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UNI
REVISTA
Revista Científica do Instituto de Ensino Superior do
Sul do Maranhão (Iesma), mantido pela Unidade de
Ensino Superior do Sul do Maranhão (Unisulma).
Imperatriz (MA), ano 2, n.2, janeiro/julho de 2012, p. 1-160.
UNISULMA – Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão
PPRESIDENTE
Dimas Salustiano da Silva
VICE-PRESIDENTE DE PROGRAMAS ESPECIAIS
Joane Gláucia Silva de Almeida e Almeida
VICE-PRESIDENTE DE ACOMPANHAMENTO E CONTROLE
José Raimundo S. Almeida - Lula Almeida
VICE-PRESIDENTE DE AUDITORIA E FISCALIZAÇÃO
José Lauro de Castro Moura
IESMA - Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão
DIRETORA GERAL
Joane Gláucia Silva de Almeida e Almeida
DIRETOR DE PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO
Alceu César Silva
COORDENADORES DE CURSOS
ADMINISTRAÇÃO
Mauro Estenio Façanha Pinheiro
CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
Iane Paula Rego Cunha
DIREITO
Artur Antonio da Rocha
EDUCAÇÃO FÍSICA
Amanda Ribeiro Miranda
ENFERMAGEM
Erika Ferreira Tourinho
NUTRIÇÃO
Neusa Araújo de Oliveira
SERVIÇO SOCIAL
Herta Maria Castelo Branco Ribeiro
UNI
REVISTA
Revista Científica do Instituto de Ensino Superior do
Sul do Maranhão (Iesma), mantido pela Unidade de
Ensino Superior do Sul do Maranhão (Unisulma).
Revista UNI é uma publicação semestral do Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão –
Iesma, mantido pela Unidade de Ensino Superior
do Sul do Maranhão – Unisulma, cujo objetivo
é divulgar produções acadêmicas de docentes,
discentes e técnicos da instituição e também de
colaboradores, nas áreas de ciências humanas,
sociais, biológicas e da saúde, estimulando o debate acerca de questões e temáticas significativas
dessas áreas de conhecimento.
2012 – IESMA/UNISULMA
Conselho editorial: Aldinar Martins Bottentuit (UFMA), Amanda Ribeiro Miranda
(Unisulma), Artur Antonio da Rocha (Unisulma), Bernadete de Lourdes de Araújo Silva
(Unisulma), Daniela Meirelles Andrade (UFLA), Edmundo Lima de Arruda Junior (UFSC),
Edney Loiola (Uema/Fama), Eugenia Cristina Gonçalves Pereira (UFPE), Hugo Ferreira Braga
Tadeu (Centro Universitário UNA), Iane Paula Rego Cunha (Unisulma), Iara Guimarães
Altafin (UNB), Janelder Eustáquio Barbosa da Costa (Unisulma), José Ribas Vieira (UFRJ/
PUC-RJ), Jonas Alves da Silva Junior (UFRRJ), Júlio Wilson Ribeiro (UFC), Kiria Karine Lins
Martins Ribeiro (Unisulma), Márcia Helena Sauáia Guimarães Rostas (IFMA), Marcos Fábio
Belo Matos (UFMA), Maria da Glória Freitas (UFMA), Maria Regina de Avila Moreira (UFRN),
Mauro Estenio Façanha Pinheiro (Unisulma), Miguel Daladier Barros (Unisulma), Nádia
Socorro Fialho Nascimento (UFPA), Paulo Roberto da Silva Ribeiro (UFMA), Raquel de Moraes
Azevedo (UFMA), Regysane Botelho Cutrim Alves (UFMA), Rossane Cardoso Carvalho
(Uema), Sandra Helena de Mesquita Pinheiro (UFMA), Valdirene Pereira da Conceição
(UFMA), Valéria Lucília Forti (UERJ), Weliton Sousa Carvalho (UFMA), Witembergue Gomes
Zaparoli (Unisulma), Zilmar Timóteo Soares (Uema/Unisulma).
Edição e produção gráfica: Yara Medeiros
Capa: ilustração de Yara Medeiros, inspirada em Atena (Minerva), a deusa da sabedoria da
mitologia greco-romana.
Revisão: Marcos Fábio Belo Matos
Revisão e resumo do texto em inglês: Regysane Botelho Cutrim Alves
Impressão e acabamento: Gráfica Santa Marta
Ficha catalográfica
Adélia Diniz
IESMA/UNISULMA – Bibliotecária CRB 13/507
R454
Revista UNI / Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão.-.
Imperatriz. v. 2, n. 2 (jan./jul.) 2012.
160f.:Il
Semestral
ISSN 2236-3068
1.Periódico. II. Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão.
III. Título.
CDU (05)(812.1Imperatriz)
Contatos
Rua São Pedro, s/n – Jardim Cristo Rei
Imperatriz – MA – CEP 65907-070
Fone: (99) 2101 0202 / Fax: (99) 2101 0203
E-mail: [email protected]
http://www.unisulma.edu.br
EDITORIAL
Estamos apresentando a segunda edição da Revista UNI – revista científica da Unisulma. Fruto de um esforço concentrado de
professores, alunos, equipe técnica e de todo o corpo gerencial
da Unisulma, este número demarca a edição do ano de 2012
e, como reza a política editorial, contempla todas as áreas de
conhecimento que a instituição abrange.
O segundo número aponta para duas ações importantes: o
caminho para a consolidação da Revista UNI como uma publicação científica representativa do ‘estado da arte’ dos estudos
acadêmicos em Imperatriz e em toda a região tocantina e a
criação de uma ‘cultura da publicação’ entre professores e alunos da Unisulma.
Os artigos enfeixados nesta edição versam sobre temas diversos: escola e meio ambiente; afetividade e ensino; poluição e
direito ambiental; fibra alimentar; transferência de renda; dignidade humana; aves urbanas; gestão por competência; livro de
imagens e educação; humanismo na administração. A ideia é
sempre abarcar o maior número de temas possível e proporcionar, com isso, um debate ampliado acerca de questões importantes que nos cercam.
Esperamos que este número tenha uma acolhida tão auspiciosa quanto o primeiro. E, desde já, convidamos pesquisadores,
docentes e discentes, daqui e de qualquer lugar, a publicar na
Revista UNI. Porque o conhecimento não tem fronteiras!
Um abraço e boa leitura!
SUMÁRIO
11
13
15
APRESENTAÇÃO
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS
ADMINISTRATION AND STUDIES
Omar Aktouf and David Holford
39
GESTÃO POR COMPETÊNCIAS:
um novo modelo de gerenciamento
Rhecyelle Mota Belfort, Ediana di Frannco Matos da Silva Santos
e Marilsa de Sá Rodrigues Tadeucci
55
57
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
ESTUDO DAS AVES URBANAS NO PROCESSO AMBIENTAL
DE IMPERATRIZ (MA)
Ladislau Freitas Varão e Jullys Alan Guimarães Gama
67
FIBRA ALIMENTAR COMO MECANISMO PREVENTIVO
DE DOENÇAS CRÔNICAS E DISTÚRBIOS METABÓLICOS
Thamires Moraes Brito Macedo, Gracilene Schmourlo
e Kátia Danielle Araújo Lourenço Viana
79
81
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
TRANSFERÊNCIA DE RENDA: elemento de inclusão social
dos beneficiários do Programa Bolsa Família no bairro Vila
Davi II do município de Imperatriz?
Jailson de Macedo Sousa, Édyla Azevedo da Silva, Julieta Guerra Maia
e Sueli Brito Barbosa
95
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E EXTREMA POBREZA:
elementos para um debate acerca da democracia brasileira
Alessandra Kelly Fonseca Dantas
109
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
111 A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE
ENSINO E APRENDIZAGEM COMO MEDIADORA DA PRÁXIS
EDUCATIVA NO ENSINO SUPERIOR
Felisnaide Martins dos Santos
123 O LIVRO DE IMAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
um recurso favorável para despertar o desejo para a leitura
Glaucia Feitosa Cunha e Jonas Alves da Silva Junior
137 A FUNÇÃO DA ESCOLA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
Vanderlene Brasil Lucena e Zilmar Timóteo Soares
151 RESENHA: TREVIÑO, Ernesto, et al. Factores asociados
al logro cognitivo de los estudiantes de
América Latina y el Caribe
Paulo Menis e José Ribamar Neres Costa
157 NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DE TRABALHOS
10
APRESENTAÇÃO
CONSOLIDANDO A PRODUÇÃO CIENTÍFICA
É com grande satisfação que entregamos à comunidade acadêmica
este segundo número da Revista UNI – periódico científico da Unisulma. Com ele, estamos dando mais um importante passo rumo
à consolidação dessa publicação como um veículo aberto a todos
aqueles que desejam colaborar com o labor acadêmico-científico
nas áreas de Ciências Naturais, Humanas, Sociais e Biológicas. As
opiniões e ideias contidas nas páginas que se seguem buscam expressar o melhor da produção científica dos nossos professores, alunos, colaboradores e parceiros.
Este segundo número vem marcado por conquistas importantes.
Conseguimos ampliar o Conselho Editorial da Revista, estamos publicando o primeiro artigo de autores internacionais (escrito em inglês) e temos mais artigos assinados em parceria professor-aluno.
Isso demonstra o amadurecimento da nossa publicação e a sua
transformação em um repositório definitivo de pesquisas e pesquisadores, tanto internos quanto externos.
Por tudo isso, o momento se apresenta extremamente positivo, permitindo-nos sonhar com grandes realizações. Trabalharemos sempre na perspectiva de transformar o Iesma/Unisulma num centro
de excelência no ensino, na pesquisa e na extensão universitária.
O que, acreditamos, vai se refletir na qualidade cada vez maior da
nossa publicação.
Boa leitura a todos.
Joane Gláucia Silva de Almeida e Almeida
Diretora geral do Iesma
11
12
ARTIGO
ARTICLE
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
MANAGEMENT, INFORMATION AND SOCIETY
THE IMPLICATIONS OF
HUMANISM FOR BUSINESS
ADMINISTRATION AND STUDIES1
Omar Aktouf 2
David Holford 3
Abstract
This paper proposes a radical re-humanization on the management traditional view, which understands the employee as an
objectified individual. Referring to the theories of Karl Marx states
that labor is the strongest form of human alienation and, therefore,
must be fought. A more complete view of the human being will
take the privileges out of the managers hands, extending them to
all the employees of the company, including the abolition of salaries
which would be replaced by profit sharing.
Keywords: humanism, marxism, alienation, governance, human
and organizational behavior.
Resumo
Este artigo propõe uma re-humanização radical da visão tradicional da administração, que entende o empregado como um ser
coisificado . Referenciando-se nas teorias de Karl Marx afirma que o
trabalho é a mais forte forma de alienação humana e que, portanto, deve ser combatida. Uma visão mais completa do ser humano
permitirá tirar os privilégios das mãos dos gerentes, estendendo-os
a todos os trabalhadores da empresa, inclusive com a abolição de
salários que seriam substituídos por participações nos lucros.
Palavras-chave: humanismo, marxismo, alienação, governance,
comportamento humano e organizacional
1
On this paper, it was preserved the original scientific writing model written according to its foreign nomenclature.
1
Preservou-se neste artigo a forma original de redação científica
grafada de acordo com nomenclatura estrangeira.
15
the authors
Omar Aktouf
Ph. D. of Administration, HEC Montréal. Teacher at the Management
Department of HEC-Montreal (Canada). Member of the Group for Education and
Environment (Germe) and of the Humanism, Management and Globalization
Centre form Montreal University. He researches Management Critical Theory and
New Management Models – ([email protected]).
.
David Holford
Ph. D. of Administration, HEC, Montréal. Teacher at the Management
and Technology Department of HEC-Montréal (UQAM). He researches
Knowledge Economy in small, medium and large organizations’ contexts –
([email protected]).
os autores
2
Omar Aktouf
Professor do Departamento de Administração (Management) da HEC-Montreal
(Canadá), doutor em Administração pela HEC-Montreal, Membro do Grupo pela
Educação e Meio Ambiente (Germe) e do centro Humanismo, Administração
e Globalização da Universidade de Montreal. Dedica-se à pesquisa sobre a
Teoria Crítica da Administração e Novos Modelos de Gestão Organizacional –
([email protected]).
3
David Holford
Professor do Departamento de Administração e Tecnologia da Universidade
de Quebec a Montreal (UQAM), doutor em Administração pela HEC-Montreal
(Canadá). Dedica-se à pesquisa sobre a economia do conhecimento no contexto
de pequenas, médias e grandes organizações – ([email protected]).
At first glance, mainstream management literature would appear to be showing encouraging ‘signs’ of enlightenment
across the myriad of leitmotivs that are discerned across such
words as “humanism”, “ethics”, “corporate governance”, “social responsibility for business”, and “environmental responsibility”. In fact, if there is a major point of convergence for the
many streams of literature, it is the importance of the human
person or personal attitudes and behaviors at work. No matter the trend or topic: whether it is about corporate ‘culturalism’ (Deal & Kennedy, 1982; Ouchi, 1981; Peters & Waterman,
1982; Schein 1985 and 1991) or motivation and the valorization of human resources (Peters and Austin, 1985; Waterman,
1987; Crozier, 1989; Archier and Serieyx, 1987); whether it is
across total quality, the re-introduction of the meaning of work,
‘empowerment’ (Juran and Gryna, 1980; Michel, 1989; Serieyx,
1989; Peters and Austin, 1985; Mintzberg, 1989) or the realization of the workplace as an area of social interactions and sharing (Peters and Austin, 1985; Weitzman, 1984; Peters, 1987;
DePree, 1989); or whether it is the various pre-occupations on
ethics, ethico-spirituality or other management methods aiming
towards cohesion, participation, initiative and creativity at all
levels, what stands out most clearly is the insistent call from all
quarters on putting the human element at the forefront. Yet let
us not fool ourselves into thinking that these various streams reflect any significant attempt at creating business frameworks or
management practices that embrace man’s emancipation as a
finality onto itself, or “man as being the measure of all things”.
THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
Adopting a humanistic approach within business activities and
interactions is of the utmost priority if society, and by extension,
we as human beings both in the individual and collective sense,
are to survive, flourish and emancipate ourselves.
THE DELETERIOUS DIALECTIC
One of the telltale signs that make us adhere to such a
skeptical view involves a dialectical process working as a vicious
circle, which when viewed from afar seems tautological: the
endless pursuit of maximization of profits leads to a truncated
understanding of the complex and profound nature of Man,
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.15-37 • janeiro/julho • 2012
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AS OF THE 1990S,
which in turn leads to the further quest for maximization
of profits and monetary wealth, whereby cause and effect
become interchangeable. But the various mechanisms
behind the scenes of this process (of which we will only
discuss a few) indicate to us that this process is far from
being banal or tautological.
THERE HAS BEEN AN
INSISTENT CALL FOR
BRINGING TO THE
FOREFRONT A MORE
HUMANE CORPORATE
ETHIC . BUT WHAT
HUMAN ARE WE
OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
REFERRING TO?
18
One half of this process (that is, the endless pursuit of
maximization of profits leading to a reduced or truncated
understanding of Man) involves the very visible “global”
context of unbridled capitalism, eagerly pursuing “maximum profits” in the shortest amount of time possible for
shareholders, all the while, seeking out infinitely exploitable labor. On a macroscopic level, adherents to such economic
interests and passions (which Hirschman (1997) so eloquently
described) attempt to paint these surrogate desires as being
purely rational in nature, with more contemporary followers
such as Baechler (1995) going through great pains to convince
us that this is all about economic or corporate ‘efficiency’ (that
is, the striving to maximize profits while simultaneously trying to
reduce economic costs to the barest minimum). But, as Godelier
(1974) repeatedly pointed out, such an ‘efficiency’ is merely a
masked ideology, since the word “efficiency” by itself carries a
neutral connotation that adheres to no specific objective; and
that the choice of any output objective (whether it be a specific
objective such as 50%, 200% or a generic one such as the maximization of ‘xyz’) for any given input, involves a decision on the
part of an individual or collective subject having roots in a specific ideology. Such an ideology (or ‘rationality’) is also one of
the prime motives for management’s notion (and treatment) of
the human being within the work environment as an instrument
of production, a sort of “mechanical being with needs”, a selfish
maximizing and rational being, and as a cost that must be controlled and minimized. Hence, all reference by mainstream management theory towards putting the human in the forefront is
(whether intentionally or not) but a means towards a financial
end. Yet paradoxically, the attainment of this crude (and often
obscene) objective has been a fleeting success at best for most
western businesses. Many have noted with astonishment and
anxiety that good management, success, productivity and prof-
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
A closer look at the ‘first’ leg (in actual fact there is no ‘first’ or
‘second’ leg in a hierarchical sense, but simply two complementary legs working together simultaneously) of our “deleterious
dialectic” unearths further contradictions and paradoxes. For example, it has now been close to 25 years since In Search of Excellence (Peters and Waterman, 1982) and its various derivatives
have been circulating within academic and orthodox professional management circles, and we have yet to see members of corporations all working together, standing as one person, within
an organization teeming with social interactions, enthusiasm,
participation and mutual aid. Reflecting a simplistic, reductionist understanding of Man, the vogue of “management by excellence” and “corporate culture” that followed in reaction to the
German-Japanese corporate onslaught consisted (and still consists today) not only of manipulating perceptions, but personal
values, beliefs, mental representations, symbols, self-image,
identity, etc; with the aim of affecting the most intimate feelings and sentiments of the individual. All employees, including
management and salaried workers are, as a result, expected to
confound there own ideal of the self with that of the organization that employs them. Yet all of this is doomed to failure, since
the most elementary knowledge of anthropology shows us that
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THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
itability has shifted towards areas such as South-East Asia, and
that North American industry has stagnated in comparison to
the more dynamic Nordic, Japanese and emerging Asian countries (we only have to look at the decrepit and nearly-bankrupt
US automotive companies in comparison to the persistent, long
term profitabilities of Honda and Toyota), while the degradation of nature and quality of life has only gained in amplitude.
Stuck in a theoretical gangue that is cemented by functionalism
and an ideology of consensus, dominant management theorists
cannot see that the root cause of the problem remains a question tied to the fundamental negation of humanist thought by
a technocratic order striving for maximization of profits at all
costs. Nonetheless, as of the 1990s, there has been an insistent
call for bringing to the forefront a more “humane” corporate
“ethic”. But what human are we referring to? Unfortunately,
it is a truncated human reduced to his “functional” dimension:
dehumanized, instrumentalised, and reified.
19
OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
20
subjectivity, ontology and values cannot be manipulated or fabricated via the revamping of symbols, rituals and ceremonies,
since all of these are artificial and “dead” in the sense attributed
by Branislaw Malinowski: a myth cannot be “operational” unless it is “alive”; that is to say, actively integrated and based in
mythology and the sacred as well as in the real life experiences
of individuals. Predictably, in trying to ‘motivate’ workers, management’s evacuation of the sacred and spiritual is most easily
seen across their use of truncated versions of Maslow’s (1959
and 1969) pyramid: that is, without the use of the spiritual top
level – a level, which when incorporated, sheds a very different
light and perspective on the subsequent levels of the pyramid.
Without attempting any ‘illuminated’ journey on our part into
‘spiritualism’, we can argue that part of Man’s spirituality involves an acceptance of his own mortality. For example, Sievers
(1996: 56-57) explains that the fundamental split in corporations between those at the top (management) and those at the
bottom (the workers) is due to a more fundamental split occurring in contemporary Western societies – namely “the split
between life and death...the reality of death and mortality as
constituent human qualities is neglected and denied in contemporary enterprises and in society in general. It seems that people
are aberrantly pre-occupied with the notion of life, and this can
be correlated with our predominant organizational concerns for
growth and survival. Through the fragmentation of work life
and life, we have more or less succeeded in expatriating death
and mortality from our institutions, and it seems that enterprises are exclusively devoted to an ongoing, permanent notion of
life [immortality]”. But as Sievers explains, the corporation does
not provide ‘immortality’ for all its members, whereby in the
Calvinistic sense: “immortality is a scarce resource, available only
to the happy few; and immortality of the enterprise as well as its
few members can only be achieved and maintained at the cost
of many others and their lack of immortality”. The infantilisation of the worker becomes one of many consequences of the
‘management of excellence’ movement, whereby management
is deified simultaneously with the worker’s’ reification. Management’s attempt to incite the worker to participate ends in a
“false” interaction between the worker and the manager, based
on a “collusive quarrel on immortality” which occludes any true
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
Needless to say, such a situation renders many corporations vulnerable whereby machinism, robotisation and even the information age have attained their limits. Product obsolescence has become evermore rapid, while the flexibility of the human mind is
becoming more and more indispensable even if all we are aiming
for is an impudent improvement in profitability. But is this the
only goal? Before attempting to answer this question, perhaps
we should first ask ourselves a question related to the ‘second’
leg of our dialectical process: where does this truncated understanding of Man lead to? The quick and superficial answer to this
was in effect highlighted in our analysis of the ‘first leg’, in that
a truncated understanding of Man paradoxically leads to lower
profitability in the long run. Hence, we seem to be in front of a
downward economic spiral: the quest for maximization of profits leads towards the adherence of a truncated understanding of
Man, which in turn leads to lower long-term profitability, to which
management, in their continued quest for maximization of profits
try to address via the ‘development’ and use of further truncated
notions of Man, which, in turn, only exacerbates negative corporate performance. But far more alarming is the deep and irreparable damage that this truncated understanding of Man wreaks
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THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
participation based on equality: workers resent the fact
WE NOW HAVE A
that the managers become ‘immortal’, while managers
PROCESS WHEREBY
look at the workers as ‘mere mortals’. This also provides
MANAGEMENT HAS
the basis for Western management’s adoption of a theINHIBITED ACTION
ory of motivation based on the reification of the worker
(Sievers), whereby the worker is perceived as not being
ON THE PART OF THE
able to think or get involved in any significant decisionWORKER VIA HIS
making. If we take Hegel’s principle that “Man has no
REIFICATION, WHILE
essence. His essence is within his action” (that is, when
Man is denied the opportunity to create he cannot emanTRYING TO MOTIVATE
cipate his humanity and transcendence), then the worker,
HIM AT THE SAME TIME
as an object, can no longer bring any meaning to his life.
But management tries to convince the worker that what
has no meaning still has meaning by using ‘motivation’
as a surrogate for meaning. We now have a process whereby
management has inhibited action on the part of the worker via
his reification, while trying to motivate him at the same time.
The resulting double-bind is nothing short of tragic.
21
OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
on his own identity and Ego. For example, a purely behavioral
theory and understanding of Man based on ‘measurable’ empirical data ostracizes any of Man’s specificity not falling within
established ‘norms’ or ‘averages’. Conversely, psychoanalytical,
ethno-psychoanalytical coupled with anthropological approaches
have shown that any attempt to repress , as opposed to express/
sublimate one or more of the aspects of the Self (be it the collective, the individual, the instrumental, the critical rational, the
emotional, the spiritual, the sexual, etc.) leads to schizoid or nearschizoid identities, emotions, values, ‘rationalities’ and behaviors
(Laplantine, 1973; Besançon, 1974; Deveureux, 1973; Erikson,
1993), which attempt to compensate these same initial repressions via obsessive addictions to surrogate substitutes. These surrogate substitutes, in turn, often have deleterious effects on both
the subjects themselves as well as the environments in which they
(and we!) subsist in. Two of the major categories of such substitutes includes the limitless accumulation of wealth, and its close
corollary, the quest for all-mightiness and immortality. Hence, we
now have the ‘second leg’ of the dialectical process we alluded to
earlier on: a truncated understanding of the self (or Man) leads to
the quest for maximization of profits.
This modest examination on our part of both halves of the full dialectical process alluded to at the beginning of this section allows us
to confirm a conservation of the status quo with respect to all that
is related to power, managing of profits, division of labor, incessant
operations of re-engineering, and fusion-acquisitions, whereby we
can only conclude that all these management methods use humanism as a façade, humanism to deceive and carrying the seeds
of its own destruction. To borrow the words of V. De Gaulejac’s at
the World Congress of Sociology, Madrid, July 9-14, 1990: “Today
it is as if the new management were trying to transform the psychic
drives feeding the individual’s narcissism into added work and an
additional source of relative surplus value.”
THE NEED FOR A RADICAL HUMANISM
How does one break this endless impasse? We believe the
answer lies in 1) having managerial studies develop and adopt
an understanding and theory of Man that incorporates, as
22
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
Various fundamental and radical shifts in management practices
and their concepts of both work and the worker are part of the
proposed agenda. For example, management, rather than relying
on organizational behavior methods that try to find ways on ‘how
to’ motivate employees, must try to understand why employees
are not motivated. This means looking at things from the point
of view of the employee. As such, three corollaries can be stated:
1) The outdated nature of orthodox management based on
unilateral privileges, exclusive “rights” and authority (often
concealed behind manipulations of perceptions, subjectivity
and symbols);
2) The outdated nature of “organizations” and “strategies” imposed by top management (often with outside “consultants”);
3) The outdated nature of various “scientific” methods that
have successively invaded management (scientific organization
of work, behavioral science, science of decision-making, science
of information management, econometric models, etc.)
Our proposed concept of radical humanism involves selections
from each of today’s major schools of thought that are convergent, complementary, and enlightening in the difficult and complex quest for a more human conception of “man”. The humanism
that we allude to involves a radical in-depth re-introduction of the
source and root of things related to historicism, diachrony, the social and economic structures at stake, and the sharing of power.
And above all, the “nature” of what it means to be human:
THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
Rosaldo (1989) puts it, “the whole self”, and embraces what
we term as “radical humanism”; and 2) adopting a concept
of corporate governance that becomes a natural extension as
well as a natural support for such an understanding of Man
(as opposed to the current situation of having Man serve and
support the corporate governance as we currently know it).
• To consider the human being as destined (owing his unique
status to his “self-consciousness”) to the pursuit of what will
liberate him, emancipate him (from all forms of obstacles
that we will analyze a bit further in this text), and lead him
towards fulfilling his inherent vocation: that is, a being en-
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HUMANISM
IS A SYSTEM
CENTERED ON MAN,
HIS INTEGRITY,
HIS DEVELOPMENT,
HIS DIGNITY,
HIS LIBERTY
dowed with consciousness, self-judgment and free will who
aspires to his own elevation. Thus, each person in humanity
is a “generic being” who creates his own milieu, society and,
therefore, himself.
From principal authors such as Aristotle, Marx, Fromm, Sartre, Freud and Evans-Pritchard, we also retain the following
essential points:
OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
1) The humanism that is proposed here is one that is completely centered on Man; and the significance to Man in regards to whichever activity is undertaken. The definition of
humanism put forward by Erich Fromm (1961:147) best summarizes this:
[Humanism is] a system centered on Man, his integrity, his development, his dignity, his liberty. [It is based] on the principle
that Man is not a means to reach this or that end but that he
is himself the bearer of his own end. It is not just based on
his capacity for individual action, but also on his capacity for
participation in history, and on the fact that each man bears
within himself humanity as a whole.
2) A long tradition, from Aristotle (“man is a political animal”), to Weber (the central idea of the passage from an
organic society to a mechanical society; or from the oikos
to bureaucracy) by way of Marx (on the importance of social relations, and class phenomena), makes of man a being
fundamentally defined by community, society, and his relations with others. Relations in and through which he lives,
constructs and makes sense of himself (a sensemaking which
becomes the basis and condition for his self-realization). It is
neither disparities nor similarities between Aristotle, Marx or
Weber as theorists that is of interest here, but rather, their
shared understanding of Man’s nature as being undeniably
social and community-oriented.
3) Given that the main idea of this reflection has to do with
men and women in the workplace, it would seem that the
author that is most pertinent on this issue is Karl Marx. But
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GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
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THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
it is not such an easy matter to position oneself simply and
clearly amongst the infinite positions Marxist schools have
previously established or retained with respect to humanism. For this reason, certain key theoretical clarifications are
in order. Relying on the work of a few experts in the subject
(Kolakowski, Mandel, Calvez, Lucaks, Gramsci, Fromm, and
Heilbroner), and without minimizing the nuances or discrepancies between some of these authors, one must consider the work of Marx as a whole, including the works said
to be “mature” and structural (Capital) while finding frameworks and roots from his more “youthful” anthropological
and philosophical works (the Manuscripts of 1844). As Kolakowski (1987: 377) explains, “although Marx’s terminology
and mode of expression changed between 1844 and 1867...
the driving unity of Marx’s thought can be found in the unrelenting search for the conditions dehumanizing man and for
possible ways of restoring more human conditions”. Thus, a
central element in radical humanism is the question of alienation and of alienated work. We will return to these terms
shortly but, for the moment, let us remember that people
are most in danger of “ruin” and “losing themselves” (alienation), through the very act by which they can express their
generic essence: the act of work. In other words, the heart
of the process of dehumanizing Man is alienation through
work. Hence, the reason for our first and foremost interest
in what takes place, concretely, in the work process. In this
process, the worker alienates himself by selling his capacity
for work (and not his actual work, which is the expression
of his creative act) while contributing to the development
and consolidation of power (merchandise, profits, capital)
which are exterior, foreign, and, in the final analysis, hostile
to him, and thus even more “dehumanizing”. The finality
pursued is no longer the person and what is most human in
him or her (e.g. satisfaction of needs through utility value)
but the “unlimited growth of exchange value” (Kolokowski,
1987: 280). It is within a “radical humanist” framework that
this alienation must be addressed if we are to accede to a
managerial conception that integrates a “re-humanized human” as well as an “ethic” in the communitarian-humanistAristotelian sense.
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OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
4) Finally, we also must consider a humanistic position which
tends towards a theory of the subject. In this sense, Marx can
be supplemented by Sartre (1948, 1966 and 1976) and by
Marcuse (1964), whereby the notion of “bad faith” joins that
of “false consciousness” and “alienation” and where the human being is, by definition and necessity, a being whose destiny is meaning, intentions, and projects – thus, by nature, a
person is involved in his or her being and in his or her becoming (to which alienation is an obstacle): a subject whose being
is meaning and which has need of meaning. Along these lines,
we can also refer to a certain social anthropology, represented
by people such as Evans-Pritchard (1950) who states that human beings are definitely not like mechanisms, machinery or
organisms: they are ruled by reasons, feelings and choices and
not to “causes” or stimuli’s (unless, to repeat, they are forced,
other-determined, or alienated, in which case there is no longer a subject but something objectified and reified so as to
become an instrument).
These are the main points of the humanistic position and concepts proposed in this paper. We also propose other works in the
field of management that can genuinely contribute towards a
more humanistic path in one or more of the ways just discussed,
by directly attacking specific problems seen as flagrant disregards for the human aspects within the corporate organization.
A non-exhaustive thematic listing of such works includes:
1) A re-questioning of the established order, unilateral power, corporate monopoly of profits, instrumental conceptions
of the employee...as so many obstacles to collective creativity, adaptation and innovation (Atlan, 1972 and 1985; Clegg,
1975; Varella, 1980; Weitzman, 1984; Morgan, 1986; Villette, 1988; Orgogozo et Serieyx, 1989; DePree, 1989).
2) A call towards the struggle against the fragmentation of
work, against the destruction of its meaning, against the overspecialization and sub-division of tasks, against the disregard
for Man’s need for symbols...all reasons why work is becoming more and more alienating, de-motivating, uninteresting
and source of suffering and tensions (Terkel, 1972; Beynon,
1973; Braverman, 1974; Pfeffer, 1979; Dejours, 1980, 1990
26
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
and 1998; Chanlat and Dufour, 1985; Sievers, 1986a and
1986b; Turner, 1990).
