Suicídio no Brasil e América Latina: revisão bibliométrica na base
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Suicídio no Brasil e América Latina: revisão bibliométrica na base
R E L ATO D E P E S Q U I S A Suicídio no Brasil e América Latina: revisão bibliométrica na base de dados Redalycs Suicide in Brazil and Latin America: bibliometric review in the database Redalycs Hugo Ferrari Cardoso(a)*, Makilim Nunes Baptista(b), Cristiane Deantonio Ventura(c), Edna Maria Branão(d), Fernando Diogo Padovan(e), Marco Antônio Gomes(f) Resumo: O estudo teve objetivo de realizar uma revisão bibliométrica da literatura latino americana, contida na base de dados Redalyc, entre os anos de 2000 a 2010, investigando a quantidade e forma de avaliação do suicídio. Foram analisados 53 artigos, chegando à constatação de que houve variabilidade de números de artigos publicados entre os anos. As revistas que mais publicaram artigos possuem como objetivo a divulgação de trabalhos na área de saúde mental. México foi o país que apresentou maior número de publicações e, dos instrumentos de avaliação que abordam descritores de suicídio, a CES-D e a Escala de Ideação de Beck foram os mais utilizados, assim como, depressão foi o construto associado ao suicídio investigado em maior frequência. Conclui-se que esse estudo não contempla toda a realidade da América Latina e que outras investigações devem ser realizadas, por meio de outras bases de dados, visando corroborar ou não tais constatações. Palavras-chave: Suicídio; Ideação Suicida; Tentativa de Suicídio Abstract: The aim of this study was to review the bibliometric literature in Latin American, contained in the database Redalyc, between the years 2000 to 2010, investigating the amount and form of assessment of suicide. We analyzed 53 articles, concluding that was variability in the numbers of the articles published between the years. The magazines that most published articles have as objective the dissemination of works in the area of mental health. Mexico was the country with the highest number of publications and assessment tools that address descriptors suicide, and CES-D Scale and Ideation Beck Scale were the most used, as well as the construct of depression was associated with suicide investigated in greater frequency. We conclude that this study does not include all the reality of Latin America and that further investigations should be carried out through other databases, in order to prove or disprove these findings. Keywords: Suicide; Suicidal Ideation; Suicide Attempts a Mestre pela Universidade São Francisco. *Email: [email protected] b Doutor pela Escola Paulista de Medicina. c Mestrando pela Universidade São Francisco. d Mestre pela Universidade São Francisco. e Mestrando pela Universidade São Francisco. f Mestre pela Universidade Metodista de Piracicaba. Sistema de Avaliação: Double Blind Review 42 Diaphora | Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul 12(2) | Ago/Dez | 42-48 Os artigos que avaliam a literatura abordam de maneira crítica os materiais que já foram publicados sobre um determinado objeto de estudo, identificando as relações, contradições e lacunas na literatura científica (APA, 2001). O conhecimento científico atualizado sobre um determinado tema é apresentado de maneira mais abrangente nos artigos de revisão por meio de um minucioso levantamento das publicações atuais, sejam elas clássicas ou recentes. Pretende-se ao fim desse artigo apontar possíveis críticas, identificar pontos positivos e negativos e sugerir, caso necessário, pesquisas futuras (Baptista, Morais & Sisto, 2007). O estilo empregado no artigo que revisa a literatura científica deve ser claro, conciso, objetivo e a linguagem precisa, coerente e simples, buscando responder a uma questão científica específica (Marconi & Lakatos, 1999). No presente estudo, a problemática em questão é a publicação de artigos sobre