Exma. Professora Doutora Assunção Cristas, Ministra da Agricultura

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Exma. Professora Doutora Assunção Cristas, Ministra da Agricultura
 Exma. Professora Doutora Assunção Cristas, Ministra da Agricultura e do Mar Praça do Comércio, 1149-­‐010 Lisboa Lisboa, 5 de fevereiro de 2014 Assunto: Discussão do Conselho Europeu sobre regulamentação para a gestão das pescas de profundidade no Atlântico Nordeste Exma. Sra. Ministra Assunção Cristas, A PONG-­‐Pesca, a Bloom, a Greenpeace, a Oceana, a Seas At Risk, a Pew Charitable Trusts e a Deep Sea Conservation Coalition (Coligação para a Conservação dos Fundos Oceânicos)—uma coligação de mais 70 organizações não-­‐governamentais, , organizações de pescadores e institutos de política e direito, todos eles empenhados em proteger os fundos oceânicos — solicitam o seu apoio para uma nova regulamentação de gestão das pescas de profundidade, que proteja os ecossistemas de profundidade dos impactos da pesca de fundo, em particular o arrasto de fundo, e que garanta a conservação das espécies de profundidade. A Comissão Europeia apresentou uma proposta1 em julho de 2012, para uma nova regulamentação, determinando condições específicas para a pesca de fundo de unidades populacionais na UE e em águas internacionais do Atlântico Nordeste, que substituía o atual regime de acesso2. Após a primeira leitura no Parlamento Europeu, concluída em dezembro de 2013, a proposta está atualmente a ser discutida pelos grupos de trabalho do Conselho das Pescas. Tal como indicado na nossa carta de maio de 2013, a legislação para a gestão das pescas de profundidade deve: • Acabar com a sobrepesca nos fundos oceânicos garantindo que a captura de todas as espécies de profundidade é regulamentada e que a pesca só é permitida se as capturas, incluindo capturas acessórias, puderem ser restringidas a níveis sustentáveis, com base num entendimento científico claro do estado das unidades populacionais e na respetiva gestão preventiva de base científica; • Garantir que as pescas de profundidade são geridas de forma a minimizar e, sempre que possível, eliminar as capturas acessórias de espécies não visadas e evitar a captura de espécies mais vulneráveis; • Garantir que impactos adversos em ecossistemas de profundidade vulneráveis, como os de coral, esponjas e montes submarinos, são evitados através da gestão adequada de todas as pescarias de profundidade, o que inclui o encerramento de zonas à pesca de fundo; • Exigir avaliações de impacto para todas as pescarias de profundidade; • Acabar com as práticas de pesca de profundidade mais destrutivas. Há uma série de disposições importantes tais como: a inclusão de mais espécies no regulamento; um novo sistema de autorizações de pesca de profundidade; a realização de estudos de impacto ambiental em novas áreas de pesca; e uma fundamentação científica clara para a definição das oportunidades de 1
COM(2012)0371 Regulamento do Conselho N.º 2347/2002 3
O texto adotado pelo Parlamento a 10 de dezembro retificando a proposta da Comissão encontra-­‐se em 2
pesca. O texto adotado pelo Parlamento Europeu3 fortalece ainda várias destas dimensões, incluindo disposições que tornariam obrigatórios os estudos de impacto ambiental em zonas atualmente pescadas e um processo para identificar e encerrar à pesca de fundo áreas onde existam ou sejam prováveis de existir ecossistemas marinhos vulneráveis (artigos 6 e 7). Estas disposições são consistentes com os acordos internacionais de gestão das pescas de profundidade negociados sob os auspícios da Assembleia Geral da ONU, da FAO e da Convenção das Nações Unidas sobre a Biodiversidade. Adicionalmente, a Comissão propôs a eliminação gradual do arrasto de fundo e das redes de emalhar de fundo para espécies de profundidade "alvo" (Artigo 9 da proposta); artes de pesca responsáveis por danos significativos no leito marinho dos fundos oceânicos e nos respetivos ecossistemas. Este ponto da proposta foi rejeitado por pequena margem no voto em sessão plenária do Parlamento Europeu.4 No entanto, vinte eurodeputados pediram posteriormente para corrigir o voto5 e, embora essas correções não alterem o texto adotado pelo Parlamento, é portanto claro