NECON

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NECON
Integração Energética do Subcontinente: Novas
Oportunidades e Desafios
Autores: Luiz Alfredo Salomão e José Malhães da Silva
Artigo apresentado em Seminário sobre Iintegração
promovido pelo MRE, em 12/03/2008
1.
Introdução
O processo de integração sul-americana ─ preconizado de forma
ainda mais ambiciosa pelo Libertador Simon Bolívar, nos termos utópicos da
unidade de toda a América Latina ─ tem diversas inspirações e pode ser
cotejada com vários paralelos históricos. Muitas críticas têm sido feitas ao
ritmo e alcance daquele processo fundadas em comparações com
experiências de integração em outras regiões. Em geral, tais críticas são
anacrônicas e históricas, por isso improcedentes.
Porém, certamente, o processo de integração com nossos vizinhos
iniciado em meados do século XX, com ênfase econômica e comercial,
poderia ter sido mais efetivo não fossem os obstáculos geográficos (a
Cordilheira, a Floresta e grandes vazios demográficos), a grande assimetria
econômica entre alguns países, a pequena diversificação industrial e
conseqüente falta de complementaridade entre as cadeias produtivas
nacionais, a precariedade e pouca densidade das redes de transportes e
comunicações que interligam nossos centros de consumo e zonas de
produção, além de outros fatores de ordem institucional (legais e regulatórios)
e política, como, por exemplo, a rivalidade latente entre Brasil e Argentina e o
ressentimento histórico que afastava o Chile do Peru e da Bolívia.
A partir de meados da década dos 80s — sobretudo em função da
decisão (1985) de Brasil e Argentina de intensificarem a relação bilateral e
atuarem politicamente de forma coordenada, a que se juntaram depois (1991)
o Paraguai e o Uruguai, formando o MERCOSUL, mas também com a
reativação do Pacto Andino (1969), dando origem à CAN — inaugura-se uma
nova fase de integração continental.
Neste contexto e com base na observação do que acontecera no
passado recente, afirmou-se para todos os países da região, sem exceção,
que a principal prioridade da estratégia de integração continental era a
integração física das rede de transportes, da energia, de comunicações em
geral e da mídia eletrônica em particular ─ especialmente a televisão. No
caso do Brasil, tal preocupação prioritária está presente em todas as políticas
públicas do governo federal, como política de Estado.
1
No caso particular da política externa para o subcontinente, a
segunda prioridade1 é a redução das assimetrias entre os países, pois a
existência de grandes desequilíbrios econômicos e sociais na região é um
obstáculo sério à integração. A terceira componente desta política é a
generosidade dos países maiores e mais desenvolvidos, tanto no âmbito do
MERCOSUL quanto para a América do Sul como um todo. Tal generosidade
deve se traduzir pelo tratamento diferencial, sem exigência de reciprocidade
em relação aos vizinhos nas áreas de comércio de bens e serviços,
suprimento de energia, compras governamentais, propriedade intelectual etc.
Sabe-se que o subcontinente América do Sul, como região, é
superavitário em termos globais em matéria de energia, mas este excedente
não é bem distribuído no território, de modo que convivem países com grande
abundância de energéticos2, efetiva ou potencial, e países com absoluta
escassez dos mesmos3. Isto sugere a oportunidade de fluxos de intercâmbio
de energéticos entre os países da região, inclusive de biocombustíveis, em
grandes volumes, evitando a evasão de divisas para outras regiões. Além de
intensificação do comércio, aquilo torna oportunos e também importantes
projetos para desenvolvimento conjunto, sejam de investimentos em infraestrutura física (plataformas de E&P, dutos, refinarias, barragens, usinas.
linhas de transmissão etc.), sejam ainda de desenvolvimento e capacitação
tecnológica, acelerando a integração.
No Brasil, adquiriu-se finalmente a consciência de que a segurança
energética é central para o desenvolvimento sustentado do país 4, com
redistribuição de renda. Por conseguinte, o tema da Energia adquiriu um
relevo para a sociedade que antes não tinha, ao mesmo tempo em que as
empresas estatais de energia — as maiores do país —, se projetam para o
exterior, particularmente para os vizinhos sul-americanos, com reflexos
importantes em várias políticas públicas brasileiras.
1
Para uma discussão mais detalhada da atual política externa para a América do Sul veja-se O Mundo
Multipolar e a Integração Sul-Americana, do Secretário-Geral do MRE, Samuel Pinheiro Guimarães,
19/07/07, mimeo.
2
No caso de hidrocarbonetos: Venezuela, Bolívia, Equador, Brasil. No caso de hidroeletricidade: o
Brasil e o Paraguai.
3
No caso dos hidrocarbonetos: Uruguai, Paraguai e Chile.
4
Nos países desenvolvidos esta consciência há muito está incorporada na maioria das políticas
públicas. No caso dos EUA ela está explicitada não apenas na política energética, mas também nas
políticas externa e de segurança nacional.
2
Este artigo está focado na integração energética, particularmente nas
questões relativas ao gás e à eletricidade, inteiramente interligadas e que
hoje polarizam as preocupações dos governantes de quase todos os países
sul-americanos. Tratar-se-á também, eventualmente, do petróleo, posto que
muito freqüentemente está associado ao gás.
