Apoio didático – Lição 02 – Texto 1

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Apoio didático – Lição 02 – Texto 1
O BATISMO DOS FILHOS DOS CRENTES
“Para vós outros é a promessa, para vossos filhos e para todos os que ainda estão longe, isto é, para
quantos o Senhor, nosso Deus, chamar.” Atos 2.39
Deus faz tudo perfeito. Quando ele fez o plano para a nossa salvação, incluiu uma organização para
nos arrebanhar. Na antiga aliança, essa organização era a congregação de Israel, formada pela nação israelita.
Na nova aliança, é a igreja, formada pelos servos de Jesus Cristo.
A essa altura surge uma pergunta: E as crianças?. Elas herdaram a culpa de Adão e já nasceram
pecadoras. E ainda não dispõem de maturidade psíquica e emocional para entender o evangelho e receber
Jesus como Salvador e Senhor. Qual é a situação espiritual das crianças?
A Bíblia Sagrada mostra que as crianças são herdeiras espirituais de seus pais. Quando os pais se
rebelam contra Deus, as crianças também sofrem as consequências. Mas, quando os pais são fiéis, elas
também são beneficiadas.
As crianças, filhas de crentes, são herdeiras espirituais de seus pais. Pertencem ao Senhor. Por isso têm
direito de receber o batismo e pertencer à igreja.
As crianças que morrem na infância, sendo eleitas, são salvas, independente da situação espiritual de seus
pais. Elas são regeneradas e salvas por Cristo, “mediante o Espírito que opera quando, onde e como quer”.1
O BATISMO E A CIRCUNCISÃO
O apóstolo Paulo mostra que o batismo equivale à circuncisão. Ele escreveu: “Nele, também fostes
circuncidados, não por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo da carne, que é circuncisão de
Cristo; tendo sido sepultados, juntamente com ele, no batismo, no qual igualmente fostes ressuscitados
mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos” (Cl 2.11-12).
Na antiga aliança as crianças eram circuncidadas. Quando Deus estabeleceu a aliança com Abraão, ele
instituiu a circuncisão como sinal e selo do pacto. “Disse mais Deus a Abraão: Guardarás a minha aliança, tu
e a tua descendência no decurso das suas gerações. Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós e
a tua descendência: todo macho entre vós será circuncidado. [...] O incircunciso, que não for circuncidado na
carne do prepúcio, essa vida será eliminada do seu povo; quebrou a minha aliança” (Gn 17.9-10,14). A
circuncisão, por sua natureza, se aplicava apenas às pessoas do sexo masculino. De acordo com os costumes
da época, as mulheres não tinham autonomia para tomar as suas próprias decisões. Elas eram sempre
representadas por um homem: quando solteiras, pelo pai; quando casadas, pelo marido. Por isso, elas não
precisavam receber nenhum sinal do pacto.
Quando Jesus estabeleceu a nova aliança, ele instituiu o batismo como sinal e selo desse novo pacto.
Ele ordenou: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e
do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” (Mt 28.19-20). “Quem
crer e for batizado será salvo; quem, porém, não crer será condenado” (Mc 16.16).
A equivalência entre circuncisão e batismo é bem clara. Lembremo-nos de que a antiga aliança foi
feita com Abraão; e para fazer parte dessa aliança a pessoa tinha de pertencer à descendência de Abraão –
por nascimento, por adesão ou por ter sido comprada. Mas Deus estabeleceria uma nova aliança, mediante
Jesus Cristo, onde a consanguinidade seria substituída pela fé. Discorrendo sobre essa nova aliança, o
apóstolo Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, mostrou que, nela, a descendência de Abraão ocorre mediante
a fé, e não mediante laços consanguíneos. Ele escreveu: “Sabei, pois, que os da fé é que são filhos de Abraão.
Ora, tendo a Escritura previsto que Deus justificaria pela fé os gentios, preanunciou o evangelho a Abraão:
Em ti, serão abençoados todos os povos. De modo que os da fé são abençoados com o crente Abraão. Cristo
nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar, porque está escrito:
Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro; para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios, em
Jesus Cristo, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido” (Gl 3.7-9,13-14). Portanto, para fazer
parte da nova aliança a pessoa precisa crer em Jesus Cristo como Salvador e Senhor. O sinal e selo da antiga
1
Confissão de Fé de Westminster, Declaração Explicativa, parágrafo II.
