Acórdão TC - Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo

Transcrição

Acórdão TC - Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo
ACÓRDÃO TC-258/2015 - PLENÁRIO
PROCESSO
-TC-2873/2009
JURISDICIONADO -PREFEITURA MUNICIPAL DE PRESIDENTE KENNEDY
ASSUNTO
-RELATÓRIO DE AUDITORIA (EXERCÍCIO DE 2008) TOMADA DE CONTAS ESPECIAL
RESPONSÁVEIS
-ALUÍZIO CARLOS CORREA
ADVOGADOS
- ALESSANDRO DANTAS COUTINHO (OAB/ES Nº. 11.188),
TALYTTA DAHER RANGEL FORATINI PEDRA (OAB/ES Nº.
16.120) E MÁRIO AUGUSTO TEIXEIRA NETO (OAB/ES Nº.
15.081)
EMENTA
RELATÓRIO DE AUDITORIA (EXERCÍCIO DE 2009) PRELIMINARMENTE: 1) CONVERTER OS AUTOS EM
TOMADA
DE
CONTAS
ESPECIAL
-
6)
DETERMINAÇÕES - 7) CONTAS IRREGULARES RESSARCIMENTO - 8) APLICAÇÃO DA PENALIDADE
DE MULTA - 9) ARQUIVAR.
O
EXMO.
SR.
CONSELHEIRO
RODRIGO
FLÁVIO
FREIRE
FARIAS
CHAMOUN:
I – RELATÓRIO:
Tratam os autos de auditoria ordinária realizada na Prefeitura Municipal de
Presidente Kennedy, referente ao exercício de 2008, cuja gestão foi de
responsabilidade do senhor Aluizio Carlos Correa.
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jm/
Os indícios de irregularidades foram identificados no Relatório de Auditoria
RA-O 103/2009 (fls.05/50), com documentação de suporte às fls. 51/1269, os
quais foram elencados na Instrução Técnica Inicial N° 525/2009 (fls.
1270/1305) sugerindo a citação do responsável acima elencado.
Por meio da Decisão Preliminar TC-449/2009 (fls.1315), o Plenário deste
Tribunal determinou a citação do Sr. Aluizio Carlos Correa, para que os mesmo
pudesse apresentar suas justificativas e documentações, no prazo de 45 dias
improrrogáveis.
Após devidamente citado, o Sr. Aluizio Carlos Correa tempestivamente fez juntar
aos autos sua manifestação de defesa (fls. 1321/1338, com documentação de
suporte às fls. 1339/1343).
Na forma regimental, os autos foram encaminhados ao Núcleo de Estudos
Técnicos e Análises Conclusivas (NEC), que se manifestou elaborando a
Instrução Técnica Conclusiva – ITC Nº 1887/2013 (fls. 1348/1423), com a
proposta cujos termos ora reproduzo:
“3.2.1. Converter, preliminarmente, os presentes autos em tomada de contas
especial em face da existência de dano ao erário, presentificado nos itens 3.1.1,
3.1.3 e 3.1.5, nos montantes de R$52.780,00 (cinquenta e dois mil, setecentos e
oitenta reais), equivalente a 29.139,29 VRTEs, R$64.348,42 (sessenta e quatro mil
trezentos e quarenta e oito reais e quarenta e dois centavos), equivalente a
35.526,10 VRTEs e R$267.503,55 (duzentos e sessenta e sete mil quinhentos e
três reais e cinquenta e cinco centavos), correspondente a 147.685,94 VRTEs,
1
respectivamente, na forma do artigo 57, inciso IV , da Lei Complementar 621/2012,
ressaltando que o responsável já foi devidamente citado quanto à possibilidade de
ressarcimento, nos moldes do artigo 162 da Resolução TCE182/2002 e Termos de
Citação 619/2009, fl. 1318;
1
Artigo 57 Na fase de instrução, havendo indícios de irregularidade, cabe ao Tribunal de Contas
ou ao Relator:
(...)
IV – converter, se for o caso, o processo em tomadas de contas especial, se configurada a
ocorrência de desfalque, desvio de bens ou outra irregularidade de que resulte dano ao erário.
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3.2.2 Acolher as razões de justificativas relativas aos itens 2.2, 2.7 e 2.15 desta
Instrução Técnica Conclusiva, excluindo a responsabilidade do Sr. Aluízio Carlos
Correa no tocante aos mesmos;
3.2.3 Julgar irregulares as contas do Sr. Aluízio Carlos Correa – Prefeito Municipal
de Presidente Kennedy no exercício de 2008, pela prática de ato ilegal
presentificado nos itens 3.1.1, 3.1.2, 3.1.4, 3.1.6, 3.1.7, 3.1.8, 3.1.9. 3.1.10, 3.1.11,
3.1.12, 3.1.13, 3.1.14 e 3.1.15 e pelo cometimento de infração que causou dano
injustificado ao erário disposto nos itens 3.1.1, 3.1.3 e 3.1.5, condenando-o ao
ressarcimento com amparo no artigo 842, inciso III, alíneas “c”, “d” e “e” da Lei
Complementar 621/2012 no montante de R$ 384.631,97 (212.351,33 VRTE), assim
discriminado:

R$ 52.780,00 (cinquenta e dois mil, setecentos e oitenta reais), equivalente
a 29.139,29 VRTE, relativos ao item 3.1.1;

R$ 64.348,42 (sessenta e quatro mil trezentos e quarenta e oito reais e
quarenta e dois centavos), equivalente a 35.526,10 VRTE, relativos ao item
3.1.3;

R$ 267.503,55 (duzentos e sessenta e sete mil quinhentos e três reais e
cinquenta e cinco centavos), correspondente a 147.685,94 VRTE, relativos
ao item 3.1.5.
3.2.4 Aplicar multa individual ao Sr. Aluízio Carlos Correa com amparo no artigo
62 da LC 32/93 e na forma do art. 96, inciso II, da Lei Complementar Estadual nº
2
Art. 84. As contas serão julgadas:
I - regulares, quando expressarem, de forma clara e objetiva, a exatidão dos
demonstrativos contábeis e a legalidade, a legitimidade, a economicidade, a
efetividade e a razoabilidade dos atos de gestão do responsável;
II - regulares com ressalva, quando evidenciarem impropriedade ou qualquer
outra falta de natureza formal, que não seja de natureza grave e que não
represente dano injustificado ao erário;
III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
a) omissão do dever de prestar contas;
b) não comprovação da regular aplicação de recursos repassados pelo Estado
ou Município;
c) prática de ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico;
d) grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira,
orçamentária, operacional ou patrimonial;
e) dano injustificado ao erário, decorrente de ato de gestão ilegítimo ou
antieconômico;
f) desfalque ou desvio de dinheiro, bens ou valores públicos.
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32/93, por ser tratar de pretensão punitiva e ser esta a legislação aplicável à época
dos fatos apurados;
3.2.5 Recomendar, com base no inciso XXXVI3, do artigo 1º, da Lei Complementar
621/2012, ao atual Prefeito Municipal de Presidente Kennedy, que regularize o
registro do imóvel localizado no perímetro urbano com área de terra medindo
281,14 m2, situado na localidade de Marobá, desapropriado no exercício de 2008,
mediante a lavratura da devida escritura pública – item 2.14 desta instrução.
3.2.6 Determinar ao atual Prefeito Municipal de Presidente Kennedy que realize
concurso público para preenchimento dos cargos que constituem a missão
institucional do órgão, e que não realize contratações para atender à
necessidade rotineira do ente com base na Lei Municipal nº 307, de 01/07/1991,
tendo em vista que a mesma autoriza apenas a contratação temporária para
atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.”
Instado a se manifestar, o Ministério Público Especial de Contas encampou na
totalidade os termos da ITC 1887/2013, conforme se depreende do Parecer –
PPJC 2306/2014 (fls. 1427/1430), da lavra do Em. Procurador Heron Carlos
Gomes de Oliveira.
É o relatório. Passo ao voto.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Examinando os autos, verifico que o mesmo se encontra devidamente instruído,
portanto, apto a um julgamento de mérito, eis que observados todos os trâmites
legais e regimentais.
3
Art. 1º Ao Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, órgão de controle
externo do Estado e dos Municípios, nos termos da Constituição Federal e
Estadual e na forma estabelecida nesta Lei Complementar, compete:
[...]
XXXVI - expedir recomendações para a correção de impropriedades verificadas no exercício do
controle externo;
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Contudo, ante a documentação conduzida aos autos, com as manifestações da
Área Técnica e do Ministério Público Especial de Contas, tornam-se necessárias
algumas considerações, com o enfrentamento das matérias suscitadas, no
intuito de fornecer ao Plenário desta Corte de Contas, plenas condições de
julgamento do presente processo.
Para tanto, faço a análise dos tópicos, separando-os conforme a natureza da
irregularidade, e, notadamente, pelo acompanhamento ou não do entendimento
vertido na ITC Nº 1887/2013 (fls. 1348/1423):
II.1) DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E AUSÊNCIA DE GRAVE
INFRAÇÃO E INJUSTIFICADO DANO AO ERÁRIO OU DE DESFALQUE:
A área técnica desta Corte de Contas citou apenas o prefeito, Sr. Aluizio
Carlos Correa, pela prática de ato ilegal presentificado nos itens 3.1.1, 3.1.2,
3.1.4, 3.1.6, 3.1.7, 3.1.8, 3.1.9. 3.1.10, 3.1.11, 3.1.12, 3.1.13, 3.1.14 e 3.1.15
da ITC Nº 1887/2013 e pelo cometimento de infração que causou dano
injustificado ao erário, disposta nos itens 3.1.1, 3.1.3 e 3.1.5 da mesma ITC,
condenando-o ao ressarcimento.
O responsável apontado, por sua vez, destaca a necessidade de citação de
outros agentes públicos responsáveis, tendo em vista a impossibilidade de
responsabilização exclusiva do Chefe do Executivo e necessidade de
individualização das condutas, em ofensa ao art. 5º, XLVI, e art. 71, II da
Constituição Federal c/c art. 4º, inc. I da Lei Complementar 32/93.
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Lado outro, alega que foram apontadas apenas impropriedades de natureza
formal, que não são de natureza grave e que não representam injustificado dano
ao erário, conforme dispõe o inc. II do art. 57 da LC 32, que se mostram
insuficientes para que o julgamento dos atos em tela sejam pela sua
irregularidade.
VOTO:
Na realidade, nos idos de 2007, época ainda posterior ao do processo TC
1785/2001, citado como precedente pelo responsável, os indícios de
irregularidade eram apurados por este Tribunal apenas sob a responsabilidade
do Ordenador de Despesas, deixando de incluir os demais responsáveis,
conforme determinava a Lei Orgânica deste Tribunal à época e como dispõem
as Constituições Federal e Estadual.
No entanto, nas auditorias relativas ao exercício de 2008, como a hipótese
vertida nestes autos, esta Corte de Contas já teria adotado a matriz de
responsabilidade, individualizando as condutas de todos que dessem causa às
inconsistências verificadas.
Há de se ressaltar que nos tópicos abaixo as falhas identificadas se referem em
geral a processos licitatórios – fase interna e externa, bem como de
inexigibilidade de licitação, cujas atribuições em seu trâmite são afetas aos
membros da Comissão Permanente de Licitação (CPL), passando, por último,
pelo crivo do parecerista jurídico para análise da regularidade do certame, para
somente neste momento ser adjudicado e homologado pelo Ordenador.
Por outro turno, identifico na tese da defesa o entendimento por mim exposto em
outras ocasiões, nas quais firmo a posição de que um prefeito, além das
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atribuições políticas-gerenciais, desempenha também tarefas de índole
administrativa, o que inviabilizaria a abrangência de uma conduta de forma
onipotente, eis que não caberia ao Prefeito a tudo se encarregar.
Neste contexto, merece destaque a posição que adotei em outros votos, nos
quais consolidei o entendimento sobre a matéria – responsabilidade subjetiva
e individualização da pena, senão vejamos:
A formação da vontade da Administração depende da atuação de vários
agentes, integrantes de um ou diferentes órgãos estatais. Essa atuação é feita
por meio do processo administrativo, que é um conjunto de atos jurídicos,
inclusive atos particulares, necessários à manifestação da vontade estatal. Tais
atos, via de regra, não são praticados por um único agente, mas por vários
agentes que atuam numa cadeia, numa relação de interdependência.
Portanto, uma decisão administrativa não depende, majoritariamente, da
vontade única e exclusiva de um agente público. Pelo contrário, as inúmeras
decisões da Administração Pública, ainda que tenham o ato final expedido por
um único agente, dependem do trabalho conjunto de inúmeros agentes que
atuam por meio de um processo administrativo.4
Para Hely Lopes Meirelles5, o procedimento administrativo é a sucessão
ordenada de operações que propiciam a formação de um ato final
objetivado pela Administração. É o iter legal a ser percorrido pelos agentes
públicos para a obtenção dos efeitos regulares de um ato administrativo
principal.
4
5
ARÊDES, Sirlene. Responsabilização do Agente Público. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 138.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 38ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 164,165.
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O procedimento administrativo constitui-se de atos intermediários,
preparatórios e autônomos, mas sempre interligados, que se conjugam
para dar conteúdo e forma ao ato principal e final colimado pelo Poder
Público. As operações intermediárias, à medida que se realizam sem oposição
dos interessados, tornam-se definitivas para a Administração e para o
administrado.
Para ele, um exemplo de procedimento administrativo típico é o da concorrência,
visto que à adjudicação da obra ou serviço ao melhor proponente (objetivo da
Administração) precedem operações intermediárias (atos procedimentais: edital,
verificação de idoneidade, julgamento) necessárias à adjudicação (ato final).
Nessa esteira, a Administração Pública realiza sua função executiva por meio de
atos jurídicos que recebem a denominação especial de atos administrativos,
onde o ato principal é o que encerra a manifestação de vontade final da
Administração e o ato intermediário ou preparatório é o que concorre para
a formação de um ato principal e final.
Consoante expõe Celso Antônio Bandeira de Mello, os atos que compõem um
determinado processo detêm as características de autonomia, unidade de
efeitos jurídicos e relação de causalidade. A autonomia implica a existência
individual de cada ato, de forma que cada ato integrante de um processo
administrativo deve conter todos os elementos do ato administrativo, a fim de
produzir um efeito específico e que é essencial para a decisão administrativa. A
unidade de efeitos decorre exatamente do fato de que, embora cada ato seja
manifestado com uma finalidade específica, todos os atos de um processo têm
em vista uma única manifestação de vontade da Administração. A última
característica é a relação de causalidade. À medida que cada ato é
pressuposto e causa do sucessor, se os atos não forem praticados na
sequência lógica, todos serão viciados, pois tal vício, em um procedimento,
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rompe com a cadeia causal a partir da prática do ato que não teve relação de
efeito do anterior.6
Por isso, a professora Sirlene Arêdes, na obra Responsabilização do Agente
Público, defende “que não se pode exigir do superior o extremo controle de
todos os atos praticados por todos os agentes subordinados, até porque, se ele
puder controlar detalhadamente, o que implica analisar detidamente todos os
elementos dos atos expedidos pelos subalternos, então, não há necessidade de
um número expressivo de agentes. O superior tem atribuições próprias e
reponde por elas. Da mesma forma, o inferior responde pelos atos
praticados ou omitidos dentro de sua esfera de competência. O superior
somente pode ser responsabilizado por atos que se inserem na competência do
subalterno, quando ficar provado que o superior contribuiu para a prática do ato
ilícito”.7
Sobre o mesmo tema, assim se pronunciou o STJ no julgamento do Recurso
Especial Nº 827.445 - SP (2006/0058922-3), em voto-vista da MINISTRO TEORI
ALBINO ZAVASCKI:
(...)
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE. LEI 8.429/92. ELEMENTO
SUBJETIVO DA CONDUTA. IMPRESCINDIBILIDADE.
(...)
3. É razoável presumir vício de conduta do agente público que pratica um ato
contrário ao que foi recomendado pelos órgãos técnicos, por pareceres
jurídicos ou pelo Tribunal de Contas. Mas não é razoável que se reconheça
ou presuma esse vício justamente na conduta oposta: de ter agido segundo
aquelas manifestações, ou de não ter promovido a revisão de atos praticados
como nelas recomendado, ainda mais se não há dúvida quanto à lisura dos
pareceres ou à idoneidade de quem os prolatou. Nesses casos, não tendo
havido conduta movida por imprudência, imperícia ou negligência, não há
culpa e muito menos improbidade. A ilegitimidade do ato, se houver, estará
sujeita a sanção de outra natureza, estranha ao âmbito da ação de
improbidade.
(...)
6
7
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 14ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 435)
ARÊDES, Sirlene. Responsabilização do Agente Público. Belo Horizonte: Fórum, 2012, ps. 140 e 141.
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Por vezes, na busca de imprimir maior celeridade ao julgamento, define-se a
responsabilidade por critérios objetivos, como por exemplo, ser o agente
detentor da carga patrimonial ou gestor do contrato.
Há muito tempo não se cogita, no âmbito dos tribunais, a imputação de
responsabilidade
objetiva.
Sempre
a
condenação
terá
por
causa
a
responsabilidade subjetiva dos agentes. Por isso, é necessário demonstrar o
dolo ou culpa, pelo menos no sentido lato, para justificar a imputação de débito
ou multa.8
A jurisprudência do STJ, por exemplo, rechaça a responsabilidade objetiva
na aplicação da Lei 8.429/1992, exigindo a presença de dolo nos casos dos arts.