Em função da importância e urgência da integração energética sulamericana têm surgido vários projetos de produção e transporte de gás em
larga escala (o anillo energetico, o Grande Gasoduto do Sul, Mariscal Sucre
etc.) sempre recobertos de forte polêmica e com entraves políticos,
econômicos e ambientais, que os mantêm stand by. Agora, com a descoberta
dos megacampos de Tupi (petróleo e gás) e Júpiter (gás natural) na costa
brasileira e a quase duplicação da reserva provada de gás peruano em
Camisea, volta a ser tempestivo o debate de novas alternativas para
equacionar e garantir o suprimento no longo prazo deste energético no
subcontinente.
2.
A Integração Através do Petróleo e Gás Natural
2.1- Considerações Preliminares
A integração energética na América do Sul deve obedecer a diretrizes
e perseguir metas que constam de várias declarações, acordos e tratados,
envolvendo todos os países da região, conforme roteiro apresentado no
Anexo I. Sua execução, porém, está distante das metas fixadas por conta de
alguns impasses e indefinições político-administrativas e econômicofinanceiras dos países-membros dos tratados. A superação de tais
dificuldades depende de iniciativas e ações que, se espera, venham a ser
implementadas pelo Conselho Energético da América do Sul (CEAS),
integrado pelos ministros de Minas e Energia de cada país. De qualquer
sorte, o processo marcha em ritmo determinado pela vontade política de cada
governo nacional e da racionalidade econômica das empresas energéticas da
região.
Os esforços de integração energética da indústria do petróleo e gás
estão basicamente concentrados em associações para exploração e
produção (E&P), parceria na construção, reforma e operação de refinarias e
plantas de processamento de gás, construção de gasodutos, em acordos de
3
suprimento de petróleo e derivados para pagamento em condições
favorecidas, bem como em acordos de transferência de tecnologia na área de
biocombustíveis.
Conforme sacramentado na Declaração de Margarita, de 17 de abril de
2007, tais esforços devem ser desenvolvidos com base na cooperação entre
as respectivas empresas nacionais de petróleo e em iniciativas de
solidariedade para com os países mais pobres que dependem da importação
de combustíveis, como a PETROAMERICA (Petrocaribe, Petroandina e
Petrosur) de iniciativa do governo da Venezuela e da PDVSA.
Neste contexto é que os governos brasileiro e venezuelano,
coadjuvados pela PETROBRAS e a PDVSA, assinaram acordo para a
realização de investimentos conjuntos de US$ 4,7 bilhões, sendo US$ 2,5
bilhões para a refinaria Gal. Abreu Lima, a ser construída em Pernambuco, e
US$ 2,2 bilhões a serem despendidos na E&P de gás natural na Venezuela.
A refinaria Gal. Abreu Lima terá capacidade de processar 200 MBPD.
Os investimentos requeridos, o suprimento de óleo cru pesado, bem como a
produção serão divididos em partes iguais entre a PETROBRAS e a PDVSA.
Entendimentos semelhantes foram ratificados entre: PDVSA e
ENARSA (Argentina); PDVSA e ANCAP (Uruguai); PDVSA e PETROPAR
(Paraguai); PDVSA e YPFB (Bolívia); PDVSA e ECOPETROL (Colômbia);
PDVSA e PETROECUADOR (Equador); PDVSA e PERUPETRO (Peru).
Há também associações para exploração e produção de petróleo e
gás, empreendidas entre empresas sul-americanas em terceiros países da
região, dentro dos respectivos marcos regulatórios para licitação e
adjudicação de campos de hidrocarbonetos (por exemplo, PETROBRAS e
ENAP no Equador). Porém, sendo o petróleo uma commodity, é natural que o
potencial de integração sul-americana por via deste energético sofra a
competição e seja balizado pelo comércio de óleo e derivados com outras
regiões fornecedoras.
4
2.2 – Integração Através do Gás Natural
As reservas provadas de gás natural na América do Sul5 montavam a
pouco mais de 7 trilhões de m3 (TMC), no início de 2007, das quais 63%
localizadas na Venezuela. Deve ser ressaltado que nesse volume não estão
incluídas as recentes descobertas brasileiras dos campos de Tupi (petróleo e
gás) e Júpiter (gás natural) e, tampouco, as descobertas que duplicaram as
reservas dos campos de Camisea, no Peru (283 BMC adicionais).
A distribuição geográfica das reservas provadas está indicada no
Mapa 2.-I seguinte. Tais reservas são pouco significativas em relação ao
volume mundial (182 TMC), representando apenas 3,8% do total, percentual
que pode crescer em função do intenso esforço exploratório atual.
MAPA 2-I
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DAS BACIAS DE GÁS SUL-AMERICANAS
5
Neste trabalho a América dos Sul inclui Trinidad & Tobago, Uruguai e Venezuela.
Conseqüentemente, tabelas e gráficos não incorporam dados da Guiana Francesa, Guiana e Suriname.
5
Com exceção da Bolívia e do Peru, o gás natural na região está
associado à exploração do petróleo. O Mapa 2-II apresenta, por países, a
distribuição das reservas, da produção e do consumo de gás natural.
MAPA 2-II
RESERVAS, PRODUÇÃO E CONSUMO DE GÁS NATURAL
NA AMÉRICA DO SUL
Como antecipado, as relações reservas sobre consumo de gás, muito
elevadas nalguns países e demasiado baixas noutros, são altamente
favoráveis ao intercâmbio do combustível e à maior integração regional.
Trinidad-Tobago
e
Peru
estão
desenvolvendo
projetos
voltados
preferencialmente para o abastecimento da América do Norte, o que de certa
6
forma compete — mas não impede — com a idéia de expandir redes de
gasodutos interligando os campos de produção e os centros de consumo da
região. Isto é particularmente destacável em relação às significativas reservas
disponíveis da Bolívia, da Venezuela e do Peru, que poderiam ser ─ dentro
do espírito integracionista ─ preferencialmente destinadas ao atendimento do
mercado sul americano, notadamente do deficitário cone sul.
