Ler Excerto

Transcrição

Ler Excerto
Titulo original
The Three Signs of a Miserable Job
ISBN (original)
978-0-7879-9531-7
Copyright @ 2007 by Patrick Lencioni
Edição original por John Wiley & Sons, Inc.
Edição Portuguesa
Direitos reservados
SmartBook
Av. 5 de Outubro, 70 8º Esq
1050-059 Lisboa
Tel: +351 217 959 119
Fax: +351 217 976 007
Email: [email protected]
Site: www.smartbook.pt
Tradução: Paula Alexandra
Revisão: Isabel Silva
Paginação: Informaster, Lda.
Capa: Artevirtual
Impressão e acabamentos: Rolo e Filhos II, SA
LENCIONI, Patrick
Os Três Sinais de um Emprego Miserável:
UMA FÁBULA PARA GESTORES (e seus empregados)
ISBN: 978-989-95434-8-5
CDU 005; 331
Depósito Legal nº 276 806/08
1ª Edição: Julho 2008
ÍNDICE
Introdução
A Fábula
Choque
Parte Um: O Gestor
Parte Dois: A “Reforma”
Parte Três: A Experiência
Parte Q uatro: Voltando à Vida
O Modelo
O Emprego Miserável
O Preço da Miséria
Os Três Sinais
Os Benefícios e Obstáculos de uma Gestão
que Visa a Satisfação no Emprego
Explorando e Tratando as Causas
da Miséria no Emprego
v
3
5
25
65
179
229
231
233
236
242
Cases Studies
Agindo
O Ministério da Gestão
252
267
Reconhecimentos
269
Sobre o Autor
273
Para os meus filhos Michael, Casey, Connor e Matthew.
Que os empregos que possam vir a ter na sua vida tenham um
propósito e os satisfaçam.
INTRODUÇÃO
O
trabalho sempre me fascinou, embora tenha que admitir, algumas vezes de uma forma ligeiramente mórbida.
Lembro‑me do meu espanto e perturbação, enquanto
jovem, ao descobrir que os adultos como o meu pai trabalhavam oito ou mais horas por dia nos seus empregos.
Era mais tempo do que aquele que eu passava na escola e
quase não conseguia suportar!
E quando me disseram que a maior parte desses adultos
não gostavam do emprego que tinha, fiquei estupefacto, incapaz de compreender como é que as pessoas passavam tanto
tempo longe da família e amigos e não se sentiam felizes com
aquilo que faziam. Suponho, também, que temia vir a estar
um dia na mesma situação.
O meu fascínio com os empregos só cresceu quando eu
próprio, aos treze anos, passei a fazer parte da classe trabalhadora. Como ajudante de empregado de mesa num grande
restaurante durante o Verão, eu trabalhei com empregados de
mesa, empregados de copa, cozinheiros e barman, a maioria
deles profissionais de carreira. Mais tarde, durante a universidade, passei as minhas férias de Verão a trabalhar como caixa
de um banco, com profissionais da área. Em ambos os empregos, sempre me questionei se os meus colegas gostavam ou
Os três sinais de um emprego miserável
não do seu emprego e com o passar o tempo cheguei à conclusão óbvia, que muitos deles não gostavam.
O que continuou a incomodar‑me.
A minha obsessão com o trabalho atingiu um novo nível
quando me graduei da universidade e cheguei ao meu primeiro emprego a tempo inteiro, como consultor de gestão.
Foi então que aprendi acerca de – e experimentei eu mesmo –
uma coisa chamada “Síndroma de Domingo à Tarde”.
Síndroma de Domingo à Tarde é aquele terrível sentimento
de temor e depressão, que muitas pessoas sentem perante o
final do fim‑de‑semana e ao pensarem no regresso ao trabalho no dia seguinte.
O que era então particularmente perturbador para mim
não era apenas o facto de eu temer ir trabalhar, mas sentir
que devia gostar daquilo que ia fazer. Afinal de contas, eu
tinha aterrado num dos empregos mais procurados e mais
bem pagos do que qualquer outro colega que havia sido graduado comigo. Certamente não me encontrava no restaurante
a embalar os restos de comida para as pessoas levarem para
os seus cães, ou sentado sozinho na caixa de um banco a
contar cheques. Estava a fazer um trabalho que era interessante para mim e estava a faze‑lo, num escritório localizado
no topo de um edifício com vistas de cortar a respiração sobre
a Baía de São Francisco.
