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Colégios eclesiásticos de Roma
Uma ponte entre
Oriente e Ocidente
Fundado em 1584 por Gregório XIII para
promover as relações entre a Santa Sé e a Igreja
Maronita, hoje o Pontifício Colégio Maronita
propõe-se como lugar de diálogo entre diversas
culturas e religiões
por Pina Baglioni
No alto, o afresco no átrio do Colégio
Maronita que representa a Coroação
á um belo vaivém no número 18 da via de Porta Pinciana, sede do Pontifício
Colégio Maronita, em Roma: são
peregrinos carregados de bandei-
H
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ras, provenientes do Líbano e das
eparquias maronitas do Oriente
Médio. Mas oriundos também da
diáspora presente nos quatro cantos do mundo – sobretudo nos Esta-
de Nossa Senhora, inspirado na figura
do santuário de Qannoubine;
aqui, acima, a entrada do colégio,
na via de Porta Pinciana
dos Unidos e no Canadá –, que representa dois terços dos três milhões e meio dos herdeiros de São
Maron. No domingo de manhã,
por volta das 10h30, é fácil encontrar os maronitas residentes na Cidade Eterna encaminhando-se, seguidos por pencas de crianças, para a igreja de São Maron, contígua
ao Colégio, na via Aurora – rua que
passa pelo lado leste do edifício –,
onde é celebrada a missa em rito sírio-antioqueno, frequentada também por muitas famílias muçulmanas. Depois da missa, ficam conversando em volta do único banco
de praça do lado de fora da igreja,
ou no jardim interno, enquanto outros preferem frequentar os cursos
de língua árabe organizados para
as crianças nascidas na Itália.
Tudo isso acontece ao redor do
elegante edifício do bairro Ludovisi, encaixado entre grandes hotéis
superluxuosos, bancos e lojas para
turistas ricos.
O Colégio Maronita, do qual os
sacerdotes estudantes ali residentes, todas as manhãs, voam como
um enxame para as Pontifícias
Universidades, representa o elo
entre a Santa Sé e a Igreja Maronita, antiquíssima Igreja sui iuris de
rito sírio-antioqueno, a única entre
todas as Igrejas cristãs do Oriente
Médio a ostentar desde sempre
A missa dominical em rito sírio-antioqueno na igreja de São Maron,
contígua ao colégio
plena comunhão com o sucessor
de Pedro. Suas origens são estabelecidas pela tradição histórica entre os séculos IV e V, quando, após
a morte do anacoreta sírio Maron,
seus seguidores começaram a edificar mosteiros ao lado de seu túmulo, em Apameia, na Síria, às
margens do rio Oronte.
Mas na via de Porta Pinciana
não se encontra apenas o Pontifício Colégio Maronita para sacerdotes estudantes; essa é também
a sede da pastoral que se dedica
aos frequentadores da igreja contígua de São Maron e da Procura-
doria do Patriarcado Maronita de
Antioquia junto à Santa Sé. Instituições que, nos últimos meses,
viram-se no centro de um turbilhão de acontecimentos: em
2010, as celebrações dos mil e
seiscentos anos da morte de São
Maron; depois, a chegada a Roma das relíquias dos grandes santos maronitas do século XIX: São
Charbel Makhlouf, Santa Rafka
Rayes e São Nimatullah Al-Hardini, cuja devoção vem-se difundindo amplamente; enfim, em 23 de
fevereiro passado, a instalação da
imagem de São Maron num ni- ¬
História do Pontifício Colégio Maronita
Forja de patriarcas, de orientalistas e de futuros santos
a sala de ingresso da Cúria Generalícia dos Jesuítas, em Roma, é possível admirar um mapa antigo
em que aparecem os primeiros cinco colégios nacionais, edificados, ao longo do século XVI, todos nas proximidades do Colégio Romano (a Universidade Gregoriana, na época). Assim, os seminaristas poderiam chegar rapidamente às aulas: eram o inglês, o alemão-húngaro, o armênio, o grego e o maronita. Este último, diferentemente de todos os outros, era o colégio de uma
Igreja sui iuris difundida sobretudo no Líbano e na Síria,
com ritos e liturgia derivados da tradição sírio-antioquena. E que ostentava plena comunhão com Roma, apesar da extrema dificuldade de comunicação entre a Santa Sé e o Oriente Médio.
O contato entre a Santa Sé e a Igreja Maronita fora
consolidado durante as Cruzadas, durante as quais os
N
exércitos cristãos receberam grande ajuda dos maronitas. E uma das consequências do reatamento de relações foi a viagem a Roma do patriarca Jeremias de
Amshit, para o Concílio Lateranense IV, em 1215. Nos
séculos seguintes, os pontífices enviaram missionários
e visitadores apostólicos ao Líbano para verificar as
eventuais problemáticas doutrinais entre os fiéis de São
Maron. A Igreja Maronita era na época uma Igreja de
fronteira, fechada entre as montanhas do Líbano e isolada não apenas de Roma, mas também do resto do
mundo, pela necessidade de proteger-se da pressão
dos Otomanos.
Um dos resultados mais brilhantes das embaixadas
pontifícias no Líbano entre 1578 e 1580 foi justamente a
fundação do Colégio Maronita em Roma, em 1584, por
iniciativa do papa Gregório XIII, que o instituiu com a ¬
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Colégios eclesiásticos de Roma
Acima, Bento XVI com o presidente libanês Michel Suleiman e o cardeal
Nasrallah Pierre Sfeir, por ocasião da inauguração da imagem de São Maron
instalada num nicho externo da Basílica de São Pedro, em 23 de fevereiro
de 2011; à direita, a imagem de São Maron no dia da inauguração
cho externo da Basílica de São Pedro, na presença de Bento XVI. Isso sem contar que entre 28 de fevereiro e 15 de março deu-se também
o pedido de demissão de sua beatitude, o cardeal Nasrallah Pierre
Sfeir, depois de vinte e cinco anos à
frente do Patriarcado, e a eleição
de seu sucessor, Béchara Boutros
Raï, bispo de Jbeil, Byblos dos Maronitas, septuagésimo sétimo patriarca maronita de Antioquia. Logo após sua eleição, o novo patriarca esteve em Roma duas vezes em
poucos dias: em 14 de abril, para a
audiência particular com o Papa, e
em 1º de maio, para a beatificação
de João Paulo II.
