Faculdade de Medicina da - CC 06-12

Transcrição

Faculdade de Medicina da - CC 06-12
Faculdade de Medicina da
Universidade do Porto
Serviço de Fisiologia
Aula Teórico-Prática
AUSCULTAÇÃO PULMONAR E
ESPIROMETRIA
Texto de Apoio
Roberto Roncon-Albuquerque Jr.
Prof. Doutor Adelino Leite Moreira
Porto, Ano Lectivo 2001 / 02
2
ÍNDICE:
!" AUSCULTAÇÃO PULMONAR .................................................................................................. Pg. 3
Princípios Gerais ......................................................................................................... Pg. 3
Auscultação sem Estetoscópio .................................................................................... Pg. 3
Sons Respiratórios ....................................................................................................... Pg. 3
Correlações Fisiopatológicas ...................................................................................... Pg. 4
Ruídos Adventícios ...................................................................................................... Pg. 5
!" ESPIROMETRIA ..................................................................................................................... Pg. 6
Definição ...................................................................................................................... Pg. 6
Nomenclatura Básica .................................................................................................. Pg. 6
Resultados .................................................................................................................... Pg. 7
Volume Residual ......................................................................................................... Pg. 7
!" FIGURAS ................................................................................................................................ Pg. 8
Volumes e Capacidades Pulmonares ......................................................................... Pg. 8
Ansa Débito-Volume Normal ..................................................................................... Pg. 9
Curva Volume-Tempo Normal .................................................................................. Pg. 9
Patologia Pulmonar Obstrutiva ............................................................................... Pg. 10
Patologia Pulmonar: Diagnóstico Diferencial.......................................................... Pg. 10
Patologia Pulmonar Restritiva ................................................................................. Pg. 11
!" BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................... Pg. 11
3
AUSCULTAÇÃO PULMONAR
PRINCÍPIOS GERAIS
O doente deve estar sentado e respirar pela boca. O examinador percorre os diferentes focos
auscultatórios com o diafragma do estetoscópio, devendo auscultar pelo menos um ciclo
respiratório em cada foco. Pesquisa-se a duração da inspiração e da expiração (razão
inspiração/expiração normal = 4/5), assim como a pausa entre a Inspiração e a Expiração.
Descrevem-se primeiro os Sons Respiratórios (sendo a descrição da simetria/assimetria
fundamental) e só depois os Ruídos Adventícios. Avaliam-se então a intensidade dos Sons
Respiratórios e a transmissão dos Sons Vocais.
Para auscultar a porção posterior do tórax deve-se pedir ao doente para cruzar os braços
anteriormente por forma a aumentar o campo de auscultação.
Deve-se tentar dar resposta às seguintes questões: 1) Os Sons Respiratórios estão
aumentados, normais ou diminuídos? 2) Existem ruídos Adventícios?
AUSCULTAÇÃO SEM
ESTETOSCÓPIO
O Estridor é um som rude que se agrava na inspiração (quando a estenose é ao nível da traqueia
extra-torácica) ou na expiração (quando a estenose é ao nível da traqueia intra-torácica). A Pieira,
por sua vez, corresponde a sons agudos e prolongados, mais evidentes na expiração (correspondem
aos Sibilos na auscultação com estetoscópio). A Pieira surge frequentemente no decurso das crises
de asma.
SONS RESPIRATÓRIOS
Os Sons Respiratórios resultam da turbulência do ar ventilado ao passar nas vias aéreas de
maior calibre, transmitida através do parênquima pulmonar e da parede torácica. A maior duração
da expiração em relação à inspiração faz com que, em condições normais, os Sons Respiratórios
sejam menos intensos na expiração.
PRIMEIRO SOM
RESPIRATÓRIO
O Primeiro Som Respiratório ou Ruído Traqueo-Brônquico é um som rude e soprado, que
se pesquisa na projecção parietal da árvore traqueo-brônquica sem interposição de parênquima
pulmonar (traqueia, articulação esterno-clavicular direita e espaço inter-escapular posterior direito);
SEGUNDO SOM
RESPIRATÓRIO
O Segundo Som Respiratório é um som grave e suave que corresponde à propagação do
Primeiro Som Respiratório através do pulmão arejado. Na prática clínica toma muitas vezes o nome
de Murmúrio Vesicular. Trata-se, no entanto, de uma denominação incorrecta, uma vez que se sabe
que a turbulência do ar ao entrar e ao sair dos alvéolos é insuficiente para produzir um som audível.
