Motivar e ensinar através da experimentação
Transcrição
Motivar e ensinar através da experimentação
Motivar e ensinar através da experimentação Marta Ornelas [email protected] Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa Caldas da Rainha, 1 de Junho de 2009 Resumo Este artigo tem como objectivo reflectir sobre a aprendizagem através da experiência, com enfoque em algumas das ideias-chave legadas por John Dewey, Jean Piaget e Jerome Bruner. A escola de hoje deve seguir os pressupostos destes autores e o professor deverá direccionar as actividades para os interesses dos seus alunos, por forma a potenciar a motivação destes. Apresenta-se uma resenha das principais considerações teóricas dos três autores referidos, ilustradas por: (1) experiência pedagógica posta em prática numa disciplina de Educação Artística do Ensino Básico; (2) demonstração da necessidade de realização de visitas de estudo a museus com exposições interactivas. Desde a promoção da aprendizagem activa, passando pela garantia de abordagem dos interesses dos alunos até à definição de estratégias de estimulação da motivação, conclui-se que é importante defender as concepções de uma aprendizagem voltada para o aluno que experimenta, descobre e, assim, desenvolve o seu raciocínio. Palavras-chave: aprendizagem activa – educação artística – exposições interactivas 1 1. Aprender Fazendo John Dewey incentivou a prática educativa de “learn by doing”, aprender fazendo, colocando o carácter insubstituível da experiência no centro do processo educativo, incutindo à escola a função de possibilitar que a criança, ao experimentar e concluir sobre o resultado da sua experiência, proceda a um questionamento permanente. Nascido em Burlington (E.U.A.) no ano de 1859, Dewey foi um teórico educacional que se manifestou contra a educação tradicional, marcada pelo intelectualismo e pela memorização, e criticou a ideia de formar a criança de acordo com modelos previamente definidos, defendendo que à criança devem ser fornecidos os meios para que resolva por si própria os problemas que lhe são colocados fazendo-os sentir como seus. A aquisição dos valores educativos pela criança depende, segundo Dewey, dos seus interesses e capacidades, devendo a escola procurar ir ao encontro destes e apoiar-se neles, valorizando a curiosidade natural. Dewey atribuiu uma importância fulcral às actividades manuais, estimuladoras da resolução de problemas concretos e impulsionadoras do espírito cooperativo e, consequentemente, social. A independência da criança, provocada pela iniciativa, traduzir-se-ia numa autonomia valorizadora do espírito democrático, mais uma vez discordante com o ensino tradicional apoiado, também, na obediência. O seu princípio de processo de ensino-aprendizagem baseava-se (a) na compreensão do saber de forma dinâmica, através de um método activo; (b) nos alunos e no professor como actores de importância inequívoca, num processo centrado na experiência e partilha de responsabilidades; (c) na aprendizagem construída de modo colectivo tal como a produção do conhecimento, salvaguardando a ideia de que viver e aprender acontecem em simultâneo. Dewey faleceu em Nova Iorque no ano de 1952, tendo o seu legado sido, de alguma forma, continuado por Jean Piaget e Jerome Bruner. 2 Nascido em Neuchatel no ano de 1896, Jean Piaget criticou o ensino tradicional, inibidor das relações sociais e incentivador do desenvolvimento do trabalho individual. Tal como Dewey, considerou que, na época, a transmissão de conhecimentos era feita com base no apelo à memorização e fundamentada num saber livresco que pouco contribuía para o emergir de espíritos autónomos e socialmente cooperantes. Com o intuito de modificar esses enraizados processos de ensino, Piaget foi um acérrimo defensor da Escola Nova ou Activa1, procurando que o processo educativo fosse baseado em princípios sociais, cognitivos e morais como forma de construção de indivíduos autónomos, críticos e criativos. Incluiu na sua teorização sobre objectivos gerais e universais da educação conceitos de liberdade, paz, solidariedade e convergência de pontos de vista entre os indivíduos. Para a prossecução destes objectivos, considerou necessária a «construção de um espírito crítico e de uma inteligência activa; ambos se desenvolverão pela aposta na cooperação entre os pares, sem qualquer forma de coacção» (Morgado, 