VIDA E OBRA DE MARCELLO MARTINELLI, UM GEÓGRAFO

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VIDA E OBRA DE MARCELLO MARTINELLI, UM GEÓGRAFO
A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
VIDA E OBRA DE MARCELLO MARTINELLI, UM GEÓGRAFOCARTÓGRAFO NA HISTÓRIA...
MIRNA KARLA AMORIM DA SILVA1
Resumo:
No contexto de sua origem, importância e objeto, a história da cartografia se confunde com a história
de seus estudiosos, alguns atores/autores dessa história. A vida e obra do Prof. Marcello Martinelli se
coloca como um exemplo de carreira de um pesquisador e educador em Geografia, especialmente,
na área da cartografia. Neste contexto, este artigo tem o objetivo de apresentar um relato biográfico
sobre o Prof. Marcello Martinelli e suas contribuições para o estudo e ensino da ciência cartográfica.
Foi utilizada uma metodologia de consulta a materiais bibliográficos pertinentes ao tema, entrevista
por meio de questionário direcionado ao professor biografado, consulta ao seu memorial descritivo e
obras publicadas em sua trajetória acadêmica/profissional. Acredita-se que o relato biográfico do Prof.
Martinelli, ora apresentado, seja além de uma homenagem a esta personalidade biografada, um
instrumento instigante na formação e aprimoramento de novos nomes na história da geografia.
Palavras-chave: relato biográfico; cartografia; formação docente.
Abstract:
In the context of its origin, importance and object, the history of cartography is mistaken with the
history of its scholars, some actors/authors of this history. The life and work of Professor Marcello
Martinelli stands as an example of career of a researcher and educator in Geography, especially, in
the area of cartography. Therefore, this article aims presenting a biographical report about Professor
Marcello Martinelli and his contributions to the study and teaching of the cartographic science. We
used a consulting methodology of bibliographic materials relevant to the theme, an interview through a
questionnaire directed to the biography teacher, consulting his descriptive memorial and published
books in his academic/professional path. We believe that Professor Martinelli‟s biographical report,
presented here, is beyond a tribute to this biographee personality, but also an instigating instrument in
the training and improvement of new names in the history of geography.
Key-words: biographical report; cartography; teaching formation.
1 – Introdução
A elaboração de mapas é reconhecida desde antes mesmo da escrita. Mapas
antigos, confeccionados a milhares de anos como, por exemplo, o Ga-sur (Babilônia,
2500 a 4500 a.C), mostram como a história dos mapas se confunde com a própria
história da humanidade. Ciência e arte fazem da cartografia e seus produtos
cartográficos, elementos indispensáveis nos mais variados campos do conhecimento
humano. Assim, a Cartografia passa a ser definida como “a arte de conhecer, de
levantar, de redigir e de divulgar os mapas” e, os mapas, como “uma representação
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- Docente do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia. E-mail de contato:
[email protected]
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geométrica plana, simplificada e convencional, do todo ou de parte da superfície
terrestre, numa relação de similitude conveniente denominada escala” (JOLY, 1990).
Deste modo, a Cartografia destaca-se na ciência geográfica por ser um
instrumento a favor do entendimento da geografia, além de um conteúdo
fundamental para se fazer a própria geografia.
E então, fazer mapa é fazer Geografia? Há quem faça mapas e não seja
geógrafo. Há quem seja geógrafo e nunca tenha elaborado um mapa em sua
formação e/ou atuação profissional. Mas não há trabalho de geografia sem mapas,
nem um mapa que não seja fruto de uma Geografia de fato!
Desde épocas bastante remotas, o homem vem se utilizando da confecção de
mapas como meio de armazenamento de conhecimentos sobre a superfície
terrestre, tendo como finalidade principal, não só conhecer, mas, muito
principalmente, administrar e racionalizar o uso do espaço geográfico envolvente.
[...] Era o começo de uma caminhada em direção ao que hoje conhecemos por
cartografia (DUARTE, 1994).
Assim, desde sua origem e desenvolvimento, a Cartografia se aplica a
estudar e representar a superfície terrestre com o auxílio de diversas ciências, entre
elas, a arte, a matemática, etc. No entanto, Oliveira (1993) destaca que, de todas as
ciências ligadas à cartografia, nenhuma é tão importante como a Geografia, pois os
fatos e fenômenos por ela representados se originam de algum ramo da Geografia,
quer Física, Humana, Econômica, entre outros.
