1 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva

Transcrição

1 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
Volume 15 • nº 1
Janeiro/Março 2003
ISSN 0103-507X
NESTA EDIÇÃO
EDITORIAL
Dilemas Éticos
Sobre o Fim da Vida
ARTIGOS ORIGINAIS
Análise Comparativa do
Débito Cardíaco (DC) Obtido
pelo Método de Fick e pela
Calorimetria Indireta em
Pacientes Sépticos
Estudo de 596 Casos
Consecutivos de Traumatismo
Craniano Grave em
Florianópolis-1994-2001
Gênero e Mortalidade em
Cirurgia de Revascularização
do Miocárdio
Quanto Sabemos Sobre o
Custo do que Prescrevemos
em Terapia Intensiva?
ARTIGOS DE REVISÃO
Calorimetria Indireta no
Paciente em Estado Crítico
Tratamento da Asma
Aguda Grave: Suporte
Ventilatório em Pediatria
Avaliação da Recusa ou
Suspensão de Tratamentos
Considerados Fúteis
ou Inúteis em UTI
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
Fundada em 1980
Diretoria para o Biênio 2002-2003
Presidente
Dr. Jairo C. Bitencourt Othero
Vice-Presidente
Dr. Jefferson Pedro Piva
1º Secretário
Dr. Luiz Alexandre A. Borges
2º Secretário
Dr. José Maria da Costa Orlando
1º Tesoureiro
Dr. Marcelo Moock
2º Tesoureiro
Dr. Odin Barbosa da Silva
Associação de Medicina
Intensiva Brasileira
Rua Domingos de Moraes, 814
Bloco 2 – Conj. 23
Vila Mariana – CEP 04010-100
São Paulo – SP
Tel.: (11) 5575-3832
[email protected]
Indexada na base de dados Lilacs
A REVISTA BRASILEIRA DE
TERAPIA INTENSIVA reservase todos os direitos, inclusive os
de tradução, em todos os países
signatários da Convenção PanAmericana e da Convenção Internacional sobre os Direitos
Autorais. Os trabalhos publicados terão seus direitos autorais
resguardados pela AMIB, que
em qualquer situação agirá
como detentora dos mesmos.
SUMÁRIO
Editorial
Dilemas Éticos Sobre o Fim da Vida
03
Rachel Duarte Moritz
Artigo Original
05
Análise Comparativa do Débito Cardíaco (DC) Obtido pelo Método de Fick
e pela Calorimetria Indireta em Pacientes Sépticos
Comparative analysis of cardiac output (CO) calculated by Fick´s
method and measured by indirect calorimetry in septic patients
Maria Auxiliadora Martins, Walther de Oliveira Campos Filho, Jaciara Machado Viana,
Edson Antônio Nicolini, Antonio Dorival Campos, Anibal Basile-Filho
Artigo Original
15
Estudo de 596 Casos Consecutivos de Traumatismo Craniano Grave em
Florianópolis-1994-2001
A study of 596 consecutive cases of severe head trauma
from 1994 to 2001 in Florianopolis, Brazil.
Evandro Tostes Martins,Thales Schott da Silva, Mario Coutinho
Artigo Original
19
Gênero e Mortalidade em Cirurgia de Revascularização do Miocárdio
Gender and Mortality in Coronary Artery Bypass Graft Surgery
Kelson Nobre Veras, José Lira Mendes Filho, Paulo Henrique Medeiros Costa, Paulo Rego
Medeiros, Sebastião Nunes Martins, Jayro Tadeu Paiva Vasconcelos
Artigo Original
26
Quanto Sabemos Sobre o Custo do que Prescrevemos em Terapia Intensiva?
Cleovaldo T. S. Pinheiro, MD, PhD; Luciano de Brito; Rosanna L. Corvello Bel. Adm.
Artigo de Revisão
Calorimetria Indireta no Paciente em Estado Crítico
Indirect Calorimetry in The Critically Ill Patient
29
Anibal Basile Filho, Maria Auxiliadora Martins, Paulo Antoniazzi, Julio Sérgio Marchini
Artigo de Revisão
Tratamento da Asma Aguda Grave: Suporte Ventilatório em Pediatria
Management of acute severe asthma: ventilatory support in pediatrics
34
Werther Brunow de Carvalho
Artigo de Revisão
40
Avaliação da Recusa ou Suspensão de Tratamentos Considerados Fúteis ou
Inúteis em UTI
Withdrawal and withholding of life support in an Intensive Care Unit
Rachel Duarte Moritz, Fabrício Pamplona
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NESTA REVISTA
RBTI
REVISTA BRASILEIRA DE
TERAPIA INTENSIVA
Editor
Cleovaldo T. S. Pinheiro (RS)
Secretário
Luciano de Brito
Editor Associado
Werther Brunow de Carvalho (SP)
Conselho Editorial
Álvaro Réa Neto (PR)
Antonio Nuno da Conceição (BA)
Cid Marcos Nascimento David (RJ)
Edson Stefanini (SP)
Eliezer Silva (SP)
Fernando Osni Machado (SC)
Flávio de Barros Maciel (SP)
Gilberto Friedman (RS)
José Luiz Comes do Amaral (SP)
José Raimundo de A. Azevedo (MA)
Odin Barbosa da Silva (PE)
Paulo César Ribeiro (SP)
Paulo Gabriel Bastos (RJ)
Paulo Sérgio S. Beraldo (DF)
Rosane Goldweisser (RJ)
Sayonara de Fátima F. Barbosa (SC)
Vera Regina Fernandes (SC)
Jornalista Responsável
Marcelo Sassine - Mtb 22.869
Diretora de Arte
Anete Salviano
Capa
MWS Design
Projeto Gráfico e
Produção Editorial
MWS Design
Fone: (11) 3399-3028
www.amws.com.br
A Revista Brasileira de Terapia Intensiva é publicada trimestralmente (março, junho, setembro a dezembro) em um
único volume anual, editada pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) e destina-se fundamentalmente a
publicar artigos originais. Eventualmente, em casos excepcionais, serão aceitos relatos de caso. Revisão de literatura será
considerada quando de autoria de especialistas de reconhecido saber, ou a convite. Resumos de congresso ficarão a critério
do editor, bem como outras matérias de interesse da medicina intensiva e especialidades correlatas.
Tanto o Abstract (resenha condensada) como o resumo, deverão ser escritos de maneira estruturada na forma do
“Annals of International Medicine”.
Os textos devem ser escritos preferencialmente em português. Serão aceitos os trabalhos escritos em inglês ou em
espanhol, quando os mesmos forem realizados em serviços estrangeiros de língua inglesa ou espanhola, ou quando forem
escritos por experts convidados. Todos os trabalhos deverão ser acompanhados de um Abstract (resenha condensada), necessariamente em inglês, seguindo o exemplo mostrado abaixo. O texto deve se fazer seguir de um resumo na língua em que foi
escrito (resumo, summary, resumen).
O texto deve ser digitado em espaço duplo e apresentado na seguinte ordem: Página de rosto, Título em inglês, Abstract,
Key Words, Introdução (deve ser feita, mas o título “Introdução” deve ser omitido), Material e Métodos, Resultados, Discussão, Resumo, Unitermos, Agradecimentos, Referências, Tabelas, Figuras, Legendas das Tabelas e das Figuras.
A Página de Rosto deve ocorrer: Título de artigo; Nome(s) do(s) autor(es) e respectivos títulos; Nome do Serviço ou
Instituição em que foi realizado o trabalho; Nome e endereço do autor principal para correspondência (a sair publicado);
Telefone do autor para contato com o editor de texto; Fonte de patrocínio (bolsas, subvenções, ofertas de produtos).
Abaixo do resumo na língua em que foi escrito, enumerar, até um máximo de cinco, as palavras ou expressões indicativas
do conteúdo do artigo (Unitermos), de preferência com base no Index Medicus, para maior facilidade na indexação.
Os trabalhos deverão ser enviados em três vias e em disquete (sendo o texto salvo em Word, letra Times New Roman,
tamanho 12 e espaço 1,5). Não deverão ultrapassar 15 páginas digitadas, salvo casos autorizados pelo Conselho Editorial.
Esses trabalhos serão apreciados pelo Conselho Editorial que se reserva o direito de recusá-los e de fazer sugestões quanto
à sua estrutura ou à sua redação. As ilustrações (gráficos, tabelas, fotografias e desenhos) devem ser apresentadas em páginas
separadas, contendo suas respectivas legendas e assinalando sua exata localização no texto. Deverão, preferencialmente,
serem enviadas em forma original e/ou em disquete. Somente serão aceitas as ilustrações que permitirem boa reprodução.
As Referências devem incluir o material estritamente necessário, realmente citado no texto. As revistas devem ser
referidas de forma abreviada, segundo critérios internacionais. As citações no texto devem ser feitas por números índices,
correspondendo às respectivas referências listadas por ordem cronológica, não-alfabética. Os livros devem ser referidos pelo
autor, título, cidade-sede da casa editora, nome da casa editora, número da edição (a partir da 2ª), volume, ano da impressão,
e páginas inicial e final citadas. Se se tratar de capítulo de livro, fazer constar: autor do capítulo, título do capítulo, a palavra
In (grifada), dois pontos, nome dos editores indicando com a abreviação eds., título do livro (grifado), cidade da editora,
nome da editora, nº da edição (a partir da 2ª), volume, ano da publicação, páginas citadas. Quando o artigo tiver mais de três
autores deverão ser citados os três primeiros seguidos de et al.
EXEMPLO DE ABSTRACT:
Background: Cardiovascular disease is a common cause of morbidity and death in persons with renal insufficiency.
Although 3-hydroxy-3methylglutaryl coenzyme A reductase inhibitors (statins) are effective for secondary prevention of
cardiovascular events in the general population, they have not been specifically studied in chronic renal insufficiency.
Objective: To determine whether pravastatin is effective and safe for secondary prevention of cardiovascular events in
persons with chronic renal insufficiency.
Design: Post hoc subgroup analysis of a randomized, double-blind, placebo-controlled trial.
Setting: The Cholesterol and Recurrent Events (CARE) study, a randomized trial of pravastatin versus placebo in 4159
participants with previous myocardial infarction and total plasma cholesterol levels less than 6.21 mmol/L (<240 mg/dL).
Participants: 1711 participants with chronic renal insufficiency defined by creatinine clearance less than or equal to 75
mL/min, using the Cockcroft-Gault equation.
Measurements: The primary outcome was death from coronary disease or symptomatic nonfatal myocardial infarction.
Results: After a median follow-up of 58.9 months, the incidence of the primary end point was lower in participants
receiving pravastatin than in those receiving placebo (adjusted hazard ratio, 0.72 [95% CI, 0.55 to 0.95]; P = 0.02).
Pravastatin was associated with lower adjusted hazard ratios for major coronary events (0.72 [CI, 0.59 to 0.88]; P =
0.001) and coronary revascularization (0.65 [CI, 0.50 to 0.83]; P = 0.001), but not total mortality (0.81 [CI, 0.61 to 1.08];
P = 0.14) or stroke (0.62 [CI, 0.39 to 1.00]; P = 0.051). Tests for interaction suggested that the observed benefit was
independent of the presence and severity of renal insufficiency. Incidence of side effects was similar in persons receiving
pravastatin and those receiving placebo.
Conclusions: These data suggest that pravastatin is effective and appears safe for secondary prevention of cardiovascular
events in persons with mild chronic renal insufficiency. Since statins may be underused in this setting, physicians should
consider prescribing them for patients with chronic renal insufficiency and known coronary disease.
EXEMPLO DE REFERÊNCIAS
1. Leppänieme A,Haapiainen R,Kiviluoto T, et al. Pancreatic trauma: acute and late manifastations. Br J Surg 1988; 75: 165-7.
2. Carter DC. Pancreatitis and the biliary tree: the continuing problem. Am J Surg 1988; 155: 10-7.
3. Buchler M, Malfertheiner P, Berger HG. Correlation of imaging procedures, biochemical parameters and clinical stage in acute pancreatitis.
ln: Malfertheiner P, Ditschuneir H. eds. Diagnostic procedures in pancreatic disease. Berlin: Springer-Verlag 1986; 123-9.
4. Crystal RG. Interstitial lung disease. In: Wyngaarden JB, Smith LH. eds. Cecil textbook of medicine. Philadelphia: WB Saunders &
Co., 18th ed., 1988; 421-35.
Para fim desta Revista, tabelas e quadros correspondem à mesma coisa e são convencionados sob o nome Tabelas,
numeradas em arábicos. Figuras, também em arábicos, incluem desenhos, fotografias, esquemas e gráficos. À margem de
cada Tabela ou Figura, ou no verso, devem ser grafados a lápis sua numeração, título do trabalho e nome do autor, ou outras
indicações que facilitem sua absoluta clareza. Cada Tabela e cada Figura devem estar montadas ou feitas em folhas separadas (uma para cada elemento) e também em disquetes. As legendas das Tabelas e das Figuras devem ser digitadas com claras
indicações a que se referem.
Esta Revista deve ser referida com as seguintes abreviações: Rev Bras Terap Intens.
A correspondência para publicação deve ser endereçada para:
RBTI - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
AMIB
Rua Domingos de Moraes, 814 – Bloco 2 – Conj. 23
Vila Mariana – CEP 04010-100 – São Paulo – SP
Tel.: (11) 5575-3832 E-mail:[email protected]
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / EDITORIAL
Dilemas Éticos Sobre o Fim da Vida
Rachel Duarte Moritz
partir da segunda metade do século XX, morrer
no hospital é uma praxe. Esse fato tem substituído
o morrer em casa junto das pessoas de estima,
pelo morrer científico, dentro dos hospitais e, mais especificamente, nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs)1,2.
A partir dos anos 70, com o desenvolvimento continuado
de novas tecnologias, o paciente gravemente enfermo pode
ser mantido por um longo período de tempo em uma UTI.
Em alguns casos, a morte é inevitável em praticamente 100%,
sendo apenas retardada a um alto custo, financeiro, moral e
psicológico, para todos os envolvidos. A partir desse fato e
da certeza de que o ser humano tem direito a uma morte
digna3 surge um novo debate, se a recusa ou a suspensão
dessas tecnologias é uma ação ética4,5.
Cada vez mais surgem processos legais contra os médicos e esses, treinados para curar e tratar, custam a aceitar a
morte dos seus pacientes. Utilizando a tecnologia e retardando a morte de alguns dos seus pacientes os médicos
intensivistas sentem-se angustiados diante da dúvida de estarem praticando a distanásia. O termo distanásia pode ser definido como a morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento6,
ao contrário do termo eutanásia, que significa a abreviatura
de um sofrimento por intermédio de uma morte induzida7.
Mais recentemente, passou-se a utilizar o termo ortotanásia
que traduz uma maior sensibilidade ao processo de
humanização da morte e alívio das dores e não incorre em
prolongamentos abusivos com a aplicação de meios desproporcionados que imporiam sofrimentos adicionais6.
Tentando praticar a ortotanásia e evitar a distanásia, o
médico intensivista passou a sofrer dilemas éticos e legais ao
ser confrontado com as decisões de recusar ou suspender
tratamentos considerados fúteis ou inúteis8,9.
Os princípios éticos necessariamente questionados são:
Quem decide, e para que paciente é decidida a recusa ou a
suspensão de um tratamento? O que é um tratamento fútil ou
inútil? Fútil para o que? Para a cura? Para o prolongamento
da vida? Para o alívio da dor e da ansiedade?10. Essas perguntas permanecem sem resposta definitiva.
O código de Ética Médica no Art.66/1988 proibe “utilizar, em qualquer caso, meios destinados a abreviar a vida
do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal”.
Contudo, o Art.28/1988 aponta como direito do médico “recusar a realização de atos médicos que, embora
permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua
A
consciência”.
Boff11 escreveu sobre o direito de morrer e afirmou que
cabe ao médico todo o esforço para curar um paciente. Entretanto, isso não significa que tratamentos que posterguem a
vida devam ser prescritos. Ressalta que “deixar morrer” não
é a mesma coisa que “fazer morrer”.
Um dos principais aspectos éticos é o direito de decisão
de um paciente e a obrigação de o médico respeitar essa decisão, o que não implica a prática de um tratamento tecnicamente contra-indicado a pedido do paciente.
O envolvimento de médicos em causar ou apressar a
morte de pacientes é proibido12, mas há suporte ético para o
aumento progressivo de medicação para alívio da dor em
pacientes terminais, mesmo que isso traga risco à vida13.
Pode-se concluir que a diferença entre um paciente que
morre com dor e aquele que tem a morte precipitada pela
administração de um analgésico está na intenção da pessoa
que administra o fármaco8,14. As complicações são parte do
risco de qualquer procedimento médico. Do ponto de vista
ético e legal, o médico tem compromisso com a atitude e
não com o resultado15,6,17.
As leis brasileiras definem a imprudência, negligência e
imperícia como casos de homicídio culposo, que ocorre quando o agente não quer o resultado, mas assume o risco de
produzi-lo14,18. A recusa, por parte do médico, de administrar
um tratamento que poderá prolongar o sofrimento de um
paciente, não pode ser considerada um erro médico, pois não
pode ser encaixada como imprudência, negligência ou imperícia. Embora tal atitude seja aceita pela Igreja, ainda é mal
definida do ponto de vista legal.
Deve ser ressaltado que o avanço tecnológico torna necessário o debate contínuo tanto do ponto de vista ético quanto
legal sobre o tratamento considerado fútil19,20.
Em 1997, o Comitê de Ética da Society of Critical Care
Medicine21 realizou uma reunião de consenso para definir o
que seria tratamento fútil e quais os procedimentos que deveriam ser tomados para resolver os casos nos quais um tratamento visando a manutenção da vida fosse considerado fútil.
Tratamento fútil foi considerado aquele que não atinge as
metas pretendidas, sendo considerado desaconselhável o tratamento que tenha pouca probabilidade de trazer benefícios.
Os participantes do consenso concluíram que, para um tratamento ser desaconselhado, o tema deveria ser debatido entre
os interessados, observando-se os valores morais da comunidade. As decisões não poderiam levar unicamente em consi-
Professora do Departamento de Clínica Médica UFSC – Mestre em Ciências Médicas – Doutora em Engenharia de Produção-Ergonomia
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
3
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / EDITORIAL
deração escores prognósticos e deveriam ter respaldo legal.
Pinheiro22, levando em consideração as imensas somas
financeiras destinadas ao tratamento de pacientes gravemente enfermos e a elevada taxa de mortalidade dos mesmos,
questiona a necessidade da avaliação da qualidade de vida
que esses indivíduos passam a ter após a alta da UTI ou do
hospital e infere que, como marcadores de qualidade em
terapia intensiva, deveriam ser analisados não somente os
índices de mortalidade intra-hospitalar, mas os de mortalidade logo após a alta dessa unidade e os de mortalidade
tardia, assim como a qualidade de vida daqueles que receberam alta das UTIs. Dessa maneira, poderia ser melhor
estipulado, no nosso País, qual tratamento deveria ser considerado fútil ou inútil.
Pellegrino23 publicou um artigo descrevendo um algoritmo
sobre as decisões da suspensão de um tratamento. Avaliou
que qualquer decisão ética deve considerar como pré-requisito fundamental a valorização da vida humana e deve levar
em consideração os embasamentos teóricos que justificam
as decisões do ponto de vista ético. O autor descreve 4 questões éticas que devem ser respondidas antes da recusa ou da
suspensão de um tratamento: 1 Quem decide? 2. Quais os
critérios utilizados? 3. Que conflitos, envolvendo a decisão,
devem ser debatidos? 4. Quais conflitos podem ser evitados?
É inquestionável que o paciente com capacidade de decidir
tem autoridade moral e legal para tal, e, em casos especiais,
os familiares, o substituto legal do paciente ou o seu médico
poderão participar dessa decisão. Entretanto, essa autoridade
não é absoluta, sendo limitada quando a decisão acarreta conseqüências graves para terceiros, quando o médico é levado a
violar sua integridade ética profissional, quando o paciente
deliberadamente atenta sobre sua vida, ou quando o tratamento requerido é fútil ou contra-indicado. Uma vez mais
nos defrontamos com a necessidade da definição correta de
futilidade. Futilidade foi definida como a relação entre a
efetividade, o benefício e as conseqüências do tratamento
em questão. Efetividade seria a avaliação da capacidade de o
procedimento alterar a história natural da doença. Benefício
seria uma avaliação feita pelo paciente quanto aos resultados
obtidos comparados aos resultados desejados do tratamento,
bem como as conseqüências do mesmo representadas por
desconforto, dor e outros efeitos colaterais. A idade, a qualidade de vida prévia e critérios econômicos são tópicos que
devem ser discutidos separadamente e que podem influenciar o médico e os familiares nas decisões sobre as perspectivas de um tratamento. A decisão médica não pode ser unilateral quando é avaliada a questão da idade e da qualidade de
vida. O fator econômico nunca deverá ser um fator decisivo
para tais questionamentos.
Membros da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, durante o I Fórum Nacional de Formação do Intensivista24
concluíram que, diante de decisões de recusar ou suspender
um tratamento fútil ou inútil, esse processo deva ser conduzido com dignidade pela equipe multidisciplinar, com respeito
à autonomia do paciente e com o conhecimento e aceitação
de seus familiares. Foi também definido que a distanásia deve
ser evitada e que a analgesia e sedação devem ser priorizadas
visando o menor sofrimento do paciente.
Apesar do debate, de âmbito mundial, visando a definição de tratamento fútil e de normas para a recusa ou a suspensão desse tratamento, esse questionamento ainda permanece sem resposta. Cada vez mais é constatada a importância
de serem levados em consideração os sentimentos e desejos
do paciente e de seus familiares, e de que uma adequada
comunicação entre os mesmos e a equipe hospitalar
multidisciplinar é imprescindível antes que qualquer decisão
terapêutica seja tomada. Qualquer que ela seja deve levar em
consideração não somente algoritmos, mas a experiência dos
profissionais envolvidos e os aspectos emocionais tão difíceis de serem dimensionados.
BIBLIOGRAFIA
01. Zaidhaft S. 1990. Morte e formação médica. Rio de Janeiro: Francisco Alves. 155p.
02. Koch KA. 1996. A linguagem da morte: Euthanatos et mors. Clínicas de Terapia
Intensiva 1(1):1-13.
03. Sancho MG. 2000. Morir com Dignidad. Prática Hospitalar (Cuidados paliativos) 9
(Mai-Jun): 55-62.
05. França GV. 2000. Bioética. Rev Conselho Federal de Medicina Mai-Jun: 8-9.
04. Sabbatini RME. 1996. Tecnologia Médica e dignidade. http://www.epub.org.br (julho/
2001)
06. Pessini L. 1996. Distanásia: Até quando investir sem agredir? http://www.cfm.org.br
(agosto/2001)
07. Alcântara HR. 1979. Deontologia e Diceologia. São Paulo: Andrei. 253p.
08. Nyman DJ, Eidelmman LA, Sprung CL. 1996. Eutanásia. Clínicas de Terapia Intensiva
1(1):85-96.
09. Vincent JL. 2001. Cultural differences in end-of-life care. Crit Care Med 29 (2):N52N55 suppl.
10. Cotler M. 1991. Forgoing medical treatment: To Withdraw, Withhold, Deny. Seminars in Anesthesia 3(3):163-9.
11. Boff L. 2002. O direito de morrer. http://www.jbonline.terra.com.br/jb (12/01/02)
12. Bizatto JI. 1990. Eutanásia e responsabilidade médica. Porto Alegre: SAGRA. 246p.
13. Caldana RP, Martins LAN. 1996. A morte auxiliada por médicos. ARS Curandi/JAMA
29(7):78-87.
14. Bizatto JI. 1990. Eutanásia e responsabilidade médica. Porto Alegre: SAGRA. 246p..7
4
15. Santos RLC. 1996. Aspectos Médico-Legais. ARS Curandi 7 (29):3-4.
16. Luce JM, Alpers A. 2000. Legal aspectsof withholding and withdrawing life support
from critically ill patients in the United States and providing palliative care to them.
AmJ Resp Crit Care Med 162(6) 2029-32.
17. Pardo A. Sobre la moralidad de retirada de tratamientos a los pacientes. http://
www.unav.es/bioetica/dejarm.html (julho/2001)
18. Martin LM. 1993. A ética médica diante do paciente terminal. São Paulo: Santuário.
399p.
19. Herbert CL. 1997. To be or not to be - an ethical debate on the not-for-ressuscitation
status of a stroke patient. J Clin Nurs 6(2): 99-105.
20. Sprung C, Eidelman LA, Steinberg A. 1997. Is the patient’s right to die involving into
a duty to die?: Medical decision making and ethical evaluations in health care. J Eval
Clin Pract 3(1):69-75.
21. Society of Critical Care Medicine Ethics Committee. 1997. Consensus statement of
the Society of Critical Care Medicine’s ethics committee regarding futile and other
possibly inadvisable treatments. Crit Care Med 25 (5):887-91.
22. Pinheiro CTS. 2000. A vida depois da UTI. Rev Bras Terap Intens 12(4):171-2.
23. Pellegrino ED. 2000. Decisions to withdraw life-sustaining treatment. A moral algorithm. JAMA 283 (8): 1065-7.
24. Dias FS, Souza RP, Trotta EA, Pereira E, Moritz RD, Kaufmann ML. 2001.
Terminalidade na Medicina Intensiva – Qual o papel do médico intensivista frente à
morte?. Atualidades AMIB. 20 (abril-junho): 5-6.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Análise Comparativa do Débito Cardíaco (DC)
Obtido pelo Método de Fick e pela Calorimetria
Indireta em Pacientes Sépticos
Comparative analysis of cardiac output (CO) calculated by Fick´s
method and measured by indirect calorimetry in septic patients
Maria Auxiliadora Martins1, Walther de Oliveira Campos Filho2, Jaciara Machado
Viana3, Edson Antônio Nicolini4, Antonio Dorival Campos5, Anibal Basile-Filho6
ABSTRACT
The aim of this study was to compare two different cardiac output (CO) monitoring systems based on thermodilution
principle (Thermo-CO) and indirect calorimetry (Fick mixed-CO) in critically ill patients victims of septic shock.
Nineteen patients were enrolled in the study (14 males and 5 females), aging 45.4±21.5 years, APACHE II=22.4 ±
6.8 with calculated odds ratio for mortality of 46.1±26.8% and the Sepsis Score=21.1±8.6. Four measurements
series to access cardiac output were carried out using both Thermo-CO and Fick mixed-CO. Samples of atrial blood
were also collected from eight patients.
