Universidade Estácio de Sá Vice Reitor de Pós

Transcrição

Universidade Estácio de Sá Vice Reitor de Pós
Universidade Estácio de Sá
Sociedade de Ensino Superior Estácio de Sá LTDA.
Presidente: Rogério Frota Melzi
Reitora: Paula Caleffi
Vice Reitor de Graduação: Vinícius da Silva Scarpi
Vice Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa: Luciano Vicente de Medeiros
Vice Reitor de Extensão, Cultura e Educação Continuada: Deonísio da Silva
Littera Docente & Discente em Revista
Universidade Estácio de Sá – Campus Nova Friburgo
Diretor Regional UNESA – RJ: Abílio Gomes de Carvalho Júnior
Diretor do Núcleo: Flávio de Castro Souza
Diretor do Campus: Manoel Nunes Neto
Gestor Acadêmico: Edezildo França de Carvalho
Editores: André Queiroz Ferreira de Mello / Reinaldo Kelmer / Roberto Fonseca Vieira
Conselho Consultivo: Allan Wagner Breder / Ana Cristina Roballo Fabbri / Carla Mariah de Oliveira
Fujimaki / Carlos Eduardo Brasil Neves / Cássia Viviane Kale Martins / Catherine Blin Nobrega de
Arruda Beltrão / Christiano Bittencourt Machado / Gil de Carvalho / Jorge Antônio Maroun / Julio
Cesar Latini Stutz / Marilza de Freitas / Martha Maria Porto Silva Jardim / Raymundo de Oliveira Reis
Neto / Valéria Campos Muniz
Conselho Editorial: André Queiroz Ferreira de Mello / Angela Moreira Utchitel / Carlos Alberto
Vieira de Melo / Fernando Periard Gurgel do Amaral / Izimar Dalboni Cunha / Kíssila Muzy de Souza
Mello / Marco Aurélio Togatlian / Maria Benedicta Graziela Guimarães / Munira Queiroz / Pedro
Paulo Alves dos Santos / Reinaldo Kelmer / Roberto Fonseca Vieira
Projeto Gráfico: Antonio Carlos D. Rodrigues / Maycon C. Pereira
Editoração Eletrônica: Julio Cesar L. Stutz / Jessica da S. Gomes / Luiz Fernando A. Medeiros /
Maycon C. Pereira / Pablo dos S. Ribeiro
Redação:
UNESA-Campus Nova Friburgo
Jardin Sans Souci, s/n
Braunes – Nova Friburgo – RJ
www.estacio.br
SUMÁRIO
Mensagem Institucinal
Editorial
Artigo Especial Docente
Do Virtual ao Real: a trajetória de um sonho
Ensaios Docentes
Estágio: extensão do conhecimento
Separação de Poderes e Criação Jurisprudencial do Direito: limitações ao protagonismo
judicial nas hipóteses de omissão legislativa
Estudo de Propriedades do Concreto através de Microtomografia por Raio X e Scanner
Comercial
“Se essa rua, se essa rua fosse minha”: a resignificação da relação entre a rua e a escola
O Conceito de Competências
Credibilidade, Diálogo e Cidadania: necessidade latente de abertura do sistema
empresarial
Nem Sempre é Amor
Comunicações
Comunicação Laboratorial SPA/Serviço de Psicologia Aplicada
Espaço Experimental do Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Recursos
Humanos
Artigos Discentes Orientados
Extradição: o caso Cesare Battisti
Do Impresso ao Digital Sem Fronteiras: caminhos de uma mídia alternativa
A Reincidência Criminal à Luz do Princípio do Non Bis In Idem
ZERO CAL COLOR: alimentação saudável não tem idade
Avaliação do Desenvolvimento Motor em Crianças e Adolescentes de Ambos os
Gêneros com Necessidades Especiais
A Educação Física na Educação Infantil em Escolas Particulares do Município de
Nova Friburgo
Atendimento Inicial ao Infarto Agudo do Miocárdio
Estudos Bibliográficos dos Benefícios e Malefícios dos Esteróides
Anabolizantederivados da Testosterona e sua Relação com o Uso na Estética e no
Esporte
Disfunção Erétil: aspectos anátomo-morfológicos e a farmacologia do tratamento
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
O Efeito do Método RMA (Reprogramação Músculo-Articular) em Profissionais de
Costura com Lombalgia: um estudo cego-aleatório
Validação do Método de Avaliação da Marcha com Microfones (mamm) em Idosos
“Mais Amor e Menos Confiança”Análise do Conto “Guardador” de João Antônio
Língua e Literatura na Informática e sua Influência na Educação
Resiliência: um processo ativado em situações adversas?
O Comportamento Anti-Social Infantil no Contexto Escolar de Nova Friburgo: análise
das propostas de prevenção
Resenhas
Borderline ou Psicose Ordinária: querelas ou avizinhamento?
Normas de Originais
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Mensagem Institucional
No mundo atual, a quantidade de informações é grande e muito dinâmica, procurando
se adequar aos momentos que a sociedade está vivenciando. Como expor estas informações de
maneira ordenada e atualizada a atender as demandas, este questionamento foi trabalhado e
resultou nesta segunda fase da Littera Docente & Discente em revista on line.
O novo modelo aqui apresentado possibilita uma melhor visão global do fluxo de
informações para atender aos anseios do mundo acadêmico, de maneira tal que através da
tecnologia todos terão acesso, e este foi o maior avanço com este trabalho.
Os trabalhos apresentados somados com a experiência profissional e de vida, aliado a
um conhecimento adquirido na academia, através de muita pesquisa, leitura e reflexão, deixam
um legado de conhecimento rico a serem explorados.
Sem dúvida a Unidade do Campus Nova Friburgo deram um passo importante para
uma longa jornada do conhecimento, e seus docentes e discentes juntos estão fazendo história.
Parabenizo a todos os colegas envolvidos e ressalto o mais difícil de uma jornada e
continuar o seu caminhar, continuem com este empenho e dedicação, em algum momento das
nossas vidas, refletiremos, conseguimos contribuir realmente para o crescimento intelectual
dos nossos irmãos e consequentemente para a Sociedade.
Edezildo França de Carvalho
Gestor Acadêmico
Campus Nova Friburgo
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
EDITORIAL
Na primeira edição da Littera não se esconderam os obstáculos para a realização da
revista, mas se ressaltaram os esforços da equipe, a luta incessante para difundir as ideias
acadêmicas. Não foi diferente na segunda edição, que agora chega a vocês. No entanto, como
destaca Vinicius de Moraes, "o sofrimento é o intervalo entre duas felicidades”. A segunda
felicidade vem com novidades.
Nesta edição, além dos trabalhos dos alunos, trazemos artigos e ensaios de professores.
A discussão, portanto, se amplia e torna-se mais aguçada; inovação e experiência; integração
acadêmica de fato. Em outras palavras, queremos dar continuidade a ideia de “experiência de
ensino de múltiplos valores humanos”.
O mais importante para nós, então, não é o ponto de partida, mas a caminhada que se
constrói dia a dia, edição a edição, debate a debate; para no fim, a certeza de termos lançado as
sementes. Não queremos ser absolutos nem definitivos, mas incentivadores, semeadores, para,
quem sabe, alguém um dia pegar com as duas mãos os frutos maduros.
Com pensamento convicto de que o ambiente universitário é espaço de realização e de
mudança pelo discurso, trazemos, também, a arte para nossa reflexão. O Museu Artenarede,
idealizado pela professora Catherine, é um baluarte nesta edição. De forma alguma podemos
pensar universidade sem a integração das áreas.
Então é isso. Passado o intervalo do sofrimento, a Littera está novamente trazendo
conhecimento, discussão e, principalmente, felicidade.
Editores
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Artigo Docente
Apresentação Especial
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Do Virtual ao Real:
A trajetória de um sonho
Catherine Blin de A. N. Beltrão
Resumo:
O projeto Museu Artenarede tem por objetivo criar um museu real a partir de um espaço
virtual, fato inédito no contexto das artes plásticas. Ao invés de se criar um site representativo
de um museu real, cria-se um museu real a partir de um site. O acervo do Museu será formado
por peças doadas por artistas que catalogam suas obras no espaço virtual. Como no site são
catalogadas peças por artistas do mundo inteiro, o museu será constituído por obras
representativas de vários países, além de vários estados do Brasil.
Abstract:
From the virtual to the real world: the strategy of a dream.
The Artenarede Museum Project has as its main objective to create a real museum from
a cyberspace, which is unprecedented in the context of painting. Instead of creating a
website that would represent a real museum, a real museum would be created from a website.
The museum acquis would be enriched with art pieces donated by artists who had catalogued
their pieces in the cyberspace. As the site has a world wide vision, the pieces are catalogued
by artists all around the world thus representing several countries besides many
Brazilian states.
Palavras-chave: museu, artes plásticas, Nova Friburgo
Apresentação
Dezembro de 2000. Em um dos laboratórios de Informática, no campus Nova Friburgo
da Universidade Estácio de Sá, cerca de 50 pessoas se aglomeram para assistir a defesa de um
projeto final do curso de Sistemas de Informação. Seria o primeiro sistema, desenvolvido por
um grupo de alunos do curso, a utilizar a Internet para coletar dados para o seu banco. A
curiosidade e a admiração dos presentes se confundem.
O projeto se intitula ARTENAREDE.
Engenheira e Mestre em Informática, pela PUC-RJ Professora da Estácio de Sá, campus Nova Friburgo
Coordenadora dos cursos de Engenharia Ambiental e Engenharia de Produção da Estácio de Sá.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
O objetivo do projeto Artenarede é a catalogação, via Internet, de obras de artistas
plásticos. O próprio artista cataloga suas obras via Internet, esteja ele onde estiver, na hora que
ele quiser. Com o passar do tempo, essa catalogação se torna um registro de sua produção
artística. Não importa o caminho que a obra irá percorrer: os dados da obra estarão registrados.
Com base neste banco de dados, vários serviços virtuais são disponibilizados no espaço
virtual: é possível enviar cartões com as imagens das obras catalogadas, bem como imprimir
calendários ou cartões de visita com estas mesmas imagens. O artista pode criar galerias
temáticas de suas obras, bem como disponibilizar o seu currículo, constando de exposições,
prêmios, críticas e peritos.
A obra de Cândido Portinari, o maior dos pintores brasileiros, levou 25 anos para ser
catalogada. Seu filho, José Cândido, não mediu esforços nesta empreitada, que o levou a
procurar e encontrar obras de seu pai em vários cantos do mundo. Se a Internet já estivesse
disponível na época e Portinari tivesse catalogado suas obras em um sistema como o proposto
pelo projeto Artenarede, muito tempo e muito dinheiro teriam sido poupados com o projeto
Portinari.
A concepção
A idéia do projeto Artenarede teve como base um trabalho de catalogação do acervo de
obras de uma pintora, realizado nos anos 80. O trabalho consistia em catalogar dados de cada
obra em uma ficha. Os dados registrados na ficha eram o título da obra, o ano, o tamanho, a
técnica utilizada, o local da assinatura e alguma observação suplementar. Cada obra era
fotografada, o que fazia inserir uma foto da obra em cada ficha. Uma vez catalogadas as obras
que faziam parte de seu acervo particular, chamadas foram divulgadas em jornais para tentar
localizar as obras que tinham sido vendidas e que não estavam mais com a pintora. Este
procedimento evidenciou que várias destas obras se encontravam em outros estados do país e
mesmo em outros países. A catalogação se tornou onerosa e não foi concluída. (2)
Decorridos quinze anos deste trabalho preliminar de catalogação de obras, a idéia foi
ampliar o trabalho, desta vez utilizando a Internet como ferramenta de catalogação. O que
tinha sido concebido para registrar as obras de um determinado artista, poderia ser aplicado
para registrar obras de inúmeros artistas, em qualquer lugar do planeta, a qualquer hora. Além
disso, as imagens das obras catalogadas poderiam ser utilizadas em outros contextos como,
por exemplo, ilustração de cartões virtuais, cartões de visita, calendários, papel de carta, e
jogos que utilizam imagens, como quebra-cabeças e jogo-da-memória.
Galerias virtuais com exposições temáticas também poderiam ser criadas,
disponibilizando obras para venda. Os direitos autorais dos artistas autores das obras poderiam
ser respeitados – como reza o artigo 38 da lei 9610/98 (Lei dos Direitos Autorais): “O autor
tem o direito, irrenunciável e inalienável, de perceber, no mínimo, cinco por cento(5%) sobre
o aumento do preço eventualmente verificável em cada revenda de obra de arte ou
manuscrito, sendo originais, que houver alienado." Com o registro do rastro da trajetória de
compra e venda da obra através dos anos, o autor poderia, finalmente, receber os royalties a
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
que tem direito, o que raramente é feito no mercado de arte real. Haveria um banco de dados
especial com dados de obras perdidas ou roubadas, o que muito auxiliaria as respectivas
investigações.
A Internet é um imenso espaço a ser explorado. Com a evolução da tecnologia e a
convergência tecnológica avançando dia a dia, é preciso adequar antigas idéias a novas
concepções, muito mais ricas e abrangentes que suas antecessoras.
O espaço virtual: o site (3)
O Projeto Artenarede foi o primeiro projeto final
do curso de Sistemas de Informação da Estácio em
Nova Friburgo a ser apresentado já disponibilizado
na Internet. Também foi o primeiro projeto final a
obter grau 10.0 de todos os membros da banca
examinadora. A equipe do projeto era formada
pelos alunos Cristiane Tarazona, Julio Stutz e
Wanderson Berbert, sob orientação da profª
Catherine Beltrão.
Em 2001, o Projeto Artenarede foi selecionado
para fazer parte da Incubadora da UERJ, em Nova
Friburgo. Nascia a empresa Artenarede
Empreeendimentos e Internet Ltda, tendo à frente
os sócios Catherine Beltrão, professora e
coordenadora do curso de Análise de Sistemas na
Estácio, na época, e Julio Stutz, um dos alunos
desenvolvedores do projeto. Continuando com o projeto inicial, a empresa desenvolveu a
Tecnologia Artenarede.
A Tecnologia Artenarede é constituída de 23 ferramentas de software que podem ser
acopladas de forma modular, de acordo com a necessidade e o interesse do usuário. Esta
tecnologia ganhou o certificado de Mérito no Prêmio de Inovação Finep 2004. A seguir, um
esquema da Tecnologia Artenarede, classificando as ferramentas em seis áreas principais:
catalogação, comunicação, editoração, divulgação, vendas e jogos.
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Catalogação
Comunicação
Tecnologia
Artenarede
Divulgação
Editoração
Vendas
Jogos
 Catalogação: cadastro de artistas; catálogo de obras; serviços de busca;
 Comunicação: notícias atualizadas; newsletter; cartão virtual; enquete; forum; chat;
livro de visitas; contato;
 Editoração: textos permanentes; classificados;
 Divulgação: cartão de visitas; calendário; convite;
 Vendas: venda direta; venda com negociação;
 Jogos: jogo de quebra-cabeças; jogo-da-memória.
O projeto Artenarede está formando um grande acervo virtual, com milhares de obras
catalogadas via Internet, obras essas de centenas de artistas plásticos oriundos de todos os
cantos do Brasil e de vários países. Atualmente, o site conta com 4.602 obras catalogadas.
O espaço real: o Museu (4)
Embora tendo sido fundada em 1818, a cidade serrana de Nova Friburgo não dispõe de
nenhum museu. Não existe nenhum espaço que abrigue obras representativas de artistas
brasileiros ou estrangeiros, renomados ou não. Como o site do projeto Artenarede objetiva a
construção de um grande acervo virtual, constando de milhares de obras criadas por centenas
de artistas do mundo inteiro, veio a idéia de solicitar aos artistas que já tivessem obras
catalogadas no site, a doação de uma destas obras, para fazerem parte do acervo – físico – de
um museu.
Em junho de 2002, foi dado início à captação das obras para constituição do acervo do
Museu Artenarede. A seguir estão listados os artistas que manifestaram sua intenção de doar
uma ou mais obras para o Museu:
. Adair A. Costa, do Rio de Janeiro (*)
. Angela Gomes, do Espírito Santo (*)
. Betim, do Espírito Santo (*)
. Catia Garcia, de São Paulo (*)
. Daise Gorgulho, do Rio de Janeiro (*)
. Débora Giestas, do Espírito Santo (*)
. Ebenezer Leyva González, de Cuba
. Edith Blin, da França (*)
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. Erminda Breda, do Espírito Santo (*)
. Fausta Giusti Sidoni, do Rio de Janeiro (*)
. Francischetti, do Rio de Janeiro
. George Pinto, do Rio Grande do Sul
. Gilda Rincon, do Rio de Janeiro (*)
. Guilherme Merçon, do Espírito Santo (**)
. Imelda Marcos, do Rio de Janeiro (*)
. Ivan Blin, do Rio de Janeiro (*)
. Janio Leonardelli, do Espírito Santo (*)
. Karlla Pio, do Espírito Santo (*)
. Lenagal, de Portugal (*)
. Luisa Bergen, do Espírito Santo (*)
. Luiza Caetano, de Portugal (*)
. Malou Pombo, de São Paulo (*)
. Marcellux, da Argentina (***)
. Maria Góis, do Espírito Santo (*)
. Milton Guanabara, do Rio de Janeiro
. Molga, do Espírito Santo (*)
. Reginaldo Leite, do Espírito Santo
. Samú, do Espírito Santo (*)
. Sirlane Fernandes, do Espírito Santo (*)
. Sonia Guaraldi, do Rio de Janeiro (*)
. Sonia Thomaz, do Rio de Janeiro (*)
. Tamanduá, do Rio de Janeiro (*)
. Tânia Leal Guerino, do Paraná (*)
. Tetê Moraes, do Rio de Janeiro (*)
. Théta C. Miguez, de São Paulo (****)
. Vania Machado, do Rio de Janeiro (*)
. Venicio Alves Nogueira, de Minas Gerais(**)
. Wagner Veiga, do Espírito Santo (*)
(*) Obra já recebida pelo Museu
(**) 2 obras já recebidas pelo Museu
(***) 4 obras já recebidas pelo Museu
(****) 28 obras já recebidas pelo Museu
O acervo do Museu (4)
A idéia do acervo do Museu Artenarede é que seja constituído de obras doadas e
previamente catalogadas por artistas cadastrados no site do projeto, gerando assim um fato
inédito nesta área: ao invés de se criar um site - espaço virtual - representativo de um museu
real, está se criando um museu real a partir de um espaço virtual.
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Atualmente, o Museu já conta com 67 peças doadas, vindas de vários estados do Brasil
– Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul, além
de outros países como Portugal, França e Argentina.
Um livro poderia ser escrito sobre as obras doadas para o Museu Artenarede. Cada
obra doada ao Museu tem sua história. A seguir, algumas das obras doadas, com partes de sua
história.
“Dor silenciosa” foi uma das primeiras obras doadas ao Museu, em 2002, por Lenagal. Esta
obra é fantástica, extremamente forte, dilacerante.
Os olhos fechados avistam uma dor interior
intensa, do tamanho do campo que se perde no
horizonte. A boca retorcida não sabe ou não
precisa mais sorrir: tudo é angústia, tudo é
sofrimento.
Esta obra é muito significativa também pois foi a
primeira doação que o Museu Artenarede recebeu
de outro país, no caso Portugal. Ao lado, “Dor
silenciosa”, de Lenagal (Portugal) – 2002 – 54 X
65 – ast
Lenagal nasceu em São Miguel, Açores. Realizou várias exposições na Europa e nos Estados
Unidos. Sua temática é o universo feminino, utilizando cores quentes e vibrantes.
“Frida Kahlo e Diego de Rivera”, doada ao Museu em 2002, esta obra também veio de
Portugal. A obra traz para o Museu Artenarede
três grandes artistas, totalmente comprometidos
com a arte e com um sentido nacionalista maior:
os mexicanos Diego de Rivera e Frida Kahlo e a
portuguesa Luiza Caetano. Trata-se de uma obra
muito
importante,
contundente
até,
ultrapassando qualquer estilo ou escola a que
possa pertencer. Ao lado, “Frida Kahlo e Diego
de Rivera”, de Luiza Caetano – 2000 - ost
Luiza Caetano nasceu em Venda do PinheiroMafra, Portugal e iniciou suas exposições em 1988, na Galeria de Arte do Casino Estoril.
Aborda o gênero naïf, não se prendendo a temas específicos. Esta artista é hoje uma das mais
importantes pintoras naïves da atualidade, e também uma das maiores incentivadoras do
projeto Artenarede, com 222 obras catalogadas no site.
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“Eterno Campeão” foi doada ao Museu Artenarede em 2003, por Theta Miguez. Esta obra nos
traz o olhar, a aura, o pensamento de Ayrton Senna
para dentro de nosso pequeno mundo interior... e ele,
então, fica imenso!
Segundo as próprias palavras da artista: „Esta obra,
que fiz com muito carinho, representa a imagem que
captei na TV, quando Ayrton Senna, na sua última
corrida em Ímola na Itália, já de capacete, dentro do
seu carro, dirigia seu olhar aos fotógrafos e câmaras
de TV. Parecia um olhar de despedida, que jamais
esquecerei. A tristeza desse olhar traduzia os mais profundos sentimentos de sua alma como
um pressentimento sobre aquele dia fatídico.‟ Ao lado, “Eterno campeão”, de Theta Miguez
(SP) – 2002 – téc.mista
Théta C. Miguez é natural de Igarapava, São Paulo, tendo participado de inúmeras exposições
no Brasil e no exterior. A artista faleceu em 2005, tendo feito a maior doação da história do
Museu Artenarede: além desta obra, ela doou mais 27 obras magníficas, que compõem a
exposição completa intitulada “Retratos do Apocalipse”.
A obra "My life in the beach "
foi doada ao Museu Artenarede
em 2002, por Débora Giestas.
A areia, o mar, o céu... estrelas
do mar, guarda-sóis... ao fundo,
serão ondas, nuvens, pássaros?
Não importa. O que importa é a
sensação de tranqüilidade, de
paz, de imersão na vida que
esta obra nos traz. Ao lado,
“My life in the beach”, de
Débora Giestas (ES) – 2002 80 X 150 – téc. mista
Obra de grandes dimensões e de extrema fragilidade – composta de milhares de
fragmentos de minúsculas partículas de casca de ovo, entre outros materiais – ela causa grande
impacto em qualquer contexto em que esteja sendo exibida.
Natural de Vitória, Espírito Santo, Débora Giestas é formada em Educação Artística
pela UFES. Cria lindos e inéditos mosaicos, feitos de noz de cola.
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“Moebius Strip Opus #2" foi doada ao Museu Artenarede em 2004, por Marcellux, artista
argentino. Sobre esta obra, disse: "...Você avança até alcançar o ponto em que iniciou. Um
laço feito para nada. Todo o seu esforço é inútil. A
eterna busca do que você sempre carregou consigo.
Que conceito poderoso! Quantas muitas coisas
engraçadas para contar... Poderia eu resistir a esta
tentação? Em absoluto. Como todos os que eu
conheço, eu experimentei a atração da Moebius Strip...
Aqui eu a partilho com você. Divirtam-se..."
Esta obra faz parte de um grupo de 4 obras doadas por
Marcellux para o Museu, que vieram diretamente de
uma exposição na Galeria Soho, New York, para Nova Friburgo. Acima, “Moebius Strip Opus
#2"a”, de Marcellux - 2002 - 50 X 70 cm – ast
Marcellux nasceu na Argentina, sendo um dos artistas catalogados no site do projeto
Artenarede que mais divulga sua arte pelo mundo afora, tendo feito inúmeras exposições em
diversos países das Américas e da Europa.
A obra "Grávida", de Karlla Pio foi doada ao Museu
Artenarede em 2004. Uma das primeiras esculturas a serem
doadas ao Museu, esta obra resplandece quando iluminada,
literalmente trazendo à luz pensamentos e emoções encobertos
ou escondidos. Ao lado, “Grávida”, de Karlla Pio (ES) – 1999
– 65 X 18 X 32 – resina. Karlla Pio transforma as formas que
lhes são significativas em suas vivências, em uma expressão
artística de linguagem espacial e nos leva a novas reflexões.
Suas esculturas são compostas por materiais, como gesso
odontológico, resina e fibra de vidro. A figura humana faz parte
de suas pesquisas como segmento de vida ou nova forma de ver
o cotidiano.
“Isto é Brasil” foi doada ao Museu Artenarede em 2004
por Ângela Gomes. Esta obra mostra o colorido da
pobreza, a alegria da simplicidade, a confiança do
trabalho cotidiano. Ao lado, “Isto é Brasil”, de Ângela
Gomes (ES) - 1989 – 60 X 81 – ast.
A pintora Ângela Gomes, nascida em Cachoeiro de
Itapemirim/ES, é naïf, o que para nós significa pintura
de criança feita por gente grande feliz. Uma obra
colorida, alegre, espontânea, ingênua e que, hoje, mais
do que nunca, retrata o belo e simples cotidiano dos que habitam em bairros simples, cheio de
histórias centenárias. Esta artista, junto a mais dez outros artistas, forma o maior grupo
representativo de um estado brasileiro – o Espírito Santo – a doar obras para o Museu
Artenarede.
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“Tríptico” foi doada ao Museu Artenarede em 2005, por Vânia Machado. Obra abstrata, ela dá
margem
a
vários
entendimentos,
dependendo da imaginação de quem a
observa. Serão partes de carcaças
bovinas? Serão flores estilizadas? Ou será
uma composição de fitas trançadas e
entrelaçadas? Qualquer que seja a
interpretação da obra, ela terá sido parte
da evolução cultural de seu contemplador.
Ao lado,
“Tríptico”, de Vânia Machado
– 2004 – 85 X 145 – téc. Mista
Vânia Machado é uma artista friburguense, sempre em busca de seu aprimoramento artístico,
sempre em busca de uma comunhão de sua arte com o público que a admira.
Em 2003, 2004 e 2005, várias mostras itinerantes do Museu Artenarede foram
realizadas. Estas mostras aconteceram na ACIANF – Associação Comercial e Agrícola de
Nova Friburgo, na Queijaria Suíça – um dos pontos turísticos mais visitados do circuito TereFri e no Colégio Anchieta. Nestas mostras, obras do acervo foram apresentadas ao público, na
medida que foram sendo doadas ao Museu pelos artistas.
Conclusão
Dez anos se passaram desde o início da captação de obras para a montagem do acervo
do Museu Artenarede, em junho de 2002. Um sonho não se torna realidade sem o
envolvimento de mais pessoas além do sonhador. O sonho para a criação e construção do
Museu já envolveu 38 artistas que acreditaram no projeto e doaram 67 obras. O sonho do
Museu Artenarede já possui uma história, um caminho percorrido. Essa história está só
começando. Mais artistas deverão doar obras. Estas obras precisam de um espaço permanente
para serem apreciadas pelo público. A cidade de Nova Friburgo, com quase 200.000
habitantes e a seis anos de seu bi-centenário, merece um museu: o Museu Artenarede.
Referências:
- (1) www.catherinebeltrao.com
- (2) Documentação em .ppt da palestra “Artenarede, a trajetória de um sonho”,
ministrada na Semana Nacional da Tecnologia de 2010, realizada em 20 de outubro no
auditório do campus Nova Friburgo da Estácio de Sá
- (3) www.artenarede.com.br
- (4) www.artenarede.com.br/museu
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Ensaios Docentes
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Estágio:
Extensão do Conhecimento
Carlos Alberto Vieira de Melo
A aprendizagem é a nossa própria vida, desde a juventude até a
velhice, de fato quase até a morte; Ninguém passa dez horas sem
nada aprender.
Paracelso
Começo este ensaio com uma epígrafe de um dos grandes pensadores do século XVI,
Paracelso, que diz que o aprendizado é a nossa própria vida, desde a juventude até a velhice,
de fato quase até a morte; ninguém passa dez horas sem nada aprender.
O Brasil ostenta hoje uma das piores educação do mundo, a melhor Universidade do
país encontra-se hoje 225 lugar no ranking das melhores universidade do mundo, o ensino
publico encontra-se falido e os melhores alunos pelo menos na teoria encontra-se nas
Universidades públicas, oriundos na sua grande maioria das melhores escolas particulares do
país. Já neste aspecto encontramos uma dicotomia na relação dos alunos que entram nas
universidades públicas e particulares no país. Os que têm melhores condições financeiras e
acesso a boas escolas conseguem na sua grande maioria entrar nas universidades públicas e ao
mesmo tempo não tendo um grande gasto na sua formação, já os alunos das universidades
particulares, na sua grande maioria, apresentam um custo elevado para conseguir terminar seus
estudos, exigindo um esforço maior para tentar se formar e conseguir competir com futuros
profissionais que se formam nas universidades públicas.
A finalidade das universidades fazendo parte da sociedade deve cumprir as suas vitais
e historicamente importantes funções de mudança no aluno, transformando este ser que entra
despido e entregá-lo a sociedade com uma roupagem crítica pensante e principalmente um ser
que contribua para melhorar o desenvolvimento de uma nação.
Através das clínicas escolas, o aluno terá a possibilidade de colocar em prática todo o
conhecimento adquirido na teoria dentro de sala de aula. É neste convívio que o aluno poderá
solucionar as dúvidas teóricas e confrontá-las com a prática no estágio. A clínica escola
oferece a oportunidade de o aluno poder conviver com situações que o obrigue a pensar a
refletir e ao mesmo tempo tornando-o capaz de tomar para si a capacidade de decidir sobre
uma determinada conduta. É no estágio que os saberes se encontram; o mestre que tem a
obrigação de orientar o caminho a ser seguido e o aluno que trazendo suas dúvidas estará
Fisioterapeuta (UCB), Pós-Graduado em Fisioterapia Desportiva (UGF) professor de Ética na Saúde, Filosofia
na Enfermagem, Saúde Coletiva, Fisioterapia Desportiva, Recuperação Músculoesquelética, Estágio e Mestrando
em Saúde, Educação e Ambiente na UNIPLI, Supervisor da Clínica Escola Fisiofriburgo.
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aberto ao aprendizado, e ambos, estarão aprendendo para melhor tratar o paciente que chega
com toda sua angustia e dor para tentar ser solucionada.
Formar o aluno para o exercício da profissão é uma obrigação das Universidades, mais
do que formar o especialista, as Universidades devem ter no seu pilar o compromisso com a
cultura social e desenvolver conhecimentos universais, mas devem, também, propor soluções
que correspondam ao contexto cultural das nações que as abrigam (José Raymundo Romeo,
2011), e a clínica escola tem um papel de fundamental importância, já que entendemos que a
clinica escola é uma extensão da sala de aula, ou melhor, dizendo é uma extensão do
conhecimento. Não podemos mais achar ou dizer que tudo depende só do Estado, as
Universidades devem assumir a responsabilidade com as classes menos favorecidas, e a
clínica escola pode contribuir para diminuir essas diferenças na área da saúde.
A clínica escola deve ser vista não só como um lugar onde o mestre ensina e o aluno
aprende, deve ser visto também como um espaço de liberdade de diálogo. Segundo Freire,
1996, ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria
produção ou a sua construção, ou seja, na clínica as probabilidades são inúmeras e cabe ao
futuro profissional aproveitar estas oportunidades.
Outro fator que eu acho relevante é que as clinicas escolas disponibilizam a população
carente um atendimento de qualidade, com ética e respeito, sendo este espaço respeitado pela
sociedade. É neste espaço que o aluno cria o verdadeiro vinculo com a profissão, cada dia
vivido na clínica escola, o aluno tem a possibilidade de vivenciar algo novo, seja com o
próprio paciente, seja com o colega mais antigo no estágio, seja com o próprio supervisor.
Na minha prática de supervisor de estágio, tenho observado e vivido muitas
experiências, dentre elas a mudança de comportamento dos alunos que entram no estágio e na
sua saída depois de alguns meses. Vejo que durante o atendimento de um paciente na clínica
escola, existe a possibilidade da troca de saberes. O aluno tentando colocar em prática todo
seu conhecimento teórico adquirido em sala de aula, enquanto o paciente também informa
sobre seu quadro clínico e das suas dificuldades funcionais, transmitindo ao aluno novos
conhecimentos.
A clínica escola não pode apenas servir como espaço de conhecimento especifico, mas
deve ter a consciência de proporcionar ao aluno a incursão em campos do saber que,
aparentemente, não se relacionam com o seu futuro profissional.
A interlocução de saberes segundo Oliveira é um fator extremamente importante no
projeto de extensão universitária. Tal como explica Fazenda, 2003, a interdisciplinaridade e
experiência prática formam a base da extensão universitária. O registro das experiências
vividas pode gerar novas perspectivas, depende do exercício interdisciplinar de captar o
movimento dialético e contraditório.
Não consigo ver como podemos formar um profissional de determinada área, sem que
estes futuros profissionais não tenham um conhecimento geral. Parafraceando José Raymundo
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Romeo que parafaceou Carl Sagan, que disse: que não conseguia entender como poderia ser
formar um físico sem os conhecimentos de Filosofia, História, Chopin, arte etc..., ainda
segundo José Raymundo Romeo o conhecimento não é um fim e sim um meio, o objetivo é a
felicidade e o bem estar das pessoas.
Estamos vendo hoje em dia cada vez mais a formação tecnicista, onde cada vez mais,
as Universidades atuais estimulando nos alunos a ideologia do êxito e da competição
alienando-os do compromisso social gerado pelo diploma universitário.
Para terminar não podemos pensar a clínica escola como apenas um espaço de
interação ensino e pesquisa, mas implica a sua interação na formação do aluno como um ser
que tem um papel a desempenhar na sociedade com seus aspectos emancipativo, e que o
objetivo final é a felicidade e a melhora da qualidade de vida das pessoas.
Referência Bibliográfica
VASCONCELO, Eymard Morão, Espiritualidade na Educação popular em saúde. Caderno
Cedes, Campinas, vol. 29, n. 79, pag. 323-334, set./dez. 2009.
Fazenda, I. C. A. Interdisciplinaridade: qual o sentido? São Paulo: Paulus, 2003
OLIVEIRA, Rudval Andrade de e PIOVESAN, Angélica de Fátima. Clínica-escola de
Psicologia da UNIT: Um espaço para práticas extensionistas e responsabilidade Social,
em Extensão. Uberlândia: MG, v. 9, n. 2, p. 53-60, jul./ dez. 2010.
MÉSZÁROS, István. A educação para além do Capital. Coleção: Mundo do trabalho,
Egitempo – Editorial, 2005.
_________________. Paracelso, selected writings. Londres, routledge & Kegan Paul, 1951,
p. 181. In: MÉSZÁROS, István. A educação para além do Capital. Coleção: Mundo do
trabalho, Egitempo – Editorial, 2005.
PARINI, Jay. A arte de ensinar. Ed. Civilização Brasileira, RJ, 2007.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa.
Coleção Leitura, Ed. Paz e Terra, 2005.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Separação de Poderes e Criação Jurisprudencial do Direito:
Limitações ao protagonismo judicial nas hipóteses de omissão legislativa
Izimar Dalboni Cunha
Com o advento da constitucionalização do Direito, todos os seus ramos, devem estar
em consonância com os ditames constitucionais, observando seus princípios e mandamentos
na elaboração, na interpretação e na aplicação da lei.
No presente trabalho, o cerne da questão é averiguar a legitimação do ativismo judicial
em decorrência da omissão legislativa.
Para tal, é utilizada a metodologia de revisão bibliográfica, tendo como fonte livros,
artigos científicos, jurisprudência e legislação vigente, buscando formular problemas e
construir hipóteses, sendo a intenção da pesquisa provocar o questionamento e a reflexão
sobre o tema.
Por tratar-se de uma pesquisa bibliográfica a principal fonte, o instrumento de coleta de
dados é a compilação de informações retiradas da bibliografia analisada, objetivando a
otimização do estudo realizado.
O método utilizado para a análise dos dados é o indutivo, ou seja, parte-se de
princípios particulares que regem a matéria, para se chegar à análise do tema proposto.
Dessa forma, torna-se possível a observação dos fatos e/ou fenômenos cujos efeitos se
deseja avaliar.
Como princípio fundante da ordem constitucional, temos a dignidade da pessoa
humana. Assim sendo, todas as relações jurídicas em que as pessoas estão envolvidas, sejam
elas públicas ou privadas, devem pautar-se na dignidade da pessoa humana, mas muitas vezes
o Legislativo, a quem cumpre o dever de regular essas relações, deixa de agir, havendo a
intervenção judicial a fim de assegurar determinado direito, com vistas a garantir o referido
princípio.
Por outro lado, temos, também, como princípio fundante da ordem jurídica, a
Separação dos Poderes.
Desse modo, busca-se fazer uma breve análise acerca do referido princípio – Separação
dos Poderes – e sobre a judicialização do Direito; para, a seguir, analisar quais são as
limitações impostas ao ativismo judicial no nosso ordenamento jurídico, verificando, por fim,
até que ponto pode-se permitir o protagonismo judicial
Professora da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Para a análise do questionamento, faz-se uma breve análise da separação dos poderes e
da criação jurisprudencial, bem como dos remédios constitucionais aplicáveis em casos de
omissão legislativa, bem como das limitações ao protagonismo judicial.
A Questão da Separação dos Poderes e a Criação Jurisprudencial
O artigo 2º, da Carta Magna, traz como cláusula pétrea o Princípio da Separação dos
Poderes, estabelecendo a tripartição em Legislativo, Executivo e Judiciário, bem como que os
mesmos devem ser independentes e harmônicos entre si.
Michel Temer (2008, p. 120) entende que se equivocam os que utilizam a expressão
“tripartição dos poderes”, já que o poder é uno e atributo do Estado, como forma de emanação
da soberania.
Assim, devemos entender que o “Poder Estatal é um só, materializado na Constituição,
de onde se extrai que a separação das funções deve funcionar como forma de viabilizar a
máxima efetividade das normas constitucionais” (FREIRE JR., 2009).
Cada um desses Poderes – Legislativo, Executivo, Judiciário – exercem funções
típicas, precípuas – legislar, executar, julgar, mas, também, funções secundárias.
Atualmente, diante da inércia dos demais Poderes, o Judiciário acaba tendo maior
atuação, suprindo as lacunas existentes, mediante mecanismos previstos na Carta Política, tais
como o mandado de injunção e a ação de inconstitucionalidade por omissão, para permitir a
efetivação dos direitos fundamentais, garantindo-se, assim, a supremacia da Constituição.
Dos Remédios Constitucionais
Para melhor elucidar a questão, uma breve análise dos institutos constitucionais.
O mandado de injunção foi criado, pelo constituinte de 1988, com o intuito de dar
maior efetividade às normas constitucionais, já que muitas vezes há uma inércia do legislador
infraconstitucional em regulamentar os direitos decorrentes dessas normas.
A ação direta de inconstitucionalidade por omissão configura-se como uma modalidade
de controle abstrato de constitucionalidade, sendo um processo objetivo de guarda do
ordenamento constitucional, afetado pela alegada lacuna normativa ou pela existência de um
ato normativo reputado insatisfatório ou insuficiente. Não se destina, portanto, à solução de
controvérsia entre partes em litígio, operando seus efeitos tão-somente no plano normativo
(BARROSO, 2006, p. 220).
O Ministro Carlos Mário da Silva Velloso (1989), ao tratar das diferenças entre os dois
institutos, esclarece que na ação de inconstitucionalidade por omissão, de competência
exclusiva do STF, a matéria é versada apenas em abstrato, enquanto que no mandado de
injunção, reconhecendo o juiz ou tribunal que o direito que a Constituição concede é ineficaz
ou inviável em razão da ausência de norma infraconstitucional, fará ele, juiz ou tribunal, por
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
força do próprio mandado de injunção, a integração do direito à ordem jurídica, assim
tornando-o eficaz e exercitável, o que não ocorre na ação de inconstitucionalidade por
omissão, que gera, declarada a inconstitucionalidade, a ciência ao
Poder competente para que adote as medidas necessárias, mas sem nenhum meio de
coerção para a lei seja criada.
Apesar da distinção entre os institutos, durante muito tempo o mandado de injunção foi
aplicado de forma inadequada, sendo-lhe dado os mesmos efeitos da ação de
inconstitucionalidade por omissão.
Apenas em outubro de 2007, o STF superou as restrições da plena operacionalização
do mandado de injunção, resgatando sua função original, qual seja, sanar a omissão
constitucional no caso concreto, entendendo que a separação dos poderes deve ser mitigada
sempre que uma interpretação rígida desse princípio implicar na frustração dos princípios,
regras e direitos estabelecidos pela Constituição.
Como se vê, o Judiciário quase sempre pode intervir, mas deve observar sua própria
capacidade institucional.
Assim, cumpre, nesse momento, estabelecer a distinção entre judicialização e ativismo
judicial.
De acordo com Luís Roberto Barroso (2009), o processo de judicialização implica as
decisões tomadas por órgãos do Poder Judiciário, buscando solucionar questões de larga
repercussão política ou social e não pelo Congresso Nacional e pelo Poder Executivo, as
instâncias políticas tradicionais, entendendo que no cenário brasileiro, a judicialização é um
fato, uma circunstância decorrente do modelo constitucional adotado e não um mero exercício
deliberado de vontade política, enquanto o ativismo judicial consiste na escolha de um modo
específico e proativo de interpretação da Constituição, expandindo seu sentido e seu alcance.
Ainda, de acordo com o ilustre professor Barroso, podem-se citar três causas para a
judicialização no Direito pátrio.
A primeira seria o processo de redemocratização do país, culminando com a
promulgação da atual Constituição. Esse processo fortaleceu e expandiu o Poder Judiciário,
transformando-o em verdadeiro poder político, capaz de fazer valer a Constituição e as leis,
mesmo em confronto com os demais poderes. Além disso, houve uma maior conscientização
popular em relação aos seus direitos e, consequentemente, uma maior demanda perante juízes
e tribunais em busca da proteção de seus interesses.
Outra causa seria a constitucionalização abrangente, trazendo para a Constituição
inúmeras matérias que anteriormente eram deixadas para o processo político majoritário e para
a legislação ordinária, que, hoje, o poder constituinte derivado quer suprimir – PEC 341/09.
Como última causa, temos o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade.
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O ativismo judicial, por seu turno, se manifesta através de condutas como a aplicação direta da
Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto; imposição de
condutas ou abstenções ao Poder Público, entre outras formas.
Essa distinção entre judicialização e ativismo judicial faz-se importante para se
averiguar se há legitimidade para esse tipo de atuação do Poder Judiciário, bem com se há
riscos e consequências para a legitimidade democrática.
Limitações aos Protagonismo Judicial
Em nosso ordenamento jurídico a regra é a discricionariedade do legislador em criar ou
não uma lei. Contudo, quando se impõe ao órgão legisferante o dever de editar uma norma
reguladora da atuação de preceito constitucional , e este não o faz, sua abstenção é ilegítima,
devendo o judiciário, ao ser provocado, atuar em conformidade com a lei e na medida do que
foi levado a sua apreciação.
Para melhor entendimento acerca do tema, traz-se à baila o entendimento do Ministro
Celso de Mello:
Na realidade, o Supremo Tribunal Federal, ao suprir as omissões inconstitucionais dos
órgãos estatais e ao adotar medidas que objetivem restaurar a Constituição violada pela
inércia dos poderes do Estado, nada mais faz senão cumprir a sua missão
constitucional e demonstrar, com esse gesto, o respeito incondicional que tem pela
autoridade da Lei Fundamental da República. Práticas de ativismo judicial, embora
moderadamente desempenhadas pela Corte Suprema em momentos excepcionais,
tornam-se uma necessidade institucional, quando os órgãos do Poder Público se
omitem ou retardam, excessivamente, o cumprimento de obrigações a que estão
sujeitos, ainda mais se se tiver presente que o Poder Judiciário, tratando-se de
comportamentos estatais ofensivos à Constituição, não pode se reduzir a uma posição
de pura passividade. A omissão do Estado – que deixa de cumprir, em maior ou em
menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional – qualifica-se como
comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante
inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos
que nela se fundam e também impede, por ausência (ou insuficiência) de medidas
concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei
Fundamental, tal como tem advertido o Supremo Tribunal Federal: “DESRESPEITO
À
CONSTITUIÇÃO
MODALIDADES
DE
COMPORTAMENTOS
INCONSTITUCIONAIS DO PODER PÚBLICO. - O desrespeito à Constituição tanto
pode ocorrer mediante ação estatal quanto mediante inércia governamental. A situação
de inconstitucionalidade pode derivar de um comportamento ativo do Poder Público,
que age ou edita normas em desacordo com o que dispõe a Constituição, ofendendolhe, assim, os preceitos e os princípios que nela se acham consignados. Essa conduta
estatal, que importa em um „facere‟ (atuação positiva), gera a inconstitucionalidade por
ação.- Se o Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos
preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis,
abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a Constituição lhe
impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse „non facere‟ ou
„non praestare‟, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total,
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
quando é nenhuma a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida
efetivada pelo Poder Público. (...).” (ADI 1.458-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE
MELLO)
Nessa linha de pensamento, Lênio Streck aponta que a partir da nova ordem jurídica
inaugurada pela Carta da República de 1988 “as inércias do executivo e falta de atuação do
legislativo passam a poder ser supridas pelo judiciário, justamente mediante a utilização dos
mecanismos previstos na Constituição que estabeleceu o Estado Democrático de Direito. Ou
isto, ou tais mecanismos legais/constitucionais podem ser expungidos do texto magno.”
(STRECK, 2004).
Cappelletti (1993), por sua vez, entende que apesar da ativação judicial ser desejada
pela própria Constituição, essa ativação traz consigo três riscos: o primeiro consiste na
dificuldade de se avaliar a discricionariedade administrativa e legislativa, quando isso
depender de conhecimentos especializados ou de técnicas sofisticadas; o segundo óbice seria o
da falta de efetividade do controle jurisdicional, principalmente em relação às decisões que
impliquem em atividade continuada da Administração, e até na edição de diplomas
legislativos; por fim, a legitimação democrática dos membros do Judiciário, pois estes são
levados ao cargo que ocupam mediante concurso, carreira e nomeação, indagando qual o
fundamento com que se dispõem a controlar os outros poderes, compostos de eleitos pelo
povo.
Desse modo, recomenda uma autocontenção aos juízes, entendendo que os mesmos
devem se submeter às opções exercidas pelos demais poderes, quando não ofendam à
Constituição e às leis.
Barroso, por seu turno, no que diz respeito aos riscos à legitimidade democrática,
entende que a razão dos membros do Judiciário não serem eleitos, são atenuados na medida
em que juízes e tribunais se prendam à aplicação da Lei da Maior e das demais leis, atuando
não por vontade própria, mas em representação indireta da vontade popular.
Considerações Finais
Na atual conjuntura jurídica brasileira, a judicialização e o ativismo judicial são traços
marcantes. A judicialização é decorrente do modelo constitucional analítico e dos sistemas de
controle de constitucionalidade existentes. Por seu lado, o ativismo decorre do modo de
interpretar a Constituição, com uma postura proativa e expansiva, potencializando o sentido de
alcance da norma além do estatuído pelo legislador ordinário.
Entendemos que o legislador não é o único responsável por viabilizar a Constituição,
pois o judiciário tem a missão, estabelecida pela própria Carta Política, de impedir ações ou
omissões contrárias ao texto constitucional. Assim, para o cumprimento desta missão,
necessário se faz vislumbrar o princípio da separação de poderes/funções não como um fim
em si mesmo, mas como um meio para a efetivação da Constituição, devendo o judiciário
atuar na preservação da supremacia da Constituição.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Assim, sendo o Judiciário o guardião da Constituição deve agir como protagonista,
atuando em prol da preservação dos direitos fundamentais e dos valores e princípios estatuídos
pela Constituição, quando houver inércia e omissão dos demais poderes constituídos.
Entretanto, deve existir uma limitação, pois deve o Poder Judiciário acatar as escolhas
legítimas feitas pelo Legislativo, respeitando-se o princípio da Separação dos Poderes.
Sintetizando, com as palavras de Luís Roberto Barroso, o ativismo judicial “é um
antibiótico poderoso, cujo uso deve ser eventual e controlado. Em dose excessiva, há risco de
se morrer da cura.” (BARROSO, 2009).
Por fim, diante da omissão legislativa, o protagonismo judicial é legítimo e não ofende
ao princípio da Separação dos Poderes, posto que a atuação do Poder Judiciário é decorrente
da própria Constituição; porém, essa atividade do Judiciário deve ocorrer eventualmente e de
forma controlada, dentro dos parâmetros estabelecidos no próprio texto constitucional.
Referências
BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2 ed.
São Paulo: Saraiva, 2006.
_________. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Revista
Atualidades Jurídicas. nº 4, jan-fev/2009, OAB. Disponível em <http: //www. oab.org.
br/oabeditora/>. Acesso em 20/09/09.
CAPPELLETTI, Mauro. Tutela dos Direitos Difusos. Revista da AJURIS. Porto Alegre, ano
XII, nº 33, 169-182, março, 1993.
FREIRE JÚNIOR, Américo Bedê. A separação dos poderes (funções) nos dias atuais. In:
http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao002/americo_freire.htm. Acesso em
16/08/09.
STF- ADI 1458- Relator- Ministro Celso de Mello.
STRECK, Lênio Luiz. As constituições sociais e a dignidade da pessoa humana como
princípio fundamental, In: 1988-1998, uma década de Constituição; apud FREIRE JÚNIOR,
Américo Bedê. A separação dos poderes (funções) nos dias atuais. In:
http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edição002/americo_freire.htm- edição 46, 2004.
Acesso em 16/08/09.
TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. As novas garantias constitucionais, in Revista dos
Tribunais, nº 644, São Paulo, 1989, apud BARROSO, Luis Roberto. O Direito
Constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição
Brasileira. 8 ed. São Paulo: Renovar, 2006.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Estudo de Propriedades do Concreto através de Microtomografia
por Raio X e Scanner Comercial
J.R.C. Pessôa
G. Carvalho
J. T.de Assis
Rodrigues G.J.O
A resistência é considerada como uma das propriedades mais importantes do concreto,
nos fornecendo uma idéia geral de sua qualidade, estando ela diretamente relacionada com a
estrutura da pasta de cimento hidratado. O grau de adensamento de um concreto está
diretamente ligado à sua resistência. Verifica-se que a presença de vazios diminui muito a
resistência chegando, segundo NEVILLE (1997), a uma redução de 30% na resistência com
5% de vazios ou a uma perda de 10% de resistência com 2% de vazios. Esses vazios são
bolhas de ar aprisionado ou espaços deixados depois de retirado o excesso de água. O volume
dessa água está ligado principalmente ao fator água/cimento da mistura. A influência do
volume de poros sobre a resistência pode ser representada por uma função exponencial,
segundo A. GRUDEMO (1975).
Além do volume, a forma e as dimensões dos poros também têm influência na
resistência do concreto. RÖSSLER e ODLER (1985) apresentaram uma relação linear entre a
resistência e a porosidade dentro do intervalo entre 5% e 28%. Geralmente, para uma mesma
porosidade, poros menores resultam resistência maior da pasta de cimento hidratado.
WINSLOW e LIU (1990) viram que para uma mesma composição de pasta e mesmo
grau de hidratação, a presença de agregado graúdo resulta aumento de porosidade.
A presença de agregado miúdo também tem um efeito semelhante, porém menor.
A microfissuração do concreto se inicia na interface entre o agregado graúdo e a pasta
que o envolve. Nota-se que a microestrutura da pasta de cimento hidratada na vizinhança
imediata das partículas do agregado graúdo difere da microestrutura do restante da pasta de
cimento. Isso porque durante a mistura as partículas de cimento seco são incapazes de se
dispor densamente junto das partículas relativamente grandes do agregado.
Assim existe menos cimento presente para se hidratar e para preencher os vazios
iniciais. Conseqüentemente a zona de interface tem uma porosidade muito maior do que a
pasta de cimento em locais mais distantes do agregado graúdo.
Professor do Instituto Politécnico da UERJ e Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
Professor do Instituto Politécnico da UERJ e Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
Professor do Instituto Politécnico da UERJ.
Engenheiro da Eletrobrás Furnas - RJ.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Nem sempre métodos diferentes de determinação da porosidade resultam em valores
semelhantes. Isso porque os métodos tradicionais de determinação da porosidade geralmente
alteram a estrutura da pasta de cimento, principalmente quando envolvem adição ou remoção
de água. Um exemplo disso é o uso da intrusão do mercúrio no estudo do sistema de poros da
pasta de cimento, que admite que os poros vão se estreitando com o aumento da profundidade,
ao passo que, na verdade, alguns poros têm uma abertura mais estreita, o que distorce o valor
da porosidade determinado pela porosimetria por intrusão de mercúrio COOK e HOVER
(1993).
A automação de métodos que determinem a porosidade de materiais é objetivo de
trabalhos que vêm sendo produzidos recentemente. A maioria desses métodos trabalha com
imagens de alta qualidade (microscopia e scanner de alta resolução) e com o uso de programas
de processamento de imagens. Sendo o concreto um material heterogêneo, a porosidade de sua
matriz é um importante parâmetro para que se possa avaliar a resistência mecânica, grau de
impermeabilidade, resistência à abrasão e etc.
Imagem digital
O termo imagem digital, ou simplesmente imagem, refere-se à função bidimensional
de intensidade da luz f(x,y), onde x e y denotam as coordenadas espaciais e o valor f em
qualquer ponto (x,y) é proporcional ao brilho (ou níveis de cinza) da imagem naquele ponto
JAIN(1989). Para gerar uma imagem digital, f(x,y) deve ser digitalizada ao longo de x e y, e
na amplitude z = f(x,y). Para tanto é feita uma amostragem (normalmente uniforme) de f(x,y)
nas direções x e y, gerando uma matriz de N x M amostras, seguida de uma quantização do
valor de f(x,y) em L níveis cores. Nesta matriz, cada elemento (x,y), x = 0, 1, 2,..., M-1 e y =
0, 1, 2,.., N-1 é chamado de pixel (uma abreviação de picture elements).
A caracterização da luz é fundamental na ciência que estuda as cores. Uma imagem
colorida é uma imagem onde a cor em cada ponto (x,y) é definida através de três grandezas:
luminância, matiz e saturação. A luminância está associada com o brilho da luz, a matiz com o
comprimento de onda dominante e a saturação com o grau de pureza (ou intensidade) da
matiz. Atualmente os modelos de cores são orientados para máquinas (vídeos, impressoras,
scanners, etc.), para as mais variadas aplicações. O modelo mais utilizado para monitores e
câmeras de vídeo é o RGB.
A maioria das cores visíveis pelo olho humano pode ser representada como uma
combinação de três cores primárias: vermelho (Red), verde (Green) e azul (Blue). O modelo
de cor serve para facilitar a especificação de cores em um padrão. Substancialmente, um
modelo de cor é especificado em um sistema de coordenadas 3D, e neste espaço cada cor é
representada por um ponto. Assim, uma representação comum para uma imagem colorida
utiliza três bandas R, G, e B com profundidade de 1 byte por pixel (a profundidade total será
de 24 bits por pixel). No modelo RGB, cada cor aparece em sua componente espectral
primária do vermelho (R), verde (G) e azul (B). A imagem colorida no sistema RGB é
composta das intensidades das 3 cores variando do 0 a 255, o que permite a codificação de
27
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
aproximadamente 17 milhões de cores diferentes, embora o olho humano não possa
reconhecer mais que 350000 cores simultaneamente.
Processamento de imagem
Entendendo-se imagem como uma forma compacta de representar muitas informações,
em um sistema de processamento de imagens estas informações podem passar por diversas
formas de representação a partir do objetivo definido para aplicação. O primeiro passo é a
aquisição de uma imagem, onde pode ser utilizado um tipo de sensor para digitalização. O
sensor pode ser um scanner, uma câmera de TV, um tomógrafo, etc. A natureza do sensor e da
imagem que ele produz é determinada pela aplicação.
O estágio da segmentação divide uma imagem de entrada em partes ou objetos
constituintes. No caso de reconhecimento de imagens, o papel básico da segmentação é extrair
objetos ou regiões (ex. vazios, grãos ou agregados de grãos da imagem).
A Morfologia Matemática foi criada em meados da década de 60, pelo grupo liderado
por Georges Matheron e Jean Serra, da École Supérieure des Mines de Paris, em
Fontainebleau BANON e BARRERA (1998). Até o final dos anos sessenta, seu grande
potencial para a análise de imagens ganhou reconhecimento e utilização na Europa,
principalmente nas áreas envolvendo Microscopia. A partir dos anos oitenta, a Morfologia
Matemática começou também a ser difundida nos Estados Unidos e hoje é um fértil campo de
pesquisas. Ao longo das últimas três décadas a Morfologia Matemática tem sido aplicada
intensivamente a problemas de análise de imagens microscópicas, e é uma ferramenta
poderosa na análise destas imagens MEYER (1986).
No processamento de imagens, o estudo morfológico concentra-se nas características
geométricas das imagens e aplica-se em diversas áreas do processamento de imagens, como
filtragem, segmentação, realce e outras.
A idéia principal da morfologia matemática consiste em conjuntos de picture elements
(pixels), que são reunidos em grupos, representando uma estrutura bidimensional (forma), e
sobre os quais são realizadas operações matemáticas que ressaltam aspectos específicos das
formas para que estas possam ser reconhecidas e medidas.
A Morfologia Matemática pode ser traduzida como a aplicação de definições e
princípios matemáticos ressaltando aspectos específicos das formas permitindo que sejam
contadas ou reconhecidas. É uma metodologia para a descrição de operadores, e sua base
consiste em extrair de uma imagem desconhecida a sua geometria e topologia através da
utilização da transformação de outra imagem completamente definida, chamada elemento
estruturante. Existem dois operadores básicos (abertura e fechamento), e todas as outras
operações são formadas a partir desses dois operadores (ex. dilatação, erosão, esqueletização,
etc.). As principais aplicações da Morfologia Matemática são nos processos de filtragem de
ruídos, segmentação de partes, esqueletização, etc.
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Procedimento Experimental
Foram utilizadas quatro corpos-de-prova cilíndricos medindo 25mm de diâmetro e
50mm de altura, confeccionados com concreto comercial.
Para a execução das microtomografias 3D, foi utilizado um aparelho compacto de
microtomografia de alta resolução (~ 10 m) da SkyScan, modelo 1172, figura 1. Esse sistema
possui um tubo de raios X que opera dentro de um intervalo de tensão de 20 a 100 kV e com
potência até 10 W. Possui um tamanho de foco variável com a potência aplicada.
Figura 1 – Sistema SkyScan 1172
Vários processos podem ser realizados para minimizar os efeitos distorsivos da
tomografia: (a) a introdução de materiais filtros a serem colocados entre a fonte de radiação e
o objeto a ser inspecionado, como, por exemplo, alumínio, cobre ou latão, (b) utilização de
pequenas amostras e (c) correção durante o processo de reconstrução das imagens.
Foi desenvolvido um programa em MATLAB® para ler cada imagem gerada e
determinar a área de vazios. Para cada corpo-de-prova foram obtidas em média 900 imagens.
Cada imagem foi ajustada em contraste, binarizada e filtrada utilizando a operação de
erosão com elemento estruturante circular de raio igual a 2 pixels para a remoção de pontos
isolados interpretados como ruído. Na imagem-resultado foram contados os vazios obtidos.
Uma representação dessa operação é descrita na figura 2.
29
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Figura 2 – Etapas do processamento das imagens obtidas
Para obtenção das imagens por scanner foi utilizado scanner comercial. Essas imagens
foram digitalizadas na resolução de 2400 dpi.
Foi desenvolvido um programa em MATLAB® para ler a imagem e separá-la em suas
componentes HSV.
A componente V foi ajustada em contraste e binarizada. Essa imagem foi filtrada
utilizando a operação de erosão com elemento estruturante circular para a remoção de pontos
isolados, que está sendo interpretado como ruído. Nessa imagem-resultado foram contados os
vazios obtidos.
Uma representação dessa operação é descrita na figura. 3.
Figura 3 – Etapas do processamento das imagens obtidas por scanner
30
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Resultados obtidos através da microtomografia
Foi utilizada a seguinte nomenclatura para os corpos-de-prova:
CP01 = Corpo-de-Prova 1
Para cada corpo-de-prova foram analisadas aproximadamente 900 imagens e obtidos os
seguintes dados: área total da amostra, área de concreto, área de vazios (poros), porosidade da
superfície (em %) e desvio padrão.
A tabela 1 mostra o número de imagens analisadas, a porosidade média e o desvio
padrão, por corpo-de-prova.
Tabela 1 – Porosidade calculada através das imagens microtomografadas
Corpo-de-Prova
CP01
CP02
CP03
CP04
Imagens
962
861
962
669
Porosidade Média (%)
2,086
4,215
5,514
5,709
Área Total Área de Concreto
x 100
Área Total
Nota-se que a porosidade média calculada para os quatro corpos-de-prova através das
3.454 imagens analisadas convergem para um valor constante de aproximadamente 4,5%.
Índice de Porosidade (%)
Resultados obtidos através de scanner comercial (Flatbed Scanner)
Foi utilizada a seguinte nomenclatura para as imagens dos corpos-de-prova.
CP01I = Corpo-de-Prova 1 – Imagem Inferior
CP01S = Corpo-de-Prova 1 – Imagem Superior
Para cada corpo-de-prova foram analisadas duas imagens obtidas na parte inferior e
superior dos mesmos. A tabela 2 mostra o resultado para a porosidade obtido através do
processamento das imagens obtidas por scanner e o desvio entre os resultados encontrados
pelos dois métodos utilizados
Tabela 2 - Resultados obtidos por scanner e o desvio entre os dois métodos utilizados.
Amostra
CP01S
CP01I
CP02S
CP02I
CP03S
CP03I
CP04S
CP04I
Porosidade(%)
2,100
2,105
3,810
5,280
5,865
4,535
7,220
3,880
Media (%)
2,103
4,545
5,200
5,550
Desvio (%)
0,8
5,2
6,0
2,8
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Desvio(%)
PS
PT
PS
100 onde;
PS
porosidade média das amostras scanneadas ,
PT
porosidade média das amostras tomografadas.
A figura 3 mostra um gráfico comparando a porosidade encontrada para cada amostra
através dos dois métodos de obtenção das imagens.
6
5,5
Scanner
Tomógrafo
Índice de Porosidade (%)
5
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1
2
3
4
Amostra
Figura 3 – Gráfico comparativo entre os dois métodos propostos
Considerações Finais
Neste trabalho foram apresentadas duas técnicas para obtenção de imagens digitais em
corpos-de-prova de concreto. Uma utilizando microtomografia e outra utilizando scanner
comercial.
Através de técnicas de processamento de imagens foi determinada a porosidade das
amostras e feita a comparação entre os resultados obtidos pelos dois métodos propostos.
Observou-se que a média entre as porosidades encontradas para as diversas imagens
numa mesma amostra é a melhor representação para o valor procurado. Nota-se ainda que a
média total de porosidade de cada amostra converge para um valor constante de
aproximadamente 4,5%, valor esse compatível com valores conhecidos de porosidades nesse
tipo de concreto.
Observou-se uma relação entre os valores encontrados pelos dois métodos, para uma
mesma amostra como pode ser observado na figura.3.
De acordo com a tabela 2 foi observado que existe em algumas amostras uma diferença
significativa entre o valor encontrado para a porosidade calculada através das imagens obtidas
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
nas duas faces do corpo-de-prova. Acreditamos que isso ocorreu devido a alguns fatos a serem
considerados: (a) como os corpos-de-prova são pequenos, as imagens obtidas para
processamento também tem um tamanho reduzido; (b) quando se observou em uma imagem
uma área grande ocupada por um agregado graúdo recortamos a mesma para que a área da
imagem obtida melhor representasse a matriz do concreto e não distorcesse os resultados; (c)
só foi obtida uma imagem por face do corpo-de-prova devido ao seu tamanho reduzido; (d) só
utilizamos duas faces de cada amostra por não ser possível fatiá-las em mais faces sem que
comprometesse a integridade do corpo-de-prova.
Para as imagens obtidas por scanner, primeiramente foi necessária uma calibração do
programa devido ao tipo de equipamento.
Embora o estudo ainda se encontre em fase inicial, os resultados encontrados até o
momento se mostram promissores, com valores obtidos da mesma ordem de grandeza e
pequena diferença em relação ao valor obtido experimentalmente por outros autores.
Para trabalhos futuros pretendemos utilizar produtos reagentes com o agregado graúdo
ou com a matriz do concreto para melhor diferenciá-los.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao suporte financeiro dado pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação Carlos Chagas Filho de
Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) para desenvolvimento desta
pesquisa.
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33
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
“Se essa rua, se essa rua fosse minha”:
A resignificação da relação entre a Rua e a Escola
Munira Queiroz
“a vida será mais bem vivida se não tiver um sentido
único, mas muitos sentidos diferentes. (...)
precisamos de uma história que nos eduque para a
descontinuidade de um modo como nunca se fez
antes; pois a descontinuidade, a ruptura eo caos são
o nosso destino."
Hayden White
Na escola, dado ao seu caráter formativo, existe a possibilidade de se identificar as
possíveis relações entre os conceitos de representações mentais (fantasias, imaginação) e os
processos sócio culturais (cooperação, conflito) vividos pelos indivíduos em suas familias,
comunidades e em outros grupos sociais.
As ações, a linguagem, os dizeres e os fazeres, o comportamento, os hábitos e atitudes,
a formulação de conceitos e valores são dados indicativos para se identificar um grupo,
diferenciando-o dos demais.
Na instituição escolar a relação entre “rua” e “escola” fica estabelecida entre alunos,
professores, funcionários, servidores e gestores dentro de um discurso que valoriza o
instituído, o conhecimento formal, em detrimento dos conhecimentos trazidos pela “escola da
vida”, que aqui chamarei de “rua”.
Por que os valores trazidos pelos alunos causam tamanha celeuma e são alvo de tanto
preconceito? No espaço escolar essa segregação se perpetua com o discurso: “os alunos não
sabem nada”, “os alunos não tem cultura”, já desde o inicio desqualificando os valores
culturais e vivenciais trazidos da “rua”.
Tal discurso faz parte da nossa tradição, contudo, no avanço da construção de projetos
educativos é preciso atentar para este fato e procurar dirimí-lo, uma vez que “educar é
colaborar na construção de sujeitos sociais, culturais, políticos. É estar atentos a essa
construção, aos sujeitos coletivos educativos” (Arroyo, 2001, p.273).
Professora da Universidade Estácio de Sá- Psicóloga e Mestre em Cognição e Linguagem, pela Universidade
Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro/UENF. Mestre em Educação e Desenvolvimento Humano, pela
UNESA. Especialista em Neuropsicologia, pelo Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro.
34
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Considero que a partir de uma associação interrelacional possa haver um
reconhecimento mútuo e uma possível troca de experiências entre os Mestres da Rua (o saber
dos alunos, os lideres de grupos comunitários, os atores não reconhecidos pelos mecanismos
formais de ensino, etc.) e os Mestres do Ensino formal.
Outras questões se impõem: como é que práticas sócio culturais (fora da escola)
constituem uma cultura marginalizada perante a escola? Como os professores de escolas
(públicas ou privadas) ratificam a marginalização dos representantes dos saberes da rua, não
obstante seu reconhecimento fora da instituição escolar? As vivências culturais (capoeira,
maculelê, samba de roda, repente, dentre outros) contribuem para a construção de uma nova
identidade que atenda as exigências identitárias do mundo atual?
Com essas reflexões e questionamentos pretendo fomentar uma discussão sobre a
possibilidade da existência de uma relação profícua e respeitosa entre a rua e a escola, a partir
da mudança das representações mentais dos indivíduos que ocupam esses espaços.
Cabe assinalar que, paralelamente às tentativas de ampliar o conhecimento sobre essas
relações intergrupais na escola e sua interação no processo educativo, serão consideradas as
abordagens: Sóciointeracionista de Vigotsky e Cognição Cultural de Tomasello.
Educação e processos sociais
Em um artigo intitulado “Educação Fisica e Escola: A capoeira como alternativa
presente”, Freitas e Freitas (2002, pp 12-3), destacam que em função de sua gênese sócio
histórica, a capoeira é mantida a distancia do meio acadêmico, salvo nos casos em que é objeto
de estudo sócio antropológico. Os agentes sociais (representantes de rua) que detêm esse saber
são tradicionalmente mantidos afastados dos meios culturais elitizados. No caso especifico da
capoeira, projetos eugênicos discriminatórios a desvalorizaram como agente disseminador de
cultura, sendo em parte, responsáveis por sua marginalização e exclusão.
Não se pode descartar o peso da história de domínio e submissão do povo latino
americano que tem grandes desafios a enfrentar, conforme Anita Novinsky, Presidente do
Congresso Internacional América 92 – Raízes e Trajetórias:
“O desafio da América em moldar um novo homem é um fardo pesado, que implica
uma comunhão de esforços em prol da educação, de uma orientação humanística,
onde o valor supremo já não seja salvar as almas, mas, como diz Leopoldo Zea, salvar
o homem que vive e morre. Não é a grandeza da conquista que faz a América
orgulhosa de seu passado, mas a história clandestina de seus hereges, de seus índios,
de seus negros, de seus judeus. É a mistura de povos que antecipa o mundo futuro
onde, esperamos, não haverá mais lugar para “raças puras”. A herança que nos
honra não é a que recebemos dos dominadores, mas dos milhares de espanhóis e
portugueses que resistiram e sucumbiram à dominação.”
O problema da marginalizaçao dos representantes da rua não é recente e nem
circunscrito aos países latinoamericanos, contudo constitui-se (como os demais preconceitos)
35
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
em um novo objeto social. A educação entendida como processo tem como objetivo a
transmissão de conhecimentos e padrões de comportamentos visando a continuidade da
cultura social. O ensino formal discrimina o modo de agir de uma população que se mantém
fora dos registros formais ou dos padrões normativos elitizados, avaliando-a com preconceitos
e dificultando sua interação com o processo educativo.
Os processos sociais são as interações repetitivas de padrões de comportamentos
encontrados na vida social e mostram como os indivíduos e os grupos se relacionam e
estabelecem relações, a saber: acomodação (ajuste a situações conflitivas), conflito,
cooperação, competição, assimilação (mais longo e complexo, implicado na alteração
profunda dos modos de pensar, sentir e agir que solucionem conflitos). Tais processos se
desenvolvem especialmente no espaço escolar, mas não exclusivamente.
O desenvolvimento cognitivo cultural
(...) “qualquer função presente no desenvolvimento cultural da criança aparece duas
vezes e em dois planos diferentes. Em primeiro lugar, aparece no plano social e
depois no plano psicológico. Em princípio, emerge entre as pessoas e como uma
categoria inter psicológica. (...) As relações sociais ou as relações entre as pessoas
são geneticamente subjacentes a todas as funções superiores”. Vigotsky (1984, p.23)
A “linha cultural de desenvolvimento cognitivo” formulada por Vigotsky considera os
bebês como seres culturais que ao longo dos primeiros nove meses de vida vão se tornando
membros de suas culturas, num processo cada vez mais ativo e participativo.
Aprendem individualmente sobre o mundo em que nasceram antes de entenderem os
outros como seres intencionais. A partir daí, entendendo os outros como agentes intencionais
iguais a eles mesmos, um novo mundo de realidades intersubjetivamente partilhadas começa a
se abrir. É um mundo povoado de artefatos e de práticas sociais materiais e simbólicas que os
membros de sua cultura, tanto os passados como os presentes, criaram para que os outros os
usassem. E as crianças aprendem a utilizar os artefatos de forma adequada e a participar
dessas práticas sociais da forma como elas foram concebidas, dependendo para isso de um
“outro” social.
Monitorar as relações intencionais dos outros com o mundo externo, para Tomasello
(2003, p.128), também significa que a criança – quase que por acidente, monitora a atenção
das outras pessoas quando estas se ocupam dela. Isso “dá inicio ao processo de formação do
auto conceito, no sentido de que a criança entende, mental e emocionalmente, como os outros
(a) vêem...”. Essa capacidade de ver o eu como um dos participantes, entre outros, capacidade
de interação, é a base sócio cognitiva da aptidão da criança de compreender os eventos
socialmente compartilhados que constituem o formato básico da atenção conjunta para a
aquisição da linguagem e de outros tipos de convenções comunicativas. Segundo o referido
autor “a compreensão dos outros como agentes intencionais é o passo fundamental na
ontogênese da cognição social humana” (p.129), o que possibilita o início da “linha cutural de
desenvolvimento” da criança, que irá durar a vida toda e que a capacitará para se engajar em
36
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
vários processos de aprendizagem cultural e para a internalização das perspectivas das outras
pessoas.
Vigotsky (1984) reconhece o caráter social e cultural do comportamento humano como
um elemento particular e diferenciador da nossa espécie que pode significar o ponto de partida
na resolução do complexo problema das relações entre desenvolvimento pessoal, social e
educação. Para ele o desenvolvimento cultural se dá no plano social e posteriormente, no
psicológico.
As representações mentais
A representação mental é a função cognitiva que tem por finalidade analisar,
armazenar, categorizar, evocar e transmitir informações captadas do mundo externo, através
dos órgãos sensoriais, e, do mundo interno, através das memórias filo e ontogenéticas; atua no
plano neuropsicológico resignificando as imagens. A partir das vivências recíprocas entre os
atores da rua e os da escola novos padrões poderão ser instaurados através de novas
representações mentais.
Os padrões individuais e coletivos podem ser (re)significados uma vez que haja o
reconhecimento dos entraves e dos preconceitos, e que os envolvidos possam refletir sobre
sua condição no mundo. A escola é um espaço rico para que ocorram tais transformações,
desde que reconheça o quão elitizado tem sido o seu discurso, preso a uma ideologia
empobrecida pela visão reducionista sobre as classes menos favorecidas.
Os desafios da Educação
Bauman (2008) aponta desafios para a educação contemporânea, tais como, aceitar que
o atributo de durabilidade do conhecimento não é mais desejável, que se tornou anacrônico
ante os imperativos da vida nas sociedades atuais, face à natureza imprevisível das mudanças.
O mundo muda de uma forma nunca antes imaginada e os conhecimentos, junto com os
critérios de verdade que os validam e legitimam, não são mais aceitos e não se sustentam.
A análise sociológica de Bauman é permeada por suas preocupações com a educação,
apesar de pouco abordar esse tema diretamente. Seu eixo se encontra nas repercussões na
educação da passagem do mundo ordenado, seguro e resolvido da "modernidade sólida" para a
condição instável, fluída e mutante da "modernidade líquida".
Segundo o autor, nos períodos cruciais da história humana, quando estratégias
consagradas e consideradas confiáveis não mais se sustentavam e precisavam ser reformadas,
a pedagogia esteve sempre implicada nessas transformações. Contudo, os desafios
contemporâneos colocam sob suspeita a própria idéia de pedagogia, aquilo que a constituiu
como tal, e certezas jamais criticadas são condenadas e substituídas. No mundo líquido
moderno, também a solidez dos legados humanos é interpretada como uma ameaça.