2005, p.27). De acordo com o que defendia Dewey, Piaget, que viria a falecer em 1980, em Genebra, referiu sempre a importância da acção como método de desenvolvimento da consciência, permitindo que a criança pense de um modo progressivo através de reestruturações internas. Piaget salientou que nenhuma aprendizagem é significativa se não envolver activa e intimamente o sujeito, sendo esta mais uma marca de uma orientação para a autonomia do sujeito. A seu ver, uma verdade aprendida sem ser reinventada pelo estudante que a aprende não é aprendizagem nenhuma, algo que nenhum pedagogo ousará desafiar (Lourenço, 2005, p. 65). Por seu turno, Jerome Bruner, nascido em Nova Iorque em 1915, desafiou o sistema educativo americano ao propor que a aprendizagem fosse baseada na descoberta, ao invés do método tradicional que valorizava o conhecimento científico em detrimento dos conceitos subjectivos. 1 O conceito de Escola Nova ou Activa pressupõe a acção como motor do desenvolvimento cognitivo. 3 Seguidor da Teoria Construtivista2, Bruner refere que o desenvolvimento pessoal parte de processos de descoberta espelhados em situações variadas e que as informações retidas pelo aluno surgem dentro de uma estrutura cognitiva construída por si próprio, composta por esquemas e modelos mentais, que lhe permite seleccionar e transformar a informação, construir hipóteses e tomar decisões. Desta forma, o aluno conseguirá ir para além das informações dadas, atribuindo-lhes significado e apresentando-se como elemento activo e construtor da sua própria aprendizagem e não um mero receptor de respostas correctas. O aluno vai construir novas ideias e conceitos baseados nos seus conhecimentos passados e actuais. Defendendo a aprendizagem por meio da descoberta, Bruner apresenta o conceito de ensino hipotético-dedutivo, que pressupõe uma participação do aluno nas tomadas de decisão, explorando os exemplos e descobrindo os conceitos implícitos (Rafael, 2005, p. 173). Tendo como base o legado de Dewey e as considerações de Piaget e de Bruner, hoje as escolas devem proporcionar aos seus alunos situações voltadas para a percepção da realidade e para a abertura do espírito. 2. A Escola de Hoje – experiência pedagógica em Educação Artística A escola de hoje deverá enveredar por práticas pedagógicas inovadoras que despertem a criatividade e a curiosidade através da experimentação. Ao experimentar, ao agir sobre a situação, o aluno percorre um caminho, contorna obstáculos e ultrapassa os conhecimentos anteriormente adquiridos. Isto fá-lo ganhar confiança nas suas capacidades e satisfação pela resolução do problema, o que poderá contribuir para que lhe seja incutido um espírito de responsabilidade. 2 As teorias construtivistas partem do pressuposto de que todos nós construimos a nossa concepção do mundo a partir da reflexão sobre as nossas próprias experiências. A aprendizagem assenta num papel activo do aluno, que constrói significados adequados a partir dos conteúdos e actividades que o professor lhe proporciona. 4 O professor deve promover a aprendizagem activa, proporcionando ao aluno a experimentação directa e imediata que lhe permita aprender por sua própria iniciativa, uma vez que é ele que controla o processo. O professor torna-se um observador-participante que impulsiona o desenvolvimento cognitivo do aluno, uma vez que os interesses e capacidades deste serão tanto mais promovidos quanto mais relevante for o seu papel na interacção dos elementos da aprendizagem. As experiências activas e directas ajudam a desenvolver os sentidos e o sistema motor e proporcionam aos alunos uma melhor compreensão. O professor poderá preparar diversas actividades incentivadoras da sua participação na resolução de problemas, como (a) colocar questões e sugerir procedimentos para que as actividades estimulem o desenvolvimento dos alunos; (b) pedir aos alunos que planeiem uma actividade, o que permite que sejam eles a determinar os seus próprios objectivos; (c) colocar à disposição diversos materiais que o aluno possa seleccionar. Foi com base nesta última tipologia de actividade que foi proposta a realização de um trabalho a uma turma de alunos do 8º ano de escolaridade (com idades compreendidas entre os 13 e os 15 anos) na disciplina de Oficina de Expressão Plástica, disciplina de oferta no âmbito da Educação Artística numa escola de Ensino Básico. Foi