AS AULAS DE EDUCAÇÃO SEXUAL NO ENSINO SECUNDÁRIO

Transcrição

AS AULAS DE EDUCAÇÃO SEXUAL NO ENSINO SECUNDÁRIO
Edição 21, volume 1, artigo nº 2, Abril/Junho 2012
D.O.I: http://dx.doi.org/10.6020/1679-9844/2102
AS AULAS DE EDUCAÇÃO SEXUAL NO ENSINO
SECUNDÁRIO ESPANHOL AJUDAM A PRENEVIR
CONDUTAS SEXUAIS DE RISCO?
¿LAS CLASES DE EDUCACIÓN SEXUAL EN LA
ENSEÑANZA SECUNDARIA AYUDAN A PREVENIR
CONDUCTAS SEXUALES DE RIESGO?
Ariadne Runte-Geidel1, Rocio Lorente2
1
2
Universidad de Jaén/Jaén, Espanha. [email protected]
Universidad de Granada/Granada, Espanha. [email protected]
Resumo – Alguns estudos científicos realizados na Espanha revelam que
os jovens iniciam a sua vida sexual cada vez mais precocemente. Outros
estudos evidenciam que uma alta porcentagem desses jovens assume
certas condutas de risco tais como não proteger-se adequadamente durante
as suas relaciones sexuais, tanto em relação à prevenção de doenças
sexualmente transmissíveis, quanto em relação à prevenção de gravidez.
A legislação que regulamenta a educação secundária espanhola contempla
a educação sexual tanto entre os seus objetivos, bem como nos conteúdos
do currículo nacional. Pensamos que a educação para a sexualidade, se
fosse ensinada de forma efetiva durante a etapa de educação secundária,
poderia ajudar a prevenir certas condutas de risco no futuro, quando esses
jovens e adolescentes iniciassem a sua vida sexual.
O objetivo dessa investigação foi conhecer a repercussão e o uso dos
conteúdos de educação sexual recebidos na educação secundária entre a
juventude universitária na Espanha. Analisamos se os conhecimentos
adquiridos nessa matéria influem no começo da vida sexual ativa desses
jovens e também em que grau eles fazem uso desses conhecimentos.
Palavras-chave: ensino secundário; educação sexual; prevenção de risco.
Resumen – Algunos estudios llevados a cabo en España evidencian que la
edad media de inicio de la vida sexual entre los jóvenes es cada vez más
temprana. Además también ponen de manifiesto que un porcentaje alto de
estos jóvenes adoptan ciertas conductas de riesgo tales como no
protegerse adecuadamente en sus relaciones sexuales, ni en relación a las
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enfermedades sexualmente transmisibles y tampoco con relación a la
prevención del embarazo. De hecho, en el marco normativo de la educación
secundaria española se contempla la educación sexual tanto en los
objetivos como en los contenidos del currículo. Pensamos que el desarrollo
efectivo de estos conocimientos por parte de los adolescentes en
secundaria debería contribuir en la prevención de ciertas conductas de
riesgo presentadas en la juventud, cuando inician su vida sexual activa. El
objetivo de este trabajo es conocer la repercusión y uso de los contenidos
relacionados con la Educación Sexual recibidos en la etapa secundaria de
escolarización entre la juventud universitaria española. Analizamos si los
conocimientos adquiridos en este ámbito influyen en su actitud en los inicios
de su vida sexual y en qué grado hacen uso de estos conocimientos.
Palabras clave: enseñanza secundaria obligatoria; educación sexual;
prevención de riesgos.
Estudos científicos sobre a sexualidade, realizados com jovens e adolescentes,
revelaram que o início da vida sexual ativa vem se dando de forma cada vez mais
precoce e que, aos 16 anos muitos adolescentes começam a ter relações sexuais,
completas o não. Estes estudos também encontraram que quase um 50% dos
jovens entre 15 e 24 anos reconhecem não usar formas de proteção adequadas a
todos os riscos associados às relações sexuais (Kann et al, 1997). Um estudo
levado a cabo pelo governo de Andaluzia, Espanha, evidenciou que perto de um
80% dos jovens entre 15 e 19 anos não utilizam método eficazes para a prevenção
da gravidez (Junta de Andalucía, 2003b). Outros estudos realizados pelo mesmo
organismo encontraram que, depois dos acidentes automobilísticos, a AIDS é a
principal causa de anos de vida potencialmente perdidos entre a juventude andaluza
(Junta de Andalucía, 2003a).
