Dissertação - PRPG - Universidade Federal da Paraíba
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Dissertação - PRPG - Universidade Federal da Paraíba
1 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA / UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA PROGRAMA REGIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE IAPONIRA SALES DE OLIVEIRA USO DO CONHECIMENTO TRADICIONAL DOS CATADORES DE CARANGUEJO-UÇÁ Ucides cordatus, (LINNAEUS, 1763) PARA A IDENTIFICAÇÃO DOS PRINCIPAIS LOCAIS DE CATAÇÃO, NO ESTUÁRIO DO RIO MAMANGUAPE-PB JOÃO PESSOA 2009 2 IAPONIRA SALES DE OLIVEIRA Dissertação apresentada ao Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Estadual da Paraíba em cumprimento às exigências para obtenção de grau de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente USO DO CONHECIMENTO TRADICIONAL DOS CATADORES DE CARANGUEJO-UÇÁ Ucides cordatus, (LINNAEUS, 1763) PARA A IDENTIFICAÇÃO DOS PRINCIPAIS LOCAIS DE CATAÇÃO, NO ESTUÁRIO DO RIO MAMANGUAPE-PB ORIENTADOR: Prof. Dr. JOSÉ SILVA MOURÃO JOÃO PESSOA - PB 2009 3 FICHA CATALOGRÁFICA 4 IAPONIRA SALES DE OLIVEIRA USO DO CONHECIMENTO TRADICIONAL DOS CATADORES DE CARANGUEJO-UÇÁ Ucides cordatus, (LINNAEUS, 1763) PARA A IDENTIFICAÇÃO DOS PRINCIPAIS LOCAIS DE CATAÇÃO, NO ESTUÁRIO DO RIO MAMANGUAPE-PB Dissertação apresentada ao Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Estadual da Paraíba em cumprimento às exigências para obtenção de grau de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente Aprovado em: ___/___/___ Banca Examinadora ______________________________________________________ Prof. Dr. José da Silva Mourão - UEPB Orientador ______________________________________________________ Prof. Dr. Alberto Kioharu Nishida - UFPB Examinador __________________________________________________________ Prof. Dra. Thelma Lúcia Pereira Dias - UEPB Examinadora 5 Dedico esta dissertação as comunidades de Tramataia e Três Rios, que os resultados deste trabalho promovam melhorias na qualidade de vida, em especial aos catadores de caranguejo-uçá do ERM. 6 AGRADECIMENTOS Rendo graças a ti ó Deus, invoquei o teu nome e encontrei o teu amor, infinito amor, que me sustenta e me faz feliz. Agradeço ao Prof. José da Silva Mourão, por ter confiado à oportunidade da orientação no mestrado, apesar de não termos desenvolvido trabalhos anteriores. Agradeço por ter proporcionado trabalhar em um dos lugares mais bonito que conheci, alem da riqueza em conhecimentos que pude adquirir. Ao Prof. Alberto Kioharu Nishida (Guy), pela coleta das amostras de solo e as analises realizadas, pelo incentivo, duvidas esclarecidas, conversar durante as viagens, em que pude aprender com sua experiência. A Priscila Melo Trindade, amiga e colaboradora. Agradeço pela parceria na coleta e analises dos dados. Pelos momentos de descontração, pelas caminhadas na praia, pela ida ao observatório, por se mostrar uma grande amiga. Ao Itamar pela coleta das amostras floristica e o inventariado das espécies vegetais. A APA do Estuário do Rio Mamanguape, por ter permitido a realização do trabalho. As comunidades de Tramataia e Três Rios, por ter me acolhido, em especial os pescadores e catadores de caranguejos: João, Farinha, Biba e Regis. Que realizaram as visitas as camboas, as informações sobre os caranguejeiros e compartilharam de seus conhecimentos locais, os quais resultaram neste trabalho. Aos amigos da Etnoecologia, em especial a Emmanoela, Douglas e Simoní, por auxiliar nos primeiros contatos com as comunidades, e por toda a literatura fornecida. 7 As meninas Silvia – pelas caronas, Dandara – pela calma ao esclarecer algumas duvidas, e Patrícia – pela sinceridade, Ákila – pelas conversar ao pé de oliveira. As quatro agradeço por todos os bons momentos na casa da APA. A todos os professores do PRODEMA/UEPB/UFPB, que durante as disciplinas ministradas puderam contribuir com a minha formação. As meninas perdidas do PRODEMA: Adriana, Aretuza, Clélia, Gabriela, Karine, Narina, Patrícia Campos e Suellen, pelos momentos de descontração e auxilio nas disciplinas. Agradeço a CNPQ, CAPES e a REUNI, pela bolsa e pelos investimentos no projeto. Agradeço a minha família – Guia (Mãe), Edmilson (Pai), Jefferson (esposo), Iapoêne (irmão) que me ajudaram, através do incentivo moral e financeiro, para que pudesse concluir este trabalho, e superar mais uma etapa da minha vida. Obrigada pelas orações, pelo amor, compreensão e carinho. A todos e a todas que contribuíram para a realização deste trabalho meus sinceros agradecimentos. E que as amizades que conquistei possam ser abençoadas por Deus, assim como foram usadas para me abençoar e trazer alegria ao meu coração. Obrigada! Iaponira Sales de Oliveira 8 RESUMO O estuário do rio Mamanguape (ERM), localizado no litoral norte do estado da Paraíba, constitui um ecossistema de extrema importância na manutenção, conservação e preservação da diversidade biológica e cultural. Porém, os conflitos ambientais encontrados neste sistema ecológico é devido à crescente atividade antrópica, a exemplo: sobrepesca, introdução de técnicas impactantes, perdas de técnicas tradicionais, carcinocultura, extração de madeiras e coleta artesanal no período do defeso (caranguejo, lagosta). Estas atividades se não forem controladas poderão levar a sérios desequilíbrios ambientais, comprometendo até a própria existência do complexo estuário-manguezal e as comunidades tradicionais. Portanto, o objetivo geral deste trabalho foi identificar os principais locais de coleta do caranguejo-uçá (U. cordatus), por meio do conhecimento ecológico dos catadores do Estuário do Rio Mamanguape, utilizando Sistema de Informação Geográfica (SIG). Para isto foram utilizados métodos quantitativos e qualitativos. Em relação ao método qualitativo foram utilizadas as técnicas de entrevistas livres, semi-estruturadas e estruturadas, em que pôde-se entrevistar 55 catadores de caranguejo, realizou-se também turnês guiadas, e observações diretas e a elaboração do mapa oral mapa e mental. Já os métodos quantitativos foram a utilização de GPS (Global Positioning System), para a demarcação das camboas utilizadas para a coleta do caranguejo-uçá e, análises granulométricas do solo de mangue e o levantamento florístico dos tributários (camboas). Os resultados obtidos mostraram que foram identificadas e nomeadas 19 camboas, por meio de um informante-chave; das 19 camboas identificadas e/ou locais explorados durante a catação ou coleta do caranguejo uçá, destacaram-se quatro locais preferência para a retirada do caranguejo-uçá: camboas de Caracabu, Mero, Tanques e Macaco. Os dados coletados mostraram também que os caranguejeiros classificam o mangue, em: mangue mole, mangue duro e mangue areiado. As análises granulométricas, feita com os tipos de solo de mangue, corresponderam com a classificação feita pelos catadores do ERM. Um levantamento florístico realizado no mangue do tipo areiado mostrando uma diversidade florística bastante grande, com cerca de 9 famílias. Com estes resultados as comunidades estudadas demonstraram conhecimento em relação ao ambiente que estão inseridos. Portanto, a utilização do conhecimento ecológico tradicional (CET), atrelado ao conhecimento científico torna-se uma importante ferramenta para a fomentação de orientações as comunidades tradicionais, para o desenvolvimento sustentável dos recursos naturais, especificamente as áreas de manguezal do estuário do rio Mamanguape. Palavras-chave: Manguezal, Conhecimento ecológico tradicional, caranguejo-uçá. 9 ABSTRAT The estuary of the Mamanguape River (EMR), located on the north shore of the State of Paraíba is an ecosystem of an extreme importance for maintenance, conservation, and preservation of biological and cultural diversity. The main objective of this work is to identify the principal places of collection of the mangrove crab (U. cordatus). Quantitative and qualitative methods were used for this matter. Qualitative method consisted of free interviews, semi-structured interviews, conducted tours, direct observations and development of the oral and mind map, whereas quantitative methods used GPS (Global Positioning System) for demarcation of the estuarine areas and granulometric analysis of the mangrove soil. 19 estuarine areas were identified and named; four of these are preferred locations for the catching of the mangrove crab: Caracabu, Mero, Tanques and Macaco. Collected data show that the men who catch the crab assort mangrove into soft, hard and sandy; the granulometric analysis of the kinds of mangrove match the classification provided by the ERM crab catchers. These results show that the communities studied have knowledge about the environment where they are in. Therefore, the use of traditional ecologic knowledge (TEC) with the scientific knowledge is an important tool for the sustained development of the natural resources. KEY-WORDS: Mangrove, Traditional communities, Mangrove crab 10 SUMÁRIO PÁG 13 1.0 INTRODUÇÃO 17 2.0 OBJETIVO GERAL 17 2. 1 OBJETIVOS ESPECIFICOS 18 3.0 REFERÊNCIAL TEÓRICO 18 3.1 O QUE É MANGUE E SUAS CARACTERÍSTICAS BIOECOLÓGICAS 22 3.2 COMUNIDADES TRADICIONAIS, USO DOS RECURSOS DO MANGUEZAL E LEIS DE PROTEÇÃO 26 3.3 ASPECTOS BIOECOLÓGICOS DO CARANGUEJO-UÇÁ (Ucides cordatus) 27 3.4 TÉCNICAS DE COLETA DO CARANGUEJO-UÇÁ (U. cordatus) E OS PROVÁVEIS IMPACTOS AMBIENTAIS 29 3.5 CARACTERIZAÇÃO DO SOLO DE MANGUE 32 3.6 GEOPROCESSAMENTO E CONHECIMENTO TRADICIONAL 34 4.0 METODOLOGIA 35 4.1 População estudada 36 4.2 Caracterização da pesquisa 36 4.3 Estratégias para Sensibilização 37 4.4 Elaboração do Mapa mental e do Mapa utilizando o Sistema de Informação Geográfica 38 4.5 Análise Granulométrica 38 4.6 Caracterização da Flora adjacente da Camboa Caracabu 39 4.7 Análises dos dados 40 5.0 RESULTADOS E DISCUSSÃO 41 5.1 PERCEPÇÃO AMBIENTAL DOS CATADORES DE CARANGUEJO-UÇÁ DO ERM. 50 5.2 CARACTERIZAÇÃO DO SEDIMENTO DE MANGUE E DA FLORA LOCAL 53 5.2.1 Caracterização da parte alta da camboa Caracabu 59 5.2.2 Caracterização do mangue duro da camboa dos Tanques 61 5.2.3 Caracterização do mangue mole da camboa dos Tanques 65 5.3 TECNICAS PARA CAPTURA DO CARANGUEJO-ÚÇA 70 6.0 CONCLUSÃO 71 7.0 REFERÊNCIAS FIGURAS PÁG FIGURA 01: Raízes de mangue sapateiro (R. Mangle). 19 FIGURA 02: Distribuição dos manguezais no litoral brasileiro FIGURA 03 : Vista aérea da foz do Estuário do Rio Mamanguape. 20 34 FIGURA 04: Mapa de localização do Estuário do Rio Mamanguape e delimitação da APA da Barra de Mamanguape. (Figura adaptada de Paludo e Klonowisk, 1999). 35 11 FIGURA 05: Etapas que demonstram a coleta das amostras de solo das camboas, Caracabu, Tanques e Macaco, para análise granulométrica. a) Coleta do sedimento; b) amostra sendo depositada sobre o jornal. 38 FIGURA 06: Mapa das principais camboas utilizadas pelos catadores de caranguejo-uçá, elaborado a partir do mapa mental e do SIG. 42 FIGURA 07: Mapa mental elaborado pelos catadores de caranguejo-uçá destacando as principais camboas, utilizadas para a coleta do caranguejouçá, ou longo do Rio Mamanguape - Litoral Norte/PB. 42 FIGURA 08: Percentual de citações das camboas citadas pelos catadores de caranguejo-uçá como pontos produtivos no ERM, Litoral Norte da Paraíba FIGURA 09: Principais camboas citadas pelos catadores de caranguejo, como pontos produtivos no Estuário do rio Mamanguape Litoral Norte da Paraíba 45 45 FIGURA 10: Mapa mental elaborado pelos catadores de caranguejo-uçá destacando as principais camboas, utilizadas para a coleta do caranguejouçá, ou longo do Rio Mamanguape - Litoral Norte/PB. 47 FIGURA 11: Composição gravimétrica da parte alta da camboa de caracabu do ERM FIGURA 12: Visão parcial do mangue areiado: em primeiro plano observa-se a presença de gramíneas, em seguida L. racemosa. 53 57 FIGURA 13: a) Camboa de Caracabu, onde o solo de mangue é areiado e ocorre a presença de gramíneas. b) cactáceas encontradas na região. 58 FIGURA 14: c) Demonstração da diversidade vegetal da região da camboa de Caracabu, e e) o Brédo, como é denominado pelos catadores de caranguejos. 59 FIGURA 15: Representação da composição do mangue duro existente na camboa de Tanques, em relação as analises granulometrica. 60 FIGURA 16: Demonstração do mangue duro, apresentando uma grande quantidade de silte e argila e a presença de caranguejo-uçá. 60 FIGURA 17: Demonstração da composição do mangue mole, existente na camboa dos Tanques mediante as analises granulometricas. 62 FIGURA 18: Mangue mole: e) aspecto pastoso do substrato sitico-argiloso. f) predominância de R. mangle (sapateiro) 62 FIGURA 19: Mapa dos tipos de solo das principais camboas, utilizadas para a coleta do caranguejo-uçá no ERM. 64 12 FIGURA 20: Catador de caranguejo demonstrando o “ferro de córvo” ou “cavadeira” instrumento utilizado para a técnica de captura por tapamento. 66 FIGURA 21: Confecção da redinha, armadilha utilizada para a captura do carangue-uçá. 66 FIGURA 22: Representação da produtividade em relação à quantidade de cordas de caranguejo-uçá retidas das principais camboas do ERM. 68 TABELAS TABELA 01: Camboas georreferenciadas através da turnê guiada realizada junto a um informante-chave, catador de caranguejo-uçá do ERM. TABELA 02: Denominação dada pelos catadores de caranguejouçá em relação a sua concepção de mangue PÁG 40 51 TABELA 03: Amostras coletadas nas Camboas mais citadas pelos catadores de caranguejo-uçá. 51 TABELA 04: Resultados da Granulometria nas amostras coletadas nas Camboas mais citadas pelos catadores de caranguejo-uçá do ERM. 52 TABELA 05: Espécies vegetais catalogadas, existentes na camboa de Caracabu, uma das mais utilizadas pelos catadores de caranguejos do ERM. 56 ANEXOS ANEXO A : PORTARIA IBAMA Nº 034 /03-N, DE 24 DE JUNHO DE 2003 PÁG 89 ANEXO B: DECRETO Nº 6.040, DE 7 DE FEVEREIRO DE 2007. Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais 92 ANEXO C: Modelo do questionário semi-estruturado a aplicado aos pescadores e coletores referente aos recursos faunísticos explorados na região do estuário Rio Mamanguape. 94 13 INTRODUÇÃO Os manguezais são ecótonos entre o ambiente marinho e terrestre, ocupando cerca de 70% da área costeira tropical, de grande importância para a estabilidade e manutenção da orla litorânea (TWILLEY et al., 1997; DUKE,1992). Ainda, essencial à ciclagem de nutrientes, relações ecológicas e tróficas dos ambientes estuarinos, relevante como fonte energética e alimentar para a produção primária e secundária marinha (LEE, 1995, JENNERJAHN & ITTEKKOT, 2002). Fornecem grandes quantidades de detritos orgânicos que servem de base às cadeias alimentares; protegem a linha de costa, a margem dos estuários, contra a erosão e as áreas ribeirinhas contra as enchentes; além disso, tem um papel ecológico muito importante como zona de contato entre o meio terrestre e o meio aquático, alimentando a cadeia trófica costeira (PROST E LOUBRY, 2000). Ainda segundo estes autores, servem de berçário e habitat para algumas espécies da ictiofauna, carcinofauna e malacofauna, como também de refúgio para várias espécies animais ameaçadas de extinção como: aves marinhas, répteis e mamíferos. Entre a macrofauna comumente encontrada nos ecossistemas de manguezais, os caranguejos braquiúros são importantes tanto pela diversidade de espécies, como por sua densidade e biomassa total (SKOV et al., 2002; LITULO, 2005; (Ronnback, 1999), com destaque para a espécie Ucides cordatus (LITULO, 2005). Amplamente distribuído na costa do Atlântico Ocidental, entre 25ºN e 27ºS (Melo, 1996), constitui-se um dos mais conspícuos componentes da macrofauna bentônica dos manguezais, desempenhando importante papel ecológico, devido à sua posição na cadeia alimentar, à participação nos ciclos biogeoquímicos de diferentes elementos e à realização de oxigenação e drenagem do sedimento através de escavação (Jones, 1984). Desempenham outras funções devido à sua elevada biomassa, papel bioturbador, e atuação no fluxo energético (AMOUROUX & TAVARES, 2005). O U. cordatus é considerado um dos principais representantes dos Ocypodidae, pois além de exercer importante papel ecológico neste ambiente (KOCH, 1999), é um dos recursos pesqueiros estuarinos mais explotados no Brasil (FAUSTO-FILHO, 1968). Sua exploração deve-se, particularmente, ao grande porte que atinge quando adulto (PINHEIRO et al., 2005; DIELE et al., 2005), bem como por sua carne de excelente valor nutricional (FISCARELLI, 2004). 