9º e 11 – que coíbem o enriquecimento ilícito e o atentado aos princípios
administrativos, respectivamente – e ao menos de culpa nos termos do art. 10,
que censura os atos de improbidade por dano ao Erário. (RECURSO ESPECIAL
No 414.697 - RO - 2002/0016729-5, Relator MINISTRO HERMAN BENJAMIN)
Neste contexto, não se pode exigir que autoridade máxima de um Órgão
examine todos os atos praticados pelos seus subordinados e antecessores, em
homenagem ao princípio da segregação de funções, sobretudo, quando existe
responsabilidade direta de outros agentes públicos.
Nessa linha, ao expedir um ato, devem ser verificados pelos agentes superiores
se os atos anteriores possuem os elementos formais, mas é impossível exigirlhes que praticamente refaça-os todos, pois o agente, do ponto de vista da
Administração Pública, deve partir do pressuposto de que os atos de seus
antecessores que chegam para sua ratificação estão corretos.
8
JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Tribunal de Contas do Brasil: jurisdição e competência. 3.ed. rev. atual. e ampl.
Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 737.
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Desta forma, não vislumbro nas hipóteses em questão a caracterização do nexo
de causalidade da irregularidade com a atuação da agente apontado como
responsável, e, tendo em vista que esse aspecto subjetivo se mostra
determinante para a aferição da culpabilidade e da sanção a ser aplicada,
entendo prejudicada a responsabilização do agente nas irregularidades ora
apontadas.
Considerando, ainda, que não houve à época da instrução processual o
chamamento aos autos dos demais agentes possivelmente envolvidos, e, por
derradeiro, considerando que a sanção deve ser aplicada na medida da
culpabilidade do agente, ou seja, a responsabilidade deve ser individualizada, o
que não ocorreu nos presentes autos, entendo que a ação punitiva por parte
deste Tribunal está nesse momento prejudicada.
Nessa linha de entendimento ganha relevo a culpabilidade, que é
importante não apenas para determinar a existência da infração, uma vez
que, sem ela, a infração inexiste, mas também para determinar a
penalidade a ser aplicada. De fato, a penalidade deve ser proporcional à
culpabilidade, ou seja, deve ser proporcional ao juízo de reprovação que se faz
sobre a conduta contrária à norma.
A sanção punitiva visa a alterar o comportamento do agente, de forma que
somente pode ser aplicada àquele que atuou contrariamente à norma, sendo os
aspectos subjetivos do tipo e da culpabilidade, bem como as demais
circunstâncias legais, mecanismos de aferição do quantum de pena deve ser
aplicado. E não só. Todos quantos atuaram contrariamente à norma devem
ser responsabilizados na medida de sua culpabilidade, não podendo o
Estado eleger um ou outro para responder pelo ilícito.
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A sanção deve ser aplicada na medida da culpabilidade. A individualização da
pena é pressuposto básico do direito sancionador e limite constitucional imposto
ao Estado, no exercício de sua atividade punitiva (CR/88, art. 5º, XLVI).
No âmbito deste Tribunal de Contas, é de relevo registrar que a individualização
da sanção decorre não só da aplicação do princípio da culpabilidade como do
próprio texto legal. O artigo 57, inciso I da Lei Complementar 621/2012 define
claramente na fase instrutória, no primeiro contato deste órgão de controle com
os indícios de irregularidade que “cabe ao Tribunal de Contas ou ao Relator
definir a responsabilidade individual ou solidária pelo ato impugnado, inclusive
do terceiro que, como contratante ou parte interessada, haja concorrido para o
dano”.
O diploma legal supracitado estabelece que no dever de prestar contas o
ordenador de despesa e o dirigente de entidade, por ação direta, conivência,
negligência ou omissão, são responsáveis solidários por prejuízos causados ao
erário ou a terceiros, por agente subordinado, em área de sua competência, nos
limites da responsabilidade a ser fixada pelo Tribunal de Contas (artigo 81,
§ 1º).
As sanções previstas serão aplicadas de forma individual, a cada agente
que tiver concorrido para o fato irregular, onde a decisão que determinar a
aplicação de multa definirá as responsabilidades individuais (artigos 131 e 132).
Cabe salientar que a individualização da sanção está prevista também no
próprio texto regimental, que dispõe, em seu art. 383, que “a sanção será
aplicada, de forma individual, a cada agente que tiver concorrido para o ato, na
medida de sua participação”, combinado com o art. 384, que estabelece que “a
decisão que determinar a aplicação de multa definirá as responsabilidades
individuais”.
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Nessa esteira, na fixação da multa torna-se imperativo o enfrentamento, pelo
Relator, das circunstâncias normativas do art. 388 do RITCEES, a saber:

o grau de reprovabilidade da conduta do agente;

a gravidade da falta;

potencial de lesividade do ato para a Administração Pública.
Por todo o exposto, no caso concreto, concluo que diante da ausência da
matriz de responsabilidade na instrução processual, resta prejudicada a
missão deste Relator em permear as circunstâncias acima, fixar o quantum
sancionatório adequado, dentro dos limites mínimo e máximo previstos na
LC 621 c/c o RITCEES, o que ensejará a correta dosimetria da penalidade e,
por conseguinte, a observância do princípio da individualização da pena
como corolário do princípio da culpabilidade.
Dessa forma:
Considerando que NÃO VISLUMBRO nas irregularidades encontradas,
segundo critérios de relevância, risco e materialidade (NAGs – 4106, 4106.1,
4106.2 e 4106.3), justificativas suficientes para refazer a instrução processual,
de forma individualizada, como preconizam as regras constitucionais, legais e
regimentais acima apresentadas;
Considerando os precedentes nos Processos TC nº 1989/2010 (Acórdão
232/2013), 5928/09 (Acórdão 304/13), 167/12 (Acórdão 231/13), 7384/12
(Acórdão
161/13),
nos
quais
proferi
voto,
no
sentido
de
afastar
a
responsabilidade dos gestores, em situações em que sequer foram citados os
demais agentes para responder por suas ações/omissões, recaindo apenas para
os Ordenadores tal responsabilidade, como no caso concreto, tendo em vista
doutrina balizada sobre responsabilidade subjetiva, culpabilidade e erro
escusável, da forma acima explicitada;
Considerando o princípio da duração razoável do processo insculpido no
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inciso LXXVII da Carta Magna;
Considerando os princípios básicos que regem as Normas de Auditoria
Governamental – NAGs, notadamente, as que se referem aos conceitos de
priorização de auditorias (NAGs - 4205), deixo de determinar o refazimento da
matriz de responsabilidade.
Nesse sentido, acato a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela
defesa,
afastando
a
responsabilidade
do
prefeito
nas
seguintes
irregularidades:
ITEM 2.1 da ITC - Ausência de plano de trabalho e omissão no dever de
cobrar a prestação de contas
Infringência: Artigo 116, § 1º, Inciso I a VI, da Lei nº 8.666/93 e Parágrafo
único do artigo 70 da Constituição Estadual
ITEM 2.5 da ITC - Ausência de licitação – aditivo firmado com a empresa
M.G. de Oliveira Milhorato Ltda.
Infringência: Inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal c/c artigo 2º da
Lei 8.666/93
ITEM 2.8 da ITC - Inobservância ao Princípio da Publicidade
Infringência: Lei 8.666/93 – caput do Artigo 3º c/c Artigo 21
ITEM 2.9 da ITC -- Inobservância ao limite da modalidade licitatória
Infringência: Art. 23, inciso I, da Lei 8.666/93
Em relação à alegada inconsistência no julgamento pela irregularidade dos atos
de gestão da Prefeitura Municipal de Presidente Kennedy, exercício de 2008, em
decorrência da ausência de graves infrações à norma legal e dano injustificado
ao erário, merece destaque os itens que, embora possam finalizar com
afastamento do ressarcimento, mantêm-se como graves infrações à norma legal
ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou
patrimonial infringida, tais como:
Item 2.4 da ITC - Ausência de motivação e de liquidação em contratação
de assessoria jurídica
Base Legal: arts. 62 e 63 da Lei 4.320/64 c/c art. 5º da Lei Municipal 688/06
Ressarcimento: passível de devolução ao erário municipal o valor de R$
64.348,42 (sessenta e quatro mil trezentos e quarenta e oito reais e quarenta
e dois centavos), equivalente a 35.526,10 VRTE9.
9
1 VRTE (2008) = 1,8113
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Assim, tendo em vista que o indício de irregularidade acima apontado importa
em infração que enseja dano ao erário, não há como acatar os argumentos da
defesa quanto à inconsistência no julgamento pela irregularidade.
Neste contexto, em consonância com a área técnica, entendo pela
improcedência da preliminar sob análise.
II.2) DO MÉRITO:
Na linha da preliminar de ilegitimidade passiva arguida, passo a análise dos
tópicos em separado, notadamente, daqueles que em decorrência da natureza
da irregularidade se configuram conduta não típica de chefe de executivo
municipal, ainda que não exista na documentação encartada nos autos a
evidenciação da participação de outras pessoas físicas ou jurídicas:
ITEM 2.1 da ITC - Ausência de plano de trabalho e omissão no dever de
cobrar a prestação de contas
Infringência: Artigo 116, § 1º, Inciso I a VI, da Lei nº 8.666/93 e Parágrafo único do artigo 70 da
Constituição Estadual
A auditoria apontou que o objeto do contrato nº 29/2008, firmado pela prefeitura
com
a
Federação
Capixaba
de
Motociclismo
não
representa
uma
contraprestação de serviço, mas sim a realização de um objetivo comum: a
prática desportiva e de lazer, interesse e obrigação constitucional do município e
função da citada entidade.
Nesse sentido, como os interesses seriam convergentes, a equipe entendeu que
o ajuste firmado deveria ter a forma de convênio e não de contrato.
Assim sendo, alegam os auditores que no contrato firmado não constam as
exigências dispostas no artigo 116, § 1º, Incisos I a VI, da Lei nº 8.666/93 quais
sejam: a prévia aprovação de um plano de trabalho da entidade interessada,
contendo no mínimo: identificação do objeto a ser executado, metas a serem
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jm/
atingidas, etapas ou fases de execução, plano de aplicação dos recursos
financeiros, cronograma de desembolso e previsão do início e fim da execução
do objeto.
Ademais, como foi realizado um contrato, não foi exigida a prestação de contas,
obrigada no convênio, para demonstrar a aplicação do recurso investido nos fins
previstos no plano de trabalho.
A
defesa
alega
que
convênio
e
contrato
são
conceitos
jurídicos
indeterminados, pois o mesmo tipo de serviço quando contratado com
entidade particular deve ser firmado através de contrato e quando contratado
com entidade pública deve ser firmado através de convênio.
Alega que não se cuidou da prestação de contas com a formalidade que
espera a Equipe de Auditoria, vez que se trata de um fato notório que,
segundo o Código de Processo Civil brasileiro (art. 334, I), independe de
prova.
Afirma que uma simples pesquisa pelo site Google (http://www.google.com.br)
com a expressão "II Campeonato Estadual de Supercross Presidente
Kennedy" permite um vasto resultado de revistas especializadas em
motocross em que destacam o evento cuja realização apresentou duvidosa
para a Equipe de Auditoria desta Corte de Contas, inclusive cita algumas
reportagens:
A 2ª etapa do Campeonato Capixaba Unificado de Motocross e Supercross
2009 foi realizada domingo passado, 22 de fevereiro, em Marobá,
Presidente Kennedy, no litoral sul do estado do Espírito Santo.
Como nos últimos anos, esta prova é sempre no domingo de
Carnaval e conta com a presença de muitos pilotos de estados
vizinhos, entre eles Swian Zanoni, Gabriel Montenegro, Tiago
Brinati, Rodrigo Donadio e Daniel "Federal" Peçanha.
Swian Zanoni, vice-campeão brasileiro de 2008, acaba de assinar
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
contrato com a Equipe Honda e estreou suas novas motos CRF250
CRF450 2009 em Marobá. Com a nova equipe o piloto mineiro
apontado como sério candidato aos títulos do motocross, arenacross
supercross 2009.
(Sites:
http://mxracing.com.br/novo_mostra_noticia.php?id=4061&secao=260
http://www.rh42.com.br/index.php?subject=noticia631.htm )
e
é
e
e
VOTO:
Verifico pela documentação encartada às fls. 233/240 que a Federação
Capixaba de Motociclismo apresenta, ao solicitar o apoio financeiro para
patrocinar o evento – 2ª Etapa do Campeonato Capixaba de Motocross, a
motivação, a planilha de custos, além da relação dos equipamentos e
materiais necessários à realização do evento.
Em relação à prestação de contas, verifico que as duas parcelas repassadas,
no valor de R$22.000,00 e R$30.780,00, tiveram respaldo nos Recibos nºs.
10 e 11/2008, respectivamente acostados às fls. 251/252 e 256/258, cópias
dos cheques encartados às fls. 253 e 259, bem como nas Ordens de
Pagamento às fls. 254 e 261, nas quais contam, inclusive, o histórico do
objeto contratado.
Assim, ainda que o instrumento utilizado não tenha sido o correto, verifico no
caso concreto que os elementos presentes em um plano de trabalho foram
supridos, de maneira geral, com a planilha de custos e a relação dos
equipamentos e materiais necessários à realização do evento apresentadas
pela Federação Capixaba de Motociclismo.
Além disto, verifico que tal inadequação na formalização da referida despesa
de patrocínio não ocasionou prejuízo ao evento patrocinado, muito menos
inviabilizou a prestação de contas, sobretudo porque o evento foi público, de
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
fácil constatação, ante as notícias de sua realização que evidenciam que o
mesmo foi realizado.
Lado outro, depreende-se dos autos que a participação do prefeito apontado
como responsável foi somente de homologar a inexigibilidade de licitação (fls.
240), além de assinar o contrato (fls. 229/230), baseado em fundamentado
Parecer jurídico (fls. 237/239), o que denota a indevida aplicação da
responsabilidade objetiva, procedimento já afastado no âmbito deste Tribunal.
Neste contexto, entendo que persiste razão ao defendente, tendo em vista a
ausência de nexo de causalidade entre a conduta do prefeito e a
irregularidade ora apontada, razão pela qual afasto sua responsabilidade.
Ademais, considerando que a falha se mostra de cunho formal, que não
acarretou qualquer prejuízo na realização das despesas, deixo de refazer a
matriz de responsabilidade, com chamamento de outros agentes públicos
eventualmente envolvidos.
ITEM 2.2 da ITC - Omissão no dever de cobrar a regular prestação de
contas
Infringência: parágrafo único do artigo 70 da Constituição Estadual/1989 e artigo 10, § 2º, Inciso
V, da Lei 9.790/1999 c/c artigo 12, incisos I, II e IV, do Decreto nº 3.100/1999
Importa salientar as razões e justificativas apresentadas pela defesa para afastar
a irregularidade apontada neste tópico, cujos termos acompanho, pelos seus
próprios fundamentos de fato e de direito, conforme trecho extraído da peça
conclusiva que passo a reproduzir:
“(...) é mister considerar que a instituição do Termo de Parceria não revogou
o instituto do convênio no ordenamento jurídico pátrio. Conforme registrou a
própria equipe técnica, esta não encontrou impedimento para celebração de
convênio entre o Município de Presidente Kennedy e a Pro-Vitae.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Mesmo no âmbito federal, a celebração de convênio não é regulada pela Lei
9790/99 e pelo seu Decreto Regulamentador 3100/99. Na verdade, o
instrumento do convênio deve ser celebrado nos termos previstos no art. 116
da Lei 8666/93.
Ressalta-se que a inconsistência apontada em auditoria não versa sobre
ausência de prestação de contas. A própria Equipe registrou que analisou a
prestação de contas apresentadas pela PRO VITAE e anexou aos autos
cópias da mesma (fls. 293/436). Apenas entendeu como irregular o fato de tal
prestação de contas não ter sido realizada nos moldes previstos na Lei
Federal 9.790/1999 e no Decreto 3.100/1999, como, por exemplo, incluindo o
relatório comparativo específico das metas propostas com os resultados
alcançados.
Tendo em vista que não era exigível a apresentação dos documentos nos
moldes previstos na Lei Federal 9.790/1999 e no artigo 12 do Decreto
3100/99, tem-se por regular o procedimento, e, consequentemente,
afastada a hipótese de imputação de débito.”
ITEM 2.3 da ITC - Contratação sem concurso público
Infringência: inciso II do artigo 37 da Constituição Federal
Convite nº: 01/2008
Objeto: Prestação de serviços de assessoria para a Secretaria de Planejamento.
Contrato nº:18/2008
Valor: R$78.600,00
Contratado:
Veloso & Cardoso Consultoria e Assessoria Econômica e Financeira
Convite nº: 05/2008
Objeto: Contratação de serviço de assessoria Técnica, para atender à Secretaria de Municipal de
Educação, no período de fevereiro a Dezembro/2008.
Contrato nº 39/2008
Valor: R$76.150,00
Contratado: ASSISTEM – Assessoria, Auditoria e Consultoria Técnica Ltda.
Convite nº: 06/2008
Objeto: Contratação de assessoria Técnica e contábil para atender ao Setor Contábil da
Prefeitura, no período de fevereiro a Dezembro/2008.
