Interdisciplinar: Revista Eletrônica da UNIVAR

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Interdisciplinar: Revista Eletrônica da UNIVAR
Interdisciplinar: Revista Eletrônica da UNIVAR
http://revista.univar.edu.br
Ano de publicação: 2014
N°.:12 Vol.:2 Págs.:20 - 26
ISSN 1984-431X
O MENOR INFRATOR DO MUNICÍPIO DE NOVA XAVANTINA/MT:
DIAGNÓSTICO PARA UMA POLÍTICA PÚBLICA
Valteir Alves dos Santos1, Ivor Prolo2 e Laura Polyanna Souza Oliveira3
RESUMO: Esta pesquisa tem o intuito de traçar um panorama do menor infrator no município de Nova Xavantina/MT
com a finalidade de auxiliar o poder público no planejamento de uma gestão pública eficiente para diminuir e/ou
amenizar a problemática causada pelo menor infrator no município. A pesquisa, de caráter qualitativo, utilizou um
levantamento de dados oficiais e entrevistas. Como resultados, encontrou projetos na cidade que contribuem com a
prevenção dos índices de infração cometidos pelo menor de idade. Embora não exista nenhum centro de
ressocialização, cabe ao Estado e ao município promoverem políticas de fortalecimento e reinserção desse jovem no
meio social.
Palavras-chave: adolescente infrator, ato infracional, ressocialização, política pública.
ABSTRACT: ABSTRACT: This research aims to give an overview of the juvenile offender in the city of Nova
Xavantina/MT with the purpose of auxiliary the government in the planning of an efficient public management to
reduce and/or soften the problems caused by the juvenile offender in the city. The research, qualitative, used a survey of
official data and interviews. As a result, it was founded projects in the city that contribute to the prevention of indices of
offense committed by the juvenile offender. Although there is no rehabilitation center, accruing to the State and the
municipality promote policies of strengthen and reintegration of this young in the social environment.
Keywords: juvenile offender, offense act, rehabilitation, public policy.
1
Bacharel em Turismo pela UNEMAT (2012) e em Administração pela UFMT/UAB (2013), pós-graduado em Gestão Pública (2014), trabalha na
delegacia de polícia civil de Nova Xavantina.
2
Bacharel em Turismo pela UNEMAT (2006), Mestre em Administração pela FEAD (2014), atuou como professor pesquisador/orientador no curso
de Gestão Pública oferecida pela UFMT, modalidade UAB e, atualmente trabalha como profissional técnico da educação superior na Universidade do
Estado de Mato Grosso (e-mail: [email protected]).
3
Licenciada em Ciências Biológicas pela UNEMAT (2010), pós-graduada em Gestão Pública pela UFMT/UAB (2012), trabalha como professora na
rede estadual de educação (e-mail: [email protected]).
1. INTRODUÇÃO
A criminalidade vem crescendo a cada dia e
passou a fazer parte do cotidiano brasileiro. Não são
poucas as notícias e imagens que chegam expondo o
sério problema da violência (ABREU; LOURENÇO,
2010).
As causas da violência estão associadas, em
parte, aos problemas sociais como a miséria, a fome e o
desemprego, no entanto, vale ressaltar que nem todos
os tipos de criminalidade derivam das condições
econômicas. Adorno (apud OLIVEIRA, 2010, p. 16)
faz um interessante questionamento acerca de tema:
“como não falar em violência se sequer os direitos
sociais fundamentais — o direito ao trabalho, à
educação, à saúde, ou seja, aqueles direitos que
recobrem a dignidade da pessoa humana não estão
universalizados, isto é, assegurados para todos os
cidadãos”.
Um Estado ineficiente e sem programas de
políticas públicas na área de segurança contribui para
aumentar a sensação de injustiça e impunidade, que é,
talvez, a principal causa da violência. Crianças e
adolescentes, com o consumo de drogas, ficam
expostas e vulneráveis a prática de outros crimes, os
mais comuns praticados para sustentar o vício são os
crimes de furto, roubo e tráfico. Na verdade é a droga
que leva o adolescente a enveredar pelo caminho do ato
infracional.