A ausência de uma educação sexual adequada e levada a cabo nas idades
pertinentes, pode eventualmente causar futuros problemas de disfunção sexual.
Contudo, a falta de conhecimentos adequados sobre a sexualidade humana também
é preocupante na medida em que pode afetar as possibilidades de transformar
aquelas bases sociais e culturais que provocam certas formas de discriminação
entre os sexos, e que impedem a convivência equilibrada e bem integrada da
sexualidade humana. Por tanto, é fundamental planificar, dentro do currículo regular
das escolas secundárias, uma série de conteúdos e objetivos que se dêem de forma
contínua e integrada com os demais conhecimentos.
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Entendemos que a educação sexual deveria atender a estas duas vertentes
de formação, por um lado preparar a juventude quanto àqueles aspectos
relacionados com o caráter biológico e, por tanto, de prevenção de riscos
relacionados com as DST, de gravidez na adolescência, bem como a utilização de
métodos anticonceptivos em geral. Por outro lado, a incorporação de aspectos
relacionados com um modelo mais social de entendimento da sexualidade humana,
ajudaria a desenvolver nos jovens e adolescentes o sentido de responsabilidade e
de respeito ao outro, no que tange as suas eleições sobre as relações íntimas.
A OMS define a saúde sexual como a integração de diferentes elementos tais
como aqueles relacionados com os aspectos corporais, bem como aqueles que se
referem aos elementos emocionais, intelectuais e sociais, os quais permitem o
desenvolvimento da personalidade, a comunicação com o outro e o amor. Enfatiza
que todos estes elementos são indispensáveis para uma realização feliz da
sexualidade (Priego y Cosme, 1995).
Conforme Barragán (1996:100), a educação sexual se refere a um processo
através do qual os sujeitos podem construir um modelo de representação e
explicação da sexualidade humana que esteja de acordo com as nossas
capacidades, os quais deveriam ter como único limite, o respeito à liberdade do
outro. Este autor afirma que o conhecimento sexual se relaciona tanto com o
conhecimento de nós mesmos, como o conhecimento do outro e das relações
afetivas e sociais que podemos estabelecer e, dessa forma, também nos ajuda a
conhecer melhor certas instituições sociais dentro de um contexto histórico e cultural
concretos.
Sabemos que na etapa da adolescência é fundamental alcançar precisamente
estes conhecimentos de si mesmo e do outro, como forma de construir uma
personalidade equilibrada e de desenvolver o sentido de respeito e tolerância para
com os demais. Por tanto os conhecimentos relacionados com a educação sexual
são imprescindíveis nessa etapa da vida.
Conforme Sarat (2011), a sexualidade humana, entendida como algo que faz
parte da própria natureza humana, mas também como um processo social, se
construiu ao longo da historia e passou por processos de transformação que
acompanharam as mudanças sociais e culturais de cada sociedade. Desde este
ponto de vista, a sexualidade humana não só faz parte das aprendizagens
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necessárias para que possamos nos construir a nós mesmos, mas também constitui
uma forma de ser e de nos relacionar com os demais que molda a maneira como a
sociedade mesma interpreta as relações humanas.
A escola como um lugar de aprendizagem e educação, no seu sentido mais
amplo, deveria ser um espaço onde fossem ensinados tanto aqueles conhecimentos
e competências relativos ao futuro profissional do alunado, como constituir um
ambiente idôneo para o desenvolvimento de habilidades de convivência, de
autoconhecimento e de respeito ao outro. Na adolescência o conhecimento sobre a
sexualidade se nutre e se vê influenciado de forma importante pelas informações
partilhadas na escola, tanto às recebidas através dos adultos, como professores e
especialistas na matéria, bem como aquelas experiências de relacionamento afetivo
e as informações partilhadas entre os seus colegas de aula.