Contrato nº: 49/2008
Valor: R$79.200,00
Contratado: Assessoria Farias
Convite nº: 07/2008
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jm/
Objeto: Contratação de serviço de advocacia, incluindo ações trabalhistas, para atender à
Prefeitura, no período de fevereiro a Dezembro/2008.
Contrato nº: 48/2008
Valor: R$79.904,00
Contratado: Constâncio Borges Brandão
Da análise dos objetos das contratações acima explicitadas, a equipe de
auditoria constatou que os mesmos se referem a serviços de natureza
permanente e contínua, típico de servidor público efetivo, caracterizando a
necessidade de contratação mediante concurso público, na forma do artigo 37,
inciso II da Constituição Federal.
A defesa registra que o que foi terceirizado foi uma "atividade-meio" da
Administração Municipal, e não uma "atividade-fim", pois, entende que não é
papel do Estado prestar serviço contábil, jurídico ou de direito financeiro ao
munícipe. Ao Estado compete prestar serviço público de saúde, educação,
segurança, assistência — essa é atividade-fim do Estado.
Aduz que, como mais do que repisado junto a este Egrégio Tribunal de
Contas, bem como em todos os Tribunais do país (Tribunais de Contas ou
Judiciários), o modus operandi da Administração Pública fica a cargo do
Administrador, naquilo que se institucionalizou como poder discricionário.
De modo diverso da defesa a área técnica concluiu que as atividades-meio
consideradas pelo Decreto Federal nº 2.271/97, se encerram na
conservação, limpeza, segurança, vigilância dos prédios e bens do ente
público, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia,
telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações.
.
Lado outro, afirmam que são atividades-fim aquelas inerentes às
categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão, que
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jm/
constituam a missão institucional do órgão ou entidade, ou que impliquem
limitação do exercício dos direitos individuais em benefício do interesse
público, exercício do poder de polícia, ou manifestação de vontade do
Estado pela emanação de atos administrativos.
Portanto, inferem que são correspondentes às atividades-fim, atos
jurídicos ou de império, que consubstanciam manifestação do poder
estatal, sob inafastável regime jurídico administrativo, razão pela qual
mantiveram a irregularidade das contratações.
VOTO:
As contratações sob análise visavam assessoria na execução contábil
financeira do ente, a representação judicial do Município, especialmente
em ações trabalhistas, o controle da execução da receita e despesa,
acompanhamento das leis orçamentárias, etc.
Verifico que a matéria em tela decorrente de contratações de terceiros
para prestar serviços de assessorias diversas, com a consequente
ausência de Concurso Público, foi matéria já devidamente discutida por
esta Corte no processo TC 2524/2010, que tratou do Relatório de
Auditoria da Prefeitura de Marechal Floriano, referente ao exercício 2009.
Na ocasião, defendi a tese no voto-vista que submeti a este Plenário, que de
maneira geral se respaldou nos princípios da eficiência, razoabilidade e
economicidade, cujos trechos destaco:
“O CONCEITO DE TERCEIRIZAÇÃO
A ideia central da terceirização, genericamente, reside na transferência de
algumas atribuições a terceiros. A própria expressão “terceirização” tem sua
origem definida em uma palavra já existente na língua portuguesa: terceiro
compreendido como intermediário.
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jm/
Na visão de José dos Santos Carvalho Filho, citado por Cristiana Fortini in
10
Terceirização na Administração , ed. Fórum, a terceirização no âmbito
empresarial e do trabalho, significa o fato de a direção de uma empresa
transferir a outra algumas atribuições de seu interesse direto. Quando a
empresa se utiliza desse procedimento, diz-se que se socorreu do processo
de terceirização.
Para esse estudioso, o problema que envolve a terceirização é o que diz
respeito à natureza das funções terceirizadas, pois muitas são as atribuições
inerentes à determinada pessoa jurídica. Algumas delas, porém, integram seu
núcleo fundamental, vale dizer representam as atribuições básicas, assim
consideradas aquelas para as quais a pessoa foi instituída. Tais misteres é
que, em última instância, mobilizaram sua criação. Ao mesmo tempo em que
lhe constituem a causa, servem-lhe também como objeto. Sem tais
finalidades, a própria pessoa se esvaziaria: são, pois, atividades-fim.
Outras atribuições, contudo, a despeito de serem importantes para a busca
das metas alvitradas, não integram o núcleo fundamental da entidade. Sua
característica é a de serem atividades-meio, ou seja, aquelas que traduzem
os instrumentos de apoio necessários à consecução dos objetivos. Cuida-se
de típicas atividades de apoio, sobre as quais a empresa vai consolidando
seus passos com os olhos voltados para as metas que estabeleceu.
TERCEIRIZAÇÃO NO SERVIÇO PÚBLICO E O DEVER DE EFICIÊNCIA
CONCEITO E DOUTRINA:
O Decreto-Lei nº 200/67 apresentou-se como um marco fundamental a
autorizar a Administração Pública Federal brasileira a recorrer à terceirização
como forma de descentralização da máquina administrativa.
O art. 10 prevê a descentralização das atividades da Administração mediante
contratos ou concessões (art. 10, § 1º, c) e, a seguir, no § 7º, se lê: “Para
melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação,
supervisão e controle e com o objetivo de impedir o crescimento
desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará
desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo,
sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que
exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a
desempenhar os encargos de execução”.
É importante salientar que o art. 175 da CRFB/88 estabeleceu a faculdade da
Administração Pública prestar serviços através de terceiros, mediante
concessão ou permissão. Segundo o Prof. Flávio Amaral Garcia, a Carta
Maior não abordou o instituto da terceirização, não tratou do tema, não se
identificando em nenhum dos seus dispositivos qualquer limite para as
11
terceirizações envolvendo a natureza da atividade – se meio ou fim.
Nesse passo, vale destacar o estudo realizado pelo Tribunal de Contas da
União, quando da apreciação das contas do Governo da República, conforme
Ata TCU nº 19, de 11.06.2002, Plenário, DOU, 29 de julho de 2002 em que o
10
FORTINI, Cristiana. Terceirização na Administração. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 49.
GARCIA, Flávio Amaral. A Relatividade da Distinção Atividade-Fim e Atividade-Meio na Terceirização Aplicada à
Administração Pública. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado. Número 19. 2009.
11
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Em. Min. Walton Alencar Rodrigues, considerando o relatório das contas do
Governo do ano de 2001, destacou, no âmbito das áreas temáticas, a
extensão do fenômeno da terceirização na Administração Pública, como
resultado da política de redução dos quadros do Estado:
“A Administração Pública vem adotando a terceirização de mão de obra,
especialmente nos últimos anos, como forma de reduzir os quadros do
Estado na realização de suas atividades”.
Relativamente à licitude da terceirização, complementa o relatório afirmando
que: “a princípio, a terceirização dos serviços de uma empresa é licita,
quando se trate de atividades secundárias, compreendendo os serviços que
não constituam sua atividade-fim”.
Consta, ainda, de referida Ata:
“No direito brasileiro, ainda não existe instrumento normativo que discipline,
de forma consolidada, todos os conceitos afetos à terceirização, uma vez que
ela assume, na prática, diversas formas associadas a normas específicas. A
doutrina e a jurisprudência atuam, então, como forma de suplementar a
12
deficiência legal. (TCU – PLENÁRIO/ATA Nº 19/2002, ITEM 5.1.1)”
O Eminente Ministro do TCU arrematou sua conclusão destacando a
necessidade de percorrer as estradas da doutrina e jurisprudência para
chegar ao destino que se deseja, qual seja, o deslinde da questão
“terceirização na Administração Pública”. E é exatamente isso que passo a
fazer neste caso concreto.
Neste mister, destaco o artigo “Serviços terceirizados e responsabilidade do
13
Estado” , de autoria do Em. Des. Jessé Torres Pereira Junior, publicado na
Revista do TCMRJ/2013.
Registrou o estudioso, nesse trabalho, os desafios que caracterizam a
passagem da administração patrimonialista para a de resultados e os
incitamentos que confrontam a eficiência com a legalidade estrita, princípios
de nível estratégico, nos termos do art. 37 da CRF/88 com a redação dada
pela Emenda nº 19/98, concluindo que o dilema se constitui nos seguintes
termos:
“A legalidade condiciona a eficiência ou a eficiência justifica o abrandamento
da legalidade, na busca da satisfação do interesse público? Aplicado à
terceirização o dilema é: rejeitam-se os seus instrumentos, porque podem
fraudar direitos, ainda que propiciem menores preços e assegurem maior
agilidade de gestão, ou estimula-se o seu emprego para a prestação de
serviços à administração, desde que encontrem soluções inteligentes para
prevenir e coibir possíveis desvios?”.
Ainda de acordo com o doutrinador “escolher o caminho da terceirização e
percorrê-lo deve enquadrar-se na moldura da eficiência e eficácia. Não se
trata de optar segundo convicções ou predileções pessoais. É imprescindível
12
VIEIRA, Antonieta Pereira; FURTADO, Madeline Rocha. Gestão de Contratos de Terceirização na Administração Pública. Belo
Horizonte. Editora Fórum, 5ª edição, 2013, p. 30.
13
PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Serviços Terceirizados e responsabilidade do Estado. Revista do
TCM-RJ, nº 54, 2013
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
verificar se, em determinado caso e suas circunstâncias, terceirizar é a
solução que superiormente atende ao interesse público e, sendo, se será de
melhor proveito entregar-lhe a respectiva execução”.
Por fim, resume em quatro as questões centrais da terceirização, conforme
passo a transcrever in verbis:
“(a) na administração pública, a terceirização de serviços somente deve
abranger atividades-meio, inviável a sua extensão às atividades finalísticas
das instituições públicas;
(b) à opção por terceirizar serviços de apoio específicos, definidos por normas
regulamentadoras, deve ser precedida de estudos e análises que levem em
conta os inúmeros fatores e circunstâncias que afetam a eficiência (relação
custo-benefício) e a eficácia (efetiva produção de resultados planejados de
interesse público) da solução;
(c) há responsabilidade subsidiária subjetiva da administração pública que se
omite no dever de fiscalizar o cumprimento, pelo fornecedor de serviços, dos
encargos devidos aos empregados de que faz uso na execução dos serviços
contratados, eventualmente atraente de hipóteses de improbidade
administrativa dos agentes omissos;
(d) os controles internos e externos constituem a primeira linha de verificação
dessa responsabilidade, no âmbito de suas competências constitucionais,
legais e regimentais”.
A par desse contexto, não é desnecessário comentar que a Emenda
Constitucional nº 19/1998 introduziu na Constituição o princípio da eficiência,
impondo, o constituinte derivado, dez anos após a promulgação do texto
original, que a administração pública passasse a atuar não somente pela
correção, mas a partir de então, acrescida de competência.
Penso ser suficiente a doutrina, até aqui exposta. Sigo, então, à apreciação
da jurisprudência que passo, também, a me filiar.
Assim, no caso concreto, tendo em vista a ausência de servidores de carreira na
área de contabilidade daquela Prefeitura, e a considerar a complexidade da
contabilidade pública que exige especialização, a contratação em voga se
mostra razoável a meu ver para suprir tal deficiência, já que se apresenta com a
qualificação necessária para a gestão orçamentária, econômica, financeira e
física do patrimônio daquele Órgão.
Também em relação à contratação de assessoria jurídica, entendo que inexiste
óbice em manter uma estrutura híbrida, como foi defendida no voto acima
explicitado, o que remonta a hipótese vertida nestes autos, pois, a depender da
quantidade e tipo de atividade jurídica a ser desenvolvida (ação contenciosa
e/ou administrativa), é de total coerência as contratações de terceiros ora
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
debatida.
Neste contexto, em dissonância com a área técnica, afasto a irregularidade
deste tópico.
ITEM 2.4 da ITC - Ausência de motivação e de liquidação em contratação de
assessoria jurídica
Infringência: arts. 62 e 63 da Lei 4.320/64 c/c art. 5º da Lei Municipal 688/06
Constatou a auditoria que a Prefeitura Municipal de Presidente Kennedy
contratou o Sr. Constâncio Borges Brandão para prestação de serviços
advocatícios, incluindo ações trabalhistas, no valor de R$79.904,00, sem,
contudo, constar a comprovação dos serviços prestados, em afronta aos artigos
62 e 63 da Lei 4.320/64.
Além disto, ressaltou a equipe técnica que a Prefeitura possui Procuradoria
Municipal, onde se encontram lotados os Procuradores Municipais: Deveite
Alves Porto Neto e Elisa Helena Lesqueves, cujas atribuições, dispostas no art.
5º da Lei Municipal 688/200614,se assemelham ao objeto definido na contratação
em questão.
Neste contexto, entendeu a área técnica pela desnecessidade da despesa,
razão pela qual teria ocasionado dano ao erário, passível de ressarcimento, o
valor de R$64.348,42, equivalente a 35.526,10 VRTE.
14
Art. 5º - Compete ao Procurador do Município:
I – a representação judicial e extrajudicial do Município;
II – promover a cobrança amigável ou judicial da dívida ativa do Município, bem como a cobrança de créditos de qualquer
natureza que lhe pertençam;
III – assistir ao Prefeito Municipal e aos Secretários Municipais, bem como os dirigentes de órgãos dotados de
autonomia, na elaboração de informações em mandato de segurança;
IV – elaborar projetos de lei e atos normativos de competência do Prefeito Municipal, assistindo os Secretários Municipais
e dirigentes de órgãos autônomos no desempenho da competência para expedição de tais atos, que lhe deverão ser
submetidos antes de sua edição;
V – exercer demais funções correlatas com o exercício da advocacia.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
O defendente alega que por se tratar de um serviço executado rotineiramente, e
não de um serviço específico, como a elaboração de um estudo, de um parecer,
hipóteses em que aí sim seria necessária a apresentação de um produto final de
forma a se efetivar o pagamento, entende desnecessário juntar um amontoado
de relatórios fantasiosos (sem a respectiva prestação).
Conclusivamente, a área técnica aduz que o responsável não trouxe qualquer
esclarecimento para a contratação de assessoria jurídica terceirizada quando já
havia profissionais habilitados e legitimados para prestar o serviço contratado,
nem mesmo comprova à regular liquidação da despesa, com a apresentação de
documentos comprobatórios do respectivo crédito, na forma disposta no art. 63
da Lei 4320/64, razão pela qual foi mantida a irregularidade atinente à ausência
de finalidade pública e respectivo ressarcimento no total de R$64.348,42
(35.526,10 VRTE).
VOTO:
Ainda que eu defenda o modelo híbrido de contratação de terceiros, qual seja, a
coexistência de contratados e servidores de carreira para atender a demanda
jurídica do Órgão, conforme tratado no supracitado item 2.3, verifico que a
contratação de serviços de advocacia em questão, segundo seu objeto, incluía
ações trabalhistas, nas quais a participação do contratado poderia ser facilmente
comprovada, seja através de ações ajuizadas e/ou acompanhamento destas
ações extraídas do site do Tribunal respectivo (TRT., TRF, TJ, etc).
No entanto, não logrou êxito ao gestor responsável em documentar os serviços
executados, não comprovando de forma alguma a atuação do contratado.
Da análise da documentação encartada pela auditoria constatei Relatórios de
Pagamento de Autônomos - RPA (fls. 441/461), que demonstram apenas o
recebimento dos valores pagos pela Prefeitura, dando-lhe a devida quitação, no
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
entanto, sem qualquer ateste por parte da Administração da efetiva prestação
dos serviços contratados.
Também vislumbrei nos Pareceres Jurídicos encartados nestes autos (fls.
237/239, 850/854, 868/871, 891/893, 947/951, 1166/1171), somente a
participação do procurador Dr. Deveite Alves Porto Neto, o que reforça a tese da
defesa de que o contratado presta serviços rotineiros, sem, no entanto, ter
emitido qualquer Parecer, uma vez que não comprova efetivamente os serviços
que o contratado – Dr. Constâncio Borges Brandão executou, suficientes a
legitimar o seu pagamento.
Assim, diante da documentação vertida nestes autos, há de se ressaltar que
nem a auditoria, nem mesmo a defesa trouxeram a estes autos documentação
que pudesse afastar a responsabilidade do prefeito.
Nestas circunstâncias, diferente do que ocorreu em outras situações que afastei
a condenação do prefeito por ausência de nexo de causalidade entre sua
conduta e os fatos imputados, no caso concreto, em consonância com a área
técnica, mantenho a irregularidade e o respectivo valor a ser ressarcido com a
imputação de responsabilidade a este chefe do Executivo, decorrente da
liquidação indevida da despesa, no valor de R$64.348,42 (35.526,10 VRTE).
ITEM 2.5 da ITC - Ausência de licitação – aditivo firmado com a empresa
M.G. de Oliveira Milhorato Ltda.
Infringência: Inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal c/c artigo 2º da Lei 8.666/93
Neste item foi verificado que o Edital do certame - Convite nº 014/2008, já foi
formulado sem a minuta contratual e a cláusula 13.1 definiu a Ordem de Compra
como o instrumento que substituiria o contrato, da forma assim expressa:
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
O objeto deste convite deverá ser entregue, em no máximo 30 (trinta) dias, na
Secretaria Municipal de Educação, após o recebimento da Ordem de
Compra.