Nesse intuito, o objetivo desse artigo é traçar
um panorama do menor infrator do município de Nova
Xavantina/MT de maneira que o poder público possa
ter um diagnóstico desta situação para poder planejar
uma gestão pública preventiva para diminuir e/ou
amenizar a problemática causada pelo menor infrator
no município.
O propósito desta pesquisa vem ao encontro
do aumento de autos de investigação de atos
infracionais registrados e instaurados no município de
Nova Xavantina, também pelo fato, de cada vez mais
cedo o adolescente ingressar no mundo do crime. A
finalidade é chamar a atenção das autoridades
constituídas no município para a importância de se
trabalhar com políticas públicas de prevenção e de se
criar programas voltados para o adolescente e para as
famílias menos favorecidas economicamente, além de
ampliar as reflexões sobre essa temática, necessidade
relatada por Silva (2009).
2. A CRIMINALIDADE NO PAÍS
ESTATUTO
DA
CRIANÇA
E
ADOLESCENTE
E
O
DO
No Brasil, a violência é um dos fenômenos
que mais tem preocupado a população nas últimas
décadas. Esse crescimento gerou estudos em diversas
áreas das Ciências Sociais, com a maior parte dos
recursos alocados na área de segurança pública
voltados, principalmente, para o bem-estar e à
ressocialização do menor infrator (ANDRADE e
PEIXOTO, 2007; BITU, 2008).
Carvalho (2013) apresenta a evolução da
taxa de mortalidade por armas de fogo no país, os
dados são assustadores e dão conta de que 36.792
pessoas foram assassinadas a tiros em 2010, com a
maior incidência entre a população jovem, de 15 a 29
anos. Segundo o autor, o Brasil mantém uma taxa de
20,4 homicídios por 100 mil habitantes, a oitava pior
marca entre 100 nações com estatísticas consideradas
relativamente confiáveis sobre o assunto.
Segundo Petraglia (2014), uma pesquisa
divulgada pela ONG (organização não governamental)
Conselho Cidadão para a Segurança Pública e Justiça
Penal, do México, aponta Cuiabá como a 29ª entre as
50 mais violentas do mundo, o estudo utilizou taxas de
homicídio do ano de 2013. A capital mato-grossense já
figurava entre as mais violentas do mundo no ranking
de 2012, porém, na 31ª posição.
Campanhas foram deflagradas com o intuito
de reduzir esses indicadores, a prioridade da segurança
pública declarada por governadores e iniciativas do
governo federal, como a campanha do desarmamento
não foi suficiente para forçar a queda e amenizar os
índices de violência na primeira década do século XXI
(CARVALHO, 2013), como uma maneira de diminuir
o efeito negativo de insegurança e vazio inerente à ação
perpetrada da criminalidade a quem está envolvido
direta ou indiretamente (OLIVEIRA, 2013).
De acordo com Chalita (2004), o laço
familiar é essencial para que a criança ganhe confiança
e se sinta amparada para esses novos desafios. Afirma
ainda que a simples e direta cumplicidade entre pais e
filhos é de suma importância para estreitar o
relacionamento entre eles para que o filho cresça num
ambiente onde possa enxergar nos pais o seu porto
seguro, uma vez que os valores éticos e morais devem
se repassados de geração a geração, no seio familiar e
não através de estranhos ou círculo de amigos.
Assis (1999) acrescenta nesta discussão que
fatores como a roda de amigos, consumo de drogas,
determinados tipos de lazer, valores do que é certo e
errado, vínculo afetivo familiar, o número e a posição
entre irmãos, a escola, a dor e a aflição devido à
violência sofrida pelos pais podem contribuir para o
ingresso no mundo do crime. A autora enfatiza que
esses fatores podem contribuir ou estar associados à
prática ou reincidência de crimes praticados por
menores infratores, ainda, que eles possam determinar
a identidade futura desse adolescente.