suicídio em países latino americanos, que se refiram à pesquisa de campo e, em especial, os instrumentos de avaliação utilizados em tais pesquisas. Suicídio - formas de avaliação O suicídio, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (2000a), está relacionado a um ato deliberado e levado a cabo por alguém que tem plena consciência de seu resultado final. Por sua vez, quando o indivíduo não consegue êxito em tal ação esse ato é classificado pela literatura como sendo tentativa de suicídio. Tanto a tentativa como o ato suicida em si são motivados por ideações suicidas, ou seja, pensamentos, geralmente relacionados à desvalia, que levam o indivíduo a pensar e planejar sua própria morte. Por suicídio, Baptista e Borges (2005) salientam que esse é um assunto que gera interesse e curiosidade, seja por parte dos pesquisadores e também da população em geral. Trata-se de um ato que acarreta consequências não somente ao indivíduo que se suicida, ou tenta tal atitude, mas também engloba toda sua rede de contato, por exemplo, familiares, grupo de trabalho, escolar e amigos em geral. Diversas variáveis foram comprovadas, principalmente por meio de pesquisas documentais e epidemiológicas, como sendo relacionadas ao ato ou ideação suicida, dentre essas pode-se destacar fatores genéticos, ambientais e socioculturais. Ainda de acordo com os mesmos autores o suicídio deve ser analisado por meio de sua característica multideterminante, ou seja, sua ocorrência muitas vezes se dá pela somatória de variáveis de risco e também da capacidade do indivíduo em resolver conflitos. Variáveis como diagnóstico de depressão, alcoolismo, uso de drogas, idade, sexo, desemprego e precária percepção de suporte familiar e social geralmente são associadas ao suicídio. O Brasil, de acordo com Viana, Zenkner, Sakae e Escobar (2008), apresenta um índice de cerca de cinco suicídios para cada 100 mil habitantes. Quanto a análise por sexo, homens se suicidaram mais que mulheres e a faixa etária mais acometida é entre 15 e 34 anos. Além disso, no que tange ao estado civil, há maior prevalência entre divorciados, solteiros e viúvos. Por fim, em relação aos métodos mais utilizados para o suicídio, enforcamento é o de maior frequência tanto em homens quanto em mulheres. Em Coahuila, no México, Mazacová e Martínez (2006), realizaram um estudo com base em 18 casos de pessoas que cometeram suicídio. Os autores destacam que no México houve uma taxa de aumento de 200% de suicídios nos últimos 30 anos. Em relação aos 18 casos analisados no estudo, 15 foram do sexo masculino, e desses, 10 eram solteiros. Esse estudo se difere à análise dos autores brasileiros uma vez que a população acometida nessa amostra foi de pessoas que tinham entre 35 e 44 anos. Paredes, Orbegoso e Rosales (2006) realizaram um estudo em um hospital em Lima, Peru, com 380 pessoas que tentaram suicídio e não tiveram êxito. Nesse estudo foi constatado que maioria dos casos foi de mulheres, com predomínio de idade variando de 15 e 29 anos. Desse total, a maioria das pessoas que tentaram suicídio era solteira e, o que difere dos demais estudos é em relação ao método utilizado, uma vez que as maiores frequências foram envenenamento, seguido por intoxicação medicamentosa. Esses dados são justificados por dados epidemiológicos na medida em que mulheres tentam mais suicídios que os homens, entretanto os homens geralmente optam por métodos mais letais, o que acaba por aumentar a frequência de mortes por suicídio no público masculino. Em 2009, o Ministério da Saúde em parceria com a Organização Pan-americana de Saúde e a Unicamp, lançaram uma cartilha didática e ilustrada, com base em bibliografia especializada, com o título Prevenção do Suicídio: Manual Dirigido aos Profissionais da Saúde da Atenção Básica. Os temas abordados englobam, de forma sucinta, a dimensão do problema, fatores de risco, associação com transtornos