14 Nos últimos anos houve uma intensificação dos estudos sobre a biologia desta espécie no Brasil (MARTINEZ et al., 1999; PINHEIRO & FISCARELLI, 2001; SANTOS, 2002; ABRUNHOSA, et. al 2002; FISCARELLI & PINHEIRO, 2002; ALVES & NISHIDA, 2003; GLASER & DIELE, 2004), demonstrando sua importância ecológica e econômica para a conservação e sustentabilidade do ecossistema de manguezal. Os mais recentes a respeito da espécie, referem-se ao seu crescimento (PINHEIRO et al., 2005), estrutura populacional (DIELE et al., 2005), crescimento relativo (PINHEIRO & HATTORI, 2006), uso como bioindicador de contaminantes do sedimento (NUDI et al., 2007), aspectos sócio-econômicos (MAGALHÃES et al., 2007), ecologia trófica (NORDHAUS & WOLFF, 2007) e estoque espermático (SANT´ANNA et al., 2007). Os manguezais, além da importância biológica e ecológica já mencionada, possuem um papel social, cultural e econômico primordial: produzem bens e serviços para as populações locais, através da exploração de sua fauna e de sua flora, gerando recursos naturais primários, a exemplo da captura do caranguejo-uçá, que envolve vários aspectos socioeconômicos: a) cultural, historicamente ativo entre as comunidades de pescadores que habitam o entorno dos manguezais, b) financeiro, uma vez que este recurso é bastante valorizado, e c) nutricional, como fonte de proteína animal indicada para o consumo humano (RODRIGUES et al., 2000). Neste sentido, esta espécie destaca-se, como um dos recursos mais explorados, nos manguezais do litoral brasileiro, onde muitas comunidades tradicionais ainda sobrevivem dessa prática (Geo Brasil, 2002) constituindo um importante recurso pesqueiro, de elevado valor sócio-econômico, gerando emprego e renda pra milhares de famílias que vivem nas zonas litorâneas (Nordi, 1994; Ivo e Gesteira,, 1999). Devido à intensa exploração e a importância social, econômica, cultural da pesca do caranguejo-uçá, associada ao aumento do esforço de pesca sobre o recurso, é crescente o interesse de vários segmentos da sociedade na proteção e no gerenciamento pesqueiro e no extrativismo sustentável. A Portaria N0 52 de 30 de setembro de 2003 (IBAMA, 2003), regula a exploração da espécie nos Estados do Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina, proibindo em qualquer época do ano a captura de fêmeas ovígeras e de indivíduos de ambos os sexos com largura da carapaça inferior a 6,0cm, bem como o uso de armadilhas, petrechos, instrumentos cortantes ou produtos químicos para sua captura. O defeso da espécie nesses estados foi instituído entre 01 de outubro a 30 de novembro para ambos os sexos, e entre 01 a 31 de dezembro para as fêmeas, quando os espécimes em questão não podem ser capturados para comercialização. 15 A catação do caranguejo é feita com as mãos nuas e auxiliada por instrumentos rústicos adaptados pelo próprio catador, e exercida no mangue nos horários de maré baixa (NORDI, 1992). Com relação ao perfil dos catadores de caranguejo, alguns autores assim os caracterizam: formam grupos marginalizados economicamente, que se instalam nas periferias das zonas urbanas litorâneas, predominantemente excluídos da agricultura, desempregados de indústrias, ou que não conseguem se firmar na pesca de alto mar, voltando-se para os manguezais. Desta forma, o manguezal acaba tornado-se a única alternativa viável para a garantia da sobrevivência de grupos com tais exclusões, por ser este um ecossistema de livre acesso e o caranguejo-uçá um recurso de propriedade comum. (CORDELL 1989; NORDI, 1994; ALVES, 2003). Portanto, o trabalho com enfoque teórico-metodológico na etnoecologia é de grande importância para compreender melhor, como esses povos, comportam-se frente aos recursos faunísticos extraídos, consumidos e comercializados (Marques, 1995, Thé, 2003; Mourão & Nordi, 2006; Begossi, 2006, Souto 2004, Alves e Nishida,2003) gerando subsídios para a elaboração de plano de manejo, manutenção da diversidade biológica, cultural e aperfeiçoamento das portarias que regulamentam as atividades de exploração dos recursos faunísticos. Através da atividade cotidiana, os pescadores adquirem uma extensa percepção espacial do ambiente o que lhes garante identificação dos melhores pontos de coleta dos recursos biológicos. Esse conjunto de conhecimentos é utilizado nas estratégias de pesca e pode ser útil para o manejo de estoques pesqueiros (DIEGUES, 1983; SILVANO, 1997). A percepção espacial do ambiente por comunidades tradicionais é valiosa, especialmente em lugares onde há poucos registros deste conhecimento. Assim, a integração de informação de fontes como imagens de satélite, fotografias aéreas ou imagens digitais, conhecimento ecológico tradicional e manejo de sistemas permite uma oportunidade importante para aplicar conhecimento ecológico tradicional para a avaliação de impactos ambientais e ainda colabora para elaboração de planos de manejos (JONES, 1984). Conhecer bem os ecossistemas locais, assim como os fatores ambientais que influenciam a distribuição e a abundância dos recursos é fundamental na definição das estratégias de pesca, caça e coleta que implicam escalas (espaciais e temporais) e instrumentos (MOURA, & MARQUES, 2007). Para Gragson e Blount (1999), a etnoecológica é usada para cobrir toda uma gama de estudos de história natural derivados de populações locais e incluindo outras áreas de estudo, mas não se restringindo à história natural a partir de uma perspectiva antropológica. A 16 etnoecologia procura, então, fornecer um entendimento dos sistemas de conhecimento de populações locais (op. cit. 1999). Nazarea (1999) lembra que a etnoecologia investiga os sistemas de percepção, cognição e uso do ambiente natural, mas também não pode mais ignorar os aspectos históricos e políticos que influenciam uma dada cultura, bem como as questões relacionadas à distribuição, acesso e poder que dão forma aos sistemas de conhecimento e nas práticas deles resultantes. Para Marques (1999), uma análise ecossistêmica tradicional com base nos fluxos energéticos e ciclos da matéria são primordiais, mas incompleta para entender a inserção humana no ecossistema, tornando- se necessária uma análise mais abrangente que seja capaz de incluir a rede informacional/cultural gerada e/ou utilizada pela espécie biológica Homo sapiens. Os pescadores fazem parte de uma rede ecossistêmica e suas interações não devem ser observadas apenas do ponto de vista do uso e apropriação dos recursos, mas no contexto das relações sociais. No que se refere à tomada de decisões, eles estão diariamente agindo não só como “forrageadores” que procuram fazer escolhas ótimas, mas também, se comportando como fiscalizadores do ambiente (Montenegro et. al 2001). Neste sentido, o presente trabalho teve como principal objetivo a identificação dos locais preferenciais de coleta do caranguejo-uçá (U. cordatus) pelos catadores das comunidades de Tramataia e Três Rios pertencentes ao Estuário do rio Mamanguape, litoral Norte do estado da Paraíba. 17 2.0 OBJETIVO GERAL Identificar e caracterizar os principais locais de coleta do caranguejo-uçá, U. cordatus, (LINNAEUS, 1763), por meio do conhecimento ecológico dos catadores do Estuário do Rio Mamanguape, utilizando Sistema de Informação Geográfica (SIG) 2.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Analisar a percepção ambiental dos catadores de caranguejo-uçá em relação ao Estuário do Rio Mamanguape (ERM) Identificar e mapear as áreas preferenciais de coleta do caranguejo-uçá, por meio do Sistema de Informação Geográfica; Obter dos catadores um mapa mental e oral do estuário do rio Mamanguape; Descrever os tipos de mangues, quanto à classificação feita pelos catadores de caranguejouçá do ERM; Caracterizar os tipos de solo de mangues quanto a sua granulometria nos principais locais de coleta; Realizar um levantamento florístico dos principais pontos de coleta. Registrar o conhecimento ecológico tradicional dos catadores onde é capturado o caranguejo-uçá; Identificar qual a principal técnica de coleta do cranguejo-uçá, utilizada pelos caranguejeiros estudados; 18 3.0 REFERÊNCIAL TEÓRICO 3.1 O QUE É MANGUE E SUAS CARACTERÍSTICAS BIOECOLÓGICAS ? A palavra mangue de acordo com estudos realizados por Vannucci (1999) é de origem africana, evidenciados em cartas náuticas do século XV, por portugueses que estiveram na costa ocidental da África, algumas destas cartas relatam que os “alagados” correspondiam aos manguezais. Mais tarde os espanhóis aprenderam a adotar as palavras mangle e manglar, que são usadas em todos os países de língua espanhola. Em inglês mangrove, significa “uma pequena floresta feita de mangue”. No entanto as palavras mangue e mangrove tornaram-se sinônimos de perigo, confusão, terras inóspitas, não sendo reconhecidos nem seu valor intrínseco, nem os serviços que prestam à humanidade, nem o papel que tem no grande drama da natureza (VANNUCCI, 1999). O termo "manguezal" geralmente faz alusão às plantas bem como a comunidade de florestas. De modo a evitar equívocos, Macnae (1968) propôs que "mangue" deveria referir-se à comunidade de floresta enquanto que "manguezal" às espécies de planta individuais. Duque (1992) definiu o termo manguezal como sendo, "árvores, arbustos, palmeiras ou samambaia de solo, geralmente excedendo meio metro de altura, e que normalmente crescem acima do nível do mar na zona ou região intertidal de ambientes litorais marinhos, ou margens estuarinas.” Esta definição é aceitável, porém admitindo-se que samambaias de solo sejam provavelmente consideradas constituintes de manguezais ao invés de verdadeiros manguezais. O termo “manguezal” também é usado como um adjetivo, como em "árvore de manguezal" ou "fauna de manguezal." Muitas vezes as florestas de manguezal são conhecidas e chamadas como "florestas de maré", "bosques litorais", ou "florestas tropicais oceânicas." A palavra "mangrove" (manguezal) normalmente é considerada uma combinação de palavras, a primeira vinda do Português "mangue" a qual forma o radical lexical do termo referido e da palavra Inglesa "grove" (arbusto). As palavras francesas correspondentes são "manglier" e "paletuvier" (Macnae, 1968) enquanto o termo espanhol é "manglar." Os holandeses usam o termo "vloedbosschen" ao se referirem a comunidade de manguezal e "mangrove" para as árvores individuais. Na Alemanha seguem o padrão Americano de uso. O termo "mangro" é um nome comum para Rhizophora no Suriname (Chapman, 1976). Acredita-se que todas estas palavras originaram-se do termo Malasiano, "manggi-manggi" que significa "acima da 19 terra". Esta palavra já não é usada na Malásia, no entanto é comumente usada na Indonésia oriental para se referir a espécies de Avicennia (mangue-preto, canoé ou siriúba). Os manguezais são compostos por plantas lenhosas que crescem na interface entre a terra (solo) e o mar, seja em latitudes tropicais ou subtropicais. Associados a estas plantas estão micróbios, fungos, outras plantas e animais os quais constituem a comunidade de florestas de manguezal ou apenas mangue, (MACNAE, 1968). O mangue e seus fatores abióticos associados constituem o ecossistema de manguezal. De acordo com Tomlinson, (1986), ecologicamente o termo "mangue" também se refere à vegetação que constitui o ecossistema "manguezal" o qual está associado a um complexo de áreas úmidas sob a influência das marés, que consiste nas florestas de mangue, planícies salinas e outros habitats associados dentro da zona inter-marés das latitudes tropicais e subtropicais, estas áreas úmidas entre-marés são compostas por um mosaico de componentes interatuantes, vinculados pelos fluxos de água, sedimentos, nutrientes, matéria orgânica e populações animais que se movem entre seus elementos componentes. A floresta de mangue, durante a maré-cheia, permanece inundada e, quando a maré recua, deixa atrás de si um emaranhado caótico de raízes de todo tipo, que alcançam até dois ou três metros de altura, observado na figura 01; troncos mais ou menos recobertos por mucilagem, liquens e algas que crescem também sobre os galhos e emergem do lodo (VANNUCCI, 1999). FIGURA 01: Raízes de mangue sapateiro (R. Mangle). FONTE: José da Silva Mourão, 2008. Do ponto de vista geográfico, estima-se, que os ecossistemas de mangue cobriam 181.000 km2 em todo o mundo (Spalding et al., 1997), de acordo com Barbieri (2006) este valor agora pode ser inferior a 150.000 km2. O Brasil é considerado o país que tem a maior 20 área de manguezal do planeta, são 25.000 km2, distribuídos em 7.408 km de orla litorânea, que vão do extremo norte do Amapá até São Francisco do Sul, em Santa Catarina (BARBIERI, 2006), figura 02: FIGURA 02: Distribuição dos manguezais no litoral brasileiro FONTE: in Alves, 2001. Os manguezais mais desenvolvidos crescem ao longo de litorais tropicais úmidos protegidos; por exemplo, nos sistemas de delta formados pelos principais rios, tais como o Ganges-Grahmaputra, Irrawaddy e Niger, e em litorais protegidos por grandes massas de terra como, por exemplo, os estreitos de Malacca, Borneo e Madagascar, tais áreas muitas vezes são locais estratégicos para assentamentos humanos densos e são submetidos a uma alta pressão populacional (MACINTOSH e ASHTON, 2005). Por outro lado, há alguns litorais abertos com ampla cobertura de mangue e pouquíssimas pessoas, como é o caso, por exemplo, do estado do Maranhão, no Brasil (MACINTOSH e ASHTON, 2005). A riqueza biológica dos ecossistemas costeiros faz com que essas áreas sejam os grandes “berçários” naturais, tanto para as espécies características desses ambientes, como para peixes anádromos e catádromos e outros animais que migram para as áreas costeiras 21 durante, pelo menos, uma fase do ciclo de vida (SCHAEFFER-NOVELLI, 2005). A autora considera um dos ecossistemas mais complexos do ambiente marinho, não apenas por sua diversidade biológica, mas principalmente devido à diversidade funcional, seus sistemas tendem a resistir mais eficientemente às perturbações tanto naturais quanto induzidas pelo ser humano. O manguezal pode ser tratado como um recurso renovável, porém finito quando se considera a produção natural de mel, ostras, caranguejos, camarões, siris e mariscos, além das oportunidades recreacionais, científicas e educacionais, também podem ser considerados como recursos não-renováveis, quando o espaço que ele ocupa é substituído por prédios, atracadouros, residências, portos, marinas, aeroportos, rodovias, salinas, aqüicultura, receptáculos de despejos de efluentes líquidos, disposição de resíduos sólidos ou ao extrativismo de produtos florestais etc. (SCHAEFFER-NOVELLI, 2005). Assim sendo, a importância dos manguezais ultrapassa o aspecto ecológico, e ganha importância econômica, segundo Balmford (2002), uma área de manguezal preservada, possui produtividade econômica superior em 70% a mesma área quando utilizada, por exemplo, para a carcinocultura, mesmo tendo em vista alta lucratividade desta atividade. O manejo de manguezais pressupondo intervenções antrópicas, não pode ser baseado unicamente em considerações de caráter biológico. Deve considerar fatores sócioeconômicos, incluindo seu potencial em gerar bens e serviços. Entende-se por bens os produtos retirados direta ou indiretamente de determinado ecossistema. Serviços compreendem as funções ecológicas exercidas pelo mesmo, ciclagem de nutrientes, manutenção da diversidade biológica. Estes aspectos representam que o ecossistema não necessariamente são bens ou serviços, mas que são valiosos para parte da sociedade (PEDRO e FIDELMAN, 2001). Em relação à fauna dos manguezais, marismas, estuários e deltas, observa-se que este têm sua origem nos ambientes terrestre, marinho e de água doce, permanecendo nesses ecossistemas toda sua vida como residentes ou apenas parte dela, na condição de semiresidentes, visitantes regulares ou oportunistas. Seja qual for à condição, esses animais estão sempre intimamente associados e dependentes desses ecossistemas. Ainda falta muito para um conhecimento completo sobre o número total das espécies da fauna e da flora existentes nos manguezais, nas marismas e, por que não dizer em toda a Zona Costeira Brasileira. Em relação à cobertura vegetal, o manguezal brasileiro apresenta quatro gêneros. Gênero Rhizophora (Mangue vermelho, sapateiro ou verdadeiro), encontra-se geralmente nas franjas dos bosques em contato com o mar, ao longo dos canais, na desembocadura de alguns 22 rios ou nas partes internas dos estuários onde a salinidade não é muito elevada. O Gênero Avicennia que corresponde a Siriúba, mangue preto ou canoé ocupa terrenos da zona entremarés, ao longo das margens lamacentas dos rios ou diretamente exposta às linhas de costa, desde que submetidas a intrusões salinas. E o Gênero Laguncularia, Mangue branco ou tinteira, encontrado em costas banhadas por águas de baixa salinidade, às vezes ao longo de canais de água salobra ou, em praias arenosas protegidas, e um gênero monoespecífico, i.e., possui apenas uma espécie Laguncularia racemosa, encontrada associada aos manguezais ao longo de todo litoral. Conocarpus tem como principal representante o Conocarpus erectus, um arbusto nativo brasileiro encontrado nas dunas litorâneas, principalmente perto de manguezais, também conhecido como mangue de botão, pelas comunidades tradicionais, ocorrem em regiões tropicais, suas flores e frutos se apresentam em densos aglomerados (SCHAEFFER-NOVELLI, 2005). Os manguezais de todo o mundo têm em comum uma notável semelhança florística e estrutural, devido às adaptações convergentes das poucas espécies de árvores, independentemente da região geográfica. Esta similaridade de acordo com Lana (2004) é certamente a causa dos manguezais serem tratados como sistemas homogêneos ou como unidades de paisagem naturais, tanto do ponto de vista científico como particularmente para a legislação ambiental. 