Calçado conquista novos mercados
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Calçado conquista novos mercados
ID: 61228177 02-10-2015 | Economia Tiragem: 100925 Pág: 20 País: Portugal Cores: Cor Period.: Semanal Área: 28,20 x 44,50 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 1 de 3 INTERNACIONALIZAÇÃO Exportações Sapatos portugueses continuam a saltar fronteiras e já chegam a 152 países As novas rotas do calçado Textos Margarida Cardoso Ilustração Paulo Buchinho T emos de “viajar mais e chegar cada vez mais longe.” Quem o diz é Fortunato Frederico, presidente da Kyaia, o maior grupo português de calçado, numa frase simples que sintetiza a dinâmica criada pelo sector para ultrapassar “o crescimento anémico da Europa”, abrindo novas rotas, da América Latina ao Oriente, sem esquecer a Antártida, que veio juntar-se à lista de clientes das empresas portuguesas no primeiro semestre do ano. No caso do grupo Kyaia, esta estratégia começou a ser seguida em 2010. “Vimos que a Europa estava a ficar caquética e voltámo-nos para outros destinos, como o Canadá ou os Estados Unidos, que já estão a superar a Inglaterra como principal mercado da nossa marca Fly London”, comenta o empresário que lidera a APICCAPS, a associação industrial do sector. A rota dos sapatos da empresa de Guimarães segue, também, para outras geografias, da Colômbia à Austrália, e foi essa base diversificada de clientes que levou Fortunato Frederico a surpreender recentemente os participantes numa sessão das Fnac Business Talks, organizadas pela Católica Porto Business School, com o otimismo sobre o futuro da sua empresa: “Estamos a trabalhar para duplicar vendas na próxima década.” Isso significa passar a barreira dos €120 milhões e ser um dos cinco maiores produtores de calçado da Europa. Dar a volta aos sinais de alerta As previsões do sector coincidem na trajetória expansionista. Até 2020, a fileira vai investir €70 milhões na sua internacionalização e quer garantir um crescimento de 25% nas exportações, para os €2,5 mil milhões. O passado recente ajuda a perceber este desígnio: desde 2009, as exportações da fileira cresceram 54%, para €1,9 mil milhões, e, no mesmo período, Itália, considerada a principal concorrente, viu as vendas de calçado ao exterior crescerem apenas 14%. Os números do presente revelam, no entanto, alguns problemas. Em 2014, as exportações aumentaram 6,3% e, no primeiro semestre de 2015, a subida ficou nos 0,4%, penalizada pela quebra de 2% das encomendas na Europa, a refletir a retração do mercado francês, o principal cliente dos sapatos portugueses, com um volume de compras superior a €400 milhões. O impulso positivo chega, precisamente, dos mercados não europeus, onde as vendas aumentaram 6%. É um bloco fei- to de pequenos números, com um peso limitado a 12% na balança do sector, mas onde há percentagens de crescimento surpreendentes, como os 88% registados na Nova Zelândia, um país que deverá contribuir com €4 milhões para as exportações de calçado e que tem nos sapatos o principal produto comprado em Portugal. Na Colômbia, um destino na mira das empresas lusas desde 2013, o crescimento no primeiro semestre rondou os 200% e as vendas no final do ano deverão atingir, também, os €4 milhões, suportadas por marcas como a Nobrand, que já abriu uma loja em Medellín, em parceria com um distribuidor local e vai inaugurar mais um espaço comercial em Bogotá ainda este ano. Além disso, dependendo da evolução do mercado e da cotação do peso colombiano, “a desvalorizar ao longo do ano”, como diz o empresário Sérgio Cunha, poderá ter mais quatro espaços de marca própria no país no final de 2016. Com vendas de €12 milhões, metade das quais na Alemanha, a marca de Felgueiras vende os seus sapatos em 20 países, contribui com mais de 50% para a faturação do grupo de calçado Maximo Internacional e assume a ambição de abrir lojas próprias nas principais cidades portuguesas e na Alemanha, onde é a insígina portuguesa de calçado mais vendida. Na China, abriu um showroom e prevê registar meio milhão de euros em 2015. No seu conjunto, as exportações para o mercado chinês deverão fechar o ano acima dos €12 milhões, o que representa um salto de 85% face a 2014. Estes números são, para a APICCAPS, um indicador do “bom potencial de crescimento no país”. A associação vê ainda sinais “muito interessantes” noutros mercados, do Japão, que já vale mais de €12 milhões e deverá crescer 10% este ano, à Coreia do Sul, onde o aumento da procura dos sapatos