TAMIRES REGINA PEDROSO RELAÇÃO DE GÊNERO

Transcrição

TAMIRES REGINA PEDROSO RELAÇÃO DE GÊNERO
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ - USJ
CURSO DE PEDAGOGIA
TAMIRES REGINA PEDROSO
RELAÇÃO DE GÊNERO: ABORDANDO AS DIFERENÇAS EM
BRINCADEIRAS ENTRE MENINOS E MENINAS
São José
Junho 2011
TAMIRES REGINA PEDROSO
RELAÇÃO DE GÊNERO: ABORDANDO AS DIFERENÇAS EM
BRINCADEIRAS ENTRE MENINOS E MENINAS
Trabalho de Conclusão de Curso elaborado com o
requisito final para a aprovação no Curso de
Pedagogia do Centro Universitário Municipal de
São José- USJ
Professora Orientadora Dr. Jaqueline A. M.
Zarbato Schmitt.
São José
Junho 2011
TAMIRES REGINA PEDROSO
RELAÇÕES DE GÊNERO: Abordando as diferenças em brincadeiras
entre Meninos e Meninas.
Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como requisito parcial para
obtenção do grau de bacharel no curso de Pedagogia do Centro Universitário
Municipal de São José – USJ avaliado pela seguinte banca examinadora:
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________
Profª. Drª. Jaqueline Zarbato Schmitt
Orientadora
USJ
___________________________________________________
Profº. Dr. Sérgio Ferreira
Membro Examinador
USJ
___________________________________________________
Profª. MSc. Roberta S. Buering
Membro Examinador
USJ
São José, 20 de Junho de 2011
Trabalho dedicado a todas as pessoas que estiveram
comigo nessa jornada de quatro anos de faculdade,
contribuindo com suas experiências e seus saberes. De
forma especial aos meninos e meninas do Colégio
Municipal Maria Luiza de Melo, do ensino Fundamental,
da turma de 2°ano vespertino. Estas, serão sempre
crianças alegres e repletas de conhecimentos a transmitir.
E também a Profa. Eni Tasca que com toda delicadeza
ajudou e orientou a realização deste da melhor forma
possível.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por estár aqui e fazer com que esse
sonho se realize.
De modo especial agradeço também aos meus pais, que desde a minha
geração me amaram muito, dando todo o carinho que eu precisava para seguir
minha vida em frente, contribuindo com a minha educação e caráter fazendo
com que me torna-se uma pessoa melhor. Obrigada por tudo! Pelos puxões de
orelha que me fizeram descobrir que vocês sempre quiseram o melhor para
mim, pelos incentivos na qual estou aqui concluindo a faculdade e também
pelas cobranças que me fizeram crescer e aprender que a vida é feita de
escolhas a qual devemos escolher o melhor caminho. ENFIM Amo vocês!!!
A minha irmã Fernanda, que agora é uma pedagoga formada e com um
grande futuro pela frente é a grande responsável pela minha formação, pois foi
a minha co-orientadora, lendo e corrigindo este trabalho. Com toda paciência
também me ajudava e explicava as matérias quando me dava uma crise
nervosa ao achar que não conseguiria passar em Estatística. Obrigada pelo
companheirismo, pelas brigas e elogios, pelos risos que me fizeram esses anos
todos tão felizes, você é a melhor irmã do MUNDO.
Ao meu querido marido Maicon, que entendeu que os meus dias de
stress era para que eu chegasse aqui, e fizesse o melhor. Obrigada pela
paciência e companheirismo que você teve quando me trancava no quarto para
estudar, não interrompendo o meu raciocínio ficava quietinho na sala para que
eu pudesse me concentrar, enfim obrigada pela sua companhia e por seu
amor.
A tia Sarita que se fez presente nos meus estágios colaborando para
que as minhas intervenções fossem as melhores possíveis emprestando livros
e dando dicas para as minhas propostas de aula.
Aos meus familiares, que de longe acompanharam a minha trajetória,
aplaudindo de pé as minhas conquista e incentivando para que eu seguisse em
frente.
Meu muito obrigado também aos meus amigos que na minha historia de
vida tiveram uma grande contribuição, com seus ensinamentos, carinhos,
2
risadas e claro pela alegria em nossas brincadeiras. Dê modo especial a minha
amiga Alexandra que sempre torceu pelo meu sucesso, e junto comigo estava
nas minhas grandes vitorias.
Professora Jaqueline, obrigada por suas aulas, tão divertidas e repletas
de saberes, por fazer das nossas orientações não só um momento de
transferência de conhecimentos mais também momentos especiais você
realmente é uma Grande educadora.
Ás Minhas colegas de sala pela convivência e pelas aprendizagens
dividas através de debates e conversas longas, de modo especial as minhas
queridas e pacientes amigas Aline, Ana, Cristiane e Elisângela que se fizeram
presentes nessa trajetória de quatro anos, obrigada pelas risadas, pelas
discussões ao realizarmos os trabalhos, pelos cafés nas casas de vocês, pelas
brigas tolas que fizeram ficarmos alguns dias sem se falar, pelos puxões de
orelha, enfim vocês sempre estarão em meu coração.
Meu muito obrigado aos professores e profissionais do curso de
Pedagogia da Universidade Municipal de São José. Somos privilegiados por
conseguir estar em uma Universidade Gratuita e principalmente por conclui-la,
cada um de vocês fazem parte da minha História.
O homem abomina tagarela
Garota caladinha ele adora
Se a mulher fica falando
O dia inteiro fofocando
Homem se zanga, diz adeus e vai
embora.
Não vá querer jogar conversa fora
Que os homens fazem de tudo pra
evitar
Sabe quem é mais querida?
É a garota retraída
E só as bem quietinhas vão casar.
RAEL(apud
LOURO;NECKEL;GOELLNER
2003,p.64)
Resumo
Esta pesquisa, intitulada: ―Relação de gênero: abordando as diferenças em
brincadeiras entre meninos e meninas‖ tem como objetivo discutir a questão de
gênero no universo da sala de aula, visando ampliar o repertório das crianças
em relação as suas vivências na escola. Realizou-se a observação participante
numa instituição de ensino pública localizado no Município de São José, para
poder verificar como meninos e meninas se relacionam com as questões de
diferenciação dos sexos feminino e masculino, bem como investigar as
discussões sobre as brincadeiras em sala de aula com a mediação dos
professores. A pesquisa enfoca a importância de trabalhar e dialogar sobre os
conceitos que envolvem as relações de gênero, sendo uma pesquisa
qualitativa explicativa.
Palavra-chave: Relações de gênero. Brincadeiras. Ambiente escolar.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Meninos e Meninas e suas relações. .................................................................. 45
Figura 2: A construção dos amigos Fernanda e William.................................................... 47
Figura 3 ―A Tristeza do Amor‖. ............................................................................................... 49
Figura 4 Brincando com meninas e meninos na sala de aula. ......................................... 52
Figura 5 Visões de meninos e meninas em relação ao mundo. ....................................... 54
Figura 6 "O príncipe Cinderelo".. ........................................................................................... 55
10
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 11
2 REFERENCIAL TEÓRICO ...................................................................................... 14
2.1 GÊNERO NAS ESCOLAS............................................................................................ 14
2.2 GÊNEROS NOS PCN´S. .............................................................................................. 17
2.3 BRINCADEIRAS E ESCOLA: DIFERENÇAS DE GÊNERO? ................................ 18
2.4 AS INTERVENÇÕES E OLHARES DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO EM
RELAÇÃO AO GÊNERO. ................................................................................................... 21
2.5 DOCÊNCIA E GÊNERO: OLHAR FEMININO OU MASCULINO NO TRABALHO
ESCOLAR? ........................................................................................................................... 25
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................................................ 27
3.1 CARACTERIZAÇÕES DA INSTITUIÇÃO .................................................................. 28
3.2 POPULAÇÕES ALVO ................................................................................................... 29
4 ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS OBTIDOS ............................................. 32
4.1. OBSERVAÇÃO ............................................................................................................. 32
4.1.1 Primeiro contato com as relações de gênero ........................................... 32
4.1.2 Por que não está brincando de futebol menino? Não gosto de futebol,
só de vôlei ............................................................................................................... 35
4.1.3 Menina também briga ................................................................................... 38
4.1.4 Respeitando as diferenças .......................................................................... 39
4.1.5 “A minha BARBIE é mais bonita que esse boneco que tu trouxe” ........ 40
4.1.6 Rosa e azul é de menino ou de menina? ................................................... 41
4.2 INTERVENÇÃO ............................................................................................................. 43
4.2.1 Iniciando o caminho com Meninos e Meninas .......................................... 43
4.2.2 Quebrando com as Diferenças. ................................................................... 45
4.2.3 A construção da História: “A tristeza do Amor” ....................................... 47
4.2.4 Brincando e descontruindo estereótipos .................................................. 50
4.2.5 Visões de Meninos e Meninas em relação ao mundo. ............................. 53
4.2.6 “O homem que pedi a mulher em casamento ele leva uma caixinha e se
ajoelha e fala que casar comigo” ......................................................................... 54
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 57
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 60
ANEXOS .................................................................................................................... 63
11
1 INTRODUÇÃO
Ao ingressar na universidade, já pensava em alguns temas para realizar
a pesquisa do Trabalho de Conclusão de Curso, no entanto, no decorrer dos
semestres, isso foi mudando. Foi então na realização do estágio que a
percepção mudou em relação ás crianças, pois percebeu-se que são
consideravelmente diferentes umas das outras e que, trazem de casa alguns
padrões seguidos pela sociedade, como por exemplo, a relação de gênero. Isto
faz com que meninos e meninas muitas vezes, não se misturem ao brincar,
bem como não realizarem tarefas em sala juntos/as. Estas situações que
ocorreram no grupo observado serviram de subsídio para a construção da
pesquisa.
Assim, o objetivo da pesquisa é discutir a questão de gênero, para
ampliar o repertório das crianças em relação às suas vivências no ambiente
escolar. Neste caso, a pesquisa visará identificar como ocorre às relações de
gênero dentro da sala de aula, levantar questionamentos referentes às
diferenças existentes entre o sexo feminino e masculino, proporcionar
momentos de diálogo e interação, ampliando seus conceitos sobre relações de
gênero, compreender a dinâmica da sala de aula, no que se refere às
diferenças.
Neste sentido, pensando a questão das diferenças de gênero em sala de
aula, encaminhou-se a problemática que norteará a pesquisa: Como as
relações de gênero são inseridas na aprendizagem de uma turma de segundo
ano?
Com base no objetivo proposto e na problemática citada acima visamos
realizar a pesquisa. É importante perceber como as questões referentes às
relações de gênero e brincadeiras são importantes de serem discutidas e
socializadas com as crianças no ambiente escolar. Um breve trecho retirado
dos ―Parâmetros Curriculares Nacionais‖ nos ajuda a pensar melhor como isto
está sendo implantado nas escolas:
A rigor, pode-se trabalhar as relações de gênero em qualquer
situação do convívio escolar. Elas se apresentam de forma nítida nas
12
relações entre alunos e nas brincadeiras diretamente ligadas a
sexualidade. Também estão presentes nas demais brincadeiras, no
modo de realizar as tarefas escolares, a organização do material de
estudo, enfim, nos comportamentos diferenciados de meninos e
meninas. Nessas situações, o professor, estando atento, pode intervir
de modo a combater as discriminações e questionar os estereótipos
associados ao gênero. BRASIL (2000,p.145).
Sabendo que meninos e meninas são sujeitos que constroem suas
próprias histórias e estando inseridos em um mundo com uma grande
diversidade cultural, faz-se necessário trazer a discussão para dentro das
escolas, buscando provocar uma reflexão em torno das concepções de
brincadeiras tidas para meninos e meninas, procurando explicitar o respeito às
diferenças existentes em relação ao gênero. Neste contexto, MEYER (apud
LOURO, 2003, p.25/26) nos mostra a importância de pesquisar e trabalhar
gênero na escola:
[...] sigo apontando que promover pesquisa na perspectiva de gênero
possibilita não só discutir e repensar nossa inserção social como
mulheres e homens e como profissionais da educação, mas pode
contribuir efetivamente, para a construção de uma sociedade mais
justa é mais igualitária não só ao que se refere ao gênero mais em
todos os seus níveis e relações.
Com base neste estudo, o estágio foi utilizado como percurso para
pesquisa. Assim, observações e intervenções foram feitas com as crianças do
(Grupo 2B) do Colégio Municipal Maria Luiza de Melo, formado por quatorze
meninos e doze meninas. Percebeu-se que alguns aspectos precisavam ser
trabalhados, principalmente no que está relacionado ao gênero, isso porque as
brincadeiras e atividades propostas pelos professores não contemplavam as
noções acerca do tema, fazendo com que meninos e meninas não se
relacionassem no cotidiano da escola e em algumas situações que serviram de
base para a construção da pesquisa. Durante as brincadeiras no recreio, na
sala de aula, na educação física e nas atividades em grupo, na qual meninos e
meninas tinham que se misturar. Vejamos alguns momentos em que um dos
meninos disse para outro:
— “tu veio de bota, isso é coisa de menina”. Evidencia-se aqui uma atitude
que revela preconceito e a visão estereotipada exercida por um dos
interlocutores.
