I - Telencéfalo

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I - Telencéfalo
Aula desgravada de Neuroanatomia
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Prof. Barbosa
Há uma relação muito estruturada entre os principais núcleos grupos talâmicos de
núcleos e determinadas áreas do córtex:
ƒ
o núcleo dorsomedial, nomeadamente o componente magnocelular, tem conexões
extremamente marcadas com o córtex pré-frontal;
ƒ
o núcleo anterior tinha conexões com a parte límbica, razão pela qual “esta seta se vai
esbatendo” como já vimos na última aula.
Por outro lado, lembram-se também que a parte mais posterior do tálamo chama-se
polvina, o núcleo dorsal lateral do tálamo tem conexões basicamente de associação
parietotemporais, nomeadamente visuais.
No conjunto dos núcleos ventrais-laterais temos o núcleo lateral com uma parte dorsal e
uma parte ventral. O ventral anterior projecta-se, basicamente, para mais perto da circunvolução
pré-central (pré-motora), que é a área 6. O ventral intermédio é um núcleo de projecção
electiva para a área motor primária e depois de VPL e VPM e, no fundo, as zonas de terminação
dos lemniscos, com projecção, basicamente, para a estrutura pré-central – áreas 3, 1 e 2.
Estas projecções conhecidas há tanto tempo, basicamente fruto do estudo de AV
corticais dos córtex dos doentes que depois autopsiavam e viam que quando mediava entre a
morte e a autópsia muito tempo viam qual a parte do tálamo que estava atrofiada e assim
construíam estes mapas de relação tálamocortical e corticotalâmica, que são conhecidos desde
o séc. passado com uma determinada minúcia. Aliás os cientistas da época do séc.XVIII, fins do
séc.XVIII, princípios do séc.XIX à cabeça das quais se encontrava um homem chamado Frenel,
que tinha de encontrar para cada função que se executasse uma determinada área cortical era
muito grande e elaboraram-se com aspectos meramente exteriores mapas os mais complexos
que vocês podem imaginar e ele a olhar para isto, podem ver que por exemplo, aqui estava a
benevolência, aqui a moderação, firmeza, comportamento parental, indisciplina que não tinha
pés nem cabeça.
Mas a necessidade de pôr uma certa ordem de cada área ter o seu local era muito
grande. Mas o que é mais bizarro, no meio disto tudo, também é que os seguidores de Frenel,
no fundo, nunca desapareceram e continuaram, só que modificaram as suas teses e não
descurando, por exemplo os estudos de Broca, foram evoluindo num sentido de predição, quer
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dizer, no fundo eles acreditavam que uma área da fala estava em determinado sítio que dentro
em pouco vamos ver (áreas 44 e 45) da perissílvica.
Os seguidores de Frenel no decurso da implantação dos totalitarismos da 1ª metade do
século passado (séc. XX) diziam que pelo aporte, pelo traço dos crânios das faces era previsível
saber qual a raça e dentro de cada raça saber quais os superiores e os inferiores. Obviamente
isto foi muito aproveitado pelas doutrinas ligadas ao eixo, portanto ao Japão, nomeadamente à
Alemanha e até Mussolini (Itália) e até andou metido dentro disto e houve um novo
frenelianismo, que teve consequências absolutamente desastrosas, partindo do princípio que a
raça ariana era aquela que tinha o crânio mais perfeito e as determinações mais perfeitas.
Com o aparecimento da metodologia histológica em primeiro lugar, uma vez que a
histologia precedeu sempre a fisiologia, a forma precedeu a função com base no estudo das 6
camadas do córtex heterotípico e as 3 camadas dos córtexes halotípicos. Então conseguiram ver
pequenas nuances que levaram muitos autores a poder dizer, esta área, apesar de ter 6
camadas, é ligeiramente diferente desta e da outra. Reparem que não estou a referir-me
exclusivamente àquilo que dentro de um isocórtex ou um neocórtex, um homotípico e um
heterotípico. Por exemplo: dentro de um homotípico, com 6 camadas típicas, com os 6 extractos,
haver um maior nº de células de Martinoti, grânulos maiores, em maior nº; quer dizer pequeninas
nuances que levaram a um mapeamento do córtex cerebral. Tal foi possível utilizando 3 métodos
ainda hoje em vigor:
ƒ
O Método de Golgi permite a visualização de todo o neurónio (é único método),
pintando cerca de 10% dos neurónios.