mentais, depressão, álcool e com transtornos de personalidade, além dos aspectos psicológicos, como ajudar a pessoa sob risco, como abordá-la e por fim, discorre sobre como avaliar e lidar com o risco de suicídio. De acordo com essa cartilha, o Brasil e demais países que compreendem a América do Sul e Central possuem, em média, uma estimativa de até oito suicídios a cada 100 mil 43 Diaphora | Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul 12(2) | Ago/Dez | 42-48 habitantes (Brasil, 2009). Acerca do processo de avaliação de pessoas que possuem ideações ou já tentaram suicídio, Bertolote, Mello-Santos e Botega (2010), abordaram a importância e os meios para a detecção do risco de suicídio nos serviços de emergência psiquiátrica. Para os autores, a melhor forma de avaliação dessa amostra é por meio do uso da entrevista clínica, uma vez que, por meio dessa, é possível identificar o risco que uma pessoa apresenta quanto a cometer o ato suicida. Nessa mesma direção, a entrevista permite, nesses casos, o apoio emocional necessário, o estabelecimento de vínculos, além da coleta de um grande número de informações. Ainda de acordo com os autores, embora haja escalas para medição e avaliação do risco de suicídio, segundo eles, nenhuma demonstrou eficiência plena para sua detecção. De acordo com Vaz (2010), a questão do suicídio é complexa e a avaliação psicológica necessita de esforços na busca de recursos para as pessoas que se encontram em condições de risco. Para o mesmo autor, os instrumentos psicológicos podem auxiliar no aprofundamento do conhecimento acerca do suicídio e no aperfeiçoamento dos métodos de avaliação, bem como expor aspectos clínicos que demorariam a aparecer de outras formas. Garrido, Alarcón e Castro (2009) afirmaram que entre as escalas existentes autoadministráveis com o intuito de rastrear a presença de ideação e intenção de suicídio, estão a Escala de Beck de Ideação Suicida; Rastreamento para Adolescentes de Columbia; Questionário de Ideação Suicida de Reynolds; Índice de Potencial Suicida de Crianças–Adolescentes (CASPI); Questionário de Conduta Suicida de Linehan; Questionário de Conduta Suicida Revisado de Linehan, todas com validade e precisão bem demonstradas; por outro lado, segundo eles, a Escala de Probabilidade Suicida, O Inventario de Ideação Suicida Positiva y Negativa (PANSI), a Escala de Ideação Suicida de Rudd, necessitam mais estudos e replicação de pesquisas para buscas de propriedades psicométricas. Nesse sentido, o presente estudo tem como objetivo realizar uma revisão bibliométrica da literatura latino americana entre os anos de 2000 a 2010 investigando a quantidade e de que forma o suicídio vem sendo avaliado nesse contexto, bem como levantar instrumentos que podem auxiliar no processo de avaliação psicológica dessa temática. bibliométrica sobre suicídio na base de dados eletrônica Red de Revistas Científicas de América Latina y el Caribe, España y Portugal - REDALYC, de língua espanhola e portuguesa, entre os anos de 2000 a 2010. Justifica-se a escolha da base de dados Redalyc uma vez que a mesma possui elevado número de periódicos latino americanos indexados, além disso, é objetivo desse grupo de pesquisadores a realização de um estudo bibliométrico sobre suicídio na base de dados Scielo (a qual também possui periódicos brasileiros e latino americanos indexados) e posteriormente, a realização de um estudo comparativo entre as publicações na temática suicídio dessas referidas bases de dados. Foram utilizadas palavras chave em espanhol, sendo essas, “suicídio”, “intento suicida”, “ideacion suicida” e “intento de suicídio”. Os artigos foram pesquisados pela modalidade de busca por palavras que compõe o título do estudo, resultando dessa busca um total de 67 artigos. Desses, 50 estudos foram localizados por meio da palavra chave “suicidio”, quatro por “intento suicida”, oito por meio de “ideacion suicida” e