Livro_Edmundo_08-06 - Sport: Laboratório de História do

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Livro_Edmundo_08-06 - Sport: Laboratório de História do
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DA CONSTRUÇÃO DE UMA NOVA MANEIRA DE ENVELHECER A UMA
PROPOSTA DE PREVENÇÃO DE QUEDAS
Prof. Dr.Edmundo de Drummond Alves Junior
Universidade Federal Fluminense
RESUMO
Estudar a velhice e o envelhecimento nos dias atuais é se debruçar sobre questões as mais
diversas, que entre outros fatores envolvem: os direitos sociais, como acesso à saúde e ao
lazer; a aposentadoria e o sistema de idades no qual estão fundamentadas as gerações dos
atuais idosos; o modo de vida, bem como as atividades assumidas no período que ronda a
aposentadoria. Neste capítulo apresentamos algumas reflexões que vêm norteando nossa
proposta de discussão do envelhecimento na sociedade brasileira e dela apresentamos
nossas reflexões acerca da prevenção de quedas. Falamos da transição demográfica que
junto a outras características torna os que envelhecem mais visíveis e ao mesmo tempo
suscetíveis a serem considerados como parte de mais um problema social. Estereótipos,
medos e preconceitos fazem com que a velhice seja considerada como uma etapa da vida
em que haveria mais lamentação do que júbilo. Neste caso nos parece serem fundamentais
as influências exercidas pela sociedade. Compreender como a velhice e o envelhecimento
foram considerados em outras épocas pode auxiliar para ao entendimento desta nova
construção social que é a do envelhecimento ativo como forma de postergar a velhice. Esta
sendo indesejada é aproximada a um mau envelhecimento em que os atores não atentaram
aos reclames da ‘feliz idade’, ‘boa idade’, ‘melhor idade’ ou mesmo da ‘terceira idade’.
São estas e outras questões que serviram à elaboração de um projeto associativo para idosos
que tem como um dos seus principais objetivos atuar com a prevenção de quedas.
Palavras chave: envelhecimento, lazer, intergeracionalidade, cultura corporal, prevenção
de quedas.
INTRODUÇÃO
Na atualidade, quando é considerado o aspecto do envelhecimento individual,
sugere-se que é necessário envelhecer tendo pelo maior tempo possível a sensação de bemestar geral, o que é bastante subjetivo. Essa meta tem feito parte das preocupações mais
atuais de um considerável número de grupos de convivência, tanto na esfera pública como
na privada. Aproveita-se a indústria do ‘antienvelhecimento’, que nem sempre aguarda os
resultados conclusivos das pesquisas que dão fundamento às suas panacéias; muitas não
passando de ilusões.
Com certa regularidade são anunciadas as pílulas que revolucionarão os anos
2000. Podemos mencionar alguns exemplos, que já estiveram em evidência, como a
melatonina, hormônio natural que teve seu descobrimento nos anos 1950 e que foi bastante
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comercializado na década de 1990 (Sciences, 1995); como o dehidro-epi-andresterona
(DHEA) e o hormônio do crescimento (GH), sendo que este último, na sua forma
sintetizada, vem sendo muitas vezes aplicado de forma indiscriminada. Mas foi a entrada
no mercado do Viagra e seus similares, que, mesmo não sendo específicos para o
aumento da longevidade, certamente acabaram influindo numa nova percepção do
envelhecimento.
Muitos estigmas do significado do ‘ser velho’ têm origem na valorização que é
dada ao trabalho e ao engajamento produtivo, que no curso da vida acabam ficando cada
vez mais presentes. Se em algumas épocas aos aposentados quase sempre era recomendado
descanso, recolhimento e inatividade, depois da metade do século XX outros valores
ganharam importância. Fenômenos como o associativismo e a participação em atividades
socialmente reconhecidas, como o voluntariado, passam a ser incorporados, resultado do
novo modelo, que acabou caracterizando o que é bom ou mau para o envelhecimento. Em
nosso entender isso está bem de acordo com o que tem sido sustentado pelos defensores de
algumas teorias psicossociais como a da atividade, que veio para se contrapor a do
desengajamento ou a da continuidade. Em outra oportunidade procuramos mostrar como se
delineou o que denominamos como a ‘A pastoral do envelhecimento ativo’ e que serviu de
suporte às discussões de uma pesquisa comparativa ente França e Brasil sobre a vida
associativa e prática da ginástica em 4 grupos de convivência de idosos e aposentados
destes dois países (ALVES JUNIOR, 2004).
A partir das elaborações teóricas da gerontologia e geriatria, que são duas ciências
aplicadas, das políticas públicas por um modo de vida para os aposentados, pode-se
perceber melhor que parte significativa dos idosos passou a ser confrontada a uma nova
maneira de envelhecer. No caso dos novos aposentados, chegam mesmo a ser vistos como
um novo poder, mesmo que paradoxalmente a sociedade contemporânea ainda seja bastante
preconceituosa com relação às coisas relacionadas ao envelhecimento, buscando de todas as
maneiras subterfúgios para esconder a velhice ou mesmo ignorá-la.
Para combater as doenças ditas da civilização, reconhecemos que após os anos
setenta do século passado vemos crescerem as recomendações visando a um modo de vida
mais saudável, tendo como suporte características mais científicas. A prática de atividades
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físicas e principalmente as ginásticas, independente da forma como era apresentada, passa a
ser relacionada como capaz de influir na saúde, autonomia, qualidade de vida e bem-estar,
surgindo como a grande novidade do nosso tempo praticá-la independente da idade
cronológica. Daí não ser tão difícil encontrarmos nos grandes centros urbanos, grupos de
idosos se reunindo com a finalidade de praticar uma atividade física. Ela passou a ser um
novo campo de intervenção de profissionais que utilizam a animação com finalidades
sociais ou de saúde, tendo forte presença dos professores de educação física e terapeutas
corporais, que propõem de forma sistemática as mais variadas atividades esportivas ou não
para grupos de idosos.
Consideramos como movimento desencadeador deste tipo de comportamento
extensivo aos idosos e aposentados, os anos sessenta, e aqui tomamos como exemplo o que
ocorria na França e em outros países que já percebiam a alteração nas suas pirâmides
etárias, e principalmente, a tendência de crescimento daqueles que eram considerados como
velhos. Resultado de conquistas sociais das últimas décadas começava a chegar à
aposentadoria um grupo significativo de idosos que acumularam determinados capitais
simbólicos que não permitia mais pensar a aposentadoria como repouso e morte social. A
proposta passou a considerar a representatividade deste grupo com muitos anos ainda a
viver e com disposição para assumir outros compromissos que já foi chamada de segunda
carreira por Gaullier (1999). Para isto ser efetivado de forma mais maciça, incorporou-se
como política de estado o incentivo a criação de grupos que visavam à preparação para a
aposentadoria. Paralelamente também surgiam as associações para idosos já aposentados.
Ambos passaram a incluir a idéia de um envelhecimento ativo e engajado em associações
nos períodos pré e pós-aposentadoria. Pode-se perceber que inicialmente havia um forte
viés para a ocupação do tempo, visando à inclusão e (re) inserção social, mas
posteriormente, com a chegada de novos aposentados com forte ‘capital cultural’,
incorporaram-se os princípios da educação permanente nas propostas associativas em que
‘animadores’(MELO, ALVES JUNIOR, 2003) sobre as mais variadas denominações,
passaram cada vez mais a atuar.
Acrescentando-se o fato de que esses novos aposentados passaram a ter uma maior
esperança de vida, lhes restando uma considerável expectativa de viver a vida com saúde,
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passou a ser viável viver a aposentadoria de forma totalmente diferente. O que se passou a
dizer é que “o indivíduo não deveria mais aceitar passivamente seu envelhecimento, mas
prolongar a vida, pelas atividades físicas, intelectuais e voluntárias, o maior tempo
possível” (BOURDELAIS, 1993: 373). Lenoir (1979) falou da invenção social da terceira
idade. Com o decorrer da euforia midiática alcançada por este novo modo vida, chegou-se
mesmo a culpabilizar aqueles que apresentavam deterioração física, sendo a dependência e
a decrepitude resultados de uma conduta desviante do indivíduo. Sendo assim, inatividade
corresponderia à velhice, opondo-se às vantagens do envelhecimento ‘terceira idade’.
No momento em que ocorre a diminuição do tempo destinado ao trabalho, não
existindo grandes pressões, seja de ordem financeira ou de saúde, a família, a religião e o
lazer passaram a ser as principais ocupações no tempo social das pessoas. No que toca o
lazer, duas tendências podem ser analisadas, uma em que ele é visto como uma necessidade
individual e outra em que ele é uma necessidade social (MUNNÉ, 1992).
Independente do que é feito, se a atividade tem predominância física ou
intelectual, tendo mais ou menos gasto energético, a proposta ativista encontrou no
ambiente associativo o espaço ideal para a prática dos seus mais caros princípios. Passado o
tempo da euforia em que idosos e aposentados se engajavam em qualquer coisa preparada
para eles pelos que entendiam dos velhos (HADDAD, 1986), chegamos a um momento em
que idosos e aposentados já buscam gerir seus próprios destinos lutando para não serem tão
tutelados como antigamente. Consideramos que o êxito das novas propostas associativas
seja resultado de uma reflexão mais ampla do processo do envelhecimento, do curso da
vida, das relações geracionais e principalmente a que servem determinadas atividades que
são endereçadas a idosos e aposentados. Temos tido estas preocupações no âmbito de dois
grupos de convivência em que integramos ensino, pesquisa e extensão cuja tônica principal
é a questão das quedas, mas que não fica deslocada de diversas outras questões que rondam
o envelhecer na sociedade.
Neste capítulo abordaremos inicialmente como veio se constituindo na história da
humanidade a relação com os que passam a ser considerados como velhos. Isto servirá para
dar seqüência aos principais referenciais que fundamentam as nossas propostas. Falaremos
do envelhecimento enquanto problema social, da transição demográfica dando maior
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visibilidade aos idosos e aposentados, como os elaboradores das políticas públicas sugerem
um novo modo de envelhecer; além de tocarmos na questão da promoção da saúde,
animação cultural e lazer e da intergeracionalidade.
O ENVELHECIMENTO E A VELHICE ATRAVÉS DA HISTÓRIA DA HUMANIDADE
A partir do conhecimento de como nossos antepassados envelheciam, podemos
fazer uma tentativa de entender como essa herança cultural pode ter influído na
compreensão do que envolve o envelhecimento na contemporaneidade.
Estudar a senescência com a única pretensão de defini-la pelo aspecto individual é
bastante limitante. Não pelo fato dele não ser importante, mas porque não é suficiente,
acabando por representar apenas um “momento abstrato” (BEAUVOIR, 1970:41).
Concordamos com essa autora quando ela diz que “para compreender a realidade e o
significado da velhice é, portanto, indispensável examinar qual o lugar nela atribuído aos
velhos, qual a imagem que deles se tem em diferentes épocas e em diferentes lugares”.
Independente da cultura investigada, a velhice é percebida de maneira bastante
distinta. Fundamentando-se em estudos etnológicos, Beauvoir apresentou a condição de ser
velho nas sociedades primitivas e sua dependência do contexto social. Podemos perceber
que diversas soluções foram adotadas para encarar a velhice. Algumas vão mesmo eliminar
seus velhos; outras vão abandoná-los, deixando morrer. Ao se tornar uma boca inútil, não
podendo mais trabalhar, a solução pode ser a morte. De raciocínio semelhante, quando o
chefe não é mais capaz de proteger o grupo, pode-se eliminá-lo. No entanto, também se
verificou que isso não seria uma norma, havendo povos em que, mesmo em situação de
penúria, e mesmo nômades, os velhos mereciam respeito e eram venerados.
Segundo ainda Beauvoir (1970:97), “o que define o sentido e o valor da velhice é
o sentido atribuído pelos homens à existência, é o seu sistema global de valores. E viceversa: segundo a maneira pela qual se comporta para com os seus velhos, a sociedade
desvenda, sem equívocos, a verdade – tantas vezes cuidadosamente mascarada – de seus
princípios e de seus fins”.
Uma maneira peculiar de representar a velhice ou sua aproximação, a fraqueza, é
encontrada em representações gráficas do antigo Egito. O hieróglifo que significa ‘velho’
ou ‘envelhecer’, encontrado a partir dos anos 2800-2700 a.C., foi representado pela
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“imagem de uma figura humana deitada, com ideograma representativo de fraqueza
muscular e perda óssea” (LEME, IN: PAPALEO NETTO, 1996:14).
Se por um lado o envelhecimento na antiga China era associado a respeito do
ponto de vista das relações sociais, em outras civilizações da mesma época o mesmo não
ocorria. É por meio de relatos escritos, quadros, esculturas, em manifestações culturais as
mais diversas, como poemas ou a dramaturgia, que são identificadas as mais diferentes
reflexões sobre os velhos e a velhice (BOIS, 1989, 1994; MINOIS, 1987; CRANDALL,
1980; BEAUVOIR, 1970). Nas diversas vezes em que esses relatos apareceram na história
antiga, quase sempre se restringiam à velhice do indivíduo, não havendo uma característica
de grupo. Tanto nas crônicas como nos tratados morais e nas obras de arte, o que se
encontrou são fragmentos que reproduzem uma visão bastante limitada do corpo social.
Saber e poder faziam parte das características dos velhos que mantinham respeito e
privilégios: “eles encarnam a continuidade e o sucesso do grupo, e, diferentemente dos
outros homens, eles estão próximos dos deuses” (BOIS, 1994:6). Num meio termo entre
mito e história, tanto a Grécia do tempo de Homero como a Roma arcaica não escaparam
desse modelo.
Quando as sociedades passam a ficar mais organizadas, e o sagrado desaparece das
relações com a política, com o desenvolvimento institucional e administrativo, acabou-se
fazendo com que declinasse o sistema gerontocrático. A velhice tornava-se destino e há
certa ambigüidade nos gregos. Enquanto Aristóteles ataca a velhice, Platão vai defendê-la,
colocando-a mais próxima de um ideal. Na verdade, ao se falar da Grécia, deve-se ter em
conta a existência de cidades-estado, não havendo qualquer unidade entre elas. Em Esparta
encontrava-se um conselho conhecido como Gerúsia, constituído de 28 gerontes e dois reis,
escolhidos entre aqueles que tinham mais de sessenta anos.
Como resultado do fim de algumas guerras, em Roma, tal como na Grécia,
demograficamente já se apresentava um considerado número de pessoas com mais de
cinqüenta anos, que eram estimadas, segundo Cowgil, citado por Crandall (1980), em 4%
do total da população. Na antiga Roma o senado parece valorizar a experiência dos seus
velhos senadores, e Cícero (1997), que era, além de filósofo, influente político, vai
apresentar a velhice pelo prisma do que podemos chamar do ‘bom envelhecer’. Segundo
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ele, existiriam quatro razões utilizadas pelos que concebiam a velhice como algo detestável:
ela nos afastaria da vida ativa, acabando por enfraquecer-nos o corpo, privando-nos de
alguns dos melhores prazeres, e finalmente nos aproximaria da morte. Seria então
necessário resistir à velhice e combater seus inconvenientes: “é preciso lutar contra ela
como se luta contra a doença; conservar a saúde, praticar exercícios apropriados, comer e
beber para recompor as forças sem arruiná-las” (CÍCERO, 1997:16).
Suas recomendações demonstram a importância que já era dada ao permanecer
ativo, tanto intelectual como fisicamente. Procurando mostrar as vantagens do
envelhecimento, Cícero sugere que no momento em que algumas características se vêem
alteradas nos velhos, outras passam a ser evidenciadas positivamente quando se confrontam
jovens a velhos. Na verdade, velhice e juventude não deveriam se contrapor, pois os que
estão na primeira categoria não têm necessariamente a obrigação de cumprir as mesmas
tarefas que distinguem a segunda. Para Cícero, os velhos acabam por fazer mais e melhor,
pois “não são nem a força, nem a agilidade física, nem a rapidez que autorizam as grandes
façanhas; são outras qualidades, como sabedoria, a clarividência, o discernimento”
(CÍCERO, 1997:19).
Nos primórdios do desenvolvimento das civilizações, a velhice foi percebida como
uma etapa particular da vida, não se verificando, como era de se esperar, qualquer acordo
sobre qual seria a idade em que ela se iniciava. Se hoje alguns usam a fórmula de dividir a
vida em três idades, antigamente outras foram feitas: Hipócrates usava para descrever o
ciclo da vida as quatro estações, sendo que a velhice corresponderia ao inverno, que para
ele cronologicamente começaria aos 56 anos. Já Aristóteles se referia à idade de 50 anos,
enquanto Santo Agostinho, que estabelecia 60 anos como limite, dividia a vida em sete
idades – divisão utilizada durante a Idade Média. Não sendo tão simples quanto parece, na
busca por identificar o início da velhice, mesmo se nunca encontrou unanimidade, foi a
idade de sessenta anos a mais utilizada para distinguir aqueles que não serviam mais para
pegar nas armas ou mesmo para trabalhar.
Foi só a partir do Renascimento que houve um aumento da expectativa de vida,
surgindo com isso um maior interesse pelos problemas do envelhecimento. Segundo Leme,
a segunda metade do século XV, Gabriele Zerbi, que era clínico, professor e anatomista,
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escreveu alguns sintomas e doenças típicas de velhos, no que poderia ser considerado como
o primeiro manual de geriatria. Par ele, “o idoso tem uma compleição especial, primeiro
fria e seca e posteriormente quente e úmida, definindo nessa compleição uma predisposição
para mais de 300 doenças”.
Também de maneira sintomática, Richelet, lexicógrafo francês do século XVII
(BOIS, 1994), apontado como um dos primeiros a catalogar o sentido das palavras para
caracterizar a velhice na França, em 1680 já se referia às palavras ‘ancião’ e ‘velha’. Foi
assim, na forma feminina, que ele se expressou, demonstrando o que foi claramente
percebido por Minois (1987), que a história da velhice é uma história do ponto de vista
masculino. O pouco poder das mulheres, como da velhice anônima, sempre foi
ridicularizado e rejeitado; já a velhice honrada seria para os possuidores de poder, como os
doges, os de classes abastadas, os conselheiros dos governantes e os reis.
Cronologicamente, anciões seriam aqueles que têm entre 40 e 70 anos: “são geralmente
desconfiados, ciumentos, avaros, melancólicos, conservadores, se queixando de tudo; os
anciões não são capazes de amizade” (BOIS, 1989:27). No que toca a caracterização da
velhice como feminina, Richelet, ao se referir às ‘velhas’, incluiu-as no mesmo período
etário dos anciões, caracterizando-as também como muito repugnantes, além de enrugadas
e sonolentas.
Alguns anos mais tarde, no dicionário elaborado por Furretière, também citado por
Bois (1994), encontramos algumas características mais abonadoras. O ciclo da vida foi
dividido em escalas de idade, cada uma comportando sete anos: a faixa dos 30 aos 50 anos
seria a da ‘idade forte’, ‘idade madura’ e ‘idade viril’, ao passo que as expressões ‘estar na
idade’, ‘estar avançando na idade’ ou ‘declinar na idade’ definiriam o começo do
envelhecer, e a decrepitude começaria após os 75 anos. Assim como em outras definições,
o paradoxo também continuava, pois ao mesmo tempo em que se associava muita idade à
experiência, enaltecendo os anciões como pessoas que têm algo de venerável, de grande,
por outro lado a velhice também é considerada como “um tempo de caduquice, em que não
se tem mais força” (BOIS, 1989:28). Na mesma época a Academia Francesa evita
apresentar qualquer idade para caracterizar a velhice e passa a incluir expressões positivas
para referi-la. Isso não significava maiores conhecimentos adquiridos, mas sim uma parcial
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mudança de mentalidade, já que se tornar ‘caduco’ continuava a ser considerado como uma
inevitável conseqüência dessa fase da vida.
O século XVIII é aquele no qual a percepção da velhice muda, “de puramente
apreciativas, tornam-se objetivas” (BOIS, 1994:63). Delineava-se no final do século um
interesse na contabilização matemática das populações, que podia constatar o lento, mas
progressivo aumento demográfico na Europa. Jean-Pierre Gutton, citado por Bois (1994),
usa a expressão ‘nascimento dos velhos’ mostrando que o interesse no século XIX passava
a valorizar mais as qualidades do indivíduo. No momento em que esses valores são
descobertos, os velhos, tal como as crianças, passaram a ser tratados de forma diferente no
seio familiar. Há uma ‘evolução favorável’, resultado de um movimento que ocorreu nas
sociedades européias. As representações da idade passam a ser bem otimistas,
principalmente após a segunda metade do século. Cria-se a imagem do bom velho, segundo
a qual ter muita idade pode contribuir para a aquisição de outras qualidades, não mais pelo
saber acumulado, mais por valores ligados à virtude, como justiça, bondade e temperança
(BOIS, 1994). Mas a ambigüidade logo fica novamente marcada.
Não demorou muito para que no século XIX, a partir da influência da medicina, se
tivesse uma imagem cada vez mais diferente da velhice, e foi nessa época que surgiram os
primeiros tratados de geriatria. Por um lado, nesse mesmo século, verificava-se uma
gerontocracia na França, já que os idosos conseguiam deter algum tipo de poder, o que
explicava o fato de que muitos deles ainda estivessem “nas famílias, nos negócios, no
exercício dos poderes constitucionais ou eletivos. A característica dominante era muito
mais favorável aos velhos do que em qualquer outra época” (BOIS, 1994:95-96). Por outro
lado, a relação com os que não tinham qualquer poder e respeito era diferente. Em Paris, foi
criado o Hospital Salpétrière, que acolhia de dois a três mil idosos, e passou-se a observar a
velhice pelos aspectos clínicos. Esse dado parece ser definitivo para marcar a contribuição
do modelo que se fundamenta na inevitável responsabilidade do indivíduo por sua
degradação ou mesmo conservação para uma boa velhice. Os doentes nos hospitais “[...]
tornavam-se sujeitos de observação, em que a clínica se afirmava e novas abordagens das
doenças da idade se sucediam [...] existiu a partir do primeiro terço do século XIX uma
verdadeira demanda de livros informando sobre o envelhecimento do indivíduo e dando
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conselhos. Estes guias de grande difusão foram geralmente escritos por professores célebres
[...] eles escreviam ao vislumbre de seus conhecimentos gerais e de sua sabedoria uma
promoção de regras para a vida que garantiriam uma boa velhice [...] Não se tratava de
pesquisas, mas de escritos que pertenciam a um gênero completamente diferente, num meio
de caminho entre medicina e filosofia”. (BOURDELAIS, 1993:322-339).
Para esse autor, era incontestável o interesse que o envelhecimento e a velhice
passaram a ter tanto no campo científico como no terapêutico, sendo estudados dentro dos
hospitais. O desenvolvimento da geriatria parece ter contribuído para a deterioração da
imagem da pessoa idosa; as diversas descrições clínicas eram categóricas, apresentando
sempre “quadros precisos, chocantes e repetitivos da decadência física. À medida que as
investigações se desenvolviam num quadro de pesquisas das anomalias, do que não
funcionava, estaria provada a deterioração pela idade” (BOURDELAIS, 1993:348).
QUEM QUER SER VELHO?
Não importa o período analisado na história da humanidade, seja nas culturas mais
antigas, seja nos países mais jovens, os significados atribuídos ao ‘ser velho’ e ao
envelhecimento foram sempre marcados por profundas contradições. Uma pessoa velha
pode ser considerada como alguém que merece e impõe respeito, ou um indivíduo
altamente desprezível. Na atualidade, testemunhamos ser bastante comum recorrer-se ao
uso da palavra ‘velho’ para uso mais pejorativo e depreciativo do que lisonjeiro.
No momento em que a velhice é apresentada como um período da vida ao qual se
associam mais desvantagens do que vantagens, constata-se com freqüência a busca de
distanciamento desse processo. Mas é fato que existe grande controvérsia sobre qual seria o
momento ideal para marcar o início dessa tal velhice. O mais freqüente é o uso da idade
cronológica para se dizer quando alguém é velho, sendo as mais utilizadas as que rondam
os sessenta anos. Há também referência ao momento em que começam os cabelos brancos
ou mesmo ao período que ronda a aposentadoria. Se pensarmos nas mulheres do início do
século XX, o climatério, sendo um período cheio de significados que extrapolam o
orgânico, também marcava para muitas delas a aproximação da velhice. Fica claro que não
é muito simples nem unânime qualquer tentativa de caracterização desse momento. A falta
de consenso é presente, seja no uso de critérios cronológicos, seja na importância que se dá
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aos sinais externos, apresentados por meio das mudanças corpóreas ou orgânicas, que
acabam refletindo na variedade de conselhos que são dados em cada época para se enfrentar
a velhice. Não precisamos ir muito longe, deixando aqui o exemplo dos ensinamentos
propostos em algumas publicações de mais de cinqüenta anos: com o significativo título A
vida começa aos quarenta anos, Pitkin (1942) apresenta um modo de vida que deveria ser
assumido para se ter uma boa velhice. O Dr. Peter Steincrohn (1950) publicou um livro
com o título O repouso começa aos quarenta. Reforçando a idade de quarenta anos como
simbólica para o início da velhice, o livro procurava ensinar ao ‘quarentão’ de que forma
ele poderia ter uma velhice mais saudável. Basicamente a recomendação principal é a de
que não é preciso fazer ginástica, pois aqueles que se dedicam a ela gastam as poucas
reservas energéticas que ainda sobrariam para enfrentar os últimos anos de vida.
Assim como a juventude podemos considerar a velhice mais uma categoria criada
culturalmente. Segundo Pierre Bourdieu (1980:145), “a idade é uma variável biológica,
socialmente manipulada”, por esse motivo, plena de ambigüidades que não serve como
único parâmetro para dizer quando alguém é velho. Não podemos ignorar, entre outras, as
variáveis derivadas: das influências do meio ambiente; das condições de trabalho; da classe
social e do modo de vida. Na verdade, os cortes cronológicos só contribuem para aumentar
as barreiras entre gerações (ATTIAS-DONFUT, 1988). Remi Lenoir (1998:68) deixa claro
que “o que está em questão é a definição dos poderes associados aos diferentes momentos
do ciclo da vida, sendo que a amplitude e o fundamento do poder variam segundo a
natureza das implicações – peculiares a cada faixa etária ou a cada fração da faixa – da luta
entre as gerações”.
Sendo
assim,
alguns
buscam
compreender
o
inexorável
processo
do
envelhecimento enquanto um processo gradual, multifatorial e multidiferencial, havendo
atualmente os que defendem que os aspectos deletérios do envelhecimento devem ser
enfrentados. É cada vez mais acentuada a busca por viver mais e de maneira saudável,
aumentando assim o combate às doenças da velhice. Diversas tentativas são feitas para
postergar pelo maior tempo possível alguns signos da velhice, contribuindo para que
aumentassem nos últimos anos as publicações sobre o sentido do envelhecimento e como
resistir à velhice.
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Os mistérios da vida sempre empurraram a humanidade a procurar dominar seu
medo do desconhecido que é a morte. As possibilidades de fazer com que sejamos capazes
de viver o maior número de anos possível não são uma preocupação de hoje, e ao que
parece não se encerrará jamais. Desde os povos antigos, alquimistas e cientistas dedicaram
seus esforços no sentido de achar algo que seja capaz de prolongar a vida humana, ou pelo
menos chegar a atenuar alguns desgastes. Teoricamente sabemos que em média nossos
limites têm sido situados em torno dos 120 anos, embora festejar os cem anos de alguém
seja bastante raro. Os centenários constituem-se num grupo bastante restrito, mesmo
considerando o aumento da sua proporcionalidade. Se até pouco tempo eram relegados aos
asilos, hoje muitos convivem com outras gerações.
Um dos componentes, e provavelmente um dos mais importantes relacionado ao
que estamos vendo como novo modo de envelhecer é a possibilidade de se engajar nos
diversos projetos associativos. Percebemos que nas propostas das políticas sociais, sempre
é sugerido nas suas ações manter o idoso ativo, inserido socialmente, evitando-se ao
máximo a forma asilar. O fato de aderir a uma associação e praticar as atividades que nela
são propostas acaba dando ao idoso uma possibilidade de se sentir mais útil e de
permanecer inserido na sociedade, afirmam os que defendem esse modelo ativo e
socialmente engajado do bom envelhecer.
Idosos e aposentados foram transformados nas últimas décadas do século XX em
categorias boas de se investir, não sendo poucos os que se viram atraídos pelos apelos da
mídia que lhes acenava com um novo imaginário do que poderia ser seu envelhecimento
num novo tempo mais independente (VENDRUSCOLO, LOVISOLO, 1997: 40).
A TRANSIÇÃO DEMOGRÁFICA NO BRASIL
Vários fatores influíram para a transformação do envelhecimento e da velhice, de
processo que só importava ao indivíduo, a destino não mais de poucos privilegiados,
assunto de responsabilidade social. O século XX marca o mundo pelos significativos
avanços sociais e científicos, que acabaram contribuindo para profundas alterações
demográficas: controle de certas doenças infecto-contagiosas, desenvolvimento de sistemas
de saneamento básico, de controle conceptivo, diminuição tanto do número de nascimentos
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como da mortalidade infantil. No entanto, o aumento da população de velhos não foi
exclusivo daquele século, já tendo sido verificado em outras épocas.
A França, por exemplo, tinha no século XIX, do total da sua população, 8% de
pessoas com mais de sessenta anos (BOURDELAIS, 1993). Esse número é bastante
significativo, principalmente quando o comparamos à recente distribuição demográfica
brasileira. Durante muito tempo o Brasil foi considerado um país de jovens, e o sinal de
alerta de que estaria havendo uma mudança em seu perfil demográfico surgiu nos anos
setenta, quando a proporção de pessoas com mais de sessenta anos ainda rondava os 7%.
Hoje constatamos que foi preciso percorrer quase todo o século XX para que a mesma
proporção encontrada na França no século XIX fosse alcançada no Brasil, só acontecendo
no decorrer da década de noventa. Registre-se que atualmente, início do século XXI, a
proporção de pessoas com mais de sessenta anos no Brasil anda em torno dos 9%.
Não se pode falar do envelhecimento de uma população, da forma como vem
ocorrendo no Brasil, sem se reportar às pressões demográficas. Tendo como base os
aspectos quantitativos, a demografia surgiu como uma ciência interessada em estudar o
movimento das populações humanas, suas mais diversas dimensões, estruturas, evolução e
também suas características gerais. Ela é tanto prospectiva como retrospectiva. Diante dos
dados já conhecidos, tudo indica que o século XXI ficará marcado pelo significativo
aumento demográfico da população mundial de idosos (US CENSUS BUREAU 2003;
INSEE 2001; BRASIL 2001), fato que se delineou no decorrer do último século.
Para melhor compreender a emergência do envelhecimento de uma população
enquanto problema é comum serem reportadas suas evoluções demográficas. Enquanto
uma das primeiras ciências sociais quantificáveis, a demografia se utiliza de estatísticas,
“cujos resultados tornam-se cabíveis de análises qualitativas (fatores sociológicos,
psicológicos, etc.), levantando diversas questões ligadas à economia, à sociologia e à
história” (GRAWITZ, 1991:108). No período compreendido entre os anos de 1950 e 2025,
enquanto a população mundial total deverá triplicar, a parcela formada pelos que têm mais
de sessenta anos será multiplicada por cinco. Surpreende quando se observa os dados
demográficos brasileiros e suas profundas alterações que ocorrerão nos próximos anos.
(TABELA 1).
14
TABELA 1
PORCENTAGEM DA DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO BRASILEIRA POR GRUPO DE IDADE NOS
ANOS DE 2000, 2025 E 2050
Brasil
0-19
20-59
60 ou >
2000
39%
53%
8%
2025
27%
57%
16%
2050
22%
51%
27%
Fonte: Us Census Bureau, 2003
A transição demográfica ocorrida no século XX fez com que se aumentasse o
número de pessoas consideradas idosas. Credita-se esse fato à forte contribuição da
melhoria das condições sanitárias, do progresso da ciência, do controle e erradicação de
algumas doenças contagiosas, de mudanças de hábitos alimentares e de higiene pessoal.
Entretanto, estas últimas não são tão fundamentais; o que mais vai importar é a sua
conjunção com outros fatores, como a diminuição da taxa de mortalidade infantil e
principalmente a diminuição das taxas de fertilidade ocorrida em determinados períodos
(TABELA 2). No Brasil, as alterações são muito significativas, e as estimativas que os
institutos de pesquisa vêm há alguns anos fazendo, mostram que a transição demográfica
não se restringirá só ao Brasil. Projeta-se que as mulheres brasileiras terão um quantitativo
em torno de 1.8 filhos para as duas próximas décadas, com tendência de baixa para as
posteriores. Deve-se registrar que a taxa de 2.1 filhos é a considerada para se ter o
equilíbrio de uma população.
TABELA 2
Taxa de fertilidade das mulheres francesas e brasileiras – dados listados a partir da
década de 1950 até o ano 2000
Brasil
1950
1960
1970
1980
1990
2000
5.93
6.07
5.33
4.09
2.56
2.13
Fonte: IBGE (2003)
Os dados que obtivemos indicam que a esperança de vida média dos brasileiros
nascidos no ano de 2000 ainda estava abaixo de 70 anos, enquanto que na França a média já
15
seria de 78,8 anos. No ano de 2003 o IBGE divulgou uma pesquisa que indica entre outros
dados que a esperança de vida média do brasileiro passava a ser de 71 anos com as
mulheres vivendo em média 7,6 anos a mais do que os homens.
Durante milhares de anos a espécie humana teve um aumento demográfico muito
lento. Só a partir dos últimos três séculos a população começou a crescer de maneira mais
acentuada, o que se deveu, entre outros fatores, ao desequilíbrio entre nascimento e morte.
Esse conjunto de fatores, como também o aumento da longevidade média, acabou
contribuindo para fazer do envelhecimento “uma novidade para o nosso tempo”, conforme
Bois (1994:1), mesmo considerando que em todas as épocas tenham existido velhos.
Concordamos com o autor quando ele diz não restar qualquer dúvida de que a nossa velhice
não será a mesma dos nossos pais, avós ou de nossos ancestrais mais longínquos.
Acrescentamos ainda que o estudo do envelhecimento e da velhice deve ser acompanhado
por uma reflexão do significado dos fenômenos geracionais. Afinal, quem poderia imaginar
há algum tempo atrás que as novas gerações estariam sendo induzidas a praticar atividade
física ou mesmo participar de competições esportivas; mais impensável seria a presença
nessas práticas de pessoas de mais de sessenta anos, como vem ocorrendo atualmente.
O uso de dados demográficos para caracterizar o envelhecimento de uma
população como um problema social do momento não é garantia de que os anseios dessa
categoria e suas necessidades mais prementes sejam atendidos. As políticas públicas
encaminhadas pelos que se apresentam enquanto entendedores do envelhecimento e da
velhice acabam por privilegiar outros interesses; no caso dos idosos e aposentados que
praticam as mais diversas atividades, em especial as de caráter físico ou esportivo, será que
não poderíamos falar de uma ‘indústria do envelhecimento saudável’?
A NOVA VELHICE
O século XX é considerado um período bastante importante no tocante ao interesse
social pelas coisas da velhice, quando uma ‘nova velhice’ passou a ser delineada, surgindo
as associações gerontológicas e geriátricas. Época da ‘hiperatividade contemporânea’, de
contato com uma ‘nova arte de envelhecer’ (MIRA Y LOPES, 1966), um resgate da época dos
iluministas do século XVIII que apresentaram uma imagem positiva da velhice. Mas
quando se encarava o envelhecimento a partir das obras geriátricas, ficavam bem marcadas
16
as perdas e as doenças, o aspecto negativo. Só na segunda metade do século XX surgiram
trabalhos mais próximos das ciências sociais que começaram a fazer denúncias sobre o
abandono e as condições miseráveis dos velhos. Ao mesmo tempo, gerontólogos passam a
defender um modelo diferente de envelhecimento que é logo incorporado pelos geriatras.
