A música dos espaços

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A música dos espaços
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A Música da Arquitetura
Cláudia Borges de Miranda
Deve haver um código que traduza as formas espaciais em música. Esse código
são as relações numéricas. Baseando em estudos de diversos autores, colocamos aqui
algumas proposições especulativas próprias.
Proporções de 2 números correspondem a intervalos simples entre duas notas e a
figuras planas que se manifestam nas plantas arquitetônicas e fachadas. Se, por
exemplo, o intervalo de 5ª corresponde a 3/2 o retângulo de 3/2 seria o equivalente
formal para esse intervalo sonoro. Proporções de 3 números corresponderiam a acordes
de 3 notas e a volumes espaciais. Seqüências de elementos como colunas, janelas,
portas representariam o ritmo da composição.
Tentemos pegar um exemplo, o mais simples e “clássico” possível. Vamos ver a
obra Villa Capra ou La Rotonda, construída em Vicenza, na Itália, em 1566, por Andréa
Palladio, arquiteto italiano do renascimento humanista. Essa obra é um marco da época
moderna, é bastante geométrica e modulada, suas formas são extremamente simples
(quadrados, círculos e retângulos de frações simples). A planta baixa é um quadrado no
qual está inserido um círculo. A altura interna equivale à largura da base, o que faz com
que a obra esteja inserida em um cubo perfeito.
Vamos tentar fazer uma partitura para essa obra.
Para fazermos a leitura da música de um espaço, temos que determinar um
percurso, assim inserimos o elemento tempo (próprio da experiência sonora) para nos
permitir codificar as formas em sons.
No caso da Villa Rotonda, existem 4 entradas simétricas. Vamos ter de escolher
entrar por uma delas e percorrer o ambiente interno em um único caminho até o centro e
depois sair dela, pelo lado oposto. A música dos espaços é onipresente, muitas notas são
tocadas ao mesmo tempo, o observador vivência sua própria música na medida que
percorre os ambientes.
Existe uma modulação básica na casa que é um quadrado de medida 1/1. A planta
baixa total é de 24x24 incluindo das escadarias e átrios. Considerando apenas o corpo da
casa, a medida é de 12x12.
Texto elaborado por participante do Curso Antropomúsica.
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Vista esquemática do conjunto
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Podemos entrar pela escadaria de 21 degraus, como uma escala diatônica de 3
oitavas que parte de um dó e chega a outro dó, num ritmo muito rápido. Lá em cima
atravessa-se uma fileira de 6 colunas que formam 5 espaços por 4 módulos de altura,
numa proporção de terças maiores (5x4), que estão próximas e correspondem a um
ritmo rápido, como de colcheias.
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Escadarias (no desenho representada esquematicamente por rampas) e colunas.
Proporção de 5x4 nas colunas
Em seguida, chega-se ao átrio, que tem medida de 6x2=2x(3x2), como duas
quintas, numa duração como de semínima.
Entrando na casa há duas salas simétricas, uma de cada lado na proporção de 5x3
(corresponde à sexta maior). São salas grandes que têm maior duração. A altura dessas
salas corresponde a 5 módulos, o que, combinado com a planta baixa dá um acorde de
prima/sexta/oitava.
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Volume das duas primeiras salas simétricas = 5x3 (sexta) por 5 de altura
Continuando o percurso, agora encontra-se também duas salas simétricas na
proporção de 3x2 (quinta) com altura de 5 módulos, que corresponde a um acorde de
prima/quinta/décima quinta. Essas salas também têm duração maior, como de mínimas.
Volume das outras duas salas simétricas = 3x2 (quinta) por 5 de altura.
No centro da casa, chega-se a um cilindro de base circular de 6 módulos por 6
módulos de altura, que corresponde à oitava. O espaço é grande e o tempo de duração é
mais longo que as demais salas, como uma semibreve.
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Volume do cilindro central 6x6 (prima) mais a cúpula de 6x 3 (oitava).
Saindo da casa, o percurso é espelhado ao da entrada, já que ela é simétrica.
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Assim, uma música bastante simplificada do que se pode traduzir das formas espaciais é:
Poderíamos aprofundar o estudo desta música. O grande quadrado base 24x24
pode soar como uma "fundamental" para o prédio todo (neste sentido ele seria
realmente o 1:1 do qual todas as outras medidas seriam "harmônicos"). A partir do que
foi descoberto neste estudo podemos mover a idéia imaginativa-sonoramente. Podemos
imaginar os instrumentos que devem soar para cada configuração arquitetônica, e
imaginar as medidas rítmicas, o próprio tempo, o andamento. Podemos nos colocar com
a imaginação no centro do prédio ouvindo todos os elementos soando juntos, se
justapondo, se alternando, conforme nossa atenção percorre o espaço. Cada adorno,
cada quadro, cada tomada de eletricidade, lâmpadas, rodapés, móveis, cortinas, enfim
todos os elementos presentes no ambiente e até mesmo os seres vivos que ali estão ou
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circulam, sejam vegetais, animais ou humanos, vão fazer parte da música. Além disso,
podemos avaliar uma decoração adequada se transformamos cada objeto na nota
musical a ele correspondente e verificarmos se esse tom é consonante com o acorde
básico do espaço tridimensional no qual se insere. Há muito ainda a ser pesquisado e
descoberto. Esse é um primeiro esboço, mas é como uma chave fundamental, sobre a
qual a criatividade pode ganhar asas para “musicar” todos os espaços.
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