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aliança era a circuncisão. O sinal e selo da nova aliança é o batismo. Na antiga aliança, o Senhor mandou
circuncidar (Gn 17.9-14); na nova aliança, o Senhor mandou batizar (Mt 28.18-20; Mc 16.15-18). Se os
filhos dos crentes da antiga aliança recebiam o sinal e selo da aliança, somos levados a concluir que os filhos
dos crentes da nova aliança devem receber o batismo, que é o sinal e selo dessa aliança.
Algumas pessoas perguntam: Se o batismo equivale à circuncisão, por que Jesus e os apóstolos foram
batizados, se eles tinham sido circuncidados? A resposta é que Jesus e os apóstolos viveram no período de
transição entre a antiga e a nova aliança. Eles foram circuncidados porque eram descendentes de Abraão e
pertenciam à antiga aliança. Foram batizados porque pertenciam à nova aliança, estabelecida por Jesus
Cristo. Eles pertenceram às duas alianças e receberam o sinal e selo de ambas: a circuncisão e o batismo. Da
mesma forma, eles celebravam a Páscoa, que fazia parte da antiga aliança, e a Ceia do Senhor, que faz parte
da nova aliança.
O BATISMO DE CRIANÇAS NO NOVO TESTAMENTO
Apesar de todas essas evidências, algumas pessoas ainda insistem na pergunta: Onde está escrito na
Escritura Sagrada que as crianças devem ser batizadas? Explicitamente não está escrito em lugar nenhum.
Mas a ausência de tal determinação explícita não anula práticas anteriores nem aquilo que se pode deduzir de
outros ensinos. Caso dependêssemos de uma ordem explícita, registrada na Escritura, para estabelecermos
práticas na igreja, não poderíamos permitir que as mulheres participassem da Ceia do Senhor, pois quando a
Ceia foi instituída só homens participaram, e não existe nenhum texto que afirma explicitamente que as
mulheres também devem participar dela. No entanto, ninguém questiona o direito que as mulheres têm de
participar desse sacramento.
O Novo Testamento não diz explicitamente que as crianças devem ser batizadas. Mas implicitamente
ensina o batismo de crianças. Veja estas três inferências bem claras:
a) O apóstolo Paulo relaciona o batismo com a circuncisão sem afirmar que as crianças estão excluídas
do batismo. A equivalência entre batismo e circuncisão é muita clara, conforme já vimos. Na antiga aliança,
as crianças que nasciam dentro do pacto, isto é, os descendentes de Abraão, eram circuncidadas ao oitavo
dia. Já que o batismo é “a circuncisão de Cristo” (Cl 2.11) na nova aliança, seria necessário uma ordem
explícita para que as crianças que nascem no pacto, isto é, filhos de crentes, fossem impedidas de recebê-lo.
b) O Novo Testamento registra o batismo de pelo menos três famílias inteiras, sem mencionar que as
crianças não foram batizadas. Lídia foi batizada juntamente com toda a sua casa (At 16.15); o carcereiro foi
batizado, e também todos os seus (At 16.33). Paulo declara ter batizado “a casa de Estéfanas” (1Co 1.16).
c) No batismo da casa de Lídia é possível que crianças tenham sido batizadas. “Certa mulher, chamada
Lídia, da cidade de Tiatira, vendedora de púrpura, temente a Deus, nos escutava; o Senhor lhe abriu o coração
para atender às coisas que Paulo dizia. Depois de ser batizada, ela e toda a sua casa, nos rogou, dizendo: Se
julgais que eu sou fiel ao Senhor, entrai em minha casa e aí ficai. E nos constrangeu a isso” (At 16.14-15). Lídia
e toda a sua casa receberam o batismo. Nesse mesmo capítulo está registrado o batismo do carcereiro e de todos
os seus. No caso do carcereiro, está registrado que “ele, com todos os seus, manifestava grande alegria, por
terem crido em Deus” (At 16.34). Logo, entre os filhos do carcereiro havia adultos que também creram e foram
batizados. Mas, no caso de Lídia, o registro bíblico cita apenas a conversão dela. Mas ela e toda a sua casa
foram batizados. Se seus filhos eram adultos, então foram batizados sem conversão. Paulo não faria isso. Logo,
os filhos de Lídia eram crianças, que foram batizadas juntamente com sua mãe.
