DO ADVENTO DA INTERNET À CATALAXIA DO CIBERESPAÇO
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DO ADVENTO DA INTERNET À CATALAXIA DO CIBERESPAÇO
DO ADVENTO DA INTERNET À CATALAXIA DO CIBERESPAÇO: como a técnicas digitais aproximam negócios, consumo e pessoas Tatiana Cioni Couto Universidade Federal Fluminense – Mestranda em Mídia e Cotidiano (PPGMC) Resumo: O presente artigo tem como objetivo abordar o comércio virtual e suas extensões nas práticas cotidianas do sujeito cartesiano em rede (BAUMAN, 2008). Para tal estudo, irá ser feito um retrato da evolução da Internet (CASTELLS, 1999) até a formação da catalaxia (SODRÉ, 2002), nesse espaço onde o ordenamento mercadológico cria diversas maneiras de promover o consumo, aproveitando-se do potencial de colaboração dos usuários na Web 2.0 (ANTOUN, 2008) para aproximar negócios e pessoas. Para tanto será feita uma análise netnográfica de modelos de comércio on-line diversos. Palavras-chaves: comércio virtual; colaboração dos usuários; conversa em rede; consumo. INTRODUÇÃO A Internet foi criada por norte-americanos como um método de comunicação de computadores em rede para impedir espionagem durante a guerra fria. O modelo chamado de Arpanet (Agência de Pesquisas em Projetos Avançados) foi inaugurado na década de 60 e evoluiu para a transformação de uma rede das redes, após a criação dos fóruns eletrônicos do estilo BBS (bulletin board systems), onde milhares de computadores foram conectados (CASTELLS, 1999, p.87). A ligação de computadores em rede na década de 90 permitiu a conexão de pessoas e empresas (CASTELLS,1999, p.233). Em 1999, nascem as empresas com transações econômicas on-line, tais como Amazon.Com, E-toys, Dell-Direct World ou The Street.com, onde somente a empresa Amazon alcançou o valor de 25 bilhões de dólares em ações (IDEM, IBIDEM, p. 192-199). A internet torna-se uma esfera de negócios: a catalaxia. Neste modelo, as técnicas digitais introduzem a interação em tempo real e auxiliam por meio de dispositivos a circulação mais rápida do capital (SODRÉ, 2002, p.22-27). Há a construção das empresas virtuais um leque de opções, como: links patrocinados; leilões virtuais; sistemas de agendamento de serviços on-line; sites para comparar preços e serviços ou para comprar ou se desfazer de mercadorias; compras coletivas, shoppings eletrônicos e até um site para fazer uma “vaquinha on-line”. Este cenário reforça a análise de Bauman (2008, p.19) na formação de um sujeito cartesiano que pode comparar e examinar as mercadorias e aprender a lidar com elas, seja para usá-las ou descartá-las. O autor vai lembrar-se da gama de produtos prontos para serem examinados na Web durante 24 horas por dia, em lojas que não tem hora para fechar. O Brasil também adota o modelo prático do comércio eletrônico com igual sucesso dos americanos: 84% dos usuários brasileiros de internet já compraram on-line, seja a partir do computador ou de celulares, de acordo com a pesquisa do IAB Brasil (Interactive Adversing Bureau) de 2013: Os números mostram como os negócios virtuais se diversificam para atingir o maior número possível de internautas. Coletando dados e conquistando clientes Nesta perspectiva, para o comércio eletrônico funcionar de modo eficiente, é necessário criar um banco de dados que consiga armazenar dados essenciais do consumidor. Com uma ficha cadastral, as lojas virtuais podem ter informações como nome e endereço completos e manter o histórico das compras do usuário. Deste modo, o sistema pode reconhecer o visitante e oferecer novas ofertas e produtos dentro daqueles hábitos mais comuns, atraindo o comprador como um “imã eletrônico”, conforme ressalta Moraes (2001, p.42-43): Pra surfar pelos links especiais, o visitante tem que se cadastrar fornecendo, opcionalmente, informações sobre nível de escolaridade, poder aquisitivo, hábitos de consumo, preferências culturais etc. Trata-se de um procedimento comum estas firmas de serviços que operam na Net. As empresas passam a dispor de autênticos catálogos virtuais, de extrema valia para análises estratégicas e malas diretas. Nenhum