Nesse contexto, de sua origem, importância, objeto, a história da Cartografia
se confunde com a história de seus estudiosos, alguns atores/autores dessa história.
Assim, entre geógrafos e cartógrafos, destacam-se alguns nomes respeitados. E,
não precisamos ir tão longe, nem no tempo, nem no espaço, para citar uma valorosa
contribuição à cartografia e representação gráfica, no campo da ciência geográfica.
Marcello Martinelli e sua obra exemplificam, com distinção, a personificação da arte
e do ensino, em forma de mapas e atlas, em um universo tão vasto e complexo
como o da ciência cartográfica.
A história de sua vida e obra se coloca em meio à discussão de questões
teóricas sobre biografias, diários biográficos, histórias de vida e suas implicações
concernentes às práticas de formação.
Do início dos anos 90 para cá, emergem pesquisas sobre formação de professores
que abordam as histórias de vida, tematizando sobre a memória, as representações
sobre a profissão, os ciclos de vida, o trabalho com a autobiografia ou as narrativas
de professores em exercício, em final de carreira ou em formação. Essa perspectiva
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de pesquisa vincula-se ao movimento internacional de formação ao longo da vida,
que toma a experiência do sujeito adulto como fonte de conhecimento e de
formação, denominada de „abordagem experiencial‟ (SOUZA, 2007).
Nesse contexto, as biografias ou histórias de vida, como esclarece Nóvoa
(2007), apontam fragilidades e ambiguidades que, de certa forma, “têm dado origem
a práticas e reflexões extremamente estimulantes” num envolvimento de diversos
discursos conceituais e metodológicos nesta perspectiva. Porém, em uma
abordagem positiva, conhecer a trajetória de vida pessoal e profissional de
personalidades, de qualquer área de formação, permite empreender uma concepção
do que seria válido como estímulo e reflexão para a formação de outras pessoas,
levando-se em conta que cada um vive em um tempo histórico, com suas
peculiaridades e oportunidades singulares.
Um instrumento utilizado como fonte nesta pesquisa biográfica, se coloca
como outro modelo de narrativa útil nesse processo de conhecimento do outro e,
inclusive de si mesmo: o memorial biográfico. A partir das memórias do sujeito
biografado, ou seja, o relato de trechos significativos de sua trajetória pessoal e
acadêmico-profissional pode-se refletir a formação a partir de
[...] duas dimensões dos memoriais. A avaliativa, que se caracteriza por um projeto
de compreensão de si para o outro [...] e a autoformativa, na qual o narrador
desenvolve um projeto de compreensão de si para si, envolvida nas tramas da
narrativa de vida. A problemática central encontra-se no entrelaçamento do
processo de institucionalização de uma imagem de si, como “eu profissional”, e do
processo de individuação e autoconhecimento de uma imagem de si, como “eu
pessoal” (PASSEGGI, 2006).
No que concerne à formação docente, existem fatores que influenciam o
modo de pensar e atuar, como, por exemplo, “o que são como pessoas, os seus
diferentes contextos biológicos e experienciais, isto é, as suas histórias de vida e os
contextos sociais em que crescem, aprendem e ensinam” (HOLLY, 2007). Desta
forma, todo um contexto de valores (conhecidos e referenciados) e oportunidades se
coloca como determinante na formação de cada indivíduo em sua busca
profissional. Mas, muitas vezes, não há o estímulo e o preparo necessário para a
busca e descoberta por um caminho desejado dentro da profissão escolhida.
Especialmente na área da ciência cartográfica, a formação de professores se
mostra, muitas vezes, deficitária, seja por um déficit da formação inicial dos
docentes ou pela falta de interesse e estimulo pelo conteúdo abordado, o que
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distancia
esses
professores
de
qualquer
motivação
em
aprimorar
seus
conhecimentos a respeito dessa temática.
Assim, Sampaio (2010) e Oliveira (2010) destacam que o estudo da
cartografia tem apresentado vários tipos de dificuldades no sentido de se trabalhar,
aprender e ensinar esta matéria, colocando-a como um „desafio‟ a ser vencido por
poucos professores que se dispõe a habilitar para se sentirem preparados a abordar
e explorar as potencialidades deste conteúdo em sala de aula, com seus alunos.
Desta forma, é extremamente válido conhecer a história de vida e profissional
de professores que transformaram a cartografia em uma profissão e ensinam essa
profissão a outros futuros mestres. A vida e obra do Prof. Marcello Martinelli se
coloca como um exemplo de carreira admirável de um pesquisador e educador em
Geografia, especialmente, na área da cartografia.
