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u m
o l h a r
e m
d e s l o c a m e n t o
claire denis
apresenta
u m
o l h a r
e m
d e s l o c a m e n t o
claire denis
Claire Denis,
um olhar
em deslocamento
Uma poesia brutal. O cinema de Claire Denis
reúne o lirismo e o visceral. Tanto o sangue
exagerado de “Desejo e Obsessão” (2001)
quanto a relação delicada e sensual entre
pai e filha de “35 Doses de Rum” (2008),
são combinações de realidades estranhas,
mas que se tornam familiares por meio das
sensações. ¶ O homem como um ser-em-deslocamento, inadequado ao espaço onde
se encontra, são características que nos motivaram a reunir sua obra e trazê-la ao Brasil. Seu cinema cria um outro tempo, mostra
o desconforto de quem não reconhece sua
pátria, de quem se sente sozinho em meio à
cidade, de quem tem a possibilidade de estar em qualquer lugar do mundo a qualquer
hora. ¶ Francesa criada na África colonial até
os catorze anos, já em seu longa de estréia,
“Chocolate”(1988), afirma sua diferença investigando um sentimento de culpa que tinha
quando criança. Através da relação entre uma
menina francesa frágil e um empregado africano, belo e bruto, expôs uma culpa histórica
do branco colonizador em relação ao negro.
Atenta às transformações de uma Europa reduto de imigrantes, Denis abre perspectivas
que questionam o modelo de um sujeito unificado com o impulso de capturar o multiculturalismo e a truculência da França contemporânea. A diretora percorre mistérios, transpõe
barreiras geográficas, sociais e políticas,
sem propor respostas ou nomes que cristalizem lugares ou personagens. A identidade do
homem é, afinal, fragmentada. ¶ Narrativas
que não respeitam a lógica da causalidade,
apresentam um olhar sensível aos impulsos
vitais. Os filmes de Denis buscam o que há
de mais cru e visceral no homem. É pelas
tensões corporais de esvaziamento, pelas
pulsões sexuais e gestos ambíguos, que se
realiza a comunicação com o outro, não por
vias do intelecto. Neste jogo, ela constrói
uma narrativa física que ressalta cada cena
como uma potência em si, fragmentos intensos que dão forma a um cinema que se movimenta através de sensações. ¶ Em “Bom
Trabalho” (1999), que consagrou a diretora
internacionalmente, são muitos os planos
que atravessam corpos revelando músculos
e gestos. Duros exercícios militares são retratados como um balé de força e virilidade.
Homens são como vetores em uma geometria
de formas, superfícies e volumes. A solidão
dos personagens representada pelo regime
rígido de trabalho (ironicamente em grupo),
revela um dos maiores temas da cineasta:
um corpo solitário em busca de um lugar, que
não pertence ao presente, que se transfigura, se transforma, que se arrasta à procura.
¶ Mergulhando na busca pelo desconhecido,
personagens que agem pela emoção constituem seu mais recente filme, “Minha Terra
África” (2009). A luta de uma francesa (Isabel Huppert) pela preservação da vida diante
de um estado de horror denota um corpo que
não se situa. Não sabemos o período histórico
ou em que país da África localiza-se o filme,
não importa. Importa nossa identificação com
o desconforto, o inadequado, o sentimento de
estrangeiro. Para mostrar os personagens
tentando encontrar seu lugar no mundo, a
câmera se movimenta com eles; a estética
de planos próximos, a câmera livre e solta
na mão, seguindo as silhuetas, os ombros, os
cabelos esvoaçantes que percorrem os espaços sem nome. ¶ A filmografia de Denis não
pretende criar uma dicotomia entre o mundo interior e exterior dos personagens, ambientados em um lugar aparentemente sem
fronteiras. No filme “O Intruso” (2004), baseado no livro homônimo do filósofo Jean Luc-Nancy, o protagonista viaja por três países
para buscar um transplante do coração. Sem
solução final, permanece na angústia, se movimentando sem fincar os pés, flutuando-os
solitários pelos espaços na contínua investigação pelo essencial para a vida. ¶ O cinema
de Claire Denis carrega uma curiosidade pelo
outro. Uma dimensão aberta sobre a realidade que corre o risco de não se encaixar em
nada, afirmando com isso sua simplicidade
complexa. É essa ambigüidade que nos motiva a desbravar sua obra e apresentá-la completa pela primeira vez no Brasil.