Precisamente em função desses conhecimentos, o marco normativo da
educação secundária espanhola, prevê a educação sexual entre seus objetivos
gerais e também através dos conteúdos previstos no currículo. Revisando o Real
Decreto 1631/20064, no qual são estabelecidos os conteúdos mínimos que
correspondem à etapa de Educação Secundária Obrigatória (ESO), deparamos que
entre os objetivos gerais se encontram alguns como estes:
a) valorizar e respeitar as diferenças entre os sexos e a igualdade de
direitos e oportunidades entre eles. Rechaçar os estereótipos que
supõem a discriminação entre homens e mulheres.
b) fortalecer
as
capacidades
afetivas
em
todos
os
âmbitos da
personalidade e nas suas relações com os demais, rechaçando
comportamentos violentos e de índole sexista.
c) conhecer e aceitar o funcionamento do próprio corpo e o dos outros,
respeitando as diferenças, e garantindo os hábitos de cuidado e saúde
corporais.
d) conhecer e valorizar a dimensão da sexualidade humana em toda sua
4
Real Decreto 1631/2006, através do qual se estabelece o currículo mínimo correspondente a
Educação Secundaria Obrigatória em Espanha (Boletin Oficial del Estado - BOE nº 5 de 5/1/2007).
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diversidade.
Estes objetivos são concretizados majoritariamente através dos conteúdos da
matéria “Ciências da natureza”, ensinados no terceiro ano do ensino secundário,
dentro de um bloco que se refere a aspectos tais como:
 a reprodução humana, as mudanças físicas e psicológicas da
adolescência, os aparelhos reprodutores femininos e masculinos.
 o ciclo menstrual, a fecundação, a gravidez e o parto.
 análise dos diferentes métodos anticonceptivos.
 as doenças sexualmente transmissíveis.
 a resposta sexual humana, sexo y sexualidade.
 saúde e higiene sexual.
Contudo, o Real Decreto 1146/20115 promulgado posteriormente, propõe a
revisão e algumas modificações no decreto anterior. Entre estas modificações
encontramos que se substituiu a matéria “Ciências da natureza”, e também os
conteúdos referentes a ela, pela matéria “Alimentação, nutrição e saúde”. Esta
matéria suprime dos seus objetivos os aspectos relacionados com a sexualidade e
os substitui por outros, mais relacionados com a nutrição humana, a alimentação
saudável e a dieta equilibrada. Ainda assim, contempla entre os conteúdos algumas
parcas referências às condutas de risco para a saúde e de pressão social, como são
os transtornos alimentícios, uso de substâncias aditivas e as doenças sexualmente
transmissíveis.
O marco legislativo da Comunidade Autônoma de Andaluzia, que regula o
ensino secundário obrigatório dentro do território andaluz, através da Ordem de 10
de agosto de 20076, sensível ao informe apresentado pela própria Junta de
5
Real Decreto 1146/2011, através do qual se modifica o Real Decreto 1631/2006, e no qual se
estabelece o currículo mínimo correspondente a Educação Secundaria Obrigatórios, assim como os
Reais Decretos 1834/2008 e 860/2010, também afetados por estas modificações (Boletin Oficial del
Estado - BOE nº 182 de 30/7/2011).
6
ORDEM de 10 de agosto de 2007, pela qual se expõe o currículo correspondente a Educação
Secundaria Obrigatória em Andaluzia (Boletín Oficial de La Junta de Andalucía, nº171, Sevilla, 30 de
agosto de 2007). Disponível em:
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Andaluzia, que referenciou a problemática relacionada com a sexualidade na
adolescência, mantém a matéria “Ciências da natureza”. Dentre os conteúdos desta,
está previsto um núcleo temático dedicado aos determinantes da saúde e inclui
recomendações metodológicas que fazem referência ao estudo sobre as alterações
corporais que se produzem na puberdade e adolescência, favorecendo assim a
motivação para o estudo das transformações anatômicas e fisiológicas em geral.
Igualmente, dentro desta legislação, está previsto uma matéria de caráter optativo,
denominada “Transformações sociais e relativas ao sexo”, a qual é descrita como
necessária para compensar as assimetrias referentes ao sexo que persistem na
sociedade espanhola, em cujos casos mais extremos se manifestam ainda hoje
como casos de brutal violência contras as mulheres. A descrição da matéria, no
Anexo 1 da referida Ordem, defende a importância de contemplar na própria
organização do ensino, a existência de um espaço específico para refletir e
aprofundar sobre a igualdade entre homens e mulheres, através de uma matéria
cujos conteúdos curriculares sirvam ao desenvolvimento de uma cidadania com
igualdade de direitos.