Mas existe ainda outra objeção a ser respondida. É a que se refere à necessidade de fé para receber o
batismo. Jesus afirmou: “Quem crer e for batizado será salvo”. E algumas pessoas, baseadas nesse texto,
afirmam que as crianças não podem ser batizadas porque não têm maturidade psíquica e emocional para
exercer a fé. Só que tais pessoas se esquecem de que o texto diz também: “quem, porém, não crer será
condenado”. Se o texto se referisse também às crianças, teríamos de concluir que elas serão condenadas. Mas
Jesus disse que delas “é o reino de Deus” (Mc 10.14). Logo, o texto se refere aos adultos que iam ouvir o
evangelho. Se eles cressem e recebessem o batismo, estariam salvos. Se não cressem, seriam condenados.
O batismo dos filhos dos crentes é praticado na Igreja Cristã desde o seu início, como parte da doutrina
dos apóstolos. Existem registros históricos da maior confiabilidade mostrando a prática do batismo infantil
na igreja, desde o seu início. Orígenes, grande teólogo e escritor cristão, nascido no ano 185, em suas
Homilias em Lucas, afirma: “portanto as crianças são também batizadas”; em seus Sermões sobre Levítico
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ensina que “as crianças também, segundo o costume da igreja” eram batizadas; e em seu Comentário de
Romanos registra que “a igreja recebeu dos apóstolos a tradição de batizar também as crianças”. Hipólito,
outro grande teólogo e escritor cristão do século 2º, em sua obra Tradição apostólica, testemunha que a
Igreja Cristã daquela época batizava crianças. Tertuliano, considerado o primeiro teólogo latino, em sua obra
De Baptismo, escrita por volta dos anos 200-206, embora tenha cometido alguns desvios doutrinários,
também testemunha que a Igreja Cristã batizava crianças.2 Só a partir do século 16, com o surgimento dos
anabatistas, é que o batismo de crianças passou a ser contestado.
OS BENEFÍCIOS DO BATISMO DOS FILHOS DOS CRENTES
Alguns pais perguntam: o que vou ganhar batizando meus filhos?
Essa pergunta deveria ser acompanhada de uma outra: o que vou perder se não batizar meus filhos?
Na antiga aliança, a criança que não fosse circuncidada era excluída do pacto, não pertencia ao Senhor
(Gn 17.14). Por analogia, somos levados a concluir que os pais que não apresentam seus filhos para o
batismo os estão excluindo da nova aliança. Isso não significa que esses pais estão condenando seus filhos ao
inferno. Mas os estão colocando na mesma condição dos filhos daqueles que não têm Jesus como Salvador e
Senhor. É a mesma situação de um pai muito rico que deixa de reconhecer um filho. Esse filho fica excluído
da herança, a não ser que ele provoque esse reconhecimento por via judicial. Em Cristo nós temos uma
grande herança de bênçãos espirituais; e não é justo privarmos os nossos filhos dessa herança.
Os nossos filhos, como nossos herdeiros espirituais, têm direito às mesmas bênçãos que nos estão
reservadas. Eles pertencem ao Senhor, por isso são guiados e protegidos pelo Senhor. Eles só perderão o
direito a tais bênçãos se nós os excluirmos do pacto. Quando se tornam adultos, eles passam a responder
espiritualmente por eles próprios. Aí compete a eles decidir se vão permanecer na fé em que foram criados e
confirmar isso pela aceitação de Jesus como Salvador pessoal e Senhor, ou se vão renunciar às bênçãos de
pertencer ao Senhor. Não existe meio-termo. Jesus afirmou: “Quem não é por mim é contra mim; e quem
comigo não ajunta, espalha” (Mt 12.30).