37
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Considerações finais
À medida que a cognição cede lugar à recognição, as imagens pertencentes aos padrões
anteriormente estabelecidos assumem uma função progressiva de transformação. A
restauração da memória é acompanhada pela recuperação do conteúdo cognitivo da fantasia e
o peso dessas redescobertas deve finalmente desmontar a estrutura em que tais imagens
ficaram confinadas.
O fato de vivermos em uma sociedade global e, ao mesmo tempo particularizada,
individualista e de múltiplas faces, nos impele a significarmos nossa presença no mundo
traçando novos rumos, novos discursos e novas empreitadas, a fim de respondermos às
exigências de diferentes ordens. Em outras palavras, a construção de um novo cidadão que nos
remeta à necessidade de uma nova forma de ser. A escola e a rua nesse processo devem
estabelecer uma relação de retroalimentação constante, de troca de significados e de
posicionamentos frente às atuais demandas sócio cultural e ambientais.
Referências
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39
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
O Conceito de Competências
Antonio Figueiredo
O Conceito de competências começa a ser utilizado nos anos 80 na Europa, mas com
características diferentes e com vários sentidos em diversas abordagens. Tem origem nas
ciências de organização, e surge num contexto de crise do modelo de organização taylorista e
fordista, mundialização da economia, exacerbação da competição nos mercados, exigências de
melhoria da qualidade dos produtos e flexibilização dos processos de produção e de trabalho, e
dentro deste contexto as empresas passam a utilizar as aquisições individuais da formação do
individuo, sobretudo na escola, em função de suas necessidades organizacionais. A Autora
define competências como algo “inseparável da ação e dos conhecimentos teóricos e/ou
técnicos são utilizados de acordo com a capacidade de executar as decisões que a ação sugere.
A competência é a capacidade de resolver um problema em uma situação dada. A competência
baseia-se nos resultados.”
A pedagogia das competências começa a ganhar força nos anos 80, e é implementada
na França na Charte des programmes de 1992, que “enuncia os princípios de diretivos dos
programas de ensino para todos os ciclos da educação geral”, que para a autora é o marco da
passagem entre o ensino focado nos saberes disciplinares para um ensino que foque a
produção de competências diversas conforme a execução de tarefas.
Esta pedagogia é focalizada em objetivos de referencias (Ensino Geral), referenciais
(Ensino profissional) e referencia de atividades (nas empresas), ou seja, é voltado para
Competências terminais a serem adquiridas no final do curso, do ano, ou da formação, que são
descritos detalhadamente. Sendo esta também a forma de identificação de competências
requeridas pelos empregos.
A experiência francesa demonstra uma tendência ao foco no aluno, colocando-o ator de
seu percurso, e ficando as organizações motivadas a valorizar os percursos e competências
individuais dentro do percurso profissional.
DELUIZ (2001) alerta para os riscos de adoção do conceito de competências de forma
acrítica, apontando para a utilização da formação por competências exclusivamente para as
necessidades de produção do mercado, e que sem a utilização do ensino politécnico, esta
abordagem se torna restritiva, instrumentalizante e tecnicista. A Autora demonstra que no
Brasil, devido a dualidade entre educação geral e educação técnico-profissional, aprofunda a
separação entre concepção e execução, pois sem a ampliação da base da educação geral, os
trabalhadores recebem uma formação insuficiente pela rápida obsolescência de
conhecimentos, sem os aprofundamentos necessários.
Professor convidado especialista em Gestão de Recursos Humanos e Mestrando em Educação.
40
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
A autora encerra o artigo reafirmando que é necessário maior questionamento na
utilização da abordagem por competências especialmente pelo manuseio do conceito para
formação restritiva e exclusiva ao mercado, questionando também o papel das políticas
públicas no sentido de articulação de um sistema em que todos os atores sociais estivessem
envolvidos.
Considerações finais
A partir do novo olhar e de novas concepções sobre o mundo do trabalho, verifica-se a
grande questão sobre a abordagem das competências, sua definição clara, sua forma de
utilização e instrumentalização.
Os conceitos de politecnia estão sendo utilizados de forma desastrosa, confundindo
com polivalência e multiplicidade de tarefas, com o conceito de competências que estão
contidas dentro da própria sistemática de formação e de educação da abordagem Gramsciana.
A formação profissional é posta em cheque quando se apropria de conceitos não claros,
e formam um trabalhador situacional, voltado as necessidades imediatas de mercado tornando
esta qualificação descartável, se for o caso de mudança, o que é praticamente certo dentro do
mundo da especialização flexível, já que a flexibilidade do mercado é o agente definidor da
premissa maior deste modo de produção.
É necessário uma reflexão profunda do papel da educação geral no processo de
formação do trabalhador e do ensino profissional, surgindo várias críticas a adoção desse
modelo na educação brasileira, como o caráter ideológico da articulação entre escolaridade
básica, competência e empregabilidade, onde as competências são tomadas como naturais,
inerente ao indivíduo e não criadas e possibilitadas socialmente. Deluiz também atenta ao
risco da adoção desse tipo de pedagogia, como atendimento exclusivo ao mercado,
preocupação com o produto e não com o processo de construção e a responsabilização do
trabalhador pela aquisição e manutenção dessas competências. Para Deluiz, os referenciais
curriculares são conceitualmente construtivistas e operacionalmente funcionalistas.
A mudança no foco da educação profissional com ênfase na laborabilidade ou
trabalhabilidade deve-se à escassez das formas tradicionais de emprego e mudança no perfil
requerido. Estas competências são conjuntos de conhecimentos (saberes), habilidades (saberfazer) e valores (saber ser) desenvolvidos através de ações-projetos, situações problemas
encontradas no mercado.
Referências
DELUIZ, Neise. O Modelo das Competências profissionais no mundo do trabalho e na
educação: implicações para o currículo. Boletim Técnico do SENAC v. 27, n.3, set./dez.,
2001.
41
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Credibilidade, Diálogo e Cidadania :
Necessidade latente de abertura do sistema empresarial
Roberto F. Vieira
“(...) não há diálogos sem sujeitos, sem aqueles que se
expõem e se dispõem às trocas, que se expressam e se
abrem às idéias e aos conceitos de um outro alguém, na
busca por novos entendimentos”.
Andréa Faria
A credibilidade não se conquista apenas com a abertura da organização no sentido de
informar aos públicos como que se relacionam suas políticas, filosofias e atitudes. Ela provém,
principalmente, da manutenção de um diálogo verdadeiro, baseado numa autêntica interação
entre as partes. Disse, (ANDRADE, 1989, p. 91), a respeito da eminência do diálogo:
“(...) A época do isolacionismo está sepultada (...). Há necessidade urgente de
intercâmbio de idéias, de experiências e de interesses. Somente o diálogo com todos
pode permitir o progresso. Não existe questão que não possa ser equacionada e
solucionada por meio de debates e da compreensão mútua (...”).
Dado que a sociedade apresenta, hoje, características bastante peculiares, tal como a
crescente soberania do interesse público em detrimento dos interesses privados, os conflitos
entre organização e comunidade tende a se agravar se não houver um redimensionamento
dessa relação. Tal redimensionamento só se tornará viável mediante a adoção de uma atitude
dialogal, que busque uma sintonia de interesses e estabeleça o entendimento com base em um
consenso. E importante que se diga que esta necessidade de diálogo não se restringe somente à
relação organização-comunidade, mas, antes, permeia todo o ambiente social em que os
indivíduos interagem continuamente uns com os outros.
A reflexão sobre o aspecto inter-humano - base primeira das relações - nos permite
compreender uma nova dimensão de mundo e nela estabelecer outras formas de interpretar o
sentido de comunidade e de organização. Ambos são segmentos orgânicos, se compõem de
um conjunto de indivíduos. Mas, a comunidade, em seu sentido lato, incorpora a organização
(esta vista como cidadã, como vizinha), substituindo, assim, a existência de duas categorias
por uma, realidade única e portadora de um significado mais amplo, e por isso mesmo
dialético: a realidade social.
Professor da Universidade Estácio de Sá - Unidade Nova Friburgo/RJ. Pesquisador stricto sensu em Ciências da
Comunicação pela USP. Como pesquisador é vinculado a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da
Comunicação – INTERCOM. Autor dos livros “Relações Públicas: opção pelo cidadão” (2002);
“Comunicação Organizacional: gestão de relações públicas” (2004) e “Organizações e o Interesse Público”
(2012). Organizador da coletânea “Jornalismo e Relações Públicas: ação e reação” (2004).
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Nesse contexto, a organização se torna parte integrante da comunidade, e a partir desse
momento, verdadeiramente responsável pelas questões que afetam de forma direta o
desenvolvimento comunitário. Para que melhor se entenda essa dialética do sistema social,
inserida na comunidade e incorporando-a a organização, é preciso que seja aprofundado o
conhecimento a respeito do inter-humano, da relação do EU e TU proposta por Bubber. Só
compreendendo a riqueza do diálogo entre os indivíduos, que nesse ato responsável se
distinguem da massa e se tornam pessoas, chegamos a autenticidade primeira das relações.
Há que se resgatar esse aspecto do inter-humano a fim de que não se corrompam os
entendimentos e o respeito às diferenças, bem como o processo consensual resultante do
diálogo. Conquanto, a organização não seja um indivíduo, é fundamental que se configure à
mesma um sentido de humanização, onde o relacionamento com grupos, como a comunidade,
deixa de ter um caráter eminentemente político e ou mercadológico (busca da aceitação para
não inviabilizar o sistema de produção), para assumir um papel social em sua essência.
O pensamento de (BUBBER, 1987, p. 123), apresenta o problema do inter-humano e dos
conflitos advindos dos interesses individuais como uma situação própria da sociedade, uma
questão dialética a ela inerente, que suscita o debate e acaba por enriquecer e reconstruir esta
relação do EU com o TU. Tal dimensionamento pode ser a base para a compreensão da
relação organização-comunidade. Diz Bubber sobre a responsabilidade dos homens no
contexto social:
“Creio que a sociedade, imensa inter-relação de muitos homens, só é real na medida em
que consiste em relações autênticas entre os homens. Por outro lado, creio igualmente que
o indivíduo atinge a realidade na medida em que se torna pessoa (...) Como pessoa, é
responsável por eles (outros homens) e aceita a responsabilidade deles por sua própria
pessoa (...) ao mesmo tempo em que sempre se oferece como pilar sobre o qual será
construída uma ponte sobre si e sobre seus parceiros momentâneos – ponte eterna que
desaba a cada momento, mas que a cada momento se reconstrói novamente”.
Quando dizemos que o diálogo do EU com o TU, proposto por ( BUBBER, 1987, p.132),
pode servir de respaldo às relações entre uma organização e comunidade, dentro do contexto
social, estamos tentando provar que através da inserção da empresa na comunidade, dada em
virtude de seu processo de humanização, se torna possível um dialogar mais autêntico entre as
partes e uma conscientização efetiva sobre o papel social para com aqueles que agora repartem
com ela o espaço comunitário.
Os interesses da coletividade se tornam, também, interesses da iniciativa privada. As
divergências passam a ser resolvidas dentro de um único grupo – a comunidade. E o
empresário, ou aquele que o representa, discute e defende suas idéias assim como qualquer um
dos membros. A diferença está no fato de que se vendo como um desses membros, este
adquire uma nova visão das conseqüências advindas de alguns de seus interesses e se torna
consciente do real sentido do termo „compromisso social‟. Seu ato se torna socialmente
responsável, porque se torna consciente. A definição de ( BUBBER, 1987, p. 132), sobre
comunidade mostra que tal fato é possível, pela própria natureza dessa forma de organização,
e diz: “A verdadeira comunidade (...) nasce de duas coisas: do fato de estarem todos em
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relação viva e mútua com um centro vivo e de estarem unidos uns aos outros em uma relação
viva e recíproca. A comunidade edifica-se sobre esta relação viva e recíproca (...)”.
Se a comunidade se origina, então, dessa relação viva e recíproca, e a empresa, para
estabelecer com ela o entendimento, participa desta relação tornando-se aberta e com ela
interagindo, não há nada de errado em se dizer que a empresa se integra à comunidade.
Contudo, esta nova estrutura, esse redimensionamento das relações estabelecidas entre a
iniciativa privada e a coletividade, não isenta o ambiente social do conflito entre estas duas
forças. Mesmo porque, o conflito é próprio da situação de devir, símbolo máximo da
contemporaneidade.
O mundo tende a sofrer, num espaço de tempo cada vez mais curto, um número cada
vez maior de alterações. Ele está em constante processo de transformação, e por esse motivo é
pura dialética. As proposições encerram em si mesmas o gérmen de sua própria negação, o
que gera um conflito dentro do próprio „objeto‟. Hegel, ( apud D‟HONDT, 1984, p. 91-92) em
Sciece de la logique, confirma essa idéia ao dizer que: “a contradição reside nas próprias
coisas e instituições (...) e que uma coisa não é viva senão na medida em que encerra uma
contradição e possui a força de a conter e sustentar (...)”.
Assim sendo, a comunidade e o sistema social, como um todo trazem em si a
contradição, vivendo o conflito que lhes é inerente e buscando uma solução que permita a sua
continuidade enquanto instituições. Esse conflito não deve ser visto como algo negativo; mas
ao contrário, como um impulso à transcendência. Da mesma forma, a empresa inserida na
comunidade, não deixará de ter com esta interesses divergentes, caracterizando-se desse modo,
o conflito. Nesse momento, uma passa a ser a „antítese‟ da outra, e a partir desses dois
posicionamentos, eis que surge a síntese, neste caso representada pelo consenso havido entre
as partes.
A própria inserção da organização na comunidade pode ser vista sob o prisma
dialético, visto que consiste em uma transformação do „status quo‟ até então vivenciado. A
organização e a comunidade interagiam, mas funcionam separadamente. A nova situação
proposta funciona como refutação da idéia primeira, e o resultado oriundo do antagonismo
destes posicionamentos não é a anulação da organização diante da comunidade, mas a sua
inserção nesta, o que não a descaracteriza, visando maior entendimento e a busca de uma
perfeita sintonia de interesses. A comprovação do processo dialético está na própria definição
de „dialética‟ de Hegel, (apud D‟HONDT, 1984, p.41) “A dialética, para Hegel é, antes de
tudo, o principio de desenvolvimento de toda a realidade (...)”.
Acrescenta-se que desde a época dos gregos, já se enunciava o caráter imprescindível
do modo dialético. Assim (HERÁCLITO, 1985 Coleção os Pensadores) diz que “tudo se
origina por oposição e tudo flui como um rio”, o que nos permite verificar a imanência da
transitoriedade na realidade humana e social.
Em síntese é a palavra „sintonia‟ que confere novo significado a este procedimento.
Porque, pressupõe, antes de tudo, o respeito pela diferenciação e a reciprocidade desse
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respeito, que é a base para a existência do diálogo e, conseqüentemente, obtenção do
consenso. Consenso que nos leva a „compreensão mútua‟.
A compreensão mutua e o resgate do valor humano
O conflito sendo iminente na sociedade, talvez faça parte do contexto social, não
havendo como expurgá-lo de nosso meio, já que tudo é dialético. Mas, visto que a
compreensão mútua não significa, necessariamente, a negação desse processo dialético,
devendo mesmo basear-se no respeito às diferenças e na necessidade de transformações
contínuas para um maior desenvolvimento das partes, não procede separar „compreensão
mútua‟ – de „conflito‟. Um pode perfeitamente, se entendido como antagonismo, se resolver
por intermédio do outro – a compreensão mútua. Porque, esta última pressupõe o
estabelecimento de uma atitude dialogal, onde sabemos conflitua-se, muitas vezes, interesses
diversos. A ordem social pode não atender a todos esses interesses, mas partirá de um
princípio de justiça, que se aceito pelas partes, culminará senão na integração, pelo menos na
consciência do respeito às diferenças para a perpetuação do modelo democrático.
É bom lembrar que! O desgaste da expressão „compreensão mútua‟, usada
excessivamente para a legitimação das atividades empresariais, e para maior aceitação destas,
pela opinião pública, gerou um descrédito na possibilidade das diferenças se entenderem e
criarem uma nova instância que represente um consenso. Como nos diz Hegel (apud
D‟HONDT, 1984, p.70), “(...) cegos são aqueles que conseguem acreditar que podem
persistir instituições (...) que deixem de concordar com os costumes, as necessidades e a
opinião das pessoas (...)”.
Depreende-se das palavras de Hegel que o processo é eminentemente dialético; mas
que suas contradições podem se dissolver de maneira negativa, resultando em aniquilamento
de uma das formas, caso não haja a procura do entendimento, ou seja, de uma verdadeira
„compreensão mútua‟. Eis que (HERÁCLITO, 1985, p.77) nos coloca diante de uma
possibilidade desse entendimento, quando diz: “que o universo é gerado não segundo o
tempo, mas segundo a reflexão”. Assim sendo, o processo reflexivo pode nos conduzir a
convivência harmoniosa, que busque a resolução dos conflitos.
Obviamente, para que essa expressão readquira o seu significado pleno, é preciso
resgatar alguns valores humanos, aplicáveis às organizações, que se perderam diante de uma
moral capitalista. Neste ínterim, tanto o conflito, que pode gerar mudanças nas estruturas
vigentes, quanto o diálogo e a compreensão mútua, que podem resultar num consenso, ambos
podem levar a conscientização do empresariado sobre o papel que tem a desempenhar na
comunidade.
A transformação dessa consciência organizacional pode se processar de duas maneiras:
uma categórica e idealista; outra, libertária e estrutural. A primeira se baseia no pensamento
kantiano e nas suas noções de moral e liberdade. O empresário, analisado segundo essas
noções, tem na moral um dever, não podendo permitir que outros interesses interfiram no seu
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ato de responsabilidade para com a comunidade. A consciência é uma conseqüência do
reconhecimento de um dever moral.
A segunda situação que pode acarretar mudanças estruturais na organização privada,
bem como a introjeção de um comportamento socialmente mais responsável, tem por base as
idéias de Michel Foucault. Segundo ele, o modo de ser do homem, embora se vincule as
positividades que o limitam, traz em si o gérmen da libertação (pela transcendência), que se
torna uma opção de escolha. O mecanismo de distanciamento e retorno da origem possibilita
ao indivíduo reavaliar seu papel no mundo e o das estruturas vigentes que o cercam. Diz
(FOUCAULT, 1985, p. 330-344).
“Na verdade (...) esta primeira descoberta da finitude do homem é instável; nada
permite detê-la sobre si; e não se poderia supor que ela promete também esse mesmo
infinito que ela recusa, segundo o sistema de atualidade? (...) é a reflexão, e a tomada
de consciência, é a elucidação do silencioso, a palavra restituída ao que é mudo, o
advento à luz dessa parte de sombra que furta o homem de si mesmo, e a reanimação
do inerte, é tudo isso que constitui, por si só, o conteúdo da ética (...) Deixemos agir
aqueles que querem, sem qualquer promessa e na ausência de virtude, constituir uma
moral (...)”.
Entendendo-se moral como um conjunto de normas e regras comportamentais, temos,
segundo Foucault, uma moral que não mais parte de urna idéia hermética de dever, mas, que
se constrói a si mesma, mediante um processo de reflexão e de tomada de consciência. O
homem ultrapassa os limites de seu pensamento condicional, e assim, questionando a própria
origem das coisas, dá a si o poder de transformá-las. Trata-se de uma conscientização que
provém do próprio ato reflexivo a que se propõe o homem.
Assim, uma reconstrução da realidade social e redimensionamento da relação
organização-comunidade podem advir de uma reflexão do empresário sobre possíveis
contribuições da iniciativa privada, em áreas prioritárias para o desenvolvimento da Nação,
desde que ele descubra em si: o desejo de transformar as estruturas empresariais, o sentimento
de participação na vida coletiva e a necessidade de construção de uma moral, baseada em seus
próprios princípios de justiça.
Em últimas palavras, a existência do conflito não elimina a possibilidade de
entendimento, porque em cada momento histórico o processo dialético se renova e o
entendimento pode ser uma forma resultante desta dialética (síntese), sem que haja
aniquilamento total de qualquer uma das proposições conflitantes.
Conforme Hegel (apud D‟HONDT, 1984, p.32), “o que somos é historicamente que o
somos”. Assim, a nova identidade empresarial pode ser entendida como o resultado de um
processo dialético estabelecido entre a „empresa como um sistema fechado em si mesmo‟ e a
„pressão exercida por uma opinião pública mais consciente e detentora de uma infinita gama
de opções‟. Como pano de fundo, a situação que deu origem ao conflito: a
contemporaneidade, que trouxe uma pluralidade de signos e o devir constante dos mesmos.
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Dai apontamos que a nova identidade empresarial não provém, exatamente, das
pressões da opinião pública, ou mesmo, do devir da contemporaneidade, mas sim da própria
deficiência do modelo administrativo, que teve na sua antítese a sua complementação. Há,
portanto, uma necessidade latente de abertura do sistema empresarial.
Referências
ANDRADE, Cândido Teobaldo de Souza. Psicossociologia das Relações Públicas. 2ª Ed..
São Paulo: Edições Loyola, 1989.
BUBBER, Martin. Sobre Comunidade. Trad. Newton Aquiles von Zuben São Paulo:
Perspectiva, 1987. Coleção Debates, nº. 203
________________. EU e TU. Trad. Newton Aquiles von Zuben. São Paulo: Cortez &
Moraes, 1977.
FARIA, Andréa Alice da Cunha. Ferramentas do diálogo – qualificando o uso das técnicas
do DRP: diagnóstico rural participativo. Brasília: MMA; IEB, 2006. 76 p.
FOUCAULT, Michel. As Palavras e as Coisas: uma arqueologia das ciências humanas.
Trad. Salma Tannus Michail. 3ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1985.
HEGEL, George Wilhelm Friedrich. „Science de la logiques’. In: D‟HONDT, Jacques. Trad.
Emília Piedade. Lisboa: Ed. 70, 1984.
______________________________. „Phénomenologie de l’espirit’. In: D‟HONDT,
Jacques. Trad. Emília Piedade. Lisboa: Ed. 70, 1984.
HERACLITO DE EFESO. In: Os Pré-Socráticos. Fragmentos, doxografia e comentários.
Trad. José Cavalcanti de Souza (et al.). 3ª Ed. São Paulo: Abril Cultural, 1985. Coleção os
Pensadores.
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Nem sempre é amor
Ludmila Maurer1
Valéria Campos Muniz
Atentos ao universo sertanejo, mais precisamente o Universitário, atravessa a
linguagem não apenas a temática do amor cortês, do amor paixão (lírica), porém a troça
(sátira). O gênero musical como discurso da comunidade jovem atual, ainda que inscrito em
um gênero musical já existente, traz entranhada em si uma história que supera e excede essa
composição no tempo e no espaço.
Ao dizer o gênero – qualquer - como discurso de uma comunidade, podemos ressaltar
esse gênero ou estilo como produto de décadas de embates sociais. Cada nova canção, num
dado gênero, se inscreve nesta rede comunitária, reforçando continuidades ou talvez propondo
rupturas, mas tendo como referência lutas sociais por definições que fazem constar disputas de
poder.
No início, a música sertaneja, na época caipira, ganhou essa identidade em virtude de
sua associação ao ambiente rural. Era uma música melancólica de fortes agudos, que cantava
causos e evocava o estilo de vida do interior, numa moda de viola.
Surgido como terceira geração do movimento, o sertanejo universitário define-se sem o
regionalismo vivido por caipiras – Sertanejo Raiz, e assume feição de um Sertanejo
Romântico com nível ideológico autônomo: poligamia, traição. A introdução da guitarra
elétrica com uma releitura de grandes sucessos internacionais ou da jovem guarda num ritmo
mais jovem atrai um público que antes considerava esse tipo de música “brega”. Temas
ligados ao interior não atraíam o povo da cidade que, de certa forma, almejava sair de uma
condição de país agrário, subdesenvolvido.
A partir de 2000, com uma tendência mais comercial, o sertanejo universitário
distancia-se do sertanejo convencional. Sua origem associa-se ao grande crescimento de
Universidades no Brasil, com possibilidades de Faculdades particulares que incorporam
segmento social antes excluído de seus bancos e que trazem consigo o gosto musical sertanejo,
universo anterior dos fãs de MPB, de Rock Progressivo e dos metaleiros.
Enquanto discurso de grupo social, representa-se num espaço contraditório da música
de massas com receptores independentemente de seu pertencimento a uma classe social
específica, vide a existência comercial e cultural de cada canção depender de sua capacidade
Pós graduada em Línguas e Letras e autora do livro Máximas da Modernidade Tardia – um convite à reflexão.
Professora da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo. Doutoranda pela UERJ em Língua
Portuguesa.
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em fazer com que o público nela se reconheça. As canções oferecem identidades que o público
deseja ter ou acredita possuir.
O sujeito Autor, não destituído de agência, está inserido nesta rede sócio-simbólica,
que lhe fornece elementos passíveis de serem compreendidos naquela cultura.
Sucessivamente, qualquer nova canção alude a um imaginário disseminado no tempo e
no espaço e, estudando-se o gênero musical como produção do coletivo anônimo, pode-se
pensar em muitas outras faixas sociais interessadas no sertanejo e envolvidas na sua
construção, além dos estudantes universitários de classe média.
Diferentemente da geração dos anos 60, ainda envolvida em um pós guerra, que
pregava liberdade, paz e amor, num movimento de rebeldia, a geração atual, bem menos
atuante em termos políticos, é uma geração de festas que, ao mesmo tempo em que utiliza
drogas, vivencia o culto ao corpo e à saúde. A bebida alcoólica, fortemente presente nesses
ambientes, seduz o jovem, de todas as idades, que procura relaxar do estresse imposto pela
dinâmica capitalista. O excesso de cobrança leva o jovem a viver essa dicotomia, buscando,
em suas horas de lazer, a diversão sem o comprometimento de se levantar uma bandeira em
prol disso ou daquilo.
De uma temática caipira, em que os causos do homem do campo transformavam-se em
acordes, a música sertaneja na década de 80 passa a falar não só da vida no interior, mas
também das paixões sofridas. Tocado num ritmo mais acelerado, alegre e dançante, com novos
instrumentos como guitarra, baixo, bateria além, é claro, da sanfona e do acordeão, mescla
elementos do pop, rock, forró e axé. Essa mistura deixa distante aquela música sertaneja
romântica em ritmo, para se tornar romântica fundamentalmente no conteúdo.
Hoje os adolescentes não sentem medo do ridículo ao assumir que gostam de música
sertaneja universitária. Como o próprio adjetivo indica, seu público é bastante peculiar e não
se confunde com o sertanejo de outrora, de marca ruralista. A proposta contida nessa releitura
musical, com novo ritmo, abre espaço para uma sinergia com um público jovem.
A escolha de se realizar um estudo sobre o gênero musical, mais precisamente o
sertanejo universitário, deveu-se à enorme repercussão na mídia desse estilo de música.
Pretende-se, por intermédio de suas letras, identificar sua formação discursiva e os amantes
desse gênero musical no tempo e no espaço.
A música identificada como sertanejo universitário ultrapassou as barreiras de uma
cultura local, de interior e ganhou espço nas grandes cidades, reduto antes impensável para o
estilo, conquistando um público jovem e também infantil. A temática de suas letras instiga o
interlocutor a um espaço discursivo do amor, das dores, da traição, do desejo. É um tipo de
música que não leva a uma reflexão do nosso papel social, porém inspira o que fica em
segundo plano numa sociedade submetida à coação do capitalismo: o sentimento.
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Será feita uma abordagem linguística das músicas, tanto de sua organização sintática
quanto semântica, de modo a correlacionar sujeito e história. Nesse sentido, o discurso será
contemplado em relação a outros discursos, num processo dialógico, evidenciando os diversos
dizeres já proferidos. É importante ressignificar as construções, a fim de inserir o indivíduo em
seu cotidiano, revelando aspectos relativos à forma de viver e pensar de um grupo, o
imaginário coletivo que se identifica com esse tipo de música.
As mensagens transmitidas pelas músicas aqui analisadas e de maneira geral pelas
músicas pertencentes a esse universo discursivo dialogam entre si, constituindo uma formação
discursiva que institui um objeto de dizer que muito pouco as diferenciam. São letras simples
em sua constituição, marcadas por refrões que facilitam sua memorização e que possibilitam o
coro das vozes duma plateia num show.
Procuramos verificar tendências constantes nesse tipo de discurso, sem esquecer que
nós mesmas somos sujeitos constituídos socialmente e como tal também teremos nossa análise
assinalada pela nossa formação social. Entretanto, é importante ressaltar que o objetivo não é
atribuição de sentidos às letras, mas perceber os sentidos que emergem dessas letras.
De construção definidora de uma formação cultural no Brasil, introduzimos justamente
aqui a Análise do Discurso para desdobrar, por exemplo, a Ordem de discursos e o Discurso
estético presentes nas letras do sertanejo universitário. A Análise do Discurso(AD), utilizada e
discutida a partir principalmente da segunda metade dos anos 60 e com maior ênfase em
diversos campos das Ciências Sociais, refere-se a um conjunto de procedimentos analíticos
que envolvem diferentes saberes e práticas do conhecimento. A palavra discurso remete à fala,
à capacidade de verbalização, de explicitação verbal, mas não possui como referência
exclusiva a retórica.
Utilizando a AD, buscamos a dinâmica interna do pensamento e seus efeitos sociais de
conhecimento e convencimento, importante na arquitetura da produção de verdade, na
estratégia discursiva de enunciação reconhecida como verdadeira. Desviando o enfoque do
produto final, intentamos enfatizar as condições do processo de produção e estudar o discurso,
isto é, a palavra em movimento em que se procura compreender a língua fazendo sentido. Na
análise do corpus As mina pira, de Léo Rodriguez, e pautadas em Charraudeau (2008,p.26),
sublinhamos os sentidos advindos do implícito, dando forma ao explícito, numa direta relação
com o ponto de vista dos interlocutores.
Em Desce um pouco de red, uma garrafa de tequila/ que hoje eu tô pagando pra você
e sua amiga/ Aí as mina pira, e vão pirar quando eu falar que eu sou amigo do Neymar/ que o
meu cartão é sem limite/ Hoje o bicho vai pegar/ aí as mina pira, e é só chegar retomamos a
autonomia ideológica assumida pelo sertanejo universitário que versa sobre poligamia, traição.
Detalhando-se a expressão Hoje eu tô pagando pra você e sua amiga/Hoje o bicho vai
pegar/Aí as mina pira e é só chegar a ideia é a de uma pessoa no comando – aquele que paga
– ter o poder de possuir (“pegar”) não somente uma pessoa como mais de uma (“você e sua
amiga”), bastando para tal pagar o preço (“Hoje eu tô pagando”). A temática do amor cortês,
do amor paixão dá lugar à banalização desses pela facilidade em se conquistar o objeto de
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desejo com preço oridinário àquele que paga, pois basta falar que eu sou amigo do Neymar,
que o meu cartão é sem limite/ Aí as mina pira e é só chegar.
Partindo-se da premissa de que o signo é uma “marca linguística”
(CHARRAUDEAU,2008, p.36) que ganha especificidade nas dependências do discurso,
quando seu sentido é ativado pelo interlocutor, que elege um significado em detrimento de
outros, o ato de interpretar revela toda uma complexidade que extrapola não só a codificação
de seus signos como também aquela visão de um sentido estável a ser redimensionado por um
locutor no ato de produção do texto. Seguindo no ponto de vista ideológico e na premissa de
Chaurreaudeau em As mina pira e é só chegar, além de revelada a banalização, direcionamos
o implícito à “evidência da sociedade capitalista que impõe uma relação humana traduzida
na coisificação do ser; que oculta as relações sociais entre os homens e as relações
espirituais ou psíquicas dando-lhes o aspecto de atributos naturais das coisas (MAURER,
2009, p.36)”.
Dando sequência nesse sentido, em Alô garçom, hoje eu tô do jeito que a mulherada
gosta/Dinheiro sobrando, meu carrão tá lá na porta/Hoje o trem vai é desandar parece-nos
claro dizer que aquelas relações fundamentais continuam existindo e cumprindo sua função,
porém apenas implicitamente. A ação cotidiana passa a ser vivida por autômatos: quem está
em poder de compra (“Alô garçom, hoje eu tô do jeito que a mulherada gosta”), compra; para
quem se ilude com a aparência do “dinheiro sobrando/carrão na porta”, se vende.
Num movimento dialético, os discursos se constituem de outros discursos, que se
materializam nos signos linguísticos que, por sua vez, em conexão com os outros signos
estabelecem uma teia de sentidos, que vai muito além de uma simples materialidade. Veja que
em Hoje o trem vai é desandar, o signo desandar nos interpela semanticamente enquanto
início de alguma ação ou manifestação de sentimento de forma súbita e intensa. Intensidade e
impulso discrepantes do refletido no amor cortês, no amor paixão. Não apenas a sátira
destacamos como também a exata guarida à automaticidade humana frente ações cotidianas.
De acordo com Mussalim (2001, p. 11), a Análise do Discurso se refere à linguagem
apenas à medida que esta faz sentido para sujeitos inscritos em estratégias de interlocução em
posições sociais ou em conjunturas históricas. Designada a geração atual como geração das
baladas, das festinhas, a bebida alcoólica está fortemente presente nesses ambientes e na
passagem Desce um pouco de red, uma garrafa de tequila temos refletida esta afirmação.
Existe, pois, a materialização de uma comunicação através da existência do signo, que reflete
e retrata uma realidade (BAKTHIN, 1999, p. 31-36). Reflete na medida em que se refere a
uma realidade que lhe é exterior e retrata porque, dentro dos seus mais variados índices de
valor possíveis, um se sobressai e outros se ocultam.
Na medida em que a linguagem não pode dissociar-se da interação social, por ser parte
dela, não se pode conceber também primazia ao contexto linguístico ou extralinguístico, uma
vez que este é o espaço onde se articulam a linguagem e a sociedade. Sendo assimétrico o ato
de enunciação (CHARRAUDEAU, 2001; MAINGUENEAU ,2000), ficará, portanto, a
compreensão do enunciado na dependência dos saberes do interlocutor, que poderá ou não
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reconstituir os sentidos propostos pelo enunciador. E quem é o interlocutor universal da
música sertaneja universitária?
No desenvolvimento da análise discursiva acerca das letras do sertanejo universitário e
pautadas na compilação crítica dos teóricos, acreditamos levantar algumas respostas. Na
música sertaneja de Luan Santana, Amar não é pecado, percebemos uma identidade que se
forja em torno do amor. Sua forma de expressão dá materialidade ao tema bastante comum
entre o público jovem, por natureza exagerado em ações e emoções: vem...quem ama não
consegue estar sozinho/ por isso mesmo é que eu te digo/ não tem sentido eu sem você. O
enunciador deixa de se ver como sujeito, pois sua existência finca-se da dependência do outro.
É uma espécie de retorno ao auge do romantismo quando a razão do viver não está na própria
vida, mas na do outro. Diz que vai gritar pra todo mundo de uma vez, que está apaixonado e
não liga para o que os outros vão dizer, assume que amar não é pecado e que o que importa é
o amor, que se dane o mundo, não tô nem ligando pro que vão dizer.
Verificamos um bom exemplo de assujeitamento, quando o centro da relação não está
nem no eu nem no tu, mas no espaço discursivo criado entre ambos (BRANDÃO, p.46) e o
diálogo que ocorre entre os interlocutores por intermédio das mensagens dessas letras calcadas
em discursos produzidos socio-historicamente, num processo de construção, reconstrução e
também de transformação. É importante ressaltar que esse universo, em virtude de sua própria
natureza, não possibilita grandes acréscimos em termos de conceitos e significados, centrandose a inovação das diferentes músicas na forma de construção da letra pelos cantores. Os
sujeitos enunciadores mantêm, portanto, forte identidade entre si, não constituindo um sujeito
único. Seus discursos estão impregnados de outras vozes, num processo bem característico do
interdiscurso, uma vez que a receita de sucesso, nesse universo, é semelhante.
A temática contida nas letras que versa sobre o amor e seus desdobramentos ─ amor,
traição, sexo, abandono ─ remete o interlocutor a sua própria esfera sentimental e possibilita-o
identificar-se com o conteúdo de sua vivência amorosa. É um tema de grande apelo, uma vez
que dificilmente alguém se sentiria excluído dos diversos casos propagados pelas músicas.
Diferentemente das canções denúncia, o sertanejo universitário não foge às raízes interioranas,
às questões melancólicas “dos causos”, assuntos de janelas de qualquer cidade pequena.
O sucesso alcançado pelos cantores se dá em razão da identificação do público, em sua
maioria jovem, com o que há de mais importante nessa fase de sua vida ─ o amor. A receita da
ampla aceitação desse tipo de música parece-nos estar no conteúdo de valor transmitido pelas
letras considerado universal entre todas as idades, mas, principalmente, entre os jovens ainda
em fase de construção de identidade. Não é um assunto que tenha restrição de idade, sexo ou
local, uma vez que seus efeitos são atemporais.
O contexto socio-cultural em que as músicas estão imersas revelam, de certa forma, a
necessidade de um retorno à teoria de Rousseau. A sociedade com todas as suas mazelas
sufoca o homem, que necessita extravazar seus anseios e imprimir um “colorido” a uma vida
imposta por compromissos e exigência de sucesso. Como já afirmou Bakhtin (2004, p.113), a
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situação social mais imediata e o meio social mais amplo determinam completamente e, por
assim dizer, a partir do seu próprio interior, a estrutura da enunciação.
As músicas analisadas são de estrutura sintática bem simples. Em sua maioria, as
orações são estruturadas coordenativamente, revelando um encadeamento antes discursivo,
que sintático (AZEREDO,1999, p.48). Há algumas substantivas que, conforme Saliés (2008,
p.108) são recursos linguísticos que remetem a um conhecimento compartilhado, com alto
grau de interatividade. Na música Amar não é pecado, as substantivas sugerem que a dor do
cantor é a dor do outro: confesso que no fundo eu duvidei, ..., mas agora é a hora/ eu vou
gritar pra todo mundo de uma vez/ eu tô apaixonado. Assim como ele, o interlocutor deve
assumir sua paixão. A oração subordinada aí tem forte poder persuasivo e argumentativo.
Também na música As mina pira, o tipo de organização sintática não difere da de Luan
Santana. É basicamente construída de forma coordenada, o que a coloca no nível do discurso,
da oralidade. Sua argumentação está calcada nas orações substantivas, no dinheiro: Quando eu
falar que eu sou amigo do Neyma/ Que meu cartão é sem limite/ hoje o bicho vai pegar.
Em outra música de muito sucesso, até no exterior, Ai se eu te pego, de Michel Teló,
observamos uma letra que se resume a uma linha narrativa bem simples: sábado na balada, a
galera começou a dançar e passou a menina mais linda/ Tomei coragem e comecei a falar. As
orações são encadeadas aditivamente, de modo bastante pueril, pois as ações não se
desdobram. Aparelhando-se à simplicidade há um refrão que, pelo bordão, transformou-se em
febre nacional: Nossa, nossa assim você me mata/ ai se eu te pego/ delícia, delícia, assim você
me mata.
Refrão massificado num grande veículo de comunicação, mesmo pessoas que não se
identificam com esse tipo de música tornam-se reféns devido à ampla repetição. Em plena era
de globalização, a música de Teló alcançou grande repercussão internacional em virtude de
uma “dancinha” feita por um famoso jogador de futebol, Cristiano Ronaldo, em comemoração
a um gol.
Numa época em que as informações circulam de forma acelerada, cada vez mais exigese dos interlocutores uma leitura crítica que sirva de base para uma intrincada rede de sentidos
que adquire contornos diversos em razão de valores firmados na sociedade. Descrever,
portanto, as vozes que atravessam os discursos é perceber a ilusão de sua unicidade, que, num
efeito de ancoragem, possibilitaria resgatar um sentido único, homogeneizado, estabelecido
numa significação profunda do texto.
Referências
AZEREDO, José Carlos de. Iniciação à sintaxe do português. Rio de Janeiro: Zahar,1999
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 2004.
BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. 7.ed. São Paulo:
Unicamp, 1998.
CHARAUDEAU, Patrick. Linguagem e discurso: modos de organização.São Paulo:
Contexto, 2008.
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MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação.São Paulo: Cortez, 2004.
MAURER, Ludmila. Máximas da Modernidade Tardia – um convite à reflexão. Nova
Friburgo: Marca Gráfica, 2009.
SALIÉS, Tânia Gastão & SOMMER, Luciane Moritz. Dos fatos, opiniões e subordinadas
substantivas em editoriais jornalísticos. Revista da ANPOLL, v.1, n. 25, pp. 106-135. 2008
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Comunicações
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Comunicação Laboratorial
SPA/Serviço de Psicologia Aplicada
Autores:
Alunos vários
Curso Psicologia
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Narrativa e Coordenação: Angela Utchitel
Ao longo do ano de 2011, o Serviço de Psicologia Aplicada da Unidade Nova Friburgo
da Universidade Estácio de Sá viveu um momento ímpar em sua história, iniciada em 1999: o
atendimento psicológico gratuito às vítimas da tragédia das chuvas de janeiro – conforme
matéria já publicada no primeiro número desta revista.
Entretanto, para além deste programa, implantado em fevereiro de 2011, o SPA –
Clínica-Escola do Curso de Psicologia – responde pela implementação dos estágios
curriculares que fazem parte da grade disciplinar daqueles que buscam a Formação de
Psicólogo.
Neste sentido, tem sido preocupação – tanto da Coordenação local do Curso de
Psicologia quanto da Coordenação do SPA – a expansão de oportunidades, para nossos alunos,
em segmentos da atividade profissional capazes de proporcionar vivências de estágio para
nossos alunos. Ao longo dos anos, as áreas contempladas com os chamados Estágios
Específicos se ampliaram consideravelmente, fazendo, hoje, parte deste leque, estágios em
Psicologia Clínica, em Psicologia Hospitalar/Institucional, em Psicologia Jurídica e em
Psicologia Organizacional.
Ao longo do ano de 2011, cento e setenta e seis estagiários compuseram o elenco das
equipes de Estágio Específico em suas diferentes áreas de atuação, acompanhados por uma
equipe de seis supervisores.
Na área Clínica, 1934 atendimentos (sessões) foram realizados nas próprias instalações
do SPA, beneficiando um total de 285 pessoas, desde crianças até idosos. Como novidade
nesta área de estágio – e na história do SPA – todos os atendimentos passaram a ser gratuitos a
partir de 01 de agosto de 2011. Deste modo, toda e qualquer pessoa que procure nossa ClínicaEscola, será atendida com hora marcada, semanalmente, sem nenhum custo pelo atendimento
psicoterápico ou para submeter-se à Avaliação Psicodiagnóstica. Esta medida encontra no
compromisso social da Universidade sua razão de ser. Ao lado desta inovação, também o
horário de funcionamento do SPA foi ampliado, de modo que, às terças e quintas-feiras, o
funcionamento se estende até às 22:00 h. Para serem atendidos, os interessados precisam ligar
Prof. Dra. da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
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para (22) 2525.1523 para terem seus dados cadastrados para agendamento posterior. Nossa
secretaria funciona de segunda a sexta-feira, das 9:00 às 13:00 e das 14:00 às 18:00 h. Às
terças e quintas, contudo, é possível, também, fazer a inscrição até às 22:00 h.
Na área Hospitalar/Institucional, ao longo do ano de 2011, algumas Instituições
puderam contar com a presença de nossos estagiários, supervisionados por professora
integrante de nosso corpo docente. Assim, a ADINF (Associação dos Diabéticos de Nova
Friburgo, o Day Hospital, bem como o Hospital da Unimed, fizeram parte deste elenco, dando
oportunidade a nossos alunos-estagiários de realizarem atendimentos a pacientes em
ambulatórios, atendimentos à beira do leito, atendimentos à equipe do hospital, bem como
acompanhamento psicoterápico.
Na área Jurídica, sob a supervisão de professora integrante de nosso corpo docente,
nossos alunos-estagiários viveram experiências tanto no âmbito dos Juizados da Infância e
Juventude quanto nas Varas de Família. No Juizado, puderam participar, de diferentes
maneiras, na implantação do Plano Mater, como, por exemplo, fazendo visitas técnicas às
Instituições de Abrigo e participando dos grupos de habilitação para adoção de menores. Nas
Varas de Família, dentre outras atividades, puderam atuar em processos de litígio sobre guarda
e visitação de menores, com vistas a subsidiar decisão do magistrado.
Na área Organizacional, também supervisionados por professora integrante de nosso
corpo docente, nossos alunos-estagiários atuaram no SINCOMÉRCIO – Sindicado do
Comércio Varejista de Nova Friburgo, realizando atividades de recrutamento e seleção de
candidatos a serem encaminhados aos empresários da cidade. Ao longo do ano, nossos alunos
realizaram 330 entrevistas, encaminhando 205 profissionais para empresas solicitantes. Além
disso, realizaram atividade de Treinamento sobre Comunicação no Trabalho com funcionários
de empresa prestadora de serviços para a Universidade Estácio de Sá.
Finalizando nosso balanço do ano de 2011, o SPA servirá de cenário – ao longo do ano
de 2012 – para a realização, com 4 estagiários, de Pesquisa de Iniciação Científica cujo
objetivo será o de tentar identificar as origens emocionais dos atrasos na aprendizagem e na
conquista de habilidades sociais em crianças de 6 a 9 anos.
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Espaço Experimental do Curso Superior
de Tecnologia em Gestão de Recursos Humanos
Autores:
Alunos vários
Curso Recurso Humanos
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Narrativa e Coordenação: Ana Cristina Roballo Fabbri
Apresentação
O Espaço Experimental do Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Recursos
Humanos tem uma proposta de trabalho, baseada no desenvolvimento de atividades que
garantem condições básicas para a inserção do nosso aluno no mundo do trabalho e integrem
teoria e prática.
O papel dos profissionais de Recursos Humanos ganhou novos contornos e posição
singular nas organizações. O profissional de RH deixou de ocupar uma posição de controlador
e supervisor de rotinas, normas e regras para ocupar o lugar de principal agente de seleção e
desenvolvimento de talentos de forma a atender às demandas das organizações. O uso
estratégico da alocação de recursos humanos para que as organizações atinjam seus objetivos e
cumpram precisamente suas missões e visões é de responsabilidade do profissional de RH.
O Projeto Pedagógico do Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Recursos
Humanos tem como missão oferecer educação de qualidade, objetivando formar cidadãos
éticos e dinâmicos, com visão holística pró- ativa. A criação do referido Espaço Experimental
do Curso de Gestão de RH pretende colaborar de forma expressiva para a formação
profissional do nosso aluno, e está fundamentado na missão do Projeto Pedagógico do Curso.
Sempre em consonância com o Projeto Pedagógico do Curso, o Espaço Experimental
pretende desenvolver em nossos alunos as mesmas linhas gerais propostas pelo PPC, seriam
elas: habilidade conceitual (o saber aprender), para perceber, dentro de uma visão abrangente e
integradora do mundo e da sociedade, as diferenças culturais, econômicas e étnicas e sua
sinergia entre as partes; habilidade humana ( saber ser), que capacita para trabalhar com
pessoas,entendendo os processos motivacionais e utilizando-se de técnicas de liderança
situacional; e, também, habilidade técnica ( o saber fazer), ou seja, a capacidade de aplicação
dos conhecimentos técnicos, métodos e ferramentas necessárias à execução de atividades
práticas específicas ligadas à profissão.
Estácio de Sá em parceria com a ABRHRJ (Associação Brasileira de Recursos Humanos).
Professora da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
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O Espaço Experimental está voltado à todas as habilidades citadas acima, mas sua
maior ênfase será no que diz respeito as habilidades técnicas. Certamente esse Espaço
Experimental envolverá alunos de outros cursos que se interessem pelas práticas
desenvolvidas em Gestão de RH. O Projeto de criação do Espaço Experimental de Gestão de
RH buscou parceria com a ABRHRJ ( Associação Brasileira de Recursos Humanos RJ ), que
teve início a partir do I Encontro de Gestores de RH, que ocorreu dia 28 de Março de 2012.
Nosso Espaço Experimental foi inaugurado no referido Encontro de Gestores que contou com
A direção da ABRHRJ, legitimando a parceria.
O Projeto Pedagógico do Curso reconhece que se aprende, também, fora do espaço
institucional. O Espaço Experimental tem como proposta desenvolver várias atividades no
intuito de preparar o nosso aluno para a efervecência do mercado, a partir da integração dos
conhecimentos e o desenvolvimento de ações práticas.
O fundamental na estruturação do Espaço Experimental do curso de Gestão de RH é
que nossos alunos tenham uma base de valores alicerçados em seu desenvolvimento
profissional, e que este conjunto forneça as condições necessárias para gerarem conhecimentos
teóricos consolidados no exercício prático.
O conhecimento prático será fundamental no processo de desenvolvimento do nosso
aluno no exercício da profissão escolhida e a participação em projetos criados pelos próprios
alunos e aplicados nas empresas do nosso entorno contribuirá de forma decisiva para um
espírito inovador e pró ativo que o “novo” profissional de RH necessita ter. É todo esse
movimento que fará com que novas tecnologias, novos produtos e novas técnicas sejam
criadas, possibilitando que os nossos alunos cresçam profissionalmente de forma sustentável,
na articulação permanente da teoria e da prática.
O Espaço Experimental contará com a participação de alunos de outros cursos que se
identifiquem na Gestão de RH, e queiram se inserir em algum projeto pertinente a sua futura
atuação profissional. Esse Espaço Experimental é estendido a todos os cursos porque parte do
pressuposto de que as pessoas na Era do Conhecimento não devem ser vistas como trabalho,
mas sim como capital. E esse “capital intelectual” é encontrado em qualquer segmento do
mercado, os projetos desenvolvidos no referido Espaço terá lugar para todos os cursos da
Universidade Estácio de Sá, campus Friburgo, respeitando a especificidade de cada curso e
seu campo de atuação. Dessa forma estaremos colocando nossos alunos no ensino
multidisciplinar e interdisciplinar efetivamente.
Lembrando sempre de que a Era do Conhecimento tem por base o homem, sua
valorização sem perder de vista a qualidade e a otimização de processos que vem a ser um dos
interesses principais de qualquer empresa. O Espaço Experimental vislumbra a possibilidade
de formar Gestores de RH capacitados em valorizar a dimensão humana, humanizando a
práxis concomitantemente com a adequação aos interesses das empresas e do mercado.
O Espaço Experimental é um projeto inovador objetivando a melhoria da qualidade da
atuação profissional dos nossos alunos.
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Artigos Discentes
Orientados
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Extradição:
O caso Cesare Battisti
Autor
Christiano Pimentel Citrangulo
Curso Direito
Universidade Estácio de Sá
Orientador: Marcus Vinicius Rodrigues
RESUMO Eminente instituto jurídico, a extradição encontra fundamentos em inúmeros ramos
do Direito, sendo de imensa importância para a harmônica relação entre diferentes países. Pela
importância e por ter sido de tanta repercussão o caso Cesare Battisti este estudo feito com
afinco resulta no presente trabalho, que, a partir do que se tem consolidado acerca da
extradição, analisa a constitucionalidade da decisão de não extraditar tomada pelo ilustre expresidente da República, Luís Inácio Lula da Silva.
Introdução
Precedem qualquer consideração, breves esclarecimentos acerca das razões através das
quais se chega à conclusão de que, formadora de debates acalorados e conturbados por fatores
eminentemente passionais, a extradição de Cesare Battisti e suas intrínsecas circunstâncias
seriam adequadas para entabular o tema de uma pesquisa acadêmica. Por haver controvérsia e
polêmica em torno do assunto, um trabalho que vise a elucidação a partir de um enfoque
científico e comprometido com a imparcialidade, mostra-se pertinente.
Perscrutar os eventos passados oportunos sob a ótica jurídica, constituirá o passo
inicial para se compreender a extensão da questão e fornecer aportes para a posterior
confecção desta pesquisa.Também endossará o trabalho a análise dos acontecimentos à luz dos
Princípios de Direito( em destaque o Pacta Sunt Servanda, o Princípio do Contraditório et
cetera), Decreto n˚ 863/93, Lei 6.815/80, e, claro, contará com a observação pontual de
egrégios juristas, as informações contidas em reportagens e matérias de jornais e revistas,
buscando, por meio de uma reflexão dialética, alcançar uma conclusão sensata sobre as atuais
conjecturas.
Medidas Compulsórias de Retirada do Estrangeiro
A fim de evitar a possível condução do leitor a erro, faz-se importante estabelecer
uma distinção entre termos que a princípio são análogos, mas possuem diferentes acepções e
aplicações técnicas: extradição, expulsão, e deportação. A diferença entre os mencionados
Professor Mestre da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
61
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
institutos consiste nos motivos que levam às respectivas aplicações e nas formas e momentos
em que ocorrem, pois, o resultado de todos, quando efetivamente consumados, é o mesmo: a
retirada de seu agente passivo do país em questão.
Não obstante o resultado prático semelhante, no que concerne à expulsão, pode-se
dizer que trata-se do exercício do direito ou poder de um Estado de requerer a um estrangeiro
que deixe seu território quando sua permanência for contrária aos interesses do próprio
Estado2, e, segundo Hildebrando Accioly, ao Estado se reserva o exercício do direito de
expulsar estrangeiro quando este atentar contra a segurança nacional ou contra a tranquilidade
pública.
A submissão da ordem nacional a risco ou a perturbação da incolumidade pública são
requisitos importantes para que se configure a expulsão. Por outro lado, a deportação é o
processo de devolução compulsória ao Estado de origem de estrangeiro que esteja irregular no
território de outro Estado. Nota-se, portanto que ocorre por encontrar-se o sujeito em situação
irregular e não por ter praticado uma ofensa grave ao interesse do país, sendo, ao indivíduo
deportado permitido o retorno ao país que o deportou, desde que atenda aos requisitos legais
ou previstos em tratado específico, enquanto o expulso
poderá retornar ao país quando a
decisão que determinou a expulsão - no Brasil, o decreto de expulsão - for revogada3.
Por seu turno, a Extradição tem como base a colaboração internacional de Estados
com o fito de se combater a impunidade, a partir do atendimento dos interesses persecutórios
do Estado que a requer, ao contrário das medidas outras que são mecanismos de defesa da
ordem pública e manutenção da Soberania Estatal4.
A extradição no direito brasileiro
Ensina-nos, o professor Accioly5, que extradição é o ato mediante o qual um Estado
entrega a outro Estado, indivíduo acusado de crime de certa gravidade ou que já se ache
condenado por aquele, após haver-se certificado de que os direitos humanos do extraditando
serão garantidos. É válido documentar a extradição "destina-se a julgar autores de ilíticos
penais, não sendo, em tese, admitida para processos de natureza puramente administrativa,
civil ou fiscal."6. A extradição, encontra-se fundamentada no sistema universal do direito de
punir, sendo o direito persecutório ou punitivo do Estado em sua projeção extraterritorial 7.
2
ONU( ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS). 58th Session of the International Law Comission.
Expulsion of Aliens, Memorandum by the Secretariat. Genebra, 2006. Disponível em:
<http://untreaty.un.org/ilc/documentation/english/a_cn4_565.pdf>. Acesso em 31 out. 2011.
3
HEANCKAERTS, Mass Expulsion in Modern International Law and Practice, 1995, p. 5.;
ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público, ed. 18ª. São Paulo: Saraiva, 2009.
4
GOODWIN-GILL, Guy S., Limits of the Power of Expulsion in Public Internacional Law, BYB, disponível em:
<http://bybil.oxfordjournals.org>. Acesso em 31 out. 2011.
5
ACCIOLY, opus cit..
6
DEL‟OLMO, Florisbal de Souza, A Extradição no Alvorecer do Século XXI, Rio de Janeiro: Renovar, 2007.
7
MARQUES, José Frederico. Curso de direito penal. São Paulo: Saraiva, v.1, 1954
62
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
A extradição, como um dos meios aptos à concretização da adequada punição, é
geralmente concedida em conformidade com tratado bilateral ou multilateral que estabeleça
vínculo entre as partes que o assinaram. Verificada a ausência de tratado sobre a questão, o
Brasil e alguns outros países concedem-na mediante Declaração de Reciprocidade, segundo a
qual, ocorrendo crime análogo no país requerido, o país requerente se compromete a conceder
a extradição solicitada8. Das condições da extradição pode ser extraído um catálogo de
elementos exigidos para sua concessão, delitos de caráter determinante e das pessoas sujeitas
ao instituto, identificando quanto aos agentes passíveis de submissão ao instituto, em relação
às infrações determinantes: a natureza e a gravidade dos delitos e no que tange aos requisitos
exigidos para a concessão: os lugar e momento da infração, a punibilidade do fato, a
inexistência de prescrição, a natureza do juízo e os princípios do Non Bis In Idem, da
Reciprocidade, da Especialidade e da Competência.No Brasil, a extradição é regulada pela
Constituição e pela Lei n˚ 6.815/809, que deve ser interpretada de acordo com o tratado
firmado com o país que a requeira.
Quanto à disciplina normativa, o Brasil adotou o chamado Modelo Belga, que
consiste em não se reexaminar o mérito( revision au fond) do processo penal que ensejou o
pleito, no âmbito do processo extradicional, tomando como assentes os fatos produzidos pelo
Estado requerente10. No entanto, quando o crime cometido por brasileiro naturalizado for o de
tráfico, quebra-se o modelo belga de cognoscibilidade limitada referido, adotando-se um
modelo de cognição, tendo em vista a exigência de comprovação de envolvimento em
traficância11.
Em muitos países, a legislação proíbe a extradição de nacionais. No Brasil não é
diferente, pois é de nossa tradição constitucional a proibição da extradição de brasileiro: o
artigo 5˚, LI da Constituição Federal veda a extradição de brasileiros natos ou de brasileiro
naturalizado, cujo crime pelo qual seria requerida a extradição tenha sido cometido depois da
naturalização ou, que não seja o de tráfico de entorpecentes, na forma da lei. A garantia de não
extraditabilidade de brasileiro consiste na segurança de que não será facultada a qualquer
autoridade, judiciária ou executiva, a extradição 12. Ressalta-se que, caso o brasileiro seja
extraditado em decorrência da prática de crime comum antes de sua naturalização, a anulação
da mesma não se faz necessária 13.
Encontra-se no artigo 5˚, LII da Constituição Federal, vedada, também, a extradição
de estrangeiro por crime político ou de opinião, cuja definição não se encontra na Constituição
Federal e, por isso, fica a cargo do Supremo Tribunal Federal, de acordo com a conceituação
da legislação ordinária vigente, dizer se o delito que deu origem ao pedido de extradição
constitui crime revestido de natureza política ou não, conforme o Princípio da Preponderância
8
DEL‟OLMO, Opus cit., p. 18-25.
Como Tramita o Processo de Extradição no Brasil. Revista Consultor Jurídico. Disponível em:
<http://www.conjur.com.br/2009-fev-23/tramita-processo-extradicao-brasil-ela-acontece>. Acessado em
18/11/2011.
10
Extradição 1171/ARG, Rel. Celso de Mello, julgada em 10-11-2009, DJ de 24-06-2010.
11
Extradição 541/ITA, Rel. p/ o acórdão Min. Sepúlveda Pertence, julgada em 07-11-1992, DJ de 18-12-1992.
12
Cf. HC-QO 81.113, Rel. Min Celso de Mello, julgado em 26-6-2003, DJ de 29-08-2003.
13
HC 67.621, Rel Min. Carlos Madureira, julgado em 19-10-1989, DJ de 16-08-1991.
9
63
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
14
ou da Principalidade15. Ressalta-se que, o STF proferiu entendimento contrário ao
enquadramento de terrorismo como crime político16. Ainda sobre os crimes políticos, de
acordo com os ensinamentos de Mirtô Fraga, a doutrina se divide em duas correntes: a) uma
objetiva, que considera crime político aquele que praticado contra a ordem estatal( o bem
protegido tem natureza política); b) outra, subjetiva, que entende serem crimes políticos todos
aqueles crimes praticados com finalidade política. Mirtô ainda diz que a noção de crime
político não é tão generalizada e pacífica quanto a de crime comum, sendo o aspecto antisocial do crime político relativo e o de crime comum, absoluto 17.
Além das hipóteses mencionadas, quanto ao tema do juiz natural, é de pungente
relevância para a análise do caso ora em tela, mencionar que ao extraditando deve-se assegurar
o direito de ser submetido a julgamento feito com base nos princípios básicos do Estado de
Direito, sem que seja submetido a qualquer jurisdição excepcional18, bem como a efetiva
observância do Princípio do Devido Processo Legal19, que possui âmbito alargado de proteção,
exigido de todos que fazem parte do aparato jurisdicional e não apenas dos julgadores 20.
Cesare Battisti21
Filho de pai comunista inveterado e mãe católica fervorosa, o mais novo de seis
irmãos, nasceu na comuna italiana de Semoneta no ano de 1954. Durante a infância teve
contato com a doutrina marxista e ideais revolucionários, ao que, em sua autobiografia, aufere
grande importância para seu futuro engajamento às lutas armadas mediante ingresso aos PAC
(Proletari Armati per il Comunismo - Proletários Armados Pelo Comunismo) - organização armada
extremo-esquerdista criada em 1976 durante o violento período conhecido como Anni di
Piombo( Anos de Chumbo) cujo fim era combater as restrições de direitos fundamentais e o
fortalecimento da repressão militar. As atividades do grupo tiveram fim três anos depois.
Associou-se ao Partido Comunista Italiano, fazendo parte da Juventude Comunista e
sindicatos e militando em meio às agitações estudantis de 1968. Em junho de 1979, Battisti é
14
Extradição 694/ITA, Rel. Min. Sydney Sanches, julgada em 13-02-1997, DJ de 22-08-1997.
Extradição 615, Rel. Min. Paulo Brossard, DJ de 05-12-1994.
16
Extradição 855/CHI, Rel. Min. Celso de Mello, julgada em 26-08-2004, DJ de 1˚-07-2005.
17
FRAGA, Mirtô. O Novo Estatuto do Estrangeiro Comentado. Forense. Rio de Janeiro, 1985.
18
Extradição 986/Bolívia, Rel. Min. Eros Grau, julgada em 15-08-2007.
19
Extradição 232/Cuba-Segunda, Rel. Min. Victor Nunes Leal, DJ de 14-12-1962; Extradição 347/Itália. Rel.
Min. Djaci Falcão, DJ de 09-06-1978; Extradição 633/República Popular da China, Rel. Min. Celso de Mello, DJ
de 06-04-2001.
20
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito
Constitucional, 5. ed. rev e atual.. São Paulo. Saraiva, 2010.
21
L‟Achèvement. Lettre de Cesare Battisti Adressée aux Juges du tribunal Suprême Fédéral. Disponível em:
<http://achevement.free.fr/article.php3?id_article=73>. Acessado em: 10 de set. de 2011; BATTISTI, Cesare.
Minha fuga sem fim. Tradução: Dorothée De Bruchard. São Paulo: Martins Fontes, 2007; LeMAGue.NET. La
Verité Sur Cesare Battisti Par Fred Vargas. 7 de mar. de 2004. Disponível em: <http://www.lemague.net/dyn/
spip.php?article656>. Acessado em 10 de set. de 2011.
15
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preso, em conjunto com outros membros inativos do grupo e em 1981 22 condenado à pena de
doze anos de cadeia pelos crimes de participação em grupo armado, assalto e receptação de
armas - nenhuma menção sobre a homicídio havia sido feita até então.
No ano de 1982, a partir da adoção de políticas de repressão ao terrorismo pelo
governo italiano com o fulcro de restabelecer a ordem no país, entra em vigor a lei cuja a pena
do delator seria reduzida23. Neste ínterim, foi um dos beneficiados pelo instituto da delação
premiada, imputando a Battisti a responsabilidade pela autoria dos quatro homicídios
mencionados anteriormente.
Durante o Governo Mitterrand na França, em 1985, estabeleceu-se a concessão de
Asilo a pessoas envolvidas em movimentos políticos armados na Itália durante os Anos de
Chumbo que tivessem abandonado a violência, o que tornaria a extradição desses indivíduos
impraticável para Itália 24.
Entre o estabelecimento da Doutrina Mitterrand em 1985 e seu retorno à França em
1990, Battisti é condenado à pena de prisão perpétua à revelia na Itália. Seu processo anterior
foi reaberto quase dez anos depois do trânsito em julgado, resultando na condenação, pelo
Tribunal do Júri de Apelação de Milão, que consubstanciava-se, basicamente, nas acusações
feitas por Pietro Mutti, confirmadas por ex-membros dos PAC que teriam sido companheiros
no movimento.
Solto, Cesare, amparado pela Doutrina Mitterrand, continua vivendo com sua família
em Paris, trabalhando como zelador de um prédio, escritor e tradutor nas horas vagas.
Entretanto, em 2004, durante o Governo Chirac, uma reviravolta nas orientações políticas da
França levam a Justiça a mudar seu posicionamento, pronunciando-se favorável à extradição,
de Battisti, que já era um escritor famoso, ocasionando grande alvoroço e comoção pública.
Esgotados os recursos jurídicos adequados para embargar ou reanalisar o deferimento
da extradição, Cesare, premido da necessidade de evadir-se para evitar premente cumprimento
de pena de prisão perpétua com restrição de luz solar25, encontra, na fuga, o único meio de
salvar-se. Refugia-se, pois, no Brasil, seguindo conselhos de agentes franceses que teriam
22
L‟EXPRESS.FR. ‹‹La Culpabilité de Battisti repouse sur des preuves›› publié le 15/03/2004( em francês).
Disponível em: <http://www.lexpress.fr/actualite/societe/justice/la-culpabilite-de-battisti-repose-sur-despreuves_490352.html> Acessado em: 30/09/11.
23
No texto original do artigo terceiro: “Articolo 3. Attenuanti per reati commessi per finalità di terrorismo o di
eversione in caso di colaborazione”. Legge 29 Maggio 1982 n.304. Disponível em:
<http://www.archivio900.it/it/documenti/doc.aspx?id=368>. Acessado em 11/11/2011, às 23:18.
24
65ème Congrès de la Ligue des Droits de l'Homme: disponível em: <http://www.mediapart.fr/files/petrellamitterrand.pdf> - Em francês. Acessado em 30/09/11
25
Primeiro Tribunal do Júri de Apelação de Milão. Sentença 17/90 – nº 86/89 e 50/85 do Registro Geral, de
13/12/1988. Item 49 (antes 50).
65
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franquiado sua fuga fornecendo documento com foto e dados pessoais para que pudesse
chegar incólume26.
Cesare Battisti e o Brasil
No Brasil, por meio de uma operação conjunta da Interpol e as polícias brasileira,
italiana e francesa, Battisti é detido no Rio de Janeiro em 2007 27 - fato divulgado pela
imprensa brasileira -, permanecendo encarcerado até janeiro de 2009, momento em que, o
então Ministro da Justiça, Tarso Genro, concede a Battisti28, conforme o artigo 29 da Lei
9.474/97, o que antes lhe fora negado pelo CONARE 29( Conselho Nacional para Refugiados)
em 200830: o status refugiado político 31, decisão esta bombardeada pela Itália que não se
conformava com a impossibilidade de punir Battisti pelos crimes que reputava ser de sua
responsabilidade32.
Tarso Genro consubstanciara sua decisão de concessão de refúgio a Battisti em um
preceito fundamental estabelecido no artigo 1˚ da mencionada lei: fundado temor de
perseguição pelas convicções políticas do requerente. Acolhera a defesa do refugiado sobre
não ter tido possibilidade de defender-se das acusações, uma vez que fora condenado à revelia,
negando, ainda, eventual influência política sobre sua decisão final33.
Extradição de Cesare Battisti no Brasil
O governo italiano, que já havia requerido a extradição ao Brasil, investiu contra a
concessão de refúgio, culminando na continuidade do julgamento, que havia sido suspenso
pela aquisição do status de refugiado, pelo STF. Outrossim, o Tribunal Constitucional deferiu
o pedido de extradição formulado pela Itália, com a ressalva de que a decisão final caberia ao
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Para insatisfação da Itália, no dia 31 de
dezembro de 2010( último dia de mandato do então Chefe do Executivo), o presidente negou o
26
CESARE Battisti: La France M‟a Aidé. Courrier International. Paris, 2009. Disponível em:
<http://www.courrierinternational.com/article/2009/01/29/cesare-battisti-la-france-m-a-aide> Acessado em
12/11/2011. Em francês.
27
UOL Notícias. Ex-Ativista Italiano, Cesare Battisti, É Preso No Brasil. Disponível em:
<http://noticias.uol.com.br/ultnot/afp/2007/03/18/ult34u176732.jhtm>. Acessado em 15/11/2011.
28
GENRO, Tarso. O Caso Cesare Battisti: O Voto do Ministro. Disponível
em:<http://www.cebela.org.br/site/baCMS/files/660404NCT3%20Tarso%20Genro.pdf>. Acessado em 18 de
novembro de 2011.
29
CONARE, Processo n˚. 08000.011373/2008-83. Disponível em:
<http://dc119.4shared.com/doc/_pxpYFK7/preview.html> Acessado em 18 de novembro de 2011.
30
Conforme o artigo 12, § 1˚ da Lei 9.474/97, o CONARE é o órgão responsável para julgar casos de asilo em
primeira instância.
31
Última Instância. Tarso Genro Concede Refúgio Político a Battisti; Processo É Suspenso no STF.
<http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/5757/61066.shtml.shtml>. Acessado em 15/11/2011.
32
Último Segundo. Refúgio a Battisti Terá „Consequências‟, Diz Ministro Italiano. Disponível em:
<http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/refugio+a+battisti+tera+consequencias+diz+ministro+italiano/n123790
3257722.html> Acessado em 15/11/2011.
33
Folha de São Paulo. São Paulo, jan. 2009. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u489941.shtml>. Acessado em 15/11/2011.
66
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
pedido de extradição do italiano, formulado pelo Governo Italiano nos autos do processo
administrativo n˚ 08000.003071/2007 - 51, lastreado no Parecer da AGU/AG 17/2010 cuja
conclusão se baseara no artigo 3˚, 1, f) do Tratado de Extradição entre Brasil e Itália. Contra a
decisão do presidente, a Itália ajuiza em fevereiro de 2011, a Reclamação RCL.11.243 ao STF,
que resulta, desta vez, em decisão favorável à soltura de Cesare Battisti, por seis votos a três,
por entender que não cabe à Corte contestar decisão soberana do Presidente da República. Por
fim, o Governo Italiano decide interpelar a Corte Internacional de Haia sobre decisão
brasileira, e, na voz do ex-presidente italiano, Silvio Berlusconi, “não foi dada a última palavra
sobre Battisti”34, que foi solto no último dia 9 de junho, depois de passar 4 anos preso.
Ab initio foi colocado em análise o pedido de extradição feito pela Itália, com o fim
de analisar a prosseguibilidade do feito, verificando se há documentos35 que ofereçam os
aportes necessários para exame judicial da questão. O requerimento italiano pautara-se no
tratado bilateral de extradição, ainda em vigor, que incorporou o ordenamento jurídico pátrio
em 1993 através do Decreto n˚ 863, o Tratado de Extradição. Uma vez comprovado o
fundamento em tratado e a efetiva condenação do extraditando por crime comum em seu país
de origem, é aceito o pedido que, então, é encaminhado à fase judicial( Extradição n˚ 1085).
Encaminhado o requerimento à fase judicial, a legalidade e a procedência do italiano
foram analisadas pelo Supremo Tribunal Federal( análise essa, na forma do artigo 83 do
Estatuto Estrangeiro, essencial para que seja o pedido concedido) que, em Plenário, pelo
apertado resultado de cinco votos a quatro, posicionou-se favorável à extradição.
A votação apertada se deu em razão do enquadramento dos crimes pelos quais se
requer a entrega do extraditando como crimes de natureza política, o que impediria a
concessão, conforme o tratado firmado entre Brasil e Itália.
Por fim, mesmo resultante de votação acirrada, o status de refugiado emprestado a
Battisti por Tarso Genro foi anulado, por reputar a maior parte dos membros do STF que o
crime não tem natureza política e sim comum; que a soberania da República Italiana não pode
ser questionada, mesmo que tenha sido proferida a sentença à contumácia; que o refúgio foi
concedido por meio de ato isolado de Tarso Genro.
Análise dos aspectos desfavoráveis à extradição
Compondo o arsenal de argumentos favoráveis à manutenção do Refúgio de Battisti,
encontram-se – além de jurisprudência e normas incisivas -, posicionamentos precipuamente
garantistas que propõem, sobretudo, um apelo humanístico às autoridades competentes.
Battisti fora condenado à revelia pela prática de quatro homicídios de autoria reclamada por
membros dos PAC. A condenação pautara-se no depoimento de pessoas que teriam
participado na atividade criminosa pela qual Battisti fora condenado e que seriam, a partir do
34
Terra. Não Foi Dada a Última Palabra Sobre Battisti, set. 2011. Disponível em:
<http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI5339911-EI306,00Nao+foi+dada+a+ultima+palavra+diz+Berlusconi+sobre+Battisti.html> Acessado em 15/11/2011.
35
Artigo 80 do Estatuto do Estrangeiro.
67
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
fornecimento das informações contidas nos depoimentos, beneficiadas pelo instituto da
delação premiada. A supressão do direito de defesa constitui grave ofensa aos Princípios do
Contraditório e Ampla Defesa, princípios basilares de Direito aos quais é signatário o Direito
Italiano, assentes, inclusive, na Constituição da República Italiana( seu artigo 24, traduzido,
diz que todos podem agir em juízo em busca da tutela dos próprios direitos e interesses
legítimos. A defesa é direito inviolável em cada estado e grau de procedimento. São
assegurados aos desprovidos de recursos, mediante instituições adequadas, os meios para agir
e se defender diante de qualquer jurisdição. A lei determina as condições e as modalidades
para a reparação dos erros judiciários36). Para os defensores de Battisti, este é um forte
argumento, uma vez que há ressalvas do Supremo Tribunal Federal quanto à concessão de
extradição quando reputar-se injusto o procedimento do julgamento que culminou em
condenação e pela qual requer-se o extraditando quando denegada a satisfação do direito à
Ampla Defesa e ao Contraditório 37, já que, em conformidade com o Direito Constitucional
brasileiro, importará em vício insanável da sentença condenatória. Quanto às alegações e a
aceitação das mesmas como prova, a Constituição em seu artigo 93, IX( bem como no artigo
217 do Código de Processo Penal) impõe a presença efetiva do defensor nos atos que
integrem a instrução criminal, sendo vedado o colhimento de elementos probatórios por juízes
quando ausente, e, de acordo com o magistério de Aury Lopes Júnior, tal prática é
absurdamente ilegal, característica de um sistema neo-inquisitório38.