cinco pelas palavras chave “intento de suicídio”. O critério de inclusão de artigos esteve condicionado a esses serem da modalidade de estudo de campo, sendo excluídos artigos teóricos (n=7), documentais (n=4), resenhas (n=1) e cartas aos editores (n=2). Essa etapa resultou em 53 artigos de pesquisas de campo, na referida década, com os temas suicídio, ideação suicida e tentativa de suicídio, dos quais foram extraídos dados, tais como, quantidade de artigos publicados por ano, nome e país das revistas, metodologia de estudo, número amostral, local de coleta de dados, instrumentos utilizados para análise da ideação e tentativa de suicídio e os construtos associados ao suicídio. Resultados A primeira análise realizada foi em relação à quantidade de artigos com a temática suicídio publicados na década entre 2000 e 2010. A figura a seguir mostra, por ano, a quantidade de artigos publicados. Método A metodologia empregada nesta pesquisa foi a revisão 44 Diaphora | Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul 12(2) | Ago/Dez | 42-48 (7,5%) sobre suicídio e, em menor freqüência (dois artigos cada) estão listadas oito diferentes revistas. Por fim, em relação a outras revistas, 22 diferentes revistas publicaram um artigo sobre suicídio cada no período pesquisado (41,3%), sendo essas, a Revista de Ciencias Sociales; Revista de Salud Publica; Nova; Persona y Bioética; Acta Universitaria; Archivos em Medicina Familiar; Biomédica; Brasil alcohol y drogas; Colombia Médica; Enseñanza y investigacion en psicologia; Interamerican journal of psychology/Austin Latinoamericanitas; Orbis; Pensamiento psicológico; Peru Med; Psicologia, Saúde & Doenças; Revista Brasileira de Saúde Ocupacional; Revista Brasileira em Promoção de Saúde; Revista Cubana de Higiene y Epidemiologia; Revista Peruana de Medicina Experimental y Salud Pública; Salud Figura 1. Distribuição da quantidade de artigos por ano. Uninorte e The Spanish Journal of Psychology. Somando-se as revistas pertencentes a um determinado país, na Tabela 2 é Como pode ser visualizado, os anos de maiores frequências possível observar a distribuição das publicações, tendo em vista de publicações foram 2007, com 10 artigos (18,9%), 2009, o país de origem dos periódicos. com nove artigos (17%) e 2002, com oito artigos (15,1%). É importante destacar que há oscilações entre a quantidade de Tabela 2 artigos no decorrer dos anos, ou seja, em alguns anos, tais como País da Revista N % 2002, 2007 e 2009 foi encontrado um número acima em relação País da Revista México 22 41,5 aos demais e nos anos 2000, 2003 e 2008 foram relacionados Colômbia 15 28,3 uma quantidade inferior de artigos. Nesse sentido, não é possív Brasil 3 5,7 3 5,7 el afirmar que o número de artigos publicados foi crescente com Espanha Chile 2 3,8 o decorrer dos anos, nem tão pouco constante. Em relação às Peru 2 3,8 revistas que publicaram os artigos dessa revisão sistemática, Latino-americanas 2 3,8 1 1,9 foram elencados na Tabela 1 os periódicos que publicaram dois Portugal Cuba 1 1,9 ou mais artigos a respeito do assunto. Tabela 1 Revistas que publicaram artigos sobre suicídio Nome da Revista Salud mental Revista Colombiana de Psiquiatria Investigación en Salud Universitas Psychologica Revista Intercontinental de Psicologia y Educacion Revista Colombiana de Psicologia Psicothema Psicología Iberoamericana Psicología y Salud Terapia Psicológica Outras Total Costa Rica Venezuela Total N 11 4 2 2 2 2 2 2 2 2 22 53 % 20,8 7,5 3,8 3,8 3,8 3,8 3,8 3,8 3,8 3,8 41,3 100,0 Cabe destacar que a revista Salud Mental foi a que apresentou maior frequência de publicação de artigos sobre suicídio, com 11 publicações (20,8%). A Revista Colombiana de Psiquiatria publicou no período de 10 anos quatro artigos 1 1 53 1,9 1,9 100,0 No que se refere aos países de origem que mais apresentaram artigos sobre suicídio na presente pesquisa (Tabela 2), México se apresentou