grão mercadológico pode ser desprezado – muito menos uma “mais valia” tecnológica como essa. Dentro da busca convencional, surgem os links patrocinados: empresas que pagam para estar entre as primeiras respostas de procura e que também ganham destaque na aba direita do Google, o “oráculo digital” do momento (GABRIEL, 2008, p.19). Para funcionar plenamente, devem ser organizados por palavras-chaves relacionadas com as palavras procuradas pelos internautas, oferecendo uma solução mais rápida para encontrar o que se deseja. Mas se nenhum usuário clicar, então terá sido uma ação sem efeito: Por outro lado, links patrocinados não são apenas para criar tráfego para o site e sim para criar tráfego para a mensagem estratégica correta. Assim, páginas que não apresentam o conteúdo adequado ao usuário ou que não são visualmente atrativas para atender os objetivos de marketing, não causam a conversão desejada (GABRIEL, 2008, p.39-40). Fora do sistema de busca, existem os inúmeros comércios virtuais, entre eles os leilões virtuais, que estabelecem preços on-line em verdadeiras “disputas” pelas mercadorias. No ambiente, uma pessoa cadastrada pode vender ou comprar mercadorias estabelecendo o preço. No sistema, é necessário um cadastro do usuário para poder dar os lances. Inicialmente é estabelecido um preço geralmente muito abaixo do praticado pelo mercado e é fornecido um tempo de duração dos lances, assim quem der o último lance, pode ser o “vencedor” da disputa. Geralmente cada usuário tem o direito de cinco lances gratuitos, mas se quiser mais, deve pagar a empresa que realiza o leilão, de modo que o consumo nestes tipos de site é constante e a cada clique. A possibilidade de pagar menos por um produto atrai muitos consumidores, como lembra Fiore (2001, p.154): “Um dos métodos mais bem-sucedidos e mais imitados de determinação dinâmica de preço na rede atualmente são os leilões on-line. Estes estão se tornando cada vez mais populares”. Como “poupar” é o lema do internauta, a estratégia é feita de modo que o preço final nunca atinja o preço normal do produto, com o estilo: “dou-lhe uma, dou-lhe duas”, o mercado, agora mais dinâmico, desafia o preço fixado pelo vendedor, à medida que os clientes podem escolher o quanto estão dispostos a pagar e pelo quê (TAPSCOTT; TICOLL; LOWY, 2001, p.197). Um dos exemplos de leilão on-line é o www.mukirana.com, do qual se percebe pelo nome a intenção da empresa com o trocadilho feito no nome do site: a pessoa é muquirana, quando gosta de economizar. No site, a oferta tem um cronômetro que informa a data e horário do inicio dos lances. Quando começa a disputa pelo produto, o relógio começa a rodar, mostrando ao participante o momento final que se aproxima a finalização do leilão. Para a pessoa levar o produto, deve ser a última a oferecer o lance. Outros comércios on-line utilizam largamente da interatividade e participação do cliente. Assim empresas procuram trazer o modelo Web 2.0 para agregar seus negócios meios para as pessoas expressarem suas opiniões: “Na nova Web, a publicidade encontraria a nova voz dos grupos da cultura de mídia que transformariam a publicidade em uma honesta recomendação crítica dos usuários” (ANTOUN, 2008, p.19). Neste modelo encontram-se os sites de agendamento de serviços de lazer, como de viagem e reservas de hotéis, onde o usuário não é mais um internauta e sim um consumidor que pode participar pelos comentários e colaborar com a construção de um ranking das melhores empresas. Um dos exemplos deste tipo de serviços é o www.edestinos.com.br, que faz uma busca por hotéis de todo o mundo e mostra as melhores ofertas. Cada hotel é avaliado pelo próprio usuário, que diz quantas estrelas o serviço mereceu, além disto, podem ser feitas avaliações de todo o ambiente, localização, serviços e atendimentos do local. A pontuação final do hotel é indicada em um índice de popularidade. Após ler os comentários, ver as fotos dos quartos e do ambiente do hotel, a pessoa decide se fecha o pacote ou não. Sentindo-se mais confortável, o usuário do sistema fecha negócio. Logo após a viagem, o