Greve nos serviços e atividades públicos e ou essenciais

Transcrição

Greve nos serviços e atividades públicos e ou essenciais
ELIAS FARAH - advogado
Greve nos serviços e atividades públicos e ou essenciais
Elias Farah
1 – A Presidência da República pôs em
discussão o seu projeto de lei, com 14 artigos, que visa a disciplinar o exercício
do direito de greve dos servidores públicos dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, previsto no art.
37, inciso VII da
Constituição, que dispõe: “O direito de greve será exercido nos termos e nos
limites definidos em lei complementar”. Outras disposições constitucionais
regulam o assunto: o art. 9o diz: “É assegurado o direito de greve, competindo ao
trabalhador decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que
devem por meio dele defender. § 1o – A lei definirá os serviços ou atividades
essenciais
e disporá sobe o atendimento das necessidades inadiáveis da
comunidade. § 2o – Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da
lei”. Finalmente, diz o art. 42, § 5o “Ao militar são proibidas a sindicalização e a
greve.”
2 - O Projeto propõe alteração na Lei n. 8.112, de 11-121990, que dispõe sobre o “regime jurídico dos servidores públicos civis da
União, das autarquias e das fundações públicas federais”,
no sentido de
acrescentar no capítulo “das responsabilidades” e casos de demissão, um inciso
XIV no artigo 132, para ficar constando: “XIV – prática, durante a greve, de
qualquer ato que viole os direitos e garantias fundamentais de outrem,
impedindo o acesso ao trabalho, perturbando o regular funcionamento do
serviço, atividades públicas ou causando ameaça ou dano a propriedade ou a
pessoa.” A súmula 316 do STF diz: “A simples adesão à greve não constitui falta
grave”. E enunciado 189 do TST ressalva: “A Justiça do Trabalho é competente
para declarar a legalidade ou ilegalidade da greve.”
3 – A vetusta CLT dispõe, nos arts. 722 a 725, sobre as
penalidades aplicáveis no “Lockout” e da greve” na atividade privada. Diz o art.
725 que “aquele
que, empregado ou empregador,
ou mesmo estranho às
categorias em conflito, instigar a prática de infrações previstas neste capítulo,
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ou se houver feito cabeça de coligação de empregadores ou de empregados,
incorrerá na pena de prisão prevista na legislação penal,
sem prejuízo das
demais sanções cominadas. § 1o - Tratando-se de serviços públicos, ou havendo
violência contra pessoa ou coisa, as penas previstas neste artigo serão aplicadas
em dobro.” § 2o - O estrangeiro que incidir nas sanções deste artigo, depois de
cumprir a respectiva penalidade, será expulso do país, observados os
dispositivos da legislação comum”
4
–
A conveniência
de
o
referido
Projeto,
ora
apresentado, ser analisado, com a profundidade possível, decorre do fato
clamoroso da última greve dos funcionários da Justiça, excessivamente longa,
ruinosa, e muito sintomática do quanto a liberdade de greve nos serviços
públicos, em geral, mormente nos serviços essenciais, está a merecer, com
urgência, uma legislação compatível com a realidade nacional no que concerne à
exigência social de uma eficiente prestação jurisdicional. Os advogados sentiram
com mais intensidade a danosidade desse movimento paredista, com vários
aspectos iniquos, que colocaram os altos e imensos interesses da sociedade
abaixo de alguns interesses relativamente irrisórios, egoísticos e oportunistas
dos grevistas.
5 – A greve do judiciário foi alvo de justa contrariedade e
preocupação do ilustre Presidente do IASP, em longos debates, dentro e fora da
entidade, e cujo pensamento foi eloquentemente sintetizado no seu oportuno
artigo, inserido no “Informativo” n. 54, de outubro e novembro de 2001, sob o
título “A Greve no Judiciário Paulista”, no qual concluiu ser “imperativo que os
homens responsáveis, quer autoridades do Executivo, quer do legislativo, quer
do próprio judiciário, revejam a norma legal para saber dela se, da forma como se
apresenta, é justa para todos, indistintamente, ou apenas para alguns. Essa
revisão é impositiva e impostergável”. Esta sábia advertência do ilustre
Presidente é uma antevisão da necessidade de o projeto ser analisado com
seriedade e realismo, em confronto com as deletérias implicações das greves na
sociedade.
