TAMIRES REGINA PEDROSO RELAÇÃO DE GÊNERO
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TAMIRES REGINA PEDROSO RELAÇÃO DE GÊNERO
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ - USJ CURSO DE PEDAGOGIA TAMIRES REGINA PEDROSO RELAÇÃO DE GÊNERO: ABORDANDO AS DIFERENÇAS EM BRINCADEIRAS ENTRE MENINOS E MENINAS São José Junho 2011 TAMIRES REGINA PEDROSO RELAÇÃO DE GÊNERO: ABORDANDO AS DIFERENÇAS EM BRINCADEIRAS ENTRE MENINOS E MENINAS Trabalho de Conclusão de Curso elaborado com o requisito final para a aprovação no Curso de Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José- USJ Professora Orientadora Dr. Jaqueline A. M. Zarbato Schmitt. São José Junho 2011 TAMIRES REGINA PEDROSO RELAÇÕES DE GÊNERO: Abordando as diferenças em brincadeiras entre Meninos e Meninas. Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel no curso de Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José – USJ avaliado pela seguinte banca examinadora: BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________ Profª. Drª. Jaqueline Zarbato Schmitt Orientadora USJ ___________________________________________________ Profº. Dr. Sérgio Ferreira Membro Examinador USJ ___________________________________________________ Profª. MSc. Roberta S. Buering Membro Examinador USJ São José, 20 de Junho de 2011 Trabalho dedicado a todas as pessoas que estiveram comigo nessa jornada de quatro anos de faculdade, contribuindo com suas experiências e seus saberes. De forma especial aos meninos e meninas do Colégio Municipal Maria Luiza de Melo, do ensino Fundamental, da turma de 2°ano vespertino. Estas, serão sempre crianças alegres e repletas de conhecimentos a transmitir. E também a Profa. Eni Tasca que com toda delicadeza ajudou e orientou a realização deste da melhor forma possível. AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus por estár aqui e fazer com que esse sonho se realize. De modo especial agradeço também aos meus pais, que desde a minha geração me amaram muito, dando todo o carinho que eu precisava para seguir minha vida em frente, contribuindo com a minha educação e caráter fazendo com que me torna-se uma pessoa melhor. Obrigada por tudo! Pelos puxões de orelha que me fizeram descobrir que vocês sempre quiseram o melhor para mim, pelos incentivos na qual estou aqui concluindo a faculdade e também pelas cobranças que me fizeram crescer e aprender que a vida é feita de escolhas a qual devemos escolher o melhor caminho. ENFIM Amo vocês!!! A minha irmã Fernanda, que agora é uma pedagoga formada e com um grande futuro pela frente é a grande responsável pela minha formação, pois foi a minha co-orientadora, lendo e corrigindo este trabalho. Com toda paciência também me ajudava e explicava as matérias quando me dava uma crise nervosa ao achar que não conseguiria passar em Estatística. Obrigada pelo companheirismo, pelas brigas e elogios, pelos risos que me fizeram esses anos todos tão felizes, você é a melhor irmã do MUNDO. Ao meu querido marido Maicon, que entendeu que os meus dias de stress era para que eu chegasse aqui, e fizesse o melhor. Obrigada pela paciência e companheirismo que você teve quando me trancava no quarto para estudar, não interrompendo o meu raciocínio ficava quietinho na sala para que eu pudesse me concentrar, enfim obrigada pela sua companhia e por seu amor. A tia Sarita que se fez presente nos meus estágios colaborando para que as minhas intervenções fossem as melhores possíveis emprestando livros e dando dicas para as minhas propostas de aula. Aos meus familiares, que de longe acompanharam a minha trajetória, aplaudindo de pé as minhas conquista e incentivando para que eu seguisse em frente. Meu muito obrigado também aos meus amigos que na minha historia de vida tiveram uma grande contribuição, com seus ensinamentos, carinhos, 2 risadas e claro pela alegria em nossas brincadeiras. Dê modo especial a minha amiga Alexandra que sempre torceu pelo meu sucesso, e junto comigo estava nas minhas grandes vitorias. Professora Jaqueline, obrigada por suas aulas, tão divertidas e repletas de saberes, por fazer das nossas orientações não só um momento de transferência de conhecimentos mais também momentos especiais você realmente é uma Grande educadora. Ás Minhas colegas de sala pela convivência e pelas aprendizagens dividas através de debates e conversas longas, de modo especial as minhas queridas e pacientes amigas Aline, Ana, Cristiane e Elisângela que se fizeram presentes nessa trajetória de quatro anos, obrigada pelas risadas, pelas discussões ao realizarmos os trabalhos, pelos cafés nas casas de vocês, pelas brigas tolas que fizeram ficarmos alguns dias sem se falar, pelos puxões de orelha, enfim vocês sempre estarão em meu coração. Meu muito obrigado aos professores e profissionais do curso de Pedagogia da Universidade Municipal de São José. Somos privilegiados por conseguir estar em uma Universidade Gratuita e principalmente por conclui-la, cada um de vocês fazem parte da minha História. O homem abomina tagarela Garota caladinha ele adora Se a mulher fica falando O dia inteiro fofocando Homem se zanga, diz adeus e vai embora. Não vá querer jogar conversa fora Que os homens fazem de tudo pra evitar Sabe quem é mais querida? É a garota retraída E só as bem quietinhas vão casar. RAEL(apud LOURO;NECKEL;GOELLNER 2003,p.64) Resumo Esta pesquisa, intitulada: ―Relação de gênero: abordando as diferenças em brincadeiras entre meninos e meninas‖ tem como objetivo discutir a questão de gênero no universo da sala de aula, visando ampliar o repertório das crianças em relação as suas vivências na escola. Realizou-se a observação participante numa instituição de ensino pública localizado no Município de São José, para poder verificar como meninos e meninas se relacionam com as questões de diferenciação dos sexos feminino e masculino, bem como investigar as discussões sobre as brincadeiras em sala de aula com a mediação dos professores. A pesquisa enfoca a importância de trabalhar e dialogar sobre os conceitos que envolvem as relações de gênero, sendo uma pesquisa qualitativa explicativa. Palavra-chave: Relações de gênero. Brincadeiras. Ambiente escolar. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Meninos e Meninas e suas relações. .................................................................. 45 Figura 2: A construção dos amigos Fernanda e William.................................................... 47 Figura 3 ―A Tristeza do Amor‖. ............................................................................................... 49 Figura 4 Brincando com meninas e meninos na sala de aula. ......................................... 52 Figura 5 Visões de meninos e meninas em relação ao mundo. ....................................... 54 Figura 6 "O príncipe Cinderelo".. ........................................................................................... 55 10 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 11 2 REFERENCIAL TEÓRICO ...................................................................................... 14 2.1 GÊNERO NAS ESCOLAS............................................................................................ 14 2.2 GÊNEROS NOS PCN´S. .............................................................................................. 17 2.3 BRINCADEIRAS E ESCOLA: DIFERENÇAS DE GÊNERO? ................................ 18 2.4 AS INTERVENÇÕES E OLHARES DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO EM RELAÇÃO AO GÊNERO. ................................................................................................... 21 2.5 DOCÊNCIA E GÊNERO: OLHAR FEMININO OU MASCULINO NO TRABALHO ESCOLAR? ........................................................................................................................... 25 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................................................ 27 3.1 CARACTERIZAÇÕES DA INSTITUIÇÃO .................................................................. 28 3.2 POPULAÇÕES ALVO ................................................................................................... 29 4 ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS OBTIDOS ............................................. 32 4.1. OBSERVAÇÃO ............................................................................................................. 32 4.1.1 Primeiro contato com as relações de gênero ........................................... 32 4.1.2 Por que não está brincando de futebol menino? Não gosto de futebol, só de vôlei ............................................................................................................... 35 4.1.3 Menina também briga ................................................................................... 38 4.1.4 Respeitando as diferenças .......................................................................... 39 4.1.5 “A minha BARBIE é mais bonita que esse boneco que tu trouxe” ........ 40 4.1.6 Rosa e azul é de menino ou de menina? ................................................... 41 4.2 INTERVENÇÃO ............................................................................................................. 43 4.2.1 Iniciando o caminho com Meninos e Meninas .......................................... 43 4.2.2 Quebrando com as Diferenças. ................................................................... 45 4.2.3 A construção da História: “A tristeza do Amor” ....................................... 47 4.2.4 Brincando e descontruindo estereótipos .................................................. 50 4.2.5 Visões de Meninos e Meninas em relação ao mundo. ............................. 53 4.2.6 “O homem que pedi a mulher em casamento ele leva uma caixinha e se ajoelha e fala que casar comigo” ......................................................................... 54 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 57 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 60 ANEXOS .................................................................................................................... 63 11 1 INTRODUÇÃO Ao ingressar na universidade, já pensava em alguns temas para realizar a pesquisa do Trabalho de Conclusão de Curso, no entanto, no decorrer dos semestres, isso foi mudando. Foi então na realização do estágio que a percepção mudou em relação ás crianças, pois percebeu-se que são consideravelmente diferentes umas das outras e que, trazem de casa alguns padrões seguidos pela sociedade, como por exemplo, a relação de gênero. Isto faz com que meninos e meninas muitas vezes, não se misturem ao brincar, bem como não realizarem tarefas em sala juntos/as. Estas situações que ocorreram no grupo observado serviram de subsídio para a construção da pesquisa. Assim, o objetivo da pesquisa é discutir a questão de gênero, para ampliar o repertório das crianças em relação às suas vivências no ambiente escolar. Neste caso, a pesquisa visará identificar como ocorre às relações de gênero dentro da sala de aula, levantar questionamentos referentes às diferenças existentes entre o sexo feminino e masculino, proporcionar momentos de diálogo e interação, ampliando seus conceitos sobre relações de gênero, compreender a dinâmica da sala de aula, no que se refere às diferenças. Neste sentido, pensando a questão das diferenças de gênero em sala de aula, encaminhou-se a problemática que norteará a pesquisa: Como as relações de gênero são inseridas na aprendizagem de uma turma de segundo ano? Com base no objetivo proposto e na problemática citada acima visamos realizar a pesquisa. É importante perceber como as questões referentes às relações de gênero e brincadeiras são importantes de serem discutidas e socializadas com as crianças no ambiente escolar. Um breve trecho retirado dos ―Parâmetros Curriculares Nacionais‖ nos ajuda a pensar melhor como isto está sendo implantado nas escolas: A rigor, pode-se trabalhar as relações de gênero em qualquer situação do convívio escolar. Elas se apresentam de forma nítida nas 12 relações entre alunos e nas brincadeiras diretamente ligadas a sexualidade. Também estão presentes nas demais brincadeiras, no modo de realizar as tarefas escolares, a organização do material de estudo, enfim, nos comportamentos diferenciados de meninos e meninas. Nessas situações, o professor, estando atento, pode intervir de modo a combater as discriminações e questionar os estereótipos associados ao gênero. BRASIL (2000,p.145). Sabendo que meninos e meninas são sujeitos que constroem suas próprias histórias e estando inseridos em um mundo com uma grande diversidade cultural, faz-se necessário trazer a discussão para dentro das escolas, buscando provocar uma reflexão em torno das concepções de brincadeiras tidas para meninos e meninas, procurando explicitar o respeito às diferenças existentes em relação ao gênero. Neste contexto, MEYER (apud LOURO, 2003, p.25/26) nos mostra a importância de pesquisar e trabalhar gênero na escola: [...] sigo apontando que promover pesquisa na perspectiva de gênero possibilita não só discutir e repensar nossa inserção social como mulheres e homens e como profissionais da educação, mas pode contribuir efetivamente, para a construção de uma sociedade mais justa é mais igualitária não só ao que se refere ao gênero mais em todos os seus níveis e relações. Com base neste estudo, o estágio foi utilizado como percurso para