4
CORRELAÇÕES
FISIOPATOLÓGICAS
Na Consolidação Parenquimatosa (e.g. Pneumonia) há um preenchimento do conteúdo dos
alvéolos por líquido resultante de um processo patológico. Na auscultação pulmonar verificam-se
fundamentalmente três alterações: a) Aumento da transmissão dos Sons Respiratórios, com carácter
rude - Sopro Tubar; b) Aumento da transmissão dos Sons Vocais, com aumento da propagação dos
sons agudos - Broncofonia; c) Aumento da transmissão da voz ciciada, com percepção clara das
palavras - Pectoriloquia Áfona.
Na Rarefacção do Parênquima (e.g. Enfisema) verifica-se uma destruição difusa dos
alvéolos. Na auscultação pulmonar verifica-se a atenuação difusa da transmissão dos Sons
Respiratórios e dos Sons Vocais
Quando há interposição de um meio estranho entre o pulmão e a superfície (ar, líquido ou
pus), dá-se a atenuação da transmissão dos Sons Respiratórios e dos Sons Vocais na projecção
parietal da área afectada. Se o meio interposto for líquido ou pus, existem adicionalmente: a)
Egofonia, ou seja, percepção nasalada dos sons vocais, no limite superior do líquido; b)
Pectoriloquia Áfona, imediatamente acima do limite superior do líquido, devido à atelectasia
compressiva do pulmão supra-adjacente;
Na Obstrução Brônquica (e.g. atelectasia, corpo estranho) dá-se a reabsorção do ar no
parênquima distal à obstrução. Neste caso há Diminuição da transmissão dos Sons Respiratórios e
dos Sons Vocais no Hemitórax correspondente à lesão (no caso de ser um brônquio principal).
A Cavitação do parênquima pulmonar pode complicar uma grande variedade de processos
patológicos (e.g. abcesso pulmonar). Quando a cavitação se encontra em comunicação com um
brônquio pode originar um Sopro Anfórico na parede torácica sobreposta.
5
RUÍDOS
ADVENTÍCIOS
As Crepitações são sons breves e descontínuos que podem surgir quer pela abertura rápida das
pequenas vias aéreas, colapsadas durante a Expiração, quer pela passagem de ar através de
secreções presentes nas vias aéreas. Podem ser difusas ou localizadas. Quando estão localizadas nas
bases pulmonares está-se normalmente perante uma congestão pulmonar por insuficiência cardíaca
congestiva. Podem finas (breves, suaves e agudas) ou grossas(graves, com maior duração e maior
intensidade; correspondem geralmente à presença de uma acumulação de secreções nas vias aéreas).
Quando as Crepitações se devem à acumulação de secreções nas vias aéreas são caracteristicamente
modificáveis pela tosse.
Os Sibilos são sons agudos, prolongados no tempo e habitualmente mais audíveis durante a
expiração. Têm origem na circulação de ar através das pequenas vias aéreas diminuídas de calibre
(por edema da mucosa, espasmo do músculo liso brônquico ou pela presença de secreções). Na
prática clínica o desaparecimento dos Sibilos pode corresponder a um agravamento do quadro
clínico por ausência de ventilação da área afectada.
Os Roncos já são sons mais graves, prolongados no tempo com origem na circulação de ar
através das vias aéreas de maior calibre, estenosadas.
O Atrito Pleural é som áspero, geralmente localizado, tipicamente presente na inspiração e na
expiração. Deve-se à fricção dos dois folhetos pleurais inflamados; o agravamento da situação
clínica pode determinar o desaparecimento do Atrito Pleural por afastamento dos dois folhetos
pleurais. A distinção com as Crepitações é por vezes muito difícil, sendo as Crepitações mais
descontínuas.
Na presença de crepitações sincronizadas com os batimentos cardíacos e não com os
movimentos respiratórios, poderemos estar na presença de Sinal de Hamman, que nos indica a
presença de ar no mediastino. O Sinal de Hamman é mais evidente com o Doente em decúbito
lateral esquerdo.