6 – Desde 1989 vige a Lei n. 7.783, de 28-6-1989, que
dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais,
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regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade e dá outras
providências. O que interessa, nesta lei, está no artigo 10, que discrimina os
serviços ou atividades considerados essenciais: “I – tratamento e abastecimento
de água, produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; II –
assistência médica e hospitalar; III – distribuição e comercialização de
medicamentos e alimentos; IV funerários; V – transporte coletivo; VI – captação e
tratamento de esgoto e lixo; VII – telecomunicações; VIII – guarda, uso e controle
de
substâncias
radioativas,
equipamentos
e
materiais
nucleares;
IX
–
processamento de dados ligados a serviços essenciais; X – controle de tráfego
aéreo; XI – compensação bancária.”
7 – Desde 1989 vige a Lei n. 7.783, de 28-6-1989, que
dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais,
regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade e dá outras
providências. O que interessa, nesta lei, está no artigo 10, que discrimina os
serviços ou atividades considerados essenciais: “I – tratamento e abastecimento
de água, produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; II –
assistência médica e hospitalar; III – distribuição e comercialização de
medicamentos e alimentos; IV funerários; V – transporte coletivo; VI – captação e
tratamento de esgoto e lixo; VII – telecomunicações; VIII – guarda, uso e controle
de
substâncias
radioativas,
equipamentos
e
materiais
nucleares;
IX
–
processamento de dados ligados a serviços essenciais; X – controle de tráfego
aéreo; XI – compensação bancária.”
8 – A lei n. 7.783-89, que dispõe sobre a greve, define
como serviços e atividades essenciais os relativos ao abastecimento de água e
energia elétrica, gás e combustível; medicamentos e alimentos; assistência
médica e hospitalar; esgoto e lixo; transporte coletivo; controle de tráfego aéreo;
compensação bancária; funerárias; telecomunicações; substâncias radioativas,
equipamentos e materiais nucleares. As greves nessas atividades e serviços
cumpre manter, no mínimo, os serviços básicos indispensáveis, para evitar
“prejuízos irreparáveis, pela deteriorização irreversível de bens, máquinas e
equipamentos, bem como manutenção daqueles essenciais à retomada das
atividades da empresa quando da cessação do movimento”.
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9 – A Constituição incautamente inseriu o direito de
greve no elenco dos direitos fundamentais dos trabalhadores do setor privado. A
proibição, pois, de greve nas atividades e nos serviços públicos e essenciais
ficou impossível de ser determinada. E a simplificação se ampliou quando a
Emenda Constitucional n. 19-98 estabeleceu, no que concerne ao funcionário
público civil, que “o direito de greve será exercido nos termos e nos limites
definidos em lei específica”, e não mais em lei complementar. A morosidade da
regulamentação gerou tormentosa perplexidade na doutrina e na jurisprudência.
O art. 37, inc. VII da Constituição ficou visto sob vários ângulos. Ora, como de
“eficácia contida”, podendo ser aplicado antes da lei específica; ou aplicada a lei
n. 7.783-89 por analogia; ou que o dispositivo constitucional não pode ser nunca
auto-aplicável.
10 – Os doutrinadores propugnam para que a greve seja
admitida como uma autodefesa. Admitem que seria a única arma com que o
trabalhador poderia enfrentar o seu empregador. Reconhecem, no entanto, a
necessidade de limitações, as quais devem ser mais amplas quando se tratar de
serviços e atividades essenciais, assim considerados aqueles que envolvem a
vida, a saúde e as necessidades básicas da população, capazes de gerar, se
paralisadas totalmente, graves danos.
Constitui disparate a equipolência
pretendida pelos grevistas entre os seus interesses particulares e os interesses
coletivos do povo prejudicado. A incoerência de alguns conceitos divulgados a
respeito da greve nos serviços e atividades públicos e essenciais revelam que o
assunto está a merecer análise mais ampla e realista.