Ana Hupe, Jô Serfaty e Rafaela Arrigoni
Material,
inflamável
Há uma espécie de mistério permanente, encantatório que perpassa a filmografia de Claire Denis. Seus
filmes nos oferecem como que esfinges em movimento, que adquirem sentido, sensualidade, sensação, na medida em que existem justamente nesta
realidade do movimento. Há sempre algo que falta e
algo que excede. Lacuna e êxtase. É através da oscilação entre estes dois pontos da curva, desses dois
estados e sensações que seus filmes se embalam, se
propagam diante de nós e para além. Pois há a permanente impressão de que há mais filme para além
do visto. Há algo que falta à nossa visão daquelas
imagens, e que espalha. Seus filmes têm um aspecto gasoso que tudo envolve, encanta e erotiza, tanto
corpos quanto espaços, através de uma câmera que
soa flutuante. Todo esse processo se estrutura de forma “peristáltica”, combinando contração e distensão,
como um grande organismo, que pulsa, e daí gera sua
própria energia vital. ¶ Um desses lugares lacunares
em seu cinema é a falta de situação do espectador.
Primeiro somos arremessados dentro de um acontecimento já em curso, ou arremessados num espaço
específico que só vamos perceber mais tarde – ou
nem isso. Cada ação parece criar um novo território,
temporal, que só dura enquanto há cena e só existe
por aquela ação que está se dando ali. Há sempre
espaços pessoais, experimentados por algum ser, ou
simplesmente pelo olhar (sensação essa criada principalmente pelo magistral trabalho da fotógrafa Agnes
Godard. É notável a impressão criada pela forma com
que a câmera pulsa, sem chamar excessiva atenção
para si mesma, mas marcando a presença de algo
que tem vida ali naquele olhar). Em cada espaço, uma
relação. Nunca um lugar com nome muito definido,
próprio, maiúsculo, determinado – o exemplo maior
disso é provavelmente “Minha Terra África”: um filme
sobre a crise de um lugar sem nome. Estamos num
lugar qualquer, sem nome, mas específico, singular,
cuja singularidade se constrói na relação vital com o
que acontece nele. O destaque dado para os corpos
humanos nos seus filmes faz o espaço, os objetos, o
não-humano, ganharem status de seres vivos. O corpo se torna algo sólido, que tem densidade, massa,
superfícies. E essa relação física do olhar vai estabelecer um horizonte de indiferença entre as matérias
que estão em cena, que culminará nos momentos de
extrema erotização do não-humano, como a cafeteira
e os alimentos em “Nénnete e Boni”, o ferro de passar
em “Bom Trabalho”, os equipamentos de laboratório,
e o caminhão, em “Desejo e Obsessão”, os trens em
“35 Doses de Rum”, e uma série de outros alimentos,
que pela forma de olhar tornam-se superfície que se
avivam ao toque da câmera, como plantas dormideiras. ¶ Todo novo elemento reconfigura o todo. Nos
filmes de Claire Denis há uma atenção muito especial
à presença física do mundo em geral. Há sempre um
destaque para as partes que instaura uma relação
de autonomia, que não as isola, mas as coloca em
relação infinita. Seus intensos closes, como em “Desejo e Obsessão”, por exemplo, vão nos colocar dentro de uma rede de relações abstratas entre aquela
sucessão de elementos materiais. Nunca o conjunto
que os engloba se dá a ver. Pois este é aberto, não
se pode mostrá-lo. Essa falta de totalidade no mostrar, essa insistência no plano próximo, tele-objetivo,
parece nos querer colocar em contato direto com a
coisa. A força que brota da proximidade excessiva é
a de instaurar um regime perceptivo sensual, antes
que intelectual. O que se quer aqui é uma espécie de
observação primeira, antes do conceito, do nome da
coisa, um contato imediato com uma realidade material do mundo, e a partir daí, desse ponto, surgem
suas conexões, entre humanos, objetos, espaços, e
matérias várias. É dessa reserva de não-dito, de não
mostrado, que seus filmes ganham a força que têm.