6
ESPIROMETRIA
DEFINIÇÃO
A Espirometria é uma prova funcional respiratória que avalia as propriedades mecânicas do
Sistema Respiratório, através da medição de volumes e débitos expiratórios e da observação de
ansas débito-volume e curvas volume-tempo. Este exame é utilizado como teste diagnóstico, na
avaliação da reversibilidade da obstrução das vias aéreas, na quantificação do comprometimento
funcional do Sistema Respiratório, na avaliação pré-operatória de um doente bem como no
seguimento de Doentes com patologia respiratória.
NOMENCLATURA
A dinâmica respiratória permite definir um conjunto de Volumes Pulmonares:
a) Volume Corrente (VT): volume de ar inspirado ou expirado num ciclo respiratório
normal(aprox. 500 ml);
b) Volume de Reserva Inspiratória (IRV): volume de ar adicional que é possível inspirar
após o volume corrente (aprox. 3000 ml);
c) Volume de Reserva Expiratória (ERV): volume de ar adicional que é possível expirar
após o volume corrente (aprox. 1100 ml);
d) Volume Residual (RV): volume de ar que permanece nos pulmões após uma expiração o
mais forçada possível (aprox. 1200 ml).
e) Volume Expiratório Forçado no 1º Segundo (FEV 1): volume máximo de ar que é
possível exalar no 1º segundo numa Expiração Forçada
Associando os diferentes Volumes obtemos as Capacidades Pulmonares:
a) Capacidade Inspiratória (IC):
Vol. Corrente + Vol. Inspiratório de Reserva
b) Capacidade Residual Funcional (FRC):
Vol. Expiratório de Reserva + Vol. Residual
c) Capacidade Vital Forçada (FVC):
Vol. Inspiratório de Reserva + Vol. Corrente + Vol. Expiratório de Reserva
d) Capacidade Pulmonar Total (TLC):
Capacidade Vital + Vol. Residual
7
RESULTADOS
Os resultados da Espirometria são valores absolutos ou percentagens dos valores normais
esperados. Os valores normais esperados dependem do sexo, da raça, da idade e do peso do doente.
Valores de FVC e de FEV 1 > 80% do Valor Normal Esperado são considerados dentro do
âmbito de normalidade. Razão FEV 1 / FVC < 70% é sugestivo de Patologia Pulmonar Obstrutiva.
No entanto devemos ter em conta que a razão FEV 1 / FVC diminui com a idade. Desta forma, nos
indivíduos idosos, uma Patologia Pulmonar Obstrutiva é diagnosticada pelo desvio do valor
esperado da razão FEV 1 / FVC (sobretudo quando os valores são inferiores ao 5º percentil).
VOLUME RESIDUAL
A Espirometria permite igualmente determinar o Volume Residual. Na prática, o Volume
Residual é calculado subtraindo o Volume de Reserva Expiratória à Capacidade Residual
Funcional. Para determinar a Capacidade Residual Funcional dispomos, entre outras, de duas
técnicas: a) Método de diluição pelo Hélio; b) Pletismografia Corporal.
No método de diluição pelo Hélio o espirómetro é preenchido com uma mistura de ar e
Hélio (10%). No final da expiração, o Doente inicia a inspiração do ar do espirómetro. À medida
que o Hélio do espirómetro se mistura com o ar pulmonar a sua concentração vai baixando até
atingir uma concentração estável, inferior à inicial. Uma vez que o Hélio não atravessa a membrana
alvéolo-capilar, o volume de Hélio não se altera.
Deste modo,
(He)in * (V)in = (He)fin * (V)fin
em que (He)in é a concentração inicial de Hélio, (V)in é o volume da mistura no espirómetro,
(He)fin é a concentração final de Hélio e (V)fin é o volume da mistura no espirómetro + a Capacidade
Residual Funcional.
Simplificando,
(V)in * ((He)in – (He)fin)
FRC =
(He)fin
em que FRC é a Capacidade Residual Funcional.
A Pletismografia Corporal é realizada num pletismógrafo, que consiste numa câmara
fechada onde o Doente se senta . Neste dispositivo o Doente respira através de um tubo conectado a
um espirómetro. Durante a inspiração, a pressão alveolar diminui e a o volume pulmonar aumenta.