Foi aí que decidi que o Síndroma de Domingo à Tarde
não fazia qualquer sentido.
Sabem, até então, eu tinha mantido a teoria de que para
eliminar a insatisfação no trabalho apenas tínhamos que
encontrar o emprego certo.
Um mau emprego equivalia a ter que fazer um trabalho
subalterno, aborrecido e mal pago, num ambiente pouco atractivo. E assim, eu decidi que a chave para a satisfação era tão
vi
Introdução
simples como encontrar um trabalho interessante que pagasse
bem e me mantivesse dentro de portas. Mas mesmo depois de
ter satisfeito todos esses critérios, ainda me sentia miserável,
o que me levou a pensar que afinal talvez não gostasse assim
tanto de consultoria
Assim mudei de carreira. E não fiquei mais feliz do que
tinha sido anteriormente.
A minha teoria sobre satisfação no emprego estava a sofrer
uma rápida erosão, especialmente à medida que conhecia mais
e mais pessoas supostamente com grandes empregos, e que,
como eu, temiam ir trabalhar. Eram engenheiros, executivos e
professores, pessoas de alto nível educacional que, baseando‑se
nas suas verdadeiras paixões e interesses, escolhem cuidadosamente as suas carreiras. E apesar disso sentiam‑se indubitavelmente miseráveis.
A teoria desmoronou‑se completamente quando me cruzei com pessoas que tinham empregos obviamente menos
atractivos e que pareciam encontrar satisfação no seu trabalho
– jardineiros, empregados de mesa e empregados de limpeza
de hotéis. Então isso fez‑me ver que devia haver mais critérios para a satisfação no emprego do que eu pensara. Eu queria descobrir o que era para que pudesse ajudar a por um fim
à tragédia sem sentido do emprego miserável, tanto no meu
caso como em relação a outras pessoas.
E chamar‑lhe tragédia não é uma hipérbole.
Inúmeras pessoas sofrem, sofrem de facto, todos os dias,
ao arrastarem‑se, deixando as suas famílias e amigos, para
irem para empregos que apenas os tornam mais cínicos, infelizes e frustrados do que eram quando saíram de casa. Ao
longo do tempo, esta aborrecida dor pode destruir a autoconfiança e paixão, até mesmo das pessoas mais fortes, o que por
sua vez de um modo subtil e profundo afecta as suas famívii
Os três sinais de um emprego miserável
lias e amigos. Claro, nalguns casos, o impacto de um emprego
miserável não é nada subtil; conduz a sérias depressões, toxicodependência, alcoolismo e até mesmo à violência doméstica
e no trabalho.
Para além da infelicidade humana causada por este fenómeno, o impacto nas organizações é inegavelmente grande.
Embora seja difícil de quantificar, a insatisfação dos empregados tem um impacto directo na produtividade, na rotatividade
de pessoal e no ânimo, o que acabará eventualmente por atingir duramente os lucros da empresa.
O que torna isto absurdo, é que de facto existe, por aí
algures, uma solução eficaz, uma solução raramente usada.
Não implica qualquer custo directo e pode produzir benefícios quase imediatos para os empregados, gestores e clientes, dando assim uma vantagem única e poderosa às empresas que a utilizam.
Mas deixem‑me ser muito claro a respeito de uma coisa; a
solução que aqui proponho vai parecer, à primeira vista, ridiculamente simples e óbvia. Eu estou consciente e devo admitir, também um pouco apreensivo acerca disso. Mas quando
considero o número de gestores que falharam em colocar estas
ideias em prática e como, em consequência disso, quantas
pessoas continuam a sofrer através de empregos miseráveis,
chego à conclusão que talvez a simplicidade e a obviedade
sejam exactamente aquilo que é necessário neste momento.
De facto, estou convencido disso.