3.2 COMUNIDADES TRADICIONAIS, USO DOS RECURSOS DO MANGUEZAL E LEIS DE PROTEÇÃO Povos e Comunidades Tradicionais são grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupa e usa territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição. Este conceito faz parte do Decreto Nº 6.040 de 7 de fevereiro de 2007, Art. 3º parágrafo I, (ver Anexo B) do Governo Federal, o qual institui a política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Para Cavalcante (1992), povos e comunidade tradicional é caracterizado pela diversidade de suas atividades produtivas, atributo que assegura sua sobrevivência, contanto que essa diversidade produtiva esteja relacionada com o padrão de necessidades e recursos disponíveis no local. Guarim (2000) considerada comunidades tradicionais aquelas que dependem culturalmente do extrativismo, ocupam ou utilizam-se de uma mesma área geográfica há várias gerações. 23 E segundo Diegues (2000) as comunidades classificadas como tradicionais são as que apresentam um modelo de ocupação de espaço e uso dos recursos naturais voltado principalmente para a subsistência, com fraca articulação com o mercado, baseado em uso intensivo de mão-de-obra familiar, tecnologias de baixo impacto derivado de conhecimentos patrimoniais e, habitualmente, de base sustentável. Dentro das populações tradicionais têm-se as indígenas e as não-indígenas; como exemplos dessas últimas existem as comunidades caiçaras, os sitiantes e roceiros, os quilombolas, ribeirinhos, os pescadores artesanais e os grupos extrativistas, cuja vida está atrelada a significados simbólicos, míticos e culturais, sendo o uso dos recursos relativo à vida material, mas também ao universo simbólico (SALDANHA, 2005). Diegues et al. (op. cit.) citam ainda outros tipos, como: caipiras, babaçueiros, jangadeiros, pantaneiros, pastoreio, praieiros, caboclos/ribeirinhos amazônicos, varjeiros, açorianos e sertanejos/vaqueiros. Algumas comunidades tradicionais se reproduzem explorando uma multiplicidade de habitats: as florestas, os estuários, os mangues e as áreas já transformadas para fins agrícolas. A exploração desses habitats diversos exige não só um conhecimento aprofundado dos recursos naturais, das épocas de reprodução das espécies, mas a utilização de um calendário complexo dentro do qual se ajustam, com maior ou menor integração, os diversos usos dos ecossistemas (BEGOSSI, 2004). Os padrões de uso de recursos são produtos das percepções e imagens formadas culturalmente sobre o ambiente (RUDDLE, 2000 apud DIEGUES, 2001), onde, segundo Saldanha (2005), as diferentes formas de uso e as diferentes práticas de manejo estão relacionadas a um conhecimento prévio do ambiente e do recurso. Como por exemplo: a captura do caranguejo-uçá (U. cordatus), a qual define a existência de um grupo ocupacional, denominado caranguejeiro, cuja reprodução social e material depende quase exclusivamente da coleta desse recurso, durante praticamente todo o ano (NORDI, 1992). O uso dos recursos bióticos e abióticos por comunidades tradicionais se fundamenta num conjunto de saberes, saber-fazer e crenças na exploração da natureza, fundado nas tradições culturais e na relação com o ambiente. Para Diegues (2000), a valorização do conhecimento e das práticas de manejo de comunidades tradicionais indígenas e nãoindígenas deveria construir uma das pilastras de um novo conservacionismo nos países do Sul. O autor ainda enfatiza a grande necessidade de interagir os conhecimentos tradicionais e acadêmicos no planejamento e execução de ações conservacionistas. Em estudos etnoecológicos, uma ênfase tem sido dada aos sistemas de conhecimentos (corpus) e de práticas (práxis) das comunidades tradicionais. Toledo (1992) sugere a 24 etnoecologia como um método cientificamente aceitável para a avaliação das formas de apropriação da natureza. De acordo com Marques (2001), etnoecologia é o campo de pesquisa (científica) transdisciplinar que estuda os pensamentos (conhecimentos e crenças), sentimentos e comportamentos que intermediam as interações entre as populações humanas que os possuem e os demais elementos dos ecossistemas que as incluem, bem como os impactos ambientais daí decorrentes. A etnoecologia analisa não somente o conhecimento que uma sociedade adquiriu sobre o meio ambiente, mais também dá condições de analisar a visão de natureza de cada sociedade, já que ela é habitada, pensada, trabalhada e transformada pelo ser humano. Neste sentido, a percepção ambiental, torna-se um elemento importante para compreender a capacidade que o ser humano possui de gerar informações a partir dos impactos ambientais, que constituem seu cotidiano, a partir dessa produção, o ser humano conhece seu ambiente e é capaz de, sobre ele produzir significados e ações. Viana et al. (2006) citam que os estudos dos processos mentais, relativos à percepção ambiental são fundamentais para que ocorra melhor entendimento das inter-relações do ser humano com o meio ambiente a partir de suas expectativas, julgamentos e condutas. Mediante a percepção, o indivíduo ou grupo enxerga, interpreta e agem no meio ambiente de acordo com seus interesses, necessidades e desejos, recebendo influências, sobretudo de um conjunto de elementos que compõe sua herança cultural (OLIVEIRA et al. 2007). As percepções sociais e ambientais em relação à importância dos manguezais variaram notavelmente no Brasil, desde os tempos coloniais até os dias de hoje. Como afirma Diegues (2001) os mangues foram utilizados pelas populações indígenas antes da chegada dos colonizadores europeus como atestam os montes de ostras retiradas das raízes de mangue. No período colonial, além de fonte de alimento (peixes e crustáceos), o mangue era utilizado para retirada de madeira de lenha e tanino para curtumes. Já no século XVIII a extração de madeira de mangue era tamanha, particularmente no Nordeste onde era usada como lenha para as usinas de açúcar, que o Rei D. José em Alvará com força de lei datado de 1760 proíbe o corte, reservando a vegetação para extração do tanino para os curtumes da metrópole Diegues (2001). Até as primeiras décadas do século XX, as áreas de mangue eram exploradas de forma pouco intensa para a pesca, construção de “viveiros” de peixes (aqüicultura extensiva) em áreas estuarinas, pesca esportiva, “caiçaras” (galhos de mangue usados para construção de habitats para peixes) e retirada de material para construção de casas e cercos. No Nordeste, especialmente no Rio Grande do Norte, áreas de mangue começaram a ser utilizadas para construção de salinas. Com exceção dessa última atividade (salinas), as áreas de mangue 25 ainda hoje são utilizadas por comunidades de pescadores e extrativistas que delas dependem para sua sobrevivência (DIEGUES, 1987). Os manguezais passaram a ser considerado como áreas insalubres, desde o final do século XIX até meados do século XX. Como conseqüência desta concepção, manguezais eram rotineiramente erradicados para reduzir a insalubridade de áreas costeiras ou mesmo convertidos para outros usos. Já em meados do século passado, de acordo com Lana (2004) passou a ser influente a idéia de que os manguezais, assim como as matas ciliares, eram importantes como estabilizadores de baixios e que a sua remoção poderia acelerar processos de erosão em regiões costeiras. O Art. 2 da lei 4771, de 15 de setembro de 1965, que instituiu o Código Florestal, considerou como de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação naturais situadas “nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues”. Manguezais são ainda tecnicamente tratados como Reservas Ecológicas (Art. 18 da Lei n. 6938, de 31 de agosto de 1981, Decreto n. 89336, de 31 de abril de 1984 e Resolução n. 4 do CONAMA, de 18 de setembro de 1985). A própria Constituição Federal de 1988 faz menção, em seu artigo 20, aos bens da união, que compreenderiam os assim chamados terrenos de marinha e seus acrescidos. Neste contexto da legislação, os manguezais são considerados bens da União pela Constituição Federal e, como tal, inalienáveis, públicos e de uso comum. Sua jurisdição é competência da Delegacia de Patrimônio da União, que, no entanto não pode distribuir títulos de posse ou propriedade. A dependência da maior parte da população costeira aos ecossistemas marinhos é fato que se impõe à observação, à reflexão e ao debate interdisciplinar e interinstitucional, no sentido de: a) chamar a atenção para as questões de superexploração, degradação e esgotamento; b) mais, sobretudo, chamar atenção para o direito de uso dos recursos comuns e posse dos territórios costeiros e marinhos construídos, milenarmente, pelas populações tradicionais; c) desvelar as especificidades sociais e ambientais dessas comunidades tradicionais, em defesa do uso seletivo e da lícita apropriação dos mesmos; d) se buscar um denominador comum para a sustentabilidade ou durabilidade dessa milenar relação entre o homem e meio ambiente, de modo a se ter um uso equilibrado dos recursos produzidos pelos ecossistemas em presença; e) e por fim, no sentido de minimizar conflitos e sugerir caminhos alternativos para a intervenção antrópica no universo costeiro (FURTADO et all, 2006). 26 3.3 ASPECTOS BIOECOLÓGICOS DO CARANGUEJO-UÇÁ (Ucides cordatus) O caranguejo-uçá, Ucides cordatus (Linnaeus, 1763) pertencente à Família Ocypodidae (Rafinesque, 1815), e ocorre em manguezais distribuídos desde a Flórida (USA), incluíndo o Golfo do México, América Central, Antilhas, norte da América do Sul, Guianas até Brasil (do Pará até Santa Catarina) (Holthuis, 1959; Manning & Provenzano Jr., 1961; Bright, 1966; Alcântara-Filho, 1978; (Costa, 1979 e Melo, 1996). A espécie Ucides cordatus é popularmente conhecida no Brasil como “caranguejouçá”, “castanhão”, “caranguejo-verdadeiro” ou “legítimo” e “comum” (BRANCO, 1993). No Nordeste do Brasil, o caranguejo-uçá, também é conhecido vulgarmente por caranguejoverdadeiro e caranguejo-comum (Costa, 1979). Em Pernambuco, a denominação mais utilizada é caranguejo-uçá e caranguejo-çá. O caranguejo-uçá, provavelmente se alimenta dos fungos ou das proteínas das folhas que são produzidas com a decomposição e armazenadas nas tocas (NASCIMENTO, 1993). Entretanto, Costa (1979) afirma que o caranguejo-uçá se alimenta de vegetais superiores, folhas, frutos, sementes de Avicennia schaueriana e raiz (mangue), e menores proporções da ingestão de bivalves e gastrópodes, algas e poríferos, além de sedimentos, o que evidencia esta espécie como onívora. O hábito alimentar do caranguejo-uçá contribui no processamento das folhas que caem, na incorporação de seus nutrientes ao solo e no aumento da disponibilidade de alimento para a cadeia detritívora, papel importante na cadeia alimentar do ecossistema manguezal (LEITÃO; SCHWAMBORN, 2000; NORDHAUS; WOLF, 2000). Os caranguejos machos, além de maiores e mais pesados que as fêmeas são mais numerosos. Essa disparidade entre os sexos é comum em caranguejos e em outros crustáceos, podendo ser explicada por várias causas como: migração reprodutiva, diferença comportamental, diferenças no tempo de vida e na taxa de mortalidade (MARGALEF, 1977). O ciclo sexual dos machos acontece mais rápido do que o das fêmeas e também se tornam sexualmente maduros primeiro (MOTA ALVES, 1975). São três as fases do ciclo de vida do caranguejo: a muda (ecdise), o acasalamento e a desova (NASCIMENTO, 1993). O caranguejo-uçá é uma espécie cavadora que proporciona a oxigenação e drenagem do sedimento (JONES, 1984). Apresenta uma coloração arroxeada, azulada ou avermelhada. O habitat do caranguejo-uçá é composto de galerias individuais, que variam entre 0,5 e 1,5 m de profundidade, construídas sob as árvores de mangue em zonas atingidas pelas marés, onde vive entocado durante a preamar e realiza a saída no início da baixa-mar (ALCÂNTARAFILHO, 1978; ALVES, 2002; CASTRO, 1986; COSTA, 1979; LUTZ, 1912; NASCIMENTO; COSTA, 1983; PAIVA; BEZERRA; FONTELES-FILHO, 1971). Tem o 27 hábito de limpar as tocas, começando essa atividade quando as galerias encontram-se parcialmente encobertas pela água e cessando quando as tocas estão totalmente descobertas, havendo sincronismo entre os habitantes. Mota Alves e Madeira Junior (1980) afirmam que o caranguejo-uçá, além de habitar tocas, onde o consumo de oxigênio é baixo, vive sobre manguezal, onde o teor de oxigênio é mais elevado. O caranguejo-uçá tem um papel fundamental na manutenção do equilíbrio do mangue. De acordo com Branco (2007), esta espécie escava galerias com profundidade média de 85 cm, nas zonas de meso e supralitoral. Quando fazem as galerias, revolvem o solo mais profundo, oxigenando e distribuindo nutrientes, que depois serão levados para o mar com as cheias e vazantes de maré. Alimentando-se, principalmente de folhas velhas e amareladas que caem das árvores do mangue, ele devolve para o ambiente a matéria orgânica rica em nutrientes. E não é apenas consumindo as folhas que o caranguejo-uçá colabora no enriquecimento do mangue, mas também fazendo um estoque de folhas nas galerias. Assim, a matéria orgânica fica retida no manguezal e não se perde quando a maré fica vazante e as águas começam a baixar. 3.4 TÉCNICAS DE COLETA DO CARANGUEJO-UÇÁ (U. cordatus) E OS PROVÁVEIS IMPACTOS AMBIENTAIS As técnicas de coleta do caranguejo-uçá são essencialmente manuais (PAIVA, 1997). No Brasil, para a obtenção deste recurso são utilizadas várias técnicas, tais como: o “braceamento”, o “tapamento”, a “ratoeira”, a “redinha”, o “raminho” (NORDI, 1992), o “pé” (NUNES, 2004), o “laço” (MANESCHY, 1993), o “gancho” e o “cambito” (ECOTUBA, 2006). As técnicas tradicionais são mais seletivas e menos produtivas e, por isso, proporcionam um uso provavelmente mais sustentável (NUNES, 2004), porém, Silvano (2004) relata que existem evidências de que a pesca artesanal pode ocasionar redução no estoque de um recurso. Em Pernambuco, até o início da década de 90, a coleta de caranguejouçá era realizada, principalmente, pelo método do braceamento. No entanto, uma nova técnica de captura, denominada de redinha foi introduzida em 1992 (SILVANO, 2004). A captura do caranguejo-uçá com a redinha tem sido apontada como uma prática predatória, devido a não retirada das armadilhas produzida com fios de nylon das galerias onde vivem os caranguejos, por esta também ser a armada com auxílio de raízes escoras ou aéreas de mangue (Rhizophora mangle), cuja vegetação também é utilizada na marcação das galerias (PONTES, 2000). 