solicitado aos alunos que realizassem uma composição plástica, inspirada na obra de diversos pintores (Klimt, Modigliani, Miró, Van Gogh e Matisse) que marcaram a história da arte. O objectivo seria criar algo novo tendo como base referências artísticas já existentes. A cada aluno seria dada a oportunidade de seleccionar as referências artísticas da sua preferência. A primeira aula planeada para a leccionação desta unidade de trabalho consistitu numa aborgadem teórica – ilustrada com imagens – à vida, obra e vertentes estéticas dos artistas. Nesta aula, os alunos contactaram pela primeira vez com a maioria das obras apresentadas, desenvolvendo uma experiência valiosa. Na aula seguinte, após tomarem conhecimento do 5 enunciado da actividade, reagiram apreensivamente por a considerarem de difícil execução. Contudo, assim que lhes foi dada a oportunidade de seleccionarem os artistas e as obras, de entre os que tinham sido abordados na aula teórica, a reacção foi imediatamente de aceder à proposta com motivação e empenho. O desenvolvimento dos trabalhos plásticos, utilizando a técnica do pastel seco sobre papel de formato A3, revestiu-se de uma clara dedicação, chegando a registar-se uma curiosidade generalizada dos alunos em saber escrever correctamente o nome dos artistas escolhidos e a rever pormenores acerca da sua vida pessoal. Este trabalho possibilitou novas leituras sobre as obras dos artistas mencionados e, embora se tratassem de reproduções impressas, permitiu experiências estéticas criativas de diálogo entre os alunos e as obras de arte que escolheram. Figura 1 - Trabalho realizado pela Inês, baseado nas imagens que seleccionou - Klimt (1918), Modigliani (1914), Van Gogh (1888) e Van Gogh (1888). 6 Figura 2 - Trabalho realizado pelo Tiago, baseado nas imagens que seleccionou - Matisse (1953), Matisse (1952), Van Gogh (1888), Van Gogh (1887) e Van Gogh (1888). Figura 3 - Trabalho realizado pela Maria, baseado nas imagens que seleccionou - Klimt (1909), Klimt (1917), Van Gogh (1890), e Miró (1961). 7 3. Os Interesses dos Alunos Para garantir a eficácia das acções é fundamental que tanto os alunos como o professor participem nos processos, sendo necessário direccionar as actividades para os interesses dos alunos, por forma a que estes se sintam motivados. O interesse dos alunos pode ser aproveitado para adaptar o currículo como forma de potenciar a sua motivação intrínseca3. Proporcionar-lhes actividades que vão ao encontro dos seus interesses impulsionará a sua atenção, concentração, empatia e compreensão. Neste sentido, o aluno atingirá os objectivos cognitivos previstos e obterá, certamente, um melhor aproveitamento. Em vez de controlar as acções dos alunos, o professor deve orientar as actividades em que estes se vêem envolvidos. O professor cria a estrutura do ambiente de aprendizagem para que os alunos possam, naturalmente, aprender. Inseridos num grupo-turma, independentemente das suas características individuais – língua materna, etnia, classe social, sexo, idade, valores, costumes e estrutura familiar –, os alunos necessitam da criação de oportunidades para uma aprendizagem activa que lhes permita desenvolver as suas capacidades. O professor terá que demonstrar flexibilidade e perspicácia na resolução de problemas que se lhe irão colocar, uma vez que, mesmo num grupo-turma homogéneo, os alunos apresentarão diferenças ao nível das experiências de vida, interesses e níveis de desenvolvimento. A estrutura deve, portanto, ser aberta. O reconhecimento dos interesses dos alunos por parte do professor possibilita a eficiência dos processos de aprendizagem. Estes interesses são 3 A motivação intrínseca possibilita a obtenção de satisfação através de reforços internos, sem relação a reforços do exterior, sendo a actividade um fim em si mesma. Por sua vez, a motivação extrínseca necessita de reforços externos que sustentem a satisfação, havendo uma consequência pela qual a actividade é realizada. 