No entanto, esta legislação é bastante atual e, somente poderá beneficiar as
gerações que estão atualmente cursando os estudos obrigatórios na Espanha. A
população que fez parte da amostra desse estudo, em média, terminou os seus
estudos secundários obrigatórios entre 2003 e 2006.
O objetivo desse trabalho de investigação foi tentar conhecer melhor a
repercussão e o uso que os jovens espanhóis fazem dos conhecimentos que
receberam sobre educação sexual, durante a sua educação secundária.
Construímos um questionário de auto aplicação que foi utilizado por jovens
universitários durante o curso acadêmico de 2009-2010. Este instrumento está
centrado em verificar se a educação sexual que os adolescentes receberam
anteriormente, na etapa de escolarização secundária, é utilizada quando iniciam a
sua vida sexual ativa, e em que grau estes conhecimentos influenciam às suas
decisões nesse âmbito.
http://www.juntadeandalucia.es/averroes/~cepco3/competencias/normativa/Normativa/118957949930
0_orden_curriculo_secundaria_definitivo_para_web.pdf
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Metodologia
A amostra de participantes foi composta por alunos e alunas da Universidade de
Granada estudantes dos três primeiros anos nas faculdades de Pedagogia,
Magistério, Enfermagem e Educação Física.
O instrumento utilizado7, como já foi explicado, se tratou de um questionário
estruturado que era respondido pelos próprios sujeitos e de forma totalmente
anônima. O questionário foi construído especificamente para avaliar quais e quantos
conhecimentos sobre educação sexual os jovens realmente aplicam durante a sua
vida sexual ativa.
Os resultados foram conseguidos através de um estudo descritivo transversal
que analisou as freqüências estatísticas de utilização dos conhecimentos relativos à
educação sexual segmentado por sexos. Esta análise permitiu identificar diferenças
entre mulheres e homens quanto ao uso dos conhecimentos adquiridos.
Também se levou a cabo uma análise bivarante das variáveis do estudo que
permitiram verificar se a educação sexual, tal e como se ensina atualmente nas
escolas de educação de nível secundário em Espanha, é realmente efetiva e
colocada em prática pelos jovens no início de sua vida sexual.
As variáveis utilizadas nesse trabalho se apresentam na tabela 1:
Tabela 1: Variáveis utilizadas
1. Sexo dos participantes
2. Ter recebido aulas de Educação Sexual no ensino secundário.
3. Ter utilizado os conhecimentos recebidos.
4. Utilizar conhecimentos sobre a anatomia dos órgãos sexuais
5. Utilizar conhecimentos sobre a prevenção de gravidez
6. Utilizar conhecimentos sobre a prevenção de D.S.T*
7. Utilizar conhecimentos sobre cuidados de higiene
8. Utilizar conhecimentos sobre a divisão de responsabilidades
9. Utilizar conhecimentos sobre o respeito aos sentimentos do
outro nas decisões sobre as atividades sexuais levadas a cabo.
* Doenças Sexualmente Transmissíveis
Os resultados indicam uma série de fatores interessantes que poderão ser
objeto de futuras pesquisas sobre esse tema, inclusive que pudessem contar com
uma ampliação da amostra.
7
Anexo 1
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Resultados e discussão
O primeiro aspecto observado ao analisar os dados foi que a amostra estava
composta por mais mulheres que homens (gráfico 1), possivelmente porque havia
um predomínio de mulheres nas formações universitárias nas quais foi aplicado o
questionário. Pensamos que este resultado se deve ao fato que, se bem é verdade
na Espanha a porcentagem de mulheres estudantes de titulações técnicas cresceu
muito nas últimas décadas (situação impensável até poucas décadas atrás, quando
este tipo de formação estava completamente masculinizado), em geral as mulheres
continuam sendo a maioria em formações de Ciências da Educação (tais como
magistério e pedagogia) e também em enfermagem.
No caso das titulações de Educação, Marina Subirats (1994:63) analisa
profundamente esta realidade no seu estudo “Conquistar la igualdad: la coeducación
hoy”, no qual afirma que a educação é um dos setores profissionais mais
feminizados. Entretanto, a autora chama a atenção para o fato de que ainda que
sejam maioria, no caso espanhol as mulheres continuam assumindo posições
inferiores a dos homens dentro da estrutura educativa, como por exemplo, a maioria
dos cargos de diretor de escola ainda é ocupado por homens. Este fato indica que
continua subsistindo um rol de sexos muito profundo na cultura espanhola, os quais
influenciam intensamente sobre a escolha do futuro profissional.