com o maior número de artigos publicados, 22 (41,5%), seguido de Colômbia com 15 (28,3%), Brasil com três (5,7%) e Espanha também com três artigos (5,7%). Em relação ao delineamento, do total de artigos pesquisados (n=53) apenas um apresentou como tipo de estudo a modalidade longitudinal. Para a classificação da amostra foram utilizados os critérios de Prieto e Muñiz (2001). De acordo com esses autores, uma amostra pequena é composta por até 150 pessoas, é considerada uma amostra suficiente quando a mesma possui uma quantidade amostral entre 150 e 300 indivíduos, uma amostra é considerada moderada quando seu número de indivíduos varia de 300 a 600, uma amostra grande possui entre 600 e 1000 indivíduos e, por fim, uma amostra muito grande é constituída por mais 45 Diaphora | Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul 12(2) | Ago/Dez | 42-48 de 1000 indivíduos. Nesse sentido, dos 53 artigos analisados, 23 (43,4%) possuíam amostras pequenas, seis (11,3%) amostras suficientes, 13 (24,5%) amostras moderadas, quatro (7,5%) com amostras grandes e sete artigos (13,2%) coletaram em amostras consideradas muito grandes. Foi analisada a variável local de coleta de dados na Tabela 3, entretanto, nem todos os artigos apresentavam um detalhamento em relação a essa variável. Tabela 3 Local de coleta dos dados Local de coleta Cidades em geral (sem especificação do local de coleta) Hospital Geral (emergências) Escolas Hospital psiquiátrico Universidades Prisões Zona rural Total N 22 11 8 6 4 1 1 53 % 41,5 20,8 15,1 11,3 7,5 1,9 1,9 100,0 Dos 53 artigos investigados, 22 (41,5%) salientavam que os dados foram coletados em cidades específicas, porém sem apresentar um contexto (por exemplo, hospital, universidades, etc). Dos artigos que especificaram o local de coleta, 11 (20,8%) foram avaliados em hospitais gerais, oito (15,1%) em escolas, seis (11,3%) em hospitais psiquiátricos, quatro (7,5%) em universidades, um (1,9%) em prisões e um (1,9%) apenas citava que a coleta havia sido realizada em zonas rurais (Tabela 3). Alguns estudos fizeram uso de instrumentos cujo objetivo foi avaliar a ideação suicida. A distribuição desses instrumentos pode ser visualizada por meio da Tabela 4. Suicida de Beck. Dos 53 artigos, 41 relacionaram suicídio, ideação suicida e/ou tentativa de suicídio com outros construtos. Os construtos associados estão elencados na Tabela 5. Tabela 5 Construtos associados ao suicídio Construto Depressão Eventos estressantes Motivos para viver Desesperança Suporte familiar Autoestima Atitudes disfuncionais Estratégias de enfrentamento Suporte Social Agressividade Alcoolismo Desordem alimentar Ansiedade Estresse Esquizofrenia Total N 10 4 4 4 3 3 3 2 2 1 1 1 1 1 1 41 % 24,5 9,8 9,8 9,8 7,3 7,3 7,3 4,9 4,9 2,4 2,4 2,4 2,4 2,4 2,4 100,0 Na presente revisão bibliométrica foi possível observar, que 41 artigos relacionaram suicídio a outro construto. Nesse caso, depressão foi o construto associado com maior frequência seguido de eventos estressantes, motivos para viver e desesperança. Discussão A temática suicídio é tratada pela literatura especializada como uma questão problemática de saúde pública, visto que, com base em estatísticas mundiais, há a ocorrência de um suicídio a cada 40 segundos (Botega, Werlang, Cais & Macedo, Tabela 4 2006; Knox, Conwell & Caine, 2004; Mann et al., 2005; OMS, Instrumentos específicos na avaliação de suicídio 2000b; 2002; 2006; WHO, 2000). Instrumentos específicos N % CES-D (Para Ideação suicida) 5 31,25 No presente artigo analisou-se a produção bibliográfica Escala de Ideação suicida de Beck 5 31,25 de suicídio entre os anos de 2000 a 2010, tendo como fonte de Identificação del risco suicida (IRSA) 1 6,25 dados a base Red de Revistas Científicas de América Latina y el Estúdio psicossocial del suicídio 1 6,25 Caribe, España y Portugal - REDALYC. A revisão bibliométrica Cédula de indicadores para suicídio 1 6,25 