O Colégio Maronita: um gomo de cristianismo médiooriental na Cidade Eterna
“Vivemos um período com uma
riqueza de acontecimentos como não
nos lembrávamos de ter tido há tempos. Estamos todos um pouco confusos, mas muito, muito contentes.”
Monsenhor Antoine Gebran é procurador do Patriarcado há dois anos, e
há alguns meses reitor do Colégio e
capelão dos migrantes adeptos da
Igreja sírio-antioquena maronita residentes na diocese de Roma. Com
pouco mais de quarenta anos, provém, como a maior parte dos sacerdotes libaneses, do vale de Qadisha,
no norte do país, também chamado
Vale Santo, pela miríade de mosteiros encastrados sob os cimos dos
montes. Foi lá, entre os séculos VIII e
IX, que encontraram refúgio os seguidores de São Maron que fugiram da
Síria em consequência das constantes perseguições por parte de bizantinos, monofisistas e muçulmanos.
cas, esses jovens assimilaram com extrema facilidade o
bula Humana sic ferunt. O objetivo era formar em Roma
latim, o italiano, o francês e o espanhol. Tanto que se diaspirantes sacerdotes que, de volta a seu país, podefundiu, logo, o ditado “culto como um maronita”. Conriam imprimir uma virada decisiva no âmbito das relacluídos os estudos, muitos eram chamados às cortes
ções entre o papa e o patriarca maronita de Antioquia.
dos soberanos europeus como tradutores e embaixadoEste, por sua vez, deveria promover as relações com tores. Aqueles que voltavam ao Líbano,
das as outras Igrejas orientais.
por sua vez, abriam escolas em todo o
A primeira sede romana, cuja direção
país. Assim, os maronitas que tinham esfoi entregue aos jesuítas, foi uma casa
tudado em Roma difundiram por toda a
junto à igreja de São João de Ficozza, a
Europa as línguas, a história, as instituipoucos metros da atual Universidade
ções e as religiões do Oriente Médio.
Gregoriana e de Fontana de Trevi. Numa
Ainda graças a eles foram impressos os
rua que, depois, assumiria o nome de “via
primeiros livros litúrgicos em siríaco. O
dos Maronitas”. Aos quatro primeiros esprimeiro, em Roma, em 1585.
tudantes, já em Roma, se juntaram, em
Em 1662, o patriarca Youhanna Mah31 de janeiro de 1584, outros seis provelouf pediu ao Papa que afastasse os jenientes de Alepo, na Síria.
suítas da direção do Colégio Maronita,
Começaram a chegar a Roma jovens
em razão da má gestão financeira e da
de oito ou nove anos para frequentar os
dispersão das vocações. Daquele moestudos primários, depois os cursos de
mento em diante, o Colégio só teria reitoFilosofia e Teologia. Tendo já aprendido
res maronitas.
na pátria a gramática das línguas semíti- O patriarca Estêvão El Douaihy
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O jovem monsenhor, antes de
assumir o triplo encargo, foi ecônomo do Colégio e trabalhou durante
sete anos no Pontifício Instituto para a Família: “Aqui”, explica, “recebemos sacerdotes enviados pelos
bispos de todas as eparquias maronitas. Mas também aqueles que
pertencem a todas as outras Igrejas
cristãs do Oriente Médio, tanto as
que estão em comunhão com Roma quanto as que não estão. O
mesmo acontece no Líbano, onde
os maronitas sempre conviveram
com os armênios apostólicos e os
armênios católicos, os greco-ortodoxos e os melquitas, os sírio-ortodoxos e os sírio-católicos, os assírios, os coptas, os caldeus e os católicos de rito latino. Além dos xiitas, dos sunitas, dos drusos, dos judeus e dos protestantes”.
Os sacerdotes chegam a Roma
já tendo terminado o primeiro ciclo
de estudos de Filosofia e Teologia
nos mais de noventa seminários
diocesanos e interdiocesanos espalhados pelo Líbano. “Graças a
Deus temos ainda muitas vocações, até mesmo adultas. Tanto assim, que foi necessário instituir no
Líbano casas de formação especializadas nas vocações maduras”,
acrescenta monsenhor Gebran.
“Aqui no Colégio hospedamos sacerdotes de 26 a 40 anos. São doze
libaneses, dos quais dez maronitas
e dois greco-católicos. Os outros
nos foram indicados pela Congregação para as Igrejas Orientais, que
lhes concede bolsas de estudo para
se sustentarem em Roma. Atualmente hospedamos um ortodoxo
do Patriarcado de Jerusalém, um
assírio e três sírio-católicos do Iraque e quatro coreanos de rito latino. Temos também dois leigos, um
francês e um italiano. Nos anos anteriores recebíamos também muitos caldeus. Dizemos que os consideramos ausentes justificados...”
Os momentos em comum são a
missa da terça-feira celebrada na
igreja de São Maron – oficiada em
língua italiana, mas de acordo com
o rito do celebrante da vez – e, diariamente, o café da manhã às
7h30, o almoço à 13 e o jantar às
19. Enquanto o grupo de maronitas, nos outros dias, se reúne para
as vésperas e a missa das 18h45
numa capela interna do segundo
andar do Colégio, todos os outros
se organizam por conta própria.