Análise dos aspectos favoráveis à extradição
Os argumentos de que dispõe o país requerente possuem extrema pertinência e grande
valor, pois encontram fundamento na legislação e na jurisprudência, ao contrário de alguns
argumentos da defesa que possuem um caráter garantista. Como advogado da República
Italiana, o senhor Antônio Nabor Areias Bulhões. O primeiro argumento é o de que a Itália, na
condição de Estado Soberano, proferiu uma sentença condenatória para punir um nacional
pela prática de fato tipificado, em lei específica, como crime passível de ostensiva punição. A
Itália detém o monopólio da coerção legítima e é direito seu punir na forma que seu
ordenamento jurídico determina, sem que outro Estado igualmente soberano, questione a
validade de suas decisões ou a capacidade de seguir o previsto em suas normas. O Brasil,
adota o Sistema Belga, que consiste na impossibilidade de analisar o processo penal percorrido
para se chegar à sentença condenatória, e, por isso, deve o STF analisar, unicamente, a
existência dos requisitos básicos para que seja concedida a extradição. Francisco Rezek 39
entende que, em consonância com a decisão do STF de deferir a extradição, deve o Chefe do
Executivo, efetivamente, cumprir a entrega do requerido. Completando este raciocínio, Nabor
36
Costituzione della Repubblica Italiana Disponível em:
<http://www.governo.it/Governo/Costituzione/CostituzioneRepubblicaItaliana.pdf>. Acessado em 22/11/2011.
Tradução Nossa.
37
Extradição 830/Estados Unidos da América, Rel. Min. Ellen Grace julgada em 10-12-2002, DJ de 26-07-2003;
Extradição 986/ Bolívia, Rel. Min. Eros grau, julgada em 16-08-2007; Extradição 232/Cuba,-segunda, Rel. Min.
Victor Nunes Leal, DJ de 14-12-1962; Extradição 347/Itália, Rel. Min. Djaci Falcão, DJ de 09-06-1978
38
LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e Sua Conformidade Constitucional, Volume I. 4. ed. Rio de
Janeiro, Editora Lumen Juris, 2009.
39
REZEK, Francisco. Direito internacional público, 10. ed. rev. e atual.. São Paulo: Saraiva, 2005.
68
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Bulhões40 menciona que seria inadmissível afastar-se a competência jurisdicional e
constitucional privativa da Suprema Corte para apreciar um processo de extradição fundado
em tratado bilateral e, para além dos óbices constitucionais como a inafastabilidade da
competência do STF, estaria o consolidado Princípio da Separação dos Poderes sendo
mitigado em demasia, uma vez prevalecendo um ato externo isolado e anômalo( a concessão
de refúgio), em detrimento da mencionada competência que detém o STF. Bulhões ainda cita a
decisão do ex-Ministro Victor Nunes Leal41 - que versava sobre Asilo Político, matéria com
dignidade constitucional, pois o instituto encontra-se inserido no artigo 4, X da Constituição
Federal - que determina a incapacidade de um ato discricionário de natureza política confiado
ao presidente da República prestar óbice à concessão de extradição, portanto, tampouco teria
aptidão para impedir a extradição o Refúgio Político, que sequer possui assento constitucional
e que fora concedido pelo Ministro da Justiça em sede de recurso, após a rejeição do
CONARE, e não pelo presidente da República.
Contra os dogmas que conferem aos crimes imputados a Battisti a natureza política,
Gilmar Mendes em seu voto posiciona-se favorável à extradição, pois acredita que crimes de
sangue praticados de forma premeditados e com pura intenção de matar, tem o mesmo caráter
do que crime cometido em meio a um levante social ou maciço ataque de retaliação, reação ou
contestação de um regime 42.
Uma vez desconsiderada a natureza política do crime, através do Princípio da Pacta
Sunt Servanda - do qual se extrai o entendimento de que a obrigação disposta em acordo
celebrado deve ser respeitada pelas partes acordantes -, deve o Brasil dar continuidade à
extradição em conformidade com a decisão do STF, sob pena de estar violando um tratado
internacional inserido ao ordenamento jurídico pátrio. Em decisão de um processo de
extradição, Sepúlveda Pertence foi categórico ao afirmar que é consolidada a jurisprudência
do tribunal no sentido de que os tratados bilaterais de extradição, nele constituem leis
especiais que prevalecem no eventual conflito com lei nacional 43.
O Procurador-Geral da República, Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, ao
examinar a possibilidade de ter ocorrido a prescrição44, entende que não operou-se ainda, pois,
o extraditando fora condenado à prisão perpétua, sendo que as condenações transitaram em
julgado em 08 de abril de 1991 e 10 de abril de 1993. Observa que, de acordo com a lei
italiana, crimes punidos com pena de prisão perpétua não são extintos pela prescrição, mesmo
como efeito da aplicação de circunstâncias agravantes. Destarte, analisado à luz do
ordenamento jurídico pátrio, uma vez não admissível pena de prisão perpétua, examina-se a
extensão prescricional no que tange à pretensão executória com base na pena mínima prevista
40
ITÁLIA defende extradição de Battisti no STF (2/20). STF, adicionado em 2009. Disponível em:
<http://www.youtube.com/watch?v=Q-CGg4Tq-g4>. Acessado em 10 de nov. de 2011.
41
Extradição No 232/Cuba-segunda, relator min. Victor Nunes Leal, DJ 14/12/1962
42
Gilmar Mendes é o Quinta Ministro a Votar Pela Extradição. Notícias STF, 18 de novembro de 2009.
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=116249>. Acessado em 10
de nov. 2011.
43
Extradição 785-8 Estados Unidos Mexicanos, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 14-11-2003.
44
3576-PGR-AF. Extradição 1.085/Itália, Rel. Min. Cezar Peluso. Apresentado em 27 de mar. De
2008.
69
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
para crime análogo, ou seja, pena máxima de trinta anos. Desta maneira, a prescrição ocorreria
somente no ano de 2011 e 2013 respectivamente.
Considerações Finais
Vivemos num mundo cujo constante processo de evolução acarreta no
aprofundamento da integração política, econômica, social e cultural, através da redução dos
custos de transporte e meios de comunicação: a Globalização. São amplamente divulgados os
benefícios trazidos pela mencionada integração. No entanto, junto ao desenvolvimento de tais
benefícios, aos Estados nota-se a imposição de desafios pelo encurtamento das distâncias entre
seus territórios, tais como a elaboração e implementação de normas eficazes e outros meios
capazes de coibir atos lesivos à ordem pública. Notavelmente, o crime internacional se
movimenta com grande velocidade enquanto a justiça continua resolvendo suas pendências de
forma um tanto lenta e leniente, restando desproporcional a ineficácia das ferramentas de
prevenção e a exponencial multiplicação dos ilícitos no plano internacional. Pode-se inferir,
portanto, que os problemas entre dois Estados Soberanos não são nada extraordinários, uma
vez evidente o aumento da criminalidade internacional: pode um suposto criminoso fugir para
país diverso, visando evitar a sua prisão, ter contra si instaurado um processo enquanto está
em outro país, e, então, o país de onde requerer a famigerada Extradição.
Uma vez instrumento de cooperação internacional contra a impunidade, não raras são
as vezes em que ao Brasil são requeridos a prisão de estrangeiro procurado pela prática de
ilícito penal que entrou em seu território e sua posterior entrega ao país requerente. No caso
concreto ora examinado, não poderia ser diferente: O Brasil foi acionado pela Itália para
efetuar a extradição de um nacional já condenado, que, por sua vez, dizia ter sido usado como
bode expiatório e sofrer perseguição política. E por esta razão, o presidente da República
resolveu, contra a decisão da Suprema Corte, denegar a extradição, instalando-se grande
celeuma em torno da questão.
Por um lado, há a decisão condenatória proferida por órgão, devidamente investido
das atribuições e competências necessárias, pertencente a um Estado Soberano com quem o
Brasil firmara tratado sobre a questão, apoiada, pois, por unanimidade pelo Tribunal Europeu
dos Direitos Humanos que declarou que o processo que ensejou tal decisão tivera
conformidade com o Devido Processo Legal;
Por outro lado, persiste, mesmo diante da declaração do Tribunal Europeu de Direitos
Humanos, o fato de que Battisti fora condenado à revelia, com base unicamente em
depoimentos tendenciosos que trariam benefícios expressivos aos depoentes - condenados,
também, pelos crimes que imputaram a Battisti em suas alegações -, pela autoria de crimes
considerados políticos à época e a pena passível de repúdio e incompatível com o
ordenamento jurídico pátrio( há mais de trinta anos, tempo mais longo do que o maior prazo
prescricional existente na legislação brasileira). Tudo isso sem permitir que a sentença fosse
reexaminada posteriormente.
70
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Reputa-se, então, acertadíssima, a decisão tomada pelo presidente, que não acoberta
um criminoso fugitivo, permite que um ser humano possa viver com dignidade depois de mais
de trinta anos de ostracismo, respirando medo, com ostensiva possibilidade de ter sua
liberdade tolhida.
Referências
ONU( ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS). 58th Session of the International Law
Comission. Expulsion of Aliens, Memorandum by the Secretariat. Genebra, 2006. Disponível
em: <http://untreaty.un.org/ilc/documentation/english/a_cn4_565.pdf>. Acesso em 31 out. 2011.
ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público, ed. 18a. São Paulo:
Saraiva, 2009
HEANCKAERTS, Mass Expulsion in Modern International Law and Practice, 1995.
GOODWIN-GILL, Guy S., Limits of the Power of Expulsion in Public Internacional Law,
BYB, disponível em: <http://bybil.oxfordjournals.org>. Acesso em 31 out. 2011. BROWNLIE, Ian.
Princípios de Direito Internacional Público, 4. ed. Trad. Maria Manuela Farrajota et al.
Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p 336.
DEL‟OLMO, Florisbal de Souza. A Extradição no Alvorecer do Século XXI. Rio de
Janeiro: Renovar, 2007, p. 23.
MARQUES, José Frederico. Curso de direito penal. São Paulo: Saraiva, v.1, 1954
CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Dicionário Compacto do Direito. 5. ed. São Paulo: Saraiva,
2007.
RUSSOMANO, Gilda Maciel Correa Meyer. Aspectos da Extradição no Direito
Internacional Público. Rio de Janeiro: José Konfino, 1960, p. 136
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.
Curso de Direito Constitucional, 5. ed. rev e atual.. São Paulo. Saraiva, 2010.
REZEK, Francisco. Direito internacional público, 10. ed. rev. e atual.. São Paulo: Saraiva,
2005.
71
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Do Impresso ao Digital sem fronteiras:
caminhos de uma mídia alternativa
Autores
Mariana Guimarães Pinheiro
Natália Gomes Albertini
Curso Comunicação Social/Jornalismo
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientador: Roberto Fonseca Vieira
Resumo:
Este artigo remete-se a pesquisa qualificada e apresentada na Divisão Temática Comunicação,
Espaço e Cidadania, da VII Jornada de Iniciação Científica em Comunicação – Intercom
Júnior, evento componente do XXXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, em
Recife, PE – 2 a 6 de setembro de 2011. Esse estudo teve como objetivo refletir sobre o Jornal
Séc. XXI como uma mídia alternativa sem fronteiras, como convencionalmente ele se
apresenta no dial. Disponibilizado agora também na internet, esta mídia de origem impressa
provoca um novo olhar no tocante à maneira como as suas informações são difundidas, uma
vez que esta se caracteriza por um processo inverso ao habitual, ou seja, do local ao global.
Incluindo as práticas socioculturais, ultrapassando fronteiras geográficas de dois tipos de
espaços diferentes (o físico e o virtual) e agregando aspectos multimídia, o Jornal Séc. XXI se
torna um meio mais cidadão e democrático.
Palavras-chave: Mídia Alternativa, Cidadania, Jornalismo On-line.
Introdução
O despertar para essa pesquisa foi caracterizado pela relevância, em face do referencial
plural das questões que envolvem os segmentos relacionados aos preceitos da comunicação
comunitária, alternativa e popular, e precipuamente compromissada enquanto espaço de
cidadania. Espaço esse que se dimensionam como nos remete (VIEIRA, 2002), ao „ethos
social’45, cujo sentido é expresso pelo autor na vivificação do campo da cidadania, ânimo do
45
Professor da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo
VIEIRA, Roberto (professor da UFPA). Anais do XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
Salvador/BA: INTERCOM, doc. base, pág. 13-14, 2002.
72
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
povo, da cultura, da nação, e completa o autor afirmando que cidadania é ethos na sua maior
expressão, que se enraíza nas subjetividades coletivas. Sem as práticas coletivas fica difícil
conquistar avanços significativos na melhoria da qualidade de vida de cada cidadão.
Diante desta perspectiva, este trabalho teve como objetivo analisar o Jornal Século XXI
da cidade de Nova Friburgo – RJ como uma mídia alternativa comprometida com esse
exercício de cidadania. Princípio, em que Peruzzo (apud, BOTÃO, 2002) destaca:
“(...) o cerne das questões gira em torno da informação, educação, arte e cultura, com
mais espaços para o entretenimento, prestação de serviços, participação de várias
organizações (cada um falando o que quer, embora respeitando os princípios éticos e
normas de programação) e divulgação das manifestações culturais locais”46
E isso nos remeteu a pensar que dentro do cenário de mídia alternativa alguns
conceitos e atitudes são elencados como partes constituintes para que esse meio cumpra seu
objetivo de forma plena. A começar pelo participacionismo, ou seja, a busca do bem-estar
comum, o incentivo ao exercício da cidadania e a ênfase da cultura e arte locais fomentando,
sobretudo o processo de produção dessas mídias alternativas. Movimentos estes que
percebemos estarem alinhados no “Jornal Século XXI”, de Nova Friburgo/Rio de Janeiro,
principalmente em atenção aos segmentos editoriais expressos nesse jornal, cujos valores são
pautados na democracia, educação e ecologia.
A mídia alternativa
A mídia é uma importante força de difusão não apenas de informação e conhecimento,
mas também de modos de vida e comportamentos criando representações do pensamento e das
práticas culturais da nossa época.
O mundo globalizado possibilitou que os sujeitos se tornassem cidadãos do mundo,
pois à medida que se acentuou essa ideologia, foram se firmando ideias como
desterritorialização, globalização da cultura e da economia e a política do sem fronteiras, ao
mesmo tempo, forma-se uma relação dialética quando o avanço para o global cria uma
necessidade de reforçar os valores locais, as raízes individuais são evidenciadas.
Portanto, pensar o Jornal Século XXI como mídia alternativa, e enquanto sem fronteira
como convencionalmente ele se apresenta no dial é a questão central.
Disponibilizado na internet permitirá pensar este mesmo jornal exigindo um outro
olhar e provocando indagações, sobretudo que práticas socioculturais seriam representadas por
um meio que ultrapassa as fronteiras geográficas de dois espaços diferentes – o físico e o
virtual - ao mesmo tempo? Como acontecem essas representações da cultura local por meio de
46
BOTÃO, Paulo Roberto. Mídia Comunitária: Novas Tecnologias e a Emergência do Local. Anais do XXV Congresso
Brasileiro de Ciências da Comunicação – Núcleo de Pesquisa Comunicação para a Cidadania – Salvador/BA – 1 a 5 Set 2002
73
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
dois suportes – um que está presente de modo palpável como articulador das questões locais e
outro podendo ser acessado em qualquer lugar do mundo?
O Exercício de Cidadania: nova dimensão social
No exercício da cidadania para o desenvolvimento pleno o cidadão como protagonista
do processo de criação e elaboração do conteúdo dos meios é que nasce dentro desse cenário a
mídia alternativa representada como uma nova forma de organização, constituindo-se num
espaço que através da democratização da comunicação renova-se, não apenas transmitindo
informação, mas ao mesmo tempo abrindo uma janela de diálogo com os receptores, a
sociedade.
Por outro lado, com a inserção da internet nesse processo comunicacional surge a
possibilidade de interação e troca de valores se expandindo de forma incalculável, pois essa
nova tecnologia permite que o participacionismo se realize de forma mais completa.
No contexto (PERUZZO, 2004. pág.50) caracterizando esse processo aponta e diz:
“a comunicação é mais que meios e mensagens, pois se realiza como parte de uma
dinâmica de organização e mobilização social; está imbuído de uma proposta de
transformação social e, ao mesmo tempo, de construção de uma sociedade mais
justa”.47
Aderindo a uma nova dimensão social, onde os limites das relações sociais
convencionais geralmente demarcadas por um espaço físico e que se viam permeadas por uma
atmosfera competitiva, muitas vezes hostil e pouco associativa, com o advento da Internet
alcançam um elevado coeficiente de superação, passando a ser possibilidade real, pelos
caminhos do virtual. Nesta conjuntura assegura a ampliação dos direitos de gozo da cidadania
promovendo políticas de inserção, sobretudo de participação social.
Portanto, faz-se necessário saber pensar o espaço, como uma tomada de consciência do
nosso próprio mapa do mundo, sendo essa uma condição básica de cidadania.
Quando, hoje, nos referimos à cidadania fazemo-lo em relação à identidade nacional, à
comunidade, à participação, aos direitos e, em boa medida, à igualdade entre os cidadãos. O
denominador comum dessas facetas da cidadania é que todas estão vinculadas às experiências
de inclusão e exclusão, para as quais o espaço é um componente iniludível, como nos afirma
António Campar e António Gama, em Geografia, conhecimento do espaço e cidadania.48
47
PERUZZO, Cicília. Direito à Comunicação Comunitária, Participação Popular e Cidadania. In: OLIVEIRA. Maria
José da C. (Org.). Comunicação pública. Campinas: Alínea, 2004, pág.50.
48
CAMPAR de Almeida, António e GAMA, António. Geografia, conhecimento de espaço e cidadania, in Fragmentos de um
retrato inacabado, in AA.VV. (org.), A geografia de Coimbra e as metamorfoses de um país, co-organizador. Coimbra:
Instituto de Estudos Geográficos da FLUC, 2003.
74
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Do impresso ao virtual: do local ao global
Necessário se fez estabelecer um parâmetro do espaço local como princípio de sóciopolítico-cultural. Nesse aspecto buscou-se em Tânia Fischer (apud, CALDAS COSTA, 2007)
49
um desses parâmetros, que caracteriza o “local” partindo de duas idéias complementares e
antagônicas: “inércia” e “movimento”. O “local” remetendo a configuração geográfica,
estática. Já a segunda numa instância dinâmica em virtude de possíveis relações com o global,
as quais o tornam o “local”, também espaço de interação virtual.
Tomamos, também essa questão no pensamento de Costa Souza (ibdem, CALDAS
COSTA, 2007)50 que nos remete o conceito de “local” afirmando: “Este se expande por meio
das novas tecnologias e ganha uma nova abordagem (...). É quando o lugar deixa de se
restringir ao espaço físico-ambiental da geografia, rompendo com a relação lugar-espaço com
o que se apresenta aos olhos”.
Entretanto, nessa passagem do local ao global invocaram-se as tendências da
sociedade-rede – resultado do processo globalizante – permitindo, segundo Lopes Garcia, ver
o panorama midiático em que os diversos suportes desempenharão um papel de
complementaridade na constelação da estrutura comunicativa. Diz o autor que: “Enquanto
avança a globalização ou se multiplicam as redes que facilitam a intercomunicação em tempo
real, o valor social da informação de proximidade também aumenta” (s/d, p. 200).51
Entendendo que a informação de proximidade deva ser substrato da comunicação
midiática local – face às redes de comunicação que parecem de alguma forma dominar os
processos de difusão midiática –, afirma-se que a ocorrência de vários exemplos de mídia
alternativa pode significar um sinal de revitalização da comunicação local frente ao contexto
da globalização.
A fácil operacionalização dos multimeios, ocasionada pela tele-info-comunicação –
telecomunicação, informática e comunicação –, fortalece o papel formativo da mídia em
estudo que, anteriormente relegada à produção artesanal, agora, encontra-se auxiliada pela
constituição da rede telemática, onde alcança multiplicidade e veiculação garantidas, já que
justificadas pelo rápido avanço dos aspectos comerciais da rede, que como conseqüência da
informatização crescente, concede a mídia alternativa, alguns status de Grande Imprensa.
É nesse sentido que passamos a conhecer e difundir, nesse relato, o objeto principal da
pesquisa, o Jornal Século XXI, coletando dados nas edições do próprio jornal correspondente.
A análise se realizou com base em aspectos da comunicação comunitária, alternativa e
49
CALDAS COSTA, Aline. Reflexões sobre cultura e poder social: uma abordagem transversal para o conceito de
local. Revista Espaço Acadêmico, nº 69, Mensal, ANO VI, Fevereiro/2007. ISSN 1519-6186.
50
Ibdem.
51
LOPEZ GARCIA, Xosé. Repensar o jornalismo de proximidade para fixar os media locais na sociedade global.
Comunicação e Sociedade 4. Braga Codex: Núcleo de Estudos de Comunicação e Sociedade da Universidade do Minho, s/d,
8 p.
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cultural, tanto no físico, quanto no virtual, incluindo mais recentemente a TV WEB, sobretudo
a partir de suas linhas editoriais.
Por outro lado observaram-se as fontes de informações, os temas trabalhados pelo
jornal e o enfoque adotado no tratamento de cada matéria relatando aspectos da região onde o
jornal Século XXI atua, abordando, principalmente, as características locais e que hoje se
inserem no espaço global.
O Jornal Século XXI: do físico ao virtual sem fronteiras
Criado há quatorze anos o Jornal Século XXI nasceu para incentivar o exercício da
cidadania, com o princípio basilar de aumentar a busca do bem-estar comum e melhorar a
qualidade da informação recebida na região.
Na tiragem de dez mil exemplares, que correm mensalmente, na Região Serrana e na
cidade de Rio das Ostras, e distribuição gratuita, o enfoque da democracia, da educação e da
ecologia se faz presente num triângulo de informações diversas voltadas para difusão da
cidadania em suas raízes. Valores de cunho social, espiritual, esportes entre outras,
particularizam interfaces com os três termos-chave.
Abrindo-se de forma significativa com a chegada das novas tecnologias, o jornal
Século XXI possibilitou agregar um espaço de discussão social mais amplo, cuja inclusão por
via da manifestação sócio-política-cultural deparou-se com campo fértil na busca de uma
sociedade mais justa e democrática.
Cabe ressaltar que nesse momento de crescente apropriação de tecnologias de
interação, tanto de expansão global quanto de conversão de interesses locais, em face da
existência de fato levou-se a necessidade de se multiplicar os espaços de participação, seja este
de natureza geográfica ou virtual. Mais que isso, tais espaços afirma-se, devem servir aos
ideais de luta a favor de uma polifonia que traga à tona os mais variados discursos, para
redefini-los num exercício da cidadania considerada enquanto recurso, sobretudo em face do
desenvolvimento local.
Portanto, disponibilizado na internet permite visualizar com mais participacionismo
seu conteúdo entre: enquetes, fotografias, edições anteriores, e principalmente nos dias de hoje
através da Web TV, sobre modo este, pois se trata de um trabalho de multimídia, um desafio do
diretor do jornal, Dib Cury, dimensionando em vídeo a cultura local, exaltando as belezas
naturais e problemas que fazem parte da vida de quem lê o Jornal Século XXI.
Perfil da Iniciativa
Consideramos que os veículos de imprensa devem assumir um papel fundamental na
transformação da sociedade brasileira. Este papel é o de informar para a Cidadania.
Acreditamos no mundo e nas pessoas. Somos otimistas com o rumo da história. Procuramos
exercitar com nossas matérias e artigos o interesse pelo auto conhecimento e saúde, além da
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melhoria do nível da cidadania. Através de linguagem acessível, procuramos influir para
elevar a Qualidade de Vida e a qualidade da informação que chega aos cidadãos.
Finalizar esse relato é virar uma página. O objeto do qual falamos acima é um
personagem ativo, dinâmico e encantador, por suas páginas palpáveis, por sua incalculável
dimensão virtual e por seu generoso objetivo. A grandiosidade do Jornal Século XXI fala por
si só, uma mídia alternativa, gratuita, inovadora em busca de: cidadania, esclarecimento e
educação ecológica.
Um tablóide de vinte folhas, com matérias que fazem a diferença e que não devem
satisfações aos formatos e padrões, pois a grande preocupação é com o que é falado e para
quem é falado,e é dentro dessa perspectiva que o Século XXI age e cumpre sua admirável
missão.
Como foi dito antes, apenas viramos uma página nessas considerações, pois o nosso
objeto continua em atividade. Mês a mês, a cada clique, poder-se-a conferir mais incentivo ao
direito básico de cada ser, a cidadania. Exercê-la e ser beneficiado com esse exercício, esse é o
xis da questão para quem vê o mundo melhor, mais verde e mais justo, segmento que
possibilitou o slogan “AQUI A MATÉRIA É VERDE”, na abertura de seus programas.
Finalmente cabem aqui algumas características do Jornal Século XXI. É um jornal de
linha editorial democrática, ecológica e humanista. É movido por um sentido libertário e um
espiritualismo ecumênico.
Na Web TV: Três vertentes norteiam a linha editorial, cujo editor responsável nomeia
de “TV Fórum Século XXI”, a saber:
1 – Defender a Mata Atlântica e debater os temas e prioridades ambientais.
2 – Colaborar para democratizar a informação cultural, cidadã e formadora de
consciência e criticidade.
3 – Divulgar Nova Friburgo, Estrada Serra-Mar e Rio das Ostras como um grande
Circuito Eco-Turístico, principalmente, pela diversidade de cenários envolvidos, além
de sua ótima estrutura hoteleira e gastronômica.
Cidadania é prioridade. Meio Ambiente é prioridade. Mudança de comportamento é
prioridade. É nisto que apostamos!
Assim, o tablóide mensal se tornou um forte ator social, inovador e sem fronteiras.
Esse é o Jornal Século XXI.
Dados da Instituição
O Fórum Século XXI é uma publicação da Agência XXI Cultural
CGC: 02673574/0001-56
Jornalista Responsável: Monique Curi MTB 27058 RJ
Fundação, Direção e Edição: Dib Curi
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Caixa Postal 89675-CEP: 28610-972 - Nova Friburgo (RJ)
E-mail: [email protected]
Registro Especial de Pessoas Jurídicas de número 11 no Cartório do 3º Ofício de Nova
Friburgo.
Referências
BOTÃO, Paulo Roberto. Mídia Comunitária: Novas Tecnologias e a Emergência do Local.
Anais do XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Núcleo de Pesquisa
Comunicação para a Cidadania – Salvador/BA – 1 a 5 Set 2002
CALDAS COSTA, Aline. Reflexões sobre cultura e poder social: uma abordagem
transversal para o conceito de local. Revista Espaço Acadêmico, nº 69, Mensal, ANO VI,
Fevereiro/2007. ISSN 1519-6186.
CANEVACCI, Massimo. Palestra proferida no Seminário Cidade: comunicação, formas e
recepção. UFRGS, setembro de 2006.
CAMPAR de Almeida, António e GAMA, António. Geografia, conhecimento de espaço e
cidadania, in Fragmentos de um retrato inacabado, in AA.VV. (org.), A geografia de
Coimbra e as metamorfoses de um país, co-organizador. Coimbra: Instituto de Estudos
Geográficos da FLUC, 2003.
LOPEZ GARCIA, Xosé. Repensar o jornalismo de proximidade para fixar os media
locais na sociedade global. Comunicação e Sociedade 4. Braga Codex: Núcleo de Estudos de
Comunicação e Sociedade da Universidade do Minho, s/d.
NICOLA, Ricardo. O Cibercidadão do Mundo On-Line: Desafios e (Re)Descobertas.
Unicamp no período de 2000-01, Campinas: IA/Unicamp, 2001.(Tese de Doutorado);
REID, Elisabeth. 2005.
PALÁCIOS, Marcos. Sete teses equivocadas sobre comunidade e comunicação
comunitária: Comunicação & Política. São Paulo, nº 11, 1990.
PERUZZO, Cicília M. Krohling & ALMEIDA, Fernando Ferreira (Org.). Comunicação para
a cidadania. São Paulo: Intercom; Salvador: UNEB, 2003.
______________________________. PERUZZO, Cicília. Direito à Comunicação
Comunitária, Participação Popular e Cidadania. In: OLIVEIRA. Maria José da C. (Org.).
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VIEIRA, Roberto (professor da UFPA). Anais do XXV Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação. Salvador/BA: INTERCOM, doc. base, pág. 13-14, 2002.
Site consultado:
http://www.forumseculo21.com.br
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A Reincidência Criminal à luz do princípio do
Non Bis In Idem
Autor:
Nayara Vogas De Sá
Curso Direito
Universidade Estácio de Sá – UNESA
Unidade Nova Friburgo
Orientador: Marcus Vinicius Vieira Rodrigues
Resumo
O presente trabalho foi fruto de estudos realizados através de doutrinas, jurisprudências e
artigos jurídicos diversos. A abordagem diz respeito ao instituto da reincidência criminal em
face do princípio do non bis in idem. Cabe verificar que, a reincidência é a situação de quem
pratica um crime após ter sido condenado por crime anterior em sentença transitada em
julgado. Este instituto está previsto no art. 61, inciso I, do Código Penal como agravante
genérica da pena e tem tido grande repercussão e incidência na legislação penal brasileira.
Ressalta-se que, está sendo alvo de debates doutrinário quanto a sua manutenção e
relativização. Diversamente do que se passa com a doutrina, que tem travado rigorosa
discussão quanto a sua sustentabilidade e constitucionalidade, a jurisprudência mostra-se em
sua imensa maioria favorável à manutenção desta agravante em nosso ordenamento jurídico.
O trabalho tem por objetivos: analisar a reincidência de acordo com o posicionamento da
doutrina e da jurisprudência tradicionais, observando os princípios constitucionais. Este estudo
foi desenvolvido mediante a pesquisa bibliográfica, e as investigações para alcançar os
objetivos expostos tiveram como base o método indutivo.
Palavras Chave: Reincidência criminal. Non bis in idem. Constitucionalidade.
Introdução
O presente trabalho tem por objeto o estudo da discussão doutrinária
relacionada à recepção da agravante da reincidência criminal na fase de aplicação da pena
privativa de liberdade frente ao Princípio do non bis in idem.
A importância desse tema reside no fato de a reincidência, presente nos artigos
63 e 61, I do Código Penal, ser um instrumento utilizado costumeiramente para agravar a pena
dos condenados que voltam a delinqüir. O tema passou a ser de interesse de todos no
Professor Mestre da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
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momento em que o Estado, por meio dos magistrados, adquiriu o poder de elevar o tempo de
encarceramento de uma pessoa.
O objetivo geral desse trabalho é analisar a possível inconstitucionalidade da
punição de um reincidente criminal, já que esta tem por finalidade agravar uma pena restritiva
de liberdade pelo fato de seu autor ter uma condenação definitiva anterior, o que viola o
Princípio do non bis in idem que entende que ninguém poderá ser punido mais de uma vez por
uma mesma infração penal.
O referido estudo deve-se ao fato de que a reincidência fere os princípios
consagrados na Constituição Federal, uma vez que descreve uma circunstância subjetiva
relevante ao sujeito ativo do desvio punível.
Este trabalho se desenvolve por meio de pesquisa bibliográfica (livros,
periódicos, publicações eletrônicas) e documental, analisando-se a reincidência e sua aplicação
no direito penal, segundo a legislação, doutrina e jurisprudência.
Conceito e aspectos introdutórios da reincidência
A Reincidência é a prática de uma nova conduta penal cometida por um autor já
condenado em um processo com trânsito em julgado, prevista no artigo 63 do Código Penal.
Dessa forma, são três os requisitos para o reconhecimento da reincidência: “ 1°) prática de
crime anterior; 2°) trânsito em julgado da sentença condenatória; 3°) prática de novo crime,
após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.” 52
Cabe destacar que artigo 63 do Código Penal, se encontra no capítulo que tem por
finalidade regrar a forma de aplicação da pena no momento da sentença. Portanto, o fato
praticado pelo agente será analisado de acordo com suas peculiaridades.
Por fim, faz-se necessário a demonstração do conceito doutrinário acerca da
reincidência abordando sobre a definição deste instituo sob a ótica do Professor Fernando
Capez, que afirma que “é a situação de quem pratica um fato criminoso após ter sido
condenado por crime anterior, em sentença transitada em julgado.” 53.
Espécies
A qualidade de recaídas constantes na seara do direito penal se divide em reincidência
real, ficta, genérica e específica.
A reincidência real se caracteriza quando o ofensor experimenta total ou parcialmente
pena que lhe foi imposta referente ao crime anterior. A reincidência ficta ou imprópria ocorre
quando o autor comete novo crime após ser condenado sem que tenha cumprido a pena.
52
53
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal –Parte Geral: 8 ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2004.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: 9 ed., São Paulo: Saraiva, 2005.
80
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Fazendo uma análise ao Código Penal, verifica-se que o legislador adotou a
reincidência ficta, pois não exige para o reconhecimento da agravante o cumprimento da pena
pela condenação do delito anterior.
A reincidência genérica é “o cometimento de um delito, depois de ter sido o agente
condenado e submetido a pena por outro delito.” 54. Significa que o crime anterior e a nova
conduta não têm a mesma natureza, conforme artigo 63 do Código Penal. É uma circunstância
subjetiva, pois é ligada a pessoa do agente pouco se importando com a conduta realizada.
“Reincidente específico será o reincidente em crime previsto no mesmo tipo
incriminador” 55. Isto é, o agente pratica um delito idêntico ao realizado anteriormente o qual
sofreu condenação e cumpriu pena.
A Lei 8.072 de 25 de Julho de 1990 que trata dos Crimes Hediondos acrescentou o
inciso V ao artigo 83 do Código Penal. Na redação deste, encontra-se o veto de liberdade
condicional ao reincidente específico. Porém, a técnica legislativa, acarretou dúvidas, criando
o entendimento que seria a recaída em qualquer dos crimes previstos na lei.
Temporariedade da reincidência
O sistema adotado pelo Código Penal Brasileiro é o da temporariedade. “Transcorrido
certo lapso de tempo sem que outro delito tenha sido praticado, evidencia-se a ausência de
periculosidade e sua normal reinserção social.” Há também um sistema intermediário,
conhecido como misto. Destaca-se por ser aproximado ao sistema perpétuo, embora atenue o
aumento conforme o período de tempo da condenação anterior e a nova.
O sistema da temporariedade consagra a chamada “prescrição da reincidência”,
articulada no artigo 64 inciso I, do Código Penal, onde não prevalece a condenação anterior, se
entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período
de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do
livramento condicional, se não ocorrer revogação.
Com base no dispositivo ora citado, deve-se pautar em três critérios distintos para
verificar o termo inicial da contagem dos 5 anos. Primeiramente, se a pena foi cumprida, o
termo a quo será aquele do término do cumprimento da resposta estatal, isto é, a pena.
Portanto, em todos os casos de extinção da pena é importante salientar que o prazo inicial é a
data que efetivamente ocorreu a causa da extinção e não da data em que foi declara. Por
último, tratando-se de cumprimento de prova de suspensão ou livramento condicional, a data,
de acordo com o professor Capez, será “a da audiência de advertência do sursis ou do
54
ZAFFARONI, Eugênio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro Parte
Geral: 4 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
55
CAPEZ, Op Cit.
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livramento”56. Frisa-se ainda, que o termo final do qüinqüênio é o decurso dos 5 anos ou a
prática de um segundo crime durante este período.
Reincidência e primariedade
Matéria que envolve bastante discussão é a compreensão do que venha ser criminoso
primário, bem como sua relação com a reincidência.
Para o doutrinador Julio Mirabete existem duas orientações: “Chama-se primário
aquele que jamais sofreu condenação irrecorrível. Reincidente é aquele que cometeu um crime
após o trânsito em julgado da sentença que o condenou por crime anterior enquanto não
transcorrido o prazo de cinco anos contados do cumprimento ou da extinção da pena” 57.
Verifica-se que com a adoção do sistema da temporariedade criou diversos conceitos
na tentativa de elucidar a questão. Surgindo uma terceira categoria chamada de tecnicamente
primário ou não primário, isto é, aquele indivíduo que realizou conduta tipificada como crime
após o prazo de da reincidência (5 anos). É o agente que não é primário nem reincidente.
Neste sistema em não há previsão legal para o não primário, aparecerá a figura do
portador dos maus antecedentes como explica o professor Rogério Greco: “Se não houver a
revogação do sursis ou do livramento condicional, ultrapassado o período de cinco anos, não
poderá a condenação anterior ser considerada para efeito de reincidência, prevalecendo
somente para configuração dos maus antecedentes.” 58.
Questões pertinentes em relação a reincidência
Em relação à natureza jurídica, “trata-se de circunstância agravante genérica de caráter
subjetivo ou pessoal” 59. Sendo subjetiva, não se comunica em caso de concursos de pessoas.
Ressalta-se, o esquecimento do legislador, ao tratar das hipóteses passiveis de reincidir,
aduzir como possibilidade de agravamento o fato do agente praticar crime após ter sido
condenado pela prática de contravenção penal. O artigo 63 da carta penal pátria define para
configuração da reincidência a conduta “crime anterior”.
O artigo 7° da Lei de Contravenções Penais, decreto-lei n° 3.688, de 1941, trás a
seguinte redação: “Verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma contravenção
depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado, no Brasil ou no estrangeiro,
por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção”.
56
CAPEZ. Op. Cit.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal-Parte Geral: 18 ed., São Paulo: Atlas, 2002.
58
GRECO. Op. Cit.
59
CAPEZ. Op. Cit
57
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Conclui-se que, somente é reincidente o condenado definitivo por crime comete
novamente crime, ou, condenado definitivamente pela conduta de contravenção comete nova
contravenção. E condenado por crime, realiza conduta descrita como contravenção penal.
Quanto à questão territorial, a preexistência de condenação no estrangeiro induz a
reincidência, uma vez que esta consideração foi consagrada expressamente no Código Penal
surgindo assim a chamada “reincidência internacional”. A sentença estrangeira não necessita
ser homologado para ser reconhecida no nosso ordenamento. Entretanto, deve-se respeitar dois
requisitos para o reconhecimento da reincidência internacional: que a conduta seja tipificada
no estrangeiro e também no Brasil, e que a sentença condenatória anterior realizada no
exterior tenha respeitado o princípio do devido processo legal. Porém, deverá haver uma
conformidade nas duas legislações no aspecto de ambas conhecerem tal instituto.
Outra hipótese que determina a configuração da agravante é em relação da natureza
dos crimes praticados. Em relação a pena pecuniária, quando o crime anterior for apenado com
multa o agente será considerado reincidente, conforme artigo 95 do Código Penal.
Há entendimento diverso em relação a este aspecto, uma vez que a pena de multa não
pode piorar a situação do réu, fazendo que o mesmo sofra as consequências de condenado
reincidente. Por força do artigo 77, parágrafo 1° do Código Penal, a condenação pecuniária
anterior não impede o sursis, não havendo carga suficiente na multa para gerar reincidência.
Em relação às condutas que não geram reincidência, têm-se diversas situações. A
primeira é em relação à contravenção praticada no exterior e uma nova contravenção realizada
no Brasil. Há este raciocínio pelo fato do artigo 2° da Lei de Contravenções Penais entender
que somente é considerada no ordenamento pátrio, as contravenções praticadas no território
nacional. Não gera reincidência transação penal, composição civil e sursis processual.
O artigo 63 do Código Penal dispõe que somente haverá a reincidência “depois” que
houver trânsito em julgado. Assim, ensina a doutrina que, “como a lei usa o advérbio depois,
entendemos que a prática do novo crime, para ensejar a reincidência, deve ocorrer em data
posterior (e não no mesmo dia) à do trânsito em julgado da condenação pelo crime anterior.” 60
Não ocorre a agravação da pena quando se verifica que o crime anterior teve extinta
sua punibilidade. Porém, nem todas as extinções de punir acarretarão a desconfiguração da
reincidência. “Se a causa extintiva ocorreu antes do trânsito em julgado, o crime anterior não
prevalece para efeitos de reincidência.” 61. Mas esta regra comporta exceções, quando a causa
for abolitio criminis ou anistia, o ato de reincidir perderá efeito “porque estas disposições
eliminaram diretamente a tipicidade da conduta anterior, e, por conseqüência, não se pode ter
em conta a condenação pronunciada em razão de uma tipicidade inexistente” 62.
60
DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado: 6 ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
CAPEZ. Op. Cit.
62
MIRABETE. Op.Cit.
61
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Deve-se ter cuidado para evitar o bis in idem no momento da aplicação da pena, uma
vez que não se pode utilizar a condenação passada como agravante de reincidência e ao
mesmo tempo se valer de circunstância judicial de maus antecedentes.
Evolução da legislação brasileira e a reincidência
A reincidência surgiu em Roma e tinha como principal objeto uma espécie de pesquisa
na conduta humana em relação aos crimes praticados reiteradamente.
Verifica-se que o objeto principal da agravante sempre foi voltado a figura do
criminoso e sua rebeldia frente à ordem social. Porém, jamais foi analisado se sua conduta
reiterada era realmente desprezo em relação às leis ou tratava-se de uma pessoa incapaz de
sobreviver diante das dificuldades da época.
Código Criminal do Império de 1830
O Código Criminal do Império foi elaborado por determinação da Constituição
brasileira de 1824 e sancionado em 1830 pelo imperador D. Pedro I. A Carta Maior da época
exigia um código criminal baseada em um núcleo de justiça e igualdade.
O liberalismo empregado nas leis esbarrava em pensamentos antagônicos. Verifica-se
um sistema de ideias contraditórias onde as leis não se harmonizam com a realidade.
Diante de um diploma penal cheio de ambigüidades, cercado de eixos políticos que se
chocam, o Código Criminal do Império, no artigo 16, parágrafo 3°, mostrava que reincidência
ocorria quando: “(...) o delinquente tinha reincidido em delito da mesma natureza (...)” 63.
Portanto, nota-se que o artigo não faz referência à sentença condenatória anterior como
requisito para a configuração da reincidência. Outro aspecto é o fato do artigo apresentar uma
espécie de reincidência específica.
Código Penal Republicano de 1890
Com o advento da República, foi necessário de elaborar um projeto de Código Penal,
sendo aprovado e publicado em 1890. O mesmo ficou pronto em cerca de 3 meses.
Insta informar que este código, com inúmeras leis extravagantes, que serviam para a
criminalização dos indivíduos indesejáveis, traz as marcas da legislação de 1830, por ter sido
um instrumento revisor e não inovador, permaneceu o caráter autoritarismo e vigilante.
O código republicano já define, em seu artigo 40, o que significa reincidência: “(...) A
reincidência verifica-se quando o criminoso, depois de passada em julgado sentença
condenatória, comete outro crime da mesma natureza e como tal entende-se, (...)” 64.
63
BRUNO, Aníbal. Direito Penal: 4 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1984.
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“Mesmo tendo procurado suprir as omissões do Código Criminal do Império, o
Código Penal Republicano não foi feliz em sua definição sobre crimes da mesma natureza”65.
Analisando o artigo mencionado, a redação restringe a reincidência específica, já que
delimita seu campo de atuação apenas no que diz respeito à violação do mesmo artigo. Logo, a
polêmica recai sobre qual o conceito de crime da mesma natureza, já que se for levar o artigo
ao pé da letra, aquele que comete furto e posteriormente roubo não será reincidente.
Código Penal de 1940
Na década de 30, em decorrência do federalismo exagerado imposto pela primeira
República, passou-se a ter uma resistência em desfavor desta passando o poder a ser forte e
centralizado. O intuito maior do Código de 1940 era garantir um sistema penal harmônico,
garantindo um estado que vise o bem-estar da coletividade.
O Código de 1940 diferenciava a reincidência genérica da específica, sendo a primeira
hipótese de crimes com a natureza diversa e a segunda seria nas ocasiões onde as infrações se
enquadram na mesma natureza, não importando se fossem previstos no mesmo dispositivo.
Nesta época era adotado o sistema da perpetuidade onde o condenado não quitava sua
obrigação com a justiça penal, podendo ter sua vida pregressa utilizada a qualquer tempo para
fins de agravamento de penal através da reincidência. Esse sistema não é mais adotado.
Outro aspecto interessante é o fato do Código de 1940, antes da reforma da Lei 7.209,
de 1984, colocar o reincidente como um sujeito perigoso merecedor de não só a pena privativa
de liberdade, mas também ao remédio da medida de segurança.
O Código Penal sofreu diversas reformas tendo a reincidência nova roupagem.
Ocorreram mudanças na distinção entre reincidência genérica e específica, adotou-se o sistema
da temporariedade.
Incompatibilidade Constitucional
Insta informar que abaixo estarão elencados alguns Princípios Constitucionais que
estabelecem acerca das garantias que tem por finalidade resguardar os direitos dos cidadãos e
que mostram que a Reincidência Criminal está em desacordo com a Constituição.
Princípios são ordenações que irão constituir os sistemas de normas jurídicas e servirão
de base para a formação destas.
64
QUEIROZ, Paulo de Souza. Legitimação versus deslegitimação do sistema penal: 1ed., Belo Horizonte: Del
Rey, 2001.
65
ZAFFARONI Op Cit.
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Princípio da legalidade
Cabe informar que o Princípio da Legalidade encontra-se exposto no art. 5º, inciso II,
da Constituição Federal, e prevê que “ninguém será obrigado fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei” 66.
Nas palavras de Bastos, o princípio da legalidade "surge como uma das vigas mestras
do nosso ordenamento jurídico”.67 Este princípio tem por objetivo combater o poder
discricionário do Estado, impedindo o poder excessivo. Assim sendo, somente através de leis,
elaboradas pelo poder legislativo constitucional, poder-se-á reprimir a conduta dos indivíduos.
Princípio da igualdade
Rege o artigo 5º, “caput”, da Constituição Federal que “todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança [...]”. 68
Segundo Silva, a Constituição Federal adota a igualdade jurídica formal, ou seja,
igualdade perante a lei, quando prescreve: “Todos são iguais perante a lei” [...]69, e reforça este
princípio em outros dispositivos constitucionais, como por exemplo, no art. 7º, inciso XXX, o
qual “proíbe a diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão por
motivo de sexo, idade, cor ou raça,” procurando, desta forma, igualar os desiguais, protegendo
e concedendo direitos.
O princípio da igualdade oferece as pessoas igualdade de direitos, não de igualdade de
condições, assim, devido às desigualdades sociais existentes, compete tratarmos igualmente os
iguais e desigualmente os desiguais, para que possamos fazer justiça.
O princípio da igualdade proíbe o arbítrio, ou seja, proíbe as diferenciações de
tratamento sem fundamento material. Proíbe a discriminação, ou seja, as diferenciações de
tratamento fundadas em categorias meramente subjetivas.
Princípio da humanidade
Prescreve o art. 5, inciso XLVII da Constituição Federal que: “não haverá penas: a) de
morte, salvo em caso de guerra; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de
banimento; e) cruéis.”
Pelo princípio da humanidade deve-se respeitar a dignidade humana daquele indivíduo
que comete infrações penais, proibindo a aplicação de pena humilhante ou degradante, como
66
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 05 jun. 2007.
67
BASTOS, Celso Ribeiro Bastos. Curso de direito constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2000.
68
BRASIL. Op. Cit
69
SILVA, José Afonso da Silva. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
86
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por exemplo: a) as condições desumanas e indignas, em geral, de execução das penas na
maioria absoluta das penitenciarias e cadeias públicas; b) as condições desumanas e indignas,
em especial, do execrável Regime Disciplinar Diferenciado.
Desta forma, deve-se tratar o delinqüente com respeito, como pessoa humana que é
devendo ser-lhe garantido processo e pena justa. Em um Estado de Direito Democrático vedase a criação, a aplicação ou a execução de pena, bem como de qualquer outra medida que
atentar contra a dignidade da pessoa humana.
Princípio da proporcionalidade
O princípio da proporcionalidade prevê que os meios destinados a realizar um fim
devem ser adequados, quer dizer, deve haver proporção entre meio e fim. Müller entende que
o princípio da proporcionalidade "se caracteriza pelo fato de presumir a existência de relação
adequada entre um ou vários fins determinados e os meios com que são levados a cabo”. 70
A principal função desempenhada pelo princípio da proporcionalidade é no campo dos
direitos fundamentais, servindo, antes de mais nada (e não somente para isto), à atualização e
efetivação da proteção da liberdade aos direitos fundamentais. Assim, quando injustificável,
excessiva ou inadequada à medida aplicada, podemos invocar a sua inconstitucionalidade.
Princípio da dignidade da pessoa humana
O art. 1º, inciso III, da Constituição Federal traz como um dos fundamentos do Estado
Democrático de Direito a dignidade da pessoa humana. Sarlet, analisando tal princípio,
formulou o seguinte conceito “temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e
distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por
parte do Estado e da comunidade, implicando, nesse sentido um complexo de direitos e
deveres fundamentais que assegurem a pessoa de todo e qualquer ato de cunho degradante e
desumano, e que venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas”. 71
Scarlet sustenta que o princípio da dignidade da pessoa humana é princípio informador
de todos os direitos e garantias fundamentais. Não reconhecer os direitos e garantias inerentes
a pessoa humana, implica em negar-lhe a própria dignidade. Nesse sentido, o princípio da
dignidade da pessoa humana vem sendo destacado como o "princípio (e valor) de maior
hierarquia da nossa e de todas as ordens jurídicas que a reconhecem.” 72
70
MULLER, apud BONAVIDES, 2004, p. 393.
71
SCARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de
1988. 2 ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. p.62.
72
SCARLET. Op. Cit.
87
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Princípio da culpabilidade
Culpabilidade é “a reprovação da ordem jurídica em face de estar ligado o homem a
um fato típico e antijurídico” 73, é através dela que o aplicador do direito examina se é possível
a imposição, ou não, de uma pena à pessoa que praticou um delito.
O princípio da culpabilidade, sucintamente, se baseia na máxima – não há crime sem
culpa. Esclarece Rebêlo, “como fundamento da pena, refere-se ao fato de ser possível ou não a
aplicação de uma sanção ao autor de um fato típico e antijurídico, isto é, proibido pela lei
penal. Já como limite da pena, é elemento de sua determinação ou medição, obstando que seja
imposta aquém ou além da medida prevista pela própria idéia de culpabilidade”. 74
Para Zaffaroni, “a culpabilidade é a reprovabilidade, que pressupõe a possibilidade de
compreensão da antijuridicidade da conduta e que no âmbito da autodeterminação do sujeito
tenha tido certa amplitude, quer dizer, que não tenha em uma pura escolha.” 75
O Código Penal, art. 26, prevê que a periculosidade é considerada como dado apenas
para a aplicação de medida de segurança, adequada ao inimputável ou semi-imputável: “Art.
26 - é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto
ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”76
Princípio do non bis in idem
O princípio processual do non bis idem traduz a idéia de que nenhuma pessoa poderá
ser submetida duas vezes a um processo pelo mesmo fato cometido. Trata-se de uma forma de
proteção ao indivíduo em face do poder punitivo do Estado. A falta desta observância
importará falta grave ao princípio da dignidade humana, onde o indivíduo nunca terá a
garantia de que cumpriu os seus deveres diante da sanção imposta. Esse princípio tem ligação
com o direito penal do fato, não se considerando a essência do autor mas a conduta praticada.
No tocante a origem do princípio do non bis idem, Zaffaroni, Nilo Batista e outros,
estudando Martin Friedland, trazem a informação que: “o primeiro antecedente remonta ao
direito inglês, em 1176, embora provenha do direito civil continental, originado na Grécia e
desenvolvido no Código de Justiniano.”77.
Seguindo na lição dos professores citados no parágrafo anterior, os doutrinadores
esclarecem que há uma diferença entre o princípio da proibição de punição dupla e o non bis
idem: “O princípio processual non bis in idem e a proibição de punição dupla não coincidem
73
JESUS, Damásio E. Direito penal: parte geral. 28 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 1. p. 155
REBÊLO, José Henrique Guaracy. Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte:
Del Rey, 2000. p. 27.
75
ZAFFARONI, Op Cit.
76
BRASIL. Decreto lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940. Código penal. loc. cit.
77
ZAFFARONI. Op. Cit.
74
88
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quanto a seu alcance: o primeiro opera mesmo antes da punição, e a segunda também em
casos nos quais o primeiro não se encontra formalmente comprometido”.
Conclui-se, portanto, que um mesmo indivíduo não poderá sofrer dupla punição em
relação sob pena de ofender princípios consagrados no ordenamento pátrio.
Reincidência e o princípio do non bis in idem
O debate sobre a constitucionalidade da reincidência deverá pautar-se de acordo com
a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil em 1988, onde se passou a
consagrar princípios que forçaram uma releitura em todo ordenamento penal.
Portanto, qualquer espécie normativa será avaliada sob os olhares dos princípios
penais constitucionais. Por serem princípios constitucionais, sua observância é de extrema
necessidade, uma vez que o afastamento dessas orientações ocasionaria uma insegurança
jurídica, bem como um enfraquecimento na supremacia da Constituição.
Assim, a garantia do non bis idem, por ser um princípio cujo objeto é evitar
arbitrariedades e proteger o indivíduo do excesso praticado pelo Estado, torna-se de análise
imprescindível em face do instituto da reincidência.
Esta circunstância agravante significa no retorno do réu ao ato de delinquir depois de
ter transitado em julgado sentença condenatória. “É a situação daquele que pratica um fato
punível quando definitivamente condenado por crime anterior”. 78
Por força do artigo 61, inciso I, do Código Penal, ocorrerá um agravo obrigatório na
pena do condenado, fazendo com que o mesmo receba uma sanção mais rigorosa do Estado.
Interpretando o texto, surge o foco central deste trabalho que está ligado ao tratamento
dispensado ao reincidente no momento da aplicação da resposta estatal, ou seja, a previsão
legal de exasperação da pena pelo fato do agente cometer uma nova infração acarreta uma
dupla punição em relação ao mesmo fato.
Uma segunda condenação na área penal, pelo mesmo fato praticado, não poderá em
nenhuma hipótese acontecer. Neste sentido, explicando o princípio do non bis idem, informa o
Mestre e Doutor Leonardo Yarocheswky, (...) se uma pessoa já foi devidamente julgada e
condenada a cumprir uma determinada sanção ela não poderá, por qualquer que seja a razão,
ser novamente punida por fato anteriormente cometido e pelo qual já tenha sido condenada. 79
Com a reincidência, o indivíduo terá uma repressão superior uma vez que na sua vida
pregressa consta o fato de já ter sido condenado pela realização de uma conduta tipificada.
Entretanto, vale a pena frisar que, em relação a este processo onde ocorreu a condenação
anterior, o agente já cumpriu pena e está quite com seus deveres perante a sociedade. Logo,
78
79
COSTA JUNIOR, Paulo José da. Curso de Direito Penal: 4 ed., São Paulo: Saraiva, 1997.
YAROCHEWSKY. Op. Cit.
89
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não pode uma sentença transitada em julgada gerar efeitos em uma decisão futura. O que
acontece nesses casos é uma ofensa a coisa julgada material, onde a pena anterior já
sentenciada e cumprida serve como base para agravações posteriores.
É importante esclarecer, que o crime posterior tem sua pena aplicada com mais rigor,
sendo fundamentada por uma conduta anterior que não tem nenhuma relação nova.
Não há dúvida que ao punir o agente, considerando o crime anterior já extinto, estará o
sentenciando novamente por uma pena já cumprida. É evidente que a punição ao reincidente,
para fins de agravamento da sanção, nada mais é que uma valoração da pessoa do agente,
trazendo o tão criticado direito penal do autor.
No que diz respeito a coisa julgada e sua ofensa por parte da reincidência,
Yarocheswky, citando Maia Neto, explica que “quando se aplica o instituto mencionado,
aumenta-se a pena anterior já cumprida e não a do delito posterior.”80 Conclui-se, portanto,
que a reincidência altera uma decisão transitada em julgada a qual já foi cumprida pelo
condenado. Tornando-se uma espécie capaz de alterar uma sentença acobertada pela coisa
julgada e passando a ser um objeto nocivo da garantia da segurança jurídica.
É inconcebível a idéia de que o reincidente esteja juridicamente mais obrigado a não
cometer ilícitos do que os demais da coletividade. É certo que o indivíduo que passou por uma
prisão, não é o mesmo ao sair dela, pois o sistema penal é perverso, degradante e desumano.
A excessiva severidade na punição aos reincidentes configura uma inversão das
orientações norteadoras do direito penal. O tratamento dado a aqueles que cometem delitos é
no sentido de puni-los valorando, desrespeitando seus direitos e dignidade.
A conclusão que se chega, é que o instituto da reincidência, como circunstância
obrigatória, não tem espaço em um ordenamento comprometido com o ser humano pautado
nas garantias do Estado Democrático de Direito.
Considerações Finais
Após uma análise jurisprudencial e doutrinária acerca do instituto da reincidência,
abordado especialmente sob o aspecto do princípio do non bis in idem, conclui-se que é
circunstância que interfere nos compromissos firmados pelo Estado Democrático de Direito.
A reincidência demonstra ser um sério inconveniente quando diz respeito a uma forma
disfarçada de punir um indivíduo duplamente, em razão de uma mesma conduta praticada. É
indiscutível que ocorre uma modificação na pena anterior já cumprida, surtindo efeitos no
delito posterior mesmo após ter sido a sentença acobertada pelo manto da coisa julgada.
80
YAROCHEWSKY. Op. Cit.
90
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Em face do agravamento da pena em razão da insuficiência da pena há divergência
entre a espécie de reincidência adotada e o argumento utilizado para impor sanção mais
severa. Não há que se falar em ineficácia da medida, já que o Brasil adota a reincidência ficta
onde não é preciso o condenado cumprir a pena anterior para ser considerado reincidente.
A doutrina e a jurisprudência analisam a reincidência apenas no âmbito
infraconstitucional, esquecendo-se que a Constituição é lei suprema. Ademais, os fundamentos
apontados pelas correntes tradicionais da doutrina e jurisprudência para justificar a aplicação
da reincidência são contestáveis e ferem princípios constitucionais: legalidade, non bis in idem
e proporcionalidade, a ofensa a tais princípios afronta o fundamento da dignidade da pessoa
humana, base do Estado Democrático de Direito.
A Constituição Federal estabelece como objetivos do Estado: construir uma sociedade
livre, justa e solidária; reduzir as desigualdades sociais e promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Assim, o direito penal como controle social formal num Estado Democrático de Direito deve
estar submetido, no plano formal, ao princípio da legalidade e, deve servir, no plano material,
à garantia dos direitos fundamentais do cidadão, buscando materializar os objetivos acima
expostos.
Diante dos aspectos apresentados, a reincidência está sendo aplicada no sistema
jurídico brasileiro, em desacordo com a Constituição Federal, tornando mais distantes da
concretização os objetivos almejados pelo Estado e pela sociedade.
Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em:
05 jun. 2007.
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CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: 9 ed., São Paulo: Saraiva, 2005.
CARVALHO, Salo. Penas e garantias: 1 ed., Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2003.
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DELMANTO, Celso... et al. Código Penal Comentado: 6 ed., Rio de Janeiro: Renovar,
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2004.
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MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal-Parte Geral: 18 ed., São Paulo:
Atlas, 2002.
91
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais comentadas: 2 ed., São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007.
QUEIROZ, Paulo de Souza. Legitimação versus deslegitimação do sistema penal: 1ed.,
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REBÊLO, José Henrique Guaracy. Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial.
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constituição federal de 1988. 2 ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
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SILVA, José Afonso da Silva. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6 ed. São
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YAROCHEWSKY, Leonardo Isaac. Da Reincidência Criminal: 28 ed., Belo Horizonte:
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ZAFFARONI, Eugênio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal
Brasileiro Parte Geral: 4 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
ZAFFARONI, Eugênio Raúl. BATISTA, Nilo. ALAGIA, Alejandro. SLOKAR,
Alejandro. Direito Penal Brasileiro – primeiro volume: 2 ed., Rio de Janeiro: Revan, 2003
92
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ZERO CAL COLOR:
Alimentação saudável não tem idade
Autora:
Aline Costa Parise
Orientador: Roberto F. Vieira (Parte I)
Orientador: Fabio Monnerat (Parte II)
Resumo:
O objetivo deste estudo, enquanto trabalho de conclusão, ou seja, TCC delimitou-se a
aplicação prática alinhada as bases teóricas de conhecimentos adquiridos durante o curso.
Estruturado na forma de criação de uma agência como modelo e com posterior escolha de um
cliente, levou-se em conta as particularidades do produto e dimensionados através de uma
campanha, cuja, realização fundamentou-se tecnicamente adequando-se às necessidades da
empresa cliente escolhida. Ainda que no imaginário, tanto agência, quanto cliente permitiu a
qualificação e capacitação, por quando da realização de um projeto experimental
comunicacional de qualidade em Publicidade e Propaganda.
Palavras-Chave: Comunicação Social; Projeto Experimental; Agência de Publicidade;
Produto; Pesquisa; Mídia; Planejamento
Introdução
Neste inicio de século, os publicitários estão assistindo e participando de velozes e
significativas mudanças no mercado. A tecnologia, os métodos de trabalho e as pessoas vivem
um período de grandes transformações. Com isso, as instituições são cada vez mais cobradas e
pressionadas a oferecerem melhor qualidade em seus produtos e serviços.
Nessa “Era do conhecimento” com explosão de informações, tanto científicas como
técnicas, bem como a rápida expansão da tecnologia, faz-se necessário o alinhamento desses
elementos, como valores agregados nos serviços e produtos, sobretudo no dimensionamento
da qualidade total por via da comunicação total.
Professor da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
Professor da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
93
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Qualidade total que se afirma tecnicamente as estatísticas de produção hoje praticadas
pelas empresas e que estariam afastadas do mercado se não se incorporassem, também,
estratégias de comunicação com a qualidade total. Nesse sentido, Juran (apud França e Freitas,
1997, p. 91) que diz: diversos conceitos de qualidade remetem-se a várias definições,
entretanto, uma delas é mais comumente citada, ou seja, “qualidade é a adequação ao uso.”
Juran (ibdem p. 92) ainda nos diz: “Qualidade: a totalidade de propriedades e características de
um produto ou serviço que confere sua habilidade em satisfazes necessidades explícitas ou
implícitas.”
E é exatamente sob essa ótica que se propôs uma agência caracterizada com a união
desses dois movimentos, ou seja, a comunicação total com qualidade total, dando origem a
marca (logomarca) “COMTOTAL”.
Por outro lado fez-se necessário a inserção da criatividade para a escolha de um cliente,
mesmo que de forma imaginária, mas permitindo-se a elaboração completa na campanha de
um produto com a estruturação de todos os valores agregados e dimensionados no despenho
de todas as etapas inerentes ao projeto final de curso.
Em última análise, o estudo permitiu o desenvolvimento global de todas as peças
publicitárias condicionadas ao grau de excelência nas relações agência/cliente através do
atendimento, pesquisa e planejamento, criação e produção.
O desafio: desenvolvimento da agência de publicidade
No primeiro momento do trabalho foi criada uma agência de publicidade, na qual se
desenvolveu toda a campanha de lançamento de um novo produto alinhado a empresa/cliente.
A agência de publicidade COMTOTAL Consultoria LTDA prestadora de serviços de
consultoria, planejamento de campanha, e execução de ações. A COMTOTAL acredita no
mercado que abrange através da internet, a utilização deste meio na promoção de suas ações.
O nome COMTOTAL tem origem do termo “comunicação total”, onde o ponto de
partida é a criação de uma filosofia global, corporativa e integrada de comunicação, orientado
todos os relacionamentos organizacionais.
A comunicação total adota, ainda, como filosofia planejar e determinar a estratégia de
interação da empresa com seus públicos, estabelecer estratégias específicas para ter êxito nas
propostas e aplicar à comunicação as novas ferramentas dos processos da Qualidade Total.
Segundo Kotler & Amstrong (1998), “a qualidade total é a chave para criar valor e
satisfação ao consumidor. Assim como o marketing é o trabalho de todos, a qualidade total é
tarefa de todos.” A qualidade total busca sempre a satisfação total do cliente em relação ao
processo, produto ou serviço e benefício recebidos. E é com este ideal que a COMTOTAL
buscou os princípios da qualidade total como seu principal objetivo.
94
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Enquanto slogan, a agência agregou o pensamento, entendido também como elemento
de sua identidade: “Proporcionando a comunicação com qualidade total”.
As cores utilizadas na logomarca da empresa trazem junto um significado de confiança
e credibilidade. A fonte utilizada na grafia do nome permite que a agência tenha em sua marca
a identificação com modernidade, e atualidade. Conforme representada na figura abaixo:
A partir desta construção foi possível, em imagem, passar os conceitos estabelecidos
para a agência, desenvolvendo-se todo o material gráfico a ser utilizado pela mesma, desde
papelaria até documentos.
Para ampliar a realidade dos processos foi estabelecido um contrato social, um
organograma e complementado com um fluxograma demonstrando efetivamente e
tecnicamente a operacionalidade da agência. Como qualquer outra organização, estabeleceu-se
nesta perspectiva sua missão, visão, metas e objetivos.
Hypermarcas, Zerocal e... Zerocal Color!: o cliente e o produto
A Hypermarcas, empresa fabricante da linha Zero Cal, é uma das maiores companhias
de bens de consumo com capital de origem brasileira e possui o maior e mais diversificado
portfólio de marcas, incluindo predominantemente marcas líderes e vice-líderes em seus
respectivos segmentos. Atua em quatro linhas de negócios, desenvolvendo, produzindo e
comercializando produtos que fazem parte de um amplo e reconhecido portfólio de marcas:
Benegrip, Engov, Doril, Atroveran, Monange, Risqué, Jontex, Cenoura & Bronze, Finn, Zero
Cal, Assolan, entre outros. Possuí uma estrutura de vendas e distribuição com abrangência
nacional.
Atualmente, opera com 19 plantas em nove complexos industriais, localizados nos
Estados de Goiás, Santa Catarina e São Paulo. Conta com uma administração e acionistas com
ampla experiência e know-how na indústria de bens de consumo. Tem uma larga experiência
na identificação, atração, aquisição e integração de negócios neste setor, na implementação de
políticas de crescimento e na realização de investimentos em marketing. Estes fatores
possibilitam o crescimento da empresa e suas marcas.
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Zero Cal, marca da Hypermarcas líder absoluta em adoçantes, ganhou o Prêmio
Melhores Marcas dos Fornecedores da Alimentação, na categoria Ingredientes e Matérias
Primas como melhor edulcorante. Zero Cal está presente no mercado há mais de 25 anos e é
uma das marcas mais reconhecidas e lembradas pelo consumidor brasileiro. Além disso, a
marca ganhou o prêmio Folha Top of Mind pelo sexto ano consecutivo, desde que a categoria
adoçantes foi inserida na pesquisa, em 2004. Zero Cal é líder da categoria de edulcorantes no
Brasil, dominando amplamente a forma de apresentação líquida (gotas) que representa cerca
de 80% do consumo no país, além das consagradas versões Sacarina Líquida 100ml e 200ml a
marca oferece ainda as versões em Pó Sache 800mg e Líquida 100ml a base de Aspartame.
Atualmente a marca pretende lançar mais uma versão para ampliar ainda mais sua
presença no mercado, o Zero Cal Color virá em um frasco de 100ml, e é destinado ao público
infantil.
Zero Cal Color: o lançamento
Em um segundo momento do trabalho, a agência entrou em contato com seu primeiro
cliente, e deu início ao desenvolvimento de toda a campanha de lançamento do produto criado
pelo próprio aluno.
O produto lançado é uma extensão da linha Zero Cal, o Zero Cal Color, um adoçante
artificial que se apresenta com uma coloração diferenciada dos demais, que se caracterizam
enquanto transparentes. Nessa perspectiva, entendeu-se que esse diferencial incentiva as
crianças que precisam de alimentação mais saudável e, por conseguinte diminuindo a
quantidade de calorias ingeridas diariamente.
96
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Este experimento deu-se a partir do briefing, documento necessário ao
desenvolvimento como peça estruturalmente de fundamental importância para a realização da
campanha. Segundo Muniz o briefing, representa-se, enquanto:
“Documento com as diretrizes e metas do anunciante para a campanha publicitária.
Contém diversas informações: do diferencial do produto/serviço ao público-alvo que
se quer atingir. A partir do briefing é que se dá início à elaboração da campanha
publicitária.” (MUNIZ, 2004)
Como em toda e qualquer campanha, para que a mesma alcance os resultados
planejados, foi necessário um planejamento minucioso, com análise de cenário, distribuição,
público-alvo, concorrência, preço, problemas e oportunidades, posicionamento, objetivo e
estratégia de marketing, objetivo e estratégia de comunicação, estratégia de mídia, controle e
execução dos resultados.
Nosso público-alvo
A campanha precisa ser direcionada a um determinado público, para ter melhor
eficácia. A Agência identificou como público-alvo do Zero Cal Color, os pais e mães de
crianças com diabetes ou obesidade.
Esses adultos tem por responsabilidade regular a alimentação de seus filhos e devem
encontrar no adoçante colorido um incentivo para que a crianças tenham uma alimentação
mais saudável.
Apesar de o produto ser infantil, a campanha direcionou-se aos pais, já que crianças
não tem interesse em consumir adoçantes artificiais mesmo que coloridos. Dessa forma, o
nosso público-alvo é pertencente das classes C+, B e A.
Promoção de Vendas, XP Game
A estratégia promocional parte do princípio de oferecer um benefício ao público-alvo,
as crianças. Esse benefício oferecido não basta apenas ser o de uma alimentação saudável, já
que isso não é incentivo para o público que adora comer doces, e gorduras. Tal benefício, um
código contido no encarte extra da embalagem, permitiu o acesso online ao jogo XP Game.
A promoção funcionou da seguinte maneira: o jogador precisou de um código de
acesso para entrar no jogo. O código só pode ser encontrado no encarte extra, que compôs as
embalagens de Zero Cal 100ml, e Zero Cal Color 100ml. Código este, que possibilitou
sobretudo a criança jogar.
Ao acessar o game o jogador escolhia um personagem. Personagem este que
representava o jogador online, que preparava uma alimentação bem saudável e gostosa.
Alguns alimentos foram disponibilizados nos jogos, com as opções de adoçar com açúcar,
mel, ou adoçante Zero Cal tradicional ou Zero Cal Color. No caso do adoçante colorido a
criança pode brincar com a mistura das cores e se divertir. As refeições saudáveis preparadas
97
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com o Zero Cal Color recebiam bonificações, e oportunidade de se cadastrar para receber
amostra grátis do Zero Cal Color com 20 ml em casa.
O jogo poderá ser jogado quantas vezes o jogador quiser, porém só pode existir um
cadastro por CPF, e para isso as crianças precisaram da ajuda dos pais, que mais uma vez
comprovaram os benefícios oferecidos a saúde de seus filhos.
A pesquisa de opinião e o planejamento de mídia
Foi necessário também a realização de uma pesquisa de opinião mercadológica, para
que desta forma a agência pudesse detectar possíveis falhas do produtos, antes do
lançamentos, e reduzir os riscos de falhas.
Para desenvolver uma pesquisa é preciso fontes seguras que garantam um resultado
verdadeiro e solucione o problema encontrado, e não o disfarce. Conforme define Yanaze
(2007), “o sucesso ou fracasso de uma organização, em muitos casos, dependerá
exclusivamente da eficácia do gerenciamento da informação, como um modo de antecipar-se e
reagir às ações dos concorrentes mais importantes.”
No total foram 43 pessoas entrevistadas, porém apenas 30 das pesquisas se tornaram
válidas por se tratar do nosso público-alvo. Os resultados a seguir são referentes a análise
apenas das entrevistas que se tornaram válidas.
Os entrevistados moram em sua maioria em Nova Friburgo, totalizando 55%. Os
demais são das outras praças em que o produto será lançado, Cordeiro e Bom Jardim. Destes
58% consome adoçantes artificiais.
98
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Dentre as marcas mais conhecidas o Zero-Cal ficou com 54%. Quando perguntado por
qual marca prefere o Zero-Cal teve 91% das respostas válidas, deixando o Assugrim com 9%,
e o Adocyl não obteve nenhuma resposta favorável.
Apenas um dos 30 entrevistados respondeu que não compraria o Zero Cal Color para
seu filho, pois para ele a ingestão de adoçantes pode dar câncer. Este é o mito representa o
maior problema no lançamento do produto.
Por fim o planejamento de mídia foi estabelecido baseado em todos os dados
adquiridos em pesquisas e planejamentos para que possa atingir o público adequado,
alcançando o objetivo da campanha.
Considerações Finais
Desde o início do curso somos postos a prova todos os dias e não apenas nas provas e
trabalhos. Compreende-se neste composto a dedicação de aprender e a vontade de se tornar
um excelente profissional (publicitário).
Nas relações ensino/aprendizagem não chega a ser suficiente todo o estudo teórico,
cuja agregação de alguma forma necessita, em alguns casos, ou quase na sua totalidade de ser
complementado com atividade e ou ensinamentos práticos durante o curso, levando-se assim
essa relação até o final da graduação.
Nesse sentido que o Projeto (TCC) torna-se uma busca, que coloca o formando “frente
a frente”, enquanto desafio inerente, na medição de sua capacidade e conhecimento.
Esta etapa final vai muito além do que uma simples avaliação de conhecimento. Nela
conquistamos o reconhecimento, nos remetendo a capacidade de sermos efetivamente bons
profissionais, e competitivos para o mercado.
Este trabalho, portanto, resultou na obtenção, se não plena, mas em parte, uma
proximidade com o mercado de trabalho, no qual acredito que tenha na sua configuração final
e estruturação alcançado o objetivo deste trabalho.
Pode-se concluir que o estudo, enquanto forma de projeto ofereceu, sobretudo a
oportunidade de desenvolvermos atividades relacionadas a profissão e cujo embasamento
teórico e prático permitiu o alcance dos saberes fornecidos pela academia. Resultados este que
doravante estão expressos na pesquisa realizada, enquanto trabalho de conclusão de curso.
Anexo, apreseta-se algumas peças produzidas como difusor da logomarca e serviços
da Agência proposta.
99
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Referências
BORGES, Ademir R. E SOARES, Sérgio A. Manual dos Projetos Experimentais em
Publicidade e Propaganda. Belo Horizonte/MG: FCH-FUMEC, 2006.
FREITAS, Sidinéia Gomes e FRANÇA, Fábio. Manual da Qualidade em Projetos da
Comunicação. São Paulo: Ed. Saraiva, 1997.
JURAN, J. M. Juran na liderança pela qualidade, 2ª Ed. São Paulo: Pioneira,1993.
KLOTER, Philip; AMSTRONG, Gary. Princípios de Marketing, 7ª edição. Rio de Janeiro:
Ed. LTC, 1998.
MUNIZ, Magda Lúcia Valente. Mídia: Conceitos & Prática. Rio de Janeiro, Ed Rio, 2004.
YANAZE; Mitzuru Higuchi. Gestão de Comunicação e Marketing: Avanços e Aplicações.
São Paulo: Ed. Saraiva, 2007.
Site Consultado
http://www.hypermarcas.com.br/marcasProdutos/linha?id=15
Material Papelaria
Índice
Fig. 1 – Saco branco; Fig. 2 – Envelope meio ofício; Fig. 3 – Envelope ofício; Fig. 4 – Capa para fita; Fig. 5 – Capa para CD; Fig. 6 – Capa
para DVD; Fig. 7 – Impresso CD; Fig. 8 – Cartão Executivo; Fig. 9 – Cartão de Visita.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Avaliação do desenvolvimento motor em crianças e adolescentes
de ambos os gêneros com necessidades especiais
Autores
Julia Pedroso Ramalho Costa
Thais Müller Heringer
Curso de Licenciatura em Educação Física
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientador: Carlos Eduardo Brasil Neves
Resumo
O estudo teve como objetivo geral avaliar o desenvolvimento motor em crianças e
adolescentes com necessidades especiais de 4 a 17 anos de idade, de ambos os gêneros, de
uma escola especial de Nova Friburgo. A pesquisa foi caracterizada como descritiva do tipo
Status Study. Para a seleção da amostra, fez-se o uso da escolha por deficientes intelectuais.