Como disse Samuel Johnson um autor do século dezoito:
“O Povo precisa de ser mais vezes lembrado do que precisa
ser instruído”. Eu sinceramente espero que este pequeno livro
o faça simplesmente lembrar, que o ajude a tornar o emprego
de alguém – talvez o seu – mais satisfatório e recompensador.
viii
Os Três
Sinais de um
Emprego
Miserável
A Fábula
CHOQUE
O
Brian Bailey nunca o viu chegar.
Depois de dezassete anos a trabalhar como CEO na JMJ
Fitness Machines, ele não poderia ter adivinhado que tudo
podia acabar, sem aviso, em apenas dezanove dias. Dezanove
dias!
Mas realmente era o fim de tudo. E embora ele estivesse
numa melhor posição financeira que alguma vez estivera na
sua vida, repentinamente, sentiu‑se tão sem objectivos como
se sentira quando saíra da faculdade.
PARTE 1
v
O
GESTOR
BRIAN
N
o inicio da sua carreira, Brian Bailey chegou a uma conclusão
inevitável: ele gostava muito de ser gestor.
Cada aspecto da gestão fascinava‑o. Quer estivesse a fazer
planeamento estratégico, orçamentos, aconselhamento ou avaliações de desempenho, Brian sentia‑se como se tivesse sido
criado para gerir. E à medida que, como um líder relativamente jovem, experimentava sucesso e mais sucesso, ele rapidamente se apercebeu que a sua decisão de não continuar na
universidade não o tinha tornado menos qualificado do que
os seus colegas que tinham terminado os estudos universitários em gestão.
Mas novamente, Brian não tinha tido muita escolha em
relação à decisão de não continuar a estudar. Para começar, a
família de Brian, uma família de classe média baixa, passou
por uma situação financeira particularmente difícil quando os
seus pomares de nogueiras foram atingidos por fortes geadas
dois anos seguidos.
Sendo o mais velho de cinco filhos e o único que já estava
fora de casa, Brian sentiu a responsabilidade de não esgotar
ainda mais os recursos financeiros da família. Mesmo com os
programas de ajuda financeira de St. Mary College, mantê‑lo
na universidade teria sido um enorme fardo financeiro para os
Os três sinais de um emprego miserável
Bailleys. E o foco académico de Brian na teologia e psicologia
não facilitava em nada a justificação económica para que continuasse a estudar.
Assim, respondendo a um anúncio de jornal, Brian aceitou
o lugar de responsável de uma linha de enlatamento, numa
fábrica da Del Monte e passou os dois anos seguintes no chão
de uma fábrica, assegurando‑se que os tomates, o feijão verde
e os cocktails de fruta eram colocados dentro das latas da
maneira mais eficiente possível. Brian gostava de brincar com
os seus empregados, dizendo que sempre quisera visitar uma
“quinta de cocktails de fruta”.
Quando os pomares do seu pai recuperaram e a situação financeira da família melhorou, Brian tinha uma decisão a
tomar. Ele podia voltar a estudar e terminar uma licenciatura
– ou continuar a trabalhar na Del Monte, onde estava perto de
obter uma promoção e uma possível oportunidade de um dia
vir a gerir a sua própria fábrica. Para vergonha dos seus pais,
ele não optou por nenhuma das duas hipóteses.
Em vez disso, Brian teve complacência pela sua curiosidade e aceitou um emprego na única fábrica de produção
de automóveis na área da Baía de São Francisco. Durante os
quinze anos seguintes ele subiu alegremente várias escadas de
promoção dentro da fábrica, passando igual tempo nas áreas
de produção, finanças e operações.
Fora do trabalho, ela casou com uma mulher com quem
tinha saído por pouco tempo na escola secundária, e que, ironicamente, frequentou o St. Mary College depois de o Brian ter
saído de lá. Eles mudaram‑se para uma comunidade pequena
mas em crescimento, chamada Pleasanton, onde criaram uma
família de dois rapazes e uma menina.
O Gestor
Aos trinta e cinco anos, Brian era o vice‑presidente de
produção da fábrica, trabalhando para uma dinâmica chefe de
operações chamada Kathryne Peterson.
Alguns anos depois de ter entrado na fábrica, Kathryne
tinha‑se interessado pessoalmente por Brian por causa do
seu modesto passado académico, a sua ética de trabalho e o
seu desejo em aprender. Enquanto pôde, ela manteve Brian
desempenhando as mais várias funções na sua área da organização. Mas Kathryne sabia que isso não podia durar para
sempre.