Simone de Beauvoir (1970) apresentou de maneira contundente as dificuldades de
sobrevivência dos idosos, e o descaso com que os mais velhos eram tratados. No momento
em que foi publicado este livro, foi bastante peculiar e foi considerado um dos mais
importantes para quem estudava o envelhecimento e a sociedade. Estudo abrangente
denunciava na história da humanidade o estado de miséria e o abandono social impostos
àqueles velhos desprovidos de algum tipo de poder. Segundo a autora, sendo raras as
sociedades em que o velho era venerado, um estudo sobre as influências da sociedade sobre
a velhice e o envelhecimento deve considerar que será então a própria sociedade que vai
determinar “[...] o lugar e o papel do velho, levando em conta suas idiossincrasias
individuais: sua impotência, sua experiência; reciprocamente, o indivíduo é condicionado
pela atitude prática e ideológica da sociedade a seu respeito” (BEAUVOIR, 1970:13).
Sobre o trabalho da autora, alguns justificam sua importância pelo momento
histórico em que foi escrito, já que as condições dos velhos na França nos anos 60
deixavam muito a desejar. Uma vez que durante muitos anos “o conhecimento do
envelhecimento e da velhice era dominado por mitos, estereótipos, preconceitos, ignorância
e medos pessoais com a velhice” (CRANDALL, 1980:4), foi necessário incorporá-la
primeiro como uma fase importante da vida e depois considerá-la enquanto um fato social,
para que pudesse então merecer estudos mais sistemáticos.
Ao fazer uma história da velhice, Jean-Pierre Bois (1994:4) argumentou que, não
importando o período em que ela foi abordada, o discurso que se fez passará sempre por
uma discussão de “[...] temas em oposição, mas sem dúvida complementares – sabedoria e
loucura, felicidade e tristeza, beleza e feiúra, virtudes e corrupções de idade e das pessoas
idosas – que exprimem duas aspirações, a tentação de uma vida longa e a recusa das
fraquezas clássicas da idade”.
Acrescentamos ainda a noção de progresso e desenvolvimento em oposição à de
estagnação e involução, ou seja, um mau e um bom envelhecimento, o que abre o caminho
17
para se contrapor atividade à inatividade na aposentadoria e autonomia à dependência.
Como então superar o que parece rondar o senso comum, a noção de que existiria certa
semelhança entre ser muito velho e a fase de dependência total? É aí que acaba surgindo
com outros fatores uma nova maneira de envelhecer, em oposição à velhice indesejada.
É então no século XX, visando a combater o mau envelhecimento, que surgem
cada vez maior número de manuais, alguns seguindo os preceitos higienistas que defendem
uma moral que resultará no bom envelhecimento. Isso acabou se intensificando ainda mais
a partir do tema na categoria de problema social. Mais precisamente, no período a partir dos
anos cinqüenta, quando aqueles manuais passaram a propor com certa freqüência um
modelo do bom envelhecimento, que acabou de certa forma sendo incorporado nas políticas
sociais da velhice. Só que agora quem passará a cuidar dos velhos serão eles próprios,
auxiliados pelo Estado, que passou a dividir com a família as responsabilidades de seus
velhos. Com o passar dos anos de desenvolvimento após a Segunda Guerra e a influência
da política do bem-estar social, surgiram novas aspirações de uma classe média assalariada
que, junto com o envelhecimento da população, cresceu de forma considerável.
PREVENINDO AS QUEDAS: INTEGRANDO PROMOÇÃO DA SAÚDE, LAZER E
INTERGERACIONALIDADE
Sendo cada vez mais crescente o número de oportunidades profissionais para se
atuar com os idosos interessados em praticar atividades físicas esportivas, é necessário estar
atento à diversidade de públicos que muitas vezes se apresentam. A melhor compreensão
desses públicos certamente contribuirá para a melhor adequação das práticas escolhidas e
dos conteúdos utilizados. Identificamos inicialmente, que entre os praticantes das atividades
físicas após a entrada na aposentadoria existe um grupo que já vem praticando há algum
tempo. Nesse mesmo caso encontram-se alguns que investem na forma dos torneios
‘masters’ em práticas competitivas. O exemplo dos competidores masters de natação serve
para percebemos como os idosos e aposentados podem participar de situações que até
pouco tempo eram exclusivas de pessoas jovens.
Fica clara a existência de um outro grupo distinto, que é constituído de idosos e
aposentados que com certa regularidade só praticaram atividades físicas em determinado
período da vida, muitas vezes de maneira obrigatória, como nas escolas ou nas forças
18
armadas. O abandono após esses períodos acaba sendo justificado pela falta de interesse ou
pelas mais diversas causas, mas a mais comum é a falta de tempo disponível, que se
concentrou na dedicação à vida familiar e profissional, ou a outros interesses pessoais.
Entre esses idosos, o retorno à atividade no período que ronda a aposentadoria, pode ser
devido a uma recomendação terapêutica específica, como uma opção de viver o
envelhecimento de forma diferente. Finalmente encontramos um terceiro grupo que em
muito se assemelha ao anterior, sendo ambos os mais representativos. Sua constituição é de
pessoas que nunca praticaram regularmente alguma atividade física, e que só após a entrada
nas associações de idosos e aposentados passaram a se engajar em programas específicos
de atividades físicas. Acreditamos que nossa proposta esteja mais dirigida a estes dois
últimos grupos e percebemos que na grande maioria dos casos enquadra-se na última opção
sendo a presença feminina a mais significativa, chegando, em muitos momentos, a ser
exclusiva.
O que se considera como teoria da ‘estratificação das idades’ (MARKIDES,
MINDEL, 1986:29) foi apresentado pelos seus autores como um modelo de
envelhecimento, de maneira que sua perspectiva não é a de oferecer uma explanação teórica
da adaptação à velhice, como a teoria da atividade e do desengajamento pretendem fazer. O
uso de algum tipo de modelização sobre o envelhecimento a partir da influência exercida
pelo meio social requer bastante prudência, já que nenhuma teoria será capaz de explicar e
que seria um conjunto de teorias que aproximariam a determinados modelos assumidos
pelos que envelhecem. O modelo percebe de duas formas fundamentais a estratificação das
idades: a idade podendo limitar as habilidades do indivíduo para desempenhar
determinados papéis; e a sociedade diferentemente repartindo direitos, papéis, privilégios e
oportunidades tendo como base uma idade. De acordo com Crandall (1980:119), a idade
cronológica pode afetar o desempenho de um papel por causa da influência das
características biológicas, legais ou das restrições sociais.
Se por um lado houve no século XX uma verdadeira revolução no que toca a
longevidade, por outro, as estruturas por idade não acompanharam no mesmo ritmo as
alterações, conforme o que vem sendo anunciado para o século XXI, quando será cada vez
mais crescente o número de pessoas idosas tanto competentes e motivadas como
19
potencialmente produtivas. Sendo assim, certamente elas “não poderão se acomodar por
muito mais tempo a estruturas que não lhes dão nenhum papel” (RILEY, RILEY, 1991:7).
Numa estrutura por idade considerada mais tradicional, os papéis sociais são
divididos em três partes: aposentadoria com a primazia dos lazeres, o trabalho para os
considerados adultos e a educação para os jovens. Nesse modelo banal, originário de um
tempo mais antigo, a aposentadoria seria muito próxima da morte e haveria uma dificuldade
adaptativa a novos modos de vida. Ele se fundamenta no declínio que se acentua com o
decorrer dos anos e acaba fortalecendo concepções que podem ser consideradas ‘ageismos’,
uma espécie de preconceito fundamentado nas idades. Seria uma divisão considerada
prática para a sociedade, pois não possibilita muitos questionamentos. Já na integração das
idades, seria possível ter diferentes papéis em todas as estruturas e tanto na escola, no
emprego como nos lazeres as pessoas estariam integradas.
Mesmo que possam ser observados alguns sinais de que estaria havendo uma
intervenção sobre as estruturas, que teria como objetivo aproximar as pessoas,
independente da idade seja no trabalho, na educação ou no lazer, os exemplos observáveis
dessa integração ainda são raros na sociedade moderna. Consideramos que nossa proposta
de atuar com a intergeracionalidade encontra suporte nesta fundamentação, que se junta à
questão da promoção da saúde.
A noção de saúde varia segundo os indivíduos, as civilizações, as épocas. A noção
de norma, de estado completo de bem-estar físico, mental e social, que seria o mesmo para
todas as pessoas, é uma generalização abusiva, daí a importância de repensá-la a partir de
outros significados. Drulhe (1996) apresenta os quatros indicadores principais de que se
serviu a OMS para propor suas ações: a mortalidade ou duração da vida; a morbidade ou
qualidade de vida; fatores considerados de risco; a autogestão da saúde tanto pelo indivíduo
como por grupos. Neste último podem ser considerados os hábitos que podem passar pelo
lazer, como a prática de exercícios e as preocupações nutricionais. Durante muito tempo
entendeu-se a saúde como algo exclusivo da esfera médica. Entretanto, alguns
pesquisadores, percebendo sua multifatoriedade, passaram a entendê-la como algo mais
amplo.
20
Defendemos que a educação para a saúde e suas relações com promoção da saúde,
podem ser consideradas como um referencial que pode ser utilizado pelos que atuam com a
animação cultural. O conceito de ‘promoção da saúde’, encara a saúde por sua
multifatoriedade, visa no caso dos idosos à autonomia, propõe a desmedicalização,
incorpora a educação para a saúde e o envolvimento do indivíduo nas mais diversas ações
para a consecução da saúde.
Consideramos a universidade como local privilegiado para a discussão da
transmissão cultural, e nada melhor do que fazer através do lazer. Alertamos para que ele
não seja confundido como mero entretenimento, com fim em si mesmo, pois sendo assim,
nada justificará sua presença numa universidade. Aceitamos que seja uma alternativa
educar pelo lazer e para o lazer, e desde o ano de 2001, temos sobre nossa responsabilidade
um Projeto de Intervenção e Pesquisa que objetivamente se interessa: a) pela diminuição da
incidência de quedas em idosos; b) pelos fatores extrínsecos e intrínsecos que podem ser
trabalhados para evitar as quedas; c) pela utilização de elementos da cultura corporal; d)
pela promoção da saúde através de atividades físicas que proporcionem prazer. Procuramos
encontrar apoio nestes indicativos na montagem do método que aplicamos no Projeto
‘Prev-quedas’, e quatro anos mais tarde no projeto ‘Envelhecimento sem tropeços’, que
veio a ser criado na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
A inclusão de elementos da cultura corporal se mostrou fundamental para manter
um ambiente mais favorável para a passagem dos nossos conteúdos, que aliam a educação
pelo lazer à perspectiva de promoção da saúde. O uso pelos animadores culturais de
elementos culturais com forte representatividade na sociedade brasileira, tem possibilitado
uma melhor mediação durante nossas intenções pedagógicas.
Cair faz parte de nossa vida, ninguém aprende a andar sem antes ter
experimentado alguma queda, a posição de pé é bastante complexa, adquirida, aprendida e
por isto frágil. “Cair é perder o equilíbrio sem poder recuperá-lo. Não se pode recuperar
este desequilíbrio quando as capacidades de adaptação postural estão inadaptadas ou
sobrecarregadas em face de esta situação” (REIGEWIRTZ, 2000:25). As quedas não estão
relacionadas unicamente a fatores considerados de risco, relacionados ao indivíduo,
havendo fatores extrínsecos, que dependem de uma situação, ligada não só à atividade
21
como também ao meio ambiente (PIERA, 2000). O meio ambiente às vezes nos
proporciona algumas surpresas que nos levam a ter uma perda do equilíbrio que podem
ocasionar uma queda do nosso corpo ao solo. Uma queda pode acontecer tanto no interior
de nossa residência como fora dela, em decorrência de uma diversidade de situações.
Podemos listar como causas mais freqüentes: escadas mal dimensionadas com inclinações e
alturas diferentes entre cada degrau; acesso a elevadores desnivelados; ambientes com
pouca iluminação; ausência de corrimão. É também importante considerar os diversos
buracos e obstáculos existentes nos equipamentos públicos urbanos, as calçadas que têm as
pedras portuguesas. Nos transportes públicos, seja no seu acesso, na tentativa de se manter
equilibrado nos balaústres ou mesmo na saída do veículo, requer-se bastante equilíbrio e
rapidez para não fazer o deslocamento com o veículo em movimento. Sem esgotar as
possibilidades de locais ou situações onde ocorre um número significativo de quedas, temos
o interior das residências. Nelas perde-se o equilíbrio escorregando na umidade de
banheiros e cozinhas, em tapetes não fixos, em pisos muito encerados, como também
tropeçando em obstáculos dos mais diversos, como fios elétricos estendidos pelo chão,
pequenos animais, brinquedos infantis etc.
Considerando que esta lista contenha algumas das causas mais freqüentes das
inevitáveis quedas que rondam nosso cotidiano, nada vem a ser de muito dramático quando
o resultado destas quedas, não apresenta conseqüências mais graves, não passando de um
simples susto. Quando se é criança, ou mesmo um adulto mais jovem, a ocorrência de
alguma queda, nem sempre influirá na mudança de comportamento. Já que com causas
semelhantes, velhos e jovens caem diferentemente (MOULIAS, H, IN: GROUPE de travail
de l´assistance publique, 2000), o grande problema passa a ser quando as quedas ocorrem
com pessoas mais idosas ou as que têm os ossos mais frágeis, resultado da alteração na
mineralização óssea, aí as conseqüências deixarão de ser tão simples.
Consideramos que existe uma série de estratégias que serão capazes de prevenir
uma queda, mas reconhecemos que não conseguiremos eliminá-las do nosso cotidiano.
Pensando na contribuição do que propomos, procuramos inicialmente responder: há um
risco potencial? Uma observação mais acurada, que envolve alguns testes de simples
aplicação, nos permite procurar interferir nas causas que o favorecem, para finalmente
22
propor medidas de segurança e quando for o caso, estratégias terapêuticas (REIGEWIRTZ,
2000: 25).
Para avaliar o risco de alguém vir a sofrer alguma queda pode ser aferido a partir
de algumas respostas dadas sobre o comportamento da pessoa. No caso de pessoas idosas
devemos verificar: se houve incidência de quedas no decorrer do último ano; se o uso de
algum sedativo mais forte é freqüente; se existem limitações que dificultem a mobilidade
física; se há pouca força nos membros inferiores; se há dificuldade para sentar-se e
levantar-se de uma cadeira sem utilizar a força dos braços; se durante a marcha, ao ser feita
uma ligeira mudança de direção há perda de equilíbrio; se há problemas posturais como
uma cifose, que venha a alterar a maneira de andar pela mudança do centro de gravidade; se
é satisfatório o tratamento dispensado aos pés; se existem problemas de ordem sensorial
que venham a influir no equilíbrio ou na percepção espaço temporal.
Como causadores de quedas uma variedade de fatores vão influir. A abordagem
médica aponta de maneira precisa diversas causas dando algumas razões de ordem
patológica como: problemas cardiovasculares, neurológicos e metabólicos. Contudo só
60% dos casos parecem ser devido a uma patologia específica. As razões são bem mais
diversificadas e muitas podem ser evitadas, seja através de uma melhor adequação
urbanística de nossos equipamentos públicos, adequando também a residência a novas
demandas dos idosos ou modificando o comportamento das pessoas. Como propostas
alternativas para diminuir os problemas que envolvem as quedas sejam elas em adultos ou
idosos, apresentamos inicialmente a prevenção fora de casa, propondo aos responsáveis
pelas políticas públicas urbanas uma maior atenção para que sejam: reduzidas as alturas de
certas calçadas muito altas ou mal concebidas; melhorados os calçamentos públicos;
melhoradas as vias de acesso dos pedestres aos equipamentos públicos urbanos sendo
instaladas rampas e corrimãos que facilitem o trânsito de todos; regulados os sinais de
trânsito que são muito rápidos e obrigam a aceleração das passadas além das habituais;
conscientização dos motoristas dos transportes públicos sobre o ritmo dos idosos,
obrigando os empresários dos transportes públicos a nivelarem os acessos dos ônibus com a
altura das calçadas, como ocorre em diversos países.
23
Os episódios de quedas envolvendo idosos têm conseqüências que não passam só
pelas questões sanitárias e sociais, mas repercutem também no aspecto econômico,
afetando física e psicologicamente o indivíduo. Na França segundo dados do Instituto
Nacional de Saúde e das Pesquisas Médicas (INSERM), 11 mil pessoas morreram em
decorrência de uma queda acidental. O mesmo número de óbitos que ocorreu no mesmo
ano em conseqüência de acidentes de tráfegos (LASCAUX, PERDRIZET, 1998), contudo
lá como aqui no Brasil não vemos tantas campanhas públicas sobre a prevenção de quedas,
fato que vez ou outra vem sendo veiculado na mídia com relação aos acidentes de trânsito.
Ao analisar os dados franceses sobre quedas Serge Reigewirtz (2000) indica que são 2
milhões de quedas anuais neste país, sendo que de cada 10 pessoas hospitalizadas por
períodos curtos, quatro caem, e entre os que ficam muito tempo hospitalizados, de cada
dois, um cairá ao menos uma vez por ano.
Nos EUA como em outros países encontramos dados semelhantes, indicando que
1/3 das pessoas que tem mais de 65 anos cairão a cada ano (CUMMINGS, NEVITT, 1994)
tendo um custo anual orçado pela Associação Americana de Cirurgiões Ortopédicos
(AAOS, 1997) de 20,2 bilhões de dólares. O principal gasto é o de uma fratura de quadril,
que chega a ser de 35 mil dólares por paciente. De todas as fraturas tratadas nos EUA, 90%
são decorrentes de alguma queda e para o ano 2000 foram previstas 350 mil fraturas de
quadril, ou seja, quase 1000 fraturas por dia. Neste tipo de fratura, um em cada quatro
pacientes terá uma recuperação total; 40% irão necessitar de cuidados especiais na própria
residência; 50% ficarão dependentes de uma bengala para andar e 20% morrerão no
primeiro ano após a ocorrência. No Canadá no ano de 1989 também 1/3 das pessoas com
mais de 65 anos vieram a cair pelo menos uma vez naquele ano (GALLAGHER, 1995)
sendo esta a causa principal de morte acidental entre pessoas com mais de 65 anos. Seja por
causas intrínsecas ou extrínsecas, mais de 2 milhões de pessoas caem a cada ano na
Comunidade Européia (LASCAUX, PERDRIZET, 1998).
Os números que mostramos sobre a incidência de quedas e fraturas em pessoas
idosas, baseados em pesquisas de outros países nos serviram como alerta para a reflexão
quanto ao que ocorre com a população brasileira, que como sabemos vem tendo um
acentuado envelhecimento demográfico. Daí privilegiamos como uma das linhas de
24
pesquisa do Grupo de Pesquisa Envelhecimento e Atividade Física a questão de quedas e
nossa proposta foi a de ter como foco idosos e aposentados que se predispusessem a fazer
parte de um projeto que não se apresenta como terapêutico. Atualmente temos algumas
pesquisas em desenvolvimento, sendo uma delas em parceria com a Universidade do
Quebec de Montreal.
Na maioria dos casos quando pessoas mais idosas se envolvem em quedas, vai se
ter alguma conseqüência que acaba comprometendo significativamente a qualidade de vida,
sendo bastante comum que pessoas idosas após sofreram alguma queda importante fiquem
cada vez mais temerosas que novos episódios venham a ocorrer. Chegam mesmo a
restringir ao mínimo seus deslocamentos fora da residência, entretanto o problema
continua, pois sabemos que é bastante significativo o número deste tipo de acidente nas
residências. O medo de cair ocasiona uma diminuição da dedicação às atividades que
necessitam de locomoção, primeiro impõe um isolamento social, depois acaba causando
ansiedade e provoca finalmente um grande estresse. A decorrente inatividade acentua a
perda de certas capacidades físicas que são bastante importantes na manutenção do
equilíbrio, da locomoção e da independência física. Reduzindo as atividades físicas pelo
medo de novas quedas, diminuirá a mobilidade articular, ocorrerá conseqüentemente perda
de força e do tônus muscular. Estes decréscimos impõem uma mudança de hábitos em
alguns idosos e influirão no grau de independência para a realização de suas atividades da
vida cotidiana, e principalmente na sua participação na vida em sociedade.
Como atenuar este quadro foi o nosso desafio, e sem dúvida, os profissionais de
educação física integrados a médicos, fisioterapeutas, psicólogos entre outros que se
predispõem a atuar com a promoção da saúde têm um importante papel a cumprir, atuando
integradamente nas atividades que propomos. Inicialmente os profissionais capacitados
para atuarem com as especificidades dos aposentados e idosos devem estar conscientes de
suas responsabilidades sociais, evitando as armadilhas das receitas do bom envelhecer
manifestadas por um exacerbado ativismo em que se preconiza que os idosos têm obrigação
de fazer alguma coisa. O que propomos é que a sua atuação num programa que inclua a
prevenção de quedas, não se limite a ele, que ele deve ir além, discutindo o envelhecimento
como algo que recebe as mais diversas influências da sociedade, passando pela questão do
25
exercício da cidadania. Isto pode ocorrer seja na participação em grupos reivindicativos
como algumas associações sejam elas de bairro, representativas de idosos, aposentados ou
sindicatos. Alertamos sempre em nossas capacitações, que o responsável por uma atividade
que é dirigida a um grupo predominantemente constituído de idosos deve se abster de
utilizar “concepções que prejulguem as capacidades dos idosos refletidas pela percepção do
processo do envelhecimento unicamente pelo sinal de diminuição, das perdas, dos riscos,
enfim de um processo involutivo do ser humano” (ALVES JUNIOR, 1999: 61).
Uma proposta global de prevenção de quedas também inclui uma reestruturação
das residências como mais uma alternativa. Entretanto sabemos que fazer uma
reestruturação nas residências, que adeqüe o ambiente a presença de pessoas que estão
envelhecendo não é uma tarefa das mais fáceis e devem-se levar em consideração três
aspectos. Primeiro sabemos que há idosos que moram sós e têm autonomia financeira, as
mudanças dependem em grande parte da influência que neles podemos exercer ou mesmo
através de parentes e amigos conscientes com alguns riscos com que este idoso convive.
Fazer o idoso compreender estas necessidades como prevenção é um grande desafio, já que
eles tendem a não se empolgarem com grandes mudanças na sua vida. Problema
semelhante pode ocorrer em lares onde os idosos têm autonomia financeira, são os
proprietários da residência e têm outros familiares como seus dependentes em coabitação.
Finalmente temos aqueles idosos que moram como dependentes dos parentes, em famílias
em que muitas vezes convivem várias gerações, neste caso a família tem que ter a
percepção de que é importante fazer as modificações e isto não ocorre com muita
facilidade. Pelos motivos apresentados é que vem justificando a nossa preocupação em
também sensibilizar a família para o problema das quedas.
Uma vez que estas dificuldades forem surgindo sugerimos: fixar tapetes ou mesmo
retirá-los, substituir pisos escorregadios e mesas de tampo vidro; eliminar banheiras,
substituindo camas e cadeiras muito baixas; instalar corrimãos nos corredores da casa,
próximo ao vaso sanitário e dentro do boxe do chuveiro, sendo que neste último se pode
instalar também um banco fixo; usar nas casas uma iluminação bastante clara, além de
instalar pequenas luzes nas tomadas que iluminem os corredores; eliminar fios elétricos
espalhados pelo chão; adequar a altura dos moradores às alturas de pias e armários. Outro
26
foco de nossa atenção envolve diretamente o idoso, e para os que têm muito receio das
quedas, recomenda-se o uso de equipamentos auxiliares da marcha como andadores,
bengalas ou cadeiras (PIERA, PETIT, CHRISPIN, 1999). Temos com certa veemência
defendido o uso do equipamento bengala, como um recurso a mais na prevenção, não
esperando que ocorra uma queda mais significativa para se fazer uso dela. Na verdade há
indicativos que permitem uma melhor recomendação ao uso deste equipamento, não
devendo seu uso ser contaminado com concepções pejorativas de que dela se utiliza é um
velho dependente. Finalmente, para todos, recomendamos a prática das atividades físicas
que tenham uma proposta que vise à prevenção de quedas dentro de uma perspectiva
educativa global.
O QUE PODE CONTER UM PROGRAMA DE ATIVIDADE FÍSICA QUE VISE À
PREVENÇÃO DE QUEDAS
Um programa de prevenção de quedas com atividades físicas só terá sucesso se for
compreendido a partir do reconhecimento da importância da intercomplementariedade de
um trabalho que seja multiprofissional. Consideraremos que a prática de uma atividade
física pode ser uma prática alternativa e agradável utilizada como recurso complementar às
diversas proposições que viemos de fazer. Somos a favor de fazê-la em contato com outras
pessoas, pois isto contribuirá também para a sociabilidade, já que “a prática de uma
atividade realizada por idosos no meio associativo, traz em si uma forte contribuição para a
re-inserção social de idosos e aposentados” (ALVES JUNIOR, 1999b: 1108). No caso das
atividades físicas recomendamos que os idosos procurem profissionais que tenham se
especializado no trabalho com idosos. Hoje já são vários os centros de formação
capacitados para preparar estes profissionais, não se justificando mais que o seu
aprendizado seja feito de maneira empírica, diretamente com os idosos. Até algum tempo
atrás, em decorrência de uma opção de mercado, muitas vezes isto ocorreu como regra já
que o assunto envelhecimento e atividade física não era muito abordado nas faculdades de
educação física. É de suma importância que os centros de formação de profissionais de
Educação Física tenham em seus currículos como disciplina o estudo das atividades físicas
praticadas por idosos ensinando como atuar especificamente com as questões referentes ao
envelhecimento senão corre-se o risco de improvisações. No campo das pesquisas
27
científicas é um campo ainda recente, mas que já existe muita produção de conhecimento
que pode servir de suporte para a prática pedagógica.
Sempre recomendamos àqueles que têm a intenção de intervir em programas que
têm idosos, que antes de iniciar um projeto de intervenção deva ser avaliado com qual tipo
de clientela se atuará, e não é o fato de duas pessoas terem a mesma idade cronológica que
elas façam parte de um mesmo grupo de interesse, que tenham habilidades semelhantes e
tenham as mesmas respostas ao esforço físico. Devemos estar atentos aos objetivos dos
praticantes, verificando antecipadamente quais são as atividades consideradas mais
apropriadas para cada tipo de público. Temos já há algum tempo apontado para existência
de um fenômeno de moda do tipo ‘vamos propor algum programa de atividade para
idosos’, pois para eles o que interessa é estarem em atividade fora de casa em contato com
os outros. Se em algum momento este tipo de proposta teve relativo sucesso, deveu-se em
parte a uma situação nova que se apresentava, onde alguns idosos aceitavam qualquer coisa
que lhes era sugerido. Um projeto para idosos sem uma boa fundamentação teórica, que
leve em conta onde se pode chegar, estará fatalmente comprometido e poderá fracassar,
principalmente devido ao alto grau de exigência que será a tônica das novas gerações de
idosos, que certamente neste século XXI não vão mais aceitar qualquer coisa. Não são
poucas as experiências calcadas no amadorismo e ingenuidade que confundem o trabalho
com idosos com o de crianças e tanto a infantilização como a escolarização dos conteúdos
foi por nós verificadas em diversos programas de atividades físicas para idosos (ALVES
JUNIOR, 1999 a).
Defendo a importância da prática de atividades físicas por idosos pelos aspectos
biológicos, psicológicos e sociais não abdicando do trabalho multidisciplinar que envolve
entre outros profissionais a parceria e troca de informações com o médico. Num trabalho
conjunto, este deverá estar sempre inteirado sobre o tipo de atividade que está sendo
realizada, sua intensidade a freqüência semanal etc. Este profissional deve encaminhar ao
responsável pela atividade, suas observações, possíveis limitações e recomendações
referentes a cada participante do grupo.
Parece ser definitivo que após os trabalhos de Maria Fiattorone, que a prática de
atividades físicas regulares em que haja resistência, pode melhorar a força das pessoas,
28
mesmo em pessoas muito idosas e frágeis. Também temos boas respostas no que toca as
atividades que visam à melhora do tempo de reação, mobilidade articular e o equilíbrio.
Num plano preventivo de quedas, apostamos na eficácia de propostas simples, que possam
ser repetidas pelos praticantes na própria residência e que tenham como base o equilíbrio, a
força muscular, a mobilidade articular e a estimulação do sistema proprioceptivo, entretanto
sabemos da importância do trabalho em grupo.
Na proposta que temos desenvolvido em nosso projeto visamos: a conservação nas
melhores condições possíveis dos diferentes receptores que são necessários à manutenção
do equilíbrio; a reativação da sensibilidade da planta dos pés; a percepção da posição do
corpo no espaço; melhorar a coordenação sensorio-motora; a manutenção em condições a
musculatura; ensinar os praticantes a se deslocar e reagir frente a obstáculos, com ou sem
ajuda da vista; ensinar a sair do solo após uma possível queda, e mesmo a cair protegendo
determinadas partes do corpo (LASCAUX, PERDIZET, 1999; PIERA, 2000; JACKOUT,
STRUBEL, PÉLISSIER, 1999). Sem querer ser exaustivo, parece ser esta conjunção que
irá permitir aos idosos uma melhor segurança nos seus deslocamentos e no enfrentamento
de uma situação de inevitável queda.
Acreditamos que propostas de trabalhos a serem realizados com aposentados e
pessoas idosas visando à prevenção de quedas tendem a ter mais sucesso quanto mais
simples elas forem, sendo fundamental que devam estar incluídas numa perspectiva
multidisciplinar, onde todos envolvidos estejam atentos às contradições do envelhecimento
multidiferencial, apostando na questão do prazer de estar entre semelhantes e estar diante
de uma atividade que lhe proporciona prazer. Além disso, parece ganhar cada vez mais
consenso, que propostas baseadas unicamente em idades cronológicas que limitem a
participação de alguém só pela data do seu nascimento, se apresentam como mais uma
forma preconceituosa, estigmatizante e simplista para decretar quando alguém se torna
velho, que pode também ser entendido como mais um ‘ageismo’, que reduz os idosos a um
ser de segunda categoria, dependente e isolado do resto da sociedade. Por este motivo
defendemos que um programa de prevenção de quedas deva ser incluído em propostas
associativas envolvendo adultos e idosos, tendo a abertura no sentido de entender que é de
suma importância aceitar a intergeracionalidade.
29
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O envelhecimento de uma sociedade vem sendo apontado como capaz de
influenciar mutuamente a política, a economia e as relações entre as gerações. É um fato
que não se deu de forma semelhante em nenhuma outra época, sendo surpreendente o que
ocorre em diversos países nestes últimos anos. Se os anos sessenta ficaram caracterizados
pela revolução em diversos sentidos empreendida pelos jovens, quarenta anos mais tarde
estamos entrando numa época em que, pelo menos em aparência, busca-se privilegiar uma
nova geração de pessoas que envelhecem.
Indesejável durante o século XX, a velhice acabou se tornando o envelhecimento
um problema social, principalmente nas sociedades que exacerbaram na valorização das
coisas mais afetas a jovialidade. Como conseqüência da perspectiva ‘antienvelhecimento’
das últimas décadas, desprezam-se, de forma direta ou velada, os velhos e a velhice. Se por
um lado aumenta-se a longevidade, a expectativa de vida e a proporção de pessoas
aposentadas frente aos mais jovens, paradoxalmente entre os novos aposentados poucos
querem se assumir como velhos ou estarem próximos da velhice. Como alternativa, criamse novas denominações e impõem-se modos de vida para eles, que associam essa fase da
vida a um período em que tudo é aparentemente permitido e possível de ser feito. É
inegável que nunca se falou tanto nessa nova idade, melhor representada como ‘terceira
idade’.
O que estaria por trás dessa pretensa redenção social para com aqueles que
envelhecem? Será que a sociedade contemporânea está passando a ter mais preocupação,
respeito e solidariedade, ou, ao contrário, estaria cada vez mais individualista, tentando
encontrar meios de se afastar e negar um modelo de velhice que associa a pessoa à idéia de
inutilidade e de peso para a sociedade? Os próprios idosos não se sentem à vontade para
falar da sua velhice, em geral, os exemplos são sempre a partir dos outros. Na procura de se
redefinir o significado da velhice, expressões como ‘feliz idade’, ‘melhor idade’, ‘boa
idade’ associam-se a ‘terceira idade’ transparecendo que existe para os aposentados uma
nova fase da vida, vista como um período alentador. Não é difícil constatar que essas
referências pecam pela ingenuidade aliada à tentativa de homogeneização de pessoas que só
têm em comum o fato de terem nascidos na mesma época. Não se pode negar que a mídia
30
em geral vem exercendo um papel de grande divulgador dessa perspectiva de
envelhecimento em que aos idosos pertencentes a essa ‘idade dourada’ tudo seria permitido
e possível de ser experimentado. A partir do que temos proposto no projeto de prevenção de
quedas que estamos como responsável evitamos cair nestas armadilhas, procurando
estabelecer um diálogo franco sobre os alcances e limitações do que estamos defendendo,
não nos apresentando como messiânicos ou salvacionistas.
31
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Dados do autor:
Edmundo de Drummond Alves Junior
Doutor em Educação Física
Professor do departamento de Educação Física da Universidade Federal Fluminense
Coordenador do Grupo de Pesquisa Envelhecimento e Atividade Física
Pesquisador do Grupo ANIMA.
e-mail [email protected]
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ASPECTOS BIOMECÂNICOS DO ENVELHECIMENTO RELACIONADOS
COM O RISCO DE QUEDA: EQUILÍBRIO E MARCHA
Profa Dra Liliam Fernandes de Oliveira
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Prof. Taian de Mello Martins Vieira
Universidade Federal do Rio de Janeiro
RESUMO
Devido ao aumento da população mundial de idosos, tem crescido o interesse de
pesquisadores em identificar os fatores biomecânicos relacionados às quedas. O equilíbrio
postural, estudado na condição estática (na postura de pé) e dinâmica (na marcha) durante o
envelhecimento, revela-se como um agente importante para a mobilidade funcional e tem
sido investigado através da técnica da estabilometria. Embora o risco de queda necessite de
uma abordagem multifatorial, as alterações do sistema de controle do equilíbrio têm relação
direta com a propensão à queda e já são largamente descritas na literatura. Contudo, tendo
em vista que o processo de envelhecimento implica em déficits diferenciados individuais
dos mecanismos de controle, geralmente agravados pela presença de patologias, ainda não é
possível quantificar precisamente o risco de queda. No entanto, apesar desta dificuldade, é
comprovada a importância da prática de atividade física na manutenção da mobilidade
funcional do idoso e redução do risco de queda.
Palavras-chave: equilíbrio postural, marcha, envelhecimento, biomecânica
INTRODUÇÃO
A população de idosos no mundo cresce aceleradamente, principalmente em países
mais desenvolvidos. Em torno de 2040 a expectativa de vida para homens e mulheres é de
respectivamente 75 e 83 anos (DALEY et al., 2000). Qual será a qualidade de vida desses
anos adicionais? Para a liberdade de movimento e realização pessoal, um certo grau de
independência funcional é necessário, onde a manutenção da mobilidade é um aspecto
central desta questão. Deficiências relacionadas ao controle do equilíbrio e da postura
podem limitar severamente as atividades durante a vida diária. Um dos problemas mais
agravantes para o declínio da mobilidade é a tendência de queda na população idosa
(LORD et al., 2001, SPIRDUSO, 1995).
Direta ou indiretamente, a queda representa uma importante parcela da taxa de
mortalidade em pessoas acima dos 65 anos (DALEY et al., 2000), somando 40% das
35
mortes decorrentes de lesões e 1% do total de mortes nesta faixa etária (SCHULTZ, 1992).
