portugal e o japão - Armando Martins Janeira

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portugal e o japão - Armando Martins Janeira
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CAPÍTULO PRIMEIRO
O CAMINHO DO OCIDENTE
O desembarque dos primeiros Portugueses no Japão deu-se em 1542 ou 1543. C. R.
Boxer, no seu último livro, The Christian Century in Japan, dá como certo o
desembarque de 1543 na ilha de Tanegashima; se alguma viagem se realizou antes, crê
teria levado às ilhas Riukiu1.
Não são ao certo conhecidos os nomes dos primeiros Portugueses que aportaram no
Japão. António Galvão, no seu Tratado, diz que foram António da Mota, Francisco
Zeimoto e António Peixoto, levados por uma tempestade. Diogo do Couto recebeu esta
versão, que vários outros historiadores, antigos e modernos, aceitaram. Outros escritores
nomeiam Cristóvão Borralho, Diogo Zeimoto e o imaginoso e aventureiro Fernão
Mendes Pinto, que se gaba de figurar entre os descobridores do Japão. Boxer prova no
seu livro que nos anos da descoberta ele não podia lá estar. Até hoje não foram
encontrados documentos nem argumentos para esclarecer decididamente a questão2.
Os Portugueses foram mais bem recebidos no Japão do que na China. É
comummente atribuído o êxito dos primeiros contactos com os Japoneses à introdução
da espingarda, que os Nipónicos, sendo um povo tradicionalmente guerreiro, admiraram
muito.
A penetração no Japão foi feita pelos jesuítas e pelos negociantes.
Em 1549, S. Francisco Xavier desembarcou em Kagoshima, ficando no Japão até
1551. Em cerca de dois anos conseguiu converter ao cristianismo nas cidades de
Kagoshima, Hirado e Yamaguchi à volta de 800 pessoas. O número de cristãos foi
aumentando, pois novos jesuítas foram enviados pelo vice-rei da Índia, e logo em 1558,
por causa dos zelos e dos conflitos com os padres budistas, surgiram as primeiras
1
C. R. Boxer, The Christian Century in Japan, p. 18 e ss.
2
História de Portugal, de Barcelos, Vol. 3, p. 607 e ss.
dificuldades com as autoridades japonesas, tendo o senhor de Hirado expulsado os
missionários dos seus territórios.
O comércio começou a desenvolver-se, sobretudo depois de os pilotos descobrirem
um porto seguro em Nagasáqui. As naus da Índia vinham a Nagasáqui, depois de
tocarem em Macau.
Os jesuítas receberam protecção e favores das autoridades, tendo-lhes sido doadas
duas aldeias perto de Nagasáqui, das quais recebiam rendas. Os jesuítas não se
limitavam a converter as almas, mantinham também por sua conta um comércio
importante. Embarcavam para o Japão seda e outros tecidos e colocavam grandes
quantidades de prata no mercado da seda na China.
O comércio com Macau aumentava e a confiança estabelecera-se a ponto de os
comerciantes macaenses poderem levantar vultosos empréstimos no Japão.
Em 1579, o número de cristãos em todo o Japão deveria andar à roda de 130 mil,
depois de 30 anos de trabalho missionário. Nesta altura, os Espanhóis, das Filipinas,
mantinham uma corrente de missionários e homens de negócios para o Nipon.
No desejo de mostrar à Europa como os Japoneses eram um povo culto e de altas
qualidades, bem como os frutos do trabalho de evangelização, o padre Valigniano
escolheu para enviar em missão à Europa quatro jovens japoneses, de menos de vinte
anos, Mâncio (nome japonês, Ito), Miguel (Chijiwa), Julião (Nakaura) e Martinho
(Hara). Levavam cartas ao Papa dos senhores de Bungo, Arima e Omura. Partiram de
Nagasáqui em Fevereiro de 1582, num barco português, via Índia e Portugal, e
regressaram oito anos depois, tão mudados que nem as próprias mães os reconheceram.
Trouxeram consigo muitos presentes e objectos europeus, entre os quais pinturas, que
haviam de ter grande influência na evolução da pintura japonesa3.
Taiko Hideyoshi, que até então favorecera os cristãos, subitamente, em 1587,
proclamou um édito condenando os missionários e a sua acção e mandando-os sair do
Japão dentro de vinte dias. A razão desta mudança de ideias de Hideyoshi nunca foi
3 O professor Yoshitomo Okamoto, erudito investigador das relações históricas entre Portugal e o
Japão, acaba de publicar um livro sobre o assunto desta influência, Kirishitan Yogashi Josetsu (Estudo
sobre a História da Pintura Cristã).
Menos feliz seria a segunda missão nipónica à Europa, em 1613, enviada pelo clã Date, de Sendai, a
Filipe II e ao Papa, via México, com o objectivo, não conseguido, de estabelecer comércio com esta nova
província espanhola; a intensificação da perseguição cristã no Japão levou a que alguns membros da
missão fossem queimados vivos, no regresso.
satisfatoriamente explicada. Hideyoshi temia provavelmente a expansão de uma
doutrina que negava a adoração dos espíritos dos antepassados (kami), sobre o que se
baseava toda a ordem social. Este édito contra os jesuítas não foi severamente
cumprido.
Agravou-se, porém, este estado de coisas quando, em 1596, por ocasião do
naufrágio de um navio espanhol, o piloto ameaçou a autoridade local japonesa, e,
vangloriando-se do poder do seu rei, disse que os missionários e comerciantes espanhóis
eram apenas a vanguarda de expedições de conquista. Hideyoshi, mal recebeu esta
notícia, agiu sem detença. Prendeu catequistas e convertidos e sentenciou à morte 26
cristãos, que foram crucificados em Nagasáqui, em 1597. Daí em diante as perseguições
aos cristãos começaram, com fogo às igrejas e seminários.
Em 1609 chegavam a Hirado dois navios da Companhia Holandesa das Índias
Orientais. Os Holandeses estabeleceram uma feitoria e abriram o seu comércio com os
Japoneses. A Holanda começava o contacto com as autoridades japonesas, contacto que
será o único país europeu a conservar sem interrupção até hoje, com sabedoria,
paciência e astúcia.
No ano seguinte, em continuação de dificuldades que iam surgindo entre Japoneses
e Portugueses, muitas vezes devido à falta de ponderação nossa, deu-se o caso do barco
Madre de Deus, queimado pelos Japoneses em Nagasáqui, afogando-se a maior parte da
tripulação.
Em 1613, também os Ingleses mandavam um navio, pertencente à Companhia
Inglesa da Índia Oriental, onde estabeleceram uma feitoria. Para combater os interesses
comerciais e a influência de Portugal, os Ingleses aliaram-se aos Holandeses e em 1619
uniram-se pelo Tratado de Defesa, pelo qual as Companhias da Índia Oriental dos dois
países formaram uma armada de defesa, de vinte navios, dez dos quais baseados em
Batávia e dez em Hirado, para atacarem as colónias portuguesas e espanholas e
atacarem e apresarem os barcos ibéricos. Porém, as lutas entre Holandeses e Ingleses
nos mares do Sul foram cada vez mais vivas e a armada desorganizou-se dois anos
depois. A Inglaterra retirou-se temporariamente perante a supremacia holandesa e em
1623 encerrou a feitoria de Hirado, dando fim ao seu comércio com o Japão.
Os Portugueses haviam estabelecido um comércio importante entre Macau e
Nagasáqui. Os jesuítas, cuja penetração tinha sido preparada por S. Francisco Xavier,
continuavam a alargar a sua obra de cristianização.
Começou a espalhar-se entre os Japoneses que os Espanhóis, das Filipinas, se
preparavam para vir conquistar o Japão, repetindo-se que os padres jesuítas tinham
vindo à frente, infiltrar-se e preparar a conquista. Em virtude disto, os Espanhóis foram
proibidos de desembarcar no Japão em 1624. Aos comerciantes portugueses era
permitido ainda desembarcar, mas não podiam alojar-se em casa de cristãos, apenas em
casa de budistas. As crianças europeias foram deportadas para Macau. Construiu-se a
ilha artificial de Dejima, onde os comerciantes e marinheiros de Macau eram
severamente guardados, depois de serem cuidadosamente revistados à sua chegada da
China. Os próprios Chineses foram confinados no seu comércio ao porto de Nagasáqui.
As autoridades administrativas eram cada vez mais hostis aos cristãos, perseguindo
a doutrinação religiosa, que continuava a fazer-se secretamente.
A revolta de Shimabara, em 1637, foi o pretexto para o corte definitivo com os
Portugueses. A população local, cansada de sofrer abusos e crueldades do dáimio,
revoltou-se. Os cristãos tiveram importante parte nesta revolta, tendo-se concentrado
por fim no castelo de Hara4 . Os Holandeses aliaram-se ao dáimio contra os cristãos
cercados. A revolta de Shimabara foi o fim de 95 anos de catequização e comércio
portugueses no Japão.
Quando o capitão Vasco Palha de Almeida chegou a Nagasáqui em 1639, com dois
barcos, não lhe foi permitido fazer negócio e foi-lhe entregue cópia do decreto, assinado
pelo Xogum, proibindo toda a espécie de comércio entre Macau e Nagasáqui, com o
fundamento de que os barcos portugueses introduziam clandestinamente no Japão
missionários, e que tanto os missionários como o dinheiro introduzidos eram
responsáveis pela revolta de Shimabara.
O capitão Palha levou a notícia para Macau, onde causou grande consternação. O
Leal Senado resolveu insistir, enviando uma delegação ao Xogum a pedir-lhe que
reconsiderasse a sua decisão. Os enviados foram executados pelos Japoneses e o barco
queimado. Os treze tripulantes chineses da expedição foram mandados num pequeno
4 A bandeira
dos revoltosos ostentava o símbolo da Eucaristia cercada pela legenda em português:
«Louvado seja o Santíssimo Sacramento».
barco dizer a Macau que se «o próprio Rei Filipe, o Deus dos cristãos, ou o Grande
Buda desrespeitassem a proibição, pagariam com as suas cabeças».
Depois da proclamação da independência, D. João IV mandou dois galeões reais a
dar a notícia da independência e do seu propósito de reatar as relações comerciais com o
Japão. Os Japoneses responderam que o comércio era o pretexto para a propaganda
cristã, em nome da qual os Portugueses tomaram reinos alheios e que os missionários
eram a vanguarda dos conquistadores. Considerando que o capitão Gonçalo de Siqueira
de Sousa viera de boa-fé, foi-lhe permitido regressar. Era em 1647 5.
A última tentativa de contacto com o Japão foi em 1685, em que Macau mandou
para o Japão treze náufragos japoneses salvos por Macaenses. Os Portugueses foram
avisados de que as leis anticristãs estavam ainda em vigor, e mandados sair de
Nagasáqui. O Japão estava então a negociar regularmente com a China, depois da queda
da dinastia Ming e acesso ao poder dos Manchus (1644), e com os Holandeses, que
mandavam anualmente cinco barcos de Batávia a Nagasáqui.
A influência holandesa começou a aumentar, à custa da portuguesa. A
cristianização foi evidentemente a capital influência portuguesa, juntamente com certos
dados científicos de astronomia e náutica que os Japoneses de nós aprenderam. O
comércio nunca representou, do lado japonês, um meio de grande influência, porque as
autoridades japonesas consideravam então, como as chinesas, o seu país
economicamente auto-suficiente. Sansom refere o cálculo que avalia, provavelmente
com exagero, em 1614, o número de cristãos no Japão em cerca de meio milhão. Hoje
não deve ir além de trezentos mil.
Os Holandeses aproveitaram a sua situação singular no Japão para comerciar e para
fazer uma inteligente política de prestígio. A língua holandesa tornou-se, à custa da
portuguesa, o meio de estudo dos intelectuais japoneses e de aquisição do conhecimento
da ciência ocidental, especialmente da medicina e cirurgia. Os Holandeses evitavam
cuidadosamente falar em assuntos religiosos, pois foi por os Japoneses os não
considerarem cristãos que lhes permitiram continuar no Japão. A língua portuguesa era
ainda empregada durante o século XVII como meio de comunicação entre Japoneses e
5 C. R. Boxer, no seu livro The Embassy of Captain Gonçalo de Siqueira de Sousa, nota que esta é a
primeira embaixada enviada por um Chefe de Estado ao Japão, as outras tendo sido em nome de vice-reis
e governadores. Boxer elogia a «coragem calma» do capitão português perante as provocações e
artimanhas nipónicas.
ocidentais. Só no século XVIII o holandês a substituiu neste campo. De 1641 em diante,
até meados do séc. XIX, os Holandeses, instalados na pequena ilha de Dejima, na barra
de Nagasáqui, mantinham a única porta aberta aos Nipónicos de contacto com o
Ocidente.
O receio da propaganda cristã era tão forte e persistente que, quando em 1804 o
barco russo Nadiezheda entrou em Nagasáqui com um enviado russo que, em nome do
Czar, propunha negociações com o Imperador, os Japoneses lhe responderam que o
Japão não precisava de mercadorias estrangeiras e que as relações comerciais traziam o
risco da penetração da religião estrangeira. Em Agosto de 1853 o Czar enviou outra
expedição a tentar estabelecer relações. Só em águas japonesas, soube o comandante
russo que o comodoro americano Perry se encontrava fundeado em Uraga.
Antes desta data, vários barcos russos, ingleses e americanos haviam entrado
teimosamente, de quando em quando, nas águas japonesas. É no entanto aos
Americanos que se deve a reabertura do Japão ao Ocidente. Em Julho desse ano chega o
comodoro Perry com uma carta do Presidente Fillmore. Perry, sob encobertas ameaças,
anunciou que na Primavera seguinte voltaria com uma força maior e que desejaria
estabelecer facilidades de navegação e comércio com o Japão. E na verdade assim fez.
Não lhe foi difícil então concluir, em 31 de Maio de 1854, um tratado pelo qual o Japão
abria dois portos, Shimoda e Hakodate, aos barcos americanos, dando outras facilidades
em matéria de comércio, dispondo ao mesmo tempo sobre o estabelecimento de um
cônsul americano no Japão. Este tratado, que termina o período de dois séculos de
encerramento do Japão, foi seguido por tratados com a Inglaterra em Outubro de 1854,
Rússia em Fevereiro de 1855 e Holanda em Novembro de 1855.
