é apresentada como a capacidade de minimizar os custos totais do sistema, em detrimento de ganhos e perdas de atividades funcionais específicas. Para Aquilon (1997), as competências logísticas tais como capacidade dos processos, segurança e controle tem se tornado mais importantes que objetivos funcionais, notadamente pelo fato de que os limites entre as empresas tendem a desaparecer. Empresas que operam em mercados mundiais de alta competitividade não podem apenas aprender a inovar, adaptar e explorar a tecnologia, mas precisam desenvolver novos tipos de competências em diversas áreas, inclusive a de logística, que podem variar desde uma simples transação até uma integração vertical entre cliente e fornecedor, passando por alianças externas, parcerias para distribuição, partilha de custos e outras mais. Closs et al (1997) apresenta um modelo com características das empresas de logística de classe mundial, com quatro competências - posicionamento, integração, agilidade e mensuração. O posicionamento é composto por estratégia, cadeia de suprimento, rede de trabalho e organização. A integração é a segunda competência apresentada, contemplando unificação da cadeia de suprimentos, conectividade, padronização, simplificação, disciplina, tecnologia e compartilhamento de informação. A união da relevância e da capacidade de acomodação com a flexibilidade compõem a competência da agilidade. A quarta competência é a mensuração, composta por avaliação funcional, avaliação do processo e benchmarking. O trabalho apresentado por Closs et al (1997) relata o resultado da seguinte seqüência de eventos: na década de 1990 o Council of Logistics Management patrocinou dois estudos sobre logística, procurando entender como algumas empresas adotavam práticas capazes de atender clientes exigentes melhor que seus concorrentes, como se tornavam líderes em excelência operacional e também como traduziam seu desempenho em vantagem competitiva e valor superior para acionistas. Estes estudos foram realizados pela Michigan State University: “Leading Edge Logistics” (1989), que evoluiu em 1992 para um modelo denominado “The leading edge best practice” sendo posteriormente realizado o “World Class Logistics” (1995) (Figura 3). Figura 3 – Modelo “World Class Logistics” Fonte: The Global Logistics Research Team, 1995 (adaptado) Os resultados destes trabalhos indicam que as companhias que estabelecem competências logísticas podem ganhar vantagens competitivas significativas nas dimensões de eficiência, eficácia e flexibilidade, que englobam as dezessete capacidades mensuráveis que uma empresa deve possuir para apresentar uma logística classe mundial, conforme relatado por Closs (1997) (figura 4). Figura 4 – Modelo de capacidades logísticas Fonte: The Global Logistics Research Team, 1995 (adaptado) Wills et al. (1997) apontam cinco competências-chave da logística: a facilidade, a unitização, as comunicações, os inventários e os transportes. Gilmour. (1998) propõe um roteiro de onze competências logísticas para uma organização, agrupadas em cinco dimensões: 1. Estratégia e organização: seleção de fornecedores, aprovisionamento, formato da organização do aprovisionamento e partilha de informações. 2. Planejamento: planejamento de ordens e desenvolvimento de produtos. 3. Processo de gestão e informação: automação das transações e aprovação do aprovisionamento. 4. Fluxo de produtos: ponto e tempo de entrega. 