Atualização no tratamento da dermatite atópica

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Atualização no tratamento da dermatite atópica
Artigo de Revisão
Atualização no tratamento da dermatite atópica
Update in the treatment of atopic dermatitis
Pérsio Roxo Júnior¹
RESUMO
ABSTRACT
Objetivo: Apresentar uma revisão atualizada de artigos
referentes aos recursos terapêuticos farmacológicos e não
farmacológicos para dermatite atópica.
Fonte de dados: Foram consultadas as fontes de dados
Medline, Lilacs e SciELO, utilizando-se as palavras-chave
‘dermatite atópica’, ‘eczema atópico’, ‘anti-histamínicos’ e
‘antiinflamatórios’, publicados no período de 1995 a 2005.
Foram encontrados 80 artigos, sendo selecionados aqueles
relacionados ao tratamento da dermatite atópica.
Síntese dos dados: O diagnóstico etiológico dos alérgenos envolvidos na dermatite atópica deve ser o mais preciso
possível, para que a profilaxia ambiental seja otimizada. A
recuperação da barreira cutânea deve ser valorizada, valendo-se
do uso diário de emolientes. Anti-histamínicos são as drogas
de escolha para o controle sintomático do prurido cutâneo. Os
corticosteróides tópicos são drogas extremamente eficazes no
controle da inflamação crônica, porém devem ser utilizados
por tempo limitado devido ao risco de efeitos adversos. Além
dessas medidas, o estudo mostrou que outras opções podem
ser adotadas para o controle da inflamação cutânea, como antileucotrienos, imunossupressores tópicos e sistêmicos, sendo
estes últimos restritos aos casos mais graves e resistentes.
Conclusões: Os pacientes portadores de dermatite atópica
devem ser avaliados de forma global e individualizada, de
modo a permitir que a profilaxia ambiental e o tratamento
farmacológico adequados sejam instituídos precocemente.
Objective: To present an updated review of pharmacologic and non-pharmacologic therapeutic resources for the
treatment of atopic dermatitis.
Data source: Studies published from 1995 to 2005
were searched from Medline, Lilacs and SciELO databases
using the key words ‘atopic dermatitis’, ‘atopic eczema’,
‘anti-histamines’, and ‘anti-inflammatory drugs’. Eighty
manuscripts were found, and studies on the treatment of
atopic dermatitis were selected.
Data synthesis: The etiologic diagnosis of allergens
associated to atopic dermatitis must be as precise as possible in order to optimize an environmental prophylaxis.
Preservation of the skin barrier must be achieved through
a daily use of emollients. Anti-histamines are drugs of
choice in order to reduce the symptoms of cutaneous pruritus. Topical steroids are extremely effective to control
chronic inflammation; however, they must be used during a
limited time period due to the risk of adverse effects. Antileucotrienes, topical, and systemic immunosuppressive
drugs are therapies available for the control of cutaneous
inflammation, but they should be used only in patients
with severe and resistant disease.
Conclusions: Patients with atopic dermatitis must receive a global and individual approach in order to achieve
effective environmental prophylaxis and pharmacologic
treatment as soon as possible.
Palavras-chave: Dermatite atópica; eczema atópico;
alergia; diagnóstico; tratamento.
Key-words: Atopic dermatitis; atopic eczema; allergy;
diagnosis; treatment.
¹Professor Assistente, Serviço de Imunologia, Alergia e Reumatologia do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; Professor
Titular da Disciplina de Pediatria do Curso de Medicina da Unaerp.
CEP 14015-110 – Ribeirão Preto/SP
E-mail: [email protected]
Endereço de correspondência:
Rua Campos Salles, 920, apto. 52
Recebido em: 23/6/2006
Aprovado em: 5/10/2006
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Pérsio Roxo Júnior
Introdução
A dermatite atópica (DA), também conhecida como eczema atópico, é uma doença inflamatória da pele, de caráter
crônico e recidivante, que evolui com períodos de ativação.
Está intimamente relacionada à atopia e freqüentemente se
associa a outras co-morbidades, como asma, rinite e conjuntivite alérgica(1).
