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LATIFUNDIO MIDIOTA 47-54.pmd
Publicado no jornal Hora do Povo, no Portal do Mundo do Trabalho e no Vermelho em
10-6-2010
SADISMO E COVARDIA MARCAM AGRESSÃO
ISRAELENSE AOS TERRITÓRIOS OCUPADOS
“A maioria das crianças foi baleada na cabeça ou na par
te superior do
parte
corpo. Os alvos mais comuns das balas de aço revestidas com borracha foram
os olhos das nossas crianças
”. H
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crianças”.
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Educação
Superior P
alestina, denunciando em 2000 a ““violência
violência indiscriminada
Palestina,
e o reinado do terror” promovido por Israel nos territórios ocupados.
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
D
ez anos se passaram desde que estive em Gaza em novembro
de 2000 acompanhando como jornalista da Hora do Povo uma
delegação da Federação Mundial das Juventudes Democráticas (FMJD), entidade consultiva da Organização das Nações
Unidas (ONU). O objetivo da visita era permitir que representantes do
Brasil, França, Itália, Grécia, África do Sul, Nova Zelândia, Índia e Chipre
pudessem ver de perto a barbárie promovida por Israel nos territórios ocupados e dar o seu testemunho pessoal. Naquele tempo, um milhão de pessoas, 75% refugiadas, encontravam-se confinadas em um espaço de apenas
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362 quilômetros quadrados. Hoje, somam um milhão e meio, o equivalente à população de Recife ou Porto Alegre, sob escombros e vitimadas pela
guerra química.
Os guardas israelenses não entenderam como havíamos conseguido driblar as inúmeras barreiras erguidas para manter sitiadas as cidades palestinas e, enfim, chegado à Faixa de Gaza. Adel, nosso motorista "árabe-israelense", disse simplesmente que não tinha visto nada. Todos na van confirmaram e o soldado foi contatar um superior. Voltou acompanhado do mais
velho e de outros, todos já com o dedo no gatilho das metralhadoras. Pediram os passaportes e ficaram surpresos com a variedade das procedências.
“Para quê nos dirigíamos à cidadela da sub-raça?”, nos inquiriam. Confirmaram não haver ali nenhum palestino, nos olharam fixamente, checaram
as fotos e após algumas palavras em hebraico decidiram nos liberar. Mal sabíamos que no outro dia iriam bombardear indiscriminadamente a simpática
e milenar Hebron, de onde acabáramos de partir.
Ainda trago comigo a sensação do ar carregado no acesso de chegada a
Gaza, da aduana militarizada, da polícia israelense monitorando todos os
movimentos. Após o sim dos guardas, começamos a caminhada em direção
ao “lado inimigo”, onde nos aguardava uma representação palestina. No
corredor, de cerca de um quilômetro completamente murado – ainda não
havia o gigantesco muro construído por centenas de quilômetros – se sobressaíam cercas e rolos de arame farpado, semelhantes às dos campos de
concentração nazistas, despejando pontas e sombras fúnebres que emprestavam contorno ainda mais cinzento à paisagem, já tingida pela fumaça, e
tornavam os passos mais pesados.
Uma sensação claustrofóbica, intensa e constante nos
acompanhou durante toda a
visita ao árido e minguado território, cuja concentração populacional já se encontrava
entre as maiores do mundo.
Ali, em tempos de “normalidade”, os poucos trabalhadores palestinos que tinham au48 Latifúndio Midiota: crime$, crise$ e trapaça$
torização passavam numa catraca eletrônica, tendo de apresentar aos guardas sionistas suas carteiras e digitais, com a comprovação do emprego em
Israel. Atualmente, o portão está fechado, o que impede milhares de pais de
família de garantirem o seu sustento.
Em meio à grave crise econômica, que somava
então centenas de milhares de desempregados, obrigando boa parte da população a sobreviver da ajuda internacional, hospitais lotados de feridos, ausência de medicamentos e equipamentos, corre-corre
nos corredores das enfermarias em meio ao cheiro
da morte... Fotografei ambulâncias crivadas de balas, um sem número de crianças alvejadas, o caos
materializado em poças de sangue, urros de dor e
lágrimas da perda de entes queridos.