28 A técnica da “redinha” foi inventada, provavelmente, no início da década de 1980, no Rio de Janeiro, e levada para Vitória (ES) por dois catadores oriundos do estado da Bahia, em 1986 (NUNES, 2004). Na Paraíba, a técnica da “redinha” é tida como predatória para o recurso caranguejo-uçá desde 14 de outubro de 1996, pela Portaria Nº 4 da Superintendência Estadual do IBAMA, que proibiu terminantemente essa forma de captura. Hoje, a Portaria IBAMA Nº 034/03-N de junho de 2003 (ver Anexo A), reforça a proibição para as regiões do Norte e Nordeste, permitindo a coleta do caranguejo apenas pelo método de braceamento, com o auxílio de gancho ou cambito com proteção na extremidade. A maioria dos trabalhos realizados sobre a técnica da “redinha” a descreve de forma superficial (NASCIMENTO, 2007). A “redinha”, de acordo com Barbieri (2006) e Nascimento (2007) embora proibida na região Sudeste-sul do país e no estado da Paraíba, vem sendo utilizado com bastante freqüência, acarretando dois tipos de problemas na região Sudeste-sul, relatados por Barbieri (2006): 1) não seleção das presas, capturando fêmeas ovígeras e "caranguejos de leite" (quando realizam a ecdise), e 2) poluição provocada pelas redinhas não recolhidas, visto que os catadores chegam a espalhar por dia mais de 100 e, nem sempre, voltam para recolhê-los, e os caranguejos presos na armadilha, que não foram capturados acabam sendo devorados pelos predadores naturais: lontras, guaxinins e gaviões, e os emaranhados de fios ficam no ambiente. Alguns trabalhos citam a técnica da “redinha”, como por exemplo, os estudos realizados por Nordi (1992) no manguezal da região de Várzea Nova – PB; Alves (2002) e Nascimento (2007) o qual relata os impactos sócio-ambientais provocados pela técnica “redinha” na captura do caranguejouçá (ucides cordatus) no estuário do rio Mamanguape – PB. Entretanto, Nunes (2004), estudando os caranguejeiros nos mangues de Vitória (ES) e Botelho, Santos e Pontes (2000), no estuário do rio Formoso, foram os que mais revelaram detalhes acerca desta técnica. Alves (2002) afirma que a “redinha” indica uma ruptura clara dos padrões de captura tradicionais, envolvendo menos esforço físico por parte do catador do que o exigido pela técnica do “tapamento”. Em todo o litoral brasileiro, as populações tradicionais de catadores vivem quase que exclusivamente dessa atividade de a catação de caranguejos. São pessoas que dependem do meio ambiente para a sua sobrevivência e que, por isso mesmo, com ele interagem, respeitando seus ciclos naturais. Conhecem tão bem os caranguejos, que sabem diferenciá-los por espécie, idade e sexo. Mas há também os catadores esporádicos, ou melhor, predadores 29 esporádicos, vindos de outras profissões, que se dedicam à cata na época da andada, quando se realiza o grande passeio do acasalamento (BARBIERI, 2006). De acordo com os catadores da Paraíba em estudos realizados por Alves e Nishida (2003), a quantidade de caranguejo tem diminuído, o que vem obrigando alguns deles a se deslocarem para manguezais de outros estados, onde a espécie ainda é abundante. A escassez verificada nos últimos anos tem tirado o sustento de centenas de famílias que sobrevivem da captura desse crustáceo, (ALVES e NISHIDA, 2003). A situação tem se agravado devido à ocorrência de uma mortandade de caranguejo-uçá em três estuários do litoral paraibano, os surtos de mortandade foram registrados em vários estados do Nordeste do Brasil e a causa, até o momento, não foi diagnosticada até o período desta pesquisa realizada por Nishida et al. (1999). Diante dos problemas observados nos manguezais nordestinos, o IBAMA uniu-se a outros centros de pesquisa para diagnosticar as causas e propor soluções. "Trata-se de uma contaminação provocada por um fungo que vive na natureza", afirma o zoólogo Sérgio Bueno, da Universidade de São Paulo (USP) (ADEODATO, 2004). Ele adverte que os estudos estariam sendo realizado diretamente pelos diversos projetos de criação de camarão em cativeiro que pontilham a costa do Nordeste (ADEODATO, 2004). Este mesmo problema pode ser identificado nos manguezais do Estuário do Rio Mamanguape, Litoral Norte da Paraíba, fato que provocou uma redução na coleta do caranguejo-uçá, obrigando as famílias que dependiam deste recurso a buscar novas fontes de renda, como o trabalho no cultivo da cana-de-açúcar e construção civil. 3.5 CARACTERIZAÇÃO DO SEDIMENTO DE MANGUE Sedimentos são definidos como depósitos de material sólido na superfície de terra, de qualquer estado (gasoso, líquido ou sólido), os quais se encontram a superfície de terra, ocupam espaço, e tem ambas as características seguintes: (1) é organizado em horizontes ou camadas como as que são distinguíveis do material inicial resultante de adições, perdas, transferências, e transformações de energia e de calor (2) é capaz ter arraigado, plantas em um ambiente natural (FERREIRA et all, 2006). De acordo com o mesmo autor são terras (solo) todos os corpos naturais que contêm seres vivos e são capazes de apoiar plantas arraigadas embora eles não tenham partes geneticamente diferenciadas (camadas e horizontes). Com relação ao manguezal, existe muita discussão se este pode ser considerado solo ou substrato. Porém, estudos realizados por Ferreira et al (2006), mostram que o substrato de 30 floresta de mangue deveria ser considerado então como uma terra (solo) em lugar de sedimento. Embora isto pareça ser puramente semântico, consideração de substratos de mangue como sedimento conduz a um quadro simplificado demais dos processos ativos envolvidos. Os solos de mangue, de acordo com Gamero et al (2004) são solos halomórficos desenvolvidos a partir de sedimentos marinhos e fluviais com presença de matéria orgânica e que ocorrem em regiões de topografia plana na faixa costeira sob a influência constante do mar. Todas as classes de solos dessas áreas estão associadas à influência marcante da água, podendo ocorrer: Areias Quartzosas Marinhas e Podzóis hidromórficos (em terraços arenosos), solos Gley, Orgânicos com tiomorfismo e solos Aluviais, principalmente da era Cenozóica. Por estarem em ambientes de baixa energia, esses solos apresentam, normalmente, predominância das frações mais finas (argila e silte), elevada quantidades de matéria orgânica e de sais solúveis em decorrência do contato com o mar. Por causa da decomposição da serapilheira e da saturação pela água, tais solos são de cores acinzentadas a pretas, com presença de H2S fracamente consolidados e podendo atingir vários metros de profundidade (Cintrón & Schaeffer-Novelli,1983). A combinação dos elevados conteúdos de matéria orgânica com a condição anaeróbia, as fontes de Fe reativo (óxidos dos sedimentos) e as fontes de SO42- (água do mar) prontamente disponíveis fazem dos solos de mangue um ambiente propício à ocorrência da redução bacteriana do sulfato a sulfeto e seu conseqüente acúmulo sob a forma de pirita, desencadeando o processo conhecido como piritização ou sulfidização. O halomorfismo (meio concentrado em sais e com valores de pH entre 5,0 e 9,6), gerado pela influência do mar, e o hidromorfismo (meio não-percolante), causado pela marcante presença da água nos solos de mangue, tornam o intemperismo hidrolítico (perda de sílica e bases), comum em solos bem drenados, inoperante nestes ambientes. O intemperismo salinolítico é, portanto, priorizado, fazendo com que o processo cristaloquímico da bissialitização predomine nestes solos (GAMERO et all 2004). O mangue é caracterizando por uma constante conquista de novas áreas pelo acúmulo de grandes massas de sedimentos e detritos trazidos pelos rios e pelo mar. Para Rossi e Mattos (2002) o substrato assim originado tem consistência pastosa; é pouco compactado, alagadiço, rico em matéria orgânica, pouco oxigenado e sujeito a períodos alternados de inundação e drenagem, conforme variação das marés. São áreas pedologicamente instáveis, dinâmicas, 31 seja pela constante deposição de areias do mar, seja pelo rejuvenescimento do solo ribeirinho, com deposições aluviais e lacustres. ODUM (1972) comenta que em áreas de mangues as raízes pronunciadas e com penetração profunda reduzem as correntes das marés, causando um depósito extenso de argila e lodo, que se supõem sejam importantes no ciclo mineral, necessário para manter a alta produtividade primária que exibe essa comunidade. Para CINTRON & SCHAEFFER-NOVELLI (1983), os solos de mangue são formados por sedimentos autóctones ou alóctones; esses ambientes em geral são de baixa energia com predomínio de acúmulo de frações finas (argilas e limos). Com freqüência podem atingir vários metros de profundidade sendo pobremente consolidados e semifluídos. Os autores acima também salientam que o pH do solo é uma função do conteúdo de umidade e das flutuações do nível freático. Ferreira (2006) afirma que se deve ter em conta, entretanto, que a condição geoquímica dos solos de mangue é submetida a variações incessantes em função da amplitude das marés, das diferentes estações climáticas (influência sobre o aporte de matéria orgânica, sedimentos continentais pelas chuvas etc.) e da atividade da fauna e da flora, podendo ser ora redutoras e ora oxidantes. A atividade das plantas em ambientes de mangue têm sido indicadas na literatura como um dos fatores responsáveis pelas variações redox nestes ambientes. Inúmeras evidências indicam que as espécies de mangue são capazes de oxidar suas rizosferas através da translocação do oxigênio absorvido nas porções superficiais do solo até as estruturas radiculares localizadas em subsuperfície, permitindo sua difusão para o solo do entorno (MCKEE, 1993; MCKEE et al., 1988). Em relação à atividade da fauna, que habita estes ambientes (em especial os caranguejos), também pode exercer considerável influência sobre as condições biogeoquímicas de seus solos. A fauna afeta o equilíbrio físico-químico dos solos através do retrabalhamento de suas partículas durante a busca por alimento ou pela própria ingestão deste material. Esta bioturbação e construção de canais biológicos têm um grande efeito sobre a bigeoquímica dos solos devido ao transporte de matéria orgânica nãodecomposta para as camadas sub-superficiais e à transferência de compostos reduzidos para regiões oxidantes (HINES; JONES, 1985). Pode-se então afirmar que o ecossistema manguezal possui uma boa dinâmica de nutrientes, possuindo sob a camada lodosa do solo, raízes e biomassa vegetal decomposta. O que favorece ao desenvolvimento e manutenção das espécies. 32 3.6 GEOPROCESSAMENTO E CONHECIMENTO TRADICIONAL A técnica de mapeamento ambiental possibilita a classificação dos ecossistemas, em decorrência do seu valor ecológico, e nela são consideradas a vulnerabilidade e susceptibilidade aos impactos e, ainda, os riscos das atividades humanas aos diversos ecossistemas. Portanto, é uma ferramenta de gerenciamento para otimização da administração dos recursos naturais, e fundamental na priorização de ambientes a serem protegidos, nos quais devam ser aplicados ações (FIGUEIREDO, 2000). O SIG é uma coleção organizada de hardware, software e dados geográficos projetada eficazmente para a captura de atualizações, organizações manipulações, analises e exibição de informações de espaços. Como uma ferramenta de computador, o SIG permite à integração de muitas informações do espaço, o desenvolvimento de modelos dinâmicos, a análise de tendências com o passar do tempo, a simulação de enredos e o desenvolvimento de modelos proféticos. Uma capacidade importante de SIG é unir, relacionar e analisar no espaço os dados atribuídos. Com os dados do SIG, referente a determinado recurso natural é possível desenvolver inventários de recursos que podem ser acessados rapidamente e podem ser atualizados. Os SIG também podem ser usados para executar dados sobre recurso de um determinado espaço, como também determinar onde os recursos naturais ou culturais ficam situados em relação a outros recursos, impactos ou perigos (CALAMIA, 1999). Os mapas orais servem como base operacional de itens locais que podem servir como parte do código para os aspectos culturais de categorias biogeográficas. Devido à própria natureza da sociedade muitos itens são de natureza espacial, que permite o mapeamento das condições (através de uma tecnologia ocidental) para a constituição de uma representação gráfica do oral (culturais) de vários mapas marinhos, por exemplo, (incluindo os recifes locais) e associá-los a feitos futuros. E para isto o conhecimento tradicional é suficiente para apoiar estas populações no processo de tomada de decisão. Hoje, porém, reconhecer que em muitas Ilhas do Pacífico, a gestão dos recursos e planejamentos futuros, deve-se ao fato de abordar o seu ambiente natural, o qual foi substancialmente modificado por agriculturas e projetos de construção civil, sobre exploração das áreas, como baías e estuários, e os outros impactos decorrentes do crescimento populacional e turístico (CALAMIA, 1999). Utilizando a tecnologia SIG, juntamente com o conhecimento tradicional, para o planejamento da gestão de recursos e o desenvolvimento de modelos espaciais através de um método de avaliação ambiental, que inclui os valores culturais tradicionais, são ferramentas importantes para a um planejamento da gestão dos recursos de uma determinada área. 33 Outra importante oportunidade para a inclusão do conhecimento tradicional durante o planejamento e gestão dos recursos é através de banco de dados desenvolvidos pelo SIG, que beneficia o desenvolvimento local através de um apoio nas tomadas de decisões. No entanto, a utilização efetiva do SIG para incorporar ao conhecimento ecológico tradicional na comunidade no processo de tomada de decisão, deverá incluir o contato direto com os usuários dos recursos locais. A escolha do o estuário do rio Mamanguape, como local de desenvolvimento deste trabalho, deve-se ao fato desta região ser uma importante área natural do Nordeste brasileiro. Ali ocorrem extensos manguezais, remanescentes florestais de Mata Atlântica, restingas, dunas, falésias e arrecifes, que compõem um grande mosaico de ecossistemas e abriga uma grande diversidade florística e faunística. Este manguezal se caracteriza como um dos mais preservados do Estado (Cunha et al., 1994). Entretanto, já apresenta algumas zonas que sofrem interferências antrópicas, devido, principalmente, à expansão do cultivo da cana-deaçúcar. Watanabe et al. (1994) constataram evidências da contaminação por produtos da monocultura canavieira em um dos tributários do estuário. As ilhas e croas também estão sofrendo transformações em função do assoreamento do leito, que se torna cada vez mais evidentes (ALVES e NISHIDA, 2003). Portanto a sustentabilidade ambiental, principalmente de comunidades ribeirinhas, desenvolveu-se por meio de comportamentos éticos, nos seus aspectos culturais, mantendo uma preocupação na conservação e preservação da vida e do ambiente. Sendo um processo que implica em um ajuste social e econômico com métodos e técnicas, para que a natureza atenda às necessidades básicas da comunidade. 