Revista: CartaCapital 03/11/2004 FATOS E MITOS O ultra

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Revista: CartaCapital 03/11/2004 FATOS E MITOS O ultra
Revista: CartaCapital
03/11/2004
FATOS E MITOS
O ultra-som ultramoderno
Com o avanço da tecnologia, hoje em dia é possível criar imagens cada
vez mais detalhadas do bebê em formação.
Mas isso é seguro?
Ultra-som 3 D vale a pena?
E os pais, emocionados, babam na frente de uma tela. São as primeiras imagens
mostrando o coração do feto batendo em ritmo frenético. Não passam de poucas
semanas de gravidez. A cada retorno médico, acompanham com expectativa e
curiosidade o desenvolvimento do bebê. Com o avanço da tecnologia, isso hoje em
dia é possível, e com imagens com definição cada vez maior. Há até imagens
tridimensionais que mostram a feição e até gestos do futuro herdeiro.
A ultra-sonografia fetal 3D tornou-se uma febre. Todo mundo quer uma foto do
bebê antes de ele nascer. Em cada esquina abre um novo centro que oferece essas
imagens artísticas intra-uterinas. Mas será que esse exame pó der considerado seguro?
As sociedades médicas emitem sinais de alerta e de cautela para os parentes e para as
autoridades públicas contra eventuais perigos desse método. Primeira preocupação: a
segurança e os efeitos a longo prazo não foram ainda provados. Segunda
preocupação: a ultra-sonografia deve ser realizada somente por indicações médicas e
não artísticas (isso não é uma simples foto do nenê). Terceira preocupação: a ausência
de controle regular dos aparelhos utilizados e da formação do pessoal que realiza
esses exames.
O grande medo dos especialistas é o do falso sentimento de segurança. Há casos de
mães que deixam de fazer a ultra-sonografia clássica, com indicação médica precisa,
porque já viram a linda foto do bebê. Ele parece ótimo. Em alguns países, como na
França e nos EUA, muitos radiologistas e obstetras interromperam a realização de
ultra-sonografia em razão de riscos jurídicos associados a esse exame. Estudos
epidemiológicos apontam para algumas observações no mínimo curiosas. Uma
pesquisa realizada na universidade de Uppsala, na Suécia, e publicada na revista
Epidemiology, demonstrou que a exposição à ultra-sonografia durante a gravidez
aumenta o risco de a criança nascer canhota. Apesar de não ser um problema em si,
esse fato pode sugerir alguns efeitos diretos da ultra-sonografia sobre o
desenvolvimento do cérebro do feto.
A dra. Mariângela Maluf, ginecologista e obstetra da Clínica Diason, fala sobre os
perigos da ultra-sonografia.
CartaCapital: Como funciona o ultra-som?
Mariangela Maluf: O ultra-som saiu do laboratório para uso militar e daí para as
aplicações médicas em um período de cem anos. Do ponto de vista técnico, pequenos
pontos brancos estáticos presentes no monitor evoluíram para imagens montadas, com
escalas de variação do cinza, obtidas em tempo real, com alta resolução (inferior a 1
mm) e, mais recentemente, para as reconstruções tridimensionais (3D-US) e,
finalmente, a ultra-sonografia 3D em tempo real, conhecida como 4D-US (um erro de
denominação).
CC: Além da moda de se ver o bebê, existem benefícios no uso rotineiro da ultrasonografia na gravidez?
MM: A ultra-sonografia obstétrica determinou um impacto maior no cuidado e no
acompanhamento de gestantes do que qualquer outra tecnologia desenvolvida nas
duas últimas décadas. Houve uma melhora notável na qualidade das imagens.
Adicionalmente, os obstetras fizeram um grande progresso no aprendizado de como
utilizar as técnicas de ultra-sonografia para reconhecer e tratar as doenças fetais.
CC: Mas a ultra-sonografia pode ter efeitos colaterais?
MM: A questão de segurança para a realização da ultra-sonografia na gestação, como
para qualquer outro equipamento ou intervenção médica, motiva continuamente a
pesquisa de possíveis danos biológicos do ultra-som. A boa notícia é que a ultrasonografia tem uma ficha exemplar de segurança em 50 anos de aplicações clínicas.
CC: Quais são seus potenciais efeitos colaterais?
MM: Embora não existam dados epidemiológicos que demonstrem efeitos
prejudiciais em fetos (ou na população geral examinada), o ultra-som é uma forma de
energia que possui efeitos bem conhecidos nos tecidos que atravessa: primeiro, o
calor, um efeito direto nos tecidos avaliados que, apesar da possibilidade teórica de
causar lesão térmica tecidual, nunca foi documentado até o presente. E também a
cavitação (criar cavidades), secundária à alternância de pressões positiva e negativa a
qual se refere à alteração explosiva do volume de bolhas de gás microscópicas presas
dentro da estrutura dos tecidos. Teoricamente, esses tecidos poderiam ser lesados,
com potencial comprometimento de certas funções. Esses efeitos são inerentes às
propriedades físicas do ultra-som, mas não demonstram efeitos prejudiciais em
humanos.
CC: E os ultra-sons 3D e 4D são mais “perigosos” do que o convencional?
MM: A ultra-sonografia tridimensional (3D-US e 4D-US), sendo um processo
computacional gráfico que “monta” a imagem após a varredura bidimensional (2DUS), não aumenta o tempo de exposição do feto ao ultra-som. Contudo, nos casos nos
quais tenta se obter a imagem 3D “perfeita” do feto, um risco inerente à exposição
prolongada do feto pode estar presente. Desse modo, seria prudente limitar a
exposição ao ultra-som somente a situações que são necessárias e informativas do
ponto de vista médico.

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