o instantâneo fotográfico a partir da Polaroid até o Instagram

Transcrição

o instantâneo fotográfico a partir da Polaroid até o Instagram
Retratos do cotidiano: o instantâneo
fotográfico a partir da Polaroid até o
Instagram
Luis Fernando Frandoloso
Fotógrafo pós-graduado em Fotografia Práxis e Discurso Fotográfico - UEL/PR
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Linguagens - Universidade Tuiuti
do Paraná
Resumo
O retrato é um gênero imagético que sempre esteve presente desde o surgimento da arte e em seguida com
o invento do aparato técnico da câmera fotográfica como meio de representação da realidade. As evoluções
tecnológicas implicaram diretamente na obtenção das fotografias, especialmente no que diz respeito às imagens
posadas. O presente artigo busca analisar estética e historicamente o retrato fotográfico com o surgimento
do instantâneo a partir da câmera Polaroid, até o presente momento com o aplicativo Instagram, usado em
dispositivos móveis. Nesse contexto, a partir do momento em que foi possível visualizar e compartilhar as
fotografias assim que são produzidas ou realizadas, busca-se identificar quais foram as mudanças estéticas no
decorrer da história desses dois períodos do retrato e suas implicações perante a sociedade.
Palavras-chave: Instantâneo. Retrato. Polaroid. Instagram.
1 Introdução
Existem, entre outros, basicamente três tipos de
formatos na fotografia. O pequeno formato, conhecido
também como o universal, 35 mm (negativo 24x36
mm), o médio formato, 120 mm (quadrado, 6x6 cm ou
ligeiramente retangular, 6x4,5 cm, 6x7 cm, 6x9 cm) e
o grande formato, chapas (9x12 cm, 13x18 cm, 20x25
cm). O fotógrafo americano Ansel Adams disse em
seu primeiro livro da trilogia (A Câmera, O Negativo,
A Cópia) que “não há a menor dúvida de que uma
câmera de grande formato (4x5 ou 8x10) exige uma
forma de ver diferente da proporcionada por uma
câmera portátil de 35 mm” (2000, p.19). O fotógrafo,
quando fotografa, tem a noção de que o tipo de câmera
utilizada é um aspecto relevante e fundamental na
obtenção de imagens.
No âmbito do retrato, que segundo BENJAMIN
(1994) “ocupa um lugar central nos primórdios da
fotografia”, há consequências notáveis decorrentes
da utilização de uma câmera de 35 mm, em que o
232
Retratos do cotidiano: o instantâneo fotográfico...
fotógrafo pode se manter “invisível” em relação a uma
câmera técnica de grande formato. No caso da câmera
técnica (grande formato) o sujeito fotografado está
condicionado, de forma muito notável, pela presença
do dispositivo, que segundo Giorgio Agamben “é, na
realidade, antes de tudo, uma máquina que produz
subjetivações” (AGAMBEN, 2009, p. 15). O que
possibilita perceber o tipo de relação que se estabelece
entre o fotógrafo e o objeto fotografado. Sobre isso
Susan Sontag coloca que “na retórica normal do retrato
fotográfico, encarar a câmera significa solenidade,
franqueza, o descerramento de essência do tema”.
(SONTAG, 2004, p. 50). A temporalidade da fotografia
encontra-se substancialmente alterada se utilizarmos
para a tomada da foto um ou outro tipo de aparelho,
já que não é a mesma captação do instante fotográfico. É
justamente sobre o instante fotográfico que tentaremos
nos concentrar aqui. Em especial o instante do retrato,
feito especificamente por câmeras polaróides e pelos
aparelhos celulares usando o aplicativo Instagram.