“Na realidade, alguns vêm assistir
também à nossa missa, com a liturgia escrita em siríaco, variante do
aramaico, e pronunciada em árabe.” Como muitos de seus colegas
dos outros colégios de Roma, os sacerdotes do Maronita também são
solicitados pelas paróquias para
ajudar nos fins de semana, no Natal
e na Páscoa. “Já temos relacionamentos estabelecidos com algumas
paróquias de Roma, de Milão, de
Entre os personagens que deram prestígio ao Pontifício Colégio Maronita de Roma destaca-se o patriarca
Stefano El Douaihy, hoje encaminhado para a beatificação. No final do século XVII, ele redigiu os Anais, a primeira história das origens da Igreja Maronita. Apoiou,
ainda, o renascimento das grandes ordens religiosas
maronitas, reinserindo nelas as regras monásticas, niveladas aos ordenamentos vigentes no mundo latino,
segundo o ensinamento de Santo Antão, o protótipo da
vida monástica. A ação de El Douaihy foi determinante
também para a reaproximação entre comunidades cristãs orientais ortodoxas e a Santa Sé. Entre outras coisas, o primeiro patriarca da Igreja sírio-católica, Inácio
Miguel III Jarweh, foi aluno do Colégio Maronita.
Um outro gigante do colégio foi José Simão Assemani, que, com outros membros de sua família, toda
uma dinastia de orientalistas, fez a fortuna da Biblioteca Apostólica Vaticana. José Simão ali entrou em 1710
como escritor. Enviado em 1715 por Clemente XI para o
Oriente em busca de manuscritos, viajou à Síria e ao
Egito, onde conseguiu adquirir quase inteiramente a bi-
Parma e de Como, para onde nossos sacerdotes vão também durante as férias de verão”, explica padre
Joseph Sfeir, o ecônomo do Colégio Maronita.
Charbel Ghoussoub é sacerdote há nove anos e vem da arquieparquia de Antélias, pouco distante de Beirute. Está para obter o
mestrado em Ciências da Formação na Universidade Salesiana.
“Vou voltar para o Líbano, pois o
meu bispo me chamou de volta; lá,
já fui pároco por cinco anos. Provavelmente voltarei a Roma para
o doutorado”, conta-nos. “Em Roma respiramos o ar da universa- ¬
São Maron
no mosaico da igreja
contígua ao colégio
e a ele dedicada
blioteca do mosteiro copta de São Macário e parte da
do mosteiro dos sírios, na Nitria; levou ainda à Europa
os primeiros fragmentos coptas do mosteiro Branco.
Em 1717, todos esses manuscritos – conservados hoje
na Biblioteca Vaticana – foram por ele levados a Roma,
onde se dedicou ao estudo dos siríacos, publicando depois seus resultados na Bibliotheca Orientalis Clementino-Vaticana. Primeiro guardião da Biblioteca Vaticana, em 1739, deu início, em colaboração com o sobrinho, Estêvão Evódio Assemani, à preparação de um
catálogo geral dos manuscritos vaticanos, do qual saíram apenas os três primeiros volumes, dedicados aos
códigos hebraicos e siríacos. José Simão Assemani foi
protagonista, como legado pontifício, do Sínodo do
Monte Líbano, de 1736, cuja presidência assumiu. Foi
ainda ele o redator de uma “Carta Constitucional” da ¬
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Acima, um altar da igreja do colégio com alguns relicários; à esquerda,
uma pintura representando Charbel Makhlouf, Rafka Rayes e Nimatullah Al-Hardini,
os três grandes santos maronitas do século XIX, conservada na igreja do colégio
lidade da Igreja, muitos ritos, muita riqueza. Só aqui entendemos o
quanto a Igreja é grande. E levamos essa consciência para o Líbano, onde o espaço físico e mental
em que atuamos normalmente é
seminário e paróquia, paróquia e
seminário, dentro de uma problemática toda libanesa. É importante estudar em Roma também para
dar a entender aos outros o que é a
Igreja Maronita. Vários colegas,
na Universidade, me perguntaram
se meus pais ainda eram muçulmanos e quando foi que eu me
converti ao cristianismo...” Temos
ainda Autoun Charbel, doutorando em Direito Canônico, já mestre
em Teologia e com experiência
missionária na Nigéria, onde trabalhou por anos numa paróquia
pessoal. Perguntamos a ele se en-
tre os sacerdotes maronitas mais
jovens há esperança de que o Líbano ultrapasse o sistema do “comunitarismo” religioso, julgado
por muitos historiadores libaneses
como o maior obstáculo ao pleno
desenvolvimento e à plena democracia do País dos Cedros. “Por
ora é só um ideal um tanto distante, complicado de alcançar: vivemos ainda o tempo das comunidades religiosas, porque, por ora,
não temos outro sistema além desse. Basta pensar que não existe
uma só história do Líbano, mas
tantas histórias quanto são as comunidades religiosas, ou seja, dezessete. Mas neste momento estamos muito otimistas com a nomeação do novo patriarca: ele certamente será capaz ao menos de pacificar os ânimos em nosso país”.
“Seria bom que o Colégio Maronita pudesse, de maneira cada
vez mais evidente, fazer sua parte
num momento tão delicado para o
Oriente Médio: ou seja, recuperar
o papel de intercâmbio cultural,
religioso e político que teve a partir do século XVI”, diz ainda o reitor, monsenhor Gebran. “Este
ano festejamos também os onze
anos da reabertura do Colégio,
ocorrida em 2001, depois da longa interrupção iniciada com a Segunda Guerra Mundial. Nos longos, terríveis anos da guerra civil
no Líbano, os nossos sacerdotes
continuaram a vir a Roma, alojando-se aqui e ali, sobretudo em Propaganda Fide e no Colégio Capranica. Graças ao trabalho intenso e
inteligente de meu antecessor,
monsenhor Hanna Alwan, o Co-
Elias Boutros Hoyek, que se tornou patriarca em 1899.