usuário recebe um e-mail pedindo a participação e destacando como é importante a visão do mesmo para outras pessoas do sistema. Deste modo, os comentários não são obrigatórios, mas tem boa adesão pelos frequentadores do site. A informação adquire consequentemente um fator decisório ao agendar um serviço: transforma-se em moeda o adquirir valor de uso, conforme avalia Moraes (1997, p.14): A informação tornou-se fonte alimentadora das engrenagens indispensáveis à hegemonia do capital, isto é, o lubrificante dos ciclos de troca e de lucro, nesse sentido a mercadoria mais importante. A mais-valia econômica (obtida pela exploração da força do trabalho) e as hierarquias políticas hibridam-se numa espécie de mais valia decisória, que se consolida como informação e se transforma em recurso básico da gestão e produção. Outro site que também usa da participação dos usuários é a Amazon. O cadastro no sistema adota um meio “inteligente” para ajudar o leitor ávido por novidades: é possível preencher um cadastro com os assuntos do interesse particular e deste modo o sistema também avisa quando chega uma mercadoria nova dentro da especificação. Há também uma filtragem colaborativa que recomenda livros, música e vídeos com base nas compras efetuadas. Tais sites são vistos como comunidades já que agregam colaborações de usuários, com comentários e discussões que criam um valor determinado (TAPSCOTT; TICOLL; LOWY, 2001, p.93). Tudo é estipulado no mercado on-line, desde preços até o processo final da compra. Os sites de comparação de preços e serviços, como o www.e-bit.com.br e www.buscapé.com.br que utilizam do mecanismo, viraram os “buscadores de mercadoria”: Basta digitar o nome do produto ou serviço na busca e em um clique abre uma página com preços, detalhes do produto, avaliações dos consumidores com comentários e o ranking feito pelo total de avaliações, listando prós e contras e fotos e vídeo, deste modo o sistema acaba virando um “infomediário”, um tipo de intermediário de negociações, que deve criar valor digital de informação através de cruzamento de dados, como explica FIORE (2001, p.34): Seu trabalho é tirar informações de compradores, suas necessidades, preferências, critérios e perfis, bem como informações sobre vendedores como estoques, produtos, serviços, termos e condições, e fornecer novos serviços agregados para os compradores e vendedores. Os infomediários manipulam informações para extrair o valor delas ao revendê-las, reutilizálas, ‘reembalá-las’ ou doá-las. No sistema do e-bit existem "medalhas": diamante, ouro, prata e bronze, dividindo as lojas em reputação respectivamente com as avaliações: Excelente, ótima, muito boa, boa e loja nova. Além disto, o sistema avisa quem comprou o que e aonde com mapa integrado do Google Maps. Quanto maior a notabilidade dos serviços, melhor será a medalha. No buscapé, cada busca de mercadoria leva a uma série de lojas on-line que vendem o produto. Neste site, há avaliação dos usuários em relação ao serviço de entrega de cada empresa, chegando a uma avaliação final que é feita em conjunto com o sistema do e-bit. Além disto, é possível consultar as opiniões dos compradores e também determinar se gostou ou não da determinada avaliação feita. Sites como www.mercadolivre.com.br usam o slogan “Onde comprar e vender de tudo”. No local, a pessoa pode adquirir uma mercadoria ou se descartar dela, o que permite diminuir a sensação do erro ao enterrar o “velho” e trazer o “novo” (HAUG, 1997, p.52). No ambiente, o vendedor também é avaliado por reputação e o próprio sistema promete a compra protegida 100%. Para o produto se tornar objeto de necessidade de outra pessoa, será no processo valorizado pela foto e descrição das funcionalidades do mesmo. Já nos sites de compras coletivas, um “leque” de opções se abre para a compra do novo e até do não planejado, mas adquirido em um impulso pelas “propostas tentadoras” de se ter determinado produto ou serviço por um preço abaixo do mercado: São vários produtos expostos em promoção. Os sites também ajudam o mecanismo da profusão de mercadorias: são muitos