Oriunda da pintura, nem sempre a fotografia foi
feita de forma tão instantânea, como sabemos através
de Peter Burke que “antes da década de 1880, na era
da câmera de tripé e exposições de vinte segundos,
os fotógrafos compunham as cenas, dizendo onde
deveriam se posicionar e como se comportar [...]
tanto no estúdio quanto ao ar livre.” (BURKE,
2004, p. 28). Os retratos pintados são, como muitos
gêneros, um gênero artístico e compostos de acordo
com sistemas de convenções que podem ser alterados
com o tempo lentamente, muitas vezes carregados de
sentido simbólico. “Nesse sentido, um retrato é uma
forma simbólica.” (BURKE, 2004, p. 31). E como
forma de simbolismo, principalmente antes de 1900, os
retratos pintados geralmente mostravam seus modelos
com as melhores roupas ou expressando seu melhor
comportamento, conforme pode ser visto na Figura 1.
Nesse período o retrato pintado é, antes de mais nada,
“um registro do que o sociólogo Erving Goffman
descreveu como ‘a apresentação do eu’, um processo
no qual o artista e o modelo geralmente se faziam
cúmplices.” (BURKE, 2004, p. 32). Algumas dessas
convenções permaneceram e se tornaram democráticas
na era do retrato de estúdio fotográfico, a partir de
meados do século 19.
Pinturas foram muitas vezes comparadas a
janelas e espelhos, e descritas de forma constante
como refletindo o mundo visível ou da sociedade.
Mas sabemos que muitas imagens não são reflexos
da realidade, nem mesmo as fotografias o são, num
momento em que o termo “realidade” está sendo usado
cada vez mais entre aspas. Partindo desse princípio
podemos afirmar que as relações com as imagens,
em especial agora a fotográfica, mudou socialmente e
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
Luis Fernando Frandoloso
esteticamente com o advento dos avanços tecnológicos
capazes de produzir imagens antes impossíveis devido
às limitações da época.
Figura 1 – Louis XVI
Fonte: Google - imagens
2 Fotografias em um minuto
Por 60 anos, ninguém mais conseguiu o que
a Polaroid idealizou: fazer uma foto aparecer em suas
mãos 60 segundos depois de ter sido tirada. Fundada
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
em 1937 por Edwin H. Land (1909-1991), a Polaroid
Corporation foi um empresa de fotografia dos Estados
Unidos, tornando-se mundialmente conhecida em 1948
devido ao surgimento da primeira câmera instantânea
criada por ela. A ideia da fotografia instantânea veio
da filha de Land, que questionava porque demorava
tanto para ver as fotos das suas férias de verão. Land
decidiu realizar todo o processo de desenvolvimento da
impressão de um negativo e combiná-lo em uma folha
só. Ele fez os dois, impressão e negativo, do mesmo
tamanho e incluiu um pacote de produtos químicos
que seria ativado quando o filme fosse impresso. No
momento em que a fotografia fosse removida da
câmera, os químicos se espalhariam uniformemente
sobre o negativo para criar a imagem.
Em 1972, foi apresentado o sistema SX-70
(Figura 2), que se transformou no grande objeto de
desejo e, aos poucos, notabilizou-se como a câmera
que viabilizava algumas experiências imediatas
denominadas por muitos usuários como a maior
gratificação do processo instantâneo. Entre as décadas
de 1950, 60 e 70, a Polaroid foi a mais inovadora
empresa de tecnologia na terra. Foi ainda a empresa
que Steve Jobs disse ter usado como modelo para criar
a Apple, e a comparação é verdadeira. Herói de Jobs,
Edwin H. Land, visionário, fez da marca um fenômeno
da cultura pop de bilhões de dólares, sendo utilizada
233
234
Retratos do cotidiano: o instantâneo fotográfico...
Figura 2 – Primeiro modelo Polaroid SX-70.
processo fotográfico. Podemos assumir que a Polaroid
e seu processo alternativo criou um novo gênero
fotográfico, pois essa imagem instantânea expandiu as
possibilidades do fazer e provocou o aparecimento de
novas variáveis que enriqueceram e educaram nosso
olhar, além das mudanças paradigmáticas na fotografia.
Hoje em dia, com a popularização das câmeras digitais,
celulares com câmeras e aplicativos como o Instagram e
afins, pode até ser mais fácil tirar fotos e ver o resultado
na hora. Ver, mas não tocar.