Igreja Maronita. O documento, fortemente impregnado
Para reativar a casa de formação sacerdotal de Roma,
de normas latinizantes e no início um tanto contestado,
ele pediu ajuda aos franceses, ao sultão turco e ao impepor ter sido julgado danoso para a antiga disciplina antirador da Áustria, Francisco José. Este último negou-lhe
oquena, foi ao final aprovado: a Igreja Maronita viveria
somas em dinheiro, mas em troca concedeu aos semidessa legislação até a promulgação do Código de Dinaristas maronitas a hospitalidade na Villa dʼEste, em Tíreito Canônico Oriental, em 1991.
voli, perto de Roma, para as férias de verão. Depois de
A vida do Colégio Maronita se interrompeu em 1º de marter obtido a permissão de Roma, o bispo
ço de 1798, quando as tropas francesas que
maronita abriu outro colégio em Paris. Foi,
haviam ocupado Roma requisitaram o edifíentre outras coisas, também o fundador
cio, obrigando os estudantes a refugiaremda congregação das Irmãs da Sagrada
se na Congregação de Propaganda Fide.
Família, e conseguiu criar uma eparquia
Em 1891, papa Leão XIII, com a bula
no Egito. Morreu em 1931 em odor de
Olim sapienter, decidiu reabrir o colégio,
santidade e atualmente está em andadoando aos maronitas metade da soma
mento a causa de sua beatificação.
necessária para a aquisição de um edifíInfelizmente, por falta de estudantes,
cio na via de Porta Pinciana. Alguns anos
em 1906 o colégio voltou a fechar as pordepois, em 3 de julho de 1895, foi adquiritas. E só foi reabri-las em 1920. A tranquido um terreno entre a via de Porta Pincialidade durou até 1939, quando, em vista
na e a via Aurora, para ali construir o colédo início iminente do segundo conflito
gio definitivo e a igreja de São Maron. O
mundial, ocorreu mais um fechamento.
protagonista da reabertura foi o bispo José Simão Assemani
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légio, logo depois do Jubileu de
2000, pôde finalmente retomar
seu caminho”. Transparece, nas
palavras de monsenhor Gebran,
também um pouco de lamento pelos muitos tesouros perdidos ao
longo dos anos: “Centenas de livros preciosíssimos já não estão
aqui. Muitos tomaram o caminho
da biblioteca do Pontifício Instituto Oriental. Para mim foi um golpe no coração, quando eu estudava para o doutorado em Ciências
Eclesiásticas Orientais no Instituto, ver em minhas mãos um livro
com o carimbo do Pontifício Colégio Maronita. Mas por muito tempo tivemos reitores jesuítas...”.
Na arcada da entrada do edifício, um afresco de cores muito vivas representa a Coroação de Nossa Senhora, aos pés da qual está
disposta uma inscrição em siríaco
em louvor à Virgem. “A Coroação
não corresponde à nossa iconografia tradicional”, explica-nos padre
Joseph Sfeir. “Essa imagem se inspira na do santuário de Qannoubine, no vale de Qadisha, sede dos
patriarcas do século XV ao XIX,
um dos santuários mais venerados
do Líbano e o mais antigo do Vale
Santo”. Bem debaixo do afresco
foi posta, sobre um balcão, uma
pequena reprodução da imagem
de São Maron instalada em 23 de
fevereiro passado num nicho externo da Basílica de São Pedro. “O
Bento XVI e o novo patriarca de Antioquia dos Maronitas, sua beatitude Béchara
Boutros Raï, com a delegação de bispos e fiéis que o acompanharam a Roma depois
da concessão da ecclesiastica communio (dada em 24 de março de 2011),
Sala Clementina do Palácio Apostólico Vaticano, em 14 de abril de 2011
justo florescerá, crescerá como o
cedro do Líbano”, reza, em aramaico, o salmo inscrito na estola do pai
da Igreja Maronita. Seguindo na direção de um amplo salão, vemos,
ao fundo, o trono do patriarca, onde evidentemente Sua Beatitude
sentou-se por ocasião de suas visitas à Cidade Eterna.
Nas paredes desfilam os retratos dos patriarcas e dos personagens mais significativos da história
maronita, todos ex-alunos do Colégio: o servo de Deus sua beatitu-
de Estêvão El Douaihy, pai da historiografia maronita e promotor e
patrocinador das grandes ordens
religiosas, já encaminhado para a
beatificação; José Simão Assemani, que viveu entre os séculos XVII
e XVIII, o mais prestigioso representante da dinastia de orientalistas Assemani que formaram o tesouro da Biblioteca Apostólica Vaticana, com os milhares de volumes da patrística oriental levados
a Roma; e ainda Nasrallah Pierre
Sfeir, líder da Igreja Maronita ¬
O procurador, monsenhor Elias Boutros Hoyek, futuro patriarca
de Antioquia dos Maronitas, no centro na foto na primeira fila,
e o reitor do Colégio, padre Gabriel Moubarak,
o terceiro a partir da direita na primeira fila,
com alguns estudantes do colégio, numa foto de 1893
Apesar dos problemas do colégio, a Procuradoria do
Patriarcado de Antioquia continuou ativa; o procurador
continuou a morar na primeira casa adquirida na via de
Porta Pinciana, em 1891.
De 1939 a 1980, o edifício foi alugado e foi transformado em hotel. Voltou definitivamente à atividade em
15 de setembro de 2001, logo depois do Jubileu, graças principalmente ao bispo Emilio Eid, procurador geral do Patriarcado dos Maronitas de 1958 a 2003. Que
devido a sua perseveraça e grande força de caráter,
fez com que o glorioso Colégio Maronita retomasse a
sua atividade. Nos dez anos que seguiram, foi ele
quem cuidou da restauração do Colégio, conseguindo
superar não poucas dificuldades burocráticas e legais.