8 uma variável importante no rendimento escolar, uma vez que influenciam a actuação dos alunos perante situações-problema. O envolvimento e a empatia que cada aluno manifesta possibilita uma maior probabilidade de realizar com sucesso as tarefas propostas pelo professor. Quando uma actividade é recompensada, o interesse por ela desenvolve-se e quando um aluno apresenta uma harmonia entre interesse, aptidão, motivação e oportunidade os problemas de adaptação são quase nulos. O professor poderá, então, fazendo uso dos interesses dos alunos, planear actividades de relevância educacional adequadas a este contexto. Ao estar alerta e disponível para “receber” as manifestações, nomeadamente os interesses temporários que muitas vezes diversos grupos apresentam – como passatempos utilizados em casa, por exemplo – o professor encoraja os alunos a desenvolver as suas capacidades. Regra geral, o aluno orgulha-se de poder evidenciar, no contexto da aula, a actividade que desenvolve, usualmente, em casa, o que vai fazer com que os seus conhecimentos e interesses na disciplina sejam ampliados. Originalmente positivos, os interesses dos alunos contribuem favoravelmente para o seu progresso na aprendizagem. 4. Dificuldades e Estratégias Para a Estimulação da Motivação Quanto mais adaptado estiver o currículo aos interesses e capacidades dos alunos, maior será a motivação destes para aprender. Aprender requer concentração e esforço, mas este acto pode também ser divertido e estimulante, assim o professor proporcione actividades práticas e os seus alunos encontrem sentido e necessidade nos conteúdos abordados. A motivação é um factor essencial à aprendizagem e para que se revele é necessário libertar o aluno das expectativas que este manifesta quanto à préexistência de uma resposta correcta, e também dos reforços e punições imediatos para que se mostre disponível para o trabalho. 9 Proporcionar experiências condicionadas pela motivação, pela predisposição para a aprendizagem, é o primeiro de quatro pressupostos de Bruner para os quais se deve direccionar a teoria da instrução, sendo os outros três: a estrutura – organização do conhecimento para que este seja mais facilmente compreendido pelo aluno, sendo possível que qualquer assunto possa ser ensinado de modo eficaz a qualquer criança em qualquer idade; a sequência de apresentação do conhecimento – organizada desde a representação motora (representação das palavras através de acções) para a icónica (através de imagens e ausência de acção) até à simbólica (tradução do conhecimento em linguagem); e a natureza e ritmo dos reforços – a informação retroactiva do desempenho do aluno (Bruner, 1999, pp.61-76). A motivação do aluno deverá ser estimulada pelo professor e incide sobre factores culturais, motivacionais e pessoais, sendo necessário e proveitoso relacionar os conteúdos com a realidade exterior, tornando-os úteis para o desenvolvimento pessoal do aluno. A motivação é muitas vezes difícil de estimular na aula, dadas as condições inerentes a esta, por diversas razões: (a) os currículos estão voltados para aquilo que a sociedade entende que os alunos devem aprender e não naquilo que os alunos escolheriam se lhes fosse dada oportunidade para tal; (b) o processo de aprendizagem está vocacionado para a obtenção de classificações, facto que muitas vezes conduz ao descontentamento e até ao embaraço de alguns alunos perante os seus colegas; (c) a escola fomenta o sucesso dos seus alunos e a consequente elaboração de estatísticas, relatórios e outras informações escritas a comunicar aos pais e encarregados de educação – a focalização é feita no sucesso e não no benefício do conhecimento; (d) a preocupação em cumprir os programas e as actividades previamente estabelecidas compromete, muitas vezes, a aquisição do conhecimento; (e) as turmas têm, na maior parte dos casos, um número excessivo de alunos, o que dificilmente permite atingir as necessidades individuais de cada um. 10 No que respeita a este último ponto, o professor pode, no entanto, tentar ir ao encontro das necessidades individuais dos alunos através da atribuição de tarefas diferenciadas dentro da mesma sala de aula. Poderá, por exemplo, proporcionar aos seus alunos actividades semelhantes a jogos que possibilitem a aplicação de conhecimentos adquiridos adaptados a uma componente lúdica da aula. Por meio do raciocínio, o aluno atingirá uma solução, pondo em prática os seus recursos cognitivos. Se o professor conseguir transpor os conteúdos a leccionar para jogos cognitivos conseguirá também facilitar o desenvolvimento cognitivo dos seus alunos, tendo em consideração que para atingir os objectivos desejados o professor deverá, previamente, preparar a actividade de acordo com os alunos em questão, explicitar-lhes qual é a