A negligência e a privação familiar podem
ser fatores responsáveis pelo cometimento de delitos
(WINNICOTT, 1994) e o caminho da delinquência
juvenil também pode estar relacionado à falta de
inclusão, principalmente, no convívio próximo o qual
está inserido esse adolescente, a começar pelo seio
familiar e escolar (VILAR, 2004). Chalita (2004, p. 21)
complementa que “a preparação para a vida, a
formação da pessoa, a construção do ser são
responsabilidades da família”.
Camargo (2013) amplia esta reflexão
quando afirma que a violência está relacionada com a
desigualdade social. Para o autor, os problemas sociais
acabam de certa forma, corroborando para o aumento
da violência, contudo, é o Estado quem tem por
obrigação amparar e oferecer ao cidadão políticas
públicas eficientes, bem como proporcionar a ele
oportunidades de viver dignamente.
As palavras de Ferreira (2010) vão ao
encontro do exposto por Camargo (2013), para eles, a
falta de oportunidades e a injustiça social acabam
contribuindo, em parte, para o ingresso do jovem na
criminalidade, principalmente, aqueles oriundos de
famílias menos favorecidas. Porém, Ferreira acrescenta
que a sensação de impunidade também leva a prática
ou reincidência de crimes, sobretudo, na adolescência
quando aqueles que vivem na margem da Lei por não
terem oportunidades de emprego, lazer e acesso à
escola. Santos (2012) complementa que o crime e a
violência, em sua maioria, são praticados por pessoas
oriundas das classes sociais mais baixas, considerados
como “marginalizados”.
Como uma forma de proteger os direitos da
criança e do adolescente foi criado o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), instituído pela Lei nº
8069/90 (BRASIL, 1990). O principal objetivo é a
proteção dos menores de 18 anos, proporcionando lhes
desenvolvimento físico, mental, moral e social
condizentes com os princípios constitucionais,
preparando-os para a vida adulta em sociedade.
No entanto, o Estatuto da Criança e do
Adolescente também rege sobre atos praticados pelo
menor de idade, o qual utiliza a terminologia “ato
infracional” para atribuir o fato praticado por menores
infratores, mesmo que se enquadre como crime ou
contravenção na esfera penal. Não se atribui uma pena
aos atos infracionais praticados por jovens menores de
dezoito anos, mas são aplicadas medidas
socioeducativas (GOIS, 2005).
Entende-se por ato infracional, de acordo
com o artigo 103 do ECA “a conduta descrita como
crime ou contravenção penal” (BRASIL, 1990),
portanto, o ato infracional é o ato condenável, de
desrespeito às Leis, à ordem pública, aos direitos dos
cidadãos ou ao patrimônio, cometido por crianças ou
adolescentes (AQUINO, 2012).
Para conceituar atos de impunidade do
menor infrator a que se distinguir criança de
adolescente para melhor entender as medidas
21
socioeducativas aplicadas a cada um deles. De acordo
com Ishida (2008, p. 2), a “criança a pessoa com até
doze anos de idade incompletos e adolescente, aquela
entre doze e dezoito anos de idade”.
Bandeira (2010) acrescenta que não se pode
aplicar à criança qualquer medida socioeducativa
porque — devido à sua condição particular ainda estar
em formação — não tem aptidão suficiente para
entender o caráter ilícito do ato infracional. Nesse
contexto, a criança e o adolescente são enxergados
como pessoas em desenvolvimento (SILVA, 2009).
O artigo 3º do ECA reforça que devem ser
dados à criança e ao adolescente todos os privilégios
para que eles tenham garantidos os seus direitos
constitucionais, bem como oportunidades de se
desenvolver como pessoas: tanto no seio familiar
quanto no meio social. Ou seja, deve-se enxergar tanto
a criança quanto o adolescente como sujeitos de
direitos. O estatuto reforça no seu Art. 70 (BRASIL,
1990), “é dever de todos prevenir a ocorrência de
ameaça ou violação dos direitos da criança e do
adolescente”.
Quanto à mitologia da irresponsabilidade,
essa está relacionada à ideia de que crianças e
adolescentes não seriam realmente punidos, já que a
legislação é extremamente branda no tratamento desses
procedimentos. Porém, deve-se lembrar que
inimputabilidade penal é diferente de impunidade
(VOLPI, 2001). Silva (1999) discorre sobre a
necessidade de conceituar impunidade para não se
confundir com inimputabilidade, o primeiro refere-se a
não punição e o segundo é quando não há culpa.