3 O novo instantâneo
Fonte: Google - imagens.
por fotógrafos como Ansel Adams – que foi consultor
da Polaroid – e artistas como Andy Warhol. Estava,
assim, aberto o caminho para a fotografia que permitia
tornar o presente num momento do passado. Através
da fotografia Polaroid foi possível registrar o instante,
comentando-o como um acontecimento do passado.
Esta capacidade de congelar o tempo, tornando-o num
documento imediato, está na origem da criação deste
O Instagram é um aplicativo gratuito para smartphones
lançado em outubro de 2010 inicialmente apenas para
dispositivos iOS e recentemente, em abril de 2012,
também para aparelhos Android. Com ele é possível
fotografar, escolher filtros e compartilhar o resultado
nas redes sociais. Além dos efeitos, é possível seguir
outros usuários na própria rede para visualizar, curtir
e comentar nas imagens postadas.
A ideia do aplicativo foi baseada no conceito da
Polaroid. O que estava em jogo não era somente o
registro da imagem, mas a relação dessa imagem em
outro registro de tempo, o instantâneo. A foto feita na
câmera Polaroid podia ser vista em 60 segundos. Sinal
dos tempos, hoje em dia cresce o número de novos
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
Luis Fernando Frandoloso
gadgets1 para consumidores que procuram otimizar
tempo e velocidade. E o celular se tornou um dos
aparelhos mais significativos, uma vez que seu campo
é o das tele-comunicações.
“Diferentemente das imagens fotográficas
convencionais, rígidas e resistentes em sua fatalidade
figurativa, a imagem eletrônica resulta muito mais
elástica, diluível e manipulável como uma massa
de modelar”. (MACHADO, 2005, p.315). E ainda
Machado nos diz que:
Os novos meios, os novos procedimentos, a nova estética, tudo
isso veio para ficar. Eles ampliarão cada vez mais o seu leque
de influências, tomarão boa parte dos espaços hoje ocupados pela
fotografia tradicional e poderão mesmo vir a provocar uma revolução
no conceito de fotografia, à medida que inteligências e sensibilidades
cada vez mais sólidas passarem a se ocupar deles em intensidade
e profundidade”. (MACHADO, 2005, p.317).
Quando surgiu em 2010, o Istagram não tinha
como proposta apenas ser mais uma rede social. Ele
tinha algo de diferente. A moeda de troca passou a
ser exclusivamente a fotografia, com espaço limitado
para “o que dizer”. Isso provocou notável exercício
de síntese, priorizando o que qualificaria a imagem,
em poucas palavras. A imagem falaria pelo fotógrafo.
Depois, com filtros que simulam filmes e lentes usados
décadas atrás, algo de vintage marcaria o Instagram.
“Alteram-se não só o modo de fazer, mas especialmente
o modo de pensar”. (VICENTE, 2005, p.320).
O Instagram possibilitou fazer uma volta ao passado,
em tempo presente, recuperando a ideia de Edwin
Land, criador da Polaroid. A intenção era ter aquele
instantâneo postado na rede, através do celular. E
uma vez que essa forma era revestida por uma estética
datada, o Instagram surgiu como o passado atualizado.
Um faz de conta que nada mais quer senão reviver
o tempo que passou e incorporá-lo agora. Nada de
nostálgico e sim contemporâneo, como são luminosas
algumas confluências dos tempos de hoje.
Imagens continuam a realizar uma boa dose de
carga emocional, mesmo que agora possam ser vistas
de forma mais imediata e com mais regularidade.
Ainda que as imagens de dispositivos móveis possam
certamente funcionar como objetos de comunicação
por serem prontamente mostradas e compartilhadas,
elas não são menos eficazes como objetos de
memória. Como nada acaba, tudo passa por épocas,
a foto também passou e está passando por um ciclo.