Sua vida quase sempre foi rodeada de mapas e sua obra compreende uma
série de trabalhos e pesquisas ligados ao tema central da cartografia e suas
representações gráficas. Martinelli é Professor Livre-docente do Departamento de
Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), da
Universidade de São Paulo (USP), onde iniciou suas atividades em 1976. A partir de
então, atua, especialmente, nas linhas de pesquisa: Cartografia temática,
Cartografia de atlas escolares, Cartografia Ambiental, Cartografia Turística e
Cartografia de atlas estaduais.
Neste contexto, este artigo tem o objetivo de apresentar um relato biográfico
do Prof. Marcello Martinelli e suas contribuições para o estudo e ensino da ciência
cartográfica. Para tal fim, foi utilizada uma metodologia de consulta a materiais
bibliográficos pertinentes ao tema, uma entrevista por meio de questionário
direcionado ao professor biografado, a consulta ao seu memorial do concurso para
professor efetivo (2006) e a consulta às suas obras publicadas (livros, artigos,
trabalhos acadêmicos, etc.) ao longo de sua trajetória acadêmica e profissional.
2 –Enquanto Marcello Martinelli...
Em 13 de Agosto de 1937, cidade de São Paulo/SP, nasceu Marcello
Martinelli, filho de pai italiano, Sr. Ilio Martinelli, e mãe brasileira, Sra. Assunta P.
Martinelli, irmão de Milena e Marino.
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Desde menino, guardava em seu peito o gosto pela arte. O desenho, a
música, o mundo da arte o encantava. Seu primeiro mestre: seu pai. Em uma fábrica
de móveis, o pai ensinava, ao filho Marcello, a arte de produzir móveis a partir de
desenhos e plantas, que seriam os primeiros mapas a ilustrar a sua história tão rica
e repleta de muitos deles. Uma influência decisiva que teria traçado um caminho a
ser percorrido, desde menino. Inegável que tais influências sejam muito importantes
na formação e direcionamento de nossas vidas.
Sua alfabetização começou em casa, por sua mãe, e, a partir de então, os
professores do colégio foram os mestres que lhe ensinaram e mostraram o mundo
dentro das salas de aula. Frequentou o Ginásio Benjamim Constant, o Grupo
Escolar Marechal Floriano da Vila Mariana, o Instituto Estadual de Educação Brasílio
Machado e foi crescendo e sendo educado pelos mestres que passaram em sua
trajetória escolar. Destes, alguns mestres lhe aguçaram ainda mais o gosto pelo
desenho, cuja habilidade e fascínio para com ele, já lhe eram natos.
O destino profissional de Marcello? Com certeza, o caminho das artes. A vida
se encarregaria de lhe mostrar a resposta.
3 – Desenhista-Cartógrafo-Geógrafo Marcello Martinelli...
Inicialmente, Martinelli optou por seguir a carreira de arquiteto, por afinidade
com o cunho artístico da profissão. Entretanto, enlevado por alguns mestres na arte
do desenho, decidiu fazer o curso de Pintura na Faculdade de Belas Artes de São
Paulo, onde se formou em 1963.
Casou-se em seguida e sua esposa, Olga, se tornou sua companheira nas
conquistas e nas dificuldades, pessoais e profissionais... na vida!
Suas primeiras atividades profissionais estiveram ligadas, inicialmente, à
fábrica de móveis do pai e, posteriormente, à elaboração de mapas como
desenhista, junto ao Departamento de Geografia da FFLCH-USP.
Fez parte do quadro técnico que executou o projeto „Atlas do Estado de São
Paulo‟ e desenvolveu diversos trabalhos na preparação de bases cartográficas e
desenhos sob a orientação dos Professores Libault e Bochicchio, do Departamento
de Geografia da FFLCH-USP, no período de 1967 a 1971.
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Nesse mesmo período, Martinelli ingressou, como portador do diploma de
Belas Artes, no curso de Geografia da mesma faculdade. Empolgava-se pelas
disciplinas que solicitavam a confecção de mapas em seus trabalhos escolares e,
desde então, já percebia que havia uma necessidade de uma reflexão crítica de tal
atividade diante da Geografia. A orientação e exemplo de seus mestres, entre eles o
Prof. Libault, o Prof. Bochicchio e a Profa. Maria Adélia, lhe permitiram compreender
melhor a complexidade da ciência cartográfica e sua íntima relação com a geografia.