É considerado um dos personagens mais significativos
da Igreja Maronita do século XX graças tanto à sua capacidade de manter sempre viva e fecunda as relações
entre a Igreja Maronita a Santa Sé; quanto pela sua ¬
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Colégios eclesiásticos de Roma
Acima, monsenhor
Antoine Gebran, atual
reitor do colégio;
à esquerda, o salão
do colégio, com o trono
do patriarca
durante vinte e cinco anos – alguns dos anos politicamente mais
dramáticos para o País dos Cedros
–, e Béchara Boutros Raï, o novo
patriarca. “Um grande pastor, que
já demonstrou com ações concretas que quer pacificar os ânimos
no país”, diz o reitor. “Ele, por
exemplo, logo depois da eleição,
fez questão de reunir todos os representantes das forças políticas
libanesas. Inclusive o Hezbollah,
um partido composto de libaneses
como nós, que, certamente, não
vieram de fora para nos ocupar,
mas foram capazes de defender o
território na última guerra com Israel, em 2006.”
A propósito do papel de ligação
entre Igreja de Roma e Igreja Maronita, perguntamos se o Colégio favoreceu, paradoxalmente, a latinização do antigo rito sírio-antioqueno, considerando que nos século
XVII e XVIII foram enviadas ordens
religiosas ocidentais para controlar
a doutrina e a liturgia dos discípulos
de São Maron. “É claro que, sendo
a única Igreja do Oriente Médio
sempre em comunhão com Roma,
tivemos logo uma certa assimilação”, explica o reitor; “isso ocorreu,
porém, mais no plano externo, como, por exemplo, nos paramentos
litúrgicos, que no plano da substância. Adotamos a casula e a planeta.
Mas preservamos a nossa liturgia sírio-antioquena”. Padre Joseph
Sfeir tem uma opinião ligeiramente
diferente: “Não devemos crucificar
ninguém, pelo amor de Deus, mas
os legados papais revisaram um por
um os nossos textos litúrgicos. E tudo o que, na opinião deles, não estava bastante em linha com a liturgia latina foi queimado, destruído”.
Voltando ao presente, pedimos
ao reitor, enfim, um juízo sobre
uma questão que muitos maronitas consideram o problema dos
problemas: a emigração dos maronitas do Líbano em consequência da instabilidade política e da
explosão demográfica dos muçulmanos. “Negar que isso esteja
acontecendo seria tolo”, responde. “Mas devemos dizer também
que muitos maronitas estão voltando. E que também muitos muçulmanos estão indo embora. Mas
o destino da Igreja Maronita está
nas mãos de Nosso Senhor: ele
nos conservou por mil e seiscentos anos. Se ainda nos quiser lá, ficaremos. O que mais posso dizer?
Seja feita a Sua vontade.”
q
to patriarcal. Enfim, é postulador para a beatificação do
patriarca Elias Boutros Hoyek. Com o apoio da Congregação para as Igrejas Orientais, monsenhor Alwan fez
voltarem ao colégio de via de Porta Pinciana todos os estudantes maronitas espalhados por outros estabelecimentos eclesiásticos, hospedando também os sacerdotes pertencentes
às outras Igrejas
orientais.
P. B.
Papa Pio X com o patriarca Elias Boutros Hoyek,
o quinto a partir da esquerda, em 23 de julho de 1905
Papa Pio XI recebe
em audiência
enorme cultura teológica. Além de monsenhor Eid, a restauração do colégio, foi também obra de monsenhor
Hanna Alwan, reitor por dez anos. Alwan é juiz do Tribunal da Rota Romana, docente in utroque iure nas Universidades Pontifícias e responsável europeu da Congregação dos Missionários Libaneses, uma ordem de direi-
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o patriarca sírio
de Antioquia Inácio
Gabriel I Tappouni,
sentado à direita
do Pontífice, em 15
de agosto de 1929
Panorâmica dos tetos e das cúpulas de Roma vistos do terraço do convento
de Santo Antão, na Colina Ópio; à direita, a fachada do convento na praça de
San Pietro in Vincoli
O arquipélago maronita
Resenha das casas religiosas maronitas em Roma. Algumas hospedam
seminaristas, outras, sacerdotes estudantes, e há, ainda, quem tenha
transformado seu convento em santuário dedicado aos grandes santos
maronitas
por Pina Baglioni
lém do Colégio Pontifício,
Roma hospeda um conjunto de procuradorias e colégios sacerdotais das ordens maronitas mais significativas.
A Ordem Libanesa Maronita
ocupa um pequeno convento pouco distante da Pirâmide de Céstio,
ao lado da paróquia dedicada a
Santa Marcela, uma nobre romana
que, por uma curiosa analogia
com os monges maronitas, seguiu,
no século IV, a regra de Santo Antão com seus amigos.
Na Colina Ópio, diante da Basílica de São Pedro in Vincoli, a
dois passos do Coliseu, fica o
convento de Santo Antão, a sede
A
dos Maronitas Mariamitas da
Bem-Aventurada Virgem Maria.
Estão lá deste 1753, depois de
ter deixado a casa e a igreja dos
Santos Marcelino e Pedro, na via
Labicana. E, ainda, entre a via
Portuense e o bairro do Trullo, está o colégio sacerdotal da Ordem
Antoniana Maronita, de Santo
Isaías. Por último, os padres da
Ordem Missionária Libanesa Maronita que estudam e trabalham
em Roma se hospedam em vários
institutos eclesiásticos. Por ser de
direito patriarcal e não pontifício,
como as outras, a Ordem Missionária não tem uma casa generalícia em Roma.
No final do século XVII, a Ordem
Libanesa Maronita e a Maronita da
Bem-Aventurada Virgem Maria
constituíam uma única realidade, a
Ordem Alepina Libanesa, fundada
em 10 de novembro de 1695 por
três jovens sírios de Alepo, Gabriel
Hawwa, Abdallah Qara’li e Joseph
El-Betn, que estabeleceram sua morada no mosteiro de Nossa Senhora
de Qannoubine, no vale de Qadisha, norte do Líbano.
Em Roma, a Ordem Alepina, já
em 1707, obteve de Clemente XI a
igreja dos Santos Marcelino e Pedro, na via Labicana, também graças ao bom êxito de uma missão
confiada pelo Papa a Gabriel ¬
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Acima, a capela do convento de Santo Antão, sede da Ordem Maronita Mariamita da Bem-Aventurada Maria Virgem;
à direita, um retrato de Santa Teresinha do Menino Jesus no salão de entrada
Hawwa, que reconduziu à obediência a Roma um bispo copta.