Em 1856 um barco de guerra americano trouxe o cônsul Townsend Harris, com o
propósito de alargar os objectivos do tratado de 1854. As autoridades japonesas
pediram-lhe que se fosse embora. Mas Harris ficou, instalado num pequeno templo em
Shimoda, trabalhando contra toda a espécie de miúdas e espessas dificuldades postas
pelas autoridades japonesas. Por fim, em 1857, conseguiu que os Japoneses, contravontade, assinassem uma convenção que abria o porto de Nagasáqui aos barcos
americanos. A vida de Harris na pequena povoação de Shimoda, vivendo de galinha e
arroz, num tranquilo templo budista, tendo por único refrigério a inteligente musumé,
Kichi, que as autoridades japonesas, astuciosas e compreensivas das fraquezas de um
homem solitário, lhe mandaram para o servir, o amar e o espiar, é um dos capítulos mais
curiosos da penetração ocidental no Japão.
Em Julho de 1857 a convenção foi substituída por um tratado que concedia
privilégios diplomáticos e consulares, abertura de mais portos, liberdade de religião e
jurisdição extraterritorial. Meses depois este tratado é seguido por tratados semelhantes
com a Inglaterra, Holanda, Rússia e França.
Os referidos tratados entraram em vigor em 1858 e enviados diplomáticos foram
logo residir para Yedo (Tóquio), e o porto de Yokohama aberto ao comércio e residência
dos estrangeiros. Portugal assinou um tratado semelhante com o Japão mais tarde, em
1860.
Ao mesmo tempo que estas vantagens iam sendo conseguidas pelos países
ocidentais, uma luta complicada, com todas as confusas malhas da astúcia e evasiva
orientais, sucedia-se no Governo do Imperador e do Xogum e nos círculos dos clãs
influentes, cujo principal e reservado objectivo era a futura expulsão dos estrangeiros,
que o Governo se não sentia com forças de operar.
Seguiu-se uma atmosfera de exaltação nacional, com perseguições aos estrangeiros.
Houve um ataque à Legação da Grã-Bretanha e o assassínio de um secretário da
Legação dos Estados Unidos.
Uma esquadra britânica bombardeou, em 1863, Kagoshima, capital de Satsuma, em
represália da morte de um cidadão britânico pelos samurais de Satsuma. No ano
seguinte as forças navais inglesas, francesas, holandesas e americanas bombardearam
Shimonoseki, para castigar o ataque de barcos mercantes ocidentais pelo dáimio de
Chofu, que pretendia encerrar os estreitos.
O Xogum havia decidido de novo expulsar todos os estrangeiros, mas as
autoridades japonesas não se atreviam já a pôr em prática a decisão, por temerem
represálias que o exemplo do acontecido na China lhes fazia temer.
O Japão, com efeito, tivera notícias da guerra, tristemente denominada do ópio, de
1839 a 1842, após a qual a China se viu obrigada, pelo Tratado de Nanquim, a pagar à
Inglaterra uma pesada indemnização e a abrir ao comércio os portos de Cantão, Amoi,
Futcheu, Ningpo e Xangai. Depois, nos tratados com os Estados Unidos e com a França,
as concessões de comércio alargaram-se a estes países. Os entraves postos pelos
Chineses ao comércio, nos anos seguintes, apesar dos tratados, a martirização dos
missionários e a afronta à bandeira britânica, originaram nova guerra com a Inglaterra e
a França, em 1857, que acabou nos tratados de Tientsin e Pequim, em 1860, pela
concessão de indemnizações, mais privilégios e a abertura de mais portos. O sentimento
xenófobo na China era ainda activo em 1900, tendo explodido na revolta contra os
estrangeiros, em Pequim, com o massacre de muitos estrangeiros, incluindo mulheres e
crianças, a qual deu origem à chamada guerra dos «Boxers», que terminou no mesmo
ano, com a China a pagar uma grande indemnização.
Estes reveses da China atemorizaram os Japoneses. Do exemplo do acontecido à
China e da evidência da sua própria fraqueza demonstrada nos conflitos com os países
ocidentais, os Japoneses tiraram rapidamente útil lição.
Em 1868 começou a era chamada da «Restauração». O Governo passou do Xogum
para as mãos do Imperador Meiji e inicia-se a reforma que vai abolir o feudalismo. A
capital é transferida para Tóquio. Em 1871 os feudos, entre os quais estava parcelada a
autoridade administrativa, são abolidos, e em 1872-73 o Governo sente-se com força
para decretar o serviço militar obrigatório. Japoneses foram à Inglaterra, França e
Alemanha estudar a arte militar e naval, medicina, marinha mercante, e aos Estados
Unidos estudar comércio e negócios. Organizaram a polícia, o sistema monetário, os
correios, criaram bancos, estabeleceram os serviços públicos e reformaram os tribunais
à semelhança do sistema judiciário francês. Foi estabelecido um Gabinete de Ministros,
seguindo o modelo alemão, e foi redigida a Constituição, outorgada ao povo pelo
Imperador e promulgada em 1889, instituindo duas câmaras, dos Pares e dos
Representantes.
O Governo deu um particular interesse à divulgação da educação, desde que o
Ministério com este fim foi criado, em 1871, fazendo do Japão o primeiro povo do
Oriente em alfabetismo. O objectivo deste programa de educação era formar e doutrinar
os cidadãos para os fins de um Estado forte. O Governo concentrou a sua maior atenção
na criação de uma armada e exército eficientes, utilizando as mais adiantadas técnicas
ocidentais, dentro do espírito nacionalista que proclamava o Japão o povo eleito, cujo
Imperador era descendente directo do Sol.
A restauração Meiji marcou um largo passo para a ocidentalização do Japão. A
reacção contra o espírito fechado a todo o contacto estrangeiro veio com inesperados
excessos. Nas duas décadas que se seguiram, a inteligência deixa-se deslumbrar pelo
fulgor da cultura ocidental, com desprezo da sua própria. A Universidade de Tóquio
funcionou por algum tempo sem secção de literatura japonesa nem chinesa; em algumas
escolas estas não eram ensinadas, ao passo que a literatura inglesa fazia parte dos
programas; o ministro da Educação, Mori, chegou a defender o uso da língua inglesa em
vez da japonesa; as traduções de livros ocidentais eram devoradas e gozavam de mais
largas edições que os originais japoneses; um escritor nipónico lembrou-se mesmo de
propor que os homens japoneses casassem com mulheres estrangeiras para melhorar a
estatura e força da raça.
Esta orientação da educação não provinha apenas da sedução do Ocidente, mas
também da tendência para descurar certos aspectos académicos do ensino por matérias
de utilidade e prática, que levaria à total transformação das bases económicas da
sociedade japonesa. Tal tendência vinha já de antes da restauração. Já em 1872 os
estudantes de língua e literatura japonesas eram metade do número dos de assuntos
ocidentais. A escola que Fukuzawa fundou em 1858 para o ensino do holandês, tornarase, após a restauração, o centro de ensino do inglês, economia, direito e outras
disciplinas de preparação para carreiras no comércio e indústria.
Esta corrente de ocidentalização preparou a potência económica e militar do Japão.
A ciência desenvolveu-se, o comércio e a indústria tiveram uma rápida expansão.
Adoptando os métodos e exemplos dos seus tutores ocidentais, os Japoneses
voltam-se também contra a China, tirando dela proveitos e indemnizações. Em 1874,
em consequência de uma expedição punitiva japonesa, sob o pretexto de vingar a morte
de alguns marinheiros japoneses, o Japão recebe da China a outra parte das ilhas Riukiu.
Em 1894 o Japão lança-se em guerra contra a China, por causa do contrôle da Coreia, a
qual, derrotada a China, é declarada independente. O Japão, pelo tratado de 1895,
recebe a Formosa, as ilhas Pescadores, a península de Liaotung e um bocado do Sul da
Manchúria.
O Japão tornara-se um Estado moderno, rivalizando em poder com os povos do
Ocidente. Em 1902, a maior potência naval, a Inglaterra, alia-se a ele num pacto militar,
que dará ao Japão a possibilidade de se lançar em guerra contra a Rússia dois anos
depois. Postas de parte a concorrência russa e a chinesa na Coreia, o Japão anexa esta
em 1910.
Segue-se a primeira guerra mundial, da qual o Japão tira os enormes proveitos das
ilhas alemãs no Pacífico e mais concessões da China. No Tratado de Versalhes, em
1919, o Japão aparece como uma grande potência.
Rapidamente, de um estado atrasado, de feudalismo, com uma organização militar
primitiva, vivendo fechado nas suas ilhas uma vida social de base rural e artesanal, o
Japão organiza-se numa forte hierarquia administrativa e militar, com classes
rigidamente separadas, e salta para a frente dos países científica e industrialmente
dirigentes, com uma técnica que lhe tornou possível a criação de um dos maiores
exércitos.
O progresso técnico do Japão, que tanto surpreende no meio dos países não
desenvolvidos para lá do Suez, foi produzido por factores idênticos aos que originaram
a revolução industrial na Inglaterra – grande população apertada num território
insuficiente, destruição da classe militar samurai que sustinha o sistema da propriedade
rural, canalização para a unidade política e para a expansão das forças nacionais –,
acrescidos da propensão nipónica para imitar a novidade estrangeira.
Ao mesmo tempo que firmava o seu lugar na vida internacional, o Japão
desenvolvia relações de bom entendimento, comércio e cultura com os principais países
do Ocidente. Não foram apenas a Inglaterra e os Estados Unidos, com a sua alta técnica,
que criaram influências no Japão. A França desenvolveu ali uma larga acção cultural,
que a conserva ainda hoje o país com maior influência nos meios intelectuais japoneses.
A Espanha retomou e desenvolveu a tradição da cristianização. A Holanda, com nunca
descurado afinco, procurou manter sempre no Japão o prestígio que lhe confere a sua
nunca interrompida acção histórica.
Na segunda guerra mundial, pela primeira vez na sua história, o Japão é derrotado.
Os efeitos desta derrota, para este país orgulhoso, que se considerava descendente dos
deuses, é de incalculável importância, tanto moral, como material, pois, além de
imensas destruições, sofreu a perda de largos territórios. A ocidentalização do Japão
passa a revestir novos e mais profundos aspectos. As tropas estrangeiras que ocupam o
seu solo trazem ao seio do país os hábitos, os exemplos e as ideias da vida ocidental. Os
ocidentais destruíram-lhe o mito divino do Imperador, que se tornou uma pessoa
humana, que fala na rádio, que se mostra aos seus súbditos, os quais, quando ele passa
nas ruas, o podem agora olhar de frente, pela primeira vez, sem serem obrigados a
dobrar-se de olhos no chão, a correr as cortinas das casas e dos carros eléctricos. A
ocupação sob o General MacArthur aboliu os títulos nobiliárquicos, o que contribuiu
também para o novo aspecto democrático do Japão. A reforma agrária, distribuindo as
terras pelos camponeses, foi considerada por MacArthur, seu autor, a maior reforma
desde os Gracos. Embora seja exagero assim considerá-la, não há dúvida que tais e
outras reformas da ocupação tiveram uma influência profunda. Pela primeira vez na sua
milenária história, o Japonês experimentou o sabor da liberdade, gozou de um Governo
e de instituições livres. A ocupação cessou no dia 28 de Abril de 1952, em que o Japão
se tornou independente.
A nova Constituição Política, entrada em vigor em 1947, elaborada pelo Governo
japonês sob a inspiração e a pressão americanas, declara que a soberania reside no povo
e que o «Imperador é o símbolo do Estado e da unidade do povo». O executivo, pela
primeira vez, fica submetido ao legislativo. O primeiro-ministro será escolhido pela
Dieta de entre os seus membros, e a Dieta pode forçar o Gabinete a demitir-se. A
Câmara dos Representantes, com 466 membros, tem precedência sobre a dos
Conselheiros, com 250, e em caso de discordância entre as duas a decisão daquela
prevalecerá desde que obtida por maioria de dois terços. A lista dos direitos dos
cidadãos foi alargada e criou-se um poder judiciário independente. O movimento
operário foi organizado em fortes uniões e promulgaram-se leis de protecção social. A
penetração do espírito destas reformas e novidades na sociedade japonesa continua
ainda a operar-se, sendo impossível prever até que ponto elas se incrustarão com
permanência. O choque foi demasiado brusco e profundo – o autoritarismo e a
submissão feudais, o despotismo militar, herdeiro do espírito samurai, não estão muito
longe dos nossos dias. A influência americana exerce-se em vários domínios: no jazz e
no striptease, por exemplo, sobretudo nas novas gerações, goza hoje de um entusiasmo
demasiado furioso para poder manter-se muito tempo. Na Música, na Arte, como na
Política, os Japoneses hão-de refazer-se e encontrar os seus próprios caminhos. Mas
qualquer que seja a reacção que venha a produzir-se, a vida e o espírito nacional do
Japão têm sofrido uma revolução radical, que começou em 1542, quando o primeiro
português desembarcou em Tanegashima, com uma espingarda.
NOTA BIBLIOGRÁFICA
No fim do século passado e neste meio século apareceram inúmeros livros sobre o
Japão. G. Sansom julga que nenhum outro país terá talvez sido objecto de tantos estudos
neste período. Mencionarei apenas aqui neste capítulo, como nos seguintes, dos livros
que consultei os que me parecem mais importantes para estudo dos assuntos aqui
abordados. Não refiro a literatura histórica geral portuguesa porque dela pouco uso
poderia fazer-se para o escopo deste estudo, que não tem preocupações de erudição nem
de investigação académica.
A Short Bibliography of Japan, The Kokusai Bunka Shinkokai, Tóquio, 1934.
Bibliographie Abrégée des Livres relatifs au Japon, en Français, Italien, Espagnol
et Portugais, Kokusai Bunka Shinkokai, Tóquio, 1936. Completa a anterior.
Henri Cordier, Biblioteca Japonica.
F. Wenckstern, A Bibliography of the Japanese Empire, 2 vols.
Oskar Nachod, Bibliography of the Japanese Empire, 3 vols.
George Sansom, The Western World and Japan, Cresset, Londres, 1950.
—— Japan in World History, Institute of Pacific Relations, Nova Iorque, 1951.
—— Japan. A Short Cultural History, Appleton, Nova Iorque, 1943.