Com as privatizações na indústria de petróleo e gás
liberalização/desregulamentação
nas
décadas
de
1990s
e
e a
2000s
expandiram-se naturalmente os investimentos estrangeiros diretos (IED) na
indústria de petróleo e gás da região, notadamente das maiores companhias
de energia do mundo. No entanto, os maiores investimentos no setor gasífero
sul-americano têm sido patrocinados por empresas estatais com eventual
participação das empresas privadas, nacionais e estrangeiras.
A situação atual da integração energética via gás natural no
subcontinente, está retratada no Mapa 2-III seguinte.
MAPA 2-III
GASODUTOS EXISTENTES NA AMÉRICA DO SUL
7
Para ampliar esta rede até certo ponto desconexa, existem alguns
projetos de interconexão gasífera que poderiam intensificar a integração
energética dos países sul-americanos, cujos balanços de prós e contras não
são definitivos. Por conseguinte, não há decisão sobre descartá-los, ou
implementá-los. O mais provável é que venham a ser adaptados a
circunstâncias que os tornem viáveis do ponto de vista técnico-ambiental e
econômico-financeiro. Pela ordem cronológica de surgimento, são os
seguintes:
• O projeto do anillo energético
Foi impelido pelo Chile em 2005, visando aumentar a segurança de
seu suprimento de energia, cuja precariedade é a mais crítica dentre todos os
países do continente. Sua concepção básica é a interligação das reservas de
de Camisea,, no Peru, e de Tarija, na Bolívia, com os mercados do Chile,
Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai, conforme assinalado no Mapa 2-IV a
seguir, criando assim alternativas de fornecimento.
A motivação principal do projeto foram os cortes no fornecimento de
gás natural argentino para o Chile, decorrentes do declínio da produção
daquele país e da prioridade para o abastecimento do seu mercado
doméstico. Com a postergação do projeto do Anel, o Chile confirmou seu
projeto de importação de GNL, mediante a construção de uma planta de
regaseificação em Quintero, próximo a Santiago, e, outra, em Mejillones, no
norte do país.
Cumpre assinalar que grande parte do anillo energético projetado já
está construída, restando implantar, além de pequenas interligações, um
único grande tramo de cerca de 1200 km de gasoduto, desde a cidade
peruana de Pisco até a chilena de Tocopilla, a um custo estimado de US$ 2,5
bilhões.
Os principais entraves são as disputas territoriais conhecidas entre
Chile e Bolívia, de um lado, e Chile e Peru, de outro, que os chilenos
esperam resolver no médio prazo.
8
MAPA 2-IV
ANEL ENERGÉTICO DO CONE SUL
Seria fundamental para o funcionamento de um mercado integrado sulamericano de gás natural a existência de um marco normativo regional, cujo
conteúdo jurídico fosse ratificado pelos Congressos dos países envolvidos,
convertendo-se
em
tratado
internacional.
Porém,
este
pré-requisito
regulatório/legal para a implantação do anel energético não prosperou,
embora o ante-projeto do texto estivesse bastante avançado.
Os estudos continuaram em 2006/7 em ritmo lento, diante da falta de
prioridade. Porém, esse projeto tornou-se altamente atraente de novo em
função da recém-anunciada duplicação das reservas peruanas, do campo de
Camisea.
9
● O projeto do Gasoduto do Nordeste da Argentina (GNEA)
O acordo bilateral entre Bolívia e Argentina, através do Contrato
ENARSA - YPFB, firmado em 19 de outubro de 2006, prevê o aumento das
vendas de gás natural boliviano dos atuais 7,7 para 27,7 MMMCPD e a
construção pelo governo argentino de um novo gasoduto, o del Nordeste da
Argentina (GNEA), bem como de uma planta separadora em Tarija, com a
condição de que todos os produtos sejam comercializados diretamente pela
YPFB. Os investimentos totalizam US$ 1,94 bilhões, dos quais US$ 1,5
bilhões para a construção do gasoduto e US$ 440 milhões para a planta de
processamento de gás.
O Mapa 2-V seguinte mostra o traçado do GNEA que abastecerá o
nordeste argentino — uma das poucas regiões do país não atendidas pela
rede doméstica de gás natural — e que se interligaria ao anel energético, se
e quando o mesmo for concretizado.
Embora os processos de licitação das obras para o GNEA estejam em
andamento, a Bolívia não tem condições de cumprir o referido. O Gráfico 2-I
seguinte mostra a impossibilidade de se equacionar o suprimento adicional a
Argentina sem sacrifício de alguma outra destinação do energético. O Brasil,
como se sabe, já manifestou enfaticamente que não aceita o descumprimento
dos compromissos contratuais assumidos pela Bolívia para a entrega de gás.
GRÁFICO 2-I
10
MAPA 2-V
TRAÇADO PREVISTO PARA O GNEA
Apesar do empenho político dos presidentes Nestor Kirchner e Evo
Morales, bem como dos respectivos ministros da área de Energia, dificilmente
este projeto irá adiante antes que se comprovem reservas suficientes de gás
boliviano para garantir a entrega à Argentina dos volumes contratados. Como
se sabe, o governo brasileiro vetou liminarmente a idéia de desviar gás
destinado ao Brasil para a Argentina, o que forçou o governo boliviano a
encarar a necessidade de pesquisar e explorar novos campos gasíferos no
sul do país, recorrendo aos principais atores lá presentes, notadamente à
PETROBRAS.