34 4.0 METODOLOGIA O estuário do Rio Mamanguape, está localizado entre as coordenadas geográficas 6043’02’’ a 6051’54’’S e 350 07’ 46’’ a 340 54’04’’ W. A área de manguezal ocupa aproximadamente 5.721ha, (Figuras 03 e 04) sendo a mais representativa no estado da Paraíba, que no total apresenta cerca de 10.080ha (PALUDO & KLONOWSKI,1999). A sua localização é na porção norte do estado, nos municípios de Rio Tinto e Marcação. Este conjunto de ambientes pertences à Área de Proteção Ambiental (APA) da Barra do Rio Mamanguape, criada pelo Decreto Federal No 924, de 10 de setembro de 1993, com o objetivo de proteger os ecossistemas costeiros e a população de peixes-bois marinhos (Trichechus manutus) da região. O estuário do rio Mamanguape, está associado à camboas (braços do rio principal, que adentram ao manguezal), croas (bancos de areno-lodosos), apicuns (área desprovidas de vegetação típica de mangue) e uma barreira de recife perpendicular à sua desembocadura (NISHIDA, 2000). Figura 03 – Vista aérea da foz do Estuário do Rio Mamanguape. Foto: José Carlos, 2000. 35 Figura 04 – Mapa de localização do Estuário do Rio Mamanguape e delimitação da APA da Barra de Mamanguape. (Figura adaptada de Paludo e Klonowisk, 1999). 4.1 População estudada As comunidades que integraram o universo da pesquisa foram: Tramataia e Três Rios pertencentes ao município de Marcação, localizadas as margens do estuário do rio Mamanguape, litoral norte do estado da Paraíba. São povoados constituídos basicamente por uma mistura racial dos elementos indígenas, negros e brancos, que desenvolvem atividades extrativistas na área de entorno e no próprio rio Mamanguape. Praticamente não existe oferecimento de empregos nesta área, a não ser a mão de obra nas usinas de cana-de-açúcar, em épocas de colheitas. O quadro sócio-econômico das várias famílias ribeirinhas é bastante semelhante. As habitações usualmente são próprias e o tipo de construção predominante atualmente são casas de alvenaria, cobertas com telha de cerâmica, com pisos cimento ou de chão batido. As residências são geralmente pequenas em relação ao tamanho das famílias que abrigam. Não existe saneamento, tampouco coleta de lixo em toda a área (ALVES & NISHIDA, 2003). Os dados sobre escolaridade evidenciam um alto grau de analfabetismo entre os adultos e um atraso na escolaridade das crianças em relação à idade. Alguns levantamentos de peso e altura efetuados em crianças indicam problemas de nutrição, que poderão acarretar prejuízos ao seu desenvolvimento (ALVES & NISHIDA, 2003). 36 Os ribeirinhos que foram estudados são pescadores tradicionais, que durante praticamente toda a sua vida tiveram a pesca como atividade principal de subsistência. Estes possuem um conhecimento empírico que deve ser respeitado no estabelecimento de reorientações quando preciso à sua conduta em relação ao ambiente e obtenção de recursos. 4.2 Caracterização da pesquisa Este trabalho trata de uma pesquisa participante de acordo com Thiollent (1998) e Pedrini (1997), que foi realizado entre os catadores de caranguejos do estuário do rio Mamanguape. Na visão de Thiollent (1998) na pesquisa participante, os pesquisadores estabelecem relações comunicativas com pessoas ou grupos da situação investigada com intuito de serem melhores aceitos, enquanto desempenham um papel ativo no equacionamento dos problemas encontrados, no acompanhamento e na avaliação das ações desencadeadas. Haguette (1997) acrescenta que na pesquisa participante o problema se origina na comunidade em estudo e a última finalidade da pesquisa é a transformação estrutural fundamental e melhoria da vida dos envolvidos. 4.3 Estratégias para Sensibilização O método utilizado foi por meio qualitativo e quantitativo, destacando-se, as seguintes técnicas: a) Bola de Neve (BAILEY, 1982); b) observação direta, equivalente à do observador participante-não membro (STEBBINS, 1987); c) turnês guiadas (SPRADLEY e MCCURDY, 1972); d) entrevistas livres e semi-estruturadas (MELLO, 1989); e) entrevistas repetidas e cruzadas; f) questionários e g) mapas mentais. A coleta de dados foi realizada em duas etapas. A primeira fase foi baseada no método, Bola de Neve, onde os informantes-chave foram indicados pelos catadores entrevistados. Esta etapa foi realizada no período de novembro a dezembro de 2007, em que 55 catadores todos do sexo masculino, com idade entre 19 e 55 anos, foram entrevistados com auxílio de questionários estruturados para a coleta de dados gerais dos informantes e informações sobre a coleta na região. Em seguida, foram definidos os informantes-chave de acordo com os seguintes critérios: 1) tempo de coleta igual ou superior a 10 anos; 2) dedicação integral à atividade de coleta; e 3) coletores aposentados, que ainda coletam para consumo ou eventual comércio. A segunda etapa foi realizada no período de janeiro a março de 2008 com entrevistas semi-estruturadas (anexo C), turnê guiada, entrevistas sincrônicas e diacrônicas, cruzadas e repetidas, realização de entrevias gravadas em fitas cassete, ou MP3 e posteriormente transcritas, e representações através de mapas mentais das áreas de coleta do 37 caranguejo-uçá, os recursos encontrados em cada área e as regiões degradadas e conservadas que compreende o ecossistema manguezal, além da descrição da espécie, o hábitat, as técnicas para captura e a sazonalidade. 4.4 Elaboração do Mapa mental e do Mapa utilizando o Sistema de Informação Geográfica O mapeamento ambiental é uma proposta de Meyer (1991, 1992), como estratégia educativa para ampliar a compreensão sobre o ambiente em que vivem, articulando investigação e ação educativa. Para a elaboração do mapa mental foi identificado um informante-chave, o qual recebeu um mapa cartográfico do estuário, contendo alguns pontos de referencia – Landmarkes, tendo em vista que a maioria dos catadores de caranguejo-uçá do ERM são analfabetos. Através deste mapa cartográfico o informante-chave pode indicar os principais pontos de coleta do caranguejo-uçá. Em relação à elaboração do mapa oral, este foi realizado através de turnês guiadas com o informante-chave, em que foram realizadas as demarcações das principais camboas, para a coleta do caranguejo-uçá, por meio do GPS (Global Positioning System). A construção de mapas mentais torna-se um importante método para expressar, o conhecimento empírico, sendo uma estratégia para sensibilização a qual tem como base o processo pesquisa – ensino – aprendizagem – ação – transformação, ocorrendo com participação, afetividade, ludicidade e criatividade, alicerçado no MEDICC - Modelo Dinâmico para Construção e Reconstrução do Conhecimento voltado para o meio ambiente (SILVA, 2000). Para a elaboração dos mapas utilizando o Sistema de Informação Geográfica, foi necessária a utilização de alguns mapas temáticos pré-existentes tendo como base o mapa de solos e uso de solos de escala 1:1.200.000 do Atlas do plano estadual de recursos hídricos da Paraíba, 2006, a base cartográfica dos limites dos municípios do IBGE, 2005 e pontos coletados aparte de um aparelho GPS. Mapa de Uso Atual - As informações espaciais referentes ao uso atual do solo foram obtidas através de um arquivo no formato matricial, o mesmo teve com base o mapa de solos de escala 1:1. 200.000 do Atlas do plano estadual de recursos hídricos da Paraíba, 2006, o qual foi georreferenciado em um SIG e digitalizado via tela de computador. Foram mapeadas as seguintes classes de uso do solo: Antropismo, Mangues, Mata Atlântica, Mata de Tabuleiros Costeiros. 38 Mapa de solos - As informações espaciais referentes os tipos de solos foram obtidos através de um arquivo no formato matricial o qual teve a base o mapa de solos de escala 1:1.200.000 do Atlas do plano estadual de recursos hídricos da Paraíba, 2006, o qual foi georreferenciado em um SIG e digitalizado via tela de computador. Após esta etapa foi realizada a plotagem dos pontos das camboas as quais foram adquiridos estudo com um receptor de satélite GPS. 4.5 Análise Granulométrica Foram coletadas amostras de solo dos tipos de mangues, utilizado um tubo de PVC, medindo de 20 cm de comprimento. Cada amostra continha cerca de 2 kg de solo e assim que coletadas foram acondicionadas em papel de jornal, (figura 05). Em seguida enviadas para análise no Laboratório de Mecânica de Solos da Universidade Federal da Paraíba. a) b) FIGURA 05: Etapas que demonstram a coleta das amostras de solo das camboas, Caracabu, Tanques e Macaco, para análise granulométrica. a) Coleta do sedimento; b) amostra sendo depositada sobre o jornal. Foto: Iaponira Sales de Oliveira, 2008. Para este procedimento foi utilizado à técnica de peneiramento de acordo com que preconiza a especificação da ABNT NBR 181/84. 4.6 Caracterização da Flora adjacente da Camboa Caracabu O material botânico coletado foi herborizado segundo métodos habituais em Botânica. A identificação das espécies foi realizada por especialistas, junto ao acervo do Herbário Lauro Pires Xavier (JPB), da Universidade Federal da Paraíba. As exsicatas resultantes do material coletado foram depositadas no Herbário referido. 39 4.7 Análises dos dados Os dados foram analisados de forma quantitativa e qualitativa, utilizando-se da triangulação, que segundo Sato (1997) e Thiollent (1998) consistem em quantificar e qualificar os dados obtidos. 40 5.0 RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1 PERCEPÇÃO AMBIENTAL DOS CATADORES DE CARANGUEJO-UÇÁ DO ERM. Os dados obtidos junto a um informante-chave apresentaram um total de 19 camboas, que foram: Amorea, Boca Rasa, Brejinho, Cação, Calango, Caracabu, Cavalo, Ilha Grande, Jaraguá, Mero, Namorado, Macaco, Porto Novo, Rato, Tanque, Tijuco, Tipuca e Terra, observado na tabela 01. Os resultados mostram que os caranguejeiros do ERM, apresentam compreensão, conhecimento e percepção detalhada sobre o ambiente em que vivem, identificando com exatidão o espaço ecológico e cultural e, ao mesmo tempo, apropriando do conhecimento produzido, tornando-se, portanto, sujeitos das ações. TABELA 01: Camboas georreferenciadas através da turnê guiada realizada junto a um informante-chave, catador de caranguejo-uçá do ERM. Camboas Localização através de GPS 1-Amorea 25 M 0283910 UTM 9250774 2-Boca Rasa 25M 0282491 UTM 9248689 3-Brejinho 25 M 0280809 UTM 9249809 4-Cação 25 M 0286903 UTM 9251361 5-Calango 25M 0277743 UTM 9248220 6-Caracabu 25M 0286596 UTM 9250569 7-Cavalo 25M 0287379 UTM 9250899 8-Cravaçu 25M 0275263 UTM 9247432 9-Ilha Grande 25M 0281220 UTM 9249198 41 10-Jaraguá 25M 0273863 UTM 9246955 11-Mero 25M 0283536 UTM 9249775 12-Namorado 25M 0275160 UTM 9247550 13-Macaco 25M 0284017 UTM 9249655 14-Porto Novo 25M 0276002 UTM 9248333 15-Rato 25M 0277701 UTM 9248361 16-Tanque 25M 0285351 UTM 9251066 17-Tijuco 25M 0279377 UTM 9248323 18-Tipuca 25M 0280953 UTM 9249832 19-Terra 25M 0284057 UTM 9251760 Destas 19 camboas, os entrevistados (N = 55) identificaram 4 (quatro) locais de preferência e/ou mais produtivos (camboas) para a retirada do caranguejo-uçá. O mapa Oral, observado na figura 06, foi elaborado diante das informações coletadas junto aos catadores de caranguejo-uçá da ERM, para a visualização espacial das camboas que são utilizadas para a coleta do caranguejo-uçá. 42 FIGURA 06: Mapa das principais camboas utilizadas pelos catadores de caranguejo-uçá. Fonte: Uso do solo atual – Atlas do Plano Estadual de Recursos Hidricos do estado da Paraíba, 2006. IBGE – Bases cartográficas do limites municipais, 2005. 43 Diante dos dados coletados, foi possível a projeção de um mapa utilizando o SIG como principal instrumento na coleta dos dados e processamento dos mesmos. Este mapa poderá auxiliar na elaboração de planos de manejo na região do ERM, tendo em vista que o mesmo destaca, ao longo do rio, os locais de coleta (camboas) do caranguejo-uçá realizados pelas comunidades em estudo. Camboas são afluentes ou braços do rio principal, neste caso, o rio Mamanguape, e são denominações êmicas, que servem como ponto de referência e local para os catadores e pescadores extraírem recursos biológicos. Também pode ser denominada como um lago artificial à beira-mar, onde em maré cheia entra o peixe miúdo. Esteiro que se enche na preamar e fica em seco na baixa-mar; o mesmo que gamboa (Dicionário Aurélio). Os SIG são uma coleção organizada de hardware, software e dados geográficos projetada eficazmente para a captura de atualizações, organização, manipulações, analise e exibição de informação de espaços (MARK, 1999). Como uma ferramenta de computador, o SIG permite a integração de muitas informações que revestem o espaço, o desenvolvimento de modelos dinâmicos, à análise de tendências com o passar do tempo, a simulação de enredos e o desenvolvimento de modelos proféticos. Uma capacidade importante do SIG de acordo com Mark (1999) é unir, relacionar e analisar os espaço e dados de atributos, sendo possível desenvolver inventários de recurso que podem ser acessados rapidamente e podem ser atualizados, também pode ser usado para executar questões de espaço em dados de recurso automatizados, como determinar onde os recursos naturais ou culturais ficam situados com respeito a outros recursos, impactos ou perigos. Alguns exemplos recentes de aplicações do SIG, em mapeamentos de áreas utilizadas por populações tradicionais e de investigação aplicada para mostrar a cultura destas populações, tem servido para antropólogos para a gestão e analise de dados (Stonich, 1996; McGwire et al., 1996). Utilizando conceitos ecológicos, esses estudos abordam problemas de integração de dados, tais como entrevistas, teledetecção de imagens, e observação participante, isso foi crucial para os investigadores que estava tentando encontrar formas de integrar os resultados da investigação tradicional antropológica, o qual geralmente é pessoal e de pequena escala com informações obtidas a partir de fenômenos de dimensão regional. (STONICH, 1996). Outro exemplo, utilizando o SIG, foi realizado por Pereira, et.al (2005), em Terras Indígenas Pankararé Raso da Catarina (Ba), permitiu analisar os etnosolos dentro do ambiente estudado, auxiliando no entendimento da visão dos índios Pankararé na caracterização do solo, podendo definir a relação deste com os demais elementos da natureza. 44 Em relação aos mapas apresentados oralmente por comunidades tradicionais podem ser visto, em outras palavras, como o modelo do seu código cultural - etnográfico. Para Mark (1999) os mapas refletem os aspectos do comportamento social, entre os membros da comunidade e a relação de conservação e uso dos recursos. Outra possível aplicação da tecnologia SIG para gestão dos recursos é usar o mapeamento para descobrir relações entre diferentes variáveis (Berry, 1995). Por exemplo, um mapa de um recife de coral morto, estatisticamente pode ser comparado, para se ter uma conclusão, com mapas de variáveis independentes, tais como a qualidade da água, inclinação, profundidade, tipo de substrato, luz solar e sua eficaz penetração. Se uma forte coincidência espacial é identificada por uma determinada combinação de variáveis, essa informação pode então ser utilizada para as medidas de gestão do recurso. De acordo com Calamia (1999), mapas cognitivos ou orais foram utilizados para refletir a cosmovisão de habitantes de ilhas do Pacífico, a fim de analisar como os recursos terrestres e marinhos foram organizados e aproveitados. Seu parentesco com o ambiente natural era muitas vezes baseada em uma forte espiritualidade, ligada com os seus antepassados e a terra onde foram enterrados e também as necessidades de subsistência. Os mapas apresentados oralmente por povos contemporâneos locais podem ser visto, em outras palavras, como um modelo etnográfico do seu código cultural. Estes mapas refletiram maiores aspectos do comportamento social e conservacionista em relação ao uso dos recursos. Os mapas orais servem como uma parte do código para os aspectos culturais das categorias biogeográficas. Devido à própria natureza da sociedade, muitos itens lexicais são de natureza espacial, o qual permite o mapeamento das condições, através de um aporte tecnológico, para a constituição de uma representação gráfica do oral (culturais). Antes do desenvolvimento em grande dimensão, CET foi suficiente para apoiar as comunidades tradicionais no processo de tomada de decisão. Hoje, porém, reconhecer que muitas Ilhas do Pacífico, por exemplo, a gestão dos recursos e planejamento para as suas futuras gerações, devem se abordar o fato de que seu ambiente natural foi substancialmente modificado por sistemas agrícolas e por projetos de construção civil, sobre exploração dos recifes de corais das áreas, aumento do impacto ambiental nas baías e estuários, alem do aumento da população residente e de turistas, Mark (1999). A figura 07 mostram que das 19 camboas e/ou locais para catar caranguejo, 4 (quatro) demonstram locais de preferência. 