da literatura se mostra como uma importante ferramenta no Escala de Ideación Suicida de Roberts 1 6,25 processo de planejamento de novas intervenções, uma vez que Escala de Intenção Suicida de Gonzales-Fortaleza1 6,25 identifica as lacunas de investigação de determinado objeto Inventário de Ideación suicida positiva y negativa 1 6,25 de estudo (APA, 2001). Especificamente acerca do suicídio Total 16 100,0 como objeto de estudo, Vaz (2010) pontua que essa temática Como pode ser visualizado na Tabela 4, oito diferentes é complexa, principalmente no que tange a mensuração. Para o instrumentos foram utilizados para avaliação dos descritores autor, os instrumentos de avaliação psicológica podem auxiliar de suicídio, tendo destaque para a CES-D e a Escala de Ideação os psicólogos quanto ao maior conhecimento do construto, 46 Diaphora | Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul 12(2) | Ago/Dez | 42-48 assim como auxiliar no aprimoramento de intervenções clínicas e prevenção. Em relação aos resultados do presente estudo, houve variação entre dois e 10 artigos publicados por ano, não podendo afirmar que houve um aumento ou decréscimo de publicações ao longo dos anos. No que tange à quantidade de publicações percebeuse que as duas revistas com maior número de artigos possuem ênfase na divulgação de trabalhos voltados para a área de saúde mental. Nem todos os artigos analisados apresentaram o local de coleta de dados, entretanto, daqueles que apresentaram, as maiores frequências ocorreram em hospitais gerais e psiquiátricos, bem como escolas. Acerca dessa informação Dias e Baptista (2004) atentam para o fato do contexto hospitalar, psiquiátrico ou hospital geral, ter maior frequência de pacientes com ideações suicidas. Os autores acrescentam, com base em estudos, que a taxa de suicídio em pacientes que passaram por internações é três vezes maior quando comparado às taxas de suicídio da população em geral. Bertolote et al., (2010) corroboram com os autores na medida em que pontuam acerca do alto índice de pacientes com ideação suicida internados em emergências clínicas, hospitais gerais e psiquiátricos. De acordo com os autores, é de grande importância que sejam feitas avaliações nessas pessoas, por meio de escalas ou estratégias específicas, para a detecção de ideias suicidas, levantamentos de fatores de riscos, bem como fatores protetivos. A respeito dos instrumentos de avaliação utilizados para investigação da ideação e tentativa do suicídio, na década investigada, a Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI) e a CES-D, foram os que apresentaram maior frequência nos artigos. Embora a CES-D não tenha o propósito único de avaliação do suicídio, ou ideação suicida, mas sim o rastreamento de sintomatologias depressivas (Batistoni, Néri & Cupertino, 2010), pode-se perceber que foi um instrumento bastante utilizado para a análise de ideação suicida. Por sua vez a BSI é um instrumento de análise de ideação suicida e, conforme ressaltam Garrido et al., (2009), apresenta-se como uma escala viável, uma vez que a mesma possui adequadas evidências de validade e precisão para a análise da ideação suicida. De acordo com Bertolote et al., (2010), embora haja escalas para mensuração do risco de suicídio, essas nem sempre se configuram como o melhor método de avaliação. Para os mesmos autores, a entrevista psicológica pode ser considerada como a melhor técnica de conhecimento nessa realidade, pois a entrevista permite ao profissional fornecer apoio emocional. Além disso, pode proporcionar coleta de informações mais precisas sobre o paciente com potencial suicida ou que tenha ideação suicida, inclusive no que tange a informações sobre fatores de riscos e protetivos percebidos pelos indivíduos, ou seja, investigar quais os fatores relacionados ao possível ato ou pensamento suicida. No entanto, para atualizações rápidas ou rastreamento, segundo