4) A call to recognize that managerial conceptions and practices foil any real possibility of giving Man the status of subject, that of an actor personally and ontologically justified to
identify with and question the firm, to re-appropriate the acts
he or she is assigned to do, and to experience them as an
expression of his or her own desires (Dejours, 1980 and 1990;
Chanlat and Dufour, 1985; Sievers, 1986a and 1986b; Sainsaulieu, 1983 and 1987; Pagès et al., 1984; Crozier, 1989).
5) A reconsideration of the relationship to time in the industrial workplace, and the denunciation of the sufferings and
violence (physical and symbolical) inflicted on workers via the
imposition of a dehumanized pace and fragmentation of time
(Hassard, 1988 and 1990; Kamden, 1990; Gasparini, 1990).
6) The denunciation of certain absences in ethics and honesty towards employees, of the damage done by monopolizing the fruits of worker commitment and productivity, and
of the selfish and short term behavior of management... all
of which prevents employees from living and being treated
as human beings (Etzioni, 1989; Olive, 1987; Packard, 1989;
Solomon and Hansen, 1985).
THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
3) A reflection on the of the relation between language and
work, on Man as a being of speech, the place and the role
of dialogue, the possibility for self-expression, and on the
pathologies of communication caused by violence to Homo
loquens in the industrial world (Chanlat A. and Bédard,
1990; Crozier, 1989; Girin, 1982 and 1990; Clegg, 1990).
7) The re-questioning of narrow utilitarianism and economism in which prevailing managerial theories and practices
are imbued, and which turn managers and corporations into
cynical predators having little consideration or respect for nature, personal integrity and dignity - whether of employees,
consumers, or citizens having the right to a certain quality of
life (Caillé, 1989; Galbraith, 1987; Etzioni, 1989; Monthoux,
1989; Pfeffer, 1979; Rifkin, 1980; Mitroff and Pauchant,
1990; Chossudovsky, 2003).
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.15-37 • janeiro/julho • 2012
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OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
8) And finally, the growing and persistant call for a kind of
epistemological and methodological radicalism highlighting the complex, systemic and multi-dimensional nature of
everything which has to do with individual human beings as
well as groups, including and above all, people at work and
in organizational life. Contributions along these lines include
multi- and inter-disciplinary approaches, dialectical and circular causality, the self-organization and general theory of
systems (Varela, 1980; Morgan, 1986; Chanlat and Dufour,
1985; Chanlat J.F. et al, 1990; Vincent, 1990; Atlan, 1985;
Morin, 1993; Maturana, 1992).
These are the themes which can be considered as being of a
more radical and humanistic tendency. Finally, there is a study
of the human being, no longer through the sole eyes of profitability and Man as simply an instrumental being, but across
the lenses of more fundamental disciplines and human sciences
(anthropology, linguistics, psychoanalysis, psychology, sociology, biology, etc.) which treat Man not as a de-incarnated, and
isolated object of production, but as Man for what he is, the
entire him – Man as a being of speech, of symbols, of senses,
of society, of free-will; and not just simply as a resource at the
service of the company and of maximization of exchange value.
This means the embracing and synthesis of Man’s inherent ambiguities and complexities; and not just limiting ourselves to the
illusion of his so-called ‘rational side’ (for example, Levy (1997)
highlights the synthetical aspects of the human being’s brain,
across its various interconnections between the reptilian, limbic
and neo-cortex sections, whereby the human being cannot be
viewed as being neither completely logical nor completely irrational; or Damasio’s (1995) past work and studies on the neurobiology of decision-making showing that the repression of
emotions and intuition significantly decreases one’s capacity for
effective decision-making). Otherwise we risk falling into schizoid traps that not only truncate Man’s inherent richness, but
often attempts to pass various ideologies and passions of the
dominant few as being completely ‘rational and reasonable’.
This movement towards a more humanistic path within the firm
is neither a romantic ideal, free act of philanthropy, or utopia,
but a necessity – even for those who simply think in terms of
28
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
MARX S THEORY OF
ALIENATING WORK IS
A SOLID FRAMEWORK
FROM WHICH TO START
Towards a Beneficial Dialectic: the Elimination of Alienating Work and the Adoption of a Humanistic Governance
OUR REFLECTIONS
ON THE SYNERGIES
REQUIRED FOR REAL
PRODUCTIVITY WITHIN
To attain the conditions that will give workers reason to be
motivated in what they do, several radical changes must be TRADITIONAL INDUSTRY
implemented. But it is important to first arm ourselves with
a conceptual framework that allow us to ask the right questions. And it is along this reasoning that we ask ourselves how
can management thinking pretend towards radical change when
it does not re-question its secular presuppositions and premises.
When we look at reflections on Man within other disciplines centered towards the understanding of Man (e.g. Evans-Pritchard in
anthropology), it is easy to understand why management theories
on motivation fail abysmally to motivate people within the workplace: they merely consider humans beings as organisms (“termites”, according to Herzberg, 1980) which obey to “causes”,
instinctive needs and external stimuli’s. We must replace our behavioral sciences by a theory of Man that allows the human subject
to find both by himself and for himself the reasons to make it his
own what we ourselves would like him to do, all the while being a
full partner to what is projected, planned and intended.
Marx’s theory of alienating work is a solid framework from
which to start our reflections on the synergies required for real
productivity within traditional industry. Restoring a sense and
meaning to work, as well as permitting the appropriation-commitment sought by ‘corporate culture’ and ‘total quality’ depends on nothing less than putting an end to the following four
estrangements of alienated work:
THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
productivity. It is primordial to remember that it should
be absolutely out of the question to conduct research in
‘productivism’ for the sake of ‘productivism’. Yet in simply
trying to catch the advocates of maximized ‘productivism’
within “their own trap”: it is in their own interest, as selfish
as they may be, to be more humanistic.
1. Estrangement from the product (whereby the employee
has no control at what, how or for who the final product is
being produced; as well as no control on its destination, nor
the profits derived from it).
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2. Estrangement from the act of work – a break perfected by
Taylorism – whereby employees are reduced to muscular or
mental stores of energy who accomplish tasks that are never
their own but always dictated and imposed by bosses, assembly-line speed machines, corporate goals and strategies.
OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
3. Estrangement from nature – whereby working hours
make time an artificial, saleable product as opposed to the
natural time of the seasons, the cycle of day and night, and
the biological clock; while substituting the satisfaction of
natural needs with those dictated by money and capital.
30
4. Estrangement from the human element – whereby workers become estranged from their own generic essence, their
capacity to create their own surrounding and themselves, as
well as their own free-will; while being put in conflict with
others who use and exploit them. Furthermore, the “exploiters” themselves are in turn just as alienated by their subjugation to the laws of maximum fructification of capital.
There is not only a need to recognize that the meaning or the
sense of work is the foundation for worker motivation and interest, but also a need to expand our reflection on all industrial,
flexible and virtual work that has essentially lost all meaning. By
wanting to regain this sense of meaning is to also recognize,
after one century of management that aimed towards negating
or masking it, that work alienation is the heart of the problem
of commitment and motivation. Within this perspective, their
is only one possible solution for companies to surmount such
problems: workers must experience their relation to their work
as a real, rather than a formal, appropriation. What they do in
the firm must be experienced as a real extension of themselves,
as an occasion for self-expression as well as for the pursuit and
satisfaction of personal desires and interests that converge with
those of the firm. Thus, the firm would become a place for
partnership and dialogue, and a workplace no longer run by
the unilateral usage of force. The question must no longer be
how to motivate the worker but rather why is he so little motivated within the current financial and socio-economic context.
To question oneself on this aspect is, as Sievers (1986a, 1986b
and 1996) pointed out, to question the significance of work,
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
The answer to the question of lack of motivation, interest and
implication of the employee within a traditional management
also has to do with a reintegration of diachrony for which the
anti-historicism of managerial functionalism has completely
evacuated. One must remember that the modern, industrial
and post-modern company has been constituted – and continues to be constituted – most often on the basis of violence
and suffering (in both the physical and symbolic sense). It has
taken long struggles and terrible confrontations, whereby laws
were attained one by one to arrive at work conditions that are
less unjust and more humane. We, via a return in history, can
come to realize the pertinence of the element which Marx has
always put in the heart of its analysis of work relationships: the
contradiction, which is very much “alive and well”, between the
interests of the owners and managers on the one hand, and
those of the workers and nature on the other. For the former, it
is always a matter of making the largest possible profits – which
is synonymous with, amongst other things, of having the lowest possible salaries and a continuously unchecked pollution – ;
while for the latter, it has been an incessant battle and struggle
in reaction to the former, so as to try and attain a better quality of life, better working conditions and more decent salaries
(regularly gouged away shortly after having been attained).
THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
the concept and organization of work, which in turn brings up
the question of the status of the human being and his relationship with others. It is not hard to imagine that the functionalistpragmatist conceptual framework of traditional management
is rather ineffective in the face of such questions, which has
always rejected such questions as being outside of its field of
preoccupations and that they relate, at best, to philosophy, if
not towards a more or less subversive, or leftist sociology.
In order to truly attain a company that is a place of consensus,
partnership, and trusting relationships, one must also adopt one
of the key and dear principles of Marx: the abolition of wages
(salaried remunerations within the definition of it being a quantifiable remuneration completely dissociated from the true work
value which the worker contributes). Highly preferment economies such as those of Japan, Germany and Sweden already
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OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
HENCE, WORKERS
practice several different forms of more equitable sharing
and re-distribution of the produced riches. Many such as
MUST NO LONGER
Weitzman (1984), Archier and Serieyx (1987), Orgogozo
BE VIEWED AS A
and Serieyx (1989), De Pree (1989), Crozier (1989), etc.
COST TO REDUCE,
speak of sharing – specifically profit sharing – as well as
dialogue, listening, and community. They, whether explicBUT RATHER AS AN
itly or not, are advocating for the abolition of wages, esALLY TO CONVINCE
pecially when they propose to inspire themselves from the
forms of remunerations found within these countries. For
example, Peters (1987), calls for profit sharing as part of
remuneration; Perrow (1979) argues that control and coercion
will be the only ways (more costly than profitable) to obtain maximum productivity as long as the salary system is the rule; while
Etchegoyen (1990), sees salaries turning employees into mercenaries working in soulless enterprises (the “mercenary” element is
seen here as an obstacle to individual commitment – a person no
longer satisfied with doing what is asked, who has neither interest nor “soul”). Even if sharing of profits is not sufficient in itself
to entrain a profound change in the nature of power and influence, of de-alienation, and even less so with the end of exploitation, it is certainly a significant step towards more equity (it is
ironic that many corporate managers adhere to current ‘theories’
which see salary increases as being mostly ineffective for worker
motivation, yet rarely hesitate to award themselves astronomical salary increases, bonuses and stock options in recognition
for their individual ‘performances’). This, along with a true and
concrete participation in management, and the orientations of
the company, as well as a larger degree of autonomy and multivalency with respect to the worker, coupled with a basic level of
security and quality of life are the necessary conditions towards
addressing stagnations in productivity (productivity in the original sense of the word, that is producing to satisfy “reasonable”
needs, by reducing the amount of degradation and exploitation
of nature and humans).
Hence, workers must no longer be viewed as a cost to reduce,
but rather as an ally to convince. Conversely, managers must
stop seeing themselves as the only people fit to think, decide,
and manage. And while the pursuit of profit is a legitimate objective, it must no longer be maximalist or short term in nature,
32
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
The price for this is the renunciation of numerous secular privileges amongst management and shareholders so as to be able
to move towards a form of organization whereby flexibility, creativity and quality can occur and evolve from the one and only
source that must be respected at all times: the human person.
This is a necessary condition to address in order to improve the
management capability of organizations in the face of growing
complexities. It is also a difficult path, strewn with numerous
forms of resistance, often deeply rooted in the unconscious, like
those psychic prisons mentioned by Morgan (1986), or the delusions of immortality and grandeur referred to by Sievers (1986b
and 1996) and Kets de Vries and Miller (1984). Yet the adoption
of a radical humanism and conception of corporate governance
which becomes a natural extension as well as a natural support
for the profound nature of Man not only breaks the vicious circle or dialectic we described much earlier, but introduces a virtuous one: the adoption of a fuller understanding and respect for
Man leads to the production and subsequent sharing of profits,
which in turn reinforces the respect and understanding of Man,
leading to further profits (and its subsequent sharing), and so
on. The exact starting or end point of this process is, as in all
dialectical processes, non-existent, but who’s circularity implies
long term viability for Man, Nature, and for the more financially
minded amongst us, the corporation.
THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
and neither must it be managed in a selfish manner for the sole
advantage of shareholders and managers, but rather, must be
considered as the fruits of labor for all, whereby the rates, destination and usage must be decided in common between the
worker and managers, as well as between the business environment, the State and society.
KEY LESSONS
Numerous streams of management literature placing a central
importance of the human person or personal attitudes and
behavior at work fail to reflect any significant attempt at
creating business frameworks or management practices that
embrace man’s emancipation as a finality onto itself, or “man
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OMAR AKTOUF E DAVID HOLFORD
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as being the measure of all things”. The dialectical nature of the
current socio-economic process at work, namely, the endless
pursuit of maximization of profits leading towards a truncated
understanding of Man, which in turn leads towards the further
quest for maximization of profits, and so on, appears to pose
an endless impasse. Within this cycle many interlinked negative
paradoxes and contradictions can be identified, including: 1)
management inhibiting creative action on the part of the worker
via his reification, while at the same time trying to motivate
him, produces the psychologically destructive “double-bind”;
and 2) the downward economic spiral which consists of the
quest for maximization of profits leads towards the adherence
of a truncated understanding of Man, which in turn leads to
lower long-term profitability, to which management, in their
continued quest for maximization of profits try to address via
the ‘development’ and use of further truncated notions of Man,
which, in turn, only exacerbates negative corporate performance.
Breaking this negative dialectic involves: 1) having managerial
studies develop and adopt an understanding and theory of
Man that embraces a “radical humanism”; and 2) adopting a
conception of corporate governance that aims to serve Mankind
in lieu of exploiting it. The radical humanism referred to in this
paper considers the human being, no longer through the sole
eyes of profitability and Man as an instrumental being, but across
the lenses of more fundamental disciplines and human sciences
(anthropology, psychoanalysis, biology, linguistics, etc.) which
treat Man for what he is, the entire him – Man considered as a
being of speech, of symbols, of senses, of society, of free-will,
and not just simply as a resource at the service of the company
and of maximization of profit. As such, the heart of the process
of dehumanizing mankind within our current socio-economies
and corporations is alienation through work. The theory of
alienating work is a solid management framework from which
start in order to restore a sense and meaning to work, as well
as to permit an appropriation-commitment on the part of
individual workers, by eliminating the sources of estrangement
related to the product, the act of work, nature, and last but
not least, the human element (including the Self and as well
as the Other). In order to truly attain a company that is a place
of consensus, partnership, and trusting relationships, one must
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
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THE IMPLICATIONS OF HUMANISM FOR BUSINESS ADMINISTRATION AND STUDIES
also abolish wages, and replace it with the sharing of profits.
Embracing a radical humanism, as well as a governance that
aims to serve Man rather than exploit him introduces a virtuous
dialectic: the adoption of a fuller understanding and respect
for Man and Nature leads to the production and subsequent
sharing of profits, which in turn reinforces the respect and
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*
On this paper, it was preserved the original reference model written according to its foreign nomenclature.
*
Preservou-se neste artigo a forma original das referências grafada de acordo
com nomenclatura estrangeira.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.15-37 • janeiro/julho • 2012
37
38
ARTIGO
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
GESTÃO POR
COMPETÊNCIAS:
UM NOVO MODELO DE GERENCIAMENTO
Rhecyelle Mota Belfort1
Ediana di Frannco Matos da Silva Santos2
Marilsa de Sá Rodrigues Tadeucci3
Resumo
O objetivo desse estudo é contribuir na perspectiva de mudanças
das ações dos colaboradores em seus devidos setores de trabalho,
possibilitando uma percepção mais autêntica do perfil e do planejamento estratégico de cada um em suas respectivas atividades, no
intuito de demonstrar a importância da gestão por competências
como um novo modelo de gerenciamento. O método desenvolvido nessa pesquisa foi o bibliográfico, cotejado pelas experiências
dos autores nesse campo.
Palavras-chave: gestão por competências, modelo de gerenciamento, planejamento estratégico.
Abstract
The purpose of this study is to contribute in view of changes in employees actions in their proper job sectors, providing a more authentic perception of the profile and strategic planning of each in
their respective activities in order to demonstrate the importance
of competency management as a new management model. The
method developed in this study was the literature, collated by the
experiences of the authors in this field.
Keywords: competency management, model management, strategic planning.
39
AS AUTORAS
1
Rhecyelle Mota Belfort
Mestranda em Gestão e Desenvolvimento Regional pela Universidade de
Taubaté (SP), graduada em Administração – ([email protected]).
2
Ediana di Frannco Matos da Silva Santos
Mestranda em Gestão e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Taubaté
(SP), graduada em Direito – ([email protected]).
3
Marilsa de Sá Rodrigues Tadeucci
Doutora e mestre em Administração pela Mackenzie (SP), professora orientadora
do Programa de Pós-Graduação em Gestão e Desenvolvimento Regional pela
Universidade de Taubaté (SP) – ([email protected]).
As novas técnicas e os métodos de gestão moderna que vêm
modificando o aparelho produtivo induzem as organizações a
lutarem cada vez mais por competitividade e resultados. Nesse
cenário, ganha o modelo de gerenciamento por competência,
que é o modo de conduzir os colaboradores para atingirem os
objetivos da organização por meio de suas capacidades técnicas e comportamentais, como opção aos padrões modernos de
gestão, visando a mais capacidade no planejamento, no captar
e desenvolver os recursos humanos necessários à conquista de
melhores resultados operacionais. Diante dessas circunstâncias, a referida pesquisa visa a discutir, através de uma pequena
abordagem, o papel do gestor de recursos humanos em meio
aos aspectos da gestão por competências, exigindo dos profissionais mais competências conceituais, técnicas e humanas na
hora de escolher os talentos para sua equipe.
Gestão por competências é uma temática que vem sendo muito
debatida nos meios acadêmicos, principalmente quando se trata de conhecimento organizacional para alcançarem vantagens
competitivas no mercado. O gerenciamento por competência é
o modelo de gestão que permite aos executivos terem uma visão
mais ampla acerca das competências exigidas para o exercício
da função, ou seja, as competências de que uma função precisa;
que competências o colaborador possui e, posteriormente, fazer
o cruzamento das informações quanto às competências exigidas
pela função versus competências do colaborador, para traçar um
plano de desenvolvimento específico para cada colaborador, gerenciando os conhecimentos de forma eficiente e eficaz.
GESTÃO POR COMPETÊNCIAS: UM NOVO MODELO DE GERENCIAMENTO
1. INTRODUÇÃO
Neste sentido, a pesquisa foi motivada pela necessidade de proporcionar à comunidade acadêmica e empresarial o perfil do
gerenciamento por competência do novo tempo, apresentando
características diferenciadas em um ambiente dinâmico e fortemente competitivo, incorporando habilidades na tomada de
decisões, descobrindo novos horizontes, traçando estratégias,
motivando e inspirando a equipe.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.39-53 • janeiro/julho • 2012
41
COMPETÊNCIAS SÃO
AS HABILIDADES, OS
CONHECIMENTOS E
AS CARACTERÍSTICAS
PESSOAIS QUE
MARCAM OS
GERENCIADORES
DE GRANDE
RHECYELLE MOTA BELFORT, EDIANA DI FRANNCO MATOS DA SILVA SANTOS, MARILSA DE SÁ RODRIGUES TADEUCCI
DESEMPENHO
A busca por novas tecnologias de informação tem o intuito de desvendar e satisfazer o sonho de cada um de
seus clientes, assim sendo, almejando o sucesso organizacional como um empreendedor, tendo em foco o desenvolvimento dos talentos humanos, de suas competências, sempre atento e alinhado às mudanças constantes.
Para tanto, o estudo partiu da análise de obras de autores relevantes à temática proposta, sintetizando o papel
desses profissionais no mercado moderno.
Com o intuito de se consumar aos objetivos desse estudo,
o presente artigo aborda a gestão por competência, suas
concepções e características proeminentes sintetizarão o
conceito por competência; discorre sobre o desenvolvimento
das competências empreendedoras nas organizações de negócios, focando as mudanças sociais no mercado de trabalho e no
novo perfil do profissional.
Assim, com esta produção científica, espera-se dar uma pequena contribuição para um melhor aprendizado no âmbito dessa
temática, sensibilizando as pessoas envolvidas nesse processo,
ressaltada a necessidade de se estar preparado para a solução
dos problemas em enfoque, dando certeza de que não encerram aqui os questionamentos, pois a própria dinâmica da vida
estabelece a necessidade de dar continuidade à busca de respostas para inúmeras dúvidas suscitadas nas perguntas aqui
apresentadas, que continuarão a surgir no decorrer do estudo
sobre a gestão por competências.
2. GESTÃO POR COMPETÊNCIAS: CONCEPÇÕES
E CARACTERÍSTICAS
A premissa básica é a de que cada colaborador sabe ou pode
aprender a identificar suas adequadas competências, habilidades, seus pontos fortes e fracos e também suas metas, sendo
este a única pessoa capaz de decidir o que é melhor para ele
mesmo. O papel dos executivos da área de recursos humanos,
que [...] “define suas estratégias para possibilitar a realização
das estratégias corporativas” (MAXIMIANO, 2008, p. 362), passa
42
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
a ser o de ajudar esse colaborador a expor seu desempenho na
empresa às habilidades e à realidade da organização.
A gestão por competências é entendida como um princípio gerencial que visa a impulsionar os colaboradores ao alcance da
competência profissional, adicionando habilidades e aumentando as já existentes. Entende-se por competências as habilidades,
os conhecimentos e as características pessoais que marcam os
gerenciadores de grande desempenho, diferenciando-os daqueles de desempenho inferior em determinado departamento.
Para Chiavenato (2006, p. 216), a gestão por competências é
considerada:
[...] um programa sistematizado e desenvolvido no sentido de definir perfis
profissionais que proporcionem maior produtividade e adequação ao negócio, identificando os pontos de excelência e os pontos de carreira, suprindo
as lacunas e agregando conhecimento, tendo por base certos critérios objetivamente mensuráveis.
Nesse diapasão, a gestão por competências busca substituir o
tradicional levantamento de obrigações e deficiências de treinamento por uma ótica das necessidades posteriores do negócio e
de como as pessoas agregarão valor à organização.
GESTÃO POR COMPETÊNCIAS: UM NOVO MODELO DE GERENCIAMENTO
Portanto, preparar um profissional que seja capaz de oferecer
à empresa as respostas desejadas exige a aquisição ou ampliação de algumas competências que lhe permitam investir em seu
desenvolvimento, pensar estrategicamente, buscar resultados,
conquistar a fidelidade do cliente, ter capacidade para negociar
e trabalhar em equipe (CARVALHO, 2007).
Para tanto, o gerenciamento fundamentado em competências
ou gestão por competências é uma ferramenta que caracteriza a identificação das competências essenciais, as habilidades
e informação causadora da eficácia profissional e também o
preenchimento da qualificação de cada contribuinte para funções estabelecidas, fornecendo recursos fundamentais para o
aperfeiçoamento dessas capacidades. Diante disso, o que se
espera é um quadro de colaboradores mais talentosos e mais
produtivos, haja vista a gestão por competências proporcionar
maior produtividade, assertividade, ambientes participativos e
motivacionais, comprometimento de todo o nível hierárquico,
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.39-53 • janeiro/julho • 2012
43
gerências e equipes mais fortalecidas e maior valorização do
capital humano.
Assim sendo, Ruas (2005) se posiciona demonstrando o exercício da competência, qual seja:
Figura 1 ‒ Competência versus qualificação
QUALIFICAÇÃO
RHECYELLE MOTA BELFORT, EDIANA DI FRANNCO MATOS DA SILVA SANTOS, MARILSA DE SÁ RODRIGUES TADEUCCI
Relativa estabilidade da atividade
econômica
Concorrência localizada
Lógica predominante: indústria
(processos e padrões de produção
previstos)
Emprego formal e base sindical
Organização tradicional do trabalho,
com base em postos definidos e
tarefas prescritas e programadas
Foco no processo
Ênfase na aprendizagem de circuito
simples
COMPETÊNCIA
Baixa previsibilidade de negócios e
atividades
Intensificação da abrangência da
concorrência
Lógica predominante: serviços
(eventos)
Relações de trabalho informais e
flexíveis; crise dos sindicatos
Novas formas organizacionais
que destacam o trabalho com
base em metas, a delegação
de responsabilidade e a
multifuncionalidade
Foco nos resultados
Estímulo a aprendizagem de circuito
duplo
(RUAS, 2005, p. 37).
Nesse sentido, podemos vislumbrar que as capacidades (habilidades, conhecimentos e atitudes) são os meios viáveis para o desempenho da competência, que se encontra intrinsecamente ligada ao
nível de envolvimento com a tarefa delegada (MASCARENHAS, 2008).
Por outro lado, enfatiza Chiavenato (2006) que a qualidade
como significado da palavra competência é algo que uma determinada pessoa possui e que é percebida pelos outros. Para
tanto, não adianta a competência ser visível, é necessário que
seja também percebida sua existência.
Na maioria das vezes, é a percepção do gestor sobre o colaborador que determina a competência do mesmo, ou seja, se
for percebida corretamente é um ponto a favor do colaborador, sendo que na maioria das vezes, entretanto, a percepção
do gestor é incompleta. Baseado nisso, o resultado é que cada
colaborador manifeste uma ótica diferente e só parcialmente
44
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
CONCEITUAR
adequada a respeito do que é preciso para atingir a
eficácia no trabalho (PRAHALAD, 1997).
DEFINIR QUAIS
CAPACITAÇÕES DEVEM
Nesse contexto, destaca-se que “uma competência
não é somente um estoque de capacidades, que podem ser mobilizadas” (MASCARENHAS, 2008, p. 184), e que para
tanto, de acordo com Ruas apud Mascarenhas (2008, p.37)
“[...] as capacidades assumem a condição de competências somente no momento em que são mobilizadas para realização de
uma ação específica”, como por exemplo, elaborar um relatório. A figura abaixo apresenta um exemplo do que diz o autor:
Figura 2 ‒ Competência: comunicar resultados
Conhecimentos
(básicos, como as
letras e palavras; e
técnicos, como a
formatação)
Habilidades
(desenhar as palavras,
concentrar-se)
Atitudes
Disposição para
aprender e
sistematizar dados
Desempenho
adequação de conteúdo,
clareza e didática etc.
Avaliação
Competência
Comunicar
Recursos
Material de escritório, informática
Entrega
relatório de visitas
comerciais
Condições
Prazo de entrega abrangência
SER PROVOCADAS,
PROTEGIDAS OU
MINIMIZADAS
GESTÃO POR COMPETÊNCIAS: UM NOVO MODELO DE GERENCIAMENTO
O gerenciamento baseado nas competências representa uma transformação cultural no caminho de um
maior senso de responsabilidade e autogerenciamento dos colaboradores. Além disso, é uma maneira simples de aprimorar o desempenho.
COMPETÊNCIA É
(RUAS, 2005, p. 37).
Assim sendo, o que se tem a fazer em primeira instância é definir as competências técnicas, conceituais e as interpessoais,
dentro de cada tarefa executada. É importante ressaltar que
conceituar competência não é definir tudo aquilo que o colaborador faz, mas definir quais capacitações devem ser provocadas,
protegidas ou minimizadas.
2.1 Conceito de competência
Existem inúmeros conceitos de competência, porém todos com
sua essência em comum, senão vejamos: “É um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes, que afetam a maior parte
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.39-53 • janeiro/julho • 2012
45
do trabalho de uma pessoa, e que se relacionam com seu desempenho no trabalho” (GRAMIGNA E DOMINGOS, 2002 apud LEME,
2005, p.17).
No mesmo sentido, Parry (1996 apud OLIVEIRA; SANTOS E LOU2008, p. 193) traz a definição de competências como
sendo:
RENÇÃO,
Um agrupamento de conhecimentos, habilidades e atitudes correlacionadas,
que afeta parte considerável da atividade de alguém, que se relaciona com
RHECYELLE MOTA BELFORT, EDIANA DI FRANNCO MATOS DA SILVA SANTOS, MARILSA DE SÁ RODRIGUES TADEUCCI
seu desempenho, que pode ser medido segundo padrões preestabelecidos, e
que pode ser melhorado por meio de treinamento e desenvolvimento.
Isto posto, pelas definições acima, entende-se o que se chama
de “Pilares das Competências”, que são: Conhecimento, Habilidade e Atitude, ou seja, o CHA:
O Conhecimento é o saber, é o que aprendemos nas escolas, nas universidades, nos livros, no trabalho, etc.
A habilidade é o saber fazer, é tudo o que utilizamos dos nossos conhecimentos no dia a dia.
A atitude é o que nos leva a exercitar nossa habilidade de um determinado
conhecimento, ela é o querer fazer (LEME, 2005, p.18.).
Diante do exposto, seguem os desdobramentos do conhecimento, habilidade e atitude:
Tabela 1- Desdobramento do CHA
Conhecimento
Saber
Habilidade
Saber fazer
Atitude
Querer fazer
Competência técnica
Competência
comportamental
(LEME, 2005, p.18)
Nesse contexto, podemos ainda citar uma outra abordagem utilizada para conceituar competência, trata-se da “Árvore de Competências” em que:
46
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
A copa corresponde às habilidades – agir com aptidão, capacidade e técnica
em relação à realidade, resolvendo problemas e obtendo resultados positivos;
o tronco e os galhos correspondem ao conhecimento – referem-se ao conjunto de informações que a pessoa armazena e utiliza, quando necessário, e
a raiz corresponde às atitudes – ao conjunto de valores, crenças e princípios
que são formados no decorrer da vida. Estão relacionados com o querer ser e
o querer agir e implicam o grau de comprometimento com o trabalho (grifo
nosso) (OLIVEIRA; SANTOS E LOURENÇÃO, 2008, p. 191).
[...] na Era da Informação, na qual estamos vivendo, o conceito de empresa
mudou radicalmente. A empresa passou a ser conceituada como um conjunto integrado e sempre atualizado de competências, sempre prontas e disponíveis, para serem aplicadas a qualquer oportunidade que apareça antes que
a concorrência o faça.
Esse novo modelo de gestão contemporânea acorda dúvidas e
uma delas é sobre a conceituação do que são competências. Por
ser um termo largamente empregado e com diversos significados, para Fleury e Fleury (2001, p. 185):
Nessa perspectiva, o conceito de competência é pensado como um conjunto
de conhecimentos, habilidades e atitudes (isto é, conjunto de capacidades
humanas) que justificam um alto desempenho, acreditando-se que os melhores desempenhos estão fundamentados na inteligência e personalidade
das pessoas.