Como se me estimulasse a não desanimar, o pequeno Tarek, de apenas 11 anos, fazia o “V” da viComo se me
tória, com o braço estilhaçado por balas de fuzil. O
estimulasse
a não
pai, ao lado, olhava com admiração a determinação
desanimar, o
do filho em continuar com o ato simbólico de expequeno
Tarek, de
pulsão do invasor, tantas vezes repetido como odiaapenas 11 anos,
do e temido pelos agressores israelenses. Um gesto
fazia o “V” da
altivo, que desvela a certeza da continuidade da invitória, com o
submissão.
PUNIÇÃO ISRAELENSE
braço estilhaçado
por balas de fuzil
O sangue que jorrava generoso daqueles jovens era o resultado da punição
israelense pelo levante popular palestino, pela segunda Intifada, iniciada após
uma provocação do carniceiro Ariel Sharon à Esplanada das Mesquitas, em
Jerusalém Oriental, acompanhado por sua guarda pretoriana. Vale destacar
que Sharon já havia chacinado mais de duas mil crianças, mulheres e idosos
nos campos de refugiados palestinos de Sabra e Chatila, no Líbano, em 1982,
o que dá a dimensão do ato de profanação ao lugar sagrado.
Lembrei da primeira Intifada, em 1987, iniciada precisamente em Gaza,
após um caminhão militar israelense ter atropelado vários trabalhadores
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palestinos, em levante popular que
durou até 1993. Como flashes, se
sucedem imagens da nossa visita,
somadas a outras, como a do assassinato do menino Mohamad El
Dura, de 12 anos, no bairro de AlBraj, em Gaza, com o pai pedindo
para que os soldados de Israel parassem de atirar. A imagem correu
mundo, bem como a cínica “justificativa” do porta-voz do governo
israelense: “Ele já esteve em manifestações”. Visitamos o bairro de Al
Braj e a guarnição de onde foi chacinado. Uma aberração sem limites. Deparávamos com a covardia Palestinos recordam o assassinato do
da ocupação em cada cidade e, pramenino Mohamad El Dura, 12 anos,
pelas tropas de ocupação em Gaza
ticamente, em cada esquina.
Recordo de uma conversa com psicólogas, em Ramalah, e a descrição do
impacto do terror e da incerteza das crianças palestinas quando ouviam as
diárias movimentações militares israelenses. Um temor plenamente justificável, racional, perfurando a pureza com ponta de baioneta, antecipando o
fim da infância.
Durante a nova Intifada, relatou Hanan Ashrawi, ministra
da Educação Superior Palestina, “a maioria das crianças foi
baleada na cabeça ou na parte
superior do corpo. Os alvos
mais comuns das balas de aço
revestidas com borracha foram
os olhos das nossas crianças”.
Ela denunciou a “violência inCharge publicada em jornais palestinos discriminada e o reinado do terdenuncia brutal perversidade israelense ror” promovidos por Israel.
50 Latifúndio Midiota: crime$, crise$ e trapaça$
Nos olhos das crianças? Infelizmente era isso o que queria dizer a presença
nos hospitais de tantos meninos com os olhos vendados. De um lado, um
soldado israelense com mira telescópica e a mais avançada tecnologia made in
USA; mãos insurgentes de outro, jogando pedras no invasor, carregadas de
esperança. Como punição, tiros certeiros. Naqueles dias, as 52 vítimas infantis mais graves só puderam ser encaminhadas à Alemanha em um voo de
emergência após ampla pressão da comunidade internacional em apoio à
reivindicação da Autoridade Nacional Palestina (ANP).
Da mesma forma que havia preferência por atirar contra as crianças palestinas balas de aço revestidas com borracha – para cinicamente cegar e
mutilar, sem o ônus da morte – contra os manifestantes, em geral, a ordem
era matar. Os bombardeios israelenses contra um cemitério de Gaza em
meados de janeiro de 2009 dão um quadro de até onde vai a perversão, que
não permite descanso sequer aos mortos palestinos.