ƒ
O método de Nisel (baseado em contrastes básicos que fixam o citoplasma e não o
núcleo das células, dando uma visão muito global da espessura das camadas, do nº
de células e, por último, o tipo de aferências de determinada zona).
ƒ
O método de Weigert pinta só feixes de mielina.
Estes métodos permitiram encontrar diferenças histológicas que levaram ao
mapeamento do córtex cerebral. O 1º mapeamento científico do córtex cerebral, a 1ª vez que
alguém disse que há uma área do córtex cerebral diferente das outras foi o Genari, na 1ª metade
do séc. XVIII, que corresponde a uma estria, que é a estria interna de Berlarger do córtex visual,
que dava a espessura da camada 4 e ao pouco nº de células da camada 5, vêem-se 2 bandas –
as bandas de Berlarger. A 1ª vez foi descrita pelo Genari, que foi de facto a 1ª pessoa a mapear
o córtex.
Bom, mas depois, quem mais empenhadamente se dedicou a este mapeamento foi um
casal de alemães: Óscar Voght que, curiosamente, para aqueles que gostam de história da
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Medicina, foi um doutor “onoris causa” da FMUP. Encontraram 223 áreas, que é uma coisa
absurda e idiota, mas que de qualquer das maneiras, inclusivamente, foram depois chamados
pelo Lenine e Estaline para criar um centro de neurociências onde se estudasse o que de
diferente tinha o cérebro do Lenine. Estudaram e centralizaram em Moscovo, com dezenas de
cientistas de primeiríssima área e lá fatiaram o cérebro do Lenine e publicaram imensos artigos
sobre o assunto, onde mostravam diferenças entre o córtex de associação que depois de glasnot
(queda do muro de Berlim), após revisão dos artigos, verificou-se que foi uma grande fraude,
como aqueles que estudaram o cérebro de Einstein.
O homem que pela 1ª vez fez um mapeaento muito exaustivo – mapa de Broadman –
que é o que é utilizado ainda hoje e continuará a ser muito utilizado pelos neurologistas.
O mapa de Broadman é de base histológica, mas já tem um componente fisiológico.
Divide-nos o sulco central e o sulco lateral. Para o lobo frontal marca aqui 2 áreas: 4 e 6, que
são áreas pré-centrais do lobo frontal e para a frente tem uma outra que é a 8, que está
próxima destas. Estas áreas foram conotadas com áreas motoras. Para a frente do lobo temos
o cunho da alta diferenciação humana, que é a região pré-frontal. A pré-central é a área 4 que
é a área motora, a área 6 que é a área pré-motora e a área 8 que é a área suplementar.
Existe um frontal dorsal, que é muito ligado a aspectos viscerais e um dorsal ventral que
é orbitário, que é ligado a aspectos comportamentais.
Na parte posterior da região parietal, do sulco central tem as áreas 3, 1, 2 (muito juntas).
A 3, 1, 2 é a área sensitiva principal e depois, mais atrás, tem a área 5 que é a área sensitiva
secundária. Há também uma área somatosensitiva da mesma maneira que há uma
somatomotora. O somato quer dizer: o corpo que está ali representado (há uma representação
ordenada no corpo naquelas áreas corticais).
Estas áreas motoras e sensitivas estão à volta do sulco lateral, coma sua angular e a
sua marginal. Tudo isto aqui à volta é uma zona curiosa, do ponto de vista, de aferências
primárias sensoriais e, por isso, se chamam zonas perissílvicas do córtex, que ali se chamam
incisura sílvica. A base, o pé desta área 44 e 45 desta zona, área de Broca, é a área da
motricidade da fala. A área 39 e 40 são a área de Wernicke, que é a área da compreensão da
fala.
A área 41 e 42 são as áreas da audição (primária e secundária).
Temos um córtex de associação muito grande (fronto), um outro córtex enorme de
associação fronto-parieto-occipital. O córtex fronto-parieto-occipital é imenso. É o que faz a
diferença entre o nosso cérebro e o cérebro de espécies que rotulamos de inferiores.