pesquisa. Assim, observações e intervenções foram feitas com as crianças do (Grupo 2B) do Colégio Municipal Maria Luiza de Melo, formado por quatorze meninos e doze meninas. Percebeu-se que alguns aspectos precisavam ser trabalhados, principalmente no que está relacionado ao gênero, isso porque as brincadeiras e atividades propostas pelos professores não contemplavam as noções acerca do tema, fazendo com que meninos e meninas não se relacionassem no cotidiano da escola e em algumas situações que serviram de base para a construção da pesquisa. Durante as brincadeiras no recreio, na sala de aula, na educação física e nas atividades em grupo, na qual meninos e meninas tinham que se misturar. Vejamos alguns momentos em que um dos meninos disse para outro: — “tu veio de bota, isso é coisa de menina”. Evidencia-se aqui uma atitude que revela preconceito e a visão estereotipada exercida por um dos interlocutores. Sendo assim, a pesquisa busca discutir a questão de gênero, ampliando o repertório das crianças em relação às distinções entre meninas/mulher e 13 meninos/homem, procurando identificar e desconstruir tabus e preconceitos existentes dentro do ambiente escolar. Sabendo que as relações de gênero são culturalmente construídas e exercidas pela sociedade, percebeu-se que dentro da instituição de ensino isso não é diferente, pois as crianças sendo do sexo feminino e masculino exercem esse papel estereotipado em que homens e mulheres devem ser diferentes nos seus comportamentos, sendo eles mentais ou biológicos. Diante dos inúmeros questionamentos referentes à situação das crianças das séries inicias é importante discutir algumas questões para que desenvolvam o conhecimento sobre a relação de diferença entre meninos e meninas. Seja nas atividades propostas pela professora ou até mesmo no convívio. Como afirma BARBOSA (apud SOUZA 1989) ―gênero não quer dizer que quando o indivíduo nasce ele se torna homem ou mulher, mas que eles se constroem com divergentes comportamentos, poderes e até mesmo diferentes sentimentos‖. Com isso, trabalhar com situações que envolvam as relações de gênero proporcionam as crianças uma desmistificação do que a sociedade considera certo ou errado para cada sexo. É poder dizer que meninas e meninos podem sim brincar das mesmas coisas, gostarem das mesmas cores ou possuírem características em comum. Assim, as questões mencionadas serão aprofundadas a partir de referencias teóricos, além do caminho percorrido através dos procedimentos metodológicos, bem como análises dos dados com as observações, intervenções do assunto pressuposto. 14 2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 GÊNERO NAS ESCOLAS O conceito de gênero é denominado por SCOTT (1995) como um elemento que se refere à organização e relação social a qual o sexo feminino e masculino está inserido dentro da sociedade. Na qual também implica em conhecer a cultura e a construção social que homens e mulheres se relacionam, e sobre as diferenças que ambos os sexos trazem no decorrer da história. A diferenciação dos sexos Masculino e Feminino vem sendo construída pela sociedade desde a infância. A sociedade molda as crianças nos gestos, atitudes e nas brincadeiras, definindo normas e comportamentos diferentes para ambos os sexos. Segundo as concepções de diferenciação de sexos, ‗os meninos têm que ser inteligentes, corajosos e bravos. As meninas obediente, sensíveis e generosas, pois segundo FELIPE; GUIZZO (apud FELIPE; BELLO, 2009, p.147). A ideia de naturalização de determinados comportamentos em torno das masculinidades e das feminilidades está amplamente incorporada em nossa sociedade e se torna muito visível nos procedimentos escolares. Tais comportamentos, percebidos de forma essencializada (meninos mais agitados, agressivos, meninas são mais meigas, passivas, meninos devem gostar de determinadas coisa, meninas de outras), estão pautados por relações de poder entre os sexos desde a infância. Assim, percebe-se que as relações de gênero instauradas na sociedade e na cultura se apresentam e se reproduzem no ambiente escolar. Pois, segundo LOURO (1997, p. 61), ―gestos e movimentos, sentidos são produzidos no espaço escolar e incorporados por meninos e meninas, tornando-se parte dos seus corpos‖. A própria escola reproduz a desigualdade, muitas vezes, separando as meninas e meninos das brincadeiras e atividades dentro da escola, impondo limites e regras para essas crianças, definindo o que ambas devem fazer conforme seu sexo. A escola há muito tempo trouxe a diferenciação entre os ricos dos pobres, isso porque distinguia os espaços de circulação de quem era 15 de família nobre e de quem não era dividindo internamente por mecanismos de poder como: hierarquização, classificação e ordenamento, além de separar os meninos das meninas. Conforme LOURO (1997, p.57): Ela se incumbiu de separar os sujeitos - tornando aqueles que nela entravam distintos dos outros, os que a ela não tinham acesso. A escola que nós foi legada pela sociedade ocidental moderna começou por separar adultos de crianças, católicos de protestantes. Ela também se fez diferente para ricos e pobres e ela imediatamente separou os meninos das meninas No espaço escolar, percebe-se como se constituem os sujeitos. Observando como as meninas e meninos se relacionam se expressam e se comunicam de diferentes maneiras, pois existem padrões estabelecidos pela sociedade a qual devem seguir. Segundo LOURO, (1997, p.61), ―o modelo de sentar e andar, as formas de colocar cadernos e canetas, pés e mãos acabariam por produzir um corpo escolarizado, distinguindo o menino ou a menina que ―passara pelos bancos escolares‖‖. As relações de gênero acabam gerando, por parte da sociedade, certa discriminação e preconceito devido alguns comportamentos que possuem. Dentro do ambiente escolar existem meninos que gostam de brincar junto com as meninas, da mesma forma com que as meninas queiram participar da brincadeira dos meninos, o que muitas vezes é considerado constrangedor pelo grupo escolar. E então, percebe-se que as crianças realizam ―piadinhas‖. Como expõe FINCO ( 2003, p.89): [...] meninos e meninas demonstram comportamentos, preferências competências, atribuídos de personalidade mais apropriados para o seu sexo, seguindo, desde bem pequenas, as normas e padrões estabelecidos. Cabe aqui ressaltar que não só a escola, assim como outros meios sociais, na qual estamos inseridos, como a igreja, família e mídia, intervêm diretamente nas relações de gênero, por meio dos discursos que impõe regras e maneiras que meninos e meninas devem estabelecer no convívio social. Como expõe BUJES (apud FELIPE; BELLO, 2009, p.149). [...] é importante lembrar que não só a escola, mas várias outras instancias sócias, tais como a família, a igreja, a mídia, costumam, por meio de seus discursos, aprisionar, controlar, regular os sujeitos, 16 subjetivando-os a partir de disciplinamentos que são próprios da cultura na qual estão inseridos. Convém lembrar, que não só a escola, mas também as famílias devem trabalhar com as crianças alguns conceitos que estão relacionados à relação de gênero, como meninas brincar somente com bonecas e brincadeiras que não tenham bagunça, pois a menina já tem o estereotipo de ser calma e carinhosa, e já para os meninos brincadeiras e brinquedos, mas agitados e barulhentos. Como afirma CAMARGO; RIBEIRO (1999, p. 107). Muitas vezes, as tarefas dos mesmos sexos entre as crianças não deixam espaço para a possibilidade que meninos e meninas têm de experimentar brincadeiras e atividades diferenciadas estereotipias sexuais: ser menino pressupõe atividade, firmeza, impulsividade, curiosidade e papéis de liderança; ser menina pressupõe passividade, docilidade, obediência, preocupação com o bem estar dos outros, ajuda incondicional. Desta forma, percebe-se que a família passa a conduzir o comportamento desses indivíduos no decorrer da infância, pois coloca a menina nos afazeres domésticos e impõe que o menino deve comportar-se de forma impulsiva mostrando o seu lado ―macho‖ em cima das mulheres. Além de influenciar as atividades rotineiras das crianças colocando-os em relações diferenciadas, como não andar juntos e nem estar nas mesmas brincadeiras, pois são dois modos de se comportar incompatíveis, ainda que, algumas vezes, essas relações não sejam seguidas e concretizadas pelas crianças. Como coloca RIBEIRO ( 2006, p. 156,157): O comportamento infantil passa a ser adestrado logo nas primeiras idades, mas se intensifica quando chega a faixa etária dos 7 aos 14 anos, sobretudo em relação ao corpo e conduta das meninas. Quanto mais cedo melhor para as crianças não só observarem as práticas de seus genitores, mas para incorporarem as idealizações e representações transmitidas pelas gerações mais velhas. Ainda que todos se considerem parentes em algum grau, há uma preocupação constante na comunidade com as fofocas que podem comprometer a conduta adequada e a sexualidade de meninos e meninas. Sendo assim, o ambiente escolar é um lugar em que as relações de gênero estão sempre presentes. Os educadores precisam proporcionar momentos onde as crianças possam sozinhas se descobrir, e juntamente com isso aprendam a conviver com as inúmeras diferenças existentes. 17 2.2 GÊNEROS NOS PCN. O volume 10 dos PCN‘S (Parâmetros Curriculares Nacionais) apresenta as relações de gênero, no bloco intitulado: Corpo e orientação sexual, e o seu objetivo é promover diálogos em que se mostre o papel em que o homem e a mulher estão inseridos na sociedade. Sendo eles de discriminação ou até mesmo nos seus comportamentos estereotipados pelos seus relacionamentos e vivências exercidas dentro da cultura padrão que a sociedade estabelece. Como mostra no PCN: Ao tratar do tema orientação sexual, busca-se considerar a sexualidade com algo inerente a vida e a saúde, que se expressa desde cedo no ser humano. Engloba o papel social do homem e da mulher, o respeito por si e pelo outro, as discriminações e os estereótipos atribuídos e vivenciados em seus relacionamentos, o avanço da AIDS e da gravidez indesejada a adolescência, entre outros, que são problemas atuais e preocupantes. (BRASIL, 2000, p.107). As relações de gênero nas escolas estão em processo de romper com as diferenças existentes entre os sexos, ou seja, mostrar para as crianças que essa relação pode ser desmistificada, e que cada um tem o seu jeito de ser, pois estamos em uma sociedade que está repleta de diversidade, seja ela no sexo, raça ou etnia. Segundo o Parâmetros Curriculares Nacionais ( BRASIL, 2000, p.144) ―o conceito de gênero diz respeito ao conjunto das representações sociais e culturais construídas a partir da diferença biológica dos sexos‖ Desta maneira, as discussões que os PCN´S trazem para as relações de gênero no ambiente escolar, têm como princípio trabalhar e combater as relações autoritárias referentes a papéis estabelecidos para homens e mulheres, que estão presentes nas brincadeiras e nas relações entre as crianças. BRASIL (2000, p.144): A discussão sobre relações de gênero tem como objetivo combater relações autoritárias, questionar a rigidez dos padrões de conduta estabelecidos para homens e mulheres e apontar para a sua transformação. A flexibilidade dos padrões visa permitir a expressão de potencialidades existentes em cada ser humano que são dificultadas pelos estereótipos de gênero. 18 Portanto, convivemos em uma sociedade que de certa forma nos impõem normas do que é certo e errado. Que denominam atitudes que são atribuídas ao sexo masculino e feminino, que de certa forma acabam interferindo nas atitudes e gestos das pessoas, inclusive das crianças. Como apresenta o PCN (BRASIL, 2000, P.118): A Construção do que é pertencer a um ou outro sexo se dá pelo tratamento diferenciado para meninos e meninas, inclusive nas expressões diretamente ligadas a sexualidade e pelos padrões socialmente estabelecidos de feminino e masculino. Esses padrões são oriundos das representações sociais e culturais construídas a partir das diferenças biológicas dos sexos e transmitidas pela educação, o que atualmente recebe a denominação de relações de gênero. É importante ressaltar que ―cada sociedade cria conjunto de regras que constituem parâmetros fundamentais para o comportamento sexual de cada individuo‖ (BRASIL, 2000, p.117) o que de certa forma acaba limitando nossas atitudes, gestos e comportamentos. Contudo, entende-se que a escola por ser responsável em transmitir o conhecimento precisa discutir e alertar os seus alunos, alguns tabus e preconceitos existentes dentro da sociedade, para que os educandos consigam formar sua própria opinião a respeito desses assuntos pertinentes há anos na sociedade. 