Sendo assim, a pesquisa busca discutir a questão de gênero, ampliando
o repertório das crianças em relação às distinções entre meninas/mulher e
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meninos/homem, procurando identificar e desconstruir tabus e preconceitos
existentes dentro do ambiente escolar.
Sabendo que as relações de gênero são culturalmente construídas e
exercidas pela sociedade, percebeu-se que dentro da instituição de ensino isso
não é diferente, pois as crianças sendo do sexo feminino e masculino exercem
esse papel estereotipado em que homens e mulheres devem ser diferentes nos
seus comportamentos, sendo eles mentais ou biológicos.
Diante dos inúmeros questionamentos referentes à situação das
crianças das séries inicias é importante discutir algumas questões para que
desenvolvam o conhecimento sobre a relação de diferença entre meninos e
meninas. Seja nas atividades propostas pela professora ou até mesmo no
convívio. Como afirma BARBOSA (apud SOUZA 1989) ―gênero não quer dizer
que quando o indivíduo nasce ele se torna homem ou mulher, mas que eles se
constroem com divergentes comportamentos, poderes e até mesmo diferentes
sentimentos‖.
Com isso, trabalhar com situações que envolvam as relações de gênero
proporcionam as crianças uma desmistificação do que a sociedade considera
certo ou errado para cada sexo. É poder dizer que meninas e meninos podem
sim brincar das mesmas coisas, gostarem das mesmas cores ou possuírem
características em comum.
Assim, as questões mencionadas serão aprofundadas a partir de
referencias teóricos, além do caminho percorrido através dos procedimentos
metodológicos, bem como análises dos dados com as observações,
intervenções do assunto pressuposto.
14
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 GÊNERO NAS ESCOLAS
O conceito de gênero é denominado por SCOTT (1995) como um
elemento que se refere à organização e relação social a qual o sexo feminino e
masculino está inserido dentro da sociedade. Na qual também implica em
conhecer a cultura e a construção social que homens e mulheres se
relacionam, e sobre as diferenças que ambos os sexos trazem no decorrer da
história.
A diferenciação dos sexos Masculino e Feminino vem sendo construída
pela sociedade desde a infância. A sociedade molda as crianças nos gestos,
atitudes e nas brincadeiras, definindo normas e comportamentos diferentes
para ambos os sexos. Segundo as concepções de diferenciação de sexos, ‗os
meninos têm que ser inteligentes, corajosos e bravos. As meninas obediente,
sensíveis e generosas, pois segundo FELIPE; GUIZZO (apud FELIPE; BELLO,
2009, p.147).
A ideia de naturalização de determinados comportamentos em torno
das masculinidades e das feminilidades está amplamente incorporada
em nossa sociedade e se torna muito visível nos procedimentos
escolares. Tais comportamentos, percebidos de forma essencializada
(meninos mais agitados, agressivos, meninas são mais meigas,
passivas, meninos devem gostar de determinadas coisa, meninas de
outras), estão pautados por relações de poder entre os sexos desde a
infância.
Assim, percebe-se que as relações de gênero instauradas na sociedade
e na cultura se apresentam e se reproduzem no ambiente escolar. Pois,
segundo LOURO (1997, p. 61), ―gestos e movimentos, sentidos são produzidos
no espaço escolar e incorporados por meninos e meninas, tornando-se parte
dos seus corpos‖.
A própria escola reproduz a desigualdade, muitas vezes, separando as
meninas e meninos das brincadeiras e atividades dentro da escola, impondo
limites e regras para essas crianças, definindo o que ambas devem fazer
conforme seu sexo. A escola há muito tempo trouxe a diferenciação entre os
ricos dos pobres, isso porque distinguia os espaços de circulação de quem era
15
de família nobre e de quem não era dividindo internamente por mecanismos de
poder como: hierarquização, classificação e ordenamento, além de separar os
meninos das meninas. Conforme LOURO (1997, p.57):
Ela se incumbiu de separar os sujeitos - tornando aqueles que nela
entravam distintos dos outros, os que a ela não tinham acesso. A
escola que nós foi legada pela sociedade ocidental moderna
começou por separar adultos de crianças, católicos de protestantes.
Ela também se fez diferente para ricos e pobres e ela imediatamente
separou os meninos das meninas
No espaço escolar, percebe-se como se constituem os sujeitos.
Observando como as meninas e meninos se relacionam se expressam e se
comunicam de diferentes maneiras, pois existem padrões estabelecidos pela
sociedade a qual devem seguir. Segundo LOURO, (1997, p.61), ―o modelo de
sentar e andar, as formas de colocar cadernos e canetas, pés e mãos
acabariam por produzir um corpo escolarizado, distinguindo o menino ou a
menina que ―passara pelos bancos escolares‖‖.
As relações de gênero acabam gerando, por parte da sociedade, certa
discriminação e preconceito devido alguns comportamentos que possuem.
Dentro do ambiente escolar existem meninos que gostam de brincar junto com
as meninas, da mesma forma com que as meninas queiram participar da
brincadeira dos meninos, o que muitas vezes é considerado constrangedor
pelo grupo escolar. E então, percebe-se que as crianças realizam ―piadinhas‖.
Como expõe FINCO ( 2003, p.89):
[...] meninos e meninas demonstram comportamentos, preferências
competências, atribuídos de personalidade mais apropriados para o
seu sexo, seguindo, desde bem pequenas, as normas e padrões
estabelecidos.
Cabe aqui ressaltar que não só a escola, assim como outros meios
sociais, na qual estamos inseridos, como a igreja, família e mídia, intervêm
diretamente nas relações de gênero, por meio dos discursos que impõe regras
e maneiras que meninos e meninas devem estabelecer no convívio social.
Como expõe BUJES (apud FELIPE; BELLO, 2009, p.149).
[...] é importante lembrar que não só a escola, mas várias outras
instancias sócias, tais como a família, a igreja, a mídia, costumam,
por meio de seus discursos, aprisionar, controlar, regular os sujeitos,
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subjetivando-os a partir de disciplinamentos que são próprios da
cultura na qual estão inseridos.
Convém lembrar, que não só a escola, mas também as famílias devem
trabalhar com as crianças alguns conceitos que estão relacionados à relação
de gênero, como meninas brincar somente com bonecas e brincadeiras que
não tenham bagunça, pois a menina já tem o estereotipo de ser calma e
carinhosa, e já para os meninos brincadeiras e brinquedos, mas agitados e
barulhentos. Como afirma CAMARGO; RIBEIRO (1999, p. 107).
Muitas vezes, as tarefas dos mesmos sexos entre as crianças não
deixam espaço para a possibilidade que meninos e meninas têm de
experimentar brincadeiras e atividades diferenciadas estereotipias
sexuais: ser menino pressupõe atividade, firmeza, impulsividade,
curiosidade e papéis de liderança; ser menina pressupõe
passividade, docilidade, obediência, preocupação com o bem estar
dos outros, ajuda incondicional.
Desta
forma,
percebe-se
que
a
família
passa
a
conduzir
o
comportamento desses indivíduos no decorrer da infância, pois coloca a
menina nos afazeres domésticos e impõe que o menino deve comportar-se de
forma impulsiva mostrando o seu lado ―macho‖ em cima das mulheres. Além de
influenciar as atividades rotineiras das crianças colocando-os em relações
diferenciadas, como não andar juntos e nem estar nas mesmas brincadeiras,
pois são dois modos de se comportar incompatíveis, ainda que, algumas
vezes, essas relações não sejam seguidas e concretizadas pelas crianças.
Como coloca RIBEIRO ( 2006, p. 156,157):
O comportamento infantil passa a ser adestrado logo nas primeiras
idades, mas se intensifica quando chega a faixa etária dos 7 aos 14
anos, sobretudo em relação ao corpo e conduta das meninas. Quanto
mais cedo melhor para as crianças não só observarem as práticas de
seus genitores, mas para incorporarem as idealizações e
representações transmitidas pelas gerações mais velhas. Ainda que
todos se considerem parentes em algum grau, há uma preocupação
constante na comunidade com as fofocas que podem comprometer a
conduta adequada e a sexualidade de meninos e meninas.
Sendo assim, o ambiente escolar é um lugar em que as relações de
gênero estão sempre presentes. Os educadores precisam proporcionar
momentos onde as crianças possam sozinhas se descobrir, e juntamente com
isso aprendam a conviver com as inúmeras diferenças existentes.
17
2.2 GÊNEROS NOS PCN.
O volume 10 dos PCN‘S (Parâmetros Curriculares Nacionais) apresenta
as relações de gênero, no bloco intitulado: Corpo e orientação sexual, e o seu
objetivo é promover diálogos em que se mostre o papel em que o homem e a
mulher estão inseridos na sociedade. Sendo eles de discriminação ou até
mesmo nos seus comportamentos estereotipados pelos seus relacionamentos
e vivências exercidas dentro da cultura padrão que a sociedade estabelece.
Como mostra no PCN:
Ao tratar do tema orientação sexual, busca-se considerar a
sexualidade com algo inerente a vida e a saúde, que se expressa
desde cedo no ser humano. Engloba o papel social do homem e da
mulher, o respeito por si e pelo outro, as discriminações e os
estereótipos atribuídos e vivenciados em seus relacionamentos, o
avanço da AIDS e da gravidez indesejada a adolescência, entre
outros, que são problemas atuais e preocupantes. (BRASIL, 2000,
p.107).
As relações de gênero nas escolas estão em processo de romper com
as diferenças existentes entre os sexos, ou seja, mostrar para as crianças que
essa relação pode ser desmistificada, e que cada um tem o seu jeito de ser,
pois estamos em uma sociedade que está repleta de diversidade, seja ela no
sexo, raça ou etnia.
Segundo o Parâmetros Curriculares Nacionais ( BRASIL, 2000, p.144) ―o
conceito de gênero diz respeito ao conjunto das representações sociais e
culturais construídas a partir da diferença biológica dos sexos‖
Desta maneira, as discussões que os PCN´S trazem para as relações de
gênero no ambiente escolar, têm como princípio trabalhar e combater as
relações autoritárias referentes a papéis estabelecidos para homens e
mulheres, que estão presentes nas brincadeiras e nas relações entre as
crianças. BRASIL (2000, p.144):
A discussão sobre relações de gênero tem como objetivo combater
relações autoritárias, questionar a rigidez dos padrões de conduta
estabelecidos para homens e mulheres e apontar para a sua
transformação. A flexibilidade dos padrões visa permitir a expressão
de potencialidades existentes em cada ser humano que são
dificultadas pelos estereótipos de gênero.
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Portanto, convivemos em uma sociedade que de certa forma nos
impõem normas do que é certo e errado. Que denominam atitudes que são
atribuídas ao sexo masculino e feminino, que de certa forma acabam
interferindo nas atitudes e gestos das pessoas, inclusive das crianças. Como
apresenta o PCN (BRASIL, 2000, P.118):
A Construção do que é pertencer a um ou outro sexo se dá pelo
tratamento diferenciado para meninos e meninas, inclusive nas
expressões diretamente ligadas a sexualidade e pelos padrões
socialmente estabelecidos de feminino e masculino. Esses padrões
são oriundos das representações sociais e culturais construídas a
partir das diferenças biológicas dos sexos e transmitidas pela
educação, o que atualmente recebe a denominação de relações de
gênero.
É importante ressaltar que ―cada sociedade cria conjunto de regras que
constituem parâmetros fundamentais para o comportamento sexual de cada
individuo‖ (BRASIL, 2000, p.117) o que de certa forma acaba limitando nossas
atitudes, gestos e comportamentos.
Contudo, entende-se que a escola por ser responsável em transmitir o
conhecimento precisa discutir e alertar os seus alunos, alguns tabus e
preconceitos existentes dentro da sociedade, para que os educandos consigam
formar sua própria opinião a respeito desses assuntos pertinentes há anos na
sociedade.
2.3 BRINCADEIRAS E ESCOLA: DIFERENÇAS DE GÊNERO?
As brincadeiras das crianças vêm sendo moldadas e observadas
levando a diferenciação do sexo feminino e masculino e fazendo com que as
crianças internalizem alguns rótulos e padrões culturais desde a mais tenra
idade.
Muitas vezes exige-se que as crianças sigam alguns valores e conceitos
pela sociedade e ao ingressar na escola isso não é diferente, pois as crianças
se deparam com o preconceito de certas pessoas ao escolherem determinadas
brincadeiras que culturalmente já estão enraizadas em nossos costumes e
comportamentos.
Pode-se perceber que as diferenças entre meninos e meninas nas
brincadeiras se dão pelo fato que a cultura social intervém diretamente entre as
19
crianças, ou seja, essa cultura é inserida e cultivada pela educação dos pais,
passada de geração a geração. Como diz FINCO ( s.d, p.1):
"Desde o berço, as atitudes, as palavras, os brinquedos, os livros
procuram moldar as crianças para que aceitem e assumam os rótulos
que a sociedade lhes reservou. Para os homens o público e a política,
para as mulheres o privado e a casa. Dos meninos espera-se
agressividade, capacidade de liderança, racionalidade. Das meninas
espera-se delicadeza, sensibilidade e beleza".
Desta
maneira,
percebe-se
que
algumas
crianças
do
Ensino
Fundamental já estão influenciadas pela visão dos adultos, pois sem perceber
cometem pequenos preconceitos com os colegas. Quando os mesmos, sendo
eles meninos, desejam brincar ou se misturarem com as meninas, e a mesma
coisa acontecem com as meninas ao querer participar das brincadeiras dos
meninos. Esse comportamento da criança se dá pelo contexto social em que
estão inseridas.