Os livros de Sansom são, no consenso geral, os melhores estudos sobre as relações
históricas entre o Japão e o Ocidente. Distinguem-nos a abundante documentação, o
conhecimento da psicologia e da história japonesas, a penetração e o bom julgamento.
Henri Bernard, Les Premiers Rapports de la Culture Européenne avec la
Civilisation Japonaise, Paul Geuthner, Paris.
—— Infiltrations Occidentales au Japon avant la Réouverture du Dix-Neuvième
Siècle, Geuthner, Paris.
James Murdoch, History of Japan during the Century of Early Foreign Intercourse
(1542-1651), Kobe, 1903.
—— History of Japan, 3 vols., Routledge, Londres, 1949.
A obra de Murdoch é a história fundamental do Japão numa língua europeia.
Recorreu largamente a fontes portuguesas no segundo volume.
C. R. Boxer, The Embassy of Captain Gonçalo de Siqueira de Souza, Macau, 1938.
Faz uma interessante e colorida descrição das relações entre os navios portugueses
e as autoridades locais de Nagasáqui e presta homenagem à calma coragem do capitão
português, cujo valor e sangue frio perante as manhas e provocações dos Japoneses
salvaram a tripulação de uma morte certa.
—— The Christian Century in Japan (1549-1650), University of California Press,
1951.
—— The Affair of Madre de Deus. A Chapter in the History of the Portuguese in
Japan, Londres, 1929.
—— The Fidalgos in the Far East (1550-1570). Fact and Fancy in the History of
Macao, Martinus Nijhoff, Haia, 1948.
—— Jan Compagnie in Japan (1660-1850), Nijhoff, Haia, 1950.
Trata da influência cultural, artística e científica exercida pelos Holandeses no
Japão.
Lafcadio Hearn, Japan, An Attempt of Interpretation, no capítulo «The Jesuit
Peril».
José da Costa Carneiro, Origem das Relações entre os Portugueses e os Japoneses,
Sociedade Luso-Japonesa, Tóquio, 1927.
É uma breve exposição que procura situar o descobrimento do Japão no quadro
geral dos descobrimentos portugueses.
Luís Norton, Os Portugueses no Japão (1543-1640), Agência-Geral do Ultramar,
1952.
Portugal e o Japão, Kokusai Bunka Shinkokai, Tóquio, 1940.
César de Sousa Mendes, Política Japonesa – Imperialismo e Democracia, Coimbra
Editora, 1922.
W. G. Beasley, Great Britain and the Opening of Japan (1834-1858), Luzac,
Londres, 1951.
Robert Feary, The Occupation of Japan (Second Phase 1948-50), Institute of
Pacific Relations, Macmillan, Nova Iorque, 1950.
É um estudo desenvolvido sobre os problemas japoneses, de política, economia,
educação, justiça, situação operária, agricultura, etc., durante a ocupação americana.
Não apareceu nenhum estudo ainda sobre a primeira fase da ocupação. Há numerosos
estudos e monografias publicadas pelo Quartel-General Aliado sobre variados assuntos,
mas que hoje precisam de ser lidos e avaliados com crítica reserva.
Edwin Reischauer, Japan Past and Present, Tuttle, Tóquio, 1952.
Tem um relato, muito resumido, sobre os períodos da guerra, da ocupação
americana e da independência até 1950.
Lawrence Battistini, The Background of Asia, Sophia, Tóquio, 1951.
—— Japan and America, Kenkyusha, Tóquio, 1954.
Trata das relações com os primeiros povos ocidentais, o desembarque de Perry, a
ocupação militar, e os problemas do Japão actual, sendo particularmente recomendável
na parte económica.
Lewe Van Aduard, Japan from Surrender to Peace, Martinus Nijhoff, Haia, 1953.
É mais desenvolvido que o anterior e escrito por um diplomata holandês que viveu
na ocupação.
Keneth Scott Latourette, A Short History of the Far East, Macmillan, Nova Iorque.
René Grousset, Histoire de la Chine, Arthème Fayard, Paris, 1942.
Arnold Toynbee, The World and the West, no capítulo «The Far East and the West»,
Oxford University Press, 1953.
CAPÍTULO SEGUNDO
O REATAR DE VELHOS LAÇOS
Portugal, que fora o primeiro país europeu a descobrir o Japão e a revelar a este a
vida e cultura europeias, foi dos últimos a estabelecer relações diplomáticas, depois que
Perry abriu este país ao Ocidente. Desde então, até hoje, as nossas relações com o Japão
não se têm empenhado suficientemente em reviver e conservar o valioso capital
histórico que ali acumulámos num século de esforços e sacrifícios.
Portugal só seguiu o exemplo dos chamados «treaty powers», de 1854 e 1855, em
1860, em que assinámos em Yedo, em 3 de Agosto, o Tratado de Paz, Amizade e
Comércio, naqueles moldado. Este tratado, além das línguas portuguesa e japonesa, usa
a holandesa, cuja versão é considerada a original. O holandês tornara-se o meio de
comunicação do Japão com os povos ocidentais.
O Governador de Macau, Isidoro Francisco Guimarães, acreditado ministro de
Portugal na China, veio a Tóquio assinar o tratado, tendo-se hospedado em casa do
ministro inglês Alcock, segundo Polidoro Francisco da Silva, sendo recebido em
audiência pelo regente do Japão e ministros da Coroa1.
Ao tempo da ratificação do tratado, em 2 de Abril de 1862, Isidoro Guimarães
encontrava-se em Macau, no desempenho das suas funções de Governador, pelo que a
ratificação foi feita na Legação dos Estados Unidos e as cartas entregues ao cônsul
Edward Clark2.
O tratado de 1860 começa por declarar perpétua paz e amizade entre os soberanos
dos dois países. Estabelece depois quanto à troca de agentes diplomáticos e nomeação
de cônsules; abre ao comércio português os portos de Hakodate, Kanagawa e
Nagasáqui, fixando para mais tarde a abertura de Nigata e Hiogo. Os cidadãos
portugueses podem alugar casas e viajar pelo Japão, dentro de estabelecidos limites, e
não podem entrar em Quioto. Gozam do direito de serem julgados pelos cônsules
portugueses. O tratado dispõe também sobre o comércio entre Portugueses e Japoneses,
1
Polidoro Francisco da Silva, Os Japoneses.
2
Young Japan.
importação e exportação, direitos alfandegários, navegação. É seguido de um
Regulamento para o comércio português no Japão, o qual dispõe sobre a entrada e
estadia de navios nos portos japoneses, direitos de tonelagem, desembarque e
desalfandegamento de mercadorias, contrabando, contravenções e multas, fixando a
tabela de direitos de importação e exportação.
O nosso tratado de 1860 é baseado no tratado assinado com os Estados Unidos em
29 de Julho de 1858. Este tratado confere já aos Estados Unidos uma posição
excepcional – constitui o Presidente americano, mediante pedido que lhe seja feito pelo
Governo japonês, futuro mediador nas questões em que surjam divergências entre o
Governo do Japão e qualquer potência europeia (art. 11.º). O confronto deste com os
tratados nipo-americanos de 30 de Março de 1854 e 17 de Junho de 1857 mostra como
os Americanos iam arrancando aos Nipónicos facilidades e privilégios. No primeiro
tratado estabelece-se paz universal entre os dois países, a futura admissão de cônsules
americanos, a abertura de dois portos a um comércio restrito, e assistência em caso de
naufrágio; no segundo documento é aberto mais um porto, é permitida a residência
permanente de Americanos em dois portos, a jurisdição do cônsul americano sobre os
seus concidadãos, e é admitido mesmo que o cônsul-geral vá além do limite de sete ris
(28 quilómetros) da sua residência, embora para se lhe pedir, logo a seguir no mesmo
artigo, que não faça uso de tal direito (art. 6.º). Este tratado foi ratificado em 22 de Maio
de 1860.
Portugal não tomou parte na Convenção de Shimonoseki, de 22 de Outubro de
1864, na qual mais uma vez os Estados Unidos, Inglaterra, França e Holanda faziam
uma política comum em relação ao Japão.
Participou, porém, no Convénio de Tarifas, assinado em Yedo, em 5 de Setembro
de 1866, com a França, Grã-Bretanha, Holanda e Estados Unidos. Os textos do
Convénio são em holandês e japonês3.
O primeiro ministro de Portugal no Japão, Visconde da Praia Grande de Macau, é
nomeado em 7 de Dezembro de 1862. Sucede-lhe José Rodrigues Coelho do Amaral,
nomeado em 22 de Abril de 1863. Em 1866, em 14 de Agosto, é nomeado novo
ministro, José Maria da Ponte Horta. No ano da restauração Meiji, em 1868, Agosto, é
3
«Verkkaring, op de Conventie en Het Tarief, evereengekomen tusschen Portugueesche en Japansche
Gevolmagtigden.»
acreditado o ministro António Sérgio de Sousa. Em 1872 é acreditado o Visconde de
São Januário, que em Novembro do ano seguinte veio a Tóquio.
No mesmo mês, em 24, é feita pelo Governo nipónico, uma comunicação dirigida a
Portugal, Inglaterra, Estados Unidos, França, Áustria, Alemanha, Itália, Holanda, Rússia
e Dinamarca sobre a exportação de farinhas de arroz e trigo, que passa a ser permitida
nos mesmos termos em que era feita a exportação de arroz e trigo em grão.
Em 1870, fundeara em Yokohama e Nagasáqui o barco de guerra Sá da Bandeira4 .
Em 1880 veio ao Japão a canhoneira Mandovi, seguida depois pelas canhoneiras Rio
Lima e Tejo. Tínhamos então em Yokohama um Consulado confiado ao Sr. Keswick, ao
qual sucedeu E. Bavier, que era ao mesmo tempo cônsul da Dinamarca.
Foi no ano de 1880, em 24 de Março, que foi acreditado o primeiro ministro
japonês em Lisboa, Hisanobu Samejima, que acumulava com as funções de ministro em
Paris, onde residia.
No ano seguinte estabeleceu-se o primeiro clube português no Japão. Chamava-se
Clube Português de Yokohama. Pouco depois iniciou-se a publicação do jornal
português Árgus, cuja vida não foi além de nove meses. Nesta altura existiam em
Yokohama três jornais ingleses e um francês.
Em 1882, em 8 de Março, chegou a Tóquio uma missão portuguesa chefiada pelo
ministro Joaquim José da Graça, que estava acreditado ministro no Japão desde
Dezembro de 1879. Compunha-se de um secretário, um intérprete e dois adidos. A
missão estabeleceu-se no Palácio Mitakoyamamachi, que o ministro dos Negócios
Estrangeiros japonês gentilmente pôs à disposição do nosso ministro. A missão
entabulou conversações sobre os tratados e os direitos extraterritoriais por estes
garantidos. Estes direitos foram objecto de conversas e disputas, dos diversos países,
com o Governo japonês, derivadas de dificuldades criadas aos estrangeiros, umas vezes
por excessivos sentimentos nacionalistas nipónicos, outras por demasiada sensibilidade
dos ocidentais.
A Inglaterra foi a primeira potência a rever o seu tratado com o Japão, num pé de
igualdade, tendo renunciado aos privilégios da extraterritorialidade em 1894. As
principais razões desta alteração eram: o facto de o Japão se ter tornado uma grande
4
Wenceslau de Moraes, Cartas do Japão, Vol. 2.
potência; a modernização do sistema judiciário japonês, que garantia um tratamento de
igualdade e humanidade aos estrangeiros, não havendo mais necessidade de serem
julgados por um foro especial; a necessidade inglesa de ganhar um aliado no Extremo
Oriente, para contrabalançar o ameaçador imperialismo russo. Os Estados Unidos e as
outras potências imitaram o exemplo da Inglaterra, e em 1899 o Japão é o primeiro país
do Oriente a libertar-se das restrições da extraterritorialidade. Mas foi só em 1911 que,
com a abolição das últimas limitações em matéria de direitos aduaneiros, o Japão tomou
o pé de absoluta independência e igualdade em relação aos países ocidentais.
Portugal extinguiu o Consulado em Tóquio em 1892. Como o ministro vivia em
Macau e não havia autoridade portuguesa para proteger os nacionais, o Governo japonês
considerou isto uma quebra das estipulações dos tratados para prever um sistema eficaz
de jurisdição sobre os Portugueses no Japão e declarou o seu direito de jurisdição sobre
eles no rescrito imperial de 3 de Agosto de 1892, denunciando todos os compromissos
tomados com Portugal em matéria de jurisdição civil.
Seguindo as pegadas dos demais países na revisão dos primeiros tratados, Portugal
celebrou em 26 de Janeiro de 1897, desta vez em Lisboa, um Tratado de Comércio e
Navegação, válido para Portugal, ilhas adjacentes e Macau. Inclui um protocolo
assinado na mesma data e dois anexos relacionando as mercadorias portuguesas e
japonesas que gozam do privilégio da nação mais favorecida. Era para valer durante
doze anos e foi denunciado em 17 de Julho de 1910 pelo Japão.
A ratificação deste tratado foi feita por troca de cartas, em Lisboa, em 30 de Agosto
de 1897, existindo correspondência sobre a prorrogação do prazo da troca dos
instrumentos de ratificação. Esta correspondência vem datada de Paris, de 19 a 24 de
Julho. Foi denunciado em 17 de Julho de 1910, pelo Governo japonês e deixou de
vigorar em 17 de Julho do ano seguinte.
O tratado de 1897 é muito diferente do de 1860. Enquanto que o tom dominante
deste é o de regular a tolerada penetração de um país ocidental num recluso e tímido
país do Oriente, no de 1897 duas potências iguais regulam livremente os seus mútuos
interesses. A reserva de jurisdição é suprimida. Os direitos individuais, aquisição e
transmissão de bens são regulados em pormenor e é inserta a cláusula da nação mais
favorecida. Estabelece-se a liberdade recíproca de comércio e navegação; os barcos
portugueses podem entrar em todos os portos e rios japoneses abertos ao comércio
estrangeiro e os cidadãos portugueses poderão viajar por todo o Japão.