GESTÃO POR COMPETÊNCIAS: UM NOVO MODELO DE GERENCIAMENTO
Outrossim, as competências estão quase todas localizadas nas
pessoas que atuam nas organizações. Elas constituem a base
racional e inteligente da ação empresarial. Assim, Chiavenato
(2008, p. 46) sintetiza que
A definição em excelência se perfaz na necessidade da instituição
de obter um método sistematizado, com metodologias peculiares, passível de mensuração e comparação de desempenhos entre
os vários colaboradores de uma organização, quando se almeja
fazer uma identificação das pessoas dentro do perfil desejado.
A excelência em administração começa com as pessoas. O primeiro passo
para o sucesso de um administrador – não importa em que tipo de empresa
ele esteja atuando, em que nível hierárquico esteja situado ou quais sejam
seus objetivos profissionais – é cercar-se de pessoas competentes. Para tanto,
o administrador precisa, necessariamente, saber formar uma equipe de trabalho, atraindo e retendo as pessoas certas, aplicar adequadamente as com-
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.39-53 • janeiro/julho • 2012
47
A AVALIAÇÃO DE CADA
petências e habilidades das pessoas, treinando-as e preparando-as para
COLABORADOR E DE
um trabalho cada vez melhor, recompensando-as, a fim de esforçar
TODA A EQUIPE EM
CONJUNTO
DEVE ENVOLVER
AS COMPETÊNCIAS
TANTO INDIVIDUAIS
RHECYELLE MOTA BELFORT, EDIANA DI FRANNCO MATOS DA SILVA SANTOS, MARILSA DE SÁ RODRIGUES TADEUCCI
COMO GRUPAIS
continuamente o desempenho excelente e, sobretudo, sabendo liderar,
conduzir e entusiasmar (CHIAVENATO, 2008, p. 49).
Em outro contexto, Chiavenato (2008) conceitua competências como as características das pessoas que dão a sustentação de vantagens competitivas, relacionadas à gestão
organizacional e profissional, ajudando na organização e
no objetivo estratégico do negócio.
Salienta-se que autores franceses como Zarifian, Le Boterf,
autores ingleses como Jacques e seus seguidores (Billis e
Rowbottom, Stamp e Stamp), responsáveis pela organização do
termo trabalho, substituíram o conceito de qualificação e/ou capacitação pelo termo competências (FLEURY; FLEURY 2001).
Segundo Zarifian (2001 apud VELOSO E TREVISAN, 2005, p. 81),
“competência é uma inteligência prática das situações que se
apoia nos conhecimentos adquiridos e os transforma com tanto
mais força quanto maior for a complexidade dessas situações”.
Em um mundo em mudança e transformação e carregado de
competitividade, talento humano é uma questão de sobrevivência e de sucesso das organizações. Esses conceitos, tecnologias e
informações estabelecerão maiores conhecimentos por parte das
pessoas envolvidas. Todavia, esses fatores não serão suficientes
para fazer a diferença. Cabe às pessoas dar sentido a esse termo
e fazer uso de uma forma que também dê sentido à organização.
A diferença estará na competência das pessoas, na sólida conservação e modernização do conhecimento e, principalmente, nas
atitudes e costumes que elas terão perante as tarefas e os novos
desafios.
3. DESENVOLVIMENTO
DAS COMPETÊNCIAS EMPREENDEDORAS
NAS ORGANIZAÇÕES DE NEGÓCIOS
Um dos aspectos fundamentais para o desenvolvimento de
competências no mundo moderno talvez esteja relacionado
com a capacidade interna das organizações de estabelecerem
e sustentarem um novo sistema de gerenciamento que permita
que as competências desejadas se instalem e se multipliquem,
48
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
em um movimento de aprendizado que se autossustente (VELOSO;
TREVISAN, 2005).
Segundo Meister (1999 apud CHIAVENATO, 2008, p. 61), as competências exigidas pelas empresas nos novos ambientes de negócios
são as seguintes:
A avaliação de cada colaborador e de toda a equipe em conjunto deve envolver necessariamente as competências, tanto individuais como grupais. Não é uma tarefa simples, pois para isso
depende de se formarem equipes alavancadas numa ação participativa, escolhendo bons profissionais no mercado, planejando
e organizando bem suas atividades, preparando e capacitando o
grupo envolvido nesse processo, reconhecendo as competências
necessárias, interligando a organização para alcance dos objetivos individuais, bem como organizacionais.
Portanto, para garantir competitividade em meio ao terceiro milênio, o maior desafio das organizações é o cultivo de um ambiente organizacional mais profissionalizado. Diante disso, a gestão profissional passou a ser uma das ferramentas mais utilizadas
pelas organizações na busca do reconhecimento de novas competências laborais, frente aos desafios existentes por processo de
mudanças ambientais, políticas, econômicas e tecnológicas.
GESTÃO POR COMPETÊNCIAS: UM NOVO MODELO DE GERENCIAMENTO
• aprender a aprender;
• comunicação e colaboração;
• raciocínio criativo e resolução de problemas;
• conhecimento tecnológico;
• conhecimento de negócios globais;
• desenvolvimento da liderança; e
• autogerenciamento da carreira.
A esse respeito, Mascarenhas (2008) demonstra a visão estratégica
e ilustra (figura 3) o princípio do alinhamento das competências.
Diante da figura 3, percebe-se que para traçar uma intenção estratégica às competências organizacionais, é imprescindível que
a empresa tenha definição clara quanto a sua visão, ou seja,
onde ela pretende estar daqui a alguns anos, como também sua
missão, ou seja, sua essência de existir. Nesta ordem, se a empresa não souber disso, como irá conduzir seus colaboradores?
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.39-53 • janeiro/julho • 2012
49
Figura 3: Configurações organizacionais das competências
Intenção
estratégica
Missão
Visão
Competências organizacionais
(básicas/seletivas/essenciais)
Competências funcionais
(grupos/áreas)
Competências individuais/
gerenciais
RHECYELLE MOTA BELFORT, EDIANA DI FRANNCO MATOS DA SILVA SANTOS, MARILSA DE SÁ RODRIGUES TADEUCCI
(MASCARENHAS, 2008)
A missão e a visão da empresa, portanto, são as premissas da
gestão por competências.
Essa questão de competitividade no ambiente de negócios em
ambiente de grande complexidade tem ocupado as laudas da
maioria dos encontros estratégicos e dos meios acadêmicos. É
inegável o fato de que, mesmo em organizações de sucesso, os
efeitos desses processos, além da influência dos executivos envolvidos, exigem rotinas que põem à prova estratégias vencedoras.
Segundo Oliveira, Santos e Lourenção (2008, p.193):
[...] as pessoas atuam como agentes de transformação e conhecimento, habilidades e atitudes em competências que entregam para organização. Nesse
sentido, a competência entregue pode ser caracterizada como agregação de
valor ao patrimônio de conhecimentos da organização.
Diante disso, as organizações necessitam a cada dia se adaptar
a essa nova estratégia de negócio, a gestão por competência,
com ações empreendedoras, que vão desde o reconhecimento
das competências, flexibilidade nas rotinas até a agilidade nas
informações.
3.1 A necessidade das competências
Adaptar-se às novas realidades do negócio é algo indiscutível,
uma questão vital para algumas empresas e apenas uma adequação para outras, como medida de segurança. Novas tecnologias, novas premissas e, portanto, novos modelos de gestão
sustentam a competitividade, sempre alicerçados no desenho
de novas competências.
50
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
Fleury e Fleury (2001 apud VELOSO E TREVISAN, 2005, p.
82) observa que:
ESSA ESTRATÉGIA
[...] a década de 1990, com seus desafios de crescente compe-
NECESSITA DE AÇÕES
definitivo das políticas de gestão de recursos humanos às es-
EMPREENDEDORAS
tratégias empresariais, incorporando à prática organizacional
DOTADAS DE
o conceito de competência, com base do modelo para geren-
RECONHECIMENTO
ciarem pessoas.
DAS COMPETÊNCIAS,
Diante disso, torna-se crucial que as empresas conFLEXIBILIDADE NAS
sistam em direcionamentos claros e esquemas dispoROTINAS E AGILIDADE
níveis que possam ajudar na avaliação e identificação
NAS INFORMAÇÕES
de suas respectivas competências ou por aquelas que
ainda possam ser manifestadas, e que lhes propiciem
a oportunidade do desenvolvimento individual, passando as empresas à função de mediadoras desse processo de
desenvolvimento em enfoque.
A esse respeito dispõe Soares; Andrade (2005, on-line):
Desenvolver as competências da organização e das pessoas é um caminho
para se vencer todos esses desafios e adequar as organizações aos novos
paradigmas mundiais. Hoje as empresas são obrigadas a buscarem as competências que negligenciavam em tempos anteriores, de menor concorrência,
de maiores facilidades para obter lucro e crescer.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
GESTÃO POR COMPETÊNCIAS: UM NOVO MODELO DE GERENCIAMENTO
titividade e globalização das atividades, levou ao alinhamento
DE NEGÓCIO
Portanto, os sistemas tradicionais de gestão de pessoas,
treinamentos, avaliação, recrutamento, seleção e remuneração
não servem mais, por estarmos na “Era das Competências”,
portanto é necessário implantar gestão de pessoas com foco em
competências, treinamento com foco em competências, avaliação
por competências, recrutamento, seleção e remuneração em
competências.
A gestão por competências como nova forma de gerenciamento demonstra-se positiva por meio dos autores pesquisados, acrescentando estímulo e motivação dos colaboradores
nas tarefas exercidas na empresa, pois a objetividade, clareza
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.39-53 • janeiro/julho • 2012
51
RHECYELLE MOTA BELFORT, EDIANA DI FRANNCO MATOS DA SILVA SANTOS, MARILSA DE SÁ RODRIGUES TADEUCCI
e transparência contribuem na obtenção tanto dos objetivos
e resultados individuais como também aos objetivos organizacionais.
52
As pessoas com suas atitudes, conhecimentos e habilidades são
o principal alicerce das organizações. Nesse novo contexto, as
pessoas deixam de ser máquinas e passam a ser tratadas como
pessoas, dotadas de inteligência, sentimentos, aspirações. A
cada dia, e cada vez de forma mais intensa, as pessoas se voltam para a busca de desenvolvimento de suas competências. As
novas relações de capital e trabalho e também a necessidade
de garantir seu grau de empregabilidade requerem das pessoas
uma perfeita integração entre desempenho e potencial, ou seja:
não basta ter potencial, é preciso colocá-lo em ação.
Neste aspecto, esse artigo abordou que as pessoas deste novo
cenário precisam mais do que nunca ter conhecimento, habilidades e competências; saber, saber fazer e saber fazer acontecer. A busca pelas competências, sejam elas individuais ou organizacionais, deve ser perseguida continuamente por um lugar
no mercado de trabalho. Afinal, os operários de chão de fábrica
assim chamados no passado, com rotinas estabelecidas, já não
funcionam. Talento humano é questão de sobrevivência e de
sucesso no mundo corporativo, cheio de mudanças e transformações e alavancado pela competitividade.
As interrogações sobre gestão por competências como um novo
modelo de gerenciamento, uma temática pertinente, necessária
e oportuna, não se limitam a esse estudo. O que se espera é
que essa temática sempre apareça para que os executivos não
cessem os seus argumentos e encontrem as respostas a cada
busca de novas opiniões.
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
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Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.39-53 • janeiro/julho • 2012
53
54
GESTÃO, INFORMAÇÃO E SOCIEDADE
55
ARTIGO
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
ESTUDO DAS AVES URBANAS
NO PROCESSO AMBIENTAL
DE IMPERATRIZ (MA)
Ladislau Freitas Varão1
Jullys Alan Guimarães Gama2
Resumo
Este trabalho foi desenvolvido para levantar avifauna ocorrente em
alguns pontos de Imperatriz (MA). A área de estudo inclui cinco
bairros selecionados (Nova Imperatriz, Três Poderes, Centro, União
e Bacuri). Foram registradas 21 espécies de aves, incluídas em 07
ordens, 14 famílias, 19 gêneros. Este estudo objetivou sistematizar
dados inerentes ao comportamento da avifauna no ecossistema
urbano, identificando os principais impactos negativos ocorrentes
na avifauna. Os resultados obtidos reforçam a proposta de que a
avifauna esteja diretamente relacionada à arborização.
Palavras-chave: aves urbanas, avifauna, ecossistema.
Abstract
This work was developed to raise birds occurring in some areas of
Imperatriz (MA). The study area includes five selected districts (New
Empress, the Three Powers, Central, Union and Bacuri). We recorded
21 species of birds, included in 07 orders, 14 families, 19 genera. This
study aimed to systematize information inherent to the behavior
of birds in urban ecosystem, identifying the main negative impacts
that occur in birds. These results support the proposal that birds are
directly related to a forestation.
Keywords: urban birds, birds, ecosystem.
57
OS AUTORES
Ladislau Freitas Varão
1
Graduado em licenciatura em Ciências Biológicas pelo Instituto de Ensino Superior
do Sul do Maranhão – ([email protected]).
Jullys Alan Guimarães Gama
2
Especialista em Auditoria e Perícia Ambiental. Graduado em Biologia pela
Universidade Estadual do Maranhão (Uema) – ([email protected]).
A classe Aves (Chordata:Vertebrata) inclui mais de 9.000 espécies distribuídas em todo o mundo e se constitui no grupo
mais homogêneo de vertebrados (SICK, 1997). As aves podem
ser encontradas nos ambientes mais variados, inclusive nas proximidades de residências e centros urbanos (ANDRADE, 1997). A
observação de aves é uma atividade bastante prazerosa, que
vem sendo cada vez mais difundida e que tem contribuído para
um melhor conhecimento da biologia e da ecologia do grupo
(ANDRADE, 1997). Podem ser descritas três categorias de aves encontradas em ambientes urbanos: 1. Aves que já se encontravam no ambiente antes de ser modificado; 2. Aves invasoras e
3. As introduzidas ou exóticas (SICK, 1997).
Existem cerca de 1.676 espécies de aves que ocorrem no Brasil,
entre espécies residentes e visitantes, o que corresponde a mais
da metade das espécies de aves registradas para a América do
Sul (ANDRADE, 1995). Deste total, 145 são espécies migratórias que
passam anualmente no país, sendo que 89 são visitantes provindas do Hemisfério Norte e 56 do Hemisfério Sul (SICK, 1993
apud ANDRADE, 1995). O mesmo autor afirma que, do total de
espécies da América do Sul, 117 são endêmicas do Brasil e 115
estão ameaçadas de extinção segundo a lista oficial do Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama), publicada em 1989. A presença das aves no ambiente é
uma indicação de que o mesmo é saudável e funcional (ANDRADE,
1993). Neste sentido, as aves constituem um dos grupos faunísticos mais importantes em termos de bioindicação da qualidade
ambiental, devido à facilidade de obtenção de dados em pesquisa de campo, permitindo-se obter diagnósticos precisos em
curto espaço de tempo (BEDÊ et al., 1997; RAMOS, 1997). Continua
o mesmo autor afirmando que as mesmas têm, em sua maioria,
hábitos diurnos e intensa movimentação, o que facilita em muito
sua observação e identificação. Além disso, têm representantes
em quase todos os níveis tróficos e utilizam uma grande variedade de hábitats, sobretudo os terrestres.
ESTUDO DAS AVES URBANAS NO PROCESSO AMBIENTAL DE IMPERATRIZ (MA)
1. INTRODUÇÃO
No Brasil, existem diversos tipos de biomas, com diferentes
ecossistemas, onde se encontra uma grande variedade de aves.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.57-66 • janeiro/julho • 2012
59
QUANDO NÃO EXISTE
MAIS HÁBITAT
PRESERVADO OS
ANIMAIS CAMINHAM
LADISLAU FREITAS VARÃO, JULLYS ALAN GUIMARÃES GAMA
PARA A EXTINÇÃO
60
Cada espécie tem preferência por um tipo de ambiente
no qual ela vive e se reproduz. Com a perda das áreas
naturais, observa-se a destruição de hábitats necessários
para a sobrevivência das espécies de fauna, incluindo as
aves. Assim, quando não existe mais hábitat preservado
no qual podem viver e reproduzir, os animais caminham
para a extinção (ANDRADE, 1994).
A perda e a fragmentação de hábitats configuram as principais ameaças para as aves no Brasil. A caça e captura excessiva
também ameaçam alguns grupos comercialmente visados. Outras ameaças incluem a invasão de espécies exóticas e a poluição,
a perturbação antrópica e a morte acidental, alterações na dinâmica das espécies nativas, desastres naturais e perseguição (MARINI & GARCIA, 2005). Estudos sobre a fragmentação florestal em
comunidades animais foram realizados na região, principalmente
com relação à avifauna (ANJOS, 2002).
Na maioria dos hábitats humanos, onde se incluem as cidades,
as aves convivem pacificamente e em harmonia com o ser humano, seja em áreas urbanas ou periurbanas. Porém, as mesmas
precisam de proteção contra as perturbações ambientais e/ou
humanas, bem como de hábitats específicos a fim de poderem
manter sua forma de vida particular (ANDRADE E ANDRADE, 1992).
As aves, devido às suas variadas adaptações, como nos hábitos alimentares (frugívoras, granívoras, insetívoras, nectarívoras,
carnívoras, piscívoras, detritívoras ou necrófagas e onívoras),
são animais muito importantes para a manutenção do equilíbrio ecológico de uma área ou fragmento, já que atuam como
dispersores de sementes (FRANCISCO & GALETTi, 2002), agentes
polinizadores (BARBOSA, 1999), reguladores de populações (NATURLINK, 2007) e ainda são bioindicadores de conservação. É possível detectar mudanças no clima através do comportamento
de algumas aves, principalmente as migratórias, que podem
atrasar ou adiar suas migrações (JENNI & KÉRY, 2003) e, como
consumidores finais de cadeias alimentares, tendem a acumular
metais pesados através da alimentação, indicando assim, como
em aves piscívoras, a qualidade dos cursos d’água (VIEIRA, 2006).
Além disso, riqueza de aves é positivamente associada ao tamanho dos fragmentos (COLLI et al., 2003).
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
A principal ameaça para as aves brasileiras é a perda e a fragmentação de hábitats. Para 111 (89,5%) das 124 espécies brasileiras presentes na lista vermelha da IUCN (IUCN, 2004), a perda
e degradação do hábitat é uma das principais ameaças, seguida
pela captura excessiva (35,5%). Outras ameaças incluem a invasão de espécies exóticas e a poluição (14%), a perturbação
antrópica e a morte acidental (9,5%), alterações na dinâmica
das espécies nativas (6,5% cada), desastres naturais (5%) e perseguição (1,5%).
Neste contexto, destacam-se as seguintes contribuições das
aves no meio ambiente em que vivem: atuam no controle biológico; polinizam as flores, alimentam-se de pragas e disseminam
sementes; são boas indicadoras biológicas do ambiente e indiretamente exercem outras contribuições ao meio ambiente. Por
isso é extremamente importante o levantamento destas aves na
área urbana de Imperatriz para identificar a que tipo de impactos estas espécies estão submetidas, a fim de propor medidas
socioambientais para preservação desta classe animal.
ESTUDO DAS AVES URBANAS NO PROCESSO AMBIENTAL DE IMPERATRIZ (MA)
A redução da cobertura florestal a fragmentos pequenos vem
trazendo consequentes urgências negativas para a avifauna,
empobrecendo-a consideravelmente (D'ÂNGELO - NETO et al.,
1998). A degradação atinge também outras vegetações como
campos, savanas, refletindo em biomas como a Mata Atlântica, Floresta Amazônica, Cerrado, Caatinga, Pantanal Matogrossense, entre outros, prejudicando principalmente a fauna
e flora endêmicas desses locais. Sendo assim, torna-se essencial
a realização de pesquisas com o intuito de se avaliar o grau de
degradação, formular estratégias para minimizar esses efeitos
negativos e contribuir para o desenvolvimento sustentável, essencial para a vida humana (FIGUEIREDO, 1993).
O presente estudo tem como objetivo identificar as espécies de
aves, distribuídas em famílias e ordens taxonômicas, e os impactos ambientais ocorrentes sobre a avifauna na área urbana
de Imperatriz, contribuindo para um maior conhecimento da
avifauna local e para o manejo e conservação do grupo na região. As aves são um componente muito útil de qualquer meio
natural, tanto para a vida da população urbana quanto para o
ecossistema, contribuindo de várias maneiras.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.57-66 • janeiro/julho • 2012
61
2. MATERIAIS E METÓDOS
2.1. Área de estudo
O presente estudo foi realizado no município de Imperatriz,
Maranhão – Brasil. A cidade ocupa uma área de 1.368 km2,
altitude de 80 metros, latitude de 5º 31’35’’ sul e longitude de
47º 29’30’’ oeste (IBGE, 2007). Detém um excelente potencial
hidrográfico, banhado por vários riachos como: Cacau, Bacuri,
Santa Tereza, Capivara, Barra Grande, Cinzeiro, Angical, Grotão
do Basílio e Saranzal, sendo o rio Tocantins o principal, com
extensão de 2.850 km, possibilitando uma grande integração.
LADISLAU FREITAS VARÃO, JULLYS ALAN GUIMARÃES GAMA
A área de estudo consistiu em cinco bairros: Nova Imperatriz,
Três Poderes, Centro, União e Bacuri.
2.2 Métodos
As observações ocorreram nos meses de setembro de 2009 a
novembro de 2009 e foram realizadas pela manhã (06h00min-09h00min). Os registros das aves foram realizados visualmente,
com o auxílio de binóculos e guia de campo e para melhor classificação utilizou-se máquina fotográfica com o objetivo de encontrar
as espécies na zona urbana de Imperatriz. Foram várias observações em cada bairro de acordo com a imagem espacial a seguir.
Figura 1. Localização dos cinco bairros estudados
Nova Imperatriz (01), Três Poderes (02), Centro (03), União (04)
e Bacuri (05). Fonte: Google Maps
62
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
AVES FOI REALIZADA
Foram registradas 26 espécies de aves, distribuídas em 09
COM AUXÍLIO DE
ordens, 18 famílias, 24 gêneros (Tabela 1). Passeriformes foi
a ordem mais representativa, destacando-se as famílias EmBINÓCULOS, GUIA DE
berizidae e Thraupidae. Durante o período de pesquisa, foCAMPO E MÁQUINA
ram encontradas as seguintes espécies: bem-te-vi (Pitangus
FOTOGRÁFICA
sulphuratus), pipira-olivácea (Mitrospingus oleagineus), pardal (Passer domesticus), pipira-azul (Cyanicterus cyanicterus),
pipira-preta (Tachyphonus rufus), sanhaço-cinzento (Thraupis
sayaca), andorinha-doméstica-grande (Progne chalybea), bigodinho (Sporophila lineola), tiziu (Volatinia jacarina), curió (Oryzoborus angolensis), garrincha-chorona (Oreophylax moreirae), rolinha-roxa (Columbina talpacoti), fogo-apagou (Columbina squammata),
pombo-comum (Columba lívia), anu-preto (Crotophaga ani), anu-coroca (Crotophaga major), alma-de-gato (Piaya cayana), quero-quero (Vanellus chilensis), urubu-de-cabeça-preta (Coragyps atratus), gavião-carijó (Rupornis magni rostris), rasga-mortalha (Tyto
alba), xexéu (Cacicus cela), gavião-azul (Leucopternis schistaceus),
arapaçu-de-cerrado (Lepidocolaptes angustirostris), gavião-carcará
(Polyborus plancus), bico-de-brasa (Monasa morphoeus). Os bairros Nova Imperatriz (01), União (04) e Bacuri (05) apresentaram o
maior número de aves registradas, isto pelo fato de estarem próximas a fragmentos florestais. As informações obtidas poderão servir
de parâmetro para novos estudos na área.
Tabela 1. Relação dos grupos taxonômicos das aves observadas
em alguns pontos da área urbana de Imperatriz, Maranhão.
Ordens
Passeriformes
Galbuliformes
Columbiformes
Cuculiformes
Strigiformes
Ciconiiformes
Cathartiformes
Accipitriformes
Falconiformes
Totais
09
Famílias
Tyrannidae
Thraupidae
Dendrocolaptidae
Passeridae
Fringilidae
Hirundinidae
Emberizidae
Furnariidae
Icteridae
Bucconidae
Columbidae
Cuculidae
Crotophagidae
Tytonidae
Charadriidae
Cathartidae
Accipitridae
Falconidae
Accipitridae
18
Gêneros
01
03
01
01
01
01
03
01
01
01
02
01
01
01
01
01
01
01
01
24
Espécies
01
03
01
01
01
01
03
01
01
01
03
02
01
01
01
01
01
01
01
26
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.57-66 • janeiro/julho • 2012
ESTUDO DAS AVES URBANAS NO PROCESSO AMBIENTAL DE IMPERATRIZ (MA)
OBSERVAÇÃO DAS
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
63
4. CONCLUSÕES
Os resultados obtidos reforçam a proposta de que a avifauna
esteja diretamente relacionada à arborização. À medida
que as cidades crescem e se expandem, necessitam de uma
arborização planejada, buscando-se a minimização dos impactos nos ecossistemas urbanos e propiciando melhorias no
padrão socioambiental. No entanto, outros fatores podem
estar interferindo na determinação dessa riqueza, exigindo
novas pesquisas para um melhor entendimento da estrutura
e composição da avifauna urbana em Imperatriz. Por todas as
razões acima, fica claro que as aves são patrimônios naturais
que devem ser protegidos para a conservação dos ecossistemas
e para que as gerações futuras também possam apreciá-las.
LADISLAU FREITAS VARÃO, JULLYS ALAN GUIMARÃES GAMA
5. ANEXO*
Bico-de-brasa
(Monasa morphoeus)
Fotos: Ladislau Freitas
Arapaçu-de-cerrado
(Lepidocolaptes angustirostris)
Bem-te-vi
(Pitangus sulphuratus)
64
Rolinha-roxa
(Columbina talpacoti)
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
Pardal
(Passer domesticus)
Pombo-comum
(Columba lívia)
ESTUDO DAS AVES URBANAS NO PROCESSO AMBIENTAL DE IMPERATRIZ (MA)
Anu-preto
(Crotophaga ani)
Fotos: Ladislau Freitas
Xexéu
(Cacicus cela)
Gavião-carijó
(Rupornis magnirostris)
*Veja as imagens coloridas na versão digital da Revista UNI no site:
http://www.unisulma.edu.br
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.57-66 • janeiro/julho • 2012
65
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NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
ARTIGO
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
FIBRA ALIMENTAR COMO
MECANISMO PREVENTIVO DE
DOENÇAS CRÔNICAS
E DISTÚRBIOS METABÓLICOS
Thamires Moraes Brito Macedo¹
Gracilene Schmourlo²
Kátia Danielle Araújo Lourenço Viana³
Resumo
A fibra alimentar (FA) desempenha papel regulador e remissivo
nos distúrbios gastrointestinais e nas doenças crônicas não transmissíveis. O efeito benéfico da FA tem gerado aprovação em seu
uso para fins preventivos e terapêuticos. Fibra alimentar é a parede
celular dos vegetais, que não é digerida pelo organismo humano,
por não possuir enzima específica, e tem propriedades funcionais
importantes no organismo humano. Portanto, são inegáveis os benefícios que a FA associada à dieta desempenha na saúde humana.
Palavras-chave: fibra alimentar, constipação, doenças crônicas não
transmissíveis.
Abstract
The dietary fiber (DF) acts as a digestion regulator and also in the
treatment of common and chronic non-communicable disorders
in the human gastrointestinal tract. The DF beneficial effects have
been proven to be useful for preventive and therapeutic purposes.
The DF is the plant cell wall, it is not digested by the human body
due to a lack of gastrointestinal specific enzymes, with important
functional properties for the human gastrointestinal tract. Therefore, the DF benefits associated with human diet are undeniable.
Keywords: dietary fiber, constipation, chronic non communicable
diseases.
67
As autoras
¹Thamires Moraes Brito Macedo
Acadêmica do curso de Nutrição da Unisulma – ([email protected]).
²Gracilene Schmourlo
Bioquímica, professora do curso de Nutrição da Unisulma
– ([email protected]).
³Kátia Danielle Araújo Lourenço Viana
Mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal da Paraíba
– ([email protected]).
1. INTRODUÇÃO
As fibras alimentares, como alimento funcional, têm tido relevância nesse aspecto, uma vez que atuam diretamente na
prevenção de doenças. Elas atualmente são foco de grande
atenção devido aos inúmeros distúrbios metabólicos e doenças
crônicas não transmissíveis geradas pelo mau hábito alimentar enfrentados pela sociedade atual. Elas têm sido apontadas
como substâncias preventivas de doenças, evitando ou minimizando os efeitos dos alimentos industrializados ou daqueles
sem propriedades benéficas ao organismo, promovendo uma
melhor qualidade alimentar e, consequentemente, uma melhor
qualidade de vida.
A fibra alimentar (FA) desempenha papel regulador e remissivo nos distúrbios do trato gastrointestinal (TGI), além de evitar
prisão de ventre. Distúrbios esses gerados por modificações dietéticas, principalmente pela diminuição, na dieta, de alimentos
ricos em fibras. Estudos mostram que a ocidentalização propiciou o aumento dessas moléstias, já que a alimentação ocidental é pobre em fibras e rica em alimentos refinados.
FIBRA ALIMENTAR COMO MECANISMO PREVENTIVO DE DOENÇAS CRÔNICAS...
A alimentação tem desempenhado um papel fundamental na
prevenção e possível cura de algumas doenças da pós-modernidade. Frente a essa sociedade que suporta um grande número
de patologias relacionadas à alimentação, vê-se a necessidade
de se trabalhar uma alimentação que previna tais transtornos.
Dentre muitas doenças que assolam a sociedade moderna, temse a constipação intestinal, fruto principalmente da má alimentação, que tem cada vez mais se intensificado entre homens e
mulheres. Apesar de o universo feminino sofrer, visivelmente,
mais de constipação, a grande maioria da sociedade, constituída por trabalhadores e estudantes que passam a maior parte do
seu tempo fora de casa, atualmente apresenta distúrbios relacionados à constipação (JAIME et al., 2009).
Nas doenças crônicas não transmissíveis pós-modernas mais comuns, como o diabetes mellitus, a obesidade, as doenças cardiovasculares e o câncer, o efeito benéfico causado pela fibra
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.67-77 • janeiro/julho • 2012
69
A FIBRA
ALIMENTAR É
ENCONTRADA
EM GRÃOS COMO
SOJA, AVEIA
E EM CASCAS
DE ALIMENTOS
tem gerado aprovação em seu uso para fins preventivos e
terapêuticos, uma vez que tem efeito hipocolesterolêmico
frente à gordura e efeito hipoglicemiante, beneficiando os
diabéticos; além de prevenir o câncer de intestino, pela
diminuição do contato das fezes com a mucosa intestinal,
e consequentemente o contato com carcinógenos e, de
um modo geral, promover o desenvolvimento da mucosa
intestinal (OLIVEIRA; MARCHINI, 2008).
THAMIRES M. BRITO MACEDO, GRACILENE SCHMOURLO, KÁTIA D. A. LOURENÇO VIANA
O objetivo da presente revisão é apresentar os benefícios
da fibra alimentar como mecanismo preventivo de doenças crônicas não transmissíveis e de distúrbios metabólicos.
2. FIBRA ALIMENTAR
A fibra alimentar nada mais é do que a parede celular dos
vegetais, que não é digerida pelo organismo humano, por não
possuir enzima específica. É geralmente um carboidrato – exceto
a lignina – e atua com propriedades funcionais no organismo
humano (OLIVEIRA; MARCHINI, 2008).