E isso não pela metonímia, mas por essa nova configuração dessas frações que são como astros de
universo em constante expansão, em relação, mas
com seu valor individual específico, órbita própria. ¶
É possível dizer que há um “toque Denis”, literalmente.
Não apenas pelo óbvio motivo de que seus filmes se
concentram nessa realidade material, sólida, líquida e
gasosa, do mundo, e suas fricções, mas pela maneira
com que esses contatos entre superfícies geram um
ritmo, como num toque de percussão. Uma sinfonia
sem centro se constitui em seus filmes. “Desejo e
Obsessão” vai abordar este problema diretamente: o
toque e seus limites. A diferença entre o tesão e o canibalismo é questão somente de intensidade. E o máximo da mistura, do contato, é a aniquilação do outro,
é furar a pele que nos envolve e invadir a alteridade.
O toque como crise. Tudo se pressiona e causa uma
impressão posterior, toda superfície (parte) é afetada
e reconfigurada após o contato, assim como o carro
torna –se outro em “Sexta-feira à noite” e os trens do
“35 Doses de Rum”. Um cinema que opera sempre por
aproximações: tanto proximidade como comparação,
material e abstrato, colocando em contato direto, nas
superfícies, projetando seus sentidos e sensações de
maneira inextensiva, sem contornos exatos, só intensidades (que por exemplo diferenciam um beijo de um
dilaceramento). Não há unidade de medida. Cada situação pede uma nova escala de olhar, e essas aproximações nos solicitam justamente isso. ¶ Se todos seus
filmes tendem à dança, ou, no mínimo, é nessa forma
que suas obras parecem atingir um apogeu sensível,
é justamente pela sua estrutura oscilatória, pendular,
rítmica. Entretanto, a idéia de dança se expande nessas
obras. Nos instantes onde há uma música e um movimento claramente associado a esse som específico,
ritmado com alguma clareza, e razoavelmente organizado em seus intervalos, como no apoteótico final de
“Bom Trabalho”, no quarto com Gregoire Coilin em “US
go home” ou no restaurante em “35 Doses de Rum”,
há somente uma maior clareza do que se desdobra
por todo o filme. É também dança o solitário passeio
de moto em “Minha Terra África”, o tatear da massa
em “Nénette e Boni”, no sentido de que são momentos onde uma seqüência de estímulos abstratos toma
forma material no corpo humano. “Bom Trabalho” é de
fato um dos maiores momentos de sua obra e do cinema nos últimos vinte anos porque expõe e celebra esse
processo. É um filme síntese da força coreográfica e
pulsante de seu cinema, com sua veia operística, oscilando entre bustos e desertos, boites e salares. A dança
é a irrupção dessa energia sensual direta, sem nome
ou contorno, sua síntese. ¶ O balanço de sua obra é
esse escorregar para fora do quadro, uma emergência
repentina que nasce justamente da forma com que ela
nos dá a ver muitas vezes muito pouco. Cada quadro
diz tanto pelo que habita o quanto pelo que não é dado
a ver. Toda a seqüência final de “Desejo e Obsessão”
se estrutura dessa maneira, colocando os espectadores em jogo, instaurando uma espécie de flutuação
desejante (dentro e fora do filme). Há algo a ver, que
faz os corpos reagirem, e somente a realidade dessa
reação que o cinema pode oferecer: aí está sua face
gasosa. Há uma força centrífuga permanente, jogando
sempre de dentro para fora do quadro. Um cinema que
transborda, que não está nem dentro nem fora do quadro, mas na relação, entre a força manifesta no mundo material e as múltiplas conexões que essas partes
criam pela sua aproximação na montagem. Exibir os
poros, desmembrar o corpo, é escondê-lo quase que
por inteiro. Transbordar por todos os lados, lançar-se
em todas as direções indefinidamente, é propagar-se
inextensivamente, espalhar-se, expandir-se a partir da
matéria para além dela. É isso que seus quadros e roteiros realizam, proliferando lacunas e êxtases: fazem
a matéria se propagar, as intensidades penetrarem as
membranas e ultrapassarem o quadro, o campo, a película e nos transportar para esses estados sem nome,
absolutamente sensuais, em direção ao transe, ao fora
de si. É nesse lugar sem nome que jaz o encantamento
permanente que sua obra exerce, entrando sem bater,
aumentando pelo toque a temperatura e pressão do
olhar. Um cinema absolutamente corpóreo, físico, e por
isso, lascivo.