Foram avaliados 35 voluntários, 15 do gênero feminino e 20 do gênero masculino. O
desempenho motor das crianças foi através da bateria de teste Körperkoordinationstest für
Kinder (KTK). De modo geral, os resultados do estudo revelaram que 34 voluntários (97,13%)
apresentaram níveis de desempenho motor abaixo da normalidade, independente da idade e do
gênero. No entanto, as meninas apresentaram níveis de desempenho motor inferiores ao dos
meninos. Com o estudo, foi concluído que os níveis de desempenho motor coordenado dos
meninos com deficiência intelectual são melhores do que os das meninas, porém, de modo
geral, a deficiência intelectual influencia negativamente nos níveis de desempenho motor das
crianças, enfatizando a necessidade das aulas de Educação Física em escolas especiais para
melhorar a coordenação e criar maiores oportunidades para a prática.
Palavras-Chave: Coordenação motora, deficientes, teste.
Introdução
O desenvolvimento motor é a sucessiva mudança no comportamento motor ao longo da
vida, favorecida pela comunicação entre as situações do ambiente, necessidades da tarefa e a
biologia do individuo. O desenvolvimento é um processo contínuo e seu estudo não foi
destacado no passado, por outros interesses que eram priorizados, como os processos
Doutor em Engenharia Biomédica COPPE/UFRJ – Professor da Universidade Estácio de Sá – Nova Friburgo.
E-mail [email protected]
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cognitivos e afetivos do desenvolvimento. No século XXI, o comportamento motor é tomado
como um termo abrangente que inclui áreas de estudos complementares, mas essencialmente
diferentes compreendidas pelo aprendizado e desenvolvimento motores. O desenvolvimento
motor é composto por três fases, sendo elas de estabilidade (ênfase no equilíbrio do corpo em
situações estáticas e dinâmicas), de locomoção (ênfase no transporte do corpo de um ponto a
outro) e manipulação (ênfase em colocar ou receber força de um objeto) (GALLAHUE;
OZMUN, 2005).
O desenvolvimento motor é dominado por duas abordagens, sendo elas a orientação ao
produto e a orientação ao processo. É possível que a abordagem orientada ao produto, seja
estendida de duas formas; na descrição de mudanças no desenvolvimento motor como, por
exemplo, ganho de velocidade de corrida, a distância que a bola é arremessada ou na descrição
de mudanças num dado comportamento ao longo do tempo, quando o importante neste, é o
que está mudando e quando está mudando. O desenvolvimento é considerado como um
sistema que abrange aperfeiçoamento, aquisição e emergência de habilidades e funções. Esse
conceito cresce a cada ano de acordo com as experiências vivenciadas e é predeterminada pela
nossa natureza humana (TANI, 2005).
De acordo com Haywood e Getchell (2004) nem toda mudança no movimento é
desenvolvimento. As atividades motoras são inerentes à vida da criança, que merece maior
compreensão e atenção ao ser observada para que aptidão e atitudes nessa idade sejam
comparadas a um padrão aceito.
A contínua alteração no comportamento ao longo da vida que acontece por meio das
necessidades de tarefa, da biologia do indivíduo e o ambiente em que vive é o
desenvolvimento motor. Ele é viabilizado tanto pelo processo evolutivo biológico quanto pelo
social. Desta forma, considera-se que uma evolução neural proporciona uma evolução ou
integração sensório-motora que acontece por meio do sistema nervoso central (SNC) em
operações cada vez mais complexas (FONSECA, 1998).
Segundo critérios de classificações internacionais, o início da deficiência intelectual
deve ocorrer antes dos 18 anos, caracterizando assim um transtorno do desenvolvimento e não
uma alteração cognitiva como é a demência. Embora o assunto comporte uma discussão mais
ampla, de modo acadêmico o funcionamento intelectual geral é definido pelo Quociente de
Inteligência (QI ou equivalente). A deficiência intelectual define-se como funcionamento
intelectual geral significativamente inferior à média, que interfere nas atividades adaptativas e
cognitivas (MANSUR; MARCON, 2006).
Crianças que apresentam necessidades especiais possuem déficit motor, ou paralisia
cerebral, ficando evidentes atrasos motores, quando comparados a crianças não portadoras de
necessidades especiais. Além de apresentarem maiores dificuldades na realização perfeita
relacionadas ao controle motor das mesmas (ROSA; MARQUES; PAPST; GOBBI, 2008).
Caso a lateralidade não seja definida, há grande probabilidade de futuros problemas de
aprendizagem (MANSUR; MARCON, 2006).
102
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Devido ao desenvolvimento motor de crianças com necessidades especiais serem
restrito, há uma diminuição no controle de movimentos voluntários, na coordenação e na
postura, que podem ser diagnosticados tardiamente ou ainda, na escassez de alguns padrões
motores maduros (ROSA; MARQUES; PAPST; GOBBI, 2008). Suas condutas motoras
consistem em um equilíbrio estático e coordenação dinâmica sempre perturbados. O andar da
criança apresenta-se de forma defeituosa, com pés afastados arrastando-se paralelamente em
busca de maior base de sustentação possível (PICO; VAYER, 1988). Na paralisia cerebral,
ocorre uma lesão no sistema nervoso central durante o desenvolvimento do mesmo, ou seja,
haverá sempre uma disfunção ocasionada pela lesão (MONTEIRO et al, 2010).
As crianças e adolescentes com deficiência cognitiva apresentam comumente
desempenho motor deficiente, seja em decorrência de disfunção cerebral, por sua capacidade
de prestar atenção ou sua capacidade para o desenvolvimento de conceitos abstratos se
encontra comprometido, ou porque não são capazes de adequar a intenção à ação e de
aprender as habilidades motoras ou motivação para explorar o ambiente. Com esses danos
causados nas pessoas com transtorno intelectual podem decorrer algumas limitações pessoais
profundas, como consciência de si limitada, senso de autodomínio reduzido e autoexpressão
restrita, esses prejuízos impactam com as funções físicas, sociais e psíquicas, porém podem ser
amenizados com acompanhamentos adequados (ROEDER, 2003). É possível afirmar que
crianças com retardo intelectual poderão ter o desenvolvimento e inteligência que se
aproximarão dos limites normais, porém, em ritmo mais lento (SHEPERD, 1996).
Ao longo dos anos escolares, são evidenciadas as insuficiencias motoras por um déficit
na precisão de movimentos, coordenação e da lentidão em relação ao corpo ou com
determinados objetos. Através do tamanho e forma de determinados objetos, a inteligência
sensório motora possíbilita a concepção mental do objeto permanente (GONZÁLEZ, 2007).
O produto e o processo do desenvolvimento motor são influenciados por diversos
fatores, inclusive deficiências intelectuais. No crescimento a continuação do retardo é
propriamente destruidora nos dois primeiros anos de vida. A maturação neuromotora é
demonstrada por meio de progressiva habilidade para diferenciar e integrar mecanismos
sensoriais e motores (GALLAHUE; OZMUN, 2002).
O termo débil mental é caracterizado pela sua natureza congênita, ou pelo menos
extremamente precoce. A demência é um déficit adquirido antes que a criança crie suas
primeiras ligações ideomotoras. Pode-se afirmar que a deficiência intelectual é classificada
pelos diferentes níveis de quociente intelectual (Q.I.), avaliado pelos diversos testes mentais.
Os retardos profundos dão-se por crianças com o Q.I. inferior a 0,30. As crianças débeis
propriamente ditas classificam-se pela debilidade profunda (Q.I. entre 0.30 e 0.50), a
debilidade média (Q.I. entre 0.50 e 0.65/0.70) e a debilidade leve (Q.I. superior a 0,65/0.70).
Quanto às debilidades médias e leves, independente da origem do retardo mental, são crianças
de aparência normal ou subnormal na maior parte do tempo. Já as crianças débeis profundas,
caracterizam-se distintamente a criança normal (PICO; VAYER, 1988).
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A Deficiência intelectual, independente de sua causa (indígena, exógena ou mista),
provoca uma carência intelectual (GONZÁLEZ, 2007). Os retardos intelectuais leves, na
aparência física e saúde geral, não são visivelmente diferentes das pessoas dadas normais.
Porém no estado do nível intelectual e vários índices do status orgânicos e da saúde, nota-se
diferenças, por possuírem um nível intelectual mais baixo. Sobre o retardo intelectual grave é
importante citar que é fisicamente desviante suas características das outras pessoas
(TELFORD; SAWREY, 1988).
É possível destacar que o índice de deficiência intelectual atinge 1% da população
jovem e 2 a 3% dos jovens e adultos. É importante ressaltar, que o uso da definição de
deficiente intelectual, está sendo questionado pela “American association of mental
retardation”, podendo ser classificado também por termos similares, como “inabilidade de
aprendizado” ou “inabilidade intelectual” difundidos respectivamente na Austrália e Japão
(MANSUR; MARCON, 2006).
A atividade física é sem duvida um fator que colabora no desenvolvimento motor das
crianças, tornando assim, uma criança mais habilidosa, com uma coordenação mais
desenvolvida (NAHAS, 2006). Uns dos pontos a serem destacados em relação aos benefícios
da educação física para crianças e adolescentes, são os fatos destas serem mais saudáveis, com
menor excesso de peso, uma melhora na capacidade cardiovascular da mesma, maior
densidade óssea, diminuição nos números de crises de asma, o processo de aterogenese, que
tende a aparecer no inicio da vida, dentre outros fatores (ALVES, 2003).
As vantagens da atividade física para o cérebro são a sensação de bem estar, melhora a
auto-estima, redução dos sintomas depressivos e ansiosos e melhora o controle do apetite.
Estes benefícios estão relacionados com a liberação de endorfina, uma substância que o
cérebro produz que dá aos indivíduos a sensação de prazer. O exercício reduz ainda a
ocorrências de gripes, resfriados e infecções respiratórias em geral. A atividade física estimula
a produção de alguns aminoácidos (componentes das proteínas) que melhoram a ação
protetora do sistema imunológico. A melhora na capacidade pulmonar vem acompanhada do
aumento da capacidade de consumo de oxigênio, já que o exercício aumenta a rede de
pequenos vasos que irrigam os alvéolos pulmonares (estruturas de troca de gases), melhorando
o aproveitamento de oxigênio pelo pulmão. Desse modo, a respiração fica mais eficiente
(MCARDLE; KATCH; KATCH, 2003).
Os estudos da fisiologia revelam que os exercícios físicos regulares podem modificar a
estrutura e o funcionamento orgânico em diversos aspectos. Nenhum outro estímulo pode
atuar direta ou indiretamente em tantos órgãos e sistemas – cardiovascular, muscular, ósseo,
endócrino e nervos. É possível afirmar que o movimento é essencial não apenas para pessoas
dotadas de desenvolvimento motor, mas todas as pessoas precisam movimentar-se para que
assim, mantenham-se vivas (NAHAS, 2006).
A atividade física é vista como um fator de reabilitação para pessoas com necessidades
especiais, pois reduz a monotonia e em alguns casos auxilia no desenvolvimento do equilíbrio
e da coordenação. A prática regular da atividade física acompanhada de um profissional
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
estimula a produção de endorfina (responsável pela sensação de bem-estar) e catecolamina
(responsável pelo combate a depressão) (DUARTE; LIMA, 2003).
É importante que pessoas com ou sem deficiência intelectual pratiquem atividades
físicas, pois as mesmas contribuem para o desenvolvimento global do indivíduo. O
desenvolvimento físico, emocional, mental e sua adaptação social, são na maioria das vezes
inegavelmente dependentes das possibilidades adquiridas de mover-se e descobrir-se, tanto
quanto o mundo que o cerca (SILVA; FERREIRA, 2001).
A Educação Física deve criar programas para todas as diferenças. Isto deve acontecer
pela necessidade que a pessoa necessita de criar, diversificar e ampliar sua bagagem motora
(SOLER, 2005).
Parte inerente a este trabalho é a avaliação, permitindo um grau de seriedade ao
tratamento. A avaliação do desenvolvimento motor é constante e global, realizada por uma
equipe. Quando o aluno é avaliado, significa que o profissional está tentando obter uma
resposta de seu aprendizado. A resposta é a medida do aluno. A avaliação propriamente dita é
a localização dessa resposta no consenso geral do trabalho. A análise inspeciona cada fato
dentro de sua veracidade, com a finalidade principal de atender os possíveis indicadores
negativos (ROSADAS, 1991).
O trabalho, portanto, tem como meta analisar crianças de diferentes deficiências
intelectuais, tendo como objetivo após tal avaliação, o comparativo de todas estas deficiências
em relação ao seu desenvolvimento motor, e o quão distante estão de crianças e jovens dentro
dos considerados padrões de normalidade.
Materiais e Métodos
Este estudo descritivo do tipo Status Study, foi realizado em uma instituição privada no
município de Nova Fribrugo para estudantes com necessidades especiais, onde aplicou-se os
testes em crianças com deficiências intelectuais diferenciadas. Para a aplicação do teste, foram
enviados um termo de consentimento livre e esclarecido e um questionário (anexo I) aos
responsáveis, objetivando a autorizar à participação dos alunos.
Participaram do estudo 35 crianças de 4 a 17 anos de idade, de ambos os gêneros, com
diferentes deficiências intelectuais. Os testes foram realizados por alunos do curso de
educação física da Universidade Estácio de Sá, campus Nova Friburgo/RJ. Os 35 voluntários
foram divididos em grupos para a realização do teste na instituição.
Na instituição visitada a equipe era formada por três alunos da graduação de Educação
Física com funções da aplicação dos testes e anotações dos resultados obtidos na pesquisa. As
avaliações foram realizadas por meio do Teste de Coordenação Corporal KTK (anexo III), que
utiliza uma bateria de testes envolvendo equilíbrio (figura 1), saltos monopedais (figura 2),
saltos laterais (figura 3) e transferência sobre plataformas (figura 4). Todos os testes foram
aplicados em uma sessão, onde o tempo de duração de aplicação dos testes, para cada criança,
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foi de aproximadamente 15 minutos. O KTK compreende tarefas para cada faixa etária entre 4
e 17 anos de idade. A complexidade da tarefa a ser realizada aumenta de acordo com o
aumento da idade.
Os participantes foram avaliados a partir do teste KTK e os valores anotados das
tentativas válidas. Em seguida somados os valores na horizontal, obtendo o valor bruto da
tarefa. Todos os dados foram anotados na ficha de coleta de dados (anexo IV) para que então
fosse realizada comparação entre os gêneros. Os resultados foram classificados de acordo com
as tabelas do teste (anexo V) e analisados por meio do coeficiente motor da tarefa obtida em
cada elemento da motricidade entre crianças portadoras de diferentes tipos de deficiência
intelectual e posteriormente, agrupados quanto ao gênero.
A tarefa mostrada na figura 1 consiste em durante toda a extensão da trave, com
medidas de 4,5cm de espessura e 3m de comprimento, o voluntário realizar a marcha para a
trás sobre a trave em três tentativas, tendo como meta a execução de oito passos.
FIGURA 1 – Tarefa 1 - Trave de equilíbrio.
106
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
No segundo teste aplicado (figura 2), são utilizados até 7 blocos de espuma variando
de acordo com a idade. Para realizar o salto, o voluntário toma uma distância de cerca de
1,50m de impulsão para que então possa pular os blocos de espuma com um dos pés. O
avaliado deverá realizar o primeiro salto com a perna de preferência e depois com a outra
perna.
FIGURA 2 – Tarefa 2 – Saltos monopedais.
Como pode ser visto na figura 3, nesta tarefa é utilizada uma plataforma de madeira
(compensado) de 60 x 50 x 0,8 cm com sarrafo divisório de 60 x 4 x 2 cm e um cronômetro.
A tarefa consiste em saltos de um lado para o outro do sarrafo ininterruptamente o mais rápido
possível, ou seja, contabilizando o maior número possível de saltos durante 15 segundos em
duas tentativas.
FIGURA 3 – Tarefa 3 – Saltos laterais.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Para a execução da tarefa 4 (figura 4), são utilizadas duas plataformas de madeira de
25 x 1,5 cm e um cronômetro. O indivíduo posiciona-se sobre uma delas e deve passar para a
outra posicionada ao lado, pegar a primeira, colocá-la do outro lado e assim sucessivamente
durante 20 segundos o mais rápido possível em duas tentativas.
FIGURA 4 – Tarefa 4 – Transferência sobre plataformas.
Os dados coletados foram analisado utilizando estatística descritiva.
Análise e Discussão dos Resultados
Os 35 voluntários avaliados apresentavam idade de 11±3 anos, sendo 20 meninos
(57,1%) e 15 meninas (42,9%), todos portadores de necessidades especiais, como mostrado na
tabela 1.
TABELA 1 – Necessidades especiais dos voluntários.
Deficiência
Autismo
Atraso cognitivo
Atraso
no
desenvolvimento
psicomotor
Atraso na fala e
linguagem e fenda
palatina
Deficiência
intelectual
Dificuldade
Geral (n=35)
Fabs
Frel
2
5,7%
2
5,7%
5
14,3%
Meninos (n=20)
Fabs
Frel
2
10%
2
10%
3
15%
Meninas (n=15)
Fabs
Frel
0
0%
0
0%
2
13,3%
2
5,6%
1
5%
1
6,7%
9
25,7%
3
15%
6
40%
2,8%
1
5%
0
0%
de 1
108
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aprendizagem
Microcefalia
Multismo seletivo
Paralisia cerebral
Síndrome de down
TDAH e dislalia
Transtorno
de
aprendizagem
e
comportamento
1
1
1
5
1
5
2,8%
2,8%
2,8%
14,3%
2,8%
14,2%
0
1
1
4
1
1
0%
5%
5%
20%
5%
5%
1
0
0
1
0
4
6,7%
0%
0%
6,7%
0%
26,7%
Dentro do ambiente escolar, 33 alunos (94,3%) participam das aulas de educação física
que são compostas por judô e capoeira. As aulas tem duração de 50 minutos com a freqüência
de 2 vezes por semana. Do número total de voluntários, apenas 2 alunos (5,7%) não praticam
nenhum tipo de atividade física na grade curricular, os quais são autistas. Nenhum dos
voluntários pratica atividade física fora do ambiente escolar.
Gorla (2004) cita diversos autores que aplicaram o teste KTK. Um deles, após a
aplicação do questionário e do teste pôde concluir que o programa de atividades motoras
sistematizadas, contribui para um avanço das condições básicas necessárias na preparação
inicial do deficiente intelectual para a sua formação.
Dentro do quadro geral de deficiências, de acordo com o somatório dos QMs obtidos
pelos 15 (quinze) voluntários do gênero feminino, 3 (três) apresentaram perturbação na
coordenação. Quanto aos demais (doze voluntários), todos apresentaram insuficiência na
coordenação como pôde ser observado na tabela 2.
TABELA 2 – Deficiência, escore obtido nos testes e classificação por gênero – feminino.
Voluntário
Voluntário 1
Voluntário 2
Voluntário 3
Voluntário 4
Voluntário 5
Voluntário 6
Voluntário 7
Voluntário 8
Voluntário 9
Voluntário 10
Voluntário 11
Voluntário 12
Voluntário 13
Voluntário 14
Voluntário 15
Deficiência
Atraso na fala e linguagem e fenda
palatina
Microcefalia
Atraso no desenvolvimento psicomotor
Deficiência intelectual
Atraso no desenvolvimento psicomotor
Deficiência intelectual
Transtorno
de
aprendizagem
e
comportamento
Transtorno
de
aprendizagem
e
comportamento
Transtorno
aprendizagem
e
comportamento
Transtorno
de
aprendizagem
e
comportamento
Deficiência intelectual
Deficiência intelectual
Deficiência intelectual
Deficiência intelectual
Síndrome de Down
Escore
79
Classificação
Perturbações na coordenação
65
80
58
74
57
52
Insuficiência de coordenação
Perturbações na coordenação
Insuficiência de coordenação
Perturbações na coordenação
Insuficiência de coordenação
Insuficiência de coordenação
42
Insuficiência de coordenação
53
Insuficiência de coordenação
51
Insuficiência de coordenação
42
62
69
47
47
Insuficiência de coordenação
Insuficiência de coordenação
Insuficiência de coordenação
Insuficiência de coordenação
Insuficiência de coordenação
109
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Segundo Gorla (2004), após a aplicação do teste KTK aos voluntários com deficiência
intelectual, alguns autores evidenciaram a partir de seus estudos, a revelação do predomínio de
classificação normal.
TABELA 3 – Deficiência, escore obtido nos testes e classificação por gênero – masculino.
Voluntário
Voluntário 1
Deficiência
Atraso na fala e linguagem e fenda palatina
Escore
80
Classificação
Perturbações na coordenação
Voluntário 2
Atraso cognitivo
75
Perturbações na coordenação
Voluntário 3
Atraso no desenvolvimento psicomotor
96
Normal
Voluntário 4
Atraso no desenvolvimento psicomotor
79
Perturbações na coordenação
Voluntário 5
Mutismo seletivo
82
Perturbações na coordenação
Voluntário 6
TDAH e dislalia
67
Insuficiência de coordenação
Voluntário 7
Paralisia cerebral
58
Insuficiência de coordenação
Voluntário 8
65
Insuficiência de coordenação
Voluntário 9
Deficiência Intelectual
Dificuldade de aprendizagem
61
Insuficiência de coordenação
Voluntário 10
Atraso no desenvolvimento psicomotor
80
Perturbações na coordenação
Voluntário 11
Transtorno aprendizagem/comportamento
76
Perturbações na coordenação
Voluntário 12
Síndrome de Down
46
Insuficiência de coordenação
Voluntário 13
Síndrome de Down
53
Insuficiência de coordenação
Voluntário 14
Deficiência intelectual
54
Insuficiência de coordenação
Voluntário 15
Deficiência intelectual
57
Insuficiência de coordenação
Voluntário 16
Autismo
49
Insuficiência de coordenação
Voluntário 17
Síndrome de Down
43
Insuficiência de coordenação
Voluntário 18
Síndrome de Down
49
Insuficiência de coordenação
Voluntário 19
Autismo
42
Insuficiência de coordenação
Voluntário 20
Atraso cognitivo
49
Insuficiência de coordenação
Dentro do quadro geral de deficiências (tabela 3), de acordo com o somatório dos QMs
dos 20 (vinte) voluntários do gênero masculino, 13 (treze) apresentaram insuficiência na
coordenação, 6 (seis) perturbação na coordenação e 1 (um) coordenação motora normal de
acordo com a classificação do teste KTK quanto a coordenação.
110
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
No caso dos voluntários do gênero feminino, 12 (doze) apresentaram insuficiência
coordenativa e 3 (três) perturbação da coordenação. Destas, nenhuma apresentou coordenação
considerada normal de acordo com a classificação dos testes
De acordo com as deficiências, englobando ambos os gêneros, foi possível perceber
que a mesma deficiência apresentou resultados variados, como no caso de 1 (um) voluntário
do gênero masculino que possui atraso no desenvolvimento psicomotor que foi classificado
com a coordenação normal, quando os outros 4 (quatro) portadores desta mesma deficiência
apresentaram perturbação na coordenação.
Também no caso do atraso cognitivo foi possível obter 2 (dois) resultados diferentes
numa mesma deficiência. Foram aplicados os testes com 2 (dois) voluntários com atraso
cognitivo e o voluntário 2 como pode ser observado na tabela 3 apresentou perturbação na
coordenação e o voluntário 20 também do gênero masculino apresentou insuficiência na
mesma.
Com exceção destes dois casos da mesma deficiência com resultados diferentes, os
demais voluntários portadores da mesma deficiência apresentaram o mesmo resultado. No
caso da síndrome de Down (5 voluntários), todos os voluntários apresentaram insuficiência
coordenativa. Os 2 (dois) voluntários autistas foram avaliados e ambos obtiveram insuficiência
coordenativa como resultado. Também no caso dos 9 (nove) voluntários portadores de
deficiência intelectual, obteve-se em todos insuficiência coordenativa. Foram avaliados 2
(dois) voluntários de atraso na fala e linguagem e fenda palatina e todos estes apresentaram
perturbação na coordenação.
Quanto as demais deficiências ainda não citadas, houve a participação de apenas um
voluntário portador de cada uma destas. Portanto não foi possível fazer o comparativo dentro
da mesma deficiência dos resultados, porém os portadores de TDAH + dislalia, paralisia
cerebral, microcefalia e dificuldade de aprendizagem, apresentaram insuficiência
coordenativa. Quanto ao voluntário portador de mutismo seletivo apresentou perturbação na
coordenação.
Como pôde ser observado, o comportamento de pessoas com deficiência intelectual é
afetado pela insuficiência de coordenação entre comandos eferentes e aferentes, sendo assim,
estas pessoas apresentam maior dificuldade na realização das atividades visando a avaliação
do comportamento motor das mesmas. (MANSUR; MARCON, 2006)
Quanto à paralisia cerebral, comprometido por lesões ocorridas no sistema nervoso
central, algumas alterações motoras são geradas, tornando assim o movimento voluntário
descoordenado. (SOUZA; et al, 2010.
111
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
TABELA 4 - Percentual do nível de coordenação por gênero e total de acordo com o resultado original da bateria
KTK.
Nível
1
2
3
4
5
Meninos
Meninas
Total
5%
65%
30%
80%
20%
2,85%
71,42%
25,71%
Nível 1 – Muito boa coordenação
Nível 2 – Boa coordenação
Nível 3 – Coordenação normal
Nível 4 – Insuficiência coordenativa
Nível 5 – Perturbação da coordenação
É possível observar na tabela 4, que apenas os meninos apresentaram algum resultado
normal referente a coordenação, entretanto, estes apresentaram um número mais alto de
perturbação da mesma. A tabela mostra também que as meninas têm um índice de
insuficiência coordenativa significativamente mais alto que a dos meninos.
TABELA 5 – Teste 1 - (Trave de equilibrio) - Média, desvio padrão, mínimo e máximo dos QMs.
M±dp
Mín-Máx
Meninos
49,8 ± 12,89
27 – 73
Meninas
46,73 ± 10,38
27 - 67
No teste da trave de equilíbrio (tabela 5), pode-se observar que a média referente ao
gênero masculino foi superior quando comparado ao do gênero feminino. O QM mínimo
apresentou o mesmo resultado entre os gêneros e os meninos, obtiveram o QM máximo
superior ao das meninas.
TABELA 6 – Teste 2 - (Saltos monopedais) - Média, desvio padrão, mínimo e máximo dos QMs.
M±dp
Mín-Máx
Meninos
39,3 ± 21,5
10 – 77
Meninas
31,8 ± 17,41
11 – 70
No segundo teste aplicado aos voluntários, nota-se que a média dos meninos foi
superior ao das meninas (tabela 6), destacando também que o desvio padrão destes foi bastante
elevado. O menor e o maior QM apresentados foram do gênero masculino.
112
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
TABELA 7 – Teste 3 - (Saltos laterais) - Média, desvio padrão, mínimo e máximo dos QMs.
M±dp
Mín-Máx
Meninos
49,0 ± 19,6
16 – 87
Meninas
37,9 ± 18,2
6 – 70
No teste dos saltos laterais (tabela 7), o QM mínimo e máximo apresentado pelos
meninos mostrou discrepância em relação ao das meninas. O QM médio dos meninos, mais
uma vez, mostrou-se superior ao das meninas.
TABELA 8 – Teste 4 - (Transferência sobre plataformas) - Média, desvio padrão, mínimo e máximo dos QMs.
M±dp
Mín-Máx
Meninos
43,25 ± 15,0
26 – 81
Meninas
45,6 ± 15,0
18 – 71
Observa-se na tabela 8 (transferência sobre plataformas) que, diferente dos testes
anteriores, os meninos obtiveram uma média inferior ao das meninas. Ainda assim, nos QMs
mínimo e máximo, os voluntários do gênero masculino apresentaram números superiores ao
do gênero feminino.
TABELA 9 – Média dos QMs de todos os testes por gênero.
Média dos QMs
Meninos
181,35
Meninas
162,03
Nota-se na tabela 9 que os meninos apresentaram uma média de QM maior que das
meninas, apresentando a diferença de 19,32 entre eles.
Segundo os resultados do teste KTK aplicado por Gorla (2004) aos deficientes
intelectuais, mostrou que os voluntários do gênero masculino apresentaram capacidade
superior de coordenação quando comparado ao gênero feminino.
113
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
GRÁFICO 1 – Classificação dos voluntários quanto a coordenação por deficiência.
Como apresentado no gráfico 1, os níveis de desenvolvimento encontrados no presente
estudo, revelaram que a maioria dos voluntários, independente da idade e do gênero
encontram-se com a coordenação motora abaixo dos níveis de normalidade, o que pode ser
justificado pela deficiência intelectual.
Comparado aos estudos de Gorla (2004), também foi possível observar que assim
como o presente estudo, a generalidade dos sujeitos de ambos os gêneros e faixas etárias se
situam no intervalo de insuficiência coordenativa e perturbação de coordenação. Já quanto aos
resultados referentes a classificação superior a perturbação e insuficiência coordenativa, Gorla
(2004) constatou que todos os meninos com faixa etária de oito anos possuem coordenação
normal quando no presente estudo apenas um voluntário do gênero masculino, com atraso no
desenvolvimento psicomotor apresentou coordenação normal.
Considerações Finais
Os níveis de desenvolvimento encontrados no estudo revelaram que a maioria dos
voluntários, independente da idade e do gênero, se encontra com a coordenação motora abaixo
da normalidade, o que pode ser justificado pelo nível de deficiência intelectual das crianças
analisadas.
Observando o percentual dos estágios de coordenação, nenhum dos voluntários possui
muito boa ou boa coordenação motora e apenas um voluntário apresentou normalidade na
114
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
mesma. Cerca de ¼ (um quarto) do total apresentou perturbação da coordenação, e a maioria
insuficiência coordenativa.
De acordo com o resultado dos testes da trave, saltos monopedais e saltos laterais, os
meninos apresentaram a média superior a das meninas. Apenas no teste de transferência sobre
plataformas as meninas apresentaram maior facilidade na execução e obtiveram a média maior
que a dos meninos.
Portanto, de acordo com a soma das médias de todos os testes, os voluntários do
gênero masculino obtiveram melhor desempenho tanto qualitativamente quanto
quantitativamente, tendo assim um resultado menos distante da normalidade indicada pelo
teste. Já as meninas apresentaram maior dificuldade na execução das tarefas, evidenciando
assim que as voluntárias do gênero feminino possuem a coordenação motora mais defasada
que dos meninos.
Sendo assim, embora no geral, os portadores de deficiência tenham apresentado um
resultado abaixo do desejável, a prática de atividade física contribui para a melhora da
coordenação como pôde ser observado quando comparado aos alunos deficientes que não
praticam nenhum tipo de atividade física e apresentaram incapacidade na execução dos testes
propostos. Os resultados obtidos no estudo tiveram o propósito de estabelecer um referencial
capaz de possibilitar auxilio em futuras análises.
Referências
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DUARTE, E.; LIMA, S. M. T. Atividade física para pessoas com necessidades especiais:
experiências e intervenções pedagógicas. Editora Guanabara Koogan; 2003.
FLINCHUM, B. M. Desenvolvimento motor das crianças. Editora Interamericana; 1981.
FONSECA, V. Psicomotricidade: filogênese, ontogênese e retrogênese. 2ª ed. Editora
Artmed; 1998.
GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. Compreendendo o Desenvolvimento Motor: Bebês,
Crianças, Adolescentes e Adultos. 3ª ed. Editora Phorte; 2005.
GONZALEZ, E. Necessidades educacionais específicas (intervenção psicoeducacional).
Editora Artmed; 2007.
GORLA, J. I. Desenvolvimento de equações generalizadas para estimativa da coordenação
motora em crianças e adolescentes portadores de deficiência mental. Revista Conexões, v.2,
n.2, p.19 à 150, 2004.
HAYWOOD, K. M.; GETCHELL, W. Desenvolvimento motor ao longo da vida. Editora
Artmed; 2004.
MANSUR, S.S; MARCON, A.J. Perfil motor de crianças e adolescentes com deficiência
mental moderada. Revista Brasileira do Crescimento e Desenvolvimento Humano, v.16,
n.3, p.9 à 15, 2006.
MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: energia, nutrição
e desempenho humano. Editora Guanabara Koogan; 2003.
115
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
MONTEIRO, C. ; JAKABI, C. M. ; PALMA, G. C. S. ; TORRIANI-PASIN, C. ; MEIRA JR.,
C. M. Aprendizagem motora em crianças com paralisia cerebral. Revista Brasileira de
Educação Especial, v.14, n.2, p. 69 à 75, 2008.
NAHAS, M. K. Atividade física, saúde e qualidade de vida. Editora Londrina; 2006.
PICO, L.; VAYER, P. Educação psicomotora e retardo mental: Aplicação aos diferentes
tipos de inadaptação. 4ª ed. Editora Manole; 1988.
ROEDER, M. A. Atividade física, saúde mental e qualidade de vida. Editora Shape; 2003.
ROSA, G. K. B; MARQUES, I; PAPST, J. M; GOBBI, L. T. B. Desenvolvimento motor de
criança com paralisia cerebral: avaliação e intervenção. Revista Brasileira de Educação
Especial, v.14, n.2, p.163 à 176, 2008.
ROSADAS, S. C. Educação Física especial para deficientes. Editora Atheneu; 1991.
SHEPERD, R. B. Fisioterapia em Pediatria. 3ª Ed. Editora Santos; 1996.
SILVA, D. R.; FERREIRA, J. S. Intervenções na Educação Física em crianças com
Síndrome de Down. Editora Maringá; 2001.
SOLER, R. Educação Física Inclusiva na Escola: em busca de uma escola plural. Editora
Sprint; 2005.
SOUZA, K. E. S.; SANKAKO, A. N.; CARVALHO, S. M. R.; BRACCIALLI, L. M. P.
Classificação do grau de comprometimento motor e do índice de massa corpórea em crianças
com paralisia cerebral. Revista Brasileira do crescimento e desenvolvimento humano, v.
21, n. 1, p.12, 2011.
TANI, G. Comportamento Motor – Aprendizagem e desenvolvimento. Editora Guanabara
Koogan; 2005.
TELFORD, C. W.; SAWREY, J. M. O indivíduo excepicional. Editora LTC; 1988.
ANEXO l
Questionário
Nome: _______________________________________________
Gênero: ______________________________________________
Data de nascimento: ____________________________________
Pratica atividade física dentro da grade escolar? ( ) Sim ( ) Não
Tipo: ________________________________________________
Duração: _____________________________________________
Dias da semana: _______________________________________
Pratica atividade física fora da ambiente escolar? ( ) Sim ( ) Não
Tipo: ________________________________________________
Duração: _____________________________________________
Dias da semana: _______________________________________
Qual tipo de deficiência possui? ___________________________
Se deficiência mental, qual o tipo? ________________________
116
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
A Educação Física na Educação Infantil em
Escolas Particulares do Município de Nova Friburgo.
Autores
Julia Pedroso Ramalho Costa
Roberta Silveira Lengruber1
Curso de Licenciatura em Educação Física
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientador: Carlos Eduardo Brasil Neves
Resumo
O trabalho na área da Educação Física escolar baseou-se por muito tempo em concepções de
corpo e movimento, mas atualmente busca que se considerem também, as dimensões culturais,
sociais e afetivas. A investigação buscou analisar a realidade da Educação Física na Educação
Infantil das escolas particulares de Nova Friburgo, bem como, conhecer o perfil dos
professores atuantes, e observar a perspectiva de Educação Física adotada quanto a concepção
de corpo, visto ser esse tema importante para a Educação, reconhecendo assim, a participação
da Educação Física no desenvolvimento infantil. Para a coleta de dados foi utilizado um
questionário com dez perguntas fechadas aplicado a vinte professores que lecionam neste
segmento e, para a análise das aulas foi elaborado uma ficha de avaliação com dez critérios
didáticos. Os resultados mostraram que 75% das aulas observadas estavam com o conteúdo de
acordo com o Referencial Curricular, mas em 25% das mesmas não houve muita
diversificação do conteúdo, ou seja, ainda não está satisfatória. Os professores atuam com
profissionalismo mantendo um bom relacionamento com os alunos, em cerca de 70% das
aulas e priorizam a concepção do corpo sujeito, ou seja, defendem a ludicidade e a
participação, visto que 70% dos professores dão atenção aos alunos preocupando-se com os
aspectos emocionais da aprendizagem, mas encontram alguns empecilhos que prejudicam na
qualidade de seu trabalho como espaço físico e recursos materiais inadequados.
Palavras-Chave: Educação Física - Educação Infantil – Corporeidade
Doutor em Engenharia Biomédica COPPE/UFRJ – Professor da Universidade Estácio de Sá – Nova Friburgo.
E-mail [email protected]
117
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Introdução
A Educação Física foi introduzida na escola oficialmente no Brasil, em 1851 com a
Reforma Couto Ferraz, havendo mais tarde, uma recomendação feita por Rui Barbosa para
que a sua prática fosse obrigatória para ambos os sexos e que fosse oferecida para escolas
normais, porém a implantação destas leis ocorreu em parte e somente em 1920 ficou
conhecida com o nome mais frequente de “Ginástica”. Várias concepções surgiram para
caracterizar a Educação Física como “Higienismo” e “Militarismo” onde a preocupação
central é com hábitos saudáveis e valorização do desenvolvimento físico a partir do exercício.
A concepção “Esportivista” marcada pela prática do esporte tecnicista e a concepção
“Recreacionista” onde os alunos escolhem o jogo, a forma de praticá-lo e o papel do professor
passa a ser restrito. “Dentre essas concepções surgiram outras a fim de romper com o modelo
tradicional que foram a “Humanista”, “Fenomenológica”, “Psicomotricidade”, “Cultural”,
“Desenvolvimentista”,
“Interacionista-Construtivista”,“Crítico-Superadora”,
Sistêmica”,
“Crítico - Emancipatória”, “Saúde Renovada”, além de outras (DARIDO, RANGEL, 2005).
Neste sentido, o trabalho na área da Educação Física baseou-se por muito tempo em
concepções de corpo e movimento, mas atualmente a análise crítica e a busca de superação
dessas concepções apontam que são necessários que se considerem também, as dimensões
culturais, sociais, políticas e afetivas, presentes no corpo vivo que interage e se movimenta
como sujeito social e como cidadão. Levando em conta essa compreensão, a Secretaria de
Educação Fundamental propôs na carta de apresentação dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN‟S) que o trabalho de Educação Física nas séries iniciais é importante, pois
possibilita aos alunos terem desde cedo, a oportunidade de desenvolver habilidades corporais e
de participar de variadas atividades culturais, ou seja, a proposta entende a Educação Física
como cultura corporal (BRASIL, 1997).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9.394/96) estabelece que a
Educação Básica compreenda três níveis de ensino: a Educação Infantil, o Ensino
Fundamental e o Ensino Médio, e, segundo o 26° artigo do capítulo II da Primeira Seção - Das
Disposições Gerais, estabelece que a Educação Física seja componente curricular da Educação
Básica de acordo com as faixas etárias e condições populacionais escolares (BRASIL, 1997).
Ainda levando em conta a LDBEN, na segunda Seção- das disposições Gerais- o 29°
artigo diz que “A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o
desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico,
psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”.
De acordo com o Referencial Curricular Nacional, as características da Educação
Física na Educação Infantil que é o foco desta pesquisa são: respeito a dignidade e aos direitos
das crianças, consideradas nas suas diferenças individuais, sociais, econômicas, culturais,
étnicas e religiosas; o direito das crianças a brincar; a socialização por meio de sua
participação e inserção nas mais diversificadas práticas sociais (BRASIL, 1998).
118
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Oliveira (2005), em uma reportagem para a Revista E.F. destinada a campanha de 1°
de Setembro do Ministério do Esporte em parceria com o Conselho Federal de Educação
Física (CONFEF) dissertou sobre o analfabetismo motor que ameaça as crianças. Em linhas
gerais falou sobre o mundo moderno que tem proporcionado cada vez mais esse analfabetismo
ao reduzir o tempo livre das crianças e as opções de atividades lúdicas. A Educação Física é
componente curricular para o Ensino Básico, porém, a carga horária é dependente do projeto
pedagógico de cada escola e se for depender do interesse dos governantes o domínio motor
não interessa, e, diante desta constatação o autor levanta a seguinte pergunta: “como trabalhar
o cérebro e negar o corpo?”, concluindo esta fala, expõe que somos unos, e, portanto devemos
considerar nossas formações também em seu todo.
No campo do desenvolvimento cognitivo e motor, Piaget (1978) citado por Freire
(2006), aponta as etapas do desenvolvimento da criança marcada por quatro períodos:
Sensório-Motor (0 a 2 anos) que vai do nascimento até o surgimento da linguagem
compreendendo três estágios: “o dos reflexos, o da organização das percepções e hábitos e o
da inteligência propriamente dita”. Logo depois vem o período Pré-Operatório, período da
inteligência intuitiva- (2 a 7 anos) que marca o momento que aparece a função simbólica, o
gosto pelo jogo de imaginação, relação entre passado e futuro, interiorização da ação como
comportamento a ser repetido e este período compreende as crianças da educação infantil.
Depois apresenta o período Operatório-Concreto (7 a 11) marcado pelo início da cooperação e
do raciocínio lógico e a seguir o período Operatório- formal (mais de 12 anos) período da
inteligência abstrata onde já é o possível uma generalização, elaboração de hipóteses e
estratégias para testá-las, onde acontece também a formação da personalidade.
Ao descrever a fase denominada pré-escolar, de dois a sete anos de idade, Gallahue e
Ozmun (2001) apresentam três estágios de desenvolvimento motor numa perspectiva
biológica, sendo denominado como fase dos movimentos fundamentais: estágio inicial, (2 a 3
anos): o movimento da criança é caracterizado por uma sequência imprópria, uso marcado ou
restrito do corpo, com coordenação rítmica pobre; estágio elementar, (4 a 5 anos ): já envolve
maior controle, melhor coordenação rítmica dos movimentos fundamentais; estágio maduro,
(6 a 7 anos): caracterizado pela eficiência mecânica, coordenação.
No campo do desenvolvimento sociocultural, Vigotski (1984) citado por Guimarães
(2008), apresenta a relação entre corpo e mente, compreendendo que as construções
socioculturais transformam o suporte biológico através das relações sociais, valorizando o que
as crianças podem descobrir e como podem crescer.
Wallon (1947) citado por Santos (2008) considera, por sua vez, o desenvolvimento
social e afetivo ao levar o corpo da criança para sala de aula acompanhado de suas emoções,
considerando, desta forma quatro elementos: a afetividade, o movimento, a inteligência e a
formação do eu como pessoa.
119
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Freire (2006) complementa a ideia de Wallon ao dizer que:
corpo e mente devem ser entendidos como componentes que integram um único
organismo. Ambos devem ter assento na escola, não um (a mente) para aprender e
outro (o corpo) para transportar, mas ambos para se emancipar [...]. Sugiro que,a cada
início de ano letivo, por ocasião das matrículas, também o corpo das crianças seja
matriculado.
Quando as crianças ingressam na escola elas já possuem uma série de conhecimentos
sobre o movimento e o corpo neste âmbito da cultura corporal, frutos de experiências pessoais
vivenciadas dentro do grupo social em que estão inseridas e possuem a necessidade de se
movimentar. Cabe à escola trabalhar a partir desse repertório cultural garantido o acesso a
novas experiências. Neste sentido a Educação Física passa a desempenhar um papel muito
grande neste contexto, pois a aula de Educação Física, é muitas vezes, a única situação em que
têm essa oportunidade (BRASIL, 1997).
Partindo de uma reflexão acerca do fenômeno corporeidade nas aulas de Educação
Física escolar, Moreira (1995), apresenta duas concepções de corpo que estão ligadas as
formas pelas quais o profissional observa e conhece o seu aluno: o “corpo – sujeito” e o
“corpo – objeto” e através do “olhar – conhecer” é que se diferenciam estas duas concepções,
ou seja, se o olhar for racional, a busca da interpretação será através do comparar, do medir,
do analisar, do enquadrar em um padrão, caracterizando neste sentido um corpo – objeto, mas
se o olhar for à busca da expressão, do desejo, dos sentimentos, caracteriza o corpo- sujeito.
Dessa forma o autor expõe a seguinte reflexão acerca da prática pedagógica do
profissional de Educação Física:
Respeitar o corpo presente - pressente é trabalhar o dia-a-dia da educação motora no
interior da escola, dando oportunidade ao aluno para refletir sobre seu corpo, sobre a
relação de seu corpo com outros corpos e com o meio ambiente; é favorecer o
surgimento de uma cultura corporal, na qual se tem respeitadas e analisadas as
questões das necessidades e dos desejos do corpo que é e que intui; é assumir uma
postura profissional em defesa do lúdico, do prazer, da participação, como atributos
sempre presentes no nosso fazer pedagógico.
Em relação à estrutura didática das aulas de Educação Física visando a Educação
Infantil, temos: Planejamento; Objetivos de Ensino; Conteúdos; Recursos Materiais e
Avaliação do Ensino-Aprendizagem.
Piletti (1995) e Libâneo (1994) indicam que o planejamento é importante
principalmente para a realização de um ensino de qualidade que evite a improvisação e a
rotina, garantia de maior segurança na direção do ensino e a facilitação na preparação de aulas.
Piletti (1995) também apresenta uma definição direta sobre os objetivos que consistem
em uma descrição clara dos resultados que os alunos devem atingir, por meio da prática
pedagógica planejada e executada pelo professor.
120
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
De acordo com o Referencial Curricular Nacional, os objetivos gerais da Educação
Física na Educação Infantil são: desenvolver na criança uma imagem positiva de si, descobrir
e conhecer seu próprio corpo, estabelecer vínculos afetivos e relações sociais, fortalecer a
autoestima, explorar o ambiente, expressar emoções, utilizar as diferentes linguagens corporal, musical, oral, e escrita-, aprender em situações orientadas, resolver problemas
(BRASIL, 1998).
Segundo Darido (2001) os conteúdos de ensino nada mais são do que uma seleção de
formas ou saberes culturais, cuja assimilação é considerada essencial para que se produza um
desenvolvimento e uma socialização adequada do aluno.
Os conteúdos são abordados em dimensões como as conceituais que dizem respeito ao
conhecimento de conceitos, fatos e princípios; as procedimentais que se referem ao “saber
fazer” e as atitudinais que estão associadas a valores, atitudes e normas. Desta forma, segundo
o Referencial Curricular Nacional é dado ênfase aos seguintes conteúdos na Educação Infantil:
participação em diversos jogos, lutas; explicação e demonstração de brincadeiras aprendidas
em contextos extra-escolares; resolução de situações de conflito por meio do diálogo, com a
ajuda do professor; utilização de habilidades (correr, saltar, arremessar, rolar, bater, receber,
chutar) em situações de jogos, lutas, brincadeiras e danças tendo como referência de avaliação
o esforço pessoal; resolução de problemas corporais individualmente; Participação e criação
de brincadeiras cantadas e participação em atividades rítmicas e expressivas.
Segundo Xavier (1986) os recursos materiais de ensino em Educação Física escolar
podem ser classificados em cinco categorias, dentre elas, se encontram recursos materiais da
escola (espaço físico para a prática, materiais disponíveis como: bolas, cones, cordas, redes);
recursos instrumentais do professor (apito, planilha, livros didáticos) e dos alunos (roupas
adequadas) que serão necessários para a prática.
De acordo com Brasil (1997), avaliação na educação infantil é feita através do
acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo
para o acesso ao ensino fundamental.
Portanto, baseando-se nesta fundamentação teórica, a respeito da Educação Física
Escolar surgiram os objetivos desta investigação: analisar as aulas de Educação Física na
Educação Infantil de escolas particulares de Nova Friburgo para verificar se estão de acordo
com a proposta do Referencial Curricular Nacional; Conhecer o perfil dos professores atuantes
neste segmento de ensino e suas práticas pedagógicas e observar a perspectiva de Educação
Física adotada pelo professor quanto à concepção de corpo. As hipóteses são: de que a maioria
dos voluntários desta pesquisa que trabalham na Educação Infantil sejam formados em
Educação Física devido a escolha pelo setor privado de ensino onde existe a questão dos
diferenciais dentro do mercado de trabalho e que por conta disso também, estes seguem o
Referencial Curricular. Quanto à concepção de corpo, almejamos que os voluntários
demonstrem adotar a ideia do corpo- sujeito, uma vez que, nos últimos anos vem se discutindo
muito sobre as novas concepções da Educação Física. Justificamos a realização desta
investigação, considerando que a mesma possa colaborar para uma melhor compreensão da
121
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
proposta da Educação Física para a Educação Infantil, e consequentemente também
influenciar na melhoria da qualidade do ensino desta disciplina para este segmento.
Materiais e Métodos
2.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
A pesquisa caracterizou-se como sendo descritiva do tipo levantamento, que segundo
Lobato (1997) é um tipo de pesquisa que expõe e descreve as características de uma
determinada população sobre um determinado objeto de estudo. O estudo de campo utilizado
para o levantamento e análise dos dados foi do tipo quantitativo e qualitativo.
2.2 POPULAÇÃO E AMOSTRA
A população do estudo foi constituída por indivíduos graduados em Educação Física e
indivíduos com formação de professores que atuam lecionando na Educação Infantil na cidade
de Nova Friburgo, RJ
Vinte professores de cinco escolas privadas que atuam na Educação Infantil na cidade
de Nova Friburgo-RJ foram selecionados por conveniência para constituírem a amostra da
pesquisa.
Para a coleta de dados foram utilizados alguns critérios de inclusão e exclusão. Para a
inclusão: professores graduados em Educação Física com registro no Conselho Regional de
Educação Física (CREF ou MEC) ou professores que tenham o curso de formação de
professores e que lecionam na Educação Infantil. Para a inclusão das escolas: rede particular
de ensino. Para a exclusão, professores e escolas que não se enquadram nos critérios
apresentados acima.
2.3 INSTRUMENTO DE PESQUISA
O instrumento de pesquisa utilizado em nosso estudo foi o questionário, o qual consiste
em um meio de levantamento de dados por escrito, onde os sujeitos pesquisados fornecem
informações através de respostas para questões estabelecidas.
O questionário (anexo 01) foi constituído por dez perguntas, sendo classificadas como
questões fechadas, aplicado aos professores, e, para a análise das aulas foi elaborado uma
ficha de avaliação (anexo 03) com dez critérios didáticos baseados no Referencial Curricular
Nacional para a Educação Física Infantil (BRASIL, 1998)
2.4 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS
Foi realizada uma visita em cinco instituições que compõem a rede particular de ensino
da cidade de Nova Friburgo-RJ. Nessas instituições, os professores foram consultados sobre a
possibilidade de participação no estudo.
122
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Com a concordância, os professores responderam ao questionário proposto que foi
entregue aos mesmos para obtenção das respostas antes da aula sem intervenção dos
pesquisadores.
2.5 CRITÉRIOS DE ANÁLISE DAS AULAS
Os critérios de análise das aulas utilizados foram: espaço físico, material disponível,
linguagem utilizada pelo professor, participação dos alunos nas aulas, uso do uniforme,
relação professor/aluno, relação aluno/aluno, conteúdos propostos, identificação dos objetivos
e atenção dada às crianças. A classificação adotada foi: bom, regular ou ruim de acordo com
os critérios apresentados no anexo 02.
2.6 ANÁLISE DOS DADOS
Os dados foram analisados através da estatística descritiva.
Análise e Discussão dos Resultados
Na tabela 1 são resumidas as freqüências absolutas e relativas, extraídas da análise do
questionário respondido pelos professores.
Tabela 1 – Análise das respostas obtidas na aplicação dos questionários.
Professores
Questões
1
2
3
4
5
Resposta
Fabs
Frel (%)
Feminino
13
65
Masculino
7
35
Formação Professores
Licenciatura
Pós-Graduação
4
14
2
20
70
10
Mestrado
0
0
Doutorado
0
0
CGIPART
15
75
CGIPUB
5
25
Menos de 12 Meses
3
15
12 a 60 Meses
10
50
Mais de 60 Meses
7
35
Sim
Às vezes
8
9
40
45
Não
3
15
123
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
6
7
8
9
10
Planejamento Sempre
16
80
Às vezes
4
20
Não Realiza
0
0
Imagem Positiva
Conhecimento do Corpo
15
18
12,5
15
Relações afetivas e sociais
16
13,3
Auto-Estima
Habilidades Motoras
11
15
9,16
12,5
Cidadania e Solidariedade
12
10
Jogos
15
14,8
Brincadeiras
Esportes
20
7
19,8
6,93
Lutas
2
1,98
Atividades Expressivas
10
9,90
Funcionamento em Grupo
0
0
Funcionamento Individual
20
100
Aspectos Biológicos
0
0
Aspectos Socioculturais
20
100
* CGIPART = Conclusão da graduação em instituição particular e CGIPUB = conclusão da graduação
em instituição pública.
Dos 20 professores entrevistados, 65% eram mulheres e 35% homens. Burger e Krug
(2009) em seu trabalho de pesquisa sobre a realidade da Educação física na Educação Infantil
em Santa Maria-RS, também encontraram a predominância das mulheres atuando neste
segmento de ensino.
André (2002) destaca esta enorme diferença entre o número de mulheres e o de homens
envolvidos no magistério, argumentando que existem determinantes sócio-históricos que
levam a esta feminização: o reduzido número de escolas existentes no século XIX e no início
do século XX explica não ter havido uma resistência organizada ao ingresso de mulheres na
profissão no momento em que a cobertura escolar foi ampliada. Desse modo, a presença tão
predominante de mulheres na profissão docente no Brasil se deveria ao aumento do mercado
de trabalho, decorrente da ampliação do atendimento escolar, como também da procura dos
homens por novas profissões que ofereciam melhores salários, quando do início da
industrialização; e, b) A associação, presente no imaginário social, entre escola e maternidade,
que leva a uma continuidade do iniciado no lar, sempre sob a orientação e/ou a coordenação
de mulheres. A própria denominação “tia”, dada pelos alunos às professoras, reforça a
proximidade e identificação da professora como a figura familiar e similar à materna.
124
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Quanto à Escolaridade (figura 1), 20% dos entrevistados concluíram apenas a formação
de professores e atuam na Educação Infantil realizando recreação com os alunos sem serem
graduados em Educação Física. Dos professores, 70% possuem graduação em Licenciatura,
um número significativo, o que indica que grande parte dos colégios da rede particular de
Nova Friburgo está contratando profissionais qualificados para atuarem com Educação Física
na Educação Infantil, apesar da Resolução nº 7, de 14 de dezembro de 2010 homologada pelo
Exmo. Ministro da Educação, proposta pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) que fixa
diretrizes curriculares nacionais para o ensino fundamental ter estabelecido em seu artigo 31,
que:
...do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, os componentes curriculares Educação
Física e Arte poderão estar a cargo do professor de referência da turma, aquele com o
qual os alunos permanecem a maior parte do período escolar, ou de professores
licenciados nos respectivos componentes (CORDÃO, 2010)
Dos entrevistados, observamos que 10% cursaram pós-graduação, ou seja, buscaram
uma especialização, aperfeiçoando-se e qualificando-se profissionalmente o que é um fator
que indica melhoria nos recursos utilizados pelo professor, assim como maior clareza de
intenções na sistematização de conteúdos, objetivos, riqueza de estratégias, dinâmicas e
formas de intervenção. Para Marques (1992), a formação do profissional em Educação Física
não se encerra na formação acadêmica, e sim, estende-se por todo o seu exercício profissional.
No entanto, nas opções “Mestrado” e “Doutorado”, não foram encontrados dados, porém
profissionais com essas qualificações atuam, geralmente, em sua maioria nas Universidades.
Figura 1 –Nível de escolaridade dos voluntários
Dos professores entrevistados, 75% concluíram a graduação em instituição particular.
Um número significativo, uma vez que na cidade de Nova Friburgo, onde foi realizada a
pesquisa, o curso de graduação em Educação Física existente é disponibilizado pela
125
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Universidade Estácio de Sá, Instituição de Ensino Particular, sendo destes apenas 25%
graduados em instituições públicas.
Com relação ao tempo em que atuam no segmento de ensino observado, apenas 15%
tem experiência inferior a 12 meses, sendo, do restante, 50% atuantes na área entre 12 e 60
meses, o que demonstra que a maior parte dos entrevistados são profissionais novos no
mercado e significa que estão atualizados em relação a novas propostas para a Educação Física
e 35% dos entrevistados são atuantes a mais de 60 meses com um maior tempo de experiência
na área.
Segundo os professores, 40% consideraram satisfatória a quantidade e a diversidade de
recursos materiais disponíveis na instituição que atuam, já 45% avaliaram que às vezes é
insatisfatório por falta de material disponível em relação ao número de alunos e 15%
consideraram que não é satisfatório, porém, alguns alegaram que devido a catástrofe que
atingiu o município de Nova Friburgo em Janeiro/2011, perderam muitos materiais e ainda
não haviam recuperado todos em quantidade.
Quanto ao plano de aula, 80% dos professores responderam que sempre o realizam,
20% indicaram que às vezes realizam, por conta da experiência, porém, segundo Piletti
(1995) e Libâneo (1994) o planejamento é importante principalmente para a realização de um
ensino de qualidade que evite a improvisação e a rotina.
De acordo com a (figura 2) apresentada abaixo, em relação aos objetivos das aulas, 15
professores dos 20 entrevistados consideraram importante como objetivo desenvolver na
criança uma imagem positiva de si; destes, 18 consideraram importante que a criança descubra
e conheça seu próprio corpo, 16 profissionais assinalaram a opção que diz respeito ao
estabelecimento de vínculos afetivos e relações sociais e apenas 11 consideraram o
fortalecimento da autoestima como um dos objetivos principais, porém, estas quatro primeiras
opções são objetivos que norteiam o Referencial Curricular e embora a média de respostas
tenha sido satisfatória pela ocorrência da maioria as assinalando, o resultado poderia ter sido
melhor.
A opção “desenvolver capacidades físicas e habilidades motoras” foi assinalada por 15
professores, porém de acordo com Referencial Curricular (BRASIL, 1997) este não é um
objetivo da Educação Física na Educação infantil, pois os objetivos fundamentais são: brincar,
expressando emoções e necessidades; utilizar as diferentes linguagens ajustadas às diferentes
intenções de comunicação.
Deste modo, trata-se de um objetivo pertinente a partir do primeiro segmento do
Ensino Fundamental, com maior ênfase no segundo segmento. Isto é visto nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997).
Na última opção: “Compreender a cidadania, adotando atitudes de solidariedade e
respeito”, 12 profissionais a assinalaram. Porém como na opção anterior este objetivo não está
126
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
presente no Referencial Curricular da Educação Infantil e sim a partir do primeiro segmento
do Ensino Fundamental, (BRASIL, 1998).
Figura 2 – objetivos da Ed. Física considerados principais pelos voluntários
Quanto aos conteúdos, de acordo com a (figura 3) entre os professores entrevistados,
37% adotam as brincadeiras como conteúdo principal em suas aulas.
Já 28% assinalaram a alternativa referente aos jogos, 18% destes assinalaram
atividades expressivas, 4% assinalaram lutas e 13% assinalaram esportes, porém de acordo
com o Referencial Curricular os esportes não estão dentre os conteúdos previstos para a
Educação Infantil. Segundo Aguiar (2003) a Educação Física Escolar ainda vive sob a
influência da cultura de aptidões físicas, iniciação desportiva e formação de equipes
representativas. Apesar de todo o discurso de inclusão, de interdisciplinaridade e da
importância da Educação Física para a formação integral, ela não precisa ser uma disciplina
especial, deve ser normal como qualquer outra, que participe da formação global do aluno
como as demais.
Faria (2004) realiza algumas reflexões sobre Educação Física e cultura e aponta como
um dos desafios da disciplina ir além da dimensão procedimental atentando aos valores,
normas, atitudes, conceitos, ludicidade.
127
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Figura 3 – Conteúdos aplicados pelos voluntários em suas aulas
O acompanhamento da aprendizagem significa incorporar as produções infantis ao
planejamento e não emitir juízos de valor sobre o que as crianças conseguiram fazer ou não.
Tradicionalmente a avaliação na Educação Física junto às crianças pequenas carece de
instrumentos elaborados ou de critérios definidos, o que leva muitos profissionais a
registrarem pareceres, muitas vezes, preconceituosos baseados naquilo que é percebido como
“falta” (SAYÃO, 2002). Todos os entrevistados assinalaram que analisam o processo de
aprendizagem observando cada criança e verificando sua relação com o grupo e não
analisando somente o funcionamento em conjunto sendo assim um fator positivo.
Este fato se repetiu quando questionados sobre como veem seus alunos no contexto
escolar, analisando a perspectiva de corpo adotada pelo professor e todos os entrevistados
assinalaram a opção que “viam os alunos como um todo, considerando os aspectos
socioculturais e realidades particulares” e isso é muito importante para um ensino que visa à
formação integral do aluno.
Burger e Krug (2009) a fim de analisar as aulas de Educação Física na Educação
Infantil em Santa Maria-RS verificaram através da existência de planejamento contendo
objetivos, metodologia, conteúdo e avaliação que havia um interesse didático-pedagógico dos
professores entrevistados e acrescentaram que a Educação voltada às crianças não pode estar
apenas ligada a aquisição de rotinas ou de preparação para o Ensino Fundamental, mas ser
uma fase de aquisição de experiências motoras, afetivas, sociais.
128
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Na tabela 2 é resumida a frequência absoluta e relativa da análise da observação das aulas.
Questões
Resposta
Observação
Fabs
Frel %
1
Bom
12
60
Espaço
Regular
8
40
Físico
Ruim
0
0
2
Bom
7
35
Material
Regular
13
65
Disponível
Ruim
0
0
3
Bom
14
70
Linguagem
Regular
6
30
Ruim
0
0
4
Bom
17
85
Participação
Regular
3
15
Ruim
0
0
5
Bom
13
65
Uniforme
Regular
7
35
Ruim
0
0
6
Bom
14
70
Professor/
Regular
6
30
Aluno
Ruim
0
0
7
Bom
9
45
Aluno/
Regular
11
55
Aluno
Ruim
0
0
8
Bom
15
75
Conteúdos
Regular
5
25
Ruim
0
0
9
Bom
13
65
Indetificação
Regular
7
35
Objetivos
Ruim
0
0
10
Bom
14
70
Atenção dada
Regular
6
30
aos alunos
Ruim
0
0
Na observação das aulas feita pelas pesquisadoras, foi utilizado como forma de
levantamento de dados a análise qualitativa classificando em “Bom”, “Regular” e “Ruim”,
vários aspectos, seguindo critérios adotados em (anexo 3) e como visto na tabela 2 não houve
a classificação “Ruim” em nenhuma questão o que indica um fator positivo em relação ao
ensino. Quanto ao espaço físico utilizado para a Educação Física, 60% foi considerado “bom”
e 40% “regular”. Na realidade social brasileira, há uma quantidade grande de escolas que não
apresentam espaço físico adequado para a Educação Física. O espaço existente para as aulas,
muitas vezes se resume a pátios e salas de aula, (SOLER, 2003). Dados apresentados pelo
129
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) indicaram em 2006, que das
159.016 escolas de Ensino Fundamental no Brasil (públicas e particulares), apenas 44.763
possuíam quadra poliesportiva (BRASIL, 2006), o que representava 28% do total,
aproximadamente.
Silva e Damazio (2008), a fim de refletir sobre o ensino da Educação Física, analisando
as condições dos espaços físicos e materiais disponíveis para a prática, em Teresópolis RJ,
verificaram que são fatores que podem comprometer de modo significativo o trabalho
pedagógico da Educação Física.
Quanto ao material disponível, 35% foi analisado como “bom” e 65% foi analisado
como “regular”, pois apesar de haver materiais diversificados, a maioria não apresentou
quantidade que atenda ao número de alunos, ou por não estarem em condições regulares de
uso e isto é comprovado pela colocação dos entrevistados quando questionados sobre os
materiais de trabalho. Freire (2006), por exemplo, descreve atividades nas quais a utilização de
bolas, arcos, bastões, cordas e até mesmo materiais feitos com garrafas e copos descartáveis,
são indispensáveis para proporcionar ao aluno a troca com o meio e atribuição de novos
significados ao brinquedo. É importante que esses materiais sejam diversificados quanto ao
peso, tipo, textura, cor e tamanho, exigindo do aluno constantes adaptações e ajustamentos de
conhecimentos previamente adquiridos. Dessa forma, o professor terá mais condições para
realizar um trabalho de melhor qualidade, se a escola em que atua lhe oferecer espaços e
recursos materiais adequados.
Em relação à linguagem utilizada pelo professor, de acordo com a figura 4, 70% foi
considerado “bom”, o que indica que a linguagem está de acordo com a faixa etária, clara e
objetiva. Destes profissionais observados, 30%, encontraram dificuldades na comunicação
com os alunos, classificados como “regular”. Estes, em sua maioria, foram professores recémformados o que pode estar relacionado à insegurança e inexperiência, porém estão em
processo de crescimento profissional.
Figura 4- Tipo de linguagem utilizada pelos professores nas aulas
130
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Em se tratando da participação dos alunos, 85% destes foi considerado “bom”, e
apenas 15% “regular”.
Quanto ao uso do uniforme, em 65% das aulas, todos os alunos utilizavam roupas
adequadas, já em 35%, a maioria destes, ou seja, nem todos estavam com o uniforme
adequado. Esta exigência é significativa, pois roupas confortáveis permitem ao aluno uma
melhor execução de movimentos, (RONDINELL, 2011).
A relação do professor com seus alunos é de fundamental importância para a
Educação, pois a partir da forma de agir do mestre é que o aprendiz se sentirá mais receptivo à
matéria. A reciprocidade, simpatia e respeito entre ambos proporcionam um trabalho
construtivo, em que o educando é tratado como pessoa e não como um número. Conforme a
figura 5, na pesquisa, 70% desta relação professor/aluno foi considerado “bom” e 30%
“regular”. Isso demonstra que o centro de interesse é a interação professor, aluno e
conhecimento, transformando o professor em um orientador e facilitador da aprendizagem
(MATTOS, NEIRA, 2006).
Figura 5- Grau da relação professor e aluno nas aulas observadas
Segundo Aquino (1996), “há muito, os conflitos deixaram de ser um evento esporádico
e particular no cotidiano das escolas brasileiras para se tornarem, talvez, um dos maiores
obstáculos pedagógicos dos dias atuais”. A importância de um ambiente escolar que favoreça
a convivência harmoniosa entre seus sujeitos, seja para a promoção da aprendizagem, seja
para a formação do aluno de modo geral e o bem estar de todos. Na pesquisa, 45% da relação
entre os alunos foi considerado bom e 55% regular. De acordo com as dimensões dos
conteúdos (conceituais, procedimentais e atitudinais), o cultivo das normas e valores, o
trabalho em grupo, a cooperação, o respeito a si e aos outros são essenciais (MATTOS,
NEIRA, 2006).
De acordo com a observação das aulas, com relação aos conteúdos trabalhados, 75%
foi analisado como “bom” e 25% “regular”. Isto demonstra que as aulas estão de acordo com o
131
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Referencial Curricular Nacional, porém algumas com pouca diversificação. Constata-se que,
“(...) tradicionalmente, não há, nos cursos de licenciatura em Educação Física, uma
preocupação em formar professores para intervirem na educação de zero a seis anos”
(SAYÃO, 1999). Quando essa preocupação existe, na maioria das vezes, a formação fica
restrita ao aprendizado de um conjunto de atividades corporais (especialmente jogos e
brincadeiras) para serem desenvolvidas com as crianças de acordo com as diferentes faixas
etárias.
Darido e Rosário (2005), a fim de pesquisar sobre a sistematização dos conteúdos da
Educação Física na escola, apontaram que a Educação Física tem um vasto conteúdo separado
por blocos, mas não se observa a diversificação destes conteúdos, pois muitos professores se
limitam a apenas um bloco. Em seu estudo os voluntários chegaram à sistematização dos
conteúdos empregando a própria experiência, tentativas e reflexões e alegaram a falta de
amparo de pesquisas ou da literatura, sobre a sistematização.
Para Sayão (2002), a brincadeira, as interações e as diferentes linguagens são o eixo de
todo o trabalho pedagógico quando se atua na Educação Infantil e os profissionais envolvidos
podem planejar situações que levem as crianças a: brincar de diferentes formas; interagir com
as outras crianças do grupo; e manifestar-se através de diferentes linguagens como, a dança, a
música e o desenho. Na identificação dos objetivos, 65% foi considerado “bom” e 35%
“regular”, ou seja, na maior parte das aulas observadas, os objetivos foram naturalmente
identificados.
Com relação à atenção dada as crianças, 70% foi considerado “bom” e 30% “regular” e
isto comprova a questão levantada sobre a perspectiva de corpo adotada pelos professores nas
aulas, onde responderam que veem o aluno como um todo.
Considerações Finais
Ao falarmos da Educação Física na Educação Infantil, entramos num campo de
discussões, de debates e reflexões, que ainda é marcado pela escassez de produções teóricas e
de estudos que contribuam para o reconhecimento e valorização da aula e do professor de
Educação Física neste nível da educação básica. Exemplo disso é o fato de observarmos, e não
raras vezes, a falta de professores de Educação Física para trabalhar na Educação Infantil em
muitas escolas, principalmente na rede pública.
Atentando nosso olhar para este segmento, buscamos com este trabalho observar a
realidade da Educação Física na Educação Infantil em colégios particulares de Nova Friburgo
no que diz respeito aos professores atuantes e suas práticas pedagógicas, além de observar a
perspectiva de concepção de corpo que estes profissionais adotam.
Sendo assim, os resultados encontrados foram que as aulas estão de acordo com o
Referencial Curricular Nacional em se tratando dos conteúdos, objetivos, mas ainda falta uma
maior diversificação dos mesmos; os professores possuem um perfil adequado, priorizando a
participação, a ludicidade, mantendo um bom relacionamento com os alunos, além de
132
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
mostrarem adotar a concepção do corpo sujeito. Apontamos como principal questão para isso,
o fato de que a maior parte dos voluntários atua na Educação Infantil entre 12 e 60 meses, ou
seja, atualizados com relação às novas concepções de Educação Física.
Com mais tempo e recursos, poderíamos analisar com maior profundidade a atuação de
docentes com formação de professor e com formação em Educação Física, a fim de refletir
sobre suas práticas pedagógicas voltadas a Educação Infantil no que diz respeito às
intencionalidades de suas ações, significados e sentidos, sendo assim, deixando esta ideia para
futuros trabalhos de pesquisa.
Finalizando, cabe a reflexão de que o processo de constituição de nosso “ser
profissional” se faz e se refaz a cada dia, com parcerias, em meio a desafios, conquistas,
temores, conflitos, buscas... Pois se somos seres inconclusos, como nos ensina Paulo Freire
(1997): “A consciência do mundo e a consciência de si como ser inacabado necessariamente
inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num permanente movimento de busca”.
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134
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
ANEXO 01- QUESTIONÁRIO APLICADO AOS PROFESSORES
*Seguindo orientações de (ZABALZA, 1998) e (BRASIL, 1998).
01-Gênero:
( ) Masculino ( ) Feminino
02-Nível de escolaridade:
( ) Licenciatura
( ) Mestrado
( ) Formação de professores
( ) Pós Graduação
( ) Doutorado
03-Em que instituição concluiu a graduação em Educação Física?
( ) Conclusão da graduação em instituição particular.
( ) Conclusão da graduação em instituição pública.
04-Há quanto tempo trabalha na Educação Infantil?
( ) Menos de 12 meses ( ) de 12 meses a 60 meses ( ) mais de 60 meses
05- Os Recursos Materiais disponíveis são satisfatórios?
( ) Sim ( ) Não ( ) às vezes
06- Você realiza um plano de aula:
( ) Sempre
( ) às vezes ( ) não realiza
07- Em sua opinião, quais são os principais objetivos da Educação Física na Educação
Infantil:
( ) Desenvolver na criança uma imagem positiva de si;
( ) Descobrir e conhecer seu próprio corpo;
( ) Estabelecer vínculos afetivos e relações sociais;
( ) Fortalecer a autoestima das crianças;
( ) Desenvolver capacidades físicas e habilidades motoras.
( ) Compreender a cidadania, adotando atitudes de solidariedade e respeito.
08- Quais são os conteúdos ministrados em suas aulas ?
( ) Jogos
( ) Lutas
( ) Brincadeiras
( ) Atividade rítmicas e expressivas
( ) Esportes
09- Como é feito o acompanhamento da aprendizagem:
( )Análise somente do funcionamento do grupo em seu conjunto
( ) Análise do processo de aprendizagem individual de cada criança e sua relação com o
grupo.
10- Você, enquanto professor, como vê seus alunos no contexto escolar:
( ) Apenas como um corpo em movimento, levando em consideração somente aspectos
biológicos.
( ) Como um todo, considerando os aspectos socioculturais e realidades particulares.
ANEXO 02- ANÁLISE DAS AULAS
01 – Espaço Físico:
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
02- Material Disponível:
135
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
03 – Linguagem utilizada pelo Professor:
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
04- Participação dos alunos na aula
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
05- Uso do uniforme
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
06 - Relação professor/aluno:
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
07 - Relação aluno/aluno:
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
08 – Conteúdos propostos:
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
09- Identificação dos objetivos;
( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim
10- Atenção dada às crianças:
( ) Bom ( ) Regular ( ) Rui
ANEXO 03 - CRITÉRIOS DE ANÁLISE DAS AULAS
Espaço físico
Será considerado “Bom”: um espaço amplo, específico para a prática de Educação Física com
um piso adequado que não ofereça riscos aos alunos; em boas condições de uso, bebedouros suficientes
para atender ao número de alunos em cada aula e banheiros em boas condições de uso.
Será considerado “Regular”: um espaço específico para a prática de Educação Física, porém
com um tamanho pequeno, piso regular para a prática, apenas um banheiro em boas condições e um
bebedouro; um espaço não específico somente para a Educação Física, mas que seja grande, que esteja
em boas condições de uso e que não ofereça riscos aos alunos, com um banheiro próximo em boas
condições e com pelo menos um bebedouro.
Será considerado “Ruim”: um espaço específico para Educação Física em más condições, piso
irregular, um banheiro em más condições, um bebedouro que não funcione adequadamente ou nenhum
bebedouro; um espaço não específico para Educação Física, apresentando-se em más condições de uso
para a prática e oferecendo riscos, com um banheiro em más condições ou nenhum banheiro, com um
bebedouro que não funcione adequadamente ou nenhum bebedouro;
Material disponível
Será considerado “Bom”: materiais diversificados para as diferentes atividades como: bolas de
variadas modalidades esportivas, cones, cordas, redes, arcos, coletes, brinquedos pedagógicos e
colchonetes, todos em quantidade adequada e satisfatória para o número de alunos, em boas condições
de uso e organizados.