Obteve o grau de bacharel e licenciado em Geografia no ano de 1971 e, como
geógrafo, ainda continuava o trabalho com mapas e atlas. Passou então, a fazer
parte de uma nova equipe técnica de trabalho na Secretaria de Economia e
Planejamento do Governo do Estado de São Paulo. Em seu primeiro trabalho nesse
cargo, participou da confecção do „São Paulo – Desenvolvimento – Atlas‟, projeto no
qual atuou nas etapas de desenho, de concepção e de construção gráfica das
representações que iriam compor o atlas.
A convite do Prof. José Setzer (USP), Martinelli foi convidado a elaborar a arte
final, diagramação, capa e impressão a cores do „Atlas Pluviométrico do Estado de
São Paulo‟, considerando este como um marco fundamental em sua vida
profissional por ter sido a primeira elaboração cartográfica a realizar sozinho
colocando em prática todo conhecimento adquirido com seus grandes mestres.
No ano de 1973, Martinelli foi convidado, pela Companhia de Melhoramentos
de São Paulo, a integrar a equipe que idealizou um atlas do Brasil (em nível escolar)
intitulado: „Atlas das potencialidades brasileiras – Brasil grande e forte‟. Este trabalho
foi considerado por ele, como um marco em sua reflexão sobre os atlas escolares,
especialmente os mapas temáticos como referências para o ensino da geografia.
Mas Martinelli ansiava mais, sonhava em experimentar todo esse aprendizado
em nível científico. E foi em busca desse ideal.
4 – Mestre, Doutor e Pós-doutor Marcello Martinelli...
Assim, em 1971, Martinelli decidiu cursar a Pós-graduação, em nível de
mestrado, na área de Geografia Humana, junto ao Departamento de Geografia da
FFLCH da USP. Seu mestrado se deu, inicialmente, pela orientação do Prof. Dr.
André Libault e, depois, sob a orientação do Prof. Dr. Pasquale Petrone. O Prof.
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Libault o incentivou a trabalhar com a geografia quantitativista, segundo ele, em
moda na ocasião. Assim, em 1975, apresentou em defesa pública a dissertação
intitulada: „A distribuição de Poisson aplicada ao estudo da área de mar de morros –
uma experiência de aplicação de um modelo probabilístico em Geomorfologia‟,
obtendo o título de Mestre em Geografia.
Em 1980, entrou para o curso de Pós-graduação, em nível de doutorado,
também na área de Geografia Humana, sob a orientação do Prof. Dr. Pasquale
Petrone, tendo concluído suas atividades no ano de 1984. Nesta pesquisa, a partir
de sua experiência vivida na confecção de mapas e atlas direta ou indiretamente
voltados ao escopo do planejamento, desenvolveu uma reflexão metodológica a
respeito da elaboração de atlas de planejamento e seu papel social. Assim, em
defesa pública de sua tese de doutorado, intitulada „Comunicação cartográfica e os
atlas de planejamento‟ obteve o título de Doutor em Ciências Humanas.
Porém, a sede de busca por maiores conhecimentos, conteúdos ainda mais
críticos, completos e elaborados fez Martinelli sentir a necessidade por um
aperfeiçoamento científico em nível de pós-doutorado, no exterior.
Assim, Martinelli realizou um estágio na França e Itália, repleto de cursos e
experiências com grandes mestres, com o objetivo primordial de reciclar seus
conhecimentos sobre a cartografia temática e as representações gráficas.
Em 1989, apresentou outro projeto de pesquisa para um novo curso de pósdoutorado no exterior. A FAPESP, então, auxiliou mais uma série de novos cursos e
novas experiências de aprendizado junto ao seu estágio em diversas instituições da
França, Polônia, Itália, com grandes mestres franceses, poloneses e italianos.
Notável o anseio de buscar por mais conhecimentos e aprimorar ainda mais
sua formação. Motor esse que deveria ser o de muitos mestres que, desmotivados
por motivos diversos, ficam estagnados em sua profissão e não buscam uma
atualização/reformulação teórico-prático-metodológica em suas atividades docentes.
Mas, além de atuar no ramo da geografia e das representações gráficas,
Martinelli ansiou por colocar em prática sua outra formação, a de educador.
Felizmente, essa vontade sim, de ensinar, de educar, aflora no íntimo dos grandes
mestres, naturalmente, sem que seja necessário lhes impor esse caminho.
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5 – Então, Livre-docente, Prof. Marcello Martinelli...
Seu primeiro contato com alunos e o ensino da geografia se deu ao final do
curso de licenciatura em Geografia, no estágio do Colégio Roldão, na Vila Mariana.