A OPORTUNIDADE
Q
uando um headhunter amigo de Kathryn, lhe telefonou perguntando se estaria disposta a ser entrevistada para o cargo
de CEO numa, relativamente, pequena fábrica de aparelhos de
Fitness no centro do vale, ela recusou. Mas insistiu com o seu
amigo para que ele recomendasse Brian como um candidato
para aquela posição.
Olhando para o seu curriculum – e para a sua falta de
formação universitária – o headhunter considerou que de
maneira alguma Brian seria contratado, mas – como um favor
a Kathryn – deixou que o Brian fosse entrevistado. Quando
duas semanas depois o seu cliente ligou dizendo que o Brian
tinha sido “de longe o melhor candidato” e que iria ser contratado como o CEO da JMJ Fitness Machines, o headhunter
ficou chocado.
O que impressionara os seus entrevistadores na JMJ, e
continuaria a impressioná‑los no desempenho do seu trabalho, era a capacidade que Brian tinha de comunicar e compreender pessoas de todos os estratos sociais. Ele tanto parecia estar confortável no meio das máquinas da fábrica como
na sala da administração, demonstrando uma combinação de
competência com um despretensiosísmo que era raro entre os
executivos, mesmo no mundo das fábricas.
10
O Gestor
No caso de Brian, ele sentia‑se como uma criança numa
loja de doces, abençoado por ter oportunidade de fazer algo
que gostava. A JMJ beneficiaria dessa bênção.
11
JMJ
L
ocalizada em Manteca, Califórnia, uma pequena cidade dormitório e agrícola a cerca de 96 quilómetros a leste de São
Francisco, a JMJ era uma empresa relativamente recente que,
durante a maior parte da sua primeira década de existência,
tinha meramente sobrevivido. Em grande parte conseguiu
sobreviver tirando vantagem da mão‑de‑obra relativamente
barata da área e imitando os seus concorrentes mais inovadores. Embora tivesse conseguido obter lucros modestos, era
uma peça de pouco valor numa indústria relativamente fragmentada, acumulando menos de 4% do mercado e uma posição nunca acima do décimo segundo lugar em termos de
share de mercado.
Perante isto, o fundador da empresa e seu CEO original
decidiu que tinha chegado ao seu limite, precipitando o telefonema ao headhunter que acabou por encontrar o Brian.
O primeiro ano do Brian no cargo não foi nenhum passeio, pois a JMJ viu‑se envolvida num insignificante mas distractivo processo penal. Ironicamente, essa situação forneceu
a Brian a sua primeira oportunidade para se afirmar como
líder e levou‑o a fazer algumas alterações estratégicas.
Nos anos seguintes, Brian reposicionou a JMJ em todos os
aspectos possíveis. O facto mais visível para o mundo exterior
12
O Gestor
foi ter mudado o foco estratégico da empresa, quase exclusivamente, na direcção dos clientes institucionais, que incluíam
hospitais, hotéis, universidades e health clubs.
Brian também injectou um sentido de investimento na
empresa, ao contratar alguns engenheiros criativos e usando
fisiologistas de outras indústrias. O resultado em rede, de ambas
as jogadas, foi um preço de venda mais alto para os produtos
da JMJ, e incrivelmente, uma maior procura dos mesmos.
Mas por mais importantes que estas mudanças tenham
sido, nada teve maior impacto no sucesso a longo prazo da
JMJ do que o que Brian fez com a cultura da empresa.
Assim como a maioria das outras fábricas na região, a
empresa tinha vindo a ser afectada por uma rotatividade de
pessoal relativamente elevada, desânimo e uma produtividade
imprevisível, vivendo debaixo da subtil, mas constante, ameaça da sindicalização. O Brian sabia que dar a volta à empresa
iria implicar mudar tudo isso.
Ao longo de apenas dois anos, Brian e a sua equipa conseguiram aumentar a dedicação e o ânimo dos funcionários a
níveis inacreditavelmente elevados, permitindo a uma empresa,
relativamente obscura, do vale central estabelecer uma reputação de satisfação e retenção da força laboral. Como resultado
disso, a JMJ acabou por ganhar mais prémios da indústria por
ser “Um Óptimo Lugar para se Trabalhar” do que aqueles que
podia expor nas vitrinas de troféus que se encontravam no
hall de entrada da empresa.