Cerca de um terço dos idosos de comunidades ativas sofrem pelo menos uma queda por ano
(HAUSDORFF et al., 1997), sendo mais freqüentes em mulheres do que em homens
(CAMPBELL et al., 1989). Pesquisadores têm-se dedicado a compreender as causas que
provocam as quedas identificando fatores de risco, que são diferenciados em intrínsecos e
extrínsecos. Os intrínsecos estão relacionados às características fisiológicas naturais ou
patológicas decorrentes do processo de envelhecimento, enquanto os extrínsecos envolvem
aspectos do ambiente como luminosidade, obstáculos, tipos de superfície etc.
(GAUCHARD et al. 2001). Ainda são importantes os fatores atribuídos às relações sociais
e ao estado emocional, ressaltando a necessidade de uma abordagem multidisciplinar no
estudo do envelhecimento. Neste contexto, a biomecânica é uma área do conhecimento que
muito tem contribuído para elucidar questões relativas às alterações físicas do corpo
humano com o avançar da idade e identificar deficiências mecânicas levando a um
potencial risco de queda.
A priori, a biomecânica procura explicar o equilíbrio e o movimento, considerando
as causas e conseqüências, através da análise das forças internas e externas que atuam no
corpo humano. Juntamente com os conhecimentos da fisiologia e do controle motor, é
possível avaliar o desempenho funcional e suas implicações no padrão de atividade
biológica.
Neste capítulo serão considerados, os dois mais significantes fatores de risco para
limitação da mobilidade e para a queda nos idosos: o equilíbrio e a marcha (DALEY et al.,
2000).
ENVELHECIMENTO NATURAL OU PATOLOGIAS INSTALADAS
O processo de envelhecimento não está dissociado do aspecto cronológico, porém,
sua caracterização depende da alteração de mecanismos fisiológicos, inerentes ao
organismo vivo, que provocam a redução da capacidade funcional, adaptativa e
eventualmente a morte (SPIRDUSO, 1995). Em uma nova abordagem, as alterações
fisiológicas decorrentes do processo natural de envelhecimento são comprometidas em
graus específicos de acordo com a presença de determinadas patologias (SHUPERT e
HORAK, 1999). Uma maneira pessimista e incoerente de se observar os efeitos da
36
passagem do tempo nas pessoas, é imaginar um declínio linear e generalizado da atividade
dos sistemas indispensáveis a uma vida diária ativa, como músculo-esquelético e nervoso.
Estudos com idosos apresentam resultados discrepantes conferindo heterogeneidade a este
grupo. A diferença encontrada nos resultados, quando as metodologias utilizadas são
controladas, denota a preservação, dentro de um padrão de eficiência, das funções do
organismo vivo com a idade, até o aparecimento de patologias que afetem a sua atividade.
Se comparada ao envelhecimento natural, a elevada probabilidade de desenvolver
patologias específicas que interferem no controle destes sistemas, tem se mostrado como o
principal fator de interesse entre os pesquisadores (ROMERO e STELMACH, 2003).
Independente da causa – tanto pelas alterações fisiológicas instaladas pelo
envelhecimento natural, como pelo desenvolvimento de doenças específicas – a imutável
ação da gravidade contra a manutenção da postura de pé é agravada com o tempo. As
corridas são substituídas por caminhadas, as reações a diferentes estímulos em ambientes
variados se tornam mais lentas e a coordenação motora exigida em atividades complexas ou
no aprendizado de uma nova tarefa é menos eficiente (SPIRDUSO, 1995). O declínio da
força muscular é evidente, podendo, em situações extremas, impossibilitar a sustentação do
próprio peso ao subir um degrau. De acordo com SHUMWAY-COOK et al. (1997),
mulheres acima de 90 anos geralmente apresentam dificuldade em se levantar de uma
cadeira em decorrência da perda de força muscular do grupo extensor de joelho.
A mobilidade funcional é um termo que se refere às manobras utilizadas durante a
marcha e para controle do equilíbrio no cotidiano, como girar o corpo ao andar ou
simplesmente quando se permanece em postura ortostática (PODSIADLO et al., 1991). A
reduzida mobilidade, evidente a partir dos 65 anos, gera um dos mais graves problemas de
saúde em pessoas idosas, a dependência funcional (LA CROIX et al., 1997, HO et al.,
1997).
EQUILÍBRIO POSTURAL E ALTERAÇÕES COM O ENVELHECIMENTO
A tarefa primária do sistema de controle do equilíbrio é manter o centro de
gravidade dentro dos limites compreendidos pelo contato do corpo com a superfície.
Quando o corpo permanece estático e de pé, este contato se restringe à área delimitada pelo
contorno dos pés, e a atuação do sistema de controle postural se traduz em um processo
37
dinâmico. Mecanismos de controle neuromuscular, como o limiar de ativação sensorial,
atrasos na velocidade de condução do sistema nervoso, tipo de recrutamento de unidades
musculares e flutuações musculares, em conjunto com fatores intrínsecos ao organismo
vivo, como o batimento cardíaco e a freqüência respiratória, não permitem a manutenção
do centro de gravidade corporal em um ponto específico no espaço, o que confere pequenas
oscilações ao corpo. O estudo dessas oscilações permite quantificar a atuação dos sistemas
de controle postural e tem trazido contribuições no conhecimento de alterações no
equilíbrio e revelando potencias fatores de queda na população de idosos.
CONCEITOS DE ORIENTAÇÃO E ESTABILIDADE
Imagine uma criança que alegremente brinca com seu boneco e durante suas
aventuras imaginárias, deseja colocar o seu brinquedo sobre algum lugar e em uma
determinada posição. Para isso, é preciso que todas as partes móveis do boneco sejam
ajustadas para uma orientação específica, o que chamamos de postura. A sustentação sobre
a superfície desejada depende, então, da postura solicitada e do contato do boneco com o
seu apoio. Simplesmente observando a permanência do brinquedo nesta situação, a criança
é capaz de identificar se obteve êxito em sua tarefa. Caso o boneco caia, novos ajustes são
necessários para uma outra tentativa. É de maneira semelhante que o sistema nervoso
central regula as diferentes posturas que somos capazes de adotar. Desta forma, pode-se
dizer que a manutenção do corpo em uma determinada postura para a realização de
diferentes tarefas corresponde ao equilíbrio postural. Nesta seção serão abordados os
principais aspectos envolvidos na regulação do equilíbrio, enfatizando a postura de pé, e
suas implicações com as quedas, assim como a elaboração de medidas de intervenção para
desenvolver o controle do equilíbrio.
Durante as atividades da vida diária, o corpo humano se depara com inúmeras
tarefas que exigem a manutenção de posturas específicas para sua execução e, portanto, o
sistema nervoso central (SNC) deve considerar informações do ambiente, assim como suas
próprias condições de funcionamento. Deste modo, o sistema de controle postural depende
da relação estabelecida entre o indivíduo, o ambiente e a tarefa a que se está sujeito em um
determinado momento. Como resultado final deste processo, duas finalidades podem ser
atribuídas à regulação da postura: orientação e estabilidade. A orientação é compreendida
38
pelo posicionamento adequado do corpo e seus segmentos no espaço, enquanto a
estabilidade se refere à capacidade de manutenção desta situação (SHUMWAY-COOK e
WOOLLACOTT, 1995). Como exemplo, embora a ação dos músculos flexores de cotovelo
sejam indispensáveis para sustentar um objeto pesado a frente do corpo (o que corresponde
à orientação dos segmentos para esta tarefa), isto não seria conseguido sem a atividade da
musculatura posterior dos membros inferiores e do tronco, evitando que o corpo fosse
projetado em direção ao solo pela ação da carga (estabilidade).
CONTROLE DO EQUILÍBRIO POSTURAL
Manter a postura de pé é uma tarefa que exige um complexo sistema sensoriomotor de controle postural, que opera através de um conjunto de informações provenientes
de sistemas sensoriais especializados, produzindo respostas manifestadas pela atividade
muscular para corrigir os desvios do centro de massa do corpo (LIN et al., 2005,
PETERKA, 2000, PRIETO et al., 1996).
A principal fonte de perturbação para o equilíbrio é a ação da gravidade, que pode
ser entendida como uma força a qual os segmentos do corpo estão permanentemente
sujeitos, na direção do solo. Para simplificação, os estudos sobre equilíbrio postural,
consideram a ação da gravidade em um ponto específico no corpo, o centro de gravidade
(CG) (ROBERTS, 1995). No caso da postura de pé, este ponto geralmente é localizado a
alguns centímetros à frente da articulação lombossacra, ao nível do quadril. A projeção do
CG sobre a base de suporte, que corresponde à área de contato dos pés com o solo,
determina a relação de estabilidade, cujos limites representam a base de suporte funcional,
ou seja, a região em que o CG pode ser deslocado sem que seja necessário modificar a base.
Para contrapor a ação da gravidade, é necessária a ativação de grupos musculares
específicos, chamados músculos antigravitacionais, como os posteriores da perna e do
tronco, que estão constantemente promovendo ajustes na posição do CG, conferindo sua
natureza oscilatória.
As respostas musculares adequadas só podem ser solicitadas a partir do
reconhecimento atual do corpo em um determinado instante. Enquanto a criança utiliza a
sua visão para promover os ajustes no brinquedo, o corpo humano dispõe, também, de
informações sobre sua posição e movimentação no espaço, assim como de seus segmentos
39
(LORD et al., 2001). Três sistemas sensoriais contribuem, de forma integrada, para esta
representação interna do corpo: sistema visual, somatossensorial e vestibular.
a) Sistema visual – Os mecanismos de identificação dos estímulos visuais são
indispensáveis para o controle do equilíbrio postural, indicando ao SNC sobre movimentos
do corpo em relação ao ambiente, uma vez que ligeiros movimentos, lineares ou angulares,
promovem desvios das imagens projetadas sobre a retina. Essa seqüência de imagens
formadas corresponde a movimentos relativos da cabeça, ou decorrentes do próprio
indivíduo ou de um estímulo externo a ele, de modo que a indistinção da causa penaliza os
ajustes posturais para o equilíbrio (ROBERTS, 1995).
b) Sistema somatossensorial – Possibilita ao sistema de controle postural a
discriminação adequada da orientação entre o corpo e seus segmentos, assim como a sua
relação com a superfície de suporte, e recebe este nome por compreender diversas funções
sensoriais, incluindo a propriocepção mediada pelo fuso muscular, órgão tendinoso de golgi
(OTG) e pelos receptores articulares, e a exterocepção proveniente de sensações cutâneas a
partir de receptores localizados na superfície do corpo (SHUPERT e HORAK, 1999).
c) Sistema vestibular – Sua função é identificar a posição e movimentação da
cabeça em relação à ação da gravidade, o que pode ser observado quando subimos uma
ladeira. Embora nesta situação a superfície seja inclinada, a direção e o sentido da força
gravitacional atuante no corpo não se alteram. Para compensar o desnível do solo, o corpo é
inclinado à frente. O sistema vestibular é responsável, ainda, pela regulação dos
movimentos da cabeça em conjunto com os do globo ocular, a fim de permitir a fixação do
olhar em um determinado objetivo.
As informações provenientes destes sistemas sensoriais são utilizadas pelo sistema
de controle postural para representar, internamente, a orientação do corpo no espaço,
processo que, pela sua complexidade, exige a ativação de centros superiores do sistema
nervoso, principalmente do tronco cerebral e do cerebelo (MORASSO et al., 1999).
Embora os mecanismos utilizados para a representação do estado do corpo não estejam
esclarecidos, sabe-se que o sistema de controle é capaz de reconhecer quando uma
informação sensorial é precisa, atribuindo-lhe maior importância (SHUMWAY-COOK e
WOOLLACOTT, 1995). Por exemplo: quando se está em um ambiente escuro, ainda assim
40
o corpo é capaz de manter-se em pé, pois apesar da informação visual não ser adequada, a
contribuição dos sistemas vestibular e somatossensorial se torna maior para a representação
do corpo.
Durante a manutenção da postura de pé, em situação relaxada, as informações dos
sistemas sensoriais contribuem de forma redundante para o equilíbrio, pois esta tarefa é
caracterizada pelo controle de pequenas perturbações, que decorrem do próprio corpo e não
oferecem grande demanda aos sistemas. No envelhecimento, a capacidade destes sistemas
de fornecer informações pode ser atenuada por uma determinada patologia (ROMERO e
STELMACH, 2003), revelando alterações das oscilações na postura de pé.
ESTABILOMETRIA
Embora nossa acuidade visual não permita observar estas oscilações, os
pesquisadores dispõem de uma técnica específica para quantificá-las, conhecida como
estabilometria (OLIVEIRA, 1996), que consiste na utilização de plataformas de força
(balança com dispositivos eletrônicos sensíveis à deformação) para calcular o deslocamento
do centro de pressão (CP) durante um determinado período.
O CP corresponde à
localização, dentro da base de suporte, da força resultante da reação do solo sobre o corpo,
que tem a mesma intensidade e direção, mas em sentido oposto à força do peso aplicada no
solo. Normalmente, os testes estabilométricos estáticos são feitos com o indivíduo de pé
sobre a plataforma, em duas condições visuais; olhos abertos e fechados. Dependendo do
objetivo, o período de teste é variável e pode ser de curta duração (20 segundos até 2
minutos) ou longa duração (até 30 minutos VIEIRA e OLIVEIRA, 2006, FREITAS et al.,
2004). Alguns dos parâmetros característicos das oscilações posturais mais estudados são a
área e a velocidade de deslocamento (OLIVEIRA et al., 1996, MELLO et al., 2002). Um
indivíduo de pé, com base confortável, apresenta uma amplitude de oscilação em torno de
5mm na direção lateral e 10 mm na anteroposterior (WIECZOREK, 2004). Existem
também sistemas de plataformas móveis, que criam perturbações em translação e rotação,
com intensidades e freqüências ajustáveis, chamados de posturografia dinâmica, que são
importantes no estudo do controle da recuperação do equilíbrio. Os testes estabilométricos
têm sido largamente utilizados nas pesquisas das alterações do equilíbrio e do risco de
queda em idosos.
41
ALTERAÇÕES COM O ENVELHECIMENTO
A orientação espacial dos segmentos na postura ortostática reflete uma estratégia
individual de sustentação contra a ação da gravidade, analisada em termos de
compensações e assimetrias. Pessoas acima de 60 anos apresentam, geralmente, uma
postura caracterizada pela tendência de flexão dos segmentos cuja severidade está
correlacionada com a debilidade muscular dos membros inferiores e do tronco, com a
reduzida capacidade de equilíbrio e com a intensificação de dores na região lombar e
cervical da coluna (BALZINI et al., 2003, SHUMWAY-COOK e WOOLLACOTT, 1995).
HIROSE et al. (2004) identificaram, em um grupo de 237 idosos, quatro padrões posturais
específicos, caracterizados de acordo com as curvaturas da coluna vertebral no plano
sagital.
Com o objetivo de quantificar as oscilações posturais, diversos estudos mostraram
que indivíduos idosos tendem a oscilar mais. TEASDALE et al. (1991) demonstraram um
aumento da amplitude de oscilação de 18% e da velocidade de deslocamento de 43% de um
grupo de idosos comparados com jovens adultos, em testes de olhos abertos. CHOY et al.
(2003) mostraram que a partir dos 60 anos, a velocidade de deslocamento do centro de
pressão aumenta significativamente, enquanto FUJITA et al. (2005) evidenciaram um
aumento significativo da área de oscilação para pessoas acima de 80 anos. A tendência de
aumento destes parâmetros é relatada em outros estudos (VIEIRA et al., 2006, PRIETO et
al., 1996).
Embora idosos saudáveis consigam compensar a redução da informação de um dos
sistemas sensoriais, quando duas ou mais fontes estão ausentes ou distorcidas, um aumento
das oscilações é observado. CHOY et al. (2003) verificaram que na situação de olhos
fechados e sobre uma superfície de espuma, a velocidade de deslocamento do centro de
pressão se torna significativamente maior a partir dos 50 anos de idade. Quando uma fonte
de informação é sucessivamente retirada e reapresentada, os idosos têm mais dificuldade de
reintegrar de forma correta estas informações para recuperar a estabilidade, em contraste
com os jovens que rapidamente se adaptam (ROMERO e STELMACH, 2003).
Para verificar o desempenho do sistema de controle do equilíbrio postural frente a
situações desafiantes, estudos têm elaborado protocolos experimentais com este fim. A
42
redução das dimensões da superfície de contato, o aumento da altura em relação ao solo, a
movimentação do ambiente em torno do indivíduo, ou simplesmente adotar a base
unipodal, são exemplos destes procedimentos (ADKIN et al., 2000, CHOY et al., 2003,
SHUMWAY-COOK e WOOLLACOTT, 1995, LORD et al., 2001).
Em relação ao risco de quedas, parece que o deslocamento lateral é uma
característica importante. Pessoas com mais idade e com um histórico de queda, apresentam
um aumento das oscilações laterais durante testes onde a base é reduzida lateralmente e,
quando de olhos fechados, adotam uma estratégia caracterizada como passo de proteção
(LORD et al., 2001). ROGERS e MILLE (2003) relatam que indivíduos idosos têm
dificuldades em compensar as perturbações laterais e podem reagir com um passo cruzado,
onde o membro inferior sem sustentação do peso é deslocado a frente do membro de apoio,
aumentando o risco de contato e posteriormente de queda.
O declínio do funcionamento dos sistemas sensoriais, motor e de integração com a
idade, está associado com a queda em pessoas de mais idade, que vivenciam a perda de
parte de sua função sensoriomotora mesmo sem documentarem a presença de uma
determinada doença ou patologia. Muitos idosos com histórico de queda e sem relato de
doenças neurológicas ou músculo-esqueléticas apresentam baixos desempenhos em testes
funcionais (SHUMWAY-COOK et al., 1997), que envolvem aspectos relacionados ao
equilíbrio e a locomoção.
MARCHA HUMANA E ALTERAÇÕES COM O ENVELHECIMENTO
Em termos cinesiológicos, a marcha humana é uma atividade resultante do
aprendizado, sendo o movimento do corpo caracterizado pela seqüência de apoios
sucessivos dos pés. A manutenção do equilíbrio durante a marcha representa um desafio
considerável para o sistema de controle postural de modo que a locomoção pode ser
dividida em quatro sub-tarefas: a geração de movimento contínuo para atingir um
determinado destino; a manutenção do equilíbrio durante a progressão; a capacidade de
adaptação às questões ambientais e o início e término do objetivo da locomoção (LORD et
al., 2001).
Devido a sua natureza cíclica, a análise de um ciclo da marcha é suficiente para
identificar um padrão de movimento dos segmentos do corpo, representativo do todo. Este
43
padrão é definido por subdivisões do ciclo baseado em eventos mecânicos importantes. A
forma mais elementar de se observar a marcha é através da divisão entre suporte simples e
duplo, conforme o tempo de contato entre um dos pés ou de ambos os pés com o solo,
respectivamente. Na marcha normal, o tempo de suporte simples é aproximadamente três
vezes maior do que o de suporte duplo (INMAN, 1981). Para fins de estudos mais
detalhados, utiliza-se a divisão de quatro fases principais:
a) Fase do toque de calcanhar – Representa o primeiro contato com o solo, com
duração aproximada de 10% do ciclo, caracterizado por um impacto mecânico, onde a força
de reação do solo é de cerca de 120% do peso corporal. Nesta fase, o funcionamento
adequado dos mecanismos de amortecimento é essencial para prevenção de lesões.
b) Fase de apoio total – Caracterizada pelo contato total do pé com o solo. Tem
duração média de 30% do ciclo e corresponde a um período de transferência do peso pela
linha média do corpo.
c) Fase de propulsão – Definida pela ação muscular impulsionando o corpo para
frente, enquanto o calcanhar está elevado, com duração de 20% do ciclo.
d) Fase de balanço – Quando o membro inferior, após a perda de contato com o
solo, se desloca livremente para frente, até o próximo contato do calcanhar, com duração de
aproximadamente 40% do ciclo. Durante esta fase, o membro inferior oposto se encontra
em apoio simples.
Durante o apoio simples, o corpo está em um estado inerente de instabilidade
devido à projeção vertical do centro de massa passar próximo da borda medial do pé e não
no centro da base de suporte. Para o membro inferior que se desloca para frente, os dedos
do pé passam a uma altura menor que um centímetro do solo. A cabeça, o tronco e os
braços, que representam cerca de 60% de toda a massa corporal, têm que ser controlados
pela musculatura do quadril para evitar inclinações. O único período de estabilidade é
durante o duplo suporte e mesmo durante este período, os pés não estão completamente
apoiados no solo enquanto os outros segmentos se deslocam em máxima velocidade
(PRINCE et al., 1997).
44
ALTERAÇÕES DA MARCHA COM O ENVELHECIMENTO
As alterações dos sistemas sensoriais responsáveis pelo controle do equilíbrio
dinâmico, com a idade, podem comprometer a estabilização do corpo na marcha. As
principais alterações biomecânicas da marcha com o envelhecimento são estudadas há mais
de três décadas e são largamente descritas na literatura.
A velocidade mais lenta da marcha do idoso, causada principalmente pelo aumento
da fase de duplo contato da marcha é uma característica comum. Este prolongamento da
fase de contato parece ser uma estratégia desenvolvida pelo sistema nervoso para se obter
um aumento da estabilidade postural. Segundo estudos clássicos de HIMAN e
colaboradores (1988) a taxa de declínio da velocidade da marcha em pessoas acima de 62
anos aumenta de 2,5 e 4,5% em homens e mulheres respectivamente para 16 e 12 % por
década de vida. Embora a velocidade de marcha nos idosos seja reduzida, os jovens podem
caminhar de forma mais lenta quando solicitados. A dificuldade dos idosos em
apresentarem velocidades extremamente lentas de sua marcha é decorrente do aumento da
demanda de atividade muscular, principalmente ao nível do quadril, para controle do
movimento, em função do tempo mais prolongado das fases de contato (LEIPER e CRAIK,
1992).
Também o comprimento do passo é significativamente reduzido com a idade.
Enquanto na população de jovens o comprimento do passo compreende a faixa de 151 a
170 cm, nos idosos estes valores reduzem para 135 a 153 cm. O aumento da flexão do
quadril na marcha do idoso pode ser uma precaução inconsciente contra tropeços ou uma
tentativa para manter o comprimento do passo. Também, é comum observar na marcha do
idoso a redução da flexão plantar, o que pode explicar a diminuição da potência da fase de
propulsão (WINTER et al., 1990; OSTROSKY et al., 1994).
Em um estudo de WIEMAN et al. (1992), o comportamento de 15 grupos
musculares foi monitorado e comparado entre grupos de jovens e idosos, durante a marcha
(de 10 a 17 ciclos). Os resultados demonstraram, curiosamente, que no grupo de jovens a
variabilidade do padrão de atividade muscular foi maior. Esta comparação indicou que os
idosos apresentaram um padrão motor mais consistente, que pode ser interpretado de duas
formas: reduzida capacidade do sistema nervoso em responder a diferentes estímulos ou o
45
resultado espontâneo caracterizado por uma marcha mais cautelosa. Comportamento
semelhante foi observado por CRAIK e colaboradores (1992) em relação à velocidade da
marcha. Quando idosos e jovens foram solicitados a andar de forma mais rápida e mais
lenta possíveis, a variabilidade dos jovens foi significativamente maior do que a dos idosos.
Um dado importante relacionado ao potencial de queda é o que descreve a ação da
musculatura responsável pela frenagem do movimento da perna durante o fim do balanço
(isquiotibiais). Este grupamento muscular apresenta um atraso do início da sua atividade
nos idosos em relação aos jovens, o que pode explicar a maior componente horizontal no
toque do calcanhar, refletindo uma maior tendência ao deslizamento do pé sobre o solo
(WIEMAN et al., 1992). Este fato, somado à tendência do pé em alcançar o solo de forma
mais achatada, aumentam o risco de queda nesta fase da marcha (WINTER et al., 1990).
Todas estas diferenças indicam uma adaptação do idoso para um padrão de marcha mais
seguro e mais estável.
Estudos específicos sobre os mecanismos causadores de quedas durante a marcha
são mais recentes e envolvem a descrição de estratégias adotadas frente a perturbações ou
presença de obstáculos na superfície (MEYER e AYALON, 2006). A grande motivação
desta nova abordagem é o fato de que maior proporção das quedas se deve ao tropeço.
Logo, a avaliação isolada do gesto de andar resulta em informação limitada sobre a
habilidade individual em se deslocar em ambientes potencialmente ameaçadores. Além
disso, a análise da transposição de obstáculos provê mais esclarecimentos sobre o papel do
componente adaptativo no controle postural (LORD et al., 2001).
A recuperação de uma perturbação intensa, como escorregar, é alcançada quando a
estabilidade do movimento pode ser restabelecida com um passo de proteção
compensatório: ato de dar um passo a partir de uma posição, estacionária ou dinâmica, que
requer a perda momentânea do equilíbrio e sua retomada. Esta estratégia é crítica para
evitar a queda eminente e demanda uma combinação adequada do comprimento do passo,
tempo de execução e força dos músculos dos membros inferiores. Esta atividade
geralmente se torna mais difícil com o aumento da idade e suscita respostas mais intensas
do que as dos jovens, para uma mesma condição (WOOLLACOTT e ASSAIANTE, 2002).
O desequilíbrio do corpo durante a transposição de obstáculos pode causar movimentos
46
inapropriados das extremidades inferiores, ocasionando possíveis contatos do pé com o
obstáculo.
Para evitar uma queda, é necessária uma resposta em três fases, que envolve a
percepção de uma ameaça eminente, a seleção da conduta apropriada como resposta e a sua
execução. Idosos parecem usar uma estratégia mais conservativa para esta transposição,
com redução da velocidade de passagem pelo obstáculo, do comprimento do passo e da
distância entre o obstáculo e o subseqüente contato do calcanhar. A flexão do quadril é
maior para enfatizar a elevação do pé (LORD et al., 2001; MEYER e AYALON, 2006). O
estudo de McKENZIE e BROWN (2004), evidenciou diferentes respostas nos idosos para
transposição de um mesmo obstáculo, porém em diferentes condições de ameaça à
estabilidade, representadas pelo estreitamento do caminho e altura relativa ao solo. Este
resultado demonstra que as diferentes estratégias de transposição de obstáculos não são
decorrentes apenas de limitações fisiológicas e/ou biomecânicas, mas refletem também, um
estado psicológico conhecido como “medo da queda”.
TREINAMENTO DO EQUILÍBRIO E MARCHA: PREVENÇÃO DE QUEDAS
Até o momento, foram relatas as principais alterações biomecânicas do equilíbrio e
da marcha durante o processo de envelhecimento. Outrossim, numerosos trabalhos
demonstram que os efeitos da idade são passíveis de intervenção, principalmente através da
atividade física, promovendo a manutenção ou recuperação da qualidade de vida.
Na maioria dos trabalhos, os programas de atividades físicas são gerais
envolvendo os exercícios para fortalecimento e alongamento, os funcionais e os lúdicos.
Como exemplo, BARNETT et al., 2003, observaram uma melhora no controle do
equilíbrio e a redução da taxa de queda em idosos considerados sob risco, a partir de um
programa de treinamento constituído de alongamentos dos músculos dos membros
inferiores, exercícios para o desenvolvimento do equilíbrio, coordenação, capacidade
aeróbica e força muscular. Os exercícios de equilíbrio envolviam manobras de Tai Chi
Chuam modificadas, prática de passos, alterações na direção, passos de dança e atirar e
apanhar uma bola.
Estudos que visam à intervenção específica no equilíbrio da postura de pé e na
marcha, são menos freqüentes e adotam modelos experimentais mais diferenciados. NITZ
47
E CHOY (2003), avaliaram a eficácia de um programa de treinamento específico para o
equilíbrio na prevenção de quedas, onde os participantes praticavam uma vez por semana,
em um total de 10 sessões, uma série de oito exercícios direcionados para o treinamento do
equilíbrio, como exemplo; sentar e levantar, ampliação do limite de estabilidade, tarefas de
alcance lateral e prática da estratégia do equilíbrio com movimentos na articulação do
tornozelo, quadril e articulações dos membros superiores. Encontraram melhoras
significativas nos testes clínicos funcionais para o grupo de intervenção e a redução do
número de quedas. Um programa similar foi proposto por ROGERS et al. (2003),
consistindo de exercícios com mudança de base e transferência de peso, em diferentes tipos
de superfícies e condições visuais. Os autores apresentaram ainda, um circuito modular
com obstáculos, constituído de nove estações reproduzindo situações funcionais comuns,
encontradas em diferentes ambientes, com objetivo principal de solicitar diferentes
estratégias relacionadas ao equilíbrio, estático e dinâmico.
Sistemas sofisticados, baseados em biofeedback, onde o indivíduo tem o retorno
sobre o seu desempenho durante a tarefa, são menos empregados clinicamente para
intervenção no equilíbrio estático e dinâmico, restringindo-se às pesquisas científicas.
Plataformas de força com biofeedback, que apresentam na tela de um monitor o
deslocamento do centro de pressão (WIECZOREK, 2004, SHUMWAY-COOK e
WOOLLACOTT, 1995), podem ser utilizadas para treinamento, pelo controle voluntário
das oscilações posturais. O recurso de biofeedback também tem sido utilizado para a
marcha em esteira rolante, onde a informação apresentada é relativa à intensidade da ação
muscular dos membros inferiores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A manutenção da estabilidade postural é uma habilidade extremamente complexa
que depende da coordenação de inúmeros fatores fisiológicos e biomecânicos. O
envelhecimento normal está associado com decréscimo da capacidade de manter a
estabilidade da postura de pé, quando respondendo a perturbações inesperadas, durante a
marcha e na transposição de obstáculos. Esse déficit na estabilidade postural nas pessoas
idosas pode ser explicado pela redução da força muscular, sensação periférica, acuidade
visual, função vestibular e o processamento do sistema nervoso central. Não obstante,
48
numerosos trabalhos, na área da biomecânica, têm confirmado a efetividade da prática da
atividade física, específica ou generalizada, na manutenção (e/ou recuperação) da
capacidade funcional dos sistemas envolvidos no controle do equilíbrio, garantindo ao
idoso, a preservação de sua mobilidade física, refletindo na sua independência social.
49
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52
Dados dos autores
Liliam Fernandes de Oliveira
Chefe do Departamento de Biociências da Atividade Física
Coordenadora Laboratório de Biomecânica
Escola de Educação Física e Desportos
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Av Pau Brasil 540, Cidade Universitária
Ilha do Fundão CEP 21941590
Rio de Janeiro
[email protected]
Taian de Mello Martins Vieira
Professor Colaborador de Biomecânica
Laboratório de Biomecânica
Escola de Educação Física e Desportos
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Av Pau Brasil 540, Cidade Universitária
Ilha do Fundão CEP 21941590
Rio de Janeiro
[email protected]
53
COMPREENDENDO O ENVELHECIMENTO FISIOLÓGICO E SUA
RELAÇÃO COM POSSÍVEIS QUEDAS
Prof. Dra. Fátima Palha de Oliveira
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Prof. Ms André Favre
Universidade Estácio de Sá
RESUMO
O presente capítulo enfoca a ação do processo de envelhecimento em algumas funções
fisiológicas que são essenciais para a manutenção da saúde geral dos idosos e que, quando
preservadas, contribuem para uma menor incidência de quedas. São sugeridas intervenções
preventivas pelo exercício físico com o objetivo de retardar esse processo degenerativo e,
assim, garantindo uma melhor qualidade de vida. Os fatores que contribuem para a maior
incidência de quedas são abordados e, em seguida, é apresentado um projeto que avalia
possíveis fatores de risco para a queda em idosos de Petrópolis.
Palavras chaves: funções fisiológicas, força muscular, osteoporose, quedas.
INTRODUÇÃO
Em virtude da maior longevidade, a população de idosos apresenta um crescimento
expressivo, ou seja, mais pessoas estão vivendo por mais tempo. Diversos são os fatores
responsáveis por esse comportamento populacional; e, sem dúvida, os avanços tecnológicos
e científicos têm contribuído significativamente para isso.
Vale lembrar que políticas de saúde pública, associadas às de saneamento básico,
como a ampliação da rede de abastecimento de água e a de esgotos, proporcionaram a
diminuição de óbitos motivados por doenças infecciosas, parasitárias e as chamadas
“doenças de subdesenvolvimento”. Com o envelhecimento da população, observou-se o
aumento da taxa de óbitos por doenças crônicas e degenerativas mais comuns em idosos
(PARAYBA, 1995). Outro problema específico desse segmento populacional é a elevada
incidência de quedas que podem deixar seqüelas físicas que contribuem para a
incapacitação e muitas vezes para óbitos (BLACK et al., 1993). Esse é, pois, um problema
de saúde pública que acarreta gastos elevados além do sofrimento humano. Os fatores que
podem provocar quedas em indivíduos idosos são diversos, por exemplo: a deterioração da
visão, o uso de medicamentos (diuréticos e psicoativos), o comprometimento da
54
flexibilidade e força muscular (PERRACINE e RAMOS, 2002; Guimarães e Farinatti,
2005), diminuição no controle postural (BLACK et al., 1993), fatores socioeconômicos
(ROSA et al., 2003).
É importante destacar que ações preventivas de problemas específicos do idoso
contribuirão para um menor índice de incapacidades, lesões ou doenças, proporcionando
melhoria na qualidade de vida dessa faixa etária. O presente capítulo objetiva apresentar
aspectos fisiológicos relativos ao processo de envelhecimento enfocando o problema da
queda em idosos.
EVIDÊNCIAS FISIOLÓGICAS DO PROCESSO DE ENVELHECIMENTO
Capacidade funcional
A curva da capacidade funcional de indivíduos saudáveis varia, ascendentemente,
até em torno de 30 anos de idade, quando começa a decrescer em função do processo de
envelhecimento. A velocidade de declínio das funções fisiológicas depende de diversos
fatores (genéticos, comportamentais, ambientais etc.) que determinam a resposta do
organismo aos estímulos. Sabe-se que um estilo de vida ativa, apesar de não evitar o
processo de envelhecimento, proporciona um declínio menos acentuado dos níveis gerais
das funções fisiológicas em relação a indivíduos de uma mesma idade e que mantêm um
estilo de vida sedentário (HARDMAN e STENSEL, 2006).
As alterações nas diferentes funções fisiológicas decorrentes do processo de
envelhecimento tornam-se, pois, evidentes com o avanço da idade. O marcante declínio da
resistência cardiovascular com a idade se expressa pelo decréscimo no consumo máximo de
oxigênio (VO2máx) o que compromete o desempenho físico e é mais acentuado nas
mulheres. O VO2máx é um índice valioso no acompanhamento do processo de
envelhecimento, pois expressa a resposta integrada ao esforço físico dos sistemas
cardiorrespiratório, circulatório e metabólico. O declínio do VO2máx ocorre pela
degeneração natural do processo de envelhecimento que atua em todos estes sistemas. A
perda de massa muscular observada ao longo dos anos e, ainda, o declínio da capacidade
oxidante dos músculos, que, em geral, decorre da baixa atividade enzimática, têm papel
determinante na diminuição do VO2máx. Somam-se também a esses fatores a menor
densidade capilar e o decréscimo do número de mitocôndrias, além de outras alterações
55
bioquímicas importantes para a respiração celular (FLEG e LAKATTA, 1998; Trappe et
al., 1995).
A diminuição, com a idade, da máxima capacidade respiratória contribui, de forma
igualmente significante, para o decréscimo da resistência cardiovascular. A freqüência
cardíaca máxima diminui com o processo de envelhecimento, expressando uma menor
capacidade de bombeamento sangüíneo. O volume sistólico decresce com o
envelhecimento por causa da redução do desempenho contrátil cardíaco, de modo que o
débito cardíaco, que é expresso pelo produto da freqüência cardíaca com o volume
sistólico, sofrerá também uma redução, prejudicando o fornecimento de oxigênio aos
músculos. Essa diminuição do débito cardíaco pode ser compensada com o aumento do
volume sistólico em idosos saudáveis estimulados por atividades aeróbias (SCHULMAN e
GERSTENBLITH, 1989; BABCOK, 1994; MACARDLE et al., 1998).