Entretanto, barcos de guerra que visitavam Macau vinham até ao Japão lembrar a
vizinhança e as velhas relações portuguesas. Em 1898, veio a canhoneira Diu e
posteriormente a Liberal e a Zaire. Depois desta vieram aqui, em 1910, o cruzador
Rainha D. Amélia, a Yokohama, o S. Gabriel, também a Yokohama, e o Vasco da Gama,
a Nagasáqui. Depois deste fundeou em Kobe o Pátria. Entretanto, a Esquadra japonesa
visitava Lisboa em 1907.
Segundo os elementos e testemunhos que pude colher, o Adamastor, em 1923, foi o
último barco de guerra a arvorar a bandeira portuguesa em águas nipónicas.
O Japão reconheceu o regime republicano em Portugal por nota de 3 de Setembro
de 1911.
As nossas relações com o Japão continuavam a ser conduzidas pelo nosso ministro
na China. Depois o secretário daquela Legação passou a residir em Tóquio, como
encarregado de Negócios. Quando, em 1918, o secretário César de Sousa Mendes saiu
de Tóquio, deixou os negócios portugueses encarregados nas mãos do ministro do
Brasil, Epaminondas Shermont.
As relações diplomáticas entre Portugal e o Japão passaram a ser mais directas,
quando, decorridos meses, em 1920, o Governo português mandou um ministro residir
em Tóquio. O primeiro ministro residente, Fernando Boto Machado, apresentou as suas
credenciais em 15 de Janeiro, tendo então entregado ao Imperador a condecoração que o
Governo português lhe havia conferido. A seguir, foi convidado, com sua mulher, a
almoçar com o Imperador.
A representação diplomática japonesa em Lisboa, que de 1880 a 1907 esteve
confiada ao ministro nipónico em Paris, passa nesta data para o ministro em Madrid,
Manjiro Inagaki. As funções foram separadas em 31 de Outubro de 1932, em que a
Legação do Japão em Lisboa foi estabelecida pelo encarregado de Negócios Taneki
Kumabe, até à posse do ministro Akio Kasama, em 4 de Dezembro seguinte.
De então para cá o estabelecimento de legações nos dois países assegurou mais
estreitas relações diplomáticas.
Os instrumentos diplomáticos que encontro a seguir referidos e transcritos no livro
de que estou a servir-me são o Acordo de Comércio e Navegação assinado em Lisboa
em 23 de Março de 1932 e que deixou de vigorar em 30 de Novembro de 1934, as notas
trocadas sobre a abolição do sistema de arrendamento perpétuo (de que até então as
potências europeias gozavam no Japão), de 30 de Abril de 1937, e o Acordo sobre o
estabelecimento da linha aérea Palau-Díli, assinado em Lisboa em 13 de Outubro de
1941.
Durante a guerra as tropas japonesas invadiram o Timor português, em 20 de
Fevereiro de 1942.
A declaração de rendição do Nipon aos Aliados, feita na rádio pelo Imperador, cuja
voz o povo japonês ouviu pela primeira vez na História, é de 15 de Agosto de 1945. A
retirada das tropas japonesas de Timor fez-se em Setembro seguinte. A soberania
portuguesa nunca fora interrompida, nem a bandeira portuguesa cessara por um só dia
de erguer-se sobre a parte portuguesa da ilha, mas o exercício das actividades da
administração foi seriamente perturbado.
Durante a guerra as relações diplomáticas entre os dois países não foram
interrompidas. O ministro japonês, Morito Morishima, saiu de Portugal, com o pessoal
da Legação, em 19 de Janeiro de 1946. Entretanto a nossa representação diplomática
continuava a funcionar, no Japão ocupado, com a denominação de «Agência
Diplomática Portuguesa», que, depois da independência do Japão, foi substituída por
uma «Representação Portuguesa». Após negociações demoradas assentou-se na base do
restabelecimento de relações diplomáticas normais entre os dois países. Nas notas
trocadas previu-se a permuta de representantes diplomáticos nas duas capitais e a
possibilidade de discussões amigáveis entre os dois Governos para solucionar os
problemas resultantes da intervenção militar japonesa na província de Timor. As notas
foram trocadas, entre o ministro dos Negócios Estrangeiros japonês e o então
representante diplomático português, autor destas linhas, em 22 de Outubro de 1953,
data a partir da qual a Legação de Portugal ficou estabelecida. A situação completou-se
com a reabertura da Legação do Japão em Lisboa, por um encarregado de Negócios, Sr.
Akira Takahashi, em Março de 1954.
NOTA BIBLIOGRÁFICA
Treaties and Conventions between the Empire of Japan and other Powers,
compilados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros japonês, Tóquio, Maruya, 1899.
Há mais edições, de 1874 e 1884.
British and Foreign State Papers, compilados por Sir Edward Hertslet,
bibliotecário e curador dos documentos, Ministério dos Negócios Estrangeiros, vários
volumes, William Ridgway, Londres, 1879.
Ruy Hidemichi Akagi, Japan’s Foreign Relations (1542-1936). A Short History,
Hokuseido, Tóquio, 1936.
John R. Black, Young Japan. Yokohama and Yedo. A Narrative of the Settlement
and the City from the Signing of the Treaties in 1858 to the close of the year 1879, 5
vols., Trubner, Londres, 1880.
Polidoro Francisco da Silva, Os Japoneses, Yokohama, 1889.
É um opúsculo com generalidades sobre a história, a religião, a política e os
costumes japoneses. Tem pouco interesse.
—— Reminiscências do Japão, Yokohama, 1884.
Contém generalidades sobre o Japão. A parte mais curiosa é a que trata dos
Portugueses no Japão. Tem pouco interesse e não merece muita confiança.
E. de Bavier, Relatório do Encarregado do Consulado de Portugal em Yokohama,
acerca do estado político, financeiro e comercial do Império do Japão.
É escrito em francês e publicado em Macau, em 1881. Tem apenas interesse
histórico para o estudo do Japão no ano a que se refere.
Wenceslau de Moraes, Serões no Japão, capítulo «Vestígios da Passagem dos
Portugueses no Japão» e Relance da História do Japão, capítulos IX a XIII.
J. H. Gubbins, The Progress of Japan (1853-1871), Clarendon Press, Oxford, 1911.
António de Oliveira Liberato, Os Japoneses Estiveram em Timor, Empresa
Nacional de Publicidade, 1951.
Descreve a ocupação japonesa de Timor, as crueldades do Exército nipónico e a
resistência portuguesa.
César dos Santos, O Japão na História, na Literatura e na Lenda, Lisboa, 1943.
CAPÍTULO TERCEIRO
TRAÇOS PERDURÁVEIS DA INFLUÊNCIA PORTUGUESA
A penetração da cristianização é de todas a mais importante e profunda influência
portuguesa sobre o povo japonês. Embora os números calculados pelos diversos
historiadores sejam muito divergentes, ela chegou a ser bastante extensa. Uma avaliação
do número de cristãos dá-o, provavelmente com exagero, em meio milhão em 1614,
numa população de menos de trinta milhões. O ardor da fé dos convertidos levou ao
martírio muitos deles, cujo sangue e exemplo não podiam deixar de impressionar as
gerações seguintes. Segundo os cálculos da Igreja, entre 1597 e 1660 o número de
cristãos executados foi de 3125. As perseguições continuaram, tendo-se registado já
perto de nós, em 1806, 1827, 1840, 1856 e 1867.
A flama da obra de cristianização não se extinguiu durante os anos em que o Japão
se manteve recluso. Quando os países ocidentais o abriram de novo, os missionários
franceses, que foram os primeiros a voltar depois da longa reclusão nipónica,
encontraram em Nagasáqui grande número de cristãos, que eles calcularam em vinte mil
ou talvez mesmo cinquenta mil. Sansom duvida que o número fosse tão alto. Em 1867
realizaram-se novas prisões e perseguições, que deram origem aos protestos dos
cônsules ocidentais.
Os Portugueses fundaram no Japão uma cidade, Nagasáqui, a única cidade
japonesa fundada por estrangeiros, e a única construída sobre colinas, à típica maneira
portuguesa.
A obra de cristianização é sobretudo portuguesa. Os Espanhóis só vieram cinquenta
anos mais tarde e foram expulsos do Japão quinze anos antes dos Portugueses.
Os primeiros hospitais abertos no Japão foram estabelecidos por Luís de Almeida,
negociante, que se tornou jesuíta, com conhecimentos de medicina. Ainda se conserva
um sino, num templo de Bungo, com a inscrição «Hospital de Santiago 1612».
O comércio, embora tendo funcionado como principal meio de aproximação e
relacionação entre Portugueses e Japoneses, nunca chegou a ter repercussões de
importância na economia ou nos hábitos japoneses. As principais mercadorias eram a
seda crua e tecidos de seda da China, que só podiam ser adquiridos pelas classes ricas.
O elemento mais importante é o facto de descobrir aos olhos dos Japoneses o
mundo desconhecido dos Europeus. O disporem de uma técnica desenvolvida, que se
mostrava nas armas de fogo e nos poderosos navios, impressionou os Nipónicos
profundamente. Curiosos e abertos como são ao estrangeiro, depressa esta admiração se
traduziu em imitação. Tornou-se moda entre os nobres japoneses imitar tudo o que era
português. Nos vestuários, os nobres confundiam-se por vezes com os Portugueses. Os
mais entusiastas chegavam a trazer ao peito oito rosários e crucifixos. A moda atingiu
até Hideyoshi e o seu sobrinho, pois era por amor à moda, e não por convicção
religiosa, que estes ornamentos eram usados.
A língua portuguesa foi sendo progressivamente estudada pelos Japoneses e
tornou-se língua franca no Japão. Um erudito japonês, segundo Costa Carneiro,
recolheu quatro mil palavras, umas ainda em uso, outras não, de origem ou influência
portuguesa1 . Este número deve ser exagerado.
O governador de Nagasáqui mantinha intérpretes de português nas repartições que
tratavam de negócios com a feitoria portuguesa. Estes intérpretes foram mantidos
mesmo depois de terminado o comércio com Portugal. A pouco e pouco, o português foi
substituído pelo holandês. Nas escolas europeias que se abriram em Yokohama, em
1862, e Nagasáqui, no ano seguinte, para o ensino de línguas europeias, o português não
figura.
Os estudos de língua japonesa feitos pelos jesuítas portugueses, há três séculos e
meio, além de serem os primeiros, mantêm ainda valor, e continuam sendo utilizados
pelos modernos estudiosos. O dicionário Japonês-Português (Vocabulario da Lingoa de
Japam com a Declaração em Português) elaborado pelos jesuítas, impresso em 1603,
em Nagasáqui, foi traduzido em espanhol e publicado em Manila em 1630, e editado em
francês, em Paris, em 1868, por Léon Pages. A utilidade deste dicionário foi
reconhecida quando, em 1952, se reimprimiu em Tóquio uma edição fac-similada da de
18682. Antes, em 1595, fora impresso no Colégio de Amakusa, com os caracteres
1
Costa Carneiro, Notas sobre a Iconografia dos Portugueses no Japão.
2 Sobre o Vocabulario acaba de sair um estudo intitulado Caceria de Refranes en el Vocabulario da
Lingoa de Japam, pelo professor da Universidade de Osaca, J. Alvarez-Taladriz, publicado em separata
dos Monumenta Nipponica (Sophia University, Tóquio, 1954).
móveis de imprensa trazidos da Europa pelo padre Alexandre Valigniano, o
Dictionarium Latino-Lusitanicum ac Japonicum. A Arte da Língua do Japão, composta
pelo padre João Rodrigues, publicada em Nagasáqui, em 1604, em três volumes, está
hoje a servir de base de investigação a uma comissão de gramáticos japoneses para o
estudo histórico da formação e da pronúncia da língua japonesa.
O dicionário de Rodrigues foi depois traduzido em francês. Deste dicionário, que
continha cerca de 30 000 palavras japonesas, extraiu o autor um resumo, que quis
publicar, sem sucesso, em Macau. O seu manuscrito só chegou a ser publicado em 1825,
pela Sociedade Asiática de Paris, que deu uma tradução dela, com um prefácio do
famoso sinólogo Kensett. No ano seguinte a mesma sociedade fez dela uma nova
publicação, editada pelo Barão Humboldt.
A Historia de Japam, do padre Luís Fróis, tem sido a base de todos os estudos
históricos sobre as primeiras relações do Japão com o Ocidente3 . A veracidade dos
relatos do padre Fróis é reconhecida pelos historiadores japoneses de hoje. Diz dele o
professor Saburo Minakawa, da Universidade de Kanagawa: «Nos seus relatos do
Japão, o autor revela um estrito sentimento de justiça, uma vontade que não dobra, um
alto sense of humour, centelhas de piedade e de sentimento de humanidade, e mesmo
lágrimas. Os seus escritos são demasiado realistas para obra histórica e demasiado
exactos para contos, embora tenhamos de admitir que são extremamente interessantes
mesmo como histórias (Christian Teaching and English Education in Early Japan, p.
21).
Algumas obras de valioso interesse histórico estão ainda por publicar. A primeira
parte desta História do Japão e a História da Igreja do Japão (1620-33), de João
Rodrigues, chamado pelos Japoneses Tsuzzu (Intérprete), esperam ainda em manuscrito
que um interesse maior pelos assuntos comuns da cultura luso-nipónica os faça
3
Padre Luís de Fróis, Segunda Parte de Historia de Japam, Capítulos I a XLIII, editada e anotada por
João do Amaral Abranches Pinto e Yoshitomo Okamoto, Tóquio, 1938. As primeiras obras de literatura
europeia impressas no Japão foram as Fábulas de Esopo, traduzidas e impressas em caracteres latinos,
pelos missionários, em 1593, no Colégio de Amakusa, e a tradução japonesa, em letras latinas, do
Contemptus Mundi de Thomas de Kempis, impressa em 1596.
imprimir4. É enorme a sua riqueza de material histórico e até de observações de
costumes, da psicologia e da sociedade japonesa. Algumas considerações sobre a
mulher japonesa, do último, surpreendem pela precisão e minúcia, para não dizer pela
atenção e perspicácia, com que os olhos do jesuíta seguiram o labirinto de pequeninas
emoções das delicadas onna e musumés do seu tempo. De ambos estes manuscritos
preparou o professor Abranches Pinto uma edição, que oxalá a inteligência das
entidades competentes o ajude a lançar à luz.