11
● O projeto do Gasoduto do Sul (GSA)
A continuação dos estudos com a reavaliação das reservas de gás da
Venezuela, dos custos de investimentos e de operação envolvidos, das
possibilidades de financiamento, de alternativas de abastecimento dos
mercados com GNL, da mitigação de riscos político-institucionais e
ambientais levaram à reconsideração do projeto, que atualmente ficou
reduzido ao trecho Puerto Ordaz a Recife, conforme pode ser visualizado no
Mapa 2-VI seguinte.
MAPA 2-VI
Se todos forem implementados, aumentariam consideravelmente o
grau de integração gasífera sul-americana, conforme indica o Mapa 2-VII
seguinte, onde consta também o recém-inaugurado Gasoduto Transguajiro,
que leva gás do oriente colombiano para o ocidente da Venezuela, enquanto
esta não desenvolve e produz o gás de suas bacias na região. Quando isso
acontecer, a previsão é de inversão do fluxo no gasoduto Transguajiro.
12
MAPA 2-VII
As dificuldades político-financeiras para viabilização desses projetos,
aliadas à falta de investimentos na E&P boliviana para o incremento da
produção de gás natural, controvérsias político-institucionais na Venezuela
associadas à certificação das suas reservas e à falta de garantia de
suprimento, disputas históricas envolvendo Chile, Peru e Bolívia, questões
ambientais, insegurança jurídica, marcos regulatórios instáveis, além de
outras causas menores, levaram os países deficitários do cone sul a
recorrerem a soluções próprias e individualizadas, via importação e
regaseificação de gás natural liquefeito (GNL) de procedência mais provável
de fora da região.
Entretanto, deve ser ressaltado que essa medida talvez contribua para
a integração sul-americana, na medida em que induza governos que têm
controlado a inflação por seus sintomas, administrando preços públicos, a
prática de preços realistas nos mercados domésticos, alinhados ao preço
internacional do gás natural. Isto poderá atrair o interesse de fornecedores de
gás de outros países sul-americanos a investir em projetos que hoje não são
13
atraentes em virtude dos preços aos consumidores excessivamente baixos. O
Mapa 2-VIII ilustra os projetos em andamento, sendo que o do Peru é de
exportação de GNL para os mercados do México e dos EUA, assim como o
de Trinidad y Tobago cujo valor mostrado indica o volume de GNL exportado
em 2006.
MAPA 2-VIII
PROJETOS DE GNL NA AMÉRICA DO SUL
2.3 – Integração Através da Energia Elétrica
Além de questões políticas, institucionais e econômicas, existem
barreiras de ordem técnica e física à maior integração regional da América do
Sul, através da interligação dos sistemas elétricos nacionais: ´
14
▪ cinco dos dez países sul-americanos6 geram, transmitem e
distribuem eletricidade na freqüência de 50 Hz (ou ciclos por segundo);
▪ seis dos dez países (mais o Suriname e a Guiana) têm fronteiras
sobre os Andes ou sobre a Floresta Amazônica, estando separados de seus
vizinhos por obstáculos geográficos e/ou vazios demográficos de larga
extensão territorial.
Coincidentemente, nos cinco países meridionais (membros do
MERCOSUL+Chile) o intercâmbio (importações ou exportações) de energia
com o mercado brasileiro depende de conversão de freqüência. Em
compensação, com os quatro do MERCOSUL não há barreiras geográficas, a
não ser travessias de grandes rios. Já o Chile, tradicional importador de
eletricidade, é separado dos demais pelos Andes.
Outros quatro países sul-americanos: Peru, Equador, Colômbia e
Venezuela têm seus sistemas em 60 Hz, como o Brasil. Porém, os mercados
brasileiros estão separados das fontes de geração dos vizinhos setentrionais
pelo extensos vazios demográficos da Amazônia.
O único intercâmbio
significativo de eletricidade existente no norte do Brasil é com a Venezuela.
▪ No âmbito do MERCOSUL
Apesar dos importantes empreendimentos binacionais existentes tanto
no setor elétrico ─ as hidrelétricas de Salto Grande (Uruguai-Argentina), de
Itaipu (Brasil-Paraguai) e de Yaciretá (Argentina-Paraguai) ─, o aparato legal
e regulatório existente no âmbito do MERCOSUL reconhecidamente não é
adequado para incentivar o aproveitamento dos potenciais desta sub-região.
Torna-se imprescindível, por exemplo, equacionar e incorporar à
legislação atual dispositivos efetivos para a solução de controvérsias, para
enfrentar situações de crise, bem como para homogeneizar dos marcos
regulatórios, entre outros aspectos.
Desde o início do MERCOSUL, os temas relacionados à mineração e
energia foram alocados a dois subgrupos de trabalho, dos vários que tratam
de assuntos setoriais. Em 2001, os dois subgrupos foram fundidos e
novamente separados, em junho de 2005. O SGT Nº 9 ficou dedicado apenas
6
Neste trabalho foram excetuados Guiana e Suriname.
15
a Energia e para abordar questões de mineração foi criado o Subgrupo de
Trabalho nº 15.