11 – Transcorreram longos quatorze anos de vida da
chamada “constituição cidadã” e o relevante assunto de exercício do direito de
greve de servidores públicos se arrasta ainda na burocracia dos debates do
“Projeto de Lei”. Projetado há cerca de 15 meses, aguardou o momento
políticamente rentável para publicizar-se A soma de várias fatores, como o
radicalismo de determinados categorias profissionais; a precariedade de espírito
público do legislador e os sigilosos conchavos partidários vêm procrastinando a
sistematização do assunto. O vácuo legislativo permite que os movimentos
grevistas fiquem, como se constata hoje, livres para deflagrações impunes de
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greves inócuas ou desnecessárias e nunca responsabilizados seus lideres e
mentores.
12 – É sabido que a lei regulamentadora da greve no
serviço público será a ordinária e não mais a complementar. A lei vigente,
n.7.783-89, não se aplica aos servidores públicos: só trata da greve no âmbito
privado. A previsão textual na lei dos serviços essenciais ou inadiáveis para a
comunidade não implica referir-se a servidor público. Depois que a Emenda
Constitucional n. 19 alterou o inc. VII do art. 37, para prever “lei específica” para
o exercício do direito de greve do servidor público, não há como aplicar-lhe a Lei
n. 7.783-89. E a “ lei específica” , ora projetada, deverá dizer quais serviços
públicos podem ser objeto de greve; quais poderão ser paralisados ou
considerados essenciais; quais as condições mínimas de segurança para não
interromper a continuidade dos serviços.
13 – A Constituição de 1969 dispunha (art. 162) que “não
será permitida greve nos serviços públicos e atividades essenciais, definidas em
lei”. O mestre Nelson Hungria advertiu que “a greve é um processo violento que
não se compreende onde haja função jurisdicional, com o fim precípuo de
resolver os conflitos trabalhistas”. Há um natural pressuposto de que o
funcionário público ou aquele responsável pelo serviço público esteja
consciente, ao ser admitido,
de que está assumindo encargo diferenciado, que
implica interesses impessoais e inegáveis, acima das individualidades, e que a
greve é um instrumento selvagem, incompatível com o aprimoramento
democrático dos povos civilizados.
14 – O Código Penal tem no artigo 197, como atentado
contra a liberdade de trabalho “constranger alguém, mediante violência ou grave
ameaça: I)- a exercer ou não exercer arte, ofício, profissão ou indústria, ou a
trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias.” O
artigo 200 também considera crime “participar de suspensão ou abandono
coletivo de trabalho, praticando violência contra pessoa ou contra coisa”. Mas,
está no artigo 201 a previsão do crime sobre a paralisação de trabalho, quando
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dispõe: “Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, provocando
a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo.”
15 – O jurista Arion Sayão Romita (in Rev. LTr 199-64)
informa que a greve do servidor público tem proibição legal na Austrália, Bolívia,
Chile, Estados Unidos, Filipinas, Japão, Kuwait, Líbano, Holanda, Ruanda, Síria,
Suiça, Tailândia, Trinidad, Tobago. Esta proibição tem disposição expressa nas
constituições da Colômbia, República Dominicana, Costa Rica, Guatemala,
Honduras, Panamá e Venezuela. No Brasil foi proibida antes da Constituição de
1988. O projeto regulador porém é demais omisso quanto ao que seja atividade
essencial que não pode ou não deveria sofrer efeitos de qualquer paralisação
grevista. Os Estados e os municípios têm a faculdade de legislar sobre o direito
de greve dos seus servidores públicos. Seria uma legislação específica para os
seus próprios servidores.
16 – A maior e recente greve dos servidores do judiciário
paulista, que fomentou conflito dentro do próprio judiciário, deve ser interpretada
como um fato histórico e sintomático de que o direito de greve dos servidores
públicos, com suas imprevisíveis implicações sócio-econômicas, está a merecer
uma análise mais realista e de base moral, e não apenas como conquista de um
ideal democrático de uma falsa igualdade social. Antes da Constituição de 1988,
quando o servidor público estava proibido de movimentos paredistas, a
população desfrutava de um sentimento benfazejo de segurança em relação ao
usufruto dos serviços públicos. Estender ao servidor público o mesmo direito de
greve do trabalhador da empresa privada constitui, inequivocamente, a mistura
de dois conceitos absolutamente diferentes, que