2.3 BRINCADEIRAS E ESCOLA: DIFERENÇAS DE GÊNERO? As brincadeiras das crianças vêm sendo moldadas e observadas levando a diferenciação do sexo feminino e masculino e fazendo com que as crianças internalizem alguns rótulos e padrões culturais desde a mais tenra idade. Muitas vezes exige-se que as crianças sigam alguns valores e conceitos pela sociedade e ao ingressar na escola isso não é diferente, pois as crianças se deparam com o preconceito de certas pessoas ao escolherem determinadas brincadeiras que culturalmente já estão enraizadas em nossos costumes e comportamentos. Pode-se perceber que as diferenças entre meninos e meninas nas brincadeiras se dão pelo fato que a cultura social intervém diretamente entre as 19 crianças, ou seja, essa cultura é inserida e cultivada pela educação dos pais, passada de geração a geração. Como diz FINCO ( s.d, p.1): "Desde o berço, as atitudes, as palavras, os brinquedos, os livros procuram moldar as crianças para que aceitem e assumam os rótulos que a sociedade lhes reservou. Para os homens o público e a política, para as mulheres o privado e a casa. Dos meninos espera-se agressividade, capacidade de liderança, racionalidade. Das meninas espera-se delicadeza, sensibilidade e beleza". Desta maneira, percebe-se que algumas crianças do Ensino Fundamental já estão influenciadas pela visão dos adultos, pois sem perceber cometem pequenos preconceitos com os colegas. Quando os mesmos, sendo eles meninos, desejam brincar ou se misturarem com as meninas, e a mesma coisa acontecem com as meninas ao querer participar das brincadeiras dos meninos. Esse comportamento da criança se dá pelo contexto social em que estão inseridas. A partir das observações, pode-se perceber que algumas brincadeiras ainda levam a diferença e o distanciamento de meninos e meninas ao brincar, pois a boneca, o pular elástico1, o pular cordas para alguns é exclusividade para as meninas, muitas vezes não permitindo aos meninos experimentar essas brincadeiras. Assim também, como carrinho, pião e skate são brincadeiras ditas como apropriados para os meninos, fazendo com que as meninas não desfrutarem do brincar. Como FINCO ( s.d, p.13) expõe: A transgressão em relação à utilização dos brinquedos considerados ―certos‖ e ―errados‖ para cada sexo foi observada em vários momentos de brincadeira. Os meninos e meninas brincam de tudo que lhes dê prazer: de bola, de boneca, de empinar pipa, de carrinho, de casinha. Esses comportamentos acabam gerando um conflito entre meninos e meninas, por achar que alguns brinquedos não fazem parte das expectativas que adultos têm em relação ao seu sexo, e por sua vez as crianças internalizam que esse ou aquele brinquedo não é adequado para suas brincadeiras. 1 Pular Elástico é uma brincadeira que é feito com elástico de roupa, na qual duas crianças ficam em pé, frente a frente, colocando o elástico em volta dos tornozelos, formando um retângulo, um terceiro participante faz uma sequência de saltos, pulando para dentro, sobre e para fora do elástico, o objetivo é fazer tudo sem tropeçar, aumentando o grau de dificuldade. http://vidadeprofa.blogspot.com/2009/04/brincadeira-pular-elastico.html 20 Alguns adultos tentam limitar as brincadeiras das crianças, esquecendo que algumas dessas brincadeiras podem ajudar meninos e meninas na vida adulta, pois se o menino brincar de boneca isso pode acarretar a um bom papel de pai na vida adulta, isso também pode acontecer com as meninas se elas brincarem de carrinho podendo ao crescer serem boas motoristas. Como expõe: (MAGLIA; MELO, 2010, p.s): "Limitar as brincadeiras das crianças, privando-as de alguns tipos de brinquedos, é também limitar sua experimentação e aprendizado. As brincadeiras são um ensaio para a vida adulta. Ou ninguém aqui conhece um engenheiro que adorava construir casinhas na arvore ou um ator estreou tendo como palco um guarda roupas vazio?" As brincadeiras podem auxiliar na vida adulta das crianças, dependendo da maneira que são encaminhadas. As experimentações de algumas brincadeiras fazem com que as crianças comparem seus brinquedos com a vida real imitando seus pais em seus comportamentos cotidianos e rotineiros. As brincadeiras de grupo como o esconde-esconde, pega-pega e futebol, fazem com que as crianças consigam compreender que possuem papéis sociais e de gênero diferentes no transcorrer das mesmas, sendo que isso ocorre por estarem em constante interação. Na instituição em que realizou-se a análise, as brincadeiras são importantes para a construção da identidade de gênero, pois ao brincar as crianças conseguem ir além da realidade. Vivem um mundo de fantasia e imaginações vão criando outras utilidades para o brinquedo ou para brincadeira, ou seja, se a brincadeira é satisfatória eles não deixam de brincar por ser de menino ou de menina. Como diz Brougère (apud LEITE 2002, p.67). [...]a brincadeira é uma mutação do sentido, da realidade: as coisas tornam-se outras. É um espaço à margem da vida comum, que obedece a regras criadas pela circunstância. Os objetos, no caso, podem ser diferentes daquilo que aparentam. Com isso, entende-se que é nas brincadeiras que meninos e meninas conseguem viver experiências e experimentar papéis de sexos diferentes, quebrando com padrões e estereótipos estabelecidos pela cultura em que vivem. 21 2.4 AS INTERVENÇÕES E OLHARES DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO EM RELAÇÃO AO GÊNERO. Sabendo que existem relações de gênero no ambiente escolar, percebeuse a importância de trabalhar esse tema e de observar alguns conceitos que os educadores vêm trabalhando para melhor compreender essas diferenças de menino e menina. Ou seja, a relação de gênero está presente nas atividades e nos trabalhos feitos na sala de aula com as inter-relações das crianças por grupo. O educador deve apontar para as crianças que existem diferenças devidas o seu sexo, que somos diferentes e que cada um tem o seu jeito de ser, uns são mais rápidos de aprender, outros são melhor no esporte, e assim, trabalhar o respeito e a diversidade que envolve a sociedade. Muitas vezes, a instituição de ensino reforça e orienta os educandos de forma sutil em relação ao gênero, desempenho e habilidades mais adequada para seu sexo, manipulando expectativas para essas crianças. Alguns profissionais da educação demonstram ter pouco interesse em trabalhar as questões referentes à relação de gênero presente no cotidiano escolar, pois alguns não percebem ou até mesmo não querem ver as diferenças e desigualdades presentes em sala de aula entre as meninas e os meninos. Nesta concepção, percebe-se que ainda existem educadores que desenvolvem atividades diferenciadas para ambos os sexos, diante disso, LOURO (1997, p.73) afirma que: [...] muitos professores atuam ainda hoje com uma expectativa de interesses e desempenhos distintos entre seus grupos de estudantes. A ideia de que mulheres são fisicamente menos capazes do que os homens possivelmente ainda é aceita. Diante dessa concepção devemos proporcionar para as crianças situações, que de certa forma desmistifique essas situações, que homem e mulher possuem atividades distintas. Desenvolver trabalhos pedagógicos que ―possibilitem a criança falar sobre as relações de abrir um canal para a construção dos seus conhecimentos, por meio da mediação da educadora, utilizando-se musicas, histórias, poemas, filmes.‖ (CAMARGO; RIBEIRO, 1998, p.108). 22 Fazendo com que as crianças entendam que meninos e meninas possuem sim algumas diferenças, mas que estas não impedem que possam gostar das mesmas brincadeiras ou das mesmas coisas. Que meninas são responsáveis pelo os serviços domésticos e meninos pelo serviço mais pesado. Que os homens são fortes e não choram, e mulheres são mais frágeis e delicadas, o que por fim acaba limitando suas atitudes e comportamento perante determinadas situações. Como mostra RAGO (apud CAMARGO; RIBEIRO 1998, p.107): [...] a negociação entre os gêneros é fundamental não só para a construção de um novo pacto ético, mas para a própria construção e um ser humano menos fragmentado entre um lado supostamente masculino, ativo e racional e outro feminino passivo e emocional. A superação da lógica binária contida na proposta da analise relacional do gênero, nesta direção, é fundamental para que se construa um novo olhar aberto às diferenças. Sendo assim, como ressalta CAMARGO e RIBEIRO (1998, p. 90) ―a tarefa do educador e da educadora é abrir para a criança aspectos inexplorados do mundo e dela mesma. Em vez de classificar as crianças, dar oportunidade para que se desenvolvam segundo sua possibilidade.‖ Nesta concepção, CAMARGO e RIBEIRO (1998, p.51) afirmam que: As educadoras e os educadores, nesse movimento da transformação social, necessitam de espaço para processar, entender, tomar consciência da mudança, da diversidade, da multidimensionalidade que estão implícitas no processo de educar. O processo pedagógico deve de certa forma, proporcionar aos alunos momentos em que os mesmos consigam compreender as diferenças existentes dentro do ambiente escolar. No qual, o educador interfira nesse processo, através das suas aulas, que podem e devem ser exploradas de diversas maneiras, seja em um ciclo de conversas, utilizar livros literários, dinâmicas em grupo ou propor outras atividades em que as relações de gênero se façam presentes. É através dessa interferência que o educador realiza, que pode-se diminuir os atritos existentes na turma. Isso por que: BRASIL (2000, p.146): A proposição, por parte do professor, de momentos de convivência e de trabalho com alunos de ambos os sexos pode ajudar a diminuir a hostilidade entre eles, além de propiciar observações, descobertas e 23 tolerâncias das diferenças. Essa convivência, mesmo quando vivida de forma conflituosa, é também facilitadora dessas relações, pois oferece oportunidades concretas para o questionamento dos estereótipos associados ao gênero. Portanto, devemos proporcionar para as crianças um lugar onde possa se expressar, se descobrir e saciar suas curiosidades, sanar suas dúvidas, como da mesma forma também aprendam a lidar com as diferenças existentes dentro do ambiente escolar como na sociedade em um todo. Como define (CAMARGO; RIBEIRO, 1998, p.78): Existe o desejo de experimentar, por exemplo, a maquiagem, mas os meninos não os fazem porque é coisas de menina. Uma questão é o exercício de esquema do ―mesmo sexo‖ no qual meninos e meninas testam o ―ser homem‖ e o ―ser mulher‖ e outra é a possibilidade de conviver com pessoas diferentes e brincadeiras diferente. Ao abordar a relação de gênero na escola, geralmente percebe-se que é dado à disciplina de educação física o papel de fazer o diálogo sobre corpo, sexualidade, etc. Porém, estas questões estão vinculadas à biologia, apontando para a ordem biológica na qual se faz presente na separação dos homens e das mulheres. Em algumas vezes, percebe-se que há uma maneira de diferenciar as atividades, fazendo assim, com que se tenham questionamentos sobre as diferenças de habilidades físicas entre menino e menina. Deste modo, entende-se que a educação física é um espaço em que são mais frequentes, as diferenças das relações de gênero dentro da escola, por ser uma disciplina que vincula questões de diferentes habilidades físicas entre os sexos. Como expõe LOURO (1997, p.72), ―Se em algumas áreas escolares a constituição da identidade de gênero parece, muitas vezes, ser feita através dos discursos implícitos, nas aulas de educação física esse processo é geralmente mais explicito e evidente‖. Na escola e até mesmo em casa se o menino não gosta de futebol, ele é visto por alguns como ―bichinha‖ porque para eles é obrigado o menino gostar de futebol que é um esporte que exige força física. Para LOURO (1997, p. 75) [..]gostar de futebol é considerado quase uma ―obrigação‖ para qualquer garoto ―normal‖ e ―sadio‖. Na infância, os próprios pais compram bolas de presente para os 24 meninos para que eles, desde pequenos, já gostem do futebol, Bonecas e loucinhas para as meninas para que elas já desempenhem o gosto pelos afazeres domésticos, estimulando a criança a exercer esse papel e comportamento pré-estabelecido na fase adulta. Pode-se perceber que as expectativas de comportamentos e gestos dos meninos e meninas são diferenciadas, conforme suas práticas e convívio no dia a dia, ou seja, quando se tem na sala de aula algo para ajeitar depois dos trabalhos a educadora solicita para a menina, e quando se tem algum objeto para ser carregado exigindo força, a educadora logo pedi para o menino, pois essas são características esperadas para cada sexo, seja ele feminino ou masculino. Como expõe FINCO (s.d, p.3): É necessário olhar mais atentamente e perceber como as características físicas e os comportamentos esperados para os meninos e para as meninas podem ser reforçados, de forma inconsciente, nos pequenos gestos e práticas do dia-a-dia da Educação Infantil. A forma como a professora conversa com a menina, elogiando sua meiguice, ou quando justifica a atividade sem capricho do menino; o fato de pedir para uma menina a tarefa de ajudar na limpeza da sala e ao menino para carregar algo; a forma como o adulto separa um conflito, defendendo e protegendo a menina da agressividade dos meninos — tudo isso torna possível perceber como as expectativas são diferenciadas para as meninas e os meninos. O que é valorizado para a menina não é valorizado para o menino e vice-versa. Algumas atividades escolares separam meninos e meninas por gêneros, isso acontece na maioria das vezes nos grupos de trabalho, nas gincanas, em atividades que exigem divisão dos grupos. Como expõe LOURO (1997, p.79): A separação de meninos e meninas é, então muitas vezes, estimulada pelas atividades escolares, que dividem grupos de estudo ou que propõem competições. Ela também é provocada, por exemplo, nas brincadeiras que ridicularizam garoto, chamando-o de ―menininha‖, ou nas perseguições de bandos de meninas por bandos de garotos. Os educadores ao presenciar alguma brincadeira onde o menino ou a menina estejam brincando com papéis distintos do seu sexo, deve deixar que essa relação aconteça de forma livre, pois as crianças estão buscando a todo o momento novos prazeres e curiosidades. Cabe salientar ainda que os educadores precisam estar atentos a pequenos indícios que os alunos mostram na convivência um com o outro em 25 relação às questões de gênero, seja na brincadeira, atividades e até mesmo no espaço escolar, devem está preparados para desconstruir essas práticas sexistas presente na cultura. 