meta a atingir e consciencializá-los das regras do jogo (Bahia, 1999). As actividades que o professor proporciona podem ainda aumentar a motivação intrínseca, considerando pelo menos quatro factores: [...] desafio (ajustar os níveis de dificuldade para que as tarefas sejam sempre desafiadoras); curiosidade (incluir elementos que estimulem a curiosidade); controlo (oferecer escolhas ou por outro lado encorajar os alunos a experienciar o sentido de autonomia ou autodeterminação quando estes se empenham nas actividades); e fantasia (embelezar as actividades de modo a encorajar os alunos a empenharse nelas com um jogo divertido, uma identificação com personagens fictícias, ou um envolvimento num mundo de fantasia) (Brophy, 2004, p.227). Sempre tendo em conta os interesses dos alunos e os seus níveis de desenvolvimento cognitivo, o professor deve privilegiar os métodos de ensino que promovam a interacção social em contexto de aula. Mais importante do que a apresentação de desenhos ou esquemas, que implicam meramente a percepção visual, o professor deverá proporcionar jogos e/ou actividades que permitam a manipulação de materiais, indispensável ao desenvolvimento da curiosidade, da necessidade de experimentação e do consequente espírito de reflexão (Morgado, 2005, p.32). 11 5. Visitas de Estudo a Museus – uma estratégia a adoptar A promoção da aprendizagem permitindo que o aluno experimente e descubra de forma autónoma – tal como foi defendido por Dewey, Piaget e Bruner – pode ser conseguida através de meios diversos que se traduzam num conjunto de actividades relacionadas com estratégias previamente definidas pelo professor. Entre estas actividades encontram-se as visitas de estudo, que são por si só experiências de aprendizagem valiosas (Ribeiro; Ribeiro, 1989, p.445). As visitas de estudo aos museus podem constituir importantes vias para a aquisição de conhecimentos, uma vez que estes têm objectivos educativos e dispõem de actividades variadas. Muitas das crianças entram pela primeira vez num museu com as suas escolas e os museus podem proporcionar aos alunos experiências activas e dinâmicas que dêem lugar à reflexão e análise, através de actividades específicas articuladas com os programas curriculares de cada nível de ensino. Figura 4 – Oficina pedagógica direccionada para o 3º ciclo do Ensino Básico. Museu Colecção Berardo, Lisboa. Desde as visitas guiadas às fichas didácticas propondo tarefas específicas que têm como objectivo principal a consolidação de alguns conceitos abordados, as actividades pedagógicas nos museus constituem exemplos interessantes a 12 explorar, uma vez que contribuem para agilizar a actividade sensorial e motora tão necessárias ao desenvolvimento cognitivo. Figura 5 - Fichas didácticas para exploração de actividades plásticas baseadas em obras expostas. Tate Modern, Londres. Os ateliers de trabalho realizados nos museus podem também cativar os alunos, proporcionando tarefas diversificadas de carácter lúdico que estimulam a capacidade criativa, proporcionando novos contextos intelectuais e familiarizando os alunos com conceitos culturais susceptíveis de desenvolver as suas capacidades e imaginação. 6. As Exposições Interactivas A participação numa experiência interactiva implica que os alunos se confrontem com um problema real que tentarão superar para atingir os seus objectivos. Esta aprendizagem poderá ser, simultaneamente, crítica e construtiva, promovendo a ideia de “aprender fazendo”, tal como defendia Dewey. A experiência interactiva irá proporcionar uma descoberta da parte do aluno. A descoberta é, em si mesma, muito mais aliciante do que a noção prévia de que se vai aprender algo. Proporciona autonomia e o aluno é recompensado pela própria descoberta, dispensando reforços exteriores. Deste modo, o aluno empenha-se, participa activamente, concentra-se e 13 consegue ampliar a sua auto-confiança. O aluno atribui um grande valor à tarefa – sente-se mais absorvido pela informação que recolheu do que se esta fosse apresentada por outro. Nas exibições interactivas, os objectos são peças de equipamentos especialmente concebidos para que o próprio visitante do museu possa efectuar experiências e observações, permitindo a apresentação de conceitos, ideias e princípios científicos e técnicos. Quer dizer, nestas exibições, não é o objecto em si mesmo que conta, mas a informação que pode