EFiCÁCiA DA rEPoSiÇÃo DE VitAMinA D3 EM iDoSoS nA DoSE DE
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EFiCÁCiA DA rEPoSiÇÃo DE VitAMinA D3 EM iDoSoS nA DoSE DE
Artigo original EFICÁCIA DA REPOSIÇÃO DE VITAMINA D3 EM IDOSOS NA DOSE DE 50.000 UI POR SEMANA DURANTE 8 SEMANAS: É O SUFICIENTE? The effectiveness of vitamin D3 replacement in the elderly at a dose of 50,000 UI per week for 8 weeks: is it enough? RESUMO Letícia Oba Galvãoa, Carmelia Matos Santiago Reisa, Malthus Fonseca Galvãob, Luiz Augusto Casulari Roxo da Mottaa INTRODUÇÃO: A deficiência de vitamina D é frequentemente observada em idosos. No entanto, ainda pairam dúvidas acerca da reposição necessária para a normalização dos níveis séricos em idosos da comunidade. OBJETIVO: Avaliar a eficácia da reposição de vitamina D com doses orais semanais de 50.000 UI em idosos da comunidade do Distrito Federal. MÉTODOS: Estudo clínico, de intervenção, quasi-experimental, com 89 voluntários da comunidade, com 60 anos ou mais, residentes no Distrito Federal, 15ºS. Foram analisadas variáveis sobre hábitos, uso de medicações, dosagem (quimioluminescência) das concentrações séricas de 25(OH)D, paratormônio (PTH), cálcio e fósforo. A suplementação com vitamina D3 foi realizada em 24 voluntários com suficiência de 25-OH vitD (≥ 30 ng/mL) na dose de 800 UI ao dia. Em 20 voluntários com deficiência de 25-OH vitD (< 20 ng/ml) e em 45 voluntários com insuficiência de 25-OH vitD (20 a 29 ng/mL) foi utilizada uma dose de vitamina D3 de 50.000 UI por semana, por 8 semanas. RESULTADOS: A hipovitaminose D foi identificada em 70,9%, sendo deficiência em 24,3% e insuficiência em 46,6%. A suplementação durante 8 semanas resultou em ganho médio de 8,27 ng/mL nas concentrações séricas de 25(OH)D. No grupo com hipovitaminose D, houve persistência de insuficiência em 49,2% dos voluntários, normalização em 46,1% e deficiência em 4,6%. No grupo com deficiência os ganhos médios foram de 12,90 ng/mL (ganho de 92,5%), sendo de 7,80 ng/mL (ganho de 33,0%) para o grupo dos deficientes e 5,25 ng/mL (ganho de 16,0%) para o grupo com suficiência. Não houve evidência de ligação dos ganhos com as variáveis sexo e faixa etária. Os pacientes tratados com antipsicóticos e bifosfonados apresentaram ganhos inferiores à média. CONCLUSÕES: Apesar do ganho estatisticamente significativo — média de 8,2 ng/mL — nos voluntários que receberam a dose de 50.000 UI de vitamina D3 semanal, a análise dos resultados indicou que, após o tratamento da hipovitaminose D, 58,3% dos hipossuficientes não alcançaram concentrações de normalidade no período de 8 semanas. Voluntários em uso de antipsicóticos e bifosfonados tiveram significativamente menores ganhos nas concentrações de vitamina D com a reposição. PALAVRAS-CHAVE: vitamina D; deficiência de vitamina D; idoso; terapêutica. Programa de Pós-graduação em Ciências para a Saúde, Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde (FEPECS) – Brasília (DF), Brasil. Faculdade de Medicina, Departamento de Patologia, Universidade de Brasília (UnB) – Brasília (DF), Brasil. a b Dados para correspondência Letícia Oba Galvão – SHLN, lote 09, Edifício Biosphere Health Center, bloco A, salas 214/216 – Asa Norte – CEP: 70770-560 – Brasília (DF), Brasil – E-mail: [email protected] Recebido em: 04/01/2016. Aceito em: 19/05/2016 DOI: 10.5327/Z2447-211520161026 Geriatr Gerontol Aging, Vol. 10, Num 2, p.93-100 93 A B ST RAC T Reposição de vitamina D3 em