A Organização Actual da Actividade dos Cruzeiros Turísticos e o
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A Organização Actual da Actividade dos Cruzeiros Turísticos e o
A Organização Actual da Actividade dos Cruzeiros Turísticos e o Panorama dos Portos Portugueses João Figueira de Sousa• Instituto de Dinâmica do Espaço Universidade Nova de Lisboa - FCSH Av. de Berna nº 26 C - 1069-061, Lisboa Tel. / Fax.: 217942044 Introdução Os primeiros cruzeiros turísticos surgiram, em parte, como forma de rentabilizar os navios das linhas regulares que tinham ficado sem ocupação com o desenvolvimento do transporte aéreo. A partir dos anos 80, e sobretudo na década de 90, a indústria dos cruzeiros registou uma fulgurante expansão, primeiro nos Estados Unidos da América e depois na Europa. Em Portugal, os portos de Lisboa e do Funchal destacam-se dos restantes portos nacionais pelo movimento de navios e de passageiros. Os elevados níveis dos tráfegos e a sua importância para os portos e as cidades têm justificado, por parte das administrações portuárias e de outras entidades ligadas à cidade e ao turismo, a implementação de estratégias de promoção e marketing, como forma de atrair mais linhas, mais navios e mais passageiros. A presente comunicação encontra-se estruturada em duas partes essenciais: na primeira analisam-se os principais aspectos que caracterizam a evolução e a organização actual da actividade dos cruzeiros turísticos e procede-se a uma reflexão sobre os seus impactos territoriais, sociais e económicos; na segunda apresenta-se a realidade dos cruzeiros turísticos nos principais portos nacionais procedendo-se a uma análise crítica das condicionantes e potencialidades que se deparam ao seu desenvolvimento. A expansão da indústria dos cruzeiros A expansão dos cruzeiros nas últimas duas décadas tem sido marcada pelo aumento da capacidade da frota, pela reorganização das empresas, pela expansão das áreas geográficas de actividade dos cruzeiros e pelo crescimento acentuado da procura e o incremento da capacidade da frota através do aumento do número e da dimensão dos navios. O aumento da capacidade das frotas Nas últimas décadas, a frota dos cruzeiros tem aumentado significativamente em número de unidades e em capacidade. Ao elevado número de navios em construção, junta-se ainda um número mais reduzido de navios desarmados e de navios antigos restaurados ou reconstruídos, que potenciam a capacidade das companhias. Por outro lado, apesar de se verificar alguma diversificação ao nível das características dos navios, um dos fenómenos que caracteriza a renovação da frota é o “gigantismo” dos navios. Este aumento da dimensão coloca problemas a alguns portos de menor dimensão, obrigando-os à adaptação das suas infraestruturas sob pena de serem excluídos dos circuitos dos cruzeiros. A reorganização das companhias As grandes companhias alargam a sua influência em termos territoriais ou em nichos de mercado, através de processos de fusões e aquisições. • Geógrafo. Mestre em Transportes. Assistente do Departamento de Geografia e Planeamento Regional da UNL e vice-presidente do Instituto de Dinâmica do Espaço. Simultaneamente, assiste-se ao aparecimento e afirmação de novas empresas, de menores dimensões, que operam em nichos de mercados, regionais, locais ou temáticos. Um outro elemento recente, principalmente no Reino Unido, é o surgimento dos Tours operators que se posicionam no mercado, fretando navios antigos, reduzindo os custos e as margens de lucro e oferecendo cruzeiros a baixo preço, um pouco à semelhança do que se passa com os charters aéreos. A expansão das áreas geográficas O incremento da actividade traduziu-se no reforço da sua expressão territorial, através do incremento das linhas, da densificação da rede de fluxos a nível geográfico, do emergir de novas regiões e da diversificação dos portos e cidades de origem, destino ou de escala dos cruzeiros. O desenvolvimento de novas regiões de cruzeiro - favorecido pela saturação das regiões tradicionais, pelo aumento do número de navios em operação, pela forte dinâmica de reposicionamento dos navios e pelo aumento da concorrência entre operadores - constituiu uma oportunidade para algumas cidades e regiões. A diversificação e a especialização da oferta Apesar da importância dos clássicos cruzeiros de lazer ligados ao sol e à "vida a bordo", que dominam a