O impacto social e econômico dessa doença é muito
relevante, especialmente nos casos graves, devido a sua interferência no sono e nas atividades diárias, assim como pelo
elevado custo financeiro para aquisição de medicamentos
para controle do prurido e da inflamação cutânea(2,3).
Sua freqüência é maior em lactentes (aproximadamente
60% dos casos) e crianças, havendo poucos dados sobre
sua prevalência. Entretanto, os estudos epidemiológicos
têm mostrado seu aumento, a exemplo de outras doenças
alérgicas(4).
A DA caracteriza-se por ser uma doença inflamatória bifásica, apresentando uma fase inicial ou aguda (mediada por reação
de hipersensibilidade imediata ou tipo I, com predomínio de
células Th2) e uma fase tardia ou crônica (mediada por reação
de hipersensibilidade retardada ou tipo IV, com predomínio de
células Th1), o que traz importantes implicações para o tratamento(5). Além dos linfócitos, o processo inflamatório envolve
a participação das células de Langerhans contendo IgE em sua
superfície, queratinócitos, eosinófilos, mastócitos e monócitos/
macrófagos. Na fase aguda, há uma grande proporção de células
Th2 produtoras de IL4, IL5 e IL13, culminando com o aumento na produção de IgE em resposta aos mais variados fatores
ambientais, bem como eosinofilia. O grande desenvolvimento
das células Th2 observado na fase aguda, pode ocorrer devido
aos seguintes fatores: microambientes nos quais as células T
se desenvolvem, presença de mediadores pró-alérgicos, sinais
co-estimulatórios presentes na ativação das células T e células
apresentadoras de antígenos(6-9).
Acredita-se que a pele seja a primeira porta de entrada
para os vários alérgenos ambientais, manifestando-se a DA
nos primeiros meses de vida. A sensibilização epicutânea
precoce, com migração posterior de células inflamatórias,
especialmente células Th2 sensibilizadas, para as vias aéreas
superiores e inferiores justificaria a inter-relação existente
entre pele e sistema respiratório(10). Gustafsson et al(11) avaliaram 94 crianças com DA por um período de oito anos e
observaram que 43% das crianças apresentavam asma e 45%
apresentaram rinite alérgica. Este estudo também mostrou
uma estreita relação entre a gravidade da DA e o desenvol-
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vimento posterior de asma e/ou níveis séricos elevados de
IgE total e específica.
As manifestações capitais da DA são prurido, eczema
e xerose cutânea, estando o prurido presente na imensa
maioria dos pacientes em fases aguda e subaguda, podendo
ser o sinal inicial de exacerbação. Em lactentes predomina
o eczema agudo (eritema, exsudação e vesiculação), acometendo principalmente face, couro cabeludo e superfícies extensoras dos membros. Em crianças mais velhas,
adolescentes e adultos predomina o eczema subagudo ou
crônico (escoriações e liquenificação), com localização
preferencial nas flexuras(12).
O diagnóstico da DA é eminentemente clínico, pois seus
achados histopatológicos são inespecíficos e não há um marcador laboratorial específico. Hanifin e Rajka(13) estabeleceram
a obrigatoriedade da presença de três dos quatro critérios
maiores (prurido; morfologia e distribuição típicas; evolução
crônica e recorrente; história pessoal ou familiar de atopia),
além de três critérios menores, em uma lista com 21.
Tratamento da dermatite atópica
A principal falha no manejo da DA é a não aderência ao tratamento. Por se tratar de doença crônica, o tratamento deve ser
planejado com perspectiva a longo prazo(14). A seguir, são apresentadas as principais medidas no manejo do paciente com DA.
Programas educacionais
Deve-se permitir que a família tenha uma vida mais próxima possível da normal, evitando restrições desnecessárias.
Recentemente, programas interdisciplinares padronizados
têm sido elaborados em vários países europeus. As principais
medidas educacionais recomendadas nestes programas são(1):
• Evitar contato da pele com tecidos à base de lã e fibras
sintéticas, bem como uso de roupa muito isolante (“roupa
quente”), para evitar a sudorese excessiva.