Com as perdas relatadas, o VO2máx decresce em torno de 10% por década após os
20 anos de idade, mas é preciso lembrar que essa queda relaciona-se com o estilo de vida
do indivíduo. A atividade física sistemática e bem orientada pode retardar a velocidade de
decréscimo da capacidade cardiovascular geral, permitindo, por exemplo, que um indivíduo
que se manteve ativo aos 70 anos apresente um VO2máx compatível com o do sedentário
de 30 anos (HARDMAN e STENSEL, 2006).
A baixa capacidade cardiovascular incapacita para esforços de longa duração em
virtude da instalação precoce da fadiga. A restrição às atividades físicas diárias, decorrentes
de uma menor condição física do idoso, é preocupante, pois tende a desencadear um maior
isolamento social e declínio da saúde, tanto mental (depressão) como física, gerando perda
expressiva na qualidade de vida dessas pessoas. Considerando que os diversos sistemas
relacionados à capacidade funcional mantêm a habilidade de adaptação ao treinamento
físico ao longo da vida, preconiza-se o encaminhamento dos idosos para a prática
sistemática de atividades físicas (orientadas) de modo a estimular o metabolismo aeróbio e
intervir na velocidade do processo degenerativo de envelhecimento.
Força muscular
Constata-se, na literatura, que o decréscimo da potência e da massa muscular
(sarcopenia) apresenta relação direta com o aumento da idade. Esse é um comportamento
56
gênero dependente (FRONTERA et al., 1991), sendo mais pronunciado nas mulheres que
alcançam o pico e o declínio da potência máxima mais precocemente que os homens
(FOLDAVARI et al., 2000). Segundo Rogers e Evans (1993), aos 70 anos um indivíduo
pode apresentar uma redução de força muscular de 30% e uma diminuição de área muscular
de 40% em relação ao que apresentava aos 20 anos de idade. A perda de massa muscular é
mais pronunciada nas fibras do tipo II (fibras de contração rápida), fato que justifica a
diminuição de potência muscular (capacidade de desenvolver força rapidamente) do idoso.
A diminuição de potência muscular acarreta limitações físicas na medida em que é
necessária para a execução de diversas tarefas diárias, além de ser um componente
importante na prevenção de quedas (FLECK e KRAEMER, 1999).
Com o envelhecimento, ocorre uma perda de qualidade e quantidade protéicas nas
unidades contráteis do músculo, o que contribui para a diminuição da força e potência
muscular (FLECK e KRAEMER, 1999). O decréscimo da força muscular, observado em
indivíduos idosos, é, portanto, conseqüência da hipotrofia muscular por desnervação e da
degeneração das estruturas musculares e placas motoras (MacArdle et al., 1998).
A perda da força muscular em idosos resulta na limitação da mobilidade e do
desempenho físico, aumentando a probabilidade de acidentes e quedas que para esses
indivíduos podem ser desastrosos. É importante destacar que preocupa bastante a
possibilidade de quedas especialmente entre as mulheres que se encontrem na pósmenopausa, fase em que a perda de massa óssea é acentuada pelo decréscimo da secreção
de estrógenos característico nessa fase da menopausa. A probabilidade de ocorrer lesões
ósseas, portanto, é maior; e a menor eficiência dos osteoblastos dificulta a recuperação de
lesões que por ventura ocorram.
Um programa de treinamento com sobrecargas, adequadamente ajustado ao
indivíduo idoso, promove respostas adaptativas significantes no músculo esquelético desses
indivíduos. Tais adaptações decorrem de um maior recrutamento de unidades motoras, de
melhor estimulação de inervações e, ainda, da hipertrofia do músculo esquelético
estimulado. A literatura apresenta, em diversos estudos científicos, a efetividade de
exercícios regulares de sustentação de peso no retardamento da perda, tanto de massa
57
muscular como óssea, em indivíduos idosos (CHARETTE et al., 1991; YOUNG e
SKELTON, 1994; FLECK e KRAEMER, 1999; CRESSET al., 2004).
O aumento ou a preservação da força em indivíduos idosos, com base em um
programa de atividades físicas, torna-os capazes de executar suas tarefas diárias com menor
risco de quedas, além de permitir-lhes condições de prestar serviços à sociedade. Medidas
preventivas, voltadas para a saúde dos idosos, contribuirão, ainda, para diminuir os gastos
do sistema de saúde pública em internações e terapias especiais.
Massa óssea
A saúde óssea é expressa por sua densidade que depende de seu conteúdo
mineral. A queda no teor de mineral ósseo revela enfraquecimento e predispõe ao risco de
fraturas. Em muitas mulheres o período de pós-menopausa, em conseqüência da baixa
produção de estrógenos, apresenta uma perda de minerais ósseos de até 15% na primeira
década. A desmineralização e maior porosidade óssea caracterizam a osteoporose que é
uma das causas mais comuns de fraturas em indivíduos idosos. Em homens, a osteoporose
ocorre em idades mais avançadas e em menor proporção do que nas mulheres. A
intervenção por um programa de exercícios que enfatize força, flexibilidade, coordenação e
condição cardiovascular reduz o risco de fraturas osteoporóticas por diminuir o risco de
quedas e permitir que idosos permaneçam ativos, reduzindo, pois, a perda óssea por
inatividade (RIKLI e MEMANIS, 1990; ACSM, 1995).
Quedas em idosos
Desde o primeiro ano de vida, quando começamos a dar nossos primeiros passos,
as quedas passam a estar presentes em nossa vida. É verdade que, na idade infantil,
encaram-se as quedas como habituais — frutos da tentativa de começar a andar ou correr,
das brincadeiras etc. — e, em geral, não afetam negativamente a qualidade de vida.
Contudo, na fase senil, incidem sobre as quedas uma outra visão por repercutirem na
qualidade de vida das pessoas. Vale ressaltar que os idosos já não possuem um controle
postural com a mesma qualidade e nem o poder regenerativo de uma criança.
Um conjunto de fatores contribui para a maior incidência de quedas em idosos, os
quais, ao sofrê-las, apresentam elevados risco de lesões. Os fatores de risco mais citados
58
como determinantes de quedas são: idade igual ou maior a 75 anos; sexo feminino; declínio
cognitivo; inatividade física; fraqueza muscular; distúrbios do equilíbrio corporal, de
marcha ou de mobilidade; história prévia de acidente vascular cerebral, de quedas
anteriores e de fraturas; comprometimento na capacidade de realizar atividades de vida
diária; e uso de medicações psicotrópicas, assim como o uso de várias medicações
concomitantes (PERRACINI e RAMOS, 2002; ROSA et al., 2003; GIMARÃES e
FARINATTI, 2005).
Torna-se importante, portanto, identificar as causas e trabalhar na prevenção. O
distúrbio de equilíbrio é o fator de risco que, possivelmente, esteja mais diretamente
envolvido nas quedas. Existem fatores que podem influenciá-lo, como a paresia muscular,
ou mesmo serem influenciados, como a marcha e o grau de independência funcional. Há,
portanto, uma relação entre os fatores de risco.
O controle postural, responsável pelo equilíbrio, envolve um complexo processo
de coordenação de mecanismos sensoriais ou aferentes e de mecanismos motores ou
eferentes, ambos organizados pelo sistema nervoso central (SNC). Quando há algum
desalinhamento entre o centro de massa corporal e a base de sustentação, gera-se uma
situação de instabilidade, isto é, de perda do equilíbrio. Tal perturbação é detectada pelo
sistema sensorial e encaminhada ao SNC que, através do sistema motor, gera respostas
posturais coordenadas por meio de atividades musculares, a fim de restabelecer o equilíbrio
(PAIXÃO JÚNIOR e HECKMANN, 2002).
Entre os mecanismos aferentes estão os sistemas visual, vestibular e
proprioceptivo. Os proprioceptores, situados nas articulações, nos músculos, tendões etc.,
são responsáveis pela noção de posição e de movimento do corpo ou de determinado
segmento corporal. O sistema vestibular está envolvido no controle da estabilidade ocular,
na orientação da cabeça e na ativação dos músculos do tronco e dos membros para a
manutenção da postura. A visão é o sistema de informação sensorial mais importante e,
geralmente, o mais exigido quando os outros sistemas estão deficientes, como forma de
compensação. Com o envelhecimento, o sistema vestibular apresenta perda de células
ciliares nos canais semicirculares e ganglionares vestibulares, assim como de fibras
nervosas (ROSENHALL e RUBIN, 1975). A sensibilidade cutânea dos pés, que pode ser
59
incluída no sistema proprioceptivo, também diminui com o envelhecimento. Dessa forma, o
idoso costuma “apoiar-se” na visão para manter-se equilibrado, por isso é um
comportamento comum em idosos caminhar olhando para os pés. Daí pode-se perceber o
risco de quedas aumentado quando o idoso apresenta uma acuidade visual diminuída.
Os mecanismos eferentes e o SNC também são afetados pelo envelhecimento. Há
uma redução da força muscular, principalmente nos membros inferiores, associada à
diminuição de tamanho e número de fibras musculares e motoneurônios (ROGERS e
EVANS, 1993). No SNC, há perda neuronal e dendrítica, redução das ramificações e
diminuição do metabolismo cerebral (LIPSITZ e GOLDBERGER, 1992). Tais alterações
levam a uma lentificação no processamento de informações que, associada à diminuição da
velocidade de condução, geram um retardo da contração muscular, e, conseqüentemente,
das respostas musculares posturais. Para compensar, o SNC pode ser mais exigido por meio
do sistema atencional, porém a capacidade de dividir atenção e de processar informações
está reduzida. Portanto, em situações de distração ou de sobrecarga de informações, como
conversar e concomitantemente caminhar em um piso irregular, o risco de quedas estaria
aumentado.
Com todas as alterações fisiológicas inerentes ao envelhecimento, o sistema de
controle postural torna-se menos eficiente para compensar as possíveis perturbações que
fazem parte do dia-a-dia. Deve-se ressaltar que, pela própria ação da gravidade, o corpo, na
posição ortostática, já se encontra em uma situação que exige do sistema de controle
postural. Somando-se às perturbações próprias da biomecânica postural as perturbações
externas, como por exemplo, um chão escorregadio ou acidentado, o sistema de controle
postural compensará até um certo limite, dependendo da habilidade de cada um. As causas
de origens internas e externas das quedas são comumente classificadas, na literatura, como
fatores de risco intrínsecos e extrínsecos (SHUMWAY-COOK et al., 1997).
Os fatores de risco intrínsecos incluem as próprias alterações fisiológicas
associadas ao envelhecimento (sistema sensorial, motor e cognitivo, por exemplo), doenças
específicas e uso de medicamentos. Como doença específica, é válido citar dois exemplos
de origem circulatória que podem comprometer a reserva de perfusão cerebral: a síncope
(perda súbita e transitória da consciência) cardiogênica, por causa da alta incidência de
60
arritmias ou da insuficiência cardíaca; e a hipotensão postural ortostática que pode ser
definida como a queda da pressão sistólica (maior ou igual a 20mmHg) ou diastólica (igual
ou maior que 10mmHg) na mudança postural do decúbito para o ortostatismo, e que pode
ter origem na desidratação, na imobilização e no uso de medicamentos (Paixão Júnior e
Heckmann, 2002).
Vários estudos indicam a associação entre o uso de medicamentos, como os
psicotrópicos, e o risco aumentado de quedas (PERRACINI e RAMOS, 2002;
GUIMARÃES e FARINATTI, 2005). Alterações no metabolismo com o envelhecimento
modificam as características farmodinâmicas e farmacocinéticas dos medicamentos,
tornando o idoso mais suscetível aos efeitos colaterais dos remédios (WYNNE, 2005).
Contudo, não é trivial distinguir os efeitos colaterais de medicamentos daqueles causados
por doenças pelas quais houve a prescrição. Com o envelhecimento, aumenta a incidência
de doenças e, conseqüentemente, o uso de medicamentos. Não se pode esquecer que fatores
psicológicos, como o medo de sofrer quedas, também estão envolvidos e que as quedas
podem produzir sintomas de ansiedade e depressão (DOWNTON, 1990), os quais, por sua
vez, aumentam o risco de uma nova queda.
Como fatores de risco extrínsecos há os sociais e os ambientais. Os fatores
ambientais estão relacionados com o ambiente físico em que o idoso se encontra, ou seja, a
iluminação local, as condições do piso (molhado, irregular etc.), a presença de obstáculos
(animais ou crianças correndo, objetos no chão etc.) e outros que podem causar distração.
Os fatores de risco geralmente coexistem, por exemplo: o idoso portador de demência
apresenta distúrbios cognitivos que atrapalham o reconhecimento dos riscos do ambiente.
Além disso, o ambiente familiar constitui-se também num fator externo que pode atuar de
maneira positiva ou negativa. O agravamento do nível de cuidado, geralmente associado
aos atritos e ao estresse causados pela situação do idoso, aumenta mais ainda a ansiedade e
o medo de ele sofrer quedas. As restrições exageradas das atividades de vida diária afetam a
qualidade de vida do idoso, aumentando a sua dependência de terceiros e diminuindo sua
independência funcional.
O idoso pode vir a ser encarado como um estorvo, uma pessoa que requer atenção
e cuidados especiais; o que nem sempre é possível ou há disposição para tal. Por isso,
61
muitos são transladados para uma casa de repouso ou um asilo. Segundo Rubeinstein e
Josephson (2002), cerca de 75% dos idosos institucionalizados sofrem quedas. Prevenir
quedas é, pois, evitar aborrecimentos e gastos. Uma fratura de colo de quadril conseqüente
a uma queda, além de representar um custo elevado para os familiares e para a saúde
pública, pode incapacitar o idoso a andar novamente; geralmente por medo de cair
novamente. É importante destacar que, para prevenir uma queda, é preciso, primeiro,
identificar os fatores de risco, o que é feito por meio de avaliação clínica, anamnese e
questionários específicos, assim como testes de avaliação (força muscular, equilíbrio,
marcha etc.).
UM ESTUDO DESENVOLVIDO COM IDOSOS DE PETRÓPOLIS
Pensando em estudar as relações entre incidência de quedas e possíveis fatores de
risco, os autores vêm desenvolvendo uma pesquisa com idosos asilares na cidade de
Petrópolis, Rio de Janeiro, que segundo uma reportagem televisiva local, tem a maior
população de idosos do Estado do Rio. A apresentação deste estudo visa expor a forma de
abordagem de estudo que considera algumas variáveis físicas envolvidas no processo de
envelhecimento e de quedas em idosos, apresentando as dificuldades inerentes às pesquisas
com este segmento da sociedade.
Até o momento, coletaram-se dados de dois asilos, um público e outro particular.
Para este estudo, consideraram-se como idosos indivíduos a partir de 60 anos (cf.
ESTATUTO do idoso, Lei 10.741 de 01/10/2003), obtendo-se 9 homens e 6 mulheres, após
exclusão daqueles que não deambulavam, que possuíam doença neurológica grave (AVC,
Parkinson, demência) e amputados. Realizaram-se anamnese e verificação da pressão e da
freqüência cardíaca. Obteve-se o número de quedas, nos últimos quatro anos, por meio de
questionário e anotações da equipe de saúde local. É bom que se saliente que o
levantamento do número de quedas constituiu uma limitação do estudo, visto que se
dependia da recordação dos idosos os quais tendem a sub-relatar as quedas. Os registros de
quedas no asilo também podem conter erros, pois apenas foram consignadas as quedas que
foram vistas. Todos os idosos assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido e
foram orientados quanto aos riscos e procedimentos necessários ao desenvolvimento do
projeto.
62
Variáveis selecionadas para o estudo
Avaliou-se o equilíbrio, a marcha, a mobilidade, a flexibilidade, a independência
funcional, o nível de depressão, a qualidade de vida, a antropometria, a resistência muscular
dos membros inferior e superior e a força de preensão manual. Antes de comentar os
resultados, faremos comentários a respeito de cada um dos fatores avaliados e da
metodologia empregada para a familiarização do leitor com os testes empregados.
Equilíbrio e Marcha:
Mantém-se o equilíbrio, conforme comentado anteriormente, pelo controle postural.
Ele influencia diretamente a marcha; e é difícil imaginar alguém com distúrbio de
equilíbrio que não apresente alteração na marcha. Sabe-se que os idosos caminham com os
pés rodados para fora, com passos mais curtos e lentos, passam menos tempo em apoio
unipodal e aumentam a freqüência dos passos quando querem desenvolver a velocidade —
estratégias para manter o equilíbrio. A cifose torácica é comum, contudo a flexão de tronco
pode ser também empregada para manter a estabilidade.
Utilizou-se no estudo a avaliação validada de marcha e equilíbrio de Tinetti
(TINETTI, 1986), a qual consiste de 9 itens de avaliação de equilíbrio e 7 de marcha,
ambos com pontuação de 0 a 2, obtendo-se o score pela soma de cada item. Os itens de
equilíbrio envolvem avaliações na postura de pé com os olhos fechados, girando 360º, por
exemplo, na posição sentada e na transição de sentado para de pé. Para a marcha, avaliamse iniciativa, direção, continuidade e simetria dos passos, além da posição do tronco e da
distância dos tornozelos. Solicitou-se que cada indivíduo caminhasse normalmente em uma
direção e voltasse caminhando rapidamente na direção oposta, enquanto o avaliador
observava e dava a pontuação.
Mobilidade (ou agilidade):
Vale lembrar que a mobilidade, ou agilidade, envolve interação de força muscular,
equilíbrio e velocidade (GUIMARÃES e FARINATTI, 2005). A mobilidade pode ser
avaliada de diversas formas; sendo que para os idosos costuma-se envolver a marcha na
tarefa a ser executada. Utilizou-se, no estudo, o teste de mobilidade para idosos, proposto
por Podsiadlo e Richardson (1991), conhecido como Timed “Up & Go”. Dessa forma,
avaliou-se o idoso pelo tempo que levava para levantar-se de uma cadeira sem apoio para
63
os membros superiores, caminhar até uma demarcação feita no chão a 3m da cadeira, dar a
volta e sentar-se novamente. Realizou-se, primeiramente, um ensaio, isto é, descartou-se o
teste que serviu de adaptação e de aprendizado para a tarefa. Depois, solicitou-se que cada
um deles realizasse a atividade o mais rápido possível, respeitando-se suas limitações. É
interessante destacar que adultos saudáveis costumam realizar o teste em até 10s, e idosos
em até 20s. Considera-se mais de 20s para a execução da tarefa como um valor indicativo
da necessidade de intervenção para a prevenção de quedas.
Flexibilidade:
Como se sabe, a flexibilidade, avaliada pela amplitude de movimento, torna-se
reduzida com o envelhecimento. E mais: a diminuição do arco de movimento das
articulações de quadril, joelhos, tornozelos e coluna vertebral estão associadas com a
ocorrência de quedas, possivelmente por influenciar o padrão da marcha. Todavia, poucos
trabalhos fazem menção à relação entre flexibilidade e número de quedas (GUIMARÃES e
FARINATTI, 2005).
Para o estudo foram utilizadas duas formas de quantificar a flexibilidade dos idosos:
uma por meio da medida em graus da flexão de quadril com a perna dominante estendida,
em que se utilizou um goniômetro, e o resultado foi a média das três medidas; outra, mediuse em centímetros, por uma variação do teste “sentar e alcançar” (MARINS e GIANNICHI,
1998), realizado num banco de Wells. Originalmente, no teste de “sentar e alcançar”,
coloca-se o indivíduo sentado sobre as tuberosidades isquiáticas, com a perna estendida e
os tornozelos a 90º, com a planta do pé apoiada no anteparo do banco. Solicita-se que
realize uma flexão de tronco ao expirar, e, com uma das mãos sobre a outra, desloque um
marcador o mais longe possível através da escala graduada.
Devido à dificuldade da maior parte dos idosos para realizar esse teste sentado, e
porque muitos não conseguiam nem sequer alcançar o marcador nesta posição, optou-se por
executar o teste com o avaliado na posição vertical. Assim, o indivíduo, em posição
ortostática, encostava a parte posterior dos membros inferiores numa parede (para evitar
que o corpo fosse projetado para trás), e o banco de Wells era colocado à frente com a
escala na sua direção. Em seguida, solicitou-se que realizasse uma flexão de tronco e
tentasse levar o marcador até o fim da escala — no caso, o mais próximo do chão. Os
64
idosos foram estabilizados logo acima dos joelhos para manter as pernas estendidas e evitar
que o corpo tombasse anteriormente, em virtude do deslocamento do centro de gravidade
para frente. O banco foi mantido a uma distância dos pés, de forma a obter-se o melhor
desempenho. Registrou-se a melhor medida de três tentativas. Como o teste original deve
ser realizado de forma ativa e livre de ajuda, a fraqueza muscular encontrada nos idosos
poderia estar contribuindo para o mau desempenho no teste de sentar e alcançar, o que se
evitou com a gravidade atuando a favor, no caso do teste feito na posição ortostática. Devese lembrar que tal teste envolve toda a cadeia muscular posterior; portanto é um teste de
flexibilidade global.
Independência Funcional:
Pode-se avaliar a independência funcional por meio de testes das atividades de vida
diária (AVD’s) e das atividades instrumentais de vida diária (AIVD’s). As AVD’s
compreendem as atividades básicas praticadas pelo indivíduo diariamente, tais como:
alimentar-se; realizar transferências, higiene pessoal, controle esfincteriano; vestir-se;
arrumar-se etc. As AIVD’s envolvem atividades mais complexas, como usar o telefone,
fazer compras, administrar as finanças, cuidar da casa, preparar refeições etc. Como as
AIVD’s não são comumente praticadas pelos idosos asilares, utilizou-se somente as escalas
de AVD’s no estudo, ou seja, as escalas de Barthel (COLLIN et al., 1988) e de Katz,
(KATZ et al., 1963). É importante destacar que os idosos que apresentam maior
dependência nas AVD’s têm mais chance de quedas do que os independentes, isto é,
aqueles que obtêm a pontuação máxima nos testes de independência funcional (ROSA et al,
2003).
Qualidade de vida e Depressão:
O nível de depressão também é citado como um fator de risco para quedas (Rao,
2005). Assim, no estudo, avaliou-se a qualidade de vida, tendo em vista o grau de relação
entre essas duas variáveis. Quando a qualidade de vida do idoso não é satisfatória, há maior
propensão a sentir-se deprimido, ou vice-versa. A depressão influi em vários aspectos da
vida, desde o padrão da marcha, em que o indivíduo pode andar mais cabisbaixo e
desatento aos possíveis fatores extrínsecos de risco de quedas, até a redução da realização
65
das atividades de vida diária e/ou de exercícios físicos. Assim, um fator de risco pode
favorecer o surgimento de outro(s) fator(es) ou piorá-lo(s).
Para observar se há relação entre os fatores de risco já citados e a depressão e
qualidade de vida, é necessário uma forma de quantificá-los. Para isso foi utilizada a escala
de depressão de Yesavage (YESAVAGE et al., 1983) e o questionário sobre qualidade de
vida da Associação Mundial de Saúde (grupo WHOQOL), na sua versão abreviada de 26
perguntas (WHOQOL-BREF), pois o questionário voltado para idosos (WHOQOL-OLD)
ainda não se encontra disponível (FLECK et al., 2003).
Medidas Antropométricas:
O percentual de gordura corporal foi estimado por
bioimpedância. Embora o
percentual de gordura não seja considerado um fator de risco para quedas pela literatura
estudada, serviu, juntamente com as medidas de perimetria debraço, para a obtenção da
área muscular transversa do braço. Observou-se que a área muscular do braço dos idosos
era proporcional à resistência muscular medida pelo número máximo de flexões de
cotovelo efetuadas com um haltere de 2kg. O resultado foi condizente com o de adultos
jovens, nos quais quanto maior a massa muscular, maior a força muscular (POMPEU et al.,
2004).
Força Muscular:
A redução da massa muscular e, conseqüentemente, da força muscular por causa do
envelhecimento é apontada como o segundo maior fator de risco para quedas (AMERICAN
Geriatrics Society et al., 2001). A perda de massa muscular dos membros inferiores é
destacada, pois favorece o desequilíbrio e a redução de atividades cotidianas, como levantar
e sentar, subir e descer escadas, etc. Avaliou-se a resistência muscular dos membros
inferiores por meio do teste de sentar e levantar em uma cadeira, sem apoio para os
membros superiores e sem carga externa, cujo resultado foi o número máximo de
repetições. A força de preensão manual foi medida com um dinamômetro. Efetuaram-se
três medidas para cada indivíduo e escolheu-se o melhor desempenho.
Resultados
Após a obtenção do coeficiente de correlação Rank de Spearman, com nível de
significância de p≤ 0,05, conheceu-se a relação entre si de todas as variáveis analisadas.
66
Observou-se na análise das variáveis que apenas a “Independência funcional” (escala de
Katz) apresenta uma relação com o número de “Quedas” (incidência de 30%) dos idosos
asilares avaliados.
O “Equilíbrio” foi a variável que se correlacionou com o maior número de fatores
de risco na amostra analisada (“Independência funcional”; “Mobilidade”; “Marcha”).
Quanto maior o equilíbrio, melhor a qualidade da marcha (r =0,60) e a mobilidade (r=0,70).
Por sua vez o equilíbrio foi influenciado pela variável “Resistência muscular dos membros
inferiores” (r=0,79) e pelo “Nível de depressão” (r= -0,66), ou seja, quanto maior a
“Resistência muscular” e menor o “Nível de depressão” e melhor o “Equilíbrio”. Quanto
mais deprimido o indivíduo, pior a qualidade de sua “Marcha” (r= -0,61).
O “Equilíbrio” e a “Força muscular” dos membros inferiores influenciam
diretamente a independência funcional (r=0,82 e r= 0,81, respectivamente). Isso é coerente,
visto que um indivíduo que possui menos força muscular nos membros inferiores terá
menos equilíbrio e, conseqüentemente, mais dificuldade para realizar suas atividades de
vida diária.
Uma menor independência funcional pode favorecer o aparecimento de quedas; e a
queda pode trazer prejuízos na realização das atividades de vida diária; e assim, gera-se um
ciclo vicioso. A relação direta entre a independência funcional e o número de quedas
aponta uma maior necessidade de atenção das equipes de saúde para esse fator de risco.
Dessa forma as escalas de AVD’s podem ser instrumentos úteis na prevenção de quedas
dos idosos. Modelos preditivos de quedas, baseados em mais de um fator de risco
(SHUMWAY-COOK et al., 1997), mostraram ser mais eficientes do que a análise dos
fatores individualmente, e poderiam incluir os scores obtidos com as escalas de AVD’s.
Em suma, a origem das quedas é multifatorial, e trabalhar na prevenção é realizar
uma boa avaliação e abordar o idoso em todos os aspectos mencionados, além de outros,
como o ambiente físico e o familiar. Cada profissional tem, portanto, sua importância nesse
compromisso. Exercícios de equilíbrio e de fortalecimento têm sido apontados como os
mais eficazes na prevenção de quedas em idosos (RAO, 2005); porém não se deve
restringi-los apenas a tais exercícios. A prática de exercícios físicos variados e com
enfoques recreativos tornam-se efetivos e agradáveis aos idosos, além de possibilitar uma
67
maior socialização do grupo. Exercícios físicos adaptados às características da faixa etária
contribuem para um menor nível de depressão e uma menor influência do processo de
envelhecimento sobre as variáveis fisiológicas estudadas e garantem, sobretudo, melhor
qualidade de vida.
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70
Dados dos Autores:
Fátima Palha de Oliveira
Doutora em Ciências de Engenharia Biomédica pelo Laboratório de Engenharia Pulmonar
da COPPE/UFRJ.
Coordenadora do Labofise na EEFD da UFRJ e do setor de Fisiologia do Instituto Virtual
do Esporte.
Endereço: Rua das Laranjeiras nº 136; apt.º 203, Laranjeiras, Rio de Janeiro.
CEP 22 240-000
e-mail: [email protected]
Telefones: 21 2562 68 25, celular: 93823844
André da Silva Favre.
Mestre em Ciências de Engenharia Biomédica pelo Laboratório de Engenharia Pulmonar da
COPPE/ UFRJ.
Coordenador do Laboratório de Fisiologia do Exercício de Universidade Estácio de Sá,
Petrópolis, Rio de Janeiro.
Endereço: Rua Basílio de Brito, 271. Cachambi, Rio de Janeiro.
CEP: 20785-000
e-mail: [email protected]
Telefones: 21 2281-8512 e 21 8123-8512.
71
FISIOTERAPIA PREVENTIVA: UM TRABALHO COM IDOSOS
Esp. Fátima de Lima Paula
Universidade Federal Fluminense
RESUMO
Este capítulo pretende comentar a abordagem de um trabalho Fisioterapêutico
preventivo que tem como ferramenta a conscientização corporal para a prevenção de
quedas de idosos. A grande dificuldade atualmente é aplicar os conhecimentos de forma a
mobilizar os idosos a realizar mudanças de hábitos para a melhora da qualidade de vida.
Partindo dos fatores de risco característicos da idade foi traçado um programa de
tratamento que utiliza a terapia corporal como uma forma prazerosa de se trabalhar o corpo
e de aprender a realizar os movimentos organizados e coordenados. Este trabalho de
Fisioterapia vem sendo realizado com os participantes do projeto Prev-Quedas (UFF) e o
Envelhecimento sem Tropeços na UFRJ.
.
Palavras chave: Conscientização corporal, propriocepção, terapia corporal
INTRODUÇÃO
O envelhecimento populacional veio acompanhado da transição epidemiológica.
Houve um controle das doenças infecto-contagiosas e o surgimento das crônicodegenerativas. O indivíduo, assim vai perdendo sua capacidade de adaptação em função dos
anos vividos, das capacidades intrínsecas, seus fatores genéticos e do meio ambiente em
que vive. E, de acordo com esse processo natural de envelhecimento, começam a surgir os
problemas que interferem na qualidade de vida do indivíduo e cuja solução torna-se difícil,
partindo do princípio que as pessoas não envelhecem da mesma forma.
Existem problemas médicos comuns nos idosos que são chamados de os ‘gigantes
da geriatria’, já que são fatores que tendem a levar o idoso a perder a autonomia e a
independência (KANE et al, 2005). Eles são designados de os cinco ”is”: incontinência
urinária e fecal, instabilidade postural, iatrogenia, imobilidade e insuficiência cognitiva.
Quando estudamos as quedas podemos observar que elas têm uma relação com todos esses
fatores acima relacionados, e por isso, são bastante temidas entre os idosos.
Segundo Ramos et al (2003) o grande desafio deste século XXI não é mais
convencer o idoso de que mudanças em seu estilo de vida são benéficas, mas sim, mobilizálo de forma a realizar essas mudanças. E quando falamos em mudanças estamos nos
72
referindo à mudança alimentar, prática de exercícios, ingestão de líquidos, lazer e tudo
aquilo que de maneira geral possa vir a melhorar a qualidade de vida desta pessoa.
Morel (2002) comenta que o difícil é transformar os conhecimentos em aplicação e
enfatiza a complexidade da transformação de conhecimento em decisões firmes e ações
efetivas de saúde pública, sendo esta transformação um processo que depende de fatores
econômicos, sociais, políticos e comportamentais. Para facilitar essa prática, tem-se
valorizado a interdisciplinidade nos trabalhos voltados para promoção da saúde, já que os
problemas são multi-fatoriais. Um dos profissionais que participa deste trabalho
interdisciplinar de promoção da saúde é o Fisioterapeuta que atua nas doenças crônicodegenerativas controlando a dor e prevenindo a perda de autonomia do idoso. Alguns
fatores
de risco presentes no envelhecimento são observados
na abordagem
Fisioterapêutica. São eles: dor, diminuição da propriocepção, alterações articulares,
alterações posturais, distúrbios da marcha e alterações nos pés. Estes fatores estão
associados à perda de função e de autonomia. Sendo assim, vamos abordar, neste capítulo,
uma forma de prevenção que acreditamos ser bastante eficaz e de grande abrangência.
PREVENÇÃO
Segundo a Organização Mundial de Saúde (WHO, 1993) um dano ou lesão pode
trazer as seguintes conseqüências para o indivíduo (PORTUGAL, 1989):
•
Deficiência (impairment) – anomalia ou perda da estrutura corporal,
aparência ou função de um órgão ou sistema.
•
Incapacidade (disability) – restrição ou perda de habilidades
•
Desvantagem (handicap) – restrições ou perdas sociais e/ou
ocupacionais
A prevenção atua nesses três níveis:
•
Prevenção primária – atua no indivíduo, buscando influenciar nas
deficiências.
•
Prevenção secundária – atua rastreando grupos de risco buscando interferir
na incapacidade.
•
Prevenção terciária – atua na avaliação para reabilitação buscando evitar as
desvantagens.
73
Como exemplo, podemos citar a queda tendo como ‘deficiência’ a diminuição da
propriocepção, causando uma ‘incapacidade’ da execução das atividades de vida diária e
como ‘desvantagem’, a ocorrência da perda da autonomia e da independência. Neste caso a
prevenção Fisioterapêutica primária seria um trabalho de equilíbrio estimulando os
receptores proprioceptivos com a intenção de fazer com que esta perda de propriocepção
seja a mínima possível e venha a surgir num tempo muito maior, buscando evitar a queda.
Já na prevenção secundária, o trabalho estaria visando a diminuir o déficit proprioceptivo,
em um indivíduo que cai, através de atividades que viessem a recrutar receptores e evitar
novas quedas. E, a prevenção terciária seria inserir esse indivíduo que cai, de volta às suas
atividades de vida diária, adaptando-o de acordo com suas limitações. Para se fazer um
trabalho de prevenção é imprescindível que se conheça a biologia do envelhecimento e os
fatores de risco que estão influenciando nas alterações que ocorrem no corpo com o
decorrer do tempo.
Existem várias teorias que discutem o envelhecimento. Não vamos aqui comentar
sobre elas. Na verdade, dos cinco ‘is’ citados anteriormente, pode-se dizer que três podem
ser abordados pela Fisioterapia de uma forma prática e direta. São eles: incontinência
urinária, imobilidade e instabilidade postural. A seguir, será feito um breve comentário
sobre cada um deles separadamente, para que se possa discutir a prevenção fisioterapêutica,
com seus objetivos.
INCONTINÊNCIA URINÁRIA
A incontinência urinária (IU) é definida como perda involuntária de urina através
de uma uretra anatomicamente sadia, resultante de um distúrbio, de uma disfunção do
equilíbrio vesico-esfincteriano (GROSSE e SENGLER, 2002).
A IU é um problema comum no idoso, que pode interferir em suas atividades de
vida diária e em suas atividades sociais e influenciar na sua qualidade de vida
(SWITHINBANK e ADAMS, 1999; Mc GROTHER et al, 1998). De acordo com a
Sociedade Brasileira de Urologia, embora possa acontecer uma mistura de sintomas, a
incontinência urinária pode ser classificada como:
74
1. IU de esforço – perda involuntária de urina na ausência de contração do
músculo da bexiga (detrusor) que acontece ao esforço, como ao espirrar,
tossir, correr.
2. IU por urgência miccional – caracterizada pela perda de urina ao
surgimento inesperado de um reflexo miccional, ou seja, graças à
hiperatividade do detrusor. Se o esfíncter conseguir resistir, não há
incontinência, mas sim, urgência.
3. IU paradoxal – sensação de urgência para urinar sem conseguir algumas
vezes; perda de gotas de urina todo o tempo; sensação de não esvaziar
completamente a bexiga.