45 FIGURA 07: Percentual de citação das camboas identificadas pelos catadores de caranguejo, como pontos produtivos no Estuário do rio Mamanguape Litoral Norte da Paraíba Segundo informações dos caranguejeiros, a preferência por catar nas camboas de Tanques, Macaco, Caracabu e Mero, deve-se, principalmente por apresentar as seguintes características: acessibilidade, próximo a residência em destaque a camboa dos Tanques, Macaco e Caracabu por estar próxima as comunidades de Tramataia e Três Rios, o tipo de substrato, por este ser mais consolidado, pois um substrato mais consolidado torna-se mais fácil o trabalho, uma locomoção mais rápida dentro do manguezal, além de favorecer o uso da técnica “redinha” para a captura do caranguejo-uçá (Ucides cordatus). De acordo com o conhecimento dos catadores, o consolidado apresenta uma maior quantidade de espécimes de caranguejos machos, além do tamanho viável a comercialização. Enquanto que a camboa dos Meros apresentou menor porcentagem em preferência dos catadores por apresentar, um solo inconsolidado, impossibilitando a locomoção e desfavorável a colocação das redinhas para a captura do caranguejo-uçá, a maioria dos catadores que utilizam a camboa dos Mero, utilizam da técnica de tapamento, com auxilio do “ferro de corvo” fecham a galeria onde o caranguejouçá faz a toca e esperam o mesmo retornar a superfície, ou utilizam a técnica de braçamento, em que o catador retira o caranguejo da toca com a própria mão. Alem de afirmarem que nas partes mais alagadas desta camboa encontram maior quantidade de espécimes de caranguejo fêmea. Como se pode observar em alguns trechos das entrevistas realizadas. “lá nos Tanques é mais melhor tem mais caranguejos e nas outras são miúdos”. João Lourenço da Silva (Burrinho - Tramataia) 46 “Lá é mais durim, bate mais ligeiro é areado e bata mais depressa”. José Ramos da Silva dos Santos (Deca - Tramataia) “Em Caracabu o mangue é mais duro é melhor de trabalhar de andar não tem ostras”. Severino Gonçalves Gomes (Biu Preto - Tramataia) “O mangue nos Mero é mole e cheio de renovo e dar mais fêmea”. João Batista Dos Santos (Tramataia) Para uma melhor compreensão, em relação às camboas e ao percurso do rio Mamanguape, foi confeccionado um mapa mental por um dos informantes- chave. Este mapa possibilitou a identificação da percepção ambiental dos catadores de caranguejo-uçá, em relação à localização das camboas utilizadas para a coleta dos caranguejos, Figura 08. 47 FIGURA 08: Mapa mental elaborado pelos catadores de caranguejo-uçá destacando as principais camboas, utilizadas para a coleta do caranguejo-uçá, ou longo do Rio Mamanguape - Litoral Norte/PB. Com a elaboração deste mapa, foi possível destacar as camboas que delimitam o rio Mamanguape, as quais receberam nomes que demonstram alguma característica local, a 48 exemplo: Camboa do Macaco, de acordo com os catadores apresentava algumas espécies de macacos na área, Camboa dos Tanques por esta fica próxima aos viveiros de camarões (carcinocultura), estas denominações mostram que os habitantes da região, apresentam o habito antigo de denominar, locais e espécies de acordo com alguma característica observada, habito comum a populações tradicionais. A técnica de mapeamento ambiental possibilita a classificação dos ecossistemas, em decorrência do seu valor ecológico, sendo consideradas a vulnerabilidade e susceptibilidade aos impactos e, ainda, os riscos das atividades humanas aos diversos ecossistemas (MEYER, 1991). Os mapas mentais, elaborados através da percepção ambiental dos autores sociais, constituem-se uma ferramenta importante uma vez que, além de fornecerem uma visão geral, no espaço geográfico e em uma escala temporal dos recursos, apresentam uma classificação da sensibilidade ambiental em relação ao conhecimento ecológico tradicional. De acordo com Mark (1999) comunidades tradicionais também usaram o Conhecimento Ecológico Tradicional (CET), para representar a dimensão de espaço de características geográficas importantes nas paisagens terrestres e marítimas. Por milhares de anos mapas escritos ou orais foram usados para definir limites de casas, como também para descrever o local de obtenção de recursos importantes, distribuídos em zonas e locais sagrados. O mapeamento ambiental é uma proposta de Meyer (1991, 1992), como estratégia educativa para ampliar a compreensão sobre o ambiente em que vivem. Trata-se de realizar, com a participação radical de todos os envolvidos, um levantamento ambiental, um diagnóstico do ambiente em que vivem os participantes segundo sua própria percepção: identificam o espaço social, histórico, político e cultural e, ao mesmo tempo, se apropriam do conhecimento produzido, tornando-se, portanto, sujeitos das ações educativas ambientais. O mapeamento ambiental tem como principal objetivo ampliar a compreensão dos sujeitos envolvidos acerca do ambiente em que vivem. Portanto, o mapeamento ambiental é uma metodologia potencializadora para a identificação dos temas ambientais locais como geradores de discussões socioambientais (MEYER, 1991). A preservação do Conhecimento Ecológico Tradicional (CET) é importante por reunir razões sociais como também para ônus de conservação de recursos, além do imperativo ético de preservar a diversidade cultural. A união internacional para conservação da natureza e recursos naturais (IUCN) e o programa em conhecimento tradicional para a conservação (IUCN 1986) resume alguns benefícios práticos e tangíveis de CET: O conhecimento tradicional pode ser útil para perspicácias biológicas e ecológicas novas. Às vezes, os estudos perceptivos de sistemas de conhecimento ambientais tradicionais são derivados de um novo 49 conhecimento científico; Muito do conhecimento tradicional é útil para administração de recurso natural em áreas com pescas tropicais por exemplo. Em particular, com procedimentos de regras e rotinas do recurso que são desenvolvidos por integrantes antigos da comunidade; Conhecimento tradicional é freqüentemente usado para áreas protegidas e para educação de conservação. Podem auxiliar na projeção de áreas protegidas, para permitir que as comunidades residentes continuem os estilos de vida tradicionais, enquanto desfrutam dos benefícios da conservação. Onde a comunidade local é juntamente envolvida na proteção de uma área, o uso de conhecimento tradicional para educação de conservação pode ser especialmente efetivo (MARK, 1999). Bruno Adler, cartógrafo russo, no século XX, adquiriu 55 mapas confeccionados por pele, madeira e papel por povos nativos antes do contato com exploradores europeus, Hutorowicz, (1911) Gladwin (1970) e Lewis (1972) citado por Mark (1999) nota que Micronesianos criaram quadros que mostraram representações complexas de oceanos, marés e correntes. Mais recentemente, informações de espaço foram usadas para inter-relações compreensivas entre sociedades humanas tradicionais e processos ecológicos. Em Manitoba, Canadá, os anciões ensinam habilidades e mantêm a continuidade e ligações das áreas de recursos, transferindo mapas orais altamente detalhados e inventários de valores de recurso e uso de terra aos integrantes mais jovens. Estes mapas individuais e coletivos também complementam um ao outro de tal um modo que eles provem conhecimento integrado dos ecossistemas dentro do vilarejo e área de recurso tradicional (Wavey, 1993). Em um estudo realizado nas terras do Kalimantan, Indonésia, Sirait et al. (1994), concluiu-se que o uso combinado de histórias orais, mapas de esboço e Sistemas de Informação Geográficos (SIG) e Sistemas de Posicionamento Globais (GPS), são metodologias úteis para traçar posses de terras e percepções de vilarejos, comparando a apropriação da terra e o uso desta terra pelo estado. Com respeito ao desenvolvimento do planejamento, o conhecimento tradicional pode beneficiar o desenvolvimento provendo avaliações mais realísticas do ambiente, dos recursos naturais e sistemas de produção. Pessoas locais envolvidas no processo de planejamento melhoram as chances de um desenvolvimento próspero. Outra importante oportunidade para a inclusão de CET durante o planejamento e gestão dos recursos é através de banco de dados SIG. Devido a natureza cultural tradicional e ecológica dos conhecimentos das eco-zonas, o que pode beneficiar o desenvolvimento de sistema de apoio à tomada de decisão. No entanto, ao utilizar de forma efetiva do SIG para incorporar o CET na comunidade, deverá incluir a partir de contato direto com o recurso local 50 utilizado. Por exemplo, o desenvolvimento de um banco de dados SIG, usando termos havaianos requer mapeamento das extensões de solo utilizadas pelas comunidades e de ecozonas marinhas, a partir da perspectiva local, o qual será mapeado através da historia oral relatada pelos havaianos, Mark (1999). Neste contexto, o conhecimento tradicional é útil para a avaliação ambiental. As populações locais que dependem de recursos locais para o sustento, estão em boas posições para avaliar as verdadeiras despesas e benefícios de um empreendimento. O conhecimento ecológico tradicional local é um aspecto crucial de qualquer avaliação de impacto. As informações são importantes no apoio a tomada de decisões sobre a prevenção e principalmente nas estratégias de aplicação de dispersantes, medidas de proteção, em nível mais estratégico, na definição de locais de instalação de empreendimentos para a indústria, entre outros. 5.2 CARACTERIZAÇÃO DO SEDIMENTO DE MANGUE E DA FLORA LOCAL A palavra “mangue” possui vários significados entre os catadores de caranguejo do ERM. De acordo com os entrevistados o mangue pode ser: o tipo de solo e ou substrato, tais como: mangue mole, mangue duro e mangue areiado; como também o tipo de vegetação: mangue canoé, mangue sapateiro e mangue manso. Como observado nos seguintes trechos de entrevistas. “Lá nos Tanques o Mangue é duro e pega caranguejo bonito” Antônio Bernadinho Bento (Farinha) “macacos dar mais macho tem canto que tem ostra, tem canto que é mais areado, tem canto que é duro”. João Batista dos Santos “Camboa dos macacos é mais duro, o mole fica uns 40 a 50 m para dentro da camboa”. Severino Gonçalves Gomes (Biu Preto-Tramataia) “Caracabu sai mais macho, tem mais areado, que é a parte mais dura”. Venâncio Marques de Meneses 51 Para definir o manguezal, os catadores de caranguejo mostraram uma relação entre o mangue (floresta) e a característica do solo, observa-se também a relação destes fatores na biologia do caranguejo-uçá, quando os mesmos dizem que a espécime macho tem preferência ao substrato mais consolidado, além de demonstrar seu conhecimento quanto à granulometria deste solo, quando destaca que o mangue areiado é mais consolidado por conter grande quantidade de areia. Observado na tabela 00. TABELA 02: Denominações dadas pelos catadores de caranguejo-uçá em relação a sua concepção de mangue VEGETAÇÃO SUBSTRATO Mangue Manso Mangue duro Canoé Mangue Mole Mangue de Botão Mangue Areiado Sapateiro Barranco As afirmações dos catadores de caranguejo-uçá não diferem de alguns autores, a exemplo de Schaeffer-Novelli (2005) manguezal é um sistema ecológico costeiro tropical, dominado por espécies vegetais típicas, às quais se associam outros componentes da flora e da fauna, microscópicos e macroscópicos, adaptados a um substrato periodicamente inundado pelas marés, com grandes variações de salinidade. Para identificar os vários tipos de substrato de mangues denominados pelos catadores de caranguejo-uçá como: mangue areiado, duro e mole, foi realizado uma analise granulométrica dos tipos de solos. Os dados obtidos estão amostrados na tabela 02 e 03. TABELA 03. Amostras coletadas nas Camboas mais citadas pelos catadores de caranguejo-uçá. Amostras Local de coleta Nomenclatura co catador 01 Camboa de Caracabu parte alta Mangue Areiado 02 Camboa de Caracabu parte baixa Mangue Areiado 03 Camboa dos Tanques Mangue Duro 52 04 Camboa dos Tanques Mangue Mole 05 Camboa de Caracabu parte Rego Mangue Areiado 06 Camboa de Caracabu parte Alta II Mangue Areiado 07 Camboa do Macaco parte Barranco Mangue Areiado TABELA 04. Resultados percentuais da Granulometria nas amostras coletadas nas Camboas mais citadas pelos catadores de caranguejo-uçá do ERM. COMPOSIÇÃO 01 02 03 C. 04 C. 05 06 07 C. Caracabu Caracabu. Tanques Tanques Caracabu Caracabu Macaco M. Duro Mangue Barranco Parte Mangue Alta Areado Mole Areado M. Rego Areado AII Pedregulho (d>2mm) 0,34 0,21 0,22 0,64 0,03 0,03 0,00 18,95 28,37 4,05 5,73 16,82 16,58 8,07 78,78 58,42 44,03 36,18 69,37 69,50 44,45 1,94 13,00 51,71 57,45 13,77 13,90 47,48 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 97,72 86,79 48,08 41,91 86,19 86,08 52,52 Areia Grossa (0,42mm<d≤2mm) Areia Fina (0,074mm<d≤0,42mm) Silte + Argila (d≤0,074mm) Total Areia Total (entre a pen. No.10 e a 200) De acordo com os ensaios realizados, as amostras de número - 03, 04 e 07 podem ser classificadas como solos argilo-arenosos, devido a sua consistência pastosa são classificados segundo os catadores de caranguejo, como solos duro, localizados na parte mais externa da camboa e mole se estiver em locais alagados. As demais são classificadas de acordo com os 53 ensaios granulométricos de solos arenosos. A denominação de solo areiado, para os catadores de caranguejo, deve-se a este tipo de solo apresentar acúmulo de areia e por passar por períodos de estiagem, acompanhado o ciclo da maré. Todas as classes de solos das áreas de mangue estão associadas à influência marcante da água, podendo ocorrer: Areias Quartzosas Marinhas e Podzóis hidromórficos (em terraços arenosos), solos Gley, Orgânicos com tiomorfismo e solos Aluviais, principalmente da era Cenozóica (EMBRAPA, 1978; LANI, 1998) citado por Gamero (2004). Por estarem em ambientes de baixa energia, esses solos apresentam, normalmente, predominância das frações mais finas (argila e silte), elevada quantidades de matéria orgânica e de sais solúveis em decorrência do contato com o mar. Por causa da decomposição da serrapilheira e da saturação pela água, tais solos são de cores acinzentadas a pretas, com presença de H2S, fracamente consolidados e podendo atingir vários metros de profundidade (Cintrón & Schaeffer-Novelli, 1983). 