• Restringir o número diário de banhos para um ou dois,
que devem ser rápidos e com temperatura amena, seguidos de secagem imediata.
• Utilizar sabonetes brancos e neutros (menos irritativos)
para a limpeza mecânica da pele, para remover crostas e
secreções, se houver.
• Aumentar o uso de emolientes durante o inverno.
• Manter aleitamento materno exclusivo até seis meses
de idade.
• Somente evitar alimentos cujas evidências clínico-laboratoriais de alergia tenham sido detectadas.
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• Manter boa ingesta hídrica.
• Manter uma temperatura amena no quarto, evitando-se
o excesso de agasalhos.
• Evitar os aero-alérgenos domiciliares.
• Expor-se ao sol em horários adequados, para melhorar a
barreira cutânea.
• Seguir o calendário vacinal (inclusive para pacientes
alérgicos a ovo), desde que não haja comprometimento
cutâneo importante(15).
• Evitar o tabagismo.
Hidratantes e Emolientes
Há evidências de que, na DA, ocorre alteração na barreira
cutânea, com redução no extrato córneo lipídico, bem como
inadequação de seus componentes (colesterol, ácidos graxos
essenciais e ceramidas), acarretando aumento da perda hídrica
transcutânea. Assim, uma das principais estratégias para o
tratamento do paciente com DA é a recuperação da barreira
cutânea, com posterior manutenção de sua integridade(16,17). O
aumento na camada gordurosa da epiderme, com conseqüente diminuição nas perdas hídricas, tem influência direta na
melhora do prurido e na redução de contaminação bacteriana
secundária(18). Deve-se ter muito cuidado no uso de preparações
com uréia na fase de inflamação intensa da pele, pois podem
não ser bem toleradas. Nestes casos, recomenda-se iniciar pelo
tratamento para inflamação aguda e posteriormente introduzir
os hidratantes (como lactato de amônio) e emolientes, que
devem conter substâncias como ceramidas, ácidos graxos
essenciais e vaselina. Estas preparações devem ser utilizadas
abundantemente em toda extensão da pele, duas a quatro vezes
ao dia, inclusive logo após o banho(1).
Anti-histamínicos
Embora haja poucos estudos controlados sobre a eficácia
do uso rotineiro anti-histamínicos com ação anti-H1 na DA,
estas drogas são preferencialmente utilizadas para controlar
o prurido cutâneo, melhorando inclusive a qualidade do
sono(19,20). Anti-histamínicos clássicos (por exemplo, Hidroxizina) apresentam boa eficácia sobre o prurido devido
à sua ação sedativa central, podendo ser utilizados em comorbidades alérgicas associadas à DA(20). Anti-histamínicos
não clássicos são mais indicados para crianças maiores e
adultos, devido à sua ação sedativa discreta. Além disso,
algumas destas substâncias podem apresentar propriedades antiinflamatórias, conforme já foi demonstrado para
Cetirizina, Loratadina, Desloratadina e Fexofenadina, com
conseqüente boa ação antipruriginosa(21-23). Warner et al(24)
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demonstraram que a Cetirizina, utilizada por 18 meses,
foi eficaz para reduzir os sintomas de asma em adultos e o
risco para desenvolvimento de asma em crianças com DA,
especialmente aquelas sensibilizadas por ácaro e pólen. Este
estudo também demonstrou redução na necessidade de uso
tópico de corticosteróide. O emprego de anti-histamínicos
tópicos não apresentou eficácia relevante no controle do
prurido da DA(1).
Antimicrobianos
A associação entre deficiência na barreira cutânea e desequilíbrio Th1/Th2 predispõe os pacientes com DA a um
maior risco para infecção bacteriana e viral secundárias.
As reagudizações estão freqüentemente associadas a sinais
clínicos de infecção, havendo evidência de associação entre
superantígenos derivados do Staphylococcus aureus e exacerbações(1,25,26). A colonização cutânea por Staphylococcus aureus
apresenta correlação significante com a gravidade da DA(27).