produtos e serviços expostos na página inicial, onde se pode realizar mais de um fechamento de negócio. Nesta perspectiva, o desconto traz consigo visões de uma “economia” e atrativo. Prova disto, é que sites do gênero já têm 3,6 milhões de visitas por mês, segundo dados do IBOPE (2010). O sistema também multiplica as ofertas por meio de integração com as redes sociais para possibilitar que os usuários possam conversar e especialmente compartilhar a “barganha”. Outro atrativo dos sites de compra coletiva é poder “navegar” nas seções de compras: beleza, entretenimento, viagens e outras categorias que organizam os tipos de consumo mais comuns nas ofertas diárias. A mesma pessoa pode participar de tudo que está exposto. Deste modo, o sistema de compras coletivas permitem juntar um, dois, três cupons de desconto para adquirir mercadorias, estimulando o ter pelo ter, em um processo de acumulação de coisas, estimulado pela criação de mercados secundários da internet, como atenta Lindstrom (2009, p.95). Um exemplo do site de compras coletivas é o www.peixeurbano.com.br , que atua em todo o Brasil com ofertas divididas por cidade. No sistema é possível ver a “economia” gerada na compra, quantas pessoas já adquiriram a promoção, o tempo restante para dar um lance e o regulamento do estabelecimento envolvido, de modo que o consumo seja facilitado. Cada oferta tem um tempo de compra,onde um relógio automaticamente vai diminuindo os minutos restantes para obter o desconto. Além disto, o produto ou serviço exposto tem o preço (promoção) em destaque, o número de cupons que podem ser adquiridos e o local da oferta. Na mesma página, é escolhido um item em destaque, mas existem outros descontos diversos com fotos. No sistema se inclui o Facebook (com a opção do botão curtir) e o envio da oferta para e-mail dos amigos, assim as facilidades criadas pela rede das redes são feitas para “pensar” como aumentar a lucratividade das empresas através de oferta dos bens, mudando a concepção do mercado de simples troca de mercadoria. No ambiente online, publicações, comentários, curtidas e compartilhamentos são critérios de seleção do consumidor, como pontua Canclini (2006, p.35): quando selecionamos os bens e nos apropriamos deles, definimos o que consideramos publicamente valioso, bem como os modos de nos integramos e nos distinguirmos da sociedade, de combinarmos o pragmático e aprazível. As livrarias optam também por estas facilidades ao criar um verdadeiro catálogo on-line dividido por autor, título, obra e assuntos. Nos sites são oferecidas obras brasileiras, publicações estrangeiras; lançamentos, e-books e buscas refinadas que permitem procurar seção, categorias e segmentos. Nelas, não é necessário o estoque imediato do produto: é possível reservar o livro para uma posterior procura. Há um vasto acervo de livros dentro de uma única livraria virtual, cujas opções muitas vezes são muito maiores que aquelas disponíveis nos locais físicos. Em alguns sites é possível também ver os comentários dos compradores sobre a obra e avaliação em estrelas das publicações ou mesmo do serviço de entrega. Como na hora da compra é feito um cadastro, a cada momento que for efetuado um negócio, o sistema das livrarias virtuais guarda aqueles dados que são usados de diversos modos para gerar novas compras: seja mandando e-mail com mercadorias do gênero ou gerando uma página inicial da livraria “inteligente”: Ao clicar naquele endereço onde já foi efetuada uma compra em determinado gênero de assunto, o sistema responde com uma primeira página com chamadas para produtos dentro dos gêneros adquiridos recentemente. Deste modo, as informações coletadas no momento da compra são usadas para dar a sensação que está ajudando o consumidor, mas que de fato estão sendo usadas para gerar um novo consumo, atenta Fiore (2001, p.46-47): Qualquer compra de um produto começa com a percepção de que um consumidor tem uma necessidade. Isso dá a primeira oportunidade de construir um relacionamento com um cliente em potencial, antecipando ou estimulando uma necessidade do consumidor. Ao ajudar