idosos INTRODUCTION: Vitamin D deficiency is frequently noticed in the elderly. However, there are still doubts about the supplementation levels required to achieve the normalization of such deficiency. OBJECTIVE: To evaluate the efficacy of vitamin D replacement with weekly oral doses of 50,000 IU in community elders of the Federal District, Brazil. METHODS: Clinical, interventional, quasi-experimental study with 89 community volunteers, aged 60 and older, living in the Federal District, 15ºS. Variables on habits, medication use, dosage (chemiluminescence) of serum 25 (OH) D, parathyroid hormone (PTH), calcium, and phosphorus were analyzed. Supplementation with vitamin D3 was performed in 24 volunteers with sufficient 25-OH VITD (≥ 30 ng/mL) at a dose of 800 IU per day; in 20 subjects with deficiency of 25-OH VITD (< 20 ng/mL), and in 45 subjects with insufficiency of 25-OH VITD (20 to 29 ng/mL) a dose of 50,000 IU per week for 8 weeks was used. RESULTS: Hypovitaminosis D was identified in 70.9% being deficient in 24.3% and insufficient in 46.6% of the subjects. Supplementation for 8 weeks resulted in an average gain of 8.27 ng/mL. In the group with D hypovitaminosis, there was a persistent insufficiency in 49.2% of volunteers, adequacy in 46.1% and deficiency only in 4.6%. In the group with deficiency the average gain were 12.90 ng/mL (92.5% gain), being 7.80 ng/mL (33.0% gain) in the deficiency group and 5.25 ng/mL (16.0% gain) for the group with no vitamin D deficiency. There was no evidence connecting the gains to gender and age group. Patients treated with antipsychotics and bisphosphonates had lower gains compared to the average. CONCLUSIONS: Despite the statistically significant gain — mean 8.2 ng/mL — in volunteers who received a dose of 50,000 IU of vitamin D3 weekly, results show that after the treatment of vitamin D deficiency, 58.3% of pacients with hyposufficiency did not reach normal concentrations in the period of 8 weeks. Volunteers taking antipsychotics and bisphosphonates had significant smaller gains in vitamin D concentrations with the supplementation. KEYWORDS: vitamin D; vitamin D deficiency; aged; therapeutics. INTRODUÇÃO O Brasil está vivenciando rápido processo de envelhecimento populacional, e fatores fisiológicos e mudanças no estilo de vida fazem com que a população geriátrica seja mais susceptível à hipovitaminose D e a todas as suas consequências negativas.1,2 Em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, latitude 30ºS, um estudo transversal com 81 adultos internados no Hospital de Clínicas de Porto Alegre evidenciou hipovitaminose D grave (25(OH)D < 10 ng/mL) em 33,7%, e moderada (25(OH)D entre 10 e 20 ng/mL) em 44,5% dos pacientes. Os níveis séricos de 25(OH)D foram inferiores a 20 ng/mL em 77,8% dos pacientes, sendo as dosagens realizadas por radioimunoensaio.3 Outros estudos no Brasil têm demonstrado valores semelhantes.2 Como grande parte da vitamina D é obtida pela exposição solar, é importante fornecer orientações consistentes aos pacientes. O horário com maior concentração de radiação UVB (290 a 315 nm), responsável pela conversão do 7-DHC em vitamina D, é entre 10 e 14 horas.4 A produção de vitamina D só acontece quando se atinge 1/4 da dose eritematosa mínima, que é a quantidade de radiação necessária para desencadear um discreto eritema na pele após 24 horas e que equivale à queimadura de grau leve da pele.5 Portanto, o tempo de exposição