Em 28 de abril de 2008, foram emitidas as autorizações de fornecimento/
execução para a empresa M.G. de Oliveira Milhorato (nºs 383/2008 e 384/2008),
totalizando R$38.613,12, cuja entrega se deu através das NFs. 195 e 196,
datadas e atestadas em 07 de junho de 2008 (fls. 512/513).
Assim, a equipe entendeu que a contratação se encerrou em 07 de junho de
2008, quando o objeto licitado15 foi entregue.
Neste contexto, considerando que o aditivo foi firmado após encerrado o
“contrato” (07/06/2008), tendo em vista que a Secretaria Municipal de Educação
e Cultura de Presidente Kennedy firmou o aditamento em 25 de agosto de 2008,
com a empresa M.G. de Oliveira Milhorato, no valor de R$9.653,28 (nove mil,
seiscentos e cinquenta e três reais e vinte e oito centavos), exatamente 25% do
valor anteriormente contratado, foi mantida em fase conclusiva a presente
irregularidade.
A defesa alega formalismo exacerbado por parte dos técnicos.
VOTO:
Constato no caso concreto que realmente o aditivo foi firmado de forma irregular,
tendo em vista que na época do aditivo já havia se encerrado o contrato pelo
cumprimento do objeto.
Contudo, verifico que os valores unitários das mercadorias praticados no termo
aditivo foram os mesmos inicialmente contratados, como se depreende da
15
Objeto contratado: 4.244 camisas em malha PV 67% Poliester e 33% Viscose fio; 2.200 bermudas masculinas em
tacktel 100% Poliester
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Autorização de Fornecimento nºs. 1346 e 1347/2008 (fls. 518/521), bem como
das NF’s. 267 e 264 (fls. 522/523).
Ademais, verifico que o acréscimo de R$9.653,28, corresponde ao percentual
máximo legalmente permitido para acréscimo (25%).
Lado outro, depreende-se dos autos que a participação do prefeito apontado
como responsável foi somente de assinar o contrato (fls. 516), baseado em
fundamentado Requerimento (fls. 515), o que denota a indevida aplicação da
responsabilidade objetiva, procedimento já afastado no âmbito deste Tribunal.
Assim, nas condições em que ocorreram o caso sub examine, restou
demonstrada a ausência de prejuízo à Administração ao não proceder a uma
nova licitação, sobretudo, porque estamos tratando de uniformes para
atendimento dos alunos da rede municipal escolar, que ficariam prejudicados
sem a compra de mais uniformes em tempo imediato, conforme termos das
justificativas encartadas às fls. 515.
Neste contexto, entendo que persiste razão ao defendente, tendo em vista a
ausência de nexo de causalidade entre a conduta do prefeito e a
irregularidade ora apontada, razão pela qual afasto sua responsabilidade.
Ademais, considerando que a falha se mostra de cunho formal, que não
acarretou qualquer prejuízo na realização das despesas, deixo de refazer a
matriz de responsabilidade, com chamamento de outros agentes públicos
eventualmente envolvidos.
ITEM 2.6 - Despesas sem finalidade pública, contrariando o princípio do
interesse público – Pregões 059/2007 e 075/2008
Infringência: artigo 32, caput, da Constituição do Estado do Espírito Santo
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
A auditoria apontou que a Prefeitura Municipal de Presidente Kennedy, através
dos Pregões Presenciais nº 059/07 e nº 075/08, ambos realizados no exercício
de 2008, adquiriu lanches (biscoitos, achocolatado, bolo confeitado, bolo de
fubá, bolo de trigo, chocolate em pó, iogurte, leite de diversos sabores,
refrigerantes, maionese, mortadela, presunto, queijos, patê, salgados fritos e
assados, sucos, tortas salgadas, etc.) para atender às Secretarias Municipais e
eventos, no total pago em 2008 de R$267.503,55, conforme segue discriminado:
Empresas
Valor contratado
Padaria e Confeitaria Scherrer Ltda. – ME
Valor pago em 2008
270.945,41
238.888,83
Adeildo R. da Silva – ME – Armazém
Popular
21.528,15
12.214,82
G. P. de Oliveira – ME
25.726,70
16.399,90
318.200,26
267.503,55
TOTAL
Desta forma, foi alegado pela área técnica que as despesas atendiam a um
número reduzido de pessoas, no caso os servidores das Secretarias Municipais,
que já recebem do município remuneração pelos serviços prestados, não
atendendo, assim, aos requisitos de utilidade e legalidade, necessários à
caracterização de uma regular despesa pública, o que ensejou, no entender da
auditoria, dano injustificado ao erário, passível de ressarcimento, no valor total
pago no exercício de 2008, de R$267.503,55, correspondente a 147.685,94
VRTE.
O defendente alega, primeiramente, que esses "lanches" não eram servidos
apenas aos servidores, mas a todos aqueles que frequentavam o Executivo
Municipal (autoridades de outros entes federativos, munícipes, demais
visitantes). Afirma que uma boa parte desses "lanches" foram consumidos
durante
as
solenidades
diversas
(inaugurações,
datas
comemorativas,
encontros, palestras, etc.).
Por fim, a defesa argumenta que as despesas em comento são corriqueiras em
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
diversas Administrações Públicas, e a título de ilustração, cita as seguintes
licitações com objetos semelhantes a ora acusada, pela ausência de interesse
público:
TRIBUNAL DE CONTAS DO
ESTADO DO ESPIRITO SANTO
(www.tc.es.gov.br)
Pregão n° 20/2009:
Objeto: Água mineral com e sem gás, café, biscoito, bolachas, leite, manteiga
etc.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO (www.tj.es.gov.br)
Pregão 07/2009:
Objeto: Contratação de empresa especializada para fornecimento parcelado de
frutas para atender necessidades deste Egrégio Tribunal de Justiça
Em relação aos gastos com fornecimentos de lanches, o gestor alega que boa
parte dos mesmos foi consumida durante solenidades diversas (inaugurações,
datas comemorativas, encontros, palestras, etc.), no entanto, não traz à colação
comprovante das referidas solenidades, restando inviável precisar quais gastos
objetivaram suprir demanda interna, em atendimento as respectivas Secretarias
(uso diário para servidores), e aquelas utilizadas nas solenidades e visitantes
(uso esporádico para público externo).
VOTO:
Da análise das Notas Fiscais encartadas às fls. 582/767, também não foi
possível em todas elas a identificação do Setor recebedor das mercadorias e do
servidor que atestou a despesa.
Lado outro, importa registrar que a impossibilidade da entidade pública custear
“coffee break” ou “buffet” em solenidades, ou materiais de consumo
relacionados, não é matéria pacificada. Há aqueles que defendem como
possível, desde que observada à dotação orçamentária, outros entendem que
depende da verificação da economicidade e razoabilidade da despesa.
Nesse sentido, é o posicionamento do Ministro do Tribunal de Contas da União,
Benjamin Zymler, in verbis:
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
“... a contratação de serviços de “buffet” ou “coffee break”, para fornecimento
de alimentação, bebidas, bem como outros materiais de consumo
relacionados, não deve ser vedada de forma ampla e genérica. Entendo que
ela pode ser admissível, desde que, de forma comedida, respeitando-se os
princípios da razoabilidade e economicidade”.
Decisão Administrativa publicada no D.O.U de 04/12/2008.
Assim, embora não se possa vedar de forma ampla a aquisição de materiais de
consumo, na hipótese em tela, em algumas notas fiscais não foi devidamente
identificada a secretaria municipal que teria sido beneficiada, em razão disto não
há como verificar fatores preponderantes como, a razoabilidade e a modicidade
dos lanches para visitantes, solenidades e servidores.
Ademais, para ilustrar a ausência de razoabilidade das despesas em voga, faço
a comparação dos valores pagos em 2008 pela Prefeitura de P. Kennedy
(R$267.503,55) com a licitação realizada pelo Tribunal de Justiça no certame
trazido à colação pelo defendente (PP 07/2009), no qual foi gasto no ano de
2009 a quantia de R$24.000,00 com materiais de consumo.
Na esteira deste entendimento, portanto, encontrei amparo para manter a
presente irregularidade, já que no caso concreto não ficou demonstrada a
ocasião de eventos que justificasse o fornecimento das mercadorias em
questão, nem mesmo qual setor seria beneficiado, fatores que inviabilizaram,
inclusive, a aferição da razoabilidade e economicidade das despesas.
Assim, apesar de algumas deficiências na liquidação das citadas despesas e
considerando que a entrega se deu em algumas secretarias identificadas,
entendo que a manutenção do ressarcimento em seu valor integral acarretaria
hipótese vedada de enriquecimento ilícito por parte da Administração, que em
última análise se beneficiou dos materiais, seja na sua integralidade ou em
parte, e ainda assim restaria recomposto do valor total.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Neste contexto, em dissonância com a área técnica, especialmente respaldado
na tese da inviabilidade de imputação de ressarcimento por dano presumido,
afasto a devolução ao erário apontada, mantendo, contudo, a irregularidade
deste tópico, tendo em vista a ausência de demonstração da razoabilidade e
economicidade
no
quantitativo
de
materiais
de
consumo
pagos
pela
municipalidade, e, sobretudo, pela deficiência na liquidação das despesas
verificada na documentação encartada nos autos.
ITEM 2.7 da ITC - Ausência de termo contratual – Pregão 056/2008
Infringência: Art. 62, caput e § 4º, da Lei 8.666/93
Assim como o item 2.2 acima delineado, saliento as razões e justificativas
apresentadas pela defesa para afastar a irregularidade apontada neste tópico,
cujos termos acompanho, pelos seus próprios fundamentos de fato e de direito,
conforme trecho extraído da peça conclusiva que passo a reproduzir:
“(...) Em síntese, as obrigações decorrentes da contratação, incluindo
garantia e assistência técnica, ficariam, de qualquer forma, resguardadas pelo
ordenamento jurídico pátrio, fato que possibilitaria a substituição do termo de
contrato por outros instrumentos previstos no caput do art. 62 da Lei 8666/93,
como as autorizações de fornecimento.
Conforme apontado pela Equipe de Auditoria, o procedimento licitatório sob
análise objetivou meramente a aquisição (compra) de equipamento –
extrusora para fabricação e tubos em polietileno para irrigação.
Tendo em vista, portanto, que, caso fosse necessário acionar a assistência
técnica do equipamento, esta era de responsabilidade do fabricante e da
Rede Autorizada de Assistência Técnica credenciada pelo fabricante, e seria
prestada mediante apresentação da Nota Fiscal constante à fl. 769 dos
presentes autos, tem-se por regular o procedimento.”
item 2.8 da ITC - Inobservância ao Princípio da Publicidade
Base Legal: Lei 8.666/93 – caput do Artigo 3º c/c Artigo 21
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Analisando os processos relativos às Tomadas de Preços e de Concorrência
realizados pela Prefeitura Municipal de Presidente Kennedy, foi verificado a
publicação do resumo dos Editais das Licitações apenas uma vez no Diário
Oficial do Estado do Espírito Santo, descumprindo o que dispõe os artigos 3º,
caput e 21 da Lei 8.666/93, que determinam a publicação dos avisos contendo
resumo desses editais, pelo menos uma vez no Diário Oficial e em jornal de
grande circulação no Estado.
O responsável alega que com a edição da Lei n° 10.520/2002 (Pregão)
entendeu a Administração Municipal que teria ocorrido a revogação parcial da
Lei n° 8.666/93 (art. 23), tendo em vista o conteúdo do art. 4° da Lei do
Pregão16.
VOTO:
Embora não concorde com as razões da defesa quanto ao mérito da questão
posta, verifico que a responsabilidade de dar publicidade aos resumos dos
Editais de licitação é inteira dos membros da Comissão Permanente de
Licitações. Como prova disto trago a publicidade dos Editais da TP 01/2008 (fls.
818/819), da CP 04/2008 (fls. 875/876), da CP 02/2008 (fls. 916/917), da CP
03/2008 (fls. 953), da CP 05/2008 (fls. 986/987), nas quais a referida Comissão
de Licitações é que assina como responsável.
Desta maneira, no meu entender não ficou evidenciado o nexo de causalidade
entre a irregularidade e a conduta do prefeito, razão pela qual, em dissonância
com a área técnica, afasto a responsabilidade do mesmo no caso em tela, da
forma já explicada na preliminar acima transcrita (item II.1).
16
Art. 4° A fase externa do pregão será iniciada com a convocação dos interessados e observará
as seguintes regras:
- a convocação dos interessados será efetuada por meio de publicação de aviso em diário
oficial do respectivo ente federado ou, não existindo, em jornal de circulação local, e
facultativamente, por meios eletrônicos e conforme o vulto da licitação, em jornal de
grande circulação, nos termos do regulamento de que trata o art. 2º. (grifos da defesa)
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
item 2.9 da ITC - Inobservância ao limite da modalidade licitatória
Base Legal: Art. 23, inciso I, da Lei 8.666/93
Foi apontada neste tópico a irregularidade consistente no serviço a ser prestado
quando da construção de 50 unidades habitacionais populares contratadas para
atender a Secretaria Municipal de Assistência Social.
Aduz a auditoria que a modalidade licitatória adotada para realização da Tomada
de Preços nº 01/2008 foi inadequada, levando-se em conta a estimativa dos
custos que resultou no contrato firmado no valor de R$1.337.018,50, restando
ultrapassado o limite da modalidade utilizada, quando da edição do aditivo, que
acresceu em R$302.917,45 o valor contratual, ou seja, acima do limite previsto
no artigo 23, I, “b”, da Lei nº 8.666/93.
Por outro lado, a defesa argumenta que o aditivo se deu em razão das
modificações surgidas durante a execução, decorrente da dificuldade de
mobilização administrativa, notadamente, por serem unidades a serem
construídas em diversas localidades, com significativa distância entre elas e os
principais fornecedores, conforme requerimento assinado pelo engenheiro cível
da PMPK, Sr. Ruy Candido Athayde, encartado às fls. 832.
VOTO:
Inicialmente, constato que não houve acréscimo do objeto, mais sim de serviços
para atendimento àquele objeto, o que obrigou o acréscimo no valor e no prazo
contratual inicialmente previsto, conforme se depreende das Planilhas de
acréscimos e decréscimos (fls. 833/836), que discriminam os serviços
necessários a serem complementados, com o valor respectivo.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Ademais, verifico às fls. 850/854, o Parecer Jurídico que veio a permitir o
acréscimo, desde que obedecido o limite dos 25%, conforme dispõe o art. 65, §
1º e 4º da LLC, ante a existência de dotação orçamentária.
Neste contexto, ainda que o prefeito tenha aposto sua assinatura na mencionada
Planilha de Acréscimo (fls. 833/836), bem como no contrato 21/2008 firmado
com a empresa Elicon Construtora Ltda (fls. 821/829), os termos do Edital
deficitário (fls. 796/817) foram respaldados no entendimento técnico firmado por
engenheiro civil, constituído pela Prefeitura para atender as demandas nesta
área, bem como fundamentado em Parecer Jurídico.
Deste modo, no meu entender não restaria ao Prefeito divergir da opinião do
Engenheiro e do Procurador do Município, já que tais funções estariam fora das
atribuições de um chefe do Executivo, e mesmo porque, pelo menos em tese,
estaria o gestor incapacitado tecnicamente para reverter a situação posta, quiçá
ser responsabilizado.
Assim, em que pese a modalidade escolhida não ter sido a adequada, no
sentido da Concorrência ser a mais ampla, com prazos mais dilatados durante a
publicação de editais, apropriada para os contratos de grande vulto,
diferentemente da Tomada de Preços, em que há procedimento mais
simplificado, com prazos menores e interessados previamente cadastrados,
constato que não houve acréscimo acima do permitido pela lei.
Constato, ainda, que os valores dos itens acrescidos não foram questionados
pelo seus respectivos valores, ou seja, não houve apontamento por parte da
área técnica de qualquer superfaturamento ou sobre preço nos itens aditados, o
que denota a regularidade de seus preços unitários.
Nessa linha, em dissonância com a área técnica, afasto a responsabilidade do
gestor em comento, primeiramente por que não foi evidenciado o nexo de
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
causalidade entre sua conduta e a irregularidade constante neste item, da forma
já tratada preliminarmente neste voto, mas, sobretudo, por que tal impropriedade
não acarretou prejuízo ao Município, demonstrando ser mais uma formalidade
que não tem o condão de macular as presentes contas.
ITEM 2.10 da ITC - Falta de controle de bens patrimoniais
Infringência: Lei 4.320/64 – Artigo 94 e Lei Orgânica Municipal – Artigo 12
A equipe de auditoria constatou que a Prefeitura Municipal de Presidente
Kennedy não possui sistema de controle de Bens Patrimoniais, pois teriam
encontrado bens sem plaqueta de controle e sem o respectivo termo de
responsabilidade de todos os bens de propriedade do município, em infringência
ao art. 94 da Lei 4.320/64 e art. 12 da Lei Orgânica17.
Ademais, apontaram que o Município não realiza periodicamente o inventário
dos bens para conferência das existências físicas, das responsabilidades pela
guarda, além do sistema contábil só registrar o saldo anterior acrescido das
aquisições no período, não possuindo controle analítico que permitisse identificar
os bens individualmente.
Aduz a defesa que o vago e impreciso apontamento da ITI não permitia o
exercício da defesa, nos termos garantidos pela Constituição brasileira de 1988
— "ampla defesa", pois não teriam afinal quantos e quais bens patrimoniais
estavam sem plaqueta de controle e não havia termo de responsabilidade.