A American Association Cereal Chemistry (2001 apud OLIVEIRA
e MARCHINI, 2008) define que fibra da dieta é a parte comestível das plantas ou carboidratos análogos que são resistentes à
digestão e à absorção no intestino delgado de humanos, com
fermentação completa ou parcial no intestino grosso. A fibra
da dieta inclui polissacarídeo, oligossacarídeos, lignina e substâncias associadas às plantas. A fibra da dieta promove efeitos
fisiológicos, benéficos, incluindo laxação, atenuação do colesterol no sangue e/ou atenuação da glicose no sangue.
Já Waitzberg (2006) define, de forma mais simples, fibra alimentar como todos os polissacarídeos vegetais da dieta (celulose, hemicelulose, pectinas, gomas e mucilagens), mais a lignina, que
não são hidrolisados pelas enzimas do trato digestivo humano.
Recentemente, o conceito de fibra foi estruturado de forma a
incluir substâncias semelhantes a elas, como a inulina, frutooligossacarídeos (FOS ) e o amido-resistente, que por alguns são
considerados prebióticos (CUKIER et al., 2005).
70
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
Estudos recentes mostram que a fibra alimentar tem sido aliada
na terapia de doenças, sendo assim considerada modernamente como alimento funcional. Intitula-se a fibra dietética como
alimento funcional porque
desempenha no organismo funções importantes, como intervir no metabolismo dos lipídeos e carboidratos e na fisiologia do trato gastrointestinal, além
de assegurar uma absorção mais lenta dos nutrientes e promover a sensação
de saciedade (CUKIER et al., 2005, p. 142).
2.1 Classificação das fibras alimentares
De acordo com diversos autores, as fibras dietéticas têm diversas formas de classificação. Salinas (2002) classifica-as em
quatro grupos distintos, conforme a digestibilidade que elas desenvolvem no tubo digestivo humano. Segundo ele, o grupo I
corresponde às fibras não digeríveis, pertencendo a este grupo
a celulose e a lignina; grupo II engloba as semidigeríveis, grupo
das hemiceluloses; o grupo III é o das fibras que retardam a digestão, composta da pectina e da goma-guar; e o grupo VI são
fibras viscosas de efeito ainda não determinado.
Schneeman (1986 apud Salinas, 2002) classifica as fibras segundo o papel que elas cumprem nos vegetais: I) polissacarídeos
estruturais (celulose, hemicelulose, pectina e amido resistente);
II) não polissacarídeos estruturais (lignina e outras substâncias);
III) polissacarídeos não estruturais (gomas e mucilagens).
FIBRA ALIMENTAR COMO MECANISMO PREVENTIVO DE DOENÇAS CRÔNICAS...
A fibra é de grande relevância para a comunidade em geral,
sendo facilmente encontrada em grãos como soja, aveia e em
cascas dos alimentos em geral.
Porém, em nossa prática cotidiana podemos visualizar duas formas diferentes de fibra dietética, devido a sua solubilidade em
água: fibra solúvel e insolúvel.
2.1.1 Fibra Alimentar Solúvel (FAS)
As fibras solúveis são encontradas mais frequentemente no interior da fruta ou do grão, ao contrário da fibra insolúvel que está
presente principalmente na casca e entrecasca dos alimentos.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.67-77 • janeiro/julho • 2012
71
Algumas fibras solúveis são pectinas, gomas, mucilagens e hemicelulose tipo A. Caracterizam-se por formarem um gel, em contato com a água, geleificando-se a mistura (CUKIER et al., 2005).
THAMIRES M. BRITO MACEDO, GRACILENE SCHMOURLO, KÁTIA D. A. LOURENÇO VIANA
São facilmente fermentadas no cólon pelas bactérias da flora
banal. Como resultado da fermentação colônica, têm-se os Ácidos Graxos de Cadeia Curta (AGCC) e gases (CO2, H2 e CH4),
que são obtidos pela fermentação de fibras e amido, principalmente, no cólon. Uma vez formados, esses são rapidamente
absorvidos no jejuno, íleo, cólon e reto (ROYALL et al., 1990 apud
WATZBERG, 2006). Dentre os AGCC mais abundantes estão o acetato, seguido do propionato e do butirato (WATZBERG, 2006).
Os AGCC são responsáveis pelo fornecimento de energia ao
hospedeiro, o que é benéfico em caso de má absorção; pela
modulação da motilidade gastrointestinal; pelo estímulo do desenvolvimento das células epiteliais do íleo e do cólon; pela possível proteção contra o câncer do cólon; e pelos efeitos benéficos sobre a homeostase da glicose e metabolismo dos lipídeos
(CUKIER et al., 2005).
A fibra solúvel também atua intensamente no retardamento
do esvaziamento gástrico e no trânsito do intestino delgado,
aumenta o volume e a maciez das fezes (pelo seu efeito de geleificação), reduz a diarreia, diminui o potencial hidrogeniônico
(pH) do cólon, aumenta a tolerância à glicose por diminuir e
retardar o contato do bolo fecal com a superfície da mucosa e
diminui os níveis elevados de colesterol total e de LDL - colesterol, pelo seu efeito “esponja”, capturando assim os lipídeos e
eliminando juntamente com as fezes (CUKIER et al., 2005).
2.1.2 Fibra Alimentar Insolúvel (FAI)
A fibra alimentar insolúvel compreende a parte mais externa e
resistente dos vegetais, ou seja, constitui elemento estrutural da
parede celular dos vegetais. Também é a parte da fibra que é
pouco fermentável e capta pouca água, formando misturas de
pouca viscosidade. É a parte da fibra responsável por aumentar
o volume das fezes, o que irá provocar uma eliminação pelo
organismo, diminuindo o risco de doenças intestinais. Por aumentar a massa e maciez fecal, apresenta um efeito mecânico
72
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
A AUSÊNCIA DE
FIBRA ALIMENTAR NO
A FAI é constituída pela celulose, hemicelulose tipo B e, principalmente, lignina. Esta é a mais hidrofóbica e, à medida
que a planta amadurece, vai se tornando mais rica em lignina
e perdendo seu conteúdo em água (OLIVEIRA; MARCHINI, 2008).
Existem autores que intitulam a FAI como antioxidante por
sua capacidade de excreção de algumas substâncias. Ela
aumenta a excreção de moléculas de colesterol através dos ácidos biliares nas fezes. Aumenta também a excreção de alguns
minerais como o zinco, cálcio, ferro e magnésio por ter efeito
competidor com esses minerais, daí a necessidade de controlar
a ingestão de fibras a fim de prevenir essa competição na absorção de nutrientes (CUKIER et al., 2005).
Segundo a American Dietetic Association (ADA) apud Cukier et
al. (2005), a ingestão recomendada é de 20-35g de fibras ao dia
para adultos e 5g ao dia para crianças.
3. CONSTIPAÇÃO INTESTINAL
A constipação pode ocorrer em qualquer idade e vai desde fezes
duras, esforço para defecar e ausência/diminuição de movimentos intestinais até fezes diárias com menos de 35g, defecações
inferiores a três vezes por semana ou espaço de três dias ou
mais sem defecar (MAHAN; ESCOTT-STUMP, 2005). Apesar de haver conceitos subjetivos e objetivos a respeito de constipação, o
mais apropriado para se identificar tal patologia ainda é baseado nesses estados acima citados.
ORGANISMO
É UMA DAS RAZÕES
PARA OCORRER
CONSTIPAÇÃO
FIBRA ALIMENTAR COMO MECANISMO PREVENTIVO DE DOENÇAS CRÔNICAS...
no trato gastrointestinal, reduzindo consideravelmente a
constipação (CUKIER et al., 2005).
Com exceção de períodos fisiológicos especiais, como na gestação e no envelhecimento, a constipação na fase adulta não é
considerada como normalidade, a não ser por algum distúrbio
secundário. Na gestação há um aumento do hormônio progesterona, que leva ao relaxamento da musculatura do útero
provocando uma pressão sobre os intestinos, o que irá diminuir os estímulos contráteis do intestino e, consequentemente,
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.67-77 • janeiro/julho • 2012
73
THAMIRES M. BRITO MACEDO, GRACILENE SCHMOURLO, KÁTIA D. A. LOURENÇO VIANA
também aumentar a absorção de água gerando constipação
na gestante. No envelhecimento, a musculatura do intestino
torna-se mais flácida, ocasionando diminuição dos movimentos
peristálticos.
Apesar de não ser normal a constipação em adultos, nota-se
um aumento gradual e constante dessa patologia. Em suas
diretrizes, a American Gastroenterological Association define
constipação como frequência de eliminação de fezes menor
que três vezes por semana, sensação de esvaziamento retal
incompleto, fezes endurecidas, esforço para eliminar fezes e
necessidade de toque para esvaziamento retal. Estes critérios,
conhecidos como critérios de Roma, são pouco práticos e, por
consequência, pouco aplicáveis a pacientes graves (AZEVEDO,
2009).
A ausência de fibra na alimentação é apontada como uma das
principais causas da constipação intestinal. A FA, por ajudar a
estimular movimentos peristálticos, tem se tornado uma aliada
na prevenção da constipação. Além da ausência de fibra alimentar no organismo, outras razões para a constipação podem
ser: falta de exercício físico, uso progressivo de laxantes, pouca
ingestão hídrica, além de doenças sistêmicas e gastrintestinais
(MAHAN; ESCOTT-STUMP, 2005).
4. ATUAÇÃO
DAS FIBRAS COMO MECANISMO PREVENTIVO DE
DISTÚRBIOS METABÓLICOS E DOENÇAS DO TRATO GASTROINTESTINAL
Mediante todos os efeitos da FA no organismo, seu papel como
alimento funcional preventivo de várias doenças tem despertado interesse científico na comprovação de sua atuação (OLIVEIRA;
MARCHINI, 2008).
No que tange ao diabetes mellitus, a fibra atua de forma positiva ao diminuir os níveis glicêmicos, além de a ingestão de
fibras também prevenir o aparecimento do diabetes. A terapia
nutricional no diabetes mellitus é parte fundamental do cuidado terapêutico (CUPPARI, 2005). O diabetes mellitus é uma síndrome de etiologia múltipla, decorrente da falta de insulina e/
ou da incapacidade da insulina de exercer adequadamente seus
74
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
efeitos no organismo. Na composição do plano alimentar para
diabetes mellitus, procura-se dar preferência aos carboidratos
complexos e ricos em fibras.
Uma evolução positiva na prevalência da obesidade vem sendo
observada em homens e mulheres (SARTORELLI; FRANCO, 2003). A
obesidade também pode ser vista como um sinal de falta de
fibras na dieta. Estudos têm apontado que a grande ingestão
de fibra, aliada à atividade física, diminui o risco de obesidade. Isso se dá devido ao estímulo à perda de peso, aliado a
uma alimentação equilibrada, além do fato de que alimentos
que têm FA geralmente proporcionam baixo índice glicêmico devido à concentração de carboidratos não disponíveis, o
que proporciona baixa resposta glicêmica pós-prandial. Não se
pode esquecer também de que certas fibras têm a capacidade
de diminuir a absorção de colesterol (LDL - colesterol) e triglicérides, diminuindo os níveis de gordura no sangue (OLIVEIRA;
MARCHINI, 2008).
As doenças cardiovasculares originam-se, principalmente, devido à grande ingestão de gorduras e estão intimamente ligadas
à obesidade. Dessa forma, os mecanismos das fibras que agem
nas doenças cardiovasculares também estão associados aos mecanismos que agem na obesidade.
FIBRA ALIMENTAR COMO MECANISMO PREVENTIVO DE DOENÇAS CRÔNICAS...
A fibra alimentar age beneficamente no diabetes mellitus porque os alimentos com elevado teor de fibras têm geralmente a
absorção mais lenta, devido ao retardamento do esvaziamento
gástrico (efeito fisiológico da fibra), evitando assim picos glicêmicos. O menor contato da glicose com a mucosa do intestino
também é fator desencadeante para isso, devido à competição
na hora da absorção dos nutrientes (OLIVEIRA; MARCHINi, 2008).
No caso do câncer, existem várias hipóteses que substanciam o
aparecimento de câncer e o consumo precário de fibra, como
a produção de AGCC e a acidificação do ceco, resultado da fermentação, podem diminuir o risco de câncer coloretal. A fermentação também age pela produção de ácidos voláteis que
diminuem o pH, além do ácido butírico produzido poder inibir
o crescimento e a proliferação de células cancerígenas (OLIVEIRA;
MARCHINI, 2008).
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.67-77 • janeiro/julho • 2012
75
A FIBRA ALIMENTAR
PARTICIPA
EFETIVAMENTE
DA PREVENÇÃO
DE DOENÇAS
CRÔNICAS E
DISTÚRBIOS
THAMIRES M. BRITO MACEDO, GRACILENE SCHMOURLO, KÁTIA D. A. LOURENÇO VIANA
METABÓLICOS
A alta exposição da mucosa às fezes pode também aumentar a exposição a fatores cancerígenos. A ingestão
adequada de fibras pode prevenir esse problema por aumentar o volume fecal e reduzir o tempo de trânsito intestinal (OLIVEIRA; MARCHINI, 2008). Acredita-se que as fibras
diminuam o risco de câncer porque as fibras insolúveis
movem o alimento mais rápido pelo trato gastrointestinal
e este decréscimo no tempo de trânsito do alimento diminui a quantidade de tempo em que carcinógenos estão
em contato com a mucosa gastrointestinal (PECKENPAUGH;
POLEMAN, 2007).
Nos demais casos de doenças do TGI, como o megacólon e a
diverticulose, a falta de fibra em geral é que ocasiona a enfermidade. A diverticulose, por exemplo, é uma doença de maior
prevalência em países onde a dieta com baixo teor em fibra faz
parte do padrão alimentar. Quando as fibras alimentares estão
ausentes na alimentação, como acontece nas dietas à base de
carboidratos refinados e proteínas, a pressão dentro do intestino aumenta e facilita a herniação. Isso também é crescente
onde a “ocidentalização” da dieta e ingestão aumentada de
alimentos refinados é frequente (SALINAS, 2002; CARUSO et al.,
2005). Em geral, a doença diverticular é: primeiro, relativamente rara em países onde a dieta de alto teor de fibra é parte do
padrão de vida; e segundo, crescente onde a “ocidentalização”
da dieta e ingestão aumentada de alimentos refinados da dieta
começaram (MAHAN; ESCOTT-STUMP, 2005).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
São inegáveis os benefícios que a FA, associada à dieta, desempenha na saúde humana. A qualidade de vida tem sofrido mudanças importantes durante muitos anos, fruto do fato de que
grande parte da população tem se mobilizado na busca por
alcançá-la.
Percebe-se que o espectro de ação da FA não se limita somente
às funções fisiológicas e estruturais, mas atua de forma conjunta no organismo como um todo, participando efetivamente na
prevenção de doenças crônicas e distúrbios metabólicos.
76
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
Apesar de as fibras alimentares ainda serem objeto de constantes pesquisas, a ingestão adequada e suficiente mostra resultados positivos, que já são mais que comprobatórios para uma
vida alimentar saudável. Portanto, faz-se imprescindível usar
dos benefícios promovidos pela FA no trato gastrointestinal e
tentar inseri-la no manejo terapêutico do nutricionista.
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e parenteral na prática clínica. 3ª ed. São
Paulo: Atheneu, 2006. v.1.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.67-77 • janeiro/julho • 2012
77
78
NATUREZA, SAÚDE E SUSTENTABILIDADE
79
ARTIGO
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
TRANSFERÊNCIA DE RENDA:
ELEMENTO DE INCLUSÃO
SOCIAL DOS BENEFICIÁRIOS DO
PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
NO BAIRRO VILA DAVI II?
Jailson de Macedo Sousa1
Édyla Azevedo da Silva2
Julieta Guerra Maia3
Sueli Brito Barbosa4
Resumo
O presente trabalho propõe analisar o processo de inclusão social
das famílias beneficiadas pelo Programa Bolsa Família (PBF) no bairro Vila Davi II do município de Imperatriz. Nesse contexto, enfatizam-se as condições de vida dessa população, objetivando identificar os verdadeiros efeitos do PBF na vida da comunidade estudada
e dos seus beneficiários e as reais possibilidades de inclusão social.
Palavras-chave: inclusão social, transferência de renda, Programa
Bolsa Família.
Abstract
The paper proposes to analyze the process of social inclusion of
families benefiting from the Family Grant Program (GMP) in Vila David II in the city of Imperatriz. In this context we emphasize the living
conditions of the population, to identify the true effects of GMP on
the lives of its users and the real possibility of inclusion
Keywords: social inclusion, income transfer, The Family Grant
Program.
81
os autores
Jailson de Macedo Sousa
1
Professor da Universidade Estadual do Maranhão (Uema) e da Unisulma. Mestre
em Geografia e doutorando em Geografia pelo Instituto de Geografia da
Universidade Federal de Uberlândia (IG/UFU). – ([email protected]).
Édyla Azevedo da Silva
2
Acadêmica da Unisulma – ([email protected]).
Julieta Guerra Maia
3
Acadêmica de Serviço Social da Unisulma – ([email protected]).
Sueli Brito Barbosa
4
Acadêmica de Serviço Social da Unisulma – ([email protected]).
82
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
1. INTRODUÇÃO
As mudanças socioeconômicas, políticas e culturais, ocorridas a
partir de 1950, tornaram-se cada vez mais visíveis, desencadeando no espaço urbano várias formas de expressão da questão
social. Nesse contexto, tornou-se relevante o discurso acerca dos
programas de transferência de renda como tentativa do Estado
de controlar e dirimir as desigualdades sociais, especialmente
em países periféricos, como é o caso do Brasil.
No Brasil, os programas de transferência de renda assumem
significados importantes como estratégias de combate à fome
e à pobreza a partir do ano de 1996, por meio do governo de
Fernando Henrique Cardoso. Nessa ocasião, vários ministérios
implementaram programas sociais com características semelhantes, que tratavam da promoção da cidadania e melhoria
da qualidade de vida. No entanto, essa temática tornou-se mais
eloquente com o surgimento, já no governo de Luiz Inácio Lula
da Silva, do Programa Bolsa Família, no ano de 2004, resultando da unificação de alguns programas de transferência de
renda que tratavam da mesma lógica.
TRANSFERÊNCIA DE RENDA: ELEMENTO DE INCLUSÃO SOCIAL...
A temática dos programas de transferência de renda é considerada de extrema relevância no contexto das políticas sociais de assistência, pois objetiva assegurar direitos e o resgate da cidadania
por meio de ações integradas que possibilitam a inclusão social.
O Programa Bolsa Família visa ao combate à fome, à pobreza e
às desigualdades sociais através da concessão de benefício, articulada às políticas de educação, saúde e segurança alimentar,
com a finalidade de garantir a inclusão social dos beneficiários.
Assim sendo, sentiu-se a necessidade, por meio deste ensaio, de
entender como este programa busca atingir seus objetivos, bem
como compreender de que forma são desenvolvidas suas ações
para a promoção do bem-estar da comunidade residente no
bairro Vila Davi II, no município de Imperatriz, Maranhão (MA).
Convém destacar que o bairro Vila Davi II emergiu, a exemplo
de outros bairros da cidade, de interesses políticos, através da
doação de terrenos situados na área periférica da cidade. Para
melhor compreensão deste fato, posteriormente estaremos dis-
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.81-94 • janeiro/julho • 2012
83
Associação Humanitária
Albé Ambrogio se originou de uma iniciativa
de um grupo de pessoas
ligado à igreja católica e
por intermédio e apoio
financeiro do representante missionário capuchinho, o italiano Albé
Ambrogio. Essa tem por
objetivo conceder ajuda
a pessoas do bairro periférico de Imperatriz, Vila
Davi II, a fim de proporcionar bem-estar social a
essa comunidade (SILVA,
2010).
JAILSON DE MACEDO SOUSA, ÉDYLA AZEVEDO DA SILVA, JULIETA GUERRA MAIA, SUELI BRITO BARBOSA
5
84
O fordismo teve início
na indústria automobilística e tem como características a produção
em massa, homogênea e
verticalizada de mercadorias. Esse modelo de
produção encontrou conjuntura para expansão
favorável, na intervenção
reguladora do Welfare
State ou Keynesianismo,
uma vez que a proteção
social assegurada pelo
Estado possibilitou um
consumo de massa, adequando à produção em
larga escala. Porém, a crise de 1970 colocou em
questionamento esse modelo de produção, devido
à forte redução do ritmo
do crescimento econômico e da queda das taxas
de lucro. (NETO, 2007, p.
195-216).
6
cutindo tal ocupação, considerando o contexto da realidade urbana de Imperatriz. Assim sendo, busca-se através deste artigo
compreender as reais possibilidades de inclusão social propiciadas através do Programa Bolsa Família.
O presente estudo é resultado do projeto de pesquisa “Bolsa
Família: uma análise do processo de inclusão/exclusão social
dos usuários residentes no bairro Vila Davi II, no município
de Imperatriz (MA)”, desenvolvido pela disciplina de Realidade
Regional do curso de graduação em Serviço Social da Unisulma, cujo objetivo central pautou-se na necessidade de articular a teoria e a prática, no que diz respeito à implementação e
efetivação das políticas públicas.
Desse modo, desenvolveu-se uma pesquisa de natureza qualitativa e quantitativa, na qual se buscou compreender o caráter
complexo do fenômeno estudado. Tal pesquisa teve como enfoque o método dialético, que consiste “em estudar os fenômenos concretos existentes no contexto espacial, bem como
as suas contradições” (TRIVIÑOS, 2006, p.53). Desenvolveram-se
ainda, como procedimentos metodológicos, a pesquisa de natureza bibliográfica, a documental e a de campo.
A pesquisa de campo foi acompanhada de análise qualitativa envolvendo 30% das 78 famílias cadastradas no bairro, ou
seja, 24 famílias. Também foram realizadas entrevistas com
membros da comunidade e com fundadores da Associação
Humanitária de Imperatriz Albé Ambrogio5, sendo dirigida
também ao gestor do Programa Bolsa Família, cuja finalidade
fundamentou-se em relacionar os dados bibliográficos com a
realidade vivenciada por essas famílias.
Assim, organizou-se esse artigo da seguinte forma: inicialmente, tratamos dos aspectos característicos do Programa
Bolsa Família, abordando algumas considerações sobre a sua
implementação e características. A etapa posterior buscou fazer uma caracterização do bairro Vila Davi II, apontando sua
formação e sua atual situação estrutural, prosseguindo com a
análise dos dados coletados relacionados à pesquisa de campo
sendo, posteriormente, apresentadas as considerações finais.
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
A recessão econômica, verificada na década de 1970, resultou do
esgotamento do padrão de acumulação produtiva baseada no
pacto fordista/keynesiano6. Tal recessão refletiu em desemprego
e precarização das condições de vida da classe trabalhadora,
situações essas que foram agravadas a partir da década de 1980
com as transformações oriundas da revolução tecnológica.
Assim, ao mesmo tempo em que há um agravamento nas
expressões da questão social, os países capitalistas passam a
adotar uma série de medidas com a finalidade de retomada do
crescimento econômico e inserção no processo de globalização
e internacionalização da economia.
Esses acontecimentos provocaram profundas modificações no
mundo do trabalho, acentuando a desigualdade social. Segundo Giovanni, Silva, Yazbek (2008, p.15), esse contexto “demanda ações do Estado para proteção do amplo contingente de
trabalhadores que passam a vivenciar o desemprego estrutural
e a precarização do seu trabalho.” Nessa conjuntura é que os
programas de transferência de renda ganharam destaque em
nível internacional no âmbito da proteção social7.
No Brasil, os programas de transferência de renda passaram a ser
discutidos, no âmbito do sistema de proteção social brasileiro8, a
partir de 1991 por meio do projeto de Lei nº 80/91, elaborado
pelo senador Eduardo Matarazzo Suplicy do Partido dos Trabalhadores e aprovado em 16 de dezembro de 1991. Tal projeto
propunha instituir o Programa de Garantia de Renda Mínima
(PGRM). Essa proposta foi interrompida pelo Congresso Nacional,
contudo, impulsionou uma série de experiências a nível municipal
e estadual, a partir de 1995 (GIOVANNI, SILVA, YAZBEK, 2008).
Experiências precursoras foram desenvolvidas em alguns municípios do estado de São Paulo, além da capital federal, Brasília.
Segundo Silva (2008, p. 23),
A trajetória histórica
do capitalismo possibilita compreender o sistema de seguridade social como resultado da
complexa relação entre o
Estado, a sociedade civil
e o mercado. Assim, na
sociedade organizada sobre o modo de produção
capitalista, a seguridade
social tem se afirmado
como mecanismo de intervenção do Estado ou
da sociedade frente às
expressões da questão
social, com a finalidade de
conter a luta de classes e
garantir os mínimos sociais aos segmentos empobrecidos da sociedade.
7
No Brasil, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, o
sistema de proteção social tinha como principal objetivo a garantia
dos direitos da classe
trabalhadora como forma de conter a luta de
classe. Porém, com o texto constitucional, a seguridade social passa a
ser definida como ações
integradas da política de
saúde, de previdência e
de assistência social
8
TRANSFERÊNCIA DE RENDA: ELEMENTO DE INCLUSÃO SOCIAL...
2. ASPECTOS CARACTERÍSTICOS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
o desenvolvimento de Programas de Transferência de Renda insere-se no âmbito da proteção social no Brasil a partir de 1995, com a implementação das
experiências pioneiras de programas municipais do tipo Renda Mínima Familiar em Campinas, Ribeirão Preto e Santos, em São Paulo, e da experiência do
Programa Bolsa Escola de Brasília.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.81-94 • janeiro/julho • 2012
85
Neste contexto, é importante destacar que, com
a inserção do Brasil no
contexto de globalização
econômica e de inovações tecnológicas, o setor econômico será colocado como prioridade
do governo brasileiro até
aproximadamente 1996.
JAILSON DE MACEDO SOUSA, ÉDYLA AZEVEDO DA SILVA, JULIETA GUERRA MAIA, SUELI BRITO BARBOSA
9
Em 1996, no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso
(1995 – 1998), manifestou-se a necessidade de adotar ações que
objetivassem a erradicação da pobreza, fome e miséria. Iniciouse então a elaboração de programas de transferência de renda
descentralizados9. Tais programas foram elaborados e implementados por vários ministérios, sendo que os primeiros foram o
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), Benefício de
Prestação Continuada (BPC) e Agente-Jovem, viabilizados através
do Ministério da Assistência Social, no ano de 1996.
A partir de 2001, no segundo mandato de Fernando Henrique
Cardoso (1999 – 2002), o Ministério da Educação elaborou o
programa Bolsa Escola. Neste mesmo ano também foi elaborado o Programa Bolsa Alimentação pelo Ministério da Saúde. Em
2002, foi instituído, pelo Ministério de Minas e Energia, o AuxílioGás; e em 2003, o Cartão Alimentação, através do Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome (GIOVANNI;
SILVA; YAZBEK, 2008).
No período de transição do governo de Fernando Henrique Cardoso para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2002 – 2003),
após estudos sistemáticos realizados, constatou-se a necessidade
de unificação de alguns Programas de Transferência de Renda,
uma vez que a diversidade de programas descentralizados resultava nos altos custos operacionais e impedia a eficiência da ação.
Deste modo, surge o Programa Bolsa Família, criado pela Medida Provisória nº 132, de 20 de outubro de 2003, que significou
para o Governo Federal uma estratégia de unidade administrativa, objetivando a racionalização dos gastos e integração entre
as três esferas de governo. É oportuno destacar que, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2006), o Programa Fome
Zero insere-se na agenda política como prioridade de governo,
apontando o Programa Bolsa Família como principal estratégia
no combate à fome, à miséria e à pobreza, sendo criado o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS),
substituindo o Ministério da Assistência Social e o Ministério
Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome.
O Programa Bolsa Família, transformado na Lei nº 10.836, de 9
de janeiro de 2004, unificou quatro Programas de Transferência
86
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
Os critérios que definem a situação da família são instituídos
por uma renda per capita baseada na renda familiar. De acordo
com Souza,
O programa beneficia famílias em situação de pobreza (com renda mensal por
pessoa de R$ 70 a R$ 140) e extrema pobreza (com renda mensal por pessoa
de R$ 70). Qualquer família em extrema pobreza pode participar do programa,
enquanto as famílias em situação de pobreza somente participam do programa caso tenham algum filho de até 17 anos. Os valores dos benefícios variam
com a condição de pobreza e a composição familiar (SOUZA, 2011, p.168).
As condicionalidades do programa são utilizadas como estratégias para garantir a participação dos beneficiários à rede de serviços e programas do governo. São entendidas como mecanismos que possibilitam a promoção da cidadania e emancipação
das famílias. Tais condicionalidades são, segundo Brasil (2010):
a) Assiduidade dos responsáveis nas ações socioeducativas
promovidas por programas do Governo Federal;
10
As condicionalidades
do programa são condições direcionadas às famílias beneficiadas e seu
cumprimento resulta no
recebimento mensal de
benefício. São elas: frequência escolar, acompanhamento nutricional
das crianças de 0 a 7
anos e acompanhamento
à gestante.
O Cadastro Único é um
instrumento que identifica e caracteriza as famílias com renda per capita
de até meio salário mínimo, sendo elemento determinante para inserção
das mesmas nos programas sociais.
11
TRANSFERÊNCIA DE RENDA: ELEMENTO DE INCLUSÃO SOCIAL...
de Renda do Governo Federal: o Bolsa Escola, o Auxílio Gás, o
Bolsa Alimentação e o Cartão Alimentação. Desse modo, o Decreto nº 5.209, de 17 de setembro de 2004, que regulamenta o
Programa Bolsa Família, estabelece como principais objetivos o
combate à fome e à pobreza, bem como à desigualdade social,
através da concessão de um benefício associado ao cumprimento de condicionalidades10 com a finalidade de garantir as condições básicas – o acesso à rede de serviços públicos, em especial,
de saúde, educação e assistência social – para promoção da
inclusão social das famílias beneficiárias (BRASIL, 2004).
b) Frequência escolar de 85% da carga horária mensal das
crianças e adolescentes de 6 a 17 anos;
c) Acompanhamento nutricional das crianças;
d) Participação das gestantes e lactantes na unidade de saúde e atividades promovidas pelo poder público sobre aleitamento e alimentação saudável.
Desse modo, o benefício é concedido mensalmente às famílias e são realizadas periodicamente atualizações das mesmas
através do Cadastro Único11 para programas sociais, que serve de acompanhamento dos resultados e do cumprimento das
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.81-94 • janeiro/julho • 2012
87
CRAS é um espaço governamental de execução
dos serviços de proteção
social básica, destinado
à população em situação
de vulnerabilidade social.
JAILSON DE MACEDO SOUSA, ÉDYLA AZEVEDO DA SILVA, JULIETA GUERRA MAIA, SUELI BRITO BARBOSA
12
condicionalidades do programa. Além disso, o Programa Bolsa
Família está integrado a uma rede de proteção social e procura
articular as políticas universais de saúde e educação com as políticas estruturantes de assistência social e segurança alimentar.