Assim, na presença de evidência clínica de infecção secundária, é indicado o uso de antissépticos tópicos (Triclosan ou
Água Boricada), bem como antibióticos tópicos(1), embora
sua ação seja discutível. Caso a extensão das lesões infectadas
seja muito grande ou diante de sinais sistêmicos de infecção,
é indicada a antibioticoterapia sistêmica.
Em relação à contaminação viral, que ocorre mais freqüentemente em pacientes com DA, atenção particular deve
ser dispensada ao eczema herpético, causado por infecção
secundária pelo vírus Herpes simplex(1). Este diagnóstico deve
ser aventado na presença de lesões ulceradas ou erosivas disseminadas com eczema, acompanhadas de febre, mal estar e
adenomegalia. Nessa situação, é indicado o uso de Aciclovir
sistêmico(28). Molusco contagioso também é uma infecção
secundária freqüente.
Corticosteróides tópicos
Glicocorticosteróides tópicos (GT) são utilizados como
droga antiinflamatória de primeira escolha nos episódios de
agudização de DA, geralmente apresentando início de ação
rápido(1). Sua eficácia é otimizada quando as condições de
hidratação cutânea são adequadas. Deve-se dar preferência
para GT de potência baixa e média, pois os efeitos adversos
sistêmicos ou tópicos estão diretamente relacionados à potência(29). Entre os efeitos adversos mais freqüentes, destacam-se
supressão na função adrenal, aparecimento de estrias, telangiectasia, adelgaçamento da pele, dermatite perioral, rosácea,
dermatite de contato alérgica (muitas vezes provocada pelo
veículo das formulações) e infecção secundária(7,30).
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Há sete classes de GT, classificados conforme a potência(7)
(Tabela 1). Os de potência muito alta podem ser utilizados por
alguns dias, preferencialmente em áreas liquenificadas, devendo
ser evitados na face, pálpebras, áreas flexurais e genitália. Os de
potência alta devem ser utilizados em áreas com exacerbação aguda, exceto na face, por um tempo máximo de três semanas. Os de
potência intermediária podem ser utilizados por mais tempo (até
quatro semanas) em lesões crônicas de tronco e extremidades. Os
de potência baixa são indicados na manutenção do tratamento,
em áreas mais sensíveis(7). Dois estudos demonstraram que o
propionato de fluticasona e o furoato de mometasona apresentam
menor absorção sistêmica e boa eficácia, quando comparados aos
outros GT, podendo ser utilizados uma vez ao dia(31,32).
Corticosteróides sistêmicos
A corticoterapia sistêmica é reservada para casos mais
graves e refratários ao tratamento tópico. Quando indicados, devem ser utilizados pelo menor tempo possível
para evitar reações adversas sistêmicas e possível efeito
rebote(1,29).