2.5 DOCÊNCIA E GÊNERO: OLHAR FEMININO OU MASCULINO NO TRABALHO ESCOLAR? A escola é historicamente é um espaço feminino, por ter relações e pratica que se assemelham ao meio familiar, como afetividade, carinho e compreensão. Buscando nas mulheres semelhança ao lar, tarefas essas tradicionalmente exercidas pelas mulheres. Como LOURO (1997, p.88): [...] a escola é feminina, porque é, primordialmente um lugar de atuação de mulheres _ elas organizam e ocupam o espaço, elas são as professoras; a atividade escolar é marcada pelo cuidado, pela vigilância e pela educação, tarefas tradicionalmente femininas. Há também, quem diga que a escola é masculina, pois os instrumentos de conhecimento foram historicamente criados pelo homem, como os livros os mapas e os métodos de investigação a linguagem. Conforme LOURO (1997, p.89)[...] a escola é masculina, pois ali se lida, fundamentalmente com o conhecimento _ e esse conhecimento foi historicamente produzido pelos homens. Portanto, percebe-se que as crianças desde a tenra idade têm na escola a constituição e cruzamento das relações de gêneros. Como expõe LOURO (1997 p.89) ―O que fica evidentemente, sem dúvida, é que a escola é atravessada pelos gêneros; é impossível pensar sobre a instituição sem que se lance mão das reflexões sobre as construções sociais e culturais de masculinos e femininos‖. Acreditamos que as professoras tiveram várias representações na história. Um desses momentos foi quando eram associadas às solteiras ou ―tias‖, por exigir uma doação e por se tratar de um trabalho fora do lar e de modo a não atrapalhar essas atividades de amor, vigilância, e dedicação. LOURO (1997,p.100) mostra que as educadoras também tem sua formação marcada pelo gênero, pois as ―Professoras foram vistas, em diferentes momentos, como solteironas ou ―tias‖, como gentis normalistas, habilidosas 26 alfabetizadoras, modelos de virtude, trabalhadoras da educação‖. Fugindo do tradicionalismo, professores e professoras estão a todo o momento buscando novas concepções para a educação. O que faz surgir novas ideias e conhecimentos, ou seja, os professores de hoje estão em busca de um caráter critico e profissional. Segundo LOURO (1997, p.108) ―Construindo formas organizativas novas, professores e professoras passam a se constituir diversamente, afastando-se, em parte, do caráter sacerdotal da atividade e buscando dar a essa atividade uma marca mais política e profissional‖. Desde modo, fica visível que não importa ser professor ou professora, pois ambos têm competência para exercer a função de educador, sendo que não é o sexo que vai definir a capacidade de cada um. 27 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Na construção da pesquisa, visou-se abordar a relação de gênero na escola, buscando investigar as discussões sobre as brincadeiras entre meninos e meninas em sala de aula e a mediação dos/as professores/as. Para tal, utilizou-se o caminho metodológico envolvendo a pesquisa qualitativa explicativa. Buscando em GIL (2009, 28-29) as denominações para tal caminho metodológico ele ―[...] identifica os fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos. Este aprofunda o conhecimento da realidade, porque explica a razão, o porquê das coisas. Por isso mesmo é o tipo mais complexo e delicado [...]‖. Para realizar a pesquisa de campo, utilizou-se as observações em sala de aula, durante os meses de agosto a outubro de dois mil e dez, com o intuito de identificar como ocorre às relações de gênero dentro do cotidiano escolar. Além de levantar questionamentos referentes às diferenças existentes em relação aos sexos femininos e masculinos. Assim, visou-se compreender a dinâmica da sala de aula, no que se refere às diferenças, bem como ampliar o repertório das crianças em relação as suas vivências no ambiente escolar. De acordo com GIL (2009 p.57): [...] é a de que no estudo de campo estuda-se um único grupo ou comunidade em termos de sua estrutura social, ou seja, ressaltado a interação de seus componentes. Assim, o estudo de campo tende a utilizar muito mais técnicas de observação do que de interrogação. A observação participante deve ser realizada com o intuito de descrever através do olhar do pesquisador as nuances do cotidiano. Sendo que uma das vantagens do estudo de campo é possibilitar o pesquisador aprofundar suas questões propostas. Através do estudo de campo é possível entender os procedimentos diários instaurados na escola, as formas de relação entre professores e alunos. Assim, através das observações relatou-se detalhadamente o cotidiano da sala de aula, os discursos da professora e as diferenças existentes no convívio das crianças em grupo. Como afirma GIL (2009, p.103): 28 A observação participante, ou observação ativa, consiste na participação real do conhecimento na vida da comunidade, do grupo ou de uma situação determinada. Neste caso, o observador assume, pelo menos até certo ponto, o papel de um membro do grupo. Daí por que se pode definir observação participante como técnica pela qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele mesmo. A observação participante faz com que consigamos realizar a pesquisa, com o intuito de perceber como as crianças se relacionam dentro da instituição de ensino. Contudo, este estudo representa o inicio de um trabalho gratificante e complexo ao mesmo tempo, pois diz respeito às relações de gênero. E a visão docente das educadoras como forma de desmistificar e provocar nos educandos uma visão crítica para quebrar alguns padrões em que estamos inseridos dentro da sociedade e consequentemente os resultados a serem alcançados. Isso representa nas Instituições de Ensino o bem estar das crianças no convívio e nas brincadeiras realizadas entre eles, bem como o melhor preparo das educadoras ao realizar atividades que consistam um bom relacionamento entre as meninas e meninos. Como por exemplo: ao dividir a turma para realizar as atividades, sendo elas em grupo de meninos e meninas juntos, para que não aconteça a separação por eles mesmos. 3.1 CARACTERIZAÇÕES DA INSTITUIÇÃO O Colégio Municipal Maria Luiza de Melo, situado na Rua José Ferminio Novaes, s/nº - Kobrasol – São José, foi fundado em 12 de novembro de 1988, porém só iniciou suas atividades em 1989. Tinha como finalidade atender aos anseios da comunidade em ter uma escola pública com garantia de um ensino de qualidade. Recebeu este nome em homenagem a mãe do então prefeito da época, Germano João Vieira. Maria Luiza de Melo (1889 – 1934) ―foi uma mulher à frente de seu tempo‖. Culta, moralmente correta e muito voltada às questões religiosas, tinha uma preocupação especial com o desenvolvimento cultural e educacional de seus filhos e das crianças da comunidade. Pode ser considerado um exemplo de força e determinação, uma grande heroína da educação. 29 O principal objetivo da instituição é proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de autorrealização e preparo para o exercício consciente da cidadania, oferecendo educação de qualidade para todos. Um dos diferenciais do colégio é o desenvolvimento de projetos culturais e esportivos extraclasses (dança, judô, basquete, capoeira e futsal e coral ―Vozes do Amanhã‖ iniciado em maio de 2004). Estes despertam os interesses dos alunos e ajudam a criar o gosto pelo esporte e a responsabilidade. Desde julho de 2008, foi reorganizada a Banda Marcial do colégio o que empolgou bastante à comunidade escolar. 3.2 POPULAÇÕES ALVO A observação ocorreu no Colégio Municipal Maria Luiza de Melo, na turma do 2° ano do Ensino fundamental do período vespertino que são crianças que possuem entre sete e nove anos. A sala de aula é dividida em doze meninas e quatorze meninos totalizando vinte e seis crianças. Através da produção do estágio, interagiu-se com as crianças, percebendo suas características, seus gostos, as divisões ou não nas brincadeiras. Isso possibilitou ampliar a análise porque instaurou-se um maior contato com as crianças. Na definição da pesquisa, percebeu-se o quanto foi importante estar em sala com as crianças, o que favoreceu a observação do comportamento e das relações de gênero. As crianças ficavam agitadas em alguns momentos da aula, geralmente quando a professora desenvolvia atividades em grupo, eles tinham que sair das suas carteiras e juntar-se com os colegas. Observou-se também que eles foram carinhosos e participativos, pois no decorrer das observações ao chegar à sala, logo vinham cumprimentar-me e abraçar-me. A sala possui apenas uma professora regente, que permanece o tempo todo com as crianças, ela procura fazer atividades que desenvolvam a percepção das crianças, o bom comportamento na vida cotidiana, focando todos os dias que, eles devem respeitar as diferenças das pessoas. Também desenvolve atividade em grupo fazendo com que os que têm mais facilidade de aprender ensinem os que tinham dificuldade, visando inserir o respeito ao 30 próximo e também mostrando para os alunos que cada um tem o seu tempo de aprender, que somos diferentes. O espaço da sala estava compreendido por mesas e carteiras incluindo a mesa da professora na frente do quadro, uma televisão, um ventilador, um armário, um calendário, um mural com desenhos do grupo e uma mesa no final da sala com livros de histórias. Assim, fora realizado a observação na referida instituição, a partir do estágio Curricular Obrigatório de Pedagogia, sobe orientação da Profa. Roberta S. Buehring. Através, das observações em sala de aula, constatou-se que o grupo que estava sendo observado era consideravelmente separado pelas relações de gênero entre meninas e meninos. Pois os mesmos não se misturam ao fazer atividades e até mesmo não se juntavam nas brincadeiras feitas na educação física e recreio. No final da aula a professora propunha aos alunos o jogo do silêncio, em que cada criança deveria estar bem quietinha e comportada. No decorrer da brincadeira para que fosse escolhido pelo amigo que estava no centro da sala para ir embora junto com ele, e assim até bater o sinal. Então aconteceu a seguinte situação: H fala para P, tem que ser um menino e uma menina, você só escolhe menina, agora tem que escolher um menino, porque é uma vez uma menina e um menino. (OBSERVAÇÃO 24/08/2010) Considerando isso, verificou-se que deveria ser realizado algo que desmistificassem esse estereótipo que por eles não era percebido. Contudo, notou-se a importância de trabalhar as relações de gênero dentro do ambiente escolar, retratando as diferenças de acordo com os interesses demonstrados pelas crianças em seu cotidiano. A proposta para as intervenções em sala de aula partiu das observações feitas no cotidiano. Assim, parte da reflexão de que cores, como o rosa e o azul, bem como carrinho e a boneca pode ser sim, utilizadas e experimentadas nas brincadeiras das crianças, ou seja, fazer com que as crianças internalizem que esses padrões não definem o que é ser menino ou menina. Nesse sentido, FINCO (s.a p.13) coloca que: Os meninos e meninas brincam de tudo que lhes dê prazer: de bola, 31 de boneca, de empinar pipa, de carrinho, de casinha. Ao brincar com todos os brinquedos que desejam, não deixam que idéias, costumes e hábitos, que já faziam parte da educação de meninos e meninas na primeira metade do século XIX (Felipe, 2000), limitem suas formas de conhecer e vivenciar o mundo, determinando o que devem ser, o que devem pensar e que espaços devem ocupar. Desta forma, notou-se que meninas e meninos ao experimentarem algumas brincadeiras que lhe dê prazer, como por exemplo, carrinho, boneca ou pipa, não se deixem influenciar e se limitarem ao brincar, pois quando estão fazendo o que gostam deixam estereótipos de lado e se entregam ao prazer da brincadeira. A apresentação deste trabalho é, portanto, uma forma de reforçar e esclarecer a importância que as relações de gênero existem dentro da instituição de ensino, pois meninos e meninas a todo o momento entram em conflitos. Acham que seus sexos não devem se misturar em brincadeiras e atividades que determinam o agrupamento entre eles. É preciso que os educadores busquem nas atividades propostas em sala de aula, trabalhar e desmistificar alguns conceitos pertinentes em relação ao gênero. 32 4 ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS OBTIDOS Nesse capítulo serão apresentados os resultados obtidos na pesquisa, sendo eles os dados coletados durante o período de observação de campo, em uma instituição pública no município de São José. Estes resultados são descritos, com o auxílio do registro de observação de campo de estágio, no qual foi elemento importante na pesquisa, fornecendo subsídios para a realização da mesma. Foi realizada no período de agosto á outubro de 2010, na turma de 2° ano vespertino, do Ensino Fundamental do Colégio Municipal Maria Luiza de Melo. A intenção era inserir na prática educativa, a discussão sobre as relações de gênero na escola bem como analisar as brincadeiras que envolvam os sexos feminino e masculino. As discussões que seguem acerca da análise dos resultados estão divididas em dois capítulos, sendo eles de observação e intervenção no campo. No primeiro subcapítulo, será abordado o primeiro contato com as relações de gênero: Por que não está brincando de futebol menino? Não gosto de futebol, só de vôlei, menina também briga, respeitando as diferenças, ―A minha BARBIE é mais bonita que esse boneco que tu trouxe‖ e Rosa e azul é de menino ou de menina?. Já no segundo subcapítulo, será abordado iniciando o caminho com Meninos e Meninas, quebrando com as Diferenças, a construção da História: ―A tristeza do Amor‖, brincando e descontruindo estereótipos, visões de Meninos e Meninas em relação ao mundo, ―O homem que pede a mulher em casamento ele leva uma caixinha e se ajoelha e fala que casar comigo‖. 