Priscila Silva de Carvalho

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Priscila Silva de Carvalho
CULTURA E ALIMENTO: ECOLOGIA HUMANA E
SUSTENTABILIDADE PARA POPULAÇÕES
RIBEIRINHAS DO RIO MADEIRA.
Priscila Silva de Carvalho1
Josué da Costa Silva2
RESUMO:
A importância em entender o modo de vida de populações
ribeirinhas, levando em consideração a maneira de produzir, viver e interagir com os
recursos naturais é necessário frente ao processo de reorganização econômico, social
e ecológico a que o mundo está passando, para não excluir do modelo de
desenvolvimento regional lugarejos a exemplo do Distrito de Nazaré, no Estado de
Rondônia. Nosso ponto de partida foi compreender o universo cultural a partir dos
hábitos alimentares. Para tal foi necessário tratar da cultura alimentar nesta
comunidade criando uma teia de relações intrínseca por se referir a um tema
protegido pela população. Dentre os dados observados está a influencia dos modelos
econômicos vivenciados pelo grupo, como o ciclo da borracha e que resultaram em
hábitos alimentares peculiares ao grupo.
PALAVRAS-CHAVES: hábitos alimentares, adaptações e ciclo da borracha
1. INTRODUÇÃO
A busca por melhores condições de vida faz o homem
interagir constantemente com toda a diversidade amazônica,
incorporando o que foi observado ao cotidiano de vida, desde a Préhistória, constituindo e enriquecendo sua cultura e, ao mesmo tempo,
“resistindo” a certas mudanças no decorrer do tempo, como resultado
de experiências oriundas da vivencia com o ambiente levando o
grupo a tomada de decisões que grantissem com relativos sucesso a
manutenção da vida.adaptativas dos seus costumes com relativo
sucesso (CORRÊA, 1994).
As populações que se firmaram nas regiões do seringal
tiveram de adaptar suas vidas por imposição do barracão e, assim,
manter preservada as seringueiras. Estas adaptações ocorreram no
meio social, na paisagem, na cultura, na educação e no habitat de
cada individuo ou grupo social em decorrência de mudanças na
conjuntura política mundial e nacional.
1
2
Bolsista / CNPq
Orientador
Por vários motivos, as adaptações ocorridas entre o homem e
o meio ambiente, entre as populações ribeirinhas, surgidas durante o
segundo ciclo da borracha, expôs o soldado da borracha a alguns
problemas, entre eles, os alimentares, já que o sustento destes
trabalhadores ficou garantido pelo consumo de produtos enlatados e
industrializados. Esta alimentação perdurou por muitos anos, a partir
do segundo ciclo da borracha, criando a este grupo social um hábito
alimentar característico.
É certo que há 50 anos este era um modo de vida adequado.
E hoje, o que mudou? Eles ou a realidade externa? Evidentemente
toda a sociedade mundial passa por uma brutal organização dos seus
valores tanto econômico, quanto social. Assim a estratégia de
sobrevivência do ribeirinho está desatualizada e desvinculada dos
planos e modelos de desenvolvimento regional?
2. OBJETIVOS
O processo de reorganização econômico, social e ecológico
mundial aponta para a necessidade de reconhecimento dos saberes
locais. Neste aspecto dá-se a importância de um modo de vida como
a dos ribeirinhos, levando em consideração a maneira de produzir,
viver e interagir com os recursos naturais.
Programas de desenvolvimento sustentável em comunidades
como a do Distrito de Nazaré, localizada a 150 km de Porto Velho,
no Estado de Rondônia, escolhida pelo grupo de pesquisadores da
Universidade Federal de Rondônia para o desenvolvimento do
Projeto Beradão, visa obter o perfil histórico e cultural vivenciado
pelas populações ribeirinhas da Amazônia, onde a intenção é buscar
meios de melhoria da qualidade de vida, usando os recursos naturais
disponíveis da mata, como castanha do Brasil, andiroba, copaíba e
que pudessem ser exploradas de forma sustentável sem prejuízos ao
ecossistema, a fim de, ter uma sustentabilidade adequada ao
ambiente em que vivem, tendo conhecimento das potencialidades da
região. Desta forma diminuir as desigualdade social e garantir a
oferta alimentar mais igualitária para toda população e construir o
processo de sustentabilidade a longo prazo e contínuo que seja
garantido nos domínios: econômico, político, social, cultural e
humano.
3. METODOLOGIA
A pesquisa e sua aplicação tiveram como suporte a
cotidianidade, considerando a historicidade de seus processos, nas
situações em seu movimento e nas aproximações com a totalidade.