5. Mensuração: desempenho de fornecedores. Em 1998 o Fritz Institute of Global Logistics et al. conduziu uma pesquisa que sugere que o estabelecimento de competências logísticas globais ocorram ao longo dos níveis funcional, da integração dos processos internos e das parcerias das atividades logísticas com outros membros da cadeia, inclusive prestadores de serviços. Evans (2000) afirma que a rápida expansão das empresas de logística no mundo virtual tem afetado três competências, que são a definição de procedimentos, a disciplina para cumpri-los e o desenvolvimento de tecnologia de informação e comunicação, desde uma simples troca eletrônica de dados, do uso de códigos de barras e até de satélites para transferência de informações. Lowson (2001) apresenta uma hierarquia de estratégias baseadas em competências: 1. Estratégias genéricas: liderança em custos, diferenciação e foco. 2. Posicionamento estratégico; flexibilidade, capacidade de respostas, custo, qualidade, velocidade, variedade etc.; 3. Estratégia de operações: efetividade operacional proporcionada pela fusão das atividades de gestão operacional, competências essenciais e tecnologias; 4. Gestão de operações: a organização das atividades de gestão operacional, competências essenciais, recursos e tecnologias interna e externamente, para prover combinações de produtos e serviços. Mentzer et al. (2004) afirma que as competências logísticas ajudam empresas a assumirem a liderança pela redução de custos e capital empatado, em decorrência da eficiência operacional e da efetividade do serviço ao cliente. As competências logísticas são categorizadas na interface da gestão da demanda, onde se destacam a gestão da cadeia de suprimentos, a gestão das informações, o serviço ao cliente e a qualidade da logística. Estas competências provêem diferenciações de produtos ou serviços conforme as particularidades dos clientes, sendo denominadas de focadas no cliente, de valor agregado ou de integração com clientes. Walters et al. (2004) dispõe uma combinação de competências requeridas para o sucesso das cadeias de suprimentos e de demanda, capazes de maximizar o valor das organizações. Quanto à cadeia de suprimentos, o foco está na eficiência da execução dos processos, onde o custo total é visto como elemento chave, sendo buscado o domínio das atividades de manufatura e logística. No que se refere à cadeia de demanda, o foco recai na efetividade, a ser alcançada com a oferta de produtos orientados para o mercado e por processos apoiados pelo planejamento. É proposta uma estratégia focada na otimização da manufatura, distribuição e rede de negócios, nos clientes e mercados, nas necessidades de personalização dos produtos chave, na estratégia de marketing e vendas, sendo criada consciência da demanda. Closs et al. (2005) apresenta a flexibilidade como uma competência logística crítica, caracterizada como a habilidade de atender às variadas necessidades dos clientes, de prover necessidades únicas de clientes e de definir a delegação necessária para satisfazer necessidades especiais dos clientes. Jonsson et al. (2005) aponta a internet como uma tecnologia capaz de agregar valor para o cliente e integrar alianças entre parceiros de uma cadeia de suprimentos, dando suporte às competências de aprovisionamento, seqüenciamento de pedidos, negociação e pagamentos. Mangan e Christopher (2005) explanam sobre a gestão de operações na cadeia de suprimentos, o foco nos fluxos e processos, a logística multimodal e a logística em mercados emergentes como sendo competências a serem aprendidas pelos gestores de logística e de cadeias de suprimentos. Mollenkopf et al (2005) utiliza o modelo Supply Chain 2000 Framework, desenvolvido na Universidade do Estado de Michigan (EUA), para identificar as práticas de logística e gestão da cadeia de suprimentos, utilizadas por empresas de classe mundial localizadas na Austrália e na nova Zelândia. As seis competências que compõem o desempenho de classe mundial em logística e cadeia de suprimentos estão enquadradas nos contextos operacional, de planejamento ou de relacionamento, sendo elas: integração com clientes, integração interna, integração com fornecedores de materiais e serviços, integração de planejamento e tecnologia, integração da mensuração e integração do relacionamento. Zhang et al (2005) apresenta a flexibilidade como uma competência essencial da logística, devendo ser aplicada no aprovisionamento, no recebimento dos materiais, na gestão da demanda e na distribuição física. Cho et al (2008) utiliza o estudo da Universidade do Estado de Michigan(MSU) (GLRT