Já formado, com seus diplomas de Belas Artes e Geografia, o Prof. Martinelli
começou a ministrar aulas de Desenho no Ginásio Estadual Prof. João Ernesto de
Souza Campos, de março de 1971 a dezembro de 1972. Ministrou ainda, aulas de
Desenho e Geografia na Escola Estadual 1º Grau da Vila Brasílio Machado, de
fevereiro de 1973 a maio de 1974. Para ele, essa experiência inicial foi gratificante e
preparadora para o posterior ingresso como docente no ensino superior.
Em 1976, após receber o título de Mestre em Geografia, foi contratado como
Auxiliar de Ensino no Departamento de Geografia onde atuava, sendo, logo em
seguida, contratado para Professor Assistente da mesma instituição. Inicialmente,
atuou como professor colaborador junto aos cursos de Cartografia I e II, e, após dois
anos, assumiu a responsabilidade efetiva pelos cursos de Cartografia da instituição.
A partir de 1984, passou a atuar como docente no Departamento de
Geografia, em Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP).
Já como doutor, após meados de 1987, o Prof. Martinelli dedicou-se a
orientação de pós-graduandos em nível de mestrado e, depois, doutorado. Muitos de
seus pupilos já se formaram e seguem seus passos na carreira acadêmica.
Em 1999, Prof. Martinelli defendeu sua tese de Livre-docência: „As
representações gráficas da geografia: os mapas temáticos‟ e recebeu o título de
Professor Associado junto ao Departamento de Geografia da FFLCH/USP e uma
nova e maior responsabilidade frente a esta nova posição.
De 2002 a 2004, continuou como representante titular na categoria de
Professor Associado, realizando diversas atividades junto Departamento de
Geografia da FFLCH/USP. E atua como docente para o curso de graduação e pósgraduação em Geografia da mesma faculdade.
6 – Enfim, MARTINELLI, M.
Dentre diversas publicações: livros (de autoria própria ou co-autoria),
capítulos de livros, artigos diversos, foram inúmeras as contribuições do Prof.
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Martinelli para a literatura nacional e internacional e para o ensino da ciência
cartográfica.
Nesta fase, com certeza, sua contribuição para o ensino da cartografia e a
formação docente se destaca perante sua obra. Sem dúvida, muitos docentes, em
diversos níveis educacionais (educação básica, graduação, pós-graduação),
recorrem a suas obras como embasamento para o ensino e compreensão da
cartografia em sala de aula. O próprio Prof. Martinelli destaca em sua produção, os
livros de cartografia e mapas gráficos, além de um atlas geográfico escolar, como
suas principais contribuições em sua obra referente à formação docente
(MARTINELLI, 2011 - Informação verbal)2.
Seu primeiro livro: „Curso de Cartografia temática‟ (Ed. Contexto, São Paulo),
foi publicado em 1991. Primeiro de muitos que ainda viriam marcar sua trajetória...
Este livro, dividido em uma parte teórico e crítica e outra seção prática, tenta levar
ao leitor um domínio mais amplo das representações gráficas, dos fundamentos da
cartografia temática e da metodologia da cartografia temática em si, como uma
proposta inovadora do ensino-aprendizagem na cartografia.
Atlas e artigos diversos também compõem o rol da sua obra no âmbito da
cartografia escolar. O relevante trabalho com os atlas geográficos escolares, em sua
pesquisa, se justifica pela enorme contribuição da utilização dessas obras na
formação de professores do ensino fundamental e médio, para a construção da
noção do espaço e suas representações junto aos alunos, em sala de aula.
Martinelli (2011 - Informação verbal)3 reforça que, muitas vezes, os docentes
se deparam com a dificuldade de trabalhar com a linguagem cartográfica em sala de
aula, por motivos diversos. Para ele, os professores da educação básica adquirem
essa deficiência em sua formação inicial, visto que, muitas vezes, são professores
formados em Pedagogia, os chamados professores polivalentes. Preocupação
pertinente ao nos deparamos com um currículo deficitário nas universidades para
uma formação docente adequada tanto na formação pedagógico-metodológica,
quanto na formação teórico-conceitual dos docentes, em diversas áreas das
ciências, assim como na área da cartografia.
2
3
Trecho de entrevista respondida pelo Prof. Martinelli via email, em Maio de 2011.
Trecho de entrevista respondida pelo Prof. Martinelli via email, em Maio de 2011.