No statistical difference were observed between Thermo-CO and Fick mixed-CO with values of 7.0±1.8 L.min-1 and
6.4±1.7 L.min-1, respectively. Despite of data from T4 (p=0.0090), no significant differences were observed for
Thermo-CO and Fick mixed-CO obtained from consecutive measurements series (T1: p=0.0874, T2: p=0.0577 e T3:
p = 0.4171). Parallel analysis of Fick mixed-CO and Fick atrial-CO was performed introducing a correction factor for
the eight atrial samples in order to adjust the values of oxygen saturation obtained from atrial blood (Fick corrected
atrial-CO) to those obtained from mixed venous blood. Our data demonstrated that no significant differences could
be detected between Fick mixed-CO and Fick corrected atrial-CO in all consecutive measurements (T1: p=0.4609,
T2: p=0.4688, T3: p=0.3125 e T4: p=0.5469).
The mean values of Fick mixed-CO was 6.0±1.2 L.min-1 and for Fick corrected atrial-CO was 5.9±1.4 L.min-1. The
coefficients of correlation for comparative analysis of Thermo-CO/Fick mixed-CO and the analysis of Fick mixedCO/Fick corrected atrial-CO was 0.84 and 0.94, respectively.
We can conclude that the indirect calorimetry might be useful to perform a less-invasive measurement of cardiac
output in patients with septic shock, mainly to manage those cases where invasive hemodynamic support is neither
available nor indicated.
KEYWORDS: Indirect calorimetry, thermodilution, cardiac output, septic shock.
sistema cardiovascular é alvo freqüente da
sepse, e, por isso, as alterações cardiovasculares interferem no prognóstico. A normalização do débito cardíaco (DC) nas primeiras 48 horas
correlaciona-se com a sobrevida(1). Sepse, trauma e cirurgia de grande porte aumentam o metabolismo e, conseqüentemente, o débito cardíaco.
As variáveis que afetam o DC incluem idade, sexo,
superfície corpórea, postura e demanda metabólica. A
mais importante dessas variáveis é a demanda metabólica, que é a responsável direta pelo DC. Sendo o DC o
O
principal responsável pela oferta de oxigênio e nutrientes aos tecidos, a adequação dessa variável hemodinâmica constitui medida indispensável para o tratamento de pacientes graves, sobretudo aquelas vítimas
de choque séptico.
O choque séptico determina um estado hiperdinâmico
que se caracteriza por taquicardia, elevação do DC e resistência vascular sistêmica reduzida(2). Uma vez que a
função precípua do coração é manter a oferta adequada
de oxigênio e nutrientes a todos os tecidos do organismo, a monitorização do DC torna-se essencial frente a
1
Supervisora de Equipe Médica do Centro de Terapia Intensiva - Campus do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo
2,3,4
Médicos Assistentes e Pós-Graduandos da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade
de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo
5
Professor Associado do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo
6
Professor Associado e Chefe da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo
Dissertação de Mestrado realizada na Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia (Centro de Terapia
Intensiva Campus – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo).
Projeto de pesquisa financiado pela FAPESP (99/07266-7). - Av. Bandeirantes, 3900 – Ribeirão Preto – SP – CEP 14049-900 - Email: [email protected] Tel: (16) 602-2439
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
5
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
situações clínicas que cursam com instabilidade
hemodinâmica.
Um dos maiores dilemas no tratamento do choque
consiste no fato de que o diagnóstico é fácil nos estágios
avançados, quando a terapia é ineficaz. O diagnóstico
precoce é mais difícil porque os sinais e sintomas são
subjetivos e imprecisos(3).
Nenhum método atualmente utilizado oferece parâmetros definitivos e acurados de monitorização da adequação da oferta tecidual de oxigênio. O débito cardíaco é
uma das variáveis mais importantes no contexto de
perfusão tecidual. Além disso, ele participa de cálculos
de outras variáveis hemodinâmicas e de oxigenação,
como: resistência vascular sistêmica (RVS), resistência
vascular pulmonar (RVP) e oferta de oxigênio (DO2).
A termodiluição, descrita inicialmente por SWAN,
GANZ et al(4), é atualmente o método padrão para a medida do DC, porém, diversas limitações são impostas ao
uso dessa técnica, tais como: alto custo, caráter invasivo
do procedimento, subestimação do consumo de oxigênio, uma vez que esse método não estima o real consumo pulmonar de oxigênio(5).
Além disso, vários questionamentos surgiram quanto à utilidade clínica da monitorização com cateter de
Swan-Ganz. Em 1985, Robin questionou a utilização do
cateter de Swan-Ganz(6) e, em 1987, propôs uma moratória no seu uso, sugerindo que este era abusivo e indiscriminado(7). Posteriormente, em 1996, CONNORS et al.
demonstraram aumento de mortalidade no atendimento
inicial a pacientes críticos(8).
O DC medido pela termodiluição sofre influência de
vários fatores externos que podem levar a erros de interpretação, a saber: posição do paciente no leito, temperatura e volume do injetado, presença de patologias valvares,
shunts intracardíacos e aumento da pressão intratorácica
provocado pelo uso de ventilação mecânica(9, 10, 11). A posição supina pode aumentar o DC em até 30%(12), a temperatura e o volume do injetado devem ser fixas e a acurácia
é maior com volumes de 10mL a temperaturas entre 0o e
5°C(13, 14, 15). O tempo de injeção não deve exceder quatro
segundos e as injeções devem ser realizadas sempre na
fase final da expiração para evitar interferência da pressão
intratorácica. Existem também artefatos relacionados ao
próprio cateter e seu termistor(16).
Devido a essas limitações, métodos alternativos têm
sido testados com o intuito de diminuir os índices de
complicações e, ao mesmo tempo, preservar a fidedignidade das medidas. Vários métodos vêm sendo estudados, dentre eles, a calorimetria indireta.
Estudos clínicos comparando a medida do DC pela
termodiluição e pelo método clássico proposto por Fick
relatam um coeficiente de correlação que varia entre
6
0,7 e 0,95(17, 18, 19, 20, 21, 22, 23,24).
Os objetivos do presente estudo foram comparar a
medida do DC pela termodiluição (DC-termo) e pela
Calorimetria Indireta (Método de Fick, DC-Fick misto)
em pacientes vítimas de choque séptico; utilizar o sangue venoso atrial em substituição ao sangue venoso misto para o cálculo do DC, acrescentando um fator de correção na tentativa de aproximar o conteúdo de O2 atrial
do conteúdo misto. Ainda, com o intuito de aproximar
os valores do conteúdo de O2 atrial daqueles do conteúdo misto, propomos a utilização de um fator de correção, pois, do ponto de vista fisiológico torna-se evidente
que o sangue atrial seja mais saturado em oxigênio do
que o sangue venoso misto.
O método de Fick inicialmente sofreu muitas limitações, principalmente no que concerne à obtenção de medidas do consumo de oxigênio. Existem laboratórios que
utilizam o consumo de oxigênio previsto pela idade, sexo
e área de superfície corpórea. A margem total de erro para
o cálculo do DC pelo método de Fick é em torno de 10%(25).
A inexatidão no valor do consumo de oxigênio pode aumentar a variabilidade do DC para mais de 10% principalmente quando se utiliza o consumo presumido e não o
consumo medido diretamente(26). Novas técnicas para medida direta do consumo de oxigênio foram desenvolvidas,
o que aprimorou este método para o cálculo do DC.
A calorimetria indireta é um método não invasivo que
fornece dados como consumo de oxigênio real (VO2),
produção de CO2 (VCO2), coeficiente respiratório (RQ)
e gasto energético real (GER)(27, 28, 29). Associada à coleta
de sangue venoso e arterial, é possível realizar o cálculo
do DC (Método de Fick) de maneira menos invasiva
quando comparada a termodiluição, e adequar esse valor numérico às necessidades reais de oferta de oxigênio
e nutrientes ao paciente num dado momento.
Tradicionalmente, colhe-se o sangue venoso misto da
artéria pulmonar para o cálculo do conteúdo venoso de
O2, que se trata de amostra correspondente ao retorno
venoso corporal efetivo. Existe a possibilidade de coleta
de uma amostra de sangue atrial com o intuito de validar
um método de cálculo de DC menos invasivo, onde podemos utilizar o consumo de oxigênio obtido pela
calorimetria indireta e amostras de sangue arterial periférico (artéria radial) e venoso atrial direito (cateter central) dispensando assim a necessidade do cateter de SwanGanz(30, 31).
A saturação de O2 no átrio direito, veia cava superior
e seio coronariano é diferente daquela do sangue venoso
misto tradicionalmente colhido do orifício distal do cateter de Swan-Ganz. O sangue venoso misto contém a
mistura de todo o sangue proveniente do retorno venoso
sistêmico, antes de ocorrer sua oxigenação no pulmão.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
CASUÍSTICA E MÉTODOS
O estudo clínico prospectivo foi realizado na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (Campus e Unidade de Emergência). O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, tendo sido
obtido o termo de consentimento livre e esclarecido em
todos os casos (Processo n° 4989/99 - HCRP).
A investigação envolveu 19 pacientes de ambos os sexos (14 do sexo masculino e cinco do sexo feminino),
vítimas de sepse de qualquer origem, com quadro clínico
de choque séptico, após restauração volêmica e estabilização hemodinâmica. Os critérios utilizados para o diagnóstico de choque séptico foram os estabelecidos pela conferência de consenso realizada pelo American College of
Chest Physicians/Society of Critical Care Medicine(32). Os
critérios de inclusão foram pacientes vítimas de choque
séptico do 1º ao 5º dia de evolução, com indicação de
monitorização hemodinâmica invasiva com cateter de
Swan-Ganz. Os critérios de exclusão incluíam: idade >
85 e < 15 anos, necessidade de FiO2 (fração de oxigênio
no ar inspirado) > 0,6, PAM (pressão arterial média) < 50
mmHg, diurese horária < 50 mL.h-1, fístula aérea, morte
encefálica e recusa do paciente ou responsável.
Todos os pacientes foram estratificados na admissão
na Unidade de Terapia Intensiva de acordo com o índice
de gravidade APACHE II(33) e pelo sistema de graduação
de sepse (34) . Em todos os casos foram realizados
monitorização hemodinâmica invasiva e não invasiva, restauração volêmica, suporte ventilatório mecânico com ventilador microprocessado, antibioticoterapia adequada, uso
de drogas vasoativas e suporte nutricional de acordo com
o gasto energético real calculado pela calorimetria indireta. Os pacientes foram sedados com benzodiazepínicos e/
ou opiáceos e bloqueador neuromuscular foi utilizado
quando necessário.O peso atual dos pacientes foi obtido
através de balança portátil eletrônica (Slingscale 2002,
Instrucom/Hill-Rom series, Hillenbrand Industries, EUA).
O protocolo teve duração média de oito horas, onde foram realizadas quatro séries de medidas do DC pelo método de termodiluição e pela calorimetria indireta. Todos
os pacientes foram submetidos a monitorização hemodinâmica invasiva com o cateter de Swan-Ganz calibre 7
F com introdutor 8,5 F (Baxter Healthcare Corp, EUA)
através de punção da veia jugular interna ou subclávia. A
medida do DC pela termodiluição foi realizada através do
monitor DIXTAL (Módulo 2010 Biomédica Ind e Com
LTDA, Brasil). Foi realizada a radiografia de tórax após o
procedimento para avaliar a posição do cateter e excluir
complicações. O DC foi determinado pela termodiluição
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
através da injeção de 10 mL de solução salina a 0,9% à
temperatura entre 0°C e 5°C, no tempo de dois a quatro
segundos, no orifício proximal do cateter (átrio direito),
estando o paciente em decúbito dorsal horizontal. Foram
realizadas três medidas, sempre ao final da expiração, e a
média das medidas foi considerada como valor definitivo
aceitando-se uma diferença de, no máximo, 10% entre elas.
Foram realizadas medidas invasivas de pressão arterial
radial, pressão arterial pulmonar, pressão venosa central
(PVC) e PAPO após insuflação do balão da ponta do cateter com 1,5 mL de ar. As medidas da PVC e PAPO foram
realizadas na fase final da expiração para evitar a interferência de pressões intratorácicas positivas, uma vez que o
paciente não era desconectado do ventilador mecânico.
Paralelamente, foram colhidas amostras de sangue venoso do orifício proximal (átrio direito), distal (artéria
pulmonar) do cateter de Swan-Ganz e sangue arterial (artéria radial) para análise dos gases sangüíneos que nos
permitiu avaliar a concentração de hemoglobina, a saturação de oxigênio no sangue arterial (SaO2) e venoso
(SvO2) e a pressão parcial de oxigênio no sangue arterial
(PaO2) e venoso (PvO2).
Após a obtenção do consumo de oxigênio pela
calorimetria indireta e os valores dos conteúdos de oxigênio no sangue arterial e venoso, foi possível calcular o
débito cardíaco de acordo com a equação de Fick. A fórmula abaixo representa a equação de Fick para o cálculo
do débito cardíaco.
DC = VO2/(CaO2 – CvO2) x 10 (L.min-1)
A fórmula abaixo mostra o cálculo do DC utilizando
o fator de correção (DC-Fick atrial corrigido):
DC = VO2/(CaO2 - CvO2x F) x 10 (L.min-1)
VO2 = Consumo de O2
CaO2 = Conteúdo arterial de O2
CvO2 = Conteúdo venoso de O2 extraído do átrio direito (orifício proximal do cateter)
F = Fator de correção (0,9222)
Este fator foi obtido a partir do cálculo da média (em
%) das diferenças entre o conteúdo venoso misto e atrial
de oxigênio, subtraída de 100%. O fator de correção encontrado foi de 0,9222.
Todos os pacientes foram submetidos à ventilação mecânica invasiva utilizando ventilador microprocessado
BIRD 8400 STi (Bird Prod Corp, EUA) ou SERVO 900C
(Siemens, Suécia). A modalidade ventilatória empregada variou de acordo com o grau de comprometimento
pulmonar de cada paciente e análise dos gases
7
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
sangüíneos. Os parâmetros básicos seguiram as orientações do FCCS-Fundamental Critical Care Support(35),
como: volume corrente de 8 a 10 mL.kg-1, fluxo de 40 a
60 L.min-1, freqüência respiratória de 12 a 16 ipm (incursões por minuto), PEEP inicial de 5 cmH2O e incrementos de acordo com a monitorização da SaO2. Esses
parâmetros foram alterados de acordo com a evolução
do quadro. A FiO2 foi sempre menor que 0,6, pois o sensor
de oxigênio do calorímetro perde sua precisão de leitura
quando em contato com altas frações de oxigênio(36, 37).
A calorimetria indireta foi realizada em todos os pacientes com o calorímetro portátil DELTATRAC II
Metabolic Monitor (Datex-Ohmeda, Finlândia). A
calibração de pressão barométrica e de gases foi realizada antes de cada protocolo. Foram realizadas quatro séries de 30 medidas consecutivas do consumo de O2 (VO2),
minuto a minuto, e o VO2 médio de cada série foi utilizado para o cálculo do DC.
ANÁLISE ESTATÍSTICA
O teste estatístico utilizado para comparação entre os
dois métodos de avaliação foi o teste não paramétrico dos
sinais de Wilcoxon para duas amostras correlacionadas.
Foi utilizado também o teste não paramétrico de
Friedman aproximado para grandes amostras. Em seguida, em vista da existência de diferença estatística significativa, foi aplicado o teste de comparações múltiplas não
paramétricas baseado na soma de postos de Friedman.
Consideramos como estatisticamente significativas,
as comparações com valor de p < 0,05. Foi realizado
também o coeficiente de correlação de Pearson entre a
variável (DC) obtida nos dois métodos.
RESULTADOS
Foram avaliados prospectivamente 19 pacientes (14
do sexo masculino e cinco do sexo feminino) com diagnóstico de choque séptico, em estabilidade hemodinâmica, admitidos na unidade de terapia intensiva entre o
3o e 5o dia de evolução do quadro. A idade média variou
de 45,4 ± 21,5 anos. O índice prognóstico APACHE II
médio foi de 22,4 ± 6,8 com risco de óbito calculado de
46,1 ± 26,8%. O SS (Sepsis Score) médio foi de 21,1 ±
8,6. Os principais dados clínicos e demográficos dos pacientes estão demonstrados na Tabela 1.
TABELA 1 - Diagnósticos clínicos e dados demográficos da população estudada.
Idade = anos, Peso = kg, Altura = cm, AP II = Índice prognóstico APACHE II,
Risco Óbito = Risco de óbito calculado pelo AP II (%), SS = Sepsis Score (Graduação de sepse).
Diagnóstico Infeccioso
Sexo
Idade
Peso
Altura
Pneumonia
M
28
67
173
Pneumonia
F
39
53
150
Pneumonia
M
35
74
177
Pneumonia
F
38
62
162
Pneumonia
M
19
67
177
Pneumonia
M
16
65
174
Pneumonia
F
78
70
163
Pneumonia
M
32
63
167
Pneumonia
M
31
70
176
Pneumonia
M
72
62
160
Pneumonia
M
67
77
170
Pneumonia
M
83
50
160
Celulite MID
M
22
70
170
Pneumonia
M
69
60
160
Pneumonia
M
48
80
177
Pneumonia
M
68
58
160
Pneumonia
M
55
80
170
Abscesso abdominal
F
41
88
162
Peritonite
F
23
62
160
39,0
67,0
167,0
MEDIANA
8
MÉDIA
45,4
66,2
166,7
DP
± 21,5
± 9,6
± 7,7
AP II
20
31
12
11
17
26
28
28
15
28
16
27
26
33
24
27
27
14
16
26,0
22,4
± 6,8
Risco Óbito
28
73
11
14
11
55
66
72
16
78
24
60
73
88
52
63
58
11
23
55,0
46,1
± 26,8
SS
27
21
26
12
45
09
10
11
17
28
19
22
25
26
15
16
17
28
27
21,0
21,1
± 8,6
Óbito
não
sim
não
não
não
não
não
não
não
sim
sim
não
não
sim
não
não
sim
não
sim
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
A maioria dos pacientes (84,21%; n = 16) foi vítima
de pneumonia com insuficiência respiratória aguda. Os
outros três casos foram vítimas de celulite grave em membro inferior direito, abscesso intraabdominal e peritonite,
respectivamente.
Não houve qualquer tipo de complicação inerente aos
procedimentos realizados (cateterização venosa central,
arterial periférica e ventilação mecânica invasiva).
Dos 19 pacientes estudados (42,1%; n = 8) evoluíram para o óbito. De acordo com o índice prognóstico
APACHE II, a média de óbitos esperada seria de 46,2%.
A média do DC dos 76 valores obtidos, correspondentes aos 19 pacientes sob estudo, pelo método de
termodiluição (DC-termo) foi de 7,0 ± 1,8 L.min-1, e pelo
método de Fick (DC-Fick misto) foi de 6,4 ± 1,7 L.min1
. Não houve diferença estatisticamente significativa dos
DC pelos métodos DC-termo e DC-Fick misto nos tempos T1 (p = 0,0874), T2 (p = 0,0577) e T3 (p = 0,4171).
No entanto, houve diferença estatisticamente significativa no tempo T4 (p = 0,0090) (Figura 1). A média das
diferenças dos valores do DC nas quatro séries de medidas foi de - 0,64 ± 0,24 L.min-1 (9,1 ± 3,3%). O coeficiente de correlação encontrado entre os valores médios
FIGURA 1 - Valores médios dos DC obtidos por
termodiluição e pelo método de Fick misto nos
tempos T1, T2, T3 e T4 (n = 19).
p=0,0874
p=0,0577
p=0,4171
observados do DC-termo e DC-Fick misto foi de 0,84
(Figura 2).
A comparação do DC-Fick misto e do DC-Fick
atrial foi realizada em oito pacientes com o intuito de
avaliar o comportamento da utilização do sangue venoso atrial como fonte para o cálculo do conteúdo
venoso de oxigênio.
A média dos valores do DC-Fick misto foi de 6,0 ±
1,2 L.min-1 e do DC-Fick atrial de 8,2 ± 2,4 L.min-1.
Houve diferença estatística significativa na medida
dos DC médios pelos métodos de DC-Fick misto e DCFick atrial nos tempos T1 (p = 0,0078), T2 (p = 0,0078),
T3 (p = 0,0156) e T4 (p = 0,0078) (Figura 3). O coeficiente de correlação encontrado entre as medidas dos DC
pelos métodos DC-Fick misto e DC-Fick atrial foi de
0,93 (Figura 4).
Quando comparamos os valores médios dos conteúdos de O2 venoso misto e atrial, observamos diferenças
importantes entre eles. Após corrigir o conteúdo de O2
atrial utilizando o fator de correção, observamos valores
médios bem mais próximos entre os conteúdos aos quais
corresponde uma correlação igual a 0,94. A média dos
valores médios do DC-Fick misto foi de 6,0 ± 1,2 L.minFIGURA 3 - Valores médios dos DC obtidos pelos
métodos de Fick misto e Fick atrial nos tempos
T1, T2, T3 e T4 (n = 8).
p=0,0090
p=0,0078
FIGURA 2 - Coeficiente de correlação entre os
valores médios dos DC obtidos por termodiluição
e pelo método de Fick misto (n = 19; r = 0,84).
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
p=0,0078
p=0,0156
p=0,0078
FIGURA 4 - Coeficiente de correlação entre os
valores médios dos DC obtidos pelos métodos
de Fick misto e Fick atrial (n = 8; r = 0,93).
9
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
e do DC-Fick atrial corrigido de 5,9 ± 1,4 L.min-1.
Não houve diferença estatisticamente significativa entre a medida do DC-Fick misto e DC-Fick atrial corrigido nos tempos T1 (p = 0,4609), T2 (p=0,4688), T3 (p =
0,3125) e T4 (p = 0,5469) (Figura 5). A média das diferenças dos valores do DC nas quatro séries de medidas
foi de 0,14 ± 0,18 L.min-1 (3,3 ± 1,3%). Após a realização do cálculo do DC através do sangue atrial corrigido,
encontramos uma correlação de 0,94 (Figura 6).
Quando comparamos os valores médios do DC pelos
métodos DC-termo e DC-Fick atrial corrigido no grupo
de oito pacientes, observamos diferença estatisticamente significativa nos tempos T1(p = 0,0234) e T3 (p =
0,0469). Nos tempos T2 (p = 0,3125) e T4 (p = 0,5469)
não houve diferença estatisticamente significativa. Provavelmente essa diferença pode estar relacionada ao número (n = 8) menor de pacientes neste grupo.
De acordo com os resultados obtidos, não houve diferença estatisticamente significativa entre a medida do DCtermo e DC-Fick misto nos tempos T1, T2 e T3, mas apenas no tempo T4. O coeficiente de correlação entre a medida do DC-termo e DC-Fick misto foi de r = 0,84 (n = 19).
1
FIGURA 5 - Valores médios dos DC obtidos pelos
métodos de Fick misto e Fick atrial corrigido nos tempos
T1, T2, T3 e T4 (n = 8). Podemos observar maior
aproximação entre os valores nesses dois métodos.
p=0,4609 p=0,4688 p=0,3125 p=0,5469
Houve diferença estatisticamente significativa entre
a medida do DC-Fick misto e DC-Fick atrial nos quatro
tempos (T1 a T4), apesar do coeficiente de correlação
ter sido de r = 0,93 (n = 8).
Após aplicar o fator de correção, a correlação entre o
conteúdo de O2 atrial e misto foi de r = 0,94. Não houve
diferença estatística significativa entre a medida do DCFick misto e DC-Fick atrial corrigido nos quatro tempos
(T1 a T4) e o coeficiente de correlação foi de 0,94 (n =
8). Quando comparamos o DC-Fick atrial corrigido com
a termodiluição nos oito casos, observamos diferença estatística nos tempos T1 e T3 e não observamos diferença
nos tempos T2 e T4. Como comentado anteriormente,
essa diferença poderia ser explicada pelo número menor
de pacientes estudados (n = 8).
Os valores médios do DC obtidos por termodiluição
e pela calorimetria utilizando sangue misto, atrial e atrial
corrigido estão apresentados na Figura 7, onde podemos observar uma discrepância nítida dos valores médios do DC-Fick atrial quando comparados com os demais.
Neste estudo, a diferença média entre os valores médios dos DC obtidos pelos dois métodos (DC-termo e
DC-Fick misto) foi de 0,4 ± 0,9 L.min-1 para os DC inferiores a 7 L.min-1 e para os valores médios de DC superiores a 7 L.min-1 foi de 0,9 ± 1,1 L.min-1. E as diferenças
estatísticas foram significativas nas situações de DC
médio > 7 L.min-1 (p = 0,0451) e não significativas nas
situações de DC médio < 7 L.min-1 (p = 0,1595).
DISCUSSÃO
A maior responsável pela alta mortalidade no choque
séptico é a Síndrome de Disfunção de Múltiplos Órgãos e
Sistemas (SDMOS) que é resultante do desequilíbrio entre a oferta e demanda de oxigênio nos diversos tecidos.
FIGURA 6 - Coeficiente de correlação entre os
valores médios dos DC obtidos pelos métodos de Fick
misto e Fick atrial corrigido (n = 8; r = 0,94).
10
FIGURA 7 - Valores médios dos DC obtidos por
termodiluição e pela calorimetria utilizando sangue
venoso misto, atrial e atrial corrigido (n=8). Observamos
aqui valores de DC sempre maiores quando utilizamos
o sangue atrial, com reaproximação desses valores
quando corrigimos o sangue com o fator de correção.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
O DC é um parâmetro hemodinâmico essencial para
o manuseio clínico de pacientes com desequilíbrio entre
a oferta e a demanda de oxigênio. Uma vez sendo possível a obtenção de seu valor num estágio inicial de instalação do quadro e de maneira menos invasiva, pode-se
interferir positivamente na evolução clínica dos pacientes vítimas de choque séptico e ao mesmo tempo evitar
as complicações inerentes à passagem de um cateter de
Swan-Ganz.
No presente estudo, o coeficiente de correlação utilizando o sangue venoso misto foi de 0,84 (n=19) e de
0,93 (n=8) quando utilizamos o sangue atrial. Estes valores se aproximam daqueles da literatura e ainda uma
discreta melhora do coeficiente de correlação pôde ser
observado quando se utilizou o fator de correção para o
sangue atrial (r = 0,94).
Este estudo apresenta a calorimetria indireta como
método de monitorização não invasiva do paciente crítico utilizando os parâmetros obtidos para o cálculo de
uma variável hemodinâmica de fundamental importância que é o débito cardíaco.