Gráfico 1. Sexo da amostra do estudo
Sexo da amostra
Frecuencia
%
Homens
12
20.7
Mulheres
46
79.3
Total
58
100.0
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Fonte: Elaboração própria
Um estudo recente realizado pelo Instituto da Mulher de Madri (2008) utilizou
dados do ano 2007 do Instituto Nacional de Estadística de Espanha e revelou que,
de fato, as licenciaturas curtas8 (menos de 5 anos) são as titulações de estudos
superiores onde se encontram maior representação feminina entre o alunado. Este
estudo evidenciou que se por um lado houve um incremento importante da
participação feminina em estudos universitários de caráter técnico, por outro,
aquelas formações que tradicionalmente estiveram feminizadas aumentaram ainda
mais o número de alunas do sexo feminino nas últimas décadas. Por exemplo, no
caso de Enfermagem, o número de estudantes mulheres passou de 79% em 1982 a
ser de 84% em 2007 e também no caso dos estudos de Pedagogia a proporção de
mulheres matriculadas em 2007 foi muito maior que a de homens (82% de
mulheres). De todas as formas estes dados confirmam o aumento generalizado da
participação feminina em estudos universitários.
Um estudo realizado pela Sociedade de Sexologia Al-Garaia, Espanha,
encontrou que as principais fontes de informação sobre a sexualidade dos jovens
espanhóis são primeiramente os amigos (30%) e em segundo lugar os professores
(19%), mas que também são fontes de informação os materiais pornográficos (18%).
Quanto ao tema central de este trabalho, verificou-se que a maioria dos
alunos que responderam ao questionário (perto de dois terços da amostra) afirmou
ter recebido algum tipo de educação sexual durante seus estudos de nível
secundário (Gráfico 2). Esses dados são confirmados por outros semelhantes,
8
Na Espanha, antes da posta em prática do Plano Bolonha, a formação universitária estava
organizada em Diplomaturas (de 3 anos) e Licenciaturas (5 o mais anos).
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encontrados em um estudo realizado na província de Almería, no sul da Espanha,
que demonstrou que até um 64% dos alunos receberam educação sexual no ensino
secundário.
Gráfico 2. Proporção de educação sexual recebida em educação secundária
Fonte: Elaboração própria
Especificamente sobre a utilização dos conhecimentos recebidos sobre
educação sexual na etapa secundária de escolarização, a maioria dos participantes
(84%) afirmou que esses conhecimentos foram de grande utilidade no início da sua
vida sexual. Como se pode observar no gráfico 3, encontramos diferenças entre
alunos do sexo masculino e feminino quanto a esta utilização, pois as mulheres da
amostra fazem mais uso desses conhecimentos (60% delas), que os homens pois
somente a metade deles afirma utilizá-los.
Gráfico 3. Utilização dos conhecimentos de educação sexual conforme o sexo.
Fonte: Elaboração própria
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O estudo realizado também se preocupou em identificar que tipo de
conhecimento adquirido em educação secundária causou mais influência na vida
sexual da juventude universitária. Os dados encontrados mostram que perto de um
60% dos participantes referiram usar os conhecimentos a respeito da anatomia dos
órgãos sexuais (Gráfico 4).
Gráfico 4. Uso dos conhecimentos adquiridos sobre anatomia sexual
Fonte: Elaboração própria
O gráfico também mostra que existem diferenças entre homens e mulheres
quanto ao uso desses conhecimentos específicos.
Quanto à aprendizagem sobre a prevenção de Doenças Sexualmente
Transmissíveis (DST), os dados revelaram que 100% da amostra afirmam ter
recebido informações sobre esse tema nas aulas de educação sexual na escola
secundária e que os utilizou com o objetivo de prevenir este tipo de doenças. Nessa
variável não foram encontradas diferenças relacionadas com o gênero, já que tanto
homens como mulheres asseguraram usar estes conhecimentos. No entanto, estes
resultados contrastam intensamente com outros encontrados em um estudo levado
a cabo com estudantes de educação secundária em Valência. Este estudo
encontrou altos índices de desinformação a respeito tanto dos sintomas associados
as DST, como sobre as vias de contágio existentes, entrevistando a estudantes com
idades entre os 15 e os 18 anos, o que deixa clara a baixa conscientização existente
sobre a seriedade e importância de prevenir estas enfermidades.