17
Lei 4.320/64
Art. 94. Haverá registros analíticos de todos os bens de caráter permanente, com indicação dos elementos necessários
para a perfeita caracterização de cada um deles e dos agentes responsáveis pela sua guarda e administração.
Lei Orgânica do Município de Presidente Kennedy
Art. 12. Compete ao Prefeito a administração dos bens municipais, respeitada a competência da Câmara Municipal
quanto aos utilizados em seus serviços.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Por fim, alega que esse item já teria sido superado quando da apreciação do
exercício de 2006 (Processo TC 1520/2007) no item "5 - AUSÊNCIA DE
DEVIDO CONTROLE PATRIMONIAL SOBRE OS BENS ADQUIRIDOS
(Infringência aos arts. 94 e 95 da Lei 4320/64)" em que o Plenário deste Tribunal
de Contas entendeu que a suposta irregularidade não estava configurada.
VOTO:
Registro primeiramente que a irregularidade apontada pela auditoria estaria
configurada ainda que a auditoria não tivesse individualizado os bens não
identificados e sem o termo de responsabilidade, uma vez que, segundo a
auditoria, todos os bens fiscalizados estavam sem a respectiva plaqueta e termo
de responsabilidade.
Por outro lado, na linha de entendimento vertido na conclusiva, verifico que este
Tribunal proferiu julgado sobre este tema, através do Acórdão 270/2008, no qual
foi mantida a irregularidade ora tratada já no exercício de 2006, como pode ser
observado no trecho do referido Acórdão:
“ACÓRDÃO TC-270/2008
PROCESSO
- TC-1520/2007 (APENSO: TC-2662/2006)
INTERESSADO - PREFEITURA MUNICIPAL DE PRESIDENTE KENNEDY
ASSUNTO
- RELATÓRIO DE AUDITORIA - EXERCÍCIO DE 2006
RELATÓRIO DE AUDITORIA - EXERCÍCIO DE 2006 - PREFEITO: ALUÍZIO
CARLOS CORRÊA - ATOS IRREGULARES - RESSARCIMENTO - MULTA.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Processo TC-1520/2007,
que cuida do Relatório de Auditoria, realizada na Prefeitura Municipal de
Presidente Kennedy, referente ao exercício de 2006, sob a responsabilidade
do Prefeito, Sr. Aluízio Carlos Corrêa.
(...)
ACORDAM os Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Espírito
Santo, em sessão realizada no dia vinte e nove de maio de dois mil e oito, por
maioria, pelo voto de desempate da Presidência (apresentado no dia vinte e
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
nove de maio de dois mil e oito, nos termos do artigo 41, § 3º, do Regimento
Interno deste Tribunal), que acompanhou o entendimento manifestado pelos
Conselheiros Enivaldo Euzébio dos Anjos, Umberto Messias de Souza e
Marco Antonio da Silva, julgar irregulares os atos praticados pelo Sr. Aluízio
Carlos Corrêa, frente ao Executivo Municipal, com base no artigo 59, inciso
III, alíneas “a” e “b”, e no artigo 96, inciso III, da Lei Complementar nº 32/93,
apenando-o com multa no valor correspondente a 1.000 (Hum mil) VRTE, de
acordo com o artigo 62 da Lei Complementar nº 32/93, devendo essa quantia
ser recolhida ao Tesouro Estadual, nos termos do artigo 169 do Regimento
Interno deste Tribunal, tendo em vista os seguintes procedimentos
irregulares:
(...)
2. Ausência de devido controle patrimonial sobre os bens adquiridos Infringência aos artigos 94 e 95 da Lei nº 4.320/64;”
Assim, em que pese as justificativas apresentadas pela defesa se mostrarem
insuficientes para elidir a inconsistência apontada, me reporto à flexibilidade
trazida pela Resolução TC 258/2013, que dispõe sobre orientação e fiscalização
das questões patrimoniais nos jurisdicionados do Tribunal de Contas do Estado
do Espírito Santo, dando nova data limite aos municípios para darem
cumprimento as normas de contabilidade pública.
Deste modo, ficaram os municípios autorizados a levantar toda situação
patrimonial e as devidas reavaliações até o prazo máximo de 31/12/2014,
conforme dispositivo supracitado, que veio a alterar, inclusive, o prazo
anteriormente disposto pela Resolução TC 221/2010, que seria até 31/12/2013
para os Municípios.
Ante o exposto, em dissonância com a área técnica, deixo de aplicar sanção ao
responsável em questão, convolando a irregularidade em determinação à
Prefeitura de Presidente Kennedy, para que adote medidas de regularização dos
bens patrimoniais, no levantamento e registro contábil, viabilizando a correção
até a próxima prestação de contas anual a ser encaminhada a este Tribunal.
2.11 da ITC - Contratação de artista em desacordo com a Lei de Licitações
Base Legal: Art. 25, inciso III, da Lei Federal 8.666/93.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
2.12 da ITC - Ausência de justificativa de preço
Base Legal Art. 26, inciso III, da Lei Federal 8.666/1993.
Da análise das cartas de exclusividade acostadas aos processos PMPK 2030 e
3017/2008, a auditoria registrou a ausência de documentos que comprovassem
o vínculo contratual que subordinasse os artistas contratados à participação da
empresa Multi Festas Promoções e Eventos Ltda.
Da mesma forma, em relação ao processo PMPK 9592/2008, entendeu a equipe
técnica que a Administração efetuou a contratação da empresa A. F. Leal
Promoções Artísticas ME, com fulcro no inciso III, do art. 25, da Lei 8.666/93,
através de cartas de exclusividade precárias, tendo em vista que eram
concedidas dando exclusividade somente na data que o artista realizaria o show
naquele município.
Também nos mencionados processos (PMPK 2030/08, 3017/08 e 9592/08), não
foram encontrados pela equipe de auditoria elementos que comprovassem que o
valor global pago pela apresentação dos shows artísticos seria o preço praticado
no mercado.
Também não foi individualizado o valor de cada apresentação, inviabilizando a
verificação de conformidade dos preços praticados pelos artistas e respectivas
bandas, em violação ao que preceitua o inciso III, do artigo 26, da Lei
18
8.666/93 .
Segundo a defesa, houve uma interpretação absoluta e restritiva no sentido de
18
Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de
inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do
art. 8º desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na
imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos. (Redação dada pela Lei nº 11.107,
de 2005)
Parágrafo único.O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no
que couber, com os seguintes elementos:
[...]
III-justificativa do preço. (Grifamos)
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
que um artista apenas pode ser contratado diretamente ou apenas por meio
de um único empresário.
Alega, em outras palavras, que o artista não pode ser obrigado a se atrelar a
apenas um empresário para a venda de seus serviços.
Quanto à ausência de justificativa de preço dos shows, sustenta que, muito
embora a justificativa de preços não conste nos autos, ela é facilmente
encontrada na Administração, vez que foi utilizada a motivação aliunde (per
relationem), cuja tese é aceita pelos Tribunais pátrios, sem exceção.
Ao contrário sensu, na conclusiva a área técnica firma a posição que a
caracterização do “empresário exclusivo”, para fins de contratação por
inexigibilidade de licitação, não se dá quando o artista apresenta um
documento credenciador ou autorizativo para a realização de um único show
em data e hora específica, como se verifica dos documentos apresentados
nos autos, tendo em vista que a Lei de Licitações exige, para a contratação
de artista através de inexigibilidade de licitação, que o ajuste se dê
diretamente (com o próprio artista) ou através de empresário exclusivo.
Também a tese da chamada motivação aliunde não foi aceita na peça
conclusiva, pois a mera referência ao ato, à sua concordância com anteriores
pareceres, informações, decisões ou propostas, não supre a obrigação da
motivação do ato administrativo, sobretudo, porque não houve indicação de
quais foram os pareceres, informações, decisões ou propostas anteriores que
foram utilizados, uma vez que se constitui requisito indispensável da motivação
per relacionem que a decisão administrativa explicitamente reporte-se aos
fundamentos existentes aliunde.
Tratando-se da justificativa de preço, cabia à Administração demonstrar nos
autos dos processos de despesa quais pesquisas de preços teriam sido
anteriormente realizadas pelo próprio município de Presidente Kennedy e outras
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
municipalidades no exercício de 2008 para embasar a contratação dos artistas
em tela.
Isto posto, ambas irregularidades apontadas nos itens 2.11 e 2.12, foram
mantidas na peça conclusiva.
VOTO:
Em verdade, as irregularidades apontadas nestes itens se reportam a
contratação de artistas por inexigibilidade de licitação, em infringência ao art.
25, inciso III, bem como em afronta ao art. 26, inciso III, ambos da Lei de
Licitações e Contratos.
Conforme apontado pela Equipe de Auditoria, as “Cartas de Exclusividade”
presentes às fls. 1111/1121, autorizaram a venda dos shows pela empresa
Multi Festas Promoções e Eventos Ltda. apenas na data da realização do
evento.
Ademais, não foi possível aferir a adequação dos valores contratados com os
praticados no mercado, sequer foram individualizados os valores gastos em
cada apresentação, inviabilizando a verificação da regularidade dos preços
pagos a empresa Multi Festas e respectivos artistas contratados.
Neste contexto, cabe ressaltar que o Parecer Jurídico encartado às fls.
1166/1171 destaca a necessidade do processo estar instruído com os elementos
exigidos pelo art. 26 da LLC, incluindo, portanto, o inciso III, que trata da
justificativa do preço.
Destarte, a ausência da justificativa de preço, nos termos do art. 26, parágrafo
único, inciso III da Lei nº 8.666/93, se mostra necessária à verificação quanto ao
preço contratado estar compatível ou não com os praticados no mercado,
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
sobretudo, nas hipóteses de contratação direta, onde não há a disputa entre
interessados, pois servem como parâmetro para a estipulação do valor
contratual.
Nesse passo, em que pese a alegação do Prefeito de que somente teria
ratificado a inexigibilidade da licitação em tela, verifico que faltou ao mesmo
uma postura diligente na adoção de medidas para atender ao que foi
ressaltado no referido Parecer Jurídico de fls. 1166/1171.
Nesse sentido, ainda que a função de contratar terceiros, inclusive por
inexigibilidade, não seja atividade compatível com as funções precípuas do
prefeito, autoridade máxima no Executivo Municipal, o gestor em comento
deveria de qualquer sorte, examinar as condições sob as quais estaria dando
prosseguimento ao feito, sobretudo, as imposições do Parecerista que o
analisou.
Nessa linha, considerando que o supracitado Parecer Jurídico não tenha
sinalizado pela regularidade incondicional da contratação em voga, o prefeito
avocou para si a responsabilidade do feito, tendo em vista que deixou de
atender as condições impostas para sua regularização, ratificando o ato
administrativo à revelia do Parecerista.
Diante dos fatos, no caso concreto, mantenho a irregularidade do tópico
aventado no item 2.12 da ITC - Ausência de justificativa de preço, em
infringência ao art. 26, III, da LLC, imputando ao prefeito a responsabilidade,
da forma apontada na peça conclusiva.
Quanto ao item 2.11 da ITC - Contratação de artista em desacordo com a
Lei de Licitações, em descumprimento ao art. 25, inciso III, da Lei Federal
8.666/93, diante da ausência de má-fé e dano ao erário comprovados, deixo
de aplicar penalidade ao gestor, afastando a irregularidade deste item,
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
conforme entendimento pacificado desta Corte sobre o assunto, assentado no
Informativo de Jurisprudência nº 02, que se formou no seguinte sentido:
“3. A contratação de bandas e artistas deve se dar de forma direta e, quando
não for possível, deve ser exigido do empresário intermediário a carta de
exclusividade acompanhada do respectivo contrato firmado por este e a
banda ou artista.
Versam os autos sobre Auditoria Ordinária realizada na Prefeitura Municipal
de São Mateus, relativa ao exercício de 2010. Dentre as irregularidades
apresentadas no Relatório de Auditoria tem-se a “contratação de profissionais
do setor artístico por inexigibilidade de licitação intermediada indevidamente
por empresa de promoção de shows e eventos”. O relator colaciona trecho de
doutrina defendendo que a contratação de artista deve se dar por meio de
empresário exclusivo cuja intervenção “somente se justificará se preexistir
vínculo contratual que subordine a contratação do artista à sua participação”.
Acompanhando o voto do relator, o Plenário deliberou por CONSIDERAR
REGULARES COM RESSALVA os atos de gestão do Prefeito Municipal
determinando, quanto à realização de eventos artísticos, que contrate
“diretamente com bandas e artistas a realização de eventos artísticos e,
quando assim não for possível, contratar com o empresário exclusivo
devidamente comprovado com “carta de exclusividade”, acompanhada do
respectivo contrato firmado entre o artista/banda, evitando assim o contrato
com pessoas interpostas munidas de cartas de exclusividade para shows em
data e local determinado”. Acórdão TC-867/2014-Plenário, TC 1280/2011,
relator Conselheiro Rodrigo Flávio Freire Farias Chamoun, publicado em
21/01/2015 (grifei)”
ITEM 2.13 da ITC - Inexistência de prova de propriedade, de quitação de
dívidas fiscais do bem expropriado e de publicação de edital para
conhecimento de terceiros
Infringência: artigo 34 do Decreto-Lei nº 3.365, de 21/06/1941, e Arts. 62 e 63 da Lei Federal
4.320/1964.
ITEM 2.14 da ITC- Não escrituração pública do imóvel em nome do
Município
Infringência: Art. 1º, § 1º, inc. IV c/c art. 167, inc. I da Lei Federal nº 6.015/73, alterada pelas Leis
nº 6.140/74 e 6.216/75;
A auditoria apontou que no processo de desapropriação nº 7468/2008 não teria
sido localizada a documentação que comprovasse a propriedade e a quitação de
dívidas fiscais, bem como o edital que desse publicidade ao ato, abrindo prazo
para manifestação de terceiros, conforme previsão legal, contida no art. 34 do
Decreto-Lei nº 3.365, de 21/06/194119.
19
Art.34.O levantamento do preço será deferido mediante prova de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que
recaiam sobre o bem expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para conhecimento de terceiros.
7
Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Também não foi constatado no citado processo de desapropriação, que a
Prefeitura
Municipal
providenciou
a
escrituração
pública
do
imóvel
desapropriado, conforme estabelece o artigo 1º, § 1º, inciso IV, c/c artigo 167,
inciso I, da Lei Federal nº 6.015/73, alterada pelas Leis nº 6.140/74 e 6.216/75,
in verbis:
“Art. 1º Os serviços concernentes aos Registros Públicos, estabelecidos pela
legislação civil para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos,
ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei. (Redação dada pela Lei nº
6.216, de 1975)
§ 1º Os Registros referidos neste artigo são os seguintes: (Redação dada
pela Lei nº 6.216, de 1975)
[...]
IV - o registro de imóveis. (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975)
Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.
(Renumerado do art. 168 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).
I - o registro: (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975).
[...]
34) da desapropriação amigável e das sentenças que, em processo de
desapropriação, fixarem o valor da indenização;”
Ademais, a administração fez a publicação dos editais de desapropriação na
sede do Executivo, nos termos previstos no art. 69 da Lei Orgânica Municipal 20,
abrindo mão de dar maior publicidade a um ato de desapropriação a ser
realizado sem comprovação da propriedade do imóvel, optando pela publicidade
da forma autorizada pela Lei Orgânica.
Nesse sentido, foi mantida a irregularidade consistente no procedimento adotado
pela Administração, em descumprimento aos termos do Decreto 3365/1941.
após sua regular liquidação.
Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e
documentos comprobatórios do respectivo crédito.
§ 1º Essa verificação tem por fim apurar:
I - a origem e o objeto do que se deve pagar;
II - a importância exata a pagar;
III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.
§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:
I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;
II - a nota de empenho;
III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.
20
Art. 69 – A publicação de leis e atos municipais far-se-á em impressa local ou através de afixação em local próprio de
acesso ao público na sede dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário do Município de Presidente Kennedy-ES.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Em suma, a defesa alega que a maioria dos imóveis no Município de Presidente
Kennedy não tem proprietários, apenas possuidores, oficialmente atestando que
tal imóvel nunca teria sido escriturado.
No entanto, considerando que a defesa não trouxe à colação qualquer prova que
pudesse atestar suas alegações, em fase conclusiva tais argumentos não foram
aceitos.
VOTO:
No caso de inexistência de escritura pública, entendeu a área técnica, seria
necessário que o expropriado comprovasse, por meio de outros documentos
idôneos (cessão de contrato, compromisso de compra e venda, etc.) que o
mesmo é o possuidor do imóvel.
Pois bem.
Observo na documentação encartada nestes autos (fls. 1196/1212), e ainda que
não conste parecer jurídico favorável ao procedimento adotado por aquela
administração, que a desapropriação se deu com base em Lei, devidamente
discutida e votada no âmbito do Legislativo local (Lei nº 770/2008), bem como
para definição do valor foi respaldada em avaliação por comissão formalmente
designada para tanto, além da publicação efetuada no mural daquela Prefeitura,
na Câmara e no Fórum do Município, que de qualquer modo, deu publicidade ao
ato da forma determinada pela Lei Orgânica, o que não cabe a meu ver maiores
questionamentos.