at Michigan State University, 1995) que demonstra empiricamente como as empresas usam suas competências logísticas para obter competitividade, focando expectativas dos clientes. As competências logísticas em um ambiente de comércio eletrônico apresentadas pelo estudo são: serviço de pré-venda, serviço de pós-venda, rapidez da entrega, consistência da entrega, responsividade - atendimento às necessidades do mercado, comunicação das informações de entrega, processamento de pedidos baseado na Internet, cobertura de distribuição seletiva, abrangente, global e de baixo custo total. Lin et al (2008) afirma que competências logísticas propiciam a oportunidade das empresas obterem simultaneamente redução de custos, flexibilidade operacional e criar valor para os clientes. Pesquisas acadêmicas (Fawcett et al. (1997), Morash et al. (1996) and Zhao et al. (2001), apud LIN, 2008) destacam as seguintes competências logísticas: gestão de inventários, eficiência nas entregas, flexibilidade, inovação, custos logísticos e serviço ao cliente. Empresas com melhor eficiência apresentam diferenciais nas suas competências logísticas, alcançando um melhor desempenho e sendo preferidas pelo mercado. (Rosenbloom (2004) apud LIN, 2008). Um estudo realizado sobre competências logísticas Macohin, Razzolini e Taboada (2003) sistematiza as competências necessárias a uma organização como compostas por um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes, aplicáveis às atividades clássicas da logística, apresentadas como transportes, armazenagem, gestão de estoques, gestão de informações e gestão de processos. Retornando ao conceito de logística aqui adotado – administração integrada dos fluxos das informações e dos materiais nas empresas e cadeias produtivas, partindo da demanda do cliente final e indo até à fonte de matériaprima (Council of Logistics Management, 2003) – observa-se que as competências mencionadas no conteúdo pesquisado tanto se referem ao ambiente interno das organizações, quanto às relações entre empresas na cadeia produtiva. Embora enfoquem diferentes aspectos da logística, as abordagens se complementam, abrangendo os níveis estratégico (Capacino et al(1991), Closs et al (1997) Gilmor (1998), Mangan et al (2005), Mollenkopf et al (2005), Cho et al (2008) ), tático ou gerencial (Morash et al. (1996), Aquilon (1997), Evans (2000), Lowson (2001), Mentzer et al (2004), Quadro 2 – Competências logísticas mencionadas Autores Ano Competências Mencionadas Capacino, W. C. et F. F. Britt 1991 1. Formação de parcerias, 2. Integração dos endereços dos canais, 3. Diferenciação por serviços, 4. Aumento da velocidade, 5.Cooperação inter-funcional, 6. Relacionamentos de parcerias Daugherty, P. J. et P. H. Pittman 1995 1. Agilidade dos processos, 2. Flexibilidade para atender às demandas dos clientes, 3. Capacidade de dispor e comunicar informações Morash, E. A., C. Droge, et al. 1996 1. Serviço logístico ao cliente, 2. Qualidade, 3. Canal de distribuição, 4. Redução do custo logístico total Aquilon, M. 1997 1. Capacidade dos processos, 2. Segurança e controle Closs, D. J., T. J. Goldsby, et al. 1997 1. Posicionamento, 2.Integração, 3. Agilidade, 4.Mensuração Wills, G. and M. Wills 1997 1. Facilidade, 2. Unitização, 3. Comunicações,4. Inventários, 5.Transportes Gilmour, P. 1998 1. Estratégia e organização, 2. Planejamento, 3. Processo de gestão da informação, 4. Fluxo de produtos, 5. Mensuração. Evans, K. 2000 1. Definição de procedimentos, 2. Disciplina para cumprir os procedimentos, 3. Desenvolvimento de tecnologia de informação e comunicação Lowson, R. H. 2001 1. Custos, 2. Diferenciação, 3. Foco 4. Flexibilidade, 5. Responsividade, 6. Qualidade, 7. Velocidade, 8. Variedade, 9. Efetividade operacional, 10. Gestão operacional, 11. Comunicação Mentzer, J. T., S. Min, et al. 2004 1. Gestão da cadeia de suprimentos, 2. Gestão das informações, 3. Serviço ao cliente, 4. Qualidade da logística Walters, D. et M. Rainbird 2004 1. Otimização da manufatura, 2. Distribuição, 3. Rede