A Fisioterapia possui um trabalho de reeducação perineal com utilização de
técnicas como “biofeedback”, eletroestimulação, utilização de cones (dispositivos
vaginais), exercícios de reeducação muscular do assoalho pélvico e correção postural. Para
isso, o indivíduo precisa conhecer a anatomia desta musculatura e conhecer melhor seu
corpo.
IMOBILIDADE
A imobilidade pode ser vista por vários aspectos. Desde a ausência de mobilidade
em uma ou mais articulações até a ausência generalizada do movimento, como acontece
quando o indivíduo está acamado. Neste capítulo serão abordados os fatores de risco para a
imobilidade, decorrentes das alterações funcionais que ocorrem devido à idade, com
enfoque nas articulações, músculos e sistema nervoso.
Articulações
As articulações determinam a amplitude de movimento, através de sua forma, ou
seja, a partir das formas dos ossos e da maneira com que eles se articulam, o movimento vai
poder ocorrer em um ou mais planos. Outro componente que vai limitar o movimento é o
ligamento, um feixe de ‘tecido fibroso’ que une dois ossos e estabiliza-os de forma a
impedir que certos movimentos aconteçam. A cápsula articular também tem como função a
estabilização e proteção das extremidades ósseas. Ela é composta de um tecido conjuntivo
fibroso denso e envolve a articulação. A membrana sinovial é composta de tecido
75
conjuntivo vascular que reveste internamente a cavidade articular. Este tecido produz o
líquido sinovial, o qual é viscoso, nutritivo, lubrificante e deslizante e possui a função de
nutrir a cartilagem articular e diminuir o mecanismo de fricção sobre a cartilagem
(RASCH, 1989).
Os discos e meniscos são compostos de fibrocartilagem interposta entre os ossos
da articulação. Servem para absorver e distribuir as cargas, proteger a articulação, aumentar
a área de contato entre as superfícies articulares e limitar o deslizamento entre os ossos. O
disco intervertebral é composto de um anel fibroso, núcleo pulposo e 2 placas cartilaginosas
que separam o anel e o núcleo do corpo vertebral (MIRANDA, 2000).
A extremidade do osso é coberta pela cartilagem hialina que possui uma
qualidade elástica com a função de dissipar as altas sobrecargas, assim como diminuir a
taxa de compressão das superfícies articulares. Esta cartilagem é composta de condrócitos e
matriz extracelular relativamente densa. Esta última é composta de água, fibras colágenas e
proteoglicanos. A água representa 66% a 80% de sua estrutura e o material orgânico é
composto de 48% a 62% de colágeno tipo II e de 22% a 38% de proteoglicanos. O
colágeno é responsável pela forma e resistência à tensão. De uma forma mais grosseira
podemos dizer que a água e os proteoglicanos hidrófilos fornecem à cartilagem articular a
capacidade de se deformar e retornar à forma original.
Com a idade vai acontecendo um desgaste da articulação. Alterações na cartilagem
hialina produzem dor e imobilidade. As camadas superficiais da cartilagem apresentam
uma diminuição do número de células, da quantidade de água e do número de
proteoglicanos. Desta forma a cartilagem fica mais delgada e começam a surgir rachaduras
e fendas na superfície. Uma das doenças que acometem a cartilagem hialina, muito comum
em idosos, é a osteoartrite. Embora a doença não deva ser igualada às alterações
fisiológicas da cartilagem relativas à idade, sabe-se que no processo de artrose há
desagregação do equilíbrio e da homogeneidade da estrutura da cartilagem que ocorre pela
sua fragmentação e resulta na liberação de enzimas degradadoras da matriz pelos
condrócitos (VELLUTINI, 1997; EGRI et al, 1999).
Com o envelhecimento também há aumento dos elementos fibrosos do anel e
diminuição no número relativo de elementos elásticos. A quantidade de água do núcleo
76
também diminui com a idade. Segundo Cox (2002) indivíduos com 77 anos apresentam
70% de conteúdo de fluido no núcleo, enquanto que um recém nascido tem esse número
aumentado para 88%. Adultos entre 30 a 50 anos são propensos a lesões do anel e
herniação do núcleo. Adultos mais velhos (50 a 90 anos) podem perder altura do tronco e
apresentar aumento da cifose torácica (PERISSINOTO et al, 2002). Naturalmente a
diminuição de altura do disco intervertebral tende a produzir degeneração das articulações
apofisárias na distribuição da tensão. Como a função das articulações apofisárias é
estabilizar e segmento e controlar seu movimento, protegendo os discos e ligamentos, podese concluir que a degeneração do disco ocasionando a degeneração das articulações
apofisárias pode ser causa de dor lombar em idosos (COX, 2002).
Como decorrência destas alterações percebe-se uma diminuição da flexibilidade da
coluna, o que é de grande importância (SCHENKMAN et al, 2001). Thigpen et al (2000)
explicam que o jovem e alguns idosos realizam uma virada de 1800 dentro do eixo do
corpo, mas que a maioria dos idosos, para executar essa virada, cambaleiam e precisam dar
de 1,7 a 2,7 passos, o que ocasiona um risco de perda de estabilidade.
Músculos
Os músculos esqueléticos são compostos de fibras organizadas em feixes. Os três
tipos de fibras musculares mais importantes são: tipo I, tipo IIA e IIB. Os músculos contêm
uma mistura destes três tipos, apresentando sempre predominância do tipo de fibra que vai
determinar suas propriedades. A fibra do tipo I é escura (vermelha) pela predominância de
grande número de mitocôndrias e alta concentração de mioglobina. Esta fibra é de
contração lenta e sua principal fonte de ATP (energia) é a fosforilação oxidativa. Elas têm
boa resistência à fadiga. A fibra do tipo IIA é clara (branca), já que não apresenta grande
quantidade de mitocôndrias e mioglobina. Ela é uma fibra de contração rápida e sua
característica é força e velocidade. Possui maior diâmetro que a fibra I, desenvolve maior
força de contração e fadiga mais rapidamente. Sua principal fonte de ATP é a glicólise. O
terceiro tipo, IIB é designado oxidativo rápido glicolítico. É intermediário. A fibra é
vermelha, possui alto teor de mioglobina e numerosas mitocôndrias. Sua principal fonte de
ATP é a fosforilação oxidativa. Possui velocidade de contração intermediária e a resistência
à fadiga fica entre a da fibra tipo I e tipo IIA. Para ocorrer contração muscular é necessária
77
a ação dos neurônios motores. O conjunto de neurônio motor, seu axônio e todas as fibras
musculares por ele inervadas é denominado unidade motora. O aumento da força de
contração muscular se dá pelo aumento do recrutamento de unidades motoras e pelo
aumento
da
freqüência
de
estimulação
das
unidades
motoras
individuais
(McARDLE,1998).
O envelhecimento do corpo provoca alterações morfológicas e bioquímicas no
músculo. O músculo atrofia e há aumento dos tecidos conjuntivos e gordurosos. Há
diminuição da capacidade oxidativa, do número de unidades motoras. Estas alterações
parecem atingir mais as fibras musculares de contração rápida. Consequentemente podem
ocorrer perda da massa muscular sem gordura, declínio da força muscular absoluta e a
redução do uso de determinados grupos musculares (IMAMURA et al, 1999). Segundo
Carvalho e Soares (2004) a força muscular máxima é alcançada por volta dos 30 anos,
estabilizando até à quinta década e declinando a partir daí. Entre os 50 e 70 anos a perda se
dá aproximadamente 15% por década. Após os 70 anos a redução da força muscular
aumenta para 30% em cada 10 anos.
Sistema Nervoso
O sistema nervoso (SN) detecta estímulos externos e internos, tanto físicos quanto
químicos, e desencadeia as respostas musculares. Assim, é responsável pela integração do
organismo com o seu meio ambiente. Através desse sistema, o organismo é capaz de
produzir respostas estereotipadas que constituem os comportamentos fixos e invariáveis
(por exemplo, os reflexos), ou então, produzir comportamentos variáveis em maior ou
menor grau. O ser humano pode modificar o seu comportamento em função de experiências
passadas. Essa modificação comportamental é chamada de aprendizagem (LENT, 2004).
Funcionalmente, pode-se afirmar que o SN é composto por neurônios sensoriais,
motores e de associação. As informações provenientes dos receptores sensoriais dirigem-se
ao Sistema Nervoso Central (SNC), onde são integradas por neurônios de associação ou
interneurônios. Estes últimos enviam uma resposta que chega ao órgão efetor (músculo)
através dos neurônios motores. Kandel, Schwartz e Jessel (2000) sugerem que para o
movimento voluntário acontecer é necessária a conexão dos sistemas sensorial e motor e o
sistema motivacional (sistema límbico). Os autores afirmam que o sistema motivacional
78
controla o sistema motor autônomo e o sistema sensoriomotor somático. As respostas
desencadeadas pelo SNC são tão mais complexas quanto mais exigentes forem os estímulos
ambientais (aferentes). Para tanto o cérebro necessita de grandes concentrações de
neurônios capazes de armazenar, interpretar e emitir respostas eficientes a qualquer
estímulo, tendo também a capacidade de, a todo instante, em decorrência de novas
informações, modificar e fazer reajustes em suas conexões sinápticas, possibilitando novas
aprendizagens (LENT, 2004).
Somestesia é a capacidade de receber informações sobre as diferentes partes do
corpo. O sistema somestésico subdivide-se em epicrítico (tato fino e propriocepção
consciente) e protopático (termossensibilidade e dor). A propriocepção é uma submodalidade da somestesia. Receptores sensoriais nos músculos, tendões e cápsulas
articulares enviam informações sobre a posição e o movimento das regiões do corpo para
áreas específicas do sistema nervoso central. Isso proporciona retroalimentação sensorial
importante durante as atividades de um indivíduo. No córtex cerebral essas informações são
utilizadas para a percepção da posição e movimento das regiões do corpo (propriocepção
consciente). Essas informações também são utilizadas para controlar os reflexos e gerar
respostas e ajustes motores (propriocepção inconsciente) capazes de tornar as posições do
corpo adequadas a cada situação (KANDEL, SCHWARTZ e JESSEL, 2000).
A principal função dos sistemas sensoriais é transformar a informação contida nos
estímulos ambientais em energia eletroquímica. A energia do estímulo é traduzida para uma
descarga neural através de dois estágios: transdução, que transforma a energia em
despolarização ou hiperpolarização local da membrana celular do receptor; e, codificação
neural, que faz com que o sinal neural evoque uma descarga de potenciais de ação os quais
representam a informação do estímulo, como a intensidade ou duração. Um estímulo forte
vai evocar grandes potenciais receptores que vão gerar um maior número e uma maior
freqüência de potenciais de ação. É importante lembrar que os receptores possuem a
propriedade da adaptação, ou seja, quando um estímulo se inicia, o potencial receptor
atinge certa amplitude proporcional a este estímulo e, após, decresce a um valor menor que
depois se torna estável. Esta adaptação pode ser lenta ou rápida (LENT, 2004; KANDEL,
SCHWARTZ e JESSEL, 2000).
79
Segundo Sargant (2000) os receptores mais estudados e considerados de maior
importância são os fusos musculares e os órgãos tendinosos de Golgi, sendo os primeiros os
funcionalmente mais elaborados e de organização mais complexa. Ribot-Ciscar e Roll
(1998) também afirmam que os fusos musculares são principais componentes sensoriais do
sistema motor e a propriocepção muscular tem um papel importante na codificação
sensorial do movimento e da posição. Eles explicam que isso está relacionado ao fato de
que quando o feedback proprioceptivo é abolido ou experimentalmente ou em alguma
patologia, percebe-se um déficit considerável. Eles relatam que a percepção da articulação
resulta de um co-processamento do SNC dos múltiplos feedbacks dos fusos musculares
originados do movimento. Konradsen et al (1993) realizaram um estudo no qual
anestesiaram a cápsula articular e ligamentos de uma articulação sem alterar os receptores
musculares. Não observaram alteração da propriocepção. Assim, eles sugerem que os fusos
musculares são os principais responsáveis pela propriocepção.
Para que haja a execução de um movimento harmônico, bem coordenado é
necessário que haja perfeita interação entre os sistemas acima citados. Segundo Levin
(1995), para que o movimento ocorra há necessidade também de integridade do aparelho
motor e da existência de um desejo. Assim, esse processo segue uma seqüência marcada
pela imagem do inconsciente do movimento inscrita no corpo pelo desejo, e por sua vez sua
articulação na ação específica. Isso seria, então, uma definição para praxia, ou seja, um
sistema de movimentos coordenados e adaptados em função de uma intenção específica.
O envelhecimento produz algumas características macro e microscópicas no
sistema nervoso. Algumas delas são: diminuição do tamanho e peso do cérebro; queda do
número de neurônios e da quantidade de proteínas cerebrais; diminuição da quantidade de
neurotransmissores; alteração do número e da sensibilidade dos receptores e do limiar de
excitabilidade dos centros reguladores (PAPALEO NETTO et al, 2002). Verschueren et al
(2002) apresentaram estudos que mencionam um declínio na função dos fusos musculares
com o avanço da idade. Eles consideram que a percepção da posição do joelho e tornozelo
tende a diminuir com a idade. Isso acontece com o cotovelo e os dedos também. O limiar
para percepção do movimento parece aumentar no joelho e tornozelo do idoso. Esta
deficiência da propriocepção é associada a problemas de equilíbrio.
80
Como o idoso apresenta alteração em seu sistema sensorial (BALOH, YING e
JACOBSON, 2003) pode-se deduzir que a diminuição da propriocepção vai atuar como
fator de risco de queda para o idoso, já que sua resposta acontecerá num tempo maior, às
vezes, insuficiente para manter o equilíbrio. Lord et al (1999) confirmam que a deterioração
do sistema sensorial afeta a estabilidade postural e com isso há diminuição da habilidade de
se recuperar da perda de equilíbrio. Amiridis, Hatzitaki e Arabatzi (2003) sugerem que
idosos se adaptam à postura estática de forma diferente dos jovens. Os idosos dependem
mais dos músculos do quadril do que do tornozelo para manter o equilíbrio. Uma hipótese
apresentada como justificativa para este fato foi que os idosos apresentam déficit
proprioceptivo no tornozelo e no pé.
INSTABILIDADE POSTURAL
Um corpo é dito estável quando seu centro de gravidade é perturbado, mas ele
consegue retorná-lo à posição anterior. O estudo da instabilidade postural é extremamente
abrangente, já que envolve vários fatores de risco, tais como, iatrogenia, distúrbios
vestibulares, visuais, psicogênicos, alterações musculoesqueléticas etc... Para se manter a
estabilidade é necessário um sistema neuro-muscular íntegro. A postura é fundamental para
a manutenção do corpo na posição ortostática. Uma boa postura faz com que o indivíduo
permaneça em pé sem grande gasto de energia.
A postura e a marcha
A postura nada mais é do que uma resposta de nosso corpo à força da gravidade.
Ela é decorrente do sistema musculoesquelético, sistema nervoso e do nosso ‘emocional’
que estaria ligado às nossas pulsões, pensamentos e experiências. Qualquer que seja a
posição, o corpo está ‘reagindo’ à força da gravidade. Sendo assim, o tempo todo, temos
um grupo de músculos agindo para manter nossa posição, e por trás disso, nossas emoções
e nosso sistema nervoso ativando esses músculos. A postura, então, acaba por exteriorizar o
bem-estar, a doença, auto-estima e os sentimentos do indivíduo.
No útero, o feto se mantém numa ‘cifose única’ como se estivesse enrolado. No
parto, ele experimenta a primeira lordose ao passar pela pelve da mãe: a lordose cervical.
Esta vai ser trabalhada nos primeiros dias e meses de vida. Ao começar a querer obter a
81
posição ortostática e a dar seus primeiros passos, a segunda lordose, a lombar, começa a ser
trabalhada de forma mais intensa. Assim, as curvas fisiológicas vão sendo estabelecidas no
corpo e vão se equilibrando, graças à força da gravidade (BIENFAIT, 1995). Da mesma
forma os músculos são alongados e fortalecidos dentro de uma organização que está
relacionada com as cadeias musculares. Para um músculo ser agonista de um movimento
ele precisa da permissão do antagonista, que através de seu alongamento ‘permite’ que o
agonista realize o movimento. Como é impossível um músculo atuar sozinho, sabemos que
existem os sinergistas que atuam junto ao agonista estabilizando a articulação ou atuando
na direção e sentido do movimento. Desta forma as cadeias musculares são acionadas.
Quando comentamos que a postura recebe influência do emocional podemos citar
Keleman (1985) que comenta que ficar ereto é um evento emocional e social e que a
postura ereta humana “é um impulso genético que, entretanto, requer uma rede social e
interpessoal para se realizar” (p.76). Sendo assim, a educação dos pais, as atividades físicas,
o convívio na escola, influenciam a confiança que a pessoa tem em si mesma, interferem
em sua auto-imagem e se refletem na postura. Atualmente vem-se dando grande
importância aos fatores epigenéticos influenciando na atividade neural (Annunciato, 2001).
A postura adquirida no decorrer da vida pode vir a sofrer algumas alterações provenientes
de sensações e emoções vivenciadas em um dado momento da vida. Então, ao invés dessa
pessoa ter aquela postura, pode estar com aquela postura devido a algum fator específico.
Um exemplo comumente utilizado é o da postura de uma pessoa deprimida, que se ‘fecha’.
Ela enrola seu ombro, seu tronco e mantém a cabeça inclinada para frente, dando a
impressão de querer se fechar para o mundo.
Denys-Struyf (1995) afirma que utilizamos nosso corpo a partir daquilo que
percebemos e experimentamos para traduzir nossas emoções e nossa vivência. O corpo se
expressa com a ajuda de nossos músculos pela postura, pelo gesto e pela mímica. Mesmo se
a expressão foi inibida, o sistema neuromuscular é ativado da cabeça às mãos e aos pés.
Pensamentos e emoções acionam grupos musculares.
Em decorrência das alterações musculoesqueléticas e dependendo da condição
emocional e social em que se envelhece a postura do idoso vai variar de indivíduo para
indivíduo. Apesar disso é comum que alterações do sistema neuro-muscular façam com que
82
a gravidade provoque aumento da cifose dorsal, projeção da cabeça para frente para manter
o olhar horizontalizado, diminuição da lordose lombar alterando a localização do centro de
gravidade do corpo (KAUFFMAN, 2001). Naturalmente esta postura traz dificuldades para
a manutenção da posição ortostática.
Segundo Carvalho Filho (2000), a partir dos 40 anos há um declínio da estatura
cerca de 1 cm por década, graças a aumento das curvaturas da coluna, achatamento das
vértebras, redução dos discos intervertebrais e achatamento dos arcos do pé. Esse declínio
começa aos 40 anos e torna-se mais acentuado com o avanço da idade (PERISSINOTTO et
al, 2002).
Da mesma forma que a postura deve ser observada com cuidado, é importante que
se dê atenção à marcha do indivíduo. Para isso torna-se necessário conhecer alguns fatores
importantes característicos de uma marcha fisiológica (SMITH et al, 1997):
1. O contato do pé com o chão deve ser feito pelo calcanhar.
2. A transferência do peso do corpo deve ser realizada pela base lateral do pé.
3. O impulso pelo ante-pé deve chegar até o hálux.
4. Boa extensão do membro inferior de apoio (100 de extensão de coxofemoral
com vértebras lombares).
5. Boa flexão de coxofemoral do membro em balanço (300 de flexão).
6. Rotação do tronco alternando membros inferiores com membros superiores.
7. Boa flexão do joelho no momento do amortecimento do toque do calcanhar
(150) e no momento do balanço para se manter afastado do solo (700).
Com a idade podem-se observar algumas alterações na marcha: diminuição da
velocidade, do comprimento do passo e da altura de oscilação, e aumento do tempo de
sustentação. Kerrigan et al (2001) observaram que existe uma diminuição da extensão do
quadril em idosos durante a marcha. Sparrow et al (2002) sugerem que embora a
caminhada pareça totalmente automática, ela exige certa atenção. Os autores sugerem que
existe uma correlação entre a idade e a necessidade de atenção para caminhar.
83
A FISIOTERAPIA NA PREVENÇÃO
Através do conhecimento das alterações que o idoso tende a apresentar, podem-se
discutir os meios que o Fisioterapeuta possui para atuar na prevenção. Para isso, é
necessário definir os objetivos da prevenção, que de uma forma geral, poderiam ser:
•
Diminuição ou prevenção da dor.
•
Aumento ou manutenção do espaço interarticular.
•
Aumento ou manutenção do arco de movimento.
•
Estimulação da produção do líquido sinovial.
•
Alongamento dos músculos retraídos.
•
Manutenção da força muscular.
•
Fortalecimento do assoalho pélvico.
•
Aumento ou manutenção do número de receptores proprioceptivos.
•
Melhora do equilíbrio.
•
Melhora da coordenação.
•
Melhora da postura.
A Fisioterapia possui vários recursos tradicionais que podem ser utilizados na
prevenção. São eles: termoterapia (gelo e calor), ultra-som, laser e as correntes elétricas.
Acreditamos que todas essas ferramentas têm um grande valor na terapia e não duvidamos
dos efeitos que elas produzem na reabilitação, especialmente no que diz respeito à dor. Por
outro lado acreditamos que a cinesioterapia e a biomecânica nos fornecem subsídios
imprescindíveis para que se atinjam os objetivos acima citados. Sendo assim vamos
exemplificar algumas abordagens comumente utilizadas: exercícios e posturas de
decoaptação das articulações, alongamento e mobilizações passiva e ativa podem atuar na
dor, no aumento de arco de movimento e no aumento da quantidade de líquido sinovial;
com o conhecimento das cadeias musculares pode-se realizar um trabalho corporal visando
à melhora da postura, aumento da flexibilidade e alongamento dos músculos retraídos;
atividades de conscientização corporal e fortalecimento do assoalho pélvico; atividades
proprioceptivas, com tábuas proprioceptivas e circuitos específicos, para melhorar a
performance dos receptores proprioceptivos e consequentemente melhorar o equilíbrio;
atividades que treinem a coordenação são também de grande importância para a
84
manutenção do equilíbrio. Além disso, o treino de marcha deve ser realizado com
freqüência para fazer com que os fatores importantes que devem ser observados durante a
marcha possam ser executados repetidamente a fim de se tornarem automáticos no dia a dia
do indivíduo. O trabalho voltado para a respiração é imprescindível. Segundo Campignion
(1998) não se aprende a respirar e sim, se aprende a liberar a respiração. Esta pode agir
sobre o físico e o mental e pode ser utilizada para liberar o corpo de tensões ou para obter
ganho de mobilidade nas articulações torácicas. Assim, é importante levar o indivíduo a
tomar consciência do seu próprio modo respiratório e a descobrir sua própria qualidade de
equilíbrio e harmonia na respiração.
Os estudos de Thérèze Bertherat, Godelieve Denys-Struyf, Piret e Béziers e
Mézières são de grande valor quando se quer trabalhar a prevenção, já que essas autoras
apresentam trabalhos que visam à organização e coordenação do movimento, o
conhecimento do próprio corpo e o conhecimento das cadeias musculares. Quando
nascemos apresentamos um grande potencial adaptativo do corpo. Aos poucos temos uma
tendência a perder essa adaptabilidade e a flexibilidade, graças a traumas, lesões, vícios
posturais, alterações neurológicas, problemas reumatológicos e emocionais.
Françoise Mézières trouxe a importância da cadeia posterior, descrevendo que a
tensão e a retração muscular afetam principalmente os músculos posteriores do tronco e dos
membros inferiores, os rotadores internos do quadril e o diafragma. Ela comenta sobre a
importância de alongar os músculos que estão retraídos ao invés de fortalecer os que estão
impedidos de atuar. Segundo Denys-Struyf (2001) Mézières ensinava que o corpo também
se vê comprimido por nossa própria força e que a partir do encurtamento dos grandes
grupos musculares podemos compreender a maioria de nossas deformações, dos nossos
sofrimentos articulares que podem ser remediados pela cinesioterapia. Conhecendo seu
próprio corpo o indivíduo aprende a alongar e relaxar a musculatura tensa e retraída.
Denys-Struyf (1995) estuda a integração do funcionamento do corpo e seus
vínculos indissociáveis com o comportamento psicológico. Ela faz uma análise da forma
humana na posição ereta na sua pulsão global e relata que todo o gesto é marcado pelo
psiquismo. A autora descreve seis cadeias musculares, pelas quais o corpo pode se exprimir
85
e faz correlação da predominância destas cadeias com a alteração postural. Com o
conhecimento desta correlação fica mais fácil trabalhar o corpo do indivíduo.
Piret e Béziers (1992) colaboraram com a coordenação motora como organização
fundamental do movimento, sugerindo que um movimento correto dá ao corpo uma forma
correta. Elas explicam a importância dos músculos pluriarticulares acessando os
monoarticulares na organização e coordenação desses últimos e explicam que existe um
sistema reto através do qual pode-se enrolar e endireitar o corpo; e o sistema cruzado
através do qual pode-se torcer o tronco e alternar membros inferiores com membros
superiores. O indivíduo precisa saber como funciona o movimento das articulações e como
são as torções que os músculos fazem no tronco, nos membros inferiores e superiores para
que através da execução destes movimentos durante as atividades, possa aprendê-los,
repeti-los e utilizá-los em seu dia a dia.
Bertherat (2002), discípula de Mézières, explica que a cadeia muscular posterior é
uma força oculta que domina o resto de nossa musculatura, inibe os abdominais, os
movimentos do diafragma, nossos impulsos amorosos e nossos movimentos. A autora
(1998) comenta que a inteligência, a emoção e o corpo nunca estão separados. Eles formam
um todo indissociável. Ela enfatiza a importância da conscientização corporal, dizendo que
a tomada de consciência é o primeiro passo para o bem-estar. E acrescenta que a maioria
dos esportistas deforma o corpo porque dele só têm uma consciência parcial, pois não
conhecem a interdependência dos músculos e seus antagonistas. Por não saberem usar os
músculos mais apropriados ao esforço, vão retirando energia de onde podem. Reich (1995)
descobriu que o corpo contém a história de cada indivíduo e descreve as couraças
musculares que são tensões crônicas que se formam ao longo da vida cuja função é proteger
o indivíduo de experiências dolorosas e ameaçadoras.
Utilizando todos estes conhecimentos, e principalmente, partindo do princípio que
com o passar do tempo existe uma tendência do indivíduo de retirar a atenção do próprio
corpo e levá-la para outros focos, percebemos que um trabalho de conscientização corporal,
voltado para a realização de um movimento organizado e coordenado pode servir como
prevenção de uma série de alterações características do envelhecimento. Segundo Bertazzo
(2004), nossa sociedade ‘...imprime um ritmo muito acelerado à nossa vida, despejando
86
muito mais informações do que somos capazes de absorver’ (p. 36). Para ele, compreender
a coordenação motora permite perceber que atividades corriqueiras como o caminhar têm
um significado maior que lhe atribuímos. Para o autor, a sociedade pouco a pouco se
distancia de certas verdades básicas. Assim, ele acredita que quando o indivíduo repete um
movimento observado, ‘surgem sensações interiores que constituem seu mapa para o
refinamento do próprio gesto’ (p.57)
Como realizar o trabalho de Fisioterapia Preventiva?
Acreditamos na importância da educação como instrumento para facilitar o
trabalho de prevenção. Com isso é necessário (1) criar palestras e cartilhas explicando os
fatores de risco a que os indivíduos estão expostos, e fornecer opções de formas de
prevenção; (2) criar intervenções buscando minimizar os fatores de risco; e (3) criar meios
que motivem e mobilizem os indivíduos a mudar seus hábitos para melhorar sua qualidade
de vida. Isso faz com que surja a necessidade de buscar um meio pelo qual o trabalho
fisioterapêutico de prevenção possa se tornar prazeroso. Para isso esse trabalho deve perder
a conotação de ‘obrigação’ e passar a ser considerado ‘lazer’.
Segundo Melo e Alves Junior (2003) quando se trabalha com grupos pode-se
perceber que o elemento motivador da atividade é exatamente a promoção de tais
encontros. Sendo assim, observa-se que a realização de um trabalho de prevenção em
grupo, buscando dar ao indivíduo a oportunidade de aliar o lazer ao trabalho corporal faz
com que as pessoas tenham prazer em realizar a atividade e o resultado é um bem-estar
geral. São relatados na literatura diversos trabalhos que usam atividades grupais com o
objetivo de influir na promoção da saúde. Há indicativos, por exemplo, de que o Tai Chi
Chuan (PAULA, 2005; PAULA e ALVES JUNIOR, 2006) melhora o equilíbrio e diminui
o risco de quedas. No entanto, a maioria dos idosos que praticam esta atividade, na verdade,
o faz na busca do seu bem-estar, como lazer.
Em nossa intervenção no projeto Prev-Quedas que se desenvolve na UFF e o
Envelhecimento sem Tropeços na UFRJ, temos utilizado todos os princípios aqui descritos
com o objetivo da prevenção de quedas, que na verdade engloba a maioria das alterações
relacionadas ao envelhecimento. Além das palestras e das informações gerais e do trabalho
do Professor de Educação Física, existe o trabalho do Fisioterapeuta que engloba (1)
87
informações sobre os fatores de risco a que eles estão expostos; (2) informações sobre
como realizar o movimento de forma correta; (3) atividades de execução de movimentos
harmônicos e coordenados (respeitando as limitações e capacidades de cada um); (4)
atividades de conscientização corporal; (5) liberação da respiração; (6) relaxamento; (7)
treino de marcha; (8) atividades de coordenação e (9) trabalho proprioceptivo. Os recursos
utilizados são: escovação, percussão óssea, apresentação de figuras das articulações e de
posturas, movimentos de torções, alongamentos, mobilizações passivas e ativas. Tudo isso,
o tempo todo, estimulando a percepção do próprio corpo, chamando a atenção para os
detalhes que normalmente são esquecidos em nosso dia a dia. Assim, o trabalho alia a
educação à prática de atividades que levam o indivíduo a perceber suas limitações e suas
capacidades, a trabalhar seu corpo e a realizar os movimentos de modo a economizar
energia e evitar a dor e o desconforto.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É importante lembrar que o Fisioterapeuta precisa ter consciência de que cada
cliente é um indivíduo que possui uma história diferente, um corpo único e que por mais
que se trabalhe em busca de um movimento coordenado é preciso que se respeite e
considere a individualidade de cada um. Só desta forma o trabalho em grupo vai poder ser
eficiente e eficaz. O resultado desse trabalho pode ser observado no momento em que elas
relatam melhora das dores e das tensões quando realizam as atividades. É interessante
também citar que as técnicas ensinadas durante as atividades como passar os pés na bolinha
ou passar a bolinha na parede massageando o corpo, por exemplo, são repetidas por muitas
delas em casa para o bem-estar e o relaxamento.
88
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91
Dados da autora
Fátima de Lima Paula
Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Envelhecimento e Atividade Física
Fisioterapeuta com Especialização em Gerontologia e Geriatria – UFF
Estrada Francisco da Cruz Nunes, 777 casa 109 – Niterói – RJ
[email protected]
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IMPACTO DA ATIVIDADE FÍSICA NA DEPRESSÃO EM IDOSOS
Profa Ms. Andréa Camaz Deslandes
Instituto de Psiquiatria (IPUB)
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
RESUMO
No processo de envelhecimento, alterações fisiológicas degenerativas aumentam a
incidência de doenças físicas e mentais. Dentre as doenças mentais mais comuns em idosos,
a depressão é a de maior incidência, muitas vezes associada a outras doenças físicas. Além
de medicamentos e psicoterapia, o exercício físico é apontado como uma estratégia de
tratamento não farmacológico da depressão, podendo estar relacionado tanto à prevenção
quanto à diminuição da sintomatologia. A prática de atividade física está relacionada à
melhora de aspectos fisiológicos e psicológicos que influenciam na qualidade de vida e na
saúde. Neste sentido, é preciso conhecer as causas da doença e entender o impacto da
atividade física no envelhecimento saudável e sua contribuição na diminuição da depressão
em idosos.
Palavras chave: exercício - depressão - envelhecimento
INTRODUÇÃO
Com o processo de envelhecimento, ocorre também uma diminuição da qualidade
de vida, seja por comprometimento no aspecto físico, psicológico ou social. Um fator
importante para o envelhecimento saudável é a prática do exercício físico regular. A
participação de idosos em programas de exercícios físicos pode influenciar no processo de
envelhecimento através da melhora na qualidade de vida, funções orgânicas e cognitivas,
garantindo uma maior independência pessoal e prevenindo doenças.
As duas síndromes psiquiátricas mais comuns em idosos são a demência e a
depressão. Associada com morbidade e mortalidade, a depressão, um transtorno mental do
humor, é o maior problema de saúde pública do mundo, e é caracterizada por perda no
humor e na capacidade de sentir prazer, fadiga e preocupação com morte e suicídio
(STRAWBRIDGE et al., 2002). A depressão em idosos está relacionada a diversos fatores,
entre eles, disfunções executivas e funcionais (ALEXIOPOULOS 2002; LOCKWOOD &
ALEXIOPOULOS, 2002; CRAFT & PERNA, 2004; LAKS et al,. 2005). Várias são as
queixas cognitivas presentes durante o estado depressivo, incluindo redução das habilidades
atentiva e mnêmica e lentidão do pensamento (ROZENTHAL et al., 2004). Neste sentido, a
93
atividade física pode ter um importante papel tanto no auxílio do tratamento quanto na
prevenção da depressão (BLUMENTAL et al., 1999; MELLION & PAPEZ, 1985;
WEUVE et al., 1996).
A saúde mental está relacionada com a saúde física e o tratamento de doenças como
a depressão deve englobar terapias farmacológicas e de reabilitação cognitiva e atividade
física. A inclusão de rotinas de exercício na atividade diária vem sendo indicada para a
redução dos sintomas de depressão, além da melhora em aspectos cognitivos como humor,
atenção e memória (WEUVE et al., 2004; COLCOMBE et al., 2004). Além disso, estudos
demonstram o efeito preventivo da atividade física em disfunções cognitivas na depressão e
na demência (STRAWBRIDGE et al.,2002; COLCOMBE et al., 2004; ABBOTT et al.,
2004). A participação em um programa de condicionamento físico sistematizado apresentase como uma alternativa não medicamentosa para a melhora cognitiva em idosos normais.
DEPRESSÃO EM IDOSOS:
A depressão é um dos maiores problemas da saúde pública, atingindo cerca de 121
milhões de pessoas em todo o mundo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a
depressão representa a quarta maior causa de doenças mundiais em 2000, com projeção de
se tornar a segunda maior responsável em 2020. No Brasil, dez milhões de brasileiros são
diagnosticados por ano com depressão. Davidson et al (2002) apontam para achados
consistentes na literatura relacionados à depressão, entre eles: seu curso recorrente, o
impacto do estresse e do fator de risco genético, o risco de suicídio, a multiplicidade de
fatores e a prevalência em mulheres. Esta doença ocupa um importante destaque não só
pela sua gravidade, mas também por ocorrer em comorbidade com outras doenças. Idosos
com diabetes, hipertensão, doenças coronarianas e obesidade comumente apresentam
quadros de depressão. Especialmente em pacientes hospitalizados, doenças físicas e
mentais são agravadas. Além disso, autores relacionam a depressão geriátrica com a
síndrome de disfunção executiva (ALEXIOPOULOS et al., 2002; LOCKWOOD &
ALEXIOPOULOS, 2002). Estudos clínicos, neuroimagem, estruturais e funcionais
sugerem que tal disfunção executiva poderia agravar o quadro de depressão e seu curso.
Com isso, pesquisadores buscam cada vez mais identificar circuitos cerebrais da depressão,
relacionando anatomia e fisiologia cerebral às respostas comportamentais.