Rádio/TV, cinema/TV, vinil/cassete/CD, publicação
impressa/publicação online. Nada aniquilou nada
ainda. As coisas naturalmente mudam, vão e voltam,
mesmo que adaptadas. Isso é porque, cada um desses
1 Gadget (em inglês: geringonça, dispositivo): é um equipamento que tem um propósito e uma função específica, prática e útil no cotidiano. São
comumente chamados de gadgets dispositivos eletrônicos portáteis como PDAs, celulares, smartphones, leitores de MP3, entre outros.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
235
236
Retratos do cotidiano: o instantâneo fotográfico...
meios tem suas tecnologias próprias; com isso, suas
estéticas próprias. As novas tecnologias trouxeram
novas oportunidades e certos aspectos da prática
fotográfica mudaram com o uso de smartphones com
câmeras cada vez melhores capazes de produzir
imagens satisfatórias em termos de qualidade e
velocidade. Nesse aspecto “o advento recente da
fotografia eletrônica [...] tem causado grande impacto
sobre o conceito tradicional de fotografia e promete
daqui para frente introduzir mudanças substanciais
tanto na prática quanto no consumo de imagens
fotográficas em todas as esferas de utilização”.
(MACHADO, 2005, p.310).
No geral, atualmente até certo ponto, pelo menos,
dispositivos móveis e suas câmeras estão sendo
usados para criar imagens de curta duração dos
eventos mundanos, enquanto as câmeras digitais de
maior porte e com mais aparatos técnicos são usadas
de forma mais profissional. Mas isso não é uma regra,
conforme analisaremos a seguir alguns fotógrafos
que se utilizaram e outros que ainda utilizam da
estética retrô2 das câmeras Polaroid, bem como do
uso de aplicativos como o Istagram produzidos
por seus potentes smartphones. Assim como para
muitos hoje estar com o celular em mãos e poder
fotografar tudo como um bloco de anotações, para
Henri Cartier-Bresson “a máquina fotográfica é [...]
um bloco de esboços, o instrumento da intuição e
da espontaneidade, a senhora do instante, que, em
termos visuais questiona e decide ao mesmo tempo”.
(CARTIER-BRESSON, 2004, p.12).
4 O uso do instantâneo
Nos primórdios do surgimento do dispositivo
fotográfico - dispositivo no sentido em que se referia
Giorgio Agamben - de “qualquer coisa que tenha de
algum modo a capacidade de capturar” (AGAMBEN,
2009, p. 13), as fotografias não eram instantâneas,
mesmo os fotógrafos desejando que fossem. Na
época, o desenvolvimento tecnológico não era
suficiente para estabelecer tal conquista. Depois do
sucesso das câmeras Polaroid e seu desaparecimento
momentâneo, surge no âmbito do instantâneo duas
possíveis “releituras” da estética da imagem com o
surgimento da Lomografia3 e do Instagram. Conforme
Carlos Fadon Vicente “esteticamente, a fotografia
eletrônica abarca, até o limite de suas viabilidades
2 A palavra retrô deriva do prefixo latino retro, que significa “para trás” ou “em tempos passados” particularmente como visto na forma de palavras
retrógradas, o que implica num movimento em direção ao passado, em vez de um progresso em direção ao futuro e, a posteriori, referindo-se
um olho crítico ou nostálgico do passado.
3 Lomografia é um movimento fotográfico que utiliza câmeras automáticas de baixo custo. O processo consiste na recepção contínua de luz que
é feito através do sistema de exposição automático, chegando a durar 30 segundos. Outro efeito, dependendo do modelo e da lente, é o olho
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
Luis Fernando Frandoloso
técnicas, as possibilidades da fotografia convencional
e soma as permitidas pela sua própria especificidade”.
(VICENTE, 2005, p.327).
Alguns fotógrafos atualmente passaram a usar essa
estética retro, gerada pela simplicidade de recursos
desses aparelhos, como linguagem de seus trabalhos.