necessário para a produção de vitamina D varia de acordo com o fototipo, o horário de exposição, a altitute, a latitude, a estação do ano e as condições climáticas. É importante orientar que a exposição da face é desnecessária, pois produz mínimas quantidades de vitamina D5,6 94 e é desaconselhável pela dificuldade terapêutica de alguns cânceres relacionados à exposição solar. Segundo a Endocrine Society7 e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM),8 para alcançar a melhor saúde óssea é recomendável a suplementação de crianças até 1 ano com pelo menos 400 UI/dia; entre 1 e 70 anos com pelo menos 600 UI/dia; enquanto que acima dos 70 anos com 800 UI/dia. Segundo recomendação da SBEM, para indivíduos com osteoporose e risco de fratura aumentado, recomenda-se concentrações de 25(OH)D mantidas acima de 30 ng/mL para benefícios plenos sobre a prevenção do hiperparatiroidismo secundário, diminuição do risco de quedas e melhora da densidade mineral óssea (DMO). Para isso, são necessárias doses diárias entre 1.000 e 2.000 UI.3,9 A vitamina D pode ser administrada diariamente, semanalmente, mensalmente, trimestralmente ou semestralmente.3,5,9 Não parece haver diferença na absorção da vitamina D considerando-se o tipo de refeição ou jejum. Segundo recomendações da SBEM, embora a suplementação e o tratamento possam ser feitos com ambos os metabólitos da vitamina D, deve-se preferir a vitamina D3, pelas vantagens sobre a manutenção de concentrações mais estáveis.8 As doses para tratamento variam de acordo com o grau de deficiência e com a meta a ser atingida. De maneira geral, quando a 25(OH)D está muito abaixo de níveis desejados (abaixo de 20 ng/mL), faz-se necessário um esquema de ataque para repor os estoques corporais. Recomenda-se 50.000 UI/semana (ou 7.000 UI/dia) de vitamina D3 por Geriatr Gerontol Aging, Vol. 10, Num 2, p.93-100 Galvão LO, Reis CMS, Galvão MF, Motta LACR 6 a 8 semanas.5,7,10 Caso a meta de 25(OH)D não seja atingida, um novo ciclo pode ser proposto. Como pode existir variação individual na resposta ao tratamento, a reavaliação dos valores plasmáticos após cada ciclo mostra-se ideal até que a meta seja alcançada, especialmente nos casos de deficiências mais graves.8 A manutenção em adultos mostrou eficácia e segurança com a administração de 50.000 UI de vitamina D2 a cada duas semanas, mantendo concentrações de 25(OH)D em torno de 40 a 60 ng/mL.3,5,8 Recentemente, uma revisão sistemática da Cochrane demonstrou que a suplementação de vitamina D associada ao cálcio pode reduzir o número de fraturas nas áreas dos quadris11 das pessoas idosas, frágeis e confinadas em instituições. Especificamente, a suplementação de vitamina D3 parece diminuir a taxa de mortalidade em mulheres idosas institucionalizadas e dependentes de cuidados.12 A European Society for Clinical and Economic Aspects of Osteoporosis and Osteoarthritis (ESCEO) recomenda que, em idosos e mulheres menopausadas, as concentrações séricas de 25(OH)D devem ser mantidas acima de 20 ng/mL, pois abaixo dessas concentrações observa-se aumento da remodelação e perdas ósseas, acompanhadas de possíveis defeitos de mineralização; ainda são mencionados aumento da fragilidade, de fraturas não vertebrais e de ossos dos quadris5 e aumento da mortalidade por causas cardiovasculares associadas aos baixos níveis de 25(OH)D.13 A vitamina D3 é bastante segura; quando administrada nas posologias recomendadas pela SBEM.