A partir das observações, pode-se perceber que algumas brincadeiras
ainda levam a diferença e o distanciamento de meninos e meninas ao brincar,
pois a boneca, o pular elástico1, o pular cordas para alguns é exclusividade
para as meninas, muitas vezes não permitindo aos meninos experimentar
essas brincadeiras. Assim também, como carrinho, pião e skate são
brincadeiras ditas como apropriados para os meninos, fazendo com que as
meninas não desfrutarem do brincar. Como FINCO ( s.d, p.13) expõe:
A transgressão em relação à utilização dos brinquedos considerados
―certos‖ e ―errados‖ para cada sexo foi observada em vários
momentos de brincadeira. Os meninos e meninas brincam de tudo
que lhes dê prazer: de bola, de boneca, de empinar pipa, de carrinho,
de casinha.
Esses comportamentos acabam gerando um conflito entre meninos e
meninas, por achar que alguns brinquedos não fazem parte das expectativas
que adultos têm em relação ao seu sexo, e por sua vez as crianças
internalizam que esse ou aquele brinquedo não é adequado para suas
brincadeiras.
1
Pular Elástico é uma brincadeira que é feito com elástico de roupa, na qual duas crianças ficam em pé,
frente a frente, colocando o elástico em volta dos tornozelos, formando um retângulo, um terceiro
participante faz uma sequência de saltos, pulando para dentro, sobre e para fora do elástico, o objetivo
é
fazer
tudo
sem
tropeçar,
aumentando
o
grau
de
dificuldade.
http://vidadeprofa.blogspot.com/2009/04/brincadeira-pular-elastico.html
20
Alguns adultos tentam limitar as brincadeiras das crianças, esquecendo
que algumas dessas brincadeiras podem ajudar meninos e meninas na vida
adulta, pois se o menino brincar de boneca isso pode acarretar a um bom papel
de pai na vida adulta, isso também pode acontecer com as meninas se elas
brincarem de carrinho podendo ao crescer serem boas motoristas. Como
expõe: (MAGLIA; MELO, 2010, p.s):
"Limitar as brincadeiras das crianças, privando-as de alguns tipos de
brinquedos, é também limitar sua experimentação e aprendizado. As
brincadeiras são um ensaio para a vida adulta. Ou ninguém aqui
conhece um engenheiro que adorava construir casinhas na arvore ou
um ator estreou tendo como palco um guarda roupas vazio?"
As brincadeiras podem auxiliar na vida adulta das crianças, dependendo
da maneira que são encaminhadas. As experimentações de algumas
brincadeiras fazem com que as crianças comparem seus brinquedos com a
vida real imitando seus pais em seus comportamentos cotidianos e rotineiros.
As brincadeiras de grupo como o esconde-esconde, pega-pega e
futebol, fazem com que as crianças consigam compreender que possuem
papéis sociais e de gênero diferentes no transcorrer das mesmas, sendo que
isso ocorre por estarem em constante interação.
Na instituição em que realizou-se a análise, as brincadeiras são
importantes para a construção da identidade de gênero, pois ao brincar as
crianças conseguem ir além da realidade. Vivem um mundo de fantasia e
imaginações vão criando outras utilidades para o brinquedo ou para
brincadeira, ou seja, se a brincadeira é satisfatória eles não deixam de brincar
por ser de menino ou de menina. Como diz Brougère (apud LEITE 2002, p.67).
[...]a brincadeira é uma mutação do sentido, da realidade: as coisas
tornam-se outras. É um espaço à margem da vida comum, que
obedece a regras criadas pela circunstância. Os objetos, no caso,
podem ser diferentes daquilo que aparentam.
Com isso, entende-se que é nas brincadeiras que meninos e meninas
conseguem viver experiências e experimentar papéis de sexos diferentes,
quebrando com padrões e estereótipos estabelecidos pela cultura em que
vivem.
21
2.4 AS INTERVENÇÕES E OLHARES DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO
EM RELAÇÃO AO GÊNERO.
Sabendo que existem relações de gênero no ambiente escolar, percebeuse a importância de trabalhar esse tema e de observar alguns conceitos que os
educadores vêm trabalhando para melhor compreender essas diferenças de
menino e menina. Ou seja, a relação de gênero está presente nas atividades e
nos trabalhos feitos na sala de aula com as inter-relações das crianças por
grupo.
O educador deve apontar para as crianças que existem diferenças
devidas o seu sexo, que somos diferentes e que cada um tem o seu jeito de
ser, uns são mais rápidos de aprender, outros são melhor no esporte, e assim,
trabalhar o respeito e a diversidade que envolve a sociedade.
Muitas vezes, a instituição de ensino reforça e orienta os educandos de
forma sutil em relação ao gênero, desempenho e habilidades mais adequada
para seu sexo, manipulando expectativas para essas crianças.
Alguns profissionais da educação demonstram ter pouco interesse em
trabalhar as questões referentes à relação de gênero presente no cotidiano
escolar, pois alguns não percebem ou até mesmo não querem ver as
diferenças e desigualdades presentes em sala de aula entre as meninas e os
meninos. Nesta concepção, percebe-se que ainda existem educadores que
desenvolvem atividades diferenciadas para ambos os sexos, diante disso,
LOURO (1997, p.73) afirma que:
[...] muitos professores atuam ainda hoje com uma expectativa de
interesses e desempenhos distintos entre seus grupos de estudantes.
A ideia de que mulheres são fisicamente menos capazes do que os
homens possivelmente ainda é aceita.
Diante dessa concepção devemos proporcionar para as crianças
situações, que de certa forma desmistifique essas situações, que homem e
mulher possuem atividades distintas.
Desenvolver trabalhos pedagógicos que ―possibilitem a criança falar
sobre as relações de abrir um canal para a construção dos seus
conhecimentos, por meio da mediação da educadora, utilizando-se musicas,
histórias, poemas, filmes.‖ (CAMARGO; RIBEIRO, 1998, p.108).
22
Fazendo com que as crianças entendam que meninos e meninas
possuem sim algumas diferenças, mas que estas não impedem que possam
gostar das mesmas brincadeiras ou das mesmas coisas. Que meninas são
responsáveis pelo os serviços domésticos e meninos pelo serviço mais pesado.
Que os homens são fortes e não choram, e mulheres são mais frágeis e
delicadas, o que por fim acaba limitando suas atitudes e comportamento
perante determinadas situações. Como mostra RAGO (apud CAMARGO;
RIBEIRO 1998, p.107):
[...] a negociação entre os gêneros é fundamental não só para a
construção de um novo pacto ético, mas para a própria construção e
um ser humano menos fragmentado entre um lado supostamente
masculino, ativo e racional e outro feminino passivo e emocional. A
superação da lógica binária contida na proposta da analise relacional
do gênero, nesta direção, é fundamental para que se construa um
novo olhar aberto às diferenças.
Sendo assim, como ressalta CAMARGO e RIBEIRO (1998, p. 90) ―a
tarefa do educador e da educadora é abrir para a criança aspectos
inexplorados do mundo e dela mesma. Em vez de classificar as crianças, dar
oportunidade para que se desenvolvam segundo sua possibilidade.‖ Nesta
concepção, CAMARGO e RIBEIRO (1998, p.51) afirmam que:
As educadoras e os educadores, nesse movimento da transformação
social, necessitam de espaço para processar, entender, tomar
consciência da mudança, da diversidade, da multidimensionalidade
que estão implícitas no processo de educar.
O processo pedagógico deve de certa forma, proporcionar aos alunos
momentos em que os mesmos consigam compreender as diferenças existentes
dentro do ambiente escolar. No qual, o educador interfira nesse processo,
através das suas aulas, que podem e devem ser exploradas de diversas
maneiras, seja em um ciclo de conversas, utilizar livros literários, dinâmicas em
grupo ou propor outras atividades em que as relações de gênero se façam
presentes. É através dessa interferência que o educador realiza, que pode-se
diminuir os atritos existentes na turma. Isso por que: BRASIL (2000, p.146):
A proposição, por parte do professor, de momentos de convivência e
de trabalho com alunos de ambos os sexos pode ajudar a diminuir a
hostilidade entre eles, além de propiciar observações, descobertas e
23
tolerâncias das diferenças. Essa convivência, mesmo quando vivida
de forma conflituosa, é também facilitadora dessas relações, pois
oferece oportunidades concretas para o questionamento dos
estereótipos associados ao gênero.
Portanto, devemos proporcionar para as crianças um lugar onde possa
se expressar, se descobrir e saciar suas curiosidades, sanar suas dúvidas,
como da mesma forma também aprendam a lidar com as diferenças existentes
dentro do ambiente escolar como na sociedade em um todo. Como define
(CAMARGO; RIBEIRO, 1998, p.78):
Existe o desejo de experimentar, por exemplo, a maquiagem, mas os
meninos não os fazem porque é coisas de menina. Uma questão é o
exercício de esquema do ―mesmo sexo‖ no qual meninos e meninas
testam o ―ser homem‖ e o ―ser mulher‖ e outra é a possibilidade de
conviver com pessoas diferentes e brincadeiras diferente.
Ao abordar a relação de gênero na escola, geralmente percebe-se que é
dado à disciplina de educação física o papel de fazer o diálogo sobre corpo,
sexualidade, etc. Porém, estas questões estão vinculadas à biologia,
apontando para a ordem biológica na qual se faz presente na separação dos
homens e das mulheres. Em algumas vezes, percebe-se que há uma maneira
de
diferenciar
as
atividades,
fazendo
assim,
com
que
se
tenham
questionamentos sobre as diferenças de habilidades físicas entre menino e
menina.
Deste modo, entende-se que a educação física é um espaço em que são
mais frequentes, as diferenças das relações de gênero dentro da escola, por
ser uma disciplina que vincula questões de diferentes habilidades físicas entre
os sexos. Como expõe LOURO (1997, p.72), ―Se em algumas áreas escolares
a constituição da identidade de gênero parece, muitas vezes, ser feita através
dos discursos implícitos, nas aulas de educação física esse processo é
geralmente mais explicito e evidente‖.
Na escola e até mesmo em casa se o menino não gosta de futebol, ele é
visto por alguns como ―bichinha‖ porque para eles é obrigado o menino gostar
de futebol que é um esporte que exige força física. Para LOURO (1997, p. 75)
[..]gostar de futebol é considerado quase uma ―obrigação‖ para qualquer garoto
―normal‖ e ―sadio‖.
Na infância, os próprios pais compram bolas de presente para os
24
meninos para que eles, desde pequenos, já gostem do futebol, Bonecas e
loucinhas para as meninas para que elas já desempenhem o gosto pelos
afazeres domésticos, estimulando a criança a exercer esse papel e
comportamento pré-estabelecido na fase adulta.
Pode-se perceber que as expectativas de comportamentos e gestos dos
meninos e meninas são diferenciadas, conforme suas práticas e convívio no
dia a dia, ou seja, quando se tem na sala de aula algo para ajeitar depois dos
trabalhos a educadora solicita para a menina, e quando se tem algum objeto
para ser carregado exigindo força, a educadora logo pedi para o menino, pois
essas são características esperadas para cada sexo, seja ele feminino ou
masculino. Como expõe FINCO (s.d, p.3):
É necessário olhar mais atentamente e perceber como as
características físicas e os comportamentos esperados para os
meninos e para as meninas podem ser reforçados, de forma
inconsciente, nos pequenos gestos e práticas do dia-a-dia da
Educação Infantil. A forma como a professora conversa com a
menina, elogiando sua meiguice, ou quando justifica a atividade sem
capricho do menino; o fato de pedir para uma menina a tarefa de
ajudar na limpeza da sala e ao menino para carregar algo; a forma
como o adulto separa um conflito, defendendo e protegendo a menina
da agressividade dos meninos — tudo isso torna possível perceber
como as expectativas são diferenciadas para as meninas e os
meninos. O que é valorizado para a menina não é valorizado para o
menino e vice-versa.
Algumas atividades escolares separam meninos e meninas por gêneros,
isso acontece na maioria das vezes nos grupos de trabalho, nas gincanas, em
atividades que exigem divisão dos grupos. Como expõe LOURO (1997, p.79):
A separação de meninos e meninas é, então muitas vezes,
estimulada pelas atividades escolares, que dividem grupos de estudo
ou que propõem competições. Ela também é provocada, por
exemplo, nas brincadeiras que ridicularizam garoto, chamando-o de
―menininha‖, ou nas perseguições de bandos de meninas por bandos
de garotos.
Os educadores ao presenciar alguma brincadeira onde o menino ou a
menina estejam brincando com papéis distintos do seu sexo, deve deixar que
essa relação aconteça de forma livre, pois as crianças estão buscando a todo o
momento novos prazeres e curiosidades.
Cabe salientar ainda que os educadores precisam estar atentos a
pequenos indícios que os alunos mostram na convivência um com o outro em
25
relação às questões de gênero, seja na brincadeira, atividades e até mesmo no
espaço escolar, devem está preparados para desconstruir essas práticas
sexistas presente na cultura.
2.5 DOCÊNCIA E GÊNERO: OLHAR FEMININO OU MASCULINO NO
TRABALHO ESCOLAR?