Dentre eles, dois dos primeiros a usarem a Polaroid
como forma de expressão foram o artista da Pop
art4 Andy Warhol e o fotógrafo Robert Mapplethorpe. O
autorretrato foi muitas vezes explorado por ambos,
como demonstram as (figuras 3, 4, 5 e 6). Alguns
fotógrafos brasileiros, como Cássio Vasconcelos
(figuras 7a e 7b), Armando Prado e o fotógrafo e
Prof. Dr. Luiz Eduardo Robson Achutti (em seu
trabalho Paris Transfer) também fazem - ou fizeram
- uso em algum momento de suas produções, desse
mesmo artefato, na busca de uma identidade visual
carregada de simbolismo vintage5.
Hoje, o que vale não é mais a questão da
instantaneidade, visto que com o advento do
fotografia digital podemos ver o resultado da
Figura 3 – Autorretrato - Polaróides de Andy Warhol.
Fonte: Google - imagens.
imagem imediatamente. Vale lembrar que a fotografia
produzida por uma Polaroid SX-70 é uma peça
de peixe, no qual a fotografia fica com uma moldura circular. O nome é uma referência ao modelo LOMO LC-A, uma câmera compacta da
marca LOMO. A LOMO é baseada na Cosina CX-1 e começou a ser produzida em 1980.
4 Pop art (ou Arte pop) é um movimento artístico surgido na década de 50 na Inglaterra, mas que alcançou sua maturidade na década de 60
em Nova York. A Pop art propunha que se admitisse a crise da arte que assolava o século XX. Desta maneira pretendia demonstrar com suas
obras a massificação da cultura popular capitalista. Procurava a estética das massas, tentando achar a definição do que seria a cultura pop,
aproximando-se do que costuma chamar de kitsch. Diz-se que a Pop art é o marco de passagem da modernidade para a pós-modernidade
na cultura ocidental.
5 Vitage: em linguagem geral, significa algo antigo e bom, um clássico. O termo vintage foi acolhido também pelo mundo da moda para designar
peças que marcam uma época, como roupas ou acessórios.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
237
238
Retratos do cotidiano: o instantâneo fotográfico...
Figura 4 – Autorretrato - Polaroid de Andy Warhol.
Figura 5 – Autorretrato Robert Mapplethorpe.
Fonte: http://whitney.org/Exhibitions/RobertMapplethorpe.
Fonte: Google - imagens
única, positiva, resultado de uma operação técnica
sofisticada e instantânea. O uso dos dispositivos
móveis junto com aplicativos para “tratamentos” e
novas experimentações estéticas e visuais, somado
as redes sociais, veio democratizar novamente a
fotografia.
Dentre alguns inúmeros fotógrafos que se utilizam
do aplicativo Instagram para seu trabalho, podemos
destacar Gal Opido, radicado em São Paulo, que
tem produzido, de forma muito sólida, imagens
esteticamente interessantes e reflexivas (Figura 8).
Relembrando sobre as tomadas fotográficas dos
primeiros retratos, podemos notar claramente como
as evoluções tecnológicas contribuíram para mudanças
estéticas significativas na fotografia contemporânea.
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
Luis Fernando Frandoloso
Figura 6 – Polaroid de Robert Mapplethorpe
Figura 7a - Polaroid Figura 7b - Polaroid
Fonte: http://www.cassiovasconcellos.com.br/
Figura 8 – Gal Opido
Fonte: http://www.artnet.com/artists/robert-mapplethorpe/
Para reforçar tal fato, segue algumas palavras de Roland
Barthes quando dizia que:
A Fotografia transformava o sujeito em objeto, e até mesmo, se é
possível falar assim, em objeto de museu: para fazer os primeiros
retratos (em torno de 1840), era preciso submeter o sujeito a longas
poses atrás de uma vidraça em pleno sol: tornar-se objeto, isso
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
Fonte: www.instagram.com/galopido
239
240
Retratos do cotidiano: o instantâneo fotográfico...
fazia sofrer como uma operação cirúrgica; inventou-se então um
aparelho, um apoio para a cabeça, espécie de prótese, invisível para
a objetiva, que sustentava e mantinha o corpo em sua passagem
para a imobilidade: esse apoio para a cabeça era o soco da estátua
que eu ia tornar-me, o espartilho de minha essência imaginária.