Estando o Doente numa câmara fechada, o aumento de volume pulmonar vai provocar uma subida
da pressão no interior do pletismógrafo. Deste modo, o volume torácico é determinado através da
8
lei de Boyle: para um gás a temperatura constante, o produto da pressão e do volume é constante,
ou seja,
P * V = (P + ∆P) * (V + ∆V)
em que P é a pressão inicial no pletismógrafo, V é a Capacidade Residual Funcional, ∆P é o
aumento de pressão após a inspiração do Volume Corrente e ∆V é o Volume Corrente.
Simplificando,
V = (P +∆P) * ∆V
∆P
FIGURAS
FIGURA 1 – VOLUMES E CAPACIDADES PULMONARES. VC – Capacidade Vital;
RV – Volume Residual; ERV – Volume de Reserva Expiratória; IC – Capacidade
Inspiratória; FRC - Capacidade Residual Funcional; Vt – Volume Corrente;
TLC – Capacidade Pulmonar Total.
9
8
PEF
EXPIRAÇÃO
6
DÉBITO (L/S)
4
2
FVC
0
-2
-4
-6
-1
0
1
2
3
4
VOLUME (L)
FIGURA 2 – ANSA DÉBITO-VOLUME NORMAL. PEF – Débito Expiratório Máximo;
CVF – Capacidade Vital Forçada.
VOLUME (L)
6
INSP.
EXP.
FVC
4
FEV 1
2
0
1
2
3
4
5
6
7
8
TEMPO (S)
FIGURA 3 – CURVA VOLUME-TEMPO NORMAL. FEV 1 – Volume Expiratório Forçado
no 1º Segundo; CVF – Capacidade Vital Forçada.
10
8
6
VOLUME (L)
6
2
4
2
0
0
1
2
3
4
5
6
7
TEMPO (S)
-2
-4
-6
-1
0
1
2
3
4
VOLUME (L)
FIGURA 4 – PATOLOGIA PULMONAR OBSTRUTIVA. Ansa Débito-Volume e Curva
Volume-Tempo (e.g. asma, enfisema). Nestes casos, a razão FEV1 / FVC < 70 % do
valor normal esperado – Critério primário para o diagnóstico de Doença Pulmonar
Obstrutiva.
120
FVC
100
(% valor normal esperado)
DÉBITO (L/S)
4
Patologia Pulmonar Obstrutiva
Normal
Patologia Pulmonar Mista
Patologia
Pulmonar
Restritiva
80
60
40
20
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
FEV1 / FVC (%)
FIGURA 4 – PATOLOGIA PULMONAR. Diagnóstico diferencial entre Patologia Pulmonar
Obstrutiva, Restritiva e Mista.
8
11
8
6
VOLUME (L)
6
DÉBITO (L/S)
4
2
4
2
0
0
1
2
3
4
5
6
7
TEMPO (S)
-2
-4
-6
-1
0
1
2
3
4
VOLUME (L)
FIGURA 6 – PATOLOGIA PULMONAR RESTRITIVA – Ansa Débito-Volume e Curva
Volume-Tempo (e.g. Fibrose Pulmonar). A razão FEV 1 / FVC pode estar normal ou
até aumentada. A ansa Débito-Volume e a curva Volume-Tempo apresentam volumes
e débitos menores apesar da sua morfologia ser normal.
BIBLIOGRAFIA
1. Guyton AC, Hall JE. Textbook of Medical Physiology. Philadelphia: W.B. Saunders, 2000:
477-490.
2. Fauci AS, Braunwald E, Isselbacher KJ, Martin JB, Kasper DL, Hauser SL, Longo DL, editors.
Harrison´s Principles of Internal Medicine. New York: McGraw-Hill, 1998:1110-1112.
3. Epstein O, Perkin GD, de Bono DP, Cookson J. Clinical Examination. London: Mosby,
1997:158-164.
4. Daffner RH. Clinical Radiology. Baltimore: Williams & Wilkins, 1993: 55-118.
8

Documentos relacionados

Lista de testes de volumes pulmonares

Lista de testes de volumes pulmonares nos pulmões depois de uma expiração completa (por definição não mobilizável) e as capacidades que o incluem: Capacidade Residual Funcional (CRF, Capacidade de ar que fica no pulmão depois de uma ex...

Leia mais