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Áreas primárias – áreas que recebem informação vindas directamente do tálamo ou
têm uma resposta directamente de determinadas áreas. Na parte medial, na parte motora falta o
bordo superior e a área pré-motora aqui fica o lobo frontal superior que passa e ultrapassa o
bordo superior do cérebro e depois tem em comum a área primária, dado que é uma área muito
profunda que se encontra em plena fissura calcarina (uma fissura completa que deixa marca no
ventrículo – calcaravis) que é a área visual primária, ou área 17, é aquela que recebe
directamente do corpo geniculado lateral.
A área primária 17 (confere-nos a possibilidade de perceber que se está a ver um
objecto), isto é, quando nós estamos a olhar para alguma coisa e essa percepção é-nos dada
pala área 17 e quando está destruída, deixamos de ver – síndrome de ………. Ver não quer
dizer que seja colocar no seu ambiente.
As áreas 18 e 19 que rodeiam a 17, são áreas de associação visual. Há uma área
primária designada por córtex visual primário ou córtex estriado, porque tem uma estria muito
grande e assim, as camadas 4 e 5 a camada 4 com estria, certa camada 4 tem tantos grânulos
responsáveis por uma organização colunar do córtex. Essa camada 4 tem inúmeras colunas.
São essas colunas que nos dão as cores, que nos dão a velocidade, que nos dão o sentido em
que se está a dirigir os nossos olhos, etc.
À volta tem as áreas que se juntam e que dão outro colorido à estrutura que estamos a
ver, que são as áreas para e periestriadas (para a 18 e peri a 19). Isto é, cada vez menos
conotadas com a visão. Aliás, hoje em dia, quem se interessa nesta coisa da visão, é uma coisa
que merece que alguns oftalmologistas se dignassem de uma vez por todas a partir do princípio
que para trás do globo orbitário existe uma coisa que se chama fita óptica, que tem uma
importância enorme e é uma das partes do cérebro mais estudada hoje em dia: existem grupos
fortíssimos que se dedicam ao estudo deste trajecto e do córtex em si, que é inevitavelmente o
maior complexo do córtex cerebral.
Eu digo-vos que, sendo o córtex visual nomeadamente tudo aquilo que está dentro da
incisura calcarina, um área que tem 3% das áreas do córtex, tem 10% de neurónios.
Em todas as partes do córtex se meterem uma agulha e tirarem um cilindro de córtex e
contarem os neurónios vêm que tem cerca de 60.000 a 100.000, conforme os livros. O Pauel foi
quem descreveu isto, diz que são 60.000, no Nolte diz 100.000. De qualquer maneira 1 cilindro
de 1 mm3 de córtex, qualquer que seja a sua área terá ou tem 60.000 neurónios. Se meterem no
córtex visual, tem o dobro; portanto o nº de células que há no córtex visual mostra bem a
complexidade desta zona. Existem até 2 romances (ficção científica), mas mais elaborados, de
um homem que eu considero que, mais dia, menos dia, irá ganhar o Prémio Nobel que é um
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indivíduo chamado Zeki. Este senhor diz que existe uma área visual artística. Quem tem o dom
de poder na realidade, no fundo vir a ter, como a Paula Rego, por exemplo, terá uma área, que é
a área 5 visual, que no fundo será maior que as outras áreas. Eu não acredito nisso, mas eles lá
dizem e, portanto, eu tenho que vos dizer que isso acontece, que existe uma estrutura, uma
fronteira sobre a qual o comum dos mortais não passará, se não tiver essa área muito
individualizada.
Este é um mapa que continua, portanto, em função. Será baseado nestes mapas que eu
vos direi e vos perguntarei a maior parte das coisas, se bem que não deixarei de repetir as
outras designações do córtex em si, porque são muito fáceis. E se fizer uma pergunta ou
perguntas onde disser áreas visuais e se puser área visual 17, ponho área visual primária
também e ponho área visual secundária e terciária 18 ou 19, não haverá problema por isso.
Esta é uma figura que vem do Gray e agora vocês têm possibilidades de perceber muito
bem que as correspondências, reparem aqui o ventral anterior para a área pré-motora, o ventral
intermédio lateral para a motora, aqui este ventral posterior para a área sensitiva, portanto, para
a área 3, 1 e 2, vêem depois a amarelo o dorsal medial para o pré-central e vêem depois aqui o
polvina para esta zona de associação parietotemporal.
Aliás, portanto, dorsal medial e polvina são os principais núcleos de associação do
tálamo, verdadeiros núcleos de associação que não relai puro.