um consumidor a preencher uma necessidade de produto ou serviço, uma empresa pode coletar – voluntariamente – informações sobre um cliente em potencial. Algumas livrarias virtuais também disponibilizam outros produtos diferentes de gêneros literários, como DVDs, CDs, brinquedos e jogos. Ao abrir mais opções de produtos, tornam-se um E-Tayler, um varejista eletrônico (FIORE, 2001, p.10). Um dos exemplos é a livraria Saraiva (livrariasaraiva.com.br, acessado em 26/08/2013) que possui eletrônicos, jogos, filmes e outros produtos disponíveis. No site, o consumidor ainda pode ver além das especificações e foto do produto, compartilhar em redes sociais, como Twitter, Facebook, Pinterest e Google+. Do shopping físico ao shopping eletrônico Ir a um shopping, em um local físico, não é mais necessário, basta entrar no comércio eletrônico e encontrar o produto a apenas um clique. Nestes tipos de site, há uma organização da informação de modo a mostrar as “lojas” disponíveis divididas em links, como, por exemplo: celular,telefones tablets, notebooks e computadores, tvs, áudio e eletrônicos, casa, esporte e lazer, bebidas, brinquedos, bebês, perfume, beleza, saúde. Como ressalta Breta (2007, p.207): “Nos domínios da internet, vende-se de tudo num incomensurável shopping center eletrônico, no qual os recursos multimidiáticos são cada vez mais sofisticados para produzir efeitos de demonstração dos produtos ofertados”. Esta estrutura é utilizada no www.submarino.com.br, onde é possível efetuar um negócio completamente on-line ou até por telefone (existe um número para ligações) e acompanhar o pedido passo a passo, tanto dentro do sistema, como ser avisado da entrega e outras etapas por e-mail. Alguns produtos ainda entram na “oferta 24 horas”, que são aqueles em maior destaque e ocupam um desconto passível de ser “capturado” pelos consumidores se for efetuado no dia determinado e não outro. A redução de preço é mostrada com risco no valor atual e mostrando o valor corrigido. Além disto, as mercadorias tem uma descrição das propriedades do mesmo: com a imagem (foto); descrição e até produtos similares. No caso dos livros e outros artigos, ainda há a opção de ler as resenhas postadas por usuários do sistema. Quando o usuário decide qual compra será efetuada, no mesmo momento, o sistema “multiplica” as escolhas, aparecendo diversos produtos relacionados ao assunto ou objeto. Outro site conhecido como “shopping eletrônico” é o www.americanas.com, na primeira página já é possível ver vídeos sobre o produto e a avaliação dos usuários (de 1 a 5 estrelas) com comentários feitos pelo comprador. Outro detalhe que chama a atenção da participação colaborativa é que todas as postagens tem a possibilidade de curtir ou não determinada avaliação. Neste ponto, como avalia Castells (1999, p.440): O preço a pagar por uma participação tão diversa e difundida é deixar que a comunicação espontânea, informal prospere simultaneamente. A comercialização do espaço cibernético estará mais próxima da experiência histórica das ruas comerciais emergentes da palpitante cultura urbana que dos shoppings centers espalhados na monotonia dos subúrbios anônimos. Este tipo de negócio virtual é chamado de E-Tayler, ou seja, um varejista eletrônico (FIORE, 2001, p.10): o cliente não precisa sair de casa e encontra todo tipo de produto disponível de acordo com as necessidades pessoais. Nestes tipos de shopping virtuais, outros sites podem fazer vendas de produtos e serviços sem necessidade de espaço físico, o que representa uma economia por cortar custos, como ressalta Lessa e Granero (2012, p.15): É mantido na prateleira apenas aquele produto que ao menos cobre o custo de estocagem e se por ventura este estiver vendendo menos que outro que ocuparia o mesmo espaço ele logo é substituído, em vista de um maior lucro e despesas mensais ou optar por ter produtos que cubram o custo da estocagem. Para o restante das mercadorias como geladeiras, fogões, armários, camas e mesas, criam-se as chamadas reservas virtuais: o cliente realiza a compra, mas o produto não existe em local físico, de