Imunossupressores tópicos
Devido aos efeitos adversos dos corticosteróides e para
oferecer novas alternativas ao uso de corticosteróides,
foram desenvolvidos dois inibidores da calcineurina para
uso tópico, o Pimecrolimo (PM) 1% creme e o Tacrolimo
(TC) 0,03% e 0,1% pomada. A eficácia de ambos, com-
Quadro 1 – Classificação dos grupos de GT, de acordo com a potência
• Grupo I (potência muito alta)
Diacetato de diflorasona 0,05% (pomada)
Dipropionato de betametasona 0,05% (creme e pomada)
Propionato de clobetasol 0,05% (creme e pomada)
Propionato de halobetasol 0,05% (creme e pomada)
• Grupo IV (potência intermediária)
Acetonido de fluocinolona 0,025% (pomada)
Acetonido de triancinolona 0,1% (creme)
Flurandrenolida 0,05% (pomada)
Furoato de mometasona 0,1% (creme)
Valerato de hidrocortisona 0,2% (pomada)
• Grupo V (potência intermediária)
• Grupo II (potência alta)
Acetonido de fluticasona 0,025% (creme)
Amcinonida 0,1% (pomada)
Dipropionato de betametasona 0,05% (loção)
Dipropionato de betametasona 0,05% (creme e pomada)
Flurandrenolida 0,05% (creme)
Desoximetasona 0,25% (creme)
Prednicarbato 0,1% (creme)
Desoximetasona 0,05% (gel)
Diacetato de diflorasona 0,05% (pomada)
Propionato de fluticasona 0,05% (creme)
Valerato de betametasona 0,1% (creme)
Valerato de hidrocortisona 0,2% (creme)
Fluocinonida 0,05% (creme, gel, pomada e solução)
Furoato de mometasona 0,1% (pomada)
Halcinonida 0,1% (creme)
• Grupo VI (potência baixa)
Acetonido de fluocinolona 0,01% (creme e solução)
Desonida 0,05% (creme)
Dipropionato de alclometasona 0,05% (creme e pomada)
• Grupo III (potência intermediária)
Valerato de betametasona 0,05% (loção)
Acetonido de triancinolona 0,1% (pomada)
Amcinonida 0,1% (creme e loção)
Desoximetasona 0,05% (creme)
Diacetato de diflorasona 0,05% (creme)
Halcinonida 0,1% (pomada e solução)
• Grupo VII (potência baixa)
Acetato de hidrocortisona 1% (creme e pomada)
Acetato de hidrocortisona 2,5% (creme, loção e pomada)
Hidrocloridato de hidrocortisona 1% (creme e pomada)
Hidrocloridato de hidrocortisona 2,5% (creme, loção e pomada)
Propionato de fluticasona 0,005% (pomada)
Hidrocloridato de pramoxine 1% (creme, loção e pomada)
Valerato de betametasona 0,1% (pomada)
Hidrocloridato de pramoxine 2,5% (creme, loção e pomada)
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parada com a de placebo, já foi demonstrada em estudos
clínicos, com uso a curto(33,34) e longo prazo(35,36). Essas
drogas apresentam boa eficácia no controle de inflamação
cutânea e prurido, porém devem ser aplicadas no momento em que surgem o eritema e o prurido. Sua segurança
para uso diário contínuo já foi demonstrada, devido à
baixa absorção sistêmica. Seu principal efeito adverso é
sensação de ardor e queimação no local da aplicação, que
tende a desaparecer após a primeira semana de uso(37). Há
evidências de que estas drogas não elevam significantemente a predisposição para infecção cutânea viral. Apenas
um estudo clínico controlado mostrou tendência para
aumento na incidência de eczema herpético em crianças(38),
enquanto um número maior de estudos não demonstrou
tal tendência(39,40).
Pouco se sabe sobre a influência da origem étnica no
tratamento da DA. Eichenfield et al(41) realizaram estudo
duplo-cego controlado por placebo para avaliar a eficácia e
a tolerabilidade do PM 1% em 589 pacientes caucasianos
e não-caucasianos, com idades entre 3 meses e 17 anos, durante seis semanas. A análise dos resultados mostrou eficácia
do tratamento no grupo tratado com PM 1% em todos os
grupos étnicos, não havendo diferenças entre eles, assim
como excelente tolerabilidade em todas as faixas etárias,
independentemente da origem étnica.
Ashcroft et al(42) publicaram uma meta-análise sobre a
potência e a tolerabilidade de PM e TC no tratamento da
DA. Em relação à potência, os resultados mostraram que
o TC 0,1% é tão efetivo quanto os GT de alta potência,
porém mais efetivos que os GT de baixa potência, sendo,
portanto, uma boa opção para uso em regiões mais sensíveis
de pacientes com DA grave. O PM mostrou-se menos efetivo que os GT de alta potência, devendo-se reservá-lo para
casos leves e moderados. Em relação à tolerabilidade, o PM
levou a uma redução significativa dos efeitos adversos locais,
quando comparado ao TC, mas não foram observados efeitos
adversos sistêmicos ou maior incidência de infecção cutânea
com nenhuma das duas medicações.