portugueses está a duplicar, para se aproximar dos €6 milhões, ou à Austrália, com um crescimento de 9%, para os €12 milhões. Atenta ao abrandamento na Europa, a associação está em campo para ajudar os sapatos portugueses a seguirem novas rotas e já definiu quatro alvos prioritários: Colômbia, Austrália, China e Estados Unidos. Para trabalhar longe da zona de conforto das fronteiras europeias, a APICCAPS desenhou uma estratégia que replica a dos seus associados. Quando uma empresa quer conquistar uma nova geografia, procura um agente ou distribuidor local. Para vencer a distância física e conhecer melhor a realidade local, a APICCAPS decidiu, também, ter representantes nestes países. O objetivo é continuar a multiplicar as vendas e fixar novas metas de crescimento como a previsão de exportar €100 milhões para os EUA em dois anos, contra os €60 milhões atuais. [email protected] Exceed escolhe a Coreia do Sul como alvo A marca de Felgueiras está a calçar atores e apresentadores de televisão na Coreia do Sul. Em 2016 quer entrar nos EUA O que faz uma empresa portuguesa com uma faturação de €6 milhões associar-se a figuras públicas como atores e apresentadores de televisão na Coreia do Sul? “Procurar impor uma marca e abrir espaço em novos mercados”, responde Agostinho Marques, a dar a cara pela terceira geração na Fábrica de Calçado Dura. Fundada pelo seu avô, José Guimarães, em 1964, a empresa de Felgueiras nasceu a fazer dois ou três modelos de sapatos de homem para vender em lojas e sapatarias no mercado nacional. O ciclo das exportações começou há 20 anos, limitado à produção para marcas dos clientes e a alguns países europeus, da França à Alemanha e Escandinávia. Foi uma nova etapa que permitiu à empresa ganhar experiência e uma nova dimensão antes de avançar com a marca própria Exceed, “com uma oferta abrangente, do estilo mais clássico ao casual”, em 2005. A indústria portuguesa de calçado vivia, na altura, anos difíceis, com a debandada das multinacionais e a concorrência crescente dos sapatos made in Asia, mas a empresa não se deixou intimidar. “Sabíamos que para começar esta aventura tínhamos de estar num bom momento, disponíveis para investir durante quatro ou cinco anos sem retorno. Sentimos que estávamos bem, tínhamos espaço para avançar e esse era o passo certo a dar para criar valor e diferenciar a nossa oferta”, comenta Agostinho Marques. Dez anos depois, o contributo da marca própria ainda está limitado a 10%, mas a empresa acredita que “esta é a aposta certa” e “as garantias de crescimento futuro passam precisamente por aqui”. E os números mostram porquê: o preço de venda ao público na marca própria varia entre os €150 e os €200, “o que significa um ganho de 20% em ID: 61228177 02-10-2015 | Economia Tiragem: 100925 Pág: 21 País: Portugal Cores: Cor Period.: Semanal Área: 28,20 x 44,50 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 2 de 3 Ambitious passa a ter o Japão como maior mercado A empresa de Guimarães assumiu a ambição de “olhar para longe”. Já chegou à Mongólia e vai crescer 25% este ano Quando pegou numa empresa já com nove anos de vida para lançar o projeto da Ambitious, Paulo Martins tinha bem definido o seu objetivo: cruzar a parte comercial e industrial, criar um produto próprio e uma marca, trabalhar para o retalho. Onze anos depois, apresenta um volume de negócios de €10 milhões, distribuído por 38 países, e a perspetiva de um crescimento de 25% em 2015. Minutos antes de o Expresso falar com o empresário, na Micam, a maior feira de calçado do mundo, em Milão, a Ambitious tinha acrescentado a Mongólia à sua lista de clientes, decidida a continuar a “olhar para longe” para manter o ritmo de entrada de encomendas na fábrica de Guimarães, onde acaba de investir €2,5 milhões em instalações e equipamento, tem uma capacidade de produção de mil pares de sapatos por dia e emprega 130 trabalhadores, 15 dos quais diretamente ligados à área da criação e desenvolvimento do produto. As exportações absorvem 99,9% das vendas, mais de metade das quais são já garantidas em mercados fora da Europa. É uma realidade bem diferente daquela que o empresário encontrou quando assumiu a missão de reestruturar esta empresa, inicialmente concentrada no mercado nacional e que começou por concretizar a nova ambição exportadora com uma aposta forte no mercado francês por razões óbvias: “Era o principal mercado dos sapatos portugueses”, diz. O aumento das encomendas conseguido por esta via permitiu ganhar escala, consolidar a