ser obtida, a partir da sua manipulação (Gil, 1992, P.83). Assim, cumpre-se um dos objectivos da educação: «proporcionar ao aluno segurança e confiança na sua capacidade de pensar, criativamente, em problemas intelectuais. A descoberta conduz a essa meta, pois requer do aluno a inferência de conceitos ou princípios, sem que outra pessoa o oriente exageradamente» (Ronca; Escobar, 1984). Mesmo que não sejam interactivas, as exposições incluem, frequentemente, elementos diversificados susceptíveis de facilitar a transmissão de conhecimentos, como os elementos gráficos (textos e imagens) e/ou audiovisuais que complementam os objectos expostos, atribuindo-lhes uma interpretação própria. Frequentemente utilizados para demonstrar, por exemplo, como se fabrica um objecto, ou para visualizar um acontecimento histórico, os elementos audiovisuais têm geralmente uma grande aceitação por parte dos alunos, qualquer que seja a faixa etária e o nível de conhecimento. Os elementos tridimensionais surgem também como réplicas/modelos capazes de apresentar objectos ou conceitos de forma imediata e de fácil interpretação, como por exemplo, a representação de um elemento orgânico em grande escala ou um modelo de uma espécie extinta. 14 Figura 6 - Modelo tridimensional interactivo – através de equipamento auditivo, pode ouvir-se o som que seria emitido pelos animais. The Natural History Museum, Londres. As situações de interactividade introduzem a visita ou complementam-na durante o percurso e têm um carácter eminentemente didáctico, possibilitando a transmissão de conhecimentos de forma lúdica. Os alunos são constantemente incentivados a intervir na exposição, realizando as experiências propostas e os objectos são apresentados integrados em artifícios experimentais de forma a poderem explicar conceitos. Desta forma, a informação é mais facilmente apreendida pelos alunos. A manipulação dos objectos faz com que estes ganhem uma nova dimensão informativa, aumentando a atracção do experimentador. Figura 7 - Modelo de experimentação de construção de um arco romano. Musée des Arts et Métiers, Paris. 15 Em alguns casos de interactividade, numa visita de estudo os alunos podem deparar-se com o que há de mais moderno em termos tecnológicos, principalmente nos museus de ciência e técnica. Na Europa, desde a criação do Palais de La Découverte, em Paris, em 1937, que proliferaram as exposições interactivas ou a integração de elementos interactivos em exposições diversas. Um dos exemplos de referência é o Musée des Arts et Métiers, em Paris. Pretendendo transmitir conhecimentos técnicos e históricos sobre instrumentos científicos, materiais, construção, comunicações, energia, mecânica e transportes, o museu coloca ao dispor dos visitantes pequenos aparelhos de informação visual – imagens e texto – que funcionam através da tecnologia de touch screen. Deste modo, quem visita pode seleccionar a informação que pretende conhecer acerca de um determinado objecto ou modelo exposto. Um outro caso de sucesso entre o público escolar tem sido a Galeria dos Dinossauros, no Natural History Museum, em Londres, que apresenta uma variedade significativa de experiências interactivas que apelam à curiosidade das crianças, nomeadamente através de questões imediatas, de resposta múltipla, que lhes são dirigidas, às quais devem responder através da selecção do botão luminoso correspondente. Seguidamente, a resposta surge e com ela as explicações acompanhadas de modelos demonstrativos tridimensionais. Muitos dos modelos são reproduzidos à escala real e complementados com tecnologia robótica, o que lhes confere um realismo muito atractivo. Figura 8 - Robôs animados à escala real permitem experienciar a vida humana no tempo dos dinossauros. The Natural History Museum, Londres. 16 Em Portugal só recentemente surgiram as exposições com ingredientes interactivos, presentes sobretudo nos museus relacionados com conceitos científicos, que são normalmente designados por Centros de Ciência Viva4. Excelentes exemplos destas práticas são o Visionarium, em Santa Maria da Feira, e o Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa, onde funciona a exposição permanente com o apelativo título “Vê, Faz, Aprende”. Em suma, os pressupostos que Dewey defendeu sobre a aprendizagem baseada na experiência podem encontrar a sua expressão prática fora da sala de aula, nas exposições interactivas. A intervenção directa dos alunos nas actividades propostas desafiará a sua curiosidade, incitará à experimentação e provocará confiança nas suas capacidades e satisfação pela resolução dos problemas. 