modo que, da venda em diante, o E-Tayler deve encontrar um parceiro virtual para efetuar o negócio. A economia do negócio on-line se torna tão atrativa que determinadas lojas físicas já fazem ofertas somente no ambiente virtual e não no físico, como a FNAC, por exemplo. Supermercados também acabam construindo prateleiras on-line com carrinho de compras virtuais, tornando as compras mais fáceis e rápidas de serem realizadas e entregues em casa. Apesar de serem mercadorias que podem estragar, mostram-se um mercado atraente por serem bens necessários constantemente. São negócios alimentícios que se tornam “mercearias digitais” (TAPSCOTT; TICOLL; LOWY, 2001, p.69-70). Os números são contundentes. Os mantimentos sobrepujam o mercado de livros – $450 bilhões contra $30 bilhões nos Estados Unidos. Os consumidores gastam um décimo da sua renda semanal, entre $60 e $100 para uma família média, em mantimentos . Mas não é só nos EUA que foi adotado o modelo, no Brasil já tem o “Zona Sul Atende” e tantos outros supermercados que tentam atingir a fatia de possíveis consumidores “práticos”. Tais sistemas ainda abrigam a “gôndola virtual”, a busca dentro do site, a ajuda por chat e até integração com redes sociais. O objetivo é montar um negócio focado no cliente e no relacionamento construído no sistema (IDEM, IBIDEM, p.74). O capital informação A ligação de computadores com outros computadores maximizam as oportunidades de comércio e de obtenção de mercadorias: é possível “ir às compras” sem sair de casa, utilizando da “navegação” e dos cliques. O processo do consumo online ainda conta com as informações geradas pelos usuários, através das observações dos comentários e avaliações existentes em cada site. Neste sentido, o consumidor pode ganhar destaque, porque sua opinião em relação às próprias mercadorias adquire valor. A informação como moeda, neste sentido, pode ajudar a movimentar o capital mais rapidamente. Neste sentido, o “capital informação” também é o da conversa que gira na Internet: dados, estatísticas, comentários, avaliações, interações são usados a cada clique. Se uma pessoa não conhece determinado país em qualquer canto do mundo, basta consultar o oráculo das buscas de serviço e agendamento. Se ela desconhece a procedência e qualidade de determinado produto ou serviço, compara opiniões ou se quer ser um daqueles consumidores que participam, também podem enviar o comentário a qualquer momento. Clicar, conversar e comprar são as trajetórias mais comuns do shopping virtual. Neste aspecto, as trocas coletivas feitas on-line fazem parte do processo do consumo, de um modo de “sociabilizar via ato de consumir”, conforme corrobora Atem (2011, p.101-102) : Como se vê, a forma-consumo significa simplesmente que ambos os indivíduos citados têm seu modo de habitar e experienciar o mundo por meio do consumo, do ato de consumir. A maneira atual de um indivíduo se socializar e participar da vida coletiva é em grande parte através do ato de consumir (seja lá o que for, simplesmente consumir). É precisamente isto que faz de nós uma sociedade cuja cultura pode ser chamada de consumista. Outras formas de comprar são através das redes sociais, como Facebook e You Tube (SIBILIA, 2008, p.17). Nelas o sujeito pode “curtir” e seguir a marca, trocar comentários ou mesmo compartilhar opiniões. Neste sistema, a mercadoria se confunde com a conversa na rede de amizades: A interação social realizada entre duas ou mais pessoas por meio dos comentários on-line, sejam em textos ou imagens, tomam sentidos diversos, de modo a serem transformados em produtos de consumo. Como corrobora Bakhtin (1998), os indivíduos ao se organizarem no ambiente on-line tornam os signos sociais por natureza, ou seja, as mensagens viram mercadorias através das interações. Além de flutuar nos shoppings eletrônicos ou redes sociais pode-se também criar um comércio voltado para si mesmo, com a chamada lista de desejos (“wish list”), onde a pessoa pode criar uma seleção virtual de objetos de desejo feita completamente online, como nas ocasiões de casamento ou aniversários, onde o