Sabem o que é o núcleo de associação e o relai e o que caracteriza fisiologicamente
cada um deles? E um núcleo de associação? No núcleo de associação há uma filtragem de
informação. Há um tonic, um saco tónico dos neurónios que é diferente em número que é o burst
que é diferente do mode.
Isto é só para vocês perceberem, que estando o tálamo aqui como um ovo, se vocês
virem aqui a sua casca percebem a importância modeladora do núcleo reticulado do tálamo.
Através do núcleo reticulado do tálamo passam todas as fibras que se dirigem ao córtex e todas
as fibras do córtex que se dirigem para o tálamo. O que é facto, é que sendo, o núcleo reticulado
do tálamo, uma estrutura 100% inibitória, os seus dendritos são isodendríticos (como são a
maiorias dos inibitórios) tem uma importância muito grande na modulação do típico tonic mode
dos núcleos talâmicos. O burst nem tanto, porque são descargas muito curtas e muito rápidas. O
tonic mode depende e muito do input GABAérgico que os núcleos reticulares mandam para os
núcleos do tálamo. Quer dizer, o tálamo não manda só tudo para o córtex, manda também fibras
para os núcleos reticulares e os núcleos reticulares recebem fibras GABAérgicas inibitórias. Isto
é muito complexo, mas é mesmo para se saber assim e para ficarem com uma ideia que as
coisas não são assim tão esquematizadas como está aqui ao lado.
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Quando vos mostrei o Broadman, disse-vos que havia no 4, uma área motora e no 6
uma área sensitiva. E que no sensitivo, a área 3 – área sensitiva primária e a área 2 – área
sensitiva secundária. Estas estruturas, que estão ali, representam, de facto, as partes do corpo
como o local onde se projectam, no caso sensitivo ou donde parte a informação no caso motor
das diversas partes do corpo, doutra maneira, quando eu quero dar uma ordem à minha mão
para este gesto, que neurónios são postos em movimento? É o que está ali representado: uma
mão, e uma mão muito grande. Vêem, por outro lado, que os movimentos de língua, lábios,
músculos da laringe ocupa uma área imensa, muito diferente da que vai entre a cabeça e a mão,
que é o tronco – os movimentos que possa fazer diferenciados, são, de facto, pequenos, o
mesmo se acontece com o pé (é grande, mas é mais pequeno que a perna, portanto, o que faz a
representação cortical ter uma determinada dimensão, que no que respeita à ordenação da parte
sensitiva que recebe quer a informação de determinadas zonas, não é o tamanho (se fosse o
tamanho, a área mais representativa, seria a toracoabdominal), é, sim, o detalhe do movimento
ou a finura da sensibilidade que lá chega. A esta disposição humana somatotópica que vocês
vêem aqui distorcida, por isso se chama homúnculo. Homúnculo motor é a forma distorcida da
representação motora do corpo humano do córtex e homúnculo sensitivo é a parte sensitiva
correspondente. Com base nisso, um homem chamado Hughlin Jackson (princípio do século
passado, brilhante neurologista) conseguiu perceber e fez este mapeamento com base nas
chamadas crises epilépticas focalizadas (que hoje têm o seu nome - jacksoniano). Verificou que
determinadas áreas do corpo humano, no caso de haver pontos de partida, as convulsões
epilépticas geralmente têm, ao fim de algumas vezes, previsibilidade – a pessoa consegue
prever que vai ter uma crise epiléptica, são as chamadas auras epilépticas, que podem ser dores
de cabeça, podem ser alterações visuais, podem ser alterações comportamentais e outras
podem ser alterações motoras e pode começar, por exemplo, por movimentos anormais. E muito
frequentemente, ele observou isso em pacientes epilépticos não tratados, que os havia, o que
acontecia era que as áreas mais frequentes onde começavam as primeiras alterações de
movimentos motoras eram precisamente nos dedos, nas mãos e nos lábios. E isso levou a que
eles supusessem que as áreas mais representadas no córtex eram precisamente as áreas da
face e as áreas da mão, o que correspondia perfeitamente à realidade. Portanto isto ficou a
dever-se a Hughlin Jackson, nos primeiros anos deste século. E assim se ficaram a conhecer
hoje as crises epilépticas focalizadas que são, basicamente, de origem temporal. Começam por
uma determinada parte e depois extendem-se a outras áreas.