Juliano Gomes
Tensão,
energia e movimento
Os filmes de Claire Denis sempre despertaram o interesse do público frequentador de mostras e festivais
de cinema no Brasil. Mas nem sempre agradaram.
Foram clássicas as sessões lotadas de “Desejo e Obsessão” e “O Intruso” no Festival do Rio nas edições
de 2001 e 2004, respectivamente. A maior parte da
plateia saía revoltada da sala, enquanto uma meia-dúzia tentava se recompor do misto de terror e maravilhamento que havia experimentado. ¶ É fácil entender tanto a revolta de uns quanto a fascinação de
outros. “Desejo e Obsessão” e “O Intruso” são filmes
que frustram certas expectativas – ligadas às formas
hegemônicas de narração – na mesma medida em
que geram novos circuitos de afinidade espectador-filme. Em ambos, Denis constrói a atmosfera mais
do que o sentido, explora o clima e a ambientação
mais do que a história ou a trama, monta um cenário
de suspense mas descarta as convenções do thriller, instala o espectador num espaço-tempo cujas
leis não lhe são muito familiares, permitindo, a partir
desse estranhamento, reações díspares de profunda
rejeição ou de profunda adesão ao filme. Se, por um
lado, pode-se sentir falta de uma intriga a resolver
ou de uma lógica dramática a conduzir as ações, o
que Denis dá em troca, por outro, é uma inesquecível
viagem estética, uma experiência de imersão num
universo de sensações plásticas tão mais intensas
quanto menos vinculadas a significados fechados.
Ao flanar pelo mundo e esquecer o fio linear do relato, o olhar é devolvido a um prazer primordial, uma
vez que o ato de ver, em si, não organiza o espaço
de maneira narrativa/descritiva: seu movimento é
circular e inconcluso. ¶ Um filme como “O Intruso”
até oferece possibilidades de significação e permite interpretações nuançadas de seu conteúdo, mas
sua eficácia maior consiste em agitar a consciência
do espectador com infinitas hipóteses não conclusivas. Denis partilha com David Lynch o gosto pela
desorientação do espectador. A progressão narrativa,
enquanto articulação de eventos dramáticos, se troca
por uma turbulenta soma de eventos com fracas ligações causais. As relações entre os personagens são
sustentadas por informações esparsas e ambíguas.
As elipses abundam e criam buracos no filme, passagens inconclusas, ausências insondáveis. A diluição
do drama é acompanhada de uma fascinação com a
pura sensação de mobilidade. Numa montagem elíptica e pouco didática, O Intruso vai das florestas da
França a um banco na Suíça, dali para a região portuária de Pusan (Coréia do Sul), de lá para os mares do
Pacífico e então de volta para o inverno no hemisfério
norte. Um corte seco pode transportar o espectador
de uma praia ensolarada para um bosque enevado
– uma verdadeira intrusão mútua dos tempos e dos
lugares. Denis nos coloca numa situação de deslocamento e passagem constantes. A indeterminação
prevalece como princípio. Estamos apanhados nos
estágios mais confusos da percepção e não conseguimos impor forma e sentido ao caos sensível das
aparências. ¶ “Desejo e Obsessão” é uma experiência ainda mais perturbadora, porquanto acrescida de
um enorme desconforto psicológico. O personagem
de Vincent Gallo é um cientista americano que, em lua
de mel na França, persegue a camareira do hotel tal
como um vampiro à caça de sangue jovem. Flertando
com elementos do cinema de suspense/terror, o filme
aborda o magnetismo sexual, a atração instintiva dos
corpos, elaborando uma imagem limítrofe – nas cenas de canibalismo – para a mesma pulsão erótica de
que o filme seguinte de Denis, “Sexta-feira à noite”,
forneceria uma versão mais light, mais palatável. ¶
De todo modo, ela está sempre mais interessada na
existência física do homem do que em sua natureza
racional. Há um aspecto neo-primitivo no olhar de Denis, uma atração pela selvageria das coisas brutas,
pelas pulsões arcaicas. Se ela foge da narratividade,
é para dar ênfase ao físico, às formas “instintivas”, às
sensações imediatas. Seus filmes são guiados por um
Stofftrieb, um tropismo pelas qualidades primárias da
matéria. O quadro é um “campo erótico”; os filmes se
constroem num elã sensual que começa pela forma
de enquadrar e decupar as cenas. A câmera “fareja”
os personagens, passeia lentamente pelos corpos,
desliza sobre a pele dos atores. O olhar está mergulhado nas contexturas da pele, da carne, mas interessado também nas vibrações invisíveis, nas emissões
feromônicas, nas fragrâncias afrodisíacas exaladas
pelos corpos. Denis filma seres indecisos entre uma
realidade carnal e um estado vaporoso. Os enquadramentos (sempre fragmentários) e os movimentos tornam provisórios os limites entre as coisas. As formas
e os contornos se interpenetram, se misturam como
nas pinturas de Rubens. ¶ “Nénnete e Boni”, de 1996,
é um momento chave na carreira de Claire Denis, pois
é o filme em que ela aprimora o estilo de mise en
scène que já vinha lapidando nas obras anteriores.