Quando os jornalistas perguntavam ao Brian qual era
o seu segredo para alcançar tudo aquilo, normalmente ele
secundarizava o seu papel e simplesmente lhes dizia que gostava de tratar as pessoas do modo como gostaria de ser tratado. O que era praticamente verdade, visto que ele nunca
desenvolvera uma metodologia específica.
13
Os três sinais de um emprego miserável
E por mais que o Brian recusasse publicamente os créditos pela reviravolta na cultura da sua empresa, silenciosamente, ele sentia‑se realmente orgulhoso pelo facto de ter
dado aos seus trabalhadores, especialmente os menos privilegiados, empregos mais recompensadores e satisfatórios do
que poderiam ter encontrado em qualquer outro lado daquela
área. Isto, mais do que qualquer objectivo financeiro ou inovação de produto alcançada, fez com que o Brian sentisse que
o seu próprio emprego tinha significado.
Razão pela qual vender a empresa seria tão doloroso para
ele.
14
ABALO
D
e um ponto de vista financeiro, a JMJ estava tão sólida como
qualquer outra média empresa poderia estar. Sob a liderança do
Brian a firma tinha gerado quinze anos de resultados sólidos,
lutando para ser o jogador número três – e por vezes, número
dois – na indústria. Sem passivo, uma marca bem conceituada
e muito dinheiro no banco, não havia qualquer razão para suspeitar que a empresa, detida por privados, estivesse em perigo.
E então um dia isso aconteceu.
Era um artigo de dois parágrafos no Jornal Wall Street,
anunciando que a Nike estava a pensar entrar no mercado dos
aparelhos de Fitness. Para a maioria das pessoas que leu o jornal naquele dia, a notícia era insignificante. Mas para o Brian,
foi a precursora de um tremor de terra.
De facto a reacção em cadeia teve início dois dias mais
tarde, quando a Nike identificou publicamente a empresa que
planeava adquirir – a FlexPro, a maior concorrente da JMJ. Antes
que alguém se apercebesse do que se estava a passar, empresas que tinham operado independentemente durante décadas
estavam a posicionar‑se para serem engolidas por conglomerados de marcas das mais diversas indústrias que estavam agora
interessadas no mercado dos aparelhos de Fitness. Para o Brian
e os seus 550 empregados era só uma questão de tempo.
15
CONSOLIDAÇÃO
A
penas alguns dias depois de ter lido aquele fatídico artigo
no Jornal Wall Street, o Brian e a sua administração, rendidos, chegaram à conclusão que teriam que vender a JMJ, e
rapidamente.
Por mais difícil que isso pudesse ser, Brian ou a sua
empresa não podiam dar‑se ao luxo de entrar em negação.
Afinal ele não queria que a sua empresa fosse a única a ficar
de pé quando a música parasse – fazendo com que ele e os
seus funcionários, que detinham, todos, acções, ficassem sem
recompensa por todos os anos de árduo trabalho. Então, telefonou a um dos seus amigos de um banco de investimentos
em São Francisco e pediu‑lhe que o ajudasse a encontrar um
comprador para a empresa que tanto amava.
De facto, Rick Simpson não era tanto um amigo, mas antes
um velho conhecido. Os dois tinham vivido durante um ano
no mesmo quarto do dormitório em St. Mary College. Embora
nunca tivessem sido muito próximos, tinham conseguido manter algum contacto ao longo dos anos.
Brian sempre tinha considerado Rick uma pessoa brilhante e ocasionalmente hilariante, assim como também arrogante e insensível. Mas por algum motivo, ele não conseguia
realmente não gostar do homem. Como Brian explicou à sua
16
O Gestor
estupefacta mulher, o Rick parecia sempre saber quando atingia o limite da antipatia, e então conseguia redimir‑se, fazendo
algo genuinamente redentor.
Apesar da sua peculiar personalidade, Rick tinha sido
muito bem sucedido na sua carreira, desenvolvendo a reputação de ser um dos melhores banqueiros de investimento do
país. De facto, ele tinha‑se tornado uma espécie de celebridade na sua área.