Quanto ao conhecimento da realidade nos embasamos em um olhar
etnográfico e por obras de pesquisadores que consideram o cotidiano
como “locus” imprescindível na pesquisa. Procuramos através deste
“olhar” etnográfico compreender a comunidade em seus mais amplos
aspectos, buscando sua organização social e produtiva. Para isso, o
Projeto Beradão (projeto interdisciplinar desenvolvidos por
pesquisadores da Universidade de Rondônia atuando com
comunidades ribeirinhas), nos deu todas as condições necessárias,
desde o debate com o grupo de pesquisa nas suas mais diversas
investigações até as estadias junto à comunidade. Com o decorrer da
pesquisa, os moradores se interessaram pelo conteúdo do estudo e
houve a participação no sentido de facilitar o desenvolvimento dos
trabalhos.
Para a formação de nosso banco de dados, aplicou-se como
método investigativo o uso de observações proporcionadas pela
convivência com as famílias e que foram complementadas com a
aplicação de entrevistas semi-estruturadas que poderiam ser reorientadas a qualquer momento conforme o encaminhamento do
diálogo e com a aplicação de entrevista com questionários fechados
(MURRIETA – 1998).
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Compreenderam-se as relações sociais do grupo e que
permitiram minimizar a ausência de alimentos, representado pela
troca entre “compadres e comadres”. Esta relação de troca amortiza
as dependências à um dos mais sérios conflitos do qual a
comunidade passa: a aquisição de produtos alimentares não ofertados
pela floresta, com forte conotação as condições econômicas de cada
família, em contraste com a cultura alimentar do grupo.
Se por hábito alimentar compreende-se num costume a que
um grupo social tem na sua forma mais conveniente de utilizar o
alimento em função de uma cultura (Morán, 1990; Murrieta, 1998 &
Machado, 1984), o costume alimentar da comunidade de Nazaré não
se exclui deste contexto.
Desta forma, o conflito formado em torno do hábito
alimentar está motivado pela presença de recursos financeiros
provenientes das reorganizações culturais efetivas para a sobreviver
em um modelo econômico de exploração da borracha na Amazônia e
gerou o sistema do barracão. Tais hábitos perduram até os dias
atuais.
A formação cultural proveniente do encontro do povo
nordestino e as nações indígenas amazônica configuram-se em uma
seletividade especifica dos alimentos, obrigando a estrutura de
restrições e tabus alimentares. Tal estrutura, além de sua
configuração cultura, possui forte herança do modelo econômico ao
qual a região amazônica foi submetida.
O grupo social ainda tem presente os itens oferecidos pelo
barracão e que caracteriza em problema alimentar, pois a
potencialidade da oferta alimentar local é secundarizada tal situação
cria para as famílias que não possuem renda, a condição de fome por
ausência de nutrientes (CASTRO, 2001)
Criou-se portanto, uma produção histórica do imaginário na
comunidade de Nazaré baseada na época da borracha, onde o acesso
a produtos industrializados e a outros alimentos importados era
imposto pelo barracão, sem medir os impactos que poderiam ocorrer
na formação de uma nova cultura e posterior criação de categorias
sociais.
Contudo, na medida em que a estabeleceu uma herança
cultural habilitou-se também o grupo a entender o seu ambiente,
garantindo sua sobrevivência, favorecendo a uma manutenção
tecnológica desatualizada, baixa escolaridade e frágil conhecimento
das instituições financeiras, que não os habilitou para criar um modo
economicamente sustentável, corroborado pela historia exclusão dos
modelos de desenvolvimento regional.
5. CONCLUSÃO
Esta produção agrícola, apesar de insipiente, atrelada a
órgãos intervencionistas municipais, estaduais ou federais, resultou
em mudanças na organização social após o declínio do período áureo
da Borracha, com a criação das seguintes categorias sociais:
funcionários públicos, produtores rurais e aposentados.
É importante que se esclareça a preocupação em distribuir
corretamente os produtos alimentícios para consumo, aproveitando
todas as suas partes comestíveis, e com isso beneficiar a saúde
pública. Informar a importância da castanha-do-brasil, como
alimento diário para a reposição de cálcio é uma ação de caráter
educativo imediato para atuais e futuras gerações. Porém o que se vê
do hábito alimentar desta comunidade é um fenômeno ligado
exclusivamente a história econômica, já que está muito acostumada
ao hábito alimentar não extrativista.
O extrativismo da borracha criou um hábito alimentar
artificial totalmente vinculado ao barracão tendo como estratégia a
manutenção do poder sobre o seringueiro. Tal hábito, ainda poder ser
caracterizado na atualidade levando-os a dependência aos produtos
da mercearia.
Não houve, portanto, a substituição da lista de alimentos
comprados no barracão do período de extração da borracha com a
lista dos itens que compram atualmente na mercearia. Isto significa
que muito destes itens poderiam ser substituídos por itens de
produção própria. Exemplo: biscoitos por macaxeira; feijão carioca,
por feijão de corda ou de praia; etc. Ou seja, continuam endividados
com o “novo barracão” – a mercearia - , desnecessariamente.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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