4.1. OBSERVAÇÃO 4.1.1 Primeiro contato com as relações de gênero Ao primeiro contato com a turma, notou-se que as crianças aguardavam as educadoras no pátio em fila de meninos e meninas, mais tinham algumas crianças que ficavam dispersos se misturando com outros colegas de outras turmas. A presença da professora fez com que as crianças se comportassem, 33 numa postura retraída, pois os mais tagarelas ficaram quietinhos com a presença da mesma. No primeiro dia de observação, com uma sala mista, de quatorze meninos e doze meninas, ambos sentavam separados em filas. Era um grupo bem agitado. As crianças não paravam de falar, queriam saber o porquê de eu estar ali. Apresentei-me para o grupo e sentei-me no fundo da sala para observar e ter as primeiras interações com as crianças, bem como me familiarizar com a rotina do grupo. No grupo de alunos, havia uma menina que ficava perambulando pela sala, cheia de livros. Então, resolveu mostra-me alguns deles, eram vários livros de histórias infantis, mas no meio daqueles livros, um era em especial, chamado, ―menina não entra‖, mostrava homens usando roupas de mulheres e mulheres usando roupas de homens. Essa menina percebeu esse fato e foi logo falando: —―olha aqui o homem vestindo roupa de mulher e a mulher vestindo roupa de homem, se ele vestir vai virar mulher”. Nota-se na fala da menina que esses conceitos que mostram como mulheres e homens devem ser portar na sociedade também são percebidos pelas crianças, ou seja, esta representação do mundo social é absorvida pela criança desde quando é bem pequena, às vezes, sem perceber, já está desenvolvendo esses comportamentos, na qual a construção de papéis femininos e masculinos se dá pelos padrões e regras estabelecidas na sociedade. Nesse sentido LOURO ( 1997, p. 23-24 ) nos mostra: A característica fundamentalmente social e relacional do conceito não deve, no entanto, levar a pensá-lo como se referindo às construções de papéis masculinos e femininos. Papéis seriam, basicamente, padrões ou regras arbitrarias que uma sociedade estabelece para os seus membros e definem seus, suas roupas, seus modos de se relacionar e de se portar... Através do aprendizado de papéis cada um/a deveria conhecer o que é adequado (e inadequado) para um homem e uma mulher numa determinada sociedade e responder a essas expectativas. Ainda que utilizada por muitos/as, essa concepção pode se mostrar redutora ou simplista. As crianças daquela sala eram bastante diferentes, como ―os quietinhos‖, ―os bagunceiros‖, ―as estudiosas‖, ―as faladeiras‖, ―os homenzinhos‖ que por sinal já tinham ―namoradinhas‖ ,bem como meninas 34 ―vaidosas‖ com cadernos da Hello Kitty2, mochilas da Barbie3, penal da Marie4 entre outros objetos usados pelas meninas, que por sinal são estipulados pela sociedade influenciada pela mídia. Deste modo, podemos dizer que os meios de comunicação ao utilizar meninas para divulgar marcas de bonecas, bolsas, maquiagens, e meninos para divulgar carrinhos, bicicletas, bolas, inserem o discurso camufladamente, padronizando relações culturais e sociais na qual as representações de comportamentos femininos e masculino se apresentam estereotipadas. Assim, percebe-se que a mídia tem grande influência nas questões relacionadas ao gênero, pois está a todo momento repassando as pessoas modos de proceder, como o que comprar, o que vestir, o que comer, direcionar padrões estéticos e de beleza. Tendo grande poder, inserem padrões de diferenciação estipulando objetos e roupas para ambos os sexos. Como afirma SABAT (apud LOURO; NECKEL E GOELLNER, 2003, p. 154). Se, ainda que inicialmente, lançarmos um olhar comparativo aos anúncios publicitários que nos são apresentados diariamente através da mídia, observamos que eles estão marcados por representações acerca das relações de gênero, apresentando sexualidades, modos de comportamento, tipos de corpos, diferentes estilos de vida. Retomando a observação, a professora propôs aos alunos uma brincadeira do silêncio, justamente porque as crianças daquele grupo eram muito agitadas. Esse jogo tinha o objetivo de a criança escolher um colega que estivesse quieto para ir embora e assim sucessivamente. Quando as meninas estavam no comando da brincadeira, só escolhiam meninas, isso também acontecia com os meninos. Assim, essas diferenças se apresentavam no cotidiano da sala, de forma com que meninos e meninas não se misturem 2 A Hello Kitty foi criada pelo designer da Sanrio, Yuko Shimizu, em 1974. Nasceu em pequenos artigos para garotas e consequentemente se desenvolveu também da mesma forma. A Sanrio lança todos os anos uma série de artigos com a Hello Kitty, incluindo bolsas, cadernos, agendas, fichários, bijuterias, adesivos e muitos mais. http://dicionario.sensagent.com. 3 A Barbie foi criada por Ruth Handler e o seu marido Elliot em 1959, que tinham uma filha de nome Barbara. Observavam Barbara que brincava apenas com bonecas bebês quando criança. A garota era apaixonada por bonecas. Quando cresceu, já pré-adolescente, seu pai observou que Barbara ainda brincava com as suas bonecas. Então, a sua mãe, Ruth Handler, teve a ideia de criar uma boneca adolescente. http://pt.wikipedia.org. 4 Marie é uma personagem do filme Os Aristogatos. Ela é uma gatinha branca peluda, que é o filho do meio de Duquesa e irmã mais velha de Berlioz e da irmã mais nova de Toulouse. Marie tem um revestimento macio branco e olhos azuis. Ela tem um laço cor de rosa amarrado no pescoço, e outro ,menor laço rosa na cabeça entre as orelhas. http://translate.google.com.br 35 formando grupos e amizades de ambos os sexos. Entretanto, há as meninas que se acertam melhor com os meninos. Mas nesse grupo somente uma menina se dava bem com menino. Desta forma fica visível que as crianças daquele grupo apresentam diferenciações pelas posturas das relações de gênero e, sem perceber, mantêm comportamentos, costumes e hábitos na qual deixam suas relações de amizade e brincadeiras marcadas pela presença de estereótipos mantidos pela sociedade e cultura em que estão inseridos. Segundo LOURO (1997, p.63), isto se dá porque: São, pois, as práticas rotineiras e comuns, os gestos e as palavras banalizados que precisam se tornar alvos de atenção renovada, de questionamento e, em especial, de desconfiança. A tarefa mais urgente talvez seja exatamente essa: desconfiar do que é tomado como ―natural‖. Afinal, é ―natural‖ que meninos e meninas se separem na escola, para os trabalhos de grupos e para as filas? É preciso aceitar que ―naturalmente‖ a escolha dos brinquedos seja diferenciada segundo o sexo? Logo, não basta professores inserir nos seus discursos a igualdade de gênero entre meninos e meninas como uma ―realidade‖, mas sim refletir sobre as práticas que estamos realizando para que a diferença seja respeitada no ambiente escolar, bem como observar as diferentes formas que as crianças têm em ser e agir, sendo nas brincadeiras e atividades rotineiras comuns do cotidiano. 4.1.2 Por que não está brincando de futebol, menino? Não gosto de futebol, só de vôlei Ao dia vinte e quatro do mês de agosto de dois mil e dez, fui recebida no campo de observação pela professora regente, assim me apresentei-me para o grupo. A professora propôs que as crianças se apresentassem o que mostrou que as crianças são muito participativas e carinhosas, pois logo que cheguei receberam-me com ―oi, beijos e abraços‖. Durante a observação constatou-se, que a sala estava com as carteiras organizadas em grupos, em que os meninos sentavam com meninos e meninas com meninas, não havia interação entre eles. Em seguida, verificouse que esse agrupamento se deu pela amizade que eles têm, pois ao fazer às 36 atividades as meninas conversam sobre alguns desenhos que viram na televisão e os meninos já conversam sobre outras coisas como novos jogos para videogame e um desenho chamado super- onze5 que conta a história de Endou um menino apaixonado por futebol. Observou-se, porém que no recreio as distinções de gênero se faziam mais presentes. Meninos se destacam nesses momentos brincando com brincadeiras como pega-pega, lutinha, garrafão. Já as meninas, ficavam mais quietinhas algumas ficavam conversando outras levavam brinquedos como bonecas, figurinhas de personagens de desenhos, pulavam corda e brincavam de amarelinha. Logo, não posso deixar de explicitar também a agitação de algumas meninas no recreio, pois elas brincam de correr com os meninos, mostrando que nem todas as meninas são quietinhas e comportadas. Nesse contexto, AUAD (2003, p.11) nos mostra como meninos e meninas se diferenciam no recreio: Ocupação diferenciada de pátios e quadra pelos meninos e meninas. Isso ocorria no recreio, quando os meninos ocupavam dois pátios e uma quadra para jogarem futebol. Quanto às meninas, estas ocupavam os cantos laterais do pátio, ao pularem elástico, corda e ao conversarem. Existiam jogos mistos, mas vale notar que os meninos sempre estavam em todos os jogos de movimento, ao passo que as únicas atividades do recreio que não implicavam corrida e amplos movimentos, como passear e conversar, eram desempenhadas apenas por meninas. Além disso, deparei-me com tentativas de meninas participarem das brincadeiras de meninos, no qual os mesmos se achavam donos do espaço e das brincadeiras, não deixando as meninas participarem alegando que elas podiam machucar-se. Entretanto também se notou que alguns meninos não gostavam de correr e até mesmo jogar futebol. Cabe então pensar, que essas relações mantêm estereótipo social, pois esses comportamentos de controle dos meninos sobre as meninas é algo que transcende nos olhares da sociedade, pois se espera das crianças algumas 5 Super onze é um desenho que passa na programação da Rede TV, que conta a história do personagem Endou “goleiro” que é o neto de um dos maiores goleiros do Japão e está em busca de amigos para formar o melhor time de futebol já existente. http://www.jogosonlinegratis.org/jogosonline/jogos-dosuper-onze. 37 habilidades, e que por sinal são diferentes. Logo, FINCO (2010, p. 126) esclarece: Os significados de gênero-habilidades, identidades e modos de ser – são socialmente configurados, impressos no corpo de meninos e meninas de acordo com as expectativas de uma determinada sociedade. Se, por um lado, é possível observar o controle da agressividade na menina, o menino sofre processo semelhante, mas em outra direção: nele são bloqueadas expressões de sentimentos como ternura, sensibilidade e carinho. Após o recreio, fomos para a sala de aula. Com a chegada da professora de educação física, as crianças ficaram eufóricas, queriam terminar de copiar a matéria para logo descer para o pátio. Ao irem para o pátio as crianças mudam o comportamento e logo saem correndo, ficam gritando. Percebeu-se que ficam mais a vontade sem a presença da educadora. A professora deixou livre a educação física, logo os meninos pegaram a bola e foram jogar futebol, bem como as meninas pegaram o bambolê, corda e foram brincar. Em seguida, observou-se um menino tentando brincar com as meninas, mas fora ignorado. Foi então quando perguntou-se á ele: Por que não está brincando de futebol? E ele falou: não gosto de futebol, só de vôlei. A menina que estava do meu lado escutou a pergunta e logo falou no meu ouvido: ele é assim mesmo só que ficar com as meninas, parece ser bichinha. (OBSERVAÇÃO, 24/08/2010) Desta maneira, ficou claro que, há entre as crianças a utilização de discursos, estereotipados em relação ao que deve ser brincadeira, ação de menina e menino, e que elas muitas vezes, reproduzem o discurso de separação de gênero, imposto na sociedade. Nesse sentido FINCO (2010, p.125) coloca: Meninos e meninas desenvolvem seus comportamentos e potencialidades a fim de corresponder às expectativas de um modo singular e unívoco de masculinidade e de feminilidade em nossa sociedade. Muitas vezes instituições como família, creches e préescolas orientam e reforçam habilidades específicas para cada sexo, transmitindo expectativas quanto ao tipo de desempenho intelectual considerado ―mais adequado‖, manipulando recompensas e sanções sempre que tais expectativas são ou não satisfeitas. Sendo assim, a escola junto com a família, deve buscar desenvolver diálogos com as crianças para quebrar com tabus em relação às expectativas 38 para os sexos femininos e masculinos, ou seja, possibilitar que meninos e meninas se orientem da maneira que se sentirem melhor. 