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Vamos agora tratar de uma zona, de uma área, que antes de falar dos outros tipos de
mapeamento e do que considero que deveria ser mais correcto, eu queria dedicar algum tempo
àquilo que nos distingue, basicamente, das outras espécies, nomeadamente, a capacidade de
falar, abstrair, de inventar, para não usar o termo criar. As áreas que estão ligadas à nossa
capacidade de falar são estas que se encontram aqui na base da circunvolução frontal inferior, à
volta do sulco anterior ascendente e o posterior – 44 e 45 – ditas áreas de Broadman e quando
há uma lesão aqui nesta zona, a pessoa consegue perceber o que lhe estão a perguntar, mas
não consegue falar, nem se consegue exprimir e portanto nós estamos perante uma afasia
motora ou uma afasia de Broca, porque esta afasia motora de Broca é uma afasia que
depende exclusivamente duma lesão específica destas zonas e o indivíduo percebe tudo, isto é,
afasia – é quando nós não conseguimos conotar ou a fazer a correlação entre o símbolo que
queremos designar: pôr a mesa com a mesa, isto é, quando nós não conseguimos (porque nós
aprendemos isto ao longo da nossa vida) cada estrutura tem um conceito que pode ser abstracto
(quando não consigo conotar mesa ao conceito mesa).
Quando há lesão destas áreas 44, 45 – áreas de Broca, nós dizemos que há uma
alteração dos programas de génese motora (no caso dos papagaios que falam, note-se que eles
não têm uma simbologia, têm antes uma adaptação).
Aqui não há uma estrutura que corresponde a um símbolo e essa incapacidade que nós
temos de enunciar esse símbolo chama-se a afasia motora de Broca, fruto de lesões que
dependem, na maior parte das vezes, a lesões da a. cerebral média; os doentes querem mesmo
dizer, começam a chorar, desesperam, percebem tudo o que o médico diz e não conseguem
dizer, nem conseguem usar linguagem gestual, nem conseguem escrever, portanto não
conseguem comunicar, por incapacidade de génese motora. A esta chama-se a afasia de Broca
ou afasia motora (é mais correcto afasia motora). É um quadro dramático, porque o doente
percebe-nos, só que não consegue comunicar.
Existe um outro tipo muito marcado de afasia, que é o que depende da destruição da
área 39 e 40 (aquele córtex que já é parietal, que está por cima da angular e da marginal), em
que o doente fala como um papagaio, tem exclusivamente polilábia, parafrasias, tudo o que
vocês quiserem, mas não percebe o que a pessoa lhe pergunta, diz-se-lhe:
“_ Sr. Fulaninho então diga-me lá como é que estão os seus filhos?”
E ele diz:
“_Olhe, os passarinhos andam aqui toda a tarde nesta janela.”
“_E o Sr. Tem dores em algum sítio?”
“_Isto, sabe, o tempo está muito frio, chove…”
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Portanto, não há um mínimo de nexo, neste caso o que acontece é que os mecanismos
que estão lesados são mecanismos integradores de compreensão da linguagem – é a afasia
sensorial. Isto quer dizer (e o Broca viu-o), quem descobriu esta afasia foi um contemporâneo de
Broca chamado Wernicke, que portanto há uma afasia sensorial e uma afasia motora que só
aparecia do lado esquerdo, vamos ver que de facto só aparece do lado esquerdo, o que levou a
conceitos de lateralização do córtex. Isto leva a perceber que, para elaborar uma frase, tem que
haver, primeiro, compreensão do que vem do exterior (39 e 40 ou de outras áreas – áreas
visuais) e depois passá-la a motora. Tem que haver um feixe que faça esta ligação – feixe
longitudinal superior. Este feixe longitudinal superior pode estar às vezes cortado e, quando
cortado, nós dizemos que há um terceiro tipo de afasia – afasia de desconexão. Isto é, um misto
de afasia motora e sensorial. É a afasia de desconexão. É de difícil percepção.