— Doses de até 10.000 UI por dia por 5 meses — não induziram sinais de toxicidade, que se traduzem por hipercalcemia e hipercalciúria. Concentrações tóxicas de 25(OH)D (> 90 ng/mL) são dificilmente alcançadas com essas doses habituais.8 O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia da reposição de vitamina D em idosos da comunidade com deficiência dessa vitamina, na dose de 50.000 UI semanais. MATERIAIS E MÉTODOS Trata-se de estudo clínico, intervencional e quasi-experimental. A população foi constituída de idosos não institucionalizados, com 60 anos de idade ou mais, de ambos os sexos, vida social ativa, residentes no Distrito Federal (DF), localizado entre os paralelos sul 15 e 16, assistidos pelos Centros de Saúde (CS) nº 9 do Cruzeiro Novo e nº 13 da 114/115 norte (CS nº 13/SES/DF), vinculados ao Complexo Regional de Saúde Norte da Secretaria de Estado da Saúde do Distrito Federal (SES/DF), recrutados no período de 10 de junho de 2014 a 30 de julho de 2014. Esses centros foram escolhidos porque desenvolvem atividades direcionadas a indivíduos com mais de 60 anos, como reuniões regulares e atividades diversas como automassagem, tai chi chuan, exercícios e danças — os denominados “grupo de idosos”. Foram excluídos os indivíduos incapazes de entender os procedimentos e benefícios do estudo, portadores de cânceres, insuficiência renal, insuficiência cardíaca grave, hiperparatiroidismo primário, aqueles que não assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e os que não seguiram as determinações do protocolo. O estudo foi desenvolvido no período de junho a dezembro de 2014, em duas fases: 1. recrutamento dos participantes, aplicação do questionário, realização da primeira coleta de sangue e análise bioquímica; 2. avaliação dos resultados dos exames, separação dos participantes em dois grupos de tratamento de acordo com os resultados, orientação de uso e fornecimento de suplementação de vitamina D por oito semanas, e segunda coleta de sangue na nona semana. Na primeira fase do estudo foram selecionados os primeiros 105 indivíduos. Foram avaliadas as seguintes variáveis: idade (em anos); sexo (masculino, feminino); raça (branco, negro, amarelo ou pardo); fototipo de acordo com a Classificação de Fitzpatrick (I, II, III, IV, V e VI);14 índice de massa corporal (IMC) [peso (kg)/altura (m2)], seguindo a classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) (< 18,5 – baixo peso; entre 18,5 e 24,9 – peso normal; 25 a 29,9 – sobrepeso; 30 ou mais – obeso);15 medicamentos em uso, registrados conforme o relato do paciente e, em seguida, agrupados em classes (hipoglicemiantes orais, anti-hipertensivos diuréticos, anti-hipertensivos não diuréticos, antiagregantes plaquetários, estatinas e outros redutores do colesterol, bifosfonados, cálcio, entre outros); horário e quantidade de tempo de exposição solar e prática de atividades esportivas. As coletas de sangue foram realizadas após oito horas de jejum, no turno matutino. As concentrações séricas de 25(OH) D foram determinadas pelo método de quimioluminescência, utilizando-se o aparelho Diasorin LIAISONTM (EUA). Foram consideradas as seguintes categorias, conforme concentrações, segundo a classificação da Sociedade Americana de Endocrinologia7 e da SBEM:8 deficiência de vitamina D se 25(OH)D < 20 ng/mL; insuficiência de vitamina D se 25(OH)D entre 20 e 29 ng/mL; e suficiência de vitamina D se 25(OH)D ≥ 30 ng/mL. Na segunda etapa do estudo, após