4.1.3 Menina também briga Ao dia vinte e seis do mês de agosto de dois mil e dez, diferente dos outros dias as crianças foram para a biblioteca, pois estavam fazendo um projeto de troca de livros. Assim, quando chegamos à biblioteca tinha uma mesa cheia de livro na qual as crianças tinham que trocar o seu livro antigo por um novo. Observou-se que os meninos só pegavam livros que tinham homens como personagem principal, e principalmente quando esse era Herói. Já as meninas se encantavam por quaisquer livros, sendo eles com personagens masculinos ou femininos, não davam preferência. No entanto, observou-se que algumas meninas davam preferência aos livros com histórias de fadas, príncipes e princesas, como por exemplo, A cinderela, Rapunzel, A bela adormecida, entre outras histórias que sigam essa linha de conto. Ao ir para o recreio, deparei-me com uma cena nada normal, uma menina e um menino se batendo, o menino puxava o cabelo da menina até no chão. Após a chamada de atenção dos mesmos, a menina bem tranquila, fala assim: —―ele tá merecendo essa lição prof porque ele é muito folgado só sabe brigar com os outros‖, E o menino foi saindo de perto como se nada tivesse acontecido. Esperou-se que a menina fosse chorar, por pensar que ela é mais frágil que o menino, mas isso não aconteceu. Então, quem chorou foi o garotinho, que estava muito nervoso, pois estava com medo de levarmos a diretora. Como expõe RIBEIRO, SALGUEIRO: Pode ser que encontremos meninos mais valentes e corajosos. E outros menos valentes, só com um pouquinho de coragem. RIBEIRO; SALGUEIRO (1990 p16-17.) Algumas pessoas pensam que ser menina significa ser fraquinha, não saber nem brigar. Engano. Existe muita menina valente e brigona – e ela não deixa de ser menina por isso. Assim como muitos meninos se defendem, brigando, muitas meninas têm que se defender . RIBEIRO;SALGUEIRO (1990,p.42). 39 Assim, novamente a questão de gênero se faz presente na hora do recreio, pois se esperam do sexo feminino docilidade, fragilidade e meiguice, bem como nunca se espera que uma menina entre numa briga, pois para o comportamento feminino isso não é adequado. Entretanto, há meninos medrosos, e dos meninos se espera bravura e coragem. Dessa forma, iremos encontrar esses comportamentos de pessoa para pessoa, e não por ser menina ou menino. 4.1.4 Respeitando as diferenças Ao dia trinta do mês de agosto de dois mil e dez, ao chegar à sala de aula como sempre fui recebida pelas crianças com muita alegria. Logo que passou a agitação das crianças com a nossa presença, a professora da sala começou um debate com as crianças lembrando um fato que ocorreu com a aluna P. no dia anterior na aula de educação física, em que alguns colegas a chamaram de ―lerda‖, fazendo a menina chorar, e ficar muito triste com o acontecido. No diálogo, a professora falava sobre algumas questões abordando as diferenças, bem como o respeito aos outros, mostrando para as crianças que cada um tem o seu tempo de aprender, uns são mais rápidos outros mais lentos. Nesse sentido o PCN´S afirma: O discernimento é indispensável, de maneira particular, quando ocorrem situações de discriminação no cotidiano da escola. Enfrentar adequadamente o ocorrido significa tanto não escapar para evasivas quando não resvalar para o tom de acusação. Se o professor se cala, ou trata do ocorrido de maneira ambígua, estará reforçando o problema social; se acusado, pode criar sofrimento, rancor e ressentimento. Assim, discernir o ocorrido, no convívio, é tratar com firmeza a ação discriminatória, esclarecendo o que é o respeito mútuo, como se pratica a solidariedade, buscando alguma atividade que possa exemplificar o que diz, com algo que faça, junto com seus alunos. (BRASIL, 2000, p.55) Assim, essa visão da professora com as questões de diferenças nos faz pensar que deveríamos falar com as crianças no decorrer de cada dia, não somente quando essas situações ocorrerem, pois se trabalharmos essas questões com meninos e meninas os mesmos respeitaram os colegas, bem como todas as pessoas que estiverem ao seu redor. 40 Logo, depois da conversa a professora começou a passar o conteúdo que estava previsto para o dia, no qual seria trabalhada a matemática. Colocou algumas contas no quadro para os alunos resolverem, foi então que se observou que alguns apresentavam dificuldades em responder. A professora colocou aqueles que já sabiam fazer com os que tinham dificuldades. Notou-se que a professora colocou os meninos para ajudar meninos e, meninas para ajudar meninas, e depois foi ao fundo da sala falar conosco, no qual foi perguntado o porquê ela colocou meninos juntos com meninos e meninas juntas com meninas, para realizar á atividade, e ela logo respondeu: _“é porque eles já são amiguinhos facilita a comunicação e aprendizagem entre eles”. No entanto, sem perceber a professora criou situações em que as crianças se organizam de forma diferenciada, ou seja, possibilitando a criação de grupos distintos de meninos e meninas. É importante que o educador tome cuidado com essas questões, pois o comportamento do educador pode influenciar os alunos, bem como incentivar ainda, mas a diferença entre os sexos. 4.1.5 “A minha BARBIE é mais bonita que esse boneco que tu trouxe” Ao dia dois do mês de setembro de dois mil e dez, ao chegar à sala de aula, constatou-se algo diferente, pois a professora da sala deixou os alunos trazer brinquedos de suas casas, para ter uma aula diferenciada, ou seja, naquele dia eles poderiam brincar com os seus próprios brinquedos. Observou-se quando as crianças começaram a pegar os brinquedos das suas mochilas, os meninos trouxeram carrinhos, bolinha de gude, figurinhas, bola, e bonecos de Super-Heróis como, por exemplo: Batman, Super-Homem, Max stell entre outros. Já as meninas trouxeram BARBIE, Boneca, loucinha e elástico. Ao longo das brincadeiras com os brinquedos trazidos pelas crianças, escutou-se uma das meninas falando para um dos meninos assim: 41 —―A minha BARBIE é mais bonita que esse boneco que tu trouxe” e na mesma hora o menino respondeu “não tem graça essas bonecas, prefiro o meu boneco forte e corajoso”. Esse momento fez-me refletir sobre os conceitos que a cultura coloca em relação aos brinquedos tidos para meninos e meninas, fazendo com que as crianças reproduzem com os próprios instrumentos de brincar, práticas sociais de distinções e desigualdades de gênero. Como afirma RAEL ( apud LOURO 1998, p.87): São múltiplas as praticas sociais, as instituições e os discursos que cercam os sujeitos, produzindo e reproduzindo identidades, produzindo e reproduzindo diferenças, distinções e desigualdades. Desta forma, sabemos que esses brinquedos na maioria das vezes são vistos na televisão pelas crianças, no qual os mesmos seguem a risca o que está na moda, pedindo para seus pais brinquedos relacionados ao seu sexo, reproduzindo assim comportamentos influenciados pela mídia. A Televisão faz vários programas direcionados para crianças e jovens, como afirma ROCHA (apud TEIXEIRA 2010, p.59): A TV é um dos principais meios de entretenimento da população brasileira. Praticamente todos os lares têm televisão. E são vários os programas, direcionados para vários públicos: novelas, telejornais, desenhos animados, filmes. Pode-se dizer então, que o educador ao trabalhar com o dia do brinquedo, deve propor para meninos e meninas contato com outros instrumentos do brincar que não sejam usados por eles no seu cotidiano, da mesma forma considerar que as crianças possuem alguns conceitos estabelecidos pela sociedade em relação ao brinquedo, e então mediar questões de diferenciação com essas crianças. 4.1.6 Rosa e azul é de menino ou de menina? Ao dia quinze do mês de setembro de dois mil e dez, fui recebida pelas crianças com uma grande agitação, pois queriam falar da programação que teria na escola, na qual seria passado um filme no auditório para todas as crianças. Em seguida, a professora disponibilizou um desenho de um urso articulando, no qual as crianças tinham que pintar e montar o urso em uma 42 folha branca, quem terminasse deveria inventar um nome para o urso e fazer uma frase com as características do ursinho. Verificou-se que nesta atividade as crianças obtiveram concentração e criatividade para forma frases, bem como observou-se que ao pintar os meninos usavam as cores com um tom, mas forte como, por exemplo: marrom, azul marinho, verde e preto. Já as meninas, pintavam os ursinhos de cor rosa, de amarelo, laranja, vermelho e roxo. Dessa maneira fica claro que as cores também são influenciadas pela cultura que prega que o rosa é de menina e azul de menino, pois ao nascermos os pais já escolhem as cores para o enxoval em relação ao sexo da criança. Nesse sentido CARVALHO; COSTA; MELO (2008 p.4) coloca: De fato, numa sociedade/cultura organizada por relações de sexo e gênero, o enxoval cor de rosa ou azul, a escolha do nome e as expectativas dos adultos já atribuem o gênero de uma criança mesmo antes do nascimento. Ao perguntar para uma das meninas da sala o porquê ela estava pintando o ursinho de rosa a mesma respondeu: —“fica mais bonito de rosa prof, porque pintar a blusa de azul é feio não combina”. No entanto quando eles estavam pintando, notou-se que os meninos e meninas se privaram ao escolher as cores que gostam. Pode ser, talvez porque escutam nas suas casas e até em rodinha de amizades que rosa é de menina e azul é de menino. Após o termino da atividade as crianças foram para o auditório, assistir ao filme caçador de dragões disponibilizado pela direção para todos os alunos das séries inicias. No decorrer do filme, notou-se que as crianças estavam agitadas por estarem sem a presença da professora regente, que estava em uma reunião com a direção do colégio. E quando estava no auditório observouse que as meninas ficaram distantes dos meninos, porque os meninos faziam muita bagunça e isso as deixava bem chateadas, pois elas queriam assistir ao filme. 43 4.2 INTERVENÇÃO 4.2.1 Iniciando o caminho com Meninos e Meninas Ao dia dezesseis do mês de setembro de dois mil e dez, começou o primeiro dia de intervenção, no qual estávamos repletas de expectativas para esse momento, pois a turma se mostrava com grande ansiedade para começar dar aula. Então, iniciou-se a intervenção com uma breve conversa com o grupo expondo que a partir daquele dia, seriam dadas algumas aulas e que o tema a ser trabalhado seria relação de gênero. Salientou-se com as crianças que esse tema se deu a partir das observações, nos dias que estava presente em sala de aula. As crianças ficaram bem alegres e empolgadas com as propostas que estava apresentando, GP falou “até que enfim você vai da aula”. Desta forma, pediu-se para o grupo sentar em roda e, após a acomodação de todos, iniciou-se a leitura do livro ―O Menino Nito‖6 da autora Sonia Rosa (1995), que contava a história de um menino que tinha medo de chorar, pois seu pai sempre falou que homem não chora, e por sempre pensar nessas palavras que seu pai dizia, guardou o choro e ficou doente. Então parou no hospital. O médico logo descobriu por que o menino Nito estava quieto. Era choro engolido. Falou para ele que a partir daquele dia deveria chorar. Depois disso, o menino Nito, pôs-se a chorar dias e dias fazendo um riacho com o seu choro. No meio da leitura as crianças interrompiam fazendo perguntas como: o que vai acontecer com o menino Nito? Menino chora. As crianças se mostravam bem concentradas na leitura. Ao término da leitura do livro fizemos a socialização com as crianças, pedindo para elas falarem o que entenderam e se tinha alguém parecido com o menino Nito da história. Todos queriam responder, foi aquele alvoroço. As falas mais recorrentes por parte dos meninos foram “quando a minha mãe me coloca de castigo eu choro” ou “quando eu me machuco eu choro” já as falas das meninas foram “todo mundo chora”. 6 ROSA, Sonia. O menino Nito. Pallas 1995. 44 Durante ao diálogo, discutimos com as crianças outros conceitos que se relacionam com essas diferenças, como se azul e de menina ou de menino, e muitos responderam que é dos dois, as brincadeiras de menino e menina também foram perguntados e as crianças responderam que pular corda e boneca é de menina, já futebol e pião é de menino. Logo, finalizamos indagando as crianças, se choramos apenas quando estamos tristes ou com raiva, foi então quando o B respondeu: — ―meu pai chora quando tá triste e alegre” e a R também falou “minha mãe chora quando está cortando cebola, e ela não tá triste”. Com isso, percebeu-se que a conversa em roda foi proveitosa para as crianças, pois alguns pontos desse diálogo chamaram a atenção, como os aspectos relacionados aos comportamentos, os brinquedos e brincadeiras de meninos e meninas bem como as tarefas, sentimentos e vestuários das crianças observadas. Depois do diálogo sobre o livro, uma atividade foi feita. As crianças tinham que colocar nas colunas o tipo de vestuário que os meninos e meninas usam. Depois que todos terminaram cada um foi no quadro colocar nas colunas a demonstração da atividade, destacando os vestuários que eles achavam que seria de menino e menina. Notou-se que os meninos colocaram nas colunas das meninas os seguintes vestuários: saia, calcinha, casaco, brinco, vestido, tênis, short, arco, cinto, blusa e óculos. Já as meninas, colocaram nas colunas dos meninos: casaco, cueca, boné, tênis, blusa, calça, cinto e short. Essa atividade também mostrou que eles colocaram alguns vestuários somente para cada sexo como calcinha, brinco somente as meninas usam e cueca, boné somente os meninos. Desta forma ficou evidente que nessa primeira intervenção meninos e meninas ainda estão muito ligados pelas diferenças e relações de gênero existentes entre os sexos, expondo a todo o momento nas suas falas os seus diferentes pensamentos e conceitos em relação as suas vivências do dia a dia. 45 Figura 1: Meninos e Meninas e suas relações. FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 16/09/2020). Entende-se que o educador ao trabalhar com as relações de gênero, deve proporcionar aos educandos, exercícios e atividades de forma lúdica, partindo de questões presentes no seu dia-a-dia, onde assim a compreensão se torna mais fácil e coerente, além de usar de estratégias, desenvolvendo trabalhos em grupos na quais meninos e meninas possam juntos perceber as diferenças e assim desmistificar alguns padrões que a sociedade impõe. 