Enquanto isso, no Líbano, houve
tamanha afluência de jovens provenientes de Damasco, Jerusalém,
Sídon e de muitas cidades do Egito, que se fez necessária a mudança para o mosteiro mais amplo de
Saint Elysées, em Becharre, e a
fundação de outros mosteiros mesmo fora do País dos Cedros.
Quem se dedicou de modo decisivo à redação das regras, que tomavam vagamente por base as de
Santo Antão mas eram demasiadamente niveladas às das ordens
latinas, foi o patriarca Estêvão El
Douaihy, grande promotor da ordem. Essas regras seriam definitivamente aprovadas em 31 de março de 1732, por Clemente XII.
Profundamente ligados à vida
camponesa, esses monges compartilhavam a dureza dessa existência. Fora do Líbano, esses mon-
ges sempre receberam do patriarca a responsabilidade pela diáspora libanesa no Egito, na Europa e
no Novo Mundo. A Igreja maronita, toda concentrada entre as montanhas do Líbano, deve a eles o
inabalável apego do povo ao cristianismo, à terra e ao papado. E
sobretudo a instrução dos camponeses e dos mais pobres: as escolas
dos vilarejos geralmente surgiam
em torno dos conventos e das igrejas paroquiais.
Com o passar do tempo, porém, apareceram dentro da ordem
sérios conflitos que determinaram
o nascimento de duas correntes:
uma afirmava que o cargo de superior geral deveria ser vitalício e que
a ordem tinha de assumir caráter
missionário; a outra defendia que o
cargo tivesse duração limitada e
que a ordem mantivesse integralmente a vida contemplativa.
As divergências não foram sanadas. Tanto que, em 19 de julho
de 1770, levaram ao nascimento
de dois ramos distintos: a Ordem
Antoniana Alepina dos Maronitas,
de caráter missionário, e a Ordem
Libanesa Maronita, de vocação
contemplativa. Cada uma com
seus membros, seus conventos e
suas posses. Em 1969, a Alepina
tomou o nome de Ordem Maronita Mariamita da Bem-Aventurada
Maria Virgem.
Em Roma, a divisão da ordem
levou os alepinos a ficarem nos
Santos Marcelino e Pedro, para
depois mudar-se para a sede da
praça San Pietro in Vincoli; já a ordem Libanesa Maronita mudou-se
para Chipre, para assistir espiritualmente os maronitas que viviam
na ilha. A presença dos maronitas
em Chipre vinha do século XI,
quando, depois da fuga da Síria em
razão das perseguições, uma pequena parte dos maronitas se refugiara ali, enquanto a maior parte
dos fugitivos encontrou abrigo nas
montanhas do Líbano.
À esquerda, os antigos
textos conservados na rica
biblioteca do convento;
acima, o servo de Deus
padre Antonios Tarabay:
está em andamento sua
causa de beatificação
A ordem do Patriarca:
os Maronitas
da Bem-Aventurada
Maria Virgem
A dois passos do Coliseu fica o
convento de Santo Antão, sede da
A entrada do convento
da Ordem Libanesa Maronita, com a
imagem de São Charbel Makhlouf,
canonizado em 1977 por Paulo VI
Procuradoria da Ordem Maronita
Mariamita da Bem-Aventurada
Maria Virgem e do colégio de formação sacerdotal. Quando fomos
encontrá-los, encontramos os padres mariamitas num estado de
grande euforia: sua beatitude Béchara Boutros Raï, o patriarca recém-eleito, pertence a sua ordem. “A escolha, na minha opinião, vem do Espírito Santo. É ele
a pessoa certa para cada libanês,
cristão ou não, e para a Igreja
Maronita, graças à sua inteligência, ao seu carisma e à capacidade de dialogar com todos”, diz
padre François Nasr, ecônomo e
postulador da Ordem, que neste
período vem-se ocupando do
processo do servo de Deus padre
Antonios Tarabay. “Em sua vida
sacerdotal, esse religioso esteve
encarregado da orientação espiritual das Irmãs de São João Batista no Líbano. Grande devoto
do Santíssimo Sacramento, praticou a ascese e a contemplação.
Enviado, depois, ao mosteiro de
Qannoubine, no Vale Santo, viveu em perfeita e completa união
com Jesus Cristo. Contraiu em
seguida uma grave doença, que
durou vinte e sete anos; suportou
heroicamente a sua condição: ele
encarna o carisma da nossa ordem, ou seja, uma síntese perfeita entre vida missionária mergulhada na realidade de todos os
dias e vida mística feita de renúncia, oração e contemplação”.
Um caso quase mais único que
raro, o colégio ainda hospeda seminaristas que vão para Roma depois de já ter frequentado o biênio
de Filosofia no Líbano: “Até algum tempo atrás, os nossos estudantes também podiam frequentar o biênio em Roma. Acolhemos, além disso, bispos e peregrinos de todas as partes do mundo”. Em Roma, eles fazem o triênio de Teologia e depois os estudos especializados, como Teologia Espiritual, Direito Canônico,
Ciências Humanas. E Mariologia,
“também pela nossa denomina-
ção, adotada durante o Concílio
Vaticano II, graças à insistência de
padre Genadios Mourani (nosso
confrade conhecido por sua grande
espiritualidade, morto num atentado terrorista no Líbano em 1959),
que desejava mais do que qualquer
coisa pôr a nossa ordem sob a proteção de Nossa Senhora”.
No Líbano, esses estudantes serão reitores dos vários campus universitários da ordem, que hoje contam seis mil inscritos. Ou diretores
das escolas, frequentadas por sete
mil estudantes. Ou, ainda, reitores
dos seminários, ou párocos. “Nosso colégio de Roma sempre foi lugar de acolhida dos libaneses maronitas, de estudantes de outras
Igrejas cristãs. No domingo de manhã, muitos vêm assistir à missa
em nossa capela, atraídos pela antiga liturgia sírio-antioquena”.