consumidor aponta para os amigos e familiares o que ele quer (FIORE, 2001, p.47). Os gastos feitos são considerados rituais sociais, onde se torna quase uma obrigação o consumo dos produtos elencados para a marcação de amizade, pois é necessário comparecer ao evento que foi convidado e demarcar a ocasião com um presente (DOUGLAS; ISHERWOOD, 2006, p.40). No site “I Casei” (icasei.com.br, acessado em 26/08/2013), um exemplo do modelo, possui a história dos noivos, fotos e uma parte destinada a lista de casamentos, muitas vezes direcionada a um outro tipo de comércio eletrônico especializado, como serviço de fotografias, filmagens e lembranças. E quando o sujeito quer fazer uma lista de desejos pessoal, chamando os amigos para colaborarem virtualmente? Neste âmbito a mercadoria vira o sujeito. A necessidade de obter um produto para si via socialização cria sites como o “Vaquinha on-line”. “Ei! me dá um dinheiro ai!” Como as conexões em rede são aproveitadas para os mais diversos tipos de negócio, parece que quase “vale tudo”, inclusive pedir objetos ou produtos para os amigos. A antiga vaquinha que era feita entre amigos da vida real para “rachar” uma conta ou ajudar um amigo toma outro destino no ciberespaço: pode ser criada por uma pessoa que pede determinado item de consumo a conhecidos e desconhecidos on-line. O site www.vakinha.com.br explica como o sistema funciona em cinco passos: Tem que especificar quanto quer; quanto precise; avisar aos amigos sobre a vaquinha; acompanhar em detalhes as contribuições que recebe e por último sacar o dinheiro ou usar o crédito para realizar seu desejo. Dentro do site já existem os "parceiros" de negócios, ou seja, outras lojas de comércio virtual que estão integradas dentro do site. Além disto, é possível ver quais foram os últimos rateios realizados e quem contribuiu. Toda postagem tem integração com Facebook, Twitter, Pinterest, Google Chrome e Google Plus, de modo que possa integrar os pedidos dentro das redes sociais. Cada pedido tem já determinado: o objetivo (valor total que deseja receber), o que já foi arrecadado, o valor pedido por contribuição, a data de encerramento e a explicação da necessidade da "vaquinha". O comércio on-line coloca deste modo um meio de interação social por interesse. O autor de determinada postagem vira um pedinte virtual, que não precisa mais de levantar a mão para ter sua contribuição e sim dar um clique para se cadastrar em um sistema que utiliza dos links para obter o resultado final desejado. Neste âmbito pode-se perceber que as mensagens alcançam um teor publicitário, tornando-se “anúncios” pessoais. No dia 22 de setembro de 2013, por exemplo, uma pessoa pede dinheiro para publicar o livro de poesias próprio, para tal antes cita uma poesia inteira na mensagem, tentando vender sua ideia (vakinha.com.br, acessado em 22/09/2013). O objetivo final do site é acumular dinheiro do total pedido seja para realmente comprar o que estava estabelecido ou para comprar outra coisa que tinha sido esquecido na lista de desejos. Quando determinada vaquinha atinge o final almejado, o anunciante pode colocar outro objeto de necessidade; Basta começar uma nova postagem para uma nova apropriação material. O pedinte não cessa de escolher novas coisas, afinal as opções são muitas. Os amigos envolvidos no “jogo da mercadoria” decidem se terão pena e oferecer a “esmola”, afinal eles mesmos também futuramente irão querer usar da mesma estratégia. Considerações Finais A entrada da internet possibilitou um mercado sem fronteiras com a criação do comércio eletrônico. As tentações do “comércio fluído” (BAUMAN, 2001) estão no shopping eletrônico e nos infomediários, onde o consumidor pode buscar diferentes produtos e encontrar muitas opções. As opções de compras on-line possibilitam acumular e desfazer-se de mercadorias; comparar preços; pesquisar produtos; conversar com outros compradores; decidir como realizar e efetuar a compra e entrar em diversos links. Com a entrada da Web 2.0, a internet toma a face de uma mídia democratizada e acessível, por permitir as pessoas a publicarem suas