4.2.2 Quebrando com as Diferenças. Ao dia vinte e um do mês de setembro de dois mil e dez, iniciou-se a aula conversando com as crianças sobre o que faríamos naquele dia, pediu-se para que eles se dividissem por sexo para aplicar a atividade, ficando os meninos de um lado da sala e as meninas do outro. As crianças se mostraram entusiasmadas para o começo da atividade. Dessa maneira, a intenção dessa atividade, não é separar as crianças por sexo e sim discutir as diferenças com o grupo, fazendo com que meninas e meninos demostrem nos bonecos seus conceitos e visões que têm em relação ao outro sexo, seja ele feminino ou masculino. Logo, quando estava todos em seus devidos lugares meninos de um lado e meninas de outro fizemos uma votação na qual uma menina e um menino de cada grupo ficavam deitados no papel pardo para os colegas copiar o seu corpo para depois montar com as características de ambos os sexos. Os 46 meninos ficaram responsáveis em criar uma menina e as meninas em criar os meninos. No desenvolver da atividade surgiram varias sugestões e dicas das crianças para montar os bonecos, como a: — “tem colocar nas bochechas das meninas aquela coisinha rosa” P “Não vamos colocar short no boneco porque vai ficar parecido com as meninas”. Enquanto indagávamos a as crianças respeito das estavam confeccionando diferenças entre os bonecos meninos/homens e meninas/mulheres, apontando para algumas questões relevantes que na maioria das vezes mantêm estereótipos nas falas das crianças como algumas falas que se deram no decorrer da atividade: —“menina tem cabelo comprido e menino não”, “menino usa azul” e “menino têm pelo no rosto a minha não”. Através da atividade, notou-se que as crianças carregam a visão ―adultocêntrica‖, que faz com que internalizem alguns conceitos e padrões vistos pelos adultos, como na construção dos bonecos, isso porque os meninos colocaram na boneca das meninas saia curta, sapato alto, Baton, brinco, unhas da mão pintadas. Já as meninas, colocaram no boneco dos meninos tênis, boné, short, camiseta e fizeram ele com a aparência de forte, mostrando o traço bem masculinizado. No decorrer da atividade uma menina foi até o grupo dos meninos e disse: —“vocês não vão colocar óculos na menina? E eles disseram: Não a nossa não usa, e a mesma menina falou: mas eu uso e sou menina então tem que colocar”. Dessa forma, utilizaram-se desenhos dos corpos de um menino e uma menina para observar como eram visto pelos meninos e meninas alguns conceitos como corpo, brincadeiras e características de homens/mulheres. Ao voltar do recreio, foi dado continuidade à atividade, fazendo uma votação, no qual foi pedido para as crianças escolherem o nome para os bonecos e colocar algumas características dando perfil para os bonecos, como cor preferida, profissão e brincadeiras que mais gosta. Logo, que terminaram os meninos apresentaram para as meninas a boneca que eles tinham feito, que se chamava Fernanda que gostava da cor azul e também gosta de brincar de 47 esconde-esconde, as meninas apresentaram o boneco Willian que gosta de futebol e vídeo game. Figura 2: A construção dos amigos Fernanda e William. FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 21/09/2010). A tarde passou muito rápido, mais foi muito proveitosa, pois cumprira-se o planejamento respeitando o tempo das crianças. Além disso, o grupo foi acolhedor e carinhoso, participando das atividades e junto com meninos e meninas se percebia a interação. Verificou-se que as crianças quase não trabalhavam em grupo e essa atividade trouxe um maior entrosamento com alguns colegas, pois os meninos observam as meninas e as meninas observam os meninos para poder construir os bonecos. Além de conseguir observar as visões das crianças em torno das roupas, das cores, dos serviços que homens e mulheres utilizam no cotidiano. Foi notório o desenvolvimento junto às crianças com um olhar sensível diante das diferentes formas de ser, discutindo as diferenças entre meninos/homens e meninas/mulheres, procurando desconstruir preconceitos e tabus existentes na sociedade e por consequente no ambiente escolar. 4.2.3 A construção da História: “A tristeza do Amor” 48 Ao dia vinte e dois do mês de setembro de dois mil e dez, iniciou-se a intervenção dando continuidade à atividade de criação dos bonecos cujo nome foi dado pelas crianças de Fernanda e Willian. Colocaram-se os bonecos feitos com papel pardo na parede, em seguida dialogou-se com as crianças perguntando o que eles tinham achado da atividade dos bonecos se eles lembravam os nomes e as características de cada boneco que foi construído. Ficamos surpresas com as crianças, pois reagiram da melhor forma possível, queriam mostra para os colegas que faltaram, os bonecos que construíram, informando para os amigos que eles tinham colocado nome, dado a profissão e até escolhido a brincadeira preferida. Logo, propõe-se para as crianças fazer uma história para os dois bonecos. Em três e três, olharam os bonecos, sendo que os meninos observavam o boneco feito pelas meninas bem como as meninas observavam o boneco feito pelos meninos. Depois que as crianças analisaram os bonecos, começamos a narrar à história, foi então àquela euforia todos queriam falar no mesmo momento, só que combinamos que seria um por vez e que começaria com o aluno GP. Começou-se a história com a frase era uma vez no quadro e as crianças completavam com as suas falas. Um de cada vez sentado em sua mesa dava continuidade à história. Dessa maneira, aconselhei que as crianças expressassem o que tinham vontade de falar, o que era mais significativo para cada uma deles. Notou-se que nesse momento as crianças ficavam ansiosas para falar, o que deixava o restante do grupo na expectativa e inquietos para chegar a sua vez. Ao final da construção da história, lemos todos juntos e escolhemos um título que foi dado pelas crianças como: ―A tristeza do Amor‖. ―A Tristeza do Amor‖ Era uma vez uma menina rica e um menino pobre. A menina se chamava Fernanda e o menino William. A menina comprou um carro e o menino ajudou a escolher um carro, corsa da Chevrolet, a menina agradeceu e ofereceu dinheiro e ele disse: não obrigado. A menina ficou pobre e perdeu tudo. O menino gostava de azul e a menina de rosa, o menino conheceu a Fernanda na aula. O menino gosta de festa e convidou ela sair. O menino gostava da menina e eles não tinham as cores em comum. Ela não queria ir à festa com ele. O menino gostava de sair com ela para todos os lugares. O menino levou a menina num restaurante muito chique, e ficaram até a noite acabar. O menino e a menina se beijaram, os dois brincaram de 49 pega-pega. O menino e a menina ficaram namorados. O menino sofreu um acidente de carro. O menino colocou fogo na casa da menina e ela ficou queimada. A menina ficou viva e foi para cada da mãe dela. Ela matou o homem. A menina ficou triste de tanto triste colocou a faca no coração, e foi para o hospital e conseguiu tirar a faca do coração e voltou a fica viva. Figura 3 “A Tristeza do Amor”. FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 22/09/2010). Dessa forma, notaram-se na história algumas falas das crianças que mostram bem a visão ―adulcêntrica‖ em relação aos comportamentos esperados para meninos e meninas, como por exemplo, quando eles falam em namorar, sair para restaurantes chiques e até mesmo no ter muito dinheiro (pobre/rico). Esses conceitos se dão porque na maioria das vezes as crianças escutam de familiares, pessoas que estão em seus cotidianos. Essa mistura da visão da criança com o que o adulto aponta fica explícita nessa fala da história: —“O menino e a menina se beijaram, os dois brincaram de pega-pega”, Percebeu-se que no mesmo tempo em que eles colocam que os dois estão se beijando eles também brincam de pega-pega, essa linguagem denota que as crianças estão influenciadas pela visão ―adulcêntrica‖ em que a sociedade os coloca. 50 O intuito dessa intervenção era discutir no grande grupo as questões de gênero, ampliando o repertório das crianças em relação as suas vivências com os colegas sendo eles meninos e meninas. Além de desmitificar alguns conceitos que algumas crianças têm em relação ao sexo oposto. No entanto, observou-se que essa atividade estimulou meninos e meninas a dar as suas opiniões e respeitar as opiniões dos amigos, pois ressaltou-se junto com o grupo o respeito que devemos ter aos momentos de ouvir e manifestar as opiniões. Além disso, conseguiu-se trabalhar a questão das diferenças com as crianças, socializando com o grupo o fato de todos serem diferentes, tanto fisicamente quanto em seus comportamentos, com isso percebeu-se que meninos e meninas se relacionaram melhor. Como sempre o empenho da turma só aumenta a cada intervenção, pois meninos e meninas se mostram comprometidos ao realizar as atividades propostas. 4.2.4 Brincando e descontruindo estereótipos Ao dia vinte e oito do mês de setembro de dois mil e dez, ao entrar em sala de aula as crianças correram para falar com a professora. Então percebeu-se que eles estavam gostando da minha presença em seus cotidianos e também do tema que estou abordando em nossas intervenções, pois uns dos meninos veio falar que seu pai colocou brinco na orelha, e explicou esse fato dizendo: — “prof sabia que meu pai disse que menino também pode usar brinco”. Com essa fala, notou-se que as crianças estão se familiarizando com o tema que está sendo proposto. Em seguida, iniciou-se a conversa sobre o que iriamos trabalhar ao longo do dia, pedindo a colaboração do grupo, pois seria passado um filme que precisaria de silêncio, para todos conseguirem assistir. Quando todos estavam sentados apresentou-se para as crianças o filme que seria passado cujo nome é: Cine Gibi quatro turmas da Mônica meninos e meninas7, na qual contêm 7 Turma da Mônica em Cine Gibi 4 – Meninos e Meninas, a turminha está de volta em mais um super sucesso, cheio de planos infalíveis e muitas coelhadas! São sete episódios muito divertidos para toda a criançada! http://blockbusteronline.com.br 51 sete episódios sendo eles: Mônica, a famosa; Para não apanhar da Mônica (de novo); Venha a minha Festinha; Brincando De boneca; Os brincos novos que a mamãe comprou; Os cinco fios mágicos; A nova Babá. Contudo, são histórias que trabalham as relações de meninos e meninas nas vivências do cotidiano, como por exemplo, nas brincadeiras na qual boneca é exclusividade das meninas e o cascão personagem do filme é primeiramente obrigado a brincar com a Magali de boneca, e depois brincando e percebendo que menino pode sim experimentar e brincar de boneca ele se envolve e se entrega no prazer da brincadeira. Logo, as crianças colaboraram com a aula de vídeo, ficando todos quietos prestando atenção no filme. Dessa forma, após verem o vídeo socializamos com as crianças algumas situações do filme que deveriam ser discutidas com as crianças, como por exemplo, a questão dos brinquedos e brincadeiras, a relação de amizade entre meninos e meninas e algumas questões de comportamentos que são esperadas para meninos e meninas. Durante o debate instigou-se as crianças com falas dizendo que as meninas e meninos podem brincar e andar juntos. Além disso, comentou-se com o grupo que eles possuem algumas habilidades que os diferenciam, mas que isso é algo natural, pois os sexos femininos e masculinos têm caráter biológico diferente, mas mesmo assim as falas mais recorrentes por parte dos meninos foram: —“Menino não pode brincar de boneca, porque isso é coisa de menina” ou “as meninas não sabem jogar bola”. Já as meninas não ligam para essas diferenças como podemos observar nas falas delas: —“Eu deixo o meu irmão brinca comigo, mas ele nunca deixa eu brinca com ele, prof”. Dando continuidade, levou-se o grupo no pátio do colégio para aplicar a atividade do brinquedo. Ao chegar ao pátio pedi para eles ficarem fila, pois seriam disponibilizados alguns brinquedos tidos para meninos e meninas como corda, pião, skate e elástico, bem como foi informado para as crianças que todos iriam experimentar as brincadeiras. Percebeu-se que a conversa que estava tendo sobre os brinquedos tinha ficado confusa devido á grande 52 agitação de alguns meninos, na qual a principal indagação era que eles não iriam pular elástico, porque era coisa de menina. Desta maneira, tive que pedir para um menino se candidatar a pular corda, para mostrar para os outros meninos que não tinha nada de mais brincar, e que era muito bom essa brincadeira. Logo depois desse episódio, peguei a corda e fiz uma roda com as crianças, na qual foi solicitado para uma menina começar a pular corda mostrando para os meninos como se brinca, e dando continuidade, foi o menino que se candidatou a pular. Logo, quando ele pulou corda os meninos que não queriam brincar notaram que não tinha nada de mais e pediram para participar. Com isso, todas as crianças participaram das brincadeiras, acontecendo assim em todos os brinquedos. Foi tão bom que ficamos duas aulas no pátio, todas as crianças participaram, sem exceção. Os meninos participaram das brincadeiras tidas para meninas e as meninas participaram das brincadeiras tidas para os meninos. Notou-se que nessas brincadeiras as falas das crianças foram positivas, pois vieram alguns meninos dizendo: — “prof, eu gostei de pular elástico sabia”. Figura 4 Brincando com meninas e meninos na sala de aula. FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 28/09/2010). Essa atividade foi muito importante para esse grupo, pois eles tinham uma grande dificuldade em trabalhar em equipe, bem como estão arraigados pelas diferenças nos comportamentos tidos para meninos e meninas. 