Será considerado “Regular”: materiais diversificados, porém em uma quantidade que não
atenda ao número de alunos, em condições regulares de uso e organização.
136
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Será considerado “Ruim”: poucos materiais em relação à diversidade e quantidade, em más
condições de uso e mal organizados.
Linguagem utilizada pelo professor
Será considerado “Bom”: se a linguagem oral utilizada pelo professor for clara, objetiva e
adequada à faixa etária ao explicar as atividades propostas e ao se relacionar com os alunos e se utilizar
uma linguagem corporal para a demonstração das atividades e linguagem musical, adequadas à faixa
etária.
Será considerado “Regular”: se o professor encontrar dificuldades na comunicação com os
alunos, em algum tipo de linguagem por não adequar à faixa etária.
Será considerado “Ruim”: se professor encontrar dificuldades na comunicação com os alunos
em diferentes linguagens, por não adequar a faixa etária e desta forma não alcançar os objetivos
previstos com as atividades propostas.
Participação dos alunos na aula
Será considerado “Bom”: a participação de todos os alunos em todas as atividades,
demonstrando interesse, motivação e segurança na execução.
Será considerado “Regular”: a participação da maioria dos alunos, em todas as atividades,
apresentando pouco interesse e motivação.
Será considerado “Ruim”: pouca participação dos alunos em todos as atividades propostas,
falta de interesse, de motivação e não se sentindo seguros na execução.
Uso do uniforme
Será considerado “Bom”: utilização de roupas adequadas para a aula prática por todos os
alunos, em boas condições de uso quanto à higiene.
Será considerado “Regular”: utilização de roupas adequadas para a aula prática pela maioria
dos alunos em boas condições de uso quanto à higiene.
Será considerado “Ruim”: não utilização de roupas adequadas para a aula prática pela maioria
dos alunos, em más condições de uso, quanto à higiene.
Relação professor/aluno
Será considerado “Bom”: se o professor apresentar uma boa relação com os alunos ao
estabelecer as normas de funcionamento das aulas, controlar e ajudar a turma, estimular a
responsabilidade e autonomia dos alunos com liberdade de expressão.
Será considerado “Regular”: se o professor apresentar uma relação autoritária com os alunos
no estabelecimento das normas das aulas, com dificuldades para controlar e ajudar a turma.
137
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Será considerado “Ruim”: se o professor apresentar uma relação totalmente autoritária com os
alunos, restringindo a liberdade de expressão dos mesmos.
Relação aluno/aluno
Será considerado “Bom”: se os alunos apresentarem uma relação de respeito mútuo entre si.
Será considerado “Regular”: se houver alguns alunos com dificuldades de se relacionar com os
demais, com relação ao respeito.
Será considerado “Ruim”: se houver muitos alunos com dificuldades de se relacionar com os
demais e sem uma relação de respeito entre os colegas.
Conteúdos propostos
Será considerado “Bom”: se os conteúdos propostos estiverem de acordo com o Referencial
Curricular Nacional e se forem diversificados.
Será considerado “Regular”: se os conteúdos estiverem de acordo com o Referencial Curricular
Nacional não sendo diversificados.
Será considerado “Ruim”: se os conteúdos não estiverem de acordo com o Referencial
Curricular Nacional.
Identificação dos objetivos
Será considerado “Bom”: se os objetivos forem facilmente identificados durante a aula.
Será considerado “Regular”: se houver dificuldade na identificação dos objetivos durante a
aula.
Será considerado “Ruim”: se não for possível identificar os objetivos durante as aulas.
Atenção dada às crianças
Será considerado “Bom”: se o professor durante as aulas sempre procurar fazer contatos com
cada criança, preocupando-se com os aspectos emocionais da aprendizagem.
Será considerado “Regular”: se o professor dificilmente, durante a aula, procura fazer contatos
com cada criança.
Será considerado “Ruim”: se o professor restringe a atenção individual oferecida aos alunos
trabalhando com o grupo todo de uma só vez com todos fazendo as mesmas coisas.
138
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Atendimento Inicial ao Infarto Agudo do Miocárdio
Autores
Ana Paula Ferreira da Rocha
Gilberto Rodrigues Chermaut
Jessica Perisse Moreira
Sandro de Carvalho Barcelos
Curso Enfermagem
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientadora: Zilma Denize Mascarenhas Xavier
Resumo: Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) é uma situação de grande frequência nas salas
de emergências, sendo necessária internação hospitalar. A pesquisa teve como objetivos
analisar o tempo gasto pelo cliente com suspeita de IAM em procurar por atendimento
emergencial, identificar a existência de um protocolo de atendimento no setor de emergência e
avaliar o conhecimento da equipe de enfermagem sobre as prioridades no atendimento a este
paciente. Foram entrevistados profissionais do setor de emergência e pacientes com suspeita
de IAM. Os resultados mostraram que não há protocolo de atendimento, a equipe de
enfermagem é capaz de identificar as prioridades no atendimento ao paciente com suspeita
IAM e que todos os clientes procuraram o atendimento após duas horas do início dos
sintomas.
Palavras-chaves: infarto agudo; emergência; enfermagem.
Introdução
O infarto agudo do miocárdio (IAM) faz parte de um grupo de doenças chamadas
doenças isquêmicas do coração. É um evento agudo que requer internação hospitalar, tendo
um diagnóstico clínico bem estabelecido, geralmente baseado na história clínica, evolução
eletrocardiográfica e curva enzimática. Estas doenças cardíacas representam a principal causa
de morte no Brasil e no mundo, apesar do advento das unidades coronarianas, dos avanços da
terapia fibrinolítica e com os novos processos de intervenção percutânea. (BRANDÃO, 2009)
Vários estudos descritos em literaturas demonstraram que cerca de 20% dos clientes
com dor torácica aguda chegam ao setor de emergência antes de duas horas de início dos
sintomas (FRANCO, et al, 2008). Existem vários fatores que podem estar relacionados com o
atraso em procurar serviço de emergência: como o não reconhecimento por parte dos clientes
Professora Mestre da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
como sendo um evento cardíaco, automedicação utilizada por alguns clientes, o baixo nível
socioeconômico, o sexo feminino, as condições de transporte, negação em aceitá-lo e pelo
atendimento prévio não especializado. (FRANCO, et al, 2008)
A discussão do tempo tem papel de destaque na assistência de enfermagem ao cliente
infartado, geralmente exposto a um maior risco de morte na primeira hora após o início dos
sintomas, portanto, antes da chegada ao hospital. O intervalo de tempo decorrido entre o início
dos sintomas e o atendimento é extremamente relevante para a sobrevida. Mais de 50% dos
óbitos ocorrem na primeira hora de evolução. Considerando-se que o benefício do uso da
terapia com trombolíticos é tempo-dependente, o retardo no tratamento de clientes com
suspeita de IAM é um fator crítico de redução na sobrevida. Dificuldades no acesso ao serviço
de emergência aumentam o tempo decorrido até a admissão, diminuindo a letalidade
hospitalar esperada e aumentando a extra-hospitalar. Nesse caso, é indiscutível o impacto da
distribuição do espaço eficiente de serviços de emergência na sobrevida de clientes infartados.
(BRANDÃO, 2009)
O enfermeiro da atenção básica tem um papel muito importante para a redução do
tempo gasto desde o surgimento dos primeiros sintomas até a busca do serviço de saúde pelo
cliente. Cabe ao enfermeiro a função de educação em saúde, orientando a população quanto à
prevenção de doenças e informando sobre os sinais e sintomas desta e de outras doenças,
ressaltando a importância em procurar auxílio dos profissionais de saúde e quando fazê-lo,
assim como prover o treinamento contínuo de sua equipe para que esta possa prestar um
atendimento adequado.
De acordo com o DATASUS, 2005, cerca de 58.000 pessoas ainda morrem vítimas de
IAM no Brasil, e indicam a ocorrência de 84.945 óbitos por doença isquêmica do coração
somente no ano de 2005, no país. (PIEGAS, 2005)
A taxa de mortalidade global varia de 5 a 30%, sendo que metade das mortes ocorre
antes dos clientes receberem atendimento adequado. Dentre aqueles que chegam ao hospital,
aproximadamente 25 % dos óbitos ocorrem nas primeiras 48 horas. (PIEGAS, 2005; MELLO,
2007)
O IAM é a destruição da musculatura miocárdica, devido à deficiência de fluxo
sanguíneo para uma região do músculo cardíaco, cujas células sofrem necrose por falta de
aporte nutritivo. A interrupção do fluxo coronário geralmente se deve a aterosclerose,
estreitamento de uma artéria coronária causado pelo acúmulo de placas de ateroma (gordura),
ou pela obstrução total de uma coronária por êmbolo ou trombo (coágulo sanguíneo).
(SMELTEZER; BARE 2008).
A característica fundamental do IAM é a dor prolongada, localizada na região
subesternal, epigástrica, abdominal alta ou precordial e se irradiando para o pescoço,
mandíbula, ombro, braço e para a mão esquerda (SMELTEZER; BARE 2008).
140
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Os sintomas são: dor ou forte pressão no peito, dor no peito refletindo nos ombros,
braço esquerdo, pescoço e maxilar, dor abdominal, suor, palidez, falta de ar, perda temporária
da consciência, sensação de morte iminente, náuseas e vômitos.
E os fatores de risco são: histórico familiar de doença coronariana, idade (a partir dos
60 anos), colesterol e triglicerídeos elevados, hipertensão arterial, obesidade, diabetes, fumo,
estresse e sedentarismo.
Através destes dados do Ministério da Saúde e com as observações nos campos de
estágio o grupo se propôs a realizar a pesquisa na busca de entender como ocorre o
atendimento ao paciente em sofrimento cardiovascular na emergência, e de qual forma
poderíamos contribuir para a mudança neste atendimento. Levantou-se como questões
norteadoras para este estudo: Quanto tempo é gasto para o cliente procurar tratamento na
Emergência? Na emergência existe protocolo de atendimento para o IAM? A Equipe de
Enfermagem conhece as prioridades para o atendimento ao cliente com suspeita de IAM com
ou sem existência de protocolo?
Os objetivos da pesquisa são: Verificar o tempo gasto para o cliente procurar
tratamento na emergência; Checar a existência de protocolo no atendimento inicial do IAM.
Identificar as prioridades no atendimento ao cliente com suspeita de IAM.
O presente estudo, inserido na linha de pesquisa O Cuidar no Processo Saúde-doença,
tendo como área dominante a Enfermagem no Cuidado ao Cliente Crítico Adulto /
Emergência, visa à busca de esclarecimento de ações em enfermagem para proporcionar para
sua equipe de emergência, de um modo claro e objetivo, métodos para um atendimento
hospitalar melhor e mais seguro ao cliente portador de IAM.
Nos dias atuais, em decorrência do grande número de vítimas de IAM é necessária a
realização de pesquisas sobre o tema e o contínuo esforço dos profissionais da área de saúde
no sentido de reduzir, ainda mais, as taxas de mortalidade deste evento através de um
atendimento mais qualificado e eficaz.
Diminuição no número da morbi-mortalidade, com consequente redução de gastos
durante o tratamento dispensado pelas instituições de saúde gerando uma maior qualidade de
vida para o cliente, como também uma menor redução da força de trabalho, o que poderia
gerar perdas para a sociedade como um todo.
Metodologia
A presente pesquisa utilizou método quantitativo o qual considera que tudo pode ser
quantificável, ou seja, traduzir em números opiniões e informações para classificá-las e
analisá-las. “As análises quantitativas são muito divulgadas e, nesse sentido, sua planificação
geralmente necessita de menos explicações que as análises qualitativas”
(CONTANDRIOPOULOS, 1994, p.90).
141
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
De acordo com Vergara (2005), na coleta de dados o autor deve informar como
pretende obter os dados de que precisa para responder ao problema. Nesta pesquisa foram
utilizadas entrevistas com perguntas fechadas, aplicadas aos profissionais e pacientes na
emergência de um hospital da Região Serrana do Rio de Janeiro.
Segundo Lehfeld (2010), o investigador na pesquisa de campo assume o papel de
observador e explorador, coletando diretamente os dados no local (campo) em que se deram
ou surgiram os fenômenos. O trabalho de campo se caracteriza pelo contato direto com o
fenômeno de estudo. A partir do uso de técnicas como observação, participante ou não
participante, entrevistas, questionários, coleta de depoimentos e estudo dos casos, o
pesquisador busca as informações sobre o objeto de estudo.
Para realização da pesquisa foram utilizadas as bases de dados da BVS, LILACS e
Med Line. Foram pesquisados e incluídos artigos e monografias que apresentavam arquivo na
íntegra e idioma Português, que contem os descritores: Atendimento médico de emergência;
enfermagem de emergência e Infarto Agudo do Miocárdio.
A pesquisa foi realizada obedecendo a Resolução 196/96, que garante ao participante
da pesquisa o direito à privacidade, ao anonimato, o respeito aos seus hábitos, costumes e
crenças, sendo protegido de qualquer preconceito ou estigmatização e, por fim o direito de
abandonar a pesquisa no momento em que achar necessário, sem qualquer dano moral ou
material, os profissionais e os clientes entrevistados assinaram um termo de consentimento
livre e esclarecido que segue em anexo ao trabalho.
A identificação dos profissionais foi feita por códigos; utilizando as iniciais do nome
seguido pela categoria profissional, e número sequencial da entrevista, tais como: Enfermeiro
– Enf 01; Técnico ou Auxiliar de Enfermagem – TEnf 01; Auxiliar de Enfermagem – AEnf
01; seguido pela data da entrevista e não fazendo distinção de sexo. Quanto aos clientes
também foi realizada codificação utilizando as siglas do nome e sobrenome seguido pelo sexo
e idade. A coleta de dados foi realizada de forma individual, sendo cada dia um integrante do
grupo responsável pela escala diurna e noturna do Hospital. O tempo de pesquisa foi do dia
11/10/2011 ao dia 17/10/2011, o aluno responsável pela entrevista chegava ao hospital no
horário de 17 horas até a última coleta do plantão noturno. As entrevistas começaram após a
aprovação do comitê de ética da Universidade Estácio de Sá, e de autorização da direção do
Hospital.
Revisão de Literatura
O atendimento inicial da doença aguda se diferencia em diversos aspectos daquele
adotado na prática do tratamento não emergencial. A história da doença e os dados referentes
ao cliente são limitados, muitas vezes se obtendo a relativa ao atendimento pré-hospitalar. O
atendimento emergencial envolve abordagem diagnóstica e tratamento simultâneo, baseados
em algoritmos de ressuscitação e na análise de dados do exame físico imediato, especialmente
sinais vitais, assim como resultados de exames complementares.
142
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Na admissão, até que se prove o contrário, espera-se que o cliente se apresente instável
ou necessitando de medidas de ressuscitação. Estas medidas são parte do Suporte Básico de
Vida (BLS – Basic Life Support), determinado pela American Heart Association, em outubro
de 2010, que utiliza o CABD (compressões torácicas, via aérea, respiração, desfibrilação) na
abordagem inicial do cliente. Associado às medidas iniciais sobrepõem-se as medidas do
Suporte Avançado de Vida (ACLS – Advanced Cardiac Life Support). Ambos foram
inicialmente desenvolvidos para abordagem de clientes com IAM, com instabilidade ou parada
cardiorrespiratória, porém, atualmente é universalmente aplicado na ressuscitação de clientes
instáveis, incluindo–se mais recentemente a abordagem à doença aguda não traumática.
(MESQUITA, 2003; PROTOCOLO AHA, 2010)
“Após a abordagem inicial e estabelecido que não há necessidade de ressuscitação,
deve-se obter a queixa principal e a história da doença atual, com atenção especial aos
sinais vitais, que são obtidos e/ou monitorados de acordo com a apresentação do
paciente, visto que a interpretação dos dados, o diagnóstico e tratamento constituem
etapas simultâneas na abordagem emergencial.” (MESQUITA, 2003, p.21).
A monitorização eletrocardiográfica é extremamente importante, pois a causa mais
comum de morte pós IAM são as arritmias. Com a monitorização efetiva é possível avaliar a
frequência e o ritmo cardíacos, podendo identificar os distúrbios arrítmicos. Para
complementar os dados da monitorização cardíaca é de suma importância a observação direta
ao cliente a beira do leito. Ao realizar o exame físico regular e detalhado deve identificar os
primeiros sinais e sintomas de insuficiência ventricular e choque cardiogênico.
A monitorização hemodinâmica ocorre por meio da utilização de cateteres que medem
as pressões arteriais e venosas. Com esses dados hemodinâmicos é possível avaliar a
gravidade do problema e a eficácia do tratamento. A monitorização hemodinâmica invasiva é
feita com a utilização do cateter de Swan-Ganz com o qual é possível a mensuração direta de
valores como pressão de artéria pulmonar, pressão de capilar pulmonar e débito cardíaco, além
de outros parâmetros derivados a partir da obtenção destes dados. Isso torna possível uma
melhor avaliação do paciente e ajuste da terapêutica medicamentosa utilizada. (MELTZER,
1997)
A fim de que o atendimento ao cliente com IAM seja adequado não basta somente um
diagnóstico correto mais também o tratamento deverá ser iniciado o mais rápido possível.
Indiscutivelmente, o diagnóstico e o tratamento precoces salvam vidas. Nesse contexto,
devemos considerar a terapêutica elétrica das arritmias graves (cardioversão e desfibrilação) e
a reperfusão precoce da artéria relacionada ao infarto (trombólise mecânica ou farmacológica).
(COELHO, et al, 2005).
Para todos os pacientes que apresentem um quadro clínico de IAM com elevação do
segmento ST ou Bloqueio Completo do Ramo Esquerdo (presumidamente novo) até 12 horas
do início dos sintomas deverão receber a terapêutica trombolítica. A administração da
terapêutica trombolítica não deverá ser realizada em caso de contraindicação ao uso da droga
ou caso exista a possibilidade da trombólise mecânica primária. A trombólise mecânica não
seria indicada caso esta opção resultasse em retardo superior a 90 minutos para dilatação da
143
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
artéria “culpada” pelo IAM, quando comparado ao tempo da administração do trombolítico.
(COELHO, et al, 2005).
“A finalidade dos trombolíticos é dissolver e lisar o trombo (trombólise) em uma
artéria coronária, permitir que o sangue flua novamente através da artéria coronária
(reperfusão), minimizar o tamanho do infarto e preservar a função ventricular. O
analgésico de escolha para o IAM ainda é o sulfato de morfina, administrado em bolos
intravenosos. A morfina não somente reduz a dor e a ansiedade, como também reduz a
pré-carga, o que, por sua vez, diminui a carga de trabalho do coração e relaxa os
bronquíolos para estimular a oxigenação.” (BRUNNER & SUDDARTH, 2008)
A nitroglicerina, um agente vasoativo, é administrada para reduzir o consumo de
oxigênio pelo miocárdio, o que diminui a isquemia e alivia a dor. A nitroglicerina dilata
principalmente as veias e também as artérias. Ela também ajuda a aumentar o fluxo sanguíneo
coronariano por evitar o vasoespasmo e aumentar a perfusão através dos vasos colaterais.
(BRUNNER & SUDDARTH, 2008)
“Não é necessário fornecer oxigênio suplementar para pacientes sem evidencia de
desconforto respiratório, caso a saturação de oxi-hemoglobinas seja
≥ 94%. A
morfina é indicada em IAMSST (sem supradesnível de segmento
ST)/EAMCSST(supradesnível de segmento ST) quando o desconforto torácico não
responde a nitratos.” (PROTOCOLO AHA,2010, p. 18)
Segundo o formulário terapêutico nacional a morfina é definida como um analgésico
narcótico de escolha para dor intensa, aguda e crônica, dor relacionada ao câncer, adjuvante
anestésico ou analgésico pós-operatório, age no SNC e na musculatura lisa em administração
IV em 5 a 10 min. No tratamento do IAM inicia-se com dose de 10mg IV, diluída, seguido de
doses adicionais de 5 a 10mg, se necessário, até o alívio completo da dor ou surgimento de
efeitos tóxicos: hipotensão, depressão respiratória, vômitos (BRASIL, 2008).
O diagnóstico de IAM pode ser dificultado, pois dos clientes que realmente apresentam
um IAM, apenas a metade tem um eletrocardiograma com alterações clássicas como CSST à
admissão e menos da metade dos clientes com IAMSSST apresenta creatinoquinase-MB (CKMB) elevada à admissão.
Sendo assim a explicação desses dados o porquê, mesmo em centros de referência, 2 a
3 % de pacientes com IAM são indevidamente liberados da emergência, taxa que pode
alcançar valores de até 10 a 20 % em alguns serviços, sendo que destes, 25% apresenta
desfecho letal.
Diante desses dados de falha terapêutica demonstram uma capacidade de inserir o
atendimento da dor torácica no conceito das Unidades de dor Torácica (UDT), nas quais o
cliente receberia uma atenção mais direcionada, com condutas normatizadas para o
diagnóstico e tratamento. Entretanto, a UDT pode funcionar no mesmo espaço físico da sala
de emergência, onde será necessário o treinamento da equipe multiprofissional de saúde nas
rotinas estabelecidas.
144
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
A abordagem inicial ao cliente com dor torácica consiste em se definir, através de uma
breve história clínica, se o sintoma decorre de uma provável causa cardíaca ou de provável
causa não cardíaca. (AGUIAR, 2008)
TIPOS DE DOR TORÁCICA
CARACTERÍSTICAS
Tipo A (dor definitivamente anginosa)
Dor torácica cujas características dão a certeza
do diagnóstico de Síndrome Coronariana
Aguda (SCA), independentemente do
resultado dos exames complementares.
Tipo B (dor provavelmente anginosa)
Dor torácica cujas características sugerem
SCA como principal hipótese diagnóstica,
porém com necessidade de exames
complementares para a confirmação do
diagnóstico.
Dor torácica cujas características não sugerem
SCA como a principal hipótese diagnóstica,
porém há necessidade de exames
complementares para excluí-la.
Dor torácica cujas características não sugerem
SCA no diagnóstico diferencial etiológico.
Tipo C (dor provavelmente não anginosa)
Tipo D (dor definitivamente não anginosa)
Fonte: Protocolos clínicos da Cooperclim – IAM: Dor torácica na sala de emergência
Segundo Aguiar (2008), pacientes com ECG CSST (supradesnível de segmento ST) e
dor torácica tipo A/B são diagnosticados como IAM CSST e devem ser internados
preferencialmente em Unidade CORONARIANA (UCO) e tratados conforme rotina
específica. Pacientes com ECG SSST (infradesnível ou inversão de T) com dor torácica tipo
B/C, ou ainda com ECG inespecífico, porém com dor torácica tipo A/B deve permanecer em
observação na Sala de Dor Torácica e submetidos a dosagens de enzimas (CK-MB /CKT)
seriadas a cada 3h e ECG 6/6h por 9 às 12h. Neste período, qualquer evidência de necrose
miocárdica justifica transferência à UCO. Caso contrário, deve-se utilizar um teste
provocativo (teste ergométrico ou cintilografia miocárdica) tardio (após controle da dor),
podendo-se considerar alta caso o teste seja negativo ou internação em UCO e cateterismo
cardíaco caso positivo para isquemia. Pacientes com ECG inespecífico e dor torácica tipo C
tem baixo risco de angina instável, porém, devem seguir protocolo, com tempo de observação
menor (6h). Pacientes com dor torácica não isquêmica, mas com suspeita de TEP
(Tromboembolismo Pulmonar) ou SATA (Síndromes Aórticas Torácicas Agudas) devem ser
internados em UCO e sequenciados conforme protocolos específicos. Pacientes com ECG
normal ou inespecífico e dor torácica tipo D podem receber alta do Pronto Socorro com
seguimento ambulatorial posterior, excetuando-se, obviamente, os que apresentem outro
diagnóstico que necessitem cuidados de urgência.
Com base nas manifestações clínicas e dados da avaliação diagnóstica, devem ser
realizados os seguintes cuidados de enfermagem em clientes com IAM:
145
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Para o alívio da dor torácica associada ao IAM a administração intravenosa de
vasodilatador e terapia anticoagulante é um método aceito. A nitroglicerina e a heparina são os
medicamentos de escolha.
Os sinais vitais são avaliados com frequência, enquanto o cliente estiver
experimentando dor.
O oxigênio deve ser administrado em conjunto com a terapia medicamentosa para
garantir o alívio da dor. A inalação de oxigênio, mesmo em doses baixas, eleva o nível
circulante de oxigênio e reduz a dor associada a baixos níveis de oxigênio circulante. Uma
taxa de 2 a 4l/min. é geralmente adequada para manter os níveis de saturação de oxigênio de
96 a 100% quando nenhuma outra doença está presente.
o
O repouso físico no leito, com a cabeceira elevada, ou em uma cadeira cardíaca ajudará
a diminuir o desconforto torácico e a dispneia. A elevação da cabeça é benéfica pelas
seguintes razões: o volume corrente melhora por causa da pressão reduzida a partir do
conteúdo abdominal sobre o diafragma e, assim gera melhora na expansão pulmonar e da troca
gasosa; a drenagem dos lobos superiores dos pulmões melhora e o retorno venoso para o
coração diminui, reduzindo seu trabalho. (BRUNNER & SUDDARTH, 2008).
Análise de Dados
Durante a realização da pesquisa verificamos que a equipe de enfermagem envolvida
no atendimento aos clientes com suspeita de IAM na unidade de emergência da instituição é
composta por um total de 45 profissionais sendo 08 Enfermeiros, 24 Técnicos em
Enfermagem e 13 Auxiliares de Enfermagem e foram entrevistados 39 profissionais sendo 06
Enfermeiros, 22 Técnicos em Enfermagem e 11 Auxiliares de Enfermagem, conforme gráficos
1.1 e 1.2 abaixo:
Gráfico 1.1 - Representa o número de profissionais existentes.
146
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Gráfico 1.2 - Representa o número de profissionais entrevistados.
Os profissionais da equipe de enfermagem da instituição foram entrevistados com base
no Anexo 01 desta pesquisa e após análise dos dados foi possível verificar que a instituição
não possui um protocolo instituído e também observar que 27 profissionais da equipe estão
cientes da ausência de protocolo enquanto 12 profissionais da equipe desconhecem este fato.
Observamos que os técnicos e os auxiliares de enfermagem não recebem treinamento
periódico dos enfermeiros, apesar de alguns enfermeiros relatarem conhecer o protocolo AHA
de Outubro de 2010 para abordagem inicial do cliente.
Dos profissionais entrevistados 34 relataram conhecer os equipamentos/ materiais
disponíveis no setor, tais como desfibriladores/cardioversores, monitores multiparâmetros e
oxímetro de pulso e apenas 05 relatam não conhecê-los.
A realização diária do check list é de extrema importância para um atendimento de
emergência eficaz, observamos que é executada por 24 profissionais da equipe enquanto 15
profissionais da equipe reconhecem não realizá-lo diariamente.
Para um tratamento eficaz, é necessário reconhecer as ações prioritárias
na
realização de um atendimento de IAM. Grande parte da equipe de
enfermagem possui
mais de cinco anos de experiência em atendimento de emergência intra-hospitalar. Durante a
entrevista os profissionais enumeraram quais seriam as prioridades no atendimento de cliente
com suspeita de IAM conforme demonstra o gráfico 1.3 a seguir:
147
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Gráfico 1.3 - Representa as ações de prioridades relatadas pelos profissionais.
Com base nas prioridades supracitadas pela equipe e indicadas no Protocolo AHA de
Outubro de 2010 de abordagem inicial do cliente, concluímos que as prioridades para
atendimento eficaz seriam:
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
Avaliar nível de consciência;
Identificar parada cardiorrespiratória (PCR);
Realizar reanimação cardiopulmonar (RCP- compressão/ventilação);
Desobstruir vias aéreas superiores (VAS);
Ofertar oxigênio;
Realizar eletrocardiograma (Monitorização-ECG);
Administrar medicações;
Promover conforto.
Foram realizadas entrevistas com 3 clientes com suspeita de IAM, todos com idade
superior a 40 anos, conforme dados dos gráficos a seguir:
148
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Gráfico 1.4 – Quanto ao sexo dos entrevistados.
Gráfico 1.5 – Representa a idade dos clientes entrevistados.
O tempo de procura do serviço de emergência é um fator importante para o prognóstico
do cliente e também foi analisado durante a entrevista. Todos os clientes procuraram o
atendimento após duas horas do início dos sintomas.
Dos clientes entrevistados 66,6% apresentaram dispneia associada a sintomas como
dor precordial e nos membros superiores. Apenas 33,4% dos clientes entrevistados
apresentaram dor na mandíbula e sudorese associada a dor precordial.
A hipertensão arterial foi observada em 66,6% dos entrevistados e todos estes faziam
uso de medicações anti-hipertensivas e acompanhamento médico regular.
Considerações Finais
Os resultados desta pesquisa evidenciaram que a equipe de enfermagem possui um
bom conhecimento teórico/prático, presta uma assistência eficaz, apresenta habilidade em
relação ao manuseio dos equipamentos/ materiais como desfibriladores/cardioversores,
monitores multiparâmetros e oxímetro de pulso além de reconhecer a importância de checar o
funcionamento dos materiais e as condições dos medicamentos antes de assumir um plantão,
pois sabe que só obterá êxito no atendimento se adotar esta conduta.
149
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Em relação ao atendimento constatamos que os profissionais de enfermagem do setor
de emergência da instituição obtiveram um aproveitamento satisfatório na identificação das
ações prioritárias durante o atendimento ao cliente com suspeita de IAM, apesar de não
receberem treinamentos periódicos baseados em protocolos todos os profissionais
demonstraram reconhecer os sinais de uma parada cardiorrespiratória e como atuar diante
deste evento.
Consideramos que a assistência de enfermagem poderia ser enriquecida com a
realização de treinamentos periódicos. O enfermeiro após receber treinamento pode realizar
uma educação continuada com base em protocolos já existentes ou criando protocolos que
seriam adequados à realidade da instituição.
Poderíamos considerar também a adoção de um modelo de atendimento como o da
UDT, visto que não demandaria um maior número de profissionais e nem mesmo mudanças
na planta física da instituição, porém contribuiria para uma melhoria da assistência, pois a
abordagem ao cliente seria mais direcionada e qualificada, com isso reduzindo possíveis
sequelas para o cliente e ainda reduzir o tempo de internação e custos.
As informações obtidas na bibliografia foram confirmadas durante a realização da
pesquisa, ou seja, os sinais e sintomas apresentados pelos clientes, à prevalência do número de
casos do sexo feminino sobre o masculino, a presença de fatores de risco principalmente a
hipertensão arterial e a idade e, outro fator que se destacou, foi o tempo de procura do serviço
de emergência por parte dos clientes que sempre superou duas horas do início dos sintomas o
que poderia reduzir as chances de sucesso no atendimento.
O enfermeiro da estratégia de saúde família pode realizar um papel importante na
redução do tempo de procura do serviço de saúde, realizando trabalhos de prevenção dentro da
sua área de abrangência como palestras e outras atividades que proporcionem a população
orientações sobre os cuidados com a alimentação, a realização de atividades físicas
regularmente, condições de reconhecer os sintomas característicos de um IAM, a importância
em procurar precocemente o serviço de emergência na presença destes visando proporcionar
uma melhor qualidade de vida e principalmente a redução da mortalidade.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Estudos bibliográficos dos benefícios e malefícios dos esteróides anabolizantes derivados
da testosterona e sua relação com o uso na estética e no esporte
Autor
Fábio Huguenin de Oliveira
Curso Farmácia
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientador: Alex da Silva Nismachin
Resumo
Os anabolizantes são drogas sintéticas laboratoriais derivadas do hormônio Testosterona, na
qual foram desenvolvidos para o uso em tratamento de diversas doenças que afetam grande
parte da população. Contudo, em virtude da crescente valorização do corpo pela sociedade
atual, e da euforia de conquista por parte dos atletas, o consumo de substâncias anabolizantes
para obtenção de beleza física e melhor desempenho esportivo tem crescimento nos dias
atuais. O objetivo do trabalho foi conhecer os principais motivos do consumo de
anabolizantes, derivados da Testosterona, além dos principais malefícios causados e os
benefícios no tratamento de diversas doenças. Os anabolizantes são usados em diversos
tratamentos terapêuticos, obtendo grande sucesso na cura de doenças, porém essas substâncias
também geram muitos malefícios a saúde da população, pois o seu uso sem finalidade
terapêutica, tem gerado doenças graves como problemas cardiovasculares e tumores diversos.
As informações, os dados e as definições foram adquiridos através de pesquisas bibliográficas
realizadas em artigos científicos e livros diversos adquiridos sobre o assunto. Portanto o
consumo desses esteróides anabolizantes é restrito apenas ao uso em tratamento de doenças,
com orientação médica, devido aos prejuízos que eles podem causar a saúde dos indivíduos.
Além dos autores dos diversos artigos pesquisados alertarem para os riscos causados pela
utilização de anabolizantes sem finalidade terapêutica.
Palavras-chave: Anabolizantes. Testosterona. Esteróides.
Introdução
Os esteróides anabolizantes são drogas sintéticas, que correspondem ao resultado do
metabolismo do colesterol, sendo produzidos pelo córtex da glândula adrenal, além dos
testículos e ovários. São substâncias que podem ser usadas no tratamento de doenças, no
Professor da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
153
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
aumento do desempenho físico ou simplesmente com finalidade estética (SANTOS et al.,
2006; FORTUNATO et al., 2007).
Derivada do hormônio sexual masculino, a testosterona é a principal substância
anabólica, a qual é produzida em nosso organismo com a capacidade de controlar o
desenvolvimento normal e o funcionamento das características masculinas, além de regular a
manutenção das características anabólicas das células e tecidos (GEBARA et al., 2001).
Entretanto, corresponde a um hormônio encontrado também nas mulheres, sendo que em
concentrações inferiores. Podem trazer grandes malefícios devido ao seu consumo abusivo
(SILVA et al., 2002), sendo que alguns efeitos são reversíveis após a suspensão do mesmo.
Porém, alguns efeitos são permanentes, como impotência sexual masculina, câncer no fígado,
crescimento da próstata e outros. Contudo, também podem trazer benefícios, sendo indicado
no combate a doenças como osteoporose, deficiência de crescimento muscular, câncer de
mama entre outros (GIROTRA et al., 2006; SANTOS et al., 2006).
Os esteróides anabolizantes foram descobertos e desenvolvidos para inúmeros
procedimentos médicos. Atualmente, devido à nova tendência da sociedade em cultivar a
beleza e a estética corporal, o consumo de hormônios anabolizantes com finalidade estética e
com objetivo de melhorar o desempenho entre atletas de diferentes modalidades do esporte,
vem sendo motivos de consumo de anabolizantes sem finalidade terapêutica (IRIART et al.,
2008).
O uso incorreto de anabolizantes hoje em dia não é exclusividade de atletas. Também
são incluídos nesse grupo de risco, os jovens que por sua vez praticam atividades físicas pelo
prazer e bem estar. Sua utilização afeta pessoas de diversas classes sociais, o que pode
representar um grande problema na saúde pública (IRIART et al., 2002).
Atualmente, os anabolizantes são restritamente vendidos, sendo liberados apenas em
casos terapêuticos com o emprego de uma prescrição médica (BRASIL, 2000).
O objetivo deste estudo é conhecer os principais motivos do consumo de
anabolizantes derivados da Testosterona, bem como os principais malefícios do consumo
dessas substâncias e os seus benefícios no combate a diversas doenças que afetam grande parte
da população.
Metodologia
O estudo foi realizado através de pesquisas bibliográficas em sítios científicos, como
Scielo, Periódicos Capes, Scribd, Hcnet, CEBRID e NEJM.org, na qual não foi utilizado
nenhuma delimitação de ano, e utilizando as palavras chaves como anabolizantes, esteróides,
testosterona, esteróides anabolizantes, anabolic, testosterone, esteroideos. Para
complementação foram realizados estudos em livros adquiridos sobre o tema em questão. A
pesquisa foi realizada no período de julho a setembro de 2011.
154
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Resultados e Discussão
Histórico dos Hormônios Anabolizantes
Antes mesmo do surgimento do conceito dos hormônios, os povos antigos buscavam
formas de adquirirem força e coragem para enfrentarem os perigos e desafios da época, sendo
assim, alimentavam-se de órgãos de animais, e até mesmo carne humana, na certeza de
adquirir essas características, confiando em suas crenças antigas. Já na Idade Média, os povos
medievais também utilizavam esses meios na confiança de adquirir a cura de doenças, o
aumento do desempenho físico e o retardo do envelhecimento. Em 1889, um estudioso
fisiologista francês, desenvolveu uma série de experiências com extrato de testículos em
animais da classe dos caninos e suínos, observando variados efeitos como aumento de força
muscular e energia mental nesses animais, descrevendo assim, sua descoberta. Porém, na
época sua experiência não foi publicada cientificamente, sendo comprovada sua eficácia anos
depois, quando foi usada como fundamento para inúmeras experiências até 1930 (SANTOS,
2007).
Os esteróides anabolizantes foram desenvolvidos na década de 1930, quando os
alemães utilizaram em cachorros e posteriormente na 2ª Guerra Mundial, descobrindo que os
efeitos dos esteroides aumentavam a força física, e consequentemente aumentavam também a
agressividade dos soldados, nas batalhas, além de serem usadas nos campos de refugiados, no
intuído de manter os feridos nutridos. Sendo assim, os alemães foram os primeiros a
sintetizarem os esteroides anabolizantes durante a 2ª Guerra Mundial. Após esses eventos
históricos, os anabolizantes passaram a serem utilizados pelos atletas em diversos eventos
esportivos durante a década de 1950, chegando ao comercio popular uma década depois,
sendo utilizados por médicos, em experiências no combate a doenças e por atletas em geral.
Atualmente eles são utilizados para diversos objetivos, como combate a diversas doenças, na
estética corporal e na melhora de desempenho de atletas em geral (SANTOS et al., 2006;
SANTOS, 2007).
Os hormônios anabolizantes são produzidos na glândula supra renal ou adrenal, pelos
testículos e pelos ovários. O Sistema Nervoso Central (SNC) trabalha em conjunto com o
Sistema Endócrino, na regulação dos hormônios corporais, sendo que o SNC controla a
liberação dos hormônios pelas glândulas. A função básica dos hormônios é o aumento da
velocidade das funções celulares. O córtex da glândula supra renal libera uma grande
quantidade de esteróides na corrente sanguínea. Alguns desses esteróides possuem baixa
atividade biológica, atuando apenas como precursores. Esses hormônios Esteróides
Androgênicos Anabólicos (EAA), mais conhecidos como anabolizantes referem-se ao grupo
dos hormônios sexuais masculinos. Porém produzidos em pequena quantidade nas mulheres.
(GEBARA et al., 2001; IRIART et al., 2008).
As formas farmacêuticas de apresentação dos anabolizantes são diversas, sendo elas
spray nasal, creme ou pomada, supositório, selo de fixação na pele, sublinguais, e os mais
conhecidos que corresponde a forma injetável e oral. A forma farmacêutica injetável e
administrada unicamente por via intramuscular, essa forma é defendida pelos usuários, pois se
155
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
trata de uma forma que não precisa ser digerida pelo organismo, pois já entra direto na
corrente sanguínea, sendo escolhida principalmente pelos usuários mais experientes. É usada
normalmente, pois varia do tipo de fármaco escolhido, através de um ciclo, na qual as doses
em maiores quantidades são aplicadas sucessivamente com intervalos que variam de
aproximadamente 30 à 120 dias. Os compostos anabolizantes administrados por via oral
acabam sendo os mais comuns, pois a maioria dos interessados não estão dispostos a injetar a
droga no corpo, optando assim, pela forma mais prática, que acaba sendo a via oral. Porém
essa forma é a mais agressiva ao fígado, pois precisa ser usada varias vezes ao dia, durante o
ciclo de uso. Alguns exemplos de anabolizantes de maior porcentagem de consumo
correspondem aos esteroides contendo princípio ativo com base de oximetolona, oxandrolona,
metandrostenolona e o estanazolol. Já em relação aos injetáveis mais utilizados são os
anabolizantes contendo o isoproato de testosterona, o cipionato de testosterona e o decanoato
de nandrolona, que por sua vez, corresponde à substância anabólica com maior frequência nos
exames de dopagem dos atletas de diferentes modalidades esportivas. Alguns desses princípios
ativos são utilizados para tratamento de doenças, sendo ilustrados nas tabelas 1 e 2, sendo a
tabela 1 correspondente aos anabolizantes de via oral e os da tabela 2, de via intramuscular
(GEBARA et al., 2001; MARQUES et al., 2002; FORTUNATO et al., 2007; SANTOS,
2007).
TABELA 1: Alguns anabolizantes de consumo Via oral utilizado com finalidade terapêutica
(Fonte: Goodman e Gilman: As Bases Farmacológicas da Terapêutica, 1996).
QUADRO 1: Alguns anabolizantes de consumo Via intramuscular utilizado com finalidade terapêutica (Fonte:
Goodman e Gilman: As Bases Farmacológicas da Terapêutica, 1996).
156
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Testosterona: principal hormônio anabolizante
Dentre as substâncias anabólicas mais importantes encontram-se a testosterona e seus
derivados. Na década de 1950, os estudiosos descobriram que essa substância possuía duas
atividades opostas, ou seja, a atividade anabólica e a androgênica. A função anabólica está
relacionada com a capacidade de formação de tecidos musculares, pois o crescimento do
músculo está diretamente ligado à suplementação hormonal adequada, pois a diminuição de
hormônios anabólicos causa deficiência muscular (DOURADO et al., 2004). Já as atividades
androgênicas, são responsáveis pela feminilidade nos homens, doença conhecida como
ginecomastia, além dos efeitos opostos nas mulheres, ou seja, características masculinas.
Concluindo assim, que os esteróide anabolizantes utilizados para crescimento muscular, ou
com finalidade anabólica, resultavam, também, nos efeitos androgênicos, ou seja, concluíram
que as duas atividades da Testosterona estavam interligadas. A partir dessa descoberta,
iniciaram-se os estudos para separar as duas funções da substância, não chegando a resultados
positivos, pois descobriram que não podiam separar as duas atividades, apenas diminuir os
efeitos androgênicos e aumentar os anabólicos, criando, assim, os esteróides anabolizantes
sintéticos. Portanto, os esteróides anabolizantes são produtos químicos derivados da
Testosterona, que por sua vez, é formada nos testículos e no córtex adrenal, compreendendo as
substâncias responsáveis pelo desenvolvimento das características sexuais secundarias, que
estão relacionadas a masculinidade no período da adolescência e na maior idade, além da
maturação dos espermas, sendo responsáveis também, pelo desenvolvimento e manutenção
das funções do sistema reprodutor do organismo humano masculino, porém em mulheres a
concentração deste hormônio é muito menor do que observa-se no sexo masculino, possuindo
assim maior importância no desenvolvimento das características masculinas. Além dessas
atividades da Testosterona no organismo, ela também é responsável pelo processo de
biossíntese de proteínas, que por sua vez, leva a aceleração da produção dos músculos, ao
aumento das células vermelhas, e a estimulação do metabolismo corporal, causando a perda de
157
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
gordura no organismo, e por fim é responsável pelo desenvolvimento e manutenção das
características anabólicas dos tecidos (GEBARA et al., 2001; SANTOS et al.,2006;
SANTOS.,2007; CRUZAT et al., 2008).
A Testosterona e seus derivados são de extrema importância para a manutenção das
funções reprodutivas e sexuais do sexo masculino. Sendo responsáveis, portanto pelas divisões
e diferenças sexuais heterogaméticas realizadas dentro do útero materno, no período de
gestação. Além do desenvolvimento e das mudanças sexuais secundárias ocorridas no período
da puberdade dos jovens. Sendo ainda, responsáveis pela manutenção da vida sexual adulta
dos homens, tendo assim, papel decisivo na fertilidade do sexo masculino (FORTUNATO et
al., 2007).
A síntese da Testosterona é estimulada pelo hormônio luteinizante (LH), que por sua
vez é produzida pela glândula Pituitária, mais conhecida como Hipófise, além dos hormônios
adrenais, que são estimulados pela ação do hormônio ACTH (adrenocorticotrópico), que
estimula os hormônios adrenais, e também aumenta a produção de testosterona no organismo.
Com a ação desse hormônio, a molécula de colesterol, que por usa vez é o precursor de todos
os hormônios sexuais, é convertida em outro hormônio, chamado Pregnolona, sendo assim, se
a concentração de ACTH aumenta no organismo, a Pregnolona também aumenta, levando ao
aumento consequente da Testosterona. No final dessa cadeia química, resulta a formação da
Testosterona, que sob influência do hormônio LH, é transformada em estrogênios, sendo em
uma concentração menor nos homens e maior nas mulheres (SANTOS, 2007).
Porém as moléculas da testosterona não possuem efeitos quando utilizadas sozinhas,
ou seja, na mesma forma estrutural, sem sofrer nenhuma mudança. Isso ocorre, pois a
testosterona em sua forma estrutural inicial esta muito apta a sofrer a metabolização, que
corresponde a sua inativação, rapidamente pelo fígado. Portanto, sua estrutura química
necessitou sofrer reações de alquilação, para formar esteróides anabolizantes de via oral e
sofrer reações de esterificação, para formação de esteróides injetáveis. Essas reações de
esterificação contribuem para que a molécula de testosterona ganhe maior consistência,
possuindo assim, maior concentração, permanecendo no corpo por maior período de tempo
(FORTUNATO et al., 2007).
Em relação ao metabolismo, uma parte da testosterona e transformada em metabólitos
biologicamente ativos, ou seja, metabólitos que ainda possuem as atividades da molécula
inicial, contudo a maioria dos metabólitos formados são inativos, ou não exercem atividades
mais no organismo, sendo assim, são excretados pelo sistema renal e vias biliares. Resultando
na inativação predominante no fígado, através do metabolismo hepático acelerado, que gera
uma baixa biodisponibilidade dos anabolizantes usados por via oral, ou seja, diminui o Tempo
de meia vida da substância, que corresponde ao tempo em que a concentração do fármaco
permanece ativa no organismo. E por sua vez aumenta o Tempo de meia vida dos
anabolizantes injetáveis, usados por via intramuscular (GEBARA et al., 2001).
158
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Motivos do Consumo de Esteróides: Esporte e Estética
Os primeiros casos de consumo de substâncias com função estimulante e anabólica
no esporte ocorreram na Grécia Antiga em aproximadamente 800 a.C. Eram usadas
substâncias como Estricnina, com ação estimulante e cogumelos alucinógenos, para reforçar
os músculos antes das competições. Os casos de consumo anabolizantes continuaram nos
esportes romanos, onde eram usadas substâncias para aumentar a velocidade dos cavalos e a
agressividade dos gladiadores ao lutarem nas arenas. Com o passar dos anos, o consumo de
esteróides no esporte só aumentou, com objetivo de melhora de desempenho e aumento de
vitórias por parte dos atletas (NETO, 2001).
O Comitê Olímpico Internacional (COI) passou a ter controle oficial sobre o uso de
substâncias anabólicas no esporte a partir da década de 60, nos Jogos Olímpicos de Inverno,
na França. Porém, apenas algumas substâncias estimulantes e narcóticas podiam ser
identificadas. Somente na década de 80 que conseguiram unir todos os instrumentos
necessários para implantar o exame de detecção de substâncias anabólicas em atletas. Já no
século XXI, o controle de dopagem de atletas chegou a um patamar mais elevado, na qual
passou a serem diagnosticadas também, as chamadas drogas sociais (cocaína, maconha, entre
outras) (NETO, 2001).
Portanto, observa-se que a pratica de exercícios físicos e atividades esportivas de
competições sempre foram fatores importantes na influência de atletas e jovens ao consumo de
anabolizantes. Pois desde o surgimento das disputas e jogos esportivos, os atletas eram
induzidos à obrigação de terem resultados positivos e favoráveis, pois os tornariam conhecidos
pela população. Com isso, os competidores faziam todos os meios possíveis e impróprios que
os ajudassem, a chegar ao objetivo final. Apesar dessas praticas serem antigas, atualmente
ainda existe essa ganancia pela fama e destaque, levando muitos atletas a terem seus futuros
desperdiçados, pelo uso de meios impróprios, como consumo de anabolizantes no interesse de
adquirirem vantagens sobre os adversários, esquecendo-se, porém, que essas praticas, hoje em
dia, são extremamente proibidas pelas comissões esportivas existentes. São grandes os
prejuízos aos atletas que desrespeitarem as regras, entre as consequências, a mais importante é
o fato do atleta ser banido do esporte, não permitindo mais a sua participação em jogos oficias,
entre outras consequências (LISE et al., 1999; CASTILHO et al., 2001; ARAUJO et al., 2002;
SANTOS, 2007).
Um dos hormônios anabólicos mais encontrados nos casos de dopagem de atletas é o
Decanoato de Nandrolona, substância derivada da Testosterona, mais precisamente da 19nortestosterona, que é metabolizada no organismo humano, resultando em metabólitos, como a
Norandrosterona, que possui maior concentração na urina, possuindo, portanto, maior poder
de excreção. É o mais utilizado, pois corresponde um anabolizante de aplicação injetável e de
rápido efeito no organismo (MARQUES et al.,2002; SANTOS, 2007).
O grande aumento da valorização do corpo, na atual sociedade, percebida pelos meios
de comunicação de grande impacto, que estipulam como modelos ideais, os com corpos
sarados e altamente musculosos, corresponde alguns dos motivos e formas de incentivos para
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
o crescente uso de anabolizantes entre os jovens, com intenção de obterem um rápido
crescimento muscular. Até pouco tempo era mais frequente essas intenções por pessoas do
sexo feminino, pois sempre foi mais evidente a preocupação das mulheres com a aparência
física e sua estética corporal, observados através das propagandas que induziam a obtenção de
uma aparência física ideal. Porém, estão cada vez mais frequentes essas preocupações também
por parte do sexo masculino, pois a sociedade estipula como aparência ideal para os homens, o
corpo físico moldado pelos músculos desenvolvidos, gerando assim uma impressão de
obtenção de força física. O alto consumo dessas substâncias entre os jovens e fisiculturistas,
que corresponde aos praticantes de exercícios físicos, com pesos, visando à modelagem do
corpo através do desenvolvimento da musculatura, tem sido observado e registrado por vários
países. (IRIART et al., 2002, NOTO et al., 2002).
Porém, esse consumo não está apenas entre os jovens de classe baixa, vem obtendo
grande aumento entre os jovens de classe alta, o que já podemos dizer que representa um
grave problema para a saúde pública. Além disso, os meios de comunicação têm alertado para
consumo dessas substâncias nas academias de musculação, chamando, assim, a atenção para
graves efeitos colaterais, decorrentes do seu alto consumo (IRIART et al., 2002; MARQUES
et al.,2002).
No Brasil, segundo a Lei 9.965 de 27 de abril de 2000, foi restrita a venda de
esteróides e substâncias anabolizantes, apenas para casos com finalidade terapêutica, na qual a
venda será realizada apenas com receituário devidamente preenchido pelo médico
responsável. E qualquer venda sem essas especificações estará, o infrator, sujeito a
penalidades. Porém essas substâncias ainda são obtidas a partir de vendas clandestinas, sem
controle e sem licença legal e nas próprias academias (BRASIL, 2000; SILVA et al., 2006).
Malefícios do Consumo de Anabolizantes
Ao pesquisar e desenvolver um medicamento ou produto para saúde os pesquisadores
precisam se preocupar com um problema muito grave que pode levar os consumidores e
pacientes a sérios problemas de saúde. Esse problema é chamado de efeitos colaterais ou
efeitos adversos, que é causado quando o princípio ativo do medicamento consegue se ligar
em vários receptores do organismo, ou seja, o medicamento consegue agir em diferentes
órgãos do organismo, gerando multiplicidade de reações, causando efeitos que não estavam
previsto, ou seja, efeitos inesperados. Além disso, ainda existem os perigos voltados para as
consequências das interações medicamentosas, causadas pela interação do medicamento com
outros tipos de alimentos ou na utilização de vários medicamentos de diferentes efeitos ao
mesmo tempo, que pode resultar na perda do efeito do fármaco, ou ainda pior aumentar a
potencia do medicamento no organismo, gerando graves problemas a saúde do paciente. Além
dessas causas, os efeitos colaterais também estão relacionados com o uso incorreto do
medicamento, que por sua vez esta diretamente relacionada com o fato do individuo no
desespero de conseguir alcançar a cura ou o resultado do tratamento, o leva a aumentar as
doses sem consultar um profissional, resultando na automedicação. Já em relação aos
anabolizantes existem também os riscos dos efeitos negativos causados pela falsificação
desses produtos, levando até o individuo um droga que além de não causar os efeitos
160
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
desejados, vai causar efeitos colaterais, prejudiciais a sua saúde (WONG, 2003; FRANCO et
al., 2006; VIRELLA, 2008).
Portanto, é de extrema importância alertar à população em geral e, principalmente os
jovens e os atletas, a respeito dos maléficos do abuso de esteróides anabolizantes. Pois todo
medicamento possui um rígido controle desde a sua pesquisa até o consumo do mesmo pelo
paciente, com objetivo de impedir os efeitos colaterais ou diminuir os seus danos ao paciente
(IRIART et al., 2002).
Alguns sintomas são determinantes para identificação de indivíduos que utilização
anabolizante de forma não terapêutica, mas com objetivo estético ou esportivo, sendo esses
sintomas caracterizados pelo ganho excessivo e rápido do peso corporal, com grande alteração
nas partes externas do corpo, sinalizando uma grande hipertrofia corporal, além do
aparecimento de grande quantidade de acnes pelo rosto, marcas de agulhas nos músculos do
corpo, surgimento da calvície repentina, entre outras características (SANTOS, 2007)
Para indicar os malefícios do consumo de esteróides, primeiramente é preciso alertar
sobre os perigos das infecções causadas pela transmissão sanguíneas, através do uso de
equipamentos não esterificados corretamente. Algumas dessas complicações são: os abscessos
cutâneos, acúmulos de substâncias infectadas; infecção pelo vírus do HIV, da Hepatite B e por
outros agentes de transmissão parenteral. Além dos traumas locais ocorrentes da má
administração desses produtos injetáveis. Ainda não podemos comprovar a relação direta do
uso de anabolizante ao infarto de miocárdio, mais o consumo dessas substâncias gera fatores
de riscos como dislipidemia, que é a presença anormal de lipídeos no organismo, alterações na
coagulação e hipertrofia do músculo miocárdio. Outros efeitos de grande importância,
relacionados ao consumo de anabolizantes são: atrofia testicular, na qual o órgão sexual
masculino diminui de tamanho, podendo causar a infertilidade; ginecomastia, que corresponde
ao crescimento das mamas nos indivíduos do sexo masculino; hipertensão arterial, que
compreende a uma das doenças com maior prevalência no mundo moderno, que é o aumento
da pressão arterial (PELUSO et al., 2000; IRIART et al.,2002; IRIART et al., 2008; SÁ et
al., 2009).
Os sintomas normais e diretos como cefaléia, náuseas, tonturas, irritabilidade, acne,
febre e aumento dos pêlos corpóreos, infelizmente acabam ficando como sintomas normais,
pelos usuários de anabolizantes. Outros sintomas decorrentes do uso de anabolizantes são
alterações no desempenho sexual e redução do volume de esperma, no sexo masculino. Muitos
indivíduos procuram amigos, parentes e pessoas conhecidas, que possuem algum
conhecimento de enfermagem, para administrarem os anabolizantes, como forma de
prevenção. Porém, é importante alertar que essas estratégias de prevenção não possuem
embasamento cientifico ou são realizadas de forma correta. O uso dessas substâncias também
tem sido relacionado a alguns fatores de riscos cardiovasculares, como hipertrofia ventricular,
arritmia, trombose, alteração da função do fígado, podendo acarretar doenças como hepatite e
hiperplasia, concluindo, portanto, que as causas de óbitos pelo consumo de anabolizantes estão
relacionadas, principalmente pelo uso prolongado da droga ou pelo consumo de altas doses,
além dos fatores de risco relacionado ao consumo dos anabolizantes, como infarto do
161
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miocárdio, trombose, tumores, entre outros, levando o indivíduo a morte. É preciso alertar
também que o consumo de esteróides por adolescentes e mulheres, mesmo por curto período
de tempo, pode ocasionar efeitos colaterais irreversíveis. No sexo feminino esses efeitos
compreendem as alterações na menstruação, engrossamento da voz, encolhimento dos seios,
aumento da libido, crescimento de cabelos no corpo e aumento do tamanho do clitóris, além
do câncer de próstata, nos homens, além de serem responsáveis pela impotência sexual nos
homens (LISE et al., 1999; PELUSO et al., 2000; NOTO et al., 2002; SANTOS et al.,2006;
SANTOS 2007; IRIART et al., 2008; LUNA et al., 2009; RHODEN et al., 2009;
VENÂNCIO, 2010; UNIFESP, 2001).
Apesar de serem muitos os malefícios do consumo de anabolizantes, ainda existem os
problemas relacionados com a abstinência do uso de esteróides, que correspondem às
mudanças psíquicas nos indivíduos consumidores dessas substâncias. Através do uso de longo
prazo, os indivíduos começam a sofrer, mudanças comportamentais, que resultam em formas
de agir agressivamente, ou momentos de raiva repentina, que para alguns esportistas, são
consideras características vantajosas, pois auxiliam aumentando a disposição para o
treinamento, permitindo assim, o aumento da carga horária dos treinos, resultando em efeitos
esperados imediatos. Porém, adquirindo com isso consequências graves, como perda de
amizades, devido à forma agressiva de agir, destruição dos relacionamentos familiares, que
por fim, resulta na diminuição da autoestima do individuo, resultando em um problema
psicológico ainda maior, que corresponde ao sentimento de depressão, um problema que está
relacionado com a maioria dos atletas, pois um bom desempenho atlético, não esta ligado
apenas ao consumo de anabolizantes, é preciso uma boa dieta, acompanhamento de um
médico nutrólogo, realização de atividades físicas, entre outras. Entretanto, os indivíduos após
consumirem essas substâncias, na esperança de adquirirem melhores desempenhos, não
observam a necessidade da realização das atividades complementares necessárias ao bom
desempenho, confiando que o anabolizante irá funcionar sem essas tarefas. Todavia, quando o
indivíduo conclui que o resultado não foi satisfatório, e resultou em prejuízos para sua saúde e
para sua vida, como a perda dos amigos e familiares, ele entra no quadro de solidão ou
depressão psicológica.
Um método preventivo para esse quadro depressivo corresponde em diminuição dos
ciclos do consumo, resultando em menores doses e diminuição dos efeitos negativos, e
evitando assim, o quadro de depressão psicológica (LISE et al., 1999; PELUSO et al., 2000;
SANTOS 2007).
Benefícios do consumo de anabolizantes no tratamento de diversas doenças
Um dos primeiros casos de uso de anabolizantes para tratamento de doenças ocorreu no
período da 2ª Guerra Mundial, na qual eram utilizados os esteróides no tratamento de
pacientes com altos riscos de vida, chegando ao estado terminal, relacionados com a
debilidade crônica, além do uso para traumatismo, queimaduras e ajudando na recuperação de
cirurgias de grandes riscos. Contudo, o uso dessas substâncias começou a ganhar maior
aceitação no meio hospitalar a partir da década de 50. E atualmente vem sendo utilizadas em
muitos tratamentos médicos, com deficiência de andrógenos, como o hipogonadismo, que
162
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
corresponde à diminuição das funções das gônodas (ovários ou testículos), no crescimento
retardado, em casos de micropênis neonatal e em doenças crônicas na concepção hormonal
masculina. Essa terapia, constituída por uso de esteróides pode ser utilizada, também, no
tratamento da anemia causada por problemas na medula óssea ou em rins, no combate ao
câncer de mama avançado, em adolescentes com estatura exagerada, e em casos especiais de
obesidade. Em doses por via transdérmica, existem relatos sobre o uso em tratamento de
doenças cardiovasculares. Além dessas funções, os órgãos governamentais reguladores das
funções das diversas drogas existentes, aprovam, também, como funções primordiais das
Esteróides Androgênicos Anabólicos (EAA), o uso para obtenção de aumento de peso
corporal de pessoas portadoras da SIDA, em crianças com retardo no desenvolvimento das
características secundarias, como por exemplo, engrossamento da voz, além do tratamento, de
anemias refratária, devido os anabolizantes aumentarem a eritropoiese, e também no
tratamento da insuficiência renal aguda, pois resultam na diminuição da produção de ureia.
São usados, também, no tratamento de sarcopenia, que é a perda de massa dos músculos,
associada à cirrose alcoólica, doenças que obstrui os pulmões, e pacientes com queimadura
grave e combate à fadiga em indivíduos com doenças renais crônicas (LISE et al., 1999;
PELUSO et al., 2000; RIBEIRO, 2001; SILVA et al., 2002; FORTUNATO et al., 2007;
SANTOS, 2007).
O uso de anabolizantes ampliou, ainda mais, as opções terapêuticas, pois estimulam
diretamente a formação do tecido ósseo, reduzindo a incidência de fraturas, além do aumento
da massa óssea. Porém o único agente anabólico aprovado nos EUA foi a Teriparatida, que
tem sido a principal abordagem em pacientes, pois aumenta a densidade óssea, melhora a
microarquitetura, e altera o tamanho do osso, reduzindo a ocorrência de fraturas vertebrais e
não vertebrais. Esse produto é aprovado para mulheres no período de pós-menopausa e para
homens com problema de osteoporose, que apresentam riscos de fraturas (PONTES JR et al.,
2003; GIROTRA et al., 2006; LUNA et al., 2009).
Os anabolizantes são substâncias que estão diretamente ligadas à saúde da população,
sendo no combate a doenças ou auxiliando no desenvolvimento delas. Por se tratar de uma
substância química sintética derivada da Testosterona produzida em laboratório, pode-se
observar que sua descoberta foi na esperança de combater diversas doenças, sendo que,
conforme Santos (2007) explicou, no decorrer das pesquisas foram descobertos os efeitos
adversos desses esteróides que, resultavam no desenvolvimento de outras doenças graves a
saúde da população. Segundo pesquisas realizadas em Goiânia e Porto Alegre, no Brasil,
respectivamente por Araújo et al (2002) e Silva et al (2006), obtém-se que o uso de
anabolizantes com objetivo estético tem adquirido grandes proporções. Ao analisar as
pesquisas do Araújo et al (2002), observa-se que 34% dos entrevistados, que corresponde a 62
indivíduos do sexo masculino, de um total de 183, consumia substância anabólica com intuído
de melhora de desempenho esportivo, ou simplesmente melhora estética. Já a pesquisa de
Silva et al (2006) obteve como fator principal para a utilização de anabolizantes a melhora da
estética corporal, significando 83% do total dos indivíduos que faziam uso de esteróides, que
representavam 11% ou 32 pessoas, do total de 288 entrevistadas, além disso, observou-se que
a maioria dos praticantes de musculação, correspondentes a 76% eram indivíduos que já
163
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haviam cursados ou estavam cursando ensino superior, demostrando que as pessoas tem
conhecimento e ciência dos riscos do consumo de substâncias anabólicas.
Observa-se que, a valorização ao corpo vem crescendo no meio da sociedade,
observadas pelas propagadas induzindo ao corpo físico ideal, formado por músculos
desenvolvidos, e pela beleza estética, defendida por Iriart et al (2002) como fator
predominante para o aumento desse consumo com finalidade estética, a exigência da
população pelo corpo físico ideal, formado pelos músculos desenvolvido, além das
propagandas e comercias que induzem e seduzem a população a desejar obter esse corpo físico
ideal. Sendo que esses motivos também foram comprovados pelas pesquisas realizadas pelo
autor Noto et al (2002).
Outro fator determinante para o consumo de anabolizantes é a vontade de adquirir um
melhor desempenho nas competições esportivas, por parte dos atletas, que corresponde,
conforme pesquisas de Neto (2001), uma prática muito antiga, existente desde o inicio dos
jogos olímpico, que veio crescendo em grande percentual na atualidade, sempre utilizado por
atletas de diversas modalidades esportivas. Em contra partida os autores Araújo et al (2002) e
Castilho et al (2001) alertam as atletas sobre os riscos de consumirem anabolizantes nas
práticas esportivas atualmente, devido ao rigoroso e avançado processo de fiscalização, que
permite identificar qualquer substância que seja proibida pelas organizações internacionais,
gerando ao atleta identificado pelo doping, sérios problemas, sendo como consequência mais
grave, a proibição da participação de jogos esportivos.
Para comprovar os riscos dos anabolizantes Silva et al (2002) chama a atenção para a
restrição do consumo de esteróides apenas para tratamentos terapêuticos, com a retenção do
receituário médico, por parte da farmácia, chegando a informar a lei brasileira que restringem
essa comercialização, no Brasil, que apesar de serem proibidas por lei, a comercialização sem
receituário e consentimento médico, ainda são feitas, segundo Santos et al (2006) e Iriart et al
(2002) nas próprias academias ou pela internet.
Apesar do consumo dos anabolizantes trazerem benefícios físicos e esportivos aos
consumidores, existem os problemas psicológicos e os riscos para saúde, que podem levar os
praticantes e consumidores a óbito. Segundo vários autores como: Lise et al (1999), Peluso et
al (2000), Santos et al (2006), Santos (2007) e Luna et al (2009), os malefícios dos
anabolizantes são variados e de grandes prejuízos a saúde, atuando em diversos órgãos e
partes do corpo, dificultando o tratamento, e gerando doenças graves, resultantes de mortes,
como problemas cardiovasculares e tumores no fígado.
Em confronto direto com os malefícios, além dos benefícios estéticos e no esporte,
ainda existe a utilização dos esteróides, derivados da Testosterona, no tratamento de diversas
doenças que afetam grande parte da população, que segundo alguns autores como: Ribeiro et
al (2001), Silva et al (2002), Pontes Jr et al (2003), Girotra et al (2006), Fortunato et al (2007)
entre outros, essa utilização compreende a justificativa para o consumo da substância, pois foi
para esse objetivo que os esteróides anabolizantes foram desenvolvidos. Além disso, Silva et
al (2002), defendem que os malefícios na maioria das vezes, ocorrem pela negligencias dos
164
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usuários, pois consomem as substâncias de forma irregular, e em doses elevadas, que por sua
vez, geram as diversas doenças já discutidas anteriormente.
Considerações Finais
Observa-se que, em virtude das novas tendências da sociedade atual, de defender e
divulgar em vários meios tecnológicos as novas escolhas por um corpo físico ideal, possuindo
os músculos bem desenvolvidos e bem destacados, levaram ao aumento do consumo de
esteróides anabolizantes com objetivo estético, pois são os anabolizantes derivados da
Testosterona os responsáveis pelo desenvolvimento e crescimento dos músculos, segundo as
pesquisas do Girotra et al (2006), Luna et al (2009), entre outros. Além disso, ainda existe o
motivo esportivo, pois a vontade de obter melhor desempenho nas atividades e competições
esportivas, sempre levou os competidores a usarem diversos métodos para conseguirem obter
seus objetivos, o que também resultou como motivo de consumo de anabolizantes, pois essas
substâncias auxiliam no desenvolvimento físico, ajudando os atletas nas competições,
defendida pelo Neto (2001), como fundamental para o aumento do consumo dessas
substâncias. Porém, apesar de resultar em melhores desempenhos esportivos, esse consumo é
proibido pelas organizações esportivas, pois são consideradas formas ilegais de competição,
gerando consequências graves aos praticantes que a consumirem antes dos jogos esportivos
(CASTILHO et al., 2001; ARAUJO et al., 2002)
Em contra partida, nota-se que apesar das vantagens estéticas e esportivas serem de
grande aceitação pela sociedade, os malefícios do consumo desses anabolizantes são
prejudiciais à saúde dos consumidores, podendo levá-los a morte, pois são responsáveis por
causarem doenças cardiovasculares e tumores no fígado, entre outros perigos.
Portanto, conclui-se que, apesar das doenças causadas pelos anabolizantes serem muitas,
existe a forma benéfica para o uso desses esteróides, como por exemplo, no tratamento de
diversas doenças que tem afetado grande parte da população mundial, sendo algumas dessas
doenças a osteoporose e o déficit no crescimento muscular. E por isso o uso dos anabolizantes
é restrito apenas aos casos terapêuticos, na qual ainda não existem outras alternativas, pois os
riscos do consumo são grandes e suas consequências catastróficas, conforme foi relatado e
defendido pelos diversos autores mencionados anteriormente.
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167
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Disfunção Erétil:
aspectos anátomo-morfológicos e
a farmacologia do tratamento
Autor
Alan de Oliveira
Curso Farmácia
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientador: Alex da Silva Nismachin
Resumo
Disfunção erétil é a incapacidade de obter ou manter uma ereção para que ocorra uma relação
sexual satisfatória. A disfunção erétil é considerada como uma doença à nível cardiovascular,
e desta forma, a sua ocorrência indica que provavelmente alguma alteração cardiovascular está
ocorrendo. Muitas são as causas da disfunção erétil, sendo então, considerada como uma
doença multifatorial, porém, suas etiologias podem ser de origem orgânica, psicogênicas e
mistas, onde dentro de cada categoria há subdivisões que por muitas das vezes a disfunção
erétil é enquadrada. Sabe-se que a disfunção endotelial é a maior causa dos quadros de
disfunção erétil, que por meio de alterações à nível endotelial dá-se início a processos
ateroscleróticos e inflamatórios, diminuição da formação de óxido nítrico. Os tratamentos para
a disfunção erétil englobam as técnicas cirúrgicas de colocação de próteses penianas, autoinjeção de substâncias vasodilatadoras e músculo-relaxadoras até aos tratamentos orais, que
constituem a maior parte da terapêutica. Dentro da terapêutica oral encontram-se os
medicamentos inibidores da enzima Fosfodiesterase - 5, que é a responsável pela linearização
do GMP cíclico, como o sildenafil, tadalafil, vardenafil, carbonato de lodenafila, estes
alcançam ótimo resultado, conforto ao paciente e melhoria da qualidade de vida do indivíduo.
Palavras-chave: Disfunção erétil. Sildenafil. Tadalafil. Vardenafil. Carbonato de lodenafila.
Introdução
Caracteriza-se como disfunção erétil a incapacidade de obter e/ou manter uma ereção
suficiente para que haja um desempenho sexual satisfatório (FREITAS et al., 2008;
MATHEUS et al., 2009; LAYDNER et al., 2009).
Uma preocupação concernente da atualidade é o uso de medicamentos para disfunção
erétil por homens jovens que não sofrem de disfunção erétil, uso recreativo. Em um estudo
realizado na cidade de São Paulo - SP - Brasil, 14,7% dos jovens entrevistados já haviam
Professor da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
168
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
usado algum desses medicamentos, onde na maioria das vezes por curiosidade, para que
houvesse potencialização da ereção, contra ejaculação precoce e para aumentar o prazer
(FREITAS et al., 2008).
Atualmente, a disfunção erétil é considerada inicialmente como uma alteração a nível
cardiovascular, agindo por muitas das vezes como um marcador de doenças cardiovasculares
(LAYDNER et al., 2009).
As causas da disfunção erétil podem ser divididas em orgânicas, que possuem origem
vasculogênica, neurogênica, endócrina; e causas psicogênicas, que estão relacionadas ao
estresse emocional, coerção sexual, problemas de relacionamento, depressão. Na avaliação
clínica do indivíduo com disfunção erétil, deve-se levar em conta o histórico do paciente,
exames físicos, exames laboratoriais de nível sérico de testosterona, glicemia e lipídios, e a
avaliação psicológica desse paciente (MATHEUS et al., 2009).
Porém, nos dias de hoje se conhece que a disfunção endotelial é etiologia de maior
ocorrência na disfunção erétil, caracterizando-se como alterações a nível de endotélio, capazes
de promover doenças ateroscleróticas e cardiovasculares, danificando o endotélio (COSTA ;
VENDEIRA, 2007). Essa aterosclerose pode ser iniciada por processos inflamatórios e
estresse oxidativo, modificando a função plaquetária e o estado contrátil e proliferativo das
células musculares lisas vasculares, alterando, então, a vasodilatação mediada pelo endotélio,
que é importante na ereção. Na disfunção erétil encontram-se então, uma série de marcadores
inflamatórios aumentados. Ocorrendo também formação diminuída de óxido nítrico (NO),
diminuição de células precursoras da medula óssea que reparam as células endoteliais no
sangue periférico (LAYDNER et al., 2009).
A integridade endotelial cavernosa é importantíssima para a ocorrência de ereção. Para
tal, mecanismos de vasculoproteção são acionados, chamados de mecanismos de angiogênese
(proliferação e migração de células endoteliais adjacentes até o local afetado para repará-lo) e
vasculogênese (as células progenitoras endoteliais vão para os locais de neoagiogênese, se
diferenciando e regenerando o endotélio). Na disfunção erétil, esses mecanismos estão
desajustados. O Fator de Crescimento do Endotélio Vascular (VEGF), que media esse
processo, está alterado no corpo cavernoso. Os Inibidores de Fosfodiasterase – 5 (PDE-5)
fazem uma indução do recrutamento das células progenitoras, ocorrendo a vasculoproteção
(COSTA ; VENDEIRA, 2007).
Porém, a disfunção erétil nem sempre esta ligada à doenças cardiovasculares
(LAYDNER et al., 2009). Em indivíduos que necessitam de hemodiálise, e por conta disso,
acabam por desenvolver algum tipo de disfunção gonodal, hiperprolactinemia, deficiência de
zinco, iodo, manganês e anemia, também podem desenvolver disfunção erétil (SANTOS et al.,
2008).
Em indivíduos que necessitam de antipsicóticos, como os que sofrem de esquizofrenia,
a taxa de disfunção sexual (entre ela a disfunção erétil) pode chegar à 60%, devido ao efeito
169
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
produzido pelos antipsicóticos, contra 30% dos homens em geral que desenvolvem algum tipo
de disfunção sexual (NUNES et al., 2008)
A disfunção sexual está ligada à diminuição da qualidade de vida, decréscimo na
formação de relacionamentos (problemas sociais que levam à dificuldades de interpessoais) e
redução da intimidade (NUNES et al., 2008; SANTOS et al., 2008).
Dentre os tratamentos medicamentosos, citam-se os Inibidores de Fosfodiasterase – 5,
(PDE-5) (sildenafil, tadalafil, vardenafil), que compreendem a terapia de maior sucesso
(FREITAS et al., 2008; MATHEUS et al., 2009).
A avaliação psicológica, injeções intracavernosas, e próteses penianas, também
constituem tratamentos contra a disfunção erétil (MATHEUS et al., 2009).
O objetivo desse trabalho é realizar uma revisão da literatura referente às questões
relacionadas à disfunção erétil como, sua etiologia, problemas posteriores trazidos aos
indivíduos que sofrem de tal doença e tratamentos mais utilizados, ressaltando o uso de
inibidores de PDE-5.