de negócios com clientes e mercados, 4. Personalização, 5. Requerimentos dos produtos chave Closs, D. J., M. 2005 1. Flexibilidade para atender às variadas necessidades dos clientes Swink, et al. (2005). Jonsson, S. et C. Gunnarsson 2005 1. Aprovisionamento, 2. Seqüenciamento de pedidos, 3. Negociação 4.Pagamentos Mangan, J. et M. Christopher 2005 1. Gestão de operações na cadeia de suprimentos, 2. Foco nos fluxos e processos, 3. Logística multimodal, 4. Logística em mercados emergentes Mollenkopf, D. and G. P. Dapiran 2005 1. Integração com clientes, 2. Integração interna, 3. Integração com fornecedores de materiais e serviços, 4.Integração de planejamento e tecnologia, 5. Integração da mensuração, 6.Integração dos relacionamentos Zhang, Q., M. A. Vonderembse, et al. 2005 1. Flexibilidade de aprovisionamento, 2. Flexibilidade no suprimento físico, 3. Flexibilidade na gestão da demanda, 4. Flexibilidade na distribuição física Cho, J. J.-K., J. Ozment, et al. 2008 1. Serviço de pré-venda, 2. Serviço de pós-venda, 3. Rapidez da entrega, 4. Consistência da entrega,5. Responsividade Lin, J.-S. C. et C.R. Chen 2008 1. Gestão de inventários, 2. Eficiência nas entregas, 3. flexibilidade, 4. Inovação, 5.Custos logísticos, 6. Serviço ao cliente Walters et al (2004), Closs et al (2005), Mangan et al (2005) e operacional (Daugherty et al (1995), Wills et al (1997), Closs et al (2005), Jonsson et al (2005), Zhang et al (2005), Lin et al (2008) das organizações, apresentando consistência e coerência teórica. Na revisão de bibliografia realizada foi identificada a menção às competências logísticas apresentadas no Quadro 2, ordenadas cronologicamente, conforme a ótica dos autores acerca do tema pesquisado. 4. Evolução da menção às competências logísticas As competências identificadas na pesquisa bibliográfica foram agrupadas conforme a afinidade dos seus significados com as perspectivas da logística, possibilitando a avaliação da sua presença na literatura no decorrer do intervalo de tempo em questão. Quadro 3 – Cronologia da menção às competências logísticas 3 Competência / Ano Serviço ao cliente, facilidade, responsividade, segurança, diferenciação, personalização, posicionamento Informação, comunicação, tecnologia Distribuição, fluxo de produtos, unitização, transporte, multimodalidade 4 Flexibilidade 4 5 Velocidade, agilidade 4 6 Qualidade, consistência 4 7 SCM, parceria / integração 4 8 Foco, efetividade, otimização operacional 3 1 2 9 1991 1995 1996 1997 1998 2000 2001 2004 2005 2008 Citações 7 5 5 3 10 11 Mensuração Processo, aprovisionamento, seqüenciamento de pedidos, negociação, pagamentos Demanda 12 Gestão de inventário 2 13 Estratégia, mercados 2 14 Cooperação interfuncional 2 15 Requisitos-chave, Variedade 2 16 Custo total 2 3 2 No Quadro 3 as competências logísticas agrupadas estão ordenadas em ordem decrescente da quantidade de citações e conforme a cronologia em que foram abordadas. Houve o predomínio de citações sobre o serviço ao cliente, sendo também consideradas como tal as competências de facilidade, responsividade, segurança, diferenciação, personalização e posicionamento. É uma competência que se mantêm presente na quase totalidade do intervalo de tempo observado, o que ressalta a sua relevância na literatura. Informação, comunicação e tecnologia estão presentes em cinco dos dez anos em que foram analisadas obras referentes às compet6encias logísticas. O mesmo é verificado com distribuição, fluxo de produtos, unitização, transporte e multimodalidade. Presentes em quatro anos estão a flexibilidade, associada à velocidade e à agilidade, a qualidade unida à consistência, e também o conjunto gestão da cadeia de suprimentos, parceria e integração. Em três dos anos das publicações foram citadas a mensuração, o conjunto processo, aprovisionamento, seqüenciamento de pedidos, negociação e pagamentos, destacando-se como mais recentemente mencionados o foco, a efetividade e a otimização operacional. Em publicações presentes em dois anos estão