oferta especialmente nas Caraíbas e no Pacífico, assiste-se à especialização da oferta com produtos cada vez mais específicos. A diversificação dos circuitos e dos portos de origem e destino, a diminuição da duração dos cruzeiros, a descida dos preços e o incremento dos cruzeiros temáticos são alguns dos principais elementos para a diversificação global da actividade. O crescimento da procura O crescimento acentuado dos turistas de cruzeiro deriva de factores intrínsecos à procura e de outros induzidos pelas alterações introduzidas pelas próprias companhias nos seus produtos. Assim, paralelamente à melhoria do nível de vida das famílias e ao aumento dos tempos dedicados às férias e ao lazer, o crescimento e a diversificação da oferta veio favorecer a procura potencial. Assistiu-se, deste modo, a uma democratização dos cruzeiros, no sentido em que a redução da duração e do custo determina um maior distanciamento da acepção da actividade como produto de luxo. O incremento das linhas e o aumento da dimensão dos navios têm contribuído para uma maior mistura de nacionalidades, diversificação cultural e diferenciação etária dos passageiros: os passageiros são cada vez mais novos e mais activos, verificando-se um crescimento do número de repetentes, com interesses cada vez mais específicos. Desenvolvimento da actividade dos cruzeiros turísticos nos portos portugueses Os portos de Lisboa e do Funchal, que apresentam uma tendência crescente no número de passageiros movimentados em navios de cruzeiro, destacam-se, indiscutivelmente, dos restantes portos, com, respectivamente, 189.349 e 172.152 passageiros movimentados no ano 2000. Os restantes portos apresentam também uma tendência positiva na evolução do número de passageiros movimentados, embora partindo de uma base muito baixa e pouco significativa quando comparada com os valores registados no Funchal e em Lisboa. Em 2000 o porto de Ponta Delgada movimentou 36.083 passageiros, Portimão 10.417 e o Douro/Leixões 14.511. Figura 1. Evolução do movimento de passageiros em navios de cruzeiro nos portos portugueses (1993-2000) 200000 180000 160000 Nº de Pas s ageiros 140000 120000 Ponta Delgada 100000 Lis boa 80000 Portimão 60000 Func hal 40000 Douro/Leix ões 20000 0 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 A nos Figura 2. Evolução do movimento de passageiros em navios de cruzeiro no porto de Lisboa (1992-2000) 250 200000 200 150000 150 100000 100 50000 50 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 0 1992 0 Es c alas Pas s ageiros O porto de Lisboa registou um movimento de cerca de 189 mil passageiros em 2000, verificando-se um grande crescimento em relação aos anos anteriores, o que, comparado com o aumento menos significativo verificado no movimento de navios, parece traduzir o aumento da dimensão e da capacidade das embarcações que escalaram o porto. Figura 3. Evolução do número de passageiros embarcados, desembarcados e em trânsito no porto de Lisboa Nº de Pas s ageiros 200000 150000 100000 em trâns ito 50000 des embarc ados embarc ados 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 0 A nos Como se pode verificar na figura 3, predominam os passageiros em trânsito, apesar do crescimento e afirmação do número de passageiros embarcados e desembarcados, determinado pela assunção, por parte do porto de Lisboa, do papel de porto base para algumas linhas de cruzeiro. Figura 4. Evolução do movimento total de passageiros nos terminais do porto de Lisboa (1994-2000) 160000 Nº de Pas s ageiros 140000 120000 Roc ha do Conde de Óbidos 100000 A lc ântara 80000 60000 Santa A polónia 40000 Jardim do Tabac o 20000 0 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 A nos A análise do movimento de passageiros nos terminais do porto de Lisboa sublinha a importância crescente do terminal de Rocha Conde de Óbidos, em resposta às condições oferecidas por esta gare (melhor preparada para as operações de check in dos passageiros) e com um cais de maior profundidade, que possibilita a sua utilização por navios de maiores dimensões. Apesar do volume inferior de passageiros do terminal de Santa Apolónia, este regista, também, uma tendência crescente, assegurada pela sua localização central no contexto da cidade, sendo preferido pelas companhias de navegação e pelos passageiros. Possui, contudo, algumas limitações em relação ao calado aos navios, em função do seu