A sua resposta ao primeiro telefonema de Brian foi típica.
“Então, já te fartaste dessa cidade de vacas, ah?” Embora fosse
certamente uma provocação, Brian não estava com disposição
para isso.
“Bem, de facto eu moro na zona da Baía e venho para
aqui para trabalhar. E o vale não incomoda tanto assim. Mas
realmente tenho que vender a empresa”.
“Porquê?”
“Não tenho muita escolha. A Nike acabou de comprar
a FlexPro, e se tentarmos competir com empresas com esse
poder de marketing, seremos esmagados”.
“Oh, certo. Lembro‑me de ter lido acerca disso”.
O Rick parecia estar a remexer nalguns papéis na sua
secretária.
“Mas não estás a agir depressa demais?”
“Bem, eventualmente todos teremos de saltar fora e normalmente os espertos saltam primeiro”.
“Contra factos não há argumentos”, concordou o Rick,
“portanto queres que te ajude a encontrar um comprador?”
“Sim. E alguém que veja o nosso negócio como uma aposta
estratégica e que reconheça o nosso valor incomparável”.
“E que valor é esse exactamente?” O Rick não estava a ser
céptico. Ele apenas precisava de saber.
17
Os três sinais de um emprego miserável
“Bem, a nossa cota de mercado não é de todo desprezível.
Cerca de 20%. Nós somos um forte número dois ou três num
mercando bastante fragmentado, dependendo de como divides o bolo”
O Rick não respondeu, mas o Brian sabia que ele estava
a apontar tudo, então continuou. “E temos um sólido balanço
financeiro, uma marca bem conceituada, fortes projecções
de vendas para os próximos cinco quadrimestres e algumas
patentes que durarão mais alguns anos”.
“Até agora parece‑me bem. O mercado está a crescer?”
O Brian não hesitou. Ele conhecia a indústria como ninguém. “A projecção de crescimento para o próximo ano é 9%,
embora pense que irá aproximar‑se dos 12%”.
“Parece‑me que fizeste um trabalho fantástico nessa cidade
de vacas”.
O Brian conhecia suficientemente bem o Rick para apreciar o seu sarcástico elogio.
“Sim, correu bem. De qualquer modo, há mais uma coisa
que penso que o possível comprador deve saber a nosso respeito”. Ele hesitou antes de continuar, não querendo ouvir
novamente uma piada. “Nós temos a maior taxa de satisfação entre os trabalhadores da nossa indústria. De facto, somos
uma das melhores em qualquer mercado. Temos constado na
lista das cinquenta melhores médias empresas para se trabalhar na América”.
Primeiro o Rick não disse uma palavra, então brincou:
“Bem, então vou ter que ajustar a minha avaliação algumas
centenas de dólares acima”.
“O que é que queres dizer com isso?”
O tom de Brian demonstrava claramente que estava aborrecido, então o Rick recuou um pouco.
18
O Gestor
“Brian, estou só a provocar‑te. Tenho a certeza que trabalhaste muito para desenvolver ali uma boa cultura laboral,
e com certeza que a colocarei no pacote”. Ele fez uma pausa.
“Mas não te vou mentir. Não penso que, em termos de preço
de venda, isso venha a traduzir‑se em algo significativo”.
“Bem, mas devia”. O Brian sabia que podia parecer orgulhoso e defensivo, mas não conseguia evitar faze‑lo.
Como era normal, o Rick não foi de rodeios. “No meu
livro não. Quero dizer, quando olho para uma empresa, só
quero saber se o mercado está a crescer, que parcela desse
mercado a empresa detém e se está em posição de aumentar
a sua cota. Não dou muita importância aos pormenores delicados. De qualquer modo, se de facto contarem, então estarão
reflectidos no bottom‑line”.
Nada chateava mais o Brian, do que ser chamado de delicado e naquele momento estava tentado a desligar o telefone
na cara de Rick e ligar a outra pessoa. Mas sabia que isso não
seria o melhor para a sua empresa. E nos lugares mais escuros do seu cérebro, ele temia que o seu cínico amigo pudesse
estar certo.
Então respirou fundo. “Sabes Rick, às vezes consegues
mesmo ser um verdadeiro idiota”.