5.2.1 Caracterização da parte alta da camboa Caracabu Em relação à caracterização da parte alta desta camboa, encontram-se as seguintes composições de solos, Figura 09: FIGURA 09: Composição granulometrica da parte alta da camboa de Caracabu no ERM. Observa-se que o solo areiado desta parte da camboa de Caracabu, contém uma grande dimensão de areia fina e pequena dimensão de Silte e argila, o que caracteriza a denominação areiado por parte dos catadores de caranguejo do ERM. De acordo com os catadores estes solos apresentam grande quantidade de areia por estar em local alto da camboa, em que 54 permanece em estiagem por grandes períodos durante o ciclo da maré. Tornando-se um solo que favorece a locomoção dentro da camboa. O solo de mangue era tido anteriormente como “solo indiscriminado de mangue” (LEPSCH et al., 1983). Muitos são os autores que não consideram a denominação de solo, mais sim substrato de ambientes estuarinos, que suportam plantas superiores, como sedimentos (CORREDOR; MORREL, 1994; MACKEY; MACKAL, 1996, MADUREIRA et. Al, 1997; CLARK, 1998). No entanto para Cíntron e Schaeffer-Novelli, (1983), os solos desses ecossistemas por estarem em ambientes de baixa energia apresentam predominância das frações mais finas (argila e silte), elevadas quantidades de matéria orgânica e sais solúveis em função do contato com o mar, sendo então denominado de solo. Silte é o material sedimentar: pequenas partículas de minerais diversos, de tamanho compreendido entre a areia e a greda (entre 0,05mm e 0,005mm de diâmetro), que normalmente constituem mantos situados no solo (AURÉLIO, 2002). De acordo com Ferreira et al (2006) os Solos de Mangue compreendem uma associação de solos hidromórficos e halomórficos denominados Glei Tiomórfico e Solonchack Sódico. O Glei tiomórfico, é um solo hidromórfico, salino, orgânico ou orgânicomineral, contém compostos de enxofre, que após drenagem e por oxidação tornam-se extremamente ácidos, devido à formação de sulfatos e em alguns casos até de ácido sulfúrico. No que diz respeito à caracterização vegetacional no estuário do rio Mamanguape (ERM), os catadores de caranguejo-uçá entrevistados possuem um conhecimento vasto e detalhado sobre a vegetação do Manguezal. Os dados obtidos mostram que os mesmos identificam as espécies e as características, como também apontam as diferenças entre os tipos vegetacionais, como pode ser observado nas falas seguintes: “Canoé é só nas beiradas tem parte dentro que é dura, tem pouco mangue manso dentro da camboa”. Biba (Tramataia) “Sapateiro é melhor de trabalha, fica nos locais alagados, Mangue manso e Canoé o substrato é duro e ninguém trabalha próximo lá”. Biu Preto (Tramataia) 55 “Na vegetação tem mangue manso, canoé, sapateiro, salambaia, mangue de botão (folhas esbraquisada), manso (folhas esverdeada e amarelada, coloca um botão maior), salambaia (no pé do arisco na parte mais enxuta e junta mais guaiamu)”. Mané (Tramataia) “Lá tem mangue manso, canoé, sapateiro, bredo (matinho que enrama fica bem distante serve para os caranguejo comer)”. Vassaman (Tramataia) “onde tem canoé (parece um orelha de burro, com folhas longas) é duro, no mangue manso é mais aberto tem menos raízes. No sapateiro é mole e enraizado, mangue de botão encontra mais em Caracabu. O mole é areado nunca muda”. Farinha (Tramataia) “Nas ilhas encontra-se o Brédo mais este não é mangue” Edvaldo (Camurupim) Nas entrevistas foi possível observar que os catadores de caranguejo-uçá detêm conhecimento em relação à vegetação do Manguezal, bem como suas características adaptativas, identificando o local em que estas se desenvolvem, e quais são os fatores do meio que favorecem o seu desenvolvimento. Sabe-se que o manguezal apresenta flora de aspecto peculiar, devido às adaptações e pouca diversidade de espécies. Além de inundação e correntezas, possuem ainda mecanismos para sobrevivência às mudanças de salinidade, sedimentos inconsolidados e dessecação, que são as raízes de escora e pneumatóforos. No entanto em regiões costeiras protegidas e de transição entre o mar e o continente (estuários, lagunas e planícies de maré), é comum o desenvolvimento de espécies vegetais halófitas adaptadas a condições de intensa salinidade e de hidromorfismo, denominadas mangue (SCHAEFFER-NOVELLI, 1991). Rhizophora mangle (mangue vermelho/ sapateiro), por exemplo, é de fácil adaptação em ambientes de solo instável e encharcado sendo assim, apresenta raízes fixadoras. Já Avicennia shaueriana (Canoé ) concentra-se em solos com alta salinidade, devido a sua capacidade de expelir sal. Por fim tem-se Laguncularia racemosa (mangue branco ou mangue 56 manso) que são encontrados em áreas que sofrem constante lavagem, isso acontece pelo fato de conseguir sobreviver por grandes períodos em água estuarina, (CARINE et al, 2006). Diante dos dados coletados junto aos catadores de caranguejo-uçá do ERM, pode-se inventariar a caracterização das principais espécies de vegetais, existente na camboa de Caracabu, a mais visitada para a coleta do caranguejo-uçá. A tabela 04 mostra uma grande variedade de espécies vegetais encontradas no mangue areiado. TABELA 04: Espécies vegetais catalogadas, existentes na camboa de Caracabu, uma das mais utilizadas pelos catadores de caranguejos do ERM. COLETOR JPB FAMÍLIA ESPÉCIE Lima, I.B., 994 39250-JPB Araceae Anthurium affine Schott Lima, I.B., 993 39249-JPB Cactaceae Pilosocereus sp. Lima, I.B., 992 39248-JPB Cactaceae Sp. Lima, I.B., 986 39242-JPB Combretaceae Conocarpus erectus L. Lima, I.B., 983 39239-JPB Cyperaceae Bulbostylis capillaris (L.) C.B. Clarke Lima, I.B., 978 39234-JPB Cyperaceae Cyperus amabilis Vahl Lima, I.B., 981 39237-JPB Cyperaceae Cyperus ligularis L. Lima, I.B., 989 39245-JPB Cyperaceae Cyperus pohlii (Nees) Steud. Lima, I.B., 979 39235-JPB Cyperaceae Cyperus sp.1 Lima, I.B., 990 39246-JPB Cyperaceae Cyperus sp.2 Lima, I.B., 980 39236-JPB Cyperaceae Fimbristylis cymosa R. Br Lima, I.B., 985 39241-JPB Erythroxylaceae Erythroxylum sp. Lima, I.B., 984 39240-JPB Leguminosae-Caes. Chamaecrista rotundifolia (Pers.) Greene Lima, I.B., 987 39243-JPB Myrtaceae Sp. Lima, I.B., 982 39238-JPB Poaceae Paspalum maritimum Trin. Lima, I.B., 991 39247-JPB Poaceae Sp. Lima, I.B., 988 39244-JPB Rubiaceae Borreria sp. FONTE: Serviço de Informações da Universidade Federal da Paraíba, Herbário Prof.º Lauro Pires Xavier, 2008. 57 Através destes dados observa-s que na parte alta da camboa de Caracabu encontra-se espécies de gramíneas, e na parte intermediaria L. racemosa (mangue manso), R. mangle (sapateiro) e A. shaueriana (Canoé), sendo possível a observação de partes alagadas, que mantém o solo areiado. Observado na figura 10. FIGURA 10: Visão parcial do mangue areiado: em primeiro plano observa-se a presença de gramíneas, em seguida Laguncularea racemosa. Foto: Iaponira Sales de Oliveira, 2008 R. mangle (Mangue Vermelho) é o mangue que se adapta a solos instáveis encharcados, por isso este foi encontrado nas proximidades do córrego. A. shaueriana (Canoé) é encontrado na parte mais interna do manguezal, essas áreas são mais altas e com maior salinidade. Percebe-se ainda que A. shaueriana (Mangue Branco) tem grande influência da oscilação da maré. Como R. mangle que é facilmente visto devido ao seu tipo de raiz em forma de arcos para sua fixação nas áreas lodosas do manguezal, diferentemente desse temos A. shaueriana que possui raízes curtas e na vertical, como se fossem espetos, próprias para solos salinos. Por fim a espécie mais abundante, A. shaueriana, essa se adapta bem a regiões de submersão freqüente pela maré. Observa-se então que cada espécie de mangue tem características próprias para adaptação do manguezal, ocorrendo assim um equilíbrio morfofisiológico e ecológico deste ecossistema (CARINE et al, 2006). A presença e atividade das plantas em ambientes de mangue têm sido indicadas na literatura como um dos fatores responsáveis pela variação redox nestes ambientes. Inúmeras evidências indicam que as espécies de mangue são capazes de oxidar suas rizosferas através 58 da translocação do oxigênio absorvido nas porções superficiais do solo até as estruturas radiculares localizadas em subsuperfície, permitindo sua difusão para o solo do entorno (MCKEE, 1993; MCKEE et al., 1988). A vegetação pode ainda vir a alterar o equilíbrio físico-químico destes solos por meio da liberação de ácidos orgânicos de baixo peso molecular (exudatos radiculares) os quais servem como uma fonte de energia de alta qualidade e, portanto, prontamente disponível à decomposição pelos microorganismos. Em outra parte da camboa de caracabu, denominada arisco (terra plana), encontra-se guaiamum (Cardisoma guanhumi), ciperácea (Cyperus sp.1; Bulbostylis capillaris (L.) C.B. Clarke; Cyperus amabilis Vahl; Fimbristylis cymosa R. Br) cactácea (Pilosocereus sp. Sp.), Laguncularia racemosa (mangue manso), Leguminosas (Chamaecrista rotundifolia (Pers.) Greene). Na figura 11 a) é possível observar a presença de plantas mais altas, o que indica que esta área apresenta uma topografia mais baixa, por tanto apresenta maior quantidade de água que permite um bom desenvolvimento dos vegetais, b) topografia mais alta dificultando a presença de água, e, portanto a vegetação é mais baixa, ocorrem áreas de apicum, com a presença de gramíneas (Chamaecrista rotundifolia (Pers.) Greene), cactáceas (Pilosocereus sp.) e outras plantas de terra firme. a) b) FIGURA 11: a) Camboa de Caracabu, onde o substrato de mangue é areiado e ocorre a presença de gramíneas. b) cactáceas encontradas na região. Foto: a) José da Silva Mourão, 2008; b) Iaponira Sales de Oliveira, 2008. 59 No mangue alto, expressado na figura 12 observa-se a diversidade de espécimes vegetais encontrada na camboa de Caracabu incluindo a L. racemosa (manso), e Brédo, ( Iresini sp). a) b) FIGURA 12: a) Demonstração da diversidade vegetal da região da camboa de Caracabu, e b) o Brédo, como é denominado pelos catadores de caranguejos. Foto: c) José da Silva Mourão, 2008. d) Iaponira Sales de Oliveira, 2008. De acordo com os entrevistados, o mangue areiado apresenta maior quantidade de caranguejo-uçá macho e de A. shaueriana (canoé), como observado nos trechos das entrevistas. “o mangue ta morrendo por ser muito areado, tem muito bredo e caranguejo macho”. (Biba – Tramataia) 5.2.2 Caracterização do mangue duro da camboa dos Tanques Para os catadores o mangue duro e o areado são os ambientes mais propícios a coleta do caranguejo-uçá (U. cordatus), por apresentar um solo consistente, e segundo eles apresentam maior quantidade de espécimes de U. cordatus, macho como observado nos trechos das entrevistas. “Por que sai mais macho, tem mais ariado, que é a parte mais dura”. Venâncio Marques De Meneses “o Mangue é duro é melhor de andar e o caranguejo é sempre maior”. Antônio (Bujão) “o Mangue é duro e adianta o serviço”. 60 Vanderley Soares Dos Santos FIGURA 14: Representação percentual da composição do substrato de mangue duro existente na camboa de Tanques. O mangue duro e o mangue areiado apresentam semelhanças tanto na composição, quanto na concepção dos catadores, as analises granulométricas mostraram que o mangue duro apresenta uma quantidade semelhante de Silte e Argila, comparada ao tipo de substrato de mangue areiado, porém uma menor proporção de areia grossa em relação à areia fina observada na Figura 15. FIGURA 15: Demonstração do mangue duro e a presença de caranguejo-uçá. FOTO: José da Silva Mourão, 2008. 61 5.2.3 Caracterização do mangue mole da camboa dos Tanques O substrato de mangue do tipo mole apresentou a seguinte composição granulométrica observada na figura 16. FIGURA 16: Demonstração da composição do mangue mole, existente na camboa dos Tanques mediante as analises granulometricas. Neste tipo de solo de mangue encontra-se uma maior fração de Silte e Argila o que caracteriza uma consistência pastosa, como pode ser visto na figura 16, e por isto é denominado de mangue mole. Segundo os catadores, este tipo de mangue apresenta uma grande quantidade de caranguejo fêmea, pois, este tipo de solo apresenta substâncias que nutrem a fêmea quando esta se encontra ovígera. Esta informação não foi encontrada na literatura especializada. Outra característica identificada pelos catadores, é que este tipo de solo também dificulta o trabalho, principalmente aqueles que utilizam a “técnica de redinha” na captura dos caranguejos, pois o mangue mole encontra-se na maior parte do tempo alagado, além disso, este tipo de mangue, contém uma grande quantidade de Rhizophora mangle. “dar muita fêmea, por que tem mais lama e tem mais vitamina” (Biba - Tramataia). 62 a) b) FIGURA 17: Mangue mole: a) aspecto pastoso do substrato sitico-argiloso. b) predominância de R. mangle (sapateiro) Foto: OLIVEIRA, Iaponira Sales de As inundações que são freqüentemente no ambiente do Manguezal, são responsáveis por importantes alterações físico-químicas nestes solos. Alterações estas que causam mudanças drásticas no equilíbrio de minerais e na dinâmica de elementos como o ferro e o enxofre (PONNAMPERUMA, 1972). Outro fator que também sofre alterações é a taxa de difusão do oxigênio no solo, a qual sofre uma diminuição de cerca de 10.000 vezes, tornandose muito inferior à demanda microbiana para oxidação da matéria orgânica. A decomposição desta passa, então, a ocorrer através de microorganismos anaeróbios e à custa de outros receptores de elétrons que não o O2, seguindo-se a seguinte seqüência termodinâmica: NO3-, Mn4+, Fe3+, SO42-, CO2 (metanogênese), N2 e H+. (FROELICH, 1979; SCHULZ, 2000). Segundo Hill (1981), a combinação dos elevados conteúdos de matéria-orgânica e enxofre com a condição anaeróbia, as fontes de Fe reativo (via aportes de sedimentos inorgânicos) e as fontes de SO42- prontamente disponíveis, faz dos solos de mangue um ambiente propício à ocorrência da redução bacteriana do sulfato (RBS). Devido a RBS ser considerada como a forma de respiração preponderante nestes locais, os compostos de ferro e enxofre são importantes para os ciclos biogeoquímicos ativos nestes ambientes (MACKIN; SWIDER, 1989). Deve-se ter em conta, entretanto, que a condição geoquímica dos solos de mangue é submetida a variações incessantes em função da amplitude das marés, das diferentes estações climáticas (influência sobre o aporte de matéria orgânica, sedimentos continentais pelas 63 chuvas etc) e da atividade da fauna e da flora, podendo ser ora redutoras e ora oxidantes, (FERREIRA, 2006). Nas camadas superficiais de sedimentos estuarinos, incluindo os estudados neste trabalho, a presença de elevadas quantidades de matéria orgânica provenientes da vegetação, a intensa atividade biológica e a liberação de compostos orgânicos e oxigênio pelas raízes induzem modificações tão intensas ao balanço químico destas porções, que estas passam se comportar como sub-sistemas independentes dentro do sedimento (MADUREIRA et al., 1997), se constituindo no que se denomina de solo. De acordo com Ferreira (2006) solos devem ser entendidos como sistemas complexos onde a interação do sedimento (material de origem) com a atividade biológica (vegetação e fauna) se encontra obrigatoriamente presente influenciando os processos atuantes na interface com a atmosfera. Tratar o substrato como sedimento e não como solo pode supor uma abordagem simplificada dos processos atuantes e/ou a subestimação das interações possíveis. Diante destes resultados pôde-se plotar os pontos georrefenciandos em um mapa cartográfico, por meio do SIG, e das analises granulométrica, indicando os tipos de solo de mangue das camboas preferenciais para a coleta do caranguejo-uçá no ERM. 64 FIGURA 18: Mapa dos tipos de solo das principais camboas, utilizadas para a coleta do caranguejo-uçá no ERM. FONTE: Uso do solo atual – Atlas do Plano Estadual de Recursos Hídricos do estado da Paraíba, 2006. IBGE – Bases cartográficas do limites municipais, 2005. Os dados demonstram que os substratos de mangue, analisados das camboas de Caracabu, Tanques, Macaco e Mero do ERM, tidos como solos indiscriminados de mangue, não diferem na composição, em relação a outros estudos realizados com solos de mangue, a exemplo de Gamero et al (2004), pois apresentam solos halomórficos desenvolvidos a partir de sedimentos marinhos e fluviais com presença de matéria orgânica e que ocorrem em 65 regiões de topografia plana na faixa costeira sob a influência constante do mar. Todas as classes de solos dessas áreas estão associadas à influência marcante da água, podendo ocorrer: Areias Quartzosas Marinhas e Podzóis hidromórficos (em terraços arenosos) e solos Aluviais. Apesar de parecer apenas uma questão de caráter semântico, a denominação e o estudo destes substratos como solos, auxilia não só no entendimento de sua dinâmica e funcionamento, mas também evidencia a necessidade de estudos mais detalhados sobre as características e processos de formação destes solos fazendo uso de técnicas mais apropriadas. Diante destas afirmações observa-se que as comunidades tradicionais, em especial as comunidades ribeirinhas, são grupos que apresentam principalmente uma peculiaridade social e cultural, apresentando modo de vida com dependência da natureza e dos ciclos naturais, atrelados a um conhecimento aprofundado referentes ao uso dos recursos naturais. 