Segundo Ashrawi, renomada lutadora pela paz e pelos direitos humanos, cujas atuações nas conversações de paz em Oslo,
Madri e Washington ganhou
reconhecimento internacional, “a política de atirar para
matar ou aleijar permanentemente está em vigor no exército israelense”. Descrevendo
a violência indiscriminada de
então – elevada agora a enésima potência – Ashrawi lembrou que o exército de ocupação sionista se utilizou de
“munição letal, tanques e helicópteros bombardeios”, buscando impor sua política de
“O objetivo de matar é claro: 60% dos
palestinos mortos recebeu um tiro na testa”, anexação ilegal e “tentando fodenunciou o doutor Jihad Massal, vice- mentar um sub-país de banpresidente da União dos Médicos da Palestina. tustões isolados, dentro do reManchete do HP: “Israel fora da Palestina!” gime de apartheid de Israel”.
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Os bantustões foram a forma clássica utilizada pela minoria branca para
reprimir os negros durante o regime de segregação racial na África do Sul,
sustentado política, econômica e “moralmente” ao longo dos anos pelos
governos dos EUA e Israel.
“O objetivo de matar é claro: 60% dos palestinos mortos recebeu um
tiro na testa”, denunciou o doutor Jihad Mashal, vice-presidente da União
dos Médicos da Palestina, alertando que “com os territórios fechados pelas
tropas de ocupação, a maioria dos transportes está parado, com gravíssimas
consequências para a saúde da população”.
Conforme o diretor da Comissão Nacional de
Direitos Humanos da Palestina, Mohammad AbuDos 678 milhões
Arthieh, “a violência utilizada por Israel é planifide metros cúbicos
cada. Não há limites. Os alvos podem ser as mude água, 560
lheres e crianças, as ambulâncias que estão ali para
milhões - 82,5% socorrer ou mesmo os jornalistas que estão simeram usurpados
plesmente trabalhando”. Naqueles dias, 30% das
por Israel. No final
vítimas eram crianças e 15% dos feridos haviam
da Guerra de 67,
ficado aleijados permanentemente. “É uma aberno mesmo 6 de
ração inteiramente desproporcional as tropas de
junho quando
ocupação responderem às pedras dos manifestanIsrael invadiu a
tes com armas de grosso calibre, tanques e heliPalestina, a
cópteros-bombardeiros. Os israelenses atiram à
Ordem Militar 2
queima-roupa, mesmo dentro das mesquitas. Isratransferia aos
el tenta transformar a Palestina em uma terra sem
invasores todos os
gente, usando de uma repressão atroz para obrigar
recursos hídricos
da região
os palestinos a abandonarem o seu território”, acrescentou.
SEGUNDO TEMPO DA INV
ASÃ
O
INVASÃ
ASÃO
A partir de junho de 1967, numa espécie de segundo tempo da ocupação iniciada em 1948 após a proclamação do Estado de Israel, nada menos
do que 73% da Cisjordânia e da Faixa de Gaza foram invadidos pelos sionistas. Alegando “motivos militares” ou “razões de segurança”, eles impuseram sua política de assentamentos com centenas de milhares de colonos
judeus ortodoxos armados até os dentes.
52 Latifúndio Midiota: crime$, crise$ e trapaça$
Leonardo Severo com o presidente Yasser Arafat, no Escritório da ANP em Gaza
Para quem teima em ficar, Israel realiza um brutal racionamento sobre a
água e a eletricidade alheia. Isso ocorre em Gaza e mesmo na Cisjordânia,
onde o potencial aquífero, o maior do Oriente Médio, é quase inteiramente
saqueado. Dos 678 milhões de metros cúbicos de água, nada menos do que
560 milhões - 82,5% - eram usurpados por Israel. Como lembrou o engenheiro geofísico Yosef Anwar Awayes, que concluía doutorado sobre Conflitos Internacionais de Água, “no final da Guerra de 1967, no mesmo dia 6
de junho em que Israel invadiu a Palestina, a Ordem Militar nº 2 foi justamente a determinação de que, a partir daquele momento, todos os recursos
hídricos da região passariam a ser assaltados pelos invasores”.