Baptista (2012), as escalas se mostram como importantes recursos do profissional de saúde. Nesse sentido, no que concerne aos construtos associados ao suicídio, depressão foi a que apareceu em maior frequência nos artigos analisados. Tal constatação é corroborada pelos achados de Baptista, Borges e Biagi (2004) que, com base em pesquisas epidemiológicas, ressaltaram possíveis fatores de risco para o suicídio, entre eles a depressão. Ainda de acordo com os autores, isolamento social, eventos estressantes, baixa autoestima e autoimagem, deficitário suporte social e familiar, uso de álcool e outras drogas e histórico familiar de psicopatologias também são variáveis que podem estar associadas à ocorrência de suicídio. Na presente pesquisa alguns desses construtos foram investigados nos artigos analisados, porém em menor frequência, como é caso de eventos estressores, suporte familiar e social, uso de álcool e drogas e autoestima. Como visto, diversas variáveis podem estar relacionadas ao suicídio, uma vez que sua operacionalização se refere a uma questão multifatorial. Em acréscimo, a OMS (2000b; 2002; 2006) atenta para o fato de o suicídio ser um fenômeno de constante preocupação para a sociedade, pois sua ocorrência está intimamente associada à saúde mental dos indivíduos. Nessa mesma direção, trabalhos preventivos devem ser articulados no intuito e atender e oferecer suporte às pessoas que já tentaram suicídio ou mesmo àquelas com potencial suicida, para que dessa forma as estatísticas mundiais tenham um decréscimo. Considerações Finais Os estudos cujo objetivo é a avaliação da literatura possuem como foco o levantamento dos trabalhos publicados em um determinado período de tempo e, mais do que isso, apontar possibilidades para investigações futuras. O intuito de realizar o levantamento bibliográfico em uma base que dados que envolve diversas revistas latino americanas foi justamente o de conhecer a realidade estudada nesses países acerca da temática suicídio. Pode-se verificar que na base de dados pesquisada houve grande variação do número de artigos publicados ao longo dos anos, o que remete a uma necessidade de maior estabilidade do número de artigos publicados por ano. Em relação aos periódicos elencados, não se detectou uma revista específica da 47 Diaphora | Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul 12(2) | Ago/Dez | 42-48 área de suicídio na base de dados em questão. Cabe destacar que somente a utilização da base de dados Redalyc pode ser considerado uma limitação do estudo, pois não abarca a realidade da América Latina no que tange aos estudos do suicídio, entretanto essa lacuna será mais bem contemplada uma vez que é objetivo dessa equipe de pesquisadores a investigação do suicídio em outros veículos de busca, de forma a ampliar a discussão sobre o assunto nesse contexto. Além disso, foram constatados poucos estudos brasileiros nessa base de dados, o que remete à necessidade de maior divulgação dos estudos nacionais sobre suicídio. Outro ponto significativo foi a ocorrência de pouca clareza de dados sobre as amostras pesquisadas nos artigos, principalmente no que tange ao local de coleta dos dados. Em contrapartida, foi observado que os artigos analisados apresentaram boa variabilidade nos instrumentos sobre descritores de suicídio, assim como a quantidade de construtos associados ao tema. Referências American Psychological Association (2001). Manual de Publicação da American Psychological Association. (4ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Baptista, M. N. (2012). Escala Baptista de Depressão – Versão Adulto (EBADEP-A). São Paulo: Vetor Editora. Baptista, M. N., & Borges, A. (2005). Suicídio: aspectos epidemiológicos em Limeira e adjacências no período de 1998 a 2002. Estudos de Psicologia, 22(4), 425-431 Baptista, M. N., Borges, A., & Biagi, T. A. T. (2004). 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