7. Conclusão Contrariamente aos modelos tradicionais de ensino nos quais se privilegia o armazenamento e recordação da informação, os alunos devem ter a oportunidade de experimentar e descobrir de forma autónoma. Devem desempenhar um papel activo, conduzindo o seu percurso em direcção aos conceitos a adquirir, aquisição esta que estará dependente dos seus actos de descoberta. Por sua vez, o professor, ao invés de dirigir exclusivamente, deverá organizar o ambiente de trabalho para que os alunos possam realizar a sua experiência com sucesso, prestando-se ao fornecimento da informação necessária. O seu papel poderá ser também de aconselhador quanto aos métodos e técnicas a utilizar pelos alunos. Ao proporcionar a experiência aos alunos, o professor estará a contribuir para que o processo de aprendizagem seja mais eficiente, “Os Centros Ciência Viva são espaços interactivos de divulgação científica e tecnológica distribuídos pelo território português, funcionando como plataformas de desenvolvimento regional - científico, cultural e económico - através da dinamização dos actores regionais mais activos nestas áreas.”, in http://www.pavconhecimento.pt/centros_cv/ 4 2 fazendo com que os alunos adquiram conhecimento e desenvolvam a sua capacidade de raciocínio. A preocupação que o professor deve manifestar em relação aos interesses dos alunos será propícia a um melhor desempenho por parte destes, despertando o seu envolvimento e empatia em relação à disciplina. Se alunos motivados aprendem mais e melhor, o professor deve criar as condições necessárias para estimular a predisposição para a aprendizagem, proporcionando experiências adequadas. Desde a utilização de jogos cognitivos à execução de projectos, há uma diversidade de estratégias que o professor poderá adoptar para motivar os seus alunos e ir ao encontro dos seus interesses. As visitas de estudo a museus constituem experiências valiosas de aprendizagem e devem ser fomentadas. Quer participando em visitas guiadas, quer realizando actividades específicas, os alunos encontrarão nos museus situações experienciais que contribuirão para ampliar o seu desenvolvimento sensorial e cognitivo. Mais especificamente, as exposições que incluem ingredientes de carácter interactivo poderão englobar meios de aprendizagem diversos. Os pressupostos que Dewey lançou sobre a aprendizagem através da acção, “learn by doing”, continuam firmes, sendo esta a forma de melhor transmitir o conhecimento aos alunos. Contrariando a escola tradicional, Piaget e Bruner contribuíram também para a defesa desta posição, em prol da construção de sujeitos autónomos, críticos e criativos. E este deve ser o rumo da escola de hoje. 3 Referências bibliográficas Bahia, S. (1999). “Como dar tarefas diferenciadas, em simultâneo, a trinta alunos de uma turma?”, in A. Estrela & J. Ferreira (Org.). Diversidade e Diferenciação, Lisboa: Actas do IX Colóquio AIPELF. Brophy, J. (2004). Motivating Students to Learn, Mahwah - New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates Publishers. Bruner, J. S. (1999). Para Uma Teoria da Educação, Lisboa: Relógio d’Água Editores. Gil, F. B. (1992). “O Objecto como Gerador de Informação”, in Iniciação à Museologia, M. B. Rocha-Trindade (Coord.), Lisboa: Universidade Aberta, pp.77-86. Lourenço, O. (2005). “Piaget e Vygotsky: Muitas Semelhanças, Uma Diferença Crucial”, in Psicologia da Educação: Temas de Desenvolvimento, Aprendizagem e Ensino, G. Miranda & S. Bahia (org.), Lisboa: Relógio d’Água Editores, pp.52-71. Morgado, L. (2005). “Jean Piaget: Um Pedagogo?”, in Psicologia da Educação: Temas de Desenvolvimento, Aprendizagem e Ensino, G. Miranda & S. Bahia (Org.), Lisboa: Relógio d’Água Editores, pp.25-42. Rafael, M. (2005). “Contributos de Jerome Bruner e Robert Gagné para a Aprendizagem e o Ensino”, in Psicologia da Educação: Temas de Desenvolvimento, Aprendizagem e Ensino, G. Miranda & S. Bahia (org.), Lisboa: Relógio d’Água Editores, pp.166-182. Ribeiro, A. C.; Ribeiro, L. C. (1989). Planificação e Avaliação do EnsinoAprendizagem, Lisboa: Universidade Aberta. Ronca, A. C.; Escobar, V. F. (1984). Técnicas Pedagógicas, Petrópolis: Vozes. 4