nível dos fundos marítimos. O porto de Lisboa alternou, ao longo da última década, com o Funchal a posição de principal porto nacional na recepção de navios de cruzeiros. A importância da actividade dos cruzeiros turísticos nos arquipélagos da Madeira e dos Açores, medida através do número de passageiros movimentados, é muito dispare, o que pode ser explicado por factores de ordem histórica e geográfica. A localização geográfica da Madeira tornou-a num ponto tradicional de escala das linhas de passageiros que atravessavam o oceano, ao mesmo tempo que a importância da colónia inglesa na ilha incentivava as férias dos ingleses na ilha. Actualmente, a posição geográfica da Madeira - próxima do Mediterrâneo, Norte de África e Canárias e no cruzamento das rotas de ligação entre os continentes Europeu e Americano – assegura a expansão dos cruzeiros turísticos no arquipélago. Figura 5. Movimento total de passageiros de navios de cruzeiro nos portos dos Arquipélagos da Madeira e dos Açores no ano de 2000 N ARQUIPÉLAGO DA MADEIRA Porto Santo Funchal Nº de passageiros 172.152 125.624 34.108 N 26.082 ARQUIPÉLAGO DOS AÇORES Corvo Flores Praia da Vitória Velas Horta Madalena Angra do Heroísmo S. Roque Calheta Santa Maria A evolução do movimento de passageiros, a partir de 1990, reflecte a vitalidade da actividade dos cruzeiros no porto do Funchal, apesar de uma quebra com algum significado, em 1997, no número de navios e passageiros. De facto, no ano seguinte, verifica-se uma retoma do crescimento do volume de passageiros, até 2000, ano em que se registam 172.152 passageiros e 224 escalas. De uma forma geral, a evolução do número de passageiros acompanha a evolução dos navios, com algumas excepções relacionadas com a capacidade dos navios recebidos. Assim, em 1996, apesar da redução de 17 navios, registaram-se mais 6421 passageiros em relação ao ano anterior. Figura 6. Evolução do movimento de passageiros em navios de cruzeiro no porto do Funchal (1990-2000) A importância dos passageiros em trânsito (98%) comparativamente ao reduzido número de passageiros embarcados e desembarcados reflecte a ausência de linhas que iniciem ou acabem naquele porto, que assim, funciona apenas como porto de escala. Sublinhe-se que os portos base são aqueles que de uma forma geral, geram um maior impacto económico na cidade e na região em que se inserem, em que os turistas passam mais tempo em terra, dinamizando uma série de actividades económicas de apoio aos passageiros mas também aos navios e tripulantes. Nos portos de escala, os passageiros passam apenas algumas horas em terra, o suficiente para fazerem algumas excursões e algumas compras, resultando num impacto mais reduzido. Figura 7. Passageiros embarcados, desembarcados e em trânsito no porto do Funchal, em 2000 As estratégias de desenvolvimento dos cruzeiros em Lisboa e na Região Autónoma da Madeira Para além das excelentes condições do porto e do estuário do Tejo, a actividade dos cruzeiros em Lisboa beneficia ainda da importância e capacidade de afirmação da capital. Nos últimos anos a Administração do Porto de Lisboa (APL) tem dedicado alguma atenção à promoção da actividade dos cruzeiros turísticos, através do envolvimento e da representação em associações nacionais e internacionais. Contudo, verifica-se a ausência de uma estratégia devidamente assumida e concertada no seio da política portuária, subsistindo algumas indefinições. Como se referiu, a postura da APL visa a obtenção de alguma visibilidade no exterior, apostando internamente no desenvolvimento das infra-estruturas através da recuperação das antigas gares de passageiros de Alcântara e Rocha Conde de Óbidos e da disponibilização de novas gares, através da adaptação de antigos armazéns portuários (caso da gare de Santa Apolónia). A promoção do porto de Lisboa envolve uma parceria público-privado através de um protocolo assinado entre a APL, a Associação de Turismo de Lisboa, o Instituto do Comércio Externo Português e a Associação Portuguesa dos Agentes Navegação. Entre os principais objectivos do protocolo destacam-se: - Estimular a colaboração entre os sectores público e privado (desenvolvimento de programas promocionais) - Estimular a intervenção conjunta de empresas com interesses paralelos ou complementares - Estimular o investimento em acções promocionais assim como a concepção, participação e identificação com marcas