Alguns pais alegam que não apresentam seus filhos para o batismo porque religião é algo muito
pessoal, cuja escolha deve ser feita pelo próprio indivíduo. Preferem instruir seus filhos e deixar que eles
mesmos, na idade apropriada, escolham o caminho que devem seguir. Mas esses mesmos pais “não sentem o
mesmo embaraço quando lhes escolhem um nome, vestuário, alimento, medicamentos, educação, etc. Qual
pai ou mãe espera o filho ou a filha crescer para decidir sozinho se quer ir à escola, comer determinado
alimento indispensável à saúde, decidir se toma ou não vacina, se quer ou não ir ao médico? Ora, se nós, no
propósito de fazer o melhor para o bem-estar dos filhos, tomamos decisões que irão afetá-los por toda a vida,
por que não consagrá-los a Deus pelo batismo, quando Deus tem promessas e deseja salvar toda a família?”3
Mas as bênçãos espirituais que nossos filhos irão receber como nossos herdeiros não dependem apenas
do batismo, mas também da nossa fidelidade ao Senhor. Acã tinha sido circuncidado, circuncidara seus
filhos, mas se tornou infiel ao Senhor. Como resultado, morreu juntamente com toda a sua família (Js 7.1626). Crentes infiéis não têm herança de bênçãos espirituais para legar aos seus filhos, mesmo que os
apresentem para receber o batismo.
CONCLUSÃO
O povo de Deus é formado por adultos e crianças. Os adultos receberam Jesus como Salvador e
Senhor. São filhos de Deus. Pertencem ao Senhor. As crianças, seus filhos, são herdeiras espirituais dos pais.
Como herdeiras espirituais, têm direito às mesmas bênçãos. Por isso devem ser batizadas. Deixar de batizálas é excluí-las dessa herança bendita. O nosso Deus é também o Deus de nossos filhos.
A Bíblia é nossa testemunha, Adão Carlos Nascimento, Editora Cultura Cristã
2
3
Áureo Rodrigues de Oliveira, O Estandarte, março de 1998, p. 14.
Áureo Rodrigues de Oliveira, idem, fevereiro de 1998, p. 14.
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CIRCUNCISÃO
(‫מל‬, ‫ ;מולת‬peritomh,)
Esta palavra deriva-se do latim e significa literalmente “cortar em volta”. A referência bíblica é
a uma cirurgia na qual o prepúcio (pele que cobre a glande do pênis do homem) é removido. Hoje, a
maioria dos bebês nascidos no mundo ocidental passa por esta simples operação na infância, por
considerações higiênicas.
Nos tempos bíblicos, a circuncisão era amplamente praticada entre os semitas do ocidente,
incluindo os hebreus. Muitas referências sugerem que a circuncisão se tornou uma marca racial e de
orgulho cultural. Os filisteus, e mais tarde os gregos, foram mencionados de forma zombeteira como
os “incircuncisos” (Jz 14.3; 15.18; 1Sm 14.6; 17.26; 2Sm 1.20; 1Cr 10.4; At 15.1; Gl 5.1-12). Os
hebreus parecem ter percebido que a circuncisão promove asseio. Com o tempo, a prática adquiriu
uma conotação espiritual, sugerindo que o circunciso era santo, enquanto que o incircunciso era
espiritualmente corrupto. Além disto, entre os judeus a circuncisão parece ter exercido uma função
análoga à do batismo cristão. Era um sinal ou símbolo de purificação e compromisso para com o
relacionamento de aliança com Deus. Para alguns pensadores rabínicos ela se tornou mais do que um
símbolo; tornou-se uma necessidade. Um homem deveria ser circuncidado para ser membro da
comunidade da aliança. Uma relação de causa e efeito foi visualizada. Esta crença foi transferida para
a Igreja Primitiva e se tornou um importante ponto de discussão nas primeiras décadas. Paulo foi
incomodado com este assunto através de seu ministério (At 15; 16.1; 21.17-32; Gl 5.1-12).
A circuncisão encontrou aceitação entre as sociedades primitivas vastamente dispersas pelo
mundo. Antropólogos têm descoberto tribos na América, África e Austrália praticando este rito.