O EXEMPL
O DE ARAFA
T
EXEMPLO
ARAFAT
Naquele início de novembro, a confirmação da tão esperada reunião
com o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Yasser Arafat, nos encheu de ânimo. Despachando normalmente, sentado em sua cadeira, Arafat olhou em volta e sorriu. Largou a caneta com que assinava os documentos e veio sentar-se conosco na mesa grande. A fala firme e serena, com
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pausas onde nos olhava nos olhos, o sorriso estampado, rapidamente explicaram a intensidade de seu carisma. Um homem de profunda humanidade,
que transparecia em cada gesto e em seu modo de falar e tratar as pessoas.
Foi relembrando os passos da agressão sionista, a brutal intransigência israelense, os inúmeros atropelos às resoluções da ONU,
as sucessivas violações às mais elementares regras
Próximos à Faixa
do direito internacional e sublinhou que “a Intifade Gaza, bombas
da continuará até hastearmos a bandeira Palestina
explodiam ao
em Jerusalém Oriental”. Arafat retribuiu com um
nosso lado e
sorriso de satisfação a saudação enviada por Nelson
podíamos ouvir as
Mandela através do representante da Juventude do
balas de fuzis e de
Congresso Nacional Africano (CNA) e apertou as
metralhadoras.
nossas mãos, agradecendo pelo gesto de solidariedaOcorrências do
de em meio aos constantes bombardeios. Tranquilo,
mesmo tipo
frisou: “Derrotaremos a agressão sionista. A Palestihaviam, naqueles
na vencerá”.
dias, atingido três
jornalistas: um foi
Animados pelas palavras do ícone da resistência
morto e outros
e herói palestino, estávamos revigorados, prontos
dois encontravampara partir e encarar o longo retorno, pois Israel
se hospitalizados
obstaculiza as estradas, fazendo com que viagens
de dezenas de quilômetros se convertam em uma
peregrinação de dezenas de horas pelas “barreiras de controle". E os aeroportos? Fechados. E o mar? Cercado. Em pouco tempo daríamos a conhecer as verdades vistas e tantas vezes escondidas pela mídia venal.
Na partida, próximos à Faixa de Gaza, bombas explodiam ao nosso lado
e podíamos ouvir as balas de fuzis e de metralhadoras. Ocorrências do mesmo tipo haviam, naqueles dias, atingido três jornalistas: um foi morto e
outros dois encontravam-se hospitalizados, um francês e o representante da
CNN em Gaza.
Inevitável pensar na necessidade de relatar ao mundo a experiência vivida. Inesquecível reverberar o sentimento daqueles instantes e o ensinamento maior do Che, deixado na carta a seus filhos, como um guia a embalar
nossa coerência: “Sobretudo, sejam capazes de sentir, no mais profundo,
qualquer injustiça cometida contra qualquer pessoa em qualquer parte do
mundo. É a qualidade mais linda de um revolucionário”.
54 Latifúndio Midiota: crime$, crise$ e trapaça$
Publicado no jornal Hora do Povo e no Portal do Mundo do Trabalho em
5-5-2011
“APARTHEID DE ISRAEL É AGRESSÃOS AOS
PALESTINOS E CRIME CONTRA A HUMANIDADE”
Em visita de solidariedade à Palestina, o secretário de Relações Internacionais
da Central Única dos Trabalhadores (CUT), professor João Antonio Felício,
participou das comemorações do 1º de Maio de 2011 em Ramalah, do Seminário
realizado pela ONG BDS(Boicote, Desinvestimento e Sanções) contra Israel e
de encontros com lideranças sindicais e da Autoridade Nacional Palestina (ANP).
Nesta entrevista, João Felício descreve o que viu: “uma política de apartheid que
agride os palestinos e se afirma como crime contra a Humanidade”
Ao lado de Arafat, a imagem do líder Marwan Barghouti, preso em Israel
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
O que mais chamou atenção nesses dias de visita a um país ocupado?