que a maioria dos eurodeputados que votaram eram a favor da eliminação progressiva das práticas de pesca mais destrutivas. A este propósito, destacamos o recente anúncio por parte de um das principais empresas de pesca de profundidade, a francesa Scapêche – que faz parte do grupo Intermarché – que se comprometeu a acabar com o arrasto de fundo abaixo dos 800 m a partir do início de 2015.6 A revisão ao regime de acesso às pescarias de profundidade na UE já há muito que devia ter sido feita. Agora que o Parlamento concluiu a primeira leitura da proposta, o processo legislativo depende da ação atempada do Conselho. Saudamos os progressos nesta matéria urgente e instamo-­‐la a apoiar as disposições em prol de uma gestão sustentável das pescas de profundidade e da proteção de espécies e ecossistemas de profundidade vulneráveis. As recomendações sobre pontos importante do texto seguem em anexo nesta carta. Não hesite em contactar-­‐nos se necessitar de informação adicional. Atenciosamente, Matthew Gianni Conselheiro político e estratégico Deep Sea Conservation Coalition (Coligação para a Conservação dos Fundos Oceânicos) www.savethehighseas.org 3
O texto adotado pelo Parlamento a 10 de dezembro retificando a proposta da Comissão encontra-­‐se em http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?type=TA&reference=P7-­‐TA-­‐2013-­‐0539&language=EN 4
Como consequência, as alterações que exigiriam a eliminação gradual do arrasto de fundo e das redes de emalhar de fundo abaixo dos 600m caiu automaticamente e não foi votada pelo Parlamento Europeu. Estas alterações diferem da proposta original da Comissão de eliminar progressivamente as redes de arrasto de fundo e as redes de emalhar de fundo para espécies de profundidade "alvo" – algumas poderão habitar águas relativamente pouco profundas, consoante a definição de espécie de profundidade "alvo". 5
Votação da alteração 62 com correções aos votos, p. 27-­‐28 do documento das votações nominais no Parlamento Europeu a 10 de dezembro de 2013 em http://www.europarl.europa.eu/plenary/en/minutes.html 6
http://www.scapeche.fr/actus-­‐1/2014/peche-­‐profonde-­‐la-­‐scapeche-­‐se-­‐felicite-­‐de-­‐laccord-­‐trouve-­‐avec-­‐les-­‐ong Recomendações sobre pontos importantes no texto proposto da regulamentação apresentada pela Comissão em julho de 2012 e alterada pelo Parlamento Europeu (PE) em dezembro de 2013 Definição de pesca direcionada de profundidade (Artigo 4) •
Apoiar a alteração 30 do PE -­‐ Artigo 4 (nº 2-­‐C) (novo) A regulamentação deve definir uma profundidade a partir da qual as pescarias de contacto com o fundo marinho são consideradas pescarias direcionadas, independentemente da percentagem de capturas de espécies de profundidade. Deste modo, assegurava-­‐se a proteção dos ecossistemas de profundidade e era muito mais fácil a monitorização e a aplicação da lei do que com uma definição com base na percentagem de espécies. Proteção dos ecossistemas marinhos vulneráveis (EMV) (Artigo 6) •
Apoiar a alteração 42 do PE – Artigo 6a (novo) As medidas para identificar onde os EMV existem ou são prováveis de existir e o subsequente encerramento dessas áreas à pesca de fundo são um passo crucial para a proteção dos habitats de grande profundidade. Esta alteração serviria para integrar as medidas exigidas nas resoluções 61/105 (2006), 64/72 (2009), 66/68 (2011) da Assembleia Geral da ONU7; as Diretrizes da FAO para a gestão das pescas de profundidade8 e as disposições relevantes dos Artigos 5 e 6 do Acordo sobre Unidades Populacionais de Peixes de 1995.9 A UE esteve amplamente envolvida nas negociações das resoluções da AGNU em 2006, 2009 e 2011, bem como das diretrizes da FAO (2007-­‐2008) e do Acordo sobre Unidades Populacionais de Peixes da ONU, tendo apoiado vigorosamente estas resoluções e instrumentos. Avaliações de impacto das pescas de profundidade (Artigo 7) •
