O Outro Lado - Jacqueline Woodson
Transcrição
O Outro Lado - Jacqueline Woodson
Jacqueline Woodson The Other Side New York, G. P. Putnam’s Sons, 2001 (Tradução e adaptação) Disse-me que não era seguro. — Quando brincares, não passes para o outro lado da vedação. minha mãe avisara-me: um dos lados da vedação. Os brancos viviam do outro lado. A cidade parecia ainda maior. Nós vivíamos numa casa amarela, de Naquele Verão, a vedação que se estendia ao longo da nossa O Outro Lado sentámo-nos todas na vedação. rapariga estava sempre sozinha. — Porque as coisas sempre foram assim. minha mãe, ela respondeu: vedação pareciam muito distantes. Quando perguntei a razão à Nesse Verão, tudo e todos os que estavam do outro lado da nos consultar. Eu não sei o que eu teria dito. Talvez sim, talvez não. podia brincar connosco. A Sandra disse logo que não, mesmo sem — Virá, pois — confirmei. — Um dia. a Annie. — Um dia, virá alguém que deite esta vedação abaixo — disse nossa amizade de sempre. Quando já estávamos cansadas de saltar, olhar para o nosso lado. Às vezes, eu devolvia-lhe o olhar. A Um dia, quando estávamos a saltar à corda, perguntou se Todas participámos na brincadeira e a Sandra e eu reatámos a — Não me importo — respondeu a Sandra. -rosa. Todas as manhãs, empoleirava-se na vedação e punha-se a Nesse Verão, vi uma rapariga que usava uma camisola cor-de- — Vejo que tens uma nova amiga — disse-me certa manhã. saltar à corda e nós perguntámos-lhes se podíamos saltar também. mundo inteiro à nossa volta. Um dia, a Sandra e as outras estavam a Nesse Verão, sentadas na vedação, a Annie e eu olhávamos o Acenei que sim e ela sorriu. fez. vedação, com a desculpa de que podia partir o pescoço, mas nunca o minha mãe observava-nos. Contava que me obrigasse a descer da estranho, eu fazia de conta que não me importava. Por vezes, a vedação. E quando a Sandra e as outras nos olhavam com um ar Nesse Verão, a Annie e eu sentámo-nos muitas vezes nessa Nesse Verão, choveu imenso. Nesses dias, a rapariga sentava- — dizia. — Aqui dentro estás quentinha, segura e seca. — Por isso é que te comprei brinquedos para os dias de chuva A minha mãe não me deixava sair quando chovia. via-a dançar nas poças de água, chapinhando e rindo. encharcada, mas tinha ar de quem não se ralava com isso. Por vezes, se na vedação com um impermeável vestido. Ficava toda mãe. — Não fiques a olhar. Não é educado — advertia-me a minha mãe dela. E ela tinha um ar triste. Se tinha! Às vezes, quando íamos à cidade, via aquela rapariga com a Sorriu. Tinha um sorriso bonito. Sorri também. E ficámos a pendurada, a secar, naquela corda de roupa. — O meu nome é Annie Paul. Vivo ali. A minha blusa está — Clover — respondi. nome. Aproximei-me da vedação e a rapariga perguntou o meu as mãos. Sentia-me corajosa e livre. relva estava húmida e o sol já ia alto no céu. Abri os braços e estiquei Em meados do Verão, a chuva parou. Um dia, quando saí, a encontrava-a sempre. Algures, junto da vedação. Mas, sempre que chovia, eu procurava aquela rapariga. E — A minha também não — confessei. na vedação. — A minha diz o mesmo, mas nunca me proibiu de me sentar expliquei. — A minha mãe diz que não devo passar para o outro lado — disse Annie, olhando para mim disfarçadamente. — Uma vedação destas foi feita para nos sentarmos nela — Percorri a madeira com a mão e toquei no topo da trave. daqui. — Esta vedação é óptima — disse a Annie. — Pode ver-se tudo olhar uma para a outra, sempre a sorrir.