Apesar de todas essas vantagens, a experiência a longo
prazo com estes imunomoduladores tópicos ainda é limitada.
Além disso, de acordo com o FDA, o risco de outros efeitos
adversos permanece desconhecido, bem como a possibilidade
do desenvolvimento de câncer de pele.
convencional. Podem ser utilizadas as seguintes drogas:
• Ciclosporina A, em dose de 3-5 mg/kg/dia, é a droga
preferencial para crianças e adultos, com início de ação
rápido em termos de redução do prurido, eritema,
pápulas, vesículas, escoriações, crostas e liquenificação(43,44). Entretanto, é necessária a precaução em relação
a possíveis efeitos adversos, como náuseas, desconforto
abdominal, hipertricose, parestesia, hiperbilirrubinemia, hipertensão arterial e alteração na função renal,
devendo-se monitorizar freqüentemente a pressão arterial e as funções renal e hepática(1,7,45).
• Azatioprina, na dose de 2,5 mg/kg/dia, é uma boa alternativa, caso a Ciclosporina não possa ser utilizada. Embora
sua eficácia clínica já tenha sido demonstrada, o início
da ação é mais lento e nem sempre é bem tolerada. Vale
ressaltar sua potencial ação mielotóxica, sendo indicada
a monitoração hematológica periódica(1,7,46).
• Mofetil micofenolato, na dose de 2 g/dia, apresenta boa
ação antiinflamatória e imunossupressora em pacientes
com DA grave e refratária, especialmente em adultos. Os
efeitos adversos mais freqüentes são retinite herpética e
mielotoxicidade(1,7,47).
Antileucotrienos
Há poucos estudos sobre a eficácia de antagonistas dos
receptores de leucotrienos na DA. Hon et al(48) avaliaram a
eficácia do Montelucaste oral nas doses de 5 mg/dia (em crianças com idade inferior a 12 anos) e 10 mg/dia (em pacientes
maiores), durante três meses. Os autores observaram redução
significativa da intensidade da DA em 70% dos pacientes,
porém não houve redução na extensão das lesões e dos sintomas.
Ainda permanece indefinida a real utilidade destes fármacos
no controle e tratamento da DA.
Fototerapia
Esta modalidade de tratamento na DA está restrita principalmente a adolescentes e adultos, embora Pasic et al(49)
tenham obtido bons resultados com a combinação de UVB
e UVA em 21 crianças com DA. A eficácia desse tratamento
é limitada ao eritema e à inflamação(1). Os possíveis efeitos
adversos a longo prazo, como envelhecimento cutâneo precoce e neoplasia, devem ser ponderados(7).
Modalidades terapêuticas em investigação
Imunossupressores sistêmicos
São indicados em casos muito graves, com comprometimento sistêmico importante e refratário ao tratamento
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Estudos clínicos controlados por placebo sugeriram que
pacientes com DA grave podem se beneficiar do uso de
ervas chinesas, embora sua real efetividade, mecanismo
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de ação e reações adversas a longo prazo permaneçam
desconhecidos(7,50,51).
Estudo randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, realizado em crianças com DA de intensidade moderada
a grave, demonstrou que os pacientes que receberam injeção
intradérmica de Mycobacterium vaccae mortos obtiveram
melhor controle da gravidade da doença(7,52).
Conclusão
A dermatite atópica é uma doença inflamatória crônica
complexa, que necessita de ampla abordagem, a começar por
medidas educacionais preventivas. O pediatra generalista
desempenha importante papel nos cuidados de rotina de
pacientes com DA não complicada. Porém, pacientes com
dermatite grave e refratária devem ser encaminhados ao especialista. São muitas as armas terapêuticas disponíveis, porém
cabe ao clínico o uso de bom senso na escolha da medicação
(ou combinação de medicações) a utilizar, levando-se sempre
em consideração a eficácia, a tolerabilidade, os efeitos adversos relevantes e o custo. Nesta ampla abordagem, também
é importante a percepção de quais pacientes necessitam de
auxílio psicológico, para que possam ser devidamente encaminhados para tratamento especializado.
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