demanda, gestão de inventário, estratégia e mercados, cooperação inter-funcional, requisitos-chave, variedade e custo total. Como resultados da análise, são apresentadas contribuições à construção teórica referente ao tema em questão. Poderiam ter sido incluídos ao estudo periódicos e bases de dados adicionais, propiciando maiores amplitude e aprofundamento ao tema em questão. Os resultados estimulam pesquisadores a refletirem sobre a evolução do tema tratado, buscando ampliar e aprofundar a pesquisa realizada, assim como favorecem o movimento de profissionais na direção das competências logísticas apresentadas. Referências AQUILON, M. Cultural dimensions in logistics management: a case study from the European automotive industry. Supply Chain Management: An International Journal, 2(2): 76-87, 1997. BOWERSOX, D. J.; CLOSS, D. Logística Empresarial: O processo de integração da cadeia de suprimento. São Paulo: Atlas, 2001. CAPACINO, W. C. AND F. F. BRITT. Perspectives on Global Logistics. The International Journal of Logistics Management, 2(1): 35-41, 1991. CHO, J. J.-K., J. OZMENT, et al. "Logistics capability, logistics outsourcing and firm performance in an e-commerce market." International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 31(5): 336-359, 2008. CLOSS, D. J., M. SWINK, et al. The role of information connectivity in making flexible logistics programs successful. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 27(1): 4-17, 2005. DAY, G.S. The capabilities of market-driven organizations. Journal of Marketing, 58: 37-52, 1994. DAUGHERTY, P. J. AND P. H. Pittman. Utilization of time-based strategies: Creating distribution flexibility/responsiveness. International Journal of Operations & Production Management, 15(2): 54-60, 1995. EVANS, K. The remaining need for localisation of logistics practices and services in Europe. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 30(5): 443-453, 2000. FABBE-COSTES ET JAHRE. Supply chain integration and performance: a review of the evidence. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 19(2): 130-154, 2008. GILMOUR, P. Benchmarking supply chain operations. Benchmarking: An International Journal, 5(4): 283-290, 1998. JONSSON, S. AND C. GUNNARSSON. Internet technology to achieve supply chain performance. Business Process Management Journal, 11(4): 403-417, 2005. LIN, J.-S. C. AND C.-R. CHEN. Determinants of manufacturers' selection of distributors. Supply Chain Management: An International Journal, 13(5): 356365, 2008. LOWSON, R. H. Retail Operational Strategies in Complex Supply Chains. The International Journal of Logistics Management, 12(1): 97-111, 2001. MANGAN, J. AND M. CHRISTOPHER. Management development and the supply chain manager of the future. The International Journal of Logistics Management 16(2): 178 – 191, 2005. MENTZER, J. T., S. MIN, et al. Toward a unified theory of logistics. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 34(8): 606-627, 2004. MOLLENKOPF, D. AND G. P. DAPIRAN. World-class logistics: Australia and New Zealand. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 35(1): 63-74, 2005. MORASH, E. A., C. DROGE, et al. Boundary spanning interfaces between logistics, production, marketing and new product development. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 26(8): 43-62, 1996. PRAHALAD, C. K., HAMEL, G. A Competência Essencial das Organizações. Harvad Business Review, 1990. THE GLOBAL LOGISTICS RESEARCH TEAM AT MICHIGAN STATE UNIVERSITY. World class logistics: the challenge of managing continuous change. Oak Brook, 1995. WALTERS, D. AND M. RAINBIRD. The demand chain as an integral component of the value chain. Journal of Consumer Marketing, 21(7): 465-475, 2004. WILLS, G. AND M. WILLS. Re-engineering knowledge logistics. Logistics Information Management, 10(2): 80-91, 1997. ZHANG, Q., M. A. VONDEREMBSE, et al. Logistics flexibility and its impact on customer satisfaction. The International Journal of Logistics Management, 16(1): 71-95, 2005.