Portanto, grande parte da sociedade
brasileira considera o ECA excessivamente paternalista
em relação aos atos infracionais cometidos por crianças
e adolescentes, uma vez que os atos infracionais estão
ficando cada vez mais violentos. Muitos consideram
que o estatuto (ECA) — que protege e educa a criança
e o adolescente—, na prática, deixa-os sem nenhum
tipo de punição ou mesmo ressocialização e, em alguns
casos, eles são usados por grupos de criminosos para
livrar-se de responsabilidades criminais fazendo com
que adolescentes assumam a culpa, em face de serem
inimputáveis perante a lei.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Essa pesquisa foi realizada no município de
Nova Xavantina, Estado de Mato Grosso, onde a
população é de aproximadamente 19.643 habitantes,
segundo censo do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística - IBGE (2010). A cidade fica localizada a
635 quilômetros da capital Cuiabá.
Para atingir os objetivos propostos, foi
realizada uma pesquisa de caráter qualitativo, que se
configurou como exploratória, bibliográfica e de
campo, com base em Dencker (1998). Para a autora, a
abordagem qualitativa oferece alternativas para que o
pesquisador possa, através da pesquisa de campo,
complementar o seu embasamento teórico.
Houve dois momentos na sua realização: o
primeiro, baseado na pesquisa bibliográfica, conforme
orientações de Vergara (2007), e o segundo na pesquisa
de campo com levantamento de dados estatísticos,
tendo referência o ano de 2013 e a aplicação da técnica
de entrevista, com perguntas semiabertas, elaborada
conforme orientações de Vergara (2009). As
entrevistas foram realizadas com integrantes do
Conselho Tutelar, Vara da Infância e Juventude –
Promotoria e Delegacia de Polícia. Ao total, foram
onze (11) entrevistados.
Os dados coletados foram interpretados a
partir do método de análise de conteúdo. Bardin (2009)
discorre que o este método é fundamental para que o
pesquisador possa buscar a campo os dados
complementares para o andamento da pesquisa. Moraes
(1999) complementa que o método de análise de
conteúdo constitui uma metodologia usada para
descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de
documentos e textos, bem como compreende
procedimentos especiais para o processamento de
dados científicos.
4. O PERFIL DO MENOR INFRATOR EM NOVA
XAVANTINA
Para entender a realidade do menor infrator
no município de Nova Xavantina, procurou-se traçar
um perfil deste menor, considerando os dados
coletados na delegacia municipal referente ao ano de
2013. Destaca-se que no ano referência foram
instaurados 95 procedimentos (pessoas diferentes),
embora tenham registrados somente 76 autos
infracionais distintos. Tal diferença ocorre devido ao
número de autos de investigação de atos infracionais
instaurados com relação ao número de participantes,
em face de que, em alguns casos, havia mais de um
adolescente infrator por procedimento instaurado.
Na Tabela 1, pode ser visualizado o perfil do
menor infrator no município de Nova Xavantina. A
idade média dos menores de idades é de 15,8 anos e a
categoria 16 < 18 aparece como a idade mais recorrente
(73%). Quanto à variável sexo, 18% são do sexo
feminino e 82% do sexo masculino. É notória a
predominância de adolescentes infratores do sexo
masculino. Percebe-se que os menores do sexo
masculino estão mais propensos à prática de crimes. De
acordo com Volpi (apud COLPANI, 2003), a
permanência mais prolongada das meninas no lar tem
sido apontada como um dos fatores responsáveis pela
sua maior frequência à escola, pela menor presença
delas nas ruas e pelo seu menor envolvimento em atos
infracionais.
Quanto à tipificação do ato infracional, a
categorização/qualificação em ato grave, não grave e
outros, a última tem menor potencial ofensivo. Esta
classificação foi baseada nas informações coletadas
junto ao “Relatório de Pesquisa – Perfil do Adolescente
Infrator”, realizada no Distrito Federal por Araújo
(2011), entre os meses de março e dezembro/2010.