(BARTHES, 1984, p. 26-7).
Tudo isso deixa de existir a partir do momento em
que a sensibilidade dos filmes melhora e o tamanho das
câmeras diminui, possibilitando mobilidade e agilidade
na captura de imagens. Essas transformações foram
representativas ao longo da história da fotografia e
do retrato, conforme demonstramos nos exemplos
acima.
Considerações Finais
A fotografia Polaroid tem uma materialidade
imediata, que se distancia dos processos fotográficos
convencionais e a aproxima mais da imagem digital
contemporânea, esta sem materialidade, mas também
tão rápida que transformou todos, como escreveu
Baudelaire no clássico ensaio sobre o Salão de 1859, em
novos “adoradores do Sol”. Ao contrário da imagem
contemporânea produzida e circulada em excesso, a
Polaroid sempre teve produção e visibilidade restritas.
Uma fotografia que era utilizada para rascunhos e
correção de erros nos grandes estúdios, para redefinir
e revisar luzes e enquadramentos e também por artistas
e fotógrafos que a viam como um suporte para diversas
experimentações.
Com o surgimento da fotografia “móvel” e a
possibilidade de compartilhamento em redes sociais, a
produção imagética parece ter ganhado força. Desde
produções feitas por amadores até mesmo trabalhos
jornalísticos, editoriais e autorais estão sendo realizados
com frequência por profissionais da imagem que
possuem celulares equipados com câmeras e como
acesso à rede de internet.
A linguagem estética da fotografia feita com Polaroid
e às tomadas com dispositivos móveis e seus aplicativos
como o Instagram (entre outros) não diferem muito,
visto que o próprio Instagram foi baseado no conceito
da Polaroid. Inclusive o formato quadrado se repete
em ambos. Enquanto o processo do instantâneo e
sua materialidade quase imediata eram fundamental
para o sucesso da empresa de Land, a possibilidade de
compartilhamento nas redes sociais foi o que tornou
o aplicativo Instagram um fenômeno mundial em
pouco mais de dois anos. É possível colecionar muitas
fotografias atualmente com essas “facilidades”, e
segundo Susan Sontag “colecionar fotos é colecionar
o mundo”. (SONTAG, 2004, p. 13).
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
Luis Fernando Frandoloso
Referências
ADAMS, Ansel. A Câmera. São Paulo: Senac, 2000.
AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? E outros ensaios. Chapecó, SC: Argos, 2009.
BARTHES, Roland. A câmara clara: notas sobre a fotografia. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1984.
BENJAMIN, Walter. A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Técnica. In Magia e técnica, arte e política. São
Paulo: Brasiliense, 1994.
BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Bauru, SP: EDUSC, 2004.
CARTIER-BRESSON, Henri. O imaginário segundo a natureza. Traduzido por Renato Aguiar. Barcelona, Espanha:
Editorial Gustavo Gili, SL, 2004.
MACHADO, Arlindo. A fotografia sob o impacto da eletrônica. In: SAMAIN, Etienne (Org.). O fotográfico. 2.ed. São
Paulo: Hucitec/Senac, 2005.
SONTAG, Susan. Sobre fotografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
VICENTE, Carlos Fadon. Fotografia: a questão da eletrônica. In: SAMAIN, Etiene (Org.). O fotográfico. 2.ed. São Paulo:
Hucitec/Senac, 2005.
Fontes Eletrônicas
http://convergencias.esart.ipcb.pt/artigo/135
http://www.ehow.com.br/historia-camera-polaroid-sobre_14328/
http://pt.wikipedia.org/wiki/Polaroid_Corporation
http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A2mera_instant%C3%A2nea
http://www.brainstorm9.com.br/31950/fotografia/livro-conta-a-incrivel-historia-da-polaroid/
Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 48, p. 229-241, Curitiba, 2014.
241