estrutura produtiva e financeira, avançar para novas etapas. Com a presença em feiras internacionais, a carteira de clientes abriu-se a novos horizontes, primeiro na Europa e, numa segunda fase, em destinos mais distantes, dos EUA ao Canadá, China, México, Colômbia, Dubai, Coreia do Sul ou Japão. O alvo principal, no entanto, não são clientes de grande dimensão, mas sim retalhistas com 15 ou 30 lojas. Em 2014, o Japão impôs-se como o principal mercado da empresa depois de dois anos de trabalho intenso naquele país. “Tivemos de investir em viagens para perceber o mercado e tivemos de nos adaptar, mas começámos a colher os frutos do esforço feito e, este ano, 10% das nossas vendas vão estar concentradas no Japão”, refere Paulo Martins. O empresário, com uma estrutura flexível para adaptar os seus modelos aos pedidos de cada cliente, também está atento ao potencial da Colômbia, onde se apresentou pela primeira vez A MARCHA DOS NÚMEROS 152 no ano passado, mas encontrou “boa recetividade”. A justificar o otimismo, refere que os investimentos recentes contemplaram o aumento da capacidade de produção. “Quintuplicámos a nossa capacidade, foi o nosso maior passo nos últimos anos”, comenta. O produto, apresentado como “um clássico para gente jovem, com cor, muita vida e algum atrevimento”, soma mais de 300 referências por coleção e também é vendido com marca dos clientes da empresa, mas Paulo Martins está já a lançar a Suit Runners, uma segunda insígnia com vocação para o segmento de conforto, que só será vendida com marca própria a clientes selecionados. À primeira vista, um modelo da Ambitious até pode parecer igual a um outro da Suit Runners, mas na mão é fácil perceber que os sapatos da nova marca são mais macios e flexíveis. “A construção é diferente e inovadora e o preço sobe 20%”, explica Paulo Martins que apresenta o preço médio de venda ao público dos seus sapatos num intervalo entre os €120 e os €150. No final do ano, o peso da marca própria deverá aproximar-se dos 35% das vendas, mas a empresa quer “continuar a ver esta percentagem crescer”, acrescenta o gestor, fiel à estratégia de combinar a diversificação de mercados com a fidelização dos atuais clientes. Boat Dock’s ruma à Colômbia, Irlanda e Oriente é o número de países para onde as empresas de calçado estão a vender. A fileira exporta 95% do que produz 6% foi o crescimento das exportações do sector para fora da Europa no primeiro semestre 2% foi a quebra das exportações para a Europa no primeiro semestre, a refletir a queda do mercado francês, que vale €400 milhões 12% é a quota das vendas fora da Europa. O objetivo é atingir 20% em 2020 60 milhões de euros é a projeção das vendas nos EUA este ano, mais 55% do que em 2014 4 valor”, sintetiza Agostinho Marques. Na carteira de encomendas mantém o trabalho para outros clientes como uma almofada segura que tem a Holanda, Bélgica, França e Alemanha como principais mercados, mas os seus sapatos já chegam a 15 países, da Coreia do Sul à Austrália. Aproveitar o Portugal 2020 Com 115 trabalhadores e uma produção diária de 900 pares de sapatos, a Dura investiu uma média de €150 mil em equipamento e desenvolvimento de produto nos últimos três anos e apresenta-se ao mercado com 30 modelos na sua marca própria e um total de 200 modelos criados na empresa ou desenvolvidos pelos seus clientes. Para avançar pelo mundo, a empresa investiu na presença em feiras internacionais do sector, de Milão a Berlim e Paris. Depois, “é preciso ter a sorte de encontrar o parceiro certo para fazer a ligação aos clientes em cada mercado”, como comenta Agostinho Marques, à espera de entrar, também, nos EUA em 2016, de forma a aproveitar “a boleia” da relação cambial euro-dólar, do acordo de comércio livre Europa-EUA e do potencial de crescimento da economia norte-americana. Sem complexos de dimensão nem medo de saltar fronteiras e ganhar mundo, Agostinho Marques assume que os mercados prioritários na sua estratégia para o futuro estão na Europa, mas também na Coreia do Sul e na Austrália. As vendas nesses países podem não ser ainda significativas, mas “as perspetivas de crescimento são boas”, diz. A preparar o futuro, a empresa já tem um projeto de internacionalização no valor de €150 mil candidato a apoios do quadro no novo pacote de fundos comunitários Portugal 2020. milhões de euros são as vendas previstas na Colômbia em 2015, mais 196% do que no ano passado 2 mil milhões de euros é a barreira que as exportações deverão ultrapassar este ano, após crescerem 