Metodologia
Essa revisão foi feita através de artigos específicos disponibilizados na internet, em
sites como Scielo, Bireme, Biblioteca Virtual da Saúde, LILACS e revistas especializadas na
área que tange tal revisão, pesquisadas também na internet. Para que a pesquisa fosse
realizada, utilizou-se de palavras-chave como disfunção erétil, sildenafil, tadalafil, vardenafil,
carbonato de lodenafila, pênis. Não houve delimitação do ano de publicação dos artigos, e a
pesquise se deu de 10 de Janeiro de 2011 à 8 de Setembro de 2011.
Desenvolvimento
Anátomofisiologia Peniana
O aparelho genital masculino (figura 1) funciona tanto como órgão copulador como
órgão excretor (BARROS et al., 2005; ANDRADE, 2010; FARIA et al., 2005),
compreendendo as seguintes estruturas: próstata, vesículas seminais, ductos ejaculatórios,
glândulas bulbouretrais, pênis, testículos, epidídimo e ductos deferentes, porém nem todas as
estruturas funcionam como estruturas excretoras (BARROS et al., 2005).
O pênis em si é dividido em três partes, raiz, corpo e glande (FARIA et al., 2005) e é
nutrido pela artéria pudenda interna e drenado pela veia dorsal profunda. No corpo do pênis
encontram-se os corpos cavernosos e corpo esponjoso, ambos, são envolvidos pela fáscia de
Buck, e por uma pele glabra. Ao momento em que a pele se estende sobre a glande, forma-se o
prepúcio. Os corpos cavernosos ficam situados logo acima da sínfise púbica, onde por um
septo incompleto posiciona-os lado a lado (BARROS et al., 2005; FARIA et al., 2005). Os
corpos cavernosos dividem com o corpo esponjoso uma estrutura trabecular, constituída de
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
fibras elásticas e colágenas, além do músculo liso, formando inúmeros espaços vasculares
(sinusóides), e possuem o músculo liso como componente primordial para a contração e
relaxamento do corpo cavernoso, responsável pela manutenção da ereção e aumento da
pressão intra-cavernosa. Já o corpo esponjoso fica localizado ventralmente (ANDRADE,
2010), dilatando-se terminalmente formando a glande peniana (BARROS et al., 2005,
ANDRADE, 2010).
A uretra atravessa todo o espaço perineal, o corpo esponjoso e glande, desembocando
no externo da uretra (BARROS et al., 2005).
Histologicamente, os corpos cavernosos (tecido erétil) são constituídos de fibras do
sistema elástico, fibras colágenas, músculo liso, artérias e veias, que são envolvidos pela
túnica albugínea (BARROS et al., 2005).
A drenagem linfática peniana, dá-se para os linfonodos inguinais superficiais e
profundos, e daí para os linfonodos ilíacos externos (ANDRADE, 2010; FARIA et al., 2005).
A sensibilidade é conferida pelos nervos dorsais, que compreende o ramo terminal do
nervo pudendo (FARIA et al., 2005) que também suprirão a glande (BARROS et al., 2005).
Figura 1. Anátomofisiologia peniana. (http://www.promen.com.br/saiba-mais/disfuncao-eretil%5Bde%5D).
Ereção
O processo de ereção (tumescência) ocorre devido à estimulação do tecido erétil
peniano, que no estado de flacidez, os músculos lisos encontram-se tonicamente contraídos
devido à ativação simpática (ANDRADE, 2010; FARIA et al., 2005). A partir do instante que
há uma estimulação sexual, ocorre a liberação de neurotransmissores (NO), nos terminais
cavernosos parassimpáticos (ANDRADE, 2010; FARIA et al., 2005; BARROS et al., 2005),
esse processo de relaxamento resulta na dilatação das arteríolas e artérias, o sangue que chega
no tecido erétil em expansão é aprisionado, o plexo venular da subtúnica é comprimido, de
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forma a reduzir o fluxo da saída venoso, e a túnica é estirada até cobrir as veias emissárias,
reduzindo o fluxo de saída venoso (BARROS et al., 2005; FARIA et al., 2005).
Podem ser divididas ainda em ereções reflexogênicas (quando a ereção é oriunda de
estímulos locais no órgão genital) e psicogênica (estímulo psicogênicos de origem central)
(MOURA; CERESÉR, 2002)
A inervação feita pelos nervos cavernosos fazem com que haja a inervação autônoma,
simpática e parassimpática vinda do plexo pélvico (FARIA et al., 2005)
Inicialmente ocorre o aumento momentâneo da pressão intra-corporal (início da
contração da musculatura lisa contra um sistema venoso fechado), lenta diminuição da pressão
(reabertura lenta dos canais venosos com a retomada do fluxo de saída venoso) e, por fim,
ocorre uma diminuição rápida da pressão, com o restabelecimento da capacidade venosa
(figura 2) (BARROS et al., 2005).
O corpo esponjoso não fica tão rígido como os corpos cavernosos, pois a bainha que o
envolve é mais elástica, evitando a compressão exagerada da uretra esponjosa (ANDRADE,
2010).
A resposta simpática é a responsável pela ejaculação, esta é uma resposta involuntária
(ANDRADE, 2010).
A detumescência peniana é oriunda da reativação do tônus parassimpático
(adrenérgico), resultando na contração da musculatura lisa das artérias helicinais e trabéculas,
levando a redução do fluxo arterial e os espaços lacunares entram em colapso,
descomprimindo as vênulas subalbugíneas, aumentando a saída do sangue venoso, dessa
forma o pênis volta ao estado de flacidez (MOURA; CERESÉR, 2002).
A observação das alterações existentes no pênis em seu estado de contração e
relaxamento auxiliam na vislumbração do fluxo sanguíneo que interfere na situação de ereção
peniana (GIAMI et al., 2009).
Fatores como a obesidade, cardiopatias podem interferir no desejo sexual, ereção e
ejaculação, dessa maneira diminuindo a satisfação (SOUZA et al., 2011).
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Figura 2. Mecanismo de ereção. (http://www.cabuloso.xpg.com.br/Anatomia-Humana/SistemaReprodutor/Viagra.htm)
Bioquímica da ereção
A ereção compreende um processo neurovascular controlado hormonalmente, que
regula a vasodilatação arterial, relaxamento da musculatura lisa e mecanismos venoclusivos
(RODRIGUES et al., 2010) representando um processo não colinérgico e não adrenérgico,
onde o Óxido Nítrico (NO) (figura 3) atua como principal mediador (MOURA; CERESÉR,
2002).
Um estímulo de cunho erótico é percebido por algum dos cinco sentidos e este
estímulo é processado no hipotálamo. O hipotálamo inibe o tônus simpático acarretando em
um aumento do tônus parassimpático e liberação de NO (NEVES et al., 2004).
A conversão da L-arginina em L- citrulina dá origem ao NO, que por ação da enzima
óxido nítrico-sintase (NOS) libera o NO. O NO induz ao relaxamento das fibras musculares do
corpo cavernoso. O relaxamento das fibras musculares do corpo cavernoso pode não vir via
óxido nítrico-sintase, mas de origem neuronal e endotelial, onde por essa via o NO ativa a
enxima guanilato-ciclase citosólica que sintetiza a enzima guanosina monofosfato-ciclase
(GMPc) como segundo mensageiro. O GMPc espalha-se pelas células lisas trabeculares e
induz ao relaxamento celular pela redução dos níveis intracelulares de cálcio (MOURA;
CERESÉR, 2002; NEVES et al., 2004).
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As fosfodiesterases (PDE), principalmente a fosfodiesterase 5 que se encontra no corpo
cavernoso, são enzimas responsáveis pela linearização do GMPc, inativando-o. Ao momento
que essa inativação ocorre, não há mais o relaxamento do corpo cavernoso (MOURA;
CERESÉR, 2002).
Figura 3. Ciclo da ereção. (JESUS; DEKERMACHER, 2009)
Porém a inervação peniana acontece por três vias: adrenérgica, colinérgica e nãoadrenérgica e não-colinérgica, esta última é a responsável pela liberação de outros mediadores
que levam ao relaxamento da musculatura lisa do pênis. O peptídeo vasoativo intestinal,
substância P, purinas, aminoácidos descarboxilados, prostaglandinas, bradicinina fatores
endoteliais são alguns dos mediadores liberados pela via não-adrenérgica e não-colinérgica
(NEVES et al., 2004).
Disfunção Erétil
Disfunção erétil, anteriormente chamada de impotência sexual, tratada como uma
desordem psicossexual, ligada à perda da virilidade / masculinidade do homem, relacionada
com a infertilidade masculina (GIAMI et al., 2009; MOURA; CERESÉR, 2002), que desde
meados do século XIX interessava aos médicos, psiquiatras e, no início do século XX gerou
interesse aos psicanalistas GIAMI et al., 2009).
Chama-se de disfunção erétil a incapacidade do homem em ter e/ou manter uma ereção
peniana suficiente para que ocorra uma relação sexual completa e satisfatória (RODRIGUES
et al., 2010; GIAMI et al., 2009), com a gravidade medida pelo índice de recorrência do
aparecimento da perda da rigidez peniana, permanente ou temporária (GIAMI et al., 2009),
podendo ser dividida em impotência mínima, moderada e grave (JÚNIOR et al., 1992), não
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constituindo uma patologia ou síndrome, mas uma manifestação sintomatológica de outras
patologias (MOURA; CERESÉR, 2002), podendo indicar uma vasculopatia de pequeno
calibre, incluindo eventos coronarianos (RODRIGUES et al., 2010).
A disfunção erétil (DE) deve ser entendida atualmente como um problema de saúde
pública, devido a sua relativa alta prevalência na população masculina e de alterações
emocionais e psicossociais que corroboram para a piora dos casos (ABDO et al., 2006;
RODRIGUES et al., 2010).
Conhece-se que a disfunção erétil é capaz de causar impactos negativos sobre a vida do
indivíduo que a desenvolve, impacto tanto na vida familiar, social e econômica (MOURA;
CERESÉR, 2002), e que a baixa auto-estima, problemas no relacionamento com a parceira,
filhos e amigos, problemas no trabalho são algumas das situações recorrentes em homens com
disfunção erétil, observando que o número de relações sexuais desse grupo é menor que no
grupo de homens que não sofrem de nenhum tipo de disfunção erétil (ABDO et al., 2006).
É visto também que um adulto com algum tipo de disfunção sexual teve deficiências
no que tange a formação sexual quando criança e que um início de vida sexual traumático
pode levar à disfunção erétil, uma vez que essa situação pode alterar a auto-estima do adulto
em formação, abalando os vínculos emocionais (ABDO et al., 2006).
A insatisfação com a qualidade de vida (desemprego, falta de comunicação e vínculos
com a parceira) e algum tipo de disfunção sexual (ejaculação precoce e diminuição da libido,
por exemplo), podem decorrer para uma disfunção erétil (RODRIGUES et al., 2010; ABDO et
al., 2006).
Quanto à etiologia da disfunção erétil, podem ser classificadas basicamente em
orgânicas (responsáveis pelo maior número de casos) (JÚNIOR et al., 1992; GIAMI et al.,
2009); psíquicas / psicológicas e ainda causas mistas (JÚNIOR et al.; 1992; MOURA;
CERESÉR, 2002).
As causas orgânicas compreendem os eventos relacionados as alterações á nível
vascular, traumatismos físicos e acidentes, infecções, idade, cirurgias e medicamentos. Já as
causas psíquicas compreendem as situações de nervosismo, medo, estresse, ansiedade,
timidez, insegurança, algum tipo de bloqueio mental ou comportamental (JÚNIOR et al.,
1992).
Em um estudo com 25 homens com lúpus eritematoso sistêmico (doença auto-imune
que ocorre, normalmente, durante o período reprodutivo) comparados a 25 homens saudáveis,
viu-se que a idade média dos pacientes era de 26 anos, nos pacientes com lúpus a incidência
de disfunção erétil era maior, as alterações gonodais também eram em maior número e nos
pacientes com lúpus do que nos pacientes saudáveis. Discute-se que devido aos medicamentos
utilizados no tratamento da doença (medicamentos imunossupressores e corticóides) podem
levar ao hipogonadismo, daí às alterações decorrentes desta complicação (SILVA et al., 2009).
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As causas de origem mista compreendem a junção das causas orgânicas e psíquicas
(JÚNIOR et al.; MOURA; CERESÉR, 2002).
Porém fatores de risco como diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, doença
vascular periférica, hipercolesterolemia, baixos níveis de lipoproteínas de alta densidade,
hiperlipidemia, drogas, fármacos utilizados em uso crônico, doenças neurológicas, alcoolismo,
tabagismo, insuficiência renal, infarto do miocárdio, neoplasias, obesidade, hipoandrogenismo
(MOURA; CERESÉR, 2002) e depressão podem acarretar na disfunção erétil (GIAMI et al.,
2009). Porém a prática de exercícios físicos, redução do tabagismo e o controle do peso são
alterações na vida do indivíduo que, melhoram a qualidade de vida à nível cardiovascular e
como visto, ajudam a evitar e/ou como tratamento adjunto para àqueles que sofrem de
disfunção erétil (RODRIGUES et al., 2010).
É importante ressaltar que o relaxamento inadequado do tecido cavernoso leva a uma
diminuição do indivíduo em obter uma ereção completa, levando à disfunção venoclusiva, esta
que possui uma grande gama de etiologias, desde eventos histopatológicos da musculatura
cavernosa e das veias, resultando em uma retenção sanguínea ineficaz (MOURA; CERESÉR,
2002).
Em estudo realizado com aplicação de questionários em 2.862 indivíduos transeuntes
de ruas e outros locais de lazer, foi observado que a amostra acoplava uma idade média de
37,6 ± 13,6 anos (p < 0,01). Foi visto que a prevalência de DE aumentava conforme a idade
(GIAMI et al., 2009).
Baixa auto-estima, problemas no relacionamento com a parceira, filhos e amigos,
problemas no trabalho são algumas das situações recorrentes em homens com disfunção erétil,
observando que o número de relações sexuais desse grupo é menor que no grupo de homens
que não sofrem de nenhum tipo de disfunção erétil.
É visto que um adulto com algum tipo de disfunção sexual teve deficiências no que
tange a formação sexual quando criança. Um início de vida sexual traumático pode levar à
disfunção erétil, uma vez que essa situação pode alterar a auto-estima do adulto em formação.
A insatisfação com a qualidade de vida (desemprego, falta de comunicação e vínculos
com a parceira) e algum tipo de disfunção sexual (ejaculação precoce e diminuição da libido,
por exemplo), podem decorrer para uma disfunção erétil.
Homens com disfunção erétil costumam ter seus vínculos emocionais abalados,
levando a estes, na tentativa de solucionar o problema, buscar relações extraconjugais.
É possível observar que indivíduos com algum tipo de cardiopatia e hipertensão arterial
sistêmica, possuem uma elevada probabilidade de desenvolverem a disfunção erétil, devido ao
comprometimento do sistema cardiovascular (ABDO et al., 2006).
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Diagnóstico
A atividade sexual é uma atividade física e pode-se mensurar seu gasto energético, que
é maior na fase do orgasmo, devido ao aumento do consumo de oxigênio, pode ser dividida
em fase de excitação, platô, orgasmo e resolução. Como, normalmente, se trata de as respostas
metabólicas e cardiovasculares da atividade sexual estão relacionadas mais à fase de excitação
do que ao esforço físico propriamente dito (SOUZA et al., 2011).
Alterações da fisiologia gênito-urinária ocorrem com o processo de envelhecimento.
Dessa maneira, os homens passam a ter menos ereções espontâneas e para que uma ereção
completa ocorra é necessário maior estimulação (SOUZA et al., 2011).
A obesidade interfere no desejo sexual, ereção e ejaculação, dessa maneira diminuindo
a satisfação.
A prática de exercícios físicos reduzem a probabilidade de indivíduos apresentarem disfunção
erétil, uma vez que melhoram a saúde cardiovascular do paciente (SOUZA et al., 2011).
Para diagnosticar uma situação de disfunção erétil deve-se levantar o histórico médico
do indivíduo, incluindo o histórico sexual (início do problema e tratamentos já tentados),
histórico emocional, qualidade das ereções, alterações relacionadas às ejaculações e orgasmos,
mesclando com uma avaliação psicológica bem realizada, levantando os antecedentes
psiquiátricos dos pacientes (MATHEUS et al., 2009; RODRIGUES et al., 1992).
Deve-se proceder com uma investigação urogenital para eliminação, ou não, de outras
afecções. Dentre os exames urogenitais, busca-se identificar se há ocorrência de curvatura
peniana anormal, presença de placas de fibrose peniana, alterações prostáticas e do tônus anal,
entre outras alterações, e com um exame geral pode-se visualizar se há alterações sistêmicas
capazes de promover a disfunção erétil, dentre elas citam-se a hipertensão arterial sistêmica,
alterações tireoidianas, hipogonadismo (RODRIGUES et al., 1992).
Com o aumento da idade, a deficiência androgênica pode acometer os homens.
Sintomas como indisposição para o trabalho, estados depressivos, irritabilidade, redução da
libido podem indicar a disfunção androgênica do envelhecimento masculino, nestes casos o
médico urologista pode iniciar a terapia de reposição hormonal. Para esse diagnóstico, pode-se
utilizar de exames laboratoriais, não só para auxiliar no diagnóstico mas também no
tratamento do paciente. Nestes exames buscam-se alterações à nível de glicemia, dislipidemia,
alterações hormonais tais como concentrações inadequadas de testosterona livre, testosterona
total e testosterona ligada à SHBG, nível de TSH, T3 e T4. Já indivíduos com alguns fatores
físicos como curvatura peniana, Peyronie, fatores hormonais como alterações endócrinas,
pacientes com histórico de trauma, cirurgia pélvica iatrogênica (que podem levar ao indivíduo
à cirurgia de revascularização peniana) necessitam, muitas vezes de exames laboratoriais
específicos (RODRIGUES et al., 2010).
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Tratamento
Como qualquer outra terapia farmacológica, o tratamento para a disfunção erétil busca
encontrar bons resultados com o menor número possível de alterações biológicas resultantes
dessa terapia, aumentando dessa forma a eficácia do tratamento e a qualidade de vida do
indivíduo (NEVES et al., 2004). Complementando esta ideia sabe-se que a prática de
exercícios físicos reduzem a probabilidade de indivíduos apresentarem disfunção erétil, uma
vez que melhoram a saúde cardiovascular do paciente (SOUZA et al., 2011).
O tratamento da disfunção erétil pode ser dividido em três linhas diferentes.
Tratamento de Primeira Linha
O tratamento chamado de Primeira Linha compreende a terapêutica oral utilizando os
inibidores da enzima Fosfodiesterase – 5 (PDE-5), com sucesso em cerca de 80%, não
importando qual a etiologia da disfunção erétil. Esses inibidores não permitem que a enzima
PDE-5 linearize o GMP cíclico, dessa forma o tempo de relaxamento muscular principalmente
no corpo cavernoso é aumentado, fato tal que também aumenta o influxo de sangue levando à
ereção (SILVA et al, 2010; CLARO; SROUGI, 2003).
Cabe salientar que os inibidores da PDE-5 devem ser utilizados na existência do desejo
sexual (ABDO et al., 2007).
Os inibidores da PDE-5 possuem uma atividade vasodilatadora, porém, quando
utilizados em sua janela terapêutica não são capazes de provocar hipotensão significativa
(SILVA et al., 2010).
Sensações como cefaléia, rubor facial, epigastralgia e congestão nasal são alguns dos
efeitos colaterais mais comuns que podem aparecer aos usuários de inibidores de PDE-5, sem
alterações significativas sobre a pressão arterial sistólica e diastólica e tampouco na função
cardíaca. Seu metabolismo se dá pelo citocromo CYP 3A4, fármacos como o cetoconazol,
inibidores da protease desativam esta via de metabolização, dessa maneira aumentam as
concentrações séricas dos inibidores de PDE-5, já drogas indutoras enzimáticas como a
rifampicina, promove uma redução das concentrações plasmáticas dos inibidores. Com relação
às interações medicamentosas, não deve-se fazer uso dos inibidores de PDE-5
concomitantemente com alfabloqueadores, devido ao efeito hipotensor gerado, e não devem
ser utilizados juntamente com nitratos, devido à sensibilidade dos inibidores frente aos nitratos
(ABDO et al., 2007).
Silva e colaboradores (2010) realizaram um estudo buscando averiguar a inter-relação
do álcool em relação aos inibidores de PDE-5. Foi visto que o álcool possui ação
vasodilatadora, interferindo diretamente no sistema do óxido nítrico, leva ao aumento
momentâneo a pressão arterial com posterior queda desta. Quando consumido em grandes
quantidades, sua ação inicial representada pela euforia, passa à sedação, deprimindo o sistema
nervoso central. Quando esta situação ocorre, o homem sente dificuldades em ter ou manter
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
uma ereção. Foi observado o não foi observado sinergismo entre o álcool e os inibidores de
PDE-5 capaz de causar um efeito clínico exagerado.
Sildenafil
O primeiro inibidor de PDE-5 conhecido foi o citrato de sildenafil (figura 4),
quimicamente chamado de 1-[[3-(6,7-diidro-1-metil-7-oxo-3-propil-1H-pirazol-[4,3 d]pirimidin-5-il)-4-etóxifenil]sulfonil]-4-metilpiperazina (WEINERT et al., 2008) possuindo sua
meia-vida curta. O citrato de sildenafil é eficaz no tratamento de disfunção erétil,
independente de sua etiologia, levando a um aumento da auto-estima e satisfação do homem,
além de promover uma melhora significativa nos casos de ejaculação precoce (CLARO;
SROUGI, 2003; WANNMACHER, 2006; STEIN; HOHMANN 2006; DEBUSK et al., 2000).
Figura 4. Estrutura química do citrato de sildenafil. (http://en.wikipedia.org/wiki/File:Sildenafil.png).
Vardenafil
Porém novos inibidores foram lançados, inibidores estes mais específicos, como o
vardenafil (figura 5) (4-[2-etoxi-5-(4-etilpiperazina-1-il)sulfonil-fenil]-9-metil-7-propil3,5,6,8-tetrazabiciclo[4.3.0]nona-3,7,9-trien-2-ona), que pode ser ingerido meia hora antes da
relação sexual e seu efeito pode perdurar por até mais de sete horas após a sua ingestão
(CLARO; SROUGI, 2003).
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Figura 5. Estrutura química do vardenafil. (http://en.wikipedia.org/wiki/File:Vardenafil.svg).
Tadalafil
Um outro inibidor bastante conhecido, que fora lançado após o advento do sildenafil, é
o tadalafil (figura 6) ((6R-trans)-6-(1,3-benzodioxol-5-yl)- 2,3,6,7,12,12a-hexahidro-2-metilpirazino [1', 2':1,6] pirido[3,4-b]indol-1,4-diona), que também pode ser ingerido cerca de meia
hora antes da relação sexual, porém possui uma meia-vida longa (cerca de 17,5 horas), seus
resultados podem chegar até 48 horas. A especificidade dos inibidores de PDE-5 mais
modernos trazem mais segurança e conforto ao paciente que necessita do seu uso (CLARO;
SROUGI, 2003).
Com relação aos efeitos colaterais, tem-se que a dor lombar e mialgia são os mais
comuns (ABDO et al., 2007).
Figura 6. Estrutura química do tadalafil. (http://en.wikipedia.org/wiki/File:Tadalafil_skeletal.svg).
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Carbonato de Lodenafila
O carbonato de lodenafila (figura 7) (bis-(2-{4-[4-etóxi-3-(1-metil(-7-oxo-3-propil-6,7diidro-1H-pirazol[4,3-d]pirimidina-5-il)-benzenesulfonil]piperazina-1-il}-etil) é um inibidor
de PDE-5, composto por duas moléculas de lodenafil ligados por uma ponte de carbonato,
sendo então, classificado como uma pró-droga, que ao ser metabolizado (hidrólise plasmática)
libera dois monômeros de lodenafil como metabólitos ativos, possuindo baixa toxicidade,
elevada segurança e eficácia (SILVA et al., 2010).
O lodenafil por sua vez é metabolizado por enzimas hepáticas e plasmáticas, atingindo
a concentração efetiva máxima superior a do sildenafil, causando maior relaxamento com
menor concentração de fármaco (SILVA et al., 2010)
Figura 7. Estrutura química do carbonato de lodenafila. (http://dbpedia.org/page/Lodenafil).
Tratamento de segunda linha
O tratamento de Segunda Linha refere-se à auto-injeção intracavernosa de drogas
vasoativas (figura 8). Um fármaco bastante utilizado com sucesso próximo aos 79% é a
Prostaglandina E1, com o benefício de rápida metabolização intracavernosa, o que reduz o
número de casos de priaprismo e fibrose dos corpos cavernoso, mas apresenta a desvantagem
de provocar intensa dor local. Atualmente a associação de Prostaglandina E1 com fentonila e
papaverina tem aumentado o sucesso do tratamento para cerca de 95% e com poucos efeitos
colaterais devido ao sinergismo positivo das drogas, os casos de priaprismo são inferiores a
0,5% e a fibrose dos corpos cavernosos praticamente não ocorre e, não ocorre dor peniana
após sua administração (CLARO; SROUGI, 2003).
Um fármaco sintetizado a partir da morfina, chamado de apomorfina, aplicado
subcutaneamente e na forma de comprimidos sublinguais, apresenta alguns aspectos
estruturais iguais aos da dopamina, uma vez que para que ocorra uma ereção, por mais que
haja estimulação periférica, o controle é central e realizado pelo cérebro. Substâncias como o
quinorelano, bromocriptina que são agonistas dos receptores D 2 apresentam potencial ação no
tratamento da disfunção erétil (NEVES et al., 2004).
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Figura 8. Injeção intracavernosa. (http://www.urologiaflorianopolis.com.br/noticias/disfuncao)
Tratamento de terceira linha
As próteses penianas (figura 9) correspondem ao tratamento de Terceira Linha. Essas
próteses evoluíram do acrílico ao silicone em cerca de 30 anos. Inicialmente havia somente as
próteses denominadas como rígidas, que causavam ereção rígida e permanente. Com a
evolução da indústria médica, foram desenvolvidas as próteses maleáveis (fio de prata
revestido por silicone), proporcionando maior conforto ao paciente. As próteses infláveis, mais
modernas, são constituídas por mecanismos hidráulicos, onde os cilindros se expandem em
diâmetro, ocasionando uma ereção plena. Um reservatório enche os cilindros. Os dilatadores
são postos lateramlente e contralateralmente aos corpos cavernosos, fato tal que mantém uma
ereção residual, melhorando o conforto do indivíduo e da sua parceira. Na prótese inflável a
bomba é posicionada no escroto de maneira que permita uma fácil manipulação (CLARO;
SROUGI, 2003).
Existe um fármaco denominado de ioimbina, classificado como um alcalóide
antagonista dos receptores α2-adrenérgicos pré-sinápticos, extraído da Corynanthe yohimbine
é com ação vasodilatadora periférica semelhante à reserpina, possui então, ação simpatolítica
(parassimpatomimética), dessa forma aumenta o tônus peniano e reduz o esvaziamento do
fluxo peniano, levando à estimulação erétil (ANDRADE et al., 2002) .
Em um estudo realizado com o objetivo de averiguar a eficácia da associação da
ioimbina com sildenafil, Andrade et al., (2002), separaram cinco grupos de seis pacientes cada
utilizaram a associação dos medicamentos com a dosagem da ioimbina variando de grupo para
grupo e, em um grupo utilizou-se placebo no lugar da ioimbina e em outro grupo, placebo no
lugar do sildenafil. Verificou-se que nos grupos onde se usavam a associação de ioimbina com
o sildenafil, independentemente da dosagem do primeiro, houve uma melhora surpreendente
na qualidade das ereções, o mesmo fato não foi obsrvado no grupo que recebia placebo no
lugar da ioimbina, confirmando assim, o sinergismo positivo entre as duas substâncias no
combate à disfunção erétil.
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Prótese Peniana
Semi-rígida
Prótese Peniana
Inflável
Figura 9. Próteses penianas. (http://www.urologiaflorianopolis.com.br/noticias/disfuncao).
Considerações Finais
Pode ser visto que o problema da disfunção erétil é bem mais complexo do que se
imagina, uma vez que os mecanismos envolvidos no reflexo da ereção são complexos e
extremamente delicados, haja visto que alterações à nível endotelial, tecidual e psicológicos
interferem de maneira surpreendentemente grande para a instalação de tal patologia.
Na sociedade contemporânea em que o ser humano vive, trabalha e se relaciona
atualmente gera um tão alto nível de estresse que, o organismo como uma forma de escape,
muitas das vezes, acaba por psicologicamente bloquear o reflexo de ereção independente do
estímulo que está sendo feito.
Mediante ao exposto, cabe ao médico conjuntamente ao paciente encontrarem uma
terapêutica adequada para a solução deste problema que afeta tão grande número de homens
em todo o mundo, interferindo diretamente em sua saúde física, mental e social, tendo em
mãos as três principais linhas de tratamentos, onde atualmente o uso dos inibidores da PDE-5
tem ganhado um grande vulto, devido à sua facilidade de uso, conforto ao paciente e resposta
biológica adequada, mas torna-se evidente a necessidade da divulgação dos efeitos benéficos
acarretados aos pacientes quando esses medicamentos são bem prescritos e utilizados.
Porém torna-se claro que uma conversa franca e aberta com o indivíduo que sofre de
disfunção erétil, deixando-o seguro e confiante pode auxiliar no tratamento, uma vez que essa
alternativa pode ser um excelente remédio para tal.
183
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
O Efeito do método RMA (reprogramação músculo-articular)
em profissionais de costura com lombalgia:
Um Estudo Cego-Aleatório
Autores:
Carolina Coutinho Anselmo
Fabiana Knupp Mafort
Juliana da Silva Netto
Curso de Fisioterapia
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo)
Orientador: Christiano Bittencourt Machado
Co-Orientador: Carlos Alberto V. Melo
Resumo
A lombalgia é um sintoma comum que atinge de 75% a 80% da população, sendo estes
adultos e comunidades de trabalhadores. O objetivo do estudo foi verificar a eficácia do
método RMA no tratamento das lombalgias em costureiras. Foram recrutadas quinze
costureiras entre 24 e 50 anos. Aplicou-se um questionário com perguntas referentes à
intensidade da dor, duração, freqüência, caráter, entre outras questões. Os profissionais foram
divididos em três grupos de forma aleatória através de um sorteio, sendo grupo controle, grupo
RMA e grupo placebo. A técnica foi aplicada uma só vez e permaneceu por três dias. A partir
de então foi verificado a eficácia do método através da escala Visual Analog Scale. Houve
uma melhora significativa (p < 0,05) do grupo RMA em relação ao placebo e ao grupo
controle.
Palavras-chave: Spiral Taping; Reprogramação Musculo-Articular; Lombalgia; Costureiras
Introdução
A limitação funcional decorrente a quadro álgico lombar é uma problemática comum
na população mundial, afetando de 75% a 80% adultos e comunidades de trabalhadores,
decorrentes de: posturas viciosas; permanência na posição sentada por longos períodos;
sobrecarga física; posturas estáticas; vibrações geradas por máquinas; movimentos repetitivos;
traumas; tumores e fatores psicológicos e psicossociais tais como depressão, ansiedade,
insatisfação laboral e responsabilidade estressante. A presença destes fatores, em conjunto ou
isoladamente, propicia a incapacidade total ou parcial sendo um desencadeador para a
Professor e Coordenador do curso de Fisioterapia Universidade Estácio de Sá - Campus Friburgo
Professor do curso de Fisioterapia - Campus Friburgo
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
aposentadoria ou para o afastamento do trabalho por tempo indeterminado gerando grandes
custos tanto para a saúde quanto para a sociedade (HALL, 2005; TOSCANO; EGYPTO,
2001; COX, 1999; MARQUES; MORAES, 2000; CHORATTO; STABILLE, 2003; BRAZIL
et al., 2004; APPEL, 2002; NORIEGA-ELÍO et al., 2005; SILVA; FASSA; VALLE, 2004;
ANTÔNIO, 2002; WILLIAMS; MYERS, 1998; VLAEYEN; KOLE-SNIJDERS; HEUTS,
1998).
A lombalgia é sucintamente definida como um desconforto pélvico que gera dor que
varia desde um relato de incômodo até uma forte algia que pode aumentar com a
movimentação postural. Apesar da alta prevalência, apenas 3% da população com lombalgia
procura assistência na área de saúde (COX, 1999; ANDRADE; ARAÚJO; VILAR, 2005;
MEIRELLES, 2003; COCICOV, 2004; BRAZIL et al., 2004; ALISTE 2005; IMAMURA;
KAZIYAMA; IMAMURA, 2001).
Atualmente, um quadro que se evidencia é o aumento significativo das atividades
sentadas que tomaram o lugar das atividades na posição de pé, mudando assim a qualidade de
trabalho. Assim, a dor nas costas devido às atividades laborativas vem crescendo e passando a
exercer uma importância cada vez maior por ter sido constatado um elevado índice de dor
lombar em trabalhadores que permanecem sentados por longos períodos, até mesmo por se
tratar de setores em significativo crescimento, com isso podendo visualizar uma multiplicação
da posição sentada no âmbito de trabalho (VIEL; ESNAULT, 1999; MORAES; MARQUES,
2000; HAMILL; KNUTZEN, 1999; KROEMER; GRANDJEAN, 2005; BERTO; MACEDO;
OLIVEIRA, 2004; DUL; WEERDMEESTER, 2004).
O método Spiral Taping, também conhecido como Reprogramação Músculo Articular
(RMA), criado pelo Professor Nobutaka Tanaka, baseando-se em conhecimentos de fisiologia
muscular, cinesiologia e acupuntura, foi trazido para o Brasil há aproximadamente 10 anos.
Esse método utiliza tiras de fitas adesivas que devem ter de 3 a 5 mm de largura que não
contém nenhum tipo de medicamento, são indolores e não-invasivas, dispostas na pele de
acordo com sua utilidade. Essa técnica tem por objetivo reduzir a dor, reequilibrar e auxiliar
na normalização postural de grupos musculares e articulações, no entanto a mesma não tem
comprovação científica (TANAKA, 1998).
Para que essa técnica seja executada, é necessário que se faça antes um teste,
conhecido como O Ring Test ou Teste do Anel Bidigital (BDORT). O teste já é conhecido na
Europa, países escandinavos, Estados Unidos e Japão. O teste leva o nome de seu criador,
teste Omura. O mesmo foi desenvolvido nos Estados Unidos na década de 1970 na cidade de
Nova Iorque. Todos os testes feitos pelo Dr. Omura foram acompanhados de exames
convencionais tais como: (I) Radiografias, (II) Tomografia Computadorizada, (III) exame de
sangue, (IV) cultura de bactérias e (V) teste de sensibilidade (OMURA, 2000).
Para a realização do teste, o terapeuta estabelecerá um contato com o paciente através
do dedo mínimo de uma de suas mãos no ponto Yoti, que é o centro da linha articular posterior
do punho. Então o terapeuta realizará uma oponência com o polegar e o terceiro dedo dessa
mesma mão, formando um círculo, ou seja, um anel entre esses dois dedos. O terapeuta deverá
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
deslizar o dorso da mão oposta em diagonal, de distal para proximal em contato com a pele do
paciente, e depois usar o anel formado pela falange distal do primeiro e segundo dedos da mão
oposta, para puxar o anel formado pelo primeiro e terceiro dedos da outra mão. Logo após, o
mesmo será realizado para a diagonal direita devendo ao final puxar o anel. Então deve-se
comparar as duas diagonais (direita e esquerda), e aquela em que for preciso utilizar uma força
maior para abrir o anel é a direção yang, e o que for necessário menor força é a direção yin
(TANAKA, 1998; OMURA, 2000).
Uma outra forma utilizada para realizar o teste é com a ajuda de um assistente,
chamado de O Ring Test Indireto, onde o assistente toca o ponto Yoti com o quinto dedo de
uma de suas mãos realizando com a outra mão um anel utilizando o primeiro e terceiro dedos.
Então o terapeuta realizará as diagonais para a esquerda e para a direita, e então irá puxar a
articulação interfalangeana do primeiro e terceiro dedos do assistente com o primeiro e
segundo dedos de sua mão com o intuito de abrir o anel (TANAKA, 1998; OMURA, 2000).
Após a realização do O Ring Test (direto ou indireto) são aplicadas sobre a pele na
região lombar as fitas adesivas de acordo com a direção definida pelo mesmo. A direção yang
além de sobrepor a direção yin terá uma fita a mais (TANAKA, 1998; OMURA, 2000).
Após aplicação, é feita a confirmação através do timo. O timo surge de uma
proliferação do endoderma de revestimento do intestino das faríngeas, na altura das terceiras
bolsas faríngeas. O timo está situado no tórax, no mediastino, imediatamente atrás da
extremidade superior do esterno, ao nível dos grandes vasos do coração. O timo é o único
órgão linfóide a não apresentar nódulos em sua estrutura, já que nódulos são formados por
linfócitos B e possuem um citorreticulo epitelial, uma vez que as células reticulares do timo
são de origem endodérmica, ao contrário dos demais órgãos linfóides, onde estas células são
de origem mesenquimal (SIQUEIRA; DANTAS, 2000).
Uma extensa parte da população sofrerá de lombalgia em alguma fase de suas vidas, e
como o Spiral Taping é um método de fácil aplicação, de baixo custo e sem contra-indicação,
ele seria de grande valia nos tratamentos álgicos, bem como nas lombalgias, caso houvesse
realmente uma comprovação científica. Por ser um método ainda desacreditado e por possuir
origens orientais, o mesmo se torna pouco conhecido e pouco utilizado.
Esse trabalho tem por objetivo testar o método Spiral Taping em profissionais de
costura com relato de dor lombar, visando à melhora do quadro álgico.
Materiais e Métodos
Primeiramente, a pesquisa foi realizada através de um questionário com perguntas
relacionadas à dor ocasionada pela lombalgia decorrente do trabalho na postura sentada,
quanto à sua intensidade, duração, freqüência e caráter, em profissionais da costura nas
confecções da cidade de Nova Friburgo. Foi aplicado um pré-teste com 10 costureiras,
ocorrendo alterações após a aplicação, sendo acrescentadas algumas questões. Para a aplicação
189
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
da técnica, foram utilizados fitas de esparadrapo impermeáveis, inelásticas, de 3 a 5 mm da
marca Cremer®.
Foram recrutadas 15 profissionais da costura com sintoma de dor lombar e idade entre
24 e 50 anos do sexo feminino. Para a aplicação do questionário, assim como da técnica, foi
utilizado um termo de consentimento assinado pelo proprietário da confecção e pelas
funcionárias voluntárias.
As profissionais foram divididas igualmente em três grupos de forma aleatória através
de um sorteio, sendo os mesmos classificados em grupo controle, grupo do método Spiral
Taping e grupo do efeito placebo. As voluntárias desconheciam a existência de outros grupos
experimentais (estudo cego).
Para a aplicação do Spiral Taping foi realizado antes o Teste do Anel Bidigital
(BDORT), também conhecido como O Ring Test, que determina a direção das fitas de
esparadrapo (figura 1). O terapeuta coloca o dedo mínimo no ponto Yoti, faz o anel com o
primeiro e terceiro dedos da mesma mão e com a mão oposta, utilizando o primeiro e o
segundo dedo com forças opostas, abre-se então o anel, para saber a direção da aplicação das
fitas.
Figura1 - O Ring Test.
O Spiral Taping foi aplicado em uma única vez, no grupo RMA e placebo, na qual os
esparadrapos permaneceram sobre a pele por três dias. Logo depois, verificou-se o quadro
álgico lombar através de uma escala chamada Escala Analógica Visual (Visual Analog Scale VAS), graduada de 0 a 100 mm, para quantificar a dor através de referências visuais, onde o 0
significa ausência de dor e 100 dor lombar máxima; sendo perguntado à voluntária, também
190
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
ao terceiro dia, se houve uso de medicamentos contra a dor referida; caso a voluntária
estivesse feito o uso de medicamentos referentes a dor lombar, para excluir fontes de viés.
Na figura 2 observa-se a imagem da aplicação do método RMA em uma voluntária.
Figura 2 - Voluntária com aplicação do método RMA em região lombar.
No grupo controle, foi verificado a dor antes e depois de três dias, sem a aplicação do
método; e no grupo placebo, foi feito uma aplicação de forma aleatória, e a dor foi igualmente
avaliada. A figura 3 mostra a imagem da aplicação do placebo em uma voluntária na região
lombar. Observa-se que as tiras foram colocadas de forma aleatória.
Figura 3 - Voluntária com aplicação do placebo.
191
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Para análise estatística, foi usado o Teste de Kruskal – Wallis (α = 0,05) para verificar
diferença significativa entre os grupos.
Resultados
A tabela 1 mostra a estatística descritiva das variáveis nominais referentes ao
questionário. Observou-se que 60% das voluntárias relataram dor em queimação; 46,7%
relataram sentir dor constante; 86,7% disseram que a posição em que mais sentem dor é a
sentada; 86,7% relataram que a dor tem relação com o trabalho; e observou-se que 93,3% das
voluntárias não praticam atividade física.
Tabela 1 - Variáveis nominais com as respostas e a freqüência em porcentagem do questionário aplicado às
voluntárias.
Variável
Respostas
Como é a dor?
Pontada
Queimação
Em peso
Contínua
Constante
Intermitente
Eventual
Espontaneamente
Com movimentos repetitivos
Sentado
Em pé
Deitado
Manhã
Tarde
Noite
Varia
Repouso
Medicação
Fisioterapia
Outros
Não procurou tratamento
Sim
Não
Início
Meio
Fim
Duas horas
Três horas
Quatro horas
Cinco horas
Seis horas
Sim
Não
Qual é a duração da dor?
A dor se manifesta de
que forma?
Em que posição dói mais?
Em que momento do dia
dói mais?
Com qual tratamento melhorou?
A dor tem relação com trabalho?
Aparece em que fase do trabalho?
A dor se agrava após quantas horas de
trabalho?
A dor interfere em algum movimento?
Freqüência(%)
13,3
60,0
20,0
6,7
46,7
33,3
20,0
46,7
53,3
86,7
6,7
6,7
6,7
40,0
6,7
46,7
6,7
13,3
6,7
6,7
66,7
86,7
13,3
20,0
60,0
20,0
13,3
26,7
20,0
33,3
6,7
40,0
60,0
192
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A dor interfere em qual movimento?
Você pratica atividade física?
Trabalha quantas horas por dia?
Quantas vezes se levanta durante a jornada
de trabalho?
Andar
Abaixar
Subir escada
Deitar
Sim
Não
Seis horas
Oito horas
Nove horas
Uma vez
Duas vezes
Três ou mais vezes
16,7
16,7
33,3
33,3
6,7
93,3
13,3
33,3
53,3
6,7
33,3
60,0
A tabela 2 mostra a estatística descritiva das variáveis contínuas, onde se observou um
valor de VAS médio no antes de 5,56 ± 1,71 cm, e um valor de VAS médio depois de 4,22 ±
2,92 cm.
Tabela 2 - Valores mínimo, máximo, médio e desvio padrão da faixa etária das voluntárias,
VAS antes e depois da aplicação.
Idade (anos)
VAS antes (cm)
VAS depois (cm)
Mínimo
Máximo
Média
Desvio padrão
24
3,2
0
50
8,1
8,8
34,13
5,56
4,22
9,33
1,71
2,92
Na tabela 3, observa-se o resultado do Teste de Kruskal – Wallis. Pode-se identificar
uma diferença no rank médio do grupo RMA em relação ao placebo e controle (p < 0,01).
Tabela 3 - Resultado do Teste Kruskal – Wallis, onde se identifica diferença no rank médio do
grupo RMA em relação ao placebo e controle.
Grupo
Rank médio
RMA
Placebo
Controle
3,0
9,2
11,8
A figura 4 apresenta um gráfico boxplot dos três grupos experimentais para a variável
diferença de VAS depois x antes. Pode-se identificar que o grupo RMA obteve melhora
significativa em comparação ao placebo e ao controle.
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Diferença VAS depois - antes (mm)
5,0
12
2,5
0,0
-2,5
-5,0
-7,5
-10,0
RMA
Placebo
Controle
Grupo experimental
Figura 4 - O gráfico boxplot mostra a diferença da VAS depois × antes com melhora significativa do grupo RMA.
Discussão
A lombalgia é um sintoma que afeta a população em geral e principalmente a classe
dos trabalhadores que permanecem sentados por muito tempo apresentando índice de
desconforto geral, como a dor em queimação, relatada por 60% das voluntárias da presente
pesquisa, sendo relatada também pela maioria das costureiras que a mesma é constante ou
intermitente (OLIVEIRA; BERTO; MACEDO, 2004; ANTÔNIO, 2002).
Segundo Oliveira et al. (2004) e Moraes; Marques (2000), trabalhos que imponham
grande sobrecarga física às atividades realizadas em posturas impróprias, expõe facilmente o
trabalhador a traumas e lesões em região lombar obtendo assim um caráter ocupacional, já que
86,7% das voluntárias confirmaram que a dor tem relação com o trabalho, e referiram com a
mesma porcentagem trabalhar mais tempo na posição sentada, o que pode levar às alterações
posturais permanentes ou transitórias. As costureiras em 66,7% dos casos relataram não
procurar tratamento e apenas 6,7% das mesmas procuraram a Fisioterapia como meio de
aliviar seus sintomas, e como um fator agravante, trabalham mais de oito horas por dia como
verificado em 53,3% dos casos.
Foi observado que 93,3% das voluntárias não praticam atividade física. Sabe-se que a
inatividade está relacionada direta ou indiretamente com dores na coluna, tendo como um dos
fatores agravantes déficit de força muscular levando as estruturas lombares a suportarem
sobrecargas elevadas. O sedentarismo, que gera a atrofia muscular, reduz a coordenação de um
correto movimento de todas as estruturas osteomioarticulares participantes das atividades
diárias. (TOSCANO; EGYPTO, 2001; CHORATTO; STABILLE, 2003; KNUTZKY;
194
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
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ATALLAH, 2002).
No decorrer da pesquisa, surgiram algumas limitações como a dificuldade de encontrar
na literatura artigos sobre o método de Reprogramação Músculo Articular até mesmo pela não
comprovação científica do mesmo. Outra limitação é que as confecções trabalham por
produção, e o afastamento de alguns minutos das funcionárias para a aplicação do método
RMA ou do placebo implica em redução da produtividade e consequentemente dos ganhos
financeiros da empresa. Por isso, o número amostral foi pequeno.
O questionário oferece limitações no que diz respeito à subjetividade do voluntário ao
responder as perguntas presentes no mesmo, podendo ser uma conseqüência do medo da
funcionária caso a empresa tivesse acesso a esses dados, podendo prejudicá-la de alguma
forma, apesar da empresa não ter acesso ao questionário. A escala da dor aplicada aos grupos
RMA, placebo e controle é subjetiva, pelo fato da voluntária ter que transferir para uma escala
visual um representante numérico em uma reta para definir o valor da sua dor, tornando-se
assim um fator limitante para o trabalho.
Apesar das limitações como a dificuldade de encontrar comprovação científica e a
maioria das pessoas desacreditarem nas terapias alternativas, o estudo mostrou que o método
RMA é eficaz para a redução da lombalgia em comparação à aplicação do placebo, como visto
na figura 4, onde todos os indivíduos obtiveram melhora.
Considerações Finais
Apesar da pequena amostra, observa-se que o método RMA tem efeito analgésico na
coluna lombar. Não se sabe ainda o real mecanismo que o método Reprogramação Músculo
Articular atua na analgesia, devido à falta de comprovação científica e estudos realizados
sobre o mesmo.
Acredita-se que com novos estudos utilizando um número maior de voluntários, os
mesmos resultados serão alcançados, salientando ainda a necessidade e a importância de
outras pesquisas como esta para justificar o efeito do método, bem como para comparar os
efeitos deste com outras terapias analgésicas alternativas.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Validação do método de avaliação da marcha
com microfones (mamm) em idosos
Autor:
Gilney Bispo Costa Angelo
Curso de Fisioterapia
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo)
Orientador: Christiano Bittencourt Machado
Resumo
O presente estudo visou validar a utilização de microfones na análise de variáveis temporais
da marcha (método MAMM) em indivíduos idosos, motivado pelo fato de que a utilização de
equipamentos de alto custo torna-se difícil na prática clínica. Foi implementado um algoritmo
em Matlab® para gravação e análise dos sinais sonoros provenientes dos microfones acoplados
aos tornozelos de indivíduos. A marcha de 17 idosos foi gravada primeiramente em em vídeo,
e posteriormente foram realizados duas gravações com a utilização do método MAMM. Foi
utilizado o coeficiente de Pearson (r), análise de concordância de Bland-Altman e o teste t (α =
0,05) sendo encontradas boas correlações entre os métodos testados (duração média dos
passos: r = 0,99). Na análise de Bland-Altman, houve boa concordância entre os métodos. A
diferença na estimativa dos métodos é aproximadamente igual a zero (p = 0,067).
Palavras-Chave: Microfone, Avaliação, Marcha, Idosos, Validação
Introdução
A avaliação da marcha é um recurso-chave no processo de reabilitação. Por exemplo,
no caso de um paciente acometido por um acidente vascular encefálico (AVE) (UMPHRED,
2001; MILLER; QUINN; SEDDON, 2002; LAUFER et al., 2001; CUNHA-FILHO; LIM;
QURESHY, 2001), lesão de medula espinhal (UMPHRED, 2001; FIELD-FOTE; TEPAVAC,
2002; BEHRMAN; HARKEMA, 2000) e lesões ortopédicas (O‟SULLIVAN; SCHMITZ,
2001), o correto diagnóstico cinésio-funcional é decisivo na intervenção terapêutica e em seu
prognóstico.
Existem diversas variáveis que podem descrever a marcha humana padrão.
Comprimento da passada, comprimento do passo, largura da base de sustentação e grau de
saída do dedo do pé compreendem as variáveis de distância; as variáveis temporais incluem a
Professor e Coordenador do curso de Fisioterapia Universidade Estácio de Sá - Campus Friburgo
198
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
duração do passo e da passada, cadência e velocidade (PELISSIER; LAASEL; GUIBAL,
2001; SHUMWAY-COOK; WOOLLACOTT, 2001).
A existência de dados quantitativos para a avaliação é muito importante (NORKIN;
LEVANGIE, 1992), sendo que diversos métodos de análise de marcha já foram propostos.
Como exemplo, a eletromiografia, que é extensivamente usada no estudo da atividade
muscular durante a locomoção (CLARK et al., 2004; LAUER et al., 2005; PATIKAS; WOLF;
DODERLEIN, 2005; ROMKES; RUDMANN; BRUNNER, 2006).
Segundo Perry (2005), a utilização da análise observacional tem se mostrado como um
método bem difundido entre os profissionais que avaliam a marcha humana. O filme
fotográfico oferece um meio remoto para essa análise, sendo sua forma de obtenção de dados
mais versátil para a visualização do movimento por existirem funções adicionais na câmera de
vídeo.
A utilização de marcadores pode melhorar a visualização através de LED‟s (Light
Emitting Diods) que emitem um sinal infravermelho para materializar pontos anatômicos em
movimento e assim com a captação por um receptor fotoelétrico serem feitas às medições e
seus possíveis diagnósticos (VIEL, 2001).
Viel (2001) afirma ainda em sua obra que as plataformas de força são indispensáveis
na avaliação ou nos estudos dos apoios unipodais no solo. Porém, a introdução de movimentos
artificiais pelo indivíduo testado tem que ser inibida camuflando a plataforma, evitando erros
na captação dos dados testados (PERRY, 2005). Ghoussayni et al. (2004) validou um método
simples de análise de marcha, detectando parâmetros como velocidade, e a possibilidade de
aumento da repetitividade da análise desta, em pacientes com histórico de patologias
associadas à marcha.
Para a avaliação temporal da marcha, Hausdorff; Ladin; Wei (1995) utilizaram placas
piezelétricas, que se acoplavam no membro inferior, sendo seu sinal enviado a um
microcomputador para análise posterior. Tal método se mostrou de fácil obtenção, bem como
baixo ônus a seus usuários.
Aminian et al. (2004) propuseram um novo sistema de análise de marcha baseando-se
num conjunto de giroscópios em miniatura conectados a um captador de dados. Thorpe;
Dusing; Moore (2005) verificaram uma boa reprodutibilidade utilizando uma via eletrônica
chamada GAITRite. Brandes et al. (2006) usaram acelerômetros com êxito no tronco inferior
e na contagem de passos. Marsh et al. (2007) avaliaram a validade do pedômetro eletrônico
em adultos velhos que estão em risco de um distúrbio locomotor. Toro; Nester; Farren (2007)
conseguiram validar o sistema Salford Gait Tool sendo um método observacional de avaliação
da marcha. Além disso, sistemas compostos de diversas câmeras de vídeo e plataformas de
força também foram explorados (ANGIN et al., 2007; GHOUSSAYNI et al., 2004; SMITH et
al., 2004).
199
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Sabe-se que o contato do calcanhar é a referência para a mensuração de variáveis
temporais, sendo a primeira subfase do apoio (SHUMWAY-COOK; WOOLLACOTT, 2001;
NORKIN; LEVANGIE, 1992). Uma vez que esse momento é gravado e o toque é
identificado, pode-se estimar diversas variáveis. Um possível dispositivo que poderia detectar
o toque do calcanhar no solo é o microfone, que representa um acessório de baixo custo,
comumente usado em microcomputadores.
Machado et al. (2005; 2006) já haviam desenvolvido um algoritmo capaz de identificar
os momentos de toque do calcanhar usando microfones em indivíduos saudáveis. Foi
observada boa concordância entre o Método de Avaliação da Marcha com Microfones
(MAMM) e a gravação de vídeo (MACHADO et al., 2006). O algoritmo foi desenvolvido
para fornecer dados quantitativos, como cadência da marcha, velocidade e duração do passo e
da passada, utilizando o som gravado do paciente numa distância a ser percorrida já prédeterminada. A gravação do vídeo foi usada como um método de avaliação padrão-ouro. O
presente estudo teve como objetivo a validação do método de análise da marcha com
microfones em indivíduos idosos.
Metodologia
Amostra
Foram recrutados para esse estudo 17 indivíduos idosos (idade média = 69,12 ± 6,97
anos de idade, altura média = 158,75 ± 5,89 cm, peso médio = 68,35 ± 10,1 kg), tendo como
critério de exclusão os idosos que não são capazes de realizar a marcha normal. Todos os
indivíduos participantes assinaram um termo de consentimento, onde atestaram que estão
cientes dos procedimentos experimentais descritos pelo documento.
O presente estudo foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade Estácio de Sá.
Algoritmo
Como mencionado anteriormente, o contato do calcanhar no solo pode ser considerado
como o início da fase de apoio, sendo referência para muitas variáveis da marcha.
Conseqüentemente, se existir um dispositivo que capta esses toques, pode-se estimar variáveis
como duração do passo e passada, cadência e velocidade. Um microfone localizado em cada
membro inferior do indivíduo poderia ter esse papel. Considere a batida de um metrônomo
como representativa do som capturado pelo microfone no momento do toque do calcanhar. Na
Figura 1, tem-se a demonstração do gráfico do som gravado em relação à cadência de um
metrônomo, que ocorre por volta de 96 batidas por minuto (bpm). Cada pico pode ser
chamado de pico positivo de magnitude máxima (PPMM). Se for considerado que cada pico é
um toque do calcanhar, os intervalos entre os dois picos podem ser representados como o
tempo relativo aos dois passos, e a cadência é caracterizada pelo número do passos dividido
pelo total do tempo desde o início da gravação até o último pico gravado. Finalmente, a
marcha tem sua estimativa de velocidade através da distância percorrida dividida pelo tempo
total do percurso.
200
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Figura 1 – Som gravado de um metrônomo.
Para estimar estas variáveis, foi desenvolvido e implementado um algoritmo em
Matlab® (The MathWorks Inc., USA).
Posteriormente ao som gravado, podem ser realizadas as seguintes instruções: (1)
gravar o arquivo (.wav extensão); (2) construa o gráfico do sinal (figura 1, por exemplo); (3)
encontrar o tempo (em segundos) relacionado a cada pico positivo de magnitude máxima,
construído pelo vetor x1 com N pontos (N picos, ou N passos); (4) Calculado o tempo dos
picos, é possível a construção de um novo vetor de N pontos x2 onde para 2 ≤ i ≤ N-1, x2(1) =
x1(2) – x1(1) e x2(i) = x1(i+1) – x1(i). Esses pontos representam a duração entre os dois
passos. Note que o intervalo da gravação no começo do primeiro passo é excluído do novo
vetor. Esse procedimento é muito importante, uma vez que o início da gravação é feito
manualmente por um avaliador e isso pode diminuir o tempo real do primeiro passo,
conseqüentemente induzindo erros na estimativa das variáveis da marcha, principalmente
quanto à velocidade. Por esta razão, o algoritmo identifica o segundo PPMM como o primeiro
passo para análise dos dados; (5) Assumindo o primeiro passo como o membro esquerdo, à
construção de dois novos vetores, y1 e y2, onde para 1 ≤ i ≤ N-1: se i é ímpar, y1(j) = x2(i) +
x2(i+1); se i é par, y2(j) = x2(i) + x2(i+1); j varia de 1 a N/2, se N for ímpar; se N for par, j
varia de 1 a N/2 para y1, e de 1 até (N/2)-1 para y2; y1 e y2 representam as durações de cada
passada direita e esquerda, respectivamente; (6) Para calcular a cadência da marcha (passos
por segundo - passos/s) divide-se N pelo total do tempo em segundos; (7) O cálculo da
velocidade da marcha (m/s) é feito pela divisão da distância percorrida pelo tempo total (s);
(8) Calcule a estatística básica, tal como desvio padrão, coeficiente de variação, valores
máximos e mínimos, retirados do vetor x2 (passos), y1 (passada esquerda) e y2 (passada
direita).
201
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
O usuário introduz três parâmetros após a análise visual do gráfico: (a) limiar de
amplitude: o algoritmo capta os picos com valores mais altos do que esse limiar. A importância
deste fato será discutida posteriormente; (b) a distância total percorrida, para estimativa da
velocidade da marcha; (c) janela temporal de busca: para encontrar os picos, o sinal é dividido
em M segmentos de t segundos. No interior da janela temporal, o algoritmo procura os
PPMM‟s, acima do limiar de amplitude. A divisão do sinal é muito importante, uma vez que
um pico que é aparentemente único pode possuir diversos picos. Isso pode ser observado na
ampliação do pico, na figura 2. Se a divisão do sinal não for feita, o algoritmo identificaria
diversos picos.
Figura 2 – Ampliação do quinto pico do sinal da figura 1.
O uso destas janelas pode ter outra desvantagem: se a região do pico é capturada por
duas janelas (no final da primeira e no início da próxima), o algoritmo determina os dois picos
aproximadamente no mesmo tempo. Para evitar isso, margem de erro (ME) é usada. Se o final
de uma janela encontra um pico em t 1 segundos, e o início da próxima encontra outro em t2,
onde t2 ≤ t1 + EM, o último pico é descartado.
Protocolo experimental
Dois microfones padrão para microcomputadores (Leadership ® - Freqüência de
resposta: 50Hz~16kHz, sensibilidade: -58±3dB, razão sinal-ruído: 40dB) foram fixados
lateralmente ao tornozelo e posteriormente ao maléolo lateral da fíbula, com a extremidade
distal a aproximadamente 1 a 3 mm do chão, usando duas presilhas de velcro unidas a um
modelo de tecido confeccionado para esse fim. Cada microfone foi conectado a uma extensão
de fio estéreo de 15 metros de comprimento, sendo colocado uma presilha na altura da cintura
dos idosos para segurar este fio afastado do solo. Esta extensão interliga o dispositivo ao
computador. Na Figura 3 é demonstrada a fixação do dispositivo na perna do indivíduo
testado.
202
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Figura 3- Modo de fixação do MAMM.
Anteriormente a colocação dos microfones, foi solicitado ao indivíduo para que
percorresse uma distância de 6 m (com sua velocidade normal cotidiana, finalizando em uma
marca específica feita no chão). Nesse período, é realizada apenas uma gravação de vídeo.
Após retornar a posição inicial, dois novos percursos foram realizados, e então gravados com
o MAMM.
A gravação e processamento do som proveniente dos microfones foram feitos usando o
programa Matlab® (The MathWorks Inc., EUA) (fa = 8 kHz; 8 Bit; Mono), com um volume de
1/6 do máximo, para capturar apenas o som produzido pelo contato do calcanhar.
Simultaneamente, para a gravação de vídeo, uma câmera digital JVC ® (modelo GR-D91U, fa
= 30 quadros por segundo = 30 Hz) foi usada.
Para a estimativa dos instantes de toque do calcanhar usando o MAMM, o algoritmo de
Machado et al. (2005, 2006) foi implementado também em Matlab®. Com esse programa, é
possível identificar os picos sonoros referentes ao contato do calcanhar no chão, e dessa forma
estimar variáveis como cadência, velocidade e duração do passo e passada. No caso da
gravação de vídeo, os instantes foram identificados visualmente na câmera, utilizando o
recurso de slow motion. Como variáveis de comparação, foram estimados os valores de
duração média e desvio-padrão dos passos de cada indivíduo, tanto para o MAMM quanto
para a gravação por vídeo.
203
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Análise estatística
Para a análise estatística, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson (CCP)
para verificar a correlação entre os métodos; a avaliação da concordância entre dois métodos
proposta por Bland e Altman (1986), o teste t para uma amostra (α = 0,05), com o objetivo de
verificar se o erro entre os métodos é significativamente igual a zero, e o teste t pareado (α =
0,05) para verificar se há diferença entre a marcha sem e com os microfones acoplados.
Resultados
Na Figura 4, pode-se observar o exemplo de um sinal proveniente da gravação do som
pelos microfones da marcha de um idoso. A velocidade foi estimada em 1,00 m/s, e sua
cadência em 1,83 passos/s, tendo uma duração média de 0,54 ± 0,04 s. Para esta estimativa,
foram utilizados um limiar de amplitude de 0,5 com uma janela de processamento de 0,4 s.
1
Amplitude (escala arbitrária)
0.8
0.6
0.4
0.2
0
-0.2
-0.4
-0.6
-0.8
-1
0
1
2
3
4
5
Tempo (segundos)
6
7
8
Figura 4 - Sinal coletado proveniente da gravação da marcha de um idoso. Estimativas: velocidade = 1,00m/s;
cadência = 1,83 passos/s; limiar de amplitude = 0,5; janela de processamento = 0,4s.
204
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
No gráfico a seguir (Figura 5) tem-se a comparação entre a duração dos passos direito
e esquerdo, onde se pode observar que não há diferença significativa entre eles.
0.6
Tempo (segundos)
0.5
0.4
0.3
0.2
0.1
Dir
Esq
0
1
1.5
2
2.5
3
Passo
3.5
4
4.5
5
Figura 5 – Comparação da duração dos passos direito e esquerdo. Observa-se que apenas no primeiro passo há
diferença quanto ao tempo realizado no passo direito sobre o esquerdo.
A Figura 6 demonstra visualmente a correlação entre as estimativas de duração média
do passo pelo vídeo e MAMM. Obteve-se alto coeficiente de Pearson (r = 0,99). Já em relação
ao desvio-padrão (Figura 7), obteve-se uma correlação moderada (r = 0,70).
Duracao media dos passos (s) MAMM
0.75
0.7
0.65
0.6
0.55
0.5
0.45
0.5
0.55
0.6
0.65
0.7
Duração média dos passos (s) Vídeo
0.75
Figura 6 – Correlação da duração dos passos entre o método MAMM e a gravação com vídeo (r = 0,99)
205
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Desvio-padrão da duração média dos passos (s) MAMM
0.13
0.12
0.11
0.1
0.09
0.08
0.07
0.06
0.05
0.04
0.03
0.02
0.04
0.06
0.08
0.1
0.12
0.14
Desvio-padrão da duração média dos passos (s) Video
Figura 7 – Correlação do desvio-padrão médio dos passos no método MAMM e na gravação por vídeo (r = 0,70).
Diferença das estimativas (duração dos passos)
entre Video e MAMM (s)
A análise de concordância Bland-Altman pode ser observada para a duração média dos
passos (Figura 8) e desvio-padrão da média dos passos (Figura 9), comparando os métodos
MAMM e vídeo. Observa-se boa concordância, exceto por um caso, que ultrapassa os limites
de concordância. A tabela 1 mostra os resultados dessa análise.
0.2
0.15
0.1
0.05
0
-0.05
-0.1
-0.15
-0.2
0.45
0.5
0.55
0.6
0.65
0.7
0.75
0.8
Média das estimativas (duração dos passos) entre Video e MAMM (s)
Figura 8 – Análise de concordância de Bland-Altman entre os métodos Vídeo e MAMM (variável: média da
duração dos passos).
206
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Diferença das estimativas (desvio-padrão da duração dos passos)
entre Video e MAMM (s)
0.2
0.15
0.1
0.05
0
-0.05
-0.1
-0.15
-0.2
-0.25
-0.05
0
0.05
0.1
0.15
0.2
Média das estimativas (desvio-padrão da duração dos passos)
entre Video e MAMM (s)
Figura 9 – Análise de concordância de Bland-Altman entre os métodos Vídeo e MAMM (variável: desvio-padrão
da média da duração dos passos).
Tabela 1 – Resultados da análise de concordância Bland-Altman (IC = intervalo de confiança).
Diferença média da duração dos
passos (s)
Limite inferior de concordância (s)
Limite superior de concordância (s)
Diferença média do desvio- padrão
da duração dos passos (s)
Limite inferior de concordância (s)
Limite superior de concordância (s)
Valor
IC 95%
inferior
IC 95%
superior
-0,003
-0,006
0,000
-0,017
0,010
-0,023
0,004
-0,011
0,016
-0,010
-0,021
0,000
-0,051
0,029
-0,069
0,011
-0,033
0,047
A aplicação do teste t de Student foi aplicada para verificar se a utilização do
microfone influenciaria o padrão normal de marcha do indivíduo. Foi observado que, em
apenas dois indivíduos, os microfones alteraram o padrão da marcha (p < 0,05). Também pelo
teste t foi possível concluir que a diferença na estimativa dos métodos é aproximadamente
igual a zero (p = 0,067).
207
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Discussão
Neste trabalho a validação do método de análise temporal da marcha foi estudada em
indivíduos idosos. A utilização de equipamentos de baixo custo, como microfones, já foi
estudada por Machado et al. (2005). Neste trabalho, a utilização de um algoritmo
desenvolvido pelos autores mostrou-se eficaz para a análise dos dados coletados.
Na Figura 4 pode-se observar o sinal do MAMM, que mostra os picos referentes aos
passos do indivíduo. O limiar de amplitude escolhido consegue selecionar os picos de máxima
amplitude, e excluir o ruído gerado no sinal. Mesmo sendo um aspecto subjetivo do método,
um rápido treinamento do profissional o deixaria capacitado para escolher os melhores
parâmetros.
Obteve-se boa correlação entre os métodos. A figura 7 demonstra o desvio-padrão da
duração média dos passos entre os métodos citados. A correlação se mostrou de forma
moderada. Isso talvez seja explicado pela freqüência de amostragem diferente entre os
métodos (8 kHz para o MAMM, e 30 Hz para a câmera de vídeo).
Porém, a análise de Bland e Altman (Figura 8) mostra que as estimativas do MAMM
são similares a da análise por vídeo, com exceção de um caso. Em relação à diferença das
estimativas (figura 9), apenas um indivíduo não apresentou valor dentro dos parâmetros,
mostrando que um método pode ser substituído pelo outro.
Além disso, a observação do vídeo gravado era feita manualmente por um dos
pesquisadores (slow motion). Este fato pode ter alterado os dados colhidos devido a sua
observação não ter sido feita com precisão. Ao realizar o processo de coleta de dados no
vídeo, o pesquisador, influenciado pela baixa freqüência de amostragem do vídeo, pode ter
estimado valores errôneos, alterando os resultados finais do processo de análise. O
desenvolvimento de um método que substitua a coleta de dados manualmente na gravação por
vídeo possibilitará a melhora da análise.
Na prática clínica, a utilização de sofisticados aparelhos biomecânicos tem se mostrado
de enorme valia para a quantificação de dados da marcha. Porém, estes métodos exigem um
ônus muito grande aos profissionais, que geralmente não possuem tais recursos na prática
semiológica, principalmente no contexto brasileiro. Este método se mostrou de baixo custo, o
que facilita sua aquisição para a mensuração de variáveis temporais da marcha. Comparados a
equipamentos como o eletromiógrafo, plataformas de força e o sistema de marcadores
captados por receptores fotoelétricos (VIEL, 2001; PERRY, 2005), utilizados em
departamentos de biomecânica, o método MAMM chega a significar um investimento
claramente menor.
Durante a captação de dados, alguns idosos apresentaram receio antes de realizar a
marcha com os microfones, devido a seus fios estarem soltos, podendo entrelaçar-se nas
pernas destes. Tal problema foi resolvido com a colocação de presilhas na altura da cintura dos
idosos, evitando que seus fios ficassem no percurso, apresentando risco de queda de um destes
208
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
idosos. Pode-se futuramente desenvolver um dispositivo que possibilite a não utilização de
fios para o acoplamento do microcomputador aos microfones.
Outra limitação que poderia ser apontada seria o fato de que em algumas ocasiões, o
sinal sonoro era de má qualidade, devido por exemplo a um mau posicionamento do
dispositivo. Isso trazia a necessidade de uma nova gravação. Estudos futuros devem tentar
resolver esse problema.
Considerações Finais
O presente estudo apresentou e validou a utilização do MAMM como ferramenta
semiológica da marcha em idosos.
As estimativas do MAMM se mostraram coerentes com a gravação de vídeo (boa
concordância), método muito usado na prática clínica e de pesquisa. Logo, um método de
menor custo e mais simples de ser utilizado torna-se uma possibilidade.
A realização de estudos futuros se mostra necessária para melhoria do protótipo
utilizado. A utilização de microfones sem fio, bem como o melhor acoplamento do protótipo a
perna do indivíduo testado, são imprescindíveis para o aumento da confiabilidade do método.
Agradecimentos
Agradecemos ao Prof. Cláudio Cirto (Universidade Estácio de Sá) pelos
conhecimentos compartilhados e pelo apoio concedido ao presente estudo, bem como ao
fisioterapeuta Elecides Teixeira Junior pelo auxílio prestado para a elaboração do trabalho.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
“Mais Amor e Menos Confiança”
Análise do Conto “Guardador” de João Antônio
Autor:
Ana Beatriz Manier
Curso de Letras
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientadora: Valéria Campos Muniz
Resumo
Dentro de uma perspectiva literária, este trabalho visa analisar o conto “Guardador” de João
Antônio Ferreira Filho. Escritor contemporâneo − paulista de nascença, carioca por opção −,
João Antônio enriquece a cena literária brasileira durante três décadas, desde os anos de 1960.
De origem humilde e olhar aguçado, voltado povo, para o marginalizado, esse contista narra
experiências cotidianas dos menos afortunados, dando visibilidade àqueles que passam
despercebidos aos olhos da sociedade.
Palavras-chave: Guardador; João Antônio; marginalizado; sociedade.
Introdução
O presente trabalho tem como objetivo analisar o conto “Gurdador” do escritor João
Antônio sob uma perspectiva literária. Apesar do traço marcante da obra de João Antônio
constituir-se da tentativa de humanização de seus personagens marginalizados, dando-lhes,
assim, visibilidade como cidadãos, não há aqui intenção de se fazer uma análise sociológica ou
psicológica da relação entre protagonista e sociedade. A análise que se segue tem como base
os recursos narrativos e linguísticos usados pelo autor na exposição dos explícitos e implícitos
de sua literatura, assim como a forma como trabalha seu lirismo e sua pressuposta intenção de
comover o leitor.
[...] antes, procurava-se mostrar que o valor e o significado de uma obra dependiam de
ela exprimir ou não certo aspecto da realidade, e que este aspecto constituía o que ela
tinha de essencial. Depois, chegou-se à conclusão oposta, procurando-se mostrar que a
matéria de uma obra é secundária e que a sua importância deriva das operações formais
postas em jogo, conferindo-lhe uma peculiaridade que a torna de fato independente de
quaisquer condicionamentos, sobretudo social, considerado inoperante como elemento
de compreensão. (CANDIDO, 2000 pg.5)
Contextualizando João Antônio na literatura brasileira
Professora Mestre da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
212
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Autor contemporâneo, João Antônio atua como escritor no período entre as décadas de
1960 e 1990.
Apesar de vivenciar o período de poder ditatorial no Brasil, as tensões, os rigores e a
falta de liberdade próprios da época não constituem o foco de sua narrativa. Sob grande
influência do que se chama, na literatura brasileira, de Romance Social, João Antônio,
seguindo a linha de escritores como Lima Barreto e Alcântara Machado, surge como contista
dos socialmente marginalizados, habitantes do submundo das grandes cidades, atribuindo-lhes
humanidade. “O submundo de João Antônio é, sobretudo, um recorte social, define-se como
um grupo à margem [...]. Os protagonistas predominantes da obra de João Antônio são mesmo
os anti-heróis, jogadores, rufiões, merdunchos e prostitutas.” (LACERDA, 2006)
Breve biografia
João Antônio Ferreira Filho, natural da cidade de São Paulo, nasceu em 27 de janeiro
de 1937. Filho de emigrante português − caminhoneiro, dono de botequim − e mãe carioca,
dona de casa semianalfabeta, morou em “quase favelas” (LACERDA, 2009 pg. 3) na periferia
paulistana.
Desde os oito anos trabalhava para ajudar a família, inicialmente no comércio do pai e
depois na posição de balconista, caixeiro viajante, office-boy e almoxarife em diversas
empresas.
Leitor assíduo, nunca deixou de estudar, embora o tenha feito com um pouco de má
vontade no que dizia respeito ao estudo formal.
Aos doze anos, em 1949, publicou alguns contos em um jornal infanto-juvenil, O
Crisol. Aos dezessete anos, em 1954, como prêmio em um concurso de literatura, publicou seu
primeiro conto adulto, “Um preso”, no jornal O Tempo. No mesmo ano, começa a frequentar
os salões de sinuca e a boemia paulista. Nos anos seguintes, ganha outros concursos e tem
mais contos publicados em diferentes jornais. Escreve sem parar. Ao terminar o segundo grau,
ingressa na faculdade de jornalismo, praticamente a interrompe para servir ao exército,
voltando depois para concluir o curso.
Em 1963, lança seu primeiro livro de contos Malagueta, Perus e Bacanaço, com a
reescrita de originais queimados durante um incêndio em sua casa, em agosto de 1960.
“Finalmente, o livro estava na rua. O menino de origem humilde e pouco dado ao estudo
formal, contra todos os obstáculos sociais e familiares, virara um escritor.” (LACERDA, 2009
pg. 4)
Ainda na década de 1960, João Antônio muda-se para o Rio de Janeiro e começa a
trabalhar no Jornal do Brasil. Em sequência, ingressa na revista Manchete e no Pasquim.