94
O ENVELHECIMENTO E O CÉREBRO
O envelhecimento provoca diversas alterações no organismo como: diminuição no
condicionamento cardiovascular, alterações na composição corporal, diminuição na visão,
audição, memória e tempo de reação (SPIRIDUSO, 2002). O Sistema Nervoso Central
(SNC) sofre alterações funcionais e anatômicas que podem ocorrer de forma linear ou
exponencial, mas sempre progressiva. O cérebro atinge a maturidade entre a segunda e a
terceira décadas de vida. A partir desta fase, começa o processo degenerativo do cérebro
(SHEPHARD, 1997). O seu envelhecimento pode estar relacionado a fatores genéticos
(programação de morte celular), ao estilo de vida (drogas, alimentação, descanso, atividade
física), ao ambiente (poluição, radiação) e às doenças (físicas e mentais). Diversas
modificações anatômicas e fisiológicas estão associadas ao envelhecimento do cérebro,
entre elas: diminuição do peso do cérebro, atrofia cerebral, morte de neurônios, aumento
dos ventrículos, diminuição da ação de neurotransmissores e diminuição do fluxo
sanguíneo cerebral (LENT, 2004). Estas modificações neurofisiológicas geram um prejuízo
nas respostas comportamentais, como aumento no tempo de reação e perda de memória e
atenção. Com isso, muitas vezes o limite entre o diagnóstico de um envelhecimento normal
e patológico é extremamente difícil e passível de erros. Diversas técnicas são utilizadas
para estudar as modificações do SNC em função do envelhecimento. Pela dificuldade de
acesso, a maior parte dos estudos em humanos é feita após a morte ou com técnicas nãoinvasivas. Entre as técnicas não-invasivas, destacam-se a Ressonância Magnética
Funcional, a Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET), a Tomografia por Emissão de
Fótons (SPECT) e a eletroencefalografia (EEG). Tais técnicas associadas à integração
progressiva das neurociências com as ciências do comportamento contribuem para o
avanço da neuropsicologia nesta área.
ASPECTOS NEUROBIOLÓGICOS DA DEPRESSÃO:
As regiões mais estudadas são as áreas frontais e suas conexões, bem como as áreas
temporais (ROZENTHAL et al., 2004; DAVIDSON et al., 2002).
Área frontal
A área frontal tem uma importante função na análise neuropsicológica da depressão.
Considerando os comprometimentos deste transtorno em funções como a emoção e a
95
atenção, é esperado que esta área tenha um destaque especial nos estudos que buscam
detectar localizações e circuitos cerebrais envolvidos na depressão. Davidson et al. (2002)
apontam para modificações anatômicas e funcionais específicas, como a diminuição do
fluxo sanguíneo e do metabolismo de glicose no córtex pré-frontal. Esta área possui
conexões com as vias para-límbicas, e estão relacionadas a aspectos emocionais, assim
como a amígdala. Especificamente em idosos deprimidos, foram relatadas também
alterações anatômicas no córtex orbital bilateral (LAI TJ et al., 2000).
Área temporal
A depressão está relacionada a alterações do eixo hipotálamo- hipófise- adrenal
(HHA). Dentre outras respostas, o aumento da produção de cortisol em resposta à
estimulação do hormônio adrenocorticotrópico (ACTH) seria uma característica associada
ao transtorno. Alterações no eixo HHA estão relacionadas a aferentes vindos de inúmeras
áreas cerebrais, entre elas, lócus ceruleus, amígdala, córtex cerebral e hipocampo
(BARDEN, 2004). Além disso, aspectos anatômicos como a hipertrofia da glândula adrenal
e da hipófise são relatados na literatura (DAVIDSON et al., 2002).
ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS DA DEPRESSÃO E O PAPEL DO EXERCÍCIO:
Atenção
Apesar das queixas de redução da habilidade atentiva presente durante o estado
depressivo, estes déficts parecem estar relacionados à gravidade do transtorno. Algumas
disfunções cognitivas permanecem mesmo com a melhora do quadro. Neste sentido, Abbott
et al. (2004) analisaram 2257 idosos num estudo prospectivo e concluíram que a atividade
física está relacionada com a melhora cognitiva e a redução do risco de demência. Segundo
Colcombe et al. (2004), através da ressonância magnética cerebral (RM), há uma ativação
do córtex pré-frontal e do giro cingulado anterior em sujeitos idosos com melhor
condicionamento físico. Além disso, o autor observou que os sujeitos que treinaram em
atividades aeróbicas tiveram um melhor resultado no tempo de reação. O autor sugere que o
aumento da atividade física possa aumentar a plasticidade do cérebro de idosos, através do
aumento do fator neurotrófico do cérebro em áreas frontais e parietais e que isso possa
contribuir para a melhora cognitiva.
96
Memória
Os hormônios do estresse estão alterados na depressão, gerando um aumento na
função do eixo HHA. Com isso, o hipocampo, área amplamente relacionada à memória,
vem sendo observado nos estudos neuropsicológicos da depressão. Davison et al. (2002)
relacionam anormalidades no volume do hipocampo à expressão da depressão e consideram
esta modificação anatômica como uma conseqüência e não uma causa primária da
desordem. A depressão poderia estar relacionada a memórias específicas, já que a de curto
prazo e implícita parecem não ser afetadas pelo transtorno (ROZENTHAL et al., 2004). A
memória semântica parece estar mais comprometida em pacientes deprimidos com psicose.
Estudos que investigaram idosos e a atividade física observaram uma boa relação entre
treinamento físico e memória. Weuve et al. (2004) observaram 18766 idosas e concluíram
que a atividade física regular está associada a uma função cognitiva melhor, através de
testes de memória de trabalho e atenção. Outro estudo realizado com 40 idosas observou
uma melhora na memória lógica e imediata com a atividade aeróbica (ANTUNES et al.,
2001).
Função executiva
Uma das funções cognitivas mais prejudicadas no idoso é a função executiva
(ALEXIOPOULOS, 2002; LOCKWOOD & ALEXIOPOULOS, 2002). No caso específico
da depressão em idosos a alteração executiva pode ser significativa durante a evolução,
sendo que a presença desses déficts está correlacionada com comprometimento funcional,
pior resposta ao tratamento, recaídas e recorrências. A síndrome da disfunção executiva na
depressão interfere diretamente na vida diária do paciente e no prognóstico destes casos. Os
pacientes têm dificuldade de planejamento, organização, iniciativa, velocidade de
processamento e desenvolvimento de estratégias, além de flexibilidade mental
comprometida. Terapias voltadas para a solução de problemas se mostram eficazes na
diminuição dos sintomas depressivos e na melhora do desempenho em atividades diárias,
podendo ser uma alternativa terapêutica importante para a população que permanece
sintomática (ROZENTHAL et al., 2004). Aliado a estas terapias, o exercício vem sendo
apresentado como um importante auxílio na melhora funcional, já que contribui para uma
maior independência do idoso em sua rotina diária. Um estudo com 153 pacientes de
97
Alzheimer observou que a terapia comportamental através do auxílio de cuidadores e o
treinamento físico contribuem para a melhora funcional e a diminuição dos sintomas de
depressão (TERI et al., 2003).
Emoção
Uma questão fundamental na neuropsicologia da depressão é a emoção, já que esta
tem o importante papel de guiar a cognição (ROZENTHAL et al., 2004). A emoção estará
influenciando, entre outros, o processo de tomada de decisão, de grande relevância clínica
para pacientes deprimidos que possuem dificuldade neste sentido.
Entretanto, existe a dificuldade de mensuração e definição de afetos e sentimentos,
fazendo com que no caso dos aspectos emocionais, os avanços das Neurociências estejam à
frente da capacidade atual da Neuropsicologia em observar e testar objetivamente a
“inteligência emocional” (LAKS et al., 1996). Observando as bases neuroanatômicas e
neurofisiológicas das emoções e sentimentos, observamos algumas teorias que tentam
explicar seus processamentos e circuitos cerebrais. A primeira proposta foi a teoria de
Papez (PAPEZ, 1937), que relacionou as áreas do hipocampo, hipotálamo, núcleos
talâmicos anteriores e giro do cíngulo, com as experiências e expressões emocionais. Outro
sistema de integração das emoções que reforçou a teoria de Papez foi o sistema límbico.
Este sistema compreende os componentes corticais do lobo límbico (córtex límbico,
hipocampo e giro do cíngulo) e os núcleos subcorticais associados (amígdala, núcleos
septais, hipotálamo, epitálamo, núcleos talâmicos e parte dos núcleos da base). Este sistema
seria responsável por interpretar e dar expressão às informações que chegam em termos de
sentimentos.Além disso, outras regiões importantes nos estudos das emoções são os lobos
frontal e parietal e suas conexões (DAVIDSON et al., 2002, GAZZANIGA et al., 2002).
Estudos relacionam a assimetria da área frontal com os humores positivos e negativos. Na
depressão, haveria uma diminuição de atividade esquerda frontal, que estaria associada a
sentimentos negativos (GAZZANIGA et al., 2002). Outro aspecto neurofuncional
importante seria a relação do fluxo sanguíneo cerebral e do metabolismo de glicose na
amígdala com a gravidade da depressão e os sintomas negativos (DAVIDSON et al., 2002).
A importância do exercício nestes circuitos ainda não é estabelecida, apesar da grande
especulação a respeito deste assunto.
98
EXERCÍCIO E DEPRESSÃO: HIPÓTESES
Como foi dito anteriormente, a atividade física vem sendo relacionada com a
melhora nos sintomas neuropsicológicos da depressão. Diversos mecanismos são propostos
para explicar este efeito benéfico, entretanto poucos são os estudos para suportar tais
evidências (CRAFT & PERNA, 2004). Hipóteses fisiológicas e psicológicas são propostas
na tentativa de elucidar a relação entre atividade física e função emocional. Hipóteses
fisiológicas incluem alterações no fluxo sanguíneo cerebral, funcionamento cerebral das
monoaminas, fatores neurotróficos do cérebro, alterações no eixo HHA e temperatura
corporal. Mecanismos psicológicos incluem o exercício servindo como distração, aumento
da auto-estima e aumento da socialização. A seguir, serão detalhadas algumas destas
hipóteses.
Hipótese HHA
A atividade do eixo HHA é modificada com o exercício, fazendo com que haja uma
diminuição da sensibilidade adrenal à estimulação do ACTH e uma menor resposta do eixo
HHA ao cortisol e ainda uma menor resposta de produção de cortisol pelas adrenais
(CHENNAOUI et al., 2002). O exercício é responsável também pelo aumento de βendorfinas, relacionadas com a melhora de humor. Entretanto, os estudos mostram que para
uma liberação de endorfinas são necessários uma intensidade e um volume alto de
treinamento, tornando esta hipótese questionável. Além disso, estudos que utilizaram
bloqueadores desta substância obtiveram sensação de prazer após a atividade, reforçando a
idéia de que outros mecanismos estão envolvidos na relação de prazer e exercício
(POWERS & HOWLEY, 2000).
Hipótese das Monoaminas
Uma resposta amplamente reconhecida do exercício é o aumento das monoaminas,
entre elas a dopamina, noradrenalina e adrenalina. Além disso, a serotonina também se
encontra aumentada após a atividade física (POWERS & HOWLEY, 2000). Visto que as
monoaminas encontram-se diminuídas na depressão, o aumento destas com o exercício vem
sendo uma hipótese fisiológica de destaque nos estudos nesta área. Autores apontam para o
aumento de dopamina no cérebro após o exercício, devido ao aumento nos níveis de cálcio
99
no cérebro através do estímulo de um sistema enzimático conhecido como cálciocalmodulina (SUTOO & AKIYAMA, 1996; SUTOO & AKIYAMA, 2003). A dopamina
está relacionada com o desempenho motor, motivação locomotora e a modulação
emocional. O exercício atuaria através da estabilização de circuitos e desordens cerebrais
geradas pela diminuição desta monoamina. Entretanto, dificuldades metodológicas
impossibilitam a esta linha de pesquisa avançar, permitindo na maioria dos estudos a
interpretação dos achados de pesquisas em animais.
Hipótese da Neurogênese
Estudos recentes apontam para uma nova teoria da depressão, que relaciona o
transtorno a uma diminuição de plasticidade neuronal. Os autores acreditam que uma
disfunção na neurogênese hipocampal possa alterar os circuitos cerebrais favorecendo o
aparecimento da depressão. Neste sentido, o estresse estaria contribuindo para a diminuição
de fatores neurotróficos do cérebro (FNC) e a atividade física e os antidepressivos teriam
um efeito oposto, facilitando o aumento do FNC e conseqüentemente a neurogênese no
hipocampo adulto e o aumento da plasticidade (LIE et al., 2004, KEMPERMANN et al.,
2002, RUSSO- NEUSTADT et al., 1999). O exercício parece ter um efeito protetor das
respostas degenerativas do estresse no cérebro (ADLARD & COTMAN, 2004). Entretanto,
esses estudos foram feitos em animais, não podendo ser afirmados em humanos.
Hipótese da Distração e da auto-estima
Diversos mecanismos psicológicos são associados à melhora dos sintomas da
depressão com o exercício, entretanto estas teorias não foram testadas extensivamente.
Espera-se que, com a atividade física, haja um aumento da distração, da auto-estima e da
independência (SPIRIDUSO, 1995). Enquanto o indivíduo treina, ele estará livre de
pensamentos negativos e problemas que o deixem deprimido. Especialmente em idosos, as
modificações corporais, tais como, aumento de força, equilíbrio e condicionamento fazem
com que ele tenha uma melhor imagem de si próprio e menor necessidade de auxílio de
terceiros para realizar as tarefas diárias como subir uma escada ou atravessar uma rua
rapidamente. Esta capacidade funcional está relacionada a uma melhor qualidade de vida e
com isso, observa-se uma menor suscetibilidade à depressão.
100
DEPRESSÃO E QUEDAS
As alterações do equilíbrio corporal, clinicamente caracterizadas como tontura,
vertigem, desequilíbrio e queda, estão entre as queixas mais comuns da população idosa e
constituem um problema médico de grande relevância. As quedas em idosos representam
altos níveis de mortalidade e morbidade (ROSE, 2003). A relação entre ser depressivo e o
ato de cair pode ser tanto de causa quanto de conseqüência. Devido às quedas, o idoso pode
ficar hospitalizado ou impossibilitado de realizar suas tarefas diárias, o que leva a um
isolamento social, além do aparecimento de doenças relacionadas ao sedentarismo
(obesidade, hipertensão, diabetes, etc). Todos esses fatores podem iniciar um processo de
depressão no idoso, que contribuirá para dificultar o processo de reabilitação do paciente.
Neste sentido, a depressão estará acontecendo como conseqüência do ato de cair. Já a
relação de causa é um pouco mais complexa, pois está dividida em dois aspectos
importantes: o efeito do medicamento no equilíbrio e a diminuição da capacidade funcional
gerada pela diminuição de atividade física no idoso depressivo. A utilização de
medicamentos antidepressivos e benzodiazepínicos está relacionada a problemas de
hipotensão postural e elevado risco de quedas em idosos (TINETTI et al., 1994, LEIPZIG,
1999a). Freqüentemente o idoso faz uso de outros medicamentos como anti-hipertensivos,
hipoglicemiantes
orais
e
outros,
sendo
altamente
susceptíveis
às
interações
medicamentosas. Idosos que fazem uso de antidepressivos tricíclicos, devido à resposta de
hipotensão postural, devem ter um cuidado maior na mudança da posição deitada e sentada
para a posição ereta. Além disso, um dos aspectos funcionais importantes do desequilíbrio é
a falta de força e flexibilidade, comum em idosos sedentários. Estudos que avaliaram a
relação entre estar depressivo e sedentarismo, verificaram uma diminuição de atividade
física em idosos depressivos. Penninx et al.(1999) acompanharam 6247 idosos ao longo de
seis anos e verificaram que aqueles que apresentavam maiores sintomas depressivos
reduziram significativamente o desempenho em tarefas diárias. Esses resultados poderiam
ser parcialmente explicados por redução da prática de atividade física e da interação social.
Vários estudos comprovaram que a depressão pode prejudicar a capacidade funcional nas
atividades de rotina (tomar banho, comer, vestir-se) e na mobilidade (caminhar metade de
uma milha ou subir e descer degraus sem ajuda) (REYNOLDS & SILVERSTEIN, 2003,
101
TURNER et al, 2005, KIVELA et al., 1994). A falta de independência no desempenho
dessas atividades pode estar associada com dores físicas crônicas (TURNER et al., 2005),
inatividade física (REYNOLDS & SILVERSTEIN, 2003, GAZMARARIAN et al., 2000,
MEANS et al., 2003) e o medo de quedas (SATTIN et al., 2005). Rotinas de exercício que
incluíram alongamento, equilíbrio, caminhada, força e coordenação mostraram ser
eficientes na redução dos níveis de depressão para idosos com recente histórico de quedas
(GAZMARARIAN et al., 2000).
EXERCÍCIO FÍSICO NA DEPRESSÃO: EFEITO PROTETOR OU TRATAMENTO EFICAZ?
A capacidade funcional, a energia, a vitalidade e a saúde física são fatores
fundamentais para melhores níveis de qualidade de vida (SPIRIDUSO, 1995). O impacto
do exercício na depressão em idosos está relacionado à diminuição de sintomas depressivos
e à prevenção da doença. Os estudos que avaliam a relação entre a prática de atividade
física e a depressão são divergentes; alguns autores observam uma boa correlação entre
fazer exercício e não ter depressão (KOHUT et al., 2005, RYBARCZYK et al., 1999),
outros não encontram relação de proteção da doença (BAYLEI & MCLAREN, 2005,
ANTOM & MILLER, 2005). O efeito do exercício como tratamento não farmacológico
para diminuição dos sintomas de depressão é observado em diversos estudos. O tipo de
atividade (HABOUSH et al., 2006), volume de treino (KING et al., 1993) e a interferência
do aspecto social (MC NEIL et al., 1991) parecem não serem fatores significativos,
mostrando que o exercício pode colaborar para diminuir os sintomas de depressão. Além
disso, quando comparados os idosos que ingeriam medicamento com os que faziam
treinamento ou, ainda, com os que se submetiam a ambas as ações, constatou-se que todos
obtiveram diminuição dos sintomas de depressão (BLUMENTAL et al., 1999).
CONCLUSÃO
A qualidade de vida em idosos está relacionada a fatores físicos, socioeconômicos e
mentais. Neste sentido, a prática regular de atividade física é fundamental para um processo
de envelhecimento normal. Através dela, os idosos diminuem o risco de doenças associadas
ao sedentarismo, melhoram aspectos físicos (força, capacidade aeróbia, equilíbrio) e
mentais (auto-estima, motivação), além de diminuir o tempo livre para pensamentos
102
negativos. O exercício promove alterações fisiológicas e psicológicas que contribuem para
a prevenção e diminuição da depressão. Apesar de os estudos não conseguirem definir as
causas específicas da melhora dos sintomas de depressão com a prática de atividade física,
esta relação positiva é respaldada por diversos estudos na literatura, mostrando que o
exercício é uma estratégia efetiva de tratamento da depressão em idosos (FRAZER et al.,
2005).
Idosos com ou sem depressão devem realizar uma rotina de exercícios físicos,
orientada por uma equipe multidisciplinar composta de médicos, professores de Educação
Física, fisioterapeutas, psicólogos e nutricionistas. A família e/ou cuidadores possuem um
papel fundamental neste processo, e precisam ter conhecimento da influência da atividade
física na depressão, para que incentivem a sua prática regular. O treinamento deve ser
gradativo e seguro, sem proporcionar riscos de lesões e quedas. O objetivo deve estar
voltado para a melhora da capacidade funcional, através do treinamento dos componentes
de capacidade aeróbica, força, flexibilidade e equilíbrio. Com isso, a atividade física
também estará contribuindo na prevenção de quedas. Independente da rotina de treinamento
deve-se estar associado à socialização (treinamento coletivo) e ao prazer. Isto facilitará a
aderência, fator fundamental para que os benefícios do exercício possam acontecer.
Independente do tempo que se vive, o importante é como viver, e neste sentido, a
atividade física tem um papel fundamental para que o envelhecimento aconteça de forma
saudável. É preciso buscar o equilíbrio do corpo e da mente, para atingir a saúde de forma
plena, conquistando a saúde física e mental.
103
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107
Dados do autor:
Prof Andréa Camaz Deslandes, Ms
Licenciada em Educação Física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Mestre e Doutoranda em Saúde Mental pelo Instituto de Psiquiatria da UFRJ
Pesquisadora dos Laboratórios de Mapeamento Cerebral e Integração Sensório-Motora e
Centro de Demência e Alzheimer (IPUB/UFRJ) e do Laboratório de Fisiologia do Esforço
(HSE).
Bolsista da CAPES
Responsável pela pesquisa “O Impacto do treinamento aeróbio em idosos depressivos”.
Av. Venceslau Brás, 71 Fundos - Botafogo 22.290-140 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil.
Email: [email protected]
108
ENVELHECIMENTO E AUTO-ESTIMA: CONTRIBUIÇÕES DA VIDA
ASSOCIATIVA
Andréa Lucena Costa
Mestre em Educação
Universidade Gama Filho
“O tempo é um ponto de vista:
velho é quem tem um dia a mais que eu.”
Mário Quintana
RESUMO
O objetivo deste artigo é analisar a relação entre os conceitos de envelhecimento
dependência, autonomia e auto-estima, apresentar a influência da auto-estima no
desempenho de pessoas acima de 65 anos de idade, apontando a dinâmica estabelecida
entre os idosos e seus familiares. Os pressupostos que norteiam este artigo apregoam a
possibilidade do exercício da autonomia de pensamento e decisão frente ao
comprometimento da autonomia de ação. Percebemos que a dependência seja ela física,
emocional ou financeira compromete a autonomia total do idoso, trazendo à tona a rede de
relações familiares, permeadas de sentimentos e atitudes antagônicas e envolvidas por uma
capa zelosa de cuidados extremistas camuflados por um autoritarismo discriminatório. Isso
acontece em um contexto onde a ausência de negociação entre o idoso e seu familiar ocorre
e o espaço desse idoso é invadido e desrespeitado. A influência exercida por cada pessoa
sobre nós varia muito, porém os processos de aceitação, ou rejeição ou os valores que lhes
são atribuídos, incidem sobre a formação da sua auto-avaliação. Durante o nosso
desenvolvimento muitos contribuem para esse processo como nossos pais, familiares,
professores, amigos e a sociedade num modo geral. Porém no envelhecimento esses
conceitos são colocados em xeque a partir do somatório das perdas emocionais, sociais,
fisiológicas e profissionais decorrentes dessa faixa etária.
Palavras-Chave: auto-estima, autonomia, dependência, idoso.
INTRODUÇÃO
Quando pensamos em auto-estima, imaginamos logo alguém bem sucedido
profissionalmente, engajado em muitos projetos, cercado de amigos, com uma família bem
estruturada, jovem e feliz. Você consegue imaginar alguém assim aos 65 anos de idade?
É pensando nisto que este capítulo se propõe a uma discussão teórica sobre os
aspectos psicológicos que envolvem as quedas e suas conseqüências nas relações
familiares. Discutindo assim algumas implicações psicossociais no processo de
envelhecimento, tentando perceber quais são os fatores — de cunho psíquico, físico, social
ou cultural — que interferem na vivência de uma vida ativa e saudável.
109
O envelhecimento sempre representou um desafio a todas as sociedades humanas,
em especial no mundo moderno, cuja dimensão social privilegia a juventude, como mito e
como valor que preside a percepção de mundo e a compreensão da vida. Assim, é bastante
natural que questões relacionadas à qualidade de vida e bem-estar do idoso passem a ocupar
a pauta das discussões políticas, acadêmicas e sociais, pois o aumento do contingente de
indivíduos pertencentes ao que vem sendo chamada de Terceira Idade demanda que
maiores estudos relacionados a este grupo sejam empreendidos, visando à melhoria na
qualidade de vida e promoção de saúde desta população.
Segundo Robledo (1994: 34), o envelhecimento é um processo inexorável, que,
considerando-se os fatores genéticos, ambientais e psicológicos, isto é, as condições a que
uma pessoa está exposta, pode ocorrer de variadas formas. O envelhecimento pode ser
analisado a partir dos pontos de vista cronológico, biológico, psíquico, social,
fenomenológico e funcional, cada qual com suas especificidades e respondendo
diferentemente aos questionamentos em relação ao processo de envelhecer. Ele também
aponta para as variadas formas de envelhecer. Indivíduos acima de 80 anos em plena
produtividade e outros com menos idade em estado de total decrepitude.
É sabido que alguns idosos preservam sua capacidade funcional, mas também
encontramos indivíduos acometidos por doenças crônico-degenerativas ou simplesmente
que após sofrerem uma queda, resulta em fragilidade na mobilidade e declínio nas suas
atividades da vida diária (AVDS), tornando-se dependentes dos cuidados dos outros.
Mesmo que esses cuidados sejam executados por profissionais qualificados se faz
necessário à participação familiar onde muitas vezes não acontece.
Postulamos que nem sempre a família está consciente da importância do problema
das quedas dos seus idosos achando que isto seria um fato normal e decorrente da idade.
Entretanto, sabemos que medidas simples, como alterações nas residências como também
uma maior conscientização do que pode vir a causar uma queda, contribuirá na prevenção
de episódios banais de quedas, mas que podem ter conseqüências bastante importantes. A
família pode e deve estimular a participação de seus idosos em atividades associativas das
mais diversas, existindo algumas que em seus programas têm propostas destinadas à
prevenção de quedas. O envolvimento da família também nestes projetos nos parece
110
fundamental, e isto já vem ocorrendo como, por exemplo, no projeto Prev-quedas, que se
desenvolve na Universidade Federal Fluminense e no projeto Envelhecimento sem
tropeços, que se desenvolve na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Às vezes a simples
mudanças de atitude da família, estimulando a participação na vida em sociedade e não
culpando o idoso pelas quedas que venham a ocorrer, contribui para que o idoso se sinta
mais seguro para enfrentar as barreiras arquitetônicas que rondam os espaços por eles
freqüentados. Uma família conscientizada sobre que papel pode desempenhar evitará o
agravamento da síndrome pós-queda, que é um fato bastante comum, e que faz com que o
temor de novas quedas venha a diminuir a confiança de sair só. Posturas que fortalecem a
melhor estima da pessoa evitarão que o idoso fique cada vez mais imóvel e isolado
socialmente, muitas vezes dependerá da sua compreensão a efetivação de determinadas
alterações que se fazem necessárias na arquitetura caseira, já que sabemos que é
significativo o número de quedas que ocorrem em casa.
Afinal, o preconceito e o estereótipo são as caracterizações que envolvem qualquer
atividade que o idoso exerça em nossa sociedade e a família deve estar atenta para não vir a
perpetuar os preconceitos. O envelhecimento é um processo dinâmico e progressivo, no
qual há alterações morfológicas, funcionais e bioquímicas, que vão alterando
progressivamente o organismo e tornando-o mais susceptível às agressões intrínsecas e
extrínsecas que terminam por levá-lo à morte. (CARVALHO FILHO, 1996).
Entretanto, (PAPALÉO NETO; PONTE, 1996), sugerem sobre a dificuldade de
definição quanto às etapas do próprio período de envelhecimento, visto que este é marcado
por declínios funcionais que, geralmente, começam de forma quase que imperceptível na
segunda década de vida. Tais declínios, caracterizados através dos déficits, são entendidos
como "deterioração ou incapacidade da função neurológica: perda da fala, perda da
linguagem, perda da memória, perda da visão, perda da destreza, perda da identidade e
inúmeras outras deficiências e perda das funções (ou faculdades) específicas" (SACKS,
1997).
Percebemos que alguns idosos se isolam e perdem completamente sua capacidade
de participação e expressão frente aos problemas do cotidiano. São pessoas que, em face de
111
suas limitações, se tornam dependentes dos cuidados de terceiros, que, por sua vez, limitam
o exercício de sua autonomia.
Os estudos gerontológicos apontam novas modalidades de atendimento à pessoa
idosa, seja para prevenção de quedas e doenças, para detecção antecipada e reabilitação dos
déficits funcionais e cognitivos e na promoção de saúde. Essas ações são vitais para a
preservação ou o resgate da autonomia e paralelamente da auto-estima deste idoso
almejando-se assim que os mesmos tenham o direito de usufruir a atenção e dos seus bens
conquistados ao longo de sua vida.
DEPENDÊNCIA, AUTONOMIA E AUTO-ESTIMA: O QUE POSSUEM EM COMUM?
Nas especializações em assistência ao idoso, há uma preocupação com a avaliação
do grau de dependência para a realização das atividades de vida diária.
É na velhice que encontramos o ápice de situações que geram transformações.
Algumas transformações acontecem de forma gradativa, outras, são instantâneas e são
capazes de modificar todo o rumo da vida dos idosos, como por exemplo, a queda.
Novaes (1995) destaca como transformações na vida do idoso: a perda do papel
profissional; a perda de amigos, familiares e contatos sociais gratificantes; as
transformações físicas e hormonais; e os comprometimentos das condições de saúde.
As situações acima citadas podem comprometer a capacidade funcional, o que
implica dependência para a realização das atividades da vida diária (AVDS) e à perda da
autonomia. A dependência pode ser um problema na velhice, muitas vezes, se configura
como perda de espaço, de valores e de autodeterminação, em função da inexistência de
negociação entre os idosos e seus familiares. Essa dependência trás situações estressantes e
ausência de respeito para ambos os lados. Contribuiu para um desequilíbrio das condições
em que ocorre o cuidado, dificultando assim uma interação familiar coesa.
Baltes e Silverberg (1995) comentam que a dependência, na velhice, é resultado de
mudanças ocorridas ao longo do curso de vida e acrescentam que elas englobam desde as
mudanças biológicas até as transformações exigidas pelo meio sociais. As autoras
discriminam a dependência em três níveis: a dependência estruturada, resultante da
circunstância cultural que atribui valor ao homem em função do que e enquanto produz.
112
A dependência física que decorre da incapacidade funcional, ou seja, falta de
condições para realizar as tarefas da vida diária. Finalmente, a dependência
comportamental, que é socialmente induzida, pois advém do julgamento e das ações de
outrem. Referimo-nos à circunstância em que uma pessoa é considerada incompetente para
realizar suas tarefas. Diante dessa avaliação, alguém sempre assume a função de fazê-lo em
seu lugar, mesmo que não haja necessidade ou que a própria pessoa não o deseje.
A dependência desencadeia algumas situações que impõem limites ao exercício da
autonomia, sobretudo no que tange à participação e tomada de decisões em situações de
interesse pessoal dos idosos. É na participação na dinâmica familiar que buscamos as
representações do idoso sobre sua relação familiar.
Quando falamos em autonomia, pensamos na capacidade do indivíduo de tomar
decisões, de administrar a vida de acordo com valores próprios e de se autogovernar.
Para Baltes e Silverberg (1995) uma incapacidade orgânica não é condição
necessária nem suficiente para a dependência. Apesar disso, dentro da dinâmica das
interações sociais e da percepção social, a dependência física é freqüentemente interpretada
como um sinal de incompetência geral, geradora de dependência generalizada. As autoras
são criticas no que tange a associação da dependência física com a perda total de
autonomia. Já segundo Motta (1992) autônomo é quem tem em si mesmo a própria lei.
Entretanto Gillon (1995) aponta para três critérios de autonomia: autonomia de ação
é aquela em que o homem pode agir de forma independente, sem qualquer obstáculo; a
autonomia de vontade é a que permite ao ser humano decidir sobre coisas com base nas
suas próprias deliberações, e a autonomia de pensamento é a que faz do homem, no uso de
sua capacidade intelectual, um ser que pode tomar decisões com base nas suas crenças e
valores.
Pavarine (1996) apresenta a influência da autonomia na qualidade de vida das
pessoas idosas, ressaltando que, apesar do grau de fragilidade ou dependência, é importante
que elas próprias exerçam o controle de suas vidas, a despeito das limitações com que se
deparam. Se o idoso mantiver preservada sua cognição, as limitações físicas não podem
constituir, por si, obstáculos para a realização de seus desejos, vontades e para que tenha
participação nas decisões que dizem respeito, em especial, à própria vida.
113
A dependência não é sinônimo de perda de autonomia. A auto-estima é um
sentimento que tem como característica conhecer e aceitar as nossas próprias limitações
sejam elas afetivas, físicas, sociais e/ou financeiras. O grau de independência do individuo
acompanha as medidas necessárias para conservar a autonomia do mesmo. Esta
manutenção ligada à preservação da capacidade funcional do idoso proporciona indicadores
de qualidade e promoção de saúde.
Segundo Evans (1984) quando há perda de algumas funções, associa-se
imediatamente à perda total da autonomia, o que conseqüentemente afeta o processo de
envelhecimento. Uma das formas de mensurar a qualidade de vida satisfatória consiste na
aferição do grau de autonomia de uma pessoa, ou seja, o grau de independência que ela
possui para desempenhar suas atividades de vida diária.
O simples fato de ser velho não o impede de tomar suas decisões, baseado em seus
valores. A sua participação ativa no processo de tomada de decisões é restringida, muitas
vezes, pela própria família ou pelas instituições, mesmo em situações de incapacidade
temporária, como quedas, breves esquecimentos, tristezas, apatia, histórias de perda ou até
mesmo definitiva, como as demências.
Mesmo que o idoso apresente limitações físicas, financeiras ou emocionais, isso não
o impede de tomar decisões e estabelecer uma participação social e muito menos um
isolamento da convivência. É fato que esse idoso poderá estabelecer limitações quanto as
suas possibilidades na interação social, familiar e na sua auto-estima, criando uma imagem
de pessoa dependente e tornando-se um ser como tal. A unidade familiar exerce influencia
sobre esse idoso onde encontramos uma grande rede de conflitos no exercício da autonomia
e na interação social e familiar. Os aspectos afetivos e valorativos no núcleo familiar
definem em parte, a forma de cuidado para com o idoso.
Estudar os aspectos psicológicos que envolvem a queda e a relação existente entre o
idoso e seus familiares nos fez perceber que as possibilidades de interação social do velho,
em nossa sociedade, sofrerão reduções significativas.
Estudos enfatizam o papel do idoso quando ele deixa de ser economicamente
produtivo e lucrativo. Em função disso ele passa a assumir também uma condição de
incapaz, inútil, descartável e os valores são distorcidos e seu valor social é deixado de lado
114
sendo excluído a partir daquele momento. A partir disso é muito comum ouvirmos idosos
reclamarem da sua exclusão nas decisões familiares.
Alguns idosos possuem condições de tomar decisões acerca de algumas situações de
vida, mas dependem da negociação estabelecida com o grupo familiar. Casos contrários às
relações familiares irão se apresentar conflituosas e insatisfatórias, com total ausência de
diálogo e poder de escolha, cerceando esse idoso nas suas ações, seja no campo afetivo,
intelectual, social, religioso e financeiro.
DISCREPÂNCIAS FORMADAS ENTRE A CONCEPÇÃO DE TERCEIRA IDADE E MODERNIDADE
O processo de modernização, apontado por muitos estudiosos, tem como traço
comum à extrema valorização do esteticamente padronizado e associado ao jovem,
fenômeno acentuado pela massificação da imagem na cultura da civilização ocidental. O
próprio Foucault (1997) aborda o assunto. Nesse sentido, os conceitos de jovem e moderno
resvalam-se que no mesmo sentido. Tal movimento desconsidera o segmento social que se
encontra em posição oposta: a terceira idade.
O culto ao corpo, como efeito do processo de modernização, é reflexo de uma
superficialidade atribuída às diversas estruturas. A desvalorização da função cognitiva das
estruturas reduz o conceito de valor ao mero atributo estético (Foucault, 1997). Inúmeros
autores vêm direcionando pesquisas com este objeto ao longo do século XX, estabelecendo
uma estreita relação entre a modernidade e a superficialidade dos conteúdos, já que a
característica mais marcante deste momento histórico é a ruptura com o tradicional. Para
construir um conceito de saúde, equilíbrio e sucesso, a imagem do jovem é o paradigma
difundido pelos meios de comunicação (Beauvoir, 1990). Desta maneira, o jovem é a mais
forte expressão do moderno. Em uma sociedade em que predominam os valores da
juventude, beleza, energia e ativismo, coisas vinculadas diretamente ao corpo, à experiência
e a sabedoria daqueles que mais viveram não são consideradas importantes (LOPES, 1994).