Nesse filme composto essencialmente de primeiros
planos captados bem à flor da pele, a câmera se torna ainda mais fluida e corpórea do que em “Noites
Sem Dormir”. O plano de abertura mostra um homem
vendendo documentos falsos e dando instruções de
como usá-los a um grupo de imigrantes africanos. A
cena pareceria uma sobra de “Noites Sem Dormir,”
não fosse pelos movimentos de câmera que já apresentam essa nova maneira de filmar que “Nénette e
Boni” inaugura na obra da diretora: a câmera flutua de
um rosto a outro, o olhar gasta mais tempo que o habitual para transitar de uma porção do espaço a outra,
de um corpo a outro, como se quisesse perceber os
pequenos eventos que se escondem entre as coisas.
Trata-se de filmar a atmosfera, os gases cromáticos
que se espalham entre as formas, as moléculas de luz
que flutuam no ar. Ela registra, ao lado das ações, os
microeventos sonoros e visuais que completam nossa
percepção da realidade. ¶ Denis realiza um cinema
de corpos e formas que se deslocam, circulam, trocam energia cinética com o mundo. Mesmo no repouso, há movimento. Para ela, o mundo não faz sentido
senão na sua mobilidade. Nada é fixo e permanente,
nem mesmo a diferença entre o homem e as outras
espécies (pensar no devir-animal de seus personagens) ou entre o sonho e a realidade (real e onírico se
confundem em “O Intruso”, “Nénette e Boni”, “Bom
Trabalho”, “Desejo e Obsessão”, “Minha Terra África”.
As fronteiras – entre corpos, lugares, territórios, indivíduos – estão nubladas. Tudo é móvel. ¶ “Vejam
esse unânime movimento onde a face invisível das
formas se torna subitamente visível uma vez que elas
se agitam diante de nós, onde a arquitetura movente
das atitudes combinadas se quebra incessantemente e se reformula sem que nosso olho seja capaz
de apreender suas transições, onde os valores e os
contrastes sempre rompidos, invertidos, modificados,
restabelecidos mas constantemente solidários, agem
em todas as dimensões do drama plástico, onde tudo
se organiza ao mesmo tempo em torno de um centro
inapreensível que sentimos em todo lugar e não percebemos em parte alguma...”. Tudo isso que Élie Faure afirmou a respeito da pintura de Tintoretto se aplica
ao cinema de Claire Denis, mas com um detalhe: o
movimento, aqui, é destituído do pathos dramático e é
apresentado como simples fato enérgico, ininterrupta
vibração na epiderme do mundo. São as partículas
em agitação, os estremecimentos da terra. A imagem
que melhor resume a obra de Claire Denis é a artéria
pulsando no braço do ator Denis Lavant ao final de
“Bom Trabalho” : o que interessa à diretora, em última
análise, é aquela pulsação que indica a presença de
vida, de energia, de movimento.
Luiz Carlos Oliveira Jr.
documentÁrios
Jacques Rivette,
Le Veilleur
curtas
Com Jacques Rivette,
Serge Daney, Jean-François
Stévenin, Bulle Ogier.
França, 1990. 125 min.