As cartas dos jesuítas já publicadas fornecem também abundante material acerca do
Japão desta época e as actividades e surpresas dos primeiros estrangeiros. Sobre o Japão
escreveu ainda Fernão Mendes Pinto, embora com menos conhecimento do que da
China.
É surpreendente notar como todos estes escritores, que falam com conhecimento
directo, gostaram do Japão e dos Japoneses. É só mais tarde que, como na Ásia Sínica e
Japónica (1745), do arrábido José de Jesus Maria (Livro VII), encontramos antipatia
pelo Japão – talvez porque o autor nunca lá esteve.
O valor das obras sobre os contactos dos primeiros Portugueses com os Japoneses é
excepcional, sobretudo considerando que os escritos japoneses do tempo foram
destruídos pela onda de perseguições contra os cristãos e supressão de todos os vestígios
da evangelização.
Os primeiros contactos com os Portugueses também se imprimiram na arte
japonesa, sobretudo na pintura. Raros, e por isso hoje valendo milhões de ienes, são os
biombos namban, em que entram marinheiros e jesuítas portugueses e atingem por
vezes uma alta beleza, na composição harmoniosa, na finura do desenho e na
originalidade decorativa das cores sobre fundos de ouro.
Os elementos referidos mostram o considerável grau de penetração do contacto
português no Japão, e a importante herança existente à data da abertura das relações
diplomáticas entre os dois países, na segunda metade do século XIX. Nenhum dos
países europeus, com excepção da Holanda, podia orgulhar-se então de semelhantes
4 A primeira
parte da História de Fróis foi publicada em alemão por G. Sehurhammer (Leipzig, 1926).
Está preparada a edição portuguesa pelos professores Abranches Pinto e Yoshitomo Okamoto das partes
terceira e quarta. Bom seria que alguma instituição portuguesa promovesse a publicação.
Da História de Rodrigues extraiu recentemente o Prof. L. Alvarez-Taladriz alguns capítulos, que
formaram um inteiro livro sobre a cerimónia do chá, que dá traduzidos em espanhol – Arte del Cha –,
proficientemente anotados (Sophia University, Tóquio, 1954).
realizações. Porém, infelizmente, daqui em diante, enquanto a influência de todos os
outros países da Europa foi aumentando por uma política atenta e expansiva, a
portuguesa foi diminuindo.
Na lembrança dos Japoneses, a memória do contacto com os Portugueses é ainda
viva. Mas falta dar-se-lhe uma orientação e um sentido político que aproveitem ao
aumento do nosso prestígio no Japão. Em Tanegashima foi erigido pela Sociedade LusoJaponesa, em 27 de Fevereiro de 1927, um monumento comemorativo da chegada dos
Portugueses. A inauguração foi feita pelo então ministro português Costa Carneiro, à
disposição do qual o Governo japonês pôs um destroyer que o levou de Kagoshima a
Tanegashima.
A Sociedade Luso-Japonesa, que publicava um Boletim (no qual Costa Carneiro
escreveu, em 1929, o mais completo estudo sobre a Iconografia dos Portugueses no
Japão nos Séculos XVI e XVII), deixou de existir durante a última guerra, e aguarda a
iniciativa meritória de quem a ressuscite.
As modernas relações literárias entre Portugal e o Japão são breves.
Da literatura japonesa estão traduzidos para português por Minoru Izawa O Amor É
uma Doença, de Kan Kikuchi, e Oguim, de Rinosuke Akutagawa, ambos grandes
escritores modernos. Nami-ko, de Kenjiro Tokutomi, está traduzido por Couto Nogueira.
Do famoso episódio dos 47 ronins, traduziu Ribeiro de Carvalho, do francês, o livro de
Tamenaga Shunsui sob o título Os 47 Capitães 5. De Nagayo Yoshiro foi publicado no
Brasil o romance A Imagem de Bronze, traduzido por Zenai de Andrea. Há vários contos
japoneses traduzidos por Luís António Pimentel, em edição ilustrada, e por J. E.
Campos, estes ilustrados também e sobre papel de arroz.
Moraes dá-nos, dispersas por vários livros, traduções de trechos e de poesias curtas.
Da literatura portuguesa também pouco há traduzido para o japonês. Quase todas as
obras de Moraes foram traduzidas por Tomizo Hanano: O Bon-Odori em Tokushima,
sob o título Tokushima no Bon Odori (Tóquio, 1935), Serões no Japão, sob o título
Nihon Yobanashi (Tóquio, 1936), O-Yoné e Ko-Haru, sob o título O-Yone to Koharu
(Tóquio, 1936), Traços do Extremo Oriente, sob o título Kyokuto Yuki (Tóquio, 1941),
5 Esta referência foi-me bondosamente dada pelo autor de Japão através da sua Literatura e o Japão
na História, na Literatura e na Lenda, César dos Santos. Neste último livro encontra-se também citada
numerosa bibliografia não literária, publicada em Portugal e no Brasil.
Relance da História do Japão, sob o título Moraes Nihon Rekishi (Tóquio, 1942), Dai
Nippon (Tóquio, 1942) e Relance da Alma Japonesa (Nihon Seishin) em 1944 e
reeditada em 1954. Esta é seguida de um posfácio sobre «A Vida de Moraes» («Moraes
no Shogai»).
Hanano escreveu também uma biografia de Wenceslau de Moraes, intitulada
Nihonjin Moraesu (O Japonês Moraes), em 1940.
O Amor de Perdição, de Camilo, foi traduzido por Takahashi em 1947, a partir da
tradução espanhola.
As Cartas de Amor de Soror Mariana, às quais a língua francesa emprestou a
universalidade de que gozam, foram traduzidas em 1934, da tradução inglesa de
Prestage, por Haruo Sato e reeditadas em 1949.
Júlio Dantas tem traduzidos em japonês: Como Elas Amam, por Kazuo Seki, sob o
título do primeiro conto do livro, «Noite de Núpcias», e o episódio dramático 1023.
Foram naturalmente traduzidos trechos e documentos históricos importantes nos
estudos das relações entre os dois países 6.
As obras de Wenceslau de Moraes deram mais um passo para a compreensão lusonipónica. Desta vez foi, porém, o Japão que veio a Portugal desvendado nas cartas e
descrições deste admirável conversador. Os estudos críticos ou doutrinários de Moraes
sobre a literatura, a filosofia e a religião japonesas carecem de profundidade, de cultura
e de séria análise. Maior pensamento e observação possuem os de Lafcadio Hearn, que
hoje estão longe de satisfazer a crítica dos especialistas que iniciaram o estudo objectivo
e científico do Japão a seguir à descoberta dos escritores exoticistas. Wenceslau é porém
admirável na descrição do pitoresco, do drama delicado e colorido da vida japonesa.
Trouxe, pela primeira vez, a pintura viva, exótica, cintilante de cor e de sonho, do
feiticeiro Japão, à massa dos leitores portugueses. As descrições dos viajantes, dos
aventureiros e dos observadores jesuítas nunca passaram além de um pequeno núcleo de
eruditos e estudiosos. Mesmo a Peregrinação, de Mendes Pinto, não sai hoje do
conhecimento de um restrito círculo culto. Porém, num tempo em que os mistérios do
6
Dos Lusíadas, traduzidos em quase todas as línguas, não há tradução publicada em japonês. Posso
no entanto informar, a quem este conhecimento interesse, que o Prof. Hoshi Makoto, da Escola de
Línguas Estrangeiras de Tóquio, fez uma tradução completa do poema, com notas, que, porém, ainda não
encontrou editor. Nas histórias e aventuras acerca do guerreiro Yuriwaka, que datam do século XVII, têmse visto influências tanto da Odisseia como dos Lusíadas. Foi também feita tradução para japonês de
Emigrantes, de Ferreira de Castro, a qual nunca chegou a ser publicada.
Oriente e em particular o pitoresco delicado e invulgar do Japão faziam moda nos
círculos literários da Europa, os escritos de Wenceslau, demais espalhados pelos jornais,
encontraram rapidamente um largo interesse. A facilidade deste êxito veio-lhes ainda da
facilidade do tratamento dos assuntos. Wenceslau é um sonhador encantado,
completamente feliz no mundo dos seus sonhos. A sua pena aquece com entusiasmo e
luz tudo o que toca, porque se alimenta de um amor intenso: Moraes ama o Japão, o seu
povo, a vida e os costumes invulgares, o pitoresco e o inesperado que está em todos os
actos de uma sociedade que convive, come, sonha, diverte-se, adora os deuses, por
regras e maneiras completamente outras. E sobretudo ama a mulher japonesa,
infinitamente gentil, amorosa e delicada, nos seus vestidos exóticos, nos seus olhos
estreitos e impenetráveis, nos seus pequeninos caprichos e meneios, que lhe dão uma
gama imensa de nuances e encantos nessa escala de feminilidade que vai da ternura
frágil da criança à madurez desejosa da mulher. Wenceslau tem um coração grande e
quente. É o último dessa geração lusa de aventureiros amorosos que a carícia das
mulheres deixou espalhados pelas longes praias exóticas, o coração a gozar e a rasgar-se
entre a saudade da pátria perdida, que não voltarão a ver mais, e os abraços cujo calor
consola a carne, adormece a vontade e inspira sonho.
Estes caracteres do homem estão reproduzidos nos livros. São livros dum emotivo,
dum amador impulsivo da cor viva, do espectáculo invulgar, que se delicia e se dá todo
à emoção de gozar o que sente e vê. A exaltação emotiva não lhe permite a calma
necessária ao espírito crítico. Os seus juízos não possuem a qualidade lógica dos de
Lafcadio Hearn. Enquanto que Hearn estudou seriamente a literatura e a filosofia
nipónicas, Moraes nunca passou, neste campo, dum curioso observador do folclore e
interessado leitor de textos isolados. Basta ler as suas traduções de haikai, talvez a mais
filosófica e dificilmente concentrada forma de poesia que existe, para nos convencermos
de quão longe Wenceslau ficou de lhe apreender o espírito sequer. O haikai é difícil,
concentrado, ultra-elaborado, dum simbolismo e poder de evocação impressivos,
subtilíssimos. Comparem-se as suas redondilhas ingénuas, numa simples e banal toada
popular, com os haikai de Ezra Pound e do mexicano José Tablada. A arte mereceu-lhe
divagações superficiais, e o teatro japonês, um dos mais belos e refinados do mundo,
provoca-lhe umas poucas frases incompreensivas de espectador obtuso e provinciano.
Wenceslau é um contador de impressões e não um intelectual cuja mentalidade penetre
o fundo dos assuntos, encadeie as causas e ligações, procure o sentido filosófico,
histórico ou social deles. Como contador é admirável, e a imagem de impressões que
nos dá do Japão é colorista, folclórica e muito humana7.
Com estas limitações e grandezas, Wenceslau de Moraes é um laço valioso nas
relações entre Portugal e o Japão. Não só nós, mas também os Japoneses veneram a sua
memória. O recheio da casa de Moraes tornara-se mais um marco da presença
portuguesa no Japão. Fora instalado no museu da cidade de Tokushima, que ali
conservava os seus manuscritos e o ambiente em que ele vivia. Infelizmente, a guerra
tudo destruiu e queimou, ficando apenas o túmulo, que a municipalidade de Tokushima
tomou a seu cuidado. Em 1 de Julho de 1954, Tokushima erigiu-lhe um belo
monumento na sua avenida principal.
Os sinais da vitalidade da influência portuguesa no Japão surgem ainda hoje
espontâneos. Uma amostra é, por exemplo, a iniciativa das escolas de Tanegashima de
enviar, em 1952, desenhos dos seus alunos, e livros escolares, aos estudantes
portugueses, que lhes retribuíram com o artístico modelo duma caravela.
Nos enormes anúncios de lápis e fogos de artifício, às vezes vê-se mencionado que
foram introduzidos no Japão pelos Portugueses.
Um dia, numa loja pobre de bugigangas para turistas, na ilha de Kiushu, onde as
naus portuguesas costumavam aportar, dei com os olhos no modelo duma velha
caravela, coberta de pó, num canto escuro. Exclamei imediatamente: «É uma nau
portuguesa!» Ninguém me soube explicar donde viera. Depois de a examinar, descobri
no alto do mastro, suja e delida, uma velha bandeira portuguesa.
Os restaurantes de Nagasáqui, em Tóquio, têm à porta, por símbolo, na cortina
exterior, uma caravela portuguesa.
O Japonês é um indivíduo em quem o forte sentido positivo e prático – que o levou
à formação duma imensa e progressiva indústria – se casa com a tendência para a
contemplação vaga e serena, que o leva ao amor da arte, tanto nas suas formas
modernas como nas subsistentes formas clássicas, e a viver o passado com uma presente
intensidade como nenhum outro povo vive. Não tomaria assim muito esforço reviver as
tradições duma velha experiência comum. No mundo de hoje parece anacrónico
7
Desenvolvo estes temas da poesia e do drama japonês nos livros Nô e Caminhos da Terra Florida.
desenterrar velhas ossadas da história e pretender animá-las e trazê-las à luz dissecativa
do nosso tempo. Mas não se trata de clamar sonoras vanglórias, hoje sem uso nem
sentido, mas de procurar aproveitar o que ainda é vivo nos sedimentos que ficaram
duma experiência ultrapassada, para os usar criteriosamente numa política utilitária de
prestígio nacional e trocas do comércio.
NOTA BIBLIOGRÁFICA
João Rodrigues (chamado pelos Japoneses «Tsuzzu»), História da Igreja do Japão
(1620-1633), códice 49-IV-53 da Biblioteca da Ajuda.
Edição preparada, e ainda inédita, do professor Abranches Pinto. Alguns capítulos
ainda encantam pela descrição minuciosa e viva dos costumes japoneses, com tanta cor
e um olho mais crítico do que o de Wenceslau de Moraes.
—— Éléments de grammaire japonaise..., traduzido do Português a partir dos
Manuscritos da Biblioteca do Rei, e cuidadosamente comparados com a gramática
publicada pelo mesmo autor em Nagasáqui, em 1604, por M. C. Landresse, Paris, 1825.
O mesmo Landresse deu ainda, traduzido de João Rodrigues, o Supplément à la
grammaire japonaise; ou Remarques aditionelles sur quelques points du système
grammatical des Japonais, retirados da gramática composta em espanhol pelo P.e
Oyanguren, e traduzidos por M. C. Landresse, Paris, 1825.