Consideramos que as explicações possíveis para estas diferenças entre os
resultados que obtivemos no nosso estudo e os dados encontrados no estudo
realizado em Valência podem ter relação com a idade e a formação dos
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participantes. Por um lado é possível considerar que, por questões culturais, os
estudantes universitários não se sentissem cômodos revelando que, mesmo
sabendo a importância de usar métodos de prevenção para as DST, em realidade
não os utilizem com a freqüência que indicam. Diversos estudos demonstram que a
juventude espanhola faz uso de preservativo prioritariamente como método
anticonceptivo e não como prevenção de DST, pois não costumam usá-los durante
os coitos orais ou anais (Faílde et al, 2008).
No entanto também é evidente que a idade dos entrevistados varia bastante
entre os dois estudos. Precisamente essa diferença de idades, e também de
formação, pode ser o fator que mais influi nas diferenças entre os resultados. Os
alunos do estudo valenciano, em alguns casos, ainda estariam recebendo a
formação relativa à sexualidade, enquanto os alunos universitários do nosso estudo
já possuíam estes conhecimentos bastante consolidados, além disso, dispõem de
mais maturidade emocional para enfrentar a essas questões que os alunos
adolescentes.
Precisamente a respeito da prevenção de gravidez, mais de 97% da amostra
afirma ter utilizado os conhecimentos adquiridos na educação secundária sobre esse
assunto quando iniciaram a sua vida sexual (Gráfico 5).
Gráfico 5. Uso dos conhecimentos adquiridos sobre a prevenção de gravidez
Fonte: Elaboração própria
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Tal como se pode observar no gráfico 5, continuam sendo as mulheres quem
mais se preocupam em se proteger das gravidezes indesejadas, pois 100% delas
afirma usar os conhecimentos adquiridos sobre esse tema. Entretanto, conforme o
Registro de Interrupción Voluntaria del Embarazo (IVE) espanhol as porcentagens
de IVE se elevaram entre todos os grupos de idade nas últimas décadas, sendo
esse aumento maior ainda no grupo de mulheres com idades entre os 20 e os 24
anos. O número de IVE pode ser interpretado como um indicador indireto da
porcentagem de relações sexuais desprotegidas e, por tanto, também indicador de
situações de risco de infecção por HIV e outras doenças transmitidas sexualmente
(Belza et al, 2003).
Com relação à educação recebida sobre a higiene nas práticas sexuais,
aproximadamente 82% dos jovens universitários espanhóis participantes na amostra
indicam usar adequadamente estes conhecimentos (Gráfico 6). Nesse aspecto, são
os homens que utilizam em maior proporção esses conhecimentos que as mulheres.
Gráfico 6. Uso dos conhecimentos adquiridos sobre higiene nas práticas sexuais
Fonte: Elaboração própria
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Os dois últimos aspectos sobre os quais esse estudo investigou se tratam de
fatores relacionados com a divisão das responsabilidades e o respeito pelos
sentimentos do outro durante as relações sexuais. O gráfico 7 demonstra que estes
conteúdos são aplicados em menor medida que os outros estudados. Os resultados
mostram que menos da metade dos participantes não tem em consideração essas
questões quando iniciam ativamente a vida sexual.
Gráfico 7. Uso dos conhecimentos adquiridos sobre a divisão de responsabilidades e o
respeito pelos sentimentos do outro
Fonte: Elaboração própria
Estes dados deixam evidente uma lacuna nos conteúdos de educação sexual
ensinados na educação secundária espanhola e indicam que os conteúdos de
caráter prioritariamente biológicos têm preferência sobre os aspectos éticos ou de
responsabilidade.
No entanto, o sexo feminino da amostra demonstra ter mais preocupações e
respeito pelos sentimentos do parceiro sexual (62%) que os homens (44%).
Pensamos que estes dados indicam uma vez mais como os papéis de gênero
influenciam as atitudes e responsabilidades que homens e mulheres assumem sobre
diferentes questões sociais, incluindo entre elas aquelas relacionadas com a vida
sexual ativa.