1. Teorias da Origem. É atribuída a Yahweh a introdução da circuncisão como sinal da
aliança (Gn 17.10-14). O derramamento de sangue, o cortar, é universalmente associado com o
estabelecimento de uma aliança, tanto no AT como no mundo antigo. Tendo sido dada dentro do
cenário do fracasso de Abraão em ter filhos com Sara, a circuncisão pode ter significado
simbolicamente: estou submetendo minha capacidade de procriação e meu futuro a Yahweh; estou me
tornando totalmente dependente dele; se eu tiver descendentes sufi cientes para que venha a ser uma
grande nação será pelos feitos de Yahweh, não meus próprios. Podemos bem imaginar que este foi o
supremo sacrifício para o patriarca. Esta teoria da origem é chamada:
A. Operação sacramental. Estudos sobre práticas de circuncisão, feitos pelos antropólogos,
têm resultado em várias teorias naturalísticas sobre a origem desta prática. Visto que Gênesis 17.10-14
é atribuído ao Código Sacerdotal pelos críticos textuais, alguns estudantes questionam a autenticidade
deste registro. Além disto, a arte egípcia de tumbas descreve a prática da circuncisão como anterior à
curta passagem de Abraão lá. Abraão deveria estar familiarizado com esta prática antes dos eventos
descritos em Gênesis 17. Consequentemente, a eficácia e honestidade exigem a consideração destas
outras teorias.
B. Operação higiênica. Na antiguidade Heródoto sugeriu que a explicação para a prática
egípcia seria a de higiene pessoal. Certamente, o prepúcio pode ser um incubador e carregar sujeiras e
doença social. Entretanto, esta explicação não leva em consideração a identificação universal da
circuncisão com sacrifício religioso.
C. Marca tribal. Muitas pessoas fazem tatuagem ou cicatrizes para que sejam facilmente
identificados por outros membros de suas tribos. Com a nítida distinção feita pelos hebreus entre
circuncisos e incircuncisos, certamente a circuncisão compartilhou desta função na vida hebraica.
Entretanto, como a marca da circuncisão não poderia ser prontamente percebida em situações
normais, esta não pode ser a explicação primária para a origem desta prática.
D. Rito de passagem. Muitas tribos ao redor do mundo têm praticado a circuncisão como
parte de uma cerimônia que marca a passagem de machos da infância para a fase adulta. Geralmente
isto ocorre perto da época da puberdade. Alguns estudiosos têm sugerido que esta tenha sido a origem
desta prática entre os hebreus, sendo subsequentemente mudada para a infância devido ao sofrimento
envolvido neste ato. Não há verdadeira base textual para esta reconstrução. Os judeus estabeleceram o
oitavo dia (Gn 17.11,12; Lc 1.59) como o tempo para a circuncisão. Para os convertidos ao judaísmo,
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entretanto, a circuncisão era algo como um rito de passagem. Ela marcava seu compromisso e entrada
no relacionamento de aliança com Yahweh. Infelizmente, como pode ser observado em Jeremias 4.4 e
Deuteronômio 10.16 e 30.6, muitos dos judeus naturais eram circuncidados fisicamente, mas
falhavam em perceber o significado simbólico e espiritual deste ato.
E. Sacrifício humano vicário. Com o fim da prática de sacrifício humano, uma grande porção
de cada macho era sacrificada como uma oferta substitutiva. Entretanto, não há evidência de que os
hebreus praticassem sacrifício humano, exceto talvez por grupos apóstatas sob a influência de
religiões pagãs (Lv 18.21; Ez 16.20).
É a opinião deste autor que, embora algumas destas teorias possam estar relacionadas às razões
que apoiem a prática da circuncisão, não há nenhum motivo que nos obrigue a rejeitar o relato da
origem como é mostrado em Gênesis 17.10-14. A circuncisão era uma operação sacramental.
Compromissos são assumidos mediante o sangue entre os povos da antiguidade. Alianças são seladas
mediante o derramamento de sangue. A circuncisão, o cortar do órgão genital de alguém, simbolizava
a dependência última de uma pessoa de Yahweh e comprometimento com sua vontade. Entendida
corretamente, a circuncisão é um rito muito significativo.