Essa articulação ocorre através de ações e programas desenvolvidos no âmbito dessas políticas como, por exemplo, o Programa de Atenção Integral às Famílias (PAIF), por meio Centro
de Referência da Assistência Social (CRAS)12, onde uma equipe
multidisciplinar composta por assistentes sociais, psicólogos e
educadores desenvolve ações socioeducativas de caráter preventivo para famílias que se encontram em situação de vulnerabilidade social, em especial as beneficiárias do Bolsa Família; o
ProJovem Adolescente, que atende a adolescentes entre 15 e 17
anos, no contraturno da jornada escolar, e visa à socialização e
permanência deste adolescente na escola; e o Sistema Nacional
de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), que proporciona
o acompanhamento nutricional das crianças de até sete anos,
beneficiárias do PBF.
Para compreender de forma mais sistemática o sentido prático da referida política, buscou-se considerá-la através de uma
experiência particularizada no município de Imperatriz, com a
finalidade de entender o papel do Programa Bolsa Família no
processo de inclusão social das famílias em situação de vulnerabilidade social. Buscou-se, dessa maneira, conduzir esta reflexão
através de uma realidade específica vivenciada no bairro Vila
Davi II, no município de Imperatriz.
3. CONSIDERAÇÕES
SOBRE A URBANIZAÇÃO DE
SUAS IMPLICAÇÕES NO BAIRRO
IMPERATRIZ
E
VILA DAVI II
A cidade de Imperatriz localiza-se no sudoeste do estado
do Maranhão e teve a sua ocupação intensificada a partir
da segunda metade do século XX, em razão das políticas de
desenvolvimento regional dirigidas para a Amazônia (SOUSA,
2009). Atualmente, Imperatriz se apresenta como o segundo
município mais populoso do estado do Maranhão, contando
com uma população de 247.505 habitantes (IBGE, 2010). Assim
sendo, a cidade se destaca como polo atacadista e varejista e
88
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
ainda na prestação de serviços na área da educação e, mais
recentemente, tem se destacado em função de diversas obras
ligadas ao segmento da construção civil.
O crescimento desordenado da cidade de Imperatriz se manifestou com bastante vigor a partir de 1950, demonstrando estreita
relação com o fenômeno urbano brasileiro. Além disso, o crescimento desordenado da cidade contou ainda com ações clientelistas de agentes políticos locais e regionais, o que se refletiu na
formação da maioria dos bairros no município, como é o caso
do processo de ocupação do bairro Vila Davi II. A este respeito,
Sousa comenta:
Têm-se outras situações semelhantes na cidade, ou seja, a formação de bair-
Informação fornecida
por João Silva Lima durante entrevista realizada na sede da Associação Humanitária Albé
Ambrogio, no dia 19 de
novembro de 2010.
13
14
Cabe ressaltar que João
Silva Lima encontrava-se
como diretor financeiro
da referida associação,
quando se realizou essa
entrevista.
local, estadual ou federal, como é o caso da Vila Fiquene, diretamente vinculada ao ex-prefeito da cidade, José de Ribamar Fiquene; Vila Cafeteira, ligada
ao ex-governador do Estado, Epitácio Cafeteira; e algumas cidades que foram
emancipadas mediante os interesses eleitoreiros de políticos como Edison Lobão, atualmente Senador da República (SOUSA, 2009, p. 89).
Nesse contexto, o bairro Vila Davi II surgiu através de uma ação
pessoal, do então deputado federal Davi Alves Silva, que, por volta de 1997, deu início ao plano de loteamento da sua propriedade rural de 89 hectares, com a finalidade de doar os terrenos
a famílias de baixa renda (informação verbal)13. De acordo com
João Silva14, a doação dos lotes ficou sob responsabilidade da Sra.
Antonia Silva, irmã de Davi Alves Silva e do Sr. João Macedo15,
assessor político do então deputado. Posteriormente, foi criada
a Associação dos Amigos de Davi Alves Silva, pela referida Sra.
Antonia Silva, com objetivo de dar continuidade a essa ação.
Informação fornecida
por Edmilson Pinto da
Silva, durante entrevista
realizada na sede da Associação Humanitária Albé
Ambrogio, no dia 25
de novembro de 2010.
Edmilson Pinto da Silva
encontrava-se como diretor contábil da referida
associação quando se realizou a entrevista.
15
TRANSFERÊNCIA DE RENDA: ELEMENTO DE INCLUSÃO SOCIAL...
ros vinculados aos interesses eleitoreiros de políticos que atuam no âmbito
Portanto, o bairro Vila Davi II emergiu pela facilidade de acesso
às terras não regulamentadas e se desenvolveu de forma precária,
refletindo um crescimento urbano não acompanhado de infraestrutura e serviços sociais básicos. Os estudos empreendidos possibilitaram constatar que o bairro não conta com os serviços de
saneamento básico, iluminação pública, abastecimento de água
e coleta de lixo, como também não possui pavimentação. Além
disso, percebeu-se que a maioria das casas foram construídas sem
as mínimas estruturas, não oferecendo condições de higiene adequadas, o que sugere a situação de pobreza e extrema pobreza.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.81-94 • janeiro/julho • 2012
89
JAILSON DE MACEDO SOUSA, ÉDYLA AZEVEDO DA SILVA, JULIETA GUERRA MAIA, SUELI BRITO BARBOSA
Figura 1: Aspectos da infraestrutura do Bairro Vila Davi II
Fonte: Silva, Édyla (2010)
Estas características apresentadas retratam o modelo de urbanização vivenciado em Imperatriz, marcado pela exclusão social
de parcela significativa da população. Como consequência, têm-se situações de miséria e pobreza que agravam as expressões
da questão social e passam a exigir mecanismos de intervenção
social, que possibilitem a não reprodução dessa questão, visando à melhoria da qualidade de vida dessa população.
No bairro Vila Davi II, é necessário destacar que as iniciativas pioneiras foram desenvolvidas em 2004 por meio da Associação Hu-
90
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
De acordo com João Silva e Valdilene Feitosa, também no ano de
2004 foram cadastradas algumas famílias do bairro Vila Davi II
no Programa Bolsa Família. Essa ação contou inicialmente com a
realização de um pré-cadastramento efetuado na sede da Associação Albé Ambrogio pela equipe técnica do programa no município de Imperatriz (informação verbal)17, prosseguindo com
as visitas domiciliares, realizadas em outra oportunidade pela
referida equipe, com a finalidade de constatar se as famílias cadastradas obedeciam aos critérios para inclusão, sendo alguns
cadastros efetivados.
Desse modo, o bairro Vila Davi II passou a contar com alguns serviços de iniciativas do poder público voltados para a melhoria das
condições de pobreza das famílias. Neste contexto foram disponibilizados serviços, como o de educação e saúde, desenvolvidos
através de parcerias entre o poder público e a referida associação.
Ibidem.
16
17
Informação fornecida
por João Silva Lima e
Valdilene Feitosa Álvares
Lima, em entrevista realizada na sede da Associação Humanitária Albé
Ambrogio, no dia 19 de
novembro de 2010. Valdilene Feitosa Lima encontrava-se como diretora de comunicação social
da associação quando se
realizou a entrevista.
TRANSFERÊNCIA DE RENDA: ELEMENTO DE INCLUSÃO SOCIAL...
manitária Albé Ambrogio, que contou com recursos advindos do
exterior, através do missionário capuchinho, o italiano Albé Ambrogio. Nessa oportunidade, construiu-se uma estrutura para a
associação constituída por um posto de saúde, uma capela, uma
escola, um campo de futebol e um poço artesiano. A partir de então, a população passou a contar com os seguintes serviços: curso
de informática e de violão, aulas de futebol, medicina alternativa e
fonte alternativa de abastecimento de água, uma vez que essa era
viabilizada apenas por cisternas (informação verbal).16
4. O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E A SUA FUNCIONALIDADE
NO BAIRRO VILA DAVI II: ELEMENTOS DE INCLUSÃO OU
EXCLUSÃO SOCIAL?
O Programa Bolsa Família foi implementado no município de
Imperatriz em janeiro de 2004. Atualmente, a política abrange
todos os bairros do município, atendendo a cerca de 19.000
famílias e conta com uma equipe formada por coordenador,
auxiliar administrativo, equipe de fiscalização, vigias e auxiliares
de serviços gerais, sendo que estes são concursados pela prefeitura municipal de Imperatriz ou contratados pela Secretaria de
Desenvolvimento Social (IMPERATRIZ, 2010).
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.81-94 • janeiro/julho • 2012
91
O NASF é constituído
por equipes compostas
por psicólogo, fisioterapeuta, nutricionista, educador físico e assistente
social.
JAILSON DE MACEDO SOUSA, ÉDYLA AZEVEDO DA SILVA, JULIETA GUERRA MAIA, SUELI BRITO BARBOSA
18
O Programa Bolsa Família conta ainda com uma estrutura física
mantida pela prefeitura e localizada no bairro Juçara, próximo
ao centro da cidade.
No município de Imperatriz, o cadastramento das famílias é realizado por meio de demanda espontânea ou encaminhamentos de outros serviços, não havendo focalização estratégica nos
bairros de maior vulnerabilidade social. Desse modo, os critérios
obedecidos para inclusão de beneficiários e os objetivos do programa seguem de forma genérica as orientações nacionais.
No bairro Vila Davi II, residem cerca de 400 famílias, das quais 78
são atendidas pelo programa. Contudo, a oferta e o acesso dessa
comunidade aos serviços de educação, saúde, assistência social
constitui um problema que merece destaque. No bairro, os serviços de saúde são oferecidos e mantidos pela prefeitura municipal
no posto de saúde da Associação Albé Ambrogio, que conta com
uma equipe técnica composta por um médico clínico geral, uma
enfermeira, uma técnica de enfermagem e um vigia, sendo que
o médico atente três vezes na semana. Essa equipe conta ainda
com o apoio do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF)18,
que desenvolve ações junto ao posto de saúde, duas vezes semanais. Os serviços de educação são proporcionados na escola
da referida associação, que se encontra alugada pela prefeitura,
oferecendo o ensino fundamental, do 1º ao 9º ano. A população
conta ainda com os serviços de creche ofertados de forma precária em outro prédio alugado e mantido pela prefeitura.
Além disso, através da pesquisa realizada, pode-se observar que
os serviços da política de assistência social são restritos e há a
ausência de programas ou serviços que objetivem a redução do
analfabetismo, a qualificação profissional, a geração de trabalho e renda, ou ainda que possibilitassem a melhoria das condições de vida e moradia da referida população. Esses programas
são essenciais para proporcionar às famílias a superação da situação de vulnerabilidade social.
No que se refere à efetivação do Programa Bolsa Família no
bairro em questão, buscou-se compreender, através da entrevista realizada com as famílias, qual o mecanismo utilizado pelo
programa para elevação da qualidade de vida e inclusão social
92
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
dos beneficiários, observando se os eixos dessa política são articulados. Desse modo, a pesquisa permitiu identificar que essas
famílias não participam de atividades desenvolvidas pelos programas complementares devido às dificuldades de buscá-los em
outros bairros, já que a Vila Davi II não dispõe desses serviços.
Constatou-se ainda que o acompanhamento das famílias cadastradas no Programa Bolsa Família se restringe aos serviços
de saúde e de educação. Na saúde esse acompanhamento é
realizado através do Sistema Nacional de Segurança Alimentar
e Nutricional (SISAN), que viabiliza uma avaliação nutricional
a cada seis meses das crianças menores de seis anos, além de
acompanhamento às gestantes. Na educação são realizados envios periódicos da frequência escolar das crianças e adolescentes para o órgão gestor do programa.
Assim sendo, pode-se perceber a ausência de consentimento e
efetivação das políticas públicas entre os objetivos do Programa
Bolsa Família e a realidade constatada desta política no bairro
Vila Davi II, o que nos permite questionar sobre os limites de
compromisso do poder público na efetivação da referida política, bem como na garantia do acesso a serviços sociais básicos à
população em situação de vulnerabilidade social.
TRANSFERÊNCIA DE RENDA: ELEMENTO DE INCLUSÃO SOCIAL...
Além disso, percebeu-se que essas famílias não reconhecem no
programa a possibilidade de emancipação, uma vez que ao serem
questionadas sobre suas perspectivas ao possível desligamento do
programa, todas as famílias analisadas não conseguiram apontar
nenhuma alternativa para superar sua situação de vulnerabilidade.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Programa Bolsa Família surge em um contexto histórico de agravamento da pobreza e das desigualdades sociais, apresentando-se
como uma possibilidade de inclusão social. Portanto, a articulação
de políticas públicas associadas à concessão monetária realizadas
pelo programa expressa um fundamento essencial para que se
possa promover inclusão social das famílias beneficiadas.
Desse modo, para a efetivação qualitativa do programa é indispensável a articulação dos três eixos essenciais desta política: a
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.81-94 • janeiro/julho • 2012
93
transferência de renda, o acesso aos serviços sociais básicos nas
áreas de educação, saúde e assistência social e os programas
complementares que objetivem a emancipação das famílias.
JAILSON DE MACEDO SOUSA, ÉDYLA AZEVEDO DA SILVA, JULIETA GUERRA MAIA, SUELI BRITO BARBOSA
É importante refletir sobre a eficácia do programa de transferência de renda Bolsa Família na busca da promoção e inclusão social
das famílias beneficiárias no bairro Vila Davi II, uma vez que a fragilidade das políticas sociais e a ausência de programas complementares dificultam a promoção da autonomia dessas famílias.
Diante do exposto, observamos que a ausência da articulação
proposta pelo programa pode contribuir para a postura de dependência dos beneficiários em relação à política, agravando o
posicionamento acrítico das famílias à realidade.
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94
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
ARTIGO
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
E EXTREMA POBREZA:
ELEMENTOS PARA UM DEBATE ACERCA
DA DEMOCRACIA BRASILEIRA
Alessandra Kelly Fonseca Dantas1
Resumo
Este trabalho objetiva refletir a relação entre dignidade da pessoa
humana ‒ esta considerada o valor supremo da constituição ‒ e extrema pobreza, considerando como uma de suas principais causas
o modo de produção capitalista, com o intuito de proporcionar elementos para um debate acerca da democracia brasileira ‒ do tipo
de democracia que se tem e que se deseja para a nação.
Palavras-chave: dignidade, extrema pobreza, democracia.
Abstract
This work aims to reflect the connection dignity of the person human ‒ this as of the its more important value of the constitution
‒, and poverty extreme ‒ this as the main case of the problem the
capitalism ‒, with the aim of the to supply information to one debate about democracy brasileira ‒ the form of democracy existent
and who democracy to want to nation.
Keywords: dignity, poverty extreme, democracy.
95
A autora
Alessandra Kelly Fonseca Dantas
1
Bacharel em Direito pela Faculdade de Imperatriz (Facimp)
– ([email protected]).
1. INTRODUÇÃO
O direito constitucional do homem, do cidadão, da dignidade da pessoa
humana, dos direitos fundamentais, afasta-se daquele centrado, exclusivamente, na figura do Estado, dele dependente, criatura servindo o criador,
instrumento de governo que dá satisfação aos interesses das maiorias conjunturais. O primeiro é o direito constitucional crítico, emancipatório, principiológico e repersonalizador. O segundo é o direito constitucional do status quo,
dogmatista, positivista, cativo do princípio majoritário, mero instrumento da
A dignidade da pessoa humana é valor intrínseco a cada ser
humano, independente de qualquer condição. Não é dada
pelo Direito. Não é concedida por este. É mesmo um atributo
que se sobrepõe ao próprio Direito.
Surgiu como forma de repudiar as arbitrariedades promovidas
pelos regimes de cunho nazista e fascista durante a Segunda
Guerra Mundial (1939-1945) e como meio de limitar a atuação estatal, no sentido de coibir atitudes que considerem o
ser humano como meio e não como fim em si mesmo, isto é,
impedir a sua coisificação/instrumentalização.
Elevando-a à condição de fundamento da república, o Estado
brasileiro ratificou o compromisso de respeitá-la, promovê-la e
protegê-la e de pautar a sua conduta no ser humano, pois este
é o fim próprio do Estado.
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E EXTREMA POBREZA...
atuação estatal [...] (CLÈVE, 2008 apud SARLET, 2008, p.8)
Este trabalho pretende refletir a relação entre dignidade da
pessoa humana – esta considerada o valor supremo da ordem
constitucional – e extrema pobreza, com o intuito de proporcionar elementos para um debate acerca da democracia brasileira – do tipo de democracia que se tem e que se deseja ter.
Assim, num primeiro momento, discorre-se acerca da dignidade da pessoa humana como valor fundante da ordem jurídica
constitucional brasileira. Posteriormente, analisa-se a extrema
pobreza no Brasil – considerando o modelo de desenvolvimento
que o país adota como uma de suas principais causas – como
uma forma de violação à dignidade humana. Após, cuida-se do
tipo de democracia que se tem e que se deseja para o país.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.95-107 • janeiro/julho • 2012
97
A DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA NÃO
2. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO VALOR FUNDANTE
DA ORDEM JURÍDICO-CONSTITUCINAL BRASILEIRA
É DADA, CONCEBIDA
A dignidade da pessoa humana apresenta conteúdo filosófico-histórico-político-jurídico a um só tempo. Desde
as sagradas escrituras, é possível encontrar os primeiros
DIREITO, É ANTES UM
contornos da ideia de dignidade humana2. Ainda na antiATRIBUTO INTRÍNSECO
guidade, de acordo com Sarlet (2008), a palavra dignitas
A TODO E QUALQUER
era utilizada para designar aqueles indivíduos que gozavam de certa posição social e que detinham certo grau de
SER HUMANO
reconhecimento pelos demais membros da comunidade.
Predominava, portanto, a noção de mensuração/ quantificação, isto é, havia pessoas mais dignas do que outras – ideia
totalmente incompatível com a dignidade que se faz presente
hodiernamente nos textos internacionais e nacionais, conforme se verificará.
ALESSANDRA KELLY FONSECA DANTAS
OU CONCEDIDA PELO
98
2
Basta verificar que, já
no livro de gênesis (Gênesis 1: 26), encontrase referência de que o
ser humano foi criado à
imagem e semelhança de
Deus. A partir desse marco, o Cristianismo extraiu
a afirmação de que todos
e todas ‒ e não apenas os
cristãos ‒ possuem um
valor que lhe é intrínseco, próprio. É claro que,
mais adiante, a chamada
Santa Inquisição parece
ter se esquecido dessa
descoberta para perpetrar toda sorte de atrocidades em desfavor dos
que se rebelaram contra
os dogmas da Igreja no
mundo.
Após os horrores vivenciados pela humanidade por meio das
duas guerras mundiais e do holocausto, em particular, a dignidade da pessoa humana surge como forma de impedir/limitar/
proibir o cometimento de toda sorte de arbitrariedades pelos
Estados soberanos. Constitui-se, primordialmente, neste momento, como uma cláusula de barreira, exigindo uma conduta
negativa por parte do Estado.
Positivou-se pela primeira vez a dignidade da pessoa humana
no artigo 1°, da Declaração Universal dos Direitos Humanos de
1948: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”3.
No Brasil, a positivação da dignidade da pessoa humana aconteceu pioneiramente por meio da constituição dita cidadã,
como reflexo da dura e triste experiência vivenciada após o
regime militar. Ao constituinte originário, coube a tarefa de
lhe conceder a devida importância, colocando-a após o preâmbulo, no Título I da Carta Maior, antes mesmo da estrutura
do Estado e dos Direitos Fundamentais. Isso não é mera coincidência. É, por assim dizer, a inequívoca demonstração de que
o Estado brasileiro reconhece o ser humano como o seu pilar,
de modo que a partir dele e por ele deverá nortear toda a sua
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
conduta, sempre no sentido de lhe proteger e lhe promover a
dignidade humana, quer em relação ao próprio Estado quer
em relação a terceiros.
Extraem-se, nesse sentido, os ensinamentos do professor Ingo
Sarlet:
Neste contexto, não restam dúvidas de que todos os órgãos, funções e atividades estatais encontram-se vinculados ao princípio da dignidade da pessoa
humana, impondo-se-lhes um dever de respeito e proteção, que se exprime
ONU ‒ Organização das
Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948.
Disponível em: <http://
unicrio.org.br/img/
DeclU_D_HumanosVersoInternet.pdf.>. Acesso
em 27 de junho de 2011.
3
tanto na obrigação por parte do Estado de abster-se de ingerências na esde protegê-la (a dignidade pessoal de todos os indivíduos) contra agressões
oriundas de terceiros, seja qual for a procedência, vale dizer, inclusive contra
agressões oriundas de outros particulares, especialmente – mas não exclusivamente – dos assim denominados poderes sociais (ou poderes privados).
(grifo nosso), (SARLET, 2008, p. 115).
Cabe apregoar, de acordo com o entendimento de Ingo Sarlet
(2008), Paulo Bonavides (2001) e da ministra do Supremo Tribunal Federal, a Sra. Carmem Lúcia4, que a dignidade da pessoa humana não é dada, concebida ou concedida pelo Direito,
pois que é atributo intrínseco a todo e qualquer ser humano.
Assim, o que o Direito pode fazer é reconhecer, respeitar, promover e defender a dignidade humana. Esta configura, por assim dizer, algo preexistente ao Direito, um atributo pré-estatal.
Nesse sentido, ainda que o Direito Constitucional brasileiro
não a houvesse positivado, a sua observância seria impositiva.
ROCHA, Carmem Lúcia
Antunes. O princípio da
dignidade da pessoa humana e a exclusão social.
Disponível em <http://
www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/
anexos/32229-384151-PB.pdf>. Acesso em:
19 de junho de 2011.
4
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E EXTREMA POBREZA...
fera individual que sejam contrárias à dignidade pessoal, quanto no dever
Observou-se que o constituinte de 1988 entendeu por bem – e
neste ponto não se desconsidera a importância desse reconhecimento – positivar a dignidade humana de tal forma que ela
se tornou fundamento do Estado Democrático brasileiro (art.
1°, III, Constituição Federal de 1988).
Considerando tudo o que já se afirmou até aqui, indaga-se:
a positivação é suficiente para impedir violações à dignidade
humana? Para responder a essa questão singela, basta olhar
para a realidade brasileira. Há 16,2 milhões de brasileiros que
vivem com renda média mensal de R$ 70,00 (são os considerados extremamente pobres). A resposta é categoricamente
negativa. Outra questão: pode-se falar em democracia plena
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.95-107 • janeiro/julho • 2012
99
quando 16,2 milhões de brasileiros vivem na extrema pobreza? Liberdade de voto? Eleições periódicas? Capacidade de autodeterminação? Liberdade? Que democracia? E mais: o que é
preciso para se respeitar, promover e proteger a dignidade da
pessoa humana? Sarlet parece iluminar esse breu na tentativa
de compreender tais contradições:
O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela
vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde as condições
mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde não houver limitação do poder, enfim, onde a liberdade e a autonomia, a igualdade
(em direitos e dignidade) e os direitos fundamentais não forem reconhecidos
e, minimante, assegurados, não haverá espaço para a dignidade da pessoa
humana e esta (a pessoa), por sua vez, poderá não passar de mero objeto de
ALESSANDRA KELLY FONSECA DANTAS
arbítrio e injustiças (grifo nosso), (SARLET, 2008, p. 62).
Verifica-se que, para que haja respeito à dignidade humana
– e, por conseguinte, liberdade, autonomia, justiça (no seu caráter substantivo e não meramente formal), em uma palavra,
democracia plena – é imprescindível a efetivação dos direitos
humanos e fundamentais – todos eles, sem exceção alguma.
Isso se relaciona, intimamente, com a própria finalidade do
ordenamento constitucional, consoante ensina Bonavides:
[...] cujo fim já não é, apenas, aquela segurança, de todo formal, senão também a justiça substantiva, a justiça material, a justiça que se distribui na sociedade, a justiça em sua dimensão igualitária; portanto, a justiça incorporadora
de todas as gerações de direitos fundamentais; da primeira à segunda, da segunda à terceira e desta à quarta, passando pelos direitos civis e políticos, pelos direitos sociais, pelo direito dos povos ao desenvolvimento, até alcançar,
com a democracia participativa, onde têm sede os direitos da quarta geração
– sobretudo o direito à democracia – um paradigma de juridicidade compendiado na dignidade da pessoa humana (grifo nosso), (BONAVIDES, 2001, p.28).
Convém ressaltar que a dignidade da pessoa humana, tendo
sua dimensão negativa e prestacional, exige do Estado – para
além da limitação do seu poder, não raras vezes arbitrário – a
efetivação dos direitos fundamentais (meio pelo qual se concretiza, ressalte-se, o núcleo que é justamente a dignidade
humana). Do contrário, não se poderá falar em liberdade, autonomia, autodeterminação, predicados que são pressupostos
do Estado Democrático de Direito.
100
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
Sente-se, neste momento, uma grande contradição (que traz
consigo desafios para a construção da democracia que se pretende para o país): como é possível que a constituinte de 1988
tenha reconhecido o compromisso do Brasil com a dignidade humana e, mais de vinte anos depois, ainda haja no país
mais de 16 milhões de pessoas vivendo na extrema pobreza?
Que relação é possível estabelecer entre dignidade da pessoa
humana e extrema pobreza? E entre extrema pobreza e capitalismo? Que contradições e desafios há nessa temática para
a democracia brasileira? É precisamente disso que se tratou
nesse momento e que se tratará adiante.
2. EXTREMA POBREZA5: O FRUTO DO CAPITALISMO E A VIOLAÇÃO
De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate
à Fome, considera-se extremamente pobre qualquer pessoa que vive em
domicílio com renda per
capita igual ou inferior a
R$ 70,00 mensais. A esse
respeito ver: http://www.
brasilsemmiseria.gov.
br/wp-content/themes/
bsm2nd/perfil_extrema_
pobreza.pdf. Acesso em
20 de junho 2011.
5
A primeira questão que se impõe acerca da extrema pobreza no
Brasil é esta: Qual a sua origem? Por que há pessoas extremamente
ricas (ou simplesmente pessoas ricas) e pessoas extremamente
pobres? E qual a importância disso para o Direito? Pode-se, num
primeiro momento, olhar para a história, pois, consoante Eduardo
Galeano (2010, p.25): “A história é um profeta com o olhar voltado
para trás: pelo que foi e contra o que foi, anuncia o que será”.
Volta-se o olhar sobre o modo de produção capitalista. O Brasil é
um país que se encontra no sul do mundo, no continente latinoamericano, como é cediço. País extremamente belo, rico e que,
exatamente por isso, desde a colonização – assim como toda a
América Latina – é alvo de estrangeiros (e também nacionais) gananciosos pelas suas riquezas, pela concentração de renda, pelo
latifúndio, pela produção e pelo consumo desenfreado.
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E EXTREMA POBREZA...
À DIGNIDADE HUMANA
Nesse caminho, pondera Karl Marx:
O descobrimento das jazidas de ouro e prata da América, a cruzada de extermínio,
escravização e sepultamento das minas da população aborígine, o começo da
conquista e o saque das Índias Orientais, a conversão do continente africano em
campo de caça dos escravos negros: são todos fatos que assinalam a alvorada da
era da produção capitalista (grifo nosso), (MARX, 1868 apud GALEANO, 2010, p. 49).
Sabe-se, nessa conjuntura, que no Brasil, desde a catequização
e extermínio de quase todos os indígenas que habitavam a
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101
Trecho
extraído
de
entre vista concedia à revista Mundo Jovem, publicada no sítio Adital.
Disponível em: http://www.
adital.com.br/site/noticia.
asp?lang=PT&cod=57456.
Acesso em 15 de junho de
2011.
6
Ibidem.
7
terra dourada antes mesmo dos colonizadores, passando pelo
tráfico de negros oriundos da África para trabalhar nos canaviais nordestinos e culminando na descoberta do ouro na
cidade de Ouro Preto, todo esse processo constitui também o
modo de produção capitalista.
Note-se, a esse respeito, que o assessor extraordinário da Secretaria Geral da Presidência da República, Selvino Heck, relaciona a fome no Brasil exatamente com o tipo de sociedade
que se tem – e que foi construída historicamente: uma sociedade que exclui as pessoas, que visa ao lucro alicerçado no
capitalismo de cunho neoliberal, que não permite a igualdade
substantiva, que perpetua a desigualdade social. Eis as palavras do assessor:
Do ponto de vista estrutural, a fome é resultado do tipo de sociedade que
temos: uma sociedade capitalista que concentra renda, exclui as pessoas,
ALESSANDRA KELLY FONSECA DANTAS
não permite que haja igualdade e uma melhor distribuição de renda. Então a
razão estrutural é esta: uma sociedade que visa ao lucro, e o lucro acontece
junto com o acúmulo de riqueza e de renda. Além disso, nós vivemos 20, 30
anos de neoliberalismo. O neoliberalismo significa: “Quem pode mais, chora
menos”. Mas não se trata apenas da política econômica e social, é também
uma política cultural, de valores, que influencia na maneira como as pessoas
agem em relação umas às outras. Precisamos fazer um trabalho longo de
reconstrução de valores de solidariedade (grifo nosso).6
Para se ter uma ideia acerca da concentração de renda no país,
dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revelam que 10% da população concentram 70% de toda a riqueza nacional e os 90% mais pobres têm acesso a 25% a
30% do restante da renda nacional.7 Esses dados são alarmantes e fruto do modelo de desenvolvimento em vigor no Brasil.
Verifica-se, assim, que a extrema pobreza é desdobramento
desse acúmulo de riqueza nas mãos de pouquíssimas pessoas.
É o desenvolvimento – para alguns – levado a cabo por meio
do subdesenvolvimento de muitos.
No esforço de levar às últimas consequências a relação entre
dignidade da pessoa humana e extrema pobreza, cumpre destacar os dados obtidos pelo Censo de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que retratam
a seguinte realidade:
102
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
Os 16,27 milhões de extremamente pobres no país estão concentrados principalmente na região Nordeste, totalizando 9,61 milhões de pessoas (59,1%),
distribuídos 56,4% no campo, enquanto outros 43,6% em áreas urbanas [...]
A distribuição da população em extrema pobreza segundo o Censo Demográfico 2010 por sexo revela que há uma distribuição homogênea entre homens
e mulheres, com leve superioridade da presença feminina (50,5% contra
49,5%) [...] As informações da população em extrema pobreza corroboram o
Disponível em <http://
www.brasilsemmiseria.
gov.br/wp-content/
themes/bsm2nd/perfil_
extrema_pobreza.pdf>.
Acesso em 20 de junho de
2011.
8
senso comum em relação à questão de cor ou raça – a grande maioria destas
pessoas (70,8%) são pardas ou pretas. Entretanto, o que chama a atenção é
a presença de indígenas, apesar de representarem, comparativamente, uma
pequena parcela da população em extrema pobreza. Os indígenas totalizam
817.963 pessoas no país, sendo que 326.375 se encontram em extrema pobreza, representando praticamente quatro em cada dez indígenas (39,9%)
[...] Entre os extremamente pobres, cerca da metade se encontra com idade
Percebe-se que o próprio modelo de sociedade que se adota
é posto em questão, em debate, diante desses números que
retratam uma realidade excludente que não permite o pleno
desenvolvimento do ser humano (este considerado como um
fim em si mesmo), que não respeita e não promove a dignidade da pessoa humana – no sentido em que é defendida neste
estudo. Urge, pois, a construção de um novo modelo de sociedade, de uma nova forma de agir e de pensar.