54% desde 2009. A meta a atingir em 2020 são os €2,5 mil milhões 160 milhões de euros é o valor a investir pela fileira até ao final da década no processo de internacionalização (€70 milhões), inovação e qualificação O mercado francês já absorveu 80% das vendas da empresa da família Coelho. Agora “pesa quase 0%” na sua estratégia No passado recente, França era o maior mercado da João Batista Pereira Coelho e Filho, mas hoje o principal destino dos sapatos desta empresa de Felgueiras é a Irlanda, país a que se juntam mais alguns mercados europeus como Espanha, Alemanha ou Inglaterra, e, cada vez mais, clientes conquistados a Oriente e na América, da Colômbia aos Estados Unidos, Líbia, Emirados, Coreia do Sul, China, Japão e Austrália. “Os novos mercados tornam-se muito exigentes, devido à distância, mas são cada vez mais importantes na nossa estratégia”, afirma Pedro Coelho, neto do fundador desta empresa, criada em 1933, agora a trabalhar com as marcas Boat Dock’s e Moccs. Nos primeiros tempos, o avô fazia os sapatos à mão, em casa, com três colaboradores e, depois, saía pelo país para os vender. Quando a segunda geração entrou na empresa aparecerem as instalações próprias, os primeiros contratos como subcontratados, algumas encomendas diretas de clientes e, mais ao menos em paralelo com a revolução do 25 de Abril, começaram as primeiras exportações de forma algo reativa, “para responder aos pedidos dos clientes”. Pedro chegou à empresa na viragem do século, quando era voz corrente dizer que a indústria do calçado iria morrer dentro de dois ou três anos, mas não se deixou intimidar. Preferiu trabalhar para diversificar clientes, investir numa marca, encontrar novos caminhos para os sapatos da família. Acabou por começar este trabalho numa feira da África do Sul simplesmente porque quando olhou para o calendário aquele era o primeiro certame em agenda. Logo aí conquistou encomendas para outros países. Foi o suficiente para ganhar confiança na nova estratégia. É verdade que a empresa já teve 200 trabalhadores e hoje emprega 110 pessoas, quatro das quais no design e desenvolvimento do produto, mas em 2014 viu as vendas crescerem 20%, para os €10 milhões e o ataque à frente colombiana, iniciado há um ano, já rendeu quatro clientes e há mais dois em perspetiva. A receita, diz o primo João, “não tem segredos, exige é trabalho”. “Temos de trabalhar muito, viver dentro da fábrica, manter alicerces sólidos”, comenta o jovem empresário. Lado a lado, segunda e terceira gerações trabalham em conjunto na empresa, com o foco claramente orientado para “fora da Europa” e para “o crescimento da marca própria” a par das encomendas de velhos clientes como a Inditex, Eagle ou Dubarry, Kickers, Lois e Levi’s. Para isso, apostam na flexibilidade da resposta, convidam os clientes a visitarem a fábrica para verem como os sapatos são feitos e fortalecerem relações. Uma semana antes de o Expresso falar com os dois primos em Milão, João e Pedro tinham recebido japoneses em Felgueiras. Na semana seguinte, seria a vez dos australianos. A oferta abarca uns 80 modelos por coleção, a capacidade de produção ronda os 1200 pares por dia, vendidos ao público a um preço médio de €100, “muitas vezes com o selo made in Portugal na sola a pedido dos clientes”, dizem. No volume de trabalho, o peso das marcas próprias ainda está limitado a 10%, mas o objetivo é ir aumentando esta percentagem para obter ganhos na cadeia de valor. Neste “trabalho de evolução que está a ser feito” contam com a marca Boat Dock’s, uma insígnia vocacionada para o calçado de tipo náutico, com trabalho artesanal incorporado, que ajudou a alicerçar a estratégia de internacionalização e valorização do produto, mas também com a Moccs, criada há apenas dois anos, com o objetivo de “abrir a porta” a um nicho de mercado onde a família viu potencial de crescimento no segmento dos sapatos tipo mocassin. “A nova marca (destinada a sapatos mocassin, com a sola embutida) permite-nos diversificar a oferta e alargar a gama. Era um formato muito procurado pelos nossos clientes e decidimos arriscar fazer os nossos próprios modelos”, explica Pedro Coelho. ID: 61228177 02-10-2015 | Economia Tiragem: 100925 Pág: 1 País: Portugal Cores: Preto e Branco Period.: Semanal Área: 4,69 x 7,26 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 3 de 3 Calçado conquista novos mercados Os sapatos portugueses já chegam a 152 países. EUA, China, Colômbia e Austrália são alvos prioritários para multiplicar exportações E20