Foram delineadas seis pautas de negociações, em 2001, dentre as
quais importa aqui destacar a que pretendia facilitar iniciativas de integração
energética na sub-região de conformidade com as orientações emanadas da
Reunião de Presidentes da América do Sul (Brasília, agosto de 2000) e com
a nova ênfase dada ao tema no contexto do MERCOSUL. Presumiu-se que o
SGT Nº 9 poderia atuar como facilitador de empreendimentos de integração
energética, através da identificação de oportunidades e atentando para o fato
de que as interligações elétricas ─ bem como as gasíferas ─ requerem
acordos operativos para serem viabilizadas. Já se observava, então, que a
ocorrência de falhas previstas ou imprevistas num Estado-Parte, afetando o
abastecimento ou a demanda de outro Estado-Parte devia contar com canais
efetivos de informação que permitissem mitigar os efeitos não desejados.
Os elementos básicos das diretrizes de políticas energéticas
concertados para o MERCOSUL são os seguintes7:

Otimização da produção e do uso das fontes de energia da região;

Observar
a
viabilidade
econômico-financeira
dos
projetos
energéticos da região;

Favorecer a integração entre os mercados energéticos dos Estados
Partes, com liberdade de compra e venda entre as empresas de energia e
livre trânsito dos energéticos, respeitando as legislações vigentes em cada
país;

A política de preços da energia é parte integrante da política
econômica dos países, e, como tal, deve ser respeitada;
● O preço da energia (ex-imposto) deve refletir, em princípio, seu
custo. A possibilidade de adoção de preços favorecidos para certos
segmentos de consumidores do setor produtivo, deve ser analisada em
conjunto;
● Tratamento tributário equivalente (impostos, taxas e gravames
internos) para a energia destinada a setores produtivos, buscando a
harmonização das políticas fiscais aplicadas;
7
Diretrizes de Políticas Energéticas no MERCOSUL, MERCOSUL/GMC/RES. 57/93
16

Promoção do uso racional da energia e sua conservação;
 Admissão,
no
marco
do
livre
intercâmbio
energético,
da
possibilidade de acordos energéticos binacionais ou multinacionais, dentro ou
fora da região;
 Promoção da produção e uso das energias renováveis em bases
econômica e ambientalmente sustentáveis;
 A harmonização da legislação ambiental e o estabelecimento de
estruturas organizadas que permitam resultados equivalentes na mitigação
de impactos sobre o meio ambiente resultantes da produção, transporte,
armazenamento e uso dos energéticos, incorporando os custos ambientais
aos custos da energia;
 Coordenação na gestão de propostas de financiamentos a
organismos internacionais com o objetivo de realizar estudos de viabilidade
econômico-financeira de empreendimentos energéticos comuns;
 Ajuste de critérios para permitir o acesso das empresas energéticas
ao mercado de capitais dos países membros;
 Elaboração de estudos de planejamento energético integrado
regional, em concordância com os planejamentos macroeconômicos
nacionais;
 Adoção no campo legal, patrimonial, técnico e gerencial de medidas
que aumentem a qualidade e a produtividade das empresas e seu
desempenho colegiado, o que pressupõe a existência de coordenação, no
sentido de ampliar os benefícios recíprocos resultantes da integração
energética dos países do MERCOSUL;
 Ter em conta a diversidade de fatores sócio-econômicos e políticos
que intervêm na organização dos sistemas energéticos.
Embora as diretrizes para a integração energética entre os países do
MERCOSUL estejam definidas, o fato é que o processo de integração como
um todo não tem avançado no MERCOSUL no ritmo desejável.
Não obstante isto, em função da aguda crise no abastecimento de
energia elétrica no cone sul, os governos da Argentina, Bolívia e Brasil
anunciaram no início de março ambicioso programa de construção de
hidrelétricas binacionais, compreendendo cinco projetos, totalizando 12.000
17
MW e orçados em US$ 31 bilhões. Entre eles destaca-se Garabí, com 1800
MW de capacidade instalada, entre o Brasil e a Argentina, cujas negociações
se arrastam há mais de 30 anos, e de Guajará-Mirim (3.000 MW), na fronteira
com a Bolívia.
Com relação ao intercâmbio de energia elétrica na América do Sul
também existem acordos bilaterais entre os países da região, impulsionados
pelos organismos regionais como a IIRSA, a CIER, a ARPEL, a OLADE e a
ALADI.
Entretanto, a pouca ênfase programática dada pelos órgãos de direção
do MERCOSUL nos temas da integração energética se refletem na rarefeita
produção do SGT Nº 9.
▪ No âmbito da Comunidad Andina
A CAN tem promovido um enfoque multilateral dos projetos de
interconexão elétrica binacionais com o propósito de criar condições para o
desenvolvimento do mercado regional.
Com este foco, o acontecimento mais representativo foi a
aprovação pelos países andinos, em 19 de dezembro de 2002, da
DECISION 536:
Marco General para la interconexión subregional de
sistemas eléctricos e intercambio intracomunitario de electricidad, que
estabelece as regras para a interligação sub-regional de sistemas elétricos e
o intercâmbio de eletricidade entre os países que a subscreveram
inicialmente: Colômbia, Equador e Peru, seguidos posteriormente por Bolívia
e Venezuela.
A CAN considera que a integração efetiva dos mercados
energéticos sub-regionais, especialmente em matéria de energia elétrica e
gás natural, poderia ampliar a escala e melhorar a eficiência do negócio
energético
andino,
além
de
abrir
oportunidades
de
integração
e
desenvolvimento para o restante da América do Sul.
A Decisão 536 contempla:
● a existência de mercados nacionais com possibilidade de livre
acesso externo;
18
●preços sem subsídios e sem discriminações, com separação
daqueles associados ao transporte e aos contratos de compra e venda de
energia elétrica;
● a promoção do investimento privado.