A escola é historicamente é um espaço feminino, por ter relações e
pratica que se assemelham ao meio familiar, como afetividade, carinho e
compreensão. Buscando nas mulheres semelhança ao lar, tarefas essas
tradicionalmente exercidas pelas mulheres. Como LOURO (1997, p.88): [...] a
escola é feminina, porque é, primordialmente um lugar de atuação de mulheres
_ elas organizam e ocupam o espaço, elas são as professoras; a atividade
escolar é marcada pelo cuidado, pela vigilância e pela educação, tarefas
tradicionalmente femininas.
Há também, quem diga que a escola é masculina, pois os instrumentos
de conhecimento foram historicamente criados pelo homem, como os livros os
mapas e os métodos de investigação a linguagem. Conforme LOURO (1997,
p.89)[...] a escola é masculina, pois ali se lida, fundamentalmente com o
conhecimento _ e esse conhecimento foi historicamente produzido pelos
homens.
Portanto, percebe-se que as crianças desde a tenra idade têm na escola
a constituição e cruzamento das relações de gêneros. Como expõe LOURO
(1997 p.89) ―O que fica evidentemente, sem dúvida, é que a escola é
atravessada pelos gêneros; é impossível pensar sobre a instituição sem que se
lance mão das reflexões sobre as construções sociais e culturais de
masculinos e femininos‖.
Acreditamos que as professoras tiveram várias representações na
história. Um desses momentos foi quando eram associadas às solteiras ou
―tias‖, por exigir uma doação e por se tratar de um trabalho fora do lar e de
modo a não atrapalhar essas atividades de amor, vigilância, e dedicação.
LOURO (1997,p.100) mostra que as educadoras também tem sua formação
marcada pelo gênero, pois as ―Professoras foram vistas, em diferentes
momentos, como solteironas ou ―tias‖, como gentis normalistas, habilidosas
26
alfabetizadoras, modelos de virtude, trabalhadoras da educação‖.
Fugindo do tradicionalismo, professores e professoras estão a todo o
momento buscando novas concepções para a educação. O que faz surgir
novas ideias e conhecimentos, ou seja, os professores de hoje estão em busca
de um caráter critico e profissional.
Segundo LOURO (1997, p.108) ―Construindo formas organizativas
novas, professores e professoras passam a se constituir diversamente,
afastando-se, em parte, do caráter sacerdotal da atividade e buscando dar a
essa atividade uma marca mais política e profissional‖.
Desde modo, fica visível que não importa ser professor ou professora,
pois ambos têm competência para exercer a função de educador, sendo que
não é o sexo que vai definir a capacidade de cada um.
27
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Na construção da pesquisa, visou-se abordar a relação de gênero na
escola, buscando investigar as discussões sobre as brincadeiras entre meninos
e meninas em sala de aula e a mediação dos/as professores/as.
Para tal, utilizou-se o caminho metodológico envolvendo a pesquisa
qualitativa explicativa. Buscando em GIL (2009, 28-29) as denominações para
tal caminho metodológico ele ―[...] identifica os fatores que determinam ou que
contribuem para a ocorrência dos fenômenos. Este aprofunda o conhecimento
da realidade, porque explica a razão, o porquê das coisas. Por isso mesmo é o
tipo mais complexo e delicado [...]‖.
Para realizar a pesquisa de campo, utilizou-se as observações em sala
de aula, durante os meses de agosto a outubro de dois mil e dez, com o intuito
de identificar como ocorre às relações de gênero dentro do cotidiano escolar.
Além de levantar questionamentos referentes às diferenças existentes em
relação aos sexos femininos e masculinos. Assim, visou-se compreender a
dinâmica da sala de aula, no que se refere às diferenças, bem como ampliar o
repertório das crianças em relação as suas vivências no ambiente escolar. De
acordo com GIL (2009 p.57):
[...] é a de que no estudo de campo estuda-se um único grupo ou
comunidade em termos de sua estrutura social, ou seja, ressaltado a
interação de seus componentes. Assim, o estudo de campo tende a
utilizar muito mais técnicas de observação do que de interrogação.
A observação participante deve ser realizada com o intuito de descrever
através do olhar do pesquisador as nuances do cotidiano. Sendo que uma das
vantagens do estudo de campo é possibilitar o pesquisador aprofundar suas
questões propostas. Através do estudo de campo é possível entender os
procedimentos diários instaurados na escola, as formas de relação entre
professores e alunos.
Assim, através das observações relatou-se detalhadamente o cotidiano
da sala de aula, os discursos da professora e as diferenças existentes no
convívio das crianças em grupo. Como afirma GIL (2009, p.103):
28
A observação participante, ou observação ativa, consiste na
participação real do conhecimento na vida da comunidade, do grupo
ou de uma situação determinada. Neste caso, o observador assume,
pelo menos até certo ponto, o papel de um membro do grupo. Daí por
que se pode definir observação participante como técnica pela qual
se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior
dele mesmo.
A observação participante faz com que consigamos realizar a pesquisa,
com o intuito de perceber como as crianças se relacionam dentro da instituição
de ensino.
Contudo, este estudo representa o inicio de um trabalho gratificante e
complexo ao mesmo tempo, pois diz respeito às relações de gênero. E a visão
docente das educadoras como forma de desmistificar e provocar nos
educandos uma visão crítica para quebrar alguns padrões em que estamos
inseridos dentro da sociedade e consequentemente os resultados a serem
alcançados.
Isso representa nas Instituições de Ensino o bem estar das crianças no
convívio e nas brincadeiras realizadas entre eles, bem como o melhor preparo
das educadoras ao realizar atividades que consistam um bom relacionamento
entre as meninas e meninos. Como por exemplo: ao dividir a turma para
realizar as atividades, sendo elas em grupo de meninos e meninas juntos, para
que não aconteça a separação por eles mesmos.
3.1 CARACTERIZAÇÕES DA INSTITUIÇÃO
O Colégio Municipal Maria Luiza de Melo, situado na Rua José Ferminio
Novaes, s/nº - Kobrasol – São José, foi fundado em 12 de novembro de 1988,
porém só iniciou suas atividades em 1989. Tinha como finalidade atender aos
anseios da comunidade em ter uma escola pública com garantia de um ensino
de qualidade. Recebeu este nome em homenagem a mãe do então prefeito da
época, Germano João Vieira. Maria Luiza de Melo (1889 – 1934) ―foi uma
mulher à frente de seu tempo‖. Culta, moralmente correta e muito voltada às
questões religiosas, tinha uma preocupação especial com o desenvolvimento
cultural e educacional de seus filhos e das crianças da comunidade. Pode ser
considerado um exemplo de força e determinação, uma grande heroína da
educação.
29
O principal objetivo da instituição é proporcionar ao educando a
formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como
elemento de autorrealização e preparo para o exercício consciente da
cidadania, oferecendo educação de qualidade para todos.
Um dos diferenciais do colégio é o desenvolvimento de projetos culturais
e esportivos extraclasses (dança, judô, basquete, capoeira e futsal e coral
―Vozes do Amanhã‖ iniciado em maio de 2004). Estes despertam os interesses
dos alunos e ajudam a criar o gosto pelo esporte e a responsabilidade. Desde
julho de 2008, foi reorganizada a Banda Marcial do colégio o que empolgou
bastante à comunidade escolar.
3.2 POPULAÇÕES ALVO
A observação ocorreu no Colégio Municipal Maria Luiza de Melo, na
turma do 2° ano do Ensino fundamental do período vespertino que são crianças
que possuem entre sete e nove anos. A sala de aula é dividida em doze
meninas e quatorze meninos totalizando vinte e seis crianças.
Através da
produção do estágio, interagiu-se com as crianças, percebendo suas
características, seus gostos, as divisões ou não nas brincadeiras. Isso
possibilitou ampliar a análise porque instaurou-se um maior contato com as
crianças.
Na definição da pesquisa, percebeu-se o quanto foi importante estar em
sala com as crianças, o que favoreceu a observação do comportamento e das
relações de gênero. As crianças ficavam agitadas em alguns momentos da
aula, geralmente quando a professora desenvolvia atividades em grupo, eles
tinham que sair das suas carteiras e juntar-se com os colegas. Observou-se
também que eles foram carinhosos e participativos, pois no decorrer das
observações ao chegar à sala, logo vinham cumprimentar-me e abraçar-me.
A sala possui apenas uma professora regente, que permanece o tempo
todo com as crianças, ela procura fazer atividades que desenvolvam a
percepção das crianças, o bom comportamento na vida cotidiana, focando
todos os dias que, eles devem respeitar as diferenças das pessoas. Também
desenvolve atividade em grupo fazendo com que os que têm mais facilidade de
aprender ensinem os que tinham dificuldade, visando inserir o respeito ao
30
próximo e também mostrando para os alunos que cada um tem o seu tempo de
aprender, que somos diferentes.
O espaço da sala estava compreendido por mesas e carteiras incluindo
a mesa da professora na frente do quadro, uma televisão, um ventilador, um
armário, um calendário, um mural com desenhos do grupo e uma mesa no final
da sala com livros de histórias.
Assim, fora realizado a observação na referida instituição, a partir do
estágio Curricular Obrigatório de Pedagogia, sobe orientação da Profa. Roberta
S. Buehring.
Através, das observações em sala de aula, constatou-se que o grupo
que estava sendo observado era consideravelmente separado pelas relações
de gênero entre meninas e meninos. Pois os mesmos não se misturam ao
fazer atividades e até mesmo não se juntavam nas brincadeiras feitas na
educação física e recreio. No final da aula a professora propunha aos alunos o
jogo do silêncio, em que cada criança deveria estar bem quietinha e
comportada. No decorrer da brincadeira para que fosse escolhido pelo amigo
que estava no centro da sala para ir embora junto com ele, e assim até bater o
sinal. Então aconteceu a seguinte situação:
H fala para P, tem que ser um menino e uma menina, você só
escolhe menina, agora tem que escolher um menino, porque é uma
vez uma menina e um menino. (OBSERVAÇÃO 24/08/2010)
Considerando isso, verificou-se que deveria ser realizado algo que
desmistificassem esse estereótipo que por eles não era percebido.
Contudo, notou-se a importância de trabalhar as relações de gênero
dentro do ambiente escolar, retratando as diferenças de acordo com os
interesses demonstrados pelas crianças em seu cotidiano.
A proposta para as intervenções em sala de aula partiu das observações
feitas no cotidiano. Assim, parte da reflexão de que cores, como o rosa e o
azul, bem como carrinho e a boneca pode ser sim, utilizadas e experimentadas
nas brincadeiras das crianças, ou seja, fazer com que as crianças internalizem
que esses padrões não definem o que é ser menino ou menina. Nesse sentido,
FINCO (s.a p.13) coloca que:
Os meninos e meninas brincam de tudo que lhes dê prazer: de bola,
31
de boneca, de empinar pipa, de carrinho, de casinha. Ao brincar com
todos os brinquedos que desejam, não deixam que idéias, costumes
e hábitos, que já faziam parte da educação de meninos e meninas na
primeira metade do século XIX (Felipe, 2000), limitem suas formas de
conhecer e vivenciar o mundo, determinando o que devem ser, o que
devem pensar e que espaços devem ocupar.
Desta forma, notou-se que meninas e meninos ao experimentarem
algumas brincadeiras que lhe dê prazer, como por exemplo, carrinho, boneca
ou pipa, não se deixem influenciar e se limitarem ao brincar, pois quando estão
fazendo o que gostam deixam estereótipos de lado e se entregam ao prazer da
brincadeira.
A apresentação deste trabalho é, portanto, uma forma de reforçar e
esclarecer a importância que as relações de gênero existem dentro da
instituição de ensino, pois meninos e meninas a todo o momento entram em
conflitos. Acham que seus sexos não devem se misturar em brincadeiras e
atividades que determinam o agrupamento entre eles. É preciso que os
educadores busquem nas atividades propostas em sala de aula, trabalhar e
desmistificar alguns conceitos pertinentes em relação ao gênero.
32
4 ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS OBTIDOS
Nesse capítulo serão apresentados os resultados obtidos na pesquisa,
sendo eles os dados coletados durante o período de observação de campo, em
uma instituição pública no município de São José.
Estes resultados são descritos, com o auxílio do registro de observação
de campo de estágio, no qual foi elemento importante na pesquisa, fornecendo
subsídios para a realização da mesma. Foi realizada no período de agosto á
outubro de 2010, na turma de 2° ano vespertino, do Ensino Fundamental do
Colégio Municipal Maria Luiza de Melo. A intenção era inserir na prática
educativa, a discussão sobre as relações de gênero na escola bem como
analisar as brincadeiras que envolvam os sexos feminino e masculino.
As discussões que seguem acerca da análise dos resultados estão
divididas em dois capítulos, sendo eles de observação e intervenção no campo.
No primeiro subcapítulo, será abordado o primeiro contato com as relações de
gênero:
Por que não está brincando de futebol menino? Não gosto de futebol, só
de vôlei, menina também briga, respeitando as diferenças, ―A minha BARBIE é
mais bonita que esse boneco que tu trouxe‖ e Rosa e azul é de menino ou de
menina?.