Virgínia Fontes, pesquisadora da Universidade Federal Fluminense (UFF), entende que
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E EXTREMA POBREZA...
até 19 anos (50,9%) – (grifo nosso).8
Essa luta contra a miséria tem um lado ligado à própria expansão do capital
internacional, da atuação do banco mundial, de uma nova filantropização.
Mas também resulta de pressões e lutas de setores populares fortes. Só que,
para não ter miséria nesse modelo, é preciso ser cada vez mais rico, o que significa que atacar a miséria é garantir a produção crescente da concentração
da riqueza – (grifo nosso) – (FONTES apud JÚNIA, 2011, on-line).
Diante de tudo quanto já se disse até aqui, urge a construção de
um novo modelo de sociedade, menos excludente, mais inclusiva; que privilegie a dignidade da pessoa humana, respeitando-a
integralmente, mediante a concretização dos direitos humanos
e fundamentais. É preciso distribuir a renda, implementar políticas públicas emancipatórias e não meramente assistencialistas.
É preciso socializar o trabalho, a qualificação profissional, gerar
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.95-107 • janeiro/julho • 2012
103
empregos e não simplesmente manipular o povo por meio de
programas governamentais assistencialistas, muito embora não
se desconsidere por completo a sua relevância.
A esse respeito, a pesquisadora tece algumas críticas ao Programa Brasil Sem Miséria, lançado pelo Governo Federal. Para
ela, trata-se de uma política de gotejamento, isto é, que não
proporciona a construção de direitos, mas apenas abranda
uma situação de exclusão e miséria sem atingir de fato os fatores que a acarretam, nestes termos:
É uma gota calibrada: não tem processo de reajuste, não tem compromisso com
produção qualificada de trabalho socializado, tem um compromisso estritamente mínimo, que é dar uma renda minimíssima para os setores de pior condição. É
melhor isso do que nada, mas isso não é um direito. A construção de direitos está
ALESSANDRA KELLY FONSECA DANTASS
bloqueada pela oferta de programas. (grifo nosso) (JÚNIA, 2011).
3. DEMOCRACIA, DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
POBREZA: ELEMENTOS PARA UMA REFLEXÃO
E EXTREMA
Uma vez reconhecida a dignidade da pessoa humana como
fundamento da República Federativa do Brasil, a extrema pobreza traduz-se em nítida violação aos direitos fundamentais
– e à própria dignidade proclamada –, inviabilizando, por conseguinte, a democracia plena.
No que concerne à democracia, adota-se a posição do professor Paulo Bonavides (2000) para quem democracia é governo
do povo, pelo povo e para o povo.
Defende-se, neste estudo, que democracia não se restringe ao
princípio majoritário, ao exercício do voto direto, secreto, universal e periódico, à realização de eleições, à alternância de
poder. Não. Democracia, aqui, possui como pilares a soberania popular e o respeito aos direitos humanos e fundamentais
(à dignidade da pessoa humana, portanto), de modo que há
uma indissociabilidade entre democracia e dignidade da pessoa humana. É também nesse sentido que prelecionam Ingo
Sarlet (2008) e Paulo Bonavides (2000).
Da mesma forma, entende a socióloga e professora. da Universidade de São Paulo (USP), Maria Victoria Benevides, para quem:
104
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
tringe a democracia à existência de direitos e liberdades individuais, além de
eleições periódicas. Quantas vezes escutamos no Brasil expressões como esta:
estamos vivendo numa democracia plena! Ora, nós todos sabemos que isso
não é verdade. É preciso ter claro, no entanto, que essa associação entre os
dois grandes princípios – a soberania popular ativa e o respeito integral aos
direitos humanos – como fundamentos da democracia, implica afirmar uma
exigência de que ambos atuem conjuntamente. Isto é, não podemos ter democracia sem soberania popular, assim como não podemos ter democracia
sem respeito aos direitos humanos9 – (grifo nosso) – (BENEVIDES, 2002).
Veja-se, então, que não é possível uma democracia plena sem
que se resguarde ao povo – o legítimo titular do poder – a
efetivação dos direitos humanos e fundamentais. Isto porque,
de acordo com Carmem Lúcia Antunes Rocha, “A democracia
tem o seu fundamento no homem e nele faz repousar a sua
finalidade, pelo que a dignidade da pessoa é o núcleo central
e referencial daquele regime político” (ROCHA, 2011, on-line).
Nessa linha, questiona-se: como é possível ao povo extremamente pobre, isto é, aos 16,27 milhões de brasileiros que vivem na extrema pobreza, participar livremente da vida política
da nação se lhes faltam comida, saneamento básico, educação, saúde, lazer? A sua autonomia e liberdade (corolários da
dignidade humana) restariam preservadas?
Nesse sentido, para que seja possível falar em democracia –
entendida como governo do povo, para o povo e pelo povo
–, urge assegurar a fruição dos direitos humanos e fundamentais, sem o que não há respeito à dignidade da pessoa humana
e, por consequência, também não há democracia – nem representativa, nem participativa.10
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Trecho extraído da palestra proferida no Fórum
Social Mundial de 2002
pela professora durante o
painel Quais são os fundamentos da democracia
e de um novo poder? , dia
26 de janeiro de 2002, e
publicado no sítio DHnet
‒ direitos humanos na
Internet. Disponível em:
<http://www.dhnet.org.
br/w3/fsmrn/fsm2002/
paineis/benevides.html>.
Acesso em 17 de junho
de 2011.
9
Democracia participativa pressupõe mecanismos de atuação direta do
povo na tomada de decisões políticas fundamentais do Estado. Tem-se
como exemplos desses
mecanismos o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. A esse
respeito, consultar: DIAS,
Luis Claudio Portinho. A
democracia participativa
brasileira. JusNavigandi,
Teresina, ano 3, n. 27,
23 dez. 1998. Disponível
em:<http://jus.uol.com.
br/revista/texto/61>.
Acesso em 25 de junho
de 2011.
10
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E EXTREMA POBREZA...
Esta definição de democracia rompe com aquela visão tradicional que res-
Nestas breves e sucintas linhas, buscou-se refletir acerca da dignidade humana e da extrema pobreza com a finalidade de fornecer
elementos para um debate acerca da democracia brasileira.
Verificou-se que a positivação da dignidade da pessoa humana não é capaz, por si só, de promover o seu respeito e a sua
devida proteção. Como forma de reafirmar isso, notou-se que
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.95-107 • janeiro/julho • 2012
105
a extrema pobreza é propiciada pelo tipo de sociedade que se
vive na contemporaneidade. Uma sociedade de matizes excludentes, desigual; que concentra riqueza, renda; que não
permite a partilha e a distribuição da riqueza produzida.
Ao voltar o olhar para a história, o capitalismo revelou-se
como o modo de acumulação originária das riquezas brasileiras – e latino-americanas – e como o principal fator da extrema
pobreza e, assim, da sociedade que exclui. Esse processo de
desenvolvimento de uns, alicerçado no subdesenvolvimento
de todos – ao invés de desenvolvimento de todos – reflete um
processo de desumanização.
Realçando a relação entre dignidade da pessoa humana, extrema pobreza e democracia, cabe tecer aqui um trecho do
artigo da ministra Carmem Lúcia Antunes Rocha:
ALESSANDRA KELLY FONSECA DANTAS
No Brasil, esse princípio constitucionalmente expresso [a dignidade da pessoa
humana] convive com subhomens empilhados sob viadutos, crianças feito
pardais de praça, sem pouso nem ninho certos, velhos purgados da convivência das famílias, desempregados amargurados pelo seu desperdício humano,
deficientes atropelados em seu olhar sob as calçadas muradas sobre a sua
capacidade, presos animalados em gaiolas sem porta, novos metecos errantes de direitos e de Justiça, excluídos de todas as espécies, produzidos por
um modelo de sociedade que se faz mais e mais impermeável à convivência
solidária dos homens (ROCHA, 2011, on-line).
Urge, pois, uma libertação, um novo modelo, uma nova sociedade, menos excludente, mais inclusiva; que distribua as
riquezas da nação; que promova a justiça em seu caráter substantivo; que respeite, promova e proteja a dignidade da pessoa humana. É preciso o empenho de todos na concretização
disso que se poderá chamar de democracia plena, pois como
bem diz o educador Paulo Freire (1987, p. 29): “Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão” – (grifo nosso).
106
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
REFERÊNCIAS
BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional
da democracia participativa: por um Direito Constitucional de luta e resistência, por
uma Nova Hermenêutica Constitucional,
por uma repolitização da legitimidade. São
Paulo: Malheiros, 2001.
BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 9º ed.
São Paulo: Malheiros, 2000.
DIAS. Luis Claudio Portinho. A democracia
participativa brasileira. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 27, 23 dez. 1998. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto
/61>. Acesso em: 25 de junho de 2011.
ONU – Organização das Nações Unidas.
Declaração Universal dos Direitos Humanos,
1948. Disponível em: <http://unicrio.org.
br/img/DeclU_D_HumanosVersoInternet.
pdf>. Acesso em 27 de junho de 2011.
ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. O princípio
da dignidade da pessoa humana e a exclusão social. Disponível em: <http:// www.
egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/ 32229-38415-1-PB.pdf>. Acesso em
19 de junho de 2011.
SARLET, Ingo. Dignidade da pessoa humana
e direitos fundamentais na Constituição de
1988. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E EXTREMA POBREZA...
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17ª
ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
MINISTÉRIO DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME. O perfil da extrema pobreza no Brasil com base nos dados
preliminares do universo do Censo 2010.
Disponível em: <http://www.brasilsemmiseria.gov.br/wp-content/themes/bsm2nd/
perfil_extrema_pobreza.pdf>. Acesso em
20 de junho de 2011.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.95-107 • janeiro/julho • 2012
107
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da
América Latina. Porto Alegre: L&PM, 2010.
JÚNIA, Raquel. Um país de ricos e miseráveis. Disponível em: <http://www.
adital.com.br/site/noticia_imp.asp?
lang=PT&img=S&cod=57330>. Acesso
em: 24 de junho de 2011.
108
DIREITO, CIDADANIA E SOCIEDADE
ARTIGO
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
A IMPORTÂNCIA
DA AFETIVIDADE NO PROCESSO
DE ENSINO E APRENDIZAGEM
COMO MEDIADORA
DA PRÁXIS EDUCATIVA NO
ENSINO SUPERIOR
Felisnaide Martins dos Santos1
Resumo
O presente artigo trata da importância da afetividade no processo
de ensino e aprendizagem como mediadora da práxis educativa no
ensino superior, visto que o professor é um importante mediador
do processo educacional. Enfoca algumas concepções teóricas sobre a afetividade e a prática docente, a afetividade na concepção
de Piaget, Vygotsky e Wallon, teóricos que muito influenciaram na
prática do afeto para o desenvolvimento do ser humano, relação
entre cognição e afeto e a afetividade nas relações professor-aluno
no ensino superior.
Palavras-chave: afetividade, inteligência, ensino, aprendizagem.
Abstract
This present article deals the importance of affectivity in the process of teaching and learning as a mediator of educational praxis in
higher education, since the teacher is an important mediator of the
educational process. In the first moment be approached in search
some theoretical concepts about the affectivity and a teaching practice, where found the importance of affectivity in human relations,
since man is by nature a social being. In the second moment be approached this affectivity in the conception of Piaget, Vygotsky and
Wallon, theoretical, that much influence in the practice of affection
for the development of human beings.
Keywords: affectivity, intelligence, education, learning.
111
A autora
Felisnaide Martins dos Santos
1
Bacharel em Administração com habilitação em Administração Hospitalar,
especialista em Didática Universitária e gerente hospitalar do Hospital Unimed
de Imperatriz – ([email protected]).
A afetividade é um tema que tem sido bastante discutido na
atualidade, dentro e fora das instituições de ensino, pois interfere diretamente no desenvolvimento afetivo emocional, cognitivo, social e em todas as relações do ser humano. Ela vem
sendo explorada em todos os campos da sociedade, através dos
programas de qualidade, de incentivo e de projetos voltados
para os recursos humanos, pois o ser humano necessita de afeto para viver. Foi pensando nisso que se decidiu realizar esta
pesquisa bibliográfica acerca da importância da afetividade no
processo de ensino e aprendizagem como mediadora da práxis
educativa no ensino superior.
Para Piaget (apud LA TAILLE, 1992, p. 14), “o ‘ser social’ de mais
alto nível é justamente aquele que consegue relacionar-se com
seus semelhantes de forma equilibrada”. Nessa perspectiva,
será apresentada a importância da relação professor-aluno, o
quão necessário é manter a inteligência emocional dentro da
sala de aula, respeitando os alunos como seres capazes de perceber, questionar e contribuir de forma significativa no ensino,
ao oposto de tratá-los como seres insignificantes diante de seu
mestre que sabe tudo. A afetividade na relação entre estas duas
figuras contribuirá para que os alunos se sintam valorizados,
acrescenta um incremento à autoestima e pode favorecer o processo de aprendizagem. Piaget (apud LA TAILLE, 1992) afirma que
a inteligência humana somente se desenvolve no indivíduo em
função de interações sociais, que são em geral demasiadamente
negligenciadas.
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM...
1. INTRODUÇÃO
O afeto é considerado a energia que move as ações dos seres
humanos, pois sem a troca, o calor e a afabilidade não há motivação nem interação entre os sujeitos, o que pode dificultar o
desenvolvimento da inteligência.
A afetividade é necessária para a vida e essencial para a construção de relações saudáveis entre os indivíduos. Assim sendo,
acresce a necessidade da realização desta pesquisa teórica que
visa a contribuir para uma reflexão sobre a importância da relação interpessoal professor-aluno no ensino superior.
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113
PARA PIAGET,
2. ALGUMAS CONCEPÇÕES TEÓRICAS SOBRE A AFETIVIDADE
A AFETIVIDADE
E A PRÁTICA DOCENTE
NÃO SE RESTRINGE
APENAS ÀS EMOÇÕES
E AOS SENTIMENTOS,
ENGLOBANDO
TENDÊNCIAS
FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS
E VONTADE
A afetividade, segundo Almeida (1999), constitui um domínio
tão importante quanto a inteligência para o desenvolvimento humano. Ela não é sentimento nem paixão, muito menos
emoção. Ela é um termo mais amplo e engloba estes três últimos, que, apesar de muito parecidos, são distintos entre si.
Na concepção de Wallon (apud ALMEIDA, 1999), a afetividade
exerce um papel imprescindível no processo de desenvolvimento da personalidade, e este, por sua vez, constitui-se sob alternância dos domínios funcionais.
Wallon (apud ALMEIDA, 1999) assinala que o nascimento da afetividade é anterior à inteligência. O ser humano, enquanto ainda recémnascido, antes mesmo de estabelecer algum tipo de relação com as
pessoas, isto é, no sentido de conhecer, observar, descobrir o meio,
permanece voltado para si mesmo como se estivesse se preparando
para interagir no mundo físico. Na concepção de Almeida (1999),
enquanto não aparece a palavra, é o movimento que traduz a vida
psíquica, garantindo a relação da criança com o meio. As descargas
motoras e, um pouco mais tarde, os gestos do lactente são carregados de significativos afetos, que, nesse princípio, nada mais são do
que expressões das necessidades alimentares e do humor. A afetividade manifesta-se primitivamente no comportamento, nos gestos
expressivos da criança. E enquanto as palavras não aparecem, são
nesses movimentos que a afetividade se manifesta.
Segundo Almeida (1999), na teoria walloniana a afetividade é o
ponto de partida para o desenvolvimento do indivíduo e o seu
crescimento parte de uma sociabilização sincrética para uma individualização psicológica.
Na concepção de Wallon:
A importância das relações humanas para o crescimento do homem está
escrita na própria história da humanidade. O meio é uma circunstância necessária para a modelagem do indivíduo. Sem ele a civilização não existiria,
pois foi graças à agregação dos grupos que a humanidade pôde construir
os seus valores, os seus papéis, a própria sociedade (WALLON apud ALMEIDA,
1999, p. 45).
114
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Assim sendo, a partir dessa concepção de Wallon, é interessante
que o ambiente em sala de aula seja propício para que se desenvolva a afetividade na relação professor-aluno, que vínculos afetivos
sejam criados, que exista uma sensação de bem-estar na relação
de ambos para que assim o trabalho do professor seja gratificante
e que o aluno tenha motivação para permanecer na instituição
absorvendo do ensino o que há de melhor, uma aprendizagem
significativa. Sem motivação, a razão de estar na sala de aula pode
deixar de existir e isso poderá resultar em frustração, desânimo,
reprovação, má qualificação profissional e, até mesmo, desistência.
O tema afetividade não é muito associado à teoria de Jean Piaget,
o que não significa dizer que este teórico não tenha dado grande
importância para o estudo da influência da afetividade para o
desenvolvimento psicológico e consequentemente da inteligência
(SOUZA, 2003).
Para Piaget (apud LA TAILLE, 1992), o desenvolvimento da inteligência humana só se efetiva a partir das interações sociais. Analisou-se a seguinte informação a partir da concepção de Piaget:
O homem é um ser essencialmente social, impossível, portanto, de ser pensado fora do contexto da sociedade em que nasce e vive. Em outras palavras,
o homem não social, o homem considerado como uma molécula isolada do
resto de seus semelhantes, o homem visto como independente das influências dos diversos grupos que frequenta, o homem visto como imune aos
legados da história e da tradição, este homem simplesmente não existe (PIAGET
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM...
3. AFETIVIDADE NAS CONCEPÇÕES DE PIAGET, VYGOTSKY E WALLON
apud LA TAILLE, 2003, p. 11).
Nesta perspectiva, observa-se claramente que o homem necessita interagir com os outros e com o meio para que ao menos
exista. Tornam-se impraticáveis as vivências sem comunicação,
sem troca e sem afeto.
Para Piaget, é a partir das relações sociais que a criança vai se
desprendendo da fase do egocentrismo, começa a perceber
a importância das relações com os outros e assim vai desenvolvendo a construção do seu eu e do outro como referência
(SALTINI,1999 apud SILVA; SCHNEIDER, 2007). Assim sendo, a manei-
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.111-122 • janeiro/julho • 2012
115
ra como os pais se relacionam com essa criança, o meio em que
ela convive e exerce suas primeiras relações poderão influenciar
no seu desenvolvimento moral e na formação de si mesma.
É interessante que, do ponto de vista de Piaget (SOUZA, 2003) no
que diz respeito à afetividade, ela não se restringe apenas às emoções e aos sentimentos, mas engloba as tendências e a vontade.
Na concepção de Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003), uma
compreensão completa do pensamento humano só é possível
quando se compreende a sua base afetivo-volitiva. Este teórico
é enfático ao afirmar que
Quem separa desde o começo o pensamento do afeto fecha para sempre a
possibilidade de explicar as causas do pensamento [...]. De igual modo, quem
separa o pensamento do afeto nega de antemão a possibilidade de estudar a
influência inversa do pensamento no plano afetivo, volitivo da vida psíquica,
porque uma análise determinista desta última inclui tanto atribuir ao pensaFELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS
mento um poder mágico capaz de fazer depender o comportamento humano
única e exclusivamente de um sistema interno do indivíduo, como transformar
o pensamento em um apêndice inútil do comportamento, em sua sombra, sua
desnecessária e impotente (VYGOTSKY, 1993, P. 25 APUD REGO; OLIVEIRA, 2003, P.18).
Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003) faz um alerta que reconhecer a íntima relação entre o pensamento e a dimensão afetiva é
uma condição necessária, porém não suficiente, para os estudos
psicológicos. Para ele, é necessário estudar essa relação ao longo
da história do desenvolvimento de uma perspectiva genética.
Para Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003), nos pressupostos da teoria histórico-cultural, o indivíduo é produto do desenvolvimento
de processos físicos e mentais, cognitivos e afetivos, internos e
externos. Em relação ao campo das emoções, Vygotsky (Van der
Veer e Valsiner, 1996, p. 382 apud Oliveira; Rego, 2003) postula
diferenças significativas entre as emoções dos animais e dos seres
humanos, pois, do seu ponto de vista, humanos têm capacidade
de emoções mais sofisticadas do que os animais e os adultos têm
uma vida emocional mais refinada do que as crianças. Conforme
as pessoas aperfeiçoam o controle sobre si mesmas, mudanças
qualitativas ocorrem no campo das emoções.
Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003) esclarece a questão acerca
da razão, pois para ele a razão tem o papel de controle dos im-
116
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Numa interpretação de Oliveira; Rego (2003) acerca da importância da afetividade na teoria de Vygotsky, do mesmo
jeito que o ser humano aprende a agir, a pensar e a falar ele
aprende a sentir. Nesta perspectiva, o aprendizado sobre as
emoções e afetos é longo, inicia-se nas primeiras horas de vida
de uma criança e se prolonga por toda a sua existência.
Diante de todos os pressupostos teóricos acerca da importância
da afetividade, percebe-se que ela é essencial não só na relação
professor-aluno, mas também como uma estratégia nas instituições de ensino superior em suas práticas pedagógicas. Um
professor afetivo faz toda a diferença na sala de aula em todas
as modalidades de ensino, pois através da afetividade o aluno
poderá ser motivado a construir o seu conhecimento.
O aluno precisa ser visto pelo professor como um ser interativo
e ativo no seu processo de crescimento e desenvolvimento, enquanto o professor é o seu mediador, facilitador. Para que haja
um excelente aprendizado, é necessário que o aluno não seja
forçado a fazer nada, mas que aja por si só, por seus próprios
esforços, pois na relação precisa existir respeito mútuo.
A afetividade, na concepção de Henri Wallon (1879-1962), parte do pressuposto de que é preciso estudar a formação do ser
humano a partir das emoções, buscando compreendê-lo do
ponto de vista do ato motor, da afetividade e da inteligência,
assim como do ponto de vista das relações com o meio. Ele concentra suas investigações nos primeiros anos de vida, período
em que, segundo ele, é possível compreender a formação das
funções psíquicas, que na fase adulta se tornam mais difíceis de
compreender, uma vez que tais funções já aparecem integradas
a funções do desenvolvimento tardio (GALVÃO, 2003).
AFETIVIDADE
É ESSENCIAL
NA RELAÇÃO
PROFESSOR-ALUNO
E UMA ESTRATÉGIA
PARA AS PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS DO
ENSINO SUPERIOR
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM...
pulsos do ser humano cultural adulto, relacionado à autorregulação do comportamento. Acrescenta ainda, enfocando
que esse papel não deve ser confundido com a ideia de razão
repressora, capaz de anular ou extinguir os afetos. Ao oposto, com o desenvolvimento a razão está a serviço da vida
afetiva, na medida em que é um instrumento de elaboração
e refinamento dos sentimentos.
Em sua teoria original, Wallon (apud DANTAS, 1992) atribui grande importância à emoção, pois ela é vista como instrumento de
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sobrevivência para o ser humano. Se não fosse a capacidade que
o ser humano tem, desde o seu nascimento, de mobilizar o ambiente através de suas emoções, possivelmente todos pereceriam.
O choro sobre a mãe atua como um chamado de socorro que imediatamente é atendido, assim como os gestos, que, mesmo sem
a fala, expressam o que a criança está sentindo. É neste sentido
que Wallon considera a afetividade fundamentalmente social, pois:
“Ela fornece o primeiro e mais forte vínculo entre os indivíduos
e supre a insuficiência da articulação cognitiva nos primórdios da
história do ser e da espécie” (WALLON apud DANTAS, 1992, p. 85).
FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS
O contágio das emoções entre os seres humanos é inevitável, por
isso Wallon (2007) afirma que é impossível as influências afetivas
que rodeiam uma criança durante toda a sua infância não terem
sobre a sua evolução uma ação determinante. Na teoria walloniana, compete também à emoção unir os indivíduos entre si.
4. RELAÇÃO ENTRE COGNIÇÃO E AFETO
Para o desenvolvimento e crescimento do ser humano, a interação
entre afetividade e inteligência exerce um importante papel, pois
ambas se desenvolvem gradativamente no indivíduo e existe uma
integração que as permite estar juntas mesmo quando o momento é propício apenas para uma. À medida que o indivíduo vai se
desenvolvendo, a afetividade vai cedendo lugar à inteligência, pois
ele sente a necessidade de conhecer o mundo em sua forma real.
Segundo Oliveira (2001), costuma-se distinguir entre as funções
cognitivas e as afetivas e/ou emotivas, sendo estas últimas frequentemente identificadas com a motivação e também com os aspectos conativos ou volitivos do sujeito. As funções cognitivas e ou
intelectuais abrangem aspectos muito diversos, como a percepção,
a aprendizagem, o conhecimento, o pensamento, o conceito, o
juízo, o raciocínio, a solução de um problema etc, enfim, tudo o
que se relaciona com a aquisição e processamento de informação.
Nesta perspectiva, a afetividade é a motivação que impulsiona o
indivíduo a seguir em frente, ela constitui o fator energético do
comportamento humano e não pode ser separada das funções
cognitivas.
118
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Para Dantas, a afetividade não é apenas uma das dimensões da
pessoa, ela é também uma fase do desenvolvimento.
O ser humano foi, logo que saiu da vida puramente orgânica, um ser afetivo.
Da afetividade diferenciou-se, lentamente, a vida racional. Portanto, no início
da vida, afetividade e inteligência estão sincreticamente misturadas, com o
predomínio da primeira (DANTAS, 1992, p. 90).
Nesta perspectiva, é a partir daí que a personalidade do ser humano é formada segundo as relações variáveis entre as duas
funções, ora predominando a afetiva ora a cognitiva. Elas oscilam, mas não se separam.
Segundo Almeida (1999, p. 50), “a evolução da inteligência é
incorporada pela afetividade de tal modo que uma determinada
relação afetiva evolui para uma outra”.
Na obra walloniana (ALMEIDA, 1999), a afetividade e a inteligência
constituem um par inseparável na evolução psíquica, pois ambas
possuem funções bem definidas, e quando integradas permitem
ao indivíduo atingir níveis de evolução cada vez mais elevados.
Diante dos pressupostos teóricos acerca da relação entre cognição e afeto, observa-se que é impossível separá-los. Piaget (apud
OLIVEIRA, 2001) exemplifica de uma maneira muito interessante a
interação destas funções, comparando-as a uma máquina e o seu
combustível. Ele diz que a afetividade e motivação são o combustível, enquanto a cognição é a estrutura da máquina ou motor
pensante. Realmente, é um exemplo significativo, porque nenhum
motor funciona sozinho e muito menos sem combustível, desse
ponto de vista o sujeito da questão seria o condutor da máquina.
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM...
O ser humano vai crescendo e a diferenciação entre a afetividade e a inteligência vai surgindo, mas elas andam paralelas. Vez
por outra, elas alternam, uma dando lugar à outra, e a afetividade
muitas vezes reflui para dar lugar à inteligência, para que o ser em
processo de crescimento encare a realidade da vida (DANTAS, 1992).
É difícil aceitar a realidade de que muitos educadores ainda façam uso de uma teoria que separa a cognição e o afeto. É de
suma importância que o professor assuma realmente o papel de
um educador, facilitador, que observa com olhar atento o seu
aluno, não só no aspecto cognitivo, mas também no emocional.
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119
5. A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES PROFESSOR-ALUNO NO ENSINO
SUPERIOR E O PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
Apesar de a afetividade ser um tema bastante discutido na
atualidade, em muitas instituições de ensino ainda existem
educadores que insistem em separar o afetivo do cognitivo. Na
teoria walloniana, a afetividade é o ponto de partida para o
desenvolvimento do indivíduo. Ela é um domínio funcional cujo
desenvolvimento depende de dois fatores: o orgânico e o social.
Entre esses dois fatores existe uma relação muito próxima: às vezes
um se destaca mais que o outro, mas jamais se separam.
FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS
A evolução do ser humano parte da sociabilidade sincrética para
uma individualização psicológica. Nesse período, as relações familiares e com o meio em que este indivíduo convive exercem um
importante papel para a sua formação (ALMEIDA, 1999).
Segundo Wallon,
A importância das relações humanas para o crescimento do homem está
escrita em sua própria história. O meio é uma circunstância necessária para
a modelagem do indivíduo. Sem ele a civilização não existiria, pois foi graças
à agregação dos grupos que a humanidade pôde construir os seus valores,
os seus papéis, a própria sociedade (WALLON, 1959 APUD ALMEIDA, 1999, p. 45).
O ser humano, por ser geneticamente social, necessita do outro para se delimitar como pessoa. Para Wallon (apud ALMEIDA
1999), o meio social é cultural e interpessoal, indispensável para
a formação do eu.
Para Almeida (1999), a postura a ser assumida pelo professor em
sala de aula deve ser a de um observador, um intérprete perspicaz
capaz de identificar os entraves que se estabelecem entre o par
professor-aluno, para melhor saber lidar com a teia das relações
que se criam na apropriação do conhecimento.
Em diversas áreas, quer seja no âmbito empresarial, educacional,
cristão, grupos de apoios e entre outras, para que as pessoas se
reúnam é preciso se sentirem motivadas, pois a troca de afetos,
o amar e ser amado, sentir-se respeitado, valorizado, faz toda a
120
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
diferença no processo das relações. Como bem comparou Piaget
(apud OLIVEIRA, 2001), o afeto representa o combustível e a inteligência representa o motor, nenhum dos dois funciona sozinho.
Nesta concepção, o sujeito (aluno) é o condutor do motor, e este
precisa de combustível (motivação) para que o motor (inteligência)
funcione e haja uma boa aprendizagem.
O processo ensino-aprendizagem, do ponto de vista de Relvas
(2007), está associado à construção de pontes entre a objetividade
e a subjetividade, entre o ser que aprende e o ser que ensina.
A função da educação pode ser alienante ou libertadora, dependendo de
como for usada, quer dizer, a educação como tal não é culpada de uma coisa
ou de outra, mas a forma como se instrumente esta educação pode ter um
efeito alienante ou libertador (PAÍN apud FERNANDÉZ, 1991, p. 82).
No ensino superior, a afetividade deve ser empregada de uma forma mais abrangente, referindo-se às relações interpessoais e ao
comportamento próprio do ser humano. Ao professor cabe ser empático com os alunos para que vínculos afetivos sejam formados
tendo como base as boas relações humanas. Para que haja uma
boa interação dos sujeitos (professor-aluno) e para que haja um
desenvolvimento maior na aprendizagem, é necessário mais que
a preocupação na aplicação do conteúdo por parte do professor.
O aprendizado tem que ser prazeroso, tanto para quem ensina
como para quem recebe. Ele não pode ser imposto. Podemos
citar como exemplo uma pessoa que é apaixonada pelo que faz,
ela desempenha suas tarefas com prazer, de maneira descomedida, para ela o que importa é a satisfação de fazer o seu trabalho.
De igual modo deve ser o professor em sala de aula.
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM...
Paín (apud FERNANDÉZ, 1991) alerta:
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O indivíduo, por ser geneticamente social, precisa de afeto para
a sua sobrevivência. No processo de aprendizagem não poderia
ser diferente, pois ser admirado, valorizado, ter alguém para
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alimentar o ego tornam-se fatores imprescindíveis para que os
resultados positivos em sala de aula sejam alcançados.
É muito comum encontrar professores que ignoram a articulação
afeto-cognitivo e instituições que, como transmissoras de conhecimentos, muitas vezes não têm clareza de que, além da missão de
transmitir conhecimentos, lidam com outros aspectos do desenvolvimento humano ligados diretamente ao aspecto cognitivo.