Os dados obtidos no tocante à qualificação
do Ato Infracional no município de Nova Xavantina,
pode-se observar que 32% dos adolescentes praticaram
atos graves, 45% os atos não graves e 21% praticaram
22
outros procedimentos tipificados como de natureza
menos relevante. Ao analisar os dados, percebe que o
procedimento com o maior índice de frequência foi o
de furto qualificado, categorizado como ato grave,
aquele cometido com destruição ou quebra de
obstáculo, com abuso de confiança ou mediante fraude,
escalada ou destreza, com emprego de chave falsa ou
mediante concurso de duas ou mais pessoas (SILVA,
2002).
E, ao comparar os dados coletados no
município de Nova Xavantina com os dados da
pesquisa no Distrito Federal (ARAÚJO, 2011),
percebe-se que, enquanto em Nova Xavantina ocorreu
uma maior predominância na prática de atos não graves
(45%), no Distrito Federal o maior índice de atuação se
deu em razão da tipificação de procedimentos de
natureza grave (53%), com maior incidência para o
delito de natureza roubo. O fato de o Distrito Federal
apresentar uma maior incidência para delitos de
natureza grave pode estar relacionado ao maior número
de habitantes, mais de 2,7 milhões. Benedetti (2013)
acrescenta que, enquanto o menor não consegue a
consumação de uma infração de natureza grave, não
será ele internado, em face de os representantes dos
Ministérios Públicos não estarem conseguindo vagas
nos centros de internação, os quais estão cada vez mais
superlotados, em virtude do aumento no índice de
adolescentes na prática e reincidência de delitos.
Tabela 1: Perfil do menor infrator no município de
Nova Xavantina em 2013
Categoria
Número
Porcentagem
de
(%)
respostas
Idade
12 < 14
08
8
14 < 16
18
19
16 < 18
69
73
Sexo
Masculino
78
82
Feminino
17
18
Tipificação do ato
infracional cometido
Roubo
01
Tráfico de
04
drogas
Associação
04
Graves
32
para o tráfico
Furto
12
qualificado
Estupro
03
Furto
06
Lesão
08
corporal
Uso ilícito de
09
drogas
Não
Receptação
04
45
Graves
Vias de fato
04
Dano
02
Ameaça
01
Falso
01
testemunho
Difamação
01
Perturbação
01
da
Outros
21
tranquilidade
Outros
15
Fonte: Dados da Delegacia Municipal de Nova
Xavantina / Elaborada pelos autores (2014)
5. O MENOR INFRATOR VISTO
ÓRGÃOS DE NOVA XAVANTINA
PELOS
Essa parte do artigo é resultado das entrevistas
realizadas com as pessoas ligadas diretamente aos
Conselhos Tutelares, Vara da infância e Juventude Fórum e a Delegacia de Polícia Civil, tendo como
critério adotado entrevistar estes servidores que
trabalham diretamente no atendimento de casos do
menor infrator.
Ao levar em consideração o questionamento
sobre o que leva o menor de idade à prática de atos
infracionais, a maioria dos entrevistados foi enfática
em afirmar que a desestrutura familiar é um dos
principais agravantes e a conseguinte falta de afeto e
amor por parte dos pais. Isso pode ser enfatizado pelo
relato de um dos entrevistados que diz que: “Iniciamos
a investigação do histórico de um menor infrator e
ficou visível a falta de estrutura familiar, pois, é ali no
berço que ele vai definir seus valores e caráter”.
Ao questionar os pesquisados se o uso de
substâncias psicoativas, como droga e álcool estimula a
prática de atos infracionais, todos afirmaram que sim.
Segundo eles, estas substâncias acabam encorajando o
menor à prática de crimes e, com o passar do tempo,
eles continuam a praticar essas infrações para sustentar
o vício e até vender os objetos da própria casa. Um dos
entrevistados alerta que, além do menor se sentir
encorajado com o uso de drogas para a prática de
crimes, ele acaba se valendo dessa substância para a
prática de outros delitos, os mais comuns, aqueles
contra o patrimônio.