Já no segundo subcapítulo, será abordado iniciando o caminho com
Meninos e Meninas, quebrando com as Diferenças, a construção da História:
―A tristeza do Amor‖, brincando e descontruindo estereótipos, visões de
Meninos e Meninas em relação ao mundo, ―O homem que pede a mulher em
casamento ele leva uma caixinha e se ajoelha e fala que casar comigo‖.
4.1. OBSERVAÇÃO
4.1.1 Primeiro contato com as relações de gênero
Ao primeiro contato com a turma, notou-se que as crianças aguardavam
as educadoras no pátio em fila de meninos e meninas, mais tinham algumas
crianças que ficavam dispersos se misturando com outros colegas de outras
turmas. A presença da professora fez com que as crianças se comportassem,
33
numa postura retraída, pois os mais tagarelas ficaram quietinhos com a
presença da mesma.
No primeiro dia de observação, com uma sala mista, de quatorze
meninos e doze meninas, ambos sentavam separados em filas. Era um grupo
bem agitado. As crianças não paravam de falar, queriam saber o porquê de eu
estar ali.
Apresentei-me para o grupo e sentei-me no fundo da sala para
observar e ter as primeiras interações com as crianças, bem como me
familiarizar com a rotina do grupo.
No grupo de alunos, havia uma menina que ficava perambulando pela
sala, cheia de livros. Então, resolveu mostra-me alguns deles, eram vários
livros de histórias infantis, mas no meio daqueles livros, um era em especial,
chamado, ―menina não entra‖, mostrava homens usando roupas de mulheres e
mulheres usando roupas de homens.
Essa menina percebeu esse fato e foi
logo falando:
—―olha aqui o homem vestindo roupa de mulher e a mulher vestindo
roupa de homem, se ele vestir vai virar mulher”.
Nota-se na fala da menina que esses conceitos que mostram como
mulheres e homens devem ser portar na sociedade também são percebidos
pelas crianças, ou seja, esta representação do mundo social é absorvida pela
criança desde quando é bem pequena, às vezes, sem perceber, já está
desenvolvendo esses comportamentos, na qual a construção de papéis
femininos e masculinos se dá pelos padrões e regras estabelecidas na
sociedade. Nesse sentido LOURO ( 1997, p. 23-24 ) nos mostra:
A característica fundamentalmente social e relacional do conceito não
deve, no entanto, levar a pensá-lo como se referindo às construções
de papéis masculinos e femininos. Papéis seriam, basicamente,
padrões ou regras arbitrarias que uma sociedade estabelece para os
seus membros e definem seus, suas roupas, seus modos de se
relacionar e de se portar... Através do aprendizado de papéis cada
um/a deveria conhecer o que é adequado (e inadequado) para um
homem e uma mulher numa determinada sociedade e responder a
essas expectativas. Ainda que utilizada por muitos/as, essa
concepção pode se mostrar redutora ou simplista.
As crianças daquela sala eram bastante diferentes, como ―os
quietinhos‖,
―os
bagunceiros‖,
―as
estudiosas‖,
―as
faladeiras‖,
―os
homenzinhos‖ que por sinal já tinham ―namoradinhas‖ ,bem como meninas
34
―vaidosas‖ com cadernos da Hello Kitty2, mochilas da Barbie3, penal da Marie4
entre outros objetos usados pelas meninas, que por sinal são estipulados pela
sociedade influenciada pela mídia.
Deste modo, podemos dizer que os meios de comunicação ao utilizar
meninas para divulgar marcas de bonecas, bolsas, maquiagens, e meninos
para divulgar carrinhos, bicicletas, bolas, inserem o discurso camufladamente,
padronizando relações culturais e sociais na qual as representações de
comportamentos femininos e masculino se apresentam estereotipadas.
Assim, percebe-se que a mídia tem grande influência nas questões
relacionadas ao gênero, pois está a todo momento repassando as pessoas
modos de proceder, como o que comprar, o que vestir, o que comer, direcionar
padrões estéticos e de beleza. Tendo grande poder, inserem padrões de
diferenciação estipulando objetos e roupas para ambos os sexos. Como afirma
SABAT (apud LOURO; NECKEL E GOELLNER, 2003, p. 154).
Se, ainda que inicialmente, lançarmos um olhar comparativo aos
anúncios publicitários que nos são apresentados diariamente através
da mídia, observamos que eles estão marcados por representações
acerca das relações de gênero, apresentando sexualidades, modos
de comportamento, tipos de corpos, diferentes estilos de vida.
Retomando a observação, a professora propôs aos alunos uma
brincadeira do silêncio, justamente porque as crianças daquele grupo eram
muito agitadas. Esse jogo tinha o objetivo de a criança escolher um colega que
estivesse quieto para ir embora e assim sucessivamente. Quando as meninas
estavam no comando da brincadeira, só escolhiam meninas, isso também
acontecia com os meninos. Assim, essas diferenças se apresentavam no
cotidiano da sala, de forma com que meninos e meninas não se misturem
2
A Hello Kitty foi criada pelo designer da Sanrio, Yuko Shimizu, em 1974. Nasceu em pequenos artigos
para garotas e consequentemente se desenvolveu também da mesma forma. A Sanrio lança todos os
anos uma série de artigos com a Hello Kitty, incluindo bolsas, cadernos, agendas, fichários, bijuterias,
adesivos e muitos mais. http://dicionario.sensagent.com.
3
A Barbie foi criada por Ruth Handler e o seu marido Elliot em 1959, que tinham uma filha de nome
Barbara. Observavam Barbara que brincava apenas com bonecas bebês quando criança. A garota era
apaixonada por bonecas. Quando cresceu, já pré-adolescente, seu pai observou que Barbara ainda
brincava com as suas bonecas. Então, a sua mãe, Ruth Handler, teve a ideia de criar uma boneca
adolescente. http://pt.wikipedia.org.
4
Marie é uma personagem do filme Os Aristogatos. Ela é uma gatinha branca peluda, que é o filho do
meio de Duquesa e irmã mais velha de Berlioz e da irmã mais nova de Toulouse. Marie tem um
revestimento macio branco e olhos azuis. Ela tem um laço cor de rosa amarrado no pescoço, e outro
,menor laço rosa na cabeça entre as orelhas. http://translate.google.com.br
35
formando grupos e amizades de ambos os sexos. Entretanto, há as meninas
que se acertam melhor com os meninos. Mas nesse grupo somente uma
menina se dava bem com menino.
Desta forma fica visível que as crianças daquele grupo apresentam
diferenciações pelas posturas das relações de gênero e, sem perceber,
mantêm comportamentos, costumes e hábitos na qual deixam suas relações de
amizade e brincadeiras marcadas pela presença de estereótipos mantidos pela
sociedade e cultura em que estão inseridos. Segundo LOURO (1997, p.63),
isto se dá porque:
São, pois, as práticas rotineiras e comuns, os gestos e as palavras
banalizados que precisam se tornar alvos de atenção renovada, de
questionamento e, em especial, de desconfiança. A tarefa mais
urgente talvez seja exatamente essa: desconfiar do que é tomado
como ―natural‖.
Afinal, é ―natural‖ que meninos e meninas se separem na escola, para
os trabalhos de grupos e para as filas? É preciso aceitar que
―naturalmente‖ a escolha dos brinquedos seja diferenciada segundo o
sexo?
Logo, não basta professores inserir nos seus discursos a igualdade de
gênero entre meninos e meninas como uma ―realidade‖, mas sim refletir sobre
as práticas que estamos realizando para que a diferença seja respeitada no
ambiente escolar, bem como observar as diferentes formas que as crianças
têm em ser e agir, sendo nas brincadeiras e atividades rotineiras comuns do
cotidiano.
4.1.2 Por que não está brincando de futebol, menino? Não gosto de
futebol, só de vôlei
Ao dia vinte e quatro do mês de agosto de dois mil e dez, fui recebida no
campo de observação pela professora regente, assim me apresentei-me para o
grupo. A professora propôs que as crianças se apresentassem o que mostrou
que as crianças são muito participativas e carinhosas, pois logo que cheguei
receberam-me com ―oi, beijos e abraços‖.
Durante a observação constatou-se, que a sala estava com as carteiras
organizadas em grupos, em que os meninos sentavam com meninos e
meninas com meninas, não havia interação entre eles. Em seguida, verificouse que esse agrupamento se deu pela amizade que eles têm, pois ao fazer às
36
atividades as meninas conversam sobre alguns desenhos que viram na
televisão e os meninos já conversam sobre outras coisas como novos jogos
para videogame e um desenho chamado super- onze5 que conta a história de
Endou um menino apaixonado por futebol.
Observou-se, porém que no recreio as distinções de gênero se faziam
mais presentes. Meninos se destacam nesses momentos brincando com
brincadeiras como pega-pega, lutinha, garrafão. Já as meninas, ficavam mais
quietinhas algumas ficavam conversando outras levavam brinquedos como
bonecas, figurinhas de personagens de desenhos, pulavam corda e brincavam
de amarelinha. Logo, não posso deixar de explicitar também a agitação de
algumas meninas no recreio, pois elas brincam de correr com os meninos,
mostrando que nem todas as meninas são quietinhas e comportadas. Nesse
contexto, AUAD (2003, p.11) nos mostra como meninos e meninas se
diferenciam no recreio:
Ocupação diferenciada de pátios e quadra pelos meninos e meninas.
Isso ocorria no recreio, quando os meninos ocupavam dois pátios e
uma quadra para jogarem futebol. Quanto às meninas, estas
ocupavam os cantos laterais do pátio, ao pularem elástico, corda e ao
conversarem. Existiam jogos mistos, mas vale notar que os meninos
sempre estavam em todos os jogos de movimento, ao passo que as
únicas atividades do recreio que não implicavam corrida e amplos
movimentos, como passear e conversar, eram desempenhadas
apenas por meninas.
Além disso, deparei-me com tentativas de meninas participarem das
brincadeiras de meninos, no qual os mesmos se achavam donos do espaço e
das brincadeiras, não deixando as meninas participarem alegando que elas
podiam machucar-se. Entretanto também se notou que alguns meninos não
gostavam de correr e até mesmo jogar futebol.
Cabe então pensar, que essas relações mantêm estereótipo social, pois
esses comportamentos de controle dos meninos sobre as meninas é algo que
transcende nos olhares da sociedade, pois se espera das crianças algumas
5
Super onze é um desenho que passa na programação da Rede TV, que conta a história do personagem
Endou “goleiro” que é o neto de um dos maiores goleiros do Japão e está em busca de amigos para
formar o melhor time de futebol já existente. http://www.jogosonlinegratis.org/jogosonline/jogos-dosuper-onze.
37
habilidades, e que por sinal são diferentes. Logo, FINCO (2010, p. 126)
esclarece:
Os significados de gênero-habilidades, identidades e modos de ser –
são socialmente configurados, impressos no corpo de meninos e
meninas de acordo com as expectativas de uma determinada
sociedade. Se, por um lado, é possível observar o controle da
agressividade na menina, o menino sofre processo semelhante, mas
em outra direção: nele são bloqueadas expressões de sentimentos
como ternura, sensibilidade e carinho.
Após o recreio, fomos para a sala de aula. Com a chegada da
professora de educação física, as crianças ficaram eufóricas, queriam terminar
de copiar a matéria para logo descer para o pátio. Ao irem para o pátio as
crianças mudam o comportamento e logo saem correndo, ficam gritando.
Percebeu-se que ficam mais a vontade sem a presença da educadora.
A professora deixou livre a educação física, logo os meninos pegaram a
bola e foram jogar futebol, bem como as meninas pegaram o bambolê, corda e
foram brincar. Em seguida, observou-se um menino tentando brincar com as
meninas, mas fora ignorado. Foi então quando perguntou-se á ele:
Por que não está brincando de futebol? E ele falou: não gosto de
futebol, só de vôlei. A menina que estava do meu lado escutou a
pergunta e logo falou no meu ouvido: ele é assim mesmo só que ficar
com as meninas, parece ser bichinha. (OBSERVAÇÃO, 24/08/2010)
Desta maneira, ficou claro que, há entre as crianças a utilização de
discursos, estereotipados em relação ao que deve ser brincadeira, ação de
menina e menino, e que elas muitas vezes, reproduzem o discurso de
separação de gênero, imposto na sociedade. Nesse sentido FINCO (2010,
p.125) coloca:
Meninos e meninas desenvolvem seus comportamentos e
potencialidades a fim de corresponder às expectativas de um modo
singular e unívoco de masculinidade e de feminilidade em nossa
sociedade. Muitas vezes instituições como família, creches e préescolas orientam e reforçam habilidades específicas para cada sexo,
transmitindo expectativas quanto ao tipo de desempenho intelectual
considerado ―mais adequado‖, manipulando recompensas e sanções
sempre que tais expectativas são ou não satisfeitas.
Sendo assim, a escola junto com a família, deve buscar desenvolver
diálogos com as crianças para quebrar com tabus em relação às expectativas
38
para os sexos femininos e masculinos, ou seja, possibilitar que meninos e
meninas se orientem da maneira que se sentirem melhor.
4.1.3 Menina também briga
Ao dia vinte e seis do mês de agosto de dois mil e dez, diferente dos
outros dias as crianças foram para a biblioteca, pois estavam fazendo um
projeto de troca de livros. Assim, quando chegamos à biblioteca tinha uma
mesa cheia de livro na qual as crianças tinham que trocar o seu livro antigo por
um novo. Observou-se que os meninos só pegavam livros que tinham homens
como personagem principal, e principalmente quando esse era Herói. Já as
meninas se encantavam por quaisquer livros, sendo eles com personagens
masculinos ou femininos, não davam preferência.