Dessa maneira, disseminam-se os conceitos deturpados acerca dos valores estéticos
e representativos. Tais conceitos são estabelecidos pelos aparelhos de comunicação,
absorvidos e praticados sem muita reflexão pela sociedade (Bulcão et al., 2004). De acordo
com o senso enraizado, o próprio termo “idoso” está associado à insuficiência de saúde,
inflexibilidade, solidão, descaso, improdutividade e desocupação.
115
Do ponto de vista de Magalhães (1995), o mundo contemporâneo não cria
oportunidades para que haja diálogo efetivo e freqüente entre gerações, o que reduz as
oportunidades para que o portador dessa memória, ou seja, o idoso vivido e experimentado
possa exercitá-la. A conseqüência deste comportamento do corpo social causa o isolamento
desta camada populacional, atrofiando a capacidade vital destes indivíduos.
Esta privação da velhice, sem diálogo e comunicação intergeracional, cria uma
concepção no próprio idoso de que ele é de fato um ser incapaz e impossibilitado de travar
diálogo com os mais jovens, fato agravado pela linguagem, devido aos novos termos de
gíria e costumes lingüísticos que aparecem como barreiras culturais que esses "novos
idiomas" erguem em relação ao discurso tradicional (ROSENTTHAL, 1993).
Mesmo que ainda se entenda a Terceira Idade como uma fase improdutiva na
sociedade atual, é notável que esta visão do idoso passe por uma reformulação gradual:
"Estamos em um período de redefinição do papel social da velhice. Para o idoso tradicional
fica o que para ele significa. O importante é o ato de refazer, relembrando o que foi feito e
selecionando o que ainda tem sentido em sua vida atual. Não é o passado, objetivamente
reconstruído, que o idoso exprime. Mas o que ainda está carregado de emoção e de paixão
no presente” (MAGALHÃES 1995: 39).
Inúmeras ações promovidas sejam por setores públicos e privados para que se mude
um pouco a realidade do conceito de idoso na sociedade. Algumas dessas ações estão
girando na esfera Governamental, que tem como objetivo aliviar a discriminação social,
que atualmente, constitui uma conduta caracterizada como passível de penalidade, no novo
Código Civil (2002).
Para Jurberg (1996), ela compreende tanto os comportamentos de recusa social
dirigidos a diferentes faixas etárias como, principalmente, em relação às diferenciações de
gênero e etnias, além daquelas ligadas ao nível sócio-econômico. Para a autora, as minorias
sociais são renegadas e submetidas a um status de inferioridade pelos grupos sociais tidos
como “superiores” e avaliados positivamente pela sociedade, em detrimento dos demais,
que sofrem dominação e exclusão sociais.
De acordo com Negreiros (2004: 08), envelhecimento é um termo em
desenvolvimento, que vem sofrendo uma gama de novos sentidos ao longo dos séculos:
116
Desde o ancião respeitável – oriundo dos raros patriarcas com experiência acumulada e
valorizada, ao velho – caracterizando tudo o que está gasto e degradado, passando pelo
idoso – termo mais respeitoso, significando pleno de idade e destinado, em geral, às
camadas mais ricas da população, até a denominada terceira idade – a partir da noção do
sistema de produção: a primeira etapa compreendendo a fase de preparação, a segunda de
produtividade e a terceira de aposentadoria. Esta última, entendida tanto como ócio,
inutilidade, inatividade, como em seu oposto, dando idéia de uma etapa destinada a novas
oportunidades e prazeres, a uma segunda vocação, ao descanso e a qualidade do momento
de vida presente: uma espécie de “idade do extra”, “idade do lucro”, especialmente para os
que têm condições financeiras para desfrutá-la.
A partir do século XIX, a velhice passou a ser tratada como uma etapa da vida
caracterizada pela decadência física e ausência de papéis sociais. Discute-se com privilégio
a questão da velhice na sociedade atual, justamente por se tratar de um tema relativamente
novo. Pensar cientificamente sobre a velhice é cada vez mais um desafio para os
intelectuais e para a sociologia, conforme aponta Debert (1999: 25). O "idoso", segundo a
autora, é um ator que não mais está ausente do conjunto de discursos produzidos. Ao
possuir tempo livre, o idoso é figura cada vez mais presente seja em debates sobre políticas
públicas, nas interpelações dos políticos em momentos eleitorais e, até mesmo, na definição
de novos mercados de consumo e novas formas de lazer. Essa transformação traduz uma
preocupação da sociedade e do mercado com o processo de envelhecimento, resultante do
fato de os idosos corresponderem a uma parcela da população cada vez mais representativa,
em termos numéricos.
A diversidade de perspectivas na percepção do segmento social idoso revela uma
crescente dualidade no imaginário social. Identifica-se de forma bem distinta uma
socialização progressiva da gestão da velhice, atribuindo uma importância de questão
pública, quando antes era considerada como própria da esfera privada e familiar (LOPES,
1994).
Focado nesse propósito é que o Estado e outras organizações privadas programam
um conjunto de orientações e intervenções, criando-se um campo de saber específico, que é
a Gerontologia, com profissionais e instituições encarregados da formação de especialistas
117
no envelhecimento, como exemplo as UTI’s (Universidades da Terceira Idade). De um
prisma diferenciado, o avanço etário é visto como um processo contínuo de perdas e
dependência, que resulta em uma concepção pejorativa através de um conjunto de imagens
negativas associadas à velhice que, embora também tenha propiciado a legitimação de
certos direitos sociais, como a universalização da aposentadoria, passa também por
processos de reprivatização, que transformaram a velhice numa responsabilidade
individual. Conforme anota (CARDOSO 2004: 12).
A qualidade de vida no que vem sendo chamado de Terceira Idade está diretamente
relacionada com as atitudes e os comportamentos individuais, o envolvimento familiar e o
suporte social. A procura por um envelhecimento ativo, que pode passar pela participação
comunitária ou centrar-se preferencialmente na família, promove um sentimento de
utilidade com reflexos sobre a alta estima.
Seja por interesses mercadológicos ou pela própria reconstrução do paradigma na
sociedade, é notável que, atualmente, cada vez mais se constrói novos conceitos atrelados à
velhice, que tendem a diminuir o valor pejorativo e rever certos estereótipos associados ao
idoso, levando-se em conta não mais às perdas, e sim a consideração de que os estágios
mais avançados da vida, e seu tempo disponível curto, porém desocupado, são momentos
propícios para novas conquistas, na busca do prazer e da satisfação pessoal.
No entanto, mesmo diante do fenômeno que reconstrói a imagem do idoso e,
conseqüentemente, da velhice, não é capaz de oferecer instrumentos eficazes para se
enfrentar a perda física, a deficiência cognitiva e distúrbios emocionais. Como um reflexo
desta nova construção da imagem do idoso, na última década, proliferou no Brasil e no
mundo, os programas voltados para os idosos, como as "escolas abertas", as "universidades
para a terceira idade" e os "grupos de convivência de idosos". Estes programas, espelhados
nas escolas para idosos na França, também se desenvolveram no Brasil a partir dos SESC’s
— Serviço Social do Comércio, organizações financiadas por comerciantes, onde
inicialmente idosos se reuniam para jogar cartas e outros passatempos, acabou por
desenvolver a maior atividade de interação entre idosos, além inseri-los em outras
atividades como exercícios físicos e até estudos. Isto acaba por abrir espaço para que uma
experiência inovadora possa ser vivida coletivamente, ao mesmo tempo em que indicam
118
que as sociedades, entre elas a brasileira, são, hoje, mais sensíveis aos problemas do
envelhecimento e estão dispostas a buscar alternativas para a melhoria da qualidade de vida
desta população (DEBERT 1999: 15).
Ser velho significa não ser mais produtivo e útil em uma sociedade de jovens; não
ter mais possibilidade de concretizar as aspirações de sucesso profissional ou financeiro;
não ter mais condições de gozar os prazeres da juventude; não ter mais perspectivas de vida
e não ser capaz de sentir e gerar amor. Isso tudo faz com que os velhos tenham a sensação
destrutiva de serem pessoas "sem valia, sem função, um verdadeiro refugo social",
conforme ressalta (FUCS 1993: 102).
Esse modo de encarar a velhice deve ser reformulado, pois, com os adventos da
Medicina, tanto a curativa quanto a preventiva, a população de idosos tem apresentado um
crescimento contínuo, em nível mundial. Por outro lado, é difícil determinar exatamente
quando começa a velhice. Alguns estabelecem um marco cronológico, ou seja, é
considerado velho quem tem mais de 65 anos, entretanto, a idade de uma pessoa não pode
ser medida apenas pela cronologia, devendo-se considerar o estado fisiológico, o
psicológico e o social.
"O avanço dos anos não é um empecilho para a produtividade pessoal, capacidade
criadora ou utilidade social de alguém. Cora Coralina morreu aos 96 anos, lúcida e fazendo
belíssimos poemas; Bertrand Russell, um dos maiores filósofos da humanidade, tinha mais
de 90 anos e continuava líder do movimento pacifista mundial. Chagall, gênio da pintura,
morreu aos 98 anos ainda expondo suas obras; Jorge Luis Borges, grande poeta, continuava
em plena atividade literária, mesmo cego, aos 86 anos" (FUCS, 1993: 103-104).
Ainda segundo a autora, em virtude do aumento da população de idosos, os países
evoluídos aprofundaram estudos de gerontologia na busca das causas do envelhecimento,
com a finalidade de se obter um retardamento desse processo. Estes estudos envolvem
componentes genéticos, imunológicos, biológicos e fisiológicos. Embora seja impossível a
juventude eterna, é possível controlar algumas doenças que antecipam o envelhecimento,
ou seja, pode-se atingir a longevidade máxima, vivendo-se a velhice de forma satisfatória,
incluindo-se a afetividade e a sexualidade.
119
Um outro aspecto, que é abordado por (MALDONADO e GOLDIN 2000: 36), é
que "o último terço da vida pode ser utilizado para desenvolver outros projetos e decidir,
com criatividade, o que fazer com o tempo livre", ou seja, novas habilidades poderão ser
desenvolvidas, antigos sonhos poderão ser revisitados e concretizados. Assim, com essa
visão positiva de si mesmo e da vida, o grau de saúde será melhor. A "mudança de vida"
não é o "fim de vida"; o essencial é fazer uma "mudança de olhar".
Na sociedade tradicional, ao velho cabiam papéis e padrões comportamentais
apoiados no valor da respeitabilidade, associados à figura patriarcal, nas sociedades
patrilineares, e matriarcal, nas sociedades matrilineares, como assinala Magalhães (1995).
Além das funções de conselheiros e curandeiros, de sábios e feiticeiros, existia o respeito
pela experiência acumulada.
Já na sociedade industrial e pós-industrial, mantém-se o estímulo aos mitos que são
funcionais para o seu equilíbrio e solução de dilemas e desafios de crescimento, ou seja, o
mito de que em todas as sociedades pré-industriais o idoso era respeitado e tratado com
veneração em função de seu saber e experiência. Por sua vez, na sociedade contemporânea,
a velhice é numerosa e sua experiência de vida já não conta para o equilíbrio e a
organização social. Outro mito reforçado na sociedade industrial é o de atribuir à família a
obrigação de assistir e cuidar de seus avós, bisavós, sogros, sogras, tios-avó, etc.
Na verdade, a coesão familiar só funciona quando articulada à ação institucional
pública, ou seja, dificilmente a família poderá arcar sozinha com a responsabilidade de
cuidar dos idosos. A sociedade contemporânea, além disso, oferece pouca oportunidade ao
idoso para exercitar e ativar a lembrança, instrumento e conteúdo fundamental de seu
diálogo com as demais gerações. Infelizmente, o que foi produzido no passado não tem
interesse hoje e possivelmente será destruído amanhã, pois o ciclo permanente de produção
e de consumo exige a incessante destruição e o desaparecimento do que foi produzido no
passado e a criação permanente de novas formas de produção e consumo.
A população idosa vem aumentando a cada dia e o seu bem-estar e sua influência
não podem ser menosprezados. A informação sobre as mudanças normais que ocorrem com
a idade é um auxílio básico que a educação pode dar.
120
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não obstante as transformações ocorridas ao longo da vida do indivíduo o processo
de envelhecimento é um processo complexo onde envolve muitas questões. É fato que a
vida pode continuar se a pessoa tiver saúde mental e física. Desta forma, a sua existência
não pode fazer parte da lista de fatores negligenciados pela sociedade quando o ser humano
está prestes a se aposentar, pois isto contraria a dinâmica do processo evolutivo dos seres
humanos.
Risman (1999) aponta a “teoria da continuidade”, que postula a permanência do
aprendizado acumulado durante a vida: existe uma continuidade entre aquilo que fomos e o
que somos. O desejo, o prazer, o romance e o afeto são intrínsecos ao homem,
independentemente de idade, raça, sexo ou nacionalidade. A experiência diária, no entanto,
parece contradizer esta asserção. Freqüentemente encontram-se homens e mulheres que, ao
chegarem aos 65 anos, declaram sentir que “encerraram sua missão”, e se tornam apáticos,
solitários, deprimidos.
Ressalte-se que a própria sociedade parece negar aos idosos o direito à continuidade
das vivências plenas. Os estereótipos estão ainda presentes no imaginário social, e dentro
deles não cabem os termos namoro, romance, sexo, orgasmo, atividade física, viagens,
aventuras, independência, auto-estima, reuniões, clubes, quando aplicados à Terceira Idade.
Verifica-se, nas últimas décadas, um movimento para recuperar a dignidade do
idoso, resgatando sua auto-estima e importância social. Crescem o número de instituições,
empresas, universidades, ONGs e outros organismos que se dedicam a projetos e trabalhos
com os idosos mantendo-os a partir da vida associativa que elas promovem a interação
deles com as coisas da sociedade.
Não obstante, estas iniciativas que procuram a desmistificação dos preconceitos
contra os idosos, segundo apontam França e Soares (1997), dois mitos relativos à idade
persistem: o primeiro relaciona-se à experiência adquirida com o passar do tempo, e o
segundo a fragilização progressiva inerente ao envelhecer. Em ambas as perspectivas, são
delegadas ao idoso um papel social fixo e imune a evidências, como, por exemplo, a de que
a saúde pode ser mantida mesmo em idade avançada, que a saúde perfeita não existe nem
mesmo na infância e a constatação de que envelhecer não é se transformar. Daí, que
121
afirmativas tais como “o idoso é paciente com crianças”, e outras do gênero, devem ser
postas em suspenso pelas evidências de que o simples envelhecer não confere, a uma
pessoa, qualidades tidas como inerentes à idade provecta, como a paciência, a sabedoria, a
tolerância, etc.
As alternativas capazes de minimizar o impacto do envelhecimento populacional
estão no investimento na promoção da saúde e na educação da população de jovens.
Conforme ressaltam França e Soares (1997: 160), “o caminho para a quebra desses e de
outros tantos preconceitos existentes é o da educação, através do contato e da convivência
entre as gerações”.
Há uma necessidade de discutir melhor a situação do idoso, seus conflitos internos
frente à família. É preciso desenvolver uma alta auto-estima, a partir da busca da
independência dos idosos, diálogo e o posicionamento diante das mais diversas questões
que o afastasse da indiferença e o aproximasse da busca por soluções, ampliando suas
possibilidades de participação social, proporcionando promoção de saúde.
122
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Dados da autora:
Andréa Lucena Costa
Mestre em Educação
Psicóloga Especialista em Gerontologia e Geriatria- UFF
Profa da Universidade da Terceira Idade da UGF-Piedade
[email protected]
125
GÊNERO, ENVELHECIMENTO E ANIMAÇÃO CULTURAL
Prof. Cleber Augusto Gonçalves
Universidade Federal do Rio de Janeiro
RESUMO
Este trabalho é uma reflexão sobre a articulação entre questões de gênero e envelhecimento
e sua possível incorporação em projetos de intervenção pedagógica no campo do lazer que
tenham o público de mulheres idosas como alvo. Neste sentido, meu objetivo foi o de
apontar, a partir de dados e de exemplos de uma experiência educacional em
desenvolvimento, alguns princípios metodológicos que possam subsidiar novas
experiências desse tipo. Anda mais particularmente, minha intenção é demonstrar a
operacionalidade dos conceitos de animação cultural, compreendida como uma
possibilidade de intervenção pedagógica nos momentos de lazer, na formulação e execução
de projetos que estejam assentados sobre questões ligados ao gênero e ao envelhecimento.
Palavras-chave: gênero, envelhecimento, lazer e animação cultural.
INTRODUÇÃO
Na tentativa de nos esclarecer sobre a raiz dos muitos problemas que enfrentamos
na contemporaneidade, Boaventura de Souza Santos começa argumentando que o último
milênio foi o milênio das descobertas, citando basicamente três tipos: o oriente, o selvagem
e a natureza. (SANTOS, 2002).
Esta apresentação inicial nos dirige a reflexão para a constatação de que toda
descoberta se dá numa relação simbiótica entre descobridores e descobertos, já que não é
possível estabelecer, a priori, quem desempenha cada um desses papéis. Entretanto,
contrariando essa interdependência, essa relação quase sempre acaba assumindo um caráter
assimétrico, pois só pode declarar-se descobridor quem tem mais poder, pois tem a
capacidade de declarar o outro como sendo o “objeto” descoberto. É nisso que reside à
relação assimétrica de poder e de saber assumida pelas descobertas do nosso milênio.
Postulados desse tipo implicam a compreensão de que a desigualdade transforma a
reciprocidade da descoberta em apropriação imperial, desembocando, inevitavelmente,
numa ação de controle e submissão, onde vemos a transformação do outro em objeto, o que
permite, por seu turno, imposições de toda ordem.
Trago esta discussão preliminar porque ao tê-la como inspiração, me parece ser
possível (re) pensar questões sobre as aproximações e diálogos possíveis entre elementos de
126
constituição identitárias, igualmente responsáveis pela constituição de profundas
assimetrias nas relações de poder, tais como as de gênero ou a de envelhecimento, por
exemplo.
A possibilidade dessa aproximação a partir da reflexão sobre a invenção cultural
das descobertas imperiais está exatamente no entendimento de que toda formulação das
identidades está assentada numa profunda e radical arbitrariedade simbólica, sendo de
fundamental importância, o exame preliminar da maneira como determinadas verdades
(pré) estabelecidas são produzidas e reproduzidas, tentando compreender e deslindar as
maneiras como estas se consolidam e se propagam.
Já nesse sentido e seguindo a provocação a respeito das descobertas imperiais, é
importante antecipar que todo o sistema de valores culturais do Ocidente está assentado sob
a égide de uma lógica binária, dicotômica, responsável pela produção e reprodução de um
sem número de desigualdades. Denuncia-las com o intuito de tentar supera-las, presume a
desconstrução destes binarismos que são reflexos do conhecimento que constituem o
mundo como sendo masculino e feminino, branco e negro, jovem e velho, ciência e não
ciência.
Separações dessa monta são, muito provavelmente, os frutos mais obviamente
observáveis de amplas formas de pensar (racionalizadas e pretensamente universalizáveis –
marcas da civilização Ocidental) e que também se materializam num essencialismo
biológico. A esse olhar essencialista são atribuídos rigidamente alguns lócus sociais tais
como profissões e práticas corporais para um ou outro grupo.
Não é por acaso que alguns grupos que compõe uma subcultura (as chamadas
minorias) - e estou nos referimos mais especificamente às mulheres e aos idosos -,
iniciaram uma forte crítica aos cânones culturais, isto é, uma crítica à expressão do
privilégio de uma cultura que é branca, masculina, européia, jovem e heterossexual, o que
representa, em última instância, a contestação aos próprios valores culturais da civilização
ocidental, que está fortemente assentada, como disse, sob a égide de uma lógica binária e
excludente.
Em resumo, podemos dizer que o gradiente de desigualdade e injustiça social é
fruto, além das óbvias discrepâncias econômico-financeiras, de diversas outras dinâmicas
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sociais como, por exemplo, as de gênero, de raça, de sexualidade e mesmo as geracionais.
Esses entendimentos se desdobram numa possibilidade de relativização ou problematização
acerca de alguns enunciados, especialmente aqueles ligados à compreensão do caráter
arbitrário, isto é, culturalmente produzido de uma série de conceitos sociais. Um deles é o
entendimento das relações de poder que estão engendradas na constituição de identidades
ligadas a questões de gênero ou de envelhecimento. Vejamos brevemente a partir de agora,
a constituição social de cada um desses dois casos.
GÊNERO E MOVIMENTO FEMINISTA
A palavra gênero foi utilizada pela primeira vez, num sentido próximo ao que
reconhecemos atualmente, pelo biólogo americano John Money em 1955, numa tentativa
de dar conta dos aspectos especificamente sociais do sexo. Refere-se, portanto, não a uma
questão de sexo (como sexo masculino ou sexo feminino), mas muito mais aos processos
de representação de masculinidade e feminilidade construído social e culturalmente.
Os equívocos de confundir discussões de gênero com questões sexuais são comuns.
Entretanto, devemos deixar claro que identidade de gênero é diferente de identidade de
sexo. Em parte, esse equívoco ainda é um reflexo da história da disseminação do próprio
conceito de gênero, já que as primeiras apropriações feitas desse conceito foram feitas pelo
movimento feminista que introduziu esse conceito na arena pública dos debates sobre
desigualdade de acesso das mulheres, onde o grande avanço da politização do conceito de
gênero está na possibilidade de mudança no foco de análise, que sai das mulheres e se volta
para os homens, já que são estes sim estão nos pólos de poder. A partir daí, a questão passa
a ser do tipo: como se forma a masculinidade? Qual a relação da masculinidade com a
posição privilegiada de poder?
Aceita essas proposições, o desdobramento que se extrai daí é um instigante
questionamento as teorias críticas estabelecidas até então. Questionamento que se
endereçava mais precisamente ao fato de que essas teorias explicativas do social estariam
demasiadamente ligadas aos processos de produção das desigualdades circunscritas
exclusivamente às questões de classe social, desconsiderando outras dimensões desse
processo, como, por exemplo, gênero, etnia e sexualidade.
128
Apresentam-nos, nesse caso, a argumentação de que as linhas de poder não estão
estruturadas apenas pelo capitalismo, mas também pelo patriarcado ou pelo “juvenelismo”.1
Essa denúncia feminista acusa a sociedade de ser feita de acordo com a característica do
gênero dominante, a dizer-se, a cultura masculina e patriarcal, o que também acaba
causando profunda desigualdade, pois a apropriação dos recursos materiais e simbólicos da
sociedade será realizada de maneira desequilibrada entre homens e mulheres, causando uma
profunda partição.
Não se trata apenas de uma questão de acesso, mas de perspectiva, pois dependendo
do lugar onde se esteja conhece-se certas coisas e não outras. Esses entendimentos criam
uma reviravolta epistemológica.
Isso nos lembra, em muito, as teorizações dos Estudos Culturais, sobretudo as de
Raymond Williams, que através do seu conceito de “cultua comum”, tenta superar a
postura puramente “difusionista”, que pretende propagar para todos aquilo que tem “valor
cultural”: a dita alta cultura. Ao abandonar essa postura “meramente difusionista”, parte-se
para um questionamento mais profundo e radical sobre quem teria o poder de atribuir esse
valor. O conceito de cultura comum acaba desmonopolizando os modelos culturais e
relativizando o valor das manifestações e experiências produzidas pela classe dominante.
Não há nenhuma possibilidade de se chegar a uma cultura
comum por meio da difusão e extensão dos valores de um
grupo específico a todos os outros, pois uma cultura comum
não é a extensão geral do que uma minoria quer dizer e
acredita, mas a criação de uma condição em que as pessoas
como um todo participem na articulação dos significados e
valores (CEVASCO, 2003, p. 45).
Nesse caso, trata-se de recuperar para todos os processos de esforço criativo.
Naturalmente, a “cultura comum não existe ainda e falar nela é mostrar a situação adversa
do presente” (ibid.), onde a luta por uma cultura comum é a luta por uma sociedade
comum.
1
Aqui, tomo de empréstimo essa expressão de Michel Maffesoli (2003) que, ao descrever a atual dinâmica
social, ampla e complexa, que cultua a maneira jovem de ser, chama-a pelo nome juvenelismo que, nas
palavras do autor, quer dizer: “ser jovem na sua maneira de se vestir, de falar, de construir e de cuidar de seu
corpo, ou mesmo de pensar e meditar, é um novo imperativo categórico que não deixa nada nem ninguém
incólume” (p.12).
129
Teorizações desse tipo tinham em mente, desde seu início, efetivar uma luta política
rumo a uma mudança estrutural da sociedade. Essa luta aconteceria através da cultura. A
perspectiva de luta impôs uma necessidade teórica: a de se pensar a cultura em conjunto
com a organização social, pois dessa forma, a intervenção no campo da cultura, implicaria
necessariamente uma intervenção na sociedade.
Na verdade, inicialmente, os Estudos Culturais viviam sob um conflito teórico entre
dois paradigmas: por um lado, os culturalistas, que viam a cultura como um todo social, um
instrumento de descoberta, interpretação e luta social; e por outro, os estruturalistas, que
buscavam na cultura a manifestação de dados estruturais da sociedade.
A convivência conflituosa entre esses dois paradigmas foi
interrompida pela invasão de outra problemática que veio
redirecionar muito do debate intelectual. Trata-se da irrupção
do feminismo, que, na recordação de Hall, “arrombou a porta
e, como um ladrão no meio da noite, interrompeu tudo o que
se estava fazendo e virou a mesa dos Estudos Culturais”
(CEVASCO, 2003, p. 102).
O feminismo tem como grande vantagem nos lembrar que a igualdade não pode ser
conseguida apenas através da igualdade de acesso a cultura hegemônica. A obtenção de
igualdade depende de um reordenamento de toda a cultura. Aliás, é isso que acaba
marcando a segunda fase deste movimento social no final da década de 60.
Não se trata mais simplesmente de ganhar acesso às
instituições e formas de conhecimento do patriarcado, mas de
transformá-la radicalmente para refletir os interesses e
experiências das mulheres. O simples aceso pode tornar as
mulheres iguais aos homens, mas num mundo ainda definido
pelos homens (SILVA, 2001:93).
Trouxemos estas reflexões para este trabalho, pois tem sido verificado que é muito
mais significativa a presença de mulheres do que a de homens em projetos associativos
como os de prevenção de quedas que estão sendo abordados neste livro. A questão que vem
sendo posta é saber se o fato de se ter mais mulheres nestes espaços sociais seria uma
questão relacionada a gênero, entendendo que os espaços sociais onde se desenvolve a
sociabilidade seriam diferentes. Esta posição ainda não pode ser aceita de maneira
simplista, considerando que homens idosos vão para espaços abertos como praças ou bares
enquanto as mulheres se adequariam a ambientes fechados como clubes e outros locais
130
considerados como centros de convivência. Isto pode ser considerado como resultado de
uma época onde a socialização das mulheres ocorreria sempre em ambientes fechados,
como em espaços residenciais, cuidando da família e do lar, já os homens estariam em
contato com as atividades externas. Na verdade estas questões poderiam ser levadas a
discussão através da compreensão dos fenômenos geracionais, que fazem parte de estudos
que o Grupo de pesquisas Envelhecimento e Atividade Física vem empreendendo
atualmente.
ENVELHECIMENTO E GERONTOLOGIA
Diferentemente do que ocorreu com o movimento feminista, a divulgação das
questões de desigualdade e mesmo de discriminação ocorrida com os idosos, não foi feita
por eles próprios, mas ao contrário, foi feita a partir de outros porta-vozes. Nesse caso,
tratava-se mais precisamente de médicos e outros profissionais ligados aos cuidados com
idosos que proclamavam um discurso especializado (leia-se, científico), que por ser
largamente aceito na sociedade, legitimou facilmente a constituição dos idosos como uma
categoria especificamente demarcada no espectro social.
A idéia de Modernidade, de “desencantamento do mundo”, introduziu o conceito de
racionalidade para definir todas as formas de atividade humana. Trata-se, portanto, da
submissão de todas as esferas sociais aos critérios de decisão racional.(HABERMAS,
2001).
Com isso, inegavelmente, nossa capacidade de controle aumentou com o
conhecimento racionalizado, onde o controle das epidemias é apenas um exemplo. Mas em
certos níveis biológicos, parecemos nos aproximar de uma barreira intransponível. Isso se
torna tão mais evidente, por exemplo, quando tentamos estender o controle humano sobre
processos de envelhecimento ou morte. A capacidade dos seres humanos em relação ao
universo natural tem seus limites e o envelhecimento inevitável dá provas disso. Os homens
podem tentar, e até certo ponto conseguir, dominar o curso da natureza e do destino, mas a
velhice marca os limites deste controle do homem sobre determinados processos naturais.
Uma das origens desses processos de controle racional, esta na imposição do
controle da violência pelo caráter inextricavelmente coletivo e social assumido pela vida
em sociedade (ao que Freud chamaria de “o mal estar da civilização”). O convívio social e
131
a crescente interdependência na vida de uma comunidade, com suas relações cada vez mais
complexificadas passou a exigir uma sociedade uniformemente pacificada pelo controle
completo dos impulsos instintivos e violentos, uma espécie de arrefecimento permanente
das emoções violentas e pulsionais (ELIAS, 1993).
Como desdobramento podemos observar uma crescente securitização generalizada
da vida cotidiana pela utilização desses mesmos mecanismos de controle racionais, que
acabam tornando a vida mais previsível. Isso fica mais evidente se observarmos a
expectativa de vida cada vez mais elevada, que nada mais é que um reflexo desse aumento
de segurança, pois não estamos mais tão vulneráveis aos perigos e ameaças físicas
imprevisíveis e imponderáveis.
Daí podem decorrer alguns problemas no tratamento social dispensado aos idosos,
pois o aumento das sensibilidades à violência, aumenta também o embaraço diante dos
processos naturais em geral e faz surgir uma antipatia muda em ralação aos velhos ou a
qualquer comportamento que nos remeta ao nosso lado mais sombrio, mais animalesco,
mais naturalmente incontrolável. O isolamento dos idosos, especialmente aqueles com
doenças e já em estado terminais, é um testemunho das dificuldades de identificar-se com
estes processos. O envelhecimento do outro nos traz a lembrança do nosso próprio
envelhecimento [como diria Marc Auge (1999), o homem só existe na sua relação com os
outros, ou seja, o outro define o si mesmo] e o que é mais assustador, a lembrança que ao
envelhecermos nos aproximamos cada vez mais da temida e inescapável morte. De maneira
inconsciente, sentimos que a velhice é ameaçadora.
Assim sendo, tendemos a evitar o quanto possível esta idéia. Estabelece-se uma
espécie de censura social, um desejo silencioso de ocultar a finitude irrevogável de nossa
existência, cercando-se e isolando-se os elementos que nos remetem aos nossos aspectos
animalescos, através de uma complexa estrutura de normas sociais, que Elias chama de
barreiras civilizadoras.
A morte é um dos grandes perigos biossociais da vida
humana. Com outros aspectos animais, a morte, tanto como
processo quanto como imagem mnemótica, é empurrada mais
e mais para os bastidores da vida social durante o impulso
civilizador. Para os moribundos isso significa que eles
132
também são empurrados para os bastidores, são isolados
(ELIAS, 2001, p. 37).
Envelhecer ou mais radicalmente morrer é uma coisa cada dia menos pública
atualmente. Isso é um reflexo da aversão em se falar ou de expressar qualquer
comportamento ligado a fatos biológicos da vida. Como esses aspectos da vida humana
passaram a ser embaraçosos, pois lembram-nos exatamente aquilo que o longo processo de
planificação/racionalização quer adormecer, quer nos fazer esquecer, ou seja, essa nossa
imemorial animalidade, esses elementos, como a velhice, acabaram sendo empurrados o
mais longe possível para os bastidores da vida pública para detrás das cenas da vida normal,
pois constituem zonas de risco biossocial.
O impacto social desse processo pode ser medido através de um dos muitos, e
graves problemas da nossa época: a desigualdade no tratamento dispensado aos idosos.
Uma das formas dessa desigualdade se manifestar é o isolamento imposto a muitos idosos,
que diante da sua fragilidade física, se vêem obrigados a conviverem com desconhecidos o
que na prática, corresponde a uma forma escamoteada e dissimulada de isolamento. “Asilos
são desertos de solidão”. Em suma, o processo de envelhecimento produz uma mudança
fundamental na posição de uma pessoa na sociedade e, portanto, em todas as suas relações.
CORPOREIDADE E SUBJETIVIDADE
A exemplo das representações de velhice ou de masculinidade/feminilidade que
tentei sumariar em poucas linhas até aqui, também as dimensões da corporeidade podem ser
pensadas nessa perspectiva, pois o corpo não é só um corpo, mas também o seu entorno, o
que significa dizer que é também local de construção de subjetividades, que não esta
circunscrito somente ao plano psicológico, mas é uma entidade que marca nossa identidade
e pode se instrumentalizar tanto para a resistência quanto para a reprodução, materializando
um olhar atravessado que aproxima natureza e cultura.
Michel Onfray (2001), astuto e provocativo, fala-nos sobre a sociedade querer que o
corpo pessoal se assemelhe ao corpo social, refletindo e reproduzindo todos os seus ideais.
Uma espécie de ingerência da sociedade, ou do que é social e coletivo sobre o que é pessoal
e particular. Assim sendo, o corpo improdutivo ou fragilizado, tal como os da imagem dos
idosos e das mulheres, não podem sequer ser considerados um corpo, já que o corpo social
133
é demasiado preocupado com a eficiência e a rentabilidade; repousa sobre os ideais de
“juventude, saúde, razão e moralidade”.
Os velhos e as velhas, aos quais são negados todos os direitos
salvo o de ser ainda consumidor e gastar de sua aposentadoria
no jogo social consumista, sofrem progressivamente de toda
arrogância permitida aos jovens: sem sensualidade, nem
sexualidade triunfante, uma vida privada que se quer modesta
e discreta. Empurrados docilmente à saída, os afagamos,
conservamos e veneramos desde que reciclem suas economias
dentro da máquina social. Reconhecidamente improdutivos –
exceto quando fazem política, onde o limite etário não existe eles são afastados com a mesma veemência com que lhe
sacrificaram a sua liberdade, sua vida, sua energia, sua
existência no tempo em que se empenhavam para alimentar a
máquina social no seu período dito ativo. Suas forças
definitivamente irrecuperáveis, a dose de isolamento a ser
infligido é ajustada: de uma participação modesta, discreta,
recuada, para os de mais sorte, ao gueto puro e simples
prometido àqueles cujas mecânicas já estão demasiadamente
gastas para que sejam destinados à outra coisa além da morte
em casas pudicamente chamadas de repouso (ONFRAY,
2001:72).
Na rígida lógica social que impera, que poderia ser caracterizada como progressiva
separação entre racionalidade e subjetividade (TOURAINE, 1994), onde as particularidades
somente são consideradas quando estão convencidas da necessidade da sua subsunção
diante dos valores racionais proclamados como universais, nossa sociedade parece não
suportar ver extraviadas suas virtudes absolutas. A degradação da razão objetiva na razão
subjetiva é uma visão racionalista do mundo, especializada em separar, classificar, ordenar,
homogeneizar e desqualificar.
Diante da constatação que determinados subgrupos sociais, as chamadas minorias,
têm seus interesses e experiências suprimidas e suplantadas pela imposição de valores
culturais da “maioria”, urge buscarmos estratégias de luta rumo a uma democracia cultural
radical, ou seja, buscar a equivalência nas formas de representação e refletir os interesses e
experiências destes subgrupos. Necessidade que fica tão mais evidente quando observamos
os corpos desses grupos, mulheres e idosos, que insistentemente são colocados em
134
suspensão; são docilmente alocados em “zonas de sombra”; ou seja, são corpos que
existem, mas não aparecem nas diversas representações sociais.