Num primeiro momento, entendo que a formalização de um processo de
desapropriação, a exemplo do que ocorre nos procedimentos licitatórios, tal
como foi levantado nos itens 2.8, 2.9, 2.11 e 2.12, remontam hipóteses de
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
ilegitimidade passiva do Prefeito, por envolver o exercício de funções em que ao
Ordenador de Despesas não cabe se imiscuir.
No entanto, consta na documentação de fls. 1211/1212, ofício da equipe de
auditoria endereçado ao prefeito da época, solicitando a apresentação de
parecer jurídico, publicação na imprensa oficial e a cópia da escritura registrada
no Cartório de Registro de Imóveis, relativamente à desapropriação em questão,
cuja resposta negativa por parte da PMPK, veio ressalvada com o registro de
que o gestor de 2009 teria iniciado seu mandato naquele exercício, e a
desapropriação questionada teria ocorrido sob a gestão de seu antecessor.
Fato notório, portanto, é que o entendimento da área técnica quanto à
responsabilização exclusiva do prefeito, se deu em decorrência da ausência de
parecer jurídico que eventualmente o tivesse respaldado naquele ato. Nesse
sentido, mantenho a responsabilidade do prefeito neste caso concreto.
Passando ao exame do mérito, trago excertos da doutrina e jurisprudência sobre
o assunto ‘desapropriação’, para avaliação do caso concreto:
2. Desapropriação: modo originário de aquisição da propriedade.
Classificam-se os meios de aquisição de um bem em originários e derivados.
Na forma originária não há transmissão da coisa, pois o fato jurídico em si é
que enseja a transferência da propriedade, prescindindo de correlação com
qualquer título jurídico de que seja titular o anterior proprietário, não havendo
sub-rogação de titular a titular.
Assim, demonstrou-se que o novo direito não deriva do anterior, mas surge
21
originariamente, opondo-se inclusive ao proprietário.
Nessa linha, a desapropriação, segundo ampla maioria da doutrina, é forma
originária de aquisição da propriedade, o que significa que é, por si mesma,
suficiente para instaurar a propriedade em favor do Poder Público,
independentemente de qualquer vinculação com o título jurídico anterior do
proprietário.
Assim, tal como na usucapião, ocupação, especificação, ou acessão, é
irrelevante a vontade do proprietário, pois não é transmitente do imóvel bem
21
Cf. voto de Moreira Alves no RE 94.580-RS, onde aborda o caráter originário da aquisição por usucapião.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
como pouco interessa o título que possua, se justo ou injusto, de boa ou máfé.
Carvalho Filho ressalta ser a desapropriação um modo sui generis de
aquisição da propriedade, mas “pela forma como se consuma, é de ser
considerada forma de aquisição originária, porque a só vontade do Estado é
idônea a consumar o suporte fático gerador da transferência da propriedade,
sem qualquer relevância atribuída à vontade do proprietário ou ao título que
22
possua” .
Juarez Freitas observa que ela se caracteriza como modalidade de aquisição
originária pelo Poder Público, pois o bem se incorpora ao domínio público
com abstração plena de qualquer título antecedente, sem que se deva
23
catalogá-la sequer como instituto misto .
Indubitável, pois, que na desapropriação inexiste qualquer liame negocial
vinculando o expropriante ao proprietário, eis que há a extinção do direito de
propriedade que o expropriado detinha sobre bem e o surgimento do direito
de propriedade do expropriante sobre o mesmo bem. Assim, é evidente a
natureza originária da propriedade imóvel que venha a ser adquirida.
Dessa premissa surgem alguns importantes efeitos:
a) A desapropriação pode prosseguir até mesmo sem que se saiba quem é o
proprietário.
b) Ainda que o dono não tenha sido indenizado, mas terceiro, a transferência
operada através da desapropriação é irreversível.
c) Todos os direitos de reais de terceiros sobre a coisa passarão a incidir
sobre o numerário depositado à ordem do juízo. Nesse sentido consta nos
24
arts. 31
do Decreto-lei 3.365/1941 (chamado de “lei geral das
25
desapropriações”), e 17 da Lei 8.257/1991 (regula a expropriação das
glebas nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas).
Quanto à posse, inserta ou destacável do direito de propriedade, sendo ou
não um direito, integra aqueles possíveis de expropriação, por atender, assim
como atendem, ao domínio e/ou à propriedade, aos pressupostos antes
anunciados: a) comercialidade; b) valor econômico; c) interesse à
consecução da política estatal.
Raras são as referências na doutrina à viabilidade de desapropriação da
posse. Dentre as poucas deve ser frisada a que segue: "A desapropriação da
propriedade é a regra, mas a posse legítima ou de boa-fé também é
expropriável, por ter valor econômico para o possuidor, principalmente
quando se trata de imóvel utilizado ou cultivado pelo posseiro. Certamente, a
posse vale menos que a propriedade, mas nem por isso deixa de ser
indenizável, como têm reconhecido e proclamado os Tribunais". Escassas,
22
23
24
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 12.ª ed. rev., amp. e atual. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005, pg. 741.
FREITAS, Juarez. Estudos de Direito Administrativo.
Malheiros, 1995, pg. 75.
2.ª Ed. São Paulo:
“Art. 31. Ficam sub-rogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado”.
“Art. 17. A expropriação de que trata este lei prevalecerá sobre direitos reais de garantia, não se admitindo embargos
de terceiro, fundados em dívida hipotecária, anticrética ou pignoratícia”.
25
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
senão inexistentes, são as referências antagônicas à proposição do
26
administrativista.
Porém, por se entender que a desapropriação é um modo originário de
aquisição da propriedade, esta se efetiva independentemente da
regularização no registro de imóveis.
Todavia, a transcrição é levada a efeito, segundo Serpa Lopes e Seabra
Fagundes, para que se dê maior publicidade à desapropriação, haja
continuidade do registro, fique constando do Registro de Imóveis a
extinção da propriedade anterior e se cientifique - a todos a que possa
interessar - o término dos direitos reais incompatíveis com a
27
desapropriação .
28
Raimundo Viana igualmente assevera que, na desapropriação, “a finalidade
desse registro é muito mais para documentar a saída do bem do domínio
privado, do que a testificação da aquisição ou o momento da consumação
desta. (...) apenas para evitar negócios irregulares envolvendo o bem, com
possibilidade de sérios prejuízos para terceiros de boa-fé”.
Assim, consumada a expropriação pelo pagamento da indenização, cabe
ao expropriante regularizar o registro do imóvel expropriado, cuidandose, portanto, de momentos distintos, sendo esta regularização de grande
29
utilidade, mas não essencial à desapropriação.
Assim, não verifico no fato do expropriado não possuir a propriedade do imóvel e
consequentemente não estar respaldado com escritura pública, uma situação
que venha a influir na consumação da desapropriação propriamente dita, já que
o pagamento da indenização efetuado e a regularização do registro de imóvel,
como foi acima explicitado, podem ocorrer em momentos distintos, e,
principalmente porque este registro serve mais para delimitar a saída do bem do
domínio
privado,
afastando
negócios
irregulares
envolvendo
o
bem
desapropriado e ocasionando possíveis prejuízos a terceiros de boa-fé.
Deste modo, não vejo razões por manter as irregularidades presentes nos itens
2.13 e 2.14, tendo em vista que tais impropriedades, referentes à ausência do
título de propriedade do imóvel e de seu respectivo registro, não teriam o condão
26
VIANA, Raimundo. Do Registro na Desapropriação. Revista Forense. Vol. 298 – Abril/Junho de 1987, pág. 373.
SALLES, José Carlos de Moraes. A Desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 4.ª ed. rev., atual. e amp.
São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2000, p. 523.
28
“Do Registro na Desapropriação”. RF 298/373.
29
SOARES DE SOUZA, Fladja Raiane. Advogada da União.DESAPROPRIAÇÃO:O Momento Consumativo e o Registro
do Imóvel Expropriado.
27
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
de contaminar a desapropriação propriamente dita, razão pela qual, podem ser
devidamente corrigidas em tempo, sem incorrer em possível prejuízo para a
Administração.
Nesse sentido, em dissonância com a área técnica, afasto as irregularidades
presentificadas nestes tópicos, transformando-as em determinação à Prefeitura
Municipal de Presidente Kennedy, no sentido que adote medidas de
regularização do registro do imóvel desapropriado, mediante lavratura da devida
escritura pública.
ITEM 2.15 da ITC - Recontratação temporária de servidores
Infringência: art. 37, inciso IX, da Constituição Federal/1988 e art. 2º, parágrafos 1º e 3º, da Lei
Municipal nº 307/1991
Assim como os itens 2.2 e 2.7 acima delineados, saliento as razões e
justificativas apresentadas pela defesa para afastar a irregularidade apontada
neste tópico, cujos termos acompanho, pelos seus próprios fundamentos de fato
e de direito, conforme trecho extraído da peça conclusiva que passo a
reproduzir:
“(...)Tendo em vista que as contratações sob análise só poderiam ser
realizadas mediante concurso público e que a inconsistência apontada pela
Equipe de Auditoria refere-se ao descumprimento de um dispositivo previsto
na lei de contratação temporária, tem-se por prejudicada a análise do
presente item.
Sugere-se, ainda, que seja determinado ao atual gestor da Prefeitura
Municipal de Presidente Kennedy que não realize contratações para
atender a necessidade rotineira do ente com base na Lei Municipal nº 307, de
01/07/1991, tendo em vista que a mesma autoriza apenas a contratação
temporária para atender a necessidade temporária de excepcional interesse
público.”
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
ITEM 2.16 da ITC - Contratação de agentes comunitários de saúde sem
prévio processo seletivo público
Infringência: art. 2º da Emenda Constitucional nº 51, de 14/02/2006; art. 198, § 4º, da
Constituição Federal/1988 (Nova redação dada pela EC nº 51/2006); e art. 9º da Lei Federal nº
11.350/2006.
Constatou a auditoria que a Prefeitura Municipal contratou dois Agentes
Comunitários sem a realização de processo seletivo público de provas ou de
provas e títulos, contrariando o art. 2º da Emenda Constitucional nº 51/2006; o
art. 198, § 4º, da Constituição Federal/1988 (NR) e o art. 9º da Lei Federal nº
11.350/200630.
ITEM 2.17 da ITC - Contratação por prazo determinado de agentes
comunitários de saúde
Infringência: art. 16 da Lei Federal nº 11.350/2006.
Constatou a auditoria que a Prefeitura Municipal de Presidente Kennedy
contratou temporariamente em 01/07/2008, para atender ao Programa de Saúde
da Família – PSF, dois agentes comunitários de saúde, em infringência ao art.
16 da Lei Federal nº 11.350/200631, que veda a contratação temporária de tais
profissionais.
ITEM 2.18 - Ausência de concurso público - PSF
Infringência: art. 37, inciso II e IX, da Constituição Federal/1988.
30
Art 2º Após a promulgação da presente Emenda Constitucional, os agentes comunitários de saúde e os agentes de
combate às endemias somente poderão ser contratados diretamente pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos
Municípios na forma do § 4º do art. 198 da Constituição Federal, observado o limite de gasto estabelecido na Lei
Complementar de que trata o art. 169 da Constituição Federal.
Art. 198, § 4º, da Constituição Federal/1988 (NR):
§ 4º Os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de
combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas
atribuições e requisitos específicos para sua atuação.
Art.9ºA contratação de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias deverá ser precedida de
processo seletivo público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade de suas
atribuições e requisitos específicos para o exercício das atividades, que atenda aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
31
Art.16.Fica vedada a contratação temporária ou terceirizada de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de
Combate às Endemias, salvo na hipótese de combate a surtos endêmicos, na forma da lei aplicável.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Constatou a auditoria que a Prefeitura Municipal de Presidente Kennedy
contratou temporariamente em 2008, para atender ao Programa de Saúde da
Família – PSF, três Médicos e um Enfermeiro, conforme demonstrativo a seguir:
Contratações realizadas no exercício de 2008 (PSF):
Nº
NOME
CONTRATO TEMPORÁRIO
CARGO
DT ADMISSÃO
DT DEMISSÃO
25/02/08
18/01/08
04/03/08
04/07/08
31/03/09
01/04/09
31/03/09
01/01/09
01
BRUNO SALGADO
MÉDICO - PSF
02
HUGO HUMBERTO C VALENCIA JUNIOR
MÉDICO – PSF
03
INGRIDI DA SILVA COSTA
ENFERMEIRO - PSF
04
PAULA BORGES DE AZEVEDO
MÉDICO - PSF
Fonte: Relatório de contratações temporárias realizadas no exercício de 2008.
Registram os auditores que as contratações em voga são realizadas desde
2006, o que demonstra uma situação perene, caracterizando a obrigatoriedade
de concurso público e não uma necessidade temporária de excepcional
interesse público, prevista no inciso IX, do art. 37, da Constituição Federal/88.
Contratações realizadas nos exercícios de 2006, 2007 e 2008 (PSF):
Nº
NOME
01 BRUNO SALGADO
02 DOUGLAS DE MENEZES GONÇALVES
CARGO
CONTRATO TEMPORÁRIO
DT ADMISSÃO
DT DEMISSÃO
MÉDICO - PSF
25/02/08
31/03/09
ENFERMEIRO - PSF
02/02/06
31/03/09
03 FELIPE DE OLIVEIRA TINOCO
MÉDICO - PSF
09/02/06
03/04/06
04 FRANCISCO DE ASSIS DUTRA MAEL
MÉDICO - PSF
02/01/07
03/03/08
ENFERMEIRO - PSF
03/01/06
09/01/09
MÉDICO - PSF
18/01/08
01/04/09
ENFERMEIRO - PSF
04/03/08
31/03/09
MÉDICO - PSF
22/05/06
01/06/06
05 GEOVANA QUINTA
06 HUGO HUMBERTO C VALENCIA JUNIOR
07 INGRIDI DA SILVA COSTA
08 MARCUS VINICIUS DUARTE D ALMEIDA
09 NEDIANA DA COSTA GOMES
ENFERMEIRO - PSF
02/02/06
19/06/06
10 PAULA BORGES DE AZEVEDO
MÉDICO - PSF
04/07/08
01/01/09
11 RAFAEL SALGADO
MÉDICO - PSF
17/01/06
31/03/09
Fonte: Relatório de contratações temporárias realizadas nos exercícios de 2006 a 2008.
A defesa registra, em ambos os casos acima (2.1.6, 2.1.7 e 2.1.8), que o
comportamento adotado pela Administração deveu-se à cautela e prudência
decorrente da decisão liminar proferida na ADI 2135-4 pelo Supremo Tribunal
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Federal, que, inclusive, foi a orientação trazida na Resolução de Consulta nº
20/2008 do Tribunal de Contas do Mato Grosso, cuja cópia anexa aos autos.
A defesa não logrou êxito em suas justificativas, pois segundo os termos da
conclusiva a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.135/DF apenas
suspendeu, com efeitos ex nunc, a eficácia do caput do art. 39 da Constituição,
com redação dada pela EC nº 19, que trata do regime de contratação.
Nessa linha, concluiu a área técnica que as irregularidades em questão, que
tratam da infringência, respectivamente, ao art. 198, § 4º da CRF/88 (exigência
de processo seletivo público para agentes comunitários), ao art. 16 da Lei
Federal nº 11.350/2006 (vedação de contratação temporária ou terceirizada de
Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias) e ao
art. 37, II, da CRF/88 (ausência de Concurso Público), não possuem qualquer
relação com a ADIN 2.135 trazida à colação pela defesa.
Assim sendo, a conclusão do corpo técnico foi pela manutenção da
irregularidade.
VOTO:
Após análise detida dos autos, verifico que a irregularidade decorrente de
contratações temporárias e consequente ausência de Concurso Público para
atender a área de Saúde do Município, especificamente ao Programa Federal do
PSF, foi matéria já devidamente discutida por esta Corte no processo TC
1158/09, que tratou do Relatório de Auditoria da Prefeitura do Município de
Santa Teresa, referente ao exercício 2008.
O Plenário, na ocasião, proferiu julgamento consubstanciado no Acórdão TC
189/2013, cujo desfecho se respaldou em tese defendida no voto de vistas por
mim elaborado, cujos trechos destaco:
[...]
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
As equipes do PSF são compostas, no mínimo, por um médico de família, um
enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e seis agentes comunitários de saúde e,
quando ampliada, conta com um dentista, um auxiliar de consultório dentário e
um técnico em higiene bucal. Soma-se a esse esforço o trabalho dos Agentes de
Vigilância Ambiental em Saúde, de modo que podemos concluir que nesta seara,
predominantemente, são três os grupos de profissionais que atuam
integradamente em atendimento à atenção básica.
A questão central do problema reside em saber qual suporte legal é cabível na
contratação de cada uma destas três equipes de profissionais da saúde.
Nossa Carta Maior, em seu artigo 37, inciso II, se pronuncia, acerca das
contratações efetivadas pela Administração Pública, como se segue:
“Art. 37 [...]
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação
prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, de acordo
com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma
prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão
declarado em lei de livre nomeação e exoneração”.
Esta mesma Constituição permite exceções ao concurso público nas
contratações de pessoal, quando admite que a lei determine os cargos de
confiança inseridos na exceção e quando prevê a possibilidade de contratações
temporárias, conforme inciso IX do art. 37:
“Art. 37 [...]
IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado
para atender a necessidade temporária de excepcional interesse
público.”