José da Costa Carneiro, «Notas sobre a Iconografia dos Portugueses no Japão nos
Séculos XVI e XVII», in Boletim da Sociedade Luso-Japonesa, Tóquio, 1929.
Saburo Minakawa, Christian Teaching and English Education in Early Japan,
Gakuseisha, Tóquio, 1953.
Jordão A. de Freitas, Subsídios para a Bibliografia Portuguesa Relativa ao Estudo
da Língua Japonesa e para a Biografia de Fernão Mendes Pinto, Coimbra, Imprensa da
Universidade, 1905.
George Sansom, Japan in World History, Institute of Pacific Relations, Nova
Iorque, 1951.
Yoshitomo Okamoto, Outline of Namban Art, Kirishitan Bunkwa Kenkyu Kwai –
Instituto da Antiga Cultura Cristã Japonesa, Tóquio, 1949.
Tokutaro Nagami, The Complete Collection of the Namban Screens, Kogeisha,
1930, Tóquio.
Maurice Prunier, Des Peintures à Fouler aux Pieds, Maison Franco-Japonaise,
Tóquio.
Relação das grandes alterações e mudanças que houve em os reinos de Japão nos
anos de 87 e 88. E da perseguição que Rey de Todo o Japão levantou contra a
cristandade. E da grânde Fé e Constancia dos Cristãos, enviada ao muito reverendo
Padre Geral da Companhia de Jesus pelo Padre Organtino da mesma Companhia,
impresso em Coimbra por António de Barreira, impressor da Universidade, 1590.
É interessante nas descrições das guerras civis e intrigas entre os dáimios.
Documenta instrutivamente a repentina mudança de Hideyoshi para com os cristãos,
acusando os padres de recrutarem os convertidos entre «gente baixa», com o objectivo
de os revoltarem contra os seus senhores e os seus deuses («kamis»).
Uma relação extensa das cartas quer impressas, quer manuscritas, vem na
publicação da Kirishitan Bunkwa Kenkyu Kwai, Letters of the Society of Jesus, por
Yoshitomo Okamoto, Tóquio, 1949. O mesmo instituto publicou Chronology of
Kirishitan Early Christian Era in Japan, Tóquio, 1949.
CAPÍTULO QUATRO
EXPANSÃO CULTURAL DOS PAÍSES OCIDENTAIS
DEPOIS DA ÚLTIMA GUERRA
Agora que falámos na influência portuguesa no Japão, mencionemos rapidamente a
dos principais países europeus e dos Estados Unidos.
Uma obra notável de reavivamento e de estudo dos vestígios do cristianismo está a
ser empreendida por padres estrangeiros, ajudados por instituições católicas japonesas.
Foi descoberta há dois anos na cidade de Morioka e arredores, ao norte da ilha de
Honshu, a existência duma comunidade cristã relativamente numerosa, com
interessantes ritos secretos, para defesa das perseguições e martírios, de que os túmulos
encontrados dão fé. Segundo um padre belga, com quem falei, deve ter havido ali
padres portugueses.
Por outro lado, missionários de várias nacionalidades são aproveitados pelas
universidades japonesas para ensino de matérias ocidentais. Não há, porém,
portugueses. E para exemplo do inconveniente que nos traz a ausência de professores
portugueses basta ler o pequeno papel atribuído aos Portugueses numa das principais
cadeiras da Universidade Católica de Tóquio, através do livro escolar do professor
Lawrence Battistini The Background of Asia (sem mencionar os erros contidos sobre a
actual situação de Portugal no Extremo Oriente).
No campo da influência religiosa, todos os países cristãos europeus, com excepção
de Portugal e da Dinamarca, têm no Japão missionários, cujas actividades os respectivos
governos favorecem e encorajam.
Os Estados Unidos, em virtude quer da sua posição na política mundial, quer dos
seus particulares interesses no Pacífico, fizeram do Japão a pedra angular da sua política
na Ásia. As condições de desenvolvimento industrial do Japão fazem-no sobressair
entre os países tecnicamente atrasados e economicamente não desenvolvidos desta área.
A política americana tem visado: 1) aliar a si o Japão por uma estreita amizade e
cooperação. A assinatura do Tratado de Paz de S. Francisco, de 8 de Setembro de 1951,
foi a medida política de maior alcance no Extremo Oriente depois da guerra, pois retirou
o Japão às possibilidades dum entendimento com a Rússia. Os Estados Unidos
assinaram depois com aquele o Acordo de Segurança, da mesma data, que estabelece o
estacionamento de tropas americanas no território japonês, para fins de defesa; o Acordo
Administrativo de 28 de Fevereiro de 1952 regulamentou as cláusulas e medidas
daquele Acordo. Por fim, um Tratado de Amizade, Navegação e Comércio foi assinado
em 2 de Abril de 1953. 2) A esta política americana de estreitamento de amizade está
interligada a de fortalecer o Japão, económica e militarmente, não só para subtraí-lo aos
riscos duma penetração comunista, mas também para fazer dele o bastião anticomunista
no Extremo Oriente; a este fim visa o Acordo de Auxílio e Segurança Mútua (MSA)
entre os dois países. 3) Ao mesmo tempo, os Estados Unidos, por meio das suas
numerosas agências e autoridades estacionadas no Japão, e através da troca de
professores e intelectuais, exposições, concessão de bolsas de estudo, envio de
companhias artísticas, e por todos os outros numerosos meios que a publicidade
americana conhece e inventa, estão a fazer uma larga política de prestígio e expansão da
cultura americana no Japão. As festas do centenário da chegada do Comodoro Perry a
Shimoda utilizaram uma enorme publicidade para proclamar a antiguidade das relações
nipo-americanas. Há numerosos centros culturais americanos espalhados pelo Japão,
bibliotecas e até bibliotecas «de algibeira», que se estendem frequentemente até às
pequenas cidades do interior.
A Inglaterra, consciente do lugar que perdeu depois da guerra com a ascendência
mundial dos Estados Unidos, tem procurado também ligar-se ao Japão por uma política
de amizade e fazer-se respeitar e admirar por uma acção de prestígio e de expansão
cultural. Para ambos estes fins tem aproveitado a oportunidade e influência que lhe
fornece a Casa Real. A instituição monárquica britânica dá-lhe prestígio num país tão
tradicionalmente imperial, e influência na família imperial e círculos que a rodeiam.
Está estabelecido em Tóquio um centro do British Council, com uma biblioteca e
discoteca. A Inglaterra procura, como os Estados Unidos e a França, levar ao Japão
artistas britânicos, organizar ou participar em exposições, concertos, desportos,
conceder bolsas de estudo a estudantes japoneses, convidar para visitas a Inglaterra
alguns dos maiores escritores japoneses. Entre vários outros meios, como os Estados
Unidos e a França, possui ainda o cinema que espalha o conhecimento e a curiosidade
pela vida britânica pelas mais pequenas cidades do Japão. Por meio duma política hábil
e persistente, a Inglaterra consegue manter hoje entre o povo japonês um prestígio que
já não corresponde à sua posição actual no mundo.
O mesmo pode dizer-se da França. Mercê duma política cultural de largas vistas e
bem preparada, a França é ainda hoje, no campo cultural, a maior influência ocidental
no Japão. Enquanto que a língua na esfera dos negócios é o inglês, a maior parte dos
escritores e artistas, que falam uma língua estrangeira, é ao francês que dão a sua
preferência. Para expansão da língua e da cultura francesas, o Governo francês instituiu
em Tóquio o Institut Franco-Japonais e a Maison Franco-Japonaise, com cursos de
lições, de conferências, exposições, edição de livros, biblioteca e discoteca. Além disso,
promove frequentemente a ida ao Japão de escritores, músicos, bailarinos, actores e
modelos franceses, que têm percorrido o país em conferências e espectáculos. Na festa
do filme francês foram a Tóquio «estrelas» francesas e exibiram-se diversos filmes.
Estas actividades foram regularmente estabelecidas no Acordo Cultural assinado entre a
França e o Japão, em 14 de Maio de 1933. O artigo 1.º dá ideia do largo alcance do
acordo, ao estabelecer:
a)
a circulação de todo o material cultural, especialmente livros, publicações,
filmes, discos de natureza educacional, literária, artística e científica;
b)
o envio e exibição de obras e objectos para exposições de carácter cultural;
c)
o emprego de professores, técnicos, educadores e cientistas, por universidades,
laboratórios e outros órgãos de educação, estudo e investigação;
d)
o desenvolvimento ou fundação de cadeiras, cursos e conferências, em
universidades e outros estabelecimentos, tratando da língua, literatura, arte,
arqueologia e instituições de cada uma das partes;
e)
disposição de bolsas de estudo;
f)
troca de emissões radiofónicas de carácter cultural;
g)
trocas respeitantes a teatro e música.
Duas comissões mistas serão estabelecidas para assegurar a realização destes fins.
Evidentemente que o acordo, no fundo, torna-se um meio de a França alargar no
Japão a sua influência cultural e o seu prestígio, intensificando e organizando, num
plano orientado, os esforços e realizações que até aqui já eram notáveis.
A Holanda, no seguimento dum programa histórico ininterrupto, aproveita todas as
oportunidades para avivar e desenvolver a sua influência histórica e cultural no Japão.
Têm-se feito exposições de arte, como a exposição de gravuras holandesas exibidas
em Kamakura e outras cidades do Japão. Anuncia-se que os quadros de Van Gogh farão
em breve a peregrinação dos museus japoneses. Os Holandeses não perdem uma
oportunidade de marcar a presença da Holanda, tanto em comemorações evocativas da
acção histórica dos países do Ocidente no Japão como em mostrar as modernas
realizações da cultura holandesa.
Entre a Itália e o Japão foi assinado um acordo cultural aos 31 de Julho de 1954. O
acordo, numa lição breve, institui uma comissão de cada país para o planeamento das
actividades culturais do ano. Compreende a troca de visitas de artistas, exposições,
livros e bolsas de estudo. Fez-se há pouco o festival do filme italiano, em Tóquio. Neste
momento o Governo italiano concede três bolsas de estudo a japoneses; artistas italianos
têm vindo ao Japão ou participado em exposições. O Instituto Italiano, que existia antes
da guerra, vai ser reposto a funcionar. Disposições semelhantes àquele acordo contém o
acordo cultural com o México, assinado em 25 de Outubro de 1954.
A Espanha não tem descurado também a expansão do seu nome, da sua cultura e o
prestígio no Japão. A Espanha tem dado especial atenção à propaganda religiosa. O
Catholic Directory for Japan 1953 indica em Novembro de 1952 o número de 47
padres, 15 irmãos leigos e 129 freiras espanholas. Embora os padres sejam
independentes na sua actividade religiosa, o Governo espanhol tem feito contribuições
para a construção de novas igrejas e reparação de antigas. No campo da cultura,
organizou uma biblioteca espanhola em Tóquio, que funciona na Embaixada, com
milhares de livros de literatura, história, ciência, etc. A Universidade Católica de Tóquio
possui uma boa secção de livros espanhóis, além duma cadeira de língua espanhola.
Publica-se em Osaca um jornal quinzenal em espanhol – Japón Comercial.
Todos estes países promoveram o aparecimento no Japão de sociedades culturais e
de boa vontade, tais como várias nipo-americanas, algumas anglo-nipónicas, hispanojaponesas, francesas e holandesas.
À influência da cultura em língua portuguesa, devemos reconhecer com justiça,
tem dado mais largueza o Brasil que Portugal. Em virtude da atracção da emigração
japonesa para o Brasil e da existência de duzentos mil japoneses neste país, o Brasil é
muito conhecido no Japão e goza de larga voga e simpatia na imprensa nipónica. Além
disso, existe uma valiosa corrente comercial entre os dois países. A propaganda
brasileira tem seguido também a orientação de tornar conhecidas no Japão a cultura, a
história e a literatura brasileiras, pela distribuição a bibliotecas e professores de livros
como a fundamental A Cultura Brasileira, de Fernando de Azevedo, e os romances,
traduzidos em belas edições inglesas, de Machado de Assis, Erico Veríssimo, Lins de
Rego e outras obras importantes da cultura brasileira.
Em 1940 foi assinado entre o Brasil e o Japão um acordo cultural para
desenvolvimento das relações culturais entre os dois países «por intermédio da ciência,
das belas-artes, da música, da literatura, do teatro, da cinematografia, da fotografia, da
radiodifusão e do desporto». Funciona em Kobe um Centro Brasileiro de Língua e de
Cultura, com o objecto, diz um relato de jornal, de «divulgar o idioma falado no Brasil e
alargar o conhecimento da vida brasileira». O Centro, patrocinado pela Câmara de
Comércio e Indústria de Kobe, dá gratuitamente um curso de português. O Consulado
Geral do Brasil em Kobe põe à disposição do Centro uma biblioteca e discoteca. Em
Tóquio existe um Clube Luso-Brasileiro, mantido por iniciativa dum cidadão brasileiro,
onde se dão aulas de português.
A língua portuguesa é oficialmente ensinada no Japão nas universidades de línguas
estrangeiras e na Universidade de Takushoku, ambas de Tóquio, e nas universidades de
Osaca e de Tenri, em Nara.
NOTA BIBLIOGRÁFICA
Edwin Reischauer, The United States and Japan (Harvard University Press,
Cambridge, 1951).
Elizabeth Gray Vining, Windows for the Crown Prince (Lippincott, Filadélfia,
1952).
CAPÍTULO QUINTO
PERSPECTIVAS FUTURAS
Vimos, sumariamente, o seguimento das relações entre Portugal e o Japão e
mencionaram-se alguns actos que, mesmo no período anormal em que entre os dois
países não existiam missões diplomáticas, traduzem boa vontade e o prolongamento
duma velha tradição de convívio cultural.
Esperemos que, agora que as relações estão normalizadas, os contactos lusonipónicos se desenvolvam.
Na base há que pôr a consideração preliminar de que nos contactos do Ocidente
com o Japão este país tem recebido mais do que tem dado à cultura ocidental. É o que se
tem chamado a «ocidentalização» do Japão.