A termodiluição possui limitações inerentes ao seu
caráter invasivo e mesmo de acurácia em situações como
shunt intracardíaco e patologias valvares pulmonar e/ou
tricúspide. No shunt da direita para a esquerda, uma parte do líquido passa através da comunicação registrando
uma curva de termodiluição abreviada semelhante à curva de alto débito. No shunt da esquerda para a direita, a
curva também é abreviada porque o sangue vindo do
coração esquerdo aumenta o volume nas câmaras direitas, diluindo a solução injetada. Logo, nas situações de
shunt, ocorrem medidas de DC falsamente altas(38). Na
regurgitação tricúspide, ocorre refluxo da solução
indicadora através da válvula em direção ao átrio direito. Isso produz uma curva de termodiluição prolongada
e de baixa amplitude, determinando medidas de DC falsamente baixas(39). Em pacientes ventilados mecanicamente com pressão positiva ocorre aumento das pressões em câmaras direitas, propiciando o aparecimento
de regurgitação tricúspide e, portanto, erro na mensuração
do DC por termodiluição(38).
Em situações de baixo débito, as curvas de DC são
de baixa amplitude, o que afeta a precisão da termodiluição por diminuir a razão sinal/interferência. De
acordo com estudo de van GRONDELLE et al.(40), ocorre uma superestimação da medida do DC por termodiluição em situações de baixo débito.
Menos invasividade e informações mais acuradas são
prioridade quando se trata de cuidados a pacientes em
estado crítico. Em princípio, o método de Fick aqui proposto requer o uso de cateter venoso central para coleta
de amostra sangüínea. Entretanto, a cateterização cenVolume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
tral está indicada na maioria dos pacientes de terapia intensiva por outros motivos. Portanto, é uma técnica menos invasiva quando comparada com a termodiluição.
A vantagem do método de Fick está na maior exatidão no cálculo do DC em situações de baixos fluxos
sistêmicos, sendo preferível em relação a termodiluição
nesses casos(40). É também independente de fatores que
afetam o formato da curva, o que leva a erros de valores
do DC pela termodiluição. Finalmente, essa técnica é
ainda um procedimento menos invasivo. Neste estudo, a
média das diferenças dos valores do DC nas quatro séries de medidas entre os dois métodos (DC-termo e DCFick misto) para os valores de DC inferiores a 7 L.min-1
foi de 0,4 ± 0,9 L.min-1 e para os valores de DC superiores a 7 L.min-1 foi de 0,9 ± 1,1 L.min-1. As diferenças
estatísticas foram significativas nas situações de DC > 7
L.min-1 (p = 0,0451) e não significativas nas situações
de DC < 7 L.min-1 (p = 0,1595). Esses valores demonstram uma aproximação maior dos dois métodos nas situações de DC menores, apesar desses valores não representarem situações de baixo débito.
Técnicas menos invasivas não são largamente utilizadas por vários motivos, tais como: alto custo, complexidade e margem de erro. Além disso, a medida do DC
não é um parâmetro que pode ser avaliado isoladamente. Já o cateter de Swan-Ganz oferece outros dados
hemodinâmicos, tais como pressão capilar pulmonar e
trabalhos cardíacos. Por outro lado, através do cateter de
Swan-Ganz a medida do DC é feita pela técnica de termodiluição que possui limitações como exposto anteriormente. O método de Fick, além de fornecer o DC, permite a obtenção de outras variáveis hemodinâmicas como
RVS, RVP, DO2 e em estágios mais precoces de evolução clínica, uma vez que não oferece maior invasividade.
Existem algumas críticas impostas ao método de Fick,
como dificuldade de coleta de gases expirados através do
saco de Douglas, classicamente usado para esse fim, e
necessidade de coleta de sangue arterial e venoso misto.
Com a evolução tecnológica, surgiram equipamentos
com melhor acurácia para medida de consumo de oxigênio, como o calorímetro. Isso despertou o interesse na
utilização do método de Fick para a determinação do
débito cardíaco em pacientes críticos. Entretanto, devemos considerar que o calorímetro é um equipamento de
alto custo e necessita de pessoal treinado para seu manuseio. Apesar disso, a técnica é de fácil realização e fornece não somente o consumo de oxigênio como também
a produção de CO 2, coeficiente respiratório, gasto
energético real e outras variáveis importantes no manuseio de pacientes críticos obtidas através de equações
matemáticas. Uma variável importante é a oferta de oxigênio, que podemos calcular através do débito cardíaco
11
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
e conteúdo arterial de oxigênio obtido pela coleta de
amostra de sangue arterial.
A calorimetria indireta é um método não invasivo e
praticamente isento de riscos, que fornece com maior
exatidão o consumo de oxigênio corporal, uma vez que
é realizada a medida direta dessa variável e não através
de cálculos como é feito pelos dados da monitorização
hemodinâmica invasiva. Dessa forma, considera o consumo pulmonar de oxigênio. Existe a limitação de uso
naqueles casos de pacientes utilizando altas frações inspiradas de O2. No entanto, existem estudos relatando a
utilização do VCO2 como fonte para o cálculo do DC,
pois essa variável não sofre influência de altas taxas de
FiO2(41, 42, 43, 44). Ainda, esse método pode ser utilizado em
situações precoces de instabilidade hemodinâmica, onde
a necessidade de altas FiO2 geralmente não existe, servindo como triagem para a indicação de monitorização
hemodinâmica invasiva.
O valor da medida da saturação de O2 no sangue do
átrio direito ou da veia cava superior tem sido questionado principalmente quando a saturação é maior do que
65%(45). A saturação de O2 no sangue atrial e na veia cava
superior é diferente daquela do sangue misto. Isso se deve
ao fato de que o consumo de oxigênio nos diferentes
órgãos é variável, o consumo cerebral de oxigênio é maior
e o consumo renal é menor, desproporcional ao seu fluxo sangüíneo, fazendo com que a saturação de O2 na
veia cava superior seja menor do que na veia cava inferior(46, 47). Apesar disso, esses dados de saturação regional
é válido para condições normais. Em pacientes críticos,
sedados, ocorre uma diminuição do metabolismo cerebral e, conseqüentemente, do consumo cerebral de oxigênio, e ainda, o estado de hipermetabolismo próprio de
pacientes em choque séptico pode alterar a saturação de
O2 nos diversos territórios vasculares.
Uma boa correlação entre a saturação atrial e venosa
mista tem sido descrita por alguns autores (30, 31) .
REINHART et al. compararam a saturação venosa mista com a saturação em veia cava superior em modelo
experimental e demonstraram uma excelente correlação
(r = 0,97)(48). LEE et al. estudaram 29 pacientes estáveis
e 15 pacientes em choque circulatório (séptico,
hemorrágico e neurogênico) encontrando boa correlação entre a saturação venosa atrial e mista(49). No presente estudo, a utilização do sangue atrial para fins de cálculo do conteúdo venoso de oxigênio mostrou boa correlação com o conteúdo venoso misto, principalmente
quando utilizamos um fator de correção (r = 0,94). A
utilização de fatores de correção é citada em inúmeros
trabalhos científicos(23, 50, 51). No presente estudo, a utilização desse fator, aprimorou o método, uma vez que aproximou os valores do DC daqueles obtidos com o sangue
12
venoso misto e com a termodiluição. Apesar da boa correlação do DC Fick misto/DC Fick atrial (r = 0,93), houve diferenças estatisticamente significativas entre as medidas nos quatro tempos e, quando corrigimos esse valor, as diferenças não mais ocorreram e o coeficiente de
correlação se manteve elevado (r = 0,94). A média das
diferenças dos valores do DC nas quatro séries de medidas foi de - 0,64 ± 0,24 L.min-1 (9,1 ± 3,3%) para o sangue misto e de 0,14± 0,18 L.min-1 (3,3 ± 1,3%) para o
sangue atrial corrigido. Isto é similar às diferenças descritas entre as medidas sucessivas de termodiluição, que
é de 9,4 ± 6,2%(3), lembrando, ainda, que o DC apresenta
uma variabilidade espontânea de 10%(52).
Observamos, neste estudo, que a concordância entre
os dois métodos foi satisfatória com base em decisões
tomadas para a terapêutica. Não observamos nenhuma
diferença entre os métodos que pudesse culminar com
terapia incorreta.
De acordo com SHOEMAKER et al. (1998), em toda
técnica de monitorização, ansiedade, hiperventilação e
agitação podem intensificar as respostas fisiológicas. Entretanto, em situação de emergência, não é tão importante ter a mesma acurácia requerida para condições estáveis, mesmo porque as medidas basais são freqüentemente desconhecidas e os valores ótimos para cada
paciente podem variar de acordo com as comorbidades
presentes. Por outro lado, na prática, 10% a 15% de diferença entre a estimativa do DC invasivo e não invasivo
pode ser aceitável quando alterações de 30% a 50% do
normal estão presentes(53).
A termodiluição apresenta limitação de acurácia tanto em situações de alto como de baixo DC, principalmente quando o paciente apresenta hipotermia, arritmias
cardíacas, calafrios e ansiedade ou quando há erros quanto à temperatura e volume do injetado. O método de Fick
é menos invasivo e sofre menos influência daqueles fatores externos que interferem na termodiluição(3).
Finalmente, a intervenção precoce no tratamento do
choque séptico é essencial e se correlaciona com diminuição de mortalidade. RIVERS et al., em estudo publicado
recentemente (2001), propuseram uma estratégia precoce
na abordagem inicial de pacientes com choque séptico(54).
Esses autores evidenciaram diminuição da taxa de mortalidade de 46,5% para 30,5% quando compararam a estratégia convencional (guiada por débito urinário, PAM e
PVC) de tratamento com a precoce, respectivamente. Dentro da estratégia precoce estava incluída a mensuração da
saturação venosa central de oxigênio (SCO2 ≥ 70%), que
serviu de guia para a restauração da perfusão tecidual.
A proposta de estratégias menos invasivas para a obtenção de variáveis hemodinâmicas é para se ter acesso
mais precoce, e sem adição de risco, a dados que podem
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
interferir positivamente no prognóstico do paciente grave. Esta abordagem precoce é uma oportunidade crucial
para intervenções terapêuticas rápidas, no momento certo, para restaurar a perfusão tecidual, antes que a
disfunção orgânica irreversível se instale.
Com certeza, a calorimetria indireta faz parte, hoje,
desse arsenal de avaliação precoce do paciente grave.
Contudo, uma experiência maior e a divulgação do método serão necessárias para que tal procedimento possa
ser utilizado à beira do leito por um maior número de
intensivistas e de forma eficiente.
Os resultados do presente estudo permitem concluir
que a calorimetria indireta é um bom método para a medida menos invasiva do débito cardíaco em pacientes vítimas de choque séptico, apresentando resultados similares àqueles obtidos pela termodiluição.
A utilização do sangue venoso atrial para o cálculo
do conteúdo venoso de O2 correlaciona-se bem com os
métodos já definidos pela literatura para o cálculo do
débito cardíaco. A tentativa de se introduzir um fator de
correção para o conteúdo atrial de oxigênio mostrou-se
interessante, uma vez que existe uma boa aproximação
dos valores de DC obtidos com o sangue atrial com aqueles obtidos com o sangue misto e termodiluição.
Dessa forma, e embora os resultados do presente estudo apontem para o fato de que a medida do DC pode
ser obtida através da calorimetria indireta, estudos adicionais com amostragem maior serão necessários para que
se possa validar o uso desse método em pacientes vítimas de choque séptico admitidos em unidades de terapia intensiva
LIMITAÇÕES DO MÉTODO
Este método como qualquer outro, apresenta limitações do ponto de vista do procedimento bem como da
interpretação de resultados. As principais limitações se
relacionam à coleta do sangue atrial pelo orifício proximal
do cateter de Swan Ganz. Esta amostra não corresponde
exatamente ao sangue venoso misto e a posição exata do
cateter dentro do átrio pode variar e interferir na saturação de O2 da amostra colhida. A saturação de O2 no átrio
alto, médio e baixo são diferentes. Talvez a coleta do
sangue da veia cava superior pudesse ser uma opção,
porém, considerando também que a posição do cateter
poderia variar e a amostra não traduzir o retorno venoso
efetivo.
A utilização do calorímetro em pacientes necessitando de altas frações inspiradas de oxigênio não é possível. O equipamento apresenta um sensor que não faz leituras corretas quando em contato com altas concentrações de O2. Além disto, fatores externos como temperaVolume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
tura ambiente, pressão barométrica e umidade podem interferir na leitura do calorímetro. O ambiente deve ser o
mais calmo possível. E, finalmente, o calorímetro é um
equipamento de alto custo, o que limita o seu uso rotineiro em unidades de terapia intensiva.
RESUMO
O objetivo deste estudo foi comparar as medidas do
débito cardíaco (DC) obtidas pela termodiluição (DCtermo) e pela calorimetria indireta (DC-Fick misto) em
pacientes vítimas de choque séptico. Foram estudados
19 pacientes (14 homens e 5 mulheres) com idade média
de 45,4 ± 21,5 anos, APACHE II de 22,4 ± 6,8 com risco
de óbito de 46,1 ± 26,8% e sepsis score de 21,1 ± 8,6.
Foram realizadas quatro séries de medidas do DC pelos
dois métodos (termodiluição e método de Fick). Em oito
casos foram coletadas também amostras de sangue atrial.
Não houve diferenças estatisticamente significativas
entre os valores do DC-termo e DC-Fick misto (7,0 ±
1,8 L.min-1 e 6,4 ± 1,7 L.min-1, respectivamente). A despeito dos dados encontrados no T4 (p = 0,0090), não
houve diferença estatisticamente significativa para o DCtermo e DC-Fick misto obtido nas outras medidas (T1: p
= 0,0874, T2: p = 0,0577, T3: p = 0,4171). Na avaliação
dos oito casos (DC-Fick misto/DC Fick atrial), foi introduzido um fator de correção para aproximar os valores
do conteúdo de O2 atrial (DC-Fick atrial corrigido) com
o venoso misto. Não houve diferença estatisticamente
significativa do DC-Fick misto e DC-Fick atrial corrigido nos 4 tempos (T1:p = 0,4609, T2: p = 0,4688, T3: p =
0,3125, T4: p = 0,5469).
A média dos valores do DC pelo método de DC-Fick
misto foi de 6,0 ± 1,2 L.min-1 e pelo DC-Fick atrial corrigido foi de 5,9 ± 1,4 L.min-1. O coeficiente de correlação foi de 0,84 para o DC-termo/DC-Fick misto e de
0,94 para o DC-Fick misto/DC-Fick atrial corrigido.
Nós podemos concluir que a calorimetria indireta é
um bom método para a medida menos invasiva do DC
em pacientes vítimas de choque séptico, sobretudo naqueles casos onde a monitorização hemodinâmica
invasiva não está disponível ou está contra indicada.
UNITERMOS: Calorimetria indireta, termodiluição,
débito cardíaco, choque séptico.
AGRADECIMENTOS:
Ao apoio financeiro complementar para a execução
deste projeto de pesquisa fornecido pela Fundação de
Apoio ao Ensino e Pesquisa (FAEPA) do Hospital das
Clínicas de Ribeirão Preto e Pró-Reitoria de Pesquisa da
Universidade de São Paulo.
13
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
26.
27.
14
Shoemaker WC, Czer LS. Evaluation of the biological importance of various hemodynamics and oxygen transport variables: which variables should
be monitored in postoperative shock? Crit Care Med 1979; 7: 424-31.
Parker MM, Parrillo JE. Septic Shock: hemodynamics and pathogenesis.
JAMA 1983; 250: 3324-7.
Shoemaker WC, Parsa MH. Invasive and noninvasive monitoring. In:
Shoemaker WC, Holbrook PR, Ayres SM, eds. Textbook of Critical Care.
Philadelphia: W. B. Saunders & Co., 2000; 74-91.
Swan HJ, Ganz W, Forrester J, et al. Catheterization of the heart in man
with use of a flow-directed balloon-tipped catheter. N Engl J Med 1970;
283: 447- 451.
Light RB. Intrapulmonary oxygen consumption in experimental pneumococcal pneumonia. J Appl Physiol 1988; 64: 2490-2495.
Robin ED. The cult of the Swan-Ganz catheter: overuse and abuse of the
pulmonary flow catheter. Ann Intern Med 1985; 103: 445-449.
Robin ED. Death by pulmonary artery flow-directed catheter. Time for a
moratorium? Chest 1987; 92: 727-731.
Connors AF Jr, Speroff T, Dawson NV, et al. The effectiveness of right
heart catheterization in the initial care of critically ill patients. JAMA
1996; 276:889-897.
Pinsky MR. Determinants of pulmonary artery flow variation during respiration. J Appl Physiol 1984; 56: 1237-1245.
Okamoto K, Komatsu T, Kumar V, et al. Effects of intermittent positivepressure ventilation on cardiac output measurements by thermodilution.
Crit Care Med 1986; 14: 977-980.
Jansen Jr, Schreuder JJ, Settels JJ, et al. An adequate strategy for the
thermodilution technique in patients during mechanical ventilation. Intensive Care Med 1990; 16: 422-425.
Driscoll A, Shanahan A, Crommy L, et al. The effect of patient position
on the reproducibility of cardiac output measurements. Heart Lung 1995;
24: 38-44.
Ganz W, Donoso R, Marcus HS, et al. A new technique for measurement of
cardiac output by thermodilution in man. Am J Cardiol 1971; 27: 392-396.
Buchbinder N, Ganz W. Hemodynamic monitoring: invasive techniques.
Anesthesiology 1976; 45: 146-155.
Pearl RG, Rosenthal MH, Nielson L, et al. Effect of injectate volume and
temperature on thermodilution cardiac output determination. Anesthesiology 1986; 64: 798-801.
Maruschak GF, Schauble JF. Limitations of thermodilution ejection fraction: degradation of frequency response by catheter mounting of fastresponse thermistors. Crit Care Med 1985; 13: 679-682.
Hodges M, Downs JB, Mitchell LA. Thermodilution and Fick cardiac
index determinations following cardiac surgery. Crit Care Med 1975; 3:
182-184.
Carpenter JP, Nair S, Staw I. Cardiac output determination: thermodilution versus a new computerized Fick method. Crit Care Med 1985; 13:
576-579.
Davies GG, Jebson PJ, Glasgow BM, et al. Continuous Fick cardiac output compared to thermodilution cardiac output. Crit Care Med 1986; 14:
881-885.
Kubo SH, Burchenal JE, Cody RJ. Comparison of direct Fick and thermodilution cardiac output techniques at high flow rates. Am J Cardiol
1987; 59: 384-386.
Lynch J, Kaemmerer H. Comparison of a modified Fick method with
thermodilution for determining cardiac output in critically ill patients on
mechanical ventilation. Intensive Care Med 1990; 16: 248-251.
Keinanen O, Takala J, Kari A. Continuous measurement of cardiac output by the Fick principle: clinical validation in intensive care. Crit Care
Med 1992; 20: 360-5.
Brandi LS, Bertolini R, Pieri M, et al. Comparison between cardiac output measured by thermodilution technique and calculated by O 2 and modified CO 2 Fick methods using a new metabolic monitor. Intensive Care
Med 1997; 23: 908-915.
Capderou A, Douguet D, Losy J, et al. Comparison of indirect calorimetry and thermodilution cardiac output measurement in children. Am J
Respir Crit Care Med 1997; 155: 1930-1934.
Visscher MB, Johnson JA. The Fick principle: analysis of potential errors in its conventional application. J Appl Physiol 1953; 5: 635-645.
Davidson CJ, Bonow RO. Cardiac catheterization. In: Braunwald, E;
Zipes, DP; Libby, P eds. Heart Disease: Textbook of Cardiovascular Medicine. Philadelphia: W. B. Saunders & Co., 2001; 359-386.
Weir JB. New methods for calculating metabolic rate with special refer-
ence to protein metabolism. J Physiol 1949; 109: 1-9.
28. Simonson DC, Defronzo RA. Indirect calorimetry: methodological and
interpretative problems. Am J Physiol 1990; 258: E399-E412.
29. Suen VMM, da Silva GA, Marchini JS. Determinação do metabolismo
energético no homem. Medicina (Ribeirão Preto) 1988; 31:13-21.
30. Schienman MM, Brown MA, Rapaport E. Critical assessment of use of
central venous oxygen saturation as a mirror of mixed venous oxygen in
severely ill cardiac patients. Circulation 1969; 40: 165-172.
31. Tahvanainen J, Meretoja O, Nikki P. Can central venous blood replace
mixed venous blood samples? Crit Care Med 1982; 10: 758-761.
32. Bone RC, Balk RA, Cerra FB, et al. Definitions for sepsis and organ
failure and guidelines for the use of innovative therapies in sepsis. The
ACCP/SCCM Consensus Conference Committee. American College of
Chest Physicians/Society of Critical Care Medicine. Chest 1992; 101:
1644-1655.
33. Knaus WA, Draper EA, Wagner DP, et al. Apache II: a severity of disease
classification system. Crit Care Med 1985; 13: 818-829.
34. Elebute EA, Stoner HB. The grading of sepsis. Br J Surg 1983; 70: 29-31.
35. Fundamental Critical Care Support - FCCS Course Text, 2 th Ed. Society
of Critical Care Medicine, USA, 1998.
36. Takala J, Keinanen O, Vaisanen P, et al. Measurement of gas exchange in
intensive care: laboratory and clinical validation of a new device. Crit
Care Med 1989; 17: 1041-47.
37. Tissot S, Delafosse B, Bertrand O, et al. Clinical validation of the
Deltatrac monitoring system in mechanically ventilated patients. Intensive Care Med 1995; 21: 149-53.
38. Marino PL. Termodiluição: métodos e aplicações. In: Compêndio de UTI
ed. Editora Artes Médicas Sul Ltda, 1999; 155-161.
39. Konishi T, Nakamura Y, Morii I, et al. Comparison of thermodilution and
Fick methods for measurement of cardiac output in tricuspid regurgitation. Am J Cardiol 1992; 70: 538-539.
40. Van Grondelle A, Ditchey RV, Groves BM, et al. Thermodilution method
overestimates low cardiac output in humans. Am J Physiol 1983; 245:
H690-692.
41. Mahutte CK, Jaffe MB, Sassoon CS, et al. Cardiac output from carbon
dioxide production and arterial and venous oximetry. Crit Care Med 1991;
19: 1270-1277.
42. Mahutte CK, Jaffe MB, Chen PA, et al. Oxygen Fick and modified carbon dioxide Fick cardiac outputs. Crit Care Med 1994; 22: 86-95.
43. Mahutte CK, Jaffe MB. Effect of measurement errors on cardiac output
calculated with O 2 and modified CO 2 Fick methods. J Clin Monit 1995;
11: 99-108.
44. Binder JC, Parkin WG. Non-invasive cardiac output determination: comparison of a new partial-rebreathing technique with thermodilution.
Anaesth Intensive Care 2001; 29: 19-23.
45. Edwards JD, Mayall RM. Importance of the sampling site for measurement of mixed venous oxygen saturation in shock. Crit Care Med 1998;
26: 1356-60.
46. Cargill WH, Hickam JB. The oxygen consumption of the normal and
diseased human kidney. J Clin Invest 1949; 28: 526-530.
47. Barratt-Boyes BG, Wood EH. The oxygen saturation of blood in the vena
cavae, right heart chambers and pulmonary vessels of healthy subjects. J
Lab Clin Med 1957; 50: 93-106.
48. Reinhart K, Rudolph T, Bredle DL, et al. Comparison of central-venous
to mixed-venous oxygen saturation during changes in oxygen supply/
demand. Chest 1989; 95: 1216-1221.
49. Lee J, Wright F, Baber R, et al. Central venous oxygen saturation in shock:
a study in man. Anesthesiology 1972; 36: 472-8.
50. Baskoff JD, Maruschack GF. Correction factor for thermodilution determination of cardiac output in children. Crit Care Med 1981; 9: 870-872.
51. Sanchez M, El-Khoury AE, Castillo L, et al. Twenty-four hour intravenous and oral tracer studies with L-[ 1-13C] phenylalanine and L-[ 3,3 –
2H2] tyrosine at tyrosine-free generous phenylalanine intake in adults.
Am J Clin Nutr 1996; 63:532-542.
52. Sasse SA, Chen PA, Berry RB, et al. Variability of cardiac output over time in
medical intensive care unit patients. Crit Care Med 1994; 22: 225-32.
53. Shoemaker WC, Belzberg H, Wo CC, et al. Multicenter study of
noinvasive monitoring systems as alternatives to invasive monitoring of
acutely ill emergency patients. Chest 1998; 114: 1643-1652.
54. Rivers E, Nguyen B, Havstad S, et al. Early goal-directed therapy in the
treatment of severe sepsis and septic shock. N Engl J Med 2001; 345:
1368-77.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Estudo de 596 Casos Consecutivos de Traumatismo
Craniano Grave em Florianópolis-1994-2001
A study of 596 consecutive cases of severe head trauma
from 1994 to 2001 in Florianopolis, Brazil.
Evandro Tostes Martins1,Thales Schott da Silva2, Mario Coutinho3
ABSTRACT
Rationale: Trauma is the major cause of mortality in the population less than 40 years old. At least 60% of trauma deaths
are secondary to head trauma. Brazil has a high incidence of traffic accidents.
Objective: Our main objective was to study the epidemiology and mortality secondary to severe head trauma in the
metropolitan area of Florianopolis (circa 600,000 inhabitants). We compared the impact of traffic safety campaigns on
the epidemiologic variables and mortality in the period from 1994 to 2001.
Material and methods: Departing from a data bank of patients admitted with severe head trauma (Glasgow Coma Scale £
8) to the Intensive Care Unit of Hospital Celso Ramos, which is the center for neurotrauma in the metropolitan Florianopolis,
in the period beginning on January 1st 1994 going to December 31st 2001. Data of 596 consecutive patients were collected
and the following variables analysed: demographics, cause of trauma, Marshall´s tomographic classification for head
trauma and in-hospital mortality. We compared mortality of two periods: 1994 to 1995 and 2000 to 2001.
Results: Men represented 85% of the deceased, most (74%) age between 12 and 40 years old. In-hospital mortality in
1994-1995 was 44% and in 2000-2001, it decreased to 29,7%. Victims of car accidents were 33% and 12,8%, respectively. On the other hand, victims of motocycle accidents were 13% and 30,7%, respectively. The rate of pedestrians
victims kept stable, 31% and 30,7%, respectively. Mass lesions evacuated (after Marshall) were 29% in the period
1994-1995 and 34,2% in the period 2000-2001.
Conclusions: The use of safety belt and the new national traffic law in act since 1998, have changed the epidemiology
of head trauma in Florianopolis. The prevalent victim profile of traffic accidents with head trauma leading to hospitalization changed from car passengers to motorcycle conductors accidents and pedestrians. There was a decreased in
mortality rate probably due to better pre-hospital and in-hospital care, especially intensive care, frequent intra-craneal
pressure monitoring, better classification and tomographic control and better treatment of clinical and surgical complications. The importance of safety in traffic campaigns with obligation of safety belt use and the new national traffic law,
as well as the need of new awareness campaigns for motocycle conductors and pedestrians.