O Rick riu‑se. “Mas apesar disso gostas de mim, não gostas Brian? E sabes uma coisa? Eu vou conseguir mais dinheiro
pela tua empresa do que qualquer outra pessoa conseguiria”.
O Brian não respondeu, então o Rick prosseguiu num
tom mais conciliador. “Hei, não quero que fiques com a ideia
errada. Eu admito que ao longo dos últimos dez anos te tenho
acompanhado a ti e à JMJ. Tenho uma boa noção daquilo
que ali tens feito. De facto, tenho um dos vossos aparelhos de
exercício na minha cave”.
19
Os três sinais de um emprego miserável
Silenciosamente, o Brian aceitou as desculpas mudas. “De
qualquer maneira, no final desta semana diz‑me aquilo que tu
pensas que precisamos fazer”.
“Quinta‑feira telefono‑te. Vamos fazer o melhor por vocês,
amigo”.
O Brian despediu‑se e desligou, espantado por o Rick
continuar o mesmo. E por ainda não conseguir odiar aquele
tipo.
20
FEITO
Q
uando o Rick ligou na quinta‑feira, o Brian esperava ouvir
que ele tinha feito alguns progressos. Afinal, ele era um dos
melhores na área dos negócios. Mas não podia ter adivinhado
que o Rick já tivesse identificado um vendedor e negociado
um valor informal de venda, um valor que excedeu tudo o
que ele tinha imaginado.
A estratégia de Rick era explorar a “vantagem do primeiro
a jogar” a carta, em ambos os lados da mesa, e jogou de um
modo brilhante. Ele convenceu o potencial comprador a agir
rapidamente antes que outros candidatos pudessem subir a
oferta. Isto fez com que fossem um pouco mais generosos do
que tinham tencionado ser. E encorajou o Brian a agir antes
que os seus outros competidores entrassem em jogo, o que
poderia lotar o campo de jogo e diluir o seu valor no mercado
aberto.
Assim, após apenas duas semanas e meia de telefonemas
em conferência, visitas e reuniões de negociação, o Brian assinou os documentos que davam o controlo da sua empresa ao
maior fornecedor de equipamento médico do país. Mais tarde
viria a admitir que não estava preparado para todas as consequências daquela assinatura.
21
TR ATAMENTO
DE CHOQUE
O
comprador da JMJ não era um novato no jogo das aquisições
e a sua equipa executiva tinha adoptado uma estratégia extremamente agressiva no que dizia respeito à integração. O seu
raciocínio era que, era melhor acelerar uma transição agindo
rapidamente, mesmo que isso causasse ruptura, do que esperar e deixar que a letargia e o medo surgissem. “Como arrancar um penso‑rápido de uma só vez”, explicou o CEO deles
antes da tinta do contrato estar seca.
O plano deles implicava que o nome da empresa fosse
imediatamente alterado, o que incluía tudo, desde a maneira
como as recepcionistas atendiam o telefone a colocar um novo
placard na frente do edifício. Isso também significava que executivos que não faziam parte dos planos a longo prazo da
empresa – o que na maioria das vezes inclui os CEO – teriam
que sair o mais rapidamente possível. Foi combinado que o
último dia de Brian na empresa seria sete dias depois de ter
assinado o contrato de venda.
Ao longo da semana seguinte, o Brian foi a vários e emotivos almoços de despedida e a celebrações da empresa, marcando o fim daquilo que um dia tinha sido uma pequena e
22
O Gestor
humilde empresa independente. Apesar de ele apreciar profundamente as esmagadoras manifestações de gratidão e
afecto dos empregados, especialmente dos trabalhadores mais
antigos da fábrica, cujas vidas tinham drasticamente mudado
durante o seu tempo na empresa, ele considerou a experiência de tal modo cansativa e esmagadora do ponto de vista
emocional que desejava ansiosamente que terminasse.
Finalmente, numa chuvosa tarde de sexta‑feira, já depois
de os porteiros terem saído, o Brian arrumou o seu escritório e abandonou o edifício pela última vez. Limpando os seus
olhos preventivamente para evitar que qualquer lágrima escapasse, dirigiu‑se para casa imaginando como iria ser o resto
da sua vida.
23

Documentos relacionados