Áreas da fala (ESQ) – a fala tem componentes que não são só estes. Se vocês ouvirem
por exemplo, aqueles indivíduos que aparecem na televisão e que põem o Pinto da Costa a falar
com o cão e o gato, num tom monocórdico que é muito próximo da verdade, vocês dizem que a
voz, essa fala não tem afectividade, nem tem componentes emotivos da fala. Ao componente
emotivo da fala, isto é, aos baixos, aos altos, aos estereonismos, aos sussurros num discurso
normal chama-se prosodia. Quando não existe isso, estamos perante uma aprosodia. É muito
importante, então para pessoas que usam um tribuno, seja ele políticos seja, na realidade, um
indivíduo que fale de um altar, é no fundo necessário cativar uma audiência e para isso é preciso
ter um alto, haver inflexões de linguagem, se não torna-se absolutamente monocórdico e
insuportável e muitas vezes isso acontece como fruto de doença e essa prosódia está do lado
esquerdo, mas do lado direito. É o hemisfério direito nas mesmas zonas 44 e 45 motora e 39, 40
que dá origem a uma prosódia motora. Uma aprosodia motora é quando o professor que é capaz
de estar a falar sempre no mesmo tom monocórdico, que é uma coisa intolerável e a mesma
aprosodia sensorial que é o que nós sentimos apesar de haver uma linguagem com afectos e
com emotividade, nós sentimos o mesmo tom e ser incapazes de gostar de uma música, haver
uma negação à música – aprosodia.
(Vejam a área que é enorme que é ocupada pela área de Broca e pela área visual.)
O córtex de associação é imenso. Isto era demasiado fácil se vocês vissem que o córtex
motor corresponde à área 4 e o córtex pré-motor corresponde à área 6 e que no córtex sensitivo
corresponde as áreas 3, 1, 2, ou seja, que a área somatomotora era 4 e 6 (a motora e a prémotora) e que a área somato-sensitiva era 3, 1, 2. Não é assim, dou-vos um exemplo que podia
ser ao contrário: o feixe corticoespinal, donde nasce a inferior última que vai para os neurónios
motores, nasce 30% do córtex motor, 30% do córtex pré-motor (que é o único que tem células de
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Becks?) e 30% do córtex sensitivo; portanto, 60% é de áreas 4 e 6, 30% é de áreas sensoriais e
10% de todo o resto do córtex (portanto, não há, de maneira nenhuma, uma fronteira estanque
quanto a isso). Ora, com base nisto, um homem extremamente inteligente – Sr. Dr. Ulsay, em
1964 definiu uma nova maneira pela qual se deveria reger a definição das áreas: que era as
áreas motoras e sensitivas primárias e era esta que está aqui que ele pôs a englobar a área
sensitiva e motora numa área a que nós deixávamos de chamar somatomotora e somatosensitiva e passávamos a chamar sensóriomotora, que englobava a parte motora e a parte
sensitiva e, como na parte pré-central, a parte motora era mais importante que a sensitiva
designávamos por MsI (1 em numeração romana) e na parte posterior SmI, porque eram as
primárias e as secundárias ao contrário, porque tinha as mesmas funções. Esta é uma ideia que
eu quero que vocês saibam e é normal e já se perguntou em exame, porque é que há
designações que em vez de se chamar córtex somatomotor ou córtex somatosensorial se chama
sensóriomotor 1 ou motosensorial 1 e motorsensorial 2? O que eu quero que vocês digam é que
a informação quer sensorial, quer motora nasce ou chega às duas áreas, por exemplo, o VA e o
VL onde vai terminar o feixe talâmico envia e, portanto, são fibras aferentes, axónios para a área
4 e para a área 6.
Mas fala-se na designação de áreas como primárias e secundárias. Áreas primárias são
áreas S1 e S2 – uma área primária ou área V1 ou área V2, V3 correspondentes às áreas 17, 18 e
19, ou área A1 e área A2 (porque a definição é: área primária é a que recebe os aferentes
exclusivamente do tálamo, no caso do somato-sensorial, no caso do sensorial de VPL e VPM, o
caso do motor das estruturas VA e DL e as secundárias recebem conforme as setinhas,
simultaneamente das que vêm do tálamo e do córtex de associação ali representado, isto é, são
as estruturas que trabalham, que associam, o nível mais correcto a que isto se vê é o nível
visual, em que o córtex visual primário recebe do corpo geniculado lateral depois de ter a 18 e a
19 que trabalham que lhe dá a tal cor, o tal movimento, etc). São estas designações que vocês
devem saber, embora nós nos vamos reger, quando vos for perguntado, pelo menos duas
designações saem sempre.
Falámos já das funções dos córtexes ditos principais – córtex motor, córtex sensitivo,
córtex límbico (é um córtex muito ligado à integração visceral somática e que vai ter uma aula
própria), falta-nos o córtex de associação (frontal).