No entanto, observou-se que algumas meninas davam preferência aos
livros com histórias de fadas, príncipes e princesas, como por exemplo, A
cinderela, Rapunzel, A bela adormecida, entre outras histórias que sigam essa
linha de conto.
Ao ir para o recreio, deparei-me com uma cena nada normal, uma
menina e um menino se batendo, o menino puxava o cabelo da menina até no
chão. Após a chamada de atenção dos mesmos, a menina bem tranquila, fala
assim:
—―ele tá merecendo essa lição prof porque ele é muito folgado só sabe
brigar com os outros‖,
E o menino foi saindo de perto como se nada tivesse acontecido.
Esperou-se que a menina fosse chorar, por pensar que ela é mais frágil que o
menino, mas isso não aconteceu. Então, quem chorou foi o garotinho, que
estava muito nervoso, pois estava com medo de levarmos a diretora. Como
expõe RIBEIRO, SALGUEIRO:
Pode ser que encontremos meninos mais valentes e corajosos. E
outros menos valentes, só com um pouquinho de coragem. RIBEIRO;
SALGUEIRO (1990 p16-17.)
Algumas pessoas pensam que ser menina significa ser fraquinha, não
saber nem brigar. Engano. Existe muita menina valente e brigona – e
ela não deixa de ser menina por isso. Assim como muitos meninos se
defendem, brigando, muitas meninas têm que se defender .
RIBEIRO;SALGUEIRO (1990,p.42).
39
Assim, novamente a questão de gênero se faz presente na hora do
recreio, pois se esperam do sexo feminino docilidade, fragilidade e meiguice,
bem como nunca se espera que uma menina entre numa briga, pois para o
comportamento feminino isso não é adequado. Entretanto, há meninos
medrosos, e dos meninos se espera bravura e coragem. Dessa forma, iremos
encontrar esses comportamentos de pessoa para pessoa, e não por ser
menina ou menino.
4.1.4 Respeitando as diferenças
Ao dia trinta do mês de agosto de dois mil e dez, ao chegar à sala de
aula como sempre fui recebida pelas crianças com muita alegria. Logo que
passou a agitação das crianças com a nossa presença, a professora da sala
começou um debate com as crianças lembrando um fato que ocorreu com a
aluna P. no dia anterior na aula de educação física, em que alguns colegas a
chamaram de ―lerda‖, fazendo a menina chorar, e ficar muito triste com o
acontecido.
No diálogo, a professora falava sobre algumas questões abordando as
diferenças, bem como o respeito aos outros, mostrando para as crianças que
cada um tem o seu tempo de aprender, uns são mais rápidos outros mais
lentos. Nesse sentido o PCN´S afirma:
O discernimento é indispensável, de maneira particular, quando
ocorrem situações de discriminação no cotidiano da escola. Enfrentar
adequadamente o ocorrido significa tanto não escapar para evasivas
quando não resvalar para o tom de acusação. Se o professor se cala,
ou trata do ocorrido de maneira ambígua, estará reforçando o
problema social; se acusado, pode criar sofrimento, rancor e
ressentimento. Assim, discernir o ocorrido, no convívio, é tratar com
firmeza a ação discriminatória, esclarecendo o que é o respeito
mútuo, como se pratica a solidariedade, buscando alguma atividade
que possa exemplificar o que diz, com algo que faça, junto com seus
alunos. (BRASIL, 2000, p.55)
Assim, essa visão da professora com as questões de diferenças nos faz
pensar que deveríamos falar com as crianças no decorrer de cada dia, não
somente quando essas situações ocorrerem, pois se trabalharmos essas
questões com meninos e meninas os mesmos respeitaram os colegas, bem
como todas as pessoas que estiverem ao seu redor.
40
Logo, depois da conversa a professora começou a passar o conteúdo
que estava previsto para o dia, no qual seria trabalhada a matemática.
Colocou algumas contas no quadro para os alunos resolverem, foi então que
se observou que alguns apresentavam dificuldades em responder. A
professora colocou aqueles que já sabiam fazer com os que tinham
dificuldades.
Notou-se que a professora colocou os meninos para ajudar meninos e,
meninas para ajudar meninas, e depois foi ao fundo da sala falar conosco, no
qual foi perguntado o porquê ela colocou meninos juntos com meninos e
meninas juntas com meninas, para realizar á atividade, e ela logo respondeu:
_“é porque eles já são amiguinhos facilita a comunicação e
aprendizagem entre eles”.
No entanto, sem perceber a professora criou situações em que as
crianças se organizam de forma diferenciada, ou seja, possibilitando a criação
de grupos distintos de meninos e meninas. É importante que o educador tome
cuidado com essas questões, pois o comportamento do educador pode
influenciar os alunos, bem como incentivar ainda, mas a diferença entre os
sexos.
4.1.5 “A minha BARBIE é mais bonita que esse boneco que tu trouxe”
Ao dia dois do mês de setembro de dois mil e dez, ao chegar à sala de
aula, constatou-se algo diferente, pois a professora da sala deixou os alunos
trazer brinquedos de suas casas, para ter uma aula diferenciada, ou seja,
naquele dia eles poderiam brincar com os seus próprios brinquedos.
Observou-se quando as crianças começaram a pegar os brinquedos das
suas mochilas, os meninos trouxeram carrinhos, bolinha de gude, figurinhas,
bola, e bonecos de Super-Heróis como, por exemplo: Batman, Super-Homem,
Max stell entre outros. Já as meninas trouxeram BARBIE, Boneca, loucinha e
elástico.
Ao longo das brincadeiras com os brinquedos trazidos pelas crianças,
escutou-se uma das meninas falando para um dos meninos assim:
41
—―A minha BARBIE é mais bonita que esse boneco que tu trouxe” e na
mesma hora o menino respondeu “não tem graça essas bonecas, prefiro o meu
boneco forte e corajoso”.
Esse momento fez-me refletir sobre os conceitos que a cultura coloca
em relação aos brinquedos tidos para meninos e meninas, fazendo com que as
crianças reproduzem com os próprios instrumentos de brincar, práticas sociais
de distinções e desigualdades de gênero. Como afirma RAEL ( apud LOURO
1998, p.87):
São múltiplas as praticas sociais, as instituições e os discursos que
cercam os sujeitos, produzindo e reproduzindo identidades,
produzindo e reproduzindo diferenças, distinções e desigualdades.
Desta forma, sabemos que esses brinquedos na maioria das vezes são
vistos na televisão pelas crianças, no qual os mesmos seguem a risca o que
está na moda, pedindo para seus pais brinquedos relacionados ao seu sexo,
reproduzindo assim comportamentos influenciados pela mídia. A Televisão faz
vários programas direcionados para crianças e jovens, como afirma ROCHA
(apud TEIXEIRA 2010, p.59):
A TV é um dos principais meios de entretenimento da população
brasileira. Praticamente todos os lares têm televisão. E são vários os
programas, direcionados para vários públicos: novelas, telejornais,
desenhos animados, filmes.
Pode-se dizer então, que o educador ao trabalhar com o dia do
brinquedo, deve propor para meninos e meninas contato com outros
instrumentos do brincar que não sejam usados por eles no seu cotidiano, da
mesma forma considerar que as crianças possuem alguns conceitos
estabelecidos pela sociedade em relação ao brinquedo, e então mediar
questões de diferenciação com essas crianças.
4.1.6 Rosa e azul é de menino ou de menina?
Ao dia quinze do mês de setembro de dois mil e dez, fui recebida pelas
crianças com uma grande agitação, pois queriam falar da programação que
teria na escola, na qual seria passado um filme no auditório para todas as
crianças. Em seguida, a professora disponibilizou um desenho de um urso
articulando, no qual as crianças tinham que pintar e montar o urso em uma
42
folha branca, quem terminasse deveria inventar um nome para o urso e fazer
uma frase com as características do ursinho.
Verificou-se que nesta atividade as crianças obtiveram concentração e
criatividade para forma frases, bem como observou-se que ao pintar os
meninos usavam as cores com um tom, mas forte como, por exemplo: marrom,
azul marinho, verde e preto. Já as meninas, pintavam os ursinhos de cor rosa,
de amarelo, laranja, vermelho e roxo. Dessa maneira fica claro que as cores
também são influenciadas pela cultura que prega que o rosa é de menina e
azul de menino, pois ao nascermos os pais já escolhem as cores para o
enxoval em relação ao sexo da criança. Nesse sentido CARVALHO; COSTA;
MELO (2008 p.4) coloca:
De fato, numa sociedade/cultura organizada por relações de sexo e
gênero, o enxoval cor de rosa ou azul, a escolha do nome e as
expectativas dos adultos já atribuem o gênero de uma criança mesmo
antes do nascimento.
Ao perguntar para uma das meninas da sala o porquê ela estava
pintando o ursinho de rosa a mesma respondeu:
—“fica mais bonito de rosa prof, porque pintar a blusa de azul é feio não
combina”.
No entanto quando eles estavam pintando, notou-se que os meninos e
meninas se privaram ao escolher as cores que gostam. Pode ser, talvez porque
escutam nas suas casas e até em rodinha de amizades que rosa é de menina
e azul é de menino.
Após o termino da atividade as crianças foram para o auditório, assistir
ao filme caçador de dragões disponibilizado pela direção para todos os alunos
das séries inicias. No decorrer do filme, notou-se que as crianças estavam
agitadas por estarem sem a presença da professora regente, que estava em
uma reunião com a direção do colégio. E quando estava no auditório observouse que as meninas ficaram distantes dos meninos, porque os meninos faziam
muita bagunça e isso as deixava bem chateadas, pois elas queriam assistir ao
filme.
43
4.2 INTERVENÇÃO
4.2.1 Iniciando o caminho com Meninos e Meninas
Ao dia dezesseis do mês de setembro de dois mil e dez, começou o
primeiro dia de intervenção, no qual estávamos repletas de expectativas para
esse momento, pois a turma se mostrava com grande ansiedade para começar
dar aula.
Então, iniciou-se a intervenção com uma breve conversa com o grupo
expondo que a partir daquele dia, seriam dadas algumas aulas e que o tema a
ser trabalhado seria relação de gênero. Salientou-se com as crianças que esse
tema se deu a partir das observações, nos dias que estava presente em sala
de aula. As crianças ficaram bem alegres e empolgadas com as propostas que
estava apresentando, GP falou “até que enfim você vai da aula”.
Desta forma, pediu-se para o grupo sentar em roda e, após a
acomodação de todos, iniciou-se a leitura do livro ―O Menino Nito‖6 da autora
Sonia Rosa (1995), que contava a história de um menino que tinha medo de
chorar, pois seu pai sempre falou que homem não chora, e por sempre pensar
nessas palavras que seu pai dizia, guardou o choro e ficou doente. Então parou
no hospital. O médico logo descobriu por que o menino Nito estava quieto. Era
choro engolido. Falou para ele que a partir daquele dia deveria chorar. Depois
disso, o menino Nito, pôs-se a chorar dias e dias fazendo um riacho com o seu
choro.
No meio da leitura as crianças interrompiam fazendo perguntas como: o
que vai acontecer com o menino Nito? Menino chora. As crianças se
mostravam bem concentradas na leitura. Ao término da leitura do livro fizemos
a socialização com as crianças, pedindo para elas falarem o que entenderam e
se tinha alguém parecido com o menino Nito da história. Todos queriam
responder, foi aquele alvoroço. As falas mais recorrentes por parte dos
meninos foram “quando a minha mãe me coloca de castigo eu choro” ou
“quando eu me machuco eu choro” já as falas das meninas foram “todo mundo
chora”.
6
ROSA, Sonia. O menino Nito. Pallas 1995.
44
Durante ao diálogo, discutimos com as crianças outros conceitos que se
relacionam com essas diferenças, como se azul e de menina ou de menino, e
muitos responderam que é dos dois, as brincadeiras de menino e menina
também foram perguntados e as crianças responderam que pular corda e
boneca é de menina, já futebol e pião é de menino. Logo, finalizamos
indagando as crianças, se choramos apenas quando estamos tristes ou com
raiva, foi então quando o B respondeu:
— ―meu pai chora quando tá triste e alegre” e a R também falou “minha
mãe chora quando está cortando cebola, e ela não tá triste”.
Com isso, percebeu-se que a conversa em roda foi proveitosa para as
crianças, pois alguns pontos desse diálogo chamaram a atenção, como os
aspectos relacionados aos comportamentos, os brinquedos e brincadeiras de
meninos e meninas bem como as tarefas, sentimentos e vestuários das
crianças observadas.
Depois do diálogo sobre o livro, uma atividade foi feita. As crianças
tinham que colocar nas colunas o tipo de vestuário que os meninos e meninas
usam. Depois que todos terminaram cada um foi no quadro colocar nas
colunas a demonstração da atividade, destacando os vestuários que eles
achavam que seria de menino e menina.
Notou-se que os meninos colocaram nas colunas das meninas os
seguintes vestuários: saia, calcinha, casaco, brinco, vestido, tênis, short, arco,
cinto, blusa e óculos. Já as meninas, colocaram nas colunas dos meninos:
casaco, cueca, boné, tênis, blusa, calça, cinto e short.