O convento-colégio ostenta
uma biblioteca rica em textos sacros do século XIII. Entre estes,
muitos livros de literatura árabe.
No salão de entrada, padre François aponta para um retrato de
Santa Teresinha do Menino Jesus. “No Líbano, é imensa a devoção a ela: o primeiro mosteiro que
lhe foi dedicado, depois da canonização, foi um mosteiro masculino mariamita, pois o superior geral da ordem, que tinha assistido à
cerimônia no Vaticano, ficara impressionado com sua vida exemplar. Neste momento suas relíquias estão visitando a Palestina.
E Santa Teresinha, pelo que me
dizem, está fazendo grandes coisas por aqueles lados”.
A Ordem Libanesa Maronita,
forja de santos
A Ordem Libanesa Maronita,
mesmo dependendo da Santa Sé,
teve muito tarde uma Procuradoria em Roma. “Nós sempre tivemos um grande desejo de vir a Roma. Mas adiávamos sempre, porque estávamos convencidos de
que a presença dos mariamitas na
Cidade Eterna era suficiente”, explica padre Elias Al Jamhoury,
postulador das causas dos santos
da ordem e procurador-geral em
Roma. Quem “levou” a Roma esses monges foi a causa de beatificação de São Charbel Makhlouf,
canonizado por Paulo VI em 9 de
outubro de 1977. Aconteceu há
sessenta anos, quando se fez necessária a presença de um postulador que pudesse acompanhar a
causa de Charbel, nascido em
Bkaakafra, no norte do Líbano,
em 1828 e falecido em 1898. Todo o Líbano e os maronitas do
mundo inteiro são imensamente
devotos desse monge, graças à
abundância de milagres concedidos por sua intercessão.
“São Charbel é como o cedro
no Líbano: já faz parte do nosso
país. Todo maronita, por uma coisa ou outra, tem ligação com ele.
Mas seus devotos já se espalham
pelo mundo todo. É um pouco como o seu Padre Pio”, confirmam
dois jovens monges do convento.
Ambos, por coincidência, se chamam Charbel. Um é doutorando
em Arqueologia Cristã, o outro em
Ciências Bíblicas. Moram estavelmente no Colégio da Universida- ¬
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Colégios eclesiásticos de Roma
de Santo Anselmo com os outros
quatro membros da ordem presentes em Roma para os estudos
de especialização. Quando os estudos permitem, os dois Charbel
dão uma ajuda a padre Elias. Até
porque o convento recebe, há algum tempo, telefonemas, cartas e
visitas de toda a Itália para pedir
graças a São Charbel e aos outros
dois santos da ordem: Santa Rafka Rayes, uma monja canonizada
em 2001, e Nimatullah Al-Hardini, grande teólogo, feito santo em
2004. A eles, logo, poderá ser
acrescentado um quarto: o frade
Estephan Nehmé, beatificado em
27 de junho de 2010.
A capelinha adjacente ao convento situado perto da Pirâmide
de Céstio hospeda as relíquias dos
Os Antonianos
de Santo Isaías e a amizade
com o povo druso
A Ordem Antoniana Maronita de
Santo Isaías possui, entre suas antigas vocações, uma que se está revelando extremamente atual, dada
a época que vivemos: o diálogo e a
acolhida das outras religiões.
“Tudo começou com o bispo
Gebraël Blouzani, futuro patriarca
da Igreja maronita, que, em 1673,
decidiu fundar o mosteiro de Nossa Senhora em Tamiche, no norte
do Líbano, tornando-o sede de seu
episcopado”, conta padre Maged
Maroun. “Depois de ter educado
muitos jovens às regras da vida
monástica oriental, ele os enviou
para edificar o mosteiro de Santo
Isaías em Broumana, no topo de
Misericordiarum Pater, em 17 de
janeiro de 1740”.
Voltando aos dias de hoje, os jovens aspirantes ao sacerdócio fazem o noviciado no famoso mosteiro de Santo Isaías, no Líbano, considerado casa-mãe da Ordem Antoniana Maronita. A chegada a Roma
deu-se em 1906, com um primeiro
seminário no Gianicolo. Depois,
em 1958, na via Boccea. E, enfim,
em 1998, na via Affogalasino, entre os bairros Portuense e Trullo.
“Hoje são sete os sacerdotes que
estudam em Roma, especializandose em Música Sacra e Direito Canônico”, explica padre Maged. “Mas
sobretudo em Ciências Eclesiásticas
Orientais e no Diálogo IslâmicoCristão no Pontifício Instituto Oriental e no Pontifício Instituto de Estu-
À esquerda,
a entrada
do convento
dos padres da Ordem
Libanesa Maronita,
com uma urna
que contém alguns
relicários;
à direita, a pequena
capela adjacente
ao convento em
que são veneradas
as relíquias
dos santos libaneses
três santos, e tornou-se a meta de
um grande número de pessoas de
Roma e de fora que vêm para visitar esse lugar e pedir graças.
“Uma coisa impensável! Nossa intenção – obviamente se a Congregação para as Igrejas Orientais
permitir – é transformar este lugar
num verdadeiro santuário dedicado a São Charbel: o fluxo de peregrinos não para nunca”, acrescenta padre Elias. “São Charbel começou a fazer milagres no dia seguinte a sua morte. A causa, assim, se iniciou já em 1926. No
Ano Santo de 1950, foram trinta
mil milagres. Ele fazia um par espiritual com os milagres de Nossa
Senhora de Lourdes. Naquela altura, em 1951, decidimos que já
não era o caso de esperar, e finalmente viemos para Roma”.
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uma colina conhecida como
‘Aramta’. Lá, no dia da festa da Assunção de 1700, foi celebrada a
primeira missa. A região era habitada principalmente por drusos,
um povo que fugiu do Egito e seguia uma religião de derivação muçulmana, nem xiita nem sunita.