turísticas específicas. O arquipélago da Madeira é, tradicionalmente, uma região de actividade dos cruzeiros turísticos. A Administração dos Portos do Arquipélago da Madeira (APRAM) possui um grande conhecimento na organização dos cruzeiros, desenvolvendo um trabalho constante junto dos principais armadores e operadores e marcando uma forte presença internacional. As principais limitações verificam-se em termos das infraestruturas portuárias, nomeadamente no que se refere à inexistência de uma gare de passageiros, ao ordenamento dos espaços portuários e ao acesso ao centro da cidade. De acordo com a APRAM estas limitações serão resolvidas aquando da transferência do movimento de mercadorias para o porto do Caniçal, libertando o porto do Funchal para o tráfego de cruzeiros e outras actividades compatíveis, nomeadamente as actividades marítimo-turísticas e a náutica de recreio. Por outro lado, verifica-se a existência de uma politica de promoção dos cruzeiros turísticos, que envolve a administração portuária, o governo regional os agentes privados e outros portos desta região do Atlântico. Entre as principais acções com vista à dinamização dos cruzeiros turísticos no arquipélago, destaca-se a promoção conjunta com os portos de Canárias, do Norte de África e do Mediterrâneo, através da criação de uma zona de cruzeiros - Cruises in the Atlantic Islands -, a participação institucional nas grandes feiras de cruzeiros, e a implementação de uma política tarifária atractiva para os navios de cruzeiro. Alguns factores contribuem para o crescimento da actividade dos cruzeiros na região, destacando-se a acessibilidade ao mercado europeu, a proximidade de uma série de portos de cruzeiro (mediterrânicos e atlânticos) e a melhoria da acessibilidade, com a entrada em funcionamento do novo aeroporto internacional do Funchal. Este viabiliza a perspectiva de desenvolvimento dos fly-cruises, cruzeiros que associados a uma viagem de avião e envolvendo uma curta estadia em terra à partida ou à chegada. Considerações finais Os cruzeiros turísticos são uma actividade em grande expansão em termos mundiais, visível através dos níveis de crescimento registados na oferta e na procura. O aumento da actividade está associado à reorganização da oferta, nomeadamente ao nível das empresas, dos navios e dos circuitos de cruzeiro, ao mesmo tempo que são notórias importantes repercussões espaciais resultantes da expansão dos circuitos, da diversificação dos portos de origens, destino ou escala e do alargamento da actividade a regiões que até há pouco tempos estavam à margem dos circuitos dos cruzeiros turísticos. Em Portugal, os portos de Lisboa e do Funchal registam os maiores movimentos de passageiros e navios de cruzeiro, possuindo uma posição de destaque mesmo a nível internacional. O crescimento da actividade nestes dois portos representa a inserção definitiva de Portugal na organização dos cruzeiros. Nos últimos anos tem sido desenvolvido um esforço de promoção, envolvendo parcerias entre as administrações portuárias e agentes privados, acompanhado de beneficiação das infraestruturas existentes. Apesar do trabalho desenvolvido até aqui será necessário desenvolver um grande esforço na melhoria da oferta portuária (terminais adequados para a movimentação de grandes volumes de passageiros, cais adequados às características dos novos navios, melhoria das acessibilidades ao centros das cidades, etc..), já que as companhias e os passageiros são cada vez mais exigentes nos padrões de qualidade. Bibliografia Escourou, P (1982) "Le Tourisme de croisière" Cahier Nantais, nº21. Institut de Géographie et d’Aménagement Régional, Université de Nantes, Nantes, Junho. (Actes du Colloque d’Oceanologie realizado em Nantes em 1981). CABRAL, Natércia (2000) “O Desenvolvimento dos Cruzeiros Turísticos e as Gares de Passageiros em Lisboa”. Transportes Aquáticos e Interfaces TerraÁgua na AML, coordenação e edição de João Figueira de Sousa, Lisboa, 2000. Figueira de Sousa, João (2000): El Archipélago de Madeira en la Ruta de los Cruceros Marítimos. Texto da apresentação efectuada na IV Jornadas de Estudios Portuarios e Marítimos. Asociación de Estudios Portuarios e Marítimos, Las Plamas de Gran Canaria, Março. ISEMAR, 2000: Les croisières: défis portuaires et enjeux touristiques, Synthèse n°27, Nantes, Septembre.
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