Essa atividade também mostrou que eles colocaram alguns vestuários
somente para cada sexo como calcinha, brinco somente as meninas usam e
cueca, boné somente os meninos.
Desta forma ficou evidente que nessa primeira intervenção meninos e
meninas ainda estão muito ligados pelas diferenças e relações de gênero
existentes entre os sexos, expondo a todo o momento nas suas falas os seus
diferentes pensamentos e conceitos em relação as suas vivências do dia a dia.
45
Figura 1: Meninos e Meninas e suas relações.
FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 16/09/2020).
Entende-se que o educador ao trabalhar com as relações de gênero,
deve proporcionar aos educandos, exercícios e atividades de forma lúdica,
partindo de questões presentes no seu dia-a-dia, onde assim a compreensão
se torna mais fácil e coerente, além de usar de estratégias, desenvolvendo
trabalhos em grupos na quais meninos e meninas possam juntos perceber as
diferenças e assim desmistificar alguns padrões que a sociedade impõe.
4.2.2 Quebrando com as Diferenças.
Ao dia vinte e um do mês de setembro de dois mil e dez, iniciou-se a
aula conversando com as crianças sobre o que faríamos naquele dia, pediu-se
para que eles se dividissem por sexo para aplicar a atividade, ficando os
meninos de um lado da sala e as meninas do outro. As crianças se mostraram
entusiasmadas para o começo da atividade.
Dessa maneira, a intenção dessa atividade, não é separar as crianças
por sexo e sim discutir as diferenças com o grupo, fazendo com que meninas e
meninos demostrem nos bonecos seus conceitos e visões que têm em relação
ao outro sexo, seja ele feminino ou masculino.
Logo, quando estava todos em seus devidos lugares meninos de um
lado e meninas de outro fizemos uma votação na qual uma menina e um
menino de cada grupo ficavam deitados no papel pardo para os colegas copiar
o seu corpo para depois montar com as características de ambos os sexos. Os
46
meninos ficaram responsáveis em criar uma menina e as meninas em criar os
meninos. No desenvolver da atividade surgiram varias sugestões e dicas das
crianças para montar os bonecos, como a:
— “tem colocar nas bochechas das meninas aquela coisinha rosa” P
“Não vamos colocar short no boneco porque vai ficar parecido com as
meninas”.
Enquanto
indagávamos
a
as
crianças
respeito
das
estavam
confeccionando
diferenças
entre
os
bonecos
meninos/homens
e
meninas/mulheres, apontando para algumas questões relevantes que na
maioria das vezes mantêm estereótipos nas falas das crianças como algumas
falas que se deram no decorrer da atividade:
—“menina tem cabelo comprido e menino não”, “menino usa azul” e
“menino têm pelo no rosto a minha não”.
Através da atividade, notou-se que as crianças carregam a visão
―adultocêntrica‖, que faz com que internalizem alguns conceitos e padrões
vistos pelos adultos, como na construção dos bonecos, isso porque os meninos
colocaram na boneca das meninas saia curta, sapato alto, Baton, brinco, unhas
da mão pintadas. Já as meninas, colocaram no boneco dos meninos tênis,
boné, short, camiseta e fizeram ele com a aparência de forte, mostrando o
traço bem masculinizado.
No decorrer da atividade uma menina foi até o grupo dos meninos e
disse:
—“vocês não vão colocar óculos na menina? E eles disseram: Não a
nossa não usa, e a mesma menina falou: mas eu uso e sou menina então tem
que colocar”.
Dessa forma, utilizaram-se desenhos dos corpos de um menino e uma
menina para observar como eram visto pelos meninos e meninas alguns
conceitos como corpo, brincadeiras e características de homens/mulheres.
Ao voltar do recreio, foi dado continuidade à atividade, fazendo uma
votação, no qual foi pedido para as crianças escolherem o nome para os
bonecos e colocar algumas características dando perfil para os bonecos, como
cor preferida, profissão e brincadeiras que mais gosta. Logo, que terminaram
os meninos apresentaram para as meninas a boneca que eles tinham feito, que
se chamava Fernanda que gostava da cor azul e também gosta de brincar de
47
esconde-esconde, as meninas apresentaram o boneco Willian que gosta de
futebol e vídeo game.
Figura 2: A construção dos amigos Fernanda e William.
FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 21/09/2010).
A tarde passou muito rápido, mais foi muito proveitosa, pois cumprira-se
o planejamento respeitando o tempo das crianças. Além disso, o grupo foi
acolhedor e carinhoso, participando das atividades e junto com meninos e
meninas se percebia a interação.
Verificou-se que as crianças quase não trabalhavam em grupo e essa
atividade trouxe um maior entrosamento com alguns colegas, pois os meninos
observam as meninas e as meninas observam os meninos para poder construir
os bonecos. Além de conseguir observar as visões das crianças em torno das
roupas, das cores, dos serviços que homens e mulheres utilizam no cotidiano.
Foi notório o desenvolvimento junto às crianças com um olhar sensível
diante das diferentes formas de ser, discutindo as diferenças entre
meninos/homens e meninas/mulheres, procurando desconstruir preconceitos e
tabus existentes na sociedade e por consequente no ambiente escolar.
4.2.3 A construção da História: “A tristeza do Amor”
48
Ao dia vinte e dois do mês de setembro de dois mil e dez, iniciou-se a
intervenção dando continuidade à atividade de criação dos bonecos cujo nome
foi dado pelas crianças de Fernanda e Willian. Colocaram-se os bonecos feitos
com papel pardo na parede, em seguida dialogou-se com as crianças
perguntando o que eles tinham achado da atividade dos bonecos se eles
lembravam os nomes e as características de cada boneco que foi construído.
Ficamos surpresas com as crianças, pois reagiram da melhor forma
possível, queriam mostra para os colegas que faltaram, os bonecos que
construíram, informando para os amigos que eles tinham colocado nome, dado
a profissão e até escolhido a brincadeira preferida.
Logo, propõe-se para as crianças fazer uma história para os dois
bonecos. Em três e três, olharam os bonecos, sendo que os meninos
observavam o boneco feito pelas meninas bem como as meninas observavam
o boneco feito pelos meninos. Depois que as crianças analisaram os bonecos,
começamos a narrar à história, foi então àquela euforia todos queriam falar no
mesmo momento, só que combinamos que seria um por vez e que começaria
com o aluno GP.
Começou-se a história com a frase era uma vez no quadro e as crianças
completavam com as suas falas. Um de cada vez sentado em sua mesa dava
continuidade à história. Dessa maneira, aconselhei que as crianças
expressassem o que tinham vontade de falar, o que era mais significativo para
cada uma deles. Notou-se que nesse momento as crianças ficavam ansiosas
para falar, o que deixava o restante do grupo na expectativa e inquietos para
chegar a sua vez.
Ao final da construção da história, lemos todos juntos e escolhemos um
título que foi dado pelas crianças como: ―A tristeza do Amor‖.
―A Tristeza do Amor‖
Era uma vez uma menina rica e um menino pobre. A menina se
chamava Fernanda e o menino William. A menina comprou um carro
e o menino ajudou a escolher um carro, corsa da Chevrolet, a menina
agradeceu e ofereceu dinheiro e ele disse: não obrigado. A menina
ficou pobre e perdeu tudo. O menino gostava de azul e a menina de
rosa, o menino conheceu a Fernanda na aula. O menino gosta de
festa e convidou ela sair. O menino gostava da menina e eles não
tinham as cores em comum. Ela não queria ir à festa com ele. O
menino gostava de sair com ela para todos os lugares. O menino
levou a menina num restaurante muito chique, e ficaram até a noite
acabar. O menino e a menina se beijaram, os dois brincaram de
49
pega-pega. O menino e a menina ficaram namorados. O menino
sofreu um acidente de carro. O menino colocou fogo na casa da
menina e ela ficou queimada. A menina ficou viva e foi para cada da
mãe dela. Ela matou o homem. A menina ficou triste de tanto triste
colocou a faca no coração, e foi para o hospital e conseguiu tirar a
faca do coração e voltou a fica viva.
Figura 3 “A Tristeza do Amor”.
FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 22/09/2010).
Dessa forma, notaram-se na história algumas falas das crianças que
mostram bem a visão ―adulcêntrica‖ em relação aos comportamentos
esperados para meninos e meninas, como por exemplo, quando eles falam em
namorar, sair para restaurantes chiques e até mesmo no ter muito dinheiro
(pobre/rico). Esses conceitos se dão porque na maioria das vezes as crianças
escutam de familiares, pessoas que estão em seus cotidianos.
Essa mistura da visão da criança com o que o adulto aponta fica
explícita nessa fala da história:
—“O menino e a menina se beijaram, os dois brincaram de pega-pega”,
Percebeu-se que no mesmo tempo em que eles colocam que os dois
estão se beijando eles também brincam de pega-pega, essa linguagem denota
que as crianças estão influenciadas pela visão ―adulcêntrica‖ em que a
sociedade os coloca.
50
O intuito dessa intervenção era discutir no grande grupo as questões de
gênero, ampliando o repertório das crianças em relação as suas vivências com
os colegas sendo eles meninos e meninas. Além de desmitificar alguns
conceitos que algumas crianças têm em relação ao sexo oposto.
No entanto, observou-se que essa atividade estimulou meninos e
meninas a dar as suas opiniões e respeitar as opiniões dos amigos, pois
ressaltou-se junto com o grupo o respeito que devemos ter aos momentos de
ouvir e manifestar as opiniões.
Além disso, conseguiu-se trabalhar a questão das diferenças com as
crianças, socializando com o grupo o fato de todos serem diferentes, tanto
fisicamente quanto em seus comportamentos, com isso percebeu-se que
meninos e meninas se relacionaram melhor.
Como sempre o empenho da turma só aumenta a cada intervenção, pois
meninos e meninas se mostram comprometidos ao realizar as atividades
propostas.
4.2.4 Brincando e descontruindo estereótipos
Ao dia vinte e oito do mês de setembro de dois mil e dez, ao entrar em
sala de aula as crianças correram para falar com a professora. Então
percebeu-se que eles estavam gostando da minha presença em seus
cotidianos e também do tema que estou abordando em nossas intervenções,
pois uns dos meninos veio falar que seu pai colocou brinco na orelha, e
explicou esse fato dizendo:
— “prof sabia que meu pai disse que menino também pode usar brinco”.
Com essa fala, notou-se que as crianças estão se familiarizando com o
tema que está sendo proposto.
Em seguida, iniciou-se a conversa sobre o que iriamos trabalhar ao
longo do dia, pedindo a colaboração do grupo, pois seria passado um filme que
precisaria de silêncio, para todos conseguirem assistir. Quando todos estavam
sentados apresentou-se para as crianças o filme que seria passado cujo nome
é: Cine Gibi quatro turmas da Mônica meninos e meninas7, na qual contêm
7
Turma da Mônica em Cine Gibi 4 – Meninos e Meninas, a turminha está de volta em mais um super
sucesso, cheio de planos infalíveis e muitas coelhadas! São sete episódios muito divertidos para toda a
criançada! http://blockbusteronline.com.br
51
sete episódios sendo eles: Mônica, a famosa; Para não apanhar da Mônica (de
novo); Venha a minha Festinha; Brincando De boneca; Os brincos novos que a
mamãe comprou; Os cinco fios mágicos; A nova Babá.
Contudo, são histórias que trabalham as relações de meninos e meninas
nas vivências do cotidiano, como por exemplo, nas brincadeiras na qual
boneca é exclusividade das meninas e o cascão personagem do filme é
primeiramente obrigado a brincar com a Magali de boneca, e depois brincando
e percebendo que menino pode sim experimentar e brincar de boneca ele se
envolve e se entrega no prazer da brincadeira. Logo, as crianças colaboraram
com a aula de vídeo, ficando todos quietos prestando atenção no filme.
Dessa forma, após verem o vídeo socializamos com as crianças
algumas situações do filme que deveriam ser discutidas com as crianças, como
por exemplo, a questão dos brinquedos e brincadeiras, a relação de amizade
entre meninos e meninas e algumas questões de comportamentos que são
esperadas para meninos e meninas.
Durante o debate instigou-se as crianças com falas dizendo que as
meninas e meninos podem brincar e andar juntos. Além disso, comentou-se
com o grupo que eles possuem algumas habilidades que os diferenciam, mas
que isso é algo natural, pois os sexos femininos e masculinos têm caráter
biológico diferente, mas mesmo assim as falas mais recorrentes por parte dos
meninos foram:
—“Menino não pode brincar de boneca, porque isso é coisa de menina”
ou “as meninas não sabem jogar bola”.
Já as meninas não ligam para essas diferenças como podemos
observar nas falas delas:
—“Eu deixo o meu irmão brinca comigo, mas ele nunca deixa eu brinca
com ele, prof”.
Dando continuidade, levou-se o grupo no pátio do colégio para aplicar a
atividade do brinquedo. Ao chegar ao pátio pedi para eles ficarem fila, pois
seriam disponibilizados alguns brinquedos tidos para meninos e meninas como
corda, pião, skate e elástico, bem como foi informado para as crianças que
todos iriam experimentar as brincadeiras. Percebeu-se que a conversa que
estava tendo sobre os brinquedos tinha ficado confusa devido á grande
52
agitação de alguns meninos, na qual a principal indagação era que eles não
iriam pular elástico, porque era coisa de menina.