As drogas podem ser consideradas uma das
mais importantes e polêmicas causas de delinquência
entre menores, depois de se tornar um dependente, ele
depara com a necessidade de manter o vício e, para
isto, torna-se capaz de cometer as piores atrocidades
contra a vida humana (SANTANA, 2006).
O terceiro questionamento procurou saber
dos entrevistados se a adoção de políticas preventivas,
centradas na promoção da educação, do trabalho, do
esporte e do lazer seria capaz de diminuir o risco da
prática de atos infracionais. Todos os entrevistados
foram categóricos em afirmar que sim. De acordo com
eles, é através da educação, cultura e lazer que se cria
um cidadão mais consciente, menos corruptível, ainda
que o investimento em políticas de prevenção com
certeza diminuiria a prática de atos infracionais.
Bombardi (apud SEQUEIRA, 2012, p. 21)
ressalta que “a sociedade marginaliza os jovens em
situação de vulnerabilidade social, oferecendo uma
pseudo-educação juntamente com poucos espaços de
cultura e desenvolvimento”. A autora esclarece o
23
quanto é necessário e importante trabalhar políticas
públicas que realmente atendam as famílias mais
carentes, especialmente aos jovens — oferecendo
escolas de qualidade e dando a eles oportunidades de
crescer, tanto dignamente quanto financeiramente.
Já Abramovay (2003, p. 38) faz menção a
esse questionamento: para ela “a carência de atividades
de diversão na comunidade é explorada pelo tráfico
que, em muitos lugares, marca presença ocupando um
espaço aberto deixado pelo poder público,
constituindo-se em referência para os jovens”. Nas
palavras da autora, quando o Estado deixa de atuar na
adoção de políticas públicas abre espaço para que
outras atividades sejam inseridas na comunidade, estas
acabam por levar os jovens a trilhar outros caminhos,
muitas das vezes sem volta. O entrevistado da
delegacia civil enfatiza que há necessidade da
implantação dessas políticas públicas no cotidiano do
menor de idade, em face dele ser uma pessoa
vulnerável e estar em busca constante pelo novo,
segundo ele: “a falta de atividade, ou seja, a
ociosidade do adolescente, que por natureza é
inquieto, aumenta sua eventual tendência à prática de
atos infracionais”.
De acordo com outro entrevistado, para que
de fato a ressocialização aconteça, o primeiro passo
seria trabalhar com a família do menor infrator, pois,
ela é a primeira a rejeitá-lo. A base é a família. A
escola e a comunidade são importantes para
continuação na formação do caráter da criança, enfatiza
um entrevistado. Outro entrevistado diz que se o
jovem se sentir excluído da família e sociedade com
certeza voltará a delinquir porque não encontrará
alternativa. É na família e na escola que o menor
aprende a ser cidadão, ou seja, as regras de boa
convivência. Arpini (apud OLIVEIRA, 2010, p. 21)
colabora ao afirmar que “é importante que os
adolescentes estejam inseridos no universo de
instituições formais como a escola, o trabalho e a
família”.
De acordo com o exposto pelo autor, se o
indivíduo deixa de ser assistido por programas sociais e
não recebe o apoio da família pode ser atraído por
atividades onde se predomina valores negativos, como
a marginalidade.
Há um entrevistado que critica que os
adolescentes infratores não recebem o tratamento
adequado nas instituições em que permanecem
segregados e que cabe a família, assim como a
sociedade, proporcionar todo o apoio necessário para
que ele não volte a delinquir. Assim, há que se pensar
em políticas públicas voltadas para programas
educacionais e profissionalizantes, além de criar
condições para que estes programas possam atuar na
formação do caráter e moral desse menor.
Sequeira (2012, p. 90) enfatiza que “as
medidas socioeducativas mais interessantes são aquelas
que oferecem ao jovem a possibilidade de
desenvolvimento pessoal, rompem com a ideia de
punição vinculada ao preconceito, vingança ou castigo
e se embasam no caráter educativo e social”. Para a
autora, o processo de ressocialização tem que ser capaz
de desenvolver a cidadania do adolescente, muitas das
vezes esquecida pela condição de vida marcada pela
exclusão social.