Dividindo a vida entre São Paulo e Rio, começa também a narrar a vida cotidiana na capital
carioca. Em 1978, lança Ô Copacabana!, livro de contos no qual narra este bairro carioca sem
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
visão idealizada. Em 1992, lança o livro de contos Guardador, que recebe o prêmio Jabuti e
cujo conto homônimo é objeto de análise deste trabalho. Em 1996, é encontrado morto em seu
apartamento em Copacabana.
O mestre Lima Barreto
Impossível falar de João Antônio sem enfatizar sua grande estima por Lima Barreto,
escritor brasileiro pré-modernista cuja obra voltou-se para o romance social. À sua memória,
dedicou todos os seus livros. Como diz em entrevista ao doutorando André Vinicius Pessôa:
Em 1970, há mais de 20 anos, eu resolvi ler e estudar Lima Barreto. Concluí que se
tratava não apenas de um dos maiores escritores do Brasil. Ele, além de escritor, foi
homem de pensamento. É impossível hoje você escrever uma história da inteligência
brasileira sem passar pela figura de Lima Barreto. Todos os grandes problemas
brasileiros já estavam expostos na sua obra, como, por exemplo, a questão fundiária.
Eu tenho por Lima Barreto não só uma admiração, mas um dever de gratidão por ele
ter me aberto os olhos para uma porção de coisas sobre a natureza deste país. É um
escritor muito forte, o maior romancista da chamada República Velha. Um escritor que
sempre contrariou o estabelecimento, uma figura muito autônoma e independente. Ele
foi um dos primeiros negros assumidos na história do país. Morreu aos 41 anos sem
dinheiro para o enterro, foi ajudado por amigos. Deixou 17 livros. Eu tento, de uma
maneira ou de outra, reverenciá-lo, dedico todos os meus livros a ele. (PESSÔA, 2009)
O Conto
Com alterações no foco narrativo, ou seja, ora narrado na terceira pessoa, ora na
primeira, assim como utilizando-se de discurso direto, indireto e indireto livre, o conto
Guardador nos dá o vislumbre da rotina de um flanelinha, nas ruas de Copacabana, nos idos
anos de 1990.
Jacarandá é seu nome, madeira forte, resistente, em contraste com a falta de
importância atribuída à sua existência como indivíduo. É um flanelinha, função que, aos olhos
da sociedade, torna-o membro impessoal de uma coletividade por ele representada:
vagabundos oportunistas que, em vez de procuraram emprego formal, visam apenas extorquir
dinheiro dos motoristas sob a possível ameaça não verbalizada de lhes danificar o carro.
Mas, para João Antônio, Jacarandá não se resume a apenas isso. É um ser humano com
angústias e reflexões; acima de tudo, com dignidade.
Com um estilo peculiar de narrativa que privilegia a informalidade da língua oral em
detrimento da formalidade da língua escrita, tanto na voz do personagem como na do próprio
narrador onisciente − que a toda hora se mesclam − João Antônio diminui a distância entre
dois mundos paralelos: o mundo do marginalizado que vive na ruas e dela tira seu sustento e o
mundo do cidadão comum, que tem emprego fixo, família ou, ao menos, uma casa para a qual
voltar.
O uso de coloquialismos e de alguns desvios de linguagem, no entanto, não nos priva
de reconhecer seu domínio da arte do bem escrever narrativo. João Antonio estrutura bem seus
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
textos, tem conhecimento amplo da língua brasileira e faz uso de retidão gramatical e
vocabular nos momentos necessários, em prol de coerência e coesão.
Usa e abusa de figuras de linguagem, o que confere grande carga expressiva ao seu
texto. Não faz menção a parábolas bíblicas, a clássicos da literatura estrangeira ou nacional,
nem à filosofia greco-romana, tampouco dialoga com saberes teóricos de grandes pensadores,
cita, contudo, os dizeres, as crenças e os saberes do povo − o que faz com maestria.
A rua ruim de novo.
Abafava de quente, depois de umas chuvadas de vento, desastrosas e medonhas, em
janeiro. Desregulava. Um calorão azucrinava o tumulto, o movimento, o rumor das
ruas. Mesmo de dia, as baratas saíam de tocas e escondidos, agitadas. Suor molhava a
testa e escorria na camisa dos que tocavam pra baixo e pra cima.
O toró, cavalo do cão, se arrumava lá no céu. Ia castigar outra vez, a gente sentia. Ia
arriar feio.
Dera, nesse tempo, para morar ou se esconder no oco do tronco da árvore, figueira
velha, das poucas ancestrais, resistente às devastações que a praça vem sofrendo.
(ANTÔNIO, 1994 p. 49)
As frases curtas e secas, as hipérboles (chuvada, calorão, toró, cavalo do cão), a
escolha lexical típica das ruas − gíria da malandragem − as sequências de termos de valor
negativo (ruim, abafava, chuvada, desastrosa, medonha, desregulava, calorão, azucrinava,
tumulto, toró, castigar, arriar feio, velha, devastações, sofrendo), nos aproximam da rotina de
quem vive nas ruas e das ruas, exposto às mudanças climáticas e ao tumulto; a imagem de
baratas saindo agitadas de tocas e escondidos nos levam a imaginar o cenário onde se
desenrolará a narrativa.
Aqui quem nos fala é o narrador, pessoa presente, testemunha ocular do que fala, que
se expressa com propriedade e objetividade. Narrador que não está ali contando a cidade de
forma utópica/idealizada, mas contando o que há, o que vê, o que sente.
Narrador e personagem muitas vezes se fundem durante o texto, aumentando a
sensação de veracidade dos fatos.
A origem humilde de João Antônio lhe proporcionou acesso ao modo de vida das
baixas camadas sociais, ao submundo dos marginalizados. Era neste (sub)mundo que se sentia
à vontade. “A convivência que ele fazia questão de cultivar com jogadores, prostitutas e
boêmios, será decisiva na concepção de seus textos”. (MARTIN, 2008).
No Rio de Janeiro, morando em um apartamento na Praça Serzedelo Correa, em
Copacabana, convivia com a decadência do bairro, com o contraste entre a Copacabana
cantada em verso e prosa e a Copacabana real, abafada, agitada, suja, cheia de baratas.
Tenta a vida naquelas calçadas.
215
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Pisando quase de lado, vai tropicando, um pedaço de flanela balanga no punho, seu
boné escorado lembra restos de carnaval. E assim sai do oco e baixa na praça.
(ANTÔNIO, 1994 p. 49)
É nas calçadas desta Copacabana que João Antônio nos apresenta seu personagem,
ainda sem nome, que “tenta” − diferentemente de “ganha” − a vida nas calçadas. A descrição
de seu andar e de seus gestos logo nos passa a impressão de desequilíbrio, de efeito de álcool.
Acrescente-se a isso a informação de que o personagem mora ou se esconde no oco de uma
figueira velha e, de lá, “baixa na praça”, podemos deduzir que esse personagem não tem
acesso a um espaço fixo nem descente como moradia, vive no oco. A rua é sua casa.
Da casa, sai para cumprir o expediente de trabalho. Para ele, como ficará mais claro
logo adiante no conto, é um trabalhador; as pessoas as quais aborda, fregueses.
Só no domingo, pela missa da manhã, oito fregueses dão a partida sem lhe pagar. Final da
missa, aflito ali, não sabe se corre para a direita ou para a esquerda, três motoristas lhe
escapam a um só tempo.
Flagrado na escapada, um despachou paternal, tirando o carro do ponto morto:
− Chefe, hoje estou sem trocado.
Disse na próxima lhe dava a forra.
Chefe, meus distintos, é o marido daquela senhora. Sim. Daquela santa mulher que
vocês deixaram em casa. Isso aí – o marido da ilustríssima. Passeiam e mariolam de lá
pra cá num bem-bom de vida. Chefe, chefe... Que é que vocês estão pensando? Mais
amor e menos confiança. (ANTÔNIO, 1994 p. 49-50)
Com sua narrativa, o autor nos permite ver a agilidade e aflição do personagem na cena
que transcorre, “o dinamismo característico do texto de João Antônio”. (ESTEVES, 2006).
Corre para um lado e outro, oito já lhe escaparam, outros três escapam juntos, é preciso correr.
Quando um dos “fregueses” é flagrado na escapada, segue-se uma interlocução interessante e
carregada de significado. A escolha do vocativo “chefe”, usado de forma paternal pelo
“freguês fugitivo”, esboça uma consideração que, via de regra, não existe por parte dos
motoristas, quando abordados por flanelinhas.
A reação do guardador, expressa em forma de pensamento, deixa claro que ele percebe
a tentativa de logro por parte do motorista; mais ainda, a seu ver, percebe a falta de respeito
para com sua pessoa. “Mais amor e menos confiança” é o que pensa e o que poderia ser
traduzido como um lembrete de que ele, guardador, também tem dignidade.
Mas um guardador de carros encena bastante de mágico, paciente, lépido ou resignado.
Pensa duas, três vezes. E fala manso. Por isso, Jacarandá procura um botequim e vai
entornando, goela abaixo, com lentidão necessária à matutação. Chefe... O quê! Estão
pensando que paralelepípedo é pão de ló?
− Assim não dá.
Havia erro. Talvez devesse se valer de ajudante, um garoto molambento, mas esperto
dos descidos das favelas, que mendigam debaixo do sol da praça, apanham algum
216
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
trocado, pixulé, caraminguá ocioso e sem serventia estendido pela caridade, inda mais
num domingo.
Que dão, dão. Beberica e escarafuncha. Difícil saber. Por que as pessoas dão esmola?
Cabeça branquejando, o boné pendido do lado reflete dúvidas.
Três tipos de pessoas dão. Só uma minoria – ninguém espere outro motivo – dá esmola
por entender o miserê. Há a maior parte, no meio, querendo se ver livre do pedinte. O
terceiro grupo, otários da classe média, escorrega trocados a esmoleiros já que,
vestidos direitinhamente, encabulariam ao tomar flagra em público – são uns duros,
uns tesos. Para eles, não ter cai mal. Se é domingo, pior. Domingo é ruim para os bemcomportados. (ANTÔNIO, 1994 p. 50-51)
Nas primeiras linhas do extrato acima, vê-se o claro confronto entre a resignação
aparente e necessária e a raiva genuína do personagem pelo motorista, seguido de uma
sensação de impotência, de exclusão e de desmoralização que o leva a beber. O uso de
sequências de sinônimos (trocado, pixulé, caraminguá ocioso; duros, tesos) reforça a
expressividade dos sentimentos. “A sonoridade das palavras, em João Antônio, têm um
valor expressivo em si, independente. [...] João Antônio insiste em enumerar dezenas de
sinônimos numa frase, siderado pelos ecos de cada um.” (LACERDA, 2006 pg. 9)
A vida é dura, paralelepípedo, pedra quente e forte, não é pão de ló, massa leve e
macia, como conclui o personagem. Em seguida, um momento de quase desistência, de
constatação de que alguma coisa precisa mudar: “havia erro”. O próprio boné reflete dúvidas,
diz o narrador, fazendo uso do recurso da prosopopeia. Talvez fosse melhor contar com a
ajuda de meninos de favela, desses que estão acostumados a viver de esmolas, porque ele, o
guardador, já tem a cabeça branquejando e não lhe sobra muita energia para trabalhar.
Na reflexão de Jacarandá e, indiretamente, do próprio autor, só grande minoria das
pessoas entende a miséria e olha para os miseráveis como pessoas que também sofrem e têm
sentimentos. “Tenho uma atração muito grande pelo que é do povo. São pessoas de grande
qualidade e, ao mesmo tempo, com grandes sofrimentos. Eu só gosto dessa gente. O popular
me chama, me atrai muito.” (ANTÔNIO, 1992). Para a grande maioria, a miséria é indiferente,
tudo o que quer é que a pobreza desapareça de sua vista. Para a classe média, que vive de
aparências e precisa ostentar mais do que tem, ser melhor do que é, a esmola é cedida por
vergonha de passar a impressão de não se sensibilizar ou não poder doar.
Apesar da pinga, esses pensamentos não o distraem de suas necessidades cada vez
mais ruças, imediatas. Se trabalhou, guardando-lhes os carros, por que resistem ao
pagamento da gorjeta? Eles rezando na Catedral e, depois, saindo para flanar. Teriam
dois jeitos de piedade – um na Catedral, outro cá fora? Chamou nova uca para abrir o
entendimento.
Muita vez, batalhando rápido nas praças e ruas, camelando nos arredores dos hotéis e
dos prédios grandes no centro, no aeroporto, na rodoviária, notou. Ele era o único que
trabalhava.
Muquiras, muquiranas. Aos poucos, ondas de álcool rondando a cabeça, capiscou. Os
motoristas caloteiros e fujões, bem-vestidinhos, viveriam atolados e amargando dívidas
de consórcio, prestações, correções monetárias e juros, arrocho, a prensa de taxas e
impostos difíceis de entender. Mas tinham de pagar e não lhes sobrava o algum com
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que soltar gorjeta ao guardador. Isso. O automóvel sozinho comia-lhes a provisão.
Jacarandá calculou. Motorista que faça umas quatro estacionadas por dia larga, picado
e aí no barato, um tufo de dinheiro no fim do mês.
Vamos e venhamos. Se não podiam, por que diabo tinham carro? O portuga diz que
quem não tem competência não se estabelece. Depois, a galinha come é com o bico no
chão. (ANTÔNIO, 1994 p. 51)
Bastante significativa aqui a fala do narrador, que principia o parágrafo com uma
oração adversativa: “Apesar da pinga...”. Apesar do álcool e da imagem de fuga, de
malandragem e de desmoralização a que a bebida remete, Jacarandá pensa, raciocina, reflete: é
dos poucos que trabalha, merece pagamento e não que os motoristas lhe fujam. Por outro lado,
mesmo reconhecendo/criticando a vida de aparências de parte da sociedade, não lhe escapa
que ela também enfrenta dificuldades financeiras. Contrai dívidas de consórcios, prestações,
correções monetárias, juros e impostos que, apesar de não fazerem parte de sua vida, sabe que
existem. O carro, aqui personificado, “come-lhes” a provisão. De tão mergulhados em dívidas,
as pessoas não têm trocados que possam ceder e deixar de contabilizar como despesa no final
do mês. Nas entrelinhas, o personagem sabe que todos têm dificuldades.
A nós, leitores, esta reflexão pode até surpreender, parecer-nos romantizada – pois
achamos que ali se encontra apenas um oportunista −, mas, para o guardador, e, por
conseguinte, para o próprio autor, a reflexão é séria, tem fundamento, é tão séria a ponto de o
personagem dizer a si para não mais pensar no assunto, sob o risco de tornar-se compreensivo
e complacente com relação ao outro. Sob o risco de enfraquecer.
Uma grande novidade na temática de João Antônio, desde seu primeiro livro, é a
valorização da humanidade de seus personagens. “Por certos momentos, de tão „humanos‟
chegam a ser idealizados e romantizados. Empresta-se a eles um lirismo que transcende sua
vida corrompida e os dignifica.” (Lacerda, 2006)
Tomar outra, não enveredar por esses negrumes. Nada. Corria o risco de desistir de
guardador. Ele sabia na pele que quem ama não fica rico. E, se vacilar, nem sobrevive.
Para afastar más inclinações, pediu outra dose. (ANTÔNIO, 1994 p. 51-52)
No entanto, como parte integrante de um sistema capitalista e impiedoso, o guardador
retorna à postura crítica anterior, não hesitando sair em defesa própria e deduzir: “quem ama
não fica rico” e “quem não tem competência não se estabelece”. Para não enfraquecer e não
correr o risco de abandonar a profissão, embriaga-se mais.
À tarde, houve futebol; suaram debaixo de um sol sem brisa. Ele e mais um magrelo de
uns oito anos, cara de quinze. A sorte lhes sorriu um tanto; guardando uma fileira de
carros no estádio, levantaram uns trocos, o crioulinho vivaço levou algum e o homem
foi beber. Havia se feito um ganho. Quando a peça não tem o que fazer, não tem nada o
que fazer.
Já não tem gana, gosto. E nem capricho; acabou a paciência para amigos ou auditórios.
Distrações suas, se há, vêm das necessidades e dos apertos. Não que o distraiam; certo
é que o aporrinham. Depois, não é de lamentações; antes, de campanar. Nem joga
dominó ou dama, a dinheiro, com os outros, enfiados na febre dos tabuleiros da praça
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na sombra das mangueiras. Mas que espia, espia, vivo entendedor. Goza com os olhos
os lances errados dos parceirinhos bobos. (ANTÔNIO, 1994 p. 52)
Mais uma vez, a bebida como fim, como fuga, como única recompensa pelo trabalho,
pois afinal, o personagem de João Antônio não tem perspectivas, vive uma realidade que lhe
acumula desprezo e desmoralização. Não tem para onde ir, é “desfixado”, vive na rua. “As
personagens de João Antônio só teriam a compartilhar essas experiências „radicalmente
desmoralizadas‟. Resta-lhes, assim, a solidão, o silêncio, o estar-separado, ausente de vida
comum.” (ESTEVES, 2006).
Fora a bebida, é um personagem sem lazer, sem distração, apenas com necessidades
que lhe ocupam a mente. Não se envolve em jogos, mas deles entende e lança seu olhar crítico
sobre os jogadores, aos quais considera “parceirinhos bobos”, e dos quais extrai um breve
gozo.
Nem sustentava a vitalidade dos guardadores. Bebia, lerdeava, e depois a hora do
almoço largava-se cochilando no oco da figueira. Era acordado pela molecagem de
motoristas gritalhões. Nada de grana e ainda desciam a língua.
− Pé de cana! Velho vagabundo!
Os cabelos pretos idos e, de passagem, a vivacidade, a espertice, o golpe de vista, o
parentesco que guardadores têm com a trucagem dos camelôs e dos jogadores de
chapinha, dos ventanistas, dos embromadores e mágicos, dos equilibristas e pingentes
urbanos. Subir nos lugares mais insuspeitados e imprevistos, pular à frente do
motorista no momento em que o freguês não espera. Miraculosamente, como de dentro
de um bueiro, de um galho de árvores, de dentro do chão ou do vão de alguma
escadaria. Saltar rápido e eficiente, limpando com flanela úmida o para-brisa,
impedindo a escapada e cobrando com cordialidade. Ironizar até com humildade e
categoria tratando o cara de doutor. E de distinto. (ANTÔNIO, 1994 p. 52-53)
Outra emoção sutilmente mostrada ao longo do texto de João Antônio é o
ressentimento: Jacarandá se ressente das ruas, do calor, do abafamento; dos motoristas que não
lhe pagam, dos motoristas que lhe pagam apenas para se verem livres dele, sem entender o que
é a miséria; da molecagem e dos outros motoristas que o taxam de alcoólatra e de vagabundo,
sem terem noção do que é sua vida. Vale relembrar sua reflexão: “Estão pensando que
paralelepípedo é pão de ló?” (ANTÔNIO, 1994 p. 50)
Os guardadores, o personagem reflete com orgulho, são espertos, quase mágicos, têm a
capacidade de aparecer do nada, de saltar rapidamente na frente do freguês, têm “truncagem”
típica de mágicos. E são cordiais, mesmo que para isso usem de ironiza. Não agridem os
clientes, tratam-nos com categoria. No entanto, ninguém parece perceber sua destreza e
tampouco lhe retribuem a gentileza. Apesar de orgulhoso de si, ressente-se.
Aos trompaços dos anos e minado pelo estrepe dos botequins, ele emperrara a
sua parte dessa picardia levípede.
Havia cata-mendigos limpando a cidade por ordem dos mandões lá de cima.
Assim, no verão; os majorengos queriam a cidade disfarçada para receber
turistas e visitantes ilustres. Os jornais, as rádios e a televisão berravam e não
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se sabia se estavam denunciando ou atiçando os assaltantes e a violência das
ruas. Quando em quando, o camburão da polícia cantava na curva da praça e
arrastava o herói, na limpeza da vagabundagem, toda essa gente sem registro.
A gente do pé inchado. Ele seguia, de cambulhada, em turminha. Lá dentro do
carrão, escuro e mais abafado.
Cambaio, sapatos comidos, amuava e já se achava homem que não precisava
de leros, nem tinha paciência pra mulher, patrão ou amizadinha. De bobeira,
tomava cadeia; saía, de novo bobeava, o metiam num arrastão.
Lá vai para o xilindró. (ANTÔNIO, 1994 p. 53)
“Herói”, eis aí, talvez, algo a mais que João Antônio tenha desejado passar para o
leitor, neste conto. Fugindo dos padrões do herói do romance clássico, o herói de João Antônio
não é menos forte, corajoso, hábil ou desimportante que este. Não é um semideus como os
heróis gregos, não é o belo justiceiro como os heróis dos romances de cavalaria. É o
marginalizado que, apesar de todo o sofrimento, todos os infortúnios, segue vivendo. Sente o
peso dos anos, sofre com as desatenções e é massificado, recolhido pelo camburão da polícia
como parte de uma coletividade de vagabundos indesejados.
− Chegou o velho chué.
No chiqueiro da polícia mofava quinze dias, um mês. Velho conhecido e cadeeiro, sim,
era salvado com zombaria que parecia consideração na fala dos freges e dos cafofos.
Banguelê:
− Chegou o velho cachaça!
Se entre o pessoal, se os mais moços, se os mais fortes não o aporrinhavam com
humilhações, desintoxicava ali, quieto nos cantos que lhe permitiam. (ANTÔNIO,
1994 p. 53)
O uso incessante de comparações que se seguirá pelo conto − aqui “cela” por
“chiqueiro” − denuncia, de forma quase ilustrativa, as condições às quais o personagem
enfrenta. Aqui, agora de forma explícita, o alvo é o poder público e seu descaso. Ser
conhecido por apelidos remete à familiaridade, à reincidência: já foi várias vezes retido pelo
poder público e depois solto, para retornar ao mesmo modo de vida em que se encontrava.
E tem que, não bebido, volta. É outro. Os movimentos de seu corpo ainda magro de
agora lembram os movimentos do corpo antigo. O verde das árvores descansa, ah,
assobia fino e bem, ensaia brincar com as crianças da praça. Dias sem cachaça, as
cores outra vez na cara, concentra um esforço, arruma ajudante, junta dinheiro. Quando
quer, ganha; organizado, desempenha direitinho. Nas pernas, opa, uma agilidade que
lembra coisa, a elegância safa de um passista de escola de samba.
Vem carro acolá:
− Deixa comigo. (ANTÔNIO, 1994 p. 54)
Fora das ruas, no entanto, embora “mofe” na cadeia, como bem metaforiza o autor, o
personagem ganha novo viço. A impossibilidade de beber o faz voltar a tomar as rédeas de si.
Surge um fio de esperança, mesmo em local improvável, de que há ainda vida e possibilidade
de recuperação.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Mas na continuação, nem semana depois, derrapava. À cana, à uca, ao mata-bicho. Ao
pingão. Fazia o carro; molhava o pé. Fazia mais, bebia a segunda e demorava o umbigo
encostado no balcão. Dia depois de dia entornando, perdia freguês e encardia, não
tomava banho. Ia longe o tempo em que dormia em quarto de pensão. E nem se
lembrava de olhar o mar. Enfiava-se, se encafuava no oco do tronco da árvore velha,
tão esquecida de trato. Fizera o esconderijo e, então, o mulherio rezadeiro das segundas
e sextas-feiras ia acender suas velas para as almas e para os santos ao pé de outras
árvores. E xingavam quem lhes tomara o espaço. (ANTÔNIO, 1994 p. 54)
Mas João Antônio escrevia sobre o que conhecia, não era um observador distante. “Eu
sou o tipo de escritor que vivencia as coisas sobre as quais escreve” (ANTÔNIO, 1992). Seus
personagens são frutos do meio, vítimas do determinismo, das “leis naturais‟ − fundamento
das narrativas realistas/naturalistas − de onde, geralmente, não há escapatória. “O Realismo se
tingirá de naturalismo, no romance e no conto, sempre que fizer personagens e enredos
submeterem-se ao destino cego das „leis naturais‟ que a ciência da época julgava ter
codificado.” (BOSI, 2006 p.168)
Dizia-se. Miséria pouca é bobagem.
A praça aninhava um miserê feio, ruim de se ver. A praça em Copacabana tinha de um
tudo. De igreja à viração rampeira de mulheres desbocadas, de ponto de jogo de bicho
a parque infantil nas tardes e nas manhãs. Pivetes de bermudas imundas, peitos nus se
arrumavam nos bancos escangalhados e ficavam magros, descalços, ameaçadores.
Dormiam ali mesmo, à noite, encolhidos como bichos, enquanto ratos enormes corriam
ariscos ou faziam paradinhas inesperadas perscrutando os canteiros. Passeavam
cachorros de apartamento e seus donos solitários e, à tarde, velhos aposentados se
uniam e tomavam a fresca, limpinhos e direitos. Também candinhas faladeiras,
pegajosas e de olhar mau, vestidas fora de moda, figuras de pardieiro descidas à rua
para a fuxicaria, de uma gordura precoce e desonesta, que as faziam parecer sempre
sujas e mais velhas do que eram, tão mulheres mal amadas e expostas ao contraste
cruel do número imenso das garotinhas bonitas no olhar, na ginga, nos meneios,
passando para a praia, bem dormidas e em tanga, corpos formosos, enxutos, admiráveis
no todo... também comadres faladeiras, faziam rodinhas do ti-ti-ti, do pó-pó-pó, do dizque-diz novidadeiro e da fofocada no mexericar, à boca pequena, chafurdando como
porcas gordas naquilo que entendiam e mal como vida alheia, falsamente boêmia ou
colorida pelo sol e pela praia, tão aparentemente livre, mas provisória, precária,
assustada, naqueles enfiados de Copacabana. Rodas de jogadores de cavalos nas
corridas noturnas se misturavam a religiosos e a cantarias do Nordeste. Muito namoro
e atracações de babás e empregadinhas com peões das construtoras. Batia o tambor e se
abria a sanfona nas noites de sábado e domingo. Ou o couro do surdo cantava solene na
batucada, havia tamborim, algum ganzá e a ginga das vozes mulatas comiam o ar.
Aquilo lhe bulia – se a gente repara, a batida do pandeiro é triste. Ia-lhe o sangue. Os
niquelados agitavam o ritmo, que o tarol e o tamborim lapidam na armação de um
diálogo. (ANTÔNIO, 1994 p. 54-55)
Mais uma vez, Jacarandá, em suas reflexões, encontra certo consolo observando a
situação dos outros à sua volta. “Miséria pouca é bobagem”, conclui, ao ver o contexto no qual
está inserido.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Segue-se no texto uma descrição minuciosa de Copacabana, de seus contrastes
(prostitutas e beatas; jogatina e parques infantis), de sua mistura de classes e costumes que
coexistem num espaço relativamente pequeno. O lado marginal, provinciano, feio, sujo,
libidinoso e antiestético da “princesinha do mar” é denunciado, mostrando a superficialidade
da imagem de cartão-postal. Jacarandá ressente-se e emociona-se: “[...] a batida do pandeiro é
triste.”
O vento vindo do mar varria a praia e chegava manso ao arvoredo noturno.
Refrescava.
Os olhos brilhavam, quanto, ficavam longe, antigos e quase infantis numa lembrança
ora peralta, ora magnífica. O samba. Era como se ele soubesse. Lá no fundo. O que
marca no som e o que prende e o que importa é a percussão. Mas meneava a cabeça,
como se dissesse para dentro: “deixa pra lá”. (ANTÔNIO, 1994 p. 55-56)
Emocionado, personagem tem lembranças da infância. São lembranças abstratas,
pouco elaboradas e individualizadas, pois, mais uma vez, têm a ver com uma relação de
coletividade e não de individualidade: o samba, música de todos, com raízes na marginalidade
do povo carioca. Mas lembranças não lhe fazem bem, pois, certamente, não há para onde
voltar, tampouco para onde ir. “Deixa pra lá”, pensa.
Outra vez. Na noite, o bacana enternado, banhado de novo, estacionou o carro
importado, desceu. Entrou na boate ali defronte, ficou horas. Saiu, madrugada,
lambuzado das importâncias, empolado e com mulher a tiracolo.
Jacarandá, bebido e de olho torto, vivia um momento em que fantasiava grandezas,
tomando um ar cavalheiresco.
O rico, no volante, lhe estendeu uma moeda.
A peça, altaneira no porre, nem o olhou:
− Doutor, isso aí eu não aceito. Trabalho com dinheiro, com esse produto não.
Avermelhado, fulo, o homem deu partida, a mulher a seu lado sacudiu, o carrão raspou
uma árvore e sumiu. Pneus cantaram.
O menino já tinha se mandado, pegara o rumo do morro e, não estivesse no aceso de
um pagode, sambando, estaria dormindo no barraco. Era hora.
Jacarandá, cabeça alta, falou-lhe como se ele estivesse:
− Xará, eu ganho mais dinheiro que ele. É que não saio do botequim. – Aí, foi para
dentro do oco da árvore, encostou a cabeça e olhou a lua. (ANTÔNIO, 1994 p. 56)
Recuperado do breve retorno ao passado, o protagonista volta à atividade. Um
contraste marcante se segue rumo ao fim da narrativa, um confronto direto entre o personagem
marginalizado e outro socialmente favorecido; um verdadeiro embate de orgulhos e
dignidades. Apesar de pobre e excluído, Jacarandá tem noção da própria existência e, como já
mostrado em partes anteriores do conto, não suporta que lhe firam os brios.
Quando o freguês que, pela aparência, ele julga rico entrega-lhe uma moeda,
Jacarandá, mesmo alcoolizado, sai em defesa da própria dignidade, negando a gorjeta.
Trabalha com dinheiro, não com aquele produto.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Em um momento carregado de lirismo, que tanto pode ser interpretado como fruto de
um devaneio, de uma necessidade de compensação, ou de reconhecimento de quem de fato
seja, o personagem julga-se tão capaz e importante quanto o freguês. O que o prejudica, é a
bebida. Volta então para o oco, para o vazio e mira a lua, o inalcançável.
Considerações Finais
Após uma análise pormenorizada de “GUARDADOR”, resta-nos endossar o que
Antonio Candido expõe no início do capítulo de “Crítica e sociologia”, devidamente citado na
página 2 deste trabalho, sobre a independência da obra literária.
Em pouco mais de dez páginas de extratos comentados do conto, ora abordando-se o
foco narrativo, o tipo discursivo, o registro, os recursos estilísticos utilizados pelo autor, ora
falando do próprio autor e de sua vivência, que, em conjunto com toda sua habilidade de
escrita, confere verossimilhança à narrativa, podemos dizer que João Antônio cumpre sua
pressuposta intenção de dar voz e visibilidade ao marginalizado, via literatura, sem para isso
lançar mão de uma narrativa documental, panfletária, baseada em análises sociológicas ou
psicológicas.
Tampouco nós, leitores ou estudiosos de literatura, precisamos enveredar por estes
caminhos para extrair a essência de sua obra.
No espaço de três páginas, personagem e enredo nos envolvem e nos fazem visualizar,
se não vivenciar, a vida de um indivíduo tão comum em nosso dia a dia e ainda assim, tão
invisível como cidadão.
Romanceada ou não, difícil sair incólume da leitura desta obra de João Antônio.
É a literatura cumprindo seu papel.
Referências
ANTÔNIO, João. Guardador. 2 Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1994.
______________. Ô Copacabana! 1 Reimpressão, 2008. São Paulo: Cosac Naify, 2001.
______________. Entrevista com João Antônio. Disponível em:
http://portalliteral.terra.com.br/artigos/entrevista-com-joao-antonio. Entrevista concedida a
André Vinicius Pessoa, 1992.
BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. 43 Ed. São Paulo: Cultrix, 2006.
CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade. 8 Ed. São Paulo: T.A. Queiroz, 2000;
Publifolha, 2000. – (Grandes nomes do pensamento brasileiro).
ESTEVES, Ana Maria. A candangagem despencou-se e perdeu as origens: Ô,
Copacabana! Contemporânea, Rio de Janeiro, n° 7, 2006. Disponível em:
http://www.contemporanea.uerj.br/pdf/ed_07/07ANAMARIA.pdf. Acesso em: setembro de
2011.
223
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
LACERDA, Rodrigo. João Antônio: uma biografia literária. Tese de doutorado, São Paulo,
2006. Disponível em: http://www.rodrigolacerda.com.br/ja-biografia
________________. O primeiro amor de João Antônio. In: ANTÔNIO, João. Malagueta,
Perus e Bacanaço. 4. Ed. rev. São Paulo: Cosac Naify, 2009.
MARTIN, Vima Lia. Literatura e Marginalidade – Um estudo sobre João Antônio e
Luandino Vieira. 1 Ed. São Paulo: Alameda 2008.
PESSOA, André Vinicius. Entrevista com João Antônio, 26 mar. 2009. Disponível em:
http://portalliteral.terra.com.br/artigos/entrevista-com-joao-Antônio. Acesso em: 17 out, 2011.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Língua e literatura na informática e
sua influência na educação
Autor:
Rick Azevedo da Cunha
Curso de Letras
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Orientadora: Valéria Campos Muniz
Resumo
Com as inovações tecnológicas e a popularização do computador e da internet, as mudanças
são grandes e perceptíveis. Essas mudanças também atingiram a língua, a literatura e a
educação. O presente trabalho apresenta as mudanças ocorridas na área literária, como novos
gêneros textuais e a adaptação de outros para o ambiente virtual. Na área da linguística, há os
casos de estrangeirismos que se acabam sendo incorporados aos nossos dicionários e palavras
que são modificadas para a nossa Língua. Na área da educação, há diversos instrumentos que
são inovadores que acrescentam no processo de ensino-aprendizagem, facilitando o estudo e
cativando os alunos que se identificam com as novas tecnologias.
Introdução
A época, em que o público se contentava em apenas receber informações sem intenção
de modificá-las, apenas navegar de site em site num simples estado de contemplação, já está
ultrapassada.
As páginas dos sites tornaram-se mais acessíveis, permitindo a interação daqueles que
tinham uma posição passiva diante da grandiosidade de informações contidas na rede.
Atualmente, a chamada “web 2.0” permite ao indivíduo tornar-se coautor dessa nova era
informatizada emergente. O usuário de vários serviços e sites pode transformá-los segundo sua
vontade e sua necessidade.
Mas, como nenhuma revolução atinge somente um lado; esse mesmo usuário, que é
agente transformador na web também sofre transformações feitas por ela. Transformações que
ocorreram ao longo do tempo, como, por exemplo, a dependência por esses mesmos serviços,
que tornaram-se essenciais na vida social do indivíduo, provocaram também mudanças na
linguagem, na língua, na visão de mundo e na forma de leitura.
Professora Mestre da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Isso tudo acontece pelo constante uso das tecnologias de informação e comunicação
(TIC) que está em crescimento contínuo em todo o mundo. O número de pessoas que acessam
a internet só aumenta e, com isso, a revolução informatizada atinge mais pessoas, podendo
estas ser agentes transformadores não só na web, mas também na área em que desejarem. Isso
se dá pela facilidade de relações que há na internet, a troca de informações e o conhecimento
de trabalhos que, sem a web, não seriam conhecidos.
Um meio onde isso tudo acontece são os sites de redes sociais que, segundo Raquel
Recuero (2009, p. 102), são “os espaços utilizados para a expressão das redes sociais na
Internet”. Em outras palavras, uma rede social é o local em que conexões entre indivíduos são
realizadas, podendo estes ter ou não os mesmos interesses e objetivos. Logo, as redes sociais
são lugares, na web, de encontros.
Para Boyd & Ellison (2007), as redes sociais são sistemas que permitem a construção
de um perfil ou página pessoal; interação através de comentários; e a exposição do perfil de
cada ator. Na rede social, o internauta tem a liberdade de expressar e de modificar a sua página
na web, podendo se relacionar com quem quiser e expor-se da sua maneira. O internauta tem a
facilidade de transformar esse meio da rede social.
Assim, “ser amigo” nessas redes, como Orkut, Facebook, Twitter tornou-se mais do
que simples relações superficiais da web com intuito de “quanto mais melhor”; as redes
sociais transformaram-se em trampolins para a divulgação de trabalhos, teses, novidades
artísticas. Mostrar sua criatividade e investir um pouco na divulgação dela, já faz com que o
indivíduo seja conhecido por certa comunidade da web e os próprios membros da comunidade
divulgam aquilo de que gostam, aprovando ou não o trabalho. Desta forma, os mais diversos
produtos criativos e novos vão se espalhando pelas redes sociais e o que é bom ou chama
atenção do público cai nas telas dos internautas e o que era novo torna-se conhecido, gerando
fama e sendo propagado por toda a web.
O que vamos estudar nesse trabalho é como essa era informatizada com a web 2.0
influencia a Literatura e a Língua Portuguesa. Como a web incentivou a criação e divulgação
literária, fazendo com que a leitura no ambiente virtual chegasse a ultrapassar a leitura dos
livros físicos. Quais os novos tipos de textos literários emergentes. Qual a influência da
informática na linguagem e como se lidar com essas mudanças? Essas e outras questões serão
discutidas no decorrer dessas páginas.
Web Autores
Quando o internauta sai da posição passiva para ser esse transformador da web,
segundo Francis Pisani e Dominique Piotet, ele se torna um web ator.
Já não são mais navegadores passivos, que consomem, sem reagir a informação que
lhes é proposta nos sites mantidos por especialistas. Os usuários atuais propõem
serviços, trocam informações, comentam, envolvem-se, participam. Eles e elas
produzem o essencial do conteúdo da web. Esses internautas em plena mutação não se
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
contentam só em navegar, surfar. Eles atuam; por isso, decidimos chamá-los “web
atores”. (2010, p.16).
Como analisaremos as transformações que a web trouxe para as áreas de linguagem e
literatura, ouso em chamar o web ator de web autor, pois ele faz parte da web, construindo-a
em um ciclo de receber e produzir, usando a criatividade nas palavras e publicando aquilo que
produz.
Ser web autor não é simplesmente escrever, o web autor deve se adaptar aos serviços
que, muitas vezes, possuem limitações e formas diferentes das encontradas fora da web.
Como, por exemplo, o Twitter (o que analisaremos mais à frente).
Literatura Informatizada
Com a possibilidade fornecida pela web de criação, produção e transformação, o web
autor usa a web da maneira que deseja, transformando-a segundo seu estilo de vida,
preferências e tribos. O web autor faz com que a literatura torne-se objeto de uma produção da
web, dada a facilidade que ele tem de produzir e divulgar para a comunidade de internautas e
interagir com ela. Com o advento da web 2.0, um novo tipo de produção literária, nos moldes
que antes não existia, atinge um público diferente daquele que produz literatura fora da web.
Tal agilidade de troca de informações e inovações faz com que a web seja uma
incentivadora da produção artística (inclusive literária). A própria liberdade que a web
proporciona atinge o web autor, incentivando-o a escrever. A falta de regras, a possibilidade
de uso de uma linguagem menos formal, a aceitação dos mais variados temas permitem ao
usuário expressar sua arte, seus desejos e suas ideias da forma que bem entender e no
momento em que quiser. Ele pode compartilhar do seu jeito o seu perfil e o perfil da sua
produção. O incentivo ocorre também pela fácil exposição e publicação da arte produzida nas
mais diversas formas de interação que há na web, fazendo do produtor, alguém conhecido no
meio. Isso acontece pelas mais diversas redes sociais que conectam grupos de amigos, grupos
de interesses, tribos e muito mais, levando a descobertas de coisas novas a cada busca na web.
Diante da grande variedade de conteúdo encontrado na web, não é difícil nos
depararmos com diferentes tipos de texto. As novidades literárias rodeiam o internauta que,
muitas vezes, consome a arte sem perceber a literariedade. Essa variedade facilitou a
propagação das Fanfics (abreviação de “fan fiction” – ficção criada por fãs81) que são
narrativas alternativas criadas por fãs de filmes, HQs, jogos, livros. O fã tem a liberdade para
usar os personagens como bem entender, podendo misturar personagens ou colocá-los em
situações diferenciadas do enredo oficial. As fanfics podem ser desde pequenos contos até
romances de vários capítulos.
Foi com a internet que houve a proliferação das fanfics, pela facilidade de publicação e
de atingir os fãs de determinadas histórias. Com os diversos fóruns da web, os blogs, os fóruns
81
In: http://pt.wikipedia.org/wiki/Fanfic
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
das comunidades do Orkut e dos próprios sites criados, exclusivamente, para a publicação e
criação de fanfics, o número de leitores aumentou e, com isso, a produção também aumentou.
Há diversos sites somente de fanfics com temas gerais, como: www.fanfiction.net;
www.fanficaddiction.com.br; www.fanfics.animespirit.net; www.fanficobsession.com.br. E
também sites com fanfics de temas específicos, como: http://fanfic.potterish.com/ - Fanfics
sobre Harry Potter; www.fanfic.twilightteam.com.br – sobre a saga Crepúsculo, e, até mesmo,
o Orkut que está cheio de comunidades dedicadas somente a fanfics de determinadas séries,
livros ou desenhos.
Essas narrativas tornaram-se conhecidas e utilizadas em todo o mundo. Não ficaram
somente chamadas de fanfics. De acordo com sua finalidade e da forma como é escrita, as
fanfics são nomeadas diferentemente. Por exemplo: Deathfic - onde os personagens principais
morrem; Drabble - uma fanfic que contém entre 100 e 500 palavras; Slash - cujo tema
principal concentra-se na relação entre dois personagens centrais; Cross Over - Fanfics onde
se misturam universos diferentes, ex.: Naruto/Bleach, Crepúsculo/Harry Potter; e Canonfanfics que seguem fielmente a história, principalmente em termos de casais e caracterização
de personagens.
Uma série de livros e filmes que é bastante famosa no mundo e com fanfics
espalhadas por toda a web, é “Harry Potter” da escritora britânica J.K. Rowling. É a história de
um menino que aos 11 anos que vê sua vida mudar ao descobrir que é um bruxo e, ao lado de
seus amigos, vai passar por aventuras e batalhas contra um poderoso bruxo das trevas. Abaixo,
um exemplo de uma fanfic Canon do Harry Potter:
Título: Reerguendo-se > R/Hr (Pós Deathly Hallows)
Primeiro capítulo: O recomeço
A guerra no castelo da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts havia terminado e
Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado finalmente tinha sido derrotado. Infelizmente essa
dura batalha havia tirado a vida de muitos bruxos e deixado muitos feridos. A notícia de
que o Garoto que sobreviveu derrotara o Lord das Trevas espalhou-se rapidamente
através de diversos jornais, todos trazendo na capa o rosto não somente do famoso Harry
Potter, como também seus inseparáveis amigos Ronald Weasley e Hermione Granger.
Todo o Mundo Bruxo ficou sabendo quase que detalhadamente de como Harry destruira
Voldemort com a ajuda da Armada de Dumbledore, como Harry, Ron e Hermione tinham
destruido as Horcruxes, como Neville Longbottom havia matado a cobra de Voldemort,
Nagini ,que era uma Horcrux e como todos os alunos e professores haviam se unido para
lutar. Para a tristeza dos familiares, os jornais também traziam os nomes daqueles que
haviam perdido suas vidas enquanto lutavam.
(www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=15161746&tid=2574103919902442059)
Como podemos ver, as fanfics evoluíram graças a ajuda da web e dos web autores que
estão sempre inovando e divulgando seu trabalho. Os leitores de livros ou fãs de desenhos e
filmes, quando acaba a série, se sentem “órfãos” e migram para as fanfics, seja para consumir
seja para produzir, em sites, fóruns e blogs.
228
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Este último item – os blogs –, chamados, inicialmente, diários virtuais, são páginas da
internet hospedadas por algum serviço próprio como Wordpress, Blogspot, onde o internauta
escreve o que quer em seus „posts‟.
Os blogs tornaram-se mais do que diários, são verdadeiros acervos de textos literários.
São neles que vários autores novatos e criativos são descobertos. A própria plataforma do blog
ajuda nisso, o leitor pode ler, comentar e interagir com o autor.
Não é de duvidar que haja conteúdos literários espalhados nos mais diversos blogs,
pois vários deles tornaram-se livros. Como o da Raquel Pacheco (mais conhecida como Bruna
Surfistinha) que, a partir de seu blog pessoal, caiu nas graças do povo e em seguida na mídia.
Raquel Pacheco com o pseudônimo de Bruna Surfistinha criou um blog para contar sua
vida de prostituta, narrando cada encontro, sexo e aventura. O blog agradou aos internautas,
popularizando-se. Em 2005, Raquel lançou o livro “O Doce Veneno do Escorpião” com o
conteúdo da página da internet que criou. O livro vendeu 250 mil exemplares, com o sucesso,
também foi lançado em Portugal e na Espanha. Após isso, Raquel ainda lançou mais dois
livros. E está sendo esperado o lançamento do filme com o mesmo título do primeiro livro.
Lembrando que isso tudo, aconteceu pela simples criação de um blog.
E tem editora que aposta nessa ideia. Como a BlogBooks que promove o Prêmio
BlogBooks. Esse concurso é para os blogueiros que têm a intenção de fazer com que seus
blogs tornem livros. Eles se cadastram no site e colocam em seu blog um banner para os
internautas votarem. São 13 categorias de blogs e são 13 os vencedores – um de cada
categoria.
A editora já promoveu o primeiro prêmio e os blogs que ganharam foram:
Poltrona.TV (Artes e cultura), Dinheirama (Comunicação e negócios), Pergunte ao
urso (entretenimento), Aventuras Gastronômicas (Gastronomia), Kibe Loco (Humor),
Vi o mundo (política), Bichinhos de jardim (Quadrinhos), Blog da Salette Ferreira
(Religião), Sexto sexo (sexo), Guanabara.info (Tecnologia), Planejando meu
casamento (Universo Feminino), Papo de homem (Universo Masculino).
(http://www2.blogbooks.com.br/premios.asp)
Podem-se citar outros web autores como Marco Aurélio Gois dos Santos, criador do
blog Balde de Gelo, Clarah Averbuck em seus vários blogs, como Brazileira!Preta que se
tornaram alguns livros
e Juliana Sampaio e Laura Guimarães do blog Mothern.82
A leitura na web é mais dinâmica e conquista um público que está sempre em frente ao
computador e que acaba, muitas vezes, não lendo um livro impresso, sua leitura é basicamente
informatizada, é na web. E quando um conteúdo da web torna-se livro, atinge outro público:
aquele que consome livros. Assim, vários leitores são conquistados e têm o contato com o
82
In: http://g1.globo.com/Noticias/Tecnologia/0,,MUL18256-6174,00BLOGS+VIRAM+LIVROS+E+FICAM+PALPAVEIS+AO+LEITOR.html
229
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
material produzido. Com isso, vemos que o blog é um grande incentivador tanto da escrita,
quanto da leitura, por abranger uma gama de leitores diferenciados.
O fato de a web estar sempre em revolução faz com que surjam tipos literários dos
serviços mais diferenciados. Um serviço que nasceu para revolucionar (até a literatura) foi o
Twitter. Microblog que nasceu em março de 2006, com o intuito de utilizar o serviço de SMS
para troca de mensagens sobre “o que você está fazendo”. Permitindo posts com apenas 140
caracteres (chamados „tweets‟), o Twitter permite que um usuário tenha followers (seguidores)
e siga (following) quantos usuários quiser. Assim, na página do usuário no Twitter, ele vê os
posts de quem ele está seguindo.
E o que isso muda para a literatura?
O slogan e a pergunta para o post do Twitter no início era: “What are you doing?” (O
que você está fazendo?), deixando a resposta bem objetiva. Depois de um tempo, com a
popularização dessa rede social, o slogan mudou para: “What‟s happening?” (O que está
acontecendo?). Assim, o Twitter deixa a visão subjetiva e diretamente pessoal para uma visão
de mundo. Com o novo slogan, o web autor ou “tuiteiro” passa para a posição de autor daquilo
que está acontecendo, usando da criatividade para falar daquilo que o cerca.
Mas o microblog (ainda) não é uma rede cheia de (micro) textos literários. A maioria
dos tweets (mensagens enviadas no Twitter) ainda está sob a pergunta: “o que você está
fazendo”. São poucos os que usam a criatividade literária no Twitter.
Lembrando que o Twitter não atingiu ainda todo o público. Em geral, os “tuiteiros” são
jovens entre 18 e 24 anos, executivos, blogueiros e pessoas da área de comunicação, segundo a
revista Época de maio de 2010. Um “tuiteiro” precisa saber ser objetivo nos seus 140
caracteres, saber passar o que quer, rapidamente, e de forma lúcida.
No Twitter, há as hashtags (ou somente tags) que são um tipo uma “etiquetagem” dos
posts. São palavras-chaves associadas aos textos enviados. Nesse serviço, a tag é precedida
pelo sinal #, facilitando a procura e recuperação de mensagens com os mesmos assuntos. As
tags incorporaram, no Twitter, também etiquetagens como formas de manifestos, como
#forasarney, na política, e #foradourado, na mídia televisiva.
A tag #microconto é um exemplo de literariedade presente no Twitter. A grande
diferença e peculiaridade do micro conto, nessa rede social, é que, com apenas 140 caracteres,
ele pode ter interpretações diferentes e mexer com o leitor. Encontrar palavras que reduzam o
texto, sem mexer com o sentido, saber escrever nas entrelinhas das poucas linhas que existem
no Twitter é a grande chave do micro conto.
Exemplos de micro contos, retirados do Twitter:
@PauloFroda: Quando eu te conheci, minhas lágrimas secaram. Hoje, gasto uma fortuna
em colírios. #curtaconto #microconto#nanoconto
230
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
@_Jefferson:
Despedaçou
nuvens,
encheu
travesseiros.
Caiu
no
sono' #curtaconto#miniconto #microconto
@Abelheira: Atraía homens com sua única beleza, depois os menosprezava com única
destreza. #microconto12:15 AM Aug 14th via Seesmic for Android
@RickAzevedo: #microconto Nunca tinha ido ao samba. Elitista. Se amarrou nas pernas
da mulata. Largou a nobre, perdeu status e sapatos. Mas ficou feliz.
@Tudo_Cultural: < Quando passou, caiu um martelo de obra em sua cabeça. Sobreviveu,
mas levou alguns pontos. Ganhou uma indenização bem gorda. #microconto
@sandromiccoli: Quando a loira da minissaia cruzou as pernas, o taxista não pôde evitar a
olhada no retrovisor nem a batida no cruzamento #microconto seabra
(acesso em 10/10/2010)
Uma tag que foi muito utilizada e veio acompanha de uma criatividade pelos usuários
do Twitter foi #saopaulofacts, na época das chuvas fortes e enchentes na capital paulista. Os
tuiteiros escreviam sobre os ocorridos de forma humorística e bastante interpretativa. Como:
Se a São Silvestre fosse em janeiro, o Cesar Cielo ia humilhar!
Depois do Airbag, os coletes salva vidas são os opcionais mais importantes nos carros
de Sao Paulo.
O melhor serviço de entrega em SP é do Submarino.
Ninguém passa fome em São Paulo, Bolinho de chuva é o que não Falta.
Quem acha que a água do mundo está acabando não mora em SP.
Bob Esponja pra Lula Molusca: “Bora pra Sao Paulo!!Da atè pra gente ir no
Shopping!!
Moisés precisamos de você em Sampa!!
O passeio ciclístico de hoje foi feito de pedalinho
Agora SP inteira tem casa com vista para o mar.
Tá chovendo tanto em Sampa que esperei o Pica-Pau para descer a Rebouças de barril!
Fagner para José Serra: “Quem dera ser um peixe para em teu límpido aquário
mergulhar..
Sobrevoar São Paulo logo após a chuva, é certo ver um sopa de letrinhas lá de cima
Qual a tribo indígena que esta fazendo a Rave da chuva?
(http://www.uhull.com.br/01/26/saopaulofacts/)
A grande questão literária, em torno desse assunto, é se é possível, nesses 140
caracteres, existir literariedade. É claro que sim. O que acontece é que poucos são os tweets
literários e poucos são os que conseguem concluir seus pensamentos nesses poucos caracteres,
mas isso não quer dizer que não exista carga literária. Podemos dizer, desse modo, que no
Twitter há uma pequena elite de web autores.
Fazendo um paralelo, podemos fazer alusão aos poemas-pílulas de Oswald de
Andrade, poemas pequenos com uma lírica sintética. Muitos deles cabem nos 140 caracteres
do Twitter, então, não há dúvida de que isto é literatura.
Outra prova disto é o livro “www.twitter.com/carpinejar” de Fabrício Carpinejar que
apresenta 416 tweets publicados na página que dá título ao livro. O conteúdo dele são os
231
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
tweets colocados um a um. Além disso, é o primeiro livro com frases postadas, por um escritor
brasileiro, no Twitter.
Estão também no Twitter, outros escritores, como Luís Fernando Veríssimo
(@luisfverissimo), Paulo Coelho (@paulocoelho) e Millôr Fernandes (@millorfernandes).
Mas alguns desses escritores nem sempre conseguem se adaptar as demandas do Twitter.
A maioria dos tweets de Luis F. Veríssimo, por exemplo, não são concluídos em uma
só mensagem, o que acaba deixando os textos fora de ordem (do último para o primeiro),
dificultando a leitura e não “obedecendo” a conclusão de pensamento nos 140 caracteres.
Diferente de Paulo Coelho, que além de interagir com seus leitores, produz tweets literários,
incluindo trechos de seus livros. Esse autor é o que mais compreendeu e pôs em prática a
própria prática do Twitter
Já Millôr Fernandes, em sua maioria de posts no Twitter, sempre coloca o link de seu
site, escrevendo na mensagem apenas o título ou uma frase relacionada ao texto completo
presente no site.
Também no Twitter, há contas de usuários somente para trabalhar a língua, linguagem
e criatividade nos posts. Como é o caso do @OCriador, que ficou famoso pelo Twitter do
Criador de tudo – Deus, que se declara como “Onipresente, Onisciente, Onipotente e Online”.
Em sua conta, suas mensagens fazem alusão a textos e histórias bíblicas, usando outra
interpretação e típico humor. Por exemplo: “Filhos, entendam o dilúvio de Noé como um
recall da criação.”; “Enquanto houver perguntas cujas respostas não estejam no Google, Eu
existirei.”; “Dinheiro não é tudo. Judas tinha 30 moedas de prata e ainda assim estava com a
corda no pescoço.”; “Quando vocês rezam “Senhor, escutai as nossas preces”, Eu coloco as
mãos nos ouvidos e faço “lá, lá, lá, lá”.” – tweets como estes, encontra-se no Twitter do
@OCriador.
Outro Twitter que também segue o mesmo ramo, é o @TodoGaroto, que comenta com
humor o universo masculino, inclusive dos adolescentes. Usa sempre a tag #todogaroto para
iniciar as frases. Como, “#TodoGaroto assistiu Chiquititas ou Diário de Daniela, e hoje tem
vergonha disso.”; “#TodoGaroto por mais que não demonstre, se sente um canalha quando
magoa uma menina.”; “#TodoGaroto quando criança achava que tinha sim super poderes de
Power Rangers, mas eles estavam escondidos...”. Com posts assim, o @TodoGaroto, assim
como @OCriador e tantos outros, fazem literatura no Twitter. Inovando a noção de
literariedade presente na web, inclusive nas redes sociais.
Língua e Informática
Assim como na literatura, a informática e a web mudam e acrescentam à linguagem e à
língua. Há a linguagem própria da informática, para os conhecedores daquela área, e a
linguagem de todo o povo que está interagindo na web. É dessa última linguagem que estamos
falando, que modifica a língua. Os internautas / “web autores”, que são falantes da língua,
passam a estruturar expressões e/ou palavras, da área de informática, segundo a estrutura
232
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
linguística, e, assim, criam neologismos que passam a ser utilizados com frequência. Com o
tempo, tornam-se naturalmente audíveis e legíveis, podendo ser até incorporados aos
dicionários, como é o caso do verbo deletar. “Delete”, que significa excluir em inglês e
francês, vem do latim “delere” (apagar), que passou para essas línguas no século XVI. Na
nossa língua nativa, o português, derivou em delével – o que se pode apagar.³ Nessa última
geração da informática, o “delete” – tecla apagar do teclado do computador – foi reestruturado
e formou o verbo deletar, voltando às origens latinas. Tal verbo já foi incorporado nos
dicionários mais novos e com constante presença em nosso dia-a-dia.
Outro verbo que já está em nossos dicionários é o verbo escanear, que veio do “scaner”
em inglês, aportuguesado em “escâner” – segundo Houaiss, equipamento de leitura óptica que
converte imagens, páginas impressas etc. em dados digitalizados. Escanear, segundo o mesmo
dicionário, é converter com escâner (foto, página impressa etc) para a forma digital.
A facilidade da Língua Portuguesa de estruturar, reestruturar e desestruturar palavras
faz com que o falante faça construções das mais diversas com qualquer termo. E não podemos
nos assustar se palavras diferentes, com o tempo, forem adicionadas ao nosso vocabulário
formal. Um verbo que já é bastante utilizado no meio da informática é o “linkar”, originado da
palavra link – palavra que já está em nossos dicionários 83, e, segundo Houaiss é um termo da
informática, em hiperdocumentos, trecho em destaque ou elemento gráfico que, adicionado,
por um clique de mouse, exibe imediatamente um novo hiperdocumento. Esse novo verbo
“linkar” é utilizado com frequência na web e não demorará a entrar, definitivamente, na nossa
Língua. Basta-nos saber se o “k” ficará ou se será trocado pelo “c”.
E não são só as estruturas que são criadas e palavras novas formadas, a própria
semântica das palavras muda com o passar do tempo. O verbo postar que, segundo o
Dicionário Houaiss, significa pôr (carta, postal etc) no correio; enviar, expedir; hoje é usado
frequentemente em relação à palavra post usada na web. Postar, na web, significa publicar
algo, publicar um post.
Lógico que a rede social que mais tem causado polêmica, transformando-se no
fenômeno da web – o Twitter – que já revoluciona a visão literária, não deixaria de acrescentar
algo a nossa Língua. A utilização do verbo twittar (ou tuitar) virou mania para os usuários da
rede e, mesmo assim, tornou-se entendida por todos que possuem algum entendimento sobre
web.
O interessante no significado desse novo verbo é que a sua utilização se dá
restritamente no Twitter. Twittar (ou tuitar) é postar um tweet, postar no Twitter. Hoje, tuitar
tornou-se uma ação cotidiana no Brasil, segundo país com maior número de usuários na
rede84.
Esse verbo ainda não está plenamente definido quanto a sua escrita. No início, era
simplesmente escrito twittar – o radical entrado na palavra Twitter (twitt) + a desinência de
83
84
In: http://www.estacio.br/rededeletras/numero19/minha_patria/texto2.asp
In: http://www.geekaco.com/brasil-ja-e-o-segundo-pais-com-mais-usuarios-do-twitter
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infinitivo “ar”. Logo, não estava propriamente aportuguesado, pois na nossa língua, o „w‟ não
é utilizado com som de vogal e também não é visto comumente o „t‟ duplo – „tt‟. Com passar
do tempo e do uso, as transformações acontecem. Hoje, encontra-se mais, nos escritos
brasileiros como em reportagens, artigos e no próprio Twitter, o verbo tuitar – exatamente
como é feita a pronúncia.
Com essa mudança na grafia, podemos perceber que esse novo verbo já está pronto
para sua efetivação em nossa língua. Tuitar é facilmente lido, entendido e conjugado como um
verbo regular da primeira declinação. Prova disso é a nova edição do Dicionário Aurélio (5ª
edição) que traz o verbo „tuitar‟ em seu conteúdo5.
No ano do centenário de Aurélio Buarque do Holanda, o dicionário, que leva o mesmo
nome, ganha, também, substantivos da era da informática como „fotolog‟, „blu-ray disc‟, „bluray player‟, „e-book‟. E assim como o verbo „tuitar‟, „blogar‟ também é adicionado 85.
Essas palavras apresentadas e essa nova edição do Dicionário Aurélio são exemplos de
como a informática e a web podem mudar e mudam o nosso cotidiano, provando que a Língua
é viva e está em constante mudança. A cada era (hoje, a era da informática) as transformações
se dão e, muitas vezes, nem percebemos. O falante não percebe quando e/ou como uma ou
mais palavras são adicionadas em seu cotidiano e nos dicionários, e também não percebe
quando outras param de ser utilizadas.
Educação e Informática
Diante dessas mudanças na literatura e na língua, o modelo educacional clássico
também se rompe, gerando mudanças. Os alunos que adentram nas escolas, nos tempos atuais,
já estão inseridos no ambiente virtual, eles são chamados pelos estudiosos de “nativos
digitais”86. Assim, como os alunos mudam, o papel do professor e sua postura em sala de aula
também deve mudar para adaptar-se às novas demandas educacionais crescentes e aos novos
tipos de alunos.
Antes de entendermos o que o professor de hoje precisa para adaptar-se a essas novas
demandas, é preciso entender os alunos, esses que são chamados de “nativos digitais”.
Segundo a Revista Veja (edição 2100, p. 86), os jovens de hoje são “fruto da revolução
tecnológica e da globalização, eles formam, ainda, a geração do „tudo-ao-mesmo-tempo-eagora‟ (uma das inúmeras expressões com as quais os especialistas tentam defini-los)”.
Eles estão, a todo o momento, conectados à rede. Esta já se tornou parte integrante
deles, isto é, eles podem estar no celular, trocar mensagens instantâneas e ouvir música, tudo
junto. O lado bom é que, na web (e em outras formas de comunicação), eles se deparam com
diversas informações, podem descobrir assuntos interessantes, pesquisar, discutir temas, como
também visitar sites de notícias. Logo são alunos aparentemente informados, que têm acesso a
conteúdos diversos. Mas eles acabam por não se aprofundarem em toda essa informação.
85
86
In: http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/tuitar-e-blogar-agora-sao-verbos-do-aurelio
In: http://www.overmundo.com.br/overblog/educacao-e-tecnologia-uma-alianca-necessaria
234
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Como as oportunidades são muitas, eles “provam” de tudo, mas não se aprofundam em
praticamente nada. Podemos dizer que seus sites prediletos são os sites de redes sociais.
Os alunos de hoje, em virtude da exigência do mercado de trabalho, estão muito mais
atarefados. Frequentam a escola, fazem cursos de idiomas, praticam esportes, aulas
particulares, aulas de música, dança e, ainda assim, arrumam tempo para navegar na internet e
conversar com amigos por mensagens instantâneas.
O professor deve entender esse aluno, saber que ele vive em um ambiente virtual que é
dinâmico e democrático, do qual ele participa, muitas vezes, como construtor (o web ator).
Sabendo que o aluno não é mais como antes, o professor clássico, que atua
simplesmente como transmissor de conteúdos por ele dominados, achando que está diante de
uma turma sem nenhum conhecimento prévio e, passiva diante de tal conteúdo, pode ser
substituído facilmente por outro que tenha o computador como um grande aliado. Com
certeza, esse professor desempenhará um trabalho de maneira mais atrativa aos alunos.
A internet possui conteúdo bastante abrangente. Sabemos que os alunos têm contato
com esses conteúdos, de maneira diferente do contato que têm com o professor em sala. A
dinamização que se tem com um ambiente virtual, a forma diferenciada de ser ver conteúdos e
de manipulá-los são atributos que o professor encontra utilizando as ferramentas da
informática e de chamar a atenção dos alunos.
Um exemplo da revolução que a informática trouxe para dentro das escolas é dada por
Andrea Ramal, em seu texto “O professor do próximo milênio” 87, onde relata:
Fui professora de Português/Literatura e Redação e, durante muito tempo, reclamei dos
alunos que não queriam fazer rascunho, pensando que era preguiça. Hoje percebo,
estudando as práticas de leitura e escrita na cibercultura, que na verdade existe uma
nova relação com o erro. Antes, errar significava refazer toda a página. Agora, o
esboço é o monitor. O rascunho é o próprio texto. Escrevemos pelo ensaio-e-erro: não
gostei deste parágrafo aqui, puxo para lá, excluo, reescrevo - tudo antes de imprimir. É
uma espécie de aprendizagem por simulação. Como pretender que os jovens façam
rascunho no papel? Isso corresponde ao paradigma da página, da linearidade.
Acompanhar o processo de escrita pelos monitores em que os alunos trabalham, em
vez de ficar apenas com o resultado final, pode ser uma estratégia para conhecer mais e
melhor a dinâmica dos processos de escrita dos estudantes.
Não se pode achar que os alunos, na escola, se contentam em apenas receber conteúdos
e ensinos sem querer transformá-los ou discuti-los. Uma aula informatizada é mais “atraente”
para esses alunos, por ser interacionista. As escolas devem sair do tipo de ensino de
transmissão de conteúdos e entrar em uma metodologia onde o aluno aprende a refletir,
pesquisar, comparar ideias, escolher caminhos, confrontar teorias. O aluno, nessa nova
87
In: http://www.revistaconecta.com/conectados/ramal_proximo.htm
235
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
metodologia, tem mais espaço, tem mais autonomia, constrói seu próprio processo de ensinoaprendizagem.
Nesse contexto, o papel do professor deve ser transformado. Antes de tudo, precisamos
de professores “maduros intelectual e emocionalmente, pessoas, curiosas, entusiasmadas,
abertas, que saibam motivar e dialogar” (MORAN, 2000, p.16) que estimulem os alunos,
sabendo que “alunos curiosos e motivados facilitam enormemente o processo, estimulam as
melhores qualidades do professor, tornam-se interlocutores lúcidos e parceiros na caminhada
do professor-educador” (p.17).
O professor deve se tornar mediador, estimulador, orientador do processo de ensinoaprendizagem. Deve orientar o aluno no conteúdo programado, orientar na pesquisa, mediar o
aluno e o saber. Esse profissional deve estar em constante diálogo com os alunos e fazer com
que eles criem diálogos com os conteúdos estudados. Segundo Marcos Masetto (2000, p. 70),
o professor tem que saber articular a aprendizagem, ser criativo, e principalmente “parceiro de
seus alunos no processo de aprendizagem”. Lembrando sempre que a aprendizagem deve ser
construída em união entre professor e alunos e, que a aprendizagem é tanto para o aluno
quanto para o professor, uma vez que, quando este se depara com questões desconhecidas,
deve antes, assim como o aluno, pesquisar e procurar informação.
Desse modo, outro ponto a que o professor precisa se dedicar é a sua formação. O novo
professor deve estar em constante formação. Para aprender a lidar com as novas tecnologias e
a web e também para estar sempre atualizado dos conteúdos que aplica. Por isso, o professor
deve ser um pesquisador, para, assim, saber motivar seus alunos a se aprofundarem nas
diversas áreas do saber e orientá-los por onde pesquisar e se informar.
Drucker (1993 apud ALMEIDA, 2000, p.15) afirma que “a tecnologia será importante,
mas principalmente porque irá nos forçar a fazer coisas novas, e não porque irá permitir que
façamos melhor a coisas velhas”. Assim, percebemos que o professor deve esforçar-se em pôr
sua criatividade em prática. Saber ousar, criar, dinamizar para conquistar a atenção do aluno e,
fazê-lo parte da construção do aprender e do ensino. A tecnologia adentra a educação
exatamente para isso: atrair e fazer o aluno participar efetivamente desse processo do qual,
antes, ele era um simples receptor de conteúdos.
Moran (2000, p. 30) afirma que o professor assume o papel de “orientador/mediador” e
classifica esse papel de quatro formas diferentes.
A primeira forma é o “orientador/mediador intelectual” que seleciona as informações
para os alunos, orientando-os a escolherem as melhores e mais pertinentes, para que eles
possam compreendê-las, associá-las e adaptá-las. Há o “orientador/mediador/emocional” que
tem o papel de estimulador, motivador e incentivador dos alunos juntamente com adjetivos
como equilíbrio e empatia. Outra forma é o “orientador/mediador/gerencial e comunicacional”
que tem a função de organizar e gerenciar as atividades propostas, desenvolvendo formas de
comunicação e interação. E a última classificação dada pelo autor é a de “orientador/ético” que
236
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
é o que trabalha para a melhor convivência e interação no ambiente escolar. “Ensina a assumir
e vivenciar valores construtivos, individual e socialmente”.
Lógico que o professor é livre para escolher uma metodologia com a qual se sinta mais
a vontade e se identifique mais, assim, também escolhendo como e o que da tecnologia usar
em sua aula. Nem todos se adaptam a tudo, tanto alunos quanto professores. Nem todos os
conteúdos se ajustam a todo tipo de tecnologia, mas, para isso, é preciso conhecer todos os
caminhos. Não há como escolher o melhor caminho, a melhor metodologia, a melhor estrutura
de ensino, sem conhecer diversos caminhos, metodologias e estruturas. Moran (2000, p. 2)
afirma que "é importante que cada docente encontre o que lhe ajuda mais a sentir-se bem, a
comunicar-se bem, ensinar bem, ajudar os alunos a que aprendam melhor”. Isso só confirma
que o professor deve ser um pesquisador. Um pesquisador de melhorias e novidades para si e
para seus alunos.
O trabalho do professor, nesse novo contexto informatizado, não se dá apenas dentro
de sala de aula, como antes. Agora, o professor também está presente virtualmente e pode
interagir com os alunos que vivem na web. Essa relação aluno-professor, pela web, estreita-se
mais, torna-se mais palpável no sentido de haver ligações eficazes. Através das redes sociais
ou de próprias conexões criadas pelo professor, a troca de informações se torna mais rápida e
no momento em que desejarem, podem construir um processo de ensino-aprendizagem em
conjunto com os alunos. Mas devemos estar atentos ao que Moran diz sobre o ensino conjunto
às tecnologias.
Mesmo com tecnologias de ponta, ainda temos grandes dificuldades no
gerenciamento emocional, tanto no pessoal como no organizacional, o que
dificulta o aprendizado rápido. As mudanças na educação dependem, mais do que
das novas tecnologias, de termos educadores, gestores e alunos maduros
intelectual, emocional e eticamente; pessoas curiosas, entusiasmadas, abertas, que
saibam motivar e dialogar; pessoas com as quais valha a pena entrar em contato,
porque dele saímos enriquecidos. São poucos os educadores que integram teoria e
prática e que aproximam o pensar do viver. 88
É importante destacar que o professor não atua sozinho. A escola precisa amparar,
apoiar e fortalecer esse processo construtivo de ensino-aprendizagem. Diretor, orientador
pedagógico, demais professores, coordenadores devem trabalhar em conjunto para o bom
desenvolvimento do processo. O professor e os alunos precisam que a escola dê suporte para
tais tecnologias, que abra o espaço escolar e entenda que este ambiente se estende para fora de
seu espaço físico.
O bom desempenho do processo de ensino-aprendizagem com a utilização das novas
tecnologias depende também das ferramentas que o professor utilizará em aula. Há serviços
dos mais variados que podem ser utilizados de maneira eficiente, conectando os alunos ao
professor e, os conectando aos conteúdos, links, matérias, sites.
88
In: http://www.eca.usp.br/prof/moran/integracao.htm
237
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Uma ferramenta que pode ser utilizada é a wiki – serviço da web que permite
“identificar um tipo específico de coleção de documentos” 89. Com uma wiki, o usuário cria
uma página que permite inserir conteúdos e documentos, estes que podem ser modificados
pelos usuários que tem permissão para utilizar a wiki. Ela pode ser criada gratuitamente pelo
serviço Zoho Wiki.
O interessante de criar uma wiki é que o professor pode postar algum texto sobre
determinado assunto e os alunos, a partir do texto, podem modificá-lo incrementando-o.
Podendo também ser fonte de pesquisa para o aluno, pois sabemos que há muitos sites na web
com informações erradas, com dados não confirmados, detalhes que muitas vezes não são
captados pelos internautas quando pesquisam. A wiki criada pelo professor dá a ele a
segurança e certeza de que seus alunos estão pesquisando em local com informações e
conteúdos necessários e corretos.
O professor também pode criar um fórum, e existe um serviço gratuito na web para
essa criação. O fórum dá ao processo de ensino-aprendizagem a possibilidade de discussão
sobre a matéria. O professor propõe um tema, instiga os alunos a participarem dos fóruns,
apresentando suas pesquisas e opiniões. Também serve para que os alunos postem suas
dúvidas e/ou pesquisas, além de permitir que outros alunos e/ou o professor interagir nesse
espaço, fazendo comentários, críticas, postando informações e conteúdos.
Outra alternativa, embora seja um pouco mais elaborada, é a criação de um web site do
professor. Lugar que seja referência para os alunos estudarem e conhecerem o currículo da
matéria. O site pode conter páginas específicas para cada matéria e turma, sendo, o material,
aberto a todo o público ou só a usuários cadastrados, no caso, os alunos. Esse espaço serve
também para o professor expressar suas ideias e propostas para a aula.
Esse ambiente virtual do professor é interessante, pois estreita mais os laços afetivos
entre alunos e professor, sendo um espaço de encontro, fazendo com que eles estejam
conectados a todo o momento, não somente dentro do ambiente escolar. Essa é a grande
motivação da utilização das TICs no processo educacional: fazer com que aconteça conexões
educacionais também fora da escola, gerando um processo de ensino-aprendizagem além dos
horários impostos na escola. Mostrando ao aluno que o ambiente virtual, também pode ser um
ambiente de aprendizagem, e, o mais importante, uma aprendizagem que se molda conforme o
tempo e querer dele.
Conhecendo as necessidades dos atores envolvidos no processo escolar (professor,
escola e alunos), Ana Amélia A. Carvalho da Universidade de Minho em Portugal, organizou
um manual chamado “Manual de Ferramentas da web 2.0 para Professores”, após um encontro
sobre essas novas tecnologias, para que professores e educadores pudessem compreendê-las e
soubessem utilizá-las. A edição desse manual foi feita pelo Ministério da Educação de
Portugal que o disponibilizou gratuitamente na internet.
89
In: http://pt.wikipedia.org/wiki/Wiki
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Cada capítulo do manual aborda uma ferramenta diferente – como utilizá-la, para que
serve – contextualizando com a prática de ensino e com utilização dessa ferramenta em sala.
Temas como Youtube, blog, poscast, wiki, google docs, Second Life são encontrados nesse
conjunto de textos que proporcionam ao professor conhecimentos sobre essas ferramentas e
como aplicá-las em aula. É um manual bem ilustrado, mostrando tudo passo a passo,
facilitando muito a aprendizagem do professor.
Aprendendo como utilizar tais ferramentas, o professor poderá utilizá-las em sua aula
e, até mesmo, fora dela, fazendo acontecer uma educação fora do espaço físico escolar. O
importante é conhecer e saber utilizar a web tanto quanto seu aluno, criando uma metodologia
de ensino através desses conhecimentos.
Os professores e demais profissionais da educação têm que entender que toda essa
adição das novas tecnologias no processo educacional tem que ser feita visando os alunos.
Eles necessitam desse conhecimento tecnológico para seu futuro profissional. O mercado de
trabalho é informatizado e precisamos inserir os alunos nesse contexto. A implantação das
TICs na aula não é somente para atrair a atenção dos alunos para o conteúdo exposto, mas para
ambientá-lo em um espaço de constante pesquisa e descoberta do conhecimento em meio a
web, que é o que ele encontrará ao entrar no mercado de trabalho.