● para a resolução de controvérsias, a Decisão 536 propõe,
ainda, o sistema arbitral previsto no Tratado de Creacion del Tribunal de
Justicia de La Comunidad Andina.
Visando à continuidade desse processo foi criado o Comité Andino de
Organismos Normativos y Organismos Reguladores de Servicios de
Electricidad (CANREL) para harmonizar as regulamentações nacionais. Na
estrutura
do
CANREL
existem
dois
grupos
de
trabalho
que
são
independentes da secretaria da CAN: o Grupo de Trabajo de los Organismos
Reguladores (GTOR) e o Grupo de Trabajo de Planificación (GOPLAN). O
primeiro, criado em 2003, realiza um trabalho permanente na identificação de
problemas de harmonização de normas técnicas e jurídicas entre os países,
sugere soluções para as diferenças e apresenta cronogramas para alcançar a
homogeneidade dos procedimentos de coordenação da operação e
administração dos mercados de eletricidade da CAN. O GOPLAN, foi
instalado em janeiro de 2004 e encarregado de elaborar propostas, realizar
ações de coordenação entre as entidades energéticas e elétricas e fazer
acordos para que sejam cumpridos os princípios de acesso à informação e
planejamento coordenado dos projetos de integração regional.
Adicionalmente, em junho de 2003, foi tomada a Decision 557: Creación
del Consejo de Ministros de Energía, Electricidad, Hidrocarburos y Minas de
la Comunidad Andina, atribuindo ao Conselho de Ministros a tarefa de
acelerar institucionalmente as ações necessárias ao processo de integração.
Durante a I Reunião deste Conselho, em janeiro de 2004, em Quito,
fixaram-se as bases da Alianza Energética Andina (AEA), que se baseia nos
cinco eixos temáticos discriminados a seguir:
1. Construcción de mercados integrados de energía (electricidad y
gas), a través de redes físicas y marcos regulatorios armonizados;
2. Inserción en los mercados internacionales de hidrocarburos, en un
contexto estratégico de seguridad energética;
19
3. Promoción del desarrollo empresarial en los países andinos, en
“clusters energéticos”;
4. Marco de negociación y clasificación de los servicios de energía en
la OMC y otras instancias internacionales;
5. Desarrollo de la temática de las energías renovables y su
vinculación con la temática ambiental y con el Plan Integrado de Desarrollo
Social (PIDS).
3 - Conclusão
A integração sul-americana através dos sistemas elétricos encontra-se
em fase ainda preliminar. Os empreendimentos já existentes foram
implantados no contexto de interesses binacionais, sem a preocupação mais
recente da constituição de um bloco econômico-político regional.
A visualização das interligações elétricas existentes entre os países
membros, conforme se pode observar no Mapa 2-IX seguinte, deixa clara a
influência das barreiras geográficas e das áreas do território sul-americano de
população rarefeita.
A interiorização do desenvolvimento na direção da Amazônia e do
centro-oeste brasileiro, sobretudo agro-industrial, certamente aponta na
direção do crescimento demográfico e das cargas elétricas daquelas regiões.
O mesmo pode ser dito em relação à região da Media Luna boliviana. Porém,
são processos que demandam tempo para consolidar o surgimento de
mercados expressivos. A Colômbia é o país que tem as propostas mais
ambiciosas de tornar-se supridor de energia elétrica em escala regional, seja
fornecendo eletricidade ao Equador, ao Peru e à América Central, seja
operando linhas de transmissão que conectam sistemas elétricos de outros
países.
Para
tanto
conta
com
pujante
empresa
que
já
atua
internacionalmente, a ISA-Interconexión Eléctrica S.A.
A ELETROBRAS - Centrais Elétricas Basileiras S/A obteve, no
primeiro trimestre de 2008, autorização legislativa para intensificar sua
atuação internacional, aproveitando o acervo técnico e a experiência
acumulada há cerca de 45 anos de operação como holding de empresas
elétricas brasileiras, viabilizando projetos com forte impacto integrador como
a usina de Itaipu e as interligações elétricas com Argentina, Uruguai e
Venezuela.
20
Mapa 2-IX
21
Não são poucas as entidades multilaterais que têm como objetivo a
integração energética sul-americana:
● Associação Latino-Americana de Integração (ALADI)
● Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional SulAmericana (IIRSA);
● Organização Latino-Americana de Energia (OLADE);
● Comissão de Integração Energética Regional (CIER);
●
Comité
Andino
de
Organismos
Normativos
e
Organismos
Reguladores de Serviços de Electricidade (CANREL)
● Assistência Recíproca Petroleira Estatal Latino-Americana (ARPEL);
● Comissão Econômica para América Latina e Caribe ( CEPAL);
● Comunidade Andina de Nações (CAN);
● Mercado Comum do Sul (MERCOSUL)
Deve-se agregar a estas as instituições financeiras que têm dentre
suas políticas operacionais priorizados projetos de integração energética,
notadamente:
● Corporação Andina de Fomento (CAF),
● Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID);
● Banco Mundial (The World Bank) e
● Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A despeito de não faltarem instituições financeiras para bancar os
novos projetos de integração energética sul-americana nos setores de
eletricidade e gás natural, há ainda sérios obstáculos para torná-los
realidade. Em primeiro lugar, a heterogeneidade dos marcos legais e
regulatórios, que é percebido como um risco adicional pelos investidores
privados. A OLADE tem vários estudos acerca deste tema.