Grifei
Desta forma, são três os requisitos obrigatórios para utilização dessa exceção,
quais sejam: i) Excepcional Interesse Público; ii) Temporariedade da
Contratação; e iii) Hipóteses expressamente previstas em lei.
O art. 39, caput da CRFB, definiu que todos os entes da federação deveriam
instituir, no âmbito de sua competência, o regime jurídico único e os planos de
carreira para os servidores da administração pública, das autarquias e das
fundações públicas.
Ocorre que com a implantação da reforma administrativa do Estado, foi abolido o
sistema de regime jurídico único (EC nº 19/98). Todavia, o Supremo Tribunal
Federal (ADI-MC 2135/DF), em decisão cautelar datada de 02/08/2007,
restabeleceu o regime jurídico único, suspendendo os efeitos da supracitada
emenda constitucional.
É importante salientar que a aludida decisão cautelar não suprimiu os efeitos da
Emenda Constitucional Nº 51/2006. Esta, por sua vez, dispõe sobre as
contratações de agentes comunitários de saúde (ACS) e agentes de combate às
endemias (ACE) diretamente pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, por
meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de
suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação (art. 198, §4º, CF/88).
Em atendimento ao § 5º do mesmo artigo foi editada Lei Federal nº 11.350, de 5
de outubro de 2006 que, em seus artigos 8º e 9º, estabelece que os agentes
comunitários de saúde (ACS) e os agentes de combate às endemias (ACE) se
submetem ao regime jurídico estabelecido pela CLT, salvo disposição contrária
do ente federativo e, ainda, que ambos se submetem a processo seletivo público
de provas ou de provas e títulos.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Diante do exposto, a meu ver, cristalino é a autorização legal para contratação
de profissionais, por meio de processo seletivo público de provas ou de provas e
títulos, para atuarem como agentes comunitários de saúde e agentes de
combate às endemias. Entendo, também, que estes profissionais se submeterão
ao regime jurídico estabelecido pela CLT, salvo se lei local dispuser de forma
diversa.
Nesta esteira, passo a analisar qual formato, diante das regras e dos fatos, é
mais adequado para a contratação dos profissionais que atuarão no Programa
Saúde da Família (médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, dentistas,
auxiliares de consultório dentário e técnicos em higiene dental): se (i)
contratação por concurso público com base no art. 37, inciso II da CRFB; ou (ii)
contratação temporária prescrita no art. 37, inciso IX da mesma Carta Maior.
[...] a Confederação Nacional dos Municípios alega a forte expansão dos gastos
municipais com diversos programas de saúde e destacam a piora acentuada no
financiamento do programa. Evidencio alguns pontos do relatório “Coletânea
Gestão Pública Municipal 2013/2016”:
Quando aconteceu a institucionalização do Programa Saúde da Família
em 1998, o Brasil possuía apenas 4 mil equipes, presentes em pouco
mais de 1.100 Municípios, passados 12 anos o Brasil passou a contar
com mais de 500 mil profissionais e trabalhadores da Saúde inseridos
somente no Saúde da Família e presentes em quase 5.300 Municípios;
Atualmente são 32 mil equipes de saúde da família, 248 mil agentes
comunitários, 21 mil equipes de saúde bucal e mais de 1,8 mil núcleos
de apoio à saúde da família;
São mais de 43,2 mil unidades básicas de saúde distribuídas pelo
território nacional, levando ações básicas de saúde a mais de 111,7
milhões de habitantes;
Em 2005, os Municípios possuíam quase 654 mil trabalhadores na
Saúde. Em julho de 2012, esse total chegou a pouco mais de 1 milhão
de trabalhadores vinculados à administração municipal, um
crescimento de 61,3% em apenas 7 anos;
Atualmente, os Municípios respondem por 76,6% do total de
trabalhadores da Saúde vinculados às esferas públicas;
A forma de financiamento federal por meio de incentivo financeiro
não é suficiente nem para o pagamento das despesas com a
equipe mínima da Saúde;
Cada equipe de Saúde da Família, contendo médico, enfermeiro,
ACS e equipe de saúde bucal, não custa para os cofres municipais
menos de R$ 50 mil mensais para manutenção;
83,1% dos programas da Saúde não se sustentam com os
repasses federais e estaduais;
Em 2011, os Municípios chegaram a investir em média 19,6% de seus
recursos próprios em Saúde. Foram apenas 22 Municípios, de um total
de 5.563, que deixaram de cumprir o mínimo constitucional de
investimento em Saúde;
Para atender às propostas de pisos salariais das profissões e
trabalhadores da Saúde que tramitam no Congresso Nacional, a
CNM estima que serão necessários quase R$ 53 bilhões ao ano,
levando em consideração apenas o valor do piso salarial, 1/3 de
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
férias e o 13º salário dos profissionais cadastrados Sistema Único
de Saúde;
A redução da carga horária dos profissionais de enfermagem para
30 horas semanais, por exemplo, na estratégia saúde da família,
que conta atualmente com mais de 32 mil equipes implantadas
pelos Municípios brasileiros, gera um déficit de 10 mil
enfermeiros, causando prejuízos
imensuráveis à atenção básica de saúde;
Com efeito, o desfecho da questão não é de fácil solução. É verdade que o
entendimento predominante, com farta jurisprudência e doutrina, segue na
direção de proibir a contratação temporária de profissionais para o PSF.
Entretanto, algumas Cortes de Contas têm adotado posição diversa,
considerando legal tal procedimento administrativo.
As ementas a seguir transcritas demostram o posicionamento favorável dos
Tribunais de Contas dos Estados de Minas Gerais e Santa Catarina, quanto à
contratação temporária de profissionais do PSF:
ASSUNTO: CONSULTA Nº 657277 SESSÃO DO DIA 20.03.02,
FORMULADA PELO DR. CLÉRIO KNUPP, PREFEITO MUNICIPAL DE
CARANGOLA, SOBRE A INCLUSÃO DOS GASTOS COM OS
AGENTES DE SAÚDE, MÉDICOS E ENFERMEIROS DO PROGRAMA
SAÚDE DA FAMÍLIA, EM CONVÊNIO COM O GOVERNO FEDERAL,
NO LIMITE DE DESPESA TOTAL COM PESSOAL, IMPOSTO PELA LEI
DE RESPONSABILIDADE FISCAL
RELATOR: CONSELHEIRO MURTA LAGES
Cumpre lembrar que, de acordo com a Constituição Federal, são apenas
três as formas de ingresso no serviço público: por meio de aprovação em
concurso público; contrato temporário para atender a necessidades de
excepcional interesse público de que trata o art. 37, inciso IX; e
admissão para cargo de provimento em comissão, de livre nomeação e
exoneração. Qualquer outra forma de admissão no serviço público fere a
Constituição Federal.
Quanto à terceirização, entendo que as atividades a serem
desempenhadas pelos profissionais contratados para o Programa
Saúde da Família referem-se à atividade-fim do município, só
podendo ser desempenhadas por servidor ou empregado público
de carreira. Além disso, já foi decidido por esta Corte de Contas, em
consultas anteriores, que a terceirização só é lícita quando envolve,
apenas, serviços ligados à atividade-meio, tais como: vigilância, limpeza,
conservação, transporte, informática, copeiragem, recepção, reprografia,
telecomunicação, instalação e manutenção de prédios públicos.
No entanto, a contratação de agentes de saúde para atuar no
Programa Saúde da Família vem trazendo uma grande dificuldade
para a maioria dos municípios. Por se tratar de um programa do
Governo Federal, a realização de concurso público para admissão
de médicos, enfermeiros e demais agentes traz insegurança em
função do término do Programa, pois não se tem a garantia de que
seja permanente. A falta de repasse, pelo Governo Federal, dos
recursos para fazer face aos gastos com pagamento de pessoal
geraria dificuldades financeiras para os municípios, inviabilizando,
conseqüentemente, o cumprimento dos limites de gastos da LRF.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Para aqueles municípios que têm condições, por si só, de dar
continuidade ao Programa,
arcando com todos os custos, quando o mesmo for encerrado pelo
Governo Federal, o ideal é que realizem o concurso público.
Caso contrário, a forma mais adequada será a contratação
temporária para atender a necessidade de excepcional interesse
público, de que trata o art. 37, inciso IX da Constituição Federal.
É preciso atentar para o fato de que lei municipal deverá disciplinar
a matéria, inclusive estabelecendo o prazo de duração do contrato,
que poderá ser vinculado à existência do referido programa de
saúde.
APROVADO O VOTO DO CONSELHEIRO RELATOR,
UNANIMIDADE. IMPEDIDO O CONSELHEIRO EDSON ARGER.
POR
CONSULTA Nº: 716.388 DATA SESSÃO: 22/11/2006
AUTOR: PREFEITURA MUNICIPAL DE BOM JARDIM DE MINAS
RELATOR: CONSELHEIRO ANTÔNIO CARLOS ANDRADA
INDEXAÇÃO: MUNICÍPIO , REMANEJAMENTO , SERVIDOR PÚBLICO
MUNICIPAL , ATUAÇÃO , PROGRAMA , SAÚDE , FAMÍLIA ,
CONVÊNIO , GOVERNO FEDERAL , SUS, RECURSOS ,
POSSIBILIDADE , REMUNERAÇÃO , VENCIMENTOS , SUBSÍDIO ,
PAGAMENTO , CARGO EFETIVO , PRESTAÇÃO DE SERVIÇO ,
CONTRATAÇÃO , CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO ,
PESSOAL , NECESSIDADE , INTERESSE PÚBLICO.
EMENTA: MUNICÍPIO. PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA.
REMANEJAMENTO DE SERVIDORES MUNICIPAIS PERTENCENTES
AO SEU QUADRO PERMANENTE DA ÁREA DE SAÚDE PARA
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. POSSIBILIDADE. VENCIMENTOS.
PAGAMENTO COM OS RECURSOS CORRESPONDENTES AO SEU
CARGO EFETIVO.
“A douta Auditoria, por meio de parecer da lavra do Auditor Edson
Antônio Arger, apresentou estudo detalhado e bem fundamentado a
respeito da matéria em tela, o qual peço vênia para transcrever em
parte:
“No que concerne à questão de fundo submetida a esta Corte, por
primeiro, recomendável que se teçam algumas considerações acerca do
Programa de Saúde da Família – PSF, que constitui uma estratégia de
priorização das ações de promoção, proteção e recuperação da saúde
dos cidadãos e da família, do recém-nascido ao idoso, sadios ou
doentes, de forma integral e contínua.
Iniciada em 1991 a implantação de sua primeira etapa, com a instituição
do Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS, a partir de
1994, deu-se início à formação das primeiras equipes do PSF,
incorporando e ampliando a atuação dos Agentes Comunitários de
Saúde.
Com a necessidade de incentivar a sua organização em todos os
municípios brasileiros, estabeleceu-se um critério para a cobertura
populacional das equipes de saúde da família em um determinado
município, envolvendo, no financiamento de suas estratégias, além dos
recursos federais, recursos estaduais e municipais.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
No tocante à questão de “pessoal” suscitada pelo consulente, destaca-se
que as normas do PSF atribuem às unidades federadas executoras a
responsabilidade pela seleção, contratação e remuneração dos
profissionais integrantes das equipes de Saúde da Família (item 4.4 do
Anexo 02 da Portaria nº 1.886/97, que regulamentou a implantação e
operacionalização do PSF), o que significa que todas as pessoas que
exerçam atividades neste programa deverão estar vinculadas ao órgão
responsável pela Saúde.
Assim, entendo que, para prestar serviços junto ao Programa Saúde da
Família, a Administração pode, a seu critério, remanejar servidores
pertencentes ao seu Quadro Permanente da área da Saúde ou contratar
pessoal – vedada a possibilidade de terceirização, em consonância com
o posicionamento do Tribunal manifesto na Consulta nº 657.257,
relatada pelo Conselheiro Murta Lages na Sessão de 20.03.2002: “as
atividades a serem desempenhadas pelos profissionais contratados para
o PSF referem-se à atividade-fim do município, só podendo ser
desempenhadas por servidor ou empregado público de carreira.”
No caso de contratação de pessoal, por se tratar de um Programa
do Governo Federal, em que o gestor público não tem controle
sobre a sua duração, é recomendável a adoção da contratação
temporária para atender a necessidade de excepcional interesse
público de que trata o art. 37, inciso IX, da Constituição da
República, submetidos ao regime geral de providência social, a teor
do disposto no art. 40, § 13, da mesma fonte.
Neste caso, há que se registrar a necessidade inafastável de lei
específica, que deverá disciplinar a matéria, inclusive
estabelecendo o prazo da contratação, vinculado à duração do
referido Programa.”
VOTO
Diante do exposto, ratifico o entendimento de que, para prestar
serviços junto ao Programa Saúde da Família – PSF, a
Administração pode, a seu critério, remanejar servidores
pertencentes ao Quadro Permanente ou contratar funcionários, na
forma da contratação temporária para atender a necessidade de
excepcional interesse público de que trata o art.37, inciso IX, da
Constituição da República, submetidos ao regime geral de
previdência social, desde que haja lei específica.
APROVADO O
UNANIMIDADE.
VOTO
DO
CONSELHEIRO
RELATOR,
POR
REP 09/00009861
Assunto: Possível burla à exigência de concurso público mediante
terceirização de serviços e contratações temporárias nos exercícios de
2005, 2006 e 2007.
“Sucede que, conforme é possível apurar a partir da análise dos
documentos de fls. 8 a 16, as despesas mais excessivas registradas no
período em referência referem-se ao pagamento de pessoal temporário,
contratado para fazer face às necessidades decorrentes da manutenção
do PSF – Programa Saúde da Família, não ocorrendo, desta forma, a
irregularidade noticiada na Representação, posto que o procedimento da
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Unidade Gestora encontrava amparo na orientação do Prejulgado nº
1083/2002, deste Tribunal de Contas, assim redigido:
No caso do Programa da Saúde da Família – PSF e do Programa de
Agentes Comunitários de Saúde – PACS, ambos do Governo
Federal, em razão de não estar suficientemente consolidada a
perenidade dos Programas, a solução que se apresenta mais viável
no momento é a contratação temporária, mediante lei específica que
estabeleça as regras, os prazos de vigência dos contratos, a
remuneração, sua vnculação ao Regime Geral da Previdência
Social, entre outras normas pertinentes.
Tal orientação vigorou até meados de 2007, quando a matéria passou,
no âmbito desta Corte de Contas, a ser tratada em conformidade com o
Prejulgado nº 1867/2007.
Mas, mesmo com o advento da nova diretriz, ainda assim continuaram
sendo admitidas as contratações por tempo determinado, quando
tivessem por objetivo a garantia de manutenção dos programas acima
referidos, ou seja, o PSF e o PACS.
Florianópolis, 02 de março de 2012. Conselheiro Relator Salomão
Ribas Junior”
Colaciono, ainda, o julgamento da ADI nº 70008489858, quando o Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul, do mesmo modo se pronunciou:
ADIN. LEI MUNICIPAL QUE AUTORIZA A CONTRATAÇÃO
TEMPORÁRIA DE SERVIDORES PARA ATENDER PROGRAMAS
FEDERAIS DE SAÚDE FAMILIAR. EXCEPCIONAL INTERESSE
PÚBLICO. URGÊNCIA. NECESSIDADE TEMPORÁRIA. AÇÃO
JULGADA IMPROCEDENTE, POR MAIORIA.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes do Tribunal Pleno do
Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em julgar improcedente a
ação, vencidos os Desembargadores Relator, Antonio Carlos Stangler
Pereira, Araken de Assis, Paulo Moacir Aguiar Vieira, Vasco Della
Giustina e João Carlos Branco Cardoso. Redator para o acórdão o
Desembargador Ranolfo Vieira. Não participou do julgamento, por
motivo justificado, o Desembargador Antonio Carlos Netto Mangabeira.
Impedido o Desembargador Marcelo Bandeira Pereira.
Porto Alegre, 01 de agosto de 2005.
O Procurador-Geral de Justiça ajuíza ação direta de
inconstitucionalidade objetivando a retirada do ordenamento jurídico
das leis de nºs 593/2001 e 670/2003 do Município de São José do
Hortêncio por afronta aos artigos 8º e 19, IV, da Constituição Estadual.
Diz, de saída, o seguinte:
As Leis Municipais nº 593/2001 e nº 670/2003 de São José do
Hortêncio dispõem sobre a contratação temporária de
médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem, agentes
comunitários de saúde, cirurgião dentista e atendente de
consultório dentário, irregularmente.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Com efeito, o Município de São José do Hortêncio vem-se
valendo da contratação temporária de servidores, ora
prorrogando indefinidamente os contratos, ora autorizando
sua vigência por prazo, na prática, indeterminado, em
desacordo com as Constituições Federal e Estadual, que
apenas admitem a dispensa de concurso público para a seleção
de candidatos, para além das hipóteses de provimento de cargos
em comissão, destinados a função de chefia, assessoramento e
direção, de modo excepcional.
Cita o art. 37, IX, da Constituição Federal e aduz que tal texto
demonstra o caráter excepcional dessa categoria de servidores
públicos temporários, uma vez que a regra é que a investidura em
cargo ou emprego público dependa de concurso (art. 37, II).
O Sr. Prefeito Municipal ofereceu as informações de fls. 51/63.
Quanto aos Agentes Comunitários/Agentes Comunitários de Saúde diz
o seguinte:
O Município não possui em seus quadros a figura do agente de
saúde, pois a duração do programa federal é indeterminada.