Desta maneira, tive que pedir para um menino se candidatar a pular
corda, para mostrar para os outros meninos que não tinha nada de mais
brincar, e que era muito bom essa brincadeira. Logo depois desse episódio,
peguei a corda e fiz uma roda com as crianças, na qual foi solicitado para uma
menina começar a pular corda mostrando para os meninos como se brinca, e
dando continuidade, foi o menino que se candidatou a pular. Logo, quando ele
pulou corda os meninos que não queriam brincar notaram que não tinha nada
de mais e pediram para participar.
Com isso, todas as crianças participaram das brincadeiras, acontecendo
assim em todos os brinquedos. Foi tão bom que ficamos duas aulas no pátio,
todas as crianças participaram, sem exceção. Os meninos participaram das
brincadeiras tidas para meninas e as meninas participaram das brincadeiras
tidas para os meninos. Notou-se que nessas brincadeiras as falas das crianças
foram positivas, pois vieram alguns meninos dizendo:
— “prof, eu gostei de pular elástico sabia”.
Figura 4 Brincando com meninas e meninos na sala de aula.
FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 28/09/2010).
Essa atividade foi muito importante para esse grupo, pois eles tinham
uma grande dificuldade em trabalhar em equipe, bem como estão arraigados
pelas diferenças nos comportamentos tidos para meninos e meninas.
53
Ao voltarmos para a sala de aula, pediu-se para as crianças fazerem um
desenho da brincadeira que mais gostaram, teve alguns meninos que
desenharam a corda e elástico. E meninas que desenharam o pião. Da mesma
maneira que tevê meninos que desenharam pião e meninas que desenharam
elástico.
Sendo assim, essa atividade teve intuito de dispor brinquedos tidos para
meninos e meninas para que eles pusessem descontruir e saber que brincar
com certos brinquedos pode ser prazeroso para ambos os sexos.
4.2.5 Visões de Meninos e Meninas em relação ao mundo.
Ao dia trinta do mês de setembro de dois mil e dez, iniciou-se a conversa
dividindo a sala em três grupos, sendo que esses grupos estavam agrupados
com meninas e meninos. Ao começar separando os grupinhos de meninos e
meninas, notou-se que eles não gostaram muito da ideia, pois queriam ficar
com os colegas que tinham, mas contato e amizade, mas no decorrer da
atividade foram se entrosando.
Foram entregues para as equipes partes da história construída por eles
mesmos, na terceira intervenção, e pedi para cada grupo, escrever na cartolina
dada um trecho da história e também solicitei que eles fizessem um desenho
do que, mas chamou atenção nas frases que eles obtinham da história. Para
depois juntarmos a produção dos três grupos e fazermos um livro. Quando
todos terminaram apresentaram as partes da história para o grande grupo e
explicaram tais desenhos.
Dessa maneira percebeu-se que as crianças desenharam no livro o que
achavam que devia aparecer da parte da história que foi dada para elas. O
primeiro grupo desenhou um carro e uma menina com dinheiro, pois achou que
essa parte era a, mas significativa do trecho que fala: “Era uma vez uma
menina rica...A menina comprou um carro”, já o segundo grupo desenhou um
menino e uma menina e ao lado o restaurante chique em festa, pois na parte
que eles pegaram tinha trechos que denotavam a seguinte fala: “o menino
levou a menina num restaurante chique e eles ficaram até a noite acabar”. E
por fim o terceiro grupo desenhou uma casa pegando fogo e fora dela estava o
menino segurando a faca e a menina ao lado, essa parte foi retirada do trecho
54
que falava a seguinte frase: “O menino colocou fogo na casa da menina... A
menina ficou triste de tanto triste colocou a faca no coração”.
Figura 5 Visões de meninos e meninas em relação ao mundo.
FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 30/09/2010)
Observou-se que as crianças têm uma grande imaginação e criatividade,
pois colocaram de forma lúdica alguns pontos no qual a tragédia tem parte
principal. Essa atividade tinha intuito de discutir com as crianças sobre as
frases construídas da história, elencando as visões em que meninos e meninas
têm dos sexos femininos e masculinos.
Dando continuidade, foi aplicada uma atividade xerocada que era uma
cruzadinha, na qual as crianças tinham que procurar as brincadeiras que eles
achavam que seria de menino e menina, como por exemplo, bolinha de gude,
pião, boneca, elástico, carrinho, corda, skate, bola. E depois colocar no quadro
ao lado. Percebeu-se que essa atividade as crianças ficaram bem agitadas
para terminar, pois eles adoram procurar as palavras na cruzadinha.
4.2.6 “O homem que pedi a mulher em casamento ele leva uma caixinha e
se ajoelha e fala que casar comigo”
Ao dia cinco do mês de outubro de dois mil e dez, entrou-se em sala
triste, pois aquele dia seria o último da observação no campo, pois os objetivos
55
em relação à pesquisa já tinham sido alcançados. Da mesma forma também
estava alegre, pois consegui concluir com êxito o que tinha previsto.
Assim, comecei aquele dia apresentando a proposta de aula para as
crianças, na qual iria fazer a contação da história do livro ―O príncipe cinderelo‖
da autora Babette Cole(2005) que conta8 a história de um menino que cuidava
da casa e das roupas dos seus três irmãos, que por sinal eram ruins para ele.
E certo dia tinha uma festa no reino e o príncipe cinderelo não podia ir, pois
não tinha roupa adequada para ocasião, foi então que apareceu uma fada e ele
fez um pedido e a fada o atendeu, mas falou que ele deveria chegar antes da
meia noite, porque se isso não fosse feito o pedido seria desfeito, o príncipe
cinderelo foi ao palácio chegando lá não pode ir a festa, pois a fadinha fez tudo
errado com os pedidos do príncipe. Ele ficou muito triste e foi pegar um ônibus
para ir embora, chegando lá se deparou com a princesa, ele estava muito feio e
a princesa ficou com medo, só que como estava chegando à meia noite, o
encanto se desfez e a princesa achou que foi o príncipe cinderelo que a
ajudou, mas ele ficou muito assustado e correu, deixando suas calças no
caminho. A princesa no outro dia correu em casa em casa para saber quem era
dono daquelas calças, pois o dono se casaria com ela e seria o novo príncipe
do reino.
Figura 6 "O príncipe Cinderelo".
FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 05/10/2010).
8
COLE, Babette. Príncipe Cinderelo. Martins, 2005.
56
Dessa maneira, constatou-se que as crianças paravam a leitura a todo o
momento para fazer a comparação com a história da Cinderela, e as falas
delas eram as seguintes:
— ―prof eu conheço essa história só que é uma menina que é a
cinderela‖ ou ―o homem que pedi a mulher em casamento ele leva uma
caixinha e se ajoelha e fala que casar comigo‖.
Em seguida, ao terminar de contar a história, dialogou-se com as
crianças, perguntando para elas quais as profissões de homem e mulher, que
eles reconhecem. Logo, as falas das crianças em relação às profissões foram:
Doméstica, Policial, Bombeiro, Taxista, Alfaiate, Motorista, telefonista entre
outros. Entretanto a profissão que chamou atenção foi que ao perguntar se
Motorista de Ônibus é profissão de homem/mulher e a maioria deles afirmaram
que era dos dois, pois já tinham pegado ônibus com mulheres dirigindo.
Dando continuidade, foi oferecida uma folha branca para todas as
crianças, e explicado que a atividade seria fazer um desenho para representar
uma profissão de homem e uma de mulher, bem como escrever na folha a
profissão escolhida.
Verificou-se que a maioria das crianças colocava as
profissões dos pais na atividade, como por exemplo, costureira, alfaiate,
bombeiro, policial, secretária, motorista de ônibus, caminhoneiro entre outros.
Assim que terminaram colaram os papéis que fizeram as profissões na
cartolina que estava no quadro dividido por sexo, homem e mulher e por fim
eles liam em voz alta a profissão que fizeram para os amigos.
A observação de campo estava chegando ao fim, e já estava ficando
triste, pois sabia que iria sentir saudades das risadas, das conversas, do
carinho das crianças ao me receber, de tudo que aprendi com aquele grupo, da
professora Eni Tasca que me recebeu da melhor forma possível, sendo
paciente e generosa com as minhas propostas.
Dessa forma, sabia que tudo que inicia, tem fim. Então chegou a hora
avisei para as crianças que hoje seria nossa última aula, e eles disseram:
— ―não acredito, agora que tava ficando bom”.
Foi muito prazeroso dividir minhas tardes com essa turma que me
ensinou muito.
57
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo da realização desta pesquisa, inúmeras questões foram se
acentuando na discussão sobre questões de gênero. Pois, á princípio, as
construções teóricas apontavam alguns direcionamentos e, na prática os
caminhos mostravam o quanto ainda havia a ser realizado em sala de aula.
Assim, pode-se dizer que a relação de gênero ocorre desde a mais tenra
idade, pois mulheres e homens assumem papéis diferenciados na sociedade e
reproduzem os elementos de vivência no contexto cultural em que estão
inseridos. No qual comportamentos e padrões sociais são influenciados e
seguidos pelos sexos, fazendo com que meninos e meninas se comportem de
forma estereotipada.
As relações de gênero se fazem presente no ambiente escolar, através
das brincadeiras nas atividades e até mesmo na amizade entre meninos e
meninas, fazendo com que os mesmos pensem ao escolher as brincadeiras e
brinquedos que irão brincar, pois estes já estão rotulados.
Diante das hipóteses colocadas para a realização deste trabalho, o
objetivo principal foi alcançado, pois através da pesquisa inserem-se novas
possibilidades de trabalho com as relações de gênero.
O processo de relação de gênero no ambiente escolar é ainda pouco
trabalhado com as crianças, merecendo maior atenção e preparo por parte da
escola e de profissionais da educação. Não somente dos professores mais
todos que fazem parte na comunidade escolar, ensinando e desmistificando
com as crianças os comportamentos diferenciados para ambos os sexos.
Necessita-se trabalhar as questões acerca das relações de gênero no
ambiente escolar, para romper com os estereótipos construídos pela sociedade
no decorrer dos anos, fazendo com que as crianças possam refletir sobre as
diferenças dos sexos sem fazer opções nos seus comportamentos e gestos em
seus cotidianos.
Os profissionais da educação precisam esclarecer aos educandos, que a
escola é constituída pelas diferenças e que meninos e meninas podem brincar
e se relacionar de forma igual, pois cabe o professor trabalhar o respeito ao
outro mostrando que os comportamentos que definem o ser menino/menina
58
não devem ser determinados e sim escolhidos por ambos.
Percebeu-se que o convívio entre meninos e meninas estabelece
algumas formas de se relacionar, muito influenciado pela sociedade e família,
pois meninos e meninas seguem padrões de conduta ao escolher
determinadas brincadeiras e objetos em sala de aula, enfocando sempre o ser
homens/mulher o posso e não posso fazer.
O caminho trilhado é longo, mas ao mesmo tempo gratificante. Os
debates em sala de aula fazem pensar no quanto a mediação e a opinião das
crianças é importante para a desconstrução de conceitos existentes na cultura
da sociedade. O processo de ensino aprendizagem nos reserva inúmeras
surpresas, pois aprendi e ensinei, e assim construí o conhecimento junto com
as crianças.
No inicio das observações de campo, meninos e meninas não se
misturavam ao realizar atividades, em grupo em sala de aula, pois essa
segregação era feita de forma tranquila pelas crianças, na qual os mesmos
nem percebiam que não se misturavam. Essa relação de diferenciação
acontecia mais acentuadamente na educação física, pois as meninas preferiam
brincadeiras mais tranquilas, ou seja, que não exija muito esforço físico, como
por exemplo: amarelinha, pular corda, elástico. Já os meninos preferiam
brincadeiras mais agitadas como futebol, pega-pega, basquete.
No decorrer das observações de campo, os comportamentos de
meninos e meninas em relação ao gênero foram mudando, pois ao trabalhar
com eles algumas questões como: as profissões de homens e mulheres; as
brincadeiras tidas para meninos e meninas; as histórias infantis, os mesmos
começaram a tomar conhecimento de algumas questões que até então não
haviam sido discutidas e apresentadas. Pensar de forma diferente em relação a
esses padrões em que a sociedade impõe, pois muitas vezes, os meninos se
sentiam mais a vontade ao escolher brincadeiras que são tidas para meninas
como pular corda, pois ao brincar até cantavam as músicas de roda.
Da mesma forma acontecia com as meninas, pois quando iniciei a
observação de campo, não brincavam de futebol, pois os meninos nunca as
deixavam, afirmavam que elas não sabiam jogar. Isso se modificou, pois
observei que ao chegar ao final dos nossos encontros, elas também já estavam
jogando futebol com os meninos, fazendo com que acontecesse a
59
desconstrução de estereótipos sexistas.
Enfim, o trabalho contribui com as reflexões de gênero, enfocando a
teoria e prática existente em sala de aula, buscando criar possibilidades em
que as crianças se sintam a vontade para dizer o que sabem em relação às
concepções de masculino e feminino, pois mediar estas questões com as
crianças, podemos esclarecer estereótipos em relação à severidade dos papéis
de gênero.
60
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61
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ANEXOS

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