realização dos exames e avaliação dos resultados, os indivíduos que concordaram em continuar foram separados em dois grupos. Geriatr Gerontol Aging, Vol. 10, Num 2, p.93-100 95 Reposição de vitamina D3 em idosos Dos 105 idosos que iniciaram o estudo, 6 mulheres e 1 homem foram excluídos do estudo: 2 apresentaram hiperparatiroidismo primário, caracterizado por paratormônio (PTH) > 65 pg/mL e cálcio > 10,6 mg/dL; não se conseguiu contato com 2 deles; 1 recusou o tratamento; 1 apresentou intercorrências clínicas e 1 iniciou tratamento por conta própria. Para esses não foi oferecida a suplementação de vitamina D. Assim, 98 idosos (19 homens e 79 mulheres) seguiram para a segunda fase, separados em dois grupos: • Grupo A: voluntários que não tinham hipovitaminose D e receberam a dose de 800 UI de vitamina D3 em pastilhas sublinguais, 1 vez ao dia, por 8 semanas; e • Grupo B: voluntários com hipovitaminose D que receberam a dose de 50.000 UI de vitamina D3 em pastilhas sublinguais, 1 vez por semana, por 8 semanas. As pastilhas sublinguais foram produzidas e fornecidas sem ônus pela Farmacotécnica® Farmácia de Manipulação. Não houve interferência sobre o tempo de exposição solar, pois a rotina pré-estabelecida dos idosos não foi alterada. Uma semana após o período de utilização da vitamina D, todos os indivíduos foram submetidos à nova coleta de sangue para avaliação das concentrações séricas de 25(OH) vitamina D e de PTH. Os participantes deste estudo foram seus próprios controles. No estudo de associação, o teste do χ2 foi aplicado para as variáveis categóricas, enquanto os testes t de Student, Welch e ANOVA, para as variáveis contínuas. O valor para rejeição de hipótese nula foi considerado para p ≤ 0,05. O software estatístico usado foi o R 3.1.0. (www.r-project.org). Na segunda fase, as médias foram calculadas utilizandose apenas os registros para os quais os dados de vitamina D antes e depois estavam presentes. O teste t de Student pareado utiliza essa premissa para sua execução. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde SES/ DF. CAAE: 30848514.6.0000.5553, data da relatoria: 12/05/2014, número de parecer: 670.239 (FEPECS/SES/DF). RESULTADOS Dos 98 idosos que iniciaram a suplementação com a vitamina D3, 9 não realizaram a coleta final e foram excluídos. Assim, concluíram a segunda fase do estudo 89 voluntários, 18 homens e 71 mulheres, com média de idade de 70 anos, separados em Grupo A: 24 voluntários (8 homens e 16 mulheres) com concentrações de vitamina D normal e que fizeram reposição com 800 UI de vitamina D3 ao dia, por 8 semanas; e Grupo B: 65 voluntários (10 homens e 96 55 mulheres) com hipovitaminose D e que também fizeram reposição com 50.000 UI por semana por 8 semanas. Desses, 20 voluntários apresentaram deficiência e 45 insuficiência. A maioria dos voluntários declarou-se etnicamente branca (66,0%), e predominou o fototipo III (34,0%), seguido do fototipo IV (32,0%) e do fototipo II (24,3%). Nenhum dos entrevistados foi classificado como fototipo I de Fitzpatrick. No grupo de estudo, o IMC variou de 16,4 a 37,2 kg/m2, com média de 26,5 kg/m2, e 62,2% dos voluntários estavam com o IMC acima do esperado (Tabela 1). Conforme apresentado na Tabela 2, ocorreu elevação significativa nas concentrações séricas de vitamina D após a sua reposição (p < 0,001) (Figura 1). Observou-se ganho médio de 8,27 ng/mL nas concentrações séricas da 25(OH) D após as suplementações (p < 