Por último, foi questionado se os
entrevistados conhecem algum programa no município
de Nova Xavantina que pode estar contribuindo para
diminuição dos índices de menores infratores. Todos
elencaram os programas e/ou locais que desenvolvem
atividades voltadas para esses menores: o Centro de
Formação e Espiritualidade Missionária - CEFEM; a
Secretaria de Esportes do Município de Nova
Xavantina; Projeto Mais Educação, desenvolvido pela
Escola Arlindo Estilac Leal e o Projeto Serviço de
Convivência e Fortalecimento de Vínculo, antigo Prójovem, o qual vem sendo desenvolvido em parceria
com o Projeto AABB Comunidade.
Percebe-se que durante a pesquisa nenhum dos
entrevistados se atentou para o fato de não existir no
município um centro de apoio que trabalhe diretamente
com a ressocialização do menor infrator. O gestor
público precisa se conscientizar da necessidade de, em
parceria com outras cidades, buscar mecanismos para a
implantação de um centro que possa atuar na
ressocialização desse menor, com cursos e oficinas
profissionalizantes, criação do primeiro emprego, em
fim, desenvolver alternativas para que as famílias mais
carentes possam ter a oportunidade de dar uma boa
educação aos seus filhos.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o exposto, reporta-se que a
criminalidade se tornou um dos principais problemas
para a sociedade, um tema polêmico e complexo, não
deve ser analisado isoladamente, sendo necessário
integrá-lo num contexto social, cultural, político e
econômico.
Diversos são os fatores que contribuem para
o amadurecimento do adolescente e na formação de sua
identidade: escola, família, amigos e comunidade e
fatores biológicos, psicológicos e emocionais. A
adolescência é um período de intensas atividades e
transformações na vida mental e corporal do indivíduo.
Estas diversas manifestações de comportamento pode
contribuir para que esse adolescente venha a se tornar
um menor infrator.
No decorrer da pesquisa ficou claro que a
desestruturação familiar é um dos principais agravantes
que leva o adolescente a se tornar um infrator. Como
estão vulneráveis, essas crianças e adolescentes estão
mais expostas aos malefícios da sociedade que, ao ser
confrontados com desafios e responsabilidades que a
vida os traz, alguns preferem optar pelo caminho que
lhe parece mais fácil: a delinqüência.
A visão do ECA não é somente de uma
justiça que tem por finalidade o restabelecimento da
ordem violada pelo delito, mas sim a premissa de que a
prevenção é mais eficiente do que a punição, pois o
estatuto visa a socialização do adolescente infrator —
buscando a participação do jovem e da sua família no
processo socioeducativo. Durante a pesquisa observouse a questão da infância e juventude como sendo uma
questão de política pública e não somente de segurança
24
pública. O estado deve promover e adotar programas
que deem respostas sociais justas e adequadas à pratica
de atos infracionais. É preciso enxergar o ato
infracional como uma causa oriunda de um processo de
exclusão, como: a falta de acesso à escola, a falta de
oportunidade de lazer e de uma opção de vida, a
ausência do convívio familiar e de uma relação positiva
com a sociedade ao qual o menor está inserido.
Através de suas autoridades constituídas, o
Estado precisa promover, desenvolver e aprimorar
políticas públicas voltadas para o atendimento do
adolescente em conflito com a lei, que tenha como
propósito a sua inclusão em uma política mais ampla e
que, de fato, provoque a reinserção desse jovem no
meio social, resgatando-o das condições adversas a que
está imposto.
Portanto, além de desenvolver programas
específicos voltados para o adolescente infrator, é
preciso se atentar para a necessidade de se criar
alternativas para que a família do adolescente,
principalmente aquelas mais carentes, tenha a
oportunidade de propiciar uma educação de qualidade
para os seus filhos. O Estado precisa dar condições
para que a família realmente atue como um agente
socializador, com programas voltados para o bem-estar
e ressocialização do menor infrator.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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