U
ma coisa é ouvir falar, a outra é presenciar até onde chega a
agressão contra o povo palestino, que se afirma como crime
contra a Humanidade. Ao longo dos percursos onde se multiplicam inúmeras barreiras militares que impedem o deslocamento dos palestinos e fazem com que trajetos curtos virem horas, temos
uma visão nítida, bastante clara, de que a ação do Estado de Israel é uma
violência sem limites. Quando vimos os estreitos espaços onde os palestinos
têm de passar para circular nestas áreas de bloqueio para entrar em Israel,
Leonardo Wexell Severo 55
Leonardo Vieira
é como se fossem gado quando vai para o matadouro, espremidos naquele
corredor, sem condições de retornar. Ali são humilhados, obrigados a apresentarem os seus documentos,
que podem não ser reconhecidos se por acaso não tiverem
pago uma simples multa de
trânsito. Esta é uma entre as
tantas perversões de um Estado policial.
E a reação palestina?
Por outro lado, vi de perto
a determinação de um povo
que resiste a ser expulso do seu
próprio país, que resiste à diáspora, e reafirmei a minha convicção de ampliarmos a mobilização e a luta para colocarmos abaixo o vergonhoso
muro, de mais de 800 quilômetros, com que Israel reproO secretário de Relações Internacionais da duz, em pleno século 21, a
CUT, João Felício, ao lado de Jamal Juma, do política de apartheid contra os
BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) negros adotada pela África do
Sul no século passado. Tive a oportunidade de andar em Jericó e em Nablus,
cidades de milhares de anos, e vi o muro que continua crescendo, se expandindo para todo o lado. Não é só para impedir que os palestinos circulem,
sob o argumento de segurança para os israelenses, é para pressionar as pessoas
a deixarem suas casas, seus terrenos, seu país. É algo extremamente indigno
e que merece um olhar da ONU e de todo o mundo para que se faça pressão
sobre Israel a fim de que reconheça de uma vez por todas o Estado palestino. Há organizações como a BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções contra
Israel) que defendem inclusive uma ação internacional mais dura, com retaliação econômica frente à continuidade desta política.
56 Latifúndio Midiota: crime$, crise$ e trapaça$
E a comemor
ação do 1º de M
aio na P
alestina?
comemoração
Maio
Palestina?
Foi um ato extremamente expressivo em Ramalah, onde todos manifestaram uma alegria muito grande pela presença de um representante brasileiro,
da CUT, com quem já estiveram tantas vezes compartilhando em nossos
congressos, e também pela participação da secretária-geral da Confederação
Sindical Internacional (CSI), Sharon Burrow. Segundo a OIT, mais de 70%
dos palestinos encontram-se desempregados e dois terços da população vivem com menos de dois dólares diários, o que dá uma ideia da gravidade da
situação. O ato do 1º de Maio também foi um alerta para as condições a
que a classe trabalhadora vem sendo submetida pelo violento cerco econômico israelense. Até mesmo a contribuição sindical dos trabalhadores palestinos em Israel é apropriada indevidamente pela central israelense, que
fica com 80% dos recursos e passa somente 20% à central palestina.
Os palestinos deram inúmeras demonstrações de que aceitam conviver
em paz com Israel dentro das fronteiras de 1967. A unificação do Fatah e
do Hamas é uma importante demonstração de unidade, uma ação que soma
para libertar seu país da ocupação estrangeira. Obviamente, os brucutus da
direita reacionária israelense de tudo fazem para que não ocorra esta união
de forças pela libertação. Dirigentes israelenses chegaram a declarar que ou
o Fatah - que dirige a Autoridade Nacional Palestina -, faz a paz com Israel
ou com o Hamas. Ou seja, querem expulsar os palestinos de todo jeito e
apostam na divisão das suas lideranças.
Como foi a agenda?
Estivemos presentes em várias atividades
com ministros, prefeitos e governadores da
região. Todos eles nos expuseram, com riqueza
de detalhes, a gravidade da situação econômica devido ao cerco imposto pelas tropas
israelenses e do seu impacto devastador.