Key Words: Neurointensive care; head trauma; neurotrauma; trauma; epidemiology
trauma é a principal causa de mortalidade na
população menor de 40 anos de idade, tem
enormes implicações na sociedade tanto do
ponto de vista econômico como social, principalmente
por acometer uma faixa etária jovem da população, tendo como implicações a nível de saúde pública o números de anos de vida perdidos. O Brasil tem uma alta incidência de acidentes de tráfego, e agora apresenta um crescente aumento da violência inter-pessoal.
O intensivista principalmente nos hospitais públicos
convive diariamente com vítimas de trauma, apesar de
sua freqüência, o trauma é ainda uma doença negligenciada não só por nossa sociedade ,como pela própria classe médica, temos poucos trabalhos no que concerne a
O
epidemiologia do trauma no nosso país, especialmente o
trauma craniano que é responsável por 60-70 % das
mortes de trauma. Inspirados no Traumatic Coma Data
Bank começamos em outubro de 1993 a coletar dados
de pacientes admitidos na UTI do Hospital Governador
Celso Ramos, hospital público estadual, referência na
área de Neurotraumatologia em Florianópolis. Até 31 de
dezembro de 2001 tínhamos 616 pacientes cadastrados
no nosso banco de dados.
Durante este período de cerca de 8 anos coletando
dados, foi possível monitorar a evolução do trauma na
Grande Florianópolis, cidade em franco crescimento
populacional de cerca de 600.000 habitantes pelas admissões de pacientes admitidos na UTI no decorrer des-
1. Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB – Médico Intensivista do Hospital Governador Celso Ramos e UTI-do Hospital
Universitário da UFSC
2. Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB – Médico Intensivista do Hospital Governador Celso Ramos e da UTI- do Hospital
Universitário da UFSC
3.Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB – Médico Intensivista do Hospital Governador Celso Ramos. – Professor Adjunto do
Departamento de Clínica Médica da UFSC
Endereço para correspondência- Hospital Governador Celso Ramos- Unidade de Terapia Intensiva- Rua Irmã Benwarda, 297 CEP88015-270 Centro- Florianópolis SC – e-mail- [email protected]
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
15
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
TABELA 1: Freqüência dos traumatismos cranioencefálicos na UTI do Hospital Gobernador Celso Ramos (HGCR) no período
de 1994-2001. Mortalidade Intra - hospitalar 1994-1995= 44 %; Mortalidade Intra-hospitalar 2000-2001 = 29,7 %
CAUSAS
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
total
ATROPELAMENTO
26
25
20
18
10
32
21
22
174
ACID. AUTO
32
22
21
15
10
21
12
6
139
MOTO
10
12
27
28
19
12
22
21
151
QUEDA
9
13
8
8
10
8
10
9
75
AGRESSÃO
2
1
4
4
3
3
5
4
26
OUTROS
4
7
2
2
3
5
5
3
31
TOTAL
83
80
82
75
55
81
75
65
596
tes anos. Tivemos a oportunidade de evidenciar como
certas medidas influenciaram no perfil das vítimas de
acidente de trânsito, tais como a obrigatoriedade do cinto de segurança e o novo código nacional de trânsito.
Constatamos o aumento das vítimas por atropelamento e motocicletas, e a progressiva diminuição das vítimas por acidente automobilístico, observando a melhoria
no atendimento das vítimas de trauma no atendimento
pré e intra-hospitalar, influenciando na progressiva queda na mortalidade e pudemos influir em tomadas de decisões na mídia, em campanhas tais como a duplicação
da BR-101 a melhoria no sistema de atendimento ao trauma e campanhas de prevenção.
MATERIAL E MÉTODOS
Estudo prospectivo, observacional de 596 casos de
TCE grave admitidos na UTI (Com escala de coma de
Glasgow menor ou igual a 8) pós-ressuscitação ou que
evoluíssem para tal em até 48 hs), desprezadas vítimas
de projéteis de arma de fogo e coma arreflexo no momento de sua admissão na UTI. Estudo realizado de 1 de
janeiro de 1994 a 31 de dezembro de 2001, dados
coletados por um banco de dados inspirado no Traumatic
Coma Data Bank colocados na planilha EXCEL, na unidade de terapia intensiva do Hospital Governador Celso
Ramos, hospital público estadual, considerado referência na área de trauma e em especial neurotraumatologia
na região da Grande Florianópolis, com população estimada em 600 mil habitantes.
O presente estudo tem por objetivo a avaliação destes
596 casos quanto aspectos epidemiológicos, traumatismos associados, classificação tomográfica e mortalidade relacionando com campanhas e medidas efetuadas
no decorrer destes anos, principalmente relacionadas aos
acidentes de trânsito.
Resultados: Quanto a distribuição por sexo: 85 %
foram do sexo masculino, faixa etária 12-40 anos=74 %,
41-65 anos=21 % , acima de 65 anos= 5 %.77,8 % das
16
vítimas foram conseqüentes de acidente de trânsito (acidente automobilístico, moto e atropelamento). Constatamos a progressiva queda das vítimas de acidente automobilístico após a obrigatoriedade do cinto de segurança em Florianópolis em 1995, havendo um progressivo
aumento das vítimas de acidente de moto de 13,0 % em
1994-1995 para 30,7 % em 2000- 2001.Em 2001 as vítimas por acidente automobilístico passaram a ser a quarta causa de admissão sendo superadas pelas quedas.
Observamos a presença de traumas associados em 45
% dos pacientes, sendo os traumas associados mais freqüentes, o de membros em 57 %, de tórax em 37 %, face
em 23 % , abdomem 20 % e coluna cervical 7 %.
Constatamos uma progressiva queda na mortalidade
intra-hospitalar de 44 % em 1994-1995 para 29,7 % em
2000 – 2001.(Tabela 1) e (Gráfico 1). Quanto ao aspecto
tomográfico as lesões difusas predominaram.Seguido
pelas lesões de massa.(Tabela 2 e 3)
FIGURA 1: Traumatismo cranioencefálico em
Florianópolis no período de 1994-2001. Pacientes
internados na UTI do HGCR. Observe-se que a partir de
1995 iniciou a obrigatoriedade do uso do cinto de
segurança. Em 1998, inicia-se a obrigatoriedade do uso
de capacete para motociclistas. Em 2001, ocorre a
duplicação da BR 1001 em Florianópolis.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
TABELA 2: Classificação tomográfica de Marshall
INJÚRIA TIPO I - NENHUMA PATOLOGIA VISÍVEL NA TC
INJÚRIA TIPO II - CISTERNAS VISÍVEIS COM DESVIO DA
LINHA MÉDIA DE 0 - 5 MM E OU LESÕES DE DENSIDADE
PRESENTES. LESÃO MISTA MAIOR QUE 25 CC PODE INCLUIR FRAGMENTOS ÓSSEOS OU CORPOS ESTRANHOS.
INJÚRIIA TIPO III - CISTERNAS BASAIS COMPRIMIDAS
OU AUSENTES, COM DESVIO DE LINHA MÉDIA DE 0 A 5
MM (SWELLING) , SEM LESÕES DE DENSIDADE ALTA OU
MISTAS MAIOR QUE 25 CC.
INJÚRIA TIPO IV - DESVIO DE LINHA MÉDIA MAIOR QUE
5 MM , AUSÊNCIA DE LESÕES DE DENSIDADE ALTA OU
MISTA MAIORES DE 25 CC .
INJÚRIA TIPO V - QUALQUER LESÃO CIRURGICAMENTE EVACUADA, PORÉM SUBDIVIDIMOS ENTRE HSD, HED
E HIC.
INJÚRIA TIPO VI - LESÃO DE DENSIDADE ALTA OU MISTA MAIOR DE 25 CC NÃO CIRURGICAMENTE EVACUADA
INJÚRIA TIPO VII - LESÃO DE TRONCO CEREBRAL
DISCUSSÃO
Este levantamento foi realizado numa UTI geral, mas
que atende a grande maioria dos pacientes politraumatizados e principalmente traumatizados de crânio grave na nossa região, com população estimada de 600.000
habitantes. Trata-se de uma UTI com boa estrutura física, e cujo corpo clínico e de enfermagem estão habituado ao manejo destes pacientes.
O presente estudo nos dá um panorama da importância do trauma e em especial dos traumatizados de crânio
graves na nossa região que pode ser extrapolada para a
maior parte das regiões do nosso país. Observamos claramente que o trauma de crânio envolve justamente a
faixa etária mais jovem e produtiva da população causando enormes repercussões médicas e sócio econômicas, sendo que 74 % dos pacientes tinham entre 12 e 40
anos de idade, implicando em grande números de anos
de vida perdidos devido a freqüente presença de seqüelas incapacitantes. A relação sexo masculino – feminino
que foi de 5/1 e a grande importância dos atropelamentos como causa do TCE demonstra particularidade em
relação aos trabalhos americanos e europeus.
Evidenciamos claramente como são efetivas as medidas de prevenção, sendo constatado com a mudança
do perfil epidemiológico das vítimas após a obrigatoriedade do uso de cinto de segurança em 1995, do novo
código nacional do trânsito em 1998 e a duplicação da
BR- 101 trecho Florianópolis – Curitiba em 2001, as
medidas de prevenção tem impacto ainda maior segundo dados levantados no DETRAN –SC, quando confrontamos com a frota de veículos automotores que aumenVolume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
TABELA 3: Comparação das lesões intracranianas:
Classificação de Marshal.
Lesão Difusa Tipo 1994-1995 2001-2002
Tipo I 6 = 3,6 % 7 = 5 %
Tipo II 38 = 23,3% 26 = 18,5 %
Tipo III 36 = 22,0% 33 = 20,3 %
Tipo IV 13 = 7,9% 12 = 8,2%
Lesão de massa evacuada 48 = 29,4% 48 = 34,2%
Lesão de massa não evacuada 8 = 4,9% 4 = 2,8 %
Lesão de tronco cerebral 14 =8,5% 11 = 7,8 %
tou em 60 % de 1994 a 2000 e a frota de motocicletas
que aumentou em 100 % de 1994-2000.
Nossos dados demonstram o quanto ainda há a ser
feito em matéria de prevenção visto ao expressivo números vítimas de atropelamentos, demonstrando ainda como o pedestre ainda é alvo freqüente nas nossa
estradas, e o crescente números de acidentados por
motocicletas.
O trauma é um assunto de toda a sociedade, tendo
um caráter multidisciplinar envolvendo por exemplo a
engenharia do trânsito, participando efetivamente na
duplicação da BR-101, já sendo constatado na nossa
UTI a diminuição em 2001 das vítimas por acidente
automobilístico.
Outro fator importante a ser considerado foi a progressiva queda na mortalidade em uma patologia tão grave, fruto de uma cadeia de eventos tais como uma
melhoria do atendimento pré –hospitalar efetuada pelo
Corpo de Bombeiros que foi mais efetiva com o seu
reaparelhamento a partir de 1995, uma melhora da formação médica ao atendimento dos pacientes politraumatizados fruto da aplicação dos princípios do ATLS nas
salas de emergência, melhoria do manuseio anestésico,
melhor classificação e controle tomográfico com a utilização da classificação tomográfica segundo o Traumatic
Coma Data Bank-Marshall, sendo possível intervir mais
precocemente nas lesões de massa com a conseqüente
diminuição da mortalidade e possibilitando melhor estratégia terapêutica. Houve uma melhora no atendimento dos cuidados clínicos na UTI e após a UTI pelo seguimento clínico destes pacientes por médicos intensivistas
possibilitando melhor tratamento das infecções tão freqüentes nestes pacientes.
Com este banco de dados foi possível influir nas estratégias de prevenção tendo acesso aos meios de comunicação, demonstrando com dados, a importância
social do trauma, a efetividade das medidas de proteção,
que culminaram no ano de 2001 com uma ampla campanha na nossa cidade para construção de uma unidade intermediária para politraumatizados com recursos da ini17
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
ciativa privada aplicados em hospital público. Salientamos a necessidade de formação de banco de dados em
outras regiões do país e a possibilidade do intensivista
ter papel preponderante em campanhas de saúde pública, principalmente relacionadas a prevenção do trauma.
RESUMO
O nosso principal objetivo deste trabalho é estudar a
epidemiologia e a mortalidade secundária a trauma de
Crânio grave na Grande Florianópolis (aproximadamente
600.000 habitantes). Comparamos o impacto das campanhas de segurança de tráfego na variação epidemiológica e mortalidade entre 1994 a 2001.
A partir do banco de dados de pacientes admitidos na
UTI do Hospital Governador Celso Ramos, referência
em Neurotrauma na Grande Florianópolis, no período
de 1 de janeiro de 1994 a 31 de dezembro de 2001, com
traumatismo craniano grave (escala de Glasgow < 8).
Dados de 596 pacientes consecutivos foram coletados e
analisados com as seguintes variáveis: Demografia, causa do trauma, classificação tomográfica de Marshall de
trauma craniano e mortalidade intra-hospitalar. Comparamos posteriormente a mortalidade relativa ao período
de 1994-1995 com 2000-2001.
Constatou-se que os pacientes foram predominantemente homens (85 %), com a maioria na faixa etária dos
12 a 40 anos (74%). A mortalidade intra-hospitalar em
1994-1995 foi de 44 % e em 2000-2001 a mortalidade
caiu para 29,7 %. Houve uma queda das vítimas de acidente automobilístico de 33 % para 12,8 % e um aumento das vítimas de acidente de motocicleta de 13 % para
30,7 %. A percentagem de atropelamentos manteve-se
31 % e 30,7 %. Nós contatamos um aumento das Lesões
de massa evacuadas de 29 para 34,2 %.
Podemos influir que o uso do cinto de segurança e o
novo código nacional de trânsito em vigor desde 1998
mudou a epidemiologia do trauma de crânio em
Florianópolis. A causa mais importante de admissões
deixou de ser o acidente automobilístico passando a ser
vítimas de acidentes de moto e atropelamentos. Houve
uma queda na mortalidade decorrente de melhor assistência pré – hospitalar e intra-hospitalar com melhores
cuidados a nível de terapia intensiva como a mais freqüente monitorização da pressão intra-craniana, melhor
classificação e controle tomográfico e melhor tratamento das complicações clínicas e cirúrgicas.
Constatamos a importância das campanhas de segurança de tráfego, tais como a obrigatoriedade do uso do
cinto de segurança e o novo código nacional de trânsito,
como a necessidade de novas campanhas visando
conscientizar os pedestres e os motociclistas.
Visando melhor recuperação e reintegração à sociedade das vítimas de acidente de trânsito é necessário melhorar as estruturas em nível hospitalar e de
reabilitação.
Unitermos: Neurointensivismo, trauma de crânio,
TCE, trauma, epidemiologia.
BIBLIOGRAFIA
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
18
Becker DP, Miller JD,Ward JD, Greeberg RP, Young HF, Sakalas : The outcome from severe head injury with early diagnosis and intensive management.
J Neurosurg 1977;47:491,
Sosin DM, Saks JJ,Smith SM: Head Injury-associated deaths in United States
from 1979 to 1986. JAMA. 1989;27;262:2251-5.
Ghajar J, Hariri R, Narayan R, Iacono L et al. Survey of critical care management of comatose, head-injured patients in the United States.Critical Care
Medicine 1995;l23:560-7.
Gennarelli T: Infuence of the type of intracranial lesion on the outcome from
severe head injured. J Neurosusurg 1982;56:26-32,
Kalsbeck WD , McLauren RL, Harris BSH, et al: The national head and spinal
cord injury survey: Major Findings. J Neurosurg 1981;53(S)19-31.
Eisenberg HM, Gagry HE, Aldrich EF: Initial CT findings in 753 patients
with severe head injury. A report from the NIH Traumatic Coma Data Bank. J
Neurosurg 1990;73: 688-98.
Marshall LF, Becker DP , Bowers SA, et al : The Traumatic Coma Data Bank:
Design, methods, and basaelines characteristics. J. Neurosurg 1983;59:276-8.
Marshall LF, Marshall SB, Klauber et al: A new classification of severe head
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
injury based on computerized tomography. J Neurosurg 1991;75 ( Suppl):
S14-S20.
Cruz J, Allen SJ , Miner ME: Hypoxic insults in acute brain injury. Crit Care
Med 1985;13 (Abstract): 284.
Cooper P.Head Injury R 3rd ed Willianms Wilkins 1993.
Bowers SA , Marshall LF: Outcome in 200 consecutives cases of severe head
injury treated in San Diego County: A prospective analisys. Neurosurgery
1980;6:237-42.
Rippe. JM, Irwin R.S. Intensive Care Medicine 1991;1459-78.
Martins E.T, Modesto.M.Validação de uma nova classificação tomográfica do
TCE grave na UTI neurológica.Rev.Bras.Terap.Intens, 1994;6:179-84.
Martins E.T.,Modesto M. Lesões vasculares isquêmicas no TCE grave.
Rev.Bras.Terap.Intens 1994;6:185-7.
Martins E.T, Bruggemann M, Coutinho M..Estudo prospectivo de 200 casos
de TCE grave na Grande Florianópolis. Rev. Bras.Terap.Intens 1997;9:201-4.
Thurman DJ, Sniek JE,Johnson D, et al .Guidelines for Surveillance of Cental
Nervous System Injury.Atlanta:Centers for Disease Control and Prevention,1995.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Gênero e Mortalidade em Cirurgia de
Revascularização do Miocárdio
Gender and Mortality in Coronary Artery Bypass Graft Surgery
Kelson Nobre Veras1, José Lira Mendes Filho2, Paulo Henrique Medeiros Costa3,
Paulo Rego Medeiros4, Sebastião Nunes Martins5, Jayro Tadeu Paiva Vasconcelos6
ABSTRACT
It has been reported that women present a higher morbidity and mortality after coronary artery bypass graft surgery
than men. It was collected, in a retrospective study, 328 adult patients’ clinical data submitted to coronary artery
bypass graft surgery in Hospital São Marcos (Teresina, Piauí). Age, mortality, body mass index, duration of ICU stay
and several concurrent illnesses and surgical complications happened with similar frequencies in both groups.
Differences with statistical significance observed between sexes were: smaller body size in women; larger medium
number of vascular grafts employed in men than in women; more frequent uniarterial coronary disease among
women, however with equal frequency of more serious coronary artery disease between sexes; smaller medium
values of left ventricular ejection fraction and left ventricular fractional shortening in men. Univariate predictors of
mortality were patients medium age, concomitant valvular dysfunction and perioperative complications as shock,
acute myocardial infarction, cardiac arrhythmias and respiratory complications. In conclusion, it was identified a
similar postoperative mortality in both sexes submitted to surgical myocardial revascularization. Once factors associated with perioperative mortality were similar for both men and women, this probably explains the absence of
differences in mortality between sexes found in this study.
KEY WORDS: Coronary Artery Bypass, Hospital Mortality, Risk Factors
iversos autores relataram que as mulheres
apresentam morbidade e mortalidade mais
altas após cirurgia de revascularização
coronariana do que os homens1,2,3,4,5,6,7,8,9,10,11,12,13,14.
Por causa da prevalência crescente de doença arterial coronariana em mulheres, junto com o envelhecimento geral da população, o número de mulheres idosas que requerem cirurgia de revascularização continuará, provavelmente, aumentando. Entender os fatores que predispõem as mulheres à mortalidade
perioperatória é essencial para tecer estratégias em
busca de melhores resultados para os pacientes.
O propósito deste estudo foi identificar variáveis
associadas com mortalidade nos pacientes submetidos à cirurgia de revascularização coronariana no
Hospital São Marcos e determinar se existem diferenças entre os sexos nas características clínicas,
morbidade e mortalidade.
D
MATERIAL E MÉTODOS
Dados clínicos foram coletados retrospectivamen-
te de 328 pacientes adultos submetidos à cirurgia de
revascularização miocárdica no Hospital São Marcos
(Teresina, PI) de julho de 1999 a outubro de 2001. Os
dados foram obtidos a partir do prontuário eletrônico
dos pacientes, bem como de revisão de laudos de
ecocardiografias e dos relatórios de cineangiocoronariografia.
Os dados demográficos incluídos foram: sexo, idade, peso, altura, superfície corpórea e índice de massa
corpórea, definido pelo produto do peso corporal pelo
quadrado da altura, e taxas de mortalidade.
As informações clínicas colecionadas incluíram a
duração da internação na UTI, número de enxertos realizados, extensão da doença coronariana, presença de
comorbidades (hipertensão, diabetes, insuficiência renal, pneumopatias, insuficiência cardíaca congestiva,
valvulopatias, infarto agudo do miocárdio prévio),
comprometimento da função sistólica ventricular (avaliada através da fração de ejeção e fração de encurtamento sistólico do diâmetro ventricular ou delta-D,
além da presença de hipo ou acinesia ventricular em
exames pré-operatórios), presença de angina instável,
1
Médico assistente da UTI de pós-operatório cardíaco do Hospital São Marcos
Equipe de cirurgia cardiológica do Hospital São Marcos
6
Coordenador do Serviço de Terapia Intensiva do Hospital São Marcos
INSTITUIÇÃO: Hospital São Marcos, Teresina, Piauí
ENDEREÇO PARA CONTATO: Kelson Nobre Veras; rua Teófilo dos Santos, 1382; CEP: 64056-450; Teresina (PI) – Fone: (86)
981-8526; e-mail: [email protected]
2,3,4,5
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
19
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
aneurisma ventricular e de complicações pós-operatórias, como complicações respiratórias (broncoespasmo, necessidade de reintubação, insuficiência
respiratória, derrame pleural, pneumonia, pneumotórax, síndrome do desconforto respiratório agudo, edema agudo de pulmão), insuficiência renal aguda, infarto agudo do miocárdio, hipotensão nãoespecificada, choque cardiogênico, necessidade de uso
de balão intraórtico, arrtimias, insuficiência cardíaca
congestiva, complicações neurológicas (acidente
vascular cerebral, convulsões, confusão mental, agitação psicomotora) e outras complicações (infecções,
coagulação intravascular disseminada, parada
cardiorrespiratória revertida).
As informações foram lançadas em um banco de
dados computadorizado, através do qual também foram realizados os cálculos estatísticos. Para análises
univariadas, as variáveis discretas foram analisadas
usando o teste do qui-quadrado ou teste exato de
Fisher, onde fosse apropriado. As variáveis contínuas
foram avaliadas com o teste t de Student. Considerouse haver uma associação entre duas variáveis quando
o intervalo de confiança para o odds ratio não incluía
1,0. A significância estatística foi assumida em um
valor de p < 0,05. Os dados para variáveis contínuas
são apresentados como média ± desvio padrão.
RESULTADOS
Ao todo, foram analisados 328 pacientes, sendo
35% do sexo feminino e 65% do sexo masculino. A
taxa de mortalidade geral foi de 7,31% (24 pacientes). Não houve grandes diferenças entre os sexos em
suas características clínicas e demográficas (TABE-
TABELA 1. Características demográficas e clínicas, conforme o sexo, de 328 pacientes submetidos à cirurgia de
revascularização miocárdica no Hospital São Marcos (Teresina – PI), no período de julho de 1999 a outubro de 2001.
Idade (média ± DP)
Mortalidade
Feminino
Masculino
p
63,8 ± 9,2
62,6 ± 9,9
0,29
6,10%
9,57%
0,25
SC (média ± DP)
1,59 ± 0,16
1,77 ± 0,17
< 0,001
IMC (média ± DP)
0,82
25,53 ± 4,10
25,43 ± 3,66
Duração da internação em dias (média ± DP)
3,4 ± 2,2
3,8 ± 2,6
0,17
Número de enxertos (média ± DP)
2,9 ± 1,2
3,3 ± 1,1
0,005
24,56%
12,32%
0,005
0,56
Extensão da doença coronariana
Uniarterial
Biarterial
26,32%
29,38%
Triarterial
49,12%
58,29%
0,11
27,08%
50,65%
0,009
69,7% ± 0,2
62,3% ± 0,2
0,02
30,4 ± 4,8
25,3 ± 4,8
0,03
FE < 65% e/ou delta-D < 30%
FE (média ± DP)
Delta-D (média ± DP)
Comorbidades
65,22%
62,91%
0,68
Valvulopatias
13,91%
8,92%
0,16
Diabetes mellitus
13,91%
11,27%
0,48
Hipertensão arterial
31,30%
35,68%
0,43
ICC
33,04%
33,33%
0,96
Angina instável
11,30%
7,98%
0,32
IAM prévio
30,43%
37,56%
0,20
Complicações pós-operatórias
49,57%
51,64%
0,72
Síndrome de baixo débito1
61,40%
55,45%
0,73
Respiratórias
36,84%
30,00%
0,52
Neurológicas
29,82%
30,00%
0,86
Arritmias
21,05%
19,09%
0,87
7,02%
8%
0,74
IAM
1. Incluindo choque cardiogênico, choque por hemorragia importante e hipotensão não especificada.
DP = desvio padrão; SC = superfície corpórea; IMC = índice de massa corpórea;
FE = fração de ejeção; delta-D = fração de encurtamento; ICC = insuficiência cardíaca congestiva; IAM = infarto agudo do miocárdio
20
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
LA 1). Idade, mortalidade, índice de massa corpórea,
duração da internação na UTI e os diversos tipos de
comorbidades e complicações pós-cirúrgicas ocorreram com freqüências semelhantes em ambos os grupos. As diferenças com significância estatística observadas entre o sexo feminino e masculino são relatadas a seguir.
As mulheres apresentavam uma superfície corpórea
inferior à dos homens (1,59 ± 0,16 e 1,77 ± 0,17; p <
0,001). O número de enxertos vasculares venosos ou
arteriais empregados foi, em média, maior nos homens
do que nas mulheres (3,3 ± 1,1 vs. 2,9 ± 1,2; p = 0,005).
A doença uniarterial foi mais comum no sexo feminino (24,56% vs. 12,32%; p = 0,005), contudo ambos
os sexos apresentaram igual freqüência de doença
coronariana mais grave. Os valores médios da fração
de ejeção foram menores no sexo masculino (62,3%
± 0,2 vs. 69,7% ± 0,2; p = 0,02), o mesmo sendo ob-
servado para a fração de encurtamento (25,3% ± 4,8
vs. 30,4% ± 4,8; p = 0,03).
Os fatores preditivos univariados de mortalidade
foram a idade do paciente, a presença de disfunção
valvular no momento da cirurgia e complicações pós
ou perioperatórias como síndrome de baixo débito,
infarto agudo do miocárdio, arritmias cardíacas e complicações respiratórias (TABELA 2).