0,001), o que ocorreu em todos os grupos, mas proporcionalmente foi maior naqueles com deficiência (92,5%), seguido dos insuficientes (33%) e, portanto, com menor ganho nos normais (16%). Em relação ao sexo, o ganho nas concentrações de vitamina D foi semelhante entre homens e mulheres (p = 0,56). Também não houve diferença significativa nos ganhos em relação à faixa etária (p = 0,55). No período avaliado, entre os voluntários do grupo com hipovitaminose D, houve persistência de insuficiência em 49,2%, normalização das concentrações séricas de 25(OH)D em 46,1% e deficiência em 4,6%. Mesmo assim, observou-se redução da prevalência de hipovitaminose D para 39,2%. Ao final do estudo, houve predomínio de voluntários com concentrações normais (60,6%), conforme demonstrado na Figura 2. As Tabelas 3 e 4 demonstram a influência do uso de medicamentos com os ganhos absoluto e relativo das concentrações séricas de vitamina D. Observa-se que os voluntários que faziam uso de antipsicóticos (p = 0,001) ou bifosfonados (p = 0,04) tiveram ganhos absolutos e relativos significativamente menores nas concentrações de vitamina D com a reposição. Na avaliação do ganho relativo, os voluntários que faziam uso de cálcio (p = 0,01) também apresentaram ganhos relativos significativamente menores. O uso dos demais medicamentos não influenciou de modo significativo as concentrações de vitamina D após a sua suplementação. Avaliando-se a interferência do uso de medicamentos no aumento das concentrações séricas de vitamina D, observouse que os ganhos absolutos foram significativamente menores (p = 0,04; teste de Tukey) em voluntários usuários de quatro ou mais medicamentos, em comparação com voluntários que não utilizavam nenhum medicamento. Esse achado não se repetiu entre os usuários de quatro ou mais medicamentos e usuários de 1, 2 ou 3 medicamentos e nem na avaliação dos ganhos relativos. Geriatr Gerontol Aging, Vol. 10, Num 2, p.93-100 Galvão LO, Reis CMS, Galvão MF, Motta LACR Tabela 1 Perfil demográfico dos voluntários. Distrito Federal (n = 89), 2015. Variáveis Idade (média, DP) Grupo A n (24) Grupo B n (65) Valor p 71,0 ± 7,3 69,3 ± 6,9 0,296a Sexo 0,115b Masculino 8 10 Feminino 16 55 Raça 0,021b Branco 20 38 Pardo 3 23 Negro – 2 Amarelo 1 2 Fototipo 0,720c I – – II 7 16 III 9 20 IV 6 24 V 2 4 VI – 1 Índice de massa corporal (kg/m2) 0,571c < 18,5 1 1 18,5 a 24,9 10 23 25 a 29,9 10 27 > 30 3 14 Uso de medicamentos 0,579b Nenhum 1 7 1a3 12 33 4 ou mais 11 25 Se expõe ao sol ao menos 30 min/dia Sim 0,560b 12 37 14 50 0,142b 19 54 0,908b 10 19 0,392b Prática de atividades esportivas Sim Prática de atividades esportivas ao ar livre Sim Já faz suplementação de vitamina D Sim Teste t de Student; bteste do χ2; cteste de Fisher. a DISCUSSÃO Nosso estudo demonstrou que, após 8 semanas de reposição com 50.000 UI de vitamina D3, os voluntários do grupo com hipovitaminose D (Grupo B) mantiveram a persistência de insuficiência em 49,2%, a normalização em 46,1% e a deficiência em somente 4,6%. Achados esses inferiores aos de Daroux et al.16 e Vashi et al.,17 sempre considerando as divergências desses estudos com o presente. Após a suplementação, o ganho médio estimado pelos autores nas concentrações séricas da 25(OH)D foi de 8,27 ng/mL, ganho semelhante aos descritos por Sakali et al.,18 mas inferiores aos descritos por Al-Zahrani et al.19 e menores do que cálculo sugerido por Maeda et al.8 de aumento de 0,7 a 1,0 ng/mL nas concentrações