Logo, não poderia realizar concurso público para o
preenchimento de tais vagas, sob pena de inchamento na folha
de pagamentos. Com o término do programa federal tais
servidores não teriam mais trabalhos a realizar, no entanto
permaneceriam no quadro do Município, recebendo salários e
todos os encargos e direitos a eles garantidos, sem se falar na
futura aposentadoria.
Quanto à Auxiliar de Enfermagem e demais profissionais de saúde diz:
Igualmente esses profissionais foram contratados pelas
legislações que o MP pretende derrubar através da presente
medida, devido à necessidade urgente de prestar atendimento
médico à população de forma eficiente, dentro do Programa de
Saúde Familiar – PSF, ou seja, programa temporário do
Governo Federal.
Portanto, mais do que provada a urgência e a necessidade dessas
contratações não devendo o Administrador sofrer qualquer tipo de
sanção por parte do Poder Judiciário.
Assim todas as contratações realizadas foram para atender
necessidades urgentes e necessárias ao interesse público e ao
atendimento da população, passamos a analisar a legalidade de todas
as contratações.
A Dra. Procuradora-Geral do Estado lançou a manifestação de fl.
70, pedindo a improcedência da ação, invocando o artigo 2º, da
Constituição Federal.
O Dr. Procurador-Geral de Justiça lançou manifestação final de fls.
74/76 pela procedência da ação.
É o relatório.
VOTO
DES. RANOLFO VIEIRA (REDATOR PARA O ACÓRDÃO)
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
Eminente Presidente, foi esclarecido que se tratam de programas
federais, programa de saúde da família, programa de saúde bucal,
também da família. O Município faz um convênio com a União e, para
atender a esse convênio, precisa de servidores.
Não pode fazer um concurso para, por exemplo, agente comunitário de
saúde, pois onde vai ser colocado esse pessoal quando terminar o
convênio? Terminou o prazo do convênio, não há nada a fazer. Não
existe, normal e permanentemente, no Município função
correspondente a tal atividade.
Esta é realmente matéria de interesse público, de urgência e
temporária, ou seja, está perfeitamente ajustada ao princípio
constitucional correspondente, por isso estou votando pela
improcedência da ação.
DES. ARMINIO JOSÉ ABREU LIMA DA ROSA – Senhor Presidente,
nós tivemos aqui precedentes- é o caso do Hospital da Brigada, em
que tanto eu quanto o Des. Vasco fomos Relatores. Fui o Relator do
primeiro caso, em que aquela contratação de médicos, de enfermeiros
em hospitais de Porto Alegre e Santa Maria já vencera há décadas.
Mas, essa é uma hipótese, essa é uma situação; a outra, é a do caso
concreto, em que a contratação me parece tipicamente temporária,
porque é vinculada a determinado programa que tem início e fim,
sendo o caso nítido de contratação temporária constitucionalmente
assegurada.
Este Órgão Especial, na sessão passada, em que fui Relator, apreciou
leis do Município de Santo Augusto, e, relativamente a cargos de
engenheiro e médico, a maioria teve por constitucionais e, quanto a
cargo de psicólogos, inconstitucional. A eminente Des.ª Maria Berenice
e mais alguns votos tiveram por constitucional a lei do Município de
Santo Augusto quanto à contratação temporária de profissionais da
área da Psicologia, na semana passada. Portanto, aqui eu
acompanho inteiramente a dissidência: é caso típico de
contratação temporária.”
Como se percebe, as decisões supracitadas se concentram na órbita da
insegurança dos gestores em relação aos compromissos futuros, no tocante a
perenidade do PSF.
Neste passo, alinho-me às decisões acima esposadas, entendendo pela
regularidade da contratação temporária de profissionais de saúde para
trabalharem na Estratégia Saúde da Família.
[...]
O Ministério da Saúde criou as normas e diretrizes do Programa de Agentes
Comunitários de Saúde e do Programa de Saúde da Família pela Portaria 1.886
de 18 de dezembro de 1997, cujos objetivos foram fortalecidos pela Portaria GM
nº 399, de 22 de fevereiro de 2006.
Um programa criado por Portaria Ministerial padece, a meu ver, de garantia
de perenidade, embora pareça óbvia a necessidade de sua manutenção.
Porém, não é inafastável a hipótese, mesmo que remota, de interrupção do
programa ou de uma diminuição dos repasses em seu financiamento ou, ainda,
da consolidação do subfinanciamento tão conhecido na área de saúde no Brasil.
Por isso, não reputo razoável, sobretudo num momento de instabilidade fiscal
dos entes, prover tais áreas com quadro de servidores efetivos. A criação de
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
vínculo permanente numa situação que pode ser temporária mostra-se
extremamente arriscada para a saúde financeira dos municípios.
Nunca é demais lembrar que a posse de um servidor concursado é um
contrato que a administração pública assume, em nome do contribuinte,
por pelo menos MEIO SÉCULO e, a meu ver, tal providência somente tem
lugar quando houver certeza de que os compromissos presentes e futuros
serão suportados pelo CAIXA, razão da existência de qualquer gasto
público responsável.
Com todo respeito, penso ser nossa missão institucional deslindar o conteúdo
dos autos sem fechar os olhos ao contexto que o envolve. Mas vou além.
Devemos calcular, com indispensável precisão, as consequências das nossas
decisões na solidez fiscal das instituições sob nossa responsabilidade. No meu
entender, o melhor caminho é a ponderação dos Princípios que regem a
Administração Pública.
[...]
Desse modo, por coerência, ratifico também a determinação vertida nos votos
786/2013 (processo TC 1158/09) e 606/2014 (processo TC 8013/2007), de
“determinar a suspensão da aplicabilidade do item 4.2 – Formas de
Contratação, do Manual de Orientação Para o Estado e Municípios Capixabas
sobre a Gestão das Ações e Serviços Públicos de Saúde – Res. TC 216/2007
com sua respectiva adequação às disposições da Portaria nº 2.488, de 21 de
outubro de 2011, do Ministério da Saúde, que “aprova a Política Nacional de
Atenção Básica estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a
organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e
o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS)”.
Afasto, na forma do exposto, as irregularidades apontadas pela Área Técnica,
constantes nos tópicos sob análise – itens 2.16, 2.17 e 2.18 da ITC.
III – CONCLUSÃO
Na forma do exposto, divergindo em parte do entendimento da área técnica e do
MPEC, VOTO para que este Colegiado profira a seguinte Decisão:
1)
Converter, preliminarmente, os presentes autos em tomada de contas
especial em face da existência de dano ao erário, presentificado no item 2.4 da
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
ITC, no montante de R$64.348,42, equivalente a 35.526,10 VRTE, na forma do
artigo 57, inciso IV, da Lei Complementar 621/201232;
2)
Afastar as seguintes irregularidades, tendo em vista a ausência de nexo
de causalidade entre a ação do Sr. Aluizio Carlos Correa e as falhas apontadas,
insuficientes a responsabilizá-lo, na forma da fundamentação exposta neste
voto:
ITEM 2.1 da ITC - Ausência de plano de trabalho e omissão no dever de
cobrar a prestação de contas
Infringência: Artigo 116, § 1º, Inciso I a VI, da Lei nº 8.666/93 e Parágrafo
único do artigo 70 da Constituição Estadual
ITEM 2.5 da ITC - Ausência de licitação – aditivo firmado com a empresa
M.G. de Oliveira Milhorato Ltda.
Infringência: Inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal c/c artigo 2º da
Lei 8.666/93
ITEM 2.8 da ITC - Inobservância ao Princípio da Publicidade
Infringência: Lei 8.666/93 – caput do Artigo 3º c/c Artigo 21
ITEM 2.9 da ITC -- Inobservância ao limite da modalidade licitatória
Infringência: Art. 23, inciso I, da Lei 8.666/93
3) Afastar as irregularidades dispostas nos itens 2.2, 2.7 e 2.15 da ITC, em
consonância com o entendimento da área técnica;
4) Em dissonância com o entendimento da área técnica, vertido na ITC, afasto
as irregularidades contidas nos itens 2.3, 2.10, 2.11, 2.13, 2.14 2.16, 2.17 e 2.18
da ITC em comento, na forma fundamentada neste voto;
5)
Afastar o ressarcimento apontado no item 2.6 da ITC, em decorrência da
ilegitimidade do dano presumido, bem como da vedação do enriquecimento
ilícito por parte da Administração Pública, mantendo, contudo, a irregularidade
do tópico, ante a não caracterização da razoabilidade e economicidade no
quantitativo de materiais de consumo pagos pela municipalidade:
ITEM 2.6 da ITC - Despesas sem finalidade pública, contrariando o
princípio do interesse público – Pregões 059/2007 e 075/2008
Infringência: artigo 32, caput, da Constituição do Estado do Espírito Santo
32
Artigo 57 Na fase de instrução, havendo indícios de irregularidade, cabe ao Tribunal de Contas ou ao Relator:
(...)
IV – converter, se for o caso, o processo em tomadas de contas especial, se configurada a ocorrência de desfalque,
desvio de bens ou outra irregularidade de que resulte dano ao erário.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
6)
Encaminhar as seguintes determinações à Prefeitura Municipal de
Presidente Kennedy, nos termos do art. 151, §1º, c/c o art. 195, ambos da
33
Resolução TC 261/13 :


7)
Adote medidas de regularização dos bens patrimoniais, no levantamento e
registro contábil, viabilizando a correção das falhas (Item 2.10 da ITC), a ser
comprovada na próxima prestação de contas anual a ser encaminhada a este
Tribunal, cabendo à SEGEX o seu monitoramento;
Adote medidas de regularização do registro do imóvel desapropriado
(localizado à Rua Projetada, s/nº, loteamento Praia de Marobá), mediante
lavratura da devida escritura pública (itens 2.13 e 2.14 da ITC), cujo
comprovante deve ser apresentado na próxima prestação de contas anual a
ser encaminhada a este Tribunal, também cabendo à SEGEX o
monitoramento deste ponto.
Julgar irregulares as presentes contas, com base no art. 84, III, “c” e “e” da
LC 621/12, condenando o responsável, Sr. Aluizio Carlos Correa, a ressarcir
ao erário municipal o valor correspondente a 35.526,10 VRTE, em decorrência
do dano presentificado no item 2.4 da ITC;
8)
Pela aplicação de multa ao prefeito, Sr. Aluizio Carlos Correa, no valor
correspondente a 5.000 VRTE, com base no art. 62 e 96, inciso II, da LC
32/1993, legislação aplicável à época dos fatos, tendo em vista as
irregularidades contidas nos itens 2.4, 2.6 e 2.12 da ITC, acima referenciados.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos do Processo TC-2873/2009, ACORDAM os
Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, em sessão
plenária realizada no dia vinte e quatro de março de dois mil e quinze:
33
Art. 151. Os órgãos e entidades de que tratam o art. 150, com vistas a subsidiar o exame das contas e o exercício do
controle e da fiscalização, deverão encaminhar bimestralmente ao Tribunal as suas informações relativas aos registros
analíticos de gestão e da execução orçamentária, financeira e patrimonial, e só por decisão deste poderão ser
dispensadas dessa responsabilidade. (...)
§ 1º As informações de que tratam o caput deste artigo proverão o Tribunal de dados analíticos e atualizados da
execução orçamentária, financeira, patrimonial e da gestão, possibilitando o exercício do controle e fiscalização, seu
acompanhamento, monitoramento e a produção de relatórios para suporte à fiscalização e à apreciação ou julgamento
das contas.
Art. 195. Para o exercício do monitoramento, o Tribunal, por meio da Secretaria Geral de Controle Externo, manterá
cadastro que contenha as recomendações, ressalvas e irregularidades constatadas em suas deliberações, organizadas
por entidades jurisdicionadas.
ACÓRDÃO TC-258/2015
jm/
1. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun, Converter, preliminarmente, os presentes autos em tomada de
contas especial em face da existência de dano ao erário, presentificado no item
2.4 da ITC, no montante de R$64.348,42, equivalente a 35.526,10 VRTE, na forma
do artigo 57, inciso IV, da Lei Complementar 621/2012;
2. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun afastar as seguintes irregularidades, tendo em vista a ausência
de nexo de causalidade entre a ação do Sr. Aluizio Carlos Correa e as falhas
apontadas, insuficientes a responsabilizá-lo, na forma da fundamentação exposta
neste voto: a) TEM 2.1 da ITC - Ausência de plano de trabalho e omissão no dever
de cobrar a prestação de contas; b) ITEM 2.5 da ITC - Ausência de licitação - aditivo
firmado com a empresa M.G. de Oliveira Milhorato Ltda.; c) ITEM 2.8 da ITC Inobservância ao Princípio da Publicidade; e d)
ITEM
2.9
da
ITC
Inobservância ao limite da modalidade licitatória;
3. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun, afastar as irregularidades dispostas nos itens 2.2, 2.7 e 2.15
da Instrução Técnica Conclusiva 1887/2013, em consonância com o
entendimento da área técnica;
4. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun, em dissonância com o entendimento da área técnica, vertido
na supracitada ITC, afastar as irregularidades contidas nos itens 2.3, 2.10,
2.11, 2.13, 2.14 2.16, 2.17 e 2.18 da aludida Instrução Técnica Conclusiva, na
forma fundamentada no voto do relator;
5. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun, afastar o ressarcimento apontado no item 2.6 da já
apontada ITC, em decorrência da ilegitimidade do dano presumido, bem como
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da vedação do enriquecimento ilícito por parte da Administração Pública,
mantendo, contudo, a irregularidade do tópico, ante a não caracterização da
razoabilidade e economicidade no quantitativo de materiais de consumo pagos
pela municipalidade. Vejamos o que dispõe o referido item: ITEM 2.6 da ITC Despesas sem finalidade pública, contrariando o princípio do interesse público
Pregões 059/2007 e 075/2008;
6. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun, determinar à municipalidade de Presidente Kennedy que: a)
adote medidas de regularização dos bens patrimoniais, no levantamento e
registro contábil, viabilizando a correção das falhas (Item 2.10 da ITC), a ser
comprovada na próxima prestação de contas anual a ser encaminhada a este
Tribunal, cabendo à SEGEX o seu monitoramento; e b) adote medidas de
regularização do registro do imóvel desapropriado (localizado à Rua Projetada,
s/nº, loteamento Praia de Marobá), mediante lavratura da devida escritura
pública (itens 2.13 e 2.14 da ITC), cujo comprovante deve ser apresentado na
próxima prestação de contas anual a ser encaminhada a este Tribunal, também
cabendo à SEGEX o monitoramento deste ponto;
7. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun, julgar irregulares as presentes contas, com base no art. 84,
III, “c” e “e” da LC 621/12, condenando o responsável, Sr. Aluizio Carlos Correa,
a ressarcir ao erário municipal o valor correspondente a 35.526,10 VRTE`s,
em decorrência do dano presentificado no item 2.4 da apontada ITC;
8. Por maioria, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio Freire
Farias Chamoun, aplicar multa ao responsável, Sr. Aluizio Carlos Correa, no
valor correspondente a 5.000 VRTE`s, com base no art. 62 e 96, inciso II, da LC
32/1993, legislação aplicável à época dos fatos, tendo em vista as
irregularidades contidas nos itens 2.4, 2.6 e 2.12 da Instrução Técnica
Conclusiva 1887/2013;
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9. À unanimidade, nos termos do voto do Relator, Conselheiro Rodrigo Flávio
Freire Farias Chamoun, arquivar os presentes autos, após o trânsito em
julgado.
Parcialmente vencido o Conselheiro Sebastião Carlos Ranna de Macedo, que
votou no sentido de acompanhar o entendimento exarado pela Área Técnica.
Fica o responsável, no prazo de trinta dias, contados a partir da publicação deste
Acórdão, obrigado a comprovar perante o Tribunal o recolhimento do débito e da
multa aplicada, nos termos do art. 454, inciso I, do Regimento Interno deste
Tribunal.
Composição Plenária
Presentes à sessão plenária de julgamento os Senhores Conselheiros Domingos
Augusto Taufner, Presidente, Rodrigo Flávio Freire Farias Chamoun, Relator,
Sebastião Carlos Ranna de Macedo, Sérgio Aboudib Ferreira Pinto, José Antônio
Almeida Pimentel e o Conselheiro em substituição Marco Antonio da Silva. Presente,
ainda, o Dr. Luciano Vieira, Procurador Especial de Contas em substituição ao
Procurador-Geral do Ministério Público Especial de Contas.
Sala das Sessões, 24 de março de 2015.
CONSELHEIRO DOMINGOS AUGUSTO TAUFNER
Presidente
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CONSELHEIRO RODRIGO FLÁVIO FREIRE FARIAS CHAMOUN
Relator
CONSELHEIRO SEBASTIÃO CARLOS RANNA DE MACEDO
CONSELHEIRO SÉRGIO ABOUDIB FERREIRA PINTO
CONSELHEIRO JOSÉ ANTÔNIO ALMEIDA PIMENTEL
CONSELHEIRO MARCO ANTONIO DA SILVA
Em substituição
Fui presente:
DR. LUCIANO VIEIRA
Procurador Especial de Contas em substituição ao Procurador-Geral
Lido na sessão do dia:
ODILSON SOUZA BARBOSA JUNIOR
Secretário-Geral das Sessões

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