Muro aumenta segregação
Leonardo Wexell Severo
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Activestills
E o rrecente
ecente acor
do de unidade do F
atah e do H
amas contr
acordo
Fatah
Hamas
contraa a ocupação?
Também resgataram o significado importantíssimo da solidariedade internacional para fazer frente a esta política de terra arrasada. Quando chegamos em Jericó, por exemplo, notamos a falta de água, pois Israel bloqueia a
nascente do rio Jordão e só deixa chegar 20% da água às torneiras palestinas. Depois de assaltar este bem precioso, ainda mais numa região desértica, os israelenses chegam ao cúmulo de vender esta mesma água roubada
aos palestinos, o que está aprofundando a desertificação. O próprio nível do
mar Negro está baixando em virtude deste tipo de política. É um tipo de
agressão sem limites, a um povo que mora lá há milhares de anos.
Há uma política clara de segregação, de apartheid...
Em todos os encontros, reiteramos a solidariedade contra essas violações e do
nosso empenho em fortalecer uma alternativa negociada que acabe com a ocupação e garanta uma Pátria ao povo palestino. Precisamos assegurar condições
de vida e trabalho dignas, direitos, salário mínimo, consolidar a seguridade
social, ampliar a participação popular. Mas com um país ocupado tudo isso fica
inviabilizado. O que fica evidente é a disposição do governo de Israel de exterminar o povo palestino. Isso pode ser visto pelo avanço do muro, que acaba
separando os jovens das escolas, obrigando crianças a caminhar por quilômetros para continuar estudando. Há ainda a destruição das casas palestinas, a
inutilização econômica de regiões inteiras, o corte de oliveiras milenares.
E as cidades israelenses?
Estive visitando Telavive, onde ao contrário da riqueza e da beleza de
uma arquitetura antiga, como se vê em Ramalah, Jericó ou Jerusalém,
podemos ver que é uma cidade americana encravada no mundo árabe. Israel
é um país construído pelos europeus e americanos, seu governo é dominado
por religiosos de extrema direita que contam com apoio financeiro das grandes
potências para se manter ali. A linha deles é: danem-se os palestinos.
Diante de tudo isso, quais os próximos passos da solidariedade?
Em conversa com os dirigentes sindicais, acordamos realizar no mês de
novembro uma Conferência Sindical na Palestina, que debaterá temas
58 Latifúndio Midiota: crime$, crise$ e trapaça$
pontuais como o desenvolvimento regional, a seguridade social, os direitos
da juventude. Acho que esse evento vai somar e multiplicar as mobilizações
internacionais, dos movimentos social e sindical, em defesa dos direitos
humanos do povo palestino. No Brasil, a CUT vai dialogar com a
Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) sobre a realização de uma
ação nacional de solidariedade, com maior envergadura, para dar a necessária
projeção ao tema, que deve ganhar prioridade no ano em que a ONU debate
a criação do Estado palestino independente.
Um balanço final...
Estou com 60 anos e, fazendo um balanço, posso dizer, sem qualquer
exagero, que foi uma das viagens mais bonitas que fiz ao longo de toda
minha vida. Vamos relatar tudo o que vivemos intensamente nestes dias
para que esta experiência abra portas para um futuro de paz, justiça e
desenvolvimento para o povo palestino, que merece viver num país livre.
Na capital paulista, a manifestação de solidariedade convocada pela
Coordenação dos Movimentos Sociais e partidos populares levou duas mil
pessoas às rruas
uas pela P
alestina livr
ana no 20 de agosto de 2011
Palestina
livree e sober
soberana
Leonardo Wexell Severo 59
NÚMERO DE
ISRAELENSES (A)
E PALESTINOS (B)
MORTOS DURANTE
A GUERRA DE GAZA
(JANEIRO DE 2009)
Esta ilustração/questionamento integra o livro “Uma Terra Sem
Gente Para Gente sem Terra”, de Nuno Coelho e Adam Kershaw
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Latifúndio Midiota: crime$, crise$ e trapaça$