Além de uma média etária estatisticamente superior nos casos de óbito, a mortalidade foi maior nos pacientes com idade no quartil superior quando comparados ao quartil inferior da idade (13,79% vs. 3,57%;
p = 0,02; odds ratio = 4,32; intervalo de confiança de
95%: 1,08 a 20,13).
Não foi detectada associação entre área de superfície corporal ou índice de massa corpórea e mortalidade (TABELA 2). A mortalidade entre os pacientes com
valores de superfície corporal no quartil inferior foi
TABELA 2 – Fatores preditivos univariados de mortalidade de 328 pacientes submetidos à cirurgia de revascularização
miocárdica no Hospital São Marcos (Teresina – PI), no período de julho de 1999 a outubro de 2001.
SEM ÓBITO
ÓBITO
Idade (média ± DP)
62,63 ± 9,24
67,79 ± 10,26
SC (média ± DP)
1,71 ± 0,18
1,65 ± 0,21
IMC (média ± DP)
25,52 ± 3,81
24,80 ± 3,87
Comorbidades
odds ratio (IC 95%)
p
0,01
0,12
0,39
0,45
0,18
0,10
0,14
0,02 2
0,83 2
0,17 2
0,90
70,83%
63,16%
1,42 (0,53-3,90)
52,08%
37,50%
0,55 (0,21-1,42)
IAM
55,21%
37,50%
0,49 (0,19-1,25)
Hipertensão arterial
53,65%
37,50%
0,52 (0,20-1,34)
Valvulopatias
14,06%
33,33%
3,06 (1,07-8,55)
Angina instável
14,06%
12,50%
0,87 (0,19-3,39)
Diabetes mellitus
19,79%
8,33%
0,37 (0,06-1,73)
Número de enxertos (média ± DP)
3,1 ± 1,2
3,2 ± 1,1
Uniarterial
17,28%
8,33%
0,44 (0,07-2,00)
0,20 2
Biarterial
28,24%
29,17%
1,05 (0,38-2,80)
0,92
Triarterial
54,49%
62,50%
1,39 (0,55-3,57)
0,45
FE < 65% e/ou delta-D < 30%
42,98%
27,27%
0,50 (0,10-2,22)
0,24 2
FE (média ± DP)
65,08% ± 0,17
65,91 % ± 0,11
Delta-D (média ± DP)
ICC
Extensão da doença coronariana
0,87
27,33% ± 0,09
30,00% ± 0,06
Complicações
45,72%
91,67%
0,45
Síndrome de baixo débito1
26,64%
62,50%
4,59 (1,80-11,88)
< 0,001
IAM
2,30%
25,00%
14,14(3,72-53,76)
< 0,0012
Arritmias
8,88%
25,00%
3,42 (1,11-10,18)
0,022
Neurológicas
15,46%
12,50%
0,78 (0,18-2,92)
0,492
Respiratória
26,97%
83,33%
13,54 (4,20-48,35)
< 0,001
13,06 (2,90-81,82)
< 0,001
1. Incluindo choque cardiogênico, choque por hemorragia importante e hipotensão não especificada.
2. Teste exato de Fisher
IC 95% = intervalo de confiança de 95%; DP = desvio padrão; SC = superfície corpórea; IMC = índice de massa corpórea; FE = fração de ejeção;
delta-D = fração de encurtamento; ICC = insuficiência cardíaca congestiva; IAM = infarto agudo do miocárdio
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
21
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
TABELA 3 – Prevalência da mortalidade conforme área de superfície corporal, índice de massa corpórea
e fração de em 328 pacientes submetidos à cirurgia de revascularização miocárdica no Hospital
São Marcos (Teresina – PI), no período de julho de 1999 a outubro de 2001.
Área de Superfície Corpórea
QUARTIL 1
QUARTIL 3
11,25%
5,06%
odds ratio (IC 95%)
p
2,38 (0,63-9,66)
0,15
2,02 (0,77-5,23)
0,11
1,49 (0,32-9,59)
0,45 *
2,49 (0,55-12,67)
0,19
0,50 (0,02-8,61)
0,53 *
0,34 (0,02-2,79)
0,26 *
0,00 (0,00-6,56)
0,42 *
Área de Superfície Corpórea
QUARTIL 1
QUARTIL > 1
11,25%
5,91%
Índice de Massa Corpórea
< 30(kg/m2)
³ 30(kg/m2)
7,45%
5,13%
Índice de Massa Corpórea
QUARTIL 1
QUARTIL 3
8,54%
3,61%
Delta-D
QUARTIL 1
QUARTIL 3
4,17%
1,04%
Fração de Ejeção
< 50%
³ 50%
3,70%
10,20%
Fração de Ejeção
< 40%
³ 40%
0,00%
9,48%
* Teste exato de Fisher
IC 95% = intervalo de confiança de 95%
de 11,25% (TABELA 3) e aquela dos pacientes com
valores no quartil superior foi de 5,06% (p = 0,15).
Mesmo comparando os pacientes com área de superfície corpórea no quartil inferior com todos os outros
pacientes com superfície corpórea maior, a diferença
na mortalidade ainda não foi significativa (p = 0,11).
Os pacientes obesos, definidos como aqueles com
um índice de massa corpórea maior ou igual a 30 kg/
m2, apresentaram mortalidade similar aos não obesos
(5,13% vs. 7,45%, respectivamente; p = 0,60). De forma semelhante, os pacientes com índice de massa
corpórea com valores no quartil inferior comparados
a pacientes com valores de índice de massa corpórea
no quartil superior não apresentaram diferenças na
mortalidade (p = 0,19; TABELA 3).
A fração de ejeção ventricular esquerda e a fração
de encurtamento sistólico do diâmetro ventricular (delta-D), analisados isoladamente ou em conjunto não
mostraram valor preditivo para mortalidade, mesmo
quando comparados os valores dos quartis inferiores
com os quartis superiores (TABELAS 2 e 3).
Os pacientes com disfunção valvular concomitante
à cirurgia e arritmias no pós-operatório apresentaram
médias de faixa etária mais elevadas. Não houve dife22
TABELA 4 – Comparação da idade com outros
fatores preditivos da mortalidade de 328 pacientes
submetidos à cirurgia de revascularização miocárdica
no Hospital São Marcos (Teresina – PI), no período
de julho de 1999 a outubro de 2001.
IDADE
(média ± DP)
p
Presente
68,83 ± 8,39
0,0002
Ausente
62,37 ± 9,37
VALVULOPATIA
CHOQUE
Presente
64,44 ± 9,33
Ausente
62,41 ± 9,38
0,08
IAM
Presente
65,85 ± 11,64
Ausente
62,89 ± 9,30
0,27
ARRITMIA
Presente
68,76 ± 8,41
Ausente
62,39 ± 9,25
0,0002
COMPLICAÇÕES
RESPIRATÓRIAS
Presente
65,04 ± 9,22
Ausente
62,62 ± 9,40
0,09
DP = desvio padrão
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
rença significativa na idade dos pacientes com outros
fatores preditivos de mortalidade pós-operatória no
presente estudo (TABELA 4).
DISCUSSÃO
A presente casuística foi composta por uma proporção significativa de mulheres (cerca de 35% dos
pacientes). Contudo, a mortalidade perioperatória foi
semelhante entre homens e mulheres. Outras casuísticas encontraram resultado semelhante 13,15,16,17. Em
nenhuma das referências consultadas, porém, encontrou-se uma maior mortalidade entre os homens.
Os fatores de risco para a cirurgia de revascularização miocárdica podem ser diferentes entre os
sexos. O próprio sexo feminino foi considerado um
fator de risco para esta cirurgia1,3,4,5,6,12,18,19,20,21,22,23.
Contudo, em várias séries cirúrgicas recentes, diversas hipóteses têm sido tentadas para explicar porque
em alguns estudos a mortalidade foi maior no sexo
feminino13,15,16,17,24,25,26,27.
Comparado com homens, o começo da doença arterial coronária sintomática em mulheres é retardado
em até 10 a 15 anos após a menopausa28. Deste modo,
as mulheres são encaminhadas para cirurgia de
revascularização em uma idade mais avançada que os
homens e com mais condições de comorbidade, como
diabetes e hipertensão1,2,3,4,5,6,7,8,9,10,11,12,13,14,23. Na presente análise, porém, a idade média entre os sexos não
apresentou diferença estatística. A duração da
internação na UTI, prevalência de doença coronariana
avançada e os diversos tipos de comorbidades e complicações pós-cirúrgicas também ocorreram com freqüências semelhantes em ambos os grupos.
Dificuldades com a técnica cirúrgica devido ao
menor tamanho da artéria coronária foi sugerida
como importante fator para os resultados piores observados nas mulheres que se submetem à cirurgia
de revascularização do miocárdio 1,2,4,11,12. Porém, alguns estudos acharam que a superfície corpórea (um
substituto para o tamanho da artéria coronária) não é
um fa tor preditivo de mortalidade operatória 5,8,10,13,15,23. Outros mostraram que não é mais provável que as mulheres tenham artérias coronárias
menores que os homens apesar de terem uma menor
superfície corpórea e que as mesmas não estão em
risco mais alto de oclusão do enxerto de artéria
coronária que os homens 13,14. Foi sugerido que a discrepância entre estes resultados mais antigos e os
estudos posteriores pudesse ser devido a melhorias
da técnica cirúrgica e ao uso mais amplo de drogas
antiplaquetárias8,10,13,14. Apesar do presente estudo não
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
ter dados quanto ao diâmetro das artérias coronárias,
a superfície corpórea do sexo feminino foi estatisticamente menor que a do sexo masculino, sem que
isto agregasse uma maior mortalidade às mulheres,
estando, portanto, em consonância com as evidências científicas acima relatadas.
O número médio de enxertos vasculares empregados foi discretamente maior nos homens do que
nas mulheres, embora de forma estatisticamente significativa (p = 0,005). A função sistólica do ventrículo
esquerdo pré-cirurgia apresentava-se mais freqüentemente comprometida no sexo masculino, conforme avaliação da fração de ejeção e da fração de
encurtamento sistólico (delta-D). FINDLAY et al. 25
e MICKLEBOROUGH et al.13 encontraram um resultado semelhante, embora ALDEA et al. 15 tenham
achado uma fração de ejeção média similar entre os
sexos. Por outro lado, mesmo o achado de uma função ventricular inferior no sexo masculino não esteve associado a uma tendência a maior mortalidade
neste grupo.
Não foi encontrada diferença no índice médio de
massa corpórea entre os dois grupos analisados e não
se detectou associação significativa entre obesidade e
óbito. Embora a obesidade seja sabidamente um fator
de risco para a ocorrência de doença coronariana, os
dados na literatura são poucos e contraditórios quanto
à análise de sua importância para a mortalidade
perioperatória nas cirurgias de revascularização
miocárdica. CHRISTAKIS et al.22 encontraram uma
maior prevalência de mortalidade cirúrgica no quartil
superior do índice de massa corpórea, apenas no sexo
feminino. Por outro lado, ENGELMAN et al.29 demonstraram uma associação independente entre um
índice de massa corpórea baixo (< 20 kg/m2) e mortalidade elevada após cirurgia cardíaca.
Os fatores preditivos univariados de mortalidade
encontrados na presente série foram a idade do paciente, a presença de disfunção valvar concomitante e
complicações perioperatórias como síndrome do baixo débito, infarto agudo do miocárdio, arritmias cardíacas e complicações respiratórias.
Tem sido amplamente relatado que a idade adiciona risco para mortalidade em cirurgia cardíaca e que a
mesma é um importante fator na explicação de resultados operatórios piores para mulheres3,4,6,7,8,9,11,13,30,31.
Na presente casuística, a idade média dos casos de
óbito foi estatisticamente superior à dos que sobreviveram à cirurgia, assim como as faixas etárias superiores apresentaram maior incidência de óbito. Além
disto, a idade média foi estatisticamente superior nos
pacientes que apresentaram outros fatores preditivos
23
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
de mortalidade, como a presença de disfunção valvar
e o desenvolvimento de arritmias importantes no pósoperatório.
O desenvolvimento de complicações no pós-operatório apresentou uma forte associação com maior
mortalidade, com exceção das complicações neurológicas. Como estudo retrospectivo que foi, a presente
análise pode ter sido prejudicada por deficiências de
registro em relação a esta variável.
O acidente vascular cerebral é reconhecido como
um importante motivo de permanência hospitalar prolongada, custos hospitalares mais elevados e aumento
da mortalidade pós-cirurgia cardíaca6,31,32,33. A maioria dos acidentes vasculares cerebrais perioperatórios
é o resultado de embolia cerebral, embora hipoperfusão cerebral durante a circulação extracorpórea,
períodos de hipotensão perioperatória, ou ambos também possam contribuir para o dano cerebral31,32,33. A
aterosclerose da aorta ascendente é uma importante
fonte de embolia cerebral e um dos mais importantes
fatores de risco para acidente vascular cerebral póscirurgia cardíaca31,32,34,35,36.
Os dados aqui apresentados mostram que as complicações cardíacas, incluindo infarto agudo do
miocárdio perioperatório, diversos tipos de arritmias
e síndrome de baixo débito, manifesta como choque
e/ou hipotensão de mecanismos diversos, são causas
importantes de mortalidade operatória, conforme relatado previamente27.
Portanto, diversamente de vários estudos já citados, nossos dados não evidenciaram uma associação
entre sexo e mortalidade perioperatória na cirurgia de
revascularização do miocárdio. A ausência de diferenças na idade, na prevalência de comorbidades ou complicações pós-operatórias, na duração da internação
na UTI ou na prevalência de doença coronariana avançada, diferentemente do encontrado por outros pesquisadores1,2,3,4,5,6,7,8,9,10,11,12,13,14,15,17,23, deve justificar o
encontro na presente análise de um índice de óbitos
semelhante entre os sexos.
Em conclusão, as principais variáveis associadas a
uma maior mortalidade perioperatória foram a presença de disfunção valvular, idade e as complicações pós-
operatórias de síndrome de baixo débito cardíaco,
infarto agudo do miocárdio, arritmias e complicações
respiratórias. A semelhança entre os sexos em relação
às características pré-cirúrgicas, incidência de complicações perioperatórias e a ausência de associação
com maior mortalidade perioperatória das variáveis
que apresentaram diferença estatística entre homens
e mulheres provavelmente explicam o nosso achado.
RESUMO
Tem sido relatado que as mulheres apresentam
morbidade e mortalidade pós-cirurgia de revascularização coronariana superiores aos homens. Reuniu-se, em um estudo retrospectivo, os dados clínicos
de 328 pacientes adulto submetidos a cirurgia de
revascularização miocárdica no Hospital São Marcos
(Teresina, Piauí). Idade, mortalidade, índice de massa
de corporal, duração da permanência na UTI e várias
comorbidades e complicações cirúrgicas aconteceram
com freqüências semelhantes em ambos os sexos. As
diferenças com significação estatística observadas
entre os sexos foram: menor superfície corpórea nas
mulheres; maior número médio de enxertos vasculares
em homens; doença coronariana uniarterial mais freqüente entre mulheres, porém com igual freqüência
de doença coronariana mais séria entre os sexos; menores valores médios da fração de ejeção e da fração
de encurtamento ventricular esquerda nos homens. As
variáveis preditivas univariadas de mortalidade foram
a idade média dos pacientes, a presença de disfunção
valvular e complicações perioperatórias como síndrome
de baixo débito, infarto agudo do miócardio, arritmias
cardíacas e complicações respiratórias. Em conclusão,
foi identificado uma mortalidade pós-operatória semelhante em ambos os sexos submetidos a revascularização miócardica cirúrgica. Uma vez que os fatores associados com maior mortalidade perioperatória
foram semelhantes para homens e mulheres esta é, provavelmente, a explicação para a ausência de diferenças
na mortalidade entre os sexos neste estudo.
Unitermos: Cirurgia de revascularização coronariana, mortalidade hospitalar, fatores de risco.
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
24
Tyras DH, Barner HB, Kaiser GC, et al. Myocardial revascularization in
women. Ann Thorac Surg 1978; 25:449-53.
Fisher LD, Kennedy JW, Davis KB, et al. Association of sex, physical size,
and operative mortality after coronary artery bypass in the Coronary Artery
Surgery Study (CASS). J Thorac Cardiovasc Surg 1982; 84: 334-41.
Hall RJ, Elayda MA, Gray A, et al. Coronary artery bypass: long-term followup of 22,284 consecutive patients. Circulation 1983; 68 (suppl. II): 20-6.
4.
5.
6.
Loop FD, Golding LR, MacMillan JP, et al. Coronary artery surgery in women
compared with men: Analyses of risks and long-term results. J Am Coll Cardiol
1983; 1: 383-90.
Gardner TJ, Horneffer PJ, Gott VL, et al.. Coronary artery bypass grafting in
women. Ann Surg 1985; 201: 780-4.
Richardson JV, Cyrus RJ. Reduced efficacy of coronary artery bypass grafting
in women. Ann Thorac Surg 1986, 42: S16-21.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
Christakis GT, Ivanov J, Weisel RD, et al. The changing pattern of coronary
artery bypass surgery. Circulation 1989; 80 (supplement I): 151-61.
Khan SS, Nessim S, Gray R, et al. Increased mortality of women in coronary
artery bypass surgery: evidence for referral bias. Ann of Intern Med 1990;
112: 561-7.
Hannan EL, Bernard HR, Kilburn Jr. HC, et al. Gender differences in mortality rates for coronary artery bypass surgery. Am Heart J 1992; 123: 866-72.
King KB, Clark PC, Hicks Jr. GL. Patterns of referral and recovery in women
and men undergoing coronary artery bypass grafting. Am J Cardiol 1992; 69:
179-82.
Rahimtoola SH, Bennett AJ, Grunkemeier GL, et al. Survival at 15 to 18
years after coronary bypass surgery for angina in women. Circulation 1993;
88: 71-8.
O’Connor GT, Morton JR, Diehl MJ, et al. Differences between men and
women in hospital mortality associated with coronary artery bypass graft surgery. Circulation 1993; 88: 2104-10.
Mickleborough LL, Takagi Y, Maruyama H, et al. Is Sex a Factor in Determining Operative Risk for Aortocoronary Bypass Graft Surgery? Circulation 1995,
92:80-4.
Tan ES, Van Der Meer J, De Kam PJ, et al. Worse clinical outcome but similar
graft patency in women versus men one year after coronary artery bypass graft
surgery owing to and excess of exposed risk factors in women. J Am Coll
Cardiol 1999; 34: 1760-8.
Aldea GS, Gaudiani JM, Shapira OM, et al. Effect of gender on postoperative
outcomes and hospital stays after coronary artery bypass grafting. Ann Thorac
Surg 1999; 67:1097-103.
Abramov D, Tamariz MG, Severa J Y, et al. The influence of gender on the
outcome of coronary artery bypass surgery. Ann Thorac Surg 2000; 70:800-5.
Capdeville M, Chamogeogarkis T, Lee JH. Effect of gender on outcomes of
beating heart operations. Ann Thorac Surg 2001; 72:1022-5.
Douglas JS, King SB, Jones EL, et al. Reduced efficacy of coronary bypass
surgery in women. Circulation 1981;64(supplement II):11-6.
Bolooki H, Vargas A, Green R, et al. Results of direct coronary artery surgery
in women. J Thorac Cardiovasc Surg 1975; 69:271-7.
Killen DA, Reed WA, Arnold M, et al. Coronary artery bypass in women:
long-term survival. Ann Thorac Surg 1982; 34: 559-63.
Laird-Meeter K, Penn OC, Haalebos MM, et al. Survival in 1041 patients with
consecutive aortocoronary bypass operations. Eur Heart J 1984; 5:35-42.
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
22. Christakis GT, Weisel RD, Buth KJ, et al. Is body size the cause for poor
outcomes of coronary artery bypass operations in women? J Thorac Cardiovasc
Surg 1995; 110:1344-58.
23. Edwards FH, Carey JS, Grover FL, et al. Impact of gender on coronary bypass
operative mortality. Ann Thorac Surg 1998; 66: 125-31.
24. Khan SS, Matloff JM. Surgical revascularization in women. Curr Opin Cardiol
1991; 6: 904-11.
25. Findlay IN. Coronary bypass surgery in women. Curr Opin Cardiol 1994;
9:650-7.
26. McGee WA, Eggerstedt JM, Mancini MC. Coronary artery bypass surgery in
women.. J La State Med Soc 1998;150:81-4.
27. Hogue Jr. CW, Thoralf S, Barzilai B, et al. Cardiac and Neurologic Complications Identify Risks for Mortality for Both Men and Women Undergoing Coronary Artery Bypass Graft Surgery. Anesthesiology 2001; 95: 1074-1078.
28. Castelli WP. Epidemiology of coronary heart disease: The Framingham Study.
Am J Med 1984; 76: 4-12.
29. Engelman DT, Adams DH, Byrne JG, et al. Impact of body mass index and
albumin on morbidity and mortality after cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc
Surg 1999; 118:866-73.
30. Peterson ED, Cowper PA, Jollis JG, et al. Outcomes of coronary artery bypass
graft surgery in 24,461 patients aged 80 years or older. Circulation 1995; 92
(suppl II): 85-91.
31. Hogue Jr. CW, Murphy SF, Schechtman KB, et al. Risk factors for early or
delayed stroke after cardiac surgery. Circulation 1999; 100: 642-7.
32. Tuman KJ, Mccarthy RJ, Najafi H, et al. Differential effects of advanced age
on neurologic and cardiac risks of coronary artery operationsJ Thorac
Cardiovasc Surg 1992; 104: 1510-17.
33. Roach GW, Kanchuger M, Mora-Mangano C, et al. Adverse cerebral outcomes
after coronary bypass surgery. N Engl J Med 1996; 335: 1857-63.
34. Blauth CI, Cosgrove DM, Webb BW, et al. Atheroembolism from the ascending aorta: An emerging problem in cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg
1992; 103: 1104-12.
35. Davila-Roman VG, Barzilai B, Wareing TH, et al.. Atherosclerosis of the ascending aorta: prevalence and role as an independent predictor of cerebrovascular events in cardiac patients. Stroke 1994; 25: 2010-6.
36. Davila-Roman VG, Murphy SF, Nickerson NJ, et al. Atherosclerosis of the
ascending aorta is an independent predictor of long-term neurologic events
and mortality. J Am Coll Cardiol 1999; 33: 1308-16.
25
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Quanto Sabemos Sobre o Custo do que
Prescrevemos em Terapia Intensiva?
Cleovaldo T. S. Pinheiro, MD, PhD1, Luciano de Brito2, Rosanna L. Corvello Bel. Adm.3
custo da terapia intensiva consome cerca de
20% dos custos de internação, apesar de contar apenas com 5% dos leitos hospitalares.3
Os custos dos pacientes terminais aumentaram cerca de
4 vezes de 1976 a 1988.4 Boa parte deste aumento se
deveu à melhoria da tecnologia utilizada, mas também à
política institucional mal organizada para a melhoria da
relação custo/benefício do processo empregado no
gerenciamento dos recursos disponíveis.5
O processo gerencial dos recursos deveria incluir um
sistema de educação permanente da equipe assistencial
sobre o real custo do material utilizado no tratamento
dos pacientes internados. Em outras palavras, faz-se necessário um contínuo processo de conscientização dos
profissionais da área da saúde sobre o custo da assistência médica, visando a escolha de alternativas com uma
relação custo/benefício mais adequada.6
Esse estudo visou avaliar o conhecimento dos profissionais, envolvidos na terapia intensiva no Centro de Tratamento Intensivo (CTI) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) , do custo de medicamentos e materiais comumente utilizados por eles em suas prescrições.
O
MATERIAL E MÉTODO
O estudo foi realizado no mês de março de 2002. Médicos intensivistas (incluindo os médicos residentes do Serviço de Medicina Intensiva), médicos assistentes não pertencentes ao quadro assistencial do CTI, médicos residentes de outras áreas (essas duas últimas categorias de médicos sistematicamente internam pacientes no CTI) e enfermeiros de terapia intensiva lotados no CTI foram convidados a participar do estudo. Aqueles que concordaram preencheram um questionário estimando o preço de 15 medicamentos e 13 materiais de consumo usados com freqüência nas prescrições realizadas no CTI. (Tabela 1). A estimativa foi realizada sem a possibilidade de consulta ou troca
idéia com outros profissionais da área. Os preços assim estimados foram considerados corretos quando apresentavam
uma variação de no máximo 20% a mais ou a menos do
que o preço real pago pela instituição (HCPA) aos fornecedores. A análise estatística foi realizada usando-se o programa Epi-Info Versão 6.0, realizando-se avaliação de freqüências, teste t para amostras não pareadas, e teste de
Friedman com um coeficiente de significância de 0,05.
TABELA 1: Medicamentos e material cujos preços foram estimados pelos participantes do estudo.
Medicamentos
Material de Consumo
Propofol 100 ml (frasco)
Intracate
Pancurônio (frasco)
Sonda de Folley 16
Noradrenalina (ampola)
Filtro para ventilador
Amicacina 500 mg
Tubo traqueal 8,5
Solução glicosada a 5% 500 ml
Equipo para bomba de infusão
Solução Salina 0,9% 500 ml
1 L/min de oxigênio
Morfina 10 mg (ampola)
Bolsa coletora de urina
Ampicilina-Sulbactan frasco de 2,5 g
Cateter para henodiálise veno-venosa
Midazolan 15 mg (frasco)
Sistema de aspiração traqueal fechado
Imipenem-Cilastatina 500 mg (frasco)
Cateter de termodiluição (Swan-Ganz)
Dopamina (ampola)
Introdutor de Swan-Ganz
Nitroglicerina (frasco)
Filtro para henodiálise veno-venosa contínua
Fentanil 10 ml (frasco)
Omeprazol (ampola)
1
Professor Adjunto do Depto. de Medicina Interna da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Chefe do Serviço de Medicina
Intensiva do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
2
Acadêmico de Medicina Universidade Federal de Pelotas
3
Gerente do CTI- HCPA.
26
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
TABELA 2: Percentagem de acertos dos preços
dos medicamentos e material de consumo
por categoria profissional. P > 0,05
Categoria Profissional
Percentagem
de Acertos
Médicos externos
10,8 %
Médicos Intensivistas
(incluindo os residentes de
Medicina Intensiva)
10,9 %
Enfermeiros de Terapia Intensiva
9,3 %
Médicos Residentes
(excluindo os de
Medicina Intensiva)
10,4 %
RESULTADOS
Responderam ao questionário 64 profissionais, dos
quais 5 (7,8%) eram médicos externos ao CTI, 20 (31,3%)
eram intensivistas ou residentes de medicina intensiva,
26 (40,6%) enfermeiros e 13 (20,3%) residentes de outras
áreas. Ao todo foram 1.792 avaliações de preços. Apenas
181 (10,1%) estavam dentro do critério adotado como
correto (preço real pago pelo HCPA ± 20 %). Não houve
diferença estatisticamente significativa entre as diferentes
categorias de profissionais. (Tabela 2). A relação de preços e a dispersão das respostas, bem como o percentual de
acertos para cada item podem ser vistos na Tabela 3.