Id. orig.:Fra., vídeo
Ter., 28/06, 15h // Qui., 30/06, 17h // CAIXA
Man no Run
Qui., 23/06, 17h //
Ter., 28/06, 17:20h // CAIXA
Vers Mathilde /
Towards Mathilde
Com Les Têtes brulées: André
Afata, Jean-Marie Ahanda,
Roger Be- kongo, Théodore
Epeme, Martin Maah.
França, 1989, 107 min.
Id. orig.: Fra., 35mm
França, 2004, 84 min,
cor, 35mm
Sex., 24/06, 15h // Ter., 28/06, 19h // CAIXA
Documentário sobre um dos maiores cineastas
franceses: Jacques Rivette. “O cinema de Rivette é
como uma coreografia, é uma coisa corporal, mas
que fala de uma certa força de vontade. Na verdade,
como meus filmes. Mas eu faço filmes que estão
presos aos seus corpos - como os sentimentos às
vezes estão apanhados pelos seus corpos. Os corpos
de Rivette obedecem, os meus, não.” (Claire Denis)
Documentário musical sobre a banda de Rock ‘Les
Tetes Brulees’. A Banda mistura influência de ritmos
africanos com a batida eletrônica. Em 1987, eles
eram verdadeiros pop-stars em Camarões.
Mathilde Monnier é uma das mais famosas coreográfas de dança contemporânea na França.
O documentário acompanha todo o processo criativo
de sua companhia, os aquecimentos e o o dia a dia
dos dançarinos até a apresentação final.
Vers Nancy
Com Jean-Luc Nancy, Ana
Samardzija, Alex Descas
França 2002, 35mm, PB, 11 min.
Id. Orig.: Fra
Nancy é uma cidade francesa (e cidade natal de Eric
Rohmer) e o último nome de Jean-Luc Nancy, o célebre filósofo que influenciou muito o recente trabalho
de Claire Denis. Uma combinação fascinante entre
entrevista direta e ficção, o curta é uma primeira
tentativa da diretora de se aproximar das ideias de
Nancy sobre intromissão, a relação com o outro e
uma excelente introdução ao longa “O Intruso”.
Nice very Nice
Com Grégoire Colin.
França 1995, 35mm, 10 min.
Id. Orig.: Fra.
Para o projeto À propos de Nice ,Le suite, Claire
Denis dirige Nice very Nice, um thriller que se passa
no carnaval em Nice e revela uma viagem de descoberta pelas zonas ocultas da cidade turística.
Pour Ushari Ahmed
Mahmoud, Soudan
1991, 35mm, 3’5’’ min.
Vídeoclipe da canção C’est déjà ça,do intérprete Alain
Souchon. O vídeo é parte de campanha sobre direitos
humanos da “Anistia Internacional”, dedicado a um
preso político sudanês.
La Robe À Cerceaux
França, 1992, 35 mm, 24 min.
É noite no interior de um bar, que está vazio, acabou
de fechar. Sem pressa, o dono prepara-se para sair. A
senhora faz um último café para si (com uma pinga
de whisky). Um homem começa a ler alto o texto que
escreveu no seu caderno.
Le 15 Mai
França, 1969, vídeo,31 min.
Um filme de ficção científica inspirado num conto de
Philip K. Dick, feito por Claire Denis com a colaboração de alguns estudantes do IDHEC. Um jovem
casal acorda. Ambos tiveram pesadelos. O dia passa
estranhamente e a manhã seguinte ainda é 15 de
maio. O homem tenta chegar ao limite das coisas.
A Propod D’une
Déclaration
França, 1996, vídeo, 3’45’’ min.
Um trabalho encomendado pela Fundação Cartier
sobre o tema do amor. Um negro na cama. Os pêlos
pubianos de uma mulher na banheira. Um peixe de
plástico. A mulher começa a se raspar.
Sessão de curtas - Qui., 30/06, 15h // Dom., 03.07 às 17h00 // CAIXA
DEBATES
debate com
Juliano Gomes e
Denílson Lopes
Dom., 26/06, 19:30h // CAIXA
Beau Travail / Good
Work / Bom Trabalho
França 1999. Com Denis Lavant, Michel
Subor, Grégoire Colin, 35mm, color, 93
min. Id. Orig.: Fra
O filme é um passeio coreográfico pelo
campo de treinamento da Legião Francesa,
no nordeste da costa africana. As imagens
mostram o universo repressor e os conflituosos sentimentos do sargente Gualp. Baseado
em romance de Melville.