Haviam-se estabelecido nas montanhas libanesas em 1300 – cerca
de quinhentos anos depois dos maronitas – para escapar das perseguições dos sunitas. O emir Abdullah Abillamah, chefe dos drusos da
região, acolheu de tão bom grado
a chegada dos monges, que decidiu, com outros emires da região,
manter seus filhos estudando com
os monges antonianos. Muitos deles pediram o batismo. Também
por tudo isso, papa Clemente XII
aprovou a nossa ordem com a bula
dos Árabes e de Islamística. Além do
estudo, vão trabalhar nas paróquias
da região, visitar os doentes. Durante a Páscoa, por exemplo, foram
abençoar as casas dos moradores do
bairro”. De volta ao Líbano, serão
futuros educadores nas escolas e nos
três campus universitários da ordem. Ou párocos no Líbano e entre
os maronitas da diáspora. “Fiéis à
vocação das origens, deverão ser cada vez mais um canal de comunicação com todos, cristãos e não cristãos. Como indicam também os
nossos novos estatutos e a nossa história”, conclui o religioso.
Os Missionários do Patriarca
Espalhados por vários institutos
eclesiásticos de Roma, os sacerdo-
tes da Congregação dos Missionários Libaneses constituem um instituto religioso masculino de direito patriarcal. São também chamados Kreimistas, pois sua fundação
aconteceu em 22 de maio de
1884 no mosteiro de Kreim, em
Ghosta, no Monte Líbano, por
obra de Youhanna Habib, um sacerdote da eparquia de Baalbek,
com a finalidade de educar a juventude maronita e anunciar o
Evangelho também aos não crentes. Uma das características de
seus membros é jurar não ambicionar os graus eclesiásticos.
Além do Líbano, os Missionários
Libaneses são ativos nas comunidades maronitas do Brasil, da Argentina, da África do Sul, dos Estados Unidos e da Austrália.
da Síria, para fugir dos bizantinos,
primeiro, e dos muçulmanos, depois. E a escolha foi no mínimo sábia: quando chegaram ao Líbano,
os turcos pararam na costa e nas cidades do sul, pois temiam tremendamente as montanhas. Portanto,
os maronitas ficaram a salvo.”
O fundador da Congregação
dos Missionários Libaneses Maronitas, Youhanna Habib, foi, no final do século XIX, um juiz do império turco. Seus funcionários, quando perceberam que fazer os maronitas seguirem as leis islâmicas era
um tanto difícil, dispuseram um tribunal para eles e outro para os muçulmanos, de modo que as causas
não fossem acabar todas no tribunal de Istambul. Habib foi escolhido como juiz dos maronitas. Mas,
Sagrada Família, religiosas que
têm como missão principal a família, por meio da educação das
crianças e da assistência aos párocos na pastoral familiar. A Congregação da Sagrada Família é espiritualmente guiada pela Congregação dos Missionários Libaneses Maronitas.
“Uma característica dos missionários libaneses é a grande aplicação ao estudo. Um pouco como
os jesuítas”, acrescenta, com certo orgulho, monsenhor Alwan.
No final, lhe perguntamos se seus
missionários terão, no futuro, um
trabalho cada vez mais pesado,
considerando a emigração constante dos maronitas. E o que deveria fazer a Santa Sé: “O interesse
de Roma aumentou quando per-
À esquerda, uma missa na capela da comunidade da Ordem Antoniana Maronita
de Santo Isaías; acima, a comunidade, com o patriarca Sfeir; à direita, Monsenhor
Hanna Alwan, responsável europeu pela Congregação dos Missionários Libaneses
“Nós mandamos os nossos sacerdotes para estudar diretamente
nas terras de missão. Assim, ao
mesmo tempo, começam a assistir
os maronitas na diáspora. Vêm a
Roma apenas aqueles que têm de se
especializar em disciplinas que só
são estudadas aqui, como Teologia
Dogmática, Direito Canônico e os
estudos bíblicos”. Monsenhor Hanna Alwan, que já encontramos no
papel de reitor emérito do Pontifício Colégio Maronita, é também,
entre muitas outras coisas, o responsável europeu da Congregação
dos Missionários Libaneses Maronitas. Ele também vem do norte do Líbano, o berço da Igreja de São Maron. E entrou para a Congregação
aos dezesseis anos, com o irmão
gêmeo. “Os maronitas se estabeleceram ao norte, depois de ter saído
tendo caído em desgraça perante o
emir, deixou o tribunal para fazerse jesuíta. O patriarca não permitiu. Ordenou-o sacerdote, convocou outros padres e mandou-os
em missão. Eram tempos de emigração para os maronitas. Eles iam
para as Américas. E o patriarca temia fortemente que, chegando na
nova terra, perdessem a fé.
Depois Youhanna Habib foi nomeado bispo. E, morto o patriarca, o Sínodo o escolheu como sucessor. Mas ele recusou, e em seu
lugar, em 1899, foi escolhido, por
sua proposta, um amigo: Elias
Boutros Hoyek, um bispo que, em
1890, tinha ido para Roma adquirir o terreno para construir o Pontifício Colégio Maronita.
Além de tudo isso, Hoyek fundou também a Congregação da
ceberam que a onda de assalto dos
muçulmanos estava-se tornando
forte demais, tanto no Líbano como nas outras Igrejas do Oriente
Médio. Enfim, quando estudaram
os números, se deram conta. O Sínodo das Igrejas Orientais celebrado em outubro passado foi importante. Se não por outros motivos,
pelo menos porque a imprensa do
mundo inteiro falou do estado das
coisas. Estamos todos à espera da
exortação de Bento XVI. Não é
impossível que o que está acontecendo no Oriente Médio e no Norte da África traga boas consequências. Estou convicto de que esses
jovens que vimos nas praças querem liberdade e trabalho. E é justo.
E estou certo de que esse anseio
pela democracia possa favorecer
também os cristãos”.
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