TABELA 3: Relação de material cujos preços foram pesquisados, com os dados de dispersão dos valores aferidos e percentual
de respostas certas para cada item.
Medicamento
e Insumos*
Preço em Reais
pago pelo HCPA**
Propofol
82,06
Valor mínimo
estimado
(em Reais)
Valor máximo
estimado
(em Reais)
Mediana
(em Reais)
Desvio
padrão
% de
acertos
2,00
500,00
100,00
105,30
10,9
Pancurônio
3,45
0,05
100,00
10,00
27,80
6,3
Noradrenalina
5,80
10,00
50,00
9,00
12,40
20,3
Amicacina
1,25
0,50
200,00
30,00
48,70
0
SG 5%
0,95
0,10
30,00
2,75
5,82
15,6
Morfina
1,98
0,02
30,00
4,00
6,90
14,1
Ampi+Sulbact
19,99
2,00
150,00
25,00
37,30
10,9
Sol. Sal. 0,9%
0,49
0,10
50,00
2,00
7,00
6,3
Midazolan
2,39
1,00
120,00
10,00
20,60
6,3
Imipenem
37,20
4,00
500,00
70,00
198,21
7,8
Dopamina
0,31
0,50
60,00
10,00
12,56
0
9,22
1,00
120,00
20,00
22,52
21,9
60,00
2,00
500,00
95,00
122,92
1,6
Nitroglicerina
Sol. de NPT
Fentanil
2,25
1,00
250,00
10,00
33,90
6,3
Omeprazol
5,50
2,00
150,00
20,00
26,36
10,9
Intracate
1,53
1,50
300,00
30,00
54,45
9,4
Cat. Folley
15,02
1,50
100,00
20,00
24,45
1,6
Filtro para ventilador
13,00
2,00
700,00
15,00
17,20
17,2
Tubo traqueal
3,17
2,00
300,00
10,00
38,5
4,7
Equipo p/ BI
4,32
0,08
50,00
6,50
12,73
21,9
Oxigênio 1 l/min
0,0015
0,01
200,00
7,50
37,28
0
Bola para coleta de urina
4,50
0,50
200,00
10,00
12,50
12,5
Cateter para hemodiálise
74,03
10,00
300,00
83,00
70,95
12,5
Sistema de aspiração traqueal
Swan-Ganz
35,00
0,50
2.000,00
20,00
31,10
10,9
122,00
10,00
2.000,00
150,00
289,02
17,2
Introdutor de S-G
58,00
5,00
700,00
50,00
99,60
25,0
Filtro de hemodiálise
27,00
10,00
3.000,00
135,00
443,45
3,1
* Melhor definição de cada item pode ser vista na Tabela 1.
** Valores fornecidos pelo centro de custos do HCPA na data da realização do estudo.
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
27
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
DISCUSSÃO
As profundas mudanças no sistema assistencial, o
avanço tecnológico ocorridos nos últimos anos alterou
profundamente os orçamentos e o déficit do sistema
assistencial à saúde no mundo inteiro e especialmente
em países do terceiro mundo. Como médicos, estamos
inteiramente voltados ao atendimento dos pacientes, mas
focamos pouca atenção ao custo que esse atendimento
gera. Poucos estudos têm sido dirigidos para avaliar quanto os profissionais da saúde conhecem sobre os custos
daquilo que prescrevem ou usam durante o trabalho
assistencial.7 Alguns estudos europeus têm analisado esse
assunto entre anestesistas e intensivistas, concluindo pelo
baixo conhecimento sobre o assunto.8,9,10
Em estudo não tão recente, Conti11 e colaboradores
solicitou a 60 anestesistas e intensivistas de vários graus
de formação para avaliarem o custo de 27 itens. A correção dos valores estimados, considerando-se como certas
as respostas que fossem 20% a mais ou a menos do que
o real preço do item avaliado foi inferior a 20%, resultado quase duas vezes melhor do que o obtido em nosso
estudo. Em nossa amostra não houve diferença entre o
percentual de respostas corretas na estratificação dos
profissionais utilizadas. No estudo de Conti os profissionais mais titulados tenderam a subestimar os preços,
enquanto os menos graduados tenderam a uma superestimação. Essa análise não foi feita em nosso estudo, uma
vez que o objetivo era diverso..
Além do baixo número de acertos, observou-se uma
dispersão muito grande dos valores, alguns atingindo
extremos muito distantes revelando o mais completo
desconhecimento sobre o assunto.
As possíveis explicações para os achados poderiam
ser enumeradas: (A) falta de treinamento na graduação
sobre aspectos gerenciais da saúde; (B) desinteresse sobre o custeio da saúde, principalmente num estado em
que quase todo o financiamento e feito por um sistema
espúrio em que as próprias instituições têm dificuldade
em saber as relações entre custo e receita; (C) falta de
contato entre os médicos e os administradores; (D) conceitos mal formados de que o gerenciamento do custo
tem implicações éticas indesejáveis.
Nos dias de hoje, quando as grandes instituições hospitalares informatizam suas prescrições, seria uma boa
norma informar aos profissionais sobre o custo de cada
medicamento e de seus similares, bem como o custo total de todos os procedimentos. Treinamento na graduação e nos programas de residência médica deveria ser
estimulado em todo o país. Quando se liga boa ética e
economia, todos ganham: o paciente, a família, a instituição e a sociedade como um todo.12
CITAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS
3
4
5
6
7
28
Rodwin VG: On the separation of health planning and provider reimbursement: the USA and France. Inquiry1981;18:139-50.
Lubitz JD, Riley GF: Trends in medicare payments in the last year of
life. N Engl J Med 1993;329:1092-96.
Shapira DV, Studnicki J, Bradham DD, Wolff P, Jarrett A: Intensive care
survival and expense of treating critically ill patients. JAMA 1993;
269:783-6.
Scitovsky AA, Capron AM: Medical care at the end of life: the interaction of economics and ethics. Ann Ver Public Health 1986;7:59-75.
Birnbaum ML: Cost-containment in critical care. Crit Care Med
1986;14:1068-77.
8
Fairbrass MJ, Chaffe AG: Staff awareness of cost of anaesthetic drugs,
fluids and disposables. BMJ 1988;296:1040-1.
9 Jayasuriya JP: Cost awareness among junior anaesthetists. Anaesthesia
1990;45: 174-5.
10 Bailey CR: Anaesthesia: cheap at twice the price? Anaesthesia
1993;48:906-9.
11 Conti G, Dell’Utri D, Pelaia P, Rosa G, Cogliatti AA, Gasparetto A: Do we
know the costs of what we prescribe? A study on awareness of the cost of
drugs and devices among ICU staff. Intensive Care Med 1998;24:1194-8
12 Lundberg GD: American Health care system management objectives: the
aura of inevitability becomes incarnate. JAMA 1993;269:2554-5.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Calorimetria Indireta no Paciente em Estado Crítico
Indirect Calorimetry in The Critically Ill Patient
Anibal Basile Filho1, Maria Auxiliadora Martins2, Paulo Antoniazzi3, Julio Sérgio Marchini4
ABSTRACT
The recent development of commercially available metabolic monitors has increased interest in measuring oxygen
uptake (VO2), carbon dioxide elimination (VCO2) and resting energy expenditure (REE) and substrate utilization in
critically ill patients. Indeed, indirect calorimetry is a potent tool that requires attention to details, particularly in the
critically ill mechanically ventilated patient. However, several factors may influence the accuracy of gas exchange
measurements, such as the effect of routine daily therapeutic and diagnostic interventions, type of feeding, gas leaks,
and operational or technical problems. This short review analyses the technical aspects involved with the use of the
metabolic cart Deltatrac II system in the intensive care setting.
KEYWORDS: Indirect calorimetry, oxygen consumption, carbon dioxide production, respiratory quotient, resting
energy expenditure.
esde o século XVIII, foi demonstrado que a
respiração modifica o ar atmosférico, diminui
o seu volume, modifica a sua natureza e, em
curto espaço de tempo, perde a propriedade de manter a
vida. Foi Lavoisier quem descobriu a existência do oxigênio e demonstrou a produção de gás carbônico. Escreveu, então: “a respiração é apenas uma combustão lenta
de carbono e hidrogênio, que se assemelha ao que se
passa em uma lâmpada ou vela acesa e, sob esse ponto
de vista, os animais que respiram são verdadeiros corpos combustíveis que se queimam e se consomem”(1).
Em 1770, Lavoisier e Laplace construíram um instrumento que seria o primórdio do calorímetro. Os animais
de experimentação eram colocados, um a um, em um
recipiente contendo neve, onde o calor produzido pelo
animal era medido através da quantidade de neve derretida em um determinado período de tempo(2).
Apesar da construção do primeiro calorimetro de corpo inteiro (calorimetria direta) ter sido construído no início do século XX, desde então, passou-se a denominar
de calorimetria indireta a medida da produção de energia pelo organismo, ao oxidar os três nutrientes básicos,
a saber os carboidratos, as proteínas e os lipídios, através da quantidade de oxigênio consumido e de gás
carbônico produzido(3). A relação entre o consumo de
oxigênio (VO2) e a produção de gás carbônico (VCO2) é
D
chamada de quociente respiratório (RQ).
Somente a partir da década de 80, o calorímetro foi
incorporado ao arsenal dos intensivistas, sendo atualmente largamente utilizado à beira do leito do paciente crítico. O calorímetro é um aparelho simples, portátil, do
tipo “circuito aberto”, que possibilita a respiração do
paciente com ar ambiente ou pode ser conectado a um
respirador (Figura 1), onde, nos dois casos, amostras do
gas inspirado/expirado são coletadas pelo aparelho para
análise da fração do CO2 no ar expirado, da fração de O2
no ar ins- e expirado e dos fluxos ins- e expiratório. A
partir da análise destes parâmetros, o consumo de oxigênio (VO2) e a produção de dióxido de carbono (VCO2)
são medidos. Além disso, a partir desses parâmetros, o
calorímetro efetua uma série de medidas importantes,
como o coeficiente respiratório e o gasto energético de
repouso, através da equação clássica de Weir, cujas técnicas serão descritas detalhadamente mais adiante(4,5,6).
De maneira geral, a VCO2 é calculada como o produto do fluxo constante (Q) pela fração de excreção de
dióxido de carbono (FECO2) à jusante da via de saída da
câmara misturadora interna:
VCO2 = Q x FECO2
Durante as medidas no respirador, o quociente respi-
1Professor Associado e Chefe da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
2Supervisora de Equipe Médica do Centro de Terapia Intensiva (CTI-Campus) da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de
Cirurgia e Anatomia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
3Médico Assistente do Centro de Terapia Intensiva (CTI-Campus) da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e
Anatomia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
4Professor Associado e Chefe do Laboratório de Espectrometria de Massa do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Endereço para Correspondência: Prof. Dr. Anibal Basile Filho (e-mail: [email protected]) – CTI-Campus – Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto – Av. Bandeirantes, 3900 – 14049-900 – Ribeirão Preto – São Paulo – Tel: (16) 602-2439 / (16) 602-2413
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
29
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Figura 1: Visão da unidade.
ratório (RQ) é calculado a partir da clássica equação de
Haldane, transformada a partir das frações dos gases,
como se segue:
1 – FiO2
RQ =
(FiO2 – FEO2) / (FECO2 – FiO2)
onde: FiO2 = Fração de oxigênio no ar inspirado e
FEO2 = Fração de oxigênio no ar exspirado.
O VO2 é calculado a partir do RQ do seguinte modo:
VO2 = VCO2 / RQ
Vários aspectos do calorímetro portátil parecem ser
especialmente interessantes para o seu uso rotineiro nas
unidades de terapia intensiva(7,8,9), a saber:
• Permite medições diretas do VO2, VCO2, Gasto
Energético e o RQ;
• Oferece as opções de se estudar pacientes em respiração espontânea (sistema de capacete) ou conectados
ao respirador;
• Permite estabelecer a demanda diária de energia,
evitando-se, assim, a oferta excessiva ou insuficiente de
nutrientes;
• Por se tratar de um método não invasivo de medição, o paciente não é exposto a riscos ou complicações.
No entanto, para que as medidas sejam bastante precisas, é necessária a observância de alguns critérios e/ou
condições(10):
30
• Ausência de vazamento no
sistema de coleta dos gases respiratórios, particularmente pelo
tubo endotraqueal, drenos torácicos e conexões do calorímetro
com o respirador;
• O paciente deve estar calmo, estável. Opiácios, benzodiazepínicos ou agentes curarizantes
podem ser utilizados, a critério
médico;
• Proceder à aspiração traqueal 5 minutos antes de iniciar
a medição dos parâmetros do
calorímetro, afim de se evitar interrupções desnecessárias;
• Evitar os efeitos termogênicos provocados pela febre do
paciente (T>39oC) e pela administração de altas doses de catecolaminas vasopressoras que podem acarretar num aumento momentâneo do VO2 e do
gasto energético;
• A FiO2 deve ser estável e abaixo de 60%, pois valores maiores aumentam os erros dos valores obtidos;
• A rede elétrica e de gases hospitalar deve ser estável e, se possível, o ambiente deve ser climatizado (Temperatura ambiente entre 21 e 23oC);
• Calibrar o aparelho antes de utilizá-lo, conforme as
especificações do fabricante (gás de calibração com 95%
de O2 e 5% de CO2);
• Evitar a circulação do pessoal no momento da
calibração, para não comprometer a pressão barométrica
medida, de maneira automática, pelo calorímetro;
• A modalidade de assistência ventilatória que mais
se adapta às medições do VO2 e VCO2 é a ventilação
volume-controlado, pois outra modalidades, tais como a
ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV)
ou a pressão contínua nas vias aéreas (CPAP) podem
tornar essas medidas instáveis;
• A determinação dos parâmetros obtidos pelo calorímetro
não deve ser inferior a 20 minutos, pois intervalos muito curtos podem levar a erros grosseiros de interpretação;
• O respirador não deve estar ciclando com pressões
de platô maiores do que 40 cmH2O ou altos valores de
PEEP (> 20 cmH2O), pois estes valores podem influenciar o analisador de gases.
DETERMINAÇÃO DO CONSUMO DE
ENERGIA (GASTO ENERGÉTICO REAL)
O termo gasto energético real (ou total), passou a ser
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
utilizado, em indivíduos saudáveis para definir: metabolismo basal, efeito térmico do excercício, efeito térmico
dos alimento ou ação específica de um determinado nutriente ingerido. O metabolismo basal é a energia gasta
pelo organismo para manter suas funções vitais, em repouso, após jejum de doze horas, à temperatura ambiente de 20oC, em estado de vigília. Efeito térmico do alimento ou ação específica de um nutriente é o gasto de
energia acima do basal, provocado pela ingestão e absorção alimentar. Isto é atribuído à todo processo da digestão, desde a absorção do alimento ao seu grau de aproveitamento celular(11).
A determinação do gasto energético real, através do
calorímetro, é realizada ainda empregando-se a equação
de Weir. A taxa de produção de energia que é igual ao
gasto energético real é obtida pela soma das taxas de
VO2 e VCO2, subtraídas da produção de uréia nitrogenada
(UN), cujo valor normal situa-se entre 13 e 15 g/dia:
EE = 3,82VO2 + 1,22VCO2 – 1,99UN
Em virtude de valores calorimétricos utilizados pelo
fabricante, a equação acima difere da clássica Equação
de Weir em, no máximo, 1%, que é:
EE = 3,94VO2 + 1,11VCO2 – 2,17UN
Se considerarmos a variação fisiológica normal dos
valores acima, esta diferença não é importante. Por exemplo, um paciente com VO2 = 250 mL/min, VCO2 = 200
mL/min e UN = 13 g/dia, obtem-se um EE de 1701 e
1710 kcal/dia para a equação do calorímetro e a de Weir,
respectivamente.
No entanto, no paciente grave vítima de trauma ou
sepse, outros fatores contribuem para o incremento do
gasto energético, sendo, o reparo dos tecidos lesados, o
maior fator. Sabe-se que nesses pacientes, o aumento do
gasto energético ocorre, principalmente, nos 2 a 7 dias
que se seguem à agressão (fase flow), devido ao aumento da taxa de renovação de proteínas.
É interessante notar que no paciente queimado, por
exemplo, o aumento do gasto energético é devido a várias razões: - síntese protéica acelerada (22%), neoglicogênese (11%), - ciclo da uréia (3%), - ciclo dos
ácido graxos (17%), - ciclo glicolítico-neoglicogênico
(4%). É curioso, contudo, salientar que 43% do aumento
energético é devido ao vazamento de prótons (proton
leakage) através da membrana mitocondrial e à
hiperatividade do sistema Na+-K+-ATPase(12). Nesse particular, a atividade excessiva da bomba de sódio e potássio parece ser a maior razão pelo aumento do gasto
energético no paciente em estado crítico. No cérebro e
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
nos rins, por exemplo, o bombeamento de sódio é o responsável por 50 a 60% do VO2(13). Além disso, este sistema enzimático contribui com a manutenção da integridade do gradiente eletroquímico nas membranas
citoplasmáticas, facilitando o transporte transmembranário de solutos, como a glicose e certos aminoácidos(14). Salienta-se, ainda, que alguns hormônios
(insulina, hormônio do crescimento e iodotironina) também afetam a atividade do sistema Na+-K+-ATPase(15).
Por outro lado, muitos outros fatores ainda podem ter
uma contribuição significativa e adicional no gasto de
energia do paciente crítico, por incremento da atividade
do sistema Na+-K+-ATPase, dentre eles destacam-se: a
liberação de citocinas, conhecidas como sustâncias
pirógenas, que se observa na fase de agressão, por ativação endotelial e macrofágica, agem, provavelmente,
modulando o transporte membranário de glicose e
aminoácidos(16) e o aumento da produção de lactato, observada em modelos experimentais de sepse(17) e de choque hemorrágico(18).
Finalmente, particular ênfase deve ser dada ao cálculo do gasto energético total para fins de administração
de suporte nutricional. Embora no passado, quando a
calorimetria indireta não era disponível em nosso meio,
era rotineiro o uso da equação de Harris-Benedict(19) para
o cálculo do gasto energético basal (GEB), multiplicado
pelos fatores de estresse de Long(20), para calcular, teoricamente, o gasto energético real (GER). Esses cálculos,
normalmente, superestimam as necessidades energéticas
dos pacientes críticos em até 50%, conduzindo à administração excessiva de nutrientes. Dados mais recentes,
obtidos através de calorimetria indireta à beira do leito,
apontam para o fato destas necessidades reais não ultrapassarem, por exemplo na sepse, mais do que 20% do
GEB(21,22).
Figura 2: Conexão esquemática do calorímetro portátil
(Deltatrac II) com o respirador.
31
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
DETERMINAÇÃO DO CONSUMO
DE OXIGÊNIO
As alterações orgânicas no pós-trauma ou na sepse
originam um desbalanço entre a oferta (DO2) e o consumo de oxigênio (VO2) pelos diferentes tecidos orgânicos. Em ambientes especializados, como nas unidades
de terapia intensiva, é de crucial importância determinar-se, com precisão, certos parâmetros fisiológicos indicadores do nível de oxigenação tecidual, sobretudo o
VO2, permitindo o norteamento de decisões terapêuticas, nos pacientes críticos admitidos nessas unidades.
O VO2 reflete o estado metabólico de todo o organismo e não apenas de determinados tecidos localizados. A
determinação do VO2 no paciente crítico é considerada
um dos parâmetros fisiológicos mais importantes, uma
vez que existe uma relação entre o seu valor e a taxa de
sobrevida desses pacientes(23).
Existem dois métodos possíveis de monitorização do
VO2 nos pacientes críticos. Um dos métodos mais utilizados é invasivo, obtido através da inserção do cateter
triluminal de Swan-Ganz, na artéria pulmonar, por punção venosa subclávia ou jugular. O segundo método de
monitorização da VO2 é não invasivo, sendo obtido através da calorimetria indireta, onde o VO2 é obtida, imediatamente, à beira do leito. O valor normal do VO2 situase entre 180 a 300 mL/min, podendo, também ser
indexado à superfície corpórea do paciente.
O método da medida do VO2 através do cateter de
Swan-Ganz baseia-se no princípio de Fick ou termodiluição, onde os cálculos são efetuados a partir da diferença entre a temperatura do sangue do paciente e da injeção
de uma solução gelada, através do cateter. Muitas limitações são imputadas ao seu uso, tais como: o custo elevado
e o carater invasivo do procedimento; uma subestimação
do consumo total de oxigênio em 10% em pacientes com
infecções pulmonares, pois este método não leva em conta o consumo pulmonar de oxigênio(24) e a limitação dos
cálculos pela possibilidade de erros matemáticos cumulativos (“mathematical coupling”), pois o cálculo do VO2
utiliza, em sua equação, diversas variáveis provenientes
de outras equações, como por exemplo, o débito cardíaco,
o conteúdo arterial e venoso de oxigênio(25,26).
Embora vários estudos comparativos não tenham
apontado uma diferença significativa entre o VO2 obtido
pelo método de Fick e pela calorimetria indireta, em pacientes críticos, uma atenção especial deve ser dada à
interpretação dos resultados obtidos através da
calorimetria indireta(27,28,29). Dessa maneira, deve-se proceder a calibrações freqüentes do aparelho e impedir a
possibilidade de qualquer vazamento de gás no circuito,
pois todo o volume expirado do paciente deve ser recolhido pelo aparelho e, finalmente, as medidas do VO2
necessitam ser repetidas através do tempo, uma vez que
o momento metabólico de cada paciente pode ser modificado, em virtude da gravidade do quadro clínico e das
diferentes intervenções terapêuticas efetuadas. Apesar das
vantagens e desvantagens dos dois métodos de determinação do VO2 (Fick vs. Calorimetria), a maioria dos autores recomenda o uso da calorimetria indireta, como
método mais seguro, mais preciso, não invasivo, menos
oneroso e quase isento de complicações(30,31,32).
RESUMO
O desenvolvimento, relativamente recente, de
monitores metabólicos portáteis propiciou um aumento
no interesse em se monitorar o consumo de oxigênio
(VO2), a produção de gás carbônico (VCO2), o gasto
energético real (REE) e a utilização de nutrientes em
pacientes em estado crítico. De fato, a calorimetria indireta tornou-se uma ferramenta muito útil, sobretudo nos
pacientes sob ventilação mecânica. No entanto, muitos
fatores podem influenciar a precisão das medidas obtidas com o calorímetro, tais como: as rotinas terapêuticas
e os procedimentos diários, tipo de terapia nutricional,
vazamento nos circuitos de conexão ao respirador, além
de problemas operacionais e/ou técnicos. Esta breve revisão analisa os diversos aspectos da utilização do
calorímetro portátil Deltatrac II, no âmbito das Unidades de Terapia Intensiva.
UNITERMOS: Calorimetria indireta, consumo de
oxigênio, produção de gás carbônico, quociente respiratório, gasto energético real.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1.
2.
3.
4.
5.
32
Coutinho R. Breve resumo do metabolismo. In: Noções de Fisiologia da
Nutrição, ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 1981, 3-16.
Schutz Y. The basis of direct and indirect calorimetry and their potentials.
Diabetes Metab Rev 1995;11:383-408.
Ferrannini E. The theoretical basis of indirect calorimetry. Metabolism
1988;37:287-301.
Frayn KN. Calculation of substrate oxidation rates in vivo from gaseous exchange. J Appl Physiol 1983;55:628-34.
Simonsen DC, DeFronzo R. Indirect calorimetry: methodological and inter-
6.
7.
8.
9.
pretative problems. Am J Physiol 1990;258:E399-E412.
Suen VMM, Da Silva GA, Marchini JS. Determinação do metabolismo
energético no homem. Medicina (Ribeirão Preto)1998;31:13-21.
Takala J, Keinänen O, Väisänen P, et al. Measurement of gas exchange in
intensive care: Laboratory and clinical validation of a new device. Crit Care
Med 1989;17: 1041-47.
Liposky JM, Nelson LD. Ventilatory response to high caloric loads in critically ill patients. Crit Care Med 1994;22: 796-802.
Brandi LS, Bertolini R, Calaf M. Indirect calorimetry in critically ill patients:
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Clinical applications and practical advice. Nutrition 1997;13:349-58.
10. Takala J, Merilänen P. Handbook of gas exchange and indirect calorimetry.
Datex-Ohmeda – Doc. No. 876710-1, 1990.
11. Reed GW, Hill JO. Mesuring the thermal effect of food. Am J Clin Nutr 1996;63:
164-9.
12. Yu Y-M, Tompkins RG, Ryan CM, et al. The metabolic basis of the increase in
energy expenditure in severely burned patients. JPEN 1999; 23:160-8.
13. Rolfe DFS, Brown GC. Cellular energy utilization and molecular origin of
standard metabolic rate in mammals. Physiol Rev 1997;77:731-58.
14. Park HS, Kelly JM, Milligan LP. Energetics and cell membranes. In: Kiney
JM, Tucker HN, eds. Energy Metabolism: Tissue Determinants and Cellular
Corollaries. New York: Raven Press, 1992;411-35.
15. Ewart HS, Klip A. Hormonal regulation of the Na+-K+-ATPase activity: Physiological relevance and cellular mechanisms. Am J Physiol 1993;265:F743-55.
16. Souba WW. Cytokine control of nutrition and metabolism critical illness. Curr
Probl Surg 1994;31:577-643.
17. James JH, Fang C-H, Schrantz SJ. Linkage of anaerobic glycolysis to sodiumpotassium transport in rat skeletal muscle. Implications for increased lactate
production in sepsis. J Clin Invest 1996; 98: 2388-97.
18. Luchette FA, Frend LA, Brown CC. Increased skeletal muscle Na+-K+-ATPase activity as a cause of increased lactate production in hemmorrhagic shock.
J Trauma 1998;44: 796-801.
19. Harris JA, Benedict FG. A biometric study on basal metabolism in man. Washington, DC, Carnegie Institute of Washington, Public. No. 279, 1919.
20. Long CL, Schaffel N, Geiger JW. Metabolic response to injury and illness:
Estimation of energy and protein needs from indirect calorimetry and nitrogen balance. JPEN 1979; 3: 452-8.