Um atalho para acelerar o ritmo da integração energética regional
seria, talvez, a concertação de regras a serem consolidadas num Tratado de
Energia da América do Sul, no âmbito da ALADI, semelhante ao existente na
União Européia (UE) — assinado em 1994, e em vigor a partir de 1998 —
intitulado The Energy Charter Treaty And Related Documents, que regula as
relações entre os mercados energéticos nacionais de cada país, com vistas a
facilitar os intercâmbios de energia dentro da UE.
22
Entre os países norte-americanos que integram o NAFTA-North
American Free Trade Agreement existe acordo similar ao da EU, expresso
no Capítulo 6 NAFTA Chapter Six - Energy and Basic Petrochemicals
Além disso, há problemas na concessão de créditos, seja no caso
daquelas instituições que só financiam a aquisição de bens de capital e
serviços de engenharia fornecidos pelo país-sede — como é o caso do
BNDES brasileiro — seja em função de limites para a tomada de
empréstimos e financiamentos com garantia soberana de certos países que
já têm elevado grau de exposição.
Este último aspecto está atenuado no presente momento, na medida
em que os países do subcontinente, sem exceção, “desendividaram-se”, isto
é, reduziram as respectivas dívidas externas e aumentaram a capacidade de
tomar recursos frescos.
23
ANEXO I
A moldura política que estabelece os marcos para o processo de
integração energética dos países sul-americanos é composta :
▪ pela Declaração da I Reunião de Ministros de Minas e Energia da
Comunidade Sul-Americana de Nações (Caracas, 26 de setembro de 2005),
▪pela Declaração sobre Integração na Área de Infra-Estrutura da I
Reunião de Chefes de Estado da Comunidade Sul-Americana de Nações
(Brasília, em 29 e 30 de setembro de 2005) e que culminou na assinatura:
▪ do Acordo-Quadro sobre Complementação Energética Regional entre
os Estados-Partes do Mercosul e Estados Associados, ocorrida durante a
Cúpula do Mercosul (Montevidéu, no dia 9 de dezembro de 2005).
Todos os países sul-americanos foram convidados a se incorporarem
ao processo de negociação. Posteriormente, os focos da integração
energética regional foram reforçados:
▪ pela Declaração Presidencial sobre Integração Energética SulAmericana (Cochabamba, de 09 de dezembro de 2006) e
▪ pela Declaración de Margarita, subscrita pelos chefes de Estado e
de Governo de todos os países do subcontinente (Margarita, de 17 de abril de
2007), denominada Construindo a Integração Energética do Sul.
Neste documento cabe destacar a criação do Conselho Energético da
América do Sul (CEAS), integrado pelos ministros de Minas e Energia de
cada país para que, dentro dos princípios estabelecidos nesta Declaração,
apresentem uma proposta para compatibilizar a Estratégia Energética SulAmericana, o Plano de Ação e o Tratado Energético da América do Sul.
24
ANEXO II
GASODUTOS DE INTEGRAÇÃO ENERGÉTICA NA
AMÉRICA DO SUL
● O gasoduto Bolívia - Brasil (GASBOL)
O avanço das negociações se deveu ao posicionamento ousado da
PETROBRAS, assegurando a demanda de um mercado ainda por
desenvolver para uma oferta de gás a ser descoberta em volume de reservas
suficiente. Ao comprar o gás boliviano no regime take or pay por 20 anos, a
PETROBRAS viabilizou os financiamentos para a construção do gasoduto,
pois havia receita garantida por 20 anos para securitizar o empreendimento.
Além disso, a PETROBRAS realizou uma compra adicional de gás e
assumiu o custo da ampliação do gasoduto, dos 16 MMMCPD (milhões de m3
por dia) originais para até 30 MMMCPD. Outro ponto crítico, de caráter
institucional, foi a disposição vigente na Constituição brasileira que reserva às
empresas estaduais o monopólio da distribuição do gás, sem considerar que
as mesmas não tinham condições de arcar com compromissos de longo
prazo do tipo take or pay. Isto foi contornado na medida em que a
PETROBRAS se subrogou nesta condição de comprador firme e irretratável
do gás boliviano, adequando-se os contratos a tal circunstância.
Fatores contrários à execução do projeto do GASBOL foram a
concorrência exercida pela Argentina — que tentou, a todo custo, fechar
acordos para vender ao Brasil gás natural produzido em seus campos do
norte do país — e às insistentes ofertas da Shell, então proprietária das
reservas de gás de Camisea, que tentava vincular o mercado brasileiro
àquele projeto para viabilizá-lo.
A opção do governo brasileiro e da
PETROBRAS pelo gás de Tarija e Santa Cruz, apesar dos contratempos
recentes (2006/07), revelou-se acertada no longo prazo.
● O gasoduto Argentina - Brasil
A partir de julho de 2000, a Argentina passou a vender gás ao Brasil,
através do gasoduto que interliga sua rede doméstica TGN, a partir de Aldea
Brasilera (centro-leste argentino), à cidade de Uruguaiana. O gasoduto
abastece a termelétrica de Uruguaiana e poderia ser estendido até Porto
25
Alegre, caso as expectativas argentinas quanto às suas reservas de gás
natural se confirmassem. No momento atual com a crise de abastecimento de
gás natural na Argentina, e as favoráveis condições hidrológicas no sul do
Brasil, essa termelétrica está parada .
● O gasoduto Bolívia – Argentina
No final dos anos 60, a Argentina comprava cerca de 2 MMMCPD de
gás da Bolívia, através de contrato de suprimento por 20 anos. Para tal, fora
construído o gasoduto Yacimientos-Bolivian Gulf (YABOG), de 440 km de
extensão e vazão máxima de 6 milhões de pés cúbicos por dia.