Nesta perspectiva, parece muito útil recorrer às preposições teóricas do pensamento
pós-estruturalista e mais particularmente do conceito de “vericção”, cuja ênfase recai muito
mais numa tentativa de investigar como e por que determinados discursos, prerrogativas e
afirmativas constituíram-se tão fortemente como verdades, do que propriamente a busca ou
esforço na construção de uma verdade consolidada e absolta.
Entendimentos desse tipo podem potencializar intervenções educativas de outra
natureza, com uma outra envergadura. Portanto, a partir de agora, minha intenção é tentar
refletir brevemente sobre o processo de intervenção pedagógica na população idosa,
especialmente as mulheres, a partir da experiência educacional em desenvolvimento no
projeto envelhecendo sem tropeços, que se desenvolve na UFRJ e no Prev-quedas que deu
origem ao primeiro, que consistem no oferecimento de um programa de atividades físicas,
especificamente direcionado à prevenção de quedas, somado a um processo de
sensibilização ao lazer, e sua compreensão como um direito de cidadania, numa tentativa de
ampliar suas possibilidades de vivência e usufruto de bens simbólicos, estimulando e
garantindo o seu acesso a patrimônios culturais.
Trata-se, em última análise, de uma tentativa de demonstrar a operacionalidade dos
conceitos ligados à animação cultural, compreendida como uma possibilidade de
intervenção pedagógica nos momentos de lazer, na formulação e execução de projetos que
estejam assentados sobre questões articulados ao gênero e ao envelhecimento.
ANIMAÇÃO CULTURAL, LAZER E ENVELHECIMENTO: NOTAS SOBRE O PROJETO
ENVELHECENDO SEM TROPEÇOS
Muito mais que um esforço em construir uma matriz teórica essa iniciativa que ora
se apresenta se refere a um esforço para empreender um redimensionamento das forças
políticas, de poder, de saber e discursivas que convergem e incidem sobre mulheres idosas,
ao mesmo tempo em que objetiva somar-se aos esforços que já vem sendo empreendidos no
sentido de produzir trabalhos científicos sobre o assunto, contribuindo para sua
consideração como fator de melhoria da qualidade de vida.
135
Isto se torna importante na medida em que observamos, a partir das constatações de
Melo (2003), que nos chama atenção para o fato de que os trabalhos sobre lazer produzidos
no Brasil mais recentemente, raramente apontam caminhos para uma intervenção mais
efetiva.
Aguçada a relevância da temática pelo delineamento definitivo no Brasil de
iniciativas ligadas à organização de uma indústria de lazer e de entretenimento, e mais
especificamente para o público idoso, onde o discurso midiático reforça sua classificação a
todo o momento como a idade do lazer.
A questão é que esse mercado e essas oportunidades têm se
desenvolvido de forma bastante seletiva, somente acessível
em sua plenitude a pequena parcela da população. O desafio
maior nesse momento parece ser estruturar estratégias que
permitam e estimulem os extratos excluídos da população
brasileira a ter acesso a tais bens culturais, um dos desafios
maiores e mais prementes para pensarmos a animação cultural
no Brasil (MELO, 2005b:74l).
Uma das abordagens que recentemente vem ganhando corpo teórico, e que surge
exatamente nesta perspectiva; a de dar conta de operacionalizar-se concretamente no campo
do lazer, é o conceito de animação cultural. A definição conceitual e precisa do termo,
ainda é nebulosa, talvez por conta do quão recente é sua utilização, ou mesmo pela carência
de estudos e compreensões mais aprofundadas (MELO, 2003).
Ainda assim, já podemos vislumbrar a emergência da animação cultural como uma
possibilidade tangível de intervenção no campo do lazer, sobretudo por conta da atual
tendência de:
se tratar o assunto de forma mais crítica. Isto é, não se trata mais de
oferecer um conjunto de atividades para o simples passar do tempo,
que acabam contribuindo para a alienação do indivíduo perante a
ordem social. Trata-se sim de perceber que temos uma poderosa
ferramenta de intervenção à busca da construção de uma nova
ordem social, mais fraterna e mais justa (ibid.).
É dentro deste escopo teórico crítico que a animação cultural tem sido
implementada no âmbito do projeto ‘Envelhecendo sem tropeços’ e o ‘Prev-quedas’.
Projetos de pesquisa e extensão, realizados na Universidade Federal Fluminense (UFF) e na
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com o objetivo de atuar, a partir do
136
oferecimento de um programa de atividade física, sob os comprometimentos que
geralmente ocorrem com o processo do envelhecimento e da prevenção de quedas.
Além disso, a proposta metodológica desenvolvida – que tem na corporeidade seu
instrumento mais interessante - tenta discutir alguns outros valores culturais utilizando,
mais especificamente, elementos da Capoeira e do Samba. A utilização destas atividades
permite, além da óbvia exercitação do equilíbrio, da mobilidade articular, da força e da
percepção do corpo no espaço, um divertimento e consolidação das redes de sociabilidade
através de elementos da cultura popular, isto é, permite a construção de subjetividades a
partir de um processo diferenciado, ou seja, com uma leitura crítica aos elementos sociais
que intervêem na construção dessas subjetividades. Talvez por isso, estas atividades
passaram a ser o ponto alto do programa, pois o caráter lúdico (relacionado à própria
utilização do corpo) e o entendimento teórico ampliado das noções de lazer que orientam e
estão por trás desse tipo de atividade, faz com que a percepção dos participantes seja
direcionada, intencionalmente, sobremaneira a estes momentos (ALVES JUNIOR, 1999,
2003, 2004).
Soma-se a isso, a realização cotidiana de um processo de estímulo e sensibilização a
necessidade do lazer, e de maneira mais profunda, sua compreensão e aceitação como um
direito de cidadania, numa tentativa de ampliar as possibilidades de lazer dos participantes,
estimulando e garantindo o seu acesso a patrimônios culturais (MELO; ALVES JUNIOR,
2003).
Atualmente já encontramos evidências de que há uma maior sensibilização com
relação ao problema das quedas, ao mesmo tempo em que há um progressivo aumento nos
seus hábitos de lazer. Evidenciando mudanças comportamentais que corroboraram nossa
perspectiva de prevenir as quedas, problematizar alguns elementos da construção de suas
subjetividades e tecer vínculos e redes de sociabilidade a partir de um programa específico
de atividades corporais dimensionados numa perspectiva do lazer.
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139
Contato do autor:
Cleber Augusto Gonçalves Dias
Especialista em Educação Física Escolar (UFF)
Mestrando em História Comparada (IFCS/UFRJ).
Pesquisador dos grupos “Anima” (UFRJ) e “Envelhecimento e Atividade Física” (UFF).
e-mail [email protected]
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USANDO COMO ESTRATÉGIA ELEMENTOS DA CULTURA CORPORAL
PARA PREVENIR QUEDAS
Prof. Esp. Bianca Viana Santos Souza
Grupo de Pesquisa Envelhecimento e Atividade Física
RESUMO
O envelhecimento ainda representa um desafio para aqueles que envelhecem, assim como,
para a sociedade que vem criando tentativas de apoio para esse grupo populacional que tem
se tornado cada vez maior. Nesse sentido, nos deparamos com a existência de vários
projetos sociais voltados para os idosos, mas que muitas vezes, pela falta de conhecimento
e/ou pela falta de compromisso com os indivíduos que envelhecem, podem estar levando-os
à alienação e somente a perpetuação das condições existentes. Assim, acreditando que a
utilização das atividades físicas em projetos para idosos e aposentados é uma prática
significativa, desde que esteja comprometida socialmente com esses indivíduos,
permitindo-lhes sua participação ativa além de proporcionar-lhes a reflexão acerca dos
problemas que os envolve, um projeto de prevenção de quedas torna-se uma intervenção
relevante para as pessoas que envelhecem. Levando em conta os interesses dos idosos no
lazer e a importância de uma prática intergeracional, o desenvolvimento das atividades
desse tipo de projeto, não pode estar distanciado do lúdico e do prazer. Diante disso,
encontramos elementos da cultura corporal, como o samba e capoeira, importantes aliadas
para o desenvolvimento de um projeto que atue na prevenção de quedas ao mesmo tempo
em que sejam feitas reflexões do envelhecimento em sua sociedade. Essa experiência, tem
nos apresentado elementos riquíssimos que justificam a importância da capoeira em um
projeto de quedas para idosos e aposentados.
Palavras-chave: prevenção de quedas, cultura corporal, capoeira, intergeracionalidade.
INTRODUÇÃO
Com o aumento populacional dos indivíduos considerados idosos, é cada vez mais
comum nos depararmos com invenções sociais que induzem a uma nova maneira de
envelhecer, há atualmente um mercado importante voltado para o lazer e cultura
direcionado para esse segmento populacional. Tendo em vista também que a velhice de
hoje certamente não é a mesma que de alguns anos atrás, estamos lidando com indivíduos
que estão buscando serem mais ativos e mais participativos socialmente. No entanto, não é
garantido ainda que haja uma infraestrutura e uma política social justa para a maioria da
população que envelhece, assim como não temos extensivo a todos que envelhecem
condições de poder usufruir do que vem sendo considerado como bom envelhecimento.
141
As sociedades modernas são sociedades do hoje e agora, mas
que tecem para si um discurso como sociedade do futuro, algo
de um devir que comanda um presente e o banaliza em nome
de um tempo que está por se fazer. Com isso aliena-se o
presente, inviabilizando a reflexão sobre o que é o vivido por
diferentes sujeitos, diferentes grupos no interior da sociedade
e quais os possíveis significados de sua existência, no aqui e
agora de suas vidas, mas também em nome de um futuro
aparentemente deles distanciado”(GUSMÃO, 2003 :17).
No caso dos idosos, eles ainda representam uma incógnita para a sociedade, que
ainda não consegue lidar com esse aumento populacional é um fenômeno novo ainda não
vivido na história da humanidade. São indivíduos que, muitas vezes com a chegada da
aposentadoria, desfrutam de um tempo disponível, mas sem condições de usufruí-lo em
detrimento de suas condições financeiras, muitas vezes se vêem ocupadas em ajudar a
família com a sua renda, se dedicam na criação dos netos sem, terem por parte da sociedade
o reconhecimento do seu papel de indivíduo cidadão.
As pessoas que chegam à velhice possuem histórias e hábitos de vidas diferentes,
assim como, a forma de encarar essa fase da vida. Passando por um processo de envelhecer
diferenciado, os indivíduos são vistos por toda a sociedade como pessoas de características
únicas, tal como preconiza o modelo terceira idade. A maioria da população esquece que “o
envelhecimento tem suas especificidades marcadas pela classe social, pela cultura e pelas
condições socioeconômicas e sanitárias individuais e/ou coletivas da região” (GOLDMAN
2004: 65).
Encarada como um processo único, o envelhecimento tem colocado as pessoas
pertencentes em um grupo só, alheias as suas características individuais tanto quanto as
suas diversidades culturais. Dessa forma, é comum estarmos diante de vários projetos
sociais endereçado a um grupo de pessoas desconsiderando a sua diversidade, parecendo
mesmo que é um fazer deslocado de sentido, que serve para o entretenimento de um
determinado momento. Atualmente tem sido cada vez mais comum nos depararmos com
muitos eventos e projetos voltados para os idosos, como os bailes para a terceira idade,
passeios culturais para os idosos, ginásticas para uma feliz idade, sem a devida reflexão
crítica do que significa envelhecer na nossa sociedade (ALVES JUNIOR, 2001).
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Deve ser considerado em primeiro lugar o que se pretende alcançar com propostas
de atividade física, certamente hoje sabemos que podemos ir além do aspecto da
sociabilidade. Porém não devemos esquecer que muitas vezes acaba-se isolando os idoso e
aposentados do contato com outras gerações, reflexo de uma sociedade preconceituosa com
relação as coisa da velhice e ao processo do envelhecimento. Defendemos a importância de
se levar em conta o compromisso que a qualidade das propostas para os idosos, sendo elas
pautadas pelo acompanhamento objetivo do que é proposto. Neste caso os estudos que são
feitos nas universidades acompanhando e investigando estes grupos têm uma grande
contribuição a dar. Dessa forma, é importante a busca por práticas que estejam
comprometidas com a aprendizagem de saberes que estejam relacionadas a uma melhor
qualidade de vida para esses indivíduos (ALVES JUNIOR 2001). Foi pensando nestas
premissas que nos engajamos numa proposta que visa trabalhar com os idosos e
aposentados com compromisso de realizar uma intervenção que seja significativa, daí a
escolha por atuar na prevenção de quedas, já que é um dos problemas que os afligem os que
envelhecem e é pouco abordado em nosso país. Em relação à prevenção de quedas,
encontramos nas atividades físicas uma importante aliada para esse trabalho de intervenção.
Nesse sentido, uma atividade física que não se limita a um fim em si mesmo, que
juntamente com ela os indivíduos possam estar refletindo sobre suas ações, que se sinta
valorizado enquanto ser participativo no mundo, que possam estar se relacionando com o
outro, além de se beneficiar com o prazer que essas atividades podem proporcionar.
Considerando os interesses dos idosos no uso qualitativo do seu tempo de lazer, o
desenvolvimento das atividades do projeto Prev-quedas e Envelhecimento sem tropeços,
não desconsiderou o lúdico e se fundamentou nas manifestações de cultura corporal como o
samba e capoeira, este têm sido bastante importantes para o desenvolvimento da
metodologia, que inclui as principais qualidades físicas que merecem ser trabalhadas para a
prevenção de quedas.
A CULTURA CORPORAL E O PROJETO DE PREVENÇÃO DE QUEDAS
No dicionário Básico de Filosofia, encontramos algumas definições que diz que o
conceito de cultura,
143
serve para designar tanto a formação do espírito humano
quanto de toda a personalidade do homem: gosto,
sensibilidade,inteligência.; é tesouro coletivo de saberes
possuído pela humanidade ou por certas civilizações;
enquanto se opõe a natura(natureza), a cultura possui duplo
sentido antropológico:a) é o conjunto das representações e dos
comportamentos adquiridos pelo homem enquanto ser
social...b) é o processo dinâmico de socialização pelo qual
todos esses fatos de cultura se comunicam e se impõe, em
determinada sociedade, seja pelos processos educacionais
propriamente ditos, seja pela difusão das informações em
grande escala, a todas as estruturas sociais, mediante os meios
de comunicação de massa [....] por último, num sentido mais
filosófico, a cultura pode ser considerada como esse feixe de
representações, de símbolos, de imaginário, de atitudes e
referências suscetíveis de irrigar, de modo bastante desigual,
mas globalmente, o corpo social.(JAPIASSU, MARCONDES
1990 :63)
Nesse sentido podemos dizer “que a cultura é o conjunto de símbolos elaborados
por um povo em determinado tempo e lugar. Dada a infinita possibilidade de simbolizar, as
culturas são múltiplas e variadas” (ARANHA 1996: 15). A questão cultural é importante
para estarmos trabalhando com o indivíduo, ela permite a construção de sua identidade
social e sua participação ativa no mundo. O indivíduo não vive dissociado disso, os
símbolos e todos os significados que representam ajudam o indivíduo a ampliar o
conhecimento e entendê-lo como ser social no mundo. “Trata-se de um processo que dura a
vida toda e não se restringe à mera continuidade da tradição, pois supõe a possibilidade de
rupturas, pelas quais a cultura se renova e o homem faz a história.” (Aranha 1996 :18)
O termo Cultura Corporal, fortemente defendido nos anos 90 na área do
conhecimento da Educação Física Escolar, surgiu na tentativa de ruptura com as tendências
bioligizantes e tecnicistas enraizadas nessa disciplina. Associada com o movimento da
educação em alcançar tendências críticas e superadoras, a reflexão acerca de uma cultura
corporal surgia com a intenção de levar a Educação Física a um novo patamar de educação
que fosse crítica, levando os seus educandos ao conhecimento para a criticidade, autonomia
e participação enquanto cidadão ativo em sua sociedade.
144
No livro “Metodologia do Ensino de Educação Física”, escrito por um “coletivo de
autores” (1992: 38) a reflexão acerca da cultura corporal e a sua dinâmica curricular no
âmbito da Educação Física, era tratado como uma nova forma de se trabalhar com os
conteúdos da Educação Física, sendo feita “uma reflexão pedagógica sobre o acervo de
formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história,
exteriorizadas pela expressão corporal”.
Portanto, tendo a cultura corporal, em suas mais variadas expressões: o jogo; a
ginástica; a dança e o esporte, como principal foco pedagógico de uma tendência crítico–
superadora, a possibilidade de proporcionar aos indivíduos uma participação mais crítica e
criativa, deixando de ser apenas meros “observadores” da história, para sujeitos
participativos e construtores de suas próprias histórias. Nesse sentido, as atividades
corporais não serão entendidas como um fim em si mesmas, serão vistas de forma não
alienada, permitindo ao indivíduo, através da expressão corporal como linguagem,
participar dos processos de produção da cultura corporal.
No caso dos idosos, a atividade física passa a ser significativa, porque além de
prevenir e/ou minimizar os declínios fisiológicos que podem ocorrer devido ao processo de
envelhecimento, pode proporcionar prazer, facilitar o convívio em grupo, além de recuperar
a auto-estima. Desta forma, a atividade física pode ser vista também como uma prática
criadora. O poder de criar, estimulado por esta prática, despertará novas maneiras de
pensar, fazendo com que os idosos criem novas perspectivas em suas vidas, em vez de se
conformar com que a sociedade lhe reserva.
Nesta perspectiva, ao pensarmos em atividade física para os idosos, não podemos
esquecer de relacionar corpo e movimento dentro do contexto social. Pois quando se
compreende corpo como um todo que pensa, sente e age, as alterações que podem ocorrer
durante esse processo, podem ser melhores compreendidas e uma nova forma de lidar com
essas alterações podem ser experimentadas e criadas, conseqüentemente crescem as
chances de adaptações bem sucedidas e mais felizes. A partir do momento em que o
indivíduo tem consciência de que o corpo não sobrevive sem movimento e que vive melhor
ainda quando ele conhece suas limitações e as possibilidades de superá-las ou minimizá-las,
a relação consigo, com os outros e com o mundo poderá tornar-se mais fácil.
145
O envelhecimento pode dificultar a realização das tarefas diárias, contribuindo para
a perda da autonomia, além de dificultar o relacionamento entre as pessoas, fazendo com
que o idoso tenha sua participação social reduzida. A atividade física pode ser facilitadora
para a sua participação social ativa, porque favorece o resgate de sua autonomia, sendo uma
importante aliada para uma velhice bem sucedida. Assim, segundo Simões (1994:86) o
trabalho com idosos deve “enfocar a conscientização deste ser idoso-no-mundo. O idoso
deve ter a certeza que seu corpo ainda pode realizar e participar de muitas atividades e
ações que produzam vida”.
Mas para isso, as atividades devem estar adequadas às condições morfofisiológicas
de cada indivíduo participante, além de ser aconselhável a participação de grupos etários
variados, para que haja estímulo, troca de experiências, conhecimento das igualdades e
diferenças. Um bom convívio social pode contribuir de forma positiva na relação dos
indivíduos.
A dimensão social do envelhecimento não pode prescindir da
questão intergeracional. Constata-se que o encontro entre
gerações não ocorre de forma linear e sem conflitos. Os
padrões culturais, os interesses, as motivações, as concepções
de mundo, os valores e a ideologia, ou seja, todos os espaços
ídeo-culturais diferem dentro e entre as faixas etárias. Mas é
justamente o embate das diferenças que propicia o salto para
as transformações e para a possibilidade de um intercâmbio
rico, dinâmico e multifacetado entre as gerações (GOLDMAN
2004: 65).
Tendo em vista os indivíduos que envelhecem, o desenvolvimento de sua expressão
corporal, através da participação em atividades físicas que possibilitam o encontro de
diferentes gerações, principalmente no âmbito do lazer, o prazer e o movimento corporal
permitidos por diferentes práticas físicas, podem ajudar significativamente na inserção
social e na facilitação de outros objetivos como a prevenção de. “As práticas corporais no
âmbito do lazer, considerando seus aspectos educativos, contribuem para a compreensão do
novo mundo social e a intervenção nele” (FRANÇA 1999: 35).
146
Portanto, temos nas diversas formas de manifestações artísticas e culturais no
âmbito do lazer, serão vistas de forma não alienada, permitindo aos indivíduos, participar
dos processos de produção da cultura tanto erudita quanto popular.
Em grande parte dos projetos de educação não-formal
desenvolvidos pelos mais diversos tipos de instituições em
nosso país, voltados para as populações de baixa renda, a
capoeira aparece como uma das atividades que encontra maior
receptividade por parte desse público [...] Os resultados
obtidos por essas atividades educacionais envolvendo a
capoeira, bem como outras manifestações da cultura popular,
nas quais o samba também aparece com muita freqüência, são
considerados excelentes na opinião da maioria de pedagogos e
arte-educadores envolvidos nesses processos, pois permitem
que sejam trabalhados valores como a auto-estima, o respeito
pelo outro, a solidariedade e a auto-superação entre outros
benefícios. (ABIB 2006:16)
Dessa forma, a capoeira e o samba, tomados como exemplo, elementos de nossa
cultura corporal brasileira, ricos pela sua diversidade de movimentos e principalmente pelo
prazer que elas podem proporcionar, são fortes aliadas no desenvolvimento de nosso
trabalho. Nesse contexto, a capoeira ou o samba, partem da cultura corporal brasileira, rica
pela diversidade de movimentos e raízes culturais, além de serem práticas intergeracionais,
pois na sua história e execução elas sempre foram praticadas por muitos indivíduos
independentes de suas faixas etárias, pertencentes a diferentes gerações. Além do
desenvolvimento físico, o ritmo, a musicalidade, a cooperação, a troca e a interação que a
capoeira e o samba tem sido fundamental para o desenvolvimento do trabalho de prevenção
de quedas. A introdução destas manifestações não entram sem estarem ligadas diretamente
com a proposta global. A base do método que tem sido proposto a partir do Grupo de
Pesquisa Envelhecimento e Atividade Física considera primeiramente a sensibilização do
grupo quanto ao problema das quedas, em seguida a verificação do estado dos participantes
no que toca as capacidades físicas que segundo a literatura sugerem que devem ser
enfocadas em um trabalho de prevenção de quedas. Dessa forma, a questão postural, a força
física, o equilíbrio tanto estático quanto dinâmico e a mobilidade articulares são
capacidades físicas vistas como necessárias para serem trabalhadas. Num segundo
momento, fazemos com que os participantes do projeto, percebam a maneira mais adequada
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para que se possa passar da posição do chão para a posição de pé, caso ocorra uma queda, e
depois no outro sentido.
Os projetos “Prevenindo as quedas para um envelhecimento saudável e sem
tropeços”, desenvolvido pela Associação Nacional de Gerontologia do Rio de Janeiro –
ANG-RJ, em parceria com o grupo Anima e a BrazilFoundation, funciona no Campus da
Faculdade de Educação Física da UFRJ, localizado na Praia Vermelha, zona sul da cidade
do Rio de Janeiro, vem atendendo um grupo significativo de pessoas idosas e aposentadas,
estando aberto o acesso a pessoas de todas as idades, já que consideramos que será a
maneira como ela é apresentada que vai fazer a diferença. O projeto é desenvolvido a partir
de uma metodologia que já vem sendo aplicada desde o ano de 2001, no projeto de
extensão e pesquisa do departamento de educação física da Universidade Federal
Fluminense (UFF). O projeto ‘Prev-Quedas – Prevenindo as quedas hoje, evitará que o
próximo a cair seja você’. Vale ressaltar que a compreensão da importância do lazer e da
animação cultural como estratégia de intervenção permitiu sua inclusão dentro das
atividades investigadas no grupo ANIMA de pesquisas (www.lazer.eefd.ufrj.br). Ao se
assumir a postura a favor da intergeracionalidade e do lazer numa perspectiva de promoção
da saúde, a proposta de Capoeira, se mostrou bastante original, diferente da grande maioria
dos projetos voltados para idosos.
Atuar considerando a importância da cultura corporal numa perspectiva de
promoção da saúde e do lazer permite ao animador cultural (Melo, Alves Junior, 2003),
sensibilizar os indivíduos para as suas diferentes linguagens e interesses, onde as relações
intergeracionais podem estar presentes, tornando as atividades significativas para todos que
tiverem envolvido nela, torna-se um desafio a mais desse projeto. A capoeira é repleta de
significados culturais, desde a sua identidade enquanto herança de uma raça, até mesmo
com a identidade brasileira, pois ela é uma luta historicamente construída em nosso país.
Esta característica cultural e o que representa ser brasileiro facilita a inclusão desta
atividade para os participantes do projeto. Nossa intervenção estimula a troca mútua, com
movimentos que permitem a livre criação.
A capoeira, muitas vezes é vista como uma atividade cujo acesso é para os jovens
ou para os adultos que iniciaram com relativas condições físicas. Pensar em idosos que
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muitas vezes estão fazendo uma atividade física sistemática pela primeira vez aos olhos de
muitos parece ser impossível. Evidente que nossas expectativas com alguma performance
são bastante limitadas, nos interessa trabalhar com outros significados como o simbólico da
atividade, da troca da movimentação com ritmo do equilíbrio, que são características da
deambulação.Portanto, na tentativa de quebrar essas barreiras, são abertos novos caminhos,
há novos olhares para seus corpos e suas possibilidades físicas levando-as a enfrentarem
novos desafios, mas de forma prazerosa e significativa. Não tememos dizer que a partir da
proposta estamos atuando na melhorara da auto-estima, que pode representar entre outras,
no enfrentamento das barreiras arquitetônicas que rondam nosso cotidiano e que podem
possibilitar uma.
Nas trocas e na interação que mediamos através da animação cultural contribuímos
para uma nova visão de envelhecer em sociedade. Considerando que as atividades de lazer
são “atividades culturais, em seu sentido mais amplo, englobando os diversos interesses
humanos, suas diversas linguagens e manifestações” (MELO, ALVES JUNIOR, 2003: 32).
O toque, “o corpo a corpo” com os outros indivíduos poderá levá-los a uma relação mais
intensa, melhorando significativamente o contato com os outros indivíduos, principalmente
quando há envolvimento de diferentes gerações.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apresentamos à guisa de ilustração alguns depoimentos de participantes do projeto.
Realizamos uma entrevista semi diretiva com quinze (15) participantes do projeto
“Prevenindo quedas para um envelhecimento saudável e sem tropeços”, onde foram
questionadas sobre questões variadas como: seu conhecimento da capoeira, o que achavam
da realização da capoeira no projeto, qual era a reação dos indivíduos mais próximos ao
saberem que idosos praticavam capoeira.
Como era de se esperar num grupo quase que totalmente constituído de mulheres,
moradoras da zona sul carioca, nenhuma dela havia praticado Capoeira anteriormente. No
entanto, todas já tinham tido algum contato com a atividade, seja assistindo uma
demonstração na televisão ou mesmo em eventos dos mais diversos que normalmente são
praticadas. Elas perceberam a importância de vivenciá-la enquanto uma atividade cultural
149
de movimento, uma forma de expressão corporal de identidade brasileira, permitindo-lhes
acrescentar mais uma nova experiência de movimentos em suas vidas.
As possibilidades de trabalhar determinadas capacidades físicas que interfiram na
prevenção de quedas, de forma prazerosa, faz com que a capoeira seja um elemento
significativo nas atividades desenvolvidas no projeto de prevenção de quedas. Pode-se
perceber isso, na fala de algumas participantes do projeto, C. M. de 72 anos de idade acha
algo muito interessante e aponta os benefícios que ela percebe na prática: “é formidável
porque é uma coisa pra nós nova, que nos está trazendo muitos benefícios, equilíbrio
principalmente”; para M C de 71 anos sua impressão é a de que “melhorou mais os
movimentos, que é bom pra circulação”. Mesmo que os resultados de nossas pesquisas
ainda não podem confirmar tal afirmação percebe-se claramente a questão da auto-estima.
Ficou também bem marcada a compreensão de que a capoeira além de beneficiar
fisicamente, houve o entendimento de que o que elas faziam mesmo de uma forma
diferente do que era visto por elas anteriormente, não deixava de representar a capoeira.. A
M de 77 anos se expressou dizendo que mesmo sendo uma luta o que passou a interessar
foi a estética do movimento, “não é violento, é uma coisa pra nós que não é violento, é uma
coisa que mexe com o corpo, bonito, principalmente aquela musiquinha que eu adoro”.
Nesse sentido, a fala de M C 71 anos também é esclarecedora “[...] você não vai fazer a
capoeira mesmo pra luta. São exercícios da capoeira”. Para ela o entendimento era de que a
capoeira como estava sendo ensinado era uma prática corporal possível de ser realizada, por
pessoas que nem ela. Os denominados “exercícios da capoeira” como foi exposto por mais
de uma delas, significam os educativos para a aprendizagem A ginga é o movimento de
base da capoeira, e é a partir dele que elas percebem estar jogando a capoeira, o que
acompanha qualquer outro aprendizado destinado a pessoas de outras idades, sendo ele o
ponto de partida para todos os outros movimentos da capoeira. Com movimentos alternados
de braços e pernas, na posição de pé, o capoeirista se locomove, se defende e mantém a
base de sustentação do seu corpo durante o jogo da capoeira. Já as esquivas, são posições
de agachamento para defesa de algum golpe e a meia lua de frente, corresponde um golpe
em que você usa uma das pernas em direção ao outro, em pé, fazendo um desenho de meio
círculo com a perna no ar, para frente no sentido ante-horário. Nestes movimentos entram
150
em jogo o equilíbrio, a mobilidade a força da perna e a propriocepção que são os elementos
perseguidos na nossa proposta global. A transferência do peso corporal para uma das pernas
e a postura são pontos importantes para a execução desses movimentos, portanto relevantes
serem trabalhados em um projeto de prevenção de quedas. Foi unânime a compreensão dos
motivos que levaram a incluir a capoeira no projeto e elas mesmo que seja ocupado todo o
tempo da atividade todas estão de acordo com a continuidade desta estratégia como recurso
para a prevenção de quedas.: “é uma coisa diferente, porque ginásticas assim nunca tem
capoeira, é uma coisa boa e que a gente movimenta bastante o corpo,”(V C, 77 anos)”
[...]continuar sempre, sempre, é novidade pra gente, devemos continuar.” (C M)
Outro fator importante que não podemos deixar de ser apresentado aqui, diz respeito
ao fato de que a sociedade em geral acredita que a capoeira é algo difícil de ser realizado
por pessoas que alcançam determinadas idades. Ao perguntarmos sobre a reação das
pessoas mais próximas como familiares e amigos quando souberam que elas estavam
praticando esta atividade, percebemos reações que variavam da surpresa a deboche pelo
fato de pessoas com idades como a delas não deviam estar praticando tal atividade:
“Quando eu digo que faço capoeira as pessoas ficam admirados”. (A O, 85 anos); “Eles
riem, né, não adianta nada, eles só ficam rindo.” (A M, 77 anos); “Eles acham engraçado,
capoeira nessa idade! [...] eu falo qualquer idade é idade, a gente gosta de aprender, visa o
aprendizado né?!”(G A, 63 anos); “Algumas pessoas que eu falo, acham isso uma besteira,
porque com essa idade! Mas aí eu explico que é ótimo, muito bom porque aí você dançando
você se equilibra, é meio a meio.”(Y L, 66 anos)
Levando em consideração a reação das pessoas ao saber da prática da capoeira por
pessoas que envelhecem, é possível perceber o fato de que a sociedade vive atribuindo
papéis aos grupos de indivíduos determinadas pelas suas faixas etárias, que agem de acordo
com o que lhes foram destinadas. Dessa forma, são reconhecidas socialmente, através de
suas condutas e atitudes.
As práticas cotidianas, que são práticas discursivas, reforçam,
no entanto, as imagens determinísticas dos grupos etários e de
suas formas de estar no mundo. Essas práticas reforçadoras
das delimitações sociais e afetivas dos diferentes grupos
etários estão permeadas de interesse políticos e de controle
151
sobre a população, jogando as pessoas em uma classificação
de idade que legisla o que ela deve ou não sentir, como deve
ou não viver (Magro 2003: 40).
Deste modo, os idosos quando realizam algo que socialmente não lhe cabe mais, são
criticados e/ou cobrados por não estarem desempenhando seu papel de um indivíduo frágil,
sem condições para o trabalho e/ou de uma participação ativa na sociedade. Ou então,
atribuem-lhe uma imagem fora da realidade, “de um sábio aureolado de cabelos brancos,
rico
de
experiência
e
vulnerável,
que
domina
de
muito
alto
a
condição
humana.”(BEAUVOIR, 1990:10).Ao pertencermos a um “grupo etário, somos marcados
socialmente e isso delimita as nossas possibilidades de expressão e de sociabilidade.”
(MAGRO, 2003 :35)
Portanto, consideramos estar comprometidos socialmente com esse grupo
populacional procurando desmistificar muitas das idéias errôneas que os indivíduos tendem
a ter da velhice. Buscamos através deste trabalho permitir como que estes indivíduos
tenham acesso a novas experiências na sua vida, que os levam à atos transgressivos, nesse
caso, a prática da capoeira. Nesse sentido, a transgressão,
como afirma Vieira, é a possibilidade de entrar em contato
com o diferente, constatando alternativas à monocultura, e
construindo uma interculturalidade. A experiência de uma
nova racionalidade rompe com uma rotina e potencializa a
integração das diferenças que enriquece a aprendizagem
cognitiva, e a afirma a multiplicidade de identidade em cada
um de nós (MAGRO 2003: 39).
A continuidade de uma prática diferenciada é relevante ao considerarmos as
possibilidades de aprendizagem que extrapolam o movimento corporal, abrindo caminhos
para novas relações consigo mesmo e até mesmo com outros indivíduos. Finalizamos com
este relato de A de O (85 anos): “um dia desses na rua estava o capoeirista com o grupo e
eu estava saindo de um baile, ia pelo museu da República, lá no palácio do Catete, aí eu
comecei fazendo assim (o movimento da ginga), mas eu estava vestida, aí me disseram vem
cá, vem cá, entra aqui dentro e os alunos todos me chamando... e eu respondi que não dava
por causa da minha roupa que não estava adequada de vestido e toda arrumada..., não num
152
dá não... e eles falaram pra mim... numa outra vez venha com uma roupa mais simples, que
eu faço aula todo dia aqui e quero ver você fazendo”.
Ao mesmo tempo em que essas idosas que estão praticando a capoeira, presenciam
reações de indignação pelo fato de estarem executando essa prática considerada pela
maioria dos indivíduos possível somente entre os mais jovens, ela possibilita um novo
espaço de interação e troca de experiências, já que entre os praticantes desta prática quando
estão num jogo de capoeira, todos que queiram praticar são convidadas para entrar na roda,
independente de sua idade, classe social ou até mesmo de suas possibilidades físicas.
Portanto, ao pensarmos em um projeto de prevenção de quedas, vemos na capoeira,
uma prática corporal que vai além do meramente físico, possibilitando-lhes um novo
conhecimento que poderá permiti-lhes o melhor convívio consigo mesmo, com as pessoas e
sua inserção com a sociedade.
153
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154
Dados da autora:
Bianca Viana Santos Souza
Professora de Educação Física do Ensino Médio, do Ensino Fundamental e da Educação
Infantil da rede pública estadual e municipal da cidade e do estado do Rio de Janeiro.
Tutora à distância do curso de Pedagogia para as séries iniciais (PAIEF/ UNIRIO),
Pesquisadora do grupo de pesquisas de envelhecimento e atividade física.(GPEAF)
Endereços para correspondência: Estrada da Boiúna 1133 casa 179 – Taquara - Cep:
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