21. Frankenfield DC, Wiles CE, Bagley S, et al. Relationships between resting
and total energy expenditure in injured and septic patients. Crit Care Med
1993;22:1796-804.
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
22. Zauner C, Schuster BI, Schneeweiss B. Similar metabolic responses to standardized total parenteral nutrition of septic and nonseptic critically ill patients.
Am J Clin Nutr 2001;74: 265-70.
23. Shoemaker W, Kram H. Oxygen transport measurements to evaluate tissue
perfusion and titrate therapy: dobutamine and dopamine effects. Crit Care
Med 1991;16: 672-88.
24. Light B. Intrapulmonary oxygen consumption in experimental pneumococcal
pneumonia. J Appl Physiol 1988;4: 2490-5.
25. Ronco J, Phang T, Walley K. Oxygen consumption is dependent of changes in
oxygen delivery in severe adult respiratory distress syndrome. Am Rev Respir
Dis 1991;43: 1267-73,.
26. Yu M, Burchell S, Takiguchi SA, McNamara JJ. The relationship of oxygen
consumption measured by indirect calorimetry to oxygen delivery in critically
ill patients. J Trauma 1996;41:41-50.
27. Bracco D, Chioléro R, Pasche O, et al. Failure in measuring gas exchange in
the ICU. Chest 1995;107:1406-10.
28. Chioléro R, Mavrocordatos P, Bracco D, et al. O2 consumption by the Fick
method. Am J Respir Crit Care Med 1994;149:1118-22.
29. Matarese L. Indirect calorimetry: Technical aspects. J Am Diet Assoc 1997;97:
S154-S160.
30. Cheong KF, Lee TL. Oxigen consumption – A comparison between calculation by Fick’s principle and measurement by indirect calorimetry. Med J Malaysia 1997;2: 70-5.
31. Epstein CD, Peerless JR, Martin JE, et al. Comparision of methods of measurements
of oxygen consuption in mechanically ventilated patients with multiple trauma: The
Fick method versus indirect calorimetry. Crit Care Med 2000;28:1363-9.
32. Marson F. Análise comparativa do consumo de oxigênio (VO2) obtido pelo
método de Fick e pela calorimetria indireta no paciente grave. Dissertação de
Mestrado. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Universidade de São
Paulo, 108 p., 2001.
33
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Tratamento da Asma Aguda Grave:
Suporte Ventilatório em Pediatria
Management of acute severe asthma: ventilatory support in pediatrics
Werther Brunow de Carvalho*
Abstract
The utilization of mechanical ventilatory support in child with acute severe asthma is usually well tolerated, but
required fisiopathologic knowing to not occur assincronisn between patient-ventilator interface and other complications. The tracheal intubation is associated with significant morbity and never should made lightly. The utilization of
rapid sequence intubation allows make easy the necessary conditions to obtain successfull in the tracheal intubation
maneuvers and is recommended in emergent situations. Are necessary precautions to prevent dynamic hyperinflation during mechanical ventilatory support. Are presented another alternative modes of therapy such: general anesthesia, helium, nitric oxide and extracorporeal membrane oxygenation.
mbora seja uma doença previnível, não são
raros os casos de óbitos de crianças por asma
grave. Os episódios agudos ameaçadores de
vida necessitam internação na Unidade de Cuidados
Intensivos (UCI) e, às vezes intubação traqueal e instituição da ventilação pulmonar mecânica (VPM).
A gravidade da asma é difícil de se definir e a sua
caracterização deve levar em conta quatro componentes: severidade biológica, fisiológica, funcional e a
apreensão (carga) da doença (em termos emocionais,
sociais, impacto financeiro da asma na família, sociedade e como um todo).
A asma aguda grave denota um episódio asmático
sério colocando a criança em risco de desenvolver uma
falência respiratória, condição esta referida também
como estado de mal asmático¹. A evolução da crise
asmática em termos de tempo bem como a gravidade
da obstrução das vias aéreas pode variar amplamente 2,3,4. Em alguns pacientes as medidas repetidas do
E
pico de fluxo expiratório podem evidenciar uma piora
subaguda do fluxo expiratório que evolui em vários
dias, antes do aparecimento dos sintomas da asma grave, sendo então chamada de “exacerbação da asma de
progressão lenta”. Em outros pacientes a função pulmonar piora de maneira grave em menos do que uma
hora sendo então chamada de “exacerbação da asma
de progressão súbita”. A “exacerbação da asma de
progressão lenta” é devida principalmente a falhas no
tratamento (tratamento inadequado, complacência
baixa, controle inadequado, fatores psicológicos
coexistentes), já a “exacerbação da asma de progressão rápida” é desencadeada pela exposição maciça aos
alergenos, sensibilidade aos agentes antiinflamatórios
não hormonais e a alergenos existentes nos alimentos, além dos sulfitos2.
São descritos dois padrões diferentes para os casos
de asma fatal (Tabela 1).
No primeiro caso em que a deterioração ocorre gra-
TABELA 1 – Padrões Distintos de Asma Fatal
Variável
Tipo 1
Tipo 2
Tempo de Evolução
Piora subaguda (dias). Início lento – chegada tardia
Piora aguda (horas). Asma asfíxica súbita
Freqüência
Aproximadamente 80-85%
Aproximadamente 10-20%
Vias Aéreas
Rolha extensa de muco
Brônquio ± “cheio”
Inflamação
Eosinófilos
Neutrófilos
Resposta ao Tratamento
Lenta
Rápida
Prevenção
Possível
?
*Professor Livre-Docente do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina – Chefe
das UCIs do Hospital São Paulo, Hospital Santa Catarina e Beneficiência Portuguesa de São Paulo
Endereço do Autor: Rua: Maria da Grã, 333 – casa 16 – Alto de Pinheiros – São Paulo – SP – CEP 05465-040 – Fone/fax: (11) 30213949 – Fone/fax: (11) 5576-4288 – e-mail: [email protected]
34
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
dualmente em dias ou semanas é geralmente possível
se fazer a prevenção, já na deterioração súbita não existe um antecedente óbvio de piora da asma a longo prazo e a resposta do paciente, caso seja tratado adequadamente (medicamente e/ou com VPM), é rápida.
INDICAÇÕES PARA ADMISSÃO NA
UNIDADE DE CUIDADOS INTENSIVOS
VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA
COM PRESSÃO POSITIVA
A utilização da ventilação não invasiva com aplicação de máscara facial é uma opção terapêutica para
suporte ventilatório de curto prazo na criança com falência ventilatória hipercapnica, mas ainda em condições de manutenção da via permeável.
O objetivo desta modalidade de ventilação é o de
dar algum tempo para a otimização dos agentes farmacológicos utilizados previamente. O suporte ventilatório não invasivo tem como vantagens: diminuir a
necessidade de sedação, diminuir o risco de infecção
nosocomial, melhorar o desconforto do paciente, evitar as complicações da intubação intratraqueal incluindo o trauma de vias aéreas superiores, sinusite, otite
e a pneumonia intra-hospitalar. Adicionalmente, os
mecanismos de defesa da via aérea, como a deglutição
e a fala permanecem intactos com o paciente alerta e
podendo se comunicar. Algumas desvantagens incluem: risco de aspiração do conteúdo gástrico, necrose
de pele devida a pressão da máscara e sensação de
claustrofobia.
A ventilação não invasiva com pressão positiva é
uma opção atrativa para o tratamento da asma refratária5. Na asma aguda grave a utilização de pressão positiva contínua em vias aéreas através de máscara diminui o trabalho respiratório, causa broncodilatação,
diminui a resistência de vias aéreas, reexpande áreas
de atelectasia, promove a remoção de secreção, permite um repouso dos músculos inspiratórios e do diafragma e diminui os efeitos hemodinâmicos adversos
de uma pressão pleural inspiratória muito negativa.
A ventilação não invasiva com pressão positiva
pode ser empregada com um aparelho de ventilação
mecânica convencional utilizando ventilação limitada a pressão ou volume, ou ainda, utilizando-se aparelhos de ventilação não invasiva. O aparelho BiPAP
funciona com um gerador de fluxo variado que permite controle independente da pressão inspiratória e
da pressão expiratória positiva em vias aéreas.
Broncodilatadores por via nebulizada podem ser fornecidos nos circuito inspiratório do aparelho. Os daVolume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
dos a respeito da eficácia da ventilação não invasiva
no estado de mal asmático são escassos. Um estudo
de Shivaram U et al, 19936, em vinte e um pacientes
com asma aguda analisou a aplicação de pressão positiva contínua em vias aéreas (CPAP) com níveis de
5 ou 7,5 cmH 2O, observando-se uma diminuição
significante da freqüência respiratória e da dispnéia.
Posteriormente, Meduri GU et al, 19967, relataram
a sua experiência com a ventilação não invasiva em
dezessete episódios de pacientes com asma aguda grave. Estes autores utilizaram inicialmente uma ventilação com suporte de pressão de 10 cmH2O de CPAP,
posteriormente a CPAP foi aumentada para 3 e para 5
cmH2O assim como a ventilação com pressão de suporte foi aumentada para obter um volume corrente
exalado de 7 ml/kg ou mais e uma freqüência respiratória inferior a 25 resp/min. Obtiveram como resultado uma melhora na dispnéia, gasometria arterial, freqüência cardíaca e freqüência respiratória.
A partir destes estudos, parece que a aplicação de
ventilação não invasiva por pessoal treinado e experiente pode ser útil na redução das taxas de intubação
em um grupo selecionado de pacientes com asma aguda grave. Entretanto, estudos adicionais são necessários para reforçar este parecer.
INTUBAÇÃO TRAQUEAL
A intubação traqueal deve ser evitada o máximo
possível na criança com asma aguda grave. A
intubação traqueal não é curativa e está associada com
uma morbidade significativa, podendo aumentar o grau
de inflamação e de obstrução da via aérea. A decisão
de intubar uma criança asmática nunca deve ser feita
de maneira inconseqüente. O momento exato para
intubação traqueal é primordialmente uma decisão clínica. Este procedimento pode agravar o broncoespasmo e a ventilação com pressão positiva aumenta
muito o risco de depressão circulatória e de barotrauma. Com a terapêutica mais agressiva utilizandose beta-2 agonistas por via inalatória, as taxas de
intubação de crianças asmáticas admitidas no hospital caíram para menos do que 1% e naquelas admitidas na UCI estão em torno de 5 a 10% dos pacientes3.
As indicações absolutas para intubação traqueal
são: parada respiratória e cardíaca, hipóxia grave e
alteração rápida do nível de consciência da criança.
O cansaço progressivo independente do tratamento
máximo otimizado é uma indicação relativa de VPM.
A indicação de se instituir o suporte ventilatório
invasivo não deve depender dos dados da gasometria
arterial 8,9,10,11,12.
35
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
FIGURA 1 – Seqüência de Intubação Rápida
Para se realizar a intubação traqueal na criança com
asma deve-se realizar a seqüência de intubação rápida
(SIR) (Fig. 1).
Antes da intubação a criança deve ser pré-oxigenada
com 100% de O2, realizada a aspiração de orofaringe e
inserida uma sonda nasogástrica para a descompressão
do estômago. O paciente deve ser pré-medicado com um
sedativo ou anestésico, a seguir realizada a atropina por
via intravenosa e utilizado um músculo relaxante de ação
rápida. A cetamina na dose de 2mg/kg intravenosa é a
droga de escolha para indução nos pacientes com asma
grave devido as suas propriedades broncodilatadoras,
sedativas, analgésicas, e anestésicas. Na dose acima ela
fornece uma anestesia geral sem uma depressão respiratória significante. A cetamina aumenta o reflexo laríngeo,
portanto, deve-se evitar a estimulação excessiva das vias
aéreas superiores, reduzindo deste modo o risco de
laringoespasmo. O propofol intravenoso é um agente
sedativo de ação curta que diminui a resistência de vias
aéreas em pacientes com broncoespasmo, sendo recomendada uma dose de indução de 2-2,5 mg/kg seguida
por uma infusão contínua entre 50-100 mcg/kg/min titulada para se obter uma sedação adequada que facilite a
VPM. O propofol pode ocasionar hipotensão, principalmente nas crianças com hipovolemia. O rocurônio é um
músculo relaxante não despolarizante, de ação curta que
pode ser utilizado na dose de 0.9-1.2 mg/kg, não ocasionando efeitos hemodinâmicos significativos. A via
orotraqueal é a de escolha para intubação. Mais de 50%
36
das complicações, na criança asmática que recebe VPM,
ocorrem durante ou imediatamente após a intubação
traqueal. Exceto pelo mau posicionamento do tubo
traqueal, as complicações são devidas principalmente ao
aprisionamento de gás. A hipotensão, a dessaturação de
oxigênio, a presença de pneumotórax/enfisema subcutâneo e parada cardíaca são as complicações mais
freqüentemente observadas.
HIPERINSUFLAÇÃO DINÂMICA
No período imediato após a intubação, e como resultado da VPM pode haver um aumento da hiperinsuflação dinâmica11. A pressão pleural que era predominante negativa na respiração espontânea torna-se
positiva ocasionando diminuição do retorno venoso e
hipotensão. A hipotensão responde freqüentemente à
infusão de volume e à diminuição de freqüência de
ciclagem do aparelho de ventilação.
A obstrução grave do fluxo aéreo na asma é o resultado da exalação incompleta que já pode estar presente antes da intubação. Dependendo do grau de
hiperinsuflação dinâmica existe uma correlação direta deste com o risco de barotrauma e hipotensão. Após
o início da ventilação com pressão positiva o grau de
hiperinsuflação dinâmica correlaciona-se com o volume corrente, tempo expiratório e com o grau de obstrução ao fluxo aéreo.
A ventilação convencional objetivando valores norRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
mais de CO2 podem ocasionar uma hiperinsuflação
maciça com o aumento do risco de barotrauma e
hipotensão.
Dois trabalhos em pediatria, Dworkin G et al, 198913
e Cox RG et al, 199114, utilizando estratégias com pico
de pressão inspiratória menor que 60 cmH2O e 45 cmH2O
respectivamente, além de freqüências de ciclagem baixas e tempo expiratório longo, observaram uma sobrevivência de 100% sem seqüelas importantes.
ESTRATÉGIAS VENTILATÓRIAS
As estratégias ventilatórias objetivam minimizar a
hiperinsuflação dinâmica e melhorar a evolução dos
pacientes com asma aguda grave.
Os modos de ventilação controlado são preferidos
no período imediato pós intubação, já que estudos anteriores evidenciaram que os pacientes com fadiga
muscular ventilatória demoram pelos menos 24 horas
para terem uma recuperação completa da fadiga. Dois
modos de ventilação controlada podem ser utilizados:
à pressão ou à volume. A ventilação com pressão controlada é mais apropriada para manutenção da pressão de via aérea, especialmente no episódio grave na
qual a resistência de vias aéreas varia rapidamente.
Nos pacientes submetidos ao modo controlado, existem três estratégias que podem diminuir a hiperinsuflação
dinâmica: diminuição minuto, aumento do tempo
expiratório e diminuição da resistência. A hipoventilação
controlada (hipercapnia permissiva) é a estratégia
ventilatória recomendada para diminuir o grau de
hiperinsuflação pulmonar fornecendo uma oxigenação
e ventilação adequadas e minimizando a possibilidade
de hipotensão sistêmica e barotrauma. A hipoventilação
pode ser obtida por diminuição do volume corrente e/ou
da freqüência de ciclagem do aparelho.
Os parâmetros iniciais do aparelho de ventilação
mecânica devem portanto, evitar a possibilidade de níveis perigosos de hiperinsuflação dinâmica (Tabela 2).
Com a resposta positiva à terapêutica empregada e
quando as condições da criança melhora, o modo de
ventilação deve ser trocado para modos assistidos iniciando-se o processo de retirada gradual da ventilação mecânica. A ventilação assistida controlada não
deve ser utilizada como estratégia inicial da criança
com asma aguda grave, porque ela pode induzir o paciente a gerar uma ventilação minuto excessiva com o
desenvolvimento de pressão expiratória final positiva
intrínseca (PEEPi). A PEEPi e os volumes correntes
expiratórios devem ser mensurados para se evitar um
aprisionamento significante de gás.
MODOS TERAPÊUTICOS ALTERNATIVOS
MISTURA HÉLIO-OXIGÊNIO
O efeito de diminuição da densidade com o emprego
da mistura hélio-oxigênio é significativo apenas quando
se empregam altas concentrações de hélio (70-80%). Em
termos específicos o Hélio diminui o gradiente de pressão para fluxo turbulento e converte parte deste fluxo
em fluxo laminar. Recentemente, alguns autores observaram um aumento significativo no pico do fluxo
expiratório e uma diminuição significativa no pulso paradoxal em pacientes com asma aguda grave após receberem a mistura hélio-oxigênio por um período de 15
minutos. Estes dados indicam a redução da resistência
de vias aéreas inspiratória e expiratória, com a aplicação
do gás podendo diminuir a fadiga muscular e servir como
uma ponte para uma terapêutica efetiva com agentes antiinflamatórios/broncodilatadores. O Heliox também
pode aumentar a deposição pulmonar periférica de medicações fornecidas por aerosol melhorando deste modo
a broncodilatação (Anderson M et al, 1993)15. O Heliox
pode ser fornecido através de máscara facial em pacientes sem intubação traqueal ou utilizando-se VPM através do ramo inspiratório do circuito de ventilação. Quando utilizado nesta população com intubação traqueal e
TABELA 2 – Parâmetros iniciais do aparelho de Ventilação Pulmonar Mecânica
Parâmetros
Recomendações
Modo
Ventilação com pressão controlada
Ventilação com pressão regulada/volume controlado
Freqüência Respiratória
15 resp/min
Volume Corrente
6ml/kg
Pressão Expiratória Final Positiva
4-5 cmH2O
Pico de Pressão Inspiratória
< 40cmH2O
Relação Inspiração/Expiração
≥ 1:3
Tempo Inspiratório
0.75-1.5 seg
Fração Inspirada de Oxigênio
Manter a Sat O2 > 90%
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
37
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
ventilação mecânica, os aparelhos devem ser recalibrados
para se obter uma medida acurada do volume corrente e
da fração inspirada de oxigênio.
ANESTESIA GERAL - HALOTANO,
ISOFLUORANO E ENFLUORANO
Os agentes anestésicos inalatórios têm sido utilizados para o tratamento do estado de mal asmático
refratário há mais de cinco décadas. Todos eles
presumivelmente causam broncodilatação por relaxamento da musculatura lisa do brônquio.
Existem várias desvantagens teóricas na utilização
destes agentes (depressão miocárdica, vasodilatação,
depressão da função mucociliar, aumento do fluxo
sangüíneo cerebral e da pressão intracraniana, atenuação da vasoconstrição pulmonar hipóxica, sensibilização do miocárdio as catecolaminas).
Uma avaliação dos efeitos hemodinâmicos e respiratórios do halotano na concentração de 1% no estado
de mal asmático foi realizada por Saulnier FF et al,
199016, em doze pacientes adultos, encontrando-se uma
redução rápida do broncoespasmo e uma melhora dos
gases arteriais sem nenhum efeito hemodinâmico adverso. Estes agentes anestésicos inalatórios, em diversos trabalhos (Schwartz SJ, 198417; Bierman M et al,
198618; Parnass S et al, 198719; Maltais F et al, 199420)
têm sido utilizados com sucesso, por curtos períodos
de tempo, podendo ser empregados na asma aguda
grave desde que haja viabilidade técnica. Em crianças
eles têm sido utilizados com sucesso nos casos mantidos em ventilação pulmonar mecânica e que não responde à terapêutica convencional. Como parece não
haver diferença no efeito broncodilatador entre o
halotano e o isofluorano, este último pode ser um agente seguro para utilização nas crianças com episódios
de asma ameaçadores da vida. O isofluorano não tem
efeitos inotrópicos negativos, mas pode causa
hipotensão devido a vasodilatação. O isofluorano também não é arritmogênico. Os anestésicos inalatórios
podem piorar o shunt intrapulmonar devido a abolição da vasoconstrição pulmonar hipóxica. A utilização prolongada de alguns anestésicos inalatórios pode
causar acúmulo de flúor ocasionando nefrotoxicidade
e diabetes insípido nefrogênico21.
PAPEL DOA ÓXIDO NÍTRICO
COMO VASODILATADOR
Existe uma síntese contínua de óxido nítrico nos
vasos pulmonares o qual desempenha um papel importante na manutenção do fluxo sangüíneo e na relação ventilação/perfusão. A diminuição da liberação do
óxido nítrico pode estar relacionada a vasoconstrição
pulmonar hipóxica. Entretanto, altas concentrações de
óxido nítrico podem ocasionar efeitos adversos na
permeabilidade capilar resultando em edema e
extravasamento de fluídos. Em condições inflamatórias pulmonares como na asma a indução da óxido
nítrico sintetase a nível endotelial e epitelial pode contribuir com a hiperemia da mucosa, estreitamento das
vias aéreas e broncoconstrição.
PAPEL DO ÓXIDO NÍTRICO
COMO BRONCODILATADOR
Na asma as altas concentrações de óxido nítrico
produzida pela indução da óxido nítrico sintetase pode
suprimir a atividade da óxido nítrico sintetase constitucional e ocasionar um aumento da concentração de
cálcio intracelular com constrição da via aérea. Altas
concentrações de óxido nítrico produzem através da
óxido nítrico sintetase induzível uma diminuição da
atividade da óxido nítrico sintetase constitucional.
Na asma o epitélio é freqüentemente lesado o qual
pode também alterar a produção de óxido nítrico pela
óxido nítrico sintetase constitucional podendo contribuir com o broncoespasmo. É provável que a deficiência de produção endógena do óxido nítrico após uma
infecção viral seja devida a uma disfunção da óxido
nítrico sintetase constitucional. O efeito do óxido
nítrico como broncodilatador em humanos tem sido
desapontador. Altas concentrações de óxido nítrico
(>que 20.000 partes do bilhão) ocasionam um aumento
da resistência de vias aéreas em indivíduos sadios.
OXIGENAÇÃO DE MEMBRANA
EXTRACORPÓREA
Utilizada nos pacientes com asma aguda grave refratária quando não se obtém uma oxigenação adequada
com a utilização de ventilação pulmonar mecânica22,23.
ÓXIDO NÍTRICO
COMPLICAÇÕES
O óxido nítrico possui pelo menos quatro ações a
nível pulmonar: como vasodilatador, broncodilatador,
transmissões não colinérgico, não adrenérgico e como
mediador inflamatório.
38
As complicações associadas com a intubação traqueal
incluem a pneumonia intra-hospitalar, sangramento digestivo devido ao estresse e desnutrição. Os pacientes
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
que necessitam VPM prolongada podem evoluir com
sepse e disfunção de múltiplos órgãos. Deve-se incluir
na prescrição medidas apropriadas para evitar estas complicações incluindo: agentes para neutralizar a secreção
gástrica (habitualmente bloqueadores do receptor de
histamina ou inibidores da bomba de próton), posicionamento correto no leito, extubação precoce do paciente
conforme haja melhora e alimentação enteral de acordo
com a possibilidade.
A utilização associada de bloqueador neuromuscular
com altas doses de corticosteróides está fortemente associada com uma miopatia grave que ocorre em cerca de
30% dos pacientes e que tem uma evolução de semanas
ou meses para sua resolução, portanto, caso se utilize
bloqueio neuromuscular, deve-se descontinuar o seu
emprego tão logo seja possível24,25,26.
RESUMO
A utilização de suporte ventilatório na criança com
asma aguda grave é habitualmente bem tolerada, mas
necessita conhecimentos fisiopatológicos básicos
para que não ocorra assincronia com o aparelho de
ventilação pulmonar mecânica e outras complicações.
A intubação traqueal está associada com uma
morbidade significante e não deve ser indicada e realizada de maneira inconseqüente. A utilização da
seqüência de intubação rápida facilita as condições
necessárias para se ter sucesso nas manobras de
intubação traqueal , sendo recomendadas na situações de emergência. São necessárias precauções para
se prevenir a hiperinsuflação dinâmica durante a ventilação assistida.
REFERÊNCIAS
12345-
67891011121314-
Dubus JC, Bodiou AC, Buttin C, et al. La crise d’asthme aigu grave de
I’enfant. Arch Pédiatr 2000; 7(1): 27-32.
Papiris S, Kotanidou A, Malagari K, et al. Clinical review: Severe asthma.
Crit Care 2001; 6:30-44.
Werner HA. Status asthmaticus in children A review. Chest 2001;
119(6):1913-29.
Wood RA. Pediatric asthma. JAMA 2002; 288(6):745-7.
Gehlbach B, Kress JP, Kahn J, et al. Correlates of prolonged hospitalization
in Inner-city ICU patients receiving noninvasive and invasive positive pressure ventilation for status asthmaticus. Chest 2002; 122(5):1709-14.
Shivaram U, Miro AM, Cash ME, et al.: Cardiopulmonary responses to continuous positive airway pressure in acute asthma. J Crit Care 1993, 8:87.
Meduri GU, Cook TR, Turner RE, et al.: Noninvasive positive pressure ventilation in status asthmaticus. Chest 1995, 110:767-74.
Qreshi F. Management of children with acute asthma in the emergency department. Ped Emerg Care 1999; 15(3):206-14.
Spagnolo SV. Status asthmaticus and hospital management of asthma.
Immunol and Allergy Clin North America 2001; 21(3):1-31.
Glukman TJ, Corbridge T. Management of respiratory failure in patients
with asthma. Curr Op Pulm Med 2000; 6:79-85.
Burns SM, Lawson C. Pharmacological and ventilatory management of acute
asthma exacerbations. Crit Care Nurse 1999; 19(4):1-16.
Oppenheimer JJ, Chipps BE, Corbridge TC, et al. Acute asthma: the basics
of assessment and treatment. J Respir Dis 2002; 23(3):126-43.
Dworkin G, Kattan M. Mechanical ventilation for status asthmaticus in children. J Pediatr 1989; 114(4 pt 1): 545-9.
Cox RG, Barker GA, Bohn DJ. Efficacy, results, and complications of mechanical ventilation in children with status asthmaticus. Pediatr Pulmonol
1991; 11:120-6.
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
15- Anderson M, Svartengren M, Bylin G, et al. Deposition in asthmatics of
particles inhaled in air or in helium-oxygen. Am Rev Respir Dis 1993;
147:524-8.
16- Saulnier FF, Durocher AV, Deturck RA, et al. Respiratory and hemodynamic
effects of hatothane in status asthmaticus. Inte Care Med 1990, 16:104-7.
17- Schwartz SJ. Treatment of status asthmaticus with halothane. JAMA 1984,
251:2688-9.