II. A prática judaica. O rito da circuncisão era um sinal de que alguém era membro da
comunidade da aliança. Não há motivo para duvidar de que a prática tenha surgido com a origem da
nação hebraica. Vários relatos antigos acerca da circuncisão são de interesse aqui, embora apareçam
em passagens difíceis.
Primeiramente, há o relato em Gênesis 34 acerca dos siquemitas submetendo-se à circuncisão
e sendo, subsequentemente, assassinados. Este registro confirma a argumentação de que a circuncisão
foi adotada bem cedo. Também indica que outros semitas foram vagarosos no adotar esta prática.
Em segundo lugar, há o relato da circuncisão de Moisés e/ou de seus filhos (Êx 4.24-26). Esta
é uma passagem muito difícil. Da forma como é apresentada, logo após uma profecia dos eventos da
primeira Páscoa, esta parece ter sido uma lição para Moisés acerca do poder de Deus e da seriedade da
tarefa apresentada a ele. Aparentemente, Moisés não havia ainda trazido seus filhos para a aliança
mediante a circuncisão.
Em terceiro lugar está o relato sobre Josué circuncidando todos os machos hebreus, quando
entraram na terra e preparavam-se para a conquista (Js 5.2-7). Como o antigo escritor explica, este foi
o momento de juntar os diversos grupos que haviam constituído a multidão do Êxodo e transformá-los
em um grupo unido. Aqui a circuncisão torna-se uma “marca tribal”.
Em quarto lugar está o “dote” de Davi para ter a filha de Saul, Mical, como esposa, 200
prepúcios de filisteus, duas vezes mais do que o requerido por Saul (1Sm 18.20-29). Esta foi uma
proeza de valor e de desdém pelo inimigo.
A circuncisão é ordenada nos códigos da lei apenas de passagem, como parte de uma
referência à Páscoa (Êx 12.48), e nos ritos de purificação que se seguem ao nascimento (Lv 12.3). O
fato de que a ordem é raramente apresentada parece indicar que a circuncisão era uma prática
amplamente aceita, não exigindo longas prescrições.
Nos tempos de Jesus, a circuncisão era realizada no Templo ou na sinagoga, por um sacerdote.
Antes disto, era uma atividade familiar, realizada em casa. É interessante notar que a tradução literal
de avô (‫ )חתן‬é aquele que circuncida. Talvez fosse ele quem habitualmente praticasse este ato nos
filhos de suas filhas. Também, nos tempos de Jesus, o ato de dar nome à criança era parte da
cerimônia da circuncisão.
Entre os judeus a circuncisão era uma marca de distinção. Os incircuncisos eram vistos com
desprezo. Esta atitude etnocêntrica deixa para trás a controvérsia sobre a circuncisão na igreja cristã.
Este etnocentrismo também cegou a muitos quanto ao sentido real do rito, o qual se tornou
uma forma de prática religiosa externa, carecendo de conteúdo espiritual. Como tal, foi condenado
pelos profetas. Jeremias tentou alcançar o sentido real da prática ao introduzir o conceito de “coração
circunciso” (Jr 4.4). Seus contemporâneos acreditavam que Deus estava do lado deles. Mas não era
assim, clamava Jeremias. A religião deve ser internalizada. Os símbolos não podem ser esvaziados de
seus significados, nem se pode permitir que permaneçam sozinhos. O significado da circuncisão
deveria ser o de simbolizar um compromisso de alguém para com a vontade de Deus, continuamente.
É um sinal externo de um coração, o âmago da personalidade de alguém, dedicado a fazer a vontade
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de Deus. Paulo assume esta linha de pensamento em Romanos 4.9-13, onde ele argumenta que a
circuncisão não é a causa da promessa de Deus a Abraão; antes, é um ato de fé simbolizando a
confiança de Abraão na capacidade de Deus de fazer o que prometeu.
A história da circuncisão ilustrou um dos paradoxos mais básicos que contaminam a religião.
O homem precisa de símbolos como meio de expressar a fé religiosa. Repetidamente, porém, os
símbolos se tornam fins em si mesmos, perdendo seu propósito e seu poder originais. Os símbolos
devem ser renovados periodicamente ou então descartados.