53 Ao voltarmos para a sala de aula, pediu-se para as crianças fazerem um desenho da brincadeira que mais gostaram, teve alguns meninos que desenharam a corda e elástico. E meninas que desenharam o pião. Da mesma maneira que tevê meninos que desenharam pião e meninas que desenharam elástico. Sendo assim, essa atividade teve intuito de dispor brinquedos tidos para meninos e meninas para que eles pusessem descontruir e saber que brincar com certos brinquedos pode ser prazeroso para ambos os sexos. 4.2.5 Visões de Meninos e Meninas em relação ao mundo. Ao dia trinta do mês de setembro de dois mil e dez, iniciou-se a conversa dividindo a sala em três grupos, sendo que esses grupos estavam agrupados com meninas e meninos. Ao começar separando os grupinhos de meninos e meninas, notou-se que eles não gostaram muito da ideia, pois queriam ficar com os colegas que tinham, mas contato e amizade, mas no decorrer da atividade foram se entrosando. Foram entregues para as equipes partes da história construída por eles mesmos, na terceira intervenção, e pedi para cada grupo, escrever na cartolina dada um trecho da história e também solicitei que eles fizessem um desenho do que, mas chamou atenção nas frases que eles obtinham da história. Para depois juntarmos a produção dos três grupos e fazermos um livro. Quando todos terminaram apresentaram as partes da história para o grande grupo e explicaram tais desenhos. Dessa maneira percebeu-se que as crianças desenharam no livro o que achavam que devia aparecer da parte da história que foi dada para elas. O primeiro grupo desenhou um carro e uma menina com dinheiro, pois achou que essa parte era a, mas significativa do trecho que fala: “Era uma vez uma menina rica...A menina comprou um carro”, já o segundo grupo desenhou um menino e uma menina e ao lado o restaurante chique em festa, pois na parte que eles pegaram tinha trechos que denotavam a seguinte fala: “o menino levou a menina num restaurante chique e eles ficaram até a noite acabar”. E por fim o terceiro grupo desenhou uma casa pegando fogo e fora dela estava o menino segurando a faca e a menina ao lado, essa parte foi retirada do trecho 54 que falava a seguinte frase: “O menino colocou fogo na casa da menina... A menina ficou triste de tanto triste colocou a faca no coração”. Figura 5 Visões de meninos e meninas em relação ao mundo. FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 30/09/2010) Observou-se que as crianças têm uma grande imaginação e criatividade, pois colocaram de forma lúdica alguns pontos no qual a tragédia tem parte principal. Essa atividade tinha intuito de discutir com as crianças sobre as frases construídas da história, elencando as visões em que meninos e meninas têm dos sexos femininos e masculinos. Dando continuidade, foi aplicada uma atividade xerocada que era uma cruzadinha, na qual as crianças tinham que procurar as brincadeiras que eles achavam que seria de menino e menina, como por exemplo, bolinha de gude, pião, boneca, elástico, carrinho, corda, skate, bola. E depois colocar no quadro ao lado. Percebeu-se que essa atividade as crianças ficaram bem agitadas para terminar, pois eles adoram procurar as palavras na cruzadinha. 4.2.6 “O homem que pedi a mulher em casamento ele leva uma caixinha e se ajoelha e fala que casar comigo” Ao dia cinco do mês de outubro de dois mil e dez, entrou-se em sala triste, pois aquele dia seria o último da observação no campo, pois os objetivos 55 em relação à pesquisa já tinham sido alcançados. Da mesma forma também estava alegre, pois consegui concluir com êxito o que tinha previsto. Assim, comecei aquele dia apresentando a proposta de aula para as crianças, na qual iria fazer a contação da história do livro ―O príncipe cinderelo‖ da autora Babette Cole(2005) que conta8 a história de um menino que cuidava da casa e das roupas dos seus três irmãos, que por sinal eram ruins para ele. E certo dia tinha uma festa no reino e o príncipe cinderelo não podia ir, pois não tinha roupa adequada para ocasião, foi então que apareceu uma fada e ele fez um pedido e a fada o atendeu, mas falou que ele deveria chegar antes da meia noite, porque se isso não fosse feito o pedido seria desfeito, o príncipe cinderelo foi ao palácio chegando lá não pode ir a festa, pois a fadinha fez tudo errado com os pedidos do príncipe. Ele ficou muito triste e foi pegar um ônibus para ir embora, chegando lá se deparou com a princesa, ele estava muito feio e a princesa ficou com medo, só que como estava chegando à meia noite, o encanto se desfez e a princesa achou que foi o príncipe cinderelo que a ajudou, mas ele ficou muito assustado e correu, deixando suas calças no caminho. A princesa no outro dia correu em casa em casa para saber quem era dono daquelas calças, pois o dono se casaria com ela e seria o novo príncipe do reino. Figura 6 "O príncipe Cinderelo". FONTE: Tamires Regina Pedroso (observação 05/10/2010). 8 COLE, Babette. Príncipe Cinderelo. Martins, 2005. 56 Dessa maneira, constatou-se que as crianças paravam a leitura a todo o momento para fazer a comparação com a história da Cinderela, e as falas delas eram as seguintes: — ―prof eu conheço essa história só que é uma menina que é a cinderela‖ ou ―o homem que pedi a mulher em casamento ele leva uma caixinha e se ajoelha e fala que casar comigo‖. Em seguida, ao terminar de contar a história, dialogou-se com as crianças, perguntando para elas quais as profissões de homem e mulher, que eles reconhecem. Logo, as falas das crianças em relação às profissões foram: Doméstica, Policial, Bombeiro, Taxista, Alfaiate, Motorista, telefonista entre outros. Entretanto a profissão que chamou atenção foi que ao perguntar se Motorista de Ônibus é profissão de homem/mulher e a maioria deles afirmaram que era dos dois, pois já tinham pegado ônibus com mulheres dirigindo. Dando continuidade, foi oferecida uma folha branca para todas as crianças, e explicado que a atividade seria fazer um desenho para representar uma profissão de homem e uma de mulher, bem como escrever na folha a profissão escolhida. Verificou-se que a maioria das crianças colocava as profissões dos pais na atividade, como por exemplo, costureira, alfaiate, bombeiro, policial, secretária, motorista de ônibus, caminhoneiro entre outros. Assim que terminaram colaram os papéis que fizeram as profissões na cartolina que estava no quadro dividido por sexo, homem e mulher e por fim eles liam em voz alta a profissão que fizeram para os amigos. A observação de campo estava chegando ao fim, e já estava ficando triste, pois sabia que iria sentir saudades das risadas, das conversas, do carinho das crianças ao me receber, de tudo que aprendi com aquele grupo, da professora Eni Tasca que me recebeu da melhor forma possível, sendo paciente e generosa com as minhas propostas. Dessa forma, sabia que tudo que inicia, tem fim. Então chegou a hora avisei para as crianças que hoje seria nossa última aula, e eles disseram: — ―não acredito, agora que tava ficando bom”. Foi muito prazeroso dividir minhas tardes com essa turma que me ensinou muito. 57 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo da realização desta pesquisa, inúmeras questões foram se acentuando na discussão sobre questões de gênero. Pois, á princípio, as construções teóricas apontavam alguns direcionamentos e, na prática os caminhos mostravam o quanto ainda havia a ser realizado em sala de aula. Assim, pode-se dizer que a relação de gênero ocorre desde a mais tenra idade, pois mulheres e homens assumem papéis diferenciados na sociedade e reproduzem os elementos de vivência no contexto cultural em que estão inseridos. No qual comportamentos e padrões sociais são influenciados e seguidos pelos sexos, fazendo com que meninos e meninas se comportem de forma estereotipada. As relações de gênero se fazem presente no ambiente escolar, através das brincadeiras nas atividades e até mesmo na amizade entre meninos e meninas, fazendo com que os mesmos pensem ao escolher as brincadeiras e brinquedos que irão brincar, pois estes já estão rotulados. Diante das hipóteses colocadas para a realização deste trabalho, o objetivo principal foi alcançado, pois através da pesquisa inserem-se novas possibilidades de trabalho com as relações de gênero. O processo de relação de gênero no ambiente escolar é ainda pouco trabalhado com as crianças, merecendo maior atenção e preparo por parte da escola e de profissionais da educação. Não somente dos professores mais todos que fazem parte na comunidade escolar, ensinando e desmistificando com as crianças os comportamentos diferenciados para ambos os sexos. Necessita-se trabalhar as questões acerca das relações de gênero no ambiente escolar, para romper com os estereótipos construídos pela sociedade no decorrer dos anos, fazendo com que as crianças possam refletir sobre as diferenças dos sexos sem fazer opções nos seus comportamentos e gestos em seus cotidianos. Os profissionais da educação precisam esclarecer aos educandos, que a escola é constituída pelas diferenças e que meninos e meninas podem brincar e se relacionar de forma igual, pois cabe o professor trabalhar o respeito ao outro mostrando que os comportamentos que definem o ser menino/menina 58 não devem ser determinados e sim escolhidos por ambos. Percebeu-se que o convívio entre meninos e meninas estabelece algumas formas de se relacionar, muito influenciado pela sociedade e família, pois meninos e meninas seguem padrões de conduta ao escolher determinadas brincadeiras e objetos em sala de aula, enfocando sempre o ser homens/mulher o posso e não posso fazer. O caminho trilhado é longo, mas ao mesmo tempo gratificante. Os debates em sala de aula fazem pensar no quanto a mediação e a opinião das crianças é importante para a desconstrução de conceitos existentes na cultura da sociedade. O processo de ensino aprendizagem nos reserva inúmeras surpresas, pois aprendi e ensinei, e assim construí o conhecimento junto com as crianças. No inicio das observações de campo, meninos e meninas não se misturavam ao realizar atividades, em grupo em sala de aula, pois essa segregação era feita de forma tranquila pelas crianças, na qual os mesmos nem percebiam que não se misturavam. Essa relação de diferenciação acontecia mais acentuadamente na educação física, pois as meninas preferiam brincadeiras mais tranquilas, ou seja, que não exija muito esforço físico, como por exemplo: amarelinha, pular corda, elástico. Já os meninos preferiam brincadeiras mais agitadas como futebol, pega-pega, basquete. No decorrer das observações de campo, os comportamentos de meninos e meninas em relação ao gênero foram mudando, pois ao trabalhar com eles algumas questões como: as profissões de homens e mulheres; as brincadeiras tidas para meninos e meninas; as histórias infantis, os mesmos começaram a tomar conhecimento de algumas questões que até então não haviam sido discutidas e apresentadas. Pensar de forma diferente em relação a esses padrões em que a sociedade impõe, pois muitas vezes, os meninos se sentiam mais a vontade ao escolher brincadeiras que são tidas para meninas como pular corda, pois ao brincar até cantavam as músicas de roda. Da mesma forma acontecia com as meninas, pois quando iniciei a observação de campo, não brincavam de futebol, pois os meninos nunca as deixavam, afirmavam que elas não sabiam jogar. Isso se modificou, pois observei que ao chegar ao final dos nossos encontros, elas também já estavam jogando futebol com os meninos, fazendo com que acontecesse a 59 desconstrução de estereótipos sexistas. Enfim, o trabalho contribui com as reflexões de gênero, enfocando a teoria e prática existente em sala de aula, buscando criar possibilidades em que as crianças se sintam a vontade para dizer o que sabem em relação às concepções de masculino e feminino, pois mediar estas questões com as crianças, podemos esclarecer estereótipos em relação à severidade dos papéis de gênero. 60 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AUAD, Daniela. Relações de gênero nas práticas escolares e a construção de um projeto de co-educação. Disponível em: < ―http://www.anped.org.br/reunioes/27/ge23/t233.pdf‖>. Acesso em: 21, abril, 2010. BRASIL, Ministério da Educação. Parâmetros curriculares nacionais: pluralidade cultural: orientação sexual/ Secretaria de Educação Fundamental. 2.ed. Rio de Janeiro: DP&A. 2000. 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