Como vimos atrás, a principal e mais funda influência portuguesa no Japão é a
cristianização. E é através desta que os demais países ocidentais têm procurado
aprofundar a sua influência. Afigura-se, pois, estaria indicado fazer ir para o Japão
alguns missionários portugueses que ali, com a doutrina, reavivassem as tradições, e
mais espalhassem o nome português. Seria uma medida, certamente frutuosa, de sensata
política e positiva conveniência, independentemente de razões de confissão religiosa. A
política religiosa realizada pela Espanha e pela França, no Japão, nestes últimos anos,
tem ali engrandecido os seus nomes e prestígio.
Na China temos mantido a missão de Shiu Hing, fundada pelos jesuítas, em 1583,
que passou em 1848 para a jurisdição das Missões Estrangeiras de Paris, e de novo foi
reincorporada na Diocese de Macau pelo acordo de 1903, só executado cinco anos mais
tarde. A existência de Macau manteve a continuação da influência religiosa e cultural na
China, enquanto que no Japão a expulsão decretada pelos Tokugawa extinguiu para
sempre os focos idênticos que ali possuíamos.
No terreno puramente da cultura, devemos atender a que existem no Japão alguns
estudiosos, isolados e sem qualquer incentivo ou apoio, das relações históricas lusojaponesas. Alguns deles dedicaram completamente a sua vida, sem proveito e sem
glória, a estes estudos. Pareceria natural que as instituições portuguesas de cultura os
auxiliassem e animassem. O fruto das investigações de certos deles continua inédito,
apesar do valor que possuem para nós, preenchendo lacunas na nossa ciência histórica.
Tal encorajamento deveria não ficar por aqui. Conviria apoiar os novos que
mostrassem preferência por este ramo de estudos, desenvolvendo-lhes o interesse por
eles e por Portugal. De entre os estudantes de português das escolas oficiais em que a
nossa língua se ensina no Japão, alguns alunos têm aparecido com gosto por tais
estudos. O mais notável que, por essa via, veio à erudição, foi o Sr. Yoshitomo
Okamoto, conhecido por todos no mundo destes assuntos e a quem Boxer presta
homenagem dedicando-lhe um dos seus últimos livros. Mas se este se salvou devido à
sua tenacidade, paixão de estudioso e completa isenção material, vários outros se
perderam por falta de apoio e de futuro em tais actividades. Por outro lado, a própria
natureza dos estudos luso-nipónicos não pode deixar de ser incompleta, tal como tem
sido feita, pela consulta e investigação de documentos separadamente em Portugal e no
Japão. O que há a fazer é criar bolsas de estudo e favor dos estudantes japoneses que se
distingam nestes estudos, para que possam vir a Portugal consultar as fontes
portuguesas, e depois, de regresso ao Japão, em escritos e conferências possam, com
conhecimento, falar de Portugal e da sua cultura. Também não seria de mais que
estabelecêssemos alguns prémios para os melhores estudantes de língua portuguesa, à
semelhança do que fazem outros países. Há que registar que todos os países ocidentais
estão a desenvolver neste campo grande actividade, sobretudo depois da última guerra.
O melhor meio de estabelecer uma base de estudos e de desenvolvimento dos
interesses culturais portugueses no Japão, seria por um acordo cultural. Nele poderia
estabelecer-se, quanto à expansão do estudo da língua portuguesa (o que viria aumentar
os frutos, a este respeito procurados, pelo acordo referido nipo-brasileiro), fomento dos
estudos históricos luso-nipónicos e auxílio da investigação, bolsas de estudo,
organização ou participação em exposições, exibição de filmes, etc.
A negociação de um tratado de comércio, navegação e amizade entre os dois
países, na tradição do de 1897, teria reflexos no campo cultural, pelo aumento de
contacto, divulgação de produtos e de costumes, e pela relacionação de pessoas. Depois
dele certamente se pode esperar o ressurgimento da Associação Luso-Japonesa, que tão
meritórias actividades desenvolveu antes da guerra, por meio de conferências e
publicação de livros, alguns deles de alto valor e ousado empreendimento, como a
Historia de Japam, de Luís Fróis.
Com estas considerações quis-se apenas mostrar o largo campo aberto à expansão
da cultura e influência portuguesas, para proveito da amizade entre os dois países e do
aumento das tradições comuns de cultura acumulada no Japão durante tantos séculos,
pelo país que lhe revelou e o revelou ao Ocidente.
Nestas bases afigura-se-me que deve ser planeada uma política portuguesa que,
verificando objectivamente o valor actual e previsivelmente futuro do Japão, no plano
da política mundial e no plano das possíveis vantagens para Portugal, vise
fundamentalmente: 1) consolidar no Japão uma posição compatível como o lugar
histórico que ocupa na tradição e na cultura japonesas e procurar reencontrar a
continuidade desta linha histórica, utilizando-a para o alargamento do nome e prestígio
portugueses; 2) construir as bases duma política objectiva que tome em conta a singular
importância do Japão no panorama político da Ásia e explorar as possibilidades que
oferece para o intercâmbio comercial entre os dois países, especialmente para a troca
das nossas matérias-primas ultramarinas por máquinas e produtos manufacturados
japoneses; conviria que se procurasse, de ambos os lados, estabelecer um novo Tratado
de Amizade, Navegação e Comércio, no prolongamento do espírito de amizade e
aproximação dos tratados de 1860 e 1897; 3) integrar a política para com o Japão no
plano geral dos desenvolvimentos da política portuguesa extremo-oriental.
(Portugal e o Japão, pp. 19-74)
TRATADO DE PAZ, AMIZADE E COMÉRCIO
ENTRE SUA MAJESTADE EL-REI DE PORTUGAL
E SUA MAJESTADE O IMPERADOR DO JAPÃO
Assinado em Yedo [ou Edo, hoje, Tóquio], em japonês, português e holandês, no
dia 3 de Agosto de 1860. Ratificações trocadas em Yedo, no dia 8 de Abril de 1862.
Sua Majestade El-Rei de Portugal e Sua Majestade o Imperador do Japão,
desejando estabelecer entre os dois países relações de permanente amizade, e facilitar o
comércio entre os seus respectivos súbditos, e tendo para esse fim resolvido celebrar um
tratado de paz, amizade e comércio, nomearam como seus Plenipotenciários, a saber:
Sua Majestade El-Rei de Portugal, a Isidoro Francisco Guimarães, do Conselho de
Sua Majestade, Governador de Macau, Plenipotenciário de Portugal na China,
Comendador das Ordens de São Bento de Avis, de Nossa Senhora da Conceição, de
Carlos III de Espanha, do Elefante de Sião, Oficial da Muito Antiga e Nobre Ordem da
Torre e Espada, Cavalheiro de Cristo, Capitão-de-Mar-e-Guerra da Armada Real, etc.,
etc.
E Sua Majestade o Imperador do Japão, a Midzogoetsi Sanoekino Kami, Sakai
Okino Kami, e Matsdaira Dzirobe: os quais, depois de terem apresentado os seus plenos
poderes, que se acharam em boa e devida forma, concordaram nos artigos seguintes:
I
Haverá perpétua paz e amizade entre Sua Majestade Fidelíssima o Rei de Portugal,
seus herdeiros e sucessores, e Sua Majestade o Imperador do Japão, bem como entre os
seus respectivos domínios e súbditos.
II
Sua Majestade o Rei de Portugal poderá nomear um agente diplomático para residir
na cidade de Yedo, bem como cônsules, ou agentes consulares, para qualquer ou todos
os portos do Japão, que pelo presente Tratado se abram ao comércio português. O
agente diplomático, ou cônsul-geral de Portugal, no Japão, terá o direito de viajar
livremente por qualquer parte do Império do Japão.
Sua Majestade o Imperador do Japão poderá nomear um agente diplomático para
residir em Lisboa, e cônsules, ou agentes consulares, para qualquer ou todos os portos
de Portugal.
III
Os portos e cidades de Hakodate, Kanagawa e Nagasáqui serão abertos aos
súbditos portugueses no dia 1 de Outubro de mil, oitocentos e sessenta. Em adição a
estes, serão abertos os seguintes portos e cidades, nas datas abaixo especificadas:
Nigata, ou se Nigata não servir como porto, outro porto na costa ocidental de
Nipon; logo que tal porto for escolhido, se dará conhecimento.
Hiogo, que será aberto no primeiro de Janeiro de mil oitocentos e sessenta e três.
Em todos os portos e cidades acima mencionados terão direito de arrendar e aforar
terrenos, comprar edifícios neles situados, construir casas, ou armazéns; porém,
nenhuma fortificação ou lugar de força militar se poderá levantar sob pretexto de
construir casas ou armazéns; e, para vigiar pela execução deste artigo, têm as
autoridades japonesas o direito de inspeccionar qualquer construção que os súbditos
portugueses fizerem, alterarem ou repararem.
O lugar onde os súbditos portugueses houverem de construir os seus edifícios, bem
como os Regulamentos dos Portos, serão escolhidos e feitos pelo Cônsul português e
pelas autoridades japonesas locais; e se não puderem vir a um acordo sobre estes
assuntos, serão referidos ao Agente Diplomático, que os regulará com o Governo
japonês. Nenhuma grade, muralha, ou coisa que possa impedir a entrada e saída, será
levantada, pela autoridade japonesa, em torno do lugar onde residirem os Portugueses.
Os súbditos portugueses terão a faculdade de ir aonde lhes aprouver nos portos e
cidades do Japão abertos ao comércio, dentro dos limites seguintes:
Em Kanagawa até ao rio Logo (que entra na baía de Yedo, entre Kawasaki e
Sinagawa); e dez ris em todas as outras direcções.
Em Hakodate, dez ris em todas as direcções.
Em Hiogo, dez ris em qualquer direcção, excepto do lado de Quioto, a cuja cidade
se não podem aproximar menos de dez ris. As guarnições dos navios portugueses que
forem a Hiogo não poderão atravessar o rio Engwa, que desemboca na baía entre Hiogo
e Osaca. As distâncias serão medidas por terra, da casa do Governo de cada um dos
portos acima mencionados, o ri sendo igual a quatro mil e duzentas e setenta e cinco
jardas inglesas.
Em Nagasáqui, poderão os súbditos portugueses ir a todos os lugares na sua
vizinhança. Os limites do porto que for aberto na casa de Nipon serão marcados pelo
Agente Diplomático português, de acordo com o Governo japonês.
Do primeiro de Janeiro de mil, oitocentos e sessenta e dois em diante, poderão os
súbditos portugueses residir na cidade de Yedo; e do primeiro de Janeiro de mil,
oitocentos e sessenta e três em diante, na cidade de Osaca, unicamente com o fim de
negociar. Em cada uma destas duas cidades, o lugar em que possam alugar casas, e as
distâncias a que possam ir, serão determinadas pelo Agente Diplomático português e
pelo Governo japonês.
IV
Todas as questões que ocorrerem entre súbditos portugueses, sejam relativas a
propriedade ou pessoa, nos domínios de Sua Majestade o Imperador, serão sujeitas à
jurisdição das autoridades portuguesas.
V
Os súbditos japoneses que foram culpados de algum crime contra súbditos
portugueses serão presos e castigados pelas autoridades japonesas, segundo as leis do
país.
Os súbditos portugueses que cometerem crime contra súbditos japoneses, ou contra
os súbditos de qualquer outro país, serão julgados e punidos pelo cônsul português, ou
outra autoridade portuguesa, conforme as leis de Portugal.
A justiça será administrada equitativa e imparcialmente, tanto pelas autoridades
portuguesas como japonesas.
VI
Quando algum súbdito português tiver de se queixar de algum japonês, dirigir-se-á
ao cônsul. O cônsul examinará o caso e fará o que estiver ao seu alcance para terminar a
questão amigavelmente. Do mesmo modo, se algum japonês tiver razão de se queixar
contra algum súbdito português, apresentar-se-á ao cônsul que deverá atendê-lo e
diligenciar para arranjar o caso amigavelmente. Se estas disputas não puderem assim ser
terminadas, o cônsul requisitará o auxílio das autoridades japonesas, para que,
examinando-as juntamente com elas, sejam decididas com equidade.
VII
Se algum súbdito japonês deixar de pagar as dívidas que tiver contraído com
súbditos portugueses, ou se fraudulentamente se esconder, as autoridades japonesas
farão o que estiver ao seu alcance para o trazer perante a autoridade e forçar ao
pagamento das duas dívidas. Do mesmo modo, se algum súbdito português se esconder,
ou deixar de pagar as dívidas em que tiver incorrido para com súbditos japoneses, as
autoridades portuguesas empregarão todos os meios ao seu alcance para descobrir e
obrigar ao pagamento das dívidas.
Nem o Governo japonês nem o Governo português são responsáveis pelo
pagamento das dívidas contraídas pelos seus respectivos súbditos.
VIII
O Governo japonês não estabelecerá restrições que estorvem o emprego de
japoneses por súbditos portugueses em serviço que não seja contrário às leis.
IX
Aos súbditos portugueses residentes no Japão é permitido o livre exercício da sua
religião, e têm o direito de construir edifícios próprios para o culto.
X
Todas as moedas estrangeiras terão curso no Japão, e passarão pelo seu
correspondente peso em moeda japonesa do mesmo metal. Tanto os súbditos
portugueses como os japoneses usarão livremente moedas estrangeiras ou japonesas nos
seus pagamentos uns aos outros. Moedas de toda a qualidade (com excepção da moeda
de cobre japonesa), bem como ouro e prata estrangeiros para cunhar, podem ser
exportados do Japão.
XI
Objectos para uso dos navios de guerra portugueses podem ser desembarcados e
armazenados nos portos de Kanagawa, Hakodate e Nagasáqui, debaixo da vigilância das
autoridades portuguesas, sem pagarem direitos; se, porém, algum destes artigos for
depois vendido no Japão, o comprador pagará às autoridades japonesas os devidos
direitos.
XII
Se algum navio português naufragar na costa do Japão, ou for obrigado a abrigar-se
nalgum dos domínios de Sua Majestade o Imperador do Japão, as autoridades
japonesas, logo que forem informadas do facto, prestar-lhe-ão todo o auxílio ao seu
alcance; as guarnições serão recebidas e tratadas amigavelmente; e, no caso de o
precisarem, serão mandadas para o consulado português mais próximo.
XIII
Qualquer navio português que chegar fora dos portos do Japão abertos ao comércio
poderá tomar piloto japonês para o conduzir para o porto.