Em meados dos anos 80, o preço do petróleo caiu e os custos
decorrentes do contrato de compra do gás boliviano tornaram-se caros e
inconvenientes para a Argentina, cuja produção de gás aumentara
substancialmente. No início da década de 90, o preço do gás boliviano
fornecido através do YABOG era praticamente o dobro do cobrado em novos
fornecimentos de gás argentino. O preço do contrato com a Bolívia foi
renegociado e, na ocasião, a Argentina adiantou que não renovaria o
contrato, tendo em vista a significativa ampliação de suas reservas, que lhe
permitiria passar à condição de país também exportador de gás.
A Bolívia ficaria em dificuldades, caso não houvesse a iniciativa do
GASBOL com o Brasil. De fato, a Argentina tornou-se exportadora de gás
natural para o Chile, para o Uruguai e para o mercado meridional do Brasil.
Menos de 10 anos depois, porém, com a explosão do consumo doméstico e a
estagnação
dos investimentos exploratórios no
país,
os
argentinos
constataram que as reservas provadas não são suficientes para suprir a
demanda projetada no prazo de 20-30 anos. Isto os levou a intensificar a
importação de gás natural da Bolívia através do YABOG, em 2004, e a
negociar um novo contrato para aquisição de até 27,7 MMMCPD de gás
boliviano através de um novo Gasoduto del Nordeste de la Argentina (GNEA)
a ser construído ao custo estimado de US$ 1,5 bilhões.
A situação do suprimento ao mercado doméstico argentino tornou-se
crítica ao ponto de obrigar as autoridades energéticas do país a impor cortes
freqüentes nos fornecimentos ao Chile e ao Uruguai, bem como a restringir o
fornecimento de gás veicular (GNC).
26
● Os gasodutos Argentina - Chile
A Argentina iniciou as exportações de gás natural para o Chile em
1996, permanecendo este, até hoje, como o maior mercado externo para o
gás argentino. Sete gasodutos interligam os dois países: três deles ao sul,
conectando a bacia produtora austral argentina à Punta Arenas no Chile. São
denominados: Tierra del Fuego, também conhecido por Methanex-PA (entrou
em operação em 1996); El Condor- Posesión, ou Methanex-YPF (entrou em
operação em 1999) e Patagónico, ou Methanex-SIP (entrada em serviço
também em 1999), que suprem plantas de produção de metanol no sul do
Chile. Além desses : o Gas Andes liga La Mora, na província de Mendoza, a
San Bernardo, nos arredores de Santiago. Inaugurado em 1997, abastece a
capital chilena e uma termelétrica de 379 MW em Nueva Renca, Chile; o
Gasoducto del Pacífico se estende dos campos produtores da província
argentina de Neuquén à região de Bio-Bio, ao sul da zona central do Chile.
Sua operação comercial teve início em novembro de 1999. Fornece gás a
diversas indústrias e consumidores comerciais e residenciais de Concepción,
a segunda maior cidade chilena; em 1999, foi concluída a interconexão da
rede gasífera argentina em Corneja, província de Salta, com a cidade de
Mejillones, na costa norte do Chile, através do gasoduto Gas de Atacama.
Supre usinas termelétricas e consumidores industriais no norte do Chile, a
partir de jazimentos do noroeste argentino; e, finalmente, o gasoduto Nor
Andino que acompanha o traçado do Gas de Atacama, ligando a bacia de
Salta a Mejillones (Chile). Desde novembro de 1999, fornece gás natural na
desértica região de Atacama a grandes consumidores industriais, incluindo a
maior refinaria mundial de cobre, bem como a termelétrica de Tocopilla.
●Os gasodutos Argentina - Uruguai
A Argentina exporta gás para o Uruguai pelo chamado Gasoducto Del
Litoral, que iniciou sua operação em 1998, ligando Colón, na província
argentina de Entre Rios, a Payssandú no Uruguai.
Existe ainda o gasoduto Cruz del Sur, que a partir de 2002, abastece o
mercado uruguaio com gás natural da bacia de Neuquén , passando por
27
Buenos Aires e chegando a Colonia e Montevideo do outro lado do Rio da
Prata. Esta conexão é parte de um projeto de maior envergadura que
interligaria a Argentina ao sul do Brasil, através do Uruguai, e que não se
materializou.
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
BIBLIOGRAFIA e WEBBLIOBRAFIA
Sanchez, Fernando Albavera; CEPAL: III Congreso de Integración
Energética, Buenos Aires, octubre 2006.
Pacheco, Carlos de Miranda; CME Bolívia: Biregional WEC Forum
North America & Latin America and the Caribean, Rio de Janeiro,
March 2006.
REISE - Rede Externa de Inteligência sobre Energia, Rio de Janeiro,
IUPERJ-EPPG, Caps. 4 - América do Sul de: maio-junho 2007; abrilmaio 2006; janeiro 2006; junho-julho 2005; abril-maio 2005; novembro
2004; e outubro 2004.
Mercados Energéticos & OLADE preparado para CAF; Informe Final:
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Ruiz-Caro, Ariela; Cooperación e Integración Energética en America
Latina Y el Caribe, CEPAL, abril del 2006.
BID; Integración Energética en el Mercosur Ampliado,
Washington,D.C.,2001
OLADE, Analisis de Legislación sobre Biocombustibles en America
Latina, 2007.
The EnergySays, diversas edições;
- www.mme.gov.br
- www.mercosur.int/msweb/
- www.ypfb.gov.bo
- www.pdvsa.com
www.petrobras.com.br
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