Apoiar as alterações 43-­‐58 do PE As atividades de pesca de profundidade não devem ser autorizadas antes de ser cientificamente demonstrado que não têm impactos adversos significativos nos ecossistemas de profundidade. Tal como acima referido, estas alterações serviriam para integrar as medidas exigidas nas resoluções da Assembleia Geral da ONU, nas Diretrizes da FAO e no Acordo sobre Unidade Populacionais de Peixes da ONU10 para a gestão das pescas de profundidade e cumprimento do Regulamento (CE) n.º 734/2008 do Conselho. O acordo obtido para a realização de avaliações de impacto em pescarias de profundidade no mar alto era um aspeto central do pacote de medidas adotado pela AGNU, nas suas resoluções de pescas sustentáveis de 2006, 2009 e 2011. As medidas adotadas pela AGNU destinam-­‐se, de igual modo, às pescas de fundo em zonas históricas de pesca e zonas de pesca inexploradas. 7
Consultar, em particular, a alínea 83 da resolução 61/105 (2006) da AGNU e as alíneas 119-­‐120 da resolução 64/72 (2009) da AGNU. http://www.un.org/Depts/los/general_assembly/general_assembly_resolutions.htm 8
Diretrizes internacionais para a gestão das pescas de profundidade no mar alto. Roma. FAO. 2009 http://www.fao.org/docrep/011/i0816t/i0816t00.HTM 9
Ver, por exemplo, os artigos 5(g); 6.2 e 6.3(d) do Acordo da ONU sobre Unidades Populacionais de Peixes 10
Ver, por exemplo, os artigos 5(d) e 6.3(d) do Acordo da ONU sobre Unidades Populacionais de Peixes Eliminação progressiva das práticas de pesca destrutivas (Artigo 9) •
Rejeitar a alteração adotada pelo Parlamento e apoiar a eliminação progressiva do equipamento pesqueiro de profundidade mais destrutivo. As redes de arrasto de fundo e das redes de emalhar de fundo de profundidade são conhecidas por ser particularmente nocivas para os EMV e são associadas a níveis elevados de capturas acessórias. Sustentabilidade das unidades populacionais de peixes (Artigo 10) •
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Apoiar as alterações do PE ao Artigo 10.1 Rejeitar as alterações 65-­‐67 do PE e apoiar a proposta da Comissão para o Artigo 10.2 Tendo em conta as suas características de vida (vida longa, baixa fecundidade, reprodução tardia), a maioria das espécies de profundidade é considerada altamente vulnerável à sobreexploração e decréscimo populacional. Só deveria ser permitido pescar estas espécies quando as avaliações aos stocks demonstrassem que poderiam ser pescadas de forma sustentável. Lista de espécies de profundidade (Anexo 1) •
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Classificar todas as espécies de tubarões de profundidade como Muito Vulnerável (marcar com um “X” no Anexo 1) Incluir todas as espécies de tubarões do género Centrophorus (Centrophorus spp.) na lista de espécies do Anexo 1 Eliminar a coluna intitulada “Aplicação diferida do Artigo 4 (2-­‐C)” Todos os tubarões de profundidade do Atlântico Nordeste são considerados particularmente vulneráveis, mesmo em situações de muito baixa mortalidade resultantes da pesca. Em 2013, o CIEM recomendou a inclusão de todas as espécies pertencentes ao género Centrophorus, na lista de tubarões de águas profundas para os quais a UE estabeleceu um total admissível de captura (TAC) de zero. Presentemente, fazem parte desta lista duas espécies de Centrophorus mas pelo menos mais duas que se encontram no Atlântico Nordeste estão omissas. Uma delas, o Centrophorus lusitanicus, tubarão-­‐lusitano, está classificado como Vulnerável na lista vermelha da UICN e inspira preocupação devido à sua limitada área de distribuição, muito baixa fecundidade e à sua exploração por pesca de fundo no Atlântico Nordeste e Centro-­‐Leste. Esta espécie é frequentemente confundida com outra do mesmo género, o Centrophorus granulosus, que se calcula que tenha sofrido decréscimos populacionais de 80 a 95%, nos respetivos locais de pesca do Atlântico Nordeste, um nível de declínio que na realidade se pode aplicar às duas espécies. Em consequência, a Comissão Europeia e o CIEM mostraram preocupações com a possibilidade de espécies de Centrophorus para as quais o TAC é zero tenham sido erradamente identificadas como C. lusitanicus. A regulamentação deve aplicar-­‐se a todas as espécies de profundidade, sem diferimentos. Os diferimentos propostos pelo Parlamento Europeu para dez espécies implicariam que, nos cinco anos seguintes à entrada em vigor da nova regulamentação, a pesca a estas espécies continuaria desregulamentada e isenta das obrigações fundamentais de, entre outras, proteger tanto as espécies como os ecossistemas marinhos vulneráveis de profundidade.