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Assim, a questão de se trabalhar com mapas e atlas em sala de aula, se
coloca complexa quando os professores não possuem habilidade específica para tal
atividade. Para Martinelli (2006 - Informação verbal)4, os professores já deveriam ir
para a sala de aula com o devido preparo para a utilização adequada dos atlas
escolares e a compreensão dos alunos a respeito da linguagem cartográfica.
Reforça ainda, em sua fala, que o uso dos mapas é realizado desde a
institucionalização da Geografia, no início do século XIX, quando se instituiu também
seu ensino nos diversos níveis escolares (fundamental, médio e superior) com o uso
de mapas, permitindo o desenvolvimento desse tipo de obras (atlas), até mesmo
aqueles especificamente dirigidos para o ensino e aprendizagem da geografia.
Percebe-se, em suas pesquisas e publicações, assim como já comentado
anteriormente, a preocupação do Prof. Martinelli em abordar a questão do ensino da
linguagem cartográfica em sala de aula, estímulo para a pesquisa e formação
contínua de docentes da geografia. Felizmente, dentro do quadro atual da educação
no país, ainda encontramos muitos docentes que, ainda que tenham tido uma
formação inicial deficitária a esse respeito, demonstram o interesse em aprofundar
seus conhecimentos e atualizar sua formação no que se refere ao uso e ensino da
linguagem cartográfica. De modo contrário, infelizmente, quem não se interessa,
tragicamente ignora esse conteúdo e essa ferramenta tão importante para a
aprendizagem dos alunos em sala de aula. Retratos da educação.
7 – Considerações finais
A docência é um espaço de construção de inúmeros saberes, que muitas
vezes, ficam à mercê do conhecimento socializado e, neste contexto, as biografias e
histórias de vida surgem como um caminho metodológico-reflexivo e prática de
investigação/formação que auxiliam no processo da formação docente.
Assim, reconhecendo que as experiências e histórias de vida, pessoal e
profissional, influenciam diretamente no estimulo a novos docentes e pesquisadores
da nossa ciência, acredita-se que o relato biográfico do Prof. Martinelli, ora
apresentado, seja além de uma homenagem a esta personalidade biografada, um
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Trecho de entrevista respondida pelo Prof. Martinelli via email, em Maio de 2011.
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instrumento instigante na formação de novos nomes na história da geografia,
especialmente, da cartografia. Cartografia, ciência esta tão bonita e tão temida... tão
vasta e tão tolhida... por professores que, por falta de conhecimento ou anseio,
ignoram um conteúdo e instrumento tão importantes dentro e fora da sala de aula.
Fica o desejo e a esperança que essa temática seja ainda motivo de
pesquisa, ensino e extensão em diversas localidades por diversos atores/autores
dessa mesma história, em um futuro próximo.
Muito já foi feito pelo Prof, Martinelli, entre outros nomes de destaque dentro
da ciência cartográfica. Contudo, em entrevista concedida, ele relata que ainda há
trabalhos/pesquisas a serem realizados ou complementados em sua trajetória e
enfatiza que há “cada dia, vai vivendo uma experiência nova para satisfazer a busca
de uma consolidação dos conhecimentos por ele adquiridos até o momento”
(MARTINELLI, 2006 - Informação verbal)5.
E, felizmente, muitos ainda são os professores e potenciais mestres que
desejam estudar e ensinar a cartografia como profissão. Que sejam prósperos em
sua jornada e que façam história, daquelas boas para serem contadas e recontadas.
Tantos trabalhos compõem a trajetória profissional de Martinelli em seu início
e decorrer de carreira, impossível a ele relatar todos em suas memórias e, a
qualquer um, citá-los no relato de sua trajetória biográfica. Ficam poucas as palavras
e as páginas do artigo para descrever e enaltecer sua contribuição para cada aluno,
cada projeto e trabalho realizado, cada instituição frequentada. Felizmente, muito
dessa trajetória ficou também registrado nas muitas páginas de suas obras!
Marcello Martinelli está fazendo a sua parte e escrevendo a sua história. A
sua dedicação ao ensino, pesquisa e extensão na área da Cartografia merece, sem
dúvida, o devido reconhecimento e respeito da academia que o recebeu, a FFCLHUSP, e de toda a sociedade. A ele, profissional que se dedicou a aprender e ensinar,
de forma crítica e reflexiva, a cartografia e suas representações, nossos
agradecimentos e cumprimentos por tão enriquecedora e motivadora trajetória
pessoal e profissional.
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Trecho de entrevista respondida pelo Prof. Martinelli via email, em Maio de 2011.
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