Muito do que nós, antes do aparecimento do PET (Tomografia de Emissão de Positrões)
– meio de no Homem vivo ver o mapeamento era muito difícil saber isso, mas de qualquer das
maneiras havia estudos mortais dos doentes que apresentavam alterações comportamentais que
fazia-se-lhes a autópsia e ia-se ver onde é que estava a lesão e chegavam a conclusões como
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esta: por exemplo, as lesões do córtex frontal são caracterizadas por alterações de
comportamento do tipo de desinibição, um tipo de dicção provocatória em relação ao médico que
o vê e desinibição do ponto de vista genital. Na parte parietal temo um outro conceito que eu
quero que vocês saibam, que é a gnosia – capacidade de identificar uma estrutura que ou veja,
ou ouça ou palpe, pode ser uma coisa táctil, pode ser uma estrutura auditiva, reconhecer
auditivamente ou ver. Quando isto está alterado, nós dizemos que está uma total, difusa
agnosia. O que o neurologista faz é dar ordem ao doente, por exemplo: pede ao doente que
meta um frasquinho no bolso e de olhos fechados pede-lhe que diga a forma do objecto. E ele
diz que é um cilindro. E nós dizemos que a gnosia táctil está preservada. É a forma mais fina de
gnosia que há. Nestas circunstâncias nós temos, quando há tumores, alterações muito marcadas
que chegam ao ponto do doente não reconhecer o próprio corpo e nesse caso nós dizemos que
estamos perante formas de autopatognosia, e não sabem se a metade do corpo é direita ou
esquerda, haver uma confusão ou ainda de saber fazer cálculo e nestes casos nós dizemos que
estamos perante agrafia e acalculia. E nesse caso este é um síndrome muito complexo que nos
foi descrito em meados do século passado (1920 e tal) por um senhor chamado Gertzman que
assim ficou conhecido como o síndrome de Gertzman – síndrome que marca as alterações do
lobo parietal.
As alterações visuais são muito curiosas, quando são de um hemisfério só e quando, na
realidade, há uma lesão típica de uma área 17 pura (são muito raras), se for só de um lado não
acontece nada, porque há capacidade de informar através do esplénio o que se passa do outro
lado. Cegueiras corticais são geralmente bilaterais e são geralmente típicas duma série que
vasculariza dos dois lados que é a a. cerebral posterior. Portanto, as áreas 17 têm que estar as
duas lesadas para haver uma cegueira cortical. Mas pode haver algumas circunstâncias ainda
mais complexas que nos dá a possibilidade de passar para um outro ponto, que é a apraxia –
incapacidade que um doente tem de executar um determinado movimento sob ordem: levar a
ponta do dedo à ponta do nariz e o doente não leva, mas passado um bocado na conversa ele
faz. Portanto, por si só é capaz de o fazer, não há nenhum movimento que o impeça, mas sob
comando não faz (é lacovaction – a capacidade de executar sob comando uma determinada
ordem motora chama-se apraxia).
Neste tipo de cegueiras existe às vezes circunstâncias muito curiosas que só se
percebem se vocês imaginarem aquilo que vão ver na prática, no corpo caloso existem fibras
que passam para o lado oposto, são as fibras comissurais. São áreas que estão postas em
espelho à direita e à esquerda. Se vocês tiverem uma visão bilateral de um córtex, todo o córtex
direito se reflecte no esquerdo e o esquerdo no direito, com excepção de duas áreas: mão (quer
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no córtex motor, quer no córtex sensitivo) e a área visual (17 que se projecta para 18 e 19 do
lado oposto e vice-versa). Voltando ao que estava a dizer, há uma circunstância muito curiosa
que é o síndrome de desconexão – síndrome em que há uma lesão desses feixes longitudinais
intra-hemisférios de conexão e que nesse caso é da área visual com a área de Wernicke 39 (é o
feixe longitudinal) em que impede de comunicar uma determinada área visual com a área do
córtex com outra, então o que vai acontecer em certos doentes em que essa trombose cerebral
posterior leva também à destruição não só da área 17, mas também da parte posterior do
esplénio. Leva a uma situação em que o doente escreve o seu nome, mas não consegue lê-lo,
isto é, há uma alexia sem grafia. É um síndrome relativamente raro, mas que se compreende
bem, se vocês partirem do princípio de que, havendo uma lesão desse feixe longitudinal inferior
e estando o córtex de um lado lesado e não havendo transferência de informação do esplénio
proveniente do outro lado o doente não comunica, nesse caso nós dizemos que as áreas estão
desconectadas, tais como acontecia entre 39 e 40 e 44 e 45, só que este é mais típico e mais
exuberante, quer dizer, o córtex visual não informa a área 39 daquilo que viu e que está ali e não
informa proveniente do lado oposto do hemisfério, porque não há comunicação com o esplénio –
síndrome de alexia sem grafia.