Conversa com
Claire Denis
Dom., 03/07, 18:30h // CAIXA
longas
Seg., 27/06, 18h // MAISON DE FRANCE
Qua., 29/06, 19h // Sáb., 02/07, 19:10h // CAIXA
Chocolat /
Chocolate
J’ai pas sommeil/ I can’t sleep /
Noites sem dormir
Com Isaach de Bankolé, Giulia Boschi,
François Cluzet. Fra/Ale, 1988, 35mm,
cor, 105 min. Id. orig.: Fra
França /Suíça 1994. Com Katerina
Golubeva, Richard Courcet, Alex Descas,
35mm, cor, 110 min. Id. orig.: Fra
Uma jovem francesa retorna para Camarões, África,
onde viveu com sua família para contemplar e
relembrar a infância. A mémoria mais forte é a
do empregado Protée, um homem bonito, forte e
inteligente submetido às barreiras racias existentes
na África Colonial.
Uma jovem imigrante da Lituânia chega a Paris. Théo,
músico, espera voltar a Martinica com seu filho. Seu
irmão homossexual, Camile, canta em bares à noite,
trabalha como miché, trafica drogas e pratica assassinatos.
Denis não está interessada em criar tensão em volta dos
assassinatos, mas na cidade grande como grande mosaico
sem descanso, ao mesmo tempo anônima e íntima.
Ter., 21/06, 19h (abertura) // Sex., 24/06, 17h //
Sex., 01/07, 15:10h // CAIXA
Qua., 22/06, 17h // Sáb., 25/06, 15h // Sex., 01/07, 15h // CAIXA
Seg., 27/06, 18h // MAISON DE FRANCE
L’ Intrus / O Intruso /
The Intruder
Nénnete et Boni / Nénnete and Boni /
Nénnete e Boni
U.S. Go Home
White Material /
Minha Terra África
Com Michel Subor, Grégoire Colin,
Katia Golubeva. França/Coréia 2004,
35mm, color, 130 min. Id. orig.: Fra
Com Grégoire Colin, Alice Houri,
Vincent Gallo. Fra 1996, 35mm,
cor, 108 min. Id. orig.: Fra
Com Alice Houri, Grégoire Colin,
Jessica Tharaud
França 1994, vídeo, cor, 67 min. Id. orig: Fra
Com Isabelle Huppert, Christopher
Lambert and Isaach De Bankolé
França, 2009, 35mm, 106 min
Louis Trebor, um homem de 70 anos, mora sozinho
com seus cachorros em uma floresta entre França e
Suíça. Ele precisa de um transplante do coração e vai
até o Taiti procurar o filho que abandonou há muitos
anos. Esta viagem representa o encontro de seu
coração com um imaginário perturbador que atravessa
a mente de Louis. Baseado no livro “ O intruso” de
Jean Luc Nancy.
Nénnette e Boni foram criados separados
porque seus pais eram divorciados. Boni
trabalha em um pizzaria para um casal
intrigante quando sua irmã foge da escola
e de repente reaparece.
Um filme de uma hora sobre o tempo, encomenda da televisão
francesa para o projeto “Tous les garçons et les filles de leur
âge”, que convidou 9 diretores, incluindo Olivier Assayas e
Andre Techine. Sobre a adolescência e a música marcante
dessa época, U.S. Go Home é um filme quase autobiográfico,
um choque cultural da volta de Denis da África a Paris. U.S. Go
Home mostra a história de duas adolescentes, uma festa e as
tensões sociais e sexuais que envolvem o evento.
Em um país africano não definido e ameaçado
constantemente por rebeliões, vive Maria, mulher
branca que se nega a abandonar o local e deixar
para trás sua plantação de café. André, exmarido e pai de seu filho, teme pela vida de Maria
e passa a arquitetar um plano de fuga para a
França, sem desconfiar que não seria tão simples
quanto pensava.