18- Bierman M, Brown M, Muren O, et al. Prolonged isoflurane anesthesia in
status asthmaticus. Crit Care Med 1986, 14:832-3.
19- Parnass S, Feld J, Chamberlim W, et al. Status asthmaticus treated with
isoflurane and enflurane. Anesth Analg 1987, 66: 193-5.
20- Maltais F, Sovilj M, Goldberg P, et al. Respiratory mechanics in status
asthmaticus. Effects of inhalational anesthesia. Chest 1994, 106:1401-6.
21- Arnold JH, Truog RD, Rice SA. Prolonged administration of isoflurane
to pediatric patients during mechanical ventilation. Anest Analg 1993;
76:520-6.
22- Tobias JD, Garret JS. Therapeutic options for severe, refractory status
asthmaticus: inhalational anesthetic agents, extracorporeal membrane oxygenation and helium/oxygen ventilation. Paediatr Anaesth 1997; 7:47-57.
23- Shapiro MB, Kleaveland AC, Bartlett RH. Extracorporal life support for
status asthmaticus. Chest 1993; 103: pp. 1651-1654.
24- Leatherman JW, Fluegel WL, David WS, et al. Muscle weakness in mechanically ventilated patients with severe asthma. Am J Respir Care Med
1996; 153:1686-90.
25- Douglass JA, Tuxen DV, Horne M, et al. Myopathy in severe asthma. Am
Rev Respir Dis 1992; 146:517-9.
26- Behbehani NA, Al-Mane F, D’yachkova Y, et al. Myopathy following mechanical ventilation for acute severe asthma: the role of muscle relaxants
and corticosteroids. Chest 1999; 115:1627-31.
39
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Avaliação da Recusa ou Suspensão de Tratamentos
Considerados Fúteis ou Inúteis em UTI
Withdrawal and withholding of life support in an Intensive Care Unit
Rachel Duarte Moritz*, Fabrício Pamplona**
ABSTRACT
Objective: To determine the incidence of withdrawal (WD) or withholding (WH) of life support in one Intensive Care
Unit (ICU) and identify which treatment was more frequently under WD or WH.
Design: Retrospective cohort study
Setting: University Hospital
Method: Data was obtained by retrospective chart review. It included age, previous pathology, length of hospital
stay, length and cause of ICU stay, decisions to limit treatment and the modalities of therapies to be under WD/WH.
Data was allocated in two groups. Group A with the patients who had active treatment, and group B with the patients
who had their therapy under WD/WH.
Results: One hundred and fifty five patients died from January 2001 to December 2001. WD/WH life-supporting was
performed in 50 (32%) patients. The medium age of group B patients was greater than of group A patients (58x54.6
years). Group B patients have more previous pathology than group A patients. The length of hospital and ICU stay
was greater in group B patients (p<0.05). The most comon causes of ICU stay in both groups were respiratory failure,
coma after cardiorrespiratory arrest and sepsis. Futility of therapy was the most frequent reason for WD/WH decisions. Vasopressors were the therapy more frequently under WD/WH (82%) followed by antibiotics therapy (48%).
Conclusions: WD/Whof life support was performed in 32% of patients. The most frequent WD/WH therapy was
vasopressors. Futility was the cause for those decisions in 100% of the cases.
KEY WORDS: Withdrawal / Withholding / Terminal illness / Ethics / Critical Care
partir do século XX, sete entre dez mortes ocorreram nos hospitais1 e, cada vez mais, esse fato
tem acontecido nas UTIs. O desenvolvimento
tecnológico tem permitido que a definição de morte venha
sendo modificada e que o paciente gravemente enfermo seja
mantido por um longo período de tempo nessas unidades2.
Em decorrência dessa realidade, em muitos casos, o
momento da morte nas UTIs passou a ser precedido de decisões sobre a recusa ou a suspensão de tratamentos considerados fúteis ou inúteis3-11. Um tratamento fútil ou inútil
pode ser definido como aquele que não atinge as metas terapêuticas12,13. Entretanto, os médicos intensivistas sofrem,
diante da decisão de recusar ou suspender um tratamento
considerado fútil ou inútil, um dilema contínuo que envolve problemas éticos, religiosos, culturais e legais14-18. Além
do mais, esses profissionais sentem-se angustiados temendo o julgamento dos seus pares e da sociedade por confundirem os termos ortotanásia, eutanásia e distanásia que, na
realidade, têm significados bastante diferentes. Distanásia
pode ser definida como a morte lenta e com muito sofrimento. Eutanásia significa a abreviatura de um sofrimento
por intermédio de uma morte induzida o que a diferencia
da Ortotanásia definida como a morte no seu tempo certo19-
A
24
. Ao confundir esses termos os médicos intensivistas podem, pelo medo de cometer erro médico ou eutanásia, praticar a distanásia em seus pacientes. Entretanto, a recusa ou
suspensão de um tratamento considerado fútil ou inútil não
pode ser considerada um erro médico, pois não pode ser
encaixada como imprudência, negligência ou imperícia e,
tampouco, tal atitude pode ser definida como eutanásia.
Torna-se importante acrescentar que, embora a recusa ou
suspensão de um tratamento considerado fútil ou inútil seja
aceita pela Igreja, ainda é mal definida do ponto de vista
legal25,26.
Tendo em vista o relatado propôs-se este trabalho que
visa avaliar a freqüência da recusa ou suspensão de tratamentos em pacientes que foram a óbito na UTI de um Hospital Universitário, e verificar quais tratamentos foram mais
comumente suspensos ou recusados.
MÉTODO
Este é um estudo do coorte histórico que avaliou os prontuários de pacientes que foram a óbito no período de janeiro de 1999 a dezembro de 2001. Foram anotados os dados
demográficos desses pacientes, seus antecedentes patoló-
*Coordenadora da Residência de Medicina Intensiva do HU/UFSC – Professora do Departamento de Clínica Médica HU/UFSC
**Residente de Medicina Intensiva do HU/UFSC
Hospital Universitário - Universidade Federal de Santa Catarina
ENDEREÇO DO AUTOR: Rua João Paulo 1929 – Bairro João Paulo – 88030-300 – Florianópolis/SC/ – Fone (48) 2385700 ou
3319264 – Email [email protected]
40
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Tabela 1: Características demográficas
Características
GRUPOS
Demográficas
Teste
A
B
TOTAL
Estatístico/Significância
N
%
N
%
F
39
40
21
39
M
66
60
34
61
N
%
SEXO
IDADE (anos)
Média
Minima
Máxima
Desvio Padrão
TEMPO INTERNAÇÃO (Média dos dias)
Unidade de Enfermagem
Terapia Intensiva
TOTAL
54.6
58
χ2
t Student
p=NS
60
38.7
95
61.3
p=NS
55.8
15
15
15
90
95
90
16.9
17.6
17.6
9.4
14.7
3.6
105
8.3
68
50
t Student
p=0.03
t Student
p=0.005
32
155
100
NS= não significante
gicos e qual o motivo e o tempo de sua internação na UTI.
Foi também verificado se houve ou não recusa ou suspensão de tratamentos e, em caso positivo, qual foi o motivo
para a decisão e, quais foram os tratamentos suspensos, recusados ou mantidos para esses pacientes.
Após a coleta dos dados dos mesmos foram subdivididos em dois grupos. Pertencerem ao grupo A os que mostravam que a medicação havia sido mantida plena até o
momento do óbito do paciente, e ao grupo B os que apresentavam decisões de recusa ou suspensão de tratamento.
Os testes estatísticos foram realizados através do programa Epi Info@ Version 6 (center for desease control, Atlanta),
utilizando-se os testes χ2 e t de Student para a análise. Foram
considerados significantes os resultados com p<0.05.
RESULTADOS
De um total de 596 internações que ocorreram na UTI
do HU, no período de janeiro a dezembro de 2001, foram
analisados os prontuários dos 155 pacientes que morreram.
Foram alocados no grupo A 105 pacientes (68%) e no grupo B 50 pacientes 32%.
O tempo de internação desses pacientes, tanto na Unidade de Enfermagem (UE) quanto na UTI, e as suas características demográficas podem ser observados na Tabela 1.
Nessa tabela pode ser constatado que os pacientes do grupo
B estiveram mais tempo internados tanto na UE (p=0.03)
quanto na UTI (p=0.005).
Na Figura 1 são descritas as principais causas para a
FIGURA 1: Motivos da internação na UTI
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
41
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
internação dos pacientes na UTI. Deve ser ressaltado que
alguns pacientes apresentavam mais de um fator que motivou a sua internação nesse setor. As patologias mais
freqüentemente associadas àquelas que foram a causa
da internação na UTI foram hipertensão arterial sistêmica
(HAS), diabetes melitus (DM) e doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC). Não foi observada diferença
significante no que concerne à relação entre a presença
de antecedentes patológicos no momento da internação
na UTI e a mortalidade dos pacientes.
Os principais motivos para a decisão da recusa ou
suspensão de tratamentos nos pacientes do grupo B podem ser observados na Tabela 2. Na Figura 2 podem ser
verificados quais os tratamentos mais freqüentemente
suspensos ou recusados nesse grupo de pacientes. Deve
ser mencionado que o resultado total é maior do que
100% porque alguns tratamentos foram recusados e/ou
suspensos no mesmo paciente.
É importante acrescentar que o suporte ventilatório
foi mantido em todos os pacientes de ambos os grupos e
que a terapêutica sedativa e/ou analgésica foi mantida
em 100% dos pacientes do grupo A e em 96% dos pacientes do grupo B.
Ressalta-se que os custos com o tratamento e a von-
TABELA 3: Motivos para recusa ou
suspensão de tratamentos.
MOTIVO
Futilidade
GRUPO B
N
%
50
100
Futura qualidade de vida
18
36
Prévia qualidade de vida
12
24
Idade
13
26
Decisão da família
1
2
Figura 2-Terapias mais freqüentemente
recusadas ou suspensas
42
tade prévia do paciente não foram citados entre os motivos de recusa ou suspensão de tratamentos.
DISCUSSÃO
A partir dos anos 70, com o desenvolvimento continuado de novas tecnologias, o paciente gravemente enfermo pode ser mantido por um longo período de tempo
em uma UTI. Em alguns casos, a morte é inevitável em
praticamente 100%, sendo apenas retardada a um alto
custo financeiro, moral e psicológico, para todos os envolvidos. A partir desse fato e da certeza de que o ser
humano tem direito a uma morte digna surge um novo
debate, se a recusa ou a suspensão dessas tecnologias é
uma ação ética e legal18,21,23,27. Entretanto, apesar de esses debates estarem apenas começando, tanto no âmbito
mundial quanto nacional é um fato constatado que as
mortes em UTI são precedidas, cada vez mais, por decisões de recusa ou suspensão de tratamentos considerados fúteis ou inúteis3,5-11,28,29.
Neste estudo, a recusa ou suspensão de tratamentos
precedeu 32% (50 pacientes) das mortes na UTI.
Percentuais maiores foram encontrados em estudos internacionais. Sprung e cols.28 constataram que 86% dos
óbitos que ocorreram em uma UTI israelense foram precedidos de decisões de recusar ou suspender tratamentos. Smedira e cols.10 revisaram o tratamento de 1719
pacientes internados em UTIs da Califórnia e de São
Francisco, e mostraram que a recusa ou suspensão de
tratamentos foi responsável pela metade das mortes que
ocorreram naquelas unidades. Prendergast e cols.9 constataram uma mudança temporal no comportamento dos
profissionais que trabalham em UTI diante da recusa ou
suspensão de um tratamento e mostraram que entre os
anos de 1987-1988, a reanimação cardiorrespiratória foi
iniciada em 40% dos pacientes que sofreram PCR nas
UTIs. Já entre os anos de 1992-1993 essa conduta foi
tomada em apenas 10% dos pacientes gravemente enfermos que sofreram PCR. Esse mesmo estudo mostra
que os óbitos foram precedidos de decisões de recusar
ou suspender tratamentos em 51% dos casos nos anos de
1987-1988 e em 90% dos casos nos anos de 1992-1993.
Na França, em 2001, Ferrand e cols.30 mostraram que as
terapias foram suspensas ou recusadas em 807 de 7309
pacientes (11%), sendo que essas decisões precederam
628 (53%) das 1175 mortes nas UTIs. Esteban3, em um
estudo que avaliou 3498 pacientes adultos internados em
UTIs espanholas, mostrou que a recusa ou suspensão de
tratamentos ocorreu em 2026 pacientes (58%). Keenan
e cols.6, em um estudo de coorte reptrospectivo, constataram que 70% dos pacientes morreram após a recusa ou
suspensão de um tratamento.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Plailisier e cols.8, em um estudo retrospectivo, com o
intuito de determinar se a recusa ou suspensão do tratamento é mais freqüente em pacientes com mais de 65
anos, mostraram que os pacientes mais jovens sofriam
de trauma mais grave e que os idosos apresentavam maior associação de comorbidades. Entretanto, as decisões
de suspensão ou recusa foram semelhantes nos dois grupos. Keenan e cols.6, constataram que os pacientes que
morreram após a recusa ou suspensão de um tratamento
tinham mais idade e que estavam internados há mais tempo na UTI. Esteban3 relatou resultados semelhantes e
mostrou que a idade, o índice prognóstico SAPS II e o
tempo de internação em UTI foram significativamente
maiores nos pacientes aos quais o tratamento foi recusado ou suspenso. Resultados semelhantes foram encontrados neste trabalho, com exceção de uma maior incidência de antecedentes patológicos nos pacientes do grupo B, o que significa que, nesta amostra, a presença de
patologias prévias não foi fator de risco e nem motivo
para se suspender ou recusar tratamentos durante a
internação na UTI.
Nos últimos anos, o fator desencadeante da maioria
das mortes nas UTIs tem sido relacionado à suspensão
ou à recusa de um tratamento, sendo constatado que 96%
dos médicos intensivistas já recusaram ou suspenderam
um tratamento em algum momento de sua vida profissional7. Embora filosoficamente não exista diferença entre recusar o início de um tratamento ou suspender um
tratamento já instituído, existe classicamente uma maior
dificuldade dos médicos de retirar uma terapêutica já em
andamento do que de não iniciar um novo tratamento16,31.
O estudo de McLean e cols.32 constatou que a terapêutica mais freqüentemente retirada foi o suporte
ventilatório sendo mantidas a sedação e a analgesia. Na
Finlândia, Hinkla e cols.4 observaram os fatores que afetam os médicos quanto às decisões de recusa ou suspensão de tratamentos em vítimas de doença cancerosa em
fase final e constataram que os tratamentos mais recusados foram a transfusão sangüínea e a profilaxia da trombose. Smedira e cols.10 mostraram que médicos e enfermeiras só retirariam a ventilação mecânica, substituindo-a por tubo em T, se essa ação não resultasse em morte rápida do paciente. Moritz e cols.33, em um estudo que
avaliou a atitude dos médicos intensivistas brasileiros
diante da recusa ou suspensão de tratamentos, mostraram que a sedação e a analgesia foram as intervenções
menos recusadas ou supensas e que os métodos dialíticos
constituíram a terapêutica mais comumente recusada ou
suspensa. No mesmo trabalho, o suporte ventilatório foi
recusado em quase 25% das vezes e, se já instituído, foi
retirado por 4% dos participantes, tendo sido a intervenção menos suspensa. Neste trabalho, as terapêuticas mais
Volume 15 - Número 1 - Janeiro/Fevereiro 2003
freqüentemente suspensas ou retiradas foram as drogas
vasoativas e os antibióticos, sendo a futilidade o motivo
da tomada dessa decisão em 100% dos casos. Decisões
semelhantes são tomadas tanto por médicos europeus
quanto norte-americanos17.
Esses resultados sugerem que a idéia de futilidade
está, cada vez mais, sendo aceita por aqueles que trabalham em UTI. Entretanto, o médico intensivista sofre
um dilema contínuo ao ser confrontado com decisões
sobre a recusa ou suspensão de tratamentos considerados fúteis ou inúteis, que envolvem problemas éticos,
religiosos, culturais e legais.
Pode-se inferir que a realidade do trabalho cotidiano do intensivista tem se tornado cada vez mais distante daquela vivida por outras especialidades médicas, e
que a recusa ou suspensão de tratamentos tem se tornado uma rotina para o médico intensivista. Deve-se ressaltar que a comunicação adequada entre a equipe de
saúde, os pacientes e seus familiares é um fator primordial no que concerne à discussão sobre a futilidade
de um tratamento2,34-41.
Diante dos resultados apresentados pode-se concluir que a recusa ou suspensão de tratamentos precedeu 32% dos óbitos na UTI avaliada. Os vasopressores
foram o tratamento mais comumente recusado ou
suspenso e a futilidade foi a causa para tal decisão em
100% dos casos.
Deve ser destacado, como fatores limitantes deste trabalho, o fato de ser um coorte histórico que não permitiu
a avaliação da gravidade dos pacientes através de sistemas prognósticos, do horário das tomadas de decisão e
do conhecimento de quais profissionais estavam envolvidos nessas decisões.
Após a constatação da alta freqüência da recusa ou
suspensão de tratamentos, precedendo o momento da
morte dos pacientes internados em UTIs, os autores permitem-se sugerir que esse tema seja mais debatido no
âmbito hospitalar.
RESUMO
Objetivo: Avaliar a freqüência da recusa ou suspensão de tratamentos em pacientes que foram a óbito na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), e verificar
quais tratamentos foram mais comumente suspensos
ou recusados.
Desenho: Estudo de coorte histórico
Local: Hospital Universitário (HU)
Método: Foram anotadas, em um formulário
estruturado, as informações sobre as características
demográficas, os antecedentes patológicos, o tempo e o
motivo de internação no hospital e na UTI e também os
43
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
detalhes sobre a recusa ou suspensão de tratamentos.
Posteriormente, os dados dos pacientes foram alocados
em dois grupos. Ao grupo A pertenceram os dados daqueles que receberam medicação plena até o momento
da morte e ao grupo B os daqueles onde foi constatada a
recusa ou suspensão de tratamentos.
Resultados: Foram analisados os prontuários de 155
pacientes que morreram na UTI do HU no período de janeiro de 2001 à dezembro de 2001. Cinqüenta pacientes
(32%) pertenceram ao grupo B. A média da idade dos pacientes do grupo B foi percentualmente maior que a dos pacientes do grupo A (58x54.6). O tempo de internação hospitalar foi maior para os pacientes do grupo B (p=0.03), o
mesmo ocorrendo com o tempo de internação na UTI
(p=0.005). Os pacientes pertencentes ao grupo B apresen-
tavam um maior número de comorbidades (p=NS). Os principais motivos da internação na UTI para os pacientes de
ambos os grupos foram insuficiência respiratória, coma pósparada cardiorrespiratória e sepse. A futilidade da terapia
foi considerada como principal motivo para a recusa ou suspensão de tratamentos em 100% dos casos. Os vasopressores
foram o tratamento mais comumente suspenso ou recusado (82%), seguidos pela antibioticoterapia (48%).
Conclusão: A recusa ou suspensão de tratamentos
precedeu 32% dos óbitos na UTI avaliada. Os vasopressores foram o tratamento mais comumente recusado/suspenso. A futilidade foi a causa para tais decisões
em 100% dos casos.
PALAVRAS-CHAVE: Recusa / Suspensão / Doença
terminal / Ética / Terapia Intensiva
BIBLIOGRAFIA
01. Hennezel M, Leloup JY. 1999. A arte de morrer. 2a ed. Petrópolis: Vozes. 143 pg.
02. Cook D. 2001. Patient autonomy versus parentalism. Crit Care Med 29(2): N24N25 suppl.
03. Esteban A, Gordo F, Solsona JF, Alia I, Caballero J e cols. 2001. Withdrawing
and withholding life support in the intensive care unit: a Spanish prospective
multi-centre observational study. Intens Care Med 27(11): 1744-9.
04. Hinkla H, Kosunen E, Metsanoja R, Lammi UK, Kellokumpu-Lehtinen P. 2002.
Factors affecting physicians’ decisions to forgo life-sustaining treatments in terminal care. J Med Ethics 28(2): 109-14.
05. Keenan SP, Busche DD, Chen LM, Esmail R, Inman KJ, Sibbald WJ. Withdrawal and withholding of life support in the intensive care unit: a comparison
of teaching and community hospitals. The Southwestern Ontario Critical Care
Research Network. 1998. Crit Care Med 26(2):200-2.
06. Keenan SP, Bushe KD, Chen LM, McCarthy L, Inman KJ, Sibbald WJ. 1997. A
retrospective review of a large cohort of patients undergoing the process of withholding or withdrawal of life support. Crit Care Med 25(8): 1324-31.
07. Levin PD, Sprung CL. 1999. End of life decisions in intensive care. Intensive
Care Med 25: 893-5.
08. Plaisier BR, Blostein PA, Hurt KJ, Malangoni MA. 2002. Withholding/Withdrawal of life support in trauma patients: is there an age bias? Am Surg 68(2):
159-62.
09. Prendergast TJ, Luce JM. 1997. Increasing incidence of withholding and withdrawal of life support from the critically ill. Am J Resp Crit Care Med 155
(1):15-20.
10. Smedira NG, Evans BH, Grais LE, Cohen NH, Cooke M, Schecter WP, et al.
1990. Withholding and withdrawal of life support from the critically ill. N Engl
J Med 322 (5): 309-15.
11. Society of Critical Care Medicine Ethics Committee. 1992. Attitudes of critical
care medicine professionals concerning forgoing life-sustaining treatments. Crit
Care Med 20 (3):320-6.
12. Society of Critical Care Medicine Ethics Committee. 1997. Consensus statement of the Society of Critical Care Medicine’s ethics committee regarding futile and other possibly inadvisable treatments. Crit Care Med 25 (5):887-91.
13. Singer PA, Barker G, Bowman KW, Harrison C, Kernerman P, Kopelow J, et al.
2001. Hospital policy on appropriate use of life-sustaining treatment. Crit Care
Med 29(1):187-91.
14. Asai A, Fukuhara S, Inoshita O, Miura Y,Tanabe N, Kurokawa K. 1997. Medical
decisions concerning the end of life: a discussion with Japanese physicians. J
Med Ethics 23(5): 323-27.
15. Marco CA, Bessman ES, Schoenfeld CN, Kelen CD. 1997. Ethical issues of
cardiopulmonary resuscitation: current practice among emergency physicians.
Acad Emerg Med 4(9): 898-904.
16. Rymes JA, McCullough LB, Teasdale TA, Wilson N. 2000. Withdrawing very
low-burden interventions in chronically ill patients. JAMA 283(8):1061-3.
17. Vincent JL. 1996. Ethical issues in critical care medicine: United States and
European views and differences. Intensive Care World 13 (4):142-4.
18. Pinheiro CTS. 2000. A vida depois da UTI. Rev Bras Terap Intens 12(4):171-2.
19. Alcântara HR. 1979. Deontologia e Diceologia. São Paulo: Andrei. 253p.
20. Boff L. 2002. O direito de morrer. http://www.jbonline.terra.com.br/jb (12/01/02)
44
21. Luce JM, Alpers A. 2000. Legal aspects of withholding and withdrawing life
support from critically ill patients in the United States and providing palliative
care to them. AmJ Resp Crit Care Med 162(6) 2029-32.
22. Nyman DJ, Eidelmman LA, Sprung CL. 1996. Eutanásia. Clínicas de Terapia
Intensiva 1(1):85-96.
23. Pardo A. Sobre la moralidad de retirada de tratamientos a los pacientes. http://
www.unav.es/bioetica/dejarm.html (julho/2001)
24. Pessini L. 1996. Distanásia: Até quando investir sem agredir? http://
www.cfm.org.br (agosto/2001)
25. Bizatto JI. 1990. Eutanásia e responsabilidade médica. Porto Alegre: SAGRA.
246p.
26. Caldana RP, Martins LAN. 1996. A morte auxiliada por médicos. ARS Curandi/
JAMA 29(7):78-87.
27. Santos RLC. 1996. Aspectos Médico-Legais. ARS Curandi 7 (29):3-4.
28. Sprung CL, Eidelman LA, Reuven R, Geber D, Jakobson DJ. 2000. Communication of end of life decisions in the ICU. Crit Care Med 28 (12): A35 suppl.
29. Luce JM. 1997. Withholding and withdrawal of life support: ethical, legal and
clinical aspects. New Horiz 5:30-7.
30. Ferrand E, Robert R, Ingrand P, Lemaire F. Withholding and withdrawal of life
support in intensive-care units in France: a prospective survey. French LATAREA
Group. 2001. Lancet 357(9249):9-14.
31. Luce JM. 1997. Withholding and withdrawal of life support: ethical, legal, and
clinical aspects. New Horiz 5(1):30-7.
32. McLean RF, Tarshis J, Mazer CD, Szalai JP. 2000. Death in two Canadian intensive care units: institutional difference and changes over time. Crit Care Med 28
(1):100-3.
33. Moritz RD, Costa AD, Mattos JD, Machado FO. 2001. O comportamento do
médico intensivista brasileiro diante da decisão de recusar ou suspender um
tratamento. Rev Bras Terap Intens 13(13):21-8.
34. Society of Critical Care Medicine Ethics Committee. Consensus report on the
ethics of foregoing life-sustaining treatments in the criticaly ill. Crit Care Med
1990; 18: 1435-9
35. Sjolvist P, Sundin PO, Berggren L. Limiting life support. 1998. Experiences
with a special protocol. Acta Anaesthesiol Scand 42(2): 232-7.
36. Gherardi CR, Biancolini C, Butera JJ, Calvillo L,Canteli M, Cardonnet L, et al.
2000. Pautas y recomendaciones para la abstención y/o retiro de los métodos de
soporte vital en el paciente crítico. Medicina Intensiva 16(2):53-6.
37. Curtis JR, Patrick DL, Caldwell ES, Collier AC. 2000a. The attitudes of patients
with advanced AIDS toward use of the medical futility rationale in decisions to
forgo mechanical ventilation. Arch Intern Med 160(12):1597-601.
38. Pellegrino ED. 2000. Decisions to withdraw life-sustaining treatment. A moral
algorithm. JAMA 283 (8): 1065-7.
39. Dias FS, Souza RP, Trotta EA, Pereira E, Moritz RD, Kaufmann ML. 2001.
Terminalidade na Medicina Intensiva – Qual o papel do médico intensivista
frente à morte?. Atualidades AMIB. 20 (abril-junho): 5-6.
40. Fins JJ, Solomon MZ. 2001. Communication in intensive care settings: The
challenge of futility disputes. Crit Care Med 29 (2):N10-N15 suppl.
41. Prendergast TJ. 2001. Advance care planning: Pitfalls, progress, promise. Crit
Care Med 29 (2): N34-N39 suppl.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva

Documentos relacionados