III. Controvérsia na Igreja Primitiva. Os cristãos da primeira geração eram judeus. Muitos,
se não a maior parte deles, continuaram a frequentar as sinagogas e o Templo (At 5.42; 6.7). Eles não
se consideravam uma nova religião, mas sim um movimento de reforma dentro do Judaísmo. O
assunto central nos primeiros capítulos de Atos é a questão se Jesus era ou não o Messias. Mesmo
durante a perseguição dirigida por Saulo (Paulo), os cristãos permaneceram dentro de Judaísmo
(9.1,2). A marca essencial de distinção era a experiência do poder e atividade do Espírito Santo na
vida deles.
Entretanto, à medida que o número dos convertidos dentre os gentios começou a se
multiplicar, uma grande controvérsia surgiu (At 10-15). Essencialmente o problema era este: visto que
a circuncisão é a marca do povo da aliança e visto que Cristo trouxe e está trazendo o cumprimento
das promessas da aliança, não seria necessário que alguém fosse circuncidado (tornando-se um judeu
prosélito) para participar das promessas? Em outras palavras: é necessário que alguém se torne judeu
antes de poder ser um seguidor de Cristo? Em Jerusalém foi formado um “partido da circuncisão”.
Contra este grupo estavam Paulo e seus seguidores. Pedro parece ter vacilado neste assunto (At 11.15;
Gl 2).
O relato sobre o primeiro concílio da igreja está registrado em Atos 15. Embora existam alguns
problemas de harmonização, Gálatas 2 é geralmente considerado como o relato de Paulo sobre este
concílio (alguns acreditam que Gálatas 2 esteja se referindo a uma visita anterior de Paulo a
Jerusalém, mencionada em Atos 11.27-30). Aqui Paulo ganhou o apoio dos líderes da igreja. A
circuncisão não foi mais exigida como pré-requisito para alguém ser reconhecido como membro da
comunidade cristã. Os únicos requerimentos eram: abandonar a adoração pagã e fugir da imoralidade
(At 15.19-21).
Embora Paulo tenha obtido a vitória no concílio, o problema continuou a persegui-lo (Gálatas
e grande parte de Romanos são dedicados a este assunto). Os judaizantes seguiam-no de cidade em
cidade e finalmente conseguiram aprisioná-lo em Jerusalém, acusando-o de profanar o Templo,
introduzindo ali um grego não-prosélito (At 21). É provável que a controvérsia acerca da circuncisão
tenha feito Paulo repensar o conjunto do legalismo judeu e chegar a sua posição acerca da primazia da
fé (Gl 2.15-21) e da morte sacrifical de Cristo. Neste sentido, a controvérsia em torno da circuncisão
foi não somente a primeira, mas também a mais importante, controvérsia na história da igreja.
Paulo ensinou que o símbolo não deve ser confundido com seu significado. A fé, e não a
circuncisão, era a base da aliança de Deus com Abraão (Rm 4.9-12). Circuncisão, pureza e
compromisso em fazer a vontade de Deus são aquilo que deve ser desejado (Rm 2.29).
IV. Relevância da circuncisão para os dias atuais. Paulo declarou que a circuncisão não era
para ser tida como o símbolo-chave da nova aliança. O que a substituiu? O Batismo (Cl 2.8-15) deve
ser interpretado como tal. Todavia, ele sofre o mesmo perigo de ser confundido com aquilo que deve
significar. Tanto Paulo quanto o autor de Hebreus evitam esta identificação óbvia. O sacramento mais
apropriado é o da Ceia do Senhor, e Paulo assim rotula o cálice (1Co 11.25). A vantagem deste
símbolo é a de que deve ser repetido regularmente durante a vida adulta. Consequentemente, o crente
é confrontado repetidamente com o significado deste símbolo.
BIBLIOGRAFIA. T. Lewis, “Circumcision”, ISBE, I (1915), 656, 657; R. Bultmann, Theology of the New Testament, I
(1955), 108-114; R. Patai, Sex and Family in the Bible (1959), 195-204; J. P. Hyatt, “Circumcision” IDB, I (1962), 629631.
G. E. FARLEY
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