Assimetrias cerebrais – o hemisfério direito é diferente do hemisfério esquerdo.
Já aqui falamos na área de Broca à esquerda a lesão nos dextros e à direita não em
todos, leva a alterações da fala, isto quer dizer que a área da fala está conectada à esquerda, ao
passo que à direita não. Mas se a fala está à esquerda, se a matemática está à esquerda, se a
lógica está à esquerda e isto é funções, o que é facto é que do lado direito estará a prosodia,
está a orientação espacial e a capacidade de ter musicalidade ou não, de uma maneira geral.
Portanto, o que acontece é que os nossos hemisférios são assimétricos funcionalmente e são
assimétricos morfologicamente. Ali está a representação de um hemisfério sobre o outro e o
exemplo mais flagrante para além das áreas motoras de Broca são maiores do lado esquerdo
que do direito, é o facto de o ramo posterior da incisura lateral ser muito mais longo à esquerda
do à direita. A esse facto dá-se-lhe o nome de plano temporal, isto é, um plano que passa atrás
da área auditiva secundária tem atrás de si muito mais córtex parietotemporal à esquerda do que
à direita, isto é, são assimétricas. Existem, portanto, assimetrias funcionais e assimetrias da
forma. Na base da assimetria está a normalidade do funcionamento do cérebro. Há
inúmeras doenças psiquiátricas, há inúmeras, à cabeça das quais se encontra a esquizofrenia,
em que há uma diminuição marcada de assimetria do cérebro – cérebros assimétricos têm mais
probabilidade de vir a desenvolver estruturas, doenças como a esquizofrenia, doenças do tipo
maníaco-obcessivo, em que quase são iguais os hemisférios direito e esquerdo. Estas são
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Aula desgravada de Neuroanatomia
8.11.04
situações que estão demonstradas cientificamente e que dão passagem para aquilo que durante
muito tempo matou os cientistas entre eles, que era a assimetria cerebral (em todos os dois
hemisférios estão todas as funções só que há maior preponderância dum lado e doutros no
outro) e isto foi demonstrado inequivocamente em situações em que há agenesia do corpo
caloso ou em situações de epilepsia em que se faz a cirurgia do corpo caloso (é cortado, ficando
um split brain).
Fazia algum sentido que o hemisfério esquerdo dominasse o direito – o cérebro
dominante (dominant brain ou major) vs o dominado (non-dominant brain ou minor). Esta posição
foi defendida por um americano Powell e Sir Jonh Eckel o foi contra um prémio Nobel que foi
precisamente ao contrário, mais recentemente, Speary. No entanto, o homem que pela primeira
vez levantou a questão a da assimetria foi Hughlin Jackson e depois Speary demonstrou que
havia assimetria cerebral e não dominância cerebral. E isto deve-se ao corpo caloso, que tem
300.000.000 de fibras a atravessar por ele, só a temporais é que não passam por aqui (passam
pela comissura anterior). E apesar disso há pessoas com agenesia (não lhes nasceu o copo
caloso – efeitos da lâmina terminal e que vivem normalmente e são achados de tomografia) e
que se corta o corpo caloso e que as alterações que emergem não são significativas.
Tudo isto do córtex é uma coisa muito complicada, a fronteira entre o normal e o anormal
é muito ténue e não é de maneira nenhuma fácil de demarcar.
Não há morte neuronal nos velhos, não se encontra nenhuma área onde realmente
haja morte dos neurónios, a não ser em situações patológicas (como um AVC), caso contrário
não há. Há alterações químicas, há alterações de índole plástica, morte neuronal não há, ou
pode haver, mas não é característico da velhice, não é o que está por detrás dos quadros
adoráveis dos velhos.
Ana Fidalgo Lopes Sequeira
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