opiniões (ANTOUN, 2008, p.19 ) e ao mesmo tempo, o comércio on-line ganha interatividade com as ferramentas de compartilhamento. Na nova fase, é possível a participação do usuário que circula opiniões, partilha atividades e realiza interações por meio das recomendações. Neste aspecto, os comentários podem ser responsáveis por tomadas de decisão e expandir a esfera dos negócios. É por meio das participações que se expõem as mercadorias. Deste modo, a busca orgânica tradicional (Google) pode migrar para uma busca social, onde o que interessa são os comentários e avaliações feitas nas interações on-line. Neste aspecto, o sujeito cartesiano apontado por Bauman (2008) talvez não esteja mais passivo, diante de tantas possibilidades de compra, e sim se torne um sujeito digital social que possa comparar e pesquisar as mercadorias por meio das interações. As redes sociais - como o Facebook, Google+, You Tube , Instagram e Twitter – também ajudam a propagar o consumo por meio das ferramentas específicas. Nestes ambientes, a mercadoria se confunde com as publicações e postagens dos indivíduos em rede. Uma postagem, um vídeo, uma foto podem adquirir o formato de signos e logo virarem através do consenso de mensagens em produtos para serem consumidos. As avaliações, os compartilhamentos, as curtidas permeiam os produtos, serviços e shoppings eletrônicos, acabam formando um mapa para “pensar” e conversar sobre o consumo. Podem-se comparar opiniões, analisar as notas conferidas por clientes e checar o ranking geral comparativo de serviços e produtos. O índice de popularidade de determinado negócio irá depender diretamente dos fatores colocados dentro destas participações feitas em ambiente completamente on-line. Além disto, é possível comparar os preços antes da compra final. De um lado clientes (usuários dos sistemas) tomam proveito do conteúdo gerado pelas avaliações, ao comparar serviços e produtos, mas também em ato posterior a compra, eles são convidados a também comentar suas opiniões, tornando-se também colaboradores do sistema. De outro, empresas aproveitam-se do ambiente para divulgar as mensagens institucionais, procurando estreitar relacionamentos com o consumidor, respondendo aos comentários, criando ações para estimular a compra e usando das ferramentas existentes da Web 2.0. Neste âmbito, é possível perceber a formação de redes sociais institucionais que dialoguem mais informalmente com o potencial cliente, seja na criação de blogs ou na administração das redes de relacionamento como Facebook e Twitter. Nesta perspectiva, percebe-se que os usuários das redes são promotores das mercadorias e o mercado se remodela diante das novas experiências de consumo, para obter mais exposição e atrair novos clientes. A informação vira “moeda”, pois agrega valor em cada consulta, podendo ajudar na trajetória de compra ao formar um caminho trilhado pelos comentários. Ao poder comparar mais produtos e serviços, mais mercadorias surgem. Deste modo, a movimentação do capital pode ser mais rápida e eficiente. Finalmente percebe-se que por dentro destas observações as técnicas digitais existentes no ambiente on-line podem aproximar negócios, consumo e pessoas. Referências ANTOUN, Henrique. De uma teia à outra: a explosão do comum e o surgimento da vigilância participativa. IN: Web 2.0: participação e vigilância na era da comunicação distribuída. ANTOUN, Henrique (Org). Rio de Janeiro: Maud X, 2008. ATEM, Guilherme Nery. A lógica social da forma-consumo. ALCEU - v. 12 - n.23 - p. 100 a 111 - jul./dez. 2011. BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 1998 BAUMAN, Zygmunt. Vida para o consumo. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. _______.IDEM. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. BRETA, BEATRIZ. A expansão do eu na vida cotidiana: a construção da subjetividade em territórios telemáticos. In: Comunicação e sociabilidade. CAIAFA, Janice; ELLAJI, Mohammed. Rio de Janeiro: Maud X, 2007. CANCLINI, Néstor García. Consumidores e cidadãos. RJ: Ed. UFRJ, 2006. 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