Gráfico 8. Uso dos conhecimentos adquiridos sobre o respeito aos sentimentos do outro
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Fonte: Elaboração própria
O
Gráfico
9
demonstra
que
também
em
relação
a
divisão
de
responsabilidades existem diferenças entre os dois gêneros. Mais da metade das
mulheres da amostra utilizam os conhecimentos sobre este assunto, enquanto
somente 44% dos homens fazem uso deles.
Gráfico 9. Uso dos conhecimentos adquiridos sobre a divisão de responsabilidades
Fonte: Elaboração própria
Com a finalidade de verificar se existe alguma associação significativa entre
as diferentes variáveis usadas nesse estudo, se levou a cabo uma análise
bivariante. Esta indicou como altamente significativa estatisticamente a relação entre
ter recebido educação sexual durante o ensino de secundaria e a utilização desses
conhecimentos no início da vida sexual ativa entre os jovens universitários
espanhóis (utilizando o Teste de Fisher e também o teste χ2: P<0.001). Estes
resultados vêm demonstrados na tabela 2.
Tabela 2: Análise Bivariante das variáveis do estudo
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Ha utilizado los conocimientos de
educación sexual
No
Sí
Total
Ha recibido
educación sexual
No
Si
19
6
33
0
19
39
Total
25
33
58
Esta associação encontrada indica que, em geral, existe efetividade nas
sessões de educação sexual recebida pelos adolescentes espanhóis de educação
secundária, pois conforme estes análises estatísticos, os conhecimentos adquiridos
nessas matéria foram utilizados posteriormente na sua vida sexual.
Conclusões
Considerando que a informação foi coletada através de um questionário estruturado
que fornece dados estritamente descritivos, avaliamos que a utilização de outras
técnicas de coleta de dados, em futuras pesquisas sobre este assunto, poderia
ministrar maior profundidade e possibilitar melhores interpretações sobre os
resultados. Entretanto, foi possível chegar a algumas conclusões interessantes a
partir dos resultados conseguidos nessa primeira aproximação ao tema e também
através da sua discussão com a literatura revisada.
O fato de existir associação estatística entre ter recebido aulas de educação
sexual e a utilização positiva desses conhecimentos posteriormente, quando os
jovens iniciam a sua vida sexual, indicam a efetividade dessas aulas durante o
ensino secundário espanhol. Entretanto, segundo os resultados encontrados,
praticamente um terço da amostra afirmou não ter recebido classes de educação
sexual durante a sua etapa de escola secundária. Consideramos um fato
preocupante, principalmente quando se têm em conta os riscos que supõe o
desconhecimento da prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e da
gravidez entre a população mais jovem. Esses riscos são ainda mais graves se
consideramos a idade média com a qual se inicia a atividade sexual da população
espanhola, que ronda os 16 anos conforme os estudos revisados.
Evidentemente a educação sexual dos jovens sofre também influências de
outras fontes, tais como as informações que se intercambiam entre os seus
companheiros de escola e amigos em geral. Por outra lado, está toda a informação
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recebida pelos canais informais de educação, como podem ser os meios de
comunicação e as campanhas publicitárias sobre a prevenção de riscos
relacionados com a sexualidade, promovidos pelo governo. Todo este conjunto de
informações do qual dispõem os jovens, vai conformando o universo de
conhecimentos sobre o assunto em questão. Entretanto, pensamos que não é
suficiente receber informações, tanto no que se refere à quantidade como em
relação à qualidade da mesma. Consideramos que a formação que os adolescentes
recebem na escola deveria enfatizar a importância de colocar em prática estes
conhecimentos e os perigos reais que supõem não levá-los a prática.
Os resultados também deixam claro que os homens, enquanto ao uso dos
conhecimentos adquiridos, utilizam mais aqueles relacionados com os aspectos
biológicos (anatomia, higiene e prevenção de DST). Por outro lado, as mulheres se
destacam por preocupações relacionadas com os aspectos emocionais (como o
respeito e a divisão de responsabilidades), mas chama a atenção que a
porcentagem de jovens que utiliza estes conhecimentos é bastante baixa em ambos
os sexos. Assim, consideramos que estes aspectos deveriam ser tidos mais em
conta no currículo da educação sexual, onde se colocasse mais ênfase naqueles
conteúdos que fizessem referência aos sentimentos e as atitudes que se deve ter
em relação à sexualidade e a aquelas pessoas com as quais as relações sexuais
são partilhadas.