de 25(OH) D para cada 100 UI suplementada. Em termos absolutos, esses aumentos foram maiores nos voluntários com deficiência (81%), seguidos daqueles com insuficiência (32%) e aqueles com concentrações normais (15%). Como já reconhecido por Canto-Costa et al.,20 o aumento nas concentrações séricas foram maiores naqueles indivíduos com valores iniciais mais baixos. Não houve evidências de ligação entre ganhos absoluto e relativo com as variáveis sexo e faixa etária. Esses relatos foram observados por Moreira-Pfrimer et al.21 Há poucos estudos de avaliação da resposta à suplementação da vitamina D em idosos saudáveis e há dificuldade na comparação, pelas peculiaridades de cada estudo. Na avaliação dos ganhos nas concentrações séricas de vitamina D, de acordo com o uso de medicamentos, foram encontradas diferenças significativas nas variáveis neuroléptico (p = 0,001) e bifosfonados (p = 0,04). Observou-se ganhos absolutos de vitamina D significativamente inferiores à média dos demais tratamentos, nos pacientes tratados com esses medicamentos. Formosa et al.,22 Baek et al.,23 Pedrera et al.24 e Lima et al.25 destacaram tal característica nos indivíduos em uso de anticonvulsivantes. Apesar de haver estudos para avaliar qual a dose e o tempo ideais de reposição de vitamina D, o tema ainda permanece controverso. Gallagher et al.,26 em um estudo randomizado e controlado por placebo, acompanharam, por 1 ano, 163 mulheres brancas, na pós-menopausa, saudáveis e com insuficiência de vitamina D, após sua suplementação nas doses de 400, 800, 1.600, 2.400, 3.200, 4.000 ou 4.800 UI, 1 vez ao dia. Os desfechos primários foram os níveis de 25(OH)D e PTH aos 6 e 12 meses. A dosagem sérica final média foi de 42 ng/mL após 2.400 UI/dia, e 47 ng/mL depois de 4.800 UI/dia em brancos, e 39 ng/mL depois de 2.400 UI/dia, e 50 ng/mL depois de 4.800 UI/dia em afro-americanos. O estudo apresentou algumas limitações: o grupo foi composto por idosos ativos que habitavam região de nível social Geriatr Gerontol Aging, Vol. 10, Num 2, p.93-100 97 Reposição de vitamina D3 em idosos Tabela 2 Concentrações da vitamina D antes e após a sua reposição em voluntários. Distrito Federal, 2015. n Concentração de vitamina D antes (ng/mL) Concentração de vitamina D após (ng/mL) Ganho absoluto médio (ng/ml) Ganho relativo médio (%) Valor pa Todos os voluntários 89 25,18 33,45 8,27 41,8 < 0,001 Deficiente 20 16,0 29,0 12,9 92,5 < 0,001 Insuficiente 45 24,1 31,9 7,8 33,0 < 0,001 Normal 24 34,6 39,9 5,2 16,0 < 0,001 Masculino 18 27,5 36,4 8,8 32,5 0,005 Feminino 71 24,5 32,6 8,0 32,9 < 0,001 60 a 69 anos 51 23,9 31,7 7,7 32,3 < 0,001 70 a 79 anos 26 27,3 36,9 9,5 35,0 < 0,001 80 anos ou mais 12 25,4 33,1 7,6 30,1 0,017 Teste t de Student pareado. a 100% 60 25(OH)D 60,6% 40 50,5% 50% 35,9% 26,9% 22,4% 20 0% Antes 3,3% 20,0 a 29,9 ng/mL < 20,0 ng/mL Antes Depois Figura 1 Demonstração das concentrações séricas de vitamina D de todos os voluntários antes e após a suplementação de vitamina D3. Distrito Federal, 2015. > 30,0 ng/mL Depois Figura 2 Concentrações séricas de 25(OH)D antes e após a suplementação de vitamina D3. Distrito Federal, 2015. Tabela 3 Influência do uso de medicamentos no ganho absoluto das concentrações séricas da vitamina D em voluntários do grupo de estudo. Distrito Federal, 2015. Medicamentos Hipoglicemiantes Média com o medicamento Média sem o medicamento Valor pa 7,4 8,6 0,480 Diuréticos 7,3 8,5 0,500 Anti-hipertensivos