Como Masetto (2000, p. 139) afirma que “não é a tecnologia que vai resolver ou
solucionar o problema educacional no Brasil. Poderá colaborar, no entanto, se for usada
adequadamente, para o desenvolvimento educacional de nossos alunos”.
Considerações Finais
A era da informática gerou transformações em nosso cotidiano. Hoje, quase todo
mundo está nas diversas redes sociais e se comunica por mensageiros instantâneos. O acesso
de web sites de notícias para ler as manchetes do dia e da hora (notícias imediatas aos
ocorridos) é uma constante na vida das pessoas. Ter um blog, vlog (ou videolog) e até um site
pessoal é comum a muitos internautas. Essas ferramentas dessa nova web – a web 2.0 – faz
com que os internautas sejam, em diversos sites, coautores do ambiente virtual. Isso fez com
que a web se tornar essencial no cotidiano.
Essa revolução da web acabou por modificar a literatura, língua e até o sistema de
ensino, e ainda continua modificando, mostrando como esses temas mudam juntamente com o
nosso modo de viver e de agir.
A informática e a web acabaram por adicionar estilos literários diferentes como
pudemos ver. Também apresentaram ferramentas e objetos que modificaram a própria língua,
adicionando, em nossos dicionários formais (e informais), termos, expressões e palavras antes
não conhecidas, que através do mundo informatizado nos foram apresentadas e, por nós,
modificadas.
239
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Com tanta mudança, as exigências educacionais aumentaram e os alunos se
diferenciaram, fazendo com que os professores tenham de utilizar outros meios para o
processo educacional. Esses novos meios são as ferramentas da web, apresentando um novo
tipo de ensino que está 24 horas por dia disponível para os alunos que vivem no ambiente
virtual. Mais do que uma facilidade, as novas tecnologias utilizadas na escola são necessidades
para o futuro dos alunos, que precisam conhecer entender e saber utilizá-las bem para o seu
próprio sucesso profissional.
Enfim, devemos entender que estas novidades podem ser de grande valor e utilidade
para toda a sociedade. Para isso, devemos entender as mudanças que essas novidades trazem e
saber aplicá-las no nosso cotidiano de forma correta. Como já disse Clarisse Lispector em seu
poema “Mudança”: “O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia.
Só o que está morto não muda!”
O mundo está vivo. Está em constante mudança. Precisamos estar abertos a nos adaptar
a cada nova era, a cada novo movimento.
Referências
ALMEIDA, Fernando J. de; FONSECA JUNIOR, Fernando M. Aprendendo com
Projetos: Coleção Informática para a Mudança na Educação. Brasília: MEC, SEED –
Programa Nacional de Informática na Educação – PROINFO, 2000.
BOYD, Danah; Ellison, Nicole. Social Network Sites: Definition, History, and
Scholarship. Journal of Computer-Mediated Communication. 2007.
CARVALHO. Ana Amélia A. Manual de ferramentas da web 2.0 para professores. Lisboa:
Ministério
da
Educação,
2008.
Disponível
em:
<http://www.erte.dgidc.minedu.pt/publico/web20/manual_web20-professores.pdf>. Acesso em: out., 2010.
MASETTO, Marcos; MORAN, José; BEHRENS, Marilda. Novas tecnologias e mediação
pedagógica. Campinas: Papirus, 2000.
PISANI, Francis; PIOTET, Dominique. Como a web transforma o mundo: a alquimia das
multidões. Tradução de Gian Bruno Grosso. São Paulo: Senac São Paulo, 2010.
RECUERO, Raquel. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Sulina, 2009.
240
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Resiliência: um processo ativado em situações adversas?
Autores:
Amanda Assad Rezende
Anna Carolina T. A. Estefan
Curso Psicologia
Universidade Estácio de Sá
Orientadora: Angela Utchitel
Resumo
O presente trabalho aborda brevemente o Transtorno de Estresse Pós-Traumático e discute o
conceito de Resiliência associado a fatores de risco/proteção e estresse/trauma. Ao longo do
artigo é apresentada uma pesquisa de campo que teve como objetivo verificar se o conceito de
Resiliência atua, de fato, como um fator de proteção e adaptação contra o desenvolvimento do
Transtorno de Estresse Pós-Traumático em situações de catástrofe. Para isso, a pesquisa
contou com uma população de trinta e três participantes. A avaliação da Resiliência foi
realizada através da Escala de Resiliência e a avaliação dos sintomas do Transtorno do
Estresse Pós-Traumático foi realizada a partir da aplicação do Post-Traumatic Stress Disorder
Checklist - Civilian Version (PCL-C).
Palavras-chave: Psicologia; Resiliência; Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT);
Situações de Catástrofe.
Introdução
Fenômenos da natureza como enchentes, tsunamis, furacões, deslizamentos de terra e
terremotos são situações experienciadas por milhões de pessoas em todo o mundo e podem se
configurar como situações traumáticas. Como conseqüência, o Transtorno de Estresse PósTraumático (TEPT) é um dos quadros psiquiátricos mais presentes em indivíduos que
sobreviveram a uma catástrofe natural.
Porém, não são todas as vítimas de um desastre natural que desenvolvem o Transtorno
de Estresse Pós-Traumático. O que leva, então, uma pessoa a se adaptar a uma situação
traumática?
O termo “resiliência” (do latim re, “para trás” e salire, “voltar) passou para o léxico
psicológico a partir das ciências físicas. Originalmente, denota a capacidade de um corpo se
Professora Doutora da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo
241
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
deformar por obra de agentes externos e, depois, recuperar a forma natural. No sentido
psicológico, segundo Christopher M. Layne (2011), pesquisador de resiliência da University
of California em Los Angeles, “basicamente significa que a pessoa volta a funcionar como
antes dentro de um breve período” (p.32).
A expressão já foi utilizada como sinônimo de fator de proteção intrínseco ao
indivíduo (HOGE et al, 2007), como uma característica positiva da personalidade que facilita
a adaptação individual (WAGNILD & YOUNG, 1993) e como sinônimo do conjunto de
fatores de proteção individuais, familiares e sociais (LAM & GROSSMAN, 1997). Embora já
tenha sido utilizada como sinônimo de desfecho positivo, freqüentemente, o termo Resiliência
é usado para descrever o processo dinâmico que leva à adaptação positiva no contexto de uma
adversidade (LUTHAR et al, 2000).
A maior tragédia natural do Brasil aconteceu na madrugada do dia 12 de janeiro de
2011 na Região Serrana do estado do Rio de Janeiro, sendo a cidade de Nova Friburgo a mais
afetada. De acordo com a Defesa Civil do município, o número de desabrigados e desalojados
ultrapassou cinco mil.
Será que indivíduos mais resilientes apresentam um quadro sintomatológico do TEPT
mais brando? A pesquisa desenvolvida teve como objetivo relacionar a Resiliência e o
Transtorno de Estresse Pós-Traumático nas vítimas da catástrofe de Nova Friburgo.
Transtorno do Estresse Pós-Traumático
A Psiquiatria buscou, desde as primeiras descrições de casos clínicos de histeria,
entender a relação entre os fenômenos traumáticos vividos pelo paciente e os sintomas
psicológicos apresentados por ele. Primeiramente, a ênfase recaía sobre a experiência
subjetivamente experienciada. Já num segundo momento, houve o reconhecimento da
importância dos estressores traumáticos presentes, por exemplo, nas Grandes Guerras
Mundiais.
Foi Abram Kardiner que publicou em 1941 um livro sobre “As Neuroses Traumáticas
de Guerra”, que passou a ser considerada a obra que viria a definir, pelo resto século XX, o
que é hoje conhecido como Transtorno de Estresse Pós- Traumático.
O TEPT, segundo Ito e Roso (1998), é uma reação a uma situação de perigo que pode
se tornar patológica quando o indivíduo permanece em um estado de desconforto resultante da
lembrança do evento estressor vivido. Define-se por uma série de sintomas físicos e
psicológicos que podem ser diretamente observados, diagnosticados e tratados. O transtorno
do estresse pós-traumático é a psicopatologia que melhor representa a relação entre eventos
externos e suas conseqüências psicológicas.
242
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Diagnóstico
O TEPT é um transtorno de ansiedade que se desenvolve após um evento traumático de
natureza extrema que causa intenso sofrimento emocional e comprometimento social e
ocupacional. De acordo com a última edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais, DSM IV, são duas as características centrais do TEPT: o evento
traumático e a tríade psicopatológica. Um evento para se configurar como traumático deve
preencher os critérios de tipo A do DSM- IV transcritos a seguir:
1. A pessoa vivenciou, testemunhou ou foi confrontada com um ou mais eventos que
envolvem morte ou grave ferimento, reais ou ameaçadores, ou uma ameaça à integridade
física própria ou a de outros;
2. A resposta da pessoa envolveu intenso medo, impotência ou horror.
Apesar de alguns eventos, como desastres naturais, acidentes, estupros, combate
militar, abuso sexual e abuso físico serem classificados como precipitadores de traumas mais
comuns na literatura especializada, qualquer situação pode ser caracterizada como traumática,
desde que a pessoa experimente altos níveis de medo, horror ou impotência. O evento pode ser
externo (assalto) à pessoa ou interno (doença). Porém, sem a ocorrência de um evento
traumático não é possível o desenvolvimento e o diagnóstico do Transtorno de Estresse PósTraumático.
Para completar o diagnóstico do TEPT, o indivíduo que experimentou uma situação
traumática deve desenvolver três grupos de sintomas, chamada de tríade psicopatológica: a
revivência do trauma, a esquiva e o entorpecimento emocional e a hiperestimulação
autonômica.
Neste sentido, o primeiro grupo (critério B do DSM-IV) é caracterizado por
revivências da experiência através de sonhos vívidos, pesadelos, pensamentos intrusivos,
sentimentos incontroláveis, flashbacks e pelo indivíduo se comportar como se o evento
traumático estivesse ainda ocorrendo. Esses sintomas, além de serem extremamente dolorosos
e dominarem a atenção da pessoa, são exclusivos do TEPT não sendo encontrados em nenhum
outro transtorno psiquiátrico.
A esquiva e o entorpecimento emocional constituem o critério C do DSM-IV. O
primeiro corresponde a uma tentativa de evitar contato com tudo que relembre o trauma
(pensamentos, sentimentos, atividades, locais e pessoas que ativem recordações) e, muitas
vezes, é acompanhado pela incapacidade de relembrar algum aspecto importante do evento. Já
o entorpecimento emocional (anestesia emocional ou numbing) é caracterizado pela sensação
de distanciamento em relação às outras pessoas, sentimento de um futuro abreviado e
incapacidade de ter afeto por pessoas próximas como antes. As características descritas nesse
grupo podem ser consideradas estratégias emocionais, cognitivas e comportamentais utilizadas
pelos indivíduos para minimizar o sofrimento causado pelos sintomas de revivência e de
hiperestimulação autonômica.
243
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Por último, é citada pelo DSM IV em seu critério D, a hiperexcitabilidade, que
representa um estado de hiper-reação do corpo a estímulos externos, como se esse estivesse
em permanente perigo, expressando-se através de sintomas como insônia, sobressalto, coração
acelerado, irritabilidade, baixa concentração e hipervigilância. A hiperestimulação pode,
também, se apresentar na forma de queixas somáticas, como fadiga e cefaléia.
Ainda segundo o DSM IV, os sintomas devem persistir por, pelo menos, quatro
semanas após o trauma para que se possa diagnosticar o Transtorno de Estresse PósTraumático. Este pode ser classificado como agudo, quando os sintomas começam nos
primeiros três meses após o trauma; como crônico, quando a duração é superior a três meses; e
de início tardio, quando os sintomas se instalam após seis meses da ocorrência do trauma.
Vale ressaltar que os critérios diagnósticos utilizados pela Classificação Internacional
de Doenças (CID-10) equiparam-se aos do DSM-IV, diferenciando-se apenas na menor ênfase
dada aos sintomas de esquiva/entorpecimento emocional e hiperestimulação autonômica.
Resiliência
Ao longo da vida, em algum momento, todos iremos passar por pelo menos uma
situação adversa. Como alguns indivíduos, então, superam essas situações? O que faz uns se
adaptarem e outros não a um contexto de intenso estresse? São todas as pessoas que se
recuperam de grandes perdas materiais e afetivas? A psicologia vem buscando responder a
essas perguntas através do estudo do fenômeno Resiliência. Este, gera uma nova possibilidade
de compreensão acerca de como o ser humano lida com condições potencialmente
traumáticas.
O conceito
O termo Resiliência, segundo o dicionário da língua portuguesa Houaiss (2001), no
sentindo físico é a propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após
terem sido submetidos a uma deformação elástica; no que diz respeito ao ser humano, é a
capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças. O dicionário da
língua inglesa Longman Dictionary of Contenporary English (1995) traz a definição do
verbete no sentido psicológico: a resiliência como a habilidade de voltar rapidamente para o
seu usual estado de saúde ou de espírito, depois de passar por doenças e dificuldades. A
conceituação do termo na psicologia não é tão precisa como na física devido à diversidade e
complexidade de variáveis no estudo de fenômenos humanos.
Para um dos principais precursores do estudo da Resiliência na psicologia, o psiquiatra
Michael Rutter (1987), este conceito se refere a uma
“variação individual em resposta ao risco e os mesmo eventos estressores podem ser
experenciados de maneira diferente por diferente pessoas. (...) A resiliência não pode
ser vista como um atributo fixo do indivíduo, e se as circunstâncias mudam a
resiliência se altera”. (RUTTER, 1987, p.317)
244
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Anos mais tarde, o referido autor define a resiliência como “um fenômeno em que se
supera o estresse e as adversidades” (RUTTER, 1999, p.119).
Ralha Simões (2001) define o termo como a possibilidade de flexibilidade interna que
permitiria a adaptação positiva frente às adversidades externas.
Para Garmezey (1993), o conceito está relacionado com a capacidade de voltar ao
funcionamento padrão após vivenciar um evento adverso, não deixando de ser transformado
por este. Já para Cyrulink (2001), a Resiliência diz respeito a um conjunto de fatores
interligados que, ao longo da vida, se desenvolvem nos aspectos afetivos, sociais e culturais e
é comparado metaforicamente à arte de navegar em meio à tempestade.
Ainda Zimmerman e Arunkmar (1994) destacam que o termo Resiliência está ligado
aos fatores e ao processo que interrompem uma trajetória de risco tendo como conseqüência
respostas positivas mesmo frente às adversidades.
Em suma, a Resiliência refere-se à capacidade do ser humano de agir de forma
favorável diante as adversidades encontradas ao longo do seu desenvolvimento. Porém, o
termo ainda é impregnado de incertezas e controvérsias entre os autores que discutem o tema.
Enquanto uns destacam a flexibilidade e versatilidade como características de pessoas
resilientes, outros salientam o conceito como um traço de personalidade (FLANCH, 1991;
GARMEZY, 1985; WOLIN, 1993). Há também discussões acerca da Resiliência ser uma
característica individual ou resultado da interação com o ambiente (FLANCH, 1991;
RUTTER, 1993; TAVARES, 2001; TROMBETA e GUZZO, 2002).
Resiliência e fatores de risco e proteção
Para entender a Resiliência é preciso explicitar os chamados fatores de risco e
proteção. Os fatores de risco estão relacionados a eventos negativos que, quando presentes,
aumentam a probabilidade do indivíduo desenvolver problemas físicos, psicológicos e sociais.
Em contrapartida, os fatores de proteção referem-se às influências que atenuam ou neutralizam
os efeitos negativos dos riscos, tornando possível a construção da Resiliência. Rutter (1987)
ressalta que a Resiliência é o processo final de mecanismos de proteção que possibilita ao
indivíduo lidar com a situação de risco de maneira positiva, não eliminando, portanto, o risco
em si.
Ainda, Cowan, Cowan e Schulz (1996) ligam Resiliência e fator de risco da seguinte
forma: “resiliência refere-se aos processos que operam na presença de risco para produzir
conseqüências boas ou melhores do que aquelas obtidas na ausência de risco” (p.14).
Risco, então, se caracteriza como qualquer obstáculo que se impõe ao desenvolvimento
positivo do indivíduo, sendo atualmente entendido como um processo e não de maneira
estática. De acordo com Yunes & Szymanski (2001), um evento para ser considerado fator de
risco dependerá da atribuição subjetiva do indivíduo; o que é risco para uns não será para
245
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
outros. Além disso, dentro de uma situação, qualquer variável poderá estar agindo com
indicadora de risco.
Na área da saúde mental, o termo risco tem sido descrito como estressor ou fator que
predispõe um resultado negativo. Esse poderá desencadear uma conseqüência indesejada,
como um distúrbio psicológico de acordo com sua severidade, duração, freqüência e
intensidade.
É importante destacar que Masten e Garmezy (1985) indicam que os fatores de risco
associados ao desenvolvimento de distúrbios envolvem características individuais (sexo,
habilidades sociais e intelectuais, aspectos psicológicos, variáveis demográficas e história
genética) e ambientais (apoio social, eventos estressantes de vida e características familiares e
culturais).
Devido à capacidade de proteger o indivíduo diante da adversidade, os fatores de
proteção são tidos como características individuais (traços de personalidade) ou ambientais
(rede de apoio social) que amenizam os efeitos negativos do meio. Logo, os mecanismos de
proteção conduzirão o indivíduo para uma resposta mais adaptada.
Proteção é definida por Deslandes e Junqueira (2003) como o grupo de influências que
modificam e melhoram a resposta do indivíduo frente a uma situação de risco que predispõe a
um resultado não adaptativo. Além disso, a proteção não elimina os aspectos psicológicos
promovidos por uma situação adversa. Vale ressaltar que proteção não é sinônimo de
invulnerabilidade, pois esta significa resistência absoluta ao estresse, uma característica não
passível de mudança. Zimmerman e Arunkumar (1994) concluem que Resiliência e
invulnerabilidade não podem ser considerados conceitos equivalentes, uma vez que,
invulnerabilidade está associada a idéia de que o indivíduo não seria atingido de nenhuma
forma pela situação de estresse.
Enfim, para Trombeta e Guzzo (2002), de um lado, encontram-se os eventos
estressores, as situações adversas, os perigos e o sofrimento e, do outro lado, respostas de
enfretamento positivas, competências pessoais, apoio social e familiar. O binômio risco x
proteção propiciará o desenvolvimento da Resiliência como um processo psicológico.
Resiliência e evento estressor/trauma
De acordo com Masten e Garmezy (1985), qualquer mudança no meio externo que
interfira nos padrões normais de enfrentamento do indivíduo e que, conseqüentemente, leve a
um alto grau de tensão são considerados eventos estressores.
“Numa visão subjetiva do fenômeno, pode-se dizer que, dependendo da percepção que o
indivíduo tem da situação, da sua interpretação do evento estressor e do sentido a ele
atribuído, teremos ou não a condição de estresse” (YUNES, SZYMANSKI, 2001, p.30).
246
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Trauma, na origem do conceito, significa lesão causada por um agente externo. No
campo da Psicologia, o termo está freqüentemente associado com a transgressão das defesas
psicológicas. Logo, o modo como a pessoa processa o evento estressor é fundamental para a
configuração ou não de um trauma.
A Resiliência promoveria a capacidade de enfrentar, resignificar e se adaptar a
situações de estresse de maneira que o estressor deixe de ser visto como tal.
Conseqüentemente, a Resiliência age de forma protetora na não formação de um trauma.
Pesquisa de Campo
A pesquisa descrita a seguir teve o intuito de averiguar se a Resiliência estaria ativada
em indivíduos que passaram por um evento estressor de alta intensidade como a catástrofe
natural ocorrida no dia 12 de janeiro de 2011 na cidade de Nova Friburgo, RJ.
Amostra
A seleção da amostra foi realizada dentro dos seguintes critérios: escolaridade
(primeiro grau completo), idade (adultos de ambos os sexos entre 20 e 60 anos) e os
participantes terem obrigatoriamente vivenciado a tragédia e estarem na condição de
desalojados ou desabrigados. Foram selecionadas 33 pessoas, sendo 11 homens e 22 mulheres.
Instrumentos de avaliação
A Escala de Resiliência (anexo A) utilizada nessa pesquisa foi desenvolvida por
Wagnild e Young (1993). Possui 25 itens descritos em forma de afirmações com respostas
auto-aplicáveis tipo Likert de sete pontos: 1 (discordo totalmente) e 7 (concordo totalmente) e
os escores variam entre 25 (baixa resiliência) e 175 (alta resiliência). A partir de 111 (ponto de
corte aproximado a 110.6) a pessoa poderá ser considerada resiliente. O estudo da “Adaptação
transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência” foi realizado por Pesce, Assis,
Avanci, Malaquias e Oliveira (2005) e apresentou equivalência conceitual entre os itens,
determinando que a escala é pertinente à cultura brasileira.
A avaliação dos sintomas do Transtorno do Estresse Pós-Traumático foi realizada
através do Post-Traumatic Stress Disorder Checklist - Civilian Version (PCL-C – anexo B)
desenvolvido por Weathers, Litz, Huska e Keane, do National Center for PTSD (EUA). É uma
escala auto-aplicável que possui duas versões: a PCLC-M (para militares) e a PCL-C (para
civis) que é amplamente utilizada em todo o mundo para rastreamento do Transtorno do
Estresse Pós-Traumático. Possui 17 itens que avaliam a intensidade dos sintomas do TEPT
com cinco possibilidades de resposta. Estas variam entre “nada” (o sintoma não está presente)
e “muito” (o sintoma está presente em alta intensidade) e os escores estão no intervalo de 17
(ausência total do quadro sintomatológico do TEPT) a 85 (quadro sintomatológico
importante), no qual a linha é 50 pontos.
247
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Resultados
A tabela abaixo ilustra os resultados obtidos através da pesquisa.
Participante
Sexo
PCL-C
Escala de
Resiliência
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
M
F
F
F
F
F
F
F
M
F
M
33
49
52
25
29
38
65
50
36
51
29
136
130
121
126
138
136
88
126
125
97
116
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
F
F
F
M
M
F
M
M
F
F
F
F
M
F
M
F
F
F
M
F
F
M
28
69
20
20
22
20
30
32
33
60
70
34
20
25
50
59
48
54
35
23
19
22
128
107
136
135
139
157
104
141
148
56
113
152
143
145
120
113
116
114
112
141
145
146
Discussão dos resultados
Pode-se observar que, dos trinta e três participantes, dez indivíduos (identificados pelos
números 3, 7, 8,10, 13, 21, 22, 26, 27 e 29) apresentaram escores para possível TEPT. Dentre
esses, quatro apresentaram baixa Resiliência (indivíduos: 7, 10, 13 e 21) e, outros três,
Resiliência pouco acima da linha de corte (indivíduos 22, 27 e 29). Segundo os critérios
248
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
estabelecidos, os sujeitos que tiveram menores escores no PCL-C (indivíduos: 14, 15, 17, 24 e
32) apresentaram alta resiliência.
Entre os dez participantes com os maiores índices de resiliência (escores que variam de
139 a 157), nenhum apresentou probabilidade de TEPT e três desses encontram-se dentre os
menores índices verificados no PCL-C (indivíduos: 17,24 e 32). Já dos cinco indivíduos (7,
10, 13, 18 e 21) que apresentam resiliência abaixo da linha de corte (111), quatro obtiveram
altos escores no PCL-C indicando provável TEPT.
Logo, podemos observar que a maioria dos mais resilientes realmente mostrou um
quadro sintomatológico do TEPT brando ou nulo, enquanto a maior parte da população que se
apresentou como a menos resiliente desenvolveu um importante quadro de sintomas do
transtorno.
A partir de análise acima, verificou-se que a Resiliência é um processo ativado a favor
do indivíduo na proteção e adaptação em situações adversas que podem levar a conseqüências
negativas, como o desenvolvimento do transtorno de estresse pós-traumático.
Limitações
Ao longo da pesquisa encontramos algumas dificuldades no tocante à seleção da
amostra, em função de algumas limitações observadas, então, na referência à utilização dos
instrumentos escolhidos e adotados. A ideia inicial era realizar a pesquisa com os desalojados
e desabrigados que estivessem nos abrigos. Porém, nos deparamos com a limitação da
escolaridade dessas pessoas que não conseguiam compreender, por conta de insuficiência de
vocabulário, os termos utilizados na escala de Resiliência de forma satisfatória. Diante desta
dificuldade, não julgamos válida a modificação de instrumento, uma vez que esse já possui
tradução transcultural publicada em artigo científico.
A partir disso, exigimos escolaridade mínima (primeiro grau completo) como critério
para a seleção da amostra. A nova população foi composta, então, por indivíduos que
vivenciaram a tragédia, tendo como atual moradia casas de parentes, amigos ou em aluguel.
Vale ressaltar que todas as pessoas que participaram da pesquisa estavam necessariamente
presentes no momento da catástrofe em suas residências atingidas.
Considerações Finais
É importante ressaltar as dificuldades geralmente encontradas em pesquisas das
ciências humanas que possuem uma complexa rede de variáveis incontroláveis, como a
história desenvolvimental de cada um, a rede de apoio social, os traços de personalidade e a
genética. É sabido que essas variáveis influenciam diretamente nos resultados obtidos. Sendo
assim, esses podem não ser totalmente fidedignos.
Além disso, o próprio conceito de Resiliência apresenta limitações devido a poucos
estudos realizados no Brasil, onde o meio acadêmico apresenta inexpressivas publicações
249
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
sobre o tema em livros didáticos e técnicos. Podemos citar, ainda, que há divergências entre os
principais autores, no sentido de interrogarem se a Resiliência seria um processo de adaptação
ou de superação, se fator inato ou adquirido, ou se referido a algo circunstancial ou
permanente. Para explicitar tamanha dificuldade, Slap (2001) ressalta que “é mais fácil
concordar sobre o que resiliência não significa do que sobre o que palavra significa” (p.173).
Porém, a resiliência possui inúmeras possibilidades de aplicação, já que contribui para
compreensão do processo de produção de saúde em meio às adversidades encontradas pelo ser
humano ao longo da vida. Então, o potencial contido nesse conceito pode contribuir para a
instrumentalização de profissionais que trabalham com indivíduos e grupos em situação de
risco.
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Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
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251
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
O Comportamento Anti-Social Infantil no Contexto Escolar de Nova Friburgo: análise
das propostas de prevenção
Autores:
Pedro Assumpção dos Reis Ferreira
Ivan Motta Mattos
Curso Psicologia
Universidade Estácio de Sá
Orientadora: Angela Utchitel
Resumo
O presente trabalho é fruto da pesquisa de caracterização da rede de ensino municipal de Nova
Friburgo quanto às ações de prevenção do comportamento anti-social infantil, cujo objetivo
foi analisar qualitativamente estas propostas e compará-las, segundo sua localização em áreas
de risco para vulnerabilidade social. Para tanto, aplicou-se um questionário em 38
representantes (gestores e/ou orientadores) das escolas e a análise dos dados apontou que as
ações de prevenção estruturam-se segundo a “necessidade”, quando os casos já ocorreram,
configurando níveis secundários e terciários de prevenção, mais próximos da concepção de
intervenção. Portanto, torna-se necessário que ações de prevenção primária sejam estruturadas
e incorporadas à rotina escolar em Nova Friburgo.
Palavras-chave: Prevenção; Comportamento anti-social infantil; Contexto escolar; Nova
Friburgo.
Introdução
O fenômeno do comportamento anti-social historicamente tem ocupado o pensamento
humano, assumindo o posto de objeto de estudo em distintas áreas do conhecimento
(GOUVEIA et al., 2009; KRISTENSEN et al., 2003). Nos últimos vinte anos, fatores como o
seu aumento significativo, aliados à massiva divulgação dada pela mídia – somado aos custos
pessoais, sociais e econômicos acarretados – têm incentivado decisivamente a elaboração de
vários estudos (GOUVEIA et al., 2009; PORTO, 2002). Estes fatores têm levado a alguns
progressos no domínio, como fica refletido nos esforços teóricos de definição e delimitação do
conceito, e no elevado número de possibilidades em termos metodológicos (FONSECA e
SIMÕES, 2002), permitindo, com isso, sua investigação segundo distintos pontos de vista.
Professora Doutora da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo
252
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
No âmbito deste trabalho, entende-se como anti-social todo comportamento que
infrinja regras e/ou normas sociais ou que seja uma ação intencional que viole os direitos
básicos dos outros, como agressão contra pessoas ou animais; destruição deliberada da
propriedade alheia (vandalismo, piromania); defraudação ou furtos; e sérias violações de
regras (ausência escolar ou fugas de casa) (PACHECO, et al., 2005; APA, 2002).
Recentemente, estudos epidemiológicos realizados têm indicado um crescente aumento
na prevalência e intensidade dos problemas de comportamento tanto na infância, como na
adolescência (PACHECO et al., 2005), de modo que, de todos os problemas diagnosticados
nestas fases de desenvolvimento, os comportamentos anti-sociais são os mais freqüentes e
provocam a maior preocupação na sociedade, devido, em parte, à quantidade de pessoas
afetadas (KOCH e GROSS, 2007) e suas graves implicações à saúde (CARDIA, 2003).
Outro ponto de vista, que passa a predominar entre os pesquisadores, baseia-se em
certo consenso acerca da importância de se conhecer as variáveis que possam explicar e
auxiliar na promoção eficaz de estratégias de prevenção e enfrentamento do problema
(GOUVEIA et al., 2009), tornando estes empreendimentos de especial importância para o
campo social e da saúde (MINAYO e SOUZA, 1999).
Embora não se tenha alcançado, ainda, um quadro teórico definitivo das causas que
predispõem ao desenvolvimento do comportamento anti-social entre crianças e adolescentes,
muitos estudos têm sido conduzidos, segundo as mais diversas perspectivas teóricas, algumas
das quais têm demonstrado maior poder preditivo em detrimento de outras (KOCH e GROSS,
2007). Dentre elas, uma perspectiva recente que vem se destacando, devido, em parte à sua
abrangência explicativa do fenômeno da interação anti-social, é a teoria geral da agressão, de
Anderson e Bushman (2002).
Nesse modelo, as crenças pessoais são determinantes da forma como o indivíduo vai
significar um evento, influenciando assim a sua reação. Essa teoria se fundamenta na
existência de estruturas de conhecimento e subtipos de estruturas que se desenvolvem a partir
de experiências do indivíduo e, conforme vão sendo utilizadas tendem a se automatizar, já que
os resultados finais servem como input para o próximo episódio, constituindo um ciclo de
interação social continuada (RIBEIRO e SANI, 2009; KRISTENSEN et al., 2003).
Entretanto, curiosamente, em meio a diversos estudos que investigaram a etiologia,
percebe-se que há linhas gerais que assinalam certo consenso acerca de alguns fatores que
desempenham a função de proteção ou expõem os indivíduos ao risco de desenvolverem o
comportamento anti-social, mesmo que a ênfase atribuída aos fatores varie conforme as
diversas vertentes.
Entende-se por fatores de risco as variáveis que estão relacionadas a uma maior
incidência de resultados negativos ou indesejáveis; já os fatores de proteção são recursos
pessoais ou sociais que influenciam no desenvolvimento do individuo, atenuando ou
impedindo a resposta individual a algum risco ambiental que predispõe ao resultado mal253
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
adaptado (KAZDIN e BUELA-CASAL, 2001; SILVEIRA et al., 2003; MAIA e WILLIAMS,
2005).
Neste caso em particular, interessa-nos os fatores associados às condições pessoais,
escolares e comunitários (ver Tabela 1).
Kazdin e Buela-Casal (2001) apontam ainda outros fatores que contribuem para
incrementar o risco de condutas anti-sociais, mas ressalta a necessidade de combinação de
vários deles.
À medida que se vai estabelecendo uma compreensão mais acurada dos fatores causais
subjacentes ao comportamento anti-social infantil, surgem, por conseguinte, condições
facilitadoras para a construção de esforços preventivos, que tem, ultimamente, levado a uma
mudança no otimismo em relação aos alcances destas ações (ASSIS e CONSTANTINO,
2005; NAVAS-COLLADO e MUÑOZ-GARCÍA, 2005).
Individuais
Tabela 1: Fatores de risco e proteção para o desenvolvimento do comportamento anti-social:
Fatores de risco
Fatores de proteção
História
de
vitimização
ou Atitude intolerante face à violência;
envolvimento com a violência;
Elevado Quociente Intelectual ou bons
resultados escolares;
Déficit de atenção, hiperatividade ou
Orientação social positiva;
Competências de gestão de stress e
problemas de aprendizagem;
regulação emocional;

Temperamento
resiliente;
Desordem de conduta;

Percepção
do
apoio social de adultos e
História de comportamento agressivo
pares;
precoce;
Envolvimento com drogas, álcool, Valorização do envolvimento em atividades
religiosas;
tabaco;
Saudável sentido de si;
Baixo Quociente Intelectual;
Expectativas positivas/otimismo face ao
Controle comportamental pobre;
futuro.
Déficit ao nível das competências
sócio-cognitivas ou de processamento
da informação;
Crenças e atitudes anti-sociais;
Elevado stress emocional;
Exposição a violência e conflito na
família.
254
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Escola/pares
Comunidade
Associação com pares delinqüentes;
Envolvimento com gangs;
Rejeição social pelos pares;
Falta de envolvimento em atividades
convencionais;
Baixos resultados acadêmicos;
Baixo compromisso com a escola e
fracasso escolar.
Compromisso com a escola;
Boa relação com os pares;
Aprovação dos amigos pelos pais;
Motivação/atitude positiva face à escola;
Escolas de elevada qualidade/regras/
padrões/critérios claros;
Envolvimento em atividades sociais.
Oportunidades econômicas diminutas;
Alta concentração de residentes pobres;
Elevado nível de transitoriedade;
Elevado nível de disrupção familiar;
Baixos
níveis
de
participação
comunitária;
Vizinhanças socialmente
desorganizadas.
Coesão social;
Expectativas elevadas por parte da
comunidade;
Comunidades economicamente estáveis;
Ambientes promotores de segurança e
saúde.
Ribeiro, 2008
Psicologia e prevenção
No campo da ciência preventiva, a Psicologia tem prestado contribuições relevantes, na
medida em que disponibiliza modelos de intervenção focados nas características centrais
presentes nas etapas de desenvolvimento de crianças e adolescentes, logo, adaptando os
conteúdos e procedimentos da prevenção às demandas específicas desta população
(ZAMBERLAN, 2003).
Aliado a isso, traz-se a constatação de que possibilitar um desenvolvimento saudável é
a melhor forma de se prevenir o envolvimento de crianças e jovens em situações de risco,
como é o caso dos comportamentos anti-sociais. (RUOTTI et al., 2006; MAIA e WILLIAMS,
2005; CUNHA e RODRIGUES, 2010). É neste sentido que se tem orientado as vertentes mais
recentes e promissoras dos programas de prevenção da violência (CARDIA, 2006; PERES et
al., 2010).
Nessa vertente, a promoção do desenvolvimento saudável está atrelada à concepção
mais ampla de saúde (CUNHA e RODRIGUES, 2010), o que inclui as dimensões psicológica
e social. Por isso, considera essencial a vinculação dos jovens às diferentes esferas de
socialização (família, escola, comunidade, grupo de pares), que devem suprir suas
necessidades básicas e promover o desenvolvimento de suas capacidades, incluindo
competências social, emocional e cognitiva. Atuando assim, de maneira mais abrangente, ao
invés de ter como objetivo um único comportamento, passam a ter como alvo múltiplos
problemas de comportamento em um contexto específico (PERES et al., 2010).
Dentro desta perspectiva, um modelo que vem sendo proposto pela Organização
Mundial de Saúde (WHO, 1997) é o de Habilidades de Vida, considerado uma estratégia para
255
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
a redução de comportamentos de risco e o aumento dos cuidados com a saúde física e mental
(PAIVA e RODRIGUES, 2008).
Esse modelo consiste em favorecer o desenvolvimento de um conjunto de dez
competências, sendo agrupadas em categorias que se complementam: habilidades sociais e
interpessoais; habilidades cognitivas; e habilidades para manejar as emoções. O conjunto é
composto pelas habilidades: autoconhecimento, empatia, comunicação eficaz, relacionamentos
interpessoais, tomada de decisões, resolução de problemas, pensamento criativo, pensamento
crítico, lidar com os sentimentos e emoções e lidar com o estresse (cf. PAIVA e
RODRIGUES, 2008).
Especialmente em relação à possibilidade de se prevenir a violência, indícios tem
sustentado o melhor aproveitamento dos esforços primários e secundários, que tem tornado
mais exitosas as ações iniciadas precocemente, na infância (RIBEIRO, 2008; PERES et al.,
2010), devido à rapidez com que crianças e adolescentes se recuperam física e
emocionalmente e sua flexibilidade e potencial para mudança (RUOTTI et al., 2006).
Prevenção no contexto escolar
A prevenção da violência torna-se também uma tarefa dos profissionais da educação,
dado que o comportamento anti-social infantil no contexto escolar se apresenta como o
principal responsável por inviabilizar o processo ensino-aprendizagem contemporâneo,
tornando impotentes os educadores, orientadores e diretores diante do problema (OLIVEIRA
et al., 2009), causando a evasão e/ou expulsão escolar e, a longo prazo, o aumento da
violência social (BARBOSA et al., 2011).
A consecução, por esses profissionais, dessa tarefa se faz possível, uma vez que a
prática preventiva utiliza mais recursos educativos do que terapêuticos propriamente ditos, e
os fatores individuais de risco ao desenvolvimento do comportamento anti-social infantil
apresentam-se como padrão de conduta aprendida nas relações sociais, portanto, passíveis de
alterações por meio de mudanças nos padrões de interação. Junto a isso, têm-se os fatores
protetivos escolares, que tornam este espaço parte do problema e parte da solução: educar o
indivíduo para evitar o comportamento anti-social.
Dessa forma, como a escola conserva o domínio sobre os recursos educativos e
mantém, nesse local, crianças e adolescentes em convívio por um período importante de
crescimento e desenvolvimento – no qual irão aprender a se relacionar umas com as outras,
adquirir valores e crenças, desenvolver senso crítico, auto-estima e segurança (RUOTTI et al.,
2006) – passa a ser, então, considerada um locus privilegiado para ações de promoção da
saúde e prevenção das doenças em seus atores, especialmente crianças e adolescentes
(BRASIL, 2006).
Esse papel tem ainda maior peso quando não há, na comunidade, uma rede de serviços
de proteção social que dê um atendimento suplementar a essas crianças, após o horário
escolar, tendo em vista que as raízes da violência na escola brotam da violência no bairro, na
256
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
família e em condições estruturais como a pobreza e privação – típicas das condições de
vulnerabilidade. Além disso, a violência vivenciada ou testemunhada fora da escola gera
impacto direto e indireto sobre a vida escolar, ao afetar o desempenho dos estudantes, as
relações entre os alunos e destes com os professores (NJAINE e MINAYO, 2003).
Objetivos
Neste estudo visamos analisar qualitativamente as ações de prevenção empregadas
pelas unidades escolares da rede de ensino municipal de Nova Friburgo, comparando-as
segundo sua localização em áreas consideradas de risco à vulnerabilidade social.
Nossa preocupação com a análise das propostas de prevenção se deve à forma
incipiente com que esta é adotada, trazendo dúvidas quanto às ações que realmente conseguem
obter resultados efetivos na prevenção da violência (PERES et al., 2010; SILVEIRA e
PEIXOTO, 2010), além de representar uma oportunidade para refinar indicadores de
resultados e comparar êxitos e limites (GOMES, et al., 2007).
Método
Amostra
Participaram desta pesquisa gestores e orientadores das equipes pedagógicas de 38
escolas municipais da rede de ensino de Nova Friburgo, todos do sexo feminino, com idade
média de 45 anos e escolaridade de nível superior. Destes, 23 (61%) possuem pelo menos uma
pós-graduação, e 13 (34%) participam de atividades de atualização ou formação continuada.
Além disso, o tempo médio de ocupação do cargo de gestor foi de 4 anos e 3 meses (DP 2,12),
sendo que 37 (99%) relatam ter experiência anterior na área de educação e 34 (90%) não
exercem outra atividade profissional paralelamente – e as que exercem, o fazem em sua
maioria na área de educação.
A amostra distribuiu-se entre dois grupos: risco (R) e não-risco (NR), segundo critério
de localização em áreas consideradas de risco elevado de vulnerabilidade urbana, conforme
dados do Conselho de Segurança de Nova Friburgo (CESEC, 2009); ficando no grupo R 22
escolas (58%) que se localizam em áreas de risco para violência urbana; enquanto o grupo NR
foi composto por 16 escolas (42%) de áreas consideradas não violentas.
Instrumento
Foi feita uma pesquisa ex post facto, de tipo estudo de campo, exploratória. O
instrumento utilizado foi um questionário de auto-relato, misto (questões abertas e de múltipla
escolha) que foi pré-testado e aperfeiçoado. O questionário foi dividido em dois eixos: IPráticas de enfrentamento e prevenção da violência e II- Concepções sobre violência escolar,
que englobaram por sua vez cinco áreas temáticas: informações de identificação, informações
acadêmicas, informações profissionais, informações institucionais e informações instrumentais
(crenças).
257
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Procedimento
Foi realizado, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Nova Friburgo
(SME/NF), um encontro com representantes de 63 unidades escolares da rede municipal de
Nova Friburgo, de um total de 100 unidades, com o objetivo de apresentar a pesquisa e
convidá-los a participar. Nesta ocasião foram apresentados, de forma coletiva, o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (GOLDIM, 2003) e o questionário aos
interessados em participar da pesquisa.
Após a anuência dos mesmos, foram entregues a cópia do TCLE e um envelope
contendo o questionário, as instruções para seu preenchimento e duas folhas de resposta (em
anexo). O envelope lacrado foi devolvido pelos participantes na SME/NF após o prazo de 14
dias. Destas 63 escolas, 43 (68%) devolveram o questionário no prazo estipulado, sendo que 5
foram excluídas por não preencherem condições de apreciação por ausência de informações
básicas.
As informações obtidas através do questionário foram submetidas à avaliação
qualitativa segundo a modalidade de análise de conteúdo temática e estrutural proposta por
Bardin (1977). Cada questionário foi lido e analisado individualmente (análise vertical) e
foram delimitados os trechos mais significativos e centrais, apontados pelos gestores (análise
categorial). Posteriormente, procedemos a uma análise horizontal das respostas, para verificar
a tendência geral dos participantes a respeito de cada temática. Por fim, avaliamos a
freqüência de respostas em relação aos pontos levantados no questionário (análise
freqüencial).
Resultados e Discussão
No tocante à caracterização das escolas quanto à violência (Tabela 2), 23 (61%)
reportaram ocorrências no atual ano letivo, sendo 16 (42%) do grupo R e 07 (18%) do grupo
NR. Quando avaliamos os dados de ocorrência referentes ao ano letivo de 2010, temos que 21
escolas (55%) indicaram ter havido algum tipo de violência, sendo 14 escolas do grupo R, o
dobro do grupo NR. Destas 21 escolas, todas apresentaram ocorrências nos dois períodos
avaliados, evidenciando uma continuidade da ocorrência de comportamentos anti-sociais.
Entre os tipos de violência mais freqüentes apareceram: verbal (36%) e física (32%),
taxas parecidas nos dois grupos, embora uma escola do grupo R tenha mencionado incidência
de porte de armas (faca e revólver), o que é indicativo de um padrão de comportamento antisocial mais grave (APA, 2002). Além disso, aparece uma diferença em relação à quantidade
total das ocorrências nos dois grupos (R=40 e NR=28). Ainda em referência à quantidade, o
grupo R teve 157 ocorrências no ano de 2010 e o grupo NR apenas 46 (23%), o que pode
sugerir a influência do ambiente, dado que a exposição à violência em contextos de maior
vulnerabilidade social aumenta a probabilidade de ocorrência da violência nas escolas
(NJAINE E MINAYO 2003).
258
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Tabela 2: Caracterização das escolas municipais de Nova Friburgo investigadas
Características
Grupo
R
%
total
%
relativa
Grupo
NR
%
total
%
relativa
Total
(T)
Violência no
atual ano letivo
16
42%
73%
07
18%
44%
23(61%)
14
21%
35%
10
15%
36%
24(36%)
Física
13
19%
33%
9
13%
32%
22(32%)
Vandalismos
6
9%
15%
6
9%
21%
12(18%)
7
T= 40
10%
59%
17%
100%
3
T= 28
4%
41%
11%
100%
10(14%)
68(100%)
1
2,6%
4,6%
0
0
0
1(2,6%)
14
36%
63%
07
18%
44%
21(55%)
157
77%
------
46
23%
------
203
Tipos de
violência
Verbal
Roubos ou
furtos
Evasão por
violência
Ocorrências de
violência*
Unidades
escolares
Quantidade
(*) Consideradas para o último ano letivo, referente ao período de fev./dez. de 2010.
Já, no que tange às ações de enfrentamento da violência existente nas escolas
levantadas, temos que a linha de ação das mesmas se direciona para três públicos, que são: o
próprio aluno; responsáveis e terceiros (ex. Conselho Tutelar e Ministério Público). No que se
refere ao primeiro, a presente pesquisa apontou que 58% (R=42% e NR=16%) direcionam
suas ações para os próprios alunos, sendo essas práticas divididas entre conversas, registros da
ocorrência e, em dois casos, a punição. Já as atividades direcionadas aos responsáveis foram
utilizadas por 66% dos gestores (R=42% e NR=24%), sendo essas ações basicamente conversa
ou comunicação do ocorrido à família. Enfim, nas atividades relacionadas ao terceiro caso,
temos que 45% direcionam a demanda existente para terceiros (R=24% e NR=21%),
encaminhando os casos para o Conselho Tutelar e/ou Ministério Público e/ou outro
profissional (por exemplo: Psicólogo).
Na Tabela 3, referente às ações de prevenção, predominaram no aspecto “Atividades”,
dentro do grupo R, as de caráter interativo, como: dinâmica de grupo (R=6), diálogos e
reuniões (R=10) e atividades lúdicas (R=5). Aparecem com menor freqüência as atividades
expositivas como: palestras e apresentações (R=8), filmes, vídeos educativos (R=5) e
teatros/fantoches (R=3). Esta tendência permaneceu no grupo NR. Outro dado interessante
259
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
está na freqüência com que foram referidas as práticas de intervenção (p. ex. atendimento
individual) (Total=6, R=4 e NR=2), cabendo menção até aos atos de punição (NR=1).
Quanto ao aspecto “Objetivo” (Tabela 3), nota-se que os dois mais frequentes foram
conscientizar/orientar (T=16) e sensibilizar/trabalhar valores (T=14), e na sequência aparece
diminuir a violência (T=7). Uma ocorrência observada foi o fato de o objetivo „trabalhar a
agressividade‟ ter aparecido em 5 escolas, em maior proporção no grupo de não risco (NR=4).
Esta também foi a freqüência da responsabilização (R=4). Além disso, poucas experiências se
voltaram para melhorar a socialização/integração de alunos, somente 13% (T=4), todas do
grupo R.
Interessante mencionar que na relação entre os aspectos “Atividade” e “Objetivo”
observou-se que a interatividade nas ações foi mais utilizada, porém, os objetivos de
socialização não foram os mais freqüentes, tendo aparecido somente em 4 escolas do grupo de
risco, não acompanhando a perspectiva entre interatividade e socialização. Percebe-se também
certa incongruência frente aos dados instrumentais (crenças) levantados no questionário, em
que socialização/relacionamento foram elencados 14 vezes como sendo a maior dificuldade
encontrada na escola em relação aos alunos com comportamento anti-social.
Tabela 3: Ações de prevenção da violência escolar
Aspectos
Grupo
%
total*
%
relativa
Grupo
NR
%
total*
%
relativa
R
Atividades
Interativas
Total*
(T)
15
50%
94%
9
30%
64%
24 (80%)
11
37%
69%
9
30%
64%
20 (67%)
7
23%
44%
9
30%
64%
16 (53%)
Sensibilizar
Público
Segmento
8
27%
50%
6
20%
43%
14 (47%)
Infantil
7
23%
44%
6
20%
43%
13 (43%)
Fundamental
13
43%
81%
12
40%
86%
25 (83%)
Responsáveis
5
17%
31%
4
13%
29%
9 (30%)
Comunidade
4
13%
25%
4
13%
29%
8 (26%)
Expositivas
Objetivo
Conscientizar
Participação
260
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Escola
5
17%
31%
4
13%
29%
9 (30%)
Restrita
Foco
Violência
5
17%
31%
5
17%
36%
10 (34%)
16
53%
100%
9
30%
29%
25 (83%)
11
36%
69%
5
17%
36%
16 (53%)
E.P.
14
47%
88%
9
30%
64%
23 (77%)
Terceiros
Avaliação
2
7%
13%
1
3%
7%
3 (10%)
E.P.
14
47%
88%
10
33%
71%
24 (80%)
1
3%
6%
1
3%
7%
2 (6%)
Necessidade
12
40%
80%
4
13%
29%
16 (53%)
Contínuo
1
3%
6%
2
7%
14%
3 (10%)
Valores
Estrutura
Planejamento
Terceiros
Frequência
E.P.= Equipe Pedagógica
(*) Considerando a amostra de 30 escolas que tiveram ações de prevenção.
Em relação ao “Público-alvo” (Tabela 3), nos dois grupos (R e NR), a maioria das
ações de prevenção ocorreu com todos os alunos, sem distinção entre violentos ou não.
Apenas 5 ações voltaram-se somente aos alunos violentos, sendo todas do grupo R. Essas
ações acontecem principalmente no ensino fundamental I (T=25) e no infantil (T=13), porém,
a maioria 10 (R=5 e NR=5) restringe a participação aos alunos, 9 (R=5 e NR=4) são abertas
aos responsáveis, 9 (R=6 e NR=3) à escola e 8 (R=4 e NR=4) à comunidade.
Nesse ponto, faz-se importante relacionar o “público-alvo” com as crenças dos gestores
sobre a origem da violência, em que 19 sujeitos da pesquisa pontuaram que esse problema
deriva da família, e somente 5 mencionaram o próprio indivíduo, sendo que, com isto (ver
dados da tabela 3), a prática caminha na contra-mão da concepção das equipes pedagógicas, já
que, dentro das propostas realizadas, existe uma inversão, pois o foco está direcionado ao
aluno, existindo, inclusive, restrição à participação dos responsáveis.
Quanto ao “Foco” das ações de prevenção (Tabela 3), 25 (R=16 e NR=9) voltaram-se à
violência, indisciplina ou falta de limites, sendo a maioria do grupo R, o que, talvez,
represente a tentativa de conscientizar os alunos das áreas de maior vulnerabilidade – e como
visto aqui, também de maiores ocorrências de violência na escola – do caráter negativo desse
tipo de conduta. Ao que se segue o foco dos valores e princípios éticos (T=16), que são
261
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
trabalhados principalmente no grupo R, o que pode apontar para a necessidade de
conscientizá-los de seus direitos e deveres.
Acerca da “Estrutura” das ações, percebe-se que o planejamento e a avaliação das
mesmas são, em sua maioria, realizados pela equipe pedagógica das escolas, tendo o
quantitativo de 23 escolas (R=14 e NR=9) que realizam seu próprio planejamento e 24 (R=14
e NR=10) a avaliação de suas próprias ações, sendo que somente uma escola envolveu os
alunos no processo de avaliação das ações realizadas, assim como somente uma utilizou os
responsáveis no planejamento. Nota-se situação oposta em duas das propostas que se
apresentam totalmente desestruturadas (sem planejamento e avaliação).
Também da “Estrutura” tiramos que, do total de atividades realizadas, somente 9 foram
consideradas sistemáticas, seguindo o critério de continuidade, sendo que, quando a proposta
faz parte da programação anual das escolas, acontecem, em sua grande maioria, com baixa
freqüência, sendo 5 (R=4 e NR=1) semanais e somente 3 (R=3) mensais, ou seja, apenas 8
(27%) do total dos gestores realizam as ações mais de uma vez ao ano.
Uma análise geral dos cinco aspectos caracterizadores das ações de prevenção permitiu
classificá-las de acordo com os níveis adotados, isto é, se tinha por objetivo evitar o
comportamento anti-social (primário), trabalhar com populações que apresentam fatores de
risco com o intuito de diminuir a probabilidade de incidência do comportamento anti-social
(secundário) e por fim, se o trabalho era realizado com o objetivo de intervir após o
acontecimento para diminuir os agravos (terciária) (ALMEIDA, 2005).
Nesse sentido, temos que 19 (63% - R=11 e NR=8) realizam a prevenção terciária,
como nos casos do Sujeito 24, que ressaltou que as práticas ocorrem “de acordo com a
necessidade, quando estão mais violentos”, e do Sujeito 72 que informou que “as ações
ocorrem uma vez por semana, com quem estiver envolvido [em ocorrências de violência]”.
Num contraponto, temos que apenas 5 (17%) realizam a prevenção em nível primário, todos
do grupo de não-risco, embora não se possa, com estes dados, assinalar que estas práticas são
responsáveis pelas escolas do grupo NR apresentarem menor número de ocorrências de
violência, como vimos.
Retornando à tabela 3, no que se refere aos aspectos “Objetivo” e “Foco”, foi possível
verificar quais eram as pretensões das escolas nas ações preventivas, e observou-se que 22
(R=12 e NR=10) atuaram sobre os fatores de risco, 21 (R=12 e NR=9) sobre os fatores de
proteção e 18 (R=10 e NR=8) incidiram na promoção de capacidades que se aproximam dos
pressupostos das habilidades de vida.
Cabe mencionar que, dentre os fatores de risco trabalhados, todas as escolas
concentraram-se na desordem de conduta (agressividade e violência), havendo apenas 6
escolas que buscaram atuar também sobre outros, como envolvimento com drogas, e 3 em
exposição à violência e conflito na família ou negligência. Quanto aos fatores protetivos, esta
tendência também se repetiu, havendo concentração no fator orientação social positiva
(direitos e deveres, e princípios éticos e morais). Em pequena proporção apareceram também
262
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
ações relativas à auto-estima (T=3). Uma (R=1) valorizou o comprometimento com atividades
escolares e outra (NR=1) com as religiosas.
Por fim, houve escolas que aproximaram suas práticas de prevenção dos pressupostos
de habilidades de vida, mas aqui também houve concentração em alguns poucos aspectos,
como socialização e autoconhecimento. Por conta disso, aponta-se a necessidade de ampliação
deste enfoque, com vistas a incluir as demais habilidades, bem como para trabalhá-las de
forma mais ativa e sistemática.
Considerações Finais
A análise das ações de prevenção do comportamento anti-social no contexto escolar de
Nova Friburgo indicou a presença de alguns pontos positivos e limites.
Como os “efeitos dos programas de prevenção se verificam por meio do aumento dos
fatores de proteção e, simultaneamente, da diminuição de fatores considerados de risco de
surgimento de problemas futuros” (SILVEIRA et al., 2003), podemos concluir que estes
fatores constituem um bom parâmetro para análise das ações investigadas.
A este respeito, as ações que se focaram na conscientização das crianças sobre seus
direitos e deveres possuem maiores chances de alcançarem resultados positivos na prevenção
da violência, à medida que o acesso à informação e seu uso responsável assume papel
fundamental na construção da cidadania (GOMES et al., 2007). E nisso, aparecem também
algumas ações que citaram o trabalho com valores (respeito, solidariedade, entre outros),
atuando na promoção de aspectos positivos para, com isso, diminuírem a probabilidade de
envolvimento em condutas anti-sociais.
No entanto, essas ações analisadas desperdiçam uma valiosa chance de trabalhar os
fatores protetivos escolares, que atuariam não apenas sobre a violência, como também em
aspectos da competência escolar, aumentando o compromisso e engajamento com as
atividades e diminuindo, por conseguinte, a probabilidade de fracasso escolar (incluindo
evasão ou expulsão).
Outro parâmetro para análise está na capacidade das ações de prevenção para
trabalharem habilidades que possam se perpetuar ao longo do desenvolvimento das crianças e
adolescentes, aumentando o envolvimento nos cuidados com a saúde e com uma atuação de
cidadania, como é o caso das habilidades de vida – que algumas ações buscaram trabalhar,
contudo, de forma ainda tímida. Para a efetivação destes ganhos, faz-se conveniente e
importante expandir essas ações para contemplarem também as demais oito habilidades de
vida. Nesse ponto, seria de grande valia a participação de profissionais da área de Psicologia,
uma vez que possuem conhecimentos profundos dessas habilidades e dos formatos de
interação humana.
Uma parte também relevante deste trabalho de análise das ações de prevenção constitui
o levantamento dos limites e dificuldades por que passam as instituições investigadas.
263
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Nesse sentido, o primeiro deles é citado pelos gestores como sendo o estabelecimento
de parceria com instituições e profissionais especializados. O segundo está na parceria com as
famílias, que faltou ser melhor articulada e expandida. Somado a isto, têm-se as dificuldades
estruturais da rede pública de ensino, explanada pela carência de funcionários e de recursos
materiais e financeiros. Sobre isto, nos fala o Sujeito 1: “com certeza, carência de
funcionários, (...) entendemos que se tivéssemos um número suficiente de funcionários,
conseguiríamos desenvolver melhor as atividades de prevenção à violência".
Em meio à pesquisa, notamos algumas dificuldades gerais inerentes às ações realizadas
nas escolas da amostra, bem como às que geraram reflexo na metodologia utilizada.
Embora algumas políticas públicas de prevenção da violência escolar estejam sendo
desenvolvidas no município, existem desafios a superar. Como ficou observado pela presente
pesquisa, essas ações vêm se configurando de forma fragmentada, apresentando
descontinuidades ao longo do ano e dos segmentos de ensino, não chegando a se concretizar
como prática das próprias instituições escolares, enquanto parte de seus projetos pedagógicos
– como se pôde verificar através da baixa taxa de continuidade e do fato de haver repetidas
menções aos encaminhamentos como forma de solucionar o problema da violência.
Quanto à aplicação destas ações, notamos a intenção de evitar/remediar o
comportamento anti-social, que indica um baixo aproveitamento das potencialidades do
espaço privilegiado que é o ambiente escolar, ao permitir que se alcance uma maior gama de
crianças e adolescentes, objetivando antecipar-se ao problema (RODRIGUES et al., 2008).
Portanto, a partir dos dados analisados, fica evidente a necessidade de investimentos,
em especial, nas ações de prevenção no grupo NR. E, de um modo geral, investir na prevenção
em nível primário, com a intenção de desenvolver as competências sociais, cognitivas e
emocionais das crianças e adolescentes, visando com isso não apenas um decréscimo do
número de violência, mas uma formação integral, mais condizente com o amplo papel ao qual
a escola passa a desempenhar junto às crianças e adolescentes, a saber: de promotor da saúde e
cidadania.
A pesquisa traz ainda como pontos problemáticos, o fato de oito (8) escolas não
apresentarem sequer alguma atividade de prevenção que se destine à violência, apesar do
registro de casos em sua rotina e, duas não as estruturarem. Ademais, há a falta de registros
institucionais sistemáticos e organizados, que possam levar a uma apreensão realista do
problema da violência nas escolas, de modo a auxiliar na proposição de ações de prevenção e
enfrentamento adequadas a essa realidade.
A ausência de uma cultura de avaliação das ações que levem em consideração não
simplesmente os resultados enquanto percepção isolada dos professores e profissionais da
educação, mas que incluam técnicas metódicas para a construção de indicadores qualitativos e
quantitativos, e que envolvam os alunos e responsáveis, ainda representa uma dificuldade à
maioria das ações de prevenção do comportamento anti-social infantil nas escolas municipais
de nova Friburgo.
264
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Assim, embora as análises dessas iniciativas ainda sejam insuficientes, é possível dizer
que há pontos distintos e assimetrias entre os dois grupos amostrais, o que pode sugerir a
influência de fatores comunitários de risco sobre o desenvolvimento desses comportamentos.
Este aspecto leva os projetos de prevenção a demonstrarem possibilidades diferenciadas entre
as escolas nos dois grupos (R e NR) e, talvez, à necessidade de articulação dessas ações de
prevenção a projetos públicos mais amplos que abarquem toda comunidade.
No entanto, cabe ressaltar que, dadas às dificuldades de ordem metodológica inerentes
à presente pesquisa, sugere-se a realização de um estudo avaliativo mais profundo das
referidas práticas de prevenção, a fim de acompanhar o desenvolvimento das suas atividades.
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Resenhas
268
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Borderline ou Psicose Ordinária:
Querelas ou Avizinhamento?
Autor
Reginaldo Cavalcanti Ferraz Junior
Curso de Psicologia
Universidade Estácio de Sá
Unidade Nova Friburgo
Resenhista: Raymundo Reis Neto
Uma das discussões que circulam entre os psicanalistas hoje diz respeito ao conceito
de psicose ordinária, proposto pelo psicanalista francês Jacques-Alain Miller, seguidor de
Lacan, para designar pacientes que, embora não manifestem os sintomas “extraordinários”
típicos da psicoses mais conhecidas, seriam psicóticos.
Para a psiquiatria, em sentido amplo – vago, portanto – psicose e neurose se
diferenciam pelo fato de, na primeira, haver perda de realidade e ausência de reconhecimento
da doença, enquanto na segunda aparece o conflito subjetivo, sem perda da realidade.
Enquanto isso, para a psicanálise, desde Freud, é diferente. O que vale não é a
“aparência externa”, mas sim a psicodinâmica. Por exemplo, é possível haver perda da
realidade na neurose e reconhecimento da doença na psicose. É possível ler em Freud
indicações de que na psicose prevalece certo tipo de mecanismo de defesa, enquanto na
neurose outro.
O psicanalista francês Jacques Lacan entende que psicose e neurose são estruturas
clínicas. Uma vez neurótico, sempre neurótico, o mesmo valendo para a psicose. São
estruturas não intercambiáveis. Não ficamos às vezes psicóticos, às vezes neuróticos, ao longo
de nossas vidas individuais.
Enquanto na infância observamos certa plasticidade nos mecanismos de defesa – a
criança somatiza, faz rituais obsessivos, conversa com amigos imaginários, experimenta as
fobias mais diversas e outros – a partir da adolescência, é um desses caminhos que
predominará, apesar de alguma combinação desses elementos também poder manifestar-se. A
partir daí, digamos assim, o sujeito não muda mais o seu jeito de enlouquecer. Seja a loucura
neurótica ou psicótica. A normalidade não livra ninguém disso, pois, como bem se sabe, de
perto ninguém é normal.
Com o conceito de psicose ordinária, Miller parece querer sustentar a visão das
estruturas clínicas, sem dar o braço a torcer e reconhecer que existem pacientes que ficam “na
fronteira” entre psicose e neurose, portanto, sem estar nem no campo da primeira, nem no
campo da segunda, como já apontaram autores da escola inglesa desde meados do século 20.
Professor Doutor, da Universidade Estácio de Sá – Campus Nova Friburgo
269
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Miller estaria, assim, reconhecendo que existem pacientes difíceis de diagnosticar, mas ainda
assim sustentando a visão estrutural.
No artigo Borderline ou Psicose Ordinária - Querelas ou Avizinhamento?, apresentado
como Trabalho de Conclusão do Curso de Psicologia em 2011, Reginaldo Ferraz traz essa
discussão, o que é sempre bem vindo em uma área na qual as teorias quase nunca se apóiam
na frieza dos números. O faz com escrita extremamente elegante e tendendo a criticar
conceituações rígidas que operem reduções muito ousadas face à infinita diversidade da
experiência. Com isso, cutuca o preciosismo de certos lacanianos, entre eles Miller, em favor
de uma posição mais tolerante para com a diversidade de leituras possíveis face aos
fenômenos diante dos quais o analista se defronta.
Verdades eternas x relativismo / pragmatismo
O século 20 foi pródigo na oferta de estudos genealógicos que procuravam mostrar
como nasciam, com data e endereço bem definidos, certas “verdades”. Foi como o
renascimento de uma espécie de maiêutica generalizada no campo do pensamento humano,
tanto na filosofia quanto nas ciências. Tais estudos procuravam, mais do que mostrar a
verdade sobre isso ou aquilo, mostrar o quanto as verdades supostas são sempre construções
humanas, filhas legítimas de seu contexto histórico. Em epistemologia, tal posição é em geral
reconhecida como relativista ou pragmática, ainda que seja importante conhecer suas
variantes.
Tal como Sócrates, os autores desses estudos pareciam vangloriar-se do único saber
possível: “só sei que nada sei”. Como se sabe, através de seu método maiêutico, que fazia o
“parto da verdade”, Sócrates fazia as pessoas perceberem o quanto apenas pensavam saber
alguma coisa, quando, na verdade, não sabiam nada.
Mas, é preciso dizer também que Sócrates tornou-se um marco temporal – há os présocráticos e os outros – na história da filosofia, exatamente por apontar para a importancia do
conceito. Sócrates não se satisfazia com exemplos: queria o conceito, o qual não se atinge com
as sensibilidades, mas sim com o pensamento (com a teoria). Ao fazer as pessoas se darem
conta de sua ignorância, pretendia torná-las mais aptas à busca da verdade, que está no
conceito.
Os estudos genealógicos, desconstrutivistas, que grassaram no século 20, pretendiam
algo semelhante, porém, apenas na primeira parte. Desconstruindo verdades muito firmemente
estabelecidas sobre a natureza eterna e imutável das coisas, pretendiam libertar o pensamento
da opressão dos universalismos, abrindo espaço para a produção do novo no campo do
pensamento. Mas, não valorizaram o conceito, tal como Sócrates; ao contrário, criticaram o
fanatismo do conceito, em favor de verdades datadas, verdadeiras enquanto úteis e sempre
dependentes de um “ponto de vista”.
270
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
A responsabilidade do intelectual tornou-se, nessa perspectiva, a produção de novas
metáforas que pudessem se tornar úteis para os interesses humanos e não a revelação de
verdades eternas sobre a essência das coisas.
As ciências humanas tornaram-se o prato cheio desses estudos. Por exemplo, Deleuze e
Guatarri, com seu Anti-Édipo, procuraram incansavelmente mostrar como as pretensões de
Freud em universalizar os complexos de Édipo e castração eram falsas e que a psicanálise,
com suas verdades, não passava de uma das multi-máscaras da ideologia burguesa e que só
poderia ter sido criada por alguém nascido e crescido no Universo da Viena da virada do
século 19. Foucault, por sua vez, com sua História da Loucura, procurou mostrar como não
existe a essência da loucura e como a doença mental não é “descoberta” pela ciência
psiquiátrica, mas sim que nasce junto com esta, assim como com aquele que curará em seu
nome, o psiquiatra.
A discussão feita por Reginaldo não deixa de remeter ao seguinte: até que ponto
podemos dizer que algo é a mesma coisa, ainda que diferente? Por que casos clínicos tão
distintos podem ser alocados como pertencendo a uma mesma classe? Até que ponto devemos
confiar em conceitos que parecem purificar demais uma experiência jamais tão pura?
A leitura que Lacan fez de Freud é pródiga em tentativas de mostrar a essência do
pensamento freudiano. Seu lema – “retorno a Freud” – seguia nessa direção: retornar à
verdade trazida por Freud. Miller, eminente lacaniano, segue na mesma linha. Sempre
defendeu a leitura estrutural, que situa na experiência analítica três estruturas clínicas: neurose,
psicose e perversão. Uma vez feito o diagnóstico estrutural, orienta-se o tratamento sabendo-se
que não há passagem de uma estrutura a outra.
Trata-se de uma leitura instigante, compatível com vários elementos que se encontram
na obra de Freud, mas que requer tolerância para com essa firmeza na busca do conceito, uma
vez que este é aquilo que permite arrolar uma série de casos individuais em uma mesma
classe.
Psicose ordinária e os casos fronteiriços (borderlines)
Como se sabe, no próprio campo teórico constituído pela práxis dos psicanalistas
existem divergências. O trabalho de Reginaldo abraça justamente uma das tensões que
percorre o campo do diagnóstico em psicanálise. Trata-se da discussão atual em torno da
criação da categoria de psicoses ordinárias por Jaques Alain Miller, psicanalista, genro de
Lacan e responsável pelo estabelecimento dos seminários do mestre francês e pela edição de
seus escritos.
As psicoses ordinárias seriam diferentes das psicoses extraordinárias, aquelas que já
eram amplamente reconhecidas desde muito tempo. Nada de delírio, de desintegração da fala e
do corpo, de alucinações e automatismos mentais. Ou seja, uma pessoa aparentemente
“normal” e que, não obstante, seria psicótica. Mas, sem os sintomas extraordinários, o que
tornaria essas pessoas psicóticas?
271
Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012
Tomada em si mesma, essa discussão já dá o que falar. Porém, a coisa ganha ares de
novela quando se sabe que, durante muito tempo, Miller e os lacanianos, com base no ensino
de Lacan, ou pelo menos em um dos momentos desse ensino, criticaram o uso da noção de
borderline por analistas da escola inglesa. Ora, borderline seria justamente aquele paciente que
não se sabe direito se é ou não psicótico, ou seja, que está em uma borda entre a neurose e a
psicose.
Por sua vez, Melanie Klein, talvez o principal expoente da escola inglesa de
psicanálise, ainda que muitos tenham sido seus nomes importantes, defendia o conceito de
posição e não de estrutura. Conforme o conceito de posição, pode-se estar em uma posição e
passar a outra. É o caso dos conceitos de posição esquizo-paranóide e depressiva, criados pela
psicanalista.
Então, depois de ter faturado muito tempo em cima da idéia de estruturas clínicas
incomunicáveis, criticando os ingleses por criarem uma categoria diagnóstica para se livrarem
da dificuldade de estabelecer precisamente o diagnóstico, Miller agora faria entrar em cena um
conceito para lá de ambíguo, pelo menos tanto quanto o de borderline.
O psicótico ordinário seria aquele paciente que não parece psicótico nem neurótico,
mas que a fina observação clínica permitiria enxergar o ponto decisivo que faz brilhar o
conceito de psicose, oculto àqueles pouco dispostos ao trabalho árduo de encontrar o mesmo
que subjaz ao diverso.
É nesse ponto que Reginaldo intervém para propor, com Freud: “Cinza é toda teoria,
caro amigo, e eternamente verde a árvore da vida”.
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Normas De Originais
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NORMAS PARA O ENVIO DE ORIGINAIS
A “Littera Docente & Discente em revista”, da Universidade Estácio de Sá, Campus Nova
Friburgo, tem por objetivo promover e difundir a pesquisa no âmbito docente e discente, num
processo interdisciplinar.
Os interessados em encaminhar trabalhos devem remeter para o Conselho Editorial da revista
de acordo com as normas instituídas, através do e-mail: [email protected]
• Artigos: trabalhos resultantes de pesquisa original, de natureza quantitativa ou qualitativa e
somente para artigos sua estrutura deve apresentar necessariamente os itens: Resumo,
Palavras-Chave, Introdução, Objetivos, Metodologia, Resultados e Discussão, Conclusão e
Referências. Apresentação em até 15 laudas.
• Ensaios: estudo bem desenvolvido, formal, discursivo e concludente, consistindo em
exposição lógica e reflexiva e em argumentação rigorosa com alto nível de interpretação e
julgamento pessoal. Apresentação em até 10 laudas.
• Comunicações: se caracterizam pela apresentação de notas prévias de pesquisa, a partir de
experiência laboratorial, devendo estar amparada em referencial teórico que dê subsídios a sua
análise. Apresentação em até 10 laudas.
• Resenha: são contribuições que têm por objeto a análise crítica sistematizada da literatura e
ou trabalho de pesquisa produzido. Deve incluir com clareza a delimitação do problema, dos
procedimentos adotados e conclusões. Apresentação de até 5 laudas.
Formatação dos trabalhos:
1. Título
Inserir Título em fonte Times New Roman, em corpo 12, negrito, caixa alta e baixa (só
iniciais maiúsculas), usando no máximo 200 toques, cerca de duas linhas, não usar sublinhado
e usar itálico só para grafias de palavras estrangeiras;
2. Autor
Logo abaixo do título na margem direita, inserir o(s) nome(s) do Autor (es), seguido do curso
e da instituição. Tudo em fonte Times New Roman, em corpo 12, negrito sem itálico
3. Resumo (somente para artigos)
Abaixo do nome dos autor (es), inserir resumo do trabalho somente em Português, utilizando
fonte Times New Roman, em corpo 12, com espaçamento simples entre as linhas. Mínimo de
400 e máximo de 900 toques (correspondentes ao mínimo de cinco e máximo de 10 linhas),
num só parágrafo.
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4. Palavras-chave (somente para artigos)
Inserir as palavras-chave, em seqüência na mesma linha, podendo ter um mínimo de 3 (três) e
o máximo de 5 (cinco) palavras-chave, separadas por; (ponto e vírgula). Usar fonte Times
New Roman, em corpo 12, caixa alta e baixa.
5. Corpo do trabalho
Inserir aqui o texto do corpo do trabalho, usando exclusivamente a fonte Times New Roman,
corpo 12, com espaçamento 1,5 entre as linhas, margens da página 3 superior e a esquerda e
2,5 inferior e a direita. Nas referências bibliográficas o negrito deverá ser usado,
exclusivamente, para destacar os subtítulos ou divisões do trabalho, sempre no mesmo corpo
12, em caixa alta e baixa (as notas bibliográficas devem vir no final do documento).
As citações de mais de 3 linhas devem ser digitadas em corpo 10, com espaçamento simples
entre as linhas e destacadas do texto com recuo 4; as citações de até três linhas devem integrar
o corpo do texto e ser assinaladas entre aspas. Informar (ANDRADE, 2005, p.79).
6. Referências
As referências bibliográficas em fonte Times New Roman, em corpo 12, com espaçamento
simples entre as linhas. As referências bibliográficas, no fim do trabalho, devem ter os dados
completos e seguir as normas da ABNT 6023 para trabalhos científicos.
Observações Gerais:
1. Os docentes deverão encaminhar diretamente, dentro das normas, para o Conselho
Editorial, devendo dar ciência aos respectivos Coordenadores de Curso.
2. No caso de trabalho discente, o original para publicação deverá conter o parecer emitido
pelo Professor Orientador e com a respectiva homologação do Coordenador de Curso,
cabendo a seleção final ao Conselho Editorial.
3. Somente são aceitas contribuições em língua portuguesa nas categorias supras.
4. Os trabalhos fora das normas e entregues fora do prazo serão rejeitados pelo Conselho
Editorial.
5. Na hipótese de aceitação do trabalho para publicação o autor estará outorgando, formal e
graciosamente, à Universidade Estácio de Sá – UNESA – o direito de reprodução na
revista, seja impressa ou on line, em sua distribuição.
6. O Conselho Editorial não é responsável pelo conteúdo das pesquisas (estudos) publicados,
nem pelos dados e opiniões expressos nos trabalhos (categorias), que são de exclusiva
responsabilidade de cada autor.
7. O autor deverá fazer rigorosa revisão do texto antes de enviá-lo; os textos devem ser
enviados obedecendo à reforma ortográfica.
EDITORES
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