5.3 TECNICAS PARA CAPTURA DO CARANGUEJO-ÚÇA Uma das principais técnicas utilizadas para a captura do caranguejo-uçá na região do ERM é a “redinha”, dos catadores entrevistados 49 afirmaram utilizar a técnica da redinha, poucos são os que capturam o caranguejo por tapamento, dos entrevistados apenas seis utilizam esta técnica, sendo esta a mais antiga em que o catador, com as mãos ou auxiliado por um instrumento denominado de “ferro de córvo” ou “cavadeira”, observado na Figura 19 aumenta o diâmetro das aberturas das galerias. Em seguida, com a ajuda das mãos, ocorre a obstrução das tocas com camadas de raízes, lama e sedimentos do mangue, que são empurradas com os pés para o interior das mesmas, de modo que sejam prensadas na medida certa. Ao final deste trabalho ocorre a “catação”, ou seja, a coleta dos caranguejos, que dura por volta de duas horas. De acordo com os caranguejeiros, os animais cujas tocas foram tapadas se dirigem até a superfície à procura de ar e, debilitados pela diminuição do oxigênio, tornam-se presas fáceis (NASCIMENTO, 2007). 66 FIGURA 19: Catador de caranguejo demonstrando o “ferro de córvo” ou “cavadeira” instrumento utilizado para a técnica de captura por tapamento. Foto: Iaponira Sales de Oliveira, 2008. Para colocar a redinha na toca do caranguejo o catador com o auxílio de um facão, aumenta o diâmetro da toca. Em seguida cortar a raiz do mangue sapateiro ou mangue vermelho (R. mangle), que é partida em duas metades e fixadas nas extremidades da abertura da toca, onde recebem os fios de nylon que, com as mãos, são empurrados para o interior da galeria (NASCIENTO, 2007). A Figura 20 mostra a confecção da redinha por catadores jovens da região do ERM. FIGURA 20: Confecção da redinha, armadilha utilizada para a captura do caranguejo. Foto: Iaponira Sales de Oliveira, 2008. 67 De acordo com alguns destes catadores (75% dos entrevistados) a redinha não é uma atividade predatória, devido à quantidade de caranguejo que tem se mantido nas camboas. Para outros (25% dos entrevistados) a redinha causa danos ao manguezal, pois os catadores que a utilizam nem sempre retiram os fios de nylon do manguezal e com isto a qualidade do caranguejo tem sido comprometida. Trabalhos já realizados no ERM a exemplo de Nascimento (2007) mostram que os procedimentos das técnicas de captura do caranguejo-uçá são relativamente semelhantes aos realizados pelos caranguejeiros de Várzea Nova – PB, estudados por Nordi (1992). Na Paraíba, a técnica da “redinha” é tida como predatória para o recurso caranguejouçá desde 14 de outubro de 1996, pela Portaria Nº 4 da Superintendência Estadual do IBAMA, que proibiu terminantemente essa forma de captura. Hoje, a Portaria IBAMA Nº 034/03-N de junho de 2003 (ver Anexo C, pág. 92), reforça a proibição para as regiões do Norte e Nordeste, permitindo a coleta do caranguejo apenas pelo método de braceamento, com o auxílio de gancho ou cambito com proteção na extremidade. (NASCIMENTO, 2007). Alves (2002) afirma que a “redinha” indica uma ruptura clara dos padrões de captura tradicionais, envolvendo menos esforço físico por parte do catador do que o exigido pela técnica do “tapamento”. Botelho et al. (2000) apontam essa forma de coleta como uma inovação tecnológica praticada pelos caranguejeiros há poucos anos. E a utilização desta técnica vem preocupando alguns dos catadores de caranguejo-uçá, que acreditam ser a causa para a diminuição da espécie na região. Observado na entrevista realizada, com um dos catadores de caranguejo-uçá de Marcação. “Arintigui ta diferente só tem planta não tem quase caranguejo por conta da redinha (caiu cerca de 80%) agora tem pouco”. João Cavalcante Sousa Neto (Marcação) No trabalho realizado por Nascimento (2007) no ERM, os catadores de caranguejos afirmam que a poluição do manguezal é causada pelas “redinhas”, que são jogadas e/ou esquecidas pelos caranguejeiros durante o trabalho. Os catadores afirmam que as “redinhas” que ficam no mangue se desmancham com o tempo, “apodrecem”, criando uma “nata”, ou liberam uma química, prejudicando o ecossistema e as formas de vida existentes. O mesmo autor diz que a morte dos caranguejos presos às “redinhas” é proveniente do esquecimento destas pelos caranguejeiros. Outro fator preocupante, em relação à técnica da redinha é sobre o corte da raiz do mangue sapateiro (Rhizophora mangle) evidenciado como um dos impactos 68 mais consideráveis sobre o manguezal. Para cada “redinha” introduzida na toca de um animal, uma raiz é cortada. Em média, são colocadas 180 “redinhas” por dia de trabalho, isso significa dizer que 180 raízes são cortadas por cada catador, considerando que a maioria vai ao mangue cinco vezes na semana (70%), já são 900 raízes, por mês seriam 4.140, totalizando no decorrer de um ano 49.680 raízes (Nascimento, 2007). A figura 21 representa, a identificação da produtividade em relação à quantidade de cordas de caranguejo-uçá retirada das camboas mais freqüentas pelos catadores da região do ERM. FIGURA 21: Representação da produtividade em relação à quantidade de cordas de caranguejo-uçá retidas das principais camboas do ERM. Estes resultados mostraram que a técnica da redinha possibilita uma maior captura de caranguejo-uçá, especialmente na camboa de Caracabu, uma das mais freqüentadas pelos catadores, que segundo eles, esta apresenta um solo consolidado, que facilita o trabalho com a redinha. Foi identificada uma média de 20 cordas (cada corda contém 12 caranguejos), retiradas durante o trabalho dos catadores que a utilizam, enquanto que na camboa do Mero, observa-se a menor produtividade, uma média de sete cordas retiradas pelos catadores, que geralmente utilizam a técnica de Tapamento, para a captura do caranguejo-uçá, em detrimento da constituição do solo de mangue. Apesar da importância notória do caranguejo-uçá para os manguezais, ecossistemas de funções ecológicas relevantes e constatadas cientificamente, e para milhares de ribeirinhos, 69 como recurso econômico, o manejo desse recurso ainda é incipiente do ponto de vista das demandas ecológicas, econômicas, sociais e culturais. Uma proposta para atender a tais demandas é a realização do manejo participativo, a base dessa proposta é a complementaridade entre o conhecimento local e o científico (JANKOWSKY et all, 2006). De acordo com Blandtt e Glaser (2000), as sociedades humanas e o recurso caranguejo constituem uma rede estrutural econômica que se envolve em meios e processos de produção e comercialização, através de práticas rudimentares de exploração social do homem e ecossistêmica do recurso caranguejo. No Nordeste brasileiro, a exploração de U. cordatus reveste-se de grande importância social, já que dela se ocupa um grande contingente de pessoas residentes em áreas costeiras próximas aos manguezais, gerando milhares de empregos diretos e indiretos, (ALVES e NISHIDA, 2003). O reconhecimento dos impactos ambientais, sociais e econômicos associados ao declínio e à degradação dos manguezais agora está sendo abordadas por meio de esforços no campo legislativo, de manejo, conservação e reabilitação. Isto inclui a introdução de novas leis e novos órgãos reguladores, com papéis administrativos ou consultivos mais claros em relação às questões ambientais; condição de preservação mais forte para algumas áreas de mangue de valor excepcional (por ex., Reservas da Biosfera) e maior ênfase sobre a conscientização e educação do público em geral. Contudo, várias das políticas de manejo atualmente adotadas ainda são setoriais, o que muitas vezes leva a conflitos de interesse, e à contínua exploração insustentável dos recursos de mangue (MACINTOSH, 2005). 70 6.0 CONCLUSÃO Todos os catadores entrevistados possuem um conhecimento profundo e detalhado dos aspectos ecológicos e dos locais de coleta. O fato de classificarem o mangue de acordo com o tipo de substrato: mangue mole, duro ou areiado, ou ao tipo de vegetação: mangue sapateiro, mangue manso, mangue canoé, demonstram a percepção espacial que os mesmo detém do ambiente em que estão inseridos. Com a elaboração dos mapas mental e oral, foi possível comprovar a percepção do ambiente em que estão inseridos e as relações ecológicas com este ambiente, alem de proporcionar a utilização de novas ferramentas como o GPS (Global Positioning System) para a identificação das principais locais de coleta do caranguejo-uçá no ERM. A identificação e caracterização dos principais locais de coleta, só foi possível, devido às informações obtidas junto aos catadores, que expuseram os fatores que contribuíram para esta preferência como: tipo de substrato favorável ao trabalho de catação e presença de espécimes de caranguejo-uçá machos com tamanho viável a comercialização. Através destas informações foram realizadas as análise granulométrica, para a identificação da composição dos tipos de substratos de acordo com a classificação dos catadores, no entanto pode-se concluir que as informações obtidas sobrepõem com o conhecimento dos mesmos sobre os tipos de mangue. Alem disto ficou comprovado que a técnica da redinha é a mais difundida entre os catadores, pois garante uma maior produtividade. Por tanto as informações contido neste trabalho, contribuirá de forma significativa para a elaboração de um plano de manejo da área do ERM, favorecendo o compromisso com a sustentabilidade da pesca artesanal, em especial da catação do caranguejo-uçá realizada pelos catadores das comunidades de Tramataia e Três Rios. 71 7.0 REFERÊNCIAS ALCÂNTARA-FILHO, P. Contribuição ao estudo da biologia e ecologia do caranguejo-uçá, Ucides cordatus (L. 1763) (Crustacea, Decapoda, Brachyura), no manguezal do rio Ceará (Brasil). Arq. Ciên. Mar, v. 18, p. 1 – 41, 1978. ALVES, R. R. N. Estrutura populacional de Ucides cordatus cordatus (L., 1763) (Decapoda, Brachyura) e a atividade de coleta no manguezal do estuário do rio Mamanguape, Paraíba: um enfoque social e etnoecológico. 2002. 139 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Biológicas) - Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa – PB, 2002. ALVES, R. R. N.; NISHIDA, A. K. A ecdise do caranguejo-uçá, Ucides cordatus L. 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O PRESIDENTE DO INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS-IBAMA, nomeado por Decreto de 03 de janeiro de 2003, publicado no Diário Oficial da União de 06/01/2003, no uso das atribuições que lhe conferem o art. 24 do Anexo I ao Decreto nº 4.756, de 20 de junho de 2003, que aprovou a Estrutura Regimental do IBAMA, publicado no D.O.U. de 23 de junho de 2003 e o item VI do art. 95 do Regimento Interno aprovado pela Portaria GM/MMA nº 230, de 14 de maio de 2002, republicada no D.O.U. de 21 de junho de 2002, e Considerando as disposições do Decreto-lei nº 221, de 28 de fevereiro de 1967; Considerando as recomendações da Reunião Técnica sobre Ordenamento da Cata do Caranguejo-uçá (Ucides cordatus) nas Regiões Norte e Nordeste do Brasil; e, Considerando o que consta no Processo IBAMA/SEDE nº 02001.009707/2002-77, R E S O L V E: 90 Art.1º Proibir, anualmente, no período de 1º de dezembro a 31 de maio, a captura, a manutenção em cativeiro, o transporte, o beneficiamento, a industrialização e a comercialização de fêmeas da espécie Ucides cordatus, conhecido popularmente por caranguejo, caranguejo-uçá, nos Estados do Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. Parágrafo único. Entende-se por manutenção em cativeiro, o confinamento de caranguejos vivos em ambientes restritos e sob domínio. Art.2º Nos meses de dezembro a maio de cada ano, fica delegado aos Gerentes Executivos do IBAMA, nos Estados de que trata o art. 1º desta Portaria, competência para, em portaria específica, estabelecer, em caráter experimental, e segundo as peculiaridades locais, a suspensão da captura, manutenção em cativeiro, transporte, beneficiamento, industrialização e comercialização da espécie Ucides cordatus, exclusivamente, durante os dias de “andada”. Parágrafo único. Entende-se por andada o período reprodutivo em que os caranguejos machos e fêmeas saem de suas galerias (tocas) e andam pelo manguezal para acasalamento e liberação de larvas. Art.3º Proibir, em qualquer época, nos Estados de que trata o art.1º desta Portaria, a captura, a coleta, o transporte, o beneficiamento, a industrialização e a comercialização de qualquer indivíduo da espécie, Ucides cordatus cuja largura de carapaça seja inferior a 6,0 cm (seis centímetros). Parágrafo único. Para esta espécie, o tamanho é dado pela maior largura de carapaça (casco). Para efeito de mensuração, a largura de carapaça é a medida tomada sobre o dorso do corpo de uma margem lateral à outra. Art.4º Proibir, em qualquer época, nos Estados de que trata o art. 1º desta Portaria, a captura com a retirada de partes isoladas (quelas, pinças, garras ou puans) da espécie Ucides cordatus. Art.5º Permitir, nos Estados de que trata o art. 1º desta Portaria, a captura da espécie Ucides cordatus somente pelo método de braceamento com auxílio de gancho ou cambito com proteção na extremidade. 91 Art.6º O produto da captura apreendido pela fiscalização, quando vivo, deverá ser devolvido, preferencialmente, ao seu "habitat", respeitando-se o disposto no Decreto nº 3.179, de 21 de setembro de 1999. Art.7º Aos infratores da presente Portaria serão aplicadas as penalidades previstas no Decreto nº 3.179, de 21 de setembro de 1999. Art.8º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as Portarias SUDEPE nº 250, de 20 de maio de 1971, SUDEPE nº 13, de 13 de maio de 1987, IBAMA nº 1208, de 22 de novembro de 1989, IBAMA nº 229, de 7 de março de 1990, IBAMA/PB nº 4, de 14 de outubro de 1996, 86, de 13 de outubro de 1999, IBAMA nº 85, de 16 de julho de 2002, IBAMA nº 133/02-N, de 14 de outubro de 2002 e demais disposições em contrário. Marcus Luiz Barroso Barros Presidente do IBAMA 92 ANEXO B Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos DECRETO Nº 6.040, DE 7 DE FEVEREIRO DE 2007. Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VI, alínea “a”, da Constituição, DECRETA: Art. 1o Fica instituída a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais - PNPCT, na forma do Anexo a este Decreto. Art. 2o Compete à Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais - CNPCT, criada pelo Decreto de 13 de julho de 2006, coordenar a implementação da Política Nacional para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Art. 3o Para os fins deste Decreto e do seu Anexo compreende-se por: I - Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição; II - Territórios Tradicionais: os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, 93 respectivamente, o que dispõem os arts. 231 da Constituição e 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações; e III - Desenvolvimento Sustentável: o uso equilibrado dos recursos naturais, voltado para a melhoria da qualidade de vida da presente geração, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras. Art. 4o Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 7 de fevereiro de 2007; 186o da Independência e 119o da República. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Patrus Ananias Marina Silva 94 ANEXO C Modelo do questionário semi-estruturado a aplicado aos pescadores e coletores referente aos recursos faunísticos explorados na região do estuário Rio Mamanguape. Nome:_________________________________Mora em:________________________ QUESTIONÁRIO SEMI-ESTRUTURADO: CARANGUEJOS 1- O que você pesca? Há quanto tempo? Aprendeu com quem? 2- Pega pra comer ou pra vender? Ou ambos? 3- Onde vivem os caranguejos? Onde é mais fácil de encontrar? 4- O que é mangue pra você? 5- Quais são os tipos de mangues? 6- Os caranguejos que vivem no mangue, em que tipo de mangue é melhor de pegar e encontrar? Por que? Tem muito? 7- Qual camboa tem mais caranguejo? Por que? 8- Como você pega? Quais os dias da semana que você pega? Quantas cordas por dia? Quantos têm na corda? 9- Você acha que os caranguejos têm diminuído? Por que? 10- Qual a técnica que você usa para pegar o caranguejo? Por que?
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