Do mesmo modo, quando os navios tiverem satisfeito os direitos e mais obrigações
do regulamento do porto, e estiverem prontos a partir, poderão engajar piloto japonês
para os pôr fora do porto.
XIV
Nos portos do Japão abertos ao comércio têm os súbditos portugueses plena
liberdade de importarem dos seus portos, ou de outros quaisquer, de venderem e
comprarem e exportarem para os seus ou outros portos, toda a qualidade de mercadoria,
que não seja contrabando, pagando os direitos em conformidade com a tarifa anexa ao
presente Tratado, sem nenhuma outra exigência. As munições de guerra só poderão ser
vendidas ao Governo japonês, ou a estrangeiros.
Todas as fazendas poderão ser vendidas ou compradas a japoneses, sem
intervenção dos empregados do Governo japonês em tais compras e vendas nem nos
seus pagamentos; e todos os japoneses poderão comprar, vender e usar quaisquer artigos
que lhes sejam vendidos pelos portugueses.
XV
Se os empregados da alfândega não ficarem satisfeitos com o valor dado às
fazendas pelos seus donos, poderão arbitrar-lhes um outro, oferecendo-se a tomá-las por
essa avaliação; se o dono das fazendas recusar a oferta, será obrigado a pagar os direitos
conforme essa avaliação. Se a oferta for aceite pelo dono das fazendas, serão pagas
imediatamente sem desconto ou abatimento algum.
XVI
Todas as fazendas importadas no Japão por súbditos portugueses, e que tiverem
pago os direitos fixados por este Tratado, poderão ser transportadas pelos japoneses para
qualquer parte do Império, sem pagamento de nenhum tributo, licença ou direito de
trânsito.
XVII
Os portugueses que tiverem importado mercadorias nos portos do Japão abertos ao
comércio, e pago os respectivos direitos, poderão reexportá-las para outros quaisquer
portos japoneses, também abertos ao comércio, sem pagamento de nenhum direito
adicional, tendo-se munido de um certificado da autoridade da alfândega de haverem
pago os direitos devidos nesses portos.
XVIII
As autoridades japonesas, nos diferentes portos abertos ao comércio, adoptarão as
medidas que julgarem convenientes, para evitar contrabandos e fraudes.
XIX
Todas as multas e confiscações feitas a súbditos portugueses, em consequência
deste Tratado, pertencem ao Governo do Imperador do Japão.
XX
Os artigos do Regulamento do Comércio apensos a este Tratado formam parte
integrante e são obrigatórios para ambas as Altas Partes Contratantes e seus súbditos.
O Agente Diplomático português no Japão, com a pessoa ou pessoas que forem
nomeadas pelas autoridades japonesas, tem os poderes para fazer os regulamentos
necessários para pôr em execução as estipulações deste Tratado e dos artigos do
Regulamento que lhe são apensos.
XXI
Este Tratado, sendo escrito em português, japonês e holandês, e todas as versões
sendo conformes em espírito e intenção, será a holandesa considerada como a original;
porém, deve entender-se que todas as comunicações oficiais, dirigidas pelo Agente
Diplomático e pelos Cônsules portugueses, deverão ser escritas em inglês; para facilitar,
contudo, as transacções de negócios, serão, nos primeiros três anos depois da assinatura
deste Tratado, acompanhadas de uma tradução em holandês ou japonês.
(aa)
Isidoro Francisco Guimarães
Midzogoetsi Sanoekino Kami
Matsdaira Dzirobe
REGULAMENTO PARA O COMÉRCIO PORTUGUÊS NO JAPÃO
I
No espaço de quarenta e oito horas (domingos exceptuados) depois da chegada de
qualquer navio português aos portos do Japão, o Capitão, o Comandante, mostrará à
autoridade de Alfândega o recibo do cônsul, mostrando que depositou no Consulado
português os conhecimentos da carga e mais papéis, e então dará entrada do seu navio,
entregando um documento em que declare o nome do navio, o do porto donde vem, a
tonelagem, o nome do capitão, e os nomes dos passageiros (no caso de os ter), e número
de equipagem; documento que o capitão certificará ser verdadeiro e que será assinado
por ele; depositará ao mesmo tempo um manifesto por escrito da carga, notando as
marcas, o número dos pacotes e seus conteúdos, como forem descritos nos
conhecimentos, com os nomes da pessoa ou pessoas a quem são consignados. Uma
relação dos mantimentos e sobressalentes do navio deve juntar-se ao manifesto e a
correcta relação da carga e trem do navio; o capitão certificará e assiná-lo-á.
Se algum erro se descobrir no manifesto, será corrigido em vinte e quatro horas
(domingos exceptuados) sem pagamento de emolumentos; porém, se alguma alteração
ou entrada posterior no manifesto tiver lugar, depois daquele número de horas, é devido
o pagamento de quinze patacas de emolumento. Todas as fazendas que não constarem
do manifesto pagarão direitos dobrados quando forem desembarcadas.
Todo o capitão ou comandante de navio português que não ser entrada na alfândega
no tempo acima especificado pagará uma multa de sessenta patacas por cada dia que se
tiver demorado a fazê-lo.
II
O Governo japonês tem o direito de pôr oficiais de alfândega a bordo dos navios
nos seus portos (excepto em navios de guerra). Estes oficiais de alfândega devem ser
tratados com civilidade, e acomodados segundo a capacidade do navio.
Nenhuma mercadoria será desembarcada dos navios do pôr até ao nascer do sol,
excepto com especial licença das autoridades de alfândega; as escotilhas e todas as
entradas para os lugares onde está a carga podem ser fechadas pelos empregados
japoneses, do pôr ao nascer do sol, com selos, chaves, cadeados, ou por outro qualquer
meio; e se alguma pessoa sem permissão da alfândega abrir qualquer entrada que assim
tenha sido fechada, ou quebrar e remover os selos, ou cadeados, ou fechaduras, que
tenham sido postos pela alfândega, pagará sessenta patacas de multa por cada
transgressão. Quaisquer fazendas que forem desembarcadas ou que se tente
desembarcar sem terem entrado na alfândega japonesa, como aqui se ordena, são
sujeitas a tomadia e confisco.
Pacotes de fazendas feitos com intenção de fraudar os direitos do Japão, ocultando
artigos que estão mencionados na factura, serão tomados.
Se algum navio português fizer contrabando, ou tentar fazê-lo nalgum dos portos
do Japão não abertos ao comércio, todas as fazendas serão confiscadas em benefício do
Governo japonês, e o navio pagará uma multa de mil patacas por cada contravenção.
Navios que carecerem de conserto poderão desembarcar as suas cargas sem
pagamentos de direitos. Todas as fazendas assim desembarcadas ficarão a cargo das
alfândegas japonesas e pagar-se-ão todas as despesas de armazenagem, trabalho e
vigilância. Porém, se alguma porção de tais cargas for vendida, serão pagos os direitos
regulares pelas porções de que assim se dispuser.
Podem baldear-se as cargas de um navio para outro, sem pagamento de direitos;
porém, estas baldeações serão feitas debaixo da inspecção dos empregados japoneses, e
depois de se ter dado às autoridades japonesas prova satisfatória da boa-fé de tais
baldeações, e com licença da mesma autoridade.
A importação do ópio sendo proibida, todo o ópio que trouxer algum navio
português e que exceda três cates será tomado e destruído pela autoridade japonesa. Se
alguma pessoa ou pessoas fizerem contrabando de ópio, ou tentarem fazê-lo, pagarão
uma multa de quinze patacas por cate de ópio que desembarcarem ou tentarem
desembarcar por contrabando.
III
O dono ou consignatário de quaisquer fazendas que deseje desembarcá-las dará
entrada delas na alfândega; a entrada será feita por escrito e declarará o nome da pessoa
que faz a entrada e o nome do navio em que as fazendas forem importadas, e as marcas,
os números, os pacotes e os conteúdos deles, com o valor de cada pacote, notado
separadamente numa parcela, e no fim a soma total do valor da entrada. Em cada
entrada o dono ou consignatário certificará, por escrito, que a entrada assim apresentada
mostra o custo actual das fazendas e que nada se oculta para fraudar os direitos do
Japão, e este certificado será assinado pelo dono ou consignatário.
Os originais da factura de todas as fazendas assim entradas serão apresentados às
autoridades de alfândega e ficarão em seu poder até que as fazendas constantes da
entrada sejam examinadas.
Os empregados japoneses podem examinar qualquer ou todos os pacotes assim
entrados e para este fim poderão levá-los para a alfândega; porém, tal exame será feito
sem despesa para o importador nem dano para as fazendas; depois do exame, os
japoneses porão as fazendas no pacote como estavam (quanto possível), e este exame
será feito com razoável brevidade.
Se algum dono ou importador descobrir que as fazendas foram danificadas na
viagem de importação antes que essas fazendas lhe fossem entregues, dará parte às
autoridades de alfândega de tais avarias, e as fazendas avariadas serão avaliadas por
duas ou mais pessoas competentes e desinteressadas, que, depois do devido exame,
passarão um certificado, determinando quantos por cento de avaria tem cada pacote,
descrevendo-o pela sua marca e pelo seu número, sendo esse certificado assinado pelos
avaliadores na presença das autoridades de alfândega, e o importador adicionará esse
certificado à sua entrada e fará nela a competente dedução. Porém, isto não impede as
autoridades de alfândega de avaliarem as fazendas, em conformidade com o artigo XV
do Tratado a que estes Regulamentos são apensos.
Depois de pagos os direitos, o dono das fazendas receberá uma ordem para que elas
lhe sejam entregues, quer estejam na alfândega ou a bordo.
A entrada será por escrito, e declara o nome do navio em que as fazendas devem
ser exportadas, com as marcas e o número dos pacotes, e a quantidade, a descrição e o
valor dos conteúdos. O exportador certificará, por escrito, que a entrada é a verdadeira
relação das fazendas contidas nos pacotes, e assinará o certificado.
Quaisquer fazendas que forem postas a bordo para exportação, antes de terem dado
entrada na alfândega, e todos os pacotes que contiverem artigos proibidos serão
confiscados em benefício do Governo japonês.
Não se exige entrada na alfândega dos mantimentos para uso dos navios, das suas
guarnições e dos seus passageiros, nem das bagagens dos passageiros.
IV
Os navios que quiserem despacho de saída darão parte à alfândega com vinte e
quatro horas de antecedência, e passado esse prazo têm direito a despacho; porém, se
lhes for recusado, as autoridades da alfândega informarão imediatamente o capitão e o
consignatário do navio das razões pelas quais se lhes recusa despacho, e darão também
parte ao cônsul português.
Os navios de guerra portugueses não dão entrada nem carecem do despacho de
alfândega, nem podem ser visitados pelos empregados de alfândega ou polícia.
Vapores conduzindo malas podem dar entrada e terem despacho no mesmo dia; e
não farão manifesto senão dos passageiros ou fazendas que houverem de desembarcar
nos portos do Japão. Porém, estes vapores em todo o caso devem dar entrada e
despacharem na alfândega.
Navios baleeiros que tocarem nos portos para se proverem de mantimentos, ou
navios com avarias, não têm de fazer manifesto das suas carregações; porém, se depois
quiserem negociar, depositarão o manifesto, conforme o artigo I.
A palavra navio, que ocorre neste Regulamento, e no Tratado a que é apenso,
significa toda a qualidade de embarcação de vela ou vapor.
V
Toda a pessoa que assinar uma declaração falsa, ou certificado, com intenção de
fraudar os direitos do Japão, pagará uma multa de cento e vinte e cinco patacas, por
cada contravenção.
VI
Os navios portugueses não pagarão nos portos do Japão direitos de tonelagem, mas
sim os seguintes emolumentos às autoridades de alfândega:
Pela entrada da embarcação
$ 15.00
Pelo despacho de saída
$
7.00
Por cada licença
$
1.50
Pela carta de saúde
$
1.50
VII
O Governo japonês receberá os direitos pelas fazendas importadas no Japão
segundo a seguinte tarifa:
Classe I – Todos os artigos desta classe são livres de direitos: Ouro e prata,
cunhados ou por cunhar. Artigos de vestuário em uso actual. Mobília de casa e livros
impressos que não sejam para vender, mas sim propriedade de pessoas que venham a
residir no Japão.
Classe II – Os seguintes artigos pagarão um direito de cinco por cento: Todos os
artigos que se usam para construir, aparelhar, consertar ou reparar navios. Utensílios da
pesca da baleia. Provisões salgadas de toda a espécie. Pão e artigos de farinha. Animais
vivos de toda a espécie. Carvão. Madeira para construção de casas. Arroz. Pele.
Máquinas a vapor. Zinco. Chumbo. Folha de lata. Sedas em rama. Fazendas
manufacturadas de linho, algodão ou lã.
Classe III – Todas as bebidas espirituosas pagarão trinta e cinco por cento de
direitos, quer sejam preparadas por destilação, fermentação ou de outro modo qualquer.
Classe IV – Todas as mercadorias não incluídas nas classes precedentes pagarão
vinte por cento de direitos.
VIII
O Governo japonês receberá direitos pelas fazendas exportadas do Japão, segundo
a seguinte tarifa: Todos os artigos de produção japonesa que forem exportados como
carga pagarão um direito de cinco por cento, à excepção das moedas de ouro, prata e de
cobre em barra.
Arroz e centeio produzidos no Japão não serão exportados como carga; porém,
tanto os súbditos portugueses residentes no Japão como as guarnições e os passageiros
dos navios portugueses serão providos com a quantidade suficiente para seu uso.
Cereais estrangeiros, trazidos aos portos do Japão em navios portugueses, se
nenhuma parte deles tiver sido desembarcada, poderão ser reexportados sem estorvo.
O Governo japonês venderá ocasionalmente, em leilão público, o cobre que puder
dispensar.
IX
Quatro anos depois da assinatura deste Tratado, as tarifas dos direitos de
importação e exportação serão reconsideradas se o Governo português ou japonês o
desejar.
(aa)
Isidoro Francisco Guimarães
Midzogoetsi Sanoekino Kami
Sakai Okino Kami
Matsdaira Dzirobe
(Diário do Governo, n.º 140, de 26 de Junho de 1861; Colecção de Legislação,
Suplemento, p. 11; Colecção de Tratados, tomo I, p. 249)
(Portugal e o Japão, pp. 113-129)
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