O projeto "Educasex Málaga" (2009), elaborado conforme as diretrizes do
Livro Branco sobre educação sexual criticam que, atualmente em Espanha a
educação sexual parte de modelos preventivos e que, portanto, se centram
maioritariamente naqueles temas relacionados com aspectos como a anticoncepção
e os riscos, preservando assim uma definição de sexualidade relacionada como uma
função exclusivamente biológica. Adotar um modelo de cunho social acrescentaria a
perspectiva de igualdade entre os sexos, promovendo os benefícios advindos da
diversidade. Essa mudança de perspectiva permitiria que o currículo se libertasse de
transmitir uma cultura na qual a sexualidade fosse entendida somente como uma
função biológica, dando passo a entendê-la como uma parte importante do
relacionamento humano. Entender a sexualidade desde esse novo modelo faria com
que as ideias de respeito e responsabilidade assumissem o lugar que atualmente
ocupam o “controle” (tabu), a heterossexualidade (uma categoria) e o sexismo.
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Evidentemente que a formação também deve continuar a enfatizar a
prevenção das DST e da gravidez na adolescência, no contexto da promoção da
saúde. A educação sexual na escola, em todas as fases do processo educacional,
deveria promover uma cultura de sexo seguro na população em geral e
especialmente na juventude, uma vez que as estatísticas revelam que continua
sendo um problema grave na juventude.
Portanto, é essencial adotar um modelo de educação sexual abrangente e
aberto que, superando a urgência da prevenção, comece a considerar a aceitação e
a valorização das diferentes biografias sexuais, promovendo a riqueza das
diferenças humana, favorecendo assim a satisfação sexual e a qualidade de vida
das pessoas. Em suma, adotar um modelo de educação que fosse além da
aquisição de conhecimentos sobre sexualidade e que atendesse, desde uma
perspectiva abrangente, tanto os sentimentos, como as atitudes e os valores.
Referências Bibliográficas
BARRAGÁN (1996). La Educación Sexual y la Educación Secundaria
Obligatoria: Enseñar a Creer o Aprender a Crear. Materiales Curriculares
Educación Secundaria Obligatoria. Junta de Andalucía: Consejería de Educación
y Ciencia.
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SUBIRATS, M. (1994). Conquistar la igualdad: la coeducación hoy. Revista
Iberoamericana de Educación, 6: 49-78.
Anexo 1
Encuesta para valorar la efectividad de las clases de Educación para la
sexualidad
Este cuestionario tiene como objetivo saber si has utilizado los conocimientos
recibidos en las clases de educación para la sexualidad que has tenido en el
Instituto en tu vida sexual activa. En caso de no haber recibido tal tipo de educación,
por favor, indica solo a los datos sociodemográficos (A)
Debe contestarse de forma anónima. Por otra parte, esta información es
absolutamente confidencial y los datos serán utilizados únicamente para un trabajo
de investigación al cual solamente accederá la persona encargada del mismo.
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(A) Datos Sociodemográficos:
1) Edad: __________años
2) Sexo (X donde proceda):
____ Hombre ____Mujer
3) Curso y Centro Actual (indicar curso):
____ Pedagogía
____ Magisterio
____ Educación Física y Deporte
____ Enfermería
4) Tipo de Instituto donde terminó la educación secundaria:
___ Público
____ Concertado
____ Privado
(B) Educación sexual recibida (en todas las preguntas indicar X donde proceda)
NO
A
VECE
S
SI
NO
A
VECE
S
SI
5) He recibido clases de educación sexual en
secundaria.
6) Cuando he iniciado mi vida sexual he utilizado
algunos
conocimientos que recibí en las clases de educación
sexual
Señala de qué contenidos de los que viste en la educación secundaria relacionados
con la sexualidad te has acordado al relacionarte con otras personas:
NO
SI
7) Anatomía de los órganos sexuales .............................
8) Prevención del embarazo ...........................................
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9) Prevención de enfermedades sexualmente
transmisibles ...................................................................
10) Cuidados de higiene ................................................ .
11) Reparto de las responsabilidades .............................
12) Respeto por los sentimientos del otro ...................... .
Muchas gracias por tu colaboración
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