não diuréticos 7,3 9,6 0,140 Antiagregante plaquetário 5,7 8,7 0,120 Antipsicótico 3,3 9,2 0,001 Estatinas e outros redutores de colesterol 6,6 9,0 0,140 Bisfosfonados 5,4 8,6 0,040 Cálcio 5,6 8,9 0,070 Outros 7,0 9,0 0,210 Teste t com correção de Welch. a 98 Geriatr Gerontol Aging, Vol. 10, Num 2, p.93-100 Galvão LO, Reis CMS, Galvão MF, Motta LACR Tabela 4 Influência do uso de medicamentos no ganho relativo das concentrações séricas da vitamina D em voluntários do grupo de estudo. Distrito Federal, 2015. Medicamentos Média com o medicamento Média sem o medicamento Valor pa Hipoglicemiantes 1,3 1,4 0,351 Diuréticos 1,3 1,4 0,418 Anti-hipertensivos não diuréticos 1,3 1,4 0,273 Antiagregante plaquetário 1,2 1,4 0,120 Neuroléptico 1,1 1,4 0,001 Estatinas e outros redutores de colesterol 1,3 1,4 0,103 Bisfosfonados 1,2 1,4 0,011 Cálcio 1,2 1,4 0,018 Outros 1,3 1,4 0,170 Teste t com correção de Welch. a não representativo da população idosa do Distrito Federal. Membros desses grupos são provavelmente mais ativos, mais preocupados com a saúde e, talvez, mais saudáveis em relação aos outros idosos da região, pois são membros de uma organização comunitária promotora de ações para envelhecimento saudável. Além disso, os membros voluntários do estudo provavelmente representam a parcela que valoriza o envelhecimento saudável, preocupada com os benefícios da vitamina D e que já faziam essa suplementação.9 Aspectos relacionados à aderência ao tratamento também não puderam ser controlados. O uso de determinadas medicações, a presença de comorbidades ou o uso prévio de suplementação de vitamina D, que podem interferir no metabolismo da vitamina D, não foram critérios de exclusão, pois a intenção dos pesquisadores foi retratar da forma mais próxima possível a realidade da população para a qual a SES/ DF deve programar a política de saúde. Não foram realizados exames laboratoriais para avaliação das funções renal ou hepática e nem uma segunda dosagem do cálcio e fósforo séricos. Não houve grupo controle utilizando vitamina D3 comercial.9,27 CONCLUSÕES Apesar do ganho estatisticamente significativo após o tratamento da hipovitaminose D — média de 8,2 ng/mL — nos voluntários que receberam a dose de 50.000 UI de vitamina D3 semanal, 58,3% dos hipossuficientes não alcançaram concentrações de normalidade no período de 8 semanas. Voluntários em uso de antipsicóticos e bifosfonados tiveram, com a reposição, significativamente menores ganhos nas concentrações de vitamina D. Esses achados demonstram variação individual nas concentrações sanguíneas de 25(OH)D atingidas em resposta a uma mesma dose de vitamina D, sugerindo que indivíduos podem apresentar diferentes competências na absorção intestinal, ou na metabolização dessa vitamina, e corroboram a idéia da necessidade de individualização na sua reposição, em especial na população geriátrica, usuária de multidrogas e com a fisiologia peculiar. CONFLITO DE INTERESSES Os autores declaram não haver conflito de interesses. REFERÊNCIAS 1. Saraiva GL, Cendoroglo MS, Ramos LR, Araújo LMQ, Vieira JGH, 2. 3. 4. 5. 6. Maeda SS, et al. Prevalência da deficiência, insuficiência de vitamina D e hiperparatiroidismo secundário em idosos institucionalizados e moradores na comunidade da cidade de São Paulo, Brasil. Arq Bras Endocrinol Metab. 2007;51(3):437-42. Osielski JM, Montresor Jr DF, Sanches DCN, Soares LHM, Ventura MM. 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