Sáb., 25/06, 19h //
Sex., 01/07, 19:10h // CAIXA
Dom., 26/06, 17h //
Sáb., 02/07, 15h // CAIXA
Qua., 29/06, 15h //
Dom., 03/07, 17h // CAIXA
Qui., 23/06, às 19h //
Dom., 26/06, 15h // CAIXA
S’en fout la mort /
No Fear, no die
Trouble Every Day /
Desejo e Obsessão
Vendredi Soir / Friday Night /
Sexta-feira à noite
35 Rhums /
35 Doses de Rum
Com Alex Descas, Isaach de Bankolé,
Solveig Dommartin
France 1990, 35mm, color, 91 min. Id. orig.: Fra
Com Vincent Gallo, Tricia Vessey,
Béatrice Dalle
França 2001, 35mm, cor, 101 min. Id orig: Fra
Com Valerie Lemercier, Vincent Lindon
França 2002, 35mm, cor,
90 min. Id. Orig: Fra
França / Alemanha 2008. Com Alex Descas,
Mati Diop, Grégoire Colin, Nicole Dogué,
Ingrid Caven. 90min, 35 mm. Id. Orig.: Fra
A vida de dois irmãos imigrantes do oeste da
África no subúrbio de Paris. Confinados, eles
preparam os animais para a briga de galo no
subsolo do restaurante onde trabalham. A briga
de galo serve como símbolo da vida sórdida e
violenta destes dois irmãos.
Shane e June são um perfeito casal americano em lua de mel em Paris na tentativa de
reconstruir uma vida nova. Secretamente, Shane
começa a frequentar uma clínica médica que
trata da libido humana e se deixa levar por
perigosos impulsos sexuais.
Laure está em mudança para morar com seu namorado. Ela entra no carro e fica presa no trânsito de horas.
Mas, Laure se sente bem dentro do carro: é o único
lugar onde pode ficar só. Sem pressa, ela observa o
caos da cidade de Paris e oferece carona para um
estranho, Jean, com quem vai passar uma noite.
O filme mostra o relacionamento entre um
pai viúvo e sua jovem filha no subúrbio de
Paris, habitado principalmente por negros e
descendentes árabes. Uma referência à obra
de Ozu, “Pai e filha”.
Qui., 23/06, 15h //
Sáb., 25/06, 17:10h // CAIXA
Quin., 30/06, 19:20h //
Sáb., 02/07, 17h // CAIXA
Qua., 22/06, 15h //
Sex., 24/06, 19h // CAIXA
Qua., 22/06, 19:10h //
Qua., 29/06, 17h // CAIXA
Realização
Electra
Realização
Coordenação geral e curadoria
Ana Hupe, Juliana Serfaty e Rafaela Arrigoni
apoio
Textos
Luiz Carlos Oliveira Junior
Juliano Gomes
Projeto gráfico
Felipe Braga e Darlan Carmo (Estudioolho)
Assessoria de Imprensa
Julia Ryff
Imagem da capa
Filme “Nénnete e Boni” (1996)
[© Why not productions]
CAIXA CULTURAL
Av. Almirante Barroso, 25, Centro
(Próximo à Estação Carioca do metrô)
Tel: 21 2544-4080
Entrada: R$4,00 (inteira), R$2,00 (meia)
MAISON DE FRANCE
Av. Presidente Antonio Carlos 58, Centro
Tel: 21 3974 – 6699
www.caixa.gov.br/caixacultural
electraproducoes.com.br/clairedenis
Agradecimentos:
À Claire Denis, por toda sua obra e por ter apoiado o projeto desde que ainda era embrionário; à Caixa Cultural,
pelo patrocínio; ao Grupo Estação, à Embaixada Francesa e à Prefeitura de Porto Alegre, pelo apoio.
À Guillaume Namur, Brigitte Veyne, Catherine Faudry, Camille Lebon, Michelle Pistolesi, Luiz Eduardo Souza, Roberto
Martins, La Fémis, Fondation Cartier, Béatrice Soule, Arté France, Aliança Francesa de Porto Alegre e Marcelo Tanus por
acreditarem e apoiarem a mostra.
Ao Juliano Gomes, Marcelo Grabowsky, à Thaís Blank, Fabi Comparato, Marcella Tobelem, Lis Kogan, Eduardo
Valente, Francesca Azzi, Denílson Lopes, Amina Muniz, Guilherme Coelho, Pedro Freire, Paula Gaitán, Mariana
Kaufman e Domingos Guimaraens, pelas dicas.
patrocínio
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