A afetividade e a inteligência estão intimamente ligadas e não podem de maneira nenhuma ser tratadas de forma separada. À medida que a inteligência vai aumentando, a afetividade vai se racionalizando e, assim, o ser humano vai se desenvolvendo.
FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS
Um professor no ensino superior, para fazer a diferença no processo
de aprendizagem e formação do sujeito para a sociedade, necessita
entender o que é a afetividade, para que serve, como funciona e
entender o propósito das relações afetivas em sala de aula.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Ana Rita Silva. A emoção na sala
de aula. Campinas: Papirus, 1999 (Coleção
Papirus Educação).
ARANTES, Valéria Amorim (org.). Afetividade na escola: alternativas teóricas e práticas.
São Paulo: Summus, 2003 (Coleção na escola: alternativas teóricas e práticas).
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Wallon. São Paulo: Summus, 1992.
FERNÁNDEZ, Alicia. A inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artmed, 1991.
GALVÃO, Izabel. Expressividade e emoções
segundo a perspectiva de Wallon. São Paulo: Summus, 2003. (Coleção na escola: alternativas teóricas e práticas)
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a
teoria revolucionária que define o que é ser
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LA TAILLE, Yves de; OLIVEIRA, Marta Kohl;
DANTAS, Heloysa. Piaget, Vygotsky, Wallon:
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cognição e afeto. Paulo: Summus, 2003.
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práticas)
RELVAS, Marta Pires. Fundamentos biológicos da Educação: despertando inteligências
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2ª ed. Rio de Janeiro: Wak Ed., 2007.
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VIGOTSKY, Lev Semenovich. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 7ª ed. São
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WALLON, Henri. A evolução psicológica da
criança. São Paulo: Martins Fontes, 2007
(Coleção psicologia e pedagogia).
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
ARTIGO
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
O LIVRO DE IMAGEM
NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
UM RECURSO FAVORÁVEL
PARA DESPERTAR O DESEJO PARA A LEITURA
Glaucia Feitosa Cunha1
Jonas Alves da Silva Junior2
Resumo
O presente artigo pretende salientar a importância do livro de imagem na educação infantil por meio de um estudo qualitativo, no
qual se procurou investigar quais as relações que a criança estabelece entre a literatura clássica e o livro de imagem, cujo texto é única
ou predominantemente visual. Para tanto, realizou-se uma análise
crítica acerca da literatura clássica, livro de imagem e das concepções de leitura fundamentadas à luz de vários autores importantes
nesse panorama literário infantil.
Palavras-chave: livro de imagem, leitura, educação infantil.
Abstract
The present article intended to point out the importance of the of
image in the book of early childhood education through a qualitative study in which we sought to investigate the relations which the
child establishes between classic literature and picture book whose
text is only or predominantly visual. To this end we carried out a
critical analysis of classic literature, picture books and reading concepts grounded in the light of several important authors in literary
landscape in children.
Keywords: the book image, reading, children s education.
123
os autores
Glaucia Feitosa Cunha
1
Pedagoga formada pela Universidade Federal do Maranhão e estudante de
Letras da Universidade Estadual do Maranhão. É professora de Educação
Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental da Rede Pública de Ensino
– ([email protected]).
Jonas Alves da Silva Junior
2
Formado em Letras e Pedagogia, é doutor em Educação pela Universidade São
Paulo (USP) e docente do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Maranhão
– ([email protected]).
1. INTRODUÇÃO
Desde o seu nascimento, a criança se encontra inserida em um
mundo letrado. As experiências que vai adquirindo e os estímulos visuais que encontra ao seu redor a impulsionam a adquirir
conhecimentos, estabelecendo relações com aquilo que ouve,
com o que deseja falar e sobretudo com o que vê.
Por meio deste artigo, pretende-se enfatizar a importância de
se trabalhar a leitura dos livros de imagem na educação infantil,
pois esta é uma atividade significativa que motivará os alunos
de forma prazerosa a uma leitura que começa antes do texto
escrito e vai além da última página do livro.
Para isso, em busca de realizar este trabalho, que tem como objetivo geral perceber até que ponto a leitura do livro de imagem
favorece o desenvolvimento da criança em relação à leitura,
buscou-se compreender a analogia que as crianças fazem entre
os textos “Patinho Feio”, de Hans Christian Andersen e “Pê: o
pato diferente”, de Regina Coeli Rennó, bem como analisar com
qual dos textos as crianças mais se identificaram e perceber que
aspectos do aprendizado dessas crianças são mais significativos.
O LIVRO DE IMAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL...
Os livros de imagem podem desempenhar um papel muito importante num processo que vai do desejo ao prazer, tendo em
vista não só uma familiaridade com o universo infantil como
também por apresentar narrativas elaboradas com introdução,
desenvolvimento e desfecho. Nesse sentido, o livro de imagem
é visto como pretexto para construir histórias (BOM-FIM, 2009).
A escolha da temática partiu das inquietações ao se trabalhar
com uma turma de segundo período numa escola pública do
munícipio de Imperatriz, onde, ao elaborar leitura em pequenos
grupos com as crianças, percebemos que elas se coadunavam
com essa prática. Desta forma, posteriormente foram oferecidos
à turma livros da literatura infantil, tais como o clássico “Patinho
feio” e, em seguida, o livro de imagem “Pê: o pato diferente”.
Nesse contexto, a opção metodológica foi pela realização de uma
pesquisa qualitativa, pois se estava interessado em desenvolver
um estudo sobre a leitura que um determinado grupo de alu-
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.123-135 • janeiro/julho • 2012
125
UM AMBIENTE
SOCIAL INSTIGANTE
E SIGNIFICATIVO
BENEFICIA A
nos da educação infantil faria do clássico “Patinho Feio” e
posteriormente do livro de imagem “Pê: o pato diferente”,
utilizando como técnica de coleta de dados a entrevista semiestruturada, apreendendo desta forma o verbalizar desses leitores mirins e incursionando-os na fruição à leitura.
APRENDIZAGEM E O
DESENVOLVIMENTO
GLAUCIA FEITOSA CUNHA,JONAS ALVES DA SILVA JUNIOR
DAS CRIANÇAS
2. LEITURA NA INFÂNCIA
Nos primeiros contatos com o mundo, percebemos o calor
e o aconchego de um berço, que é diferente da sensação
dos braços carinhosos que nos enlaçam, assim como uma canção
de ninar que embala o sono, o toque nas mãos, o cheiro do peito
e a pulsação de quem nos amamenta nos provocam sensação.
Começamos, assim, a compreender o sentido de tudo que nos
cerca. Esses também são os primeiros passos para aprender a ler.
Acreditar que mesmo crianças ainda bem pequenas têm o que dizer deriva
de algumas ideias que vêm sendo construídas nas últimas décadas. Entre
elas, tem destaque o reconhecimento de que, desde a mais tenra infância,
nas suas interações sociais, as crianças vão somando impressões, gostos, antipatias, desejos, medos etc, desenvolvendo sentimentos e percepções cada
vez mais diversificados e definidos, atribuindo significados, construindo a sua
identidade (VIEIRA, 2008, p.18).
Na infância, as crianças possuem uma natureza singular que as
caracteriza como seres que sentem e pensam o mundo de um
jeito muito próprio. Nas interações que estabelecem desde cedo
com as pessoas que lhes são próximas e com o meio que as circunda, elas revelam o seu esforço para compreender o mundo
em que vivem por meio dos seus anseios e desejos.
O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998,
p.21) deixa claro que a criança, como todo ser humano, é um
sujeito histórico e faz parte de uma organização familiar que
está inserida em uma sociedade, com uma determinada cultura, em um determinado momento histórico. É profundamente
marcada pelo meio social em que se desenvolve, mas também o
marca. A criança tem na família, biológica ou não, um ponto de
referência fundamental, apesar da multiplicidade de interações
sociais que estabelece com outras instituições sociais.
126
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
A infância é o tempo de maior disponibilidade a influências. É a
etapa em que as crianças gostam de “imitar” atos de leitura, em
que a família e os educadores são excelentes modelos de leitores
competentes. Assim, as instituições de educação infantil devem
tornar acessíveis a todas as crianças elementos que enriqueçam o
seu desenvolvimento e inserção social, ao propiciar o desenvolvimento da identidade das crianças por meio de atividades diversificadas de leituras realizadas em situações de interação.
Com base nisto, a criança deve ser considerada sujeito ativo na
sociedade, que possui uma história e que constrói e reconstrói
sua própria história. Para tanto, o ambiente social deve ser instigante e significativo, em benefício da aprendizagem e desenvolvimento da autonomia do ser humano.
Desde a história mais remota conhecida, a imagem marca sua
presença de forma inegável e, através dela, o ser humano se expressa desde muito tempo antes da palavra escrita. Sua cultura se
fortaleceu através da significação que essas imagens estabeleceram durante o percurso nas mais diversas épocas. E, atualmente,
o mundo nos cerca de imagens durante todo o tempo, mensagens visuais que estão sendo estudadas e investigadas por diversas disciplinas de pesquisa, conforme Francastel (1982, p. 35):
Os homens comunicam-se entre si pelo olhar. O conhecimento das imagens,
O LIVRO DE IMAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL...
2.1 Algumas reflexões acerca da leitura do livro de imagem
de sua origem, suas leis, é uma das chaves do nosso tempo. Para compreendermos a nós mesmos e para nos expressarmos é necessário que conheçamos
a fundo o mecanismo dos signos aos quais recorremos.
Sabe-se hoje que a criança, quando chega à escola, já é uma
entusiasta e experiente leitora do mundo. Ela começa desde
cedo a observar, atribuir significados aos seres e situações do
mundo à sua volta. Para compreender e interpretar o mundo,
essa busca de significados empreendida pela criança deve ser
entendida pelo professor como instrumento que, incorporado
ao cotidiano pedagógico, pode gerar o desenvolvimento da
criança. A leitura do livro de imagem é entendida como um
processo contínuo e permanente, que começa no momento em
a criança é capaz de perceber sinais e atribuir-lhes significados,
e vai acompanhá-la por toda a vida.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.123-135 • janeiro/julho • 2012
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Este raciocínio se complementa com as palavras de Benjamim
(1984, p.55), quando afiança que “frente ao livro ilustrado a
criança (...) vence a parede ilusória da superfície e, esgueirandose entre tapetes e bastidores coloridos, penetra em um palco
onde o conto de fadas vive”. Assim, compreende-se que, por
meio da leitura do livro de imagem, a criança transcende através
dos seus devaneios, adentrando na mais significativa experiência que inicia bem antes da leitura do texto escrito.
GLAUCIA FEITOSA CUNHA,JONAS ALVES DA SILVA JUNIOR
Considera-se o livro de imagem um texto significativo que permite ao leitor incursionar por sua bagagem de vida pessoal,
histórica e cultural, possibilitando novas experiências e reelaborações nas quais a exploração do fantástico, do lúdico, da
fantasia, que são metas de interação participativa do/a aluno/a
com a obra, possa levá-lo/a a “experimentar o sabor literário”.
Nesse sentido, os livros de imagem são aqueles em que a história é contada por meio de imagem. Eles são um instrumento
de educação ativa, capaz de tocar diretamente a imaginação e
a inteligência da criança. A imagem, por si só, é portadora de
uma mensagem decifrável pela criança. Cada imagem representa uma unidade de ação e de leitura, o que permite ao leitor a
compreensão e a utilização de um vocábulo adaptado às situações propostas. É relevante ressaltar que as gravuras favorecem,
sobretudo, às crianças pequenas, permitindo que elas observem
os detalhes que contribuem para a organização de seu pensamento. Isso lhes facilitará, mais tarde, a identificação da ideia
central, os fatos principais e os fatos secundários.
Assim, os livros de imagem nos trazem importantes contribuições para compreender e refletir a perspectiva da leitura da
imagem como peça fundamental para despertar o ato de ler,
encontrando ricas oportunidades de interagir e recriar de forma particular, através da sensibilidade, para discorrer sobre esse
universo imagético e enriquecedor.
A retomada da infância distante, buscando a compreensão do meu ato de
“ler” o mundo particular em que me movia – e até onde não sou traído pela
memória – me é absolutamente significativa. Neste esforço a que me vou
entregando, re-crio, e re-vivo, no texto que escrevo a experiência vivida no
momento em que ainda não lia a palavra. Vejo-me então na casa mediana
em que nasci, no Recife, rodeada de árvores, algumas delas como se fossem
128
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
gente, tal a intimidade entre nós – a sua sombra brincava e em seus ga-
LIVROS DE
lhos mais dóceis a minha altura eu me experimentava em riscos menores
IMAGEM SÃO UM
que me preparavam para riscos e aventuras maiores (FREIRE, 2006, p. 12).
Freire, ao relembrar o seu passado, deixa claro que, mesmo a
criança não tendo a apropriação do código escrito, ela consegue expressar-se categoricamente através das suas experiências
de vida e da leitura que faz do mundo. Sob esse prisma, o livro
de imagem é um recurso que favorece que a criança desperte
o desejo da leitura, uma vez que, enquanto pequeno/a leitor/a,
é capaz de discorrer belissimamente sobre as sequências ilustradas a seu modo de ver e interpretar a realidade a sua volta.
INSTRUMENTO DE
EDUCAÇÃO ATIVA,
CAPAZ DE TOCAR
A IMAGINAÇÃO E A
INTELIGÊNCIA DA
CRIANÇA
Corroborando essa reflexão, consideram-se iluminadores os argumentos de Weisz (2003, p. 106):
diversidade cultural, social e também individual. Considera-se que as formas
de aprender diferem, que os tempos de aprendizagem também, e que não
tem sentido sonhar com todos os alunos caminhando igualmente em seu
processo de construção de conhecimento.
Para esta autora, é importante o educador não dar respostas
prontas, mas fazer o aluno pensar, valorizando cada criança
como um ser único de infinitas possibilidades de aprender e expressar-se por meio de sua sensibilidade. Nessa perspectiva, deve
haver uma valorização do indivíduo como ser ativo, singular e social. Portanto, é imprescindível que reconheçamos a importância
desse recurso na inserção do leitor iniciante nesse universo que
ultrapassa a palavra escrita e que não tem fim, uma vez que cada
releitura incita uma série de novas descobertas por parte do leitor.
2. REFLEXÕES
O LIVRO DE IMAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL...
A escola que propomos e buscamos é uma escola aberta à diversidade - a
SOBRE A LEITURA DAS CRIANÇAS ACERCA DO
LIVRO DE IMAGEM
Contar e ouvir histórias permite a entrada da criança em um
mundo encantador, cheio surpresas que divertem e ao mesmo
tempo ensinam. Desta forma, é na relação lúdica e prazerosa da
criança com a obra literária que se tem uma das possibilidades
de se formar o leitor-mirim, bem como a exploração da fantasia
e da imaginação, estimulando a criatividade e o fortalecimento
da interação do leitor com as narrativas visuais.
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Partindo desse assentimento e de uma reflexão crítica acerca
desse universo literário que possibilita que a criança se expresse
através de suas experiências e valores, tal afirmação se apoia
em um despertar por uma leitura que antecede a leitura da palavra escrita. Desta forma, a criança lerá através dos elementos
simbólicos, tendo a oportunidade de desenvolver todo o seu
potencial criativo e ampliar os seus horizontes desde a infância.
Ler uma narrativa literária é um fenômeno de outra espécie. Muito mais sutil
e delicioso. Vai muito além de juntar, formar sílabas, compor palavras e frases,
decifrar seu significado de acordo com o dicionário. É um transporte para outro
universo, onde o leitor se transforma em parte integrante da vida de um outro,
GLAUCIA FEITOSA CUNHA,JONAS ALVES DA SILVA JUNIOR
e passa a ser alguém que ele não é no mundo cotidiano (SMOLKA, 2009, p. 77).
A partir do exposto acima, considera-se oportuno enfatizar que
uma história traz consigo inúmeras possibilidades de aprendizagem. Assim, parte-se para a primeira etapa da pesquisa, em
que se trabalhou a narrativa oral do clássico da literatura infantil
“Patinho feio”, de Hans Christian Andersen.
Foram entrevistadas 15 crianças. Elas responderam às questões
tendo o auxílio da pesquisadora acadêmica, visto que as crianças
ainda não leem o código escrito. Os dados foram organizados sob
a forma de descrição dos aspectos fundamentais para uma análise,
expondo com fidelidade as falas das crianças e a norma coloquial
por elas empregada no desenvolvimento da coleta de dados.
Algumas das questões que emergiram nessa primeira etapa da
pesquisa foram as seguintes:
Iniciamos perguntando às crianças: “Quem era o patinho feio?”
LC: “Aquele que todo mundo brigou com ele, coitadinho”... “Vou convidar
ele pra morar lá em casa”.
MC: “Era aquele que cresceu... Cresceu e ficou bonito”.
CA: “O que ficou bonito titia”.
Pesquisadores: “Como ele foi tratado pelos animais?”
MA: “O gato pegou ele... Aí... Ele correu, correu!”.
LU: “O gato beliscou ele”. “Sabia que ele tava era com ciúmes do patinho”.
DA: “Os animais bateu!”.
130
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Pesquisadores: “O que você entendeu do final dessa história?”
LC: “Que ele foi muito feliz! Tinha um montão de patos brancos”.
LU: “Ele viveu feliz com os amigos dele”.
DA: “Porque os patos era muito bonitos e ele foi enfeitiçado e ficou bonito”.
Desta forma, as crianças demonstraram com criticidade que, apesar de o patinho ser incompreendido pelos animais da floresta em
relação a sua aparência física, este tem grande valor pela essência
do ser, atraindo assim os pequenos leitores com base em uma situação simbólica que traz grandes lições de vida na sociedade, já que
no seio social ainda existe uma forte reação do meio ao diferente.
Outro aspecto significativo na aprendizagem do pequeno leitor foi
o toque imaginativo dado à narrativa que já perpassa séculos na
sociedade e a criança a cada leitura tem a capacidade de dar novos
sentidos ao enredo da obra.
Nesse caminho, parte-se para o segundo momento da coleta de
dados, quando propusemos investigar os discursos produzidos
pelas crianças com base nas narrativas visuais. Para isso, foi trabalhado o livro de imagem “Pê: o pato diferente” através de uma
segunda entrevista semiestruturada realizada com os/as alunos/as.
O LIVRO DE IMAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL...
Sabe-se que os clássicos são tesouros para quem os lê e são mais
valiosos ainda para quem consegue apreciá-los com prazer e profundidade. Interessante para nossa análise foi constatar que a obra
literária exerceu grande influência nas crianças, provocando um
brilho no olhar, um sorriso iluminado no rosto e o sentimento de
desafeto pelos indivíduos que maltratavam o patinho denominado
de feio na história.
Nesse momento inicial, procuramos nos abster excessivamente de
explanar ou dar qualquer tipo de instrução sobre como proceder
na leitura do livro de imagem. Além disso, não fizemos nenhuma
observação às crianças sobre o fato de o livro “Pê: o pato diferente” ser concebido exclusivamente por imagens. Nada revelamos
sobre o enredo ou temas referentes ao livro. Assim, foi dada uma
autonomia à criança para manusear e discorrer sobre a temática
do livro de imagem.
Alguns resultados que emergiram nessa segunda etapa da pesquisa foram os seguintes:
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.123-135 • janeiro/julho • 2012
131
A LITERATURA DEVE
Pesquisadores: “Quem é Pê, o pato diferente nessa história?”
SER APRESENTADA
LC: “Esse patinho que tá ouvindo música.”
À CRIANÇAS ANTES
VI: “É o patinho amarelinho.”
MESMO QUE ELAS
CA: “Esse pato legal aqui da figura.”
APRENDAM A LER
Nessa pergunta inicial, a criança já consegue se apropriar,
com base no livro de imagem, de quem é o personagem
principal da história. Constatou-se que a leitura é um processo ininterrupto e permanente, que começa no momento em que a criança é capaz de perceber sinais e atribuirlhes significados que irão acompanhá-la por toda a vida.
FORMALMENTE
Pesquisadores: “Por que ele é considerado diferente nessa história?”
MA: “Porque ele queria cantar e tocar e ser feliz”
LU: “Porque ele queria tocar na banda e os seus irmãozinhos não queria toGLAUCIA FEITOSA CUNHA,JONAS ALVES DA SILVA JUNIOR
car... Só ficava fazendo mesa com o papai.”
DA: “Ele quer tocar música... Vou levar ele pra minha igreja.”
Nas falas coletadas, observou-se que as crianças conseguiam
acompanhar o enredo da história unicamente pelas ilustrações. É
interessante ressaltar a fala da criança (DA): “Ele quer tocar música... Vou levar ele pra minha igreja”. Esta sentiu a necessidade de
acolher o personagem principal da história, levando-o, por meio
do imaginário infantil, para determinadas ações do seu dia a dia.
Pesquisadores: “Qual era o sonho de Pê?”
MC: “Era cantar e fazer banda.”
CA: “Tocar o violão dele. Sem o pai dele atrapalhar né. Tia eu vou mandar
prender o pai dele... para ele não atrapalhar o Pê."
DA: “Tocar violão na igreja. Junto com meu primo.”
Nesse prisma, as crianças enumeraram o real sonho do patinho Pê,
desvelando múltiplos olhares apreciados durante a leitura do livro
de imagem. É interessante a fala de (CA): “Tocar o violão dele. Sem
o pai dele atrapalhar né. Tia eu vou mandar prender o pai dele...
para ele não atrapalhar o Pê.”, reportando-se às autoridades que
têm o encargo de proteger a sociedade em geral. Assim, a criança
trouxe para a narrativa esses representantes com a finalidade de
proteger o patinho Pê, de tal modo que pudesse realizar o seu
sonho sem as relutâncias impostas pelo pai no enredo da história.
132
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Pesquisadores: “E o seu sonho, qual é?”
MC: “De tocar bateria e violão igual o Pê.”
CA: “Ser grande e ficar famosa cantando.”
MA: “Meu pai comprar um violão. Mais ele não tem dinheiro pra comprar agora.”
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A literatura infantil foi representada nesta pesquisa em uma
abordagem de interpretação imagética, carregada de significados, que foram apresentados a partir do contexto social,
cultural do leitor-mirim. Deste modo, a leitura do livro de imagem
foi considerada como o ponto de partida para um processo de
desenvolvimento e reflexão pela criança. Apoiando-se nesse
instrumento, os leitores iniciantes puderam concretizar uma
leitura fruindo como embasamento sua própria visão de mundo,
tendo em vista que a criança é um ser social, ativo e pleno de
descobertas, sobretudo nas relações adquiridas com o outro.
O LIVRO DE IMAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL...
Vindas de universos culturais diferentes, as crianças proferem
valores distintos. Assim, os discursos suscitados desvelam experiências do seu cotidiano, bem como seus anseios para o futuro.
Deste modo, destacamos a fala de (MC): “De tocar bateria e
violão igual o Pê”, em que há uma identificação com a escolha
profissional do personagem principal da narrativa visual. Assim,
a partir da leitura do livro de imagem, oportunizou-se ao pequeno leitor fazer uma leitura de mundo muito significativa no
florescer das suas habilidades ao longo do tempo.
Nesse cenário rico em aprendizagens, é salutar o excelente desenvolvimento das crianças em relação à leitura, pois, firmados
numa leitura que antecede a leitura da palavra escrita, viu-se, ao
longo desse itinerário, que cada criança é um ser especial capaz
de abrilhantar o livro de imagem com suas contribuições tão
singelas, transparentes, impregnadas de fantasias e desejos que
foram ao longo do caminho realizados através da leitura que
cada leitor produziu da narrativa visual “Pê: o pato diferente”.
Logo, é crucial mencionar que as leituras diversas produzidas por
cada criança através de um único livro de imagem deixam claro
que este recurso é repleto de novos significados imbuídos a cada
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.123-135 • janeiro/julho • 2012
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nova leitura desempenhada pelas crianças. É fundamental valorizarmos cada leitura em sua plenitude, uma vez que as crianças
conseguiram discorrer sobre a narrativa visual tão sutilmente.
GLAUCIA FEITOSA CUNHA,JONAS ALVES DA SILVA JUNIOR
A sociedade exige profundas mudanças e lança-nos importantes
desafios diariamente. Nesse caminho, a escola e a família também
têm de evoluir para uma educação mais significativa. Para tanto,
é imprescindível que comecem a transmitir o ensino da literatura infantil prazerosamente às crianças, de tal modo que, quando
crescidas, possam enfrentar e transformar a sua realidade. A nosso ver, o grande valor dado à literatura infantil permitirá à criança
acreditar em si mesma e construir, por meio do imaginário, o seu
lugar no mundo.
A literatura infantil é um instrumento que abre portas para a criatividade, pois a criança, desde muito pequena, já tem uma bagagem
rica em aprendizagens que facilita a expressão frente ao clássico
literário e às narrativas visuais. Dessa forma, é possível reconhecer o
grande valor tanto da utilização do clássico literário “Patinho Feio”
quanto do livro de imagem “Pê: o pato diferente”.
Sanches (2009 apud BOM-FIM, 2009, p.6) prestigia a importância
de “cultivar” esse recurso tão admirável que é o livro de imagem:
Entre a colheita de significados pelas imagens e a colheita de significados
pelas letras, o ser humano continua em sua roça cotidiana, fazendo leituras
e joeirando os muitos sentidos que são dados para ou que ele descobre em
sua própria vida.
Nessa trajetória, a leitura do livro de imagem proporcionou aos
seus leitores a oportunidade de partilhar e reconstruir criativamente o imaginário e a sua potencialidade idealizadora. Presentemente, as crianças continuarão em sua “roça cotidiana”, mas com uma
nova semente para ser “colhida”, vivenciada, transformada a cada
nova leitura incitada pelo livro de imagem.
134
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
REFERÊNCIAS
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10ª ed. São Paulo: Ática, 1999.
BENJAMIM, Walter. Reflexões: a criança, o
brinquedo, a educação. São Paulo: Summus,
1984.
BOM-FIM, Tereza. O livro de imagem: um
(pré) texto para contar histórias. 3ª ed. Imperatriz, MA: Alma de Artista, 2009.
________. O livro de imagem: um (pré) texto
para contar histórias. Caderno de atividades.
Imperatriz, MA: Alma de Artista, 2009.
RENNÓ, Regina Coeli. Pê: O pato diferente
São Paulo: FTD, 1993 (Coleção Roda Pião).
SMOLKA, Ana Luiza Bustamante. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização
como processo discursivo. 12ª ed. Campinas,
SP: Cortez, 2009.
VIEIRA, Silvia Helena. A criança fala: a escrita
de crianças em pesquisas. São Paulo: Cortez,
2008.
WEISZ, Telma. O diálogo entre o ensino e a
aprendizagem. 2ª ed. São Paulo: Ática, 2003.
O LIVRO DE IMAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL...
FRANCASTEL, Pierre. A realidade figurativa.
São Paulo: Perspectiva, 1982.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler:
em três artigos que se completam. São Paulo:
Cortez, 2006.
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135
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EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
ARTIGO
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
A FUNÇÃO DA ESCOLA
NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
Vanderlene Brasil Lucena1
Zilmar Timóteo Soares2
Resumo
O presente artigo tem por finalidade auxiliar na formação e na
qualificação dos alunos e professores, com base nos princípios e
na metodologia que envolve a comunidade escolar na defesa do
meio ambiente. Os métodos aplicados basearam-se em revisões
bibliográficas e entrevistas com 30 acadêmicos universitários e 20
professores. Os resultados apresentados constatam ainda que, na
maioria dos casos, a problemática ambiental é tratada na escola
somente por meio de projetos, seminários e feiras, fazendo apenas
alguns enfoques nas aulas regulares. Assim, é necessário adequação
às formas de regulamentação, bem como criar condições que facilitem a difusão da informação científica entre docentes e discentes.
Palavras-chave: defesa, meio ambiente, escola.
Abstract
This article aims to assist in training and qualifications of students
and teachers, on the basis of the principles and methodology that
involves the school community in defense of the environment. Baser
am-methods applied in bibliographical reviews and interviews with
30 university academics and 20 teachers. The results presented still
realize that in most cases the environmental problem is treated in
school only through projects, seminars and fairs, doing just a few
approaches in regular classes. Thus, it is necessary to fit regulatory
forms, as well as create conditions facilitating the dissemination of
scientific information between teachers and students.
Keywords: defense, environment, school.
137
os autores
Vanderlene Brasil Lucena
1
Graduada em Licenciatura em Ciências Biológicas pelo Instituto de Ensino Superior
do Sul do Maranhão - ([email protected]).
Zilmar Timóteo Soares
2
Doutor e mestre em Educação. Graduado em Biologia pela Universidade Estadual
do Maranhão (Uema) - ([email protected]).
138
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
1. INTRODUÇÃO
Desde as primeiras civilizações humanas mais simples e remotas
de que se tem registro, observa-se que, movido pelo instinto de
sobrevivência e perpetuação da espécie, o ser humano busca na
natureza tudo que é possível para seu bem-estar.
As relações entre as pessoas foram se tornando mais complexas e exigentes, notadamente novos interesses foram emergindo
e grupos sociais e nações se organizaram, criando normas, padrões, leis e diretrizes gerais para uma vida em sociedade, em que
se excluíram do meio, para só mais tarde perceber que estavam
se autodestruindo, à medida que indiscriminadamente faziam
e fazem uso dos recursos naturais renováveis e não renováveis.
Consequências disso são os impactos ambientais, catástrofes
ecológicas, mudanças climáticas e de estações e o desaparecimento de espécies animais e vegetais sobre a terra.
A FUNÇÃO DA ESCOLA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
As civilizações foram evoluindo e com elas a necessidade de cada
vez mais subtrair do meio natural tudo o que pode satisfazê-las.
E nessa busca incessante e mais tarde também insana, pois já
não era só a sobrevivência, mas o acúmulo de bens diversos, o
ser humano não só manipulou os recursos ambientais disponíveis
como também os alterou.
No processo de evolução e organização das civilizações surgem,
além dos grupos sociais, as instituições para diversos fins de manutenção dos grupos e interesse da sociedade. A esse mesmo
homem, algoz de si mesmo, promotor da destruição da vida natural, recai a responsabilidade e o dever de respeitar e contribuir
para a construção de uma nova visão, consciência e modo de se
relacionar com a vida, ou seja, com a natureza.
Diante deste processo evolutivo da humanidade que vem destruindo os recursos naturais, cabe à escola dar o primeiro passo
para trabalhar bem a educação ambiental e criar na escola um
ambiente capaz de envolver todos os professores e também a
comunidade. O meio ambiente vai além das dimensões biofísicas, como vegetação, recursos hídricos, fauna, solos, atmosfera.
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139
O MEIO AMBIENTE VAI
ALÉM DAS DIMENSÕES
BIOFÍSICAS, ENVOLVE
AS CONFIGURAÇÕES
Envolve as configurações dos conhecimentos, das técnicas,
das estruturas e das relações sociais. As instituições educacionais encontram-se perante um desafio, quanto as suas
funções e, particularmente, no que concerne à conscientização e à formação dos discentes.
DE CONHECIMENTOS,
Com esse pensamento, o artigo tem por finalidade auxiliar
na formação e na qualificação dos alunos e professores, com
E RELAÇÕES SOCIAIS
base nos princípios e na metodologia que envolve a comunidade escolar na defesa do meio ambiente. Este auxílio na
qualificação visa também a promover um maior conhecimento sobre novos processos de preservação e conservação, adequação
às formas de regulamentação, bem como criar condições que facilitem a difusão da informação científica entre docentes e discentes.
TÉCNICAS, ESTRUTURAS
VANDERLENE BRASIL LUCENA E ZILMAR TIMÓTEO SOARES
2. REVISÃO DE LITERATURA
É por meio da educação, seja ela familiar ou escolar, que a sociedade transfere seus costumes e conhecimentos fundamentais
à vida. Na família e nos grupos sociais de diversos segmentos,
eles são repassados naturalmente ou por imposição dos grupos
sociais. O ato de educar significa transferir conhecimentos, costumes, comportamentos aceitáveis e de sobrevivência. Ocorre de
forma sistematizada e a mais científica possível, quando é realizado em uma instituição especializada. Todas as formas objetivam
assegurar o contínuo processo de socialização e ajustamento dos
novos indivíduos à sociedade e ao mesmo tempo desenvolver
mais potencialidades que as do próprio grupo do qual se faz parte. Nesse contexto, afirma Oliveira (2000): “A educação é uma
das atividades básicas de todas as sociedades humanas, pois a
sobrevivência de qualquer sociedade depende da transmissão de
sua herança cultural aos jovens”. Portanto, ao longo da história,
foram apenas mudando as formas de construção do conhecimento e em muitos casos os objetivos, pois novas exigências sociais despontaram, porém os fins são os mesmos: a manutenção
e a conservação dos grupos e seus interesses sociais.
A escola não é a única responsável pela educação, porém ainda
é a mais importante e oficial instituição disseminadora do conhecimento. Ela se apropria do conhecimento por diversos meios e
140
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
o reproduz de forma a atender ao sistema, pouco se adaptando
aos avanços científicos e tecnológicos, para cumprir realmente seu
papel. Ela tem uma estrutura complexa, pois compreende um conjunto de ações voltadas para fins diversos, que vão desde formação básica a especialidades dos indivíduos em seus grupos sociais.
Nesse aspecto, contribui incontestavelmente para o bem-estar de
um novo ser socializado, mas ainda deixa a desejar, quando há
muito cai na estagnação e mesmice do processo de construção do
conhecimento, esquivando-se de sua verdadeira função.
É uma necessidade e responsabilidade de todos, já que a vida é
resultante de uma relação intrínseca com a natureza, portanto
não se trata simplesmente de um processo educacional, mas uma
construção de valores indispensáveis à manutenção da vida.
Nessa construção, ocorrendo de fato, não só a educação ambiental terá êxito mas também toda a vida humana nos diversos níveis
sociais, pois um homem com valores sociais e éticos consequentemente é um homem que respeita a natureza e suas leis.
No âmbito internacional, a educação ambiental surge em 1977,
com a Conferência Internacional de Educação Ambiental, em Tbilisi. Nesse encontro se definiram os objetivos e características da
educação ambiental, bem como as metodologias concernentes
ao plano nacional e internacional. Já no Brasil, há tempos que
alguns idealistas, estudiosos, cientistas, religiosos, sindicalistas
e até mesmo algumas instituições clamam por uma educação
voltada para a defesa do meio ambiente, como Chico Mendes e
outros. Mas ela só passou a ser exercida como obrigação nacional
a partir de 1988, com a Constituição Federal, responsabilizando
os governos federal, estaduais e municipais.
A FUNÇÃO DA ESCOLA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
2.1 A educação ambiental
Como todo processo educacional, a educação ambiental deve ser
conduzida impreterivelmente por professores conscientes, críticos, abnegados, livres de preconceitos, bem como dispostos a
transmiti-la a seus alunos e a toda comunidade. Só a consciência
é capaz de instruir com garantia de formular conceitos coerentes
a que se propõe e assim fundir conhecimentos e experiências na
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.137-150 • janeiro/julho • 2012
141
VANDERLENE BRASIL LUCENA E ZILMAR TIMÓTEO SOARES
produção de novos cidadãos livres para pensar, sentir e mudar a
realidade. Nesse sentido, afirma Vieira (1996): “O curso de educação ambiental deve basear-se em vivências juntamente com
conhecimentos. Desenvolver o lado sensível é de fundamental
importância para que o professor possa repetir sua experiência
com seus alunos”. Neste contexto, entende-se que a formação do
professor para a educação ambiental depende de dois fatores indispensáveis: o curso e a sensibilidade dele. Ou seja, não basta ter
uma graduação, é preciso vivência e saber dividir as experiências
vividas com os discentes. Ainda sobre esse contexto, os Pârametros Curriculares Nacionais (1997) relatam: “A responsabilidade e
a solidariedade devem expressar desde a relação entre as pessoas
com seu meio, até as relações entre povos e nações, passando
pelas relações sociais, econômicas e culturais”.
A carta magna brasileira reconhece o direito de todos a um ambiente equilibrado ecologicamente e responsabiliza o poder público em assegurar a efetividade desse direito. Nesse contexto, ela
ainda prevê que a forma de manter o equilíbrio ecológico é promover a educação e conscientização da população, e para tanto
essa responsabilidade recai com maior ênfase sobre as instituições
educacionais, oficiais ou não, já que as mesmas possuem a função
de instruir e educar.
Legalmente a educação ambiental existe, está fundamentada em
leis e figura como uma das mais preocupantes no cenário educacional. Como em outros setores, deixam a desejar o cumprimento
e o respeito à mesma.
Em 1996, é promulgada a lei Darci Ribeiro, ou seja, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB), com um texto mais atual,
que contemplou senão todas pelo menos boa parte das necessidades da educação brasileira, sendo uma delas a educação ambiental.
E sobre essa modalidade de educação o artigo segundo afirma que
A educação é dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho.
142
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
OS PARÂMETROS
CURRICULARES
NACIONAIS
ADOTARAM O TEMA
Como membros efetivos, os professores também são alvo das
atribuições da LDB, quando a mesma no art. 13, I e II, afirma
MEIO AMBIENTE
sobre o papel dos docentes: “I - participar da elaboração da
E SAÚDE COMO
proposta pedagógica do estabelecimento de ensino. II - elaboTRANSVERSAIS
rar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagóAO ENSINO
gica do estabelecimento de ensino”. Esse artigo reforça a participação dos docentes no planejamento do processo educativo,
ou seja, os mesmos também são responsáveis diretos por todo o
processo e não só por uma parte, que é o que muitos pensam. Na
prática, o processo de planejamento e propostas pedagógicas nas
escolas deixa muito a desejar, já que na maioria dos casos são elaborados simplesmente para constar nos arquivos e, portanto, não
correspondendo às necessidades do educando, às experiências,
pesquisas e àquilo que propõem as diretrizes educacionais. Com
considerações importantes sobre a prática da educação ambiental, Rodrigues (2000), ressalta que muitos projetos em educação
ambiental desconsideram todo um saber acumulado na área de
pesquisa em educação e tem sido comum encontrar grupos desenvolvendo programas baseados numa concepção de educação
linear e mecânica de transmissão de informações.
A FUNÇÃO DA ESCOLA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
Na prática, entende-se que esse pleno desenvolvimento humano não pode ocorrer às margens ou em meio a tamanha degradação ambiental que vive o mundo, inclusive nosso Brasil.
Uma das demonstrações de ineficácia dos planos e propostas é o
fato de que o que se vai trabalhar em um mês ou em um ano é
planejado em três ou quatro horas. Este é mais um dos pontos que
precisam mudar para se ter uma boa educação em termos gerais.
Para enfrentar todos esses problemas, sugere Rodrigues (2000): “O
maior acesso à informação potencializa mudanças comportamentais necessárias para um agir orientado para a defesa do interesse
geral”. É bastante relevante essa orientação, pois o mundo da informação domina hoje um espaço muito grande na vida de cada
ser humano, sendo portanto uma via de conhecimento, motivação
e sensibilização para a participação de todos na defesa da vida.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais são propostas do Ministério
da Educação e do Desporto para a educação, usando temas trans-
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.137-150 • janeiro/julho • 2012
143
versais e orientando a escola, docentes e discentes referentes ao
tratamento dos mesmos. Em relação ao meio ambiente e à saúde,
é dedicado um fascículo (volume 9) com o tema “Meio Ambiente
e Saúde”. Destaca-se a principal intenção:
A intenção deste documento é tratar as questões relativas ao meio ambiente
em que vivemos, considerando seus elementos físicos e biológicos e os modos de interação do homem e da natureza, por meio do trabalho, da ciência,
da arte e da tecnologia.
VANDERLENE BRASIL LUCENA E ZILMAR TIMÓTEO SOARES
E com objetivos bem definidos, expõe como se deve trabalhar com
o tema meio ambiente.
Com os parâmetros curriculares nacionais, tornaram-se mais
palpáveis e viáveis as diretrizes educacionais, previstas em lei
e propostas pelo Ministério da Educação (MEC), além de ir ao
encontro de vários anseios dos docentes em todos os níveis de
ensino. Este documento reflete com mais intensidade as reais
necessidades do currículo educacional. A proposta interdisciplinar, por exemplo, apesar de difícil aplicabilidade, tornou-se um
fato, pois os docentes passaram a ter uma garantia documental
da modalidade, o que antes eram apenas teorias de alguns especialistas não efetivos na sala de aula. Mesmo assim, ainda é
preciso acabar com muito preconceito e resistência ao “novo”
para um maior aproveitamento dos parâmetros curriculares
atuais e outros que virão.
3. RESULTADOS DA DISCUSSÃO
A educação é um ato político e que, para ser identificada como
um ato educativo na perspectiva ambiental, necessita mais de
uma mudança qualitativa da escola do que de informações eficientes. Isto será possível com uma maior ênfase nos aspectos
éticos e políticos da questão ambiental. Assim, os resultados
basearam-se em entrevistas com acadêmicos e professores sobre o tema a “Função da escola na defesa do meio ambiente”.
3.1 Pesquisa de campo
Foram consultados 30 acadêmicos no município brasileiro de Imperatriz (MA), em agosto de 2010, sobre a função da escola na
defesa do meio ambiente com os seguintes questionamentos:
144
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Gráfico 1. A instituição onde você estuda demonstra preocupação
com os problemas ambientais?
5%
5%
5%
Sim
Não
Pouca
Muito pouca
85%
Fonte: Pesquisa de Campo ‒ Agosto de 2010.
Os resultados da pesquisa nos emitem dados animadores. Mas
algumas escolas ainda deixam para um segundo plano os aspectos ambientais e, os que responderam que sim, deixaram
claro que somente em datas especiais trabalham problemas
ambientais no seu currículo, confirmando assim, que os temas
ambientais são tratados nas escolas por meio de projetos, seminários e feiras, desconectados da realidade e da situação local.
Como desafio e não como algo impossível de se realizar, é possível
que, com mais segurança, os profissionais da escola, de comum
acordo, estabeleçam metodologias mais valiosas e viáveis que possam trilhar na busca de seu próprio desenvolvimento e do desenvolvimento ambiental no processo educativo de que participam.
A FUNÇÃO DA ESCOLA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
Sobre a preocupação da escola com os problemas ambientais,
85% afirmaram que sua escola já demonstrou interesse por este
tema.
Sobre a função da escola na defesa do meio ambiente foram consultados 20 professores e 100% afirmaram que é responsabilidade
deles mostrar que a escola tem função intrínseca sobre o aspecto
ambiental. Esse resultado positivo mostra que os professores estão
conscientes do seu papel de defensores do meio ambiente.
O gráfico 2 demonstra um problema sério, já que 40% dos professores consultados afirmam que os cursos superiores deixaram a
desejar no que se refere à preparação do docente para a educação
ambiental. Dez por cento admitiram não ter recebido nenhuma informação sobre as questões ambientais no seu curso, já o restante
dos entrevistados disseram ter recebido pouca informação.
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Gráfico 2. Em face dos problemas ambientais no Brasil e no mundo,
você considera que sua formação universitária ofereceu uma
estrutura curricular flexível e dinâmica que facilitasse o tratamento
das questões ambientais?
10%
30%
20%
Sim
Não
Pouca
Muito pouca
40%
Fonte: Pesquisa de Campo ‒ Agosto de 2010.
Gráfico 3. Você tem conhecimento do que a Constituição Federal e
VANDERLENE BRASIL LUCENA E ZILMAR TIMÓTEO SOARES
a LDB destacam sobre a defesa do meio ambiente?
10%
Tem conhecimento
Tem pouco conhecimento
Não tem nenhum
conhecimento
40%
50%
Fonte: Pesquisa de Campo ‒ Agosto de 2010.
O gráfico 3 mostra que a maioria dos professores tem pouco
conhecimento das leis que tratam da defesa do meio ambiente.
É um problema que precisa ser revisto entre os educadores. É
necessário mais compromisso com as literaturas, leis e normas
que estão relacionadas com os aspectos ambientais.
Gráfico 4. Os planejamentos e projetos de sua escola têm previsto
com frequência temas voltados para defesa do meio ambiente?
20%
Sim
Não
80%
Fonte: Pesquisa de Campo ‒ Agosto de 2010.
146
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
É um resultado importante, porém suscita outro questionamento: como estão sendo trabalhados os conteúdos nos 20%
restantes, se 80% dos entrevistados relataram que sua instituição tem projetos voltados para as questões ambientais? É uma
questão para ser revista pelos gestores educacionais, já que a
escola está descrita como formadora de opinião.
Grupo 5. Como formadora de opinião, sistematizadora de
conhecimento, a escola está cumprindo sua função em defesa do
meio ambiente?
50%
40%
Sim
Não
Pouco
Muito pouco
0%
Fonte: Pesquisa de Campo ‒ Agosto de 2010.
Metade dos professores entrevistados afirmaram que o que a
escola está fazendo em defesa do meio ambiente ainda é pouco. Esse dado pode ser relevante ou apenas demonstrar o grau
de consciência dos entrevistados em relação à questão ambiental. É necessário mais conhecimento sobre o tema, que é de
suma importância para a nossa vida e a vida no planeta.
A FUNÇÃO DA ESCOLA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
10%
Gráfico 6. Na função de educador, além de sensibilizado e consciente
da necessidade e da importância do tratamento dessa questão com
seus alunos, você se sente preparado(a) e instrumentalizado(a) para
enfrentar esse desafio?
20%
40%
20%
Sim
Não
Pouco
Muito pouco
20%
Fonte: Pesquisa de Campo ‒ Agosto de 2010.
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A maioria demonstrou que necessita de mais qualificação para
trabalhar as questões ambientais na escola. Essa resposta talvez
esteja relacionada à falta de um programa dos gestores educacionais que leve a sério os problemas ambientais como questões
de sobrevivência não só para o futuro, mas para os dias de hoje.
Gráfico 7. Nos livros didáticos adotados em sua escola, os conteúdos
programáticos tratam com eficiência dos problemas ambientais?
10%
Sim
Não
Pouco
Muito pouco
10%
20%
VANDERLENE BRASIL LUCENA E ZILMAR TIMÓTEO SOARES
60%
Fonte: Pesquisa de Campo ‒ Agosto de 2010.
Sobre os livros didáticos, os resultados demonstraram que os
professores não estão satisfeitos com os conteúdos, o que justifica em parte a falta de instrumentalização, porém sabemos
que não é a única via de acesso para se trabalhar a educação
ambiental. Os próprios docentes podem utilizar problemas ambientais do cotidiano da escola, bairro, município e estado.
Com base nas entrevistas e observações, ficou claro que há muito que fazer para que a escola se torne um veículo na defesa do
meio ambiente. É necessária uma construção contínua no interior
da escola, proporcionando assim uma educação ambiental para o
desenvolvimento sustentável e para uma vida ampla e longa que
sustente com inteligência cada desafio individual, das instituições e
das sociedades, para que visualizem o amanhã com uma diferença
que pertença a todos nós, ou não pertença a ninguém.
4. CONCLUSÃO
Com base na revisão literária e pesquisa de campo efetivadas
para a produção desse artigo, ficou explícito que a educação
ambiental vem sendo aplicada informalmente, ou seja, mesmo
148
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
nas escolas acontece como em outras instituições, em forma de
campanhas, seminários e outras, e formal, quando possui uma
relação concreta com o planejamento e conteúdos curriculares,
essa última com menos frequência, e ainda falta coerência nas
propostas, nos projetos e uma vontade maior de fazer acontecer a transformação da consciência de todos.
É importante ressaltar que a função da escola e, portanto, dos professores em relação à defesa do meio ambiente é imprescindível,
não só porque trabalham com educação, mas também pelo fato
de que são agentes transformadores dessa educação e já fazem
acontecer no meio de um público-alvo formado de pessoas que
serão os futuros condutores dos destinos da vida, socioambientais
e sociopolíticos do país e do mundo, pois vivemos a globalização.
O artigo tem por finalidade auxiliar na formação e na qualificação dos alunos e professores, com base nos princípios e na metodologia que envolve a comunidade escolar na defesa do meio
ambiente. Este auxílio na qualificação visa também a promover
um maior conhecimento sobre novos processos de preservação
e conservação, adequação às formas de regulamentação, bem
como criar condições que facilitem a difusão da informação
científica entre docentes e discentes.
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.137-150 • janeiro/julho • 2012
A FUNÇÃO DA ESCOLA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
Constata-se ainda que, na maioria dos casos, a problemática ambiental é tratada na escola somente por meio de projetos, seminários e feiras, fazendo apenas alguns enfoques nas aulas regulares, já que os livros didáticos pouco se referem à temática e os
professores, por uma questão de formação, condições de trabalho e também de conscientização, acabam por não fazerem sua
parte, ignorando que cuidar do meio ambiente é cuidar da vida.
149
REFERÊNCIAS
BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais:
meio ambiente saúde (PCN’s). Secretaria
de Educação Fundamental - Brasília: vol.9,
1997.
BRASIL, MEC, Panorama da Educação ambiental no Ensino Fundamental. Secretaria de
Educação Fundamental – Brasília; SEF, 2001,
p.149. (Oficina de trabalho realizada em
março de 2000).
BRASIL, Constituição Federal (1988); Constituição da República Federativa do Brasil; DF,
1998.
VANDERLENE BRASIL LUCENA E ZILMAR TIMÓTEO SOARES
OLIVEIRA, P.S., Introdução à Sociologia da
Educação. 3ª ed. São Paulo. Àtica, 2000.
150
PILETTI, C., Filosofia da Educação. 9ª ed. São
Paulo. Ática, 2005.
RODRIGUES, N., Por uma nova escola: o transitório e o permanente na educação. 12ª ed.
São Paulo: Cortez, 2000.
UEMA – Universidade Estadual do Maranhão. Apostila; Leis de Diretrizes e Bases da
Educação – LDB. 200.
VIEIRA, E., Sociologia da Educação: reproduzir e transformar. 3ª ed. São Paulo: FTD,
1996.
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
RESENHA
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
TREVIÑO, ERNESTO, ET AL.
FACTORES ASOCIADOS AL LOGRO COGNITIVO DE LOS
ESTUDIANTES DE AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE.
SANTIAGO: UNESCO, 2010. 157 PÁGINAS.
Paulo Menis
economista, especialista em Didática e
mestrando em Educação pela Universidade Católica de Brasília
– ([email protected]).
José Ribamar Neres Costa
especialista em Literatura Brasileira e mestrando em Educação
pela Universidade Católica de Brasília – ([email protected]).
Identificar as causas do sucesso ou do fracasso escolar é
um sonho acalentado por diversos pesquisadores ao longo da história da educação, mas fazer um mapeamento
dos entraves e dos fatores que favorecem a aprendizagem é uma tarefa que demanda bastante tempo, recursos financeiros e um domínio técnico-teórico grande.
Para suprir essa carência de dados mais detalhados, foi
realizada uma grande pesquisa a partir de testes aplicados no Segundo Estudo Regional e Comparativo e Explicativo (SERCE), realizado pelo Escritório Regional de
Educação da Unesco para a América latina e o Caribe
(OREALC, na sigla em espanhol) e que resultou no livrorelatório "Factores asociados al logro cognitivo de los estudiantes de América Latina y el Caribe", publicado em
janeiro de 2010, pela Unesco.
Redigido por uma equipe de experientes pesquisadores
em educação formada por Ernesto Treviño, Héctor Valdés, Mauricio Castro, Ruy Costillas, Carlos Pardo e Francisca Donoso Rivas, o relatório traz um estudo detalhado
da atual situação do ensino nos países pertencentes à
151
OS SISTEMAS
região delimitada. E, ao longo da apresentação do trabalho,
os pesquisadores demonstram como cada um dos fatores
analisados influencia na aprendizagem dos alunos.
DE EDUCAÇÃO
INFLUENCIAM A
ORGANIZAÇÃO SOCIAL
EM DIFERENTES POVOS,
PAULO MENIS, JOSÉ RIBAMAR NERES COSTA
LUGARES E ÉPOCAS
Escrito em uma linguagem técnica, mas bastante acessível,
o trabalho é ilustrado por um número bastante significativo
de gráficos e tabelas explicativos e é composto pelas seguintes partes: uma breve apresentação, um prólogo, um resumo da execução da pesquisa, uma introdução geral, quatro
capítulos e quatro anexos.
Basicamente, os quatro capítulos que compõem o livro (1. A
influência da escola na aprendizagem; 2. Desigualdades sociais
e aprendizagem; 3. Fatores associados à aprendizagem; 4. Conclusões e recomendações de políticas) são aprofundamentos,
exemplificados e ilustrados com comentários que fazem o leitor
compreender alguns pontos que dificilmente seriam esclarecidos apenas com a presença dos infográficos ou somente com
palavras.
Após uma sucinta apresentação, assinada por Jorge Sequeira,
diretor do OREALC/ Unesco de Santiago, e um prólogo também
bastante sintético, escrito por Héctor Valdés Veloz, diretor do Laboratório Latino-Americano de Avaliação e Qualidade na Educação
(LLECE, em espanhol) o leitor chega a dois dos pontos mais importantes da obra: o resumo de execução da pesquisa e introdução.
Fica-se sabendo então que a publicação é resultado de uma longa
e exaustiva pesquisa realizada entre 2004 e 2008, que o corpus
de pesquisa foi formado por 6.000 estudantes e 200 escolas por
país pesquisado, e que o “SERCE é o mais importante estudo avaliativo sobre o desempenho dos estudantes da escola primária realizado na América Latina e no Caribe” (p. 09). Os pesquisadores
esclarecem ainda que o modelo utilizado para a pesquisa foi o de
Contexto-Insumo-Processo-Produto (CIPP), modelo de avaliação
criado por Stufflebeam em 1966, baseado na premissa de que a
aprendizagem depende dos insumos e dos processos destinados
à escola, assim como do contexto socioeconômico e cultural de
onde os alunos vivem e onde as escolas estão situadas. O modelo adotado foi de suma importância para o desenvolvimento
da pesquisa, suas análises, conclusões e propostas apresentadas.
152
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
As partes iniciais do relatório trazem diversas informações que serão recorrentes ao longo dos capítulos seguintes. Algumas ideias
solidificadas pelo tempo são questionadas, como, por exemplo,
a relação entre condição econômica e aprendizagem. Os pesquisadores afirmam que “o nível socioeconômico influi, mas não é o
determinante do sucesso educacional” (p.14), e mais adiante voltam a afirmar que “os recursos materiais e humanos são necessários para melhorar o rendimento acadêmico, mas por si mesmos
não asseguram que os estudantes aprendam” (p.15), pois “os
recursos têm um grau menor de importância que os processos,
já que é necessário um uso adequado dos recursos para produzir
aprendizagem” (p.112).
Na apresentação dos dados obtidos na análise do fator contexto,
os autores procuraram demonstrar como está a construção, pela
educação, do aluno enquanto ser social. Se os alunos têm conseguido, através da educação, a sua socialização, independente
do sexo, da etnia, se o aluno realiza algum trabalho infantil e
também da localização, tipo e média da escola. Um fator negativo muito preocupante é quanto à queda no rendimento dos
alunos que trabalham ou que têm origem indígena, assim como
o desempenho das meninas em relação aos meninos. Esta visão
da educação mostra que diferentes povos, em diferentes lugares
e em determinadas épocas, têm determinados sistemas de educação que influenciam sua organização social. Apesar de ser utilizada uma pesquisa quantitativa, pode-se captar e entender bem
as influências do meio externo sobre o desempenho médio dos
alunos, mostrando que, como afirmava Durkheim, “o homem,
mais do que formador da sociedade, é um produto dela".
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.151-156 • janeiro/julho • 2012
RESENHA: FACTORES ASOCIADOS AL LOGRO COGNITIVO DE LOS ESTUDIANTES...
As variáveis levadas em consideração do item contexto são: a situação educacional do lar, o índice socioeconômico e cultural da
família, os gêneros, a condição indígena e o trabalho infantil. Com
relação ao insumo, os fatores determinantes foram: a infraestrutura da escola, o número de computadores, os docentes e, com relação aos discentes, a repetência e o acesso à pré-escola. Quanto ao
processo, foram estudadas variáveis como clima escolar, gestão do
diretor, satisfação e desempenho dos docentes. Finalmente, com
relação ao produto, os critérios analisados foram aprendizagem,
formação cívica e a participação social e econômica.
153
Chama também a atenção a ênfase dada ao que os pesquisadores denominam de “clima escolar” e à gestão administrativa da
escola. Ao longo de todo o relatório, os autores alertam para o
fato de que “os estudantes aprendem mais quando frequentam
escolas onde se sentem acolhidos e se dão relações de cordialidade e respeito entre alunos e professores” (p.15) e há a constatação de que “a gestão do diretor é a variável que ocupa o segundo
lugar nos processos educativos quanto à consistência de sua relação com o rendimento” (p.125). De modo geral, o relatório deixa
claro que “o clima escolar e a gestão do diretor são elementos
essenciais para explicar uma melhora na aprendizagem, seguidos
pela satisfação e o desempenho dos docentes” (p.107).
PAULO MENIS, JOSÉ RIBAMAR NERES COSTA
Saindo da parte introdutória e entrando nos capítulos do relatório, tem-se o primeiro capítulo, que analisa “a influência da
escola na aprendizagem”, com seus respectivos efeitos na leitura, na matemática e nas ciências. Os pesquisadores demonstram
que existe uma gradação na influência da família e da escola na
formação cognitiva dos estudantes. Nos aspectos da leitura, a família influencia mais que a escola, ocorrendo o contrário quando
se trata das ciências, isso se dá porque “as escolas são um veículo
essencial para instalar noções científicas nos estudantes” (p.40)
ao mesmo tempo em que a influência da escola na aprendizagem da matemática é levemente superior à da leitura, isso acontece porque “a escola é a principal fonte formal desta matéria em
nossa sociedade” (p.36).
O segundo capítulo ocupa-se das desigualdades sociais relacionadas com a aprendizagem. Partindo da noção de que “as desigualdades sociais mantêm uma relação estreita com a aprendizagem"
(p.45), os autores fazem um mapeamento sintético, porém detalhado da situação encontrada nos países, traçando perfis escolares específicos para cada uma das nações investigadas. Ao final
do capítulo, questionam sobre as providências a serem tomadas
para diminuir as desigualdades sociais e educacionais existentes
dentro das nações ou entre elas.
A seguir, em um terceiro capítulo, com alto grau técnico, os autores, voltando-se para o modelo CIPP, analisam os resultados
obtidos na investigação. Nessa parte do trabalho, constata-se
que há, por exemplo, “geralmente vantagem para as meninas
154
EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Como parte final do relatório, os pesquisadores dedicam um
capítulo não só para as conclusões, mas também sugestões de
práticas políticas, além de recomendações aos professores e aos
gestores das escolas. Os autores dizem que para diminuir as diferenças encontradas são necessárias “estratégias que promovam um incremento de aprendizagem de todos os estudantes"
(p.127), recomendam melhorar a formação inicial dos docentes,
inserir “docentes destacados em escolas de contexto desconfortável” (p.127) e melhorar o desempenho dos docentes. Há também a sugestão de uma melhor distribuição das verbas destinadas à educação, pois, “é indispensável transformar a política de
distribuição para dotar de maiores recursos os mais necessitados”
(p.129), entre outras sugestões de caráter prático.
RESENHA: FACTORES ASOCIADOS AL LOGRO COGNITIVO DE LOS ESTUDIANTES...
em leitura de aproximadamente cinco pontos e desvantagens
É INDISPENSÁVEL
em matemática e ciências de 10 pontos, com algum grau de
TRANSFORMAR
variação entre países” (p.88). O estudo constata também que,
A POLÍTICA DE
por ter uma cultura singular e ser menos favorecida financeiramente, a educação da população indígena deve ser vista
DISTRIBUIÇÃO PARA
com maior atenção pelas políticas públicas, e que o trabalho
DOTAR DE MAIORES
“juvenil tem um efeito negativo na aprendizagem, com maior
RECURSOS OS MAIS
incidência em leitura e ciências em comparação com matemática” (p.89). Os pesquisadores chamam a atenção também
NECESSITADOS
para os males ocasionados pela segregação social na escola,
que “reduz a possibilidade de construção de uma sociedade
mais coesa desde a escola” (p.90) e alertam para o fato de isso
ser mais visível na zona urbana, uma vez que “nas zonas rurais
afastadas costuma existir apenas uma opção de escola” (p.90).
Há também nesse capítulo a análise dos elementos relativos a
insumo, produção e produto do processo educacional.
De um modo geral, "Factores asociados al logro cognitivo de los
estudiantes de América Latina y el Caribe" é um livro que merece ser lido não apenas por educadores e gestores, mas sim por
todos os interessados nas questões educacionais, como também
pelos responsáveis pelas políticas públicas de educação em todos
os países pesquisados. Uma das maiores lições que os autores
deixam é a de que, apesar de todas as condições adversas, a escola ainda mostra “um potencial para reverter as desigualdades
e promover aprendizagem dos estudantes”. Não se trata de uma
Revista UNI • Imperatriz (MA) • ano 2 • n.2 • p.151-156 • janeiro/julho • 2012
155
PAULO MENIS, JOSÉ RIBAMAR NERES COSTA
obra que apenas aponta os problemas educacionais nos países,
mas sim de um trabalho que busca também apontar soluções
práticas para questões que muito incomodaram no passado e
que, caso não sejam enfrentadas de forma eficiente, continuarão
a incomodar por muito tempo ainda.
156
A obra objeto desta resenha é uma publicação do Escritório Regional da Educação da Unesco para a América Latina e Caribe
(OREALC/UNESCO Santiago) e do Laboratório Latino-Americano
de Avaliação da Qualidade na Educação (LLECE), tendo como
organizador Ernesto Treviño, pós-Doutor em Ciências na especialidade em Pesquisas Educativas pelo Departamento de Investigaciones Educativas (DIE) de CINVESTAV, México DF (PHD
em Ciências), mestre em Educação pela Universidad Pedagógica Veracruzana (Master's Degree in Education), especialista em
Pesquisa Educacional pela Universidad Pedagógica Veracruzana
(postgraduate in Educational Research) e licenciado em Pedagogia pela Universidad Veracruzana, Xalapa (bachelor's degree in
Pedagogy). É membro do Conselho Mexicano de Pesquisa Educacional; professor convidado da School of Education, Department
of Curriculum and Instruction, University of Wisconsin-Madison,
EUA, integrante permanente do programa de Análisis Político de
Discurso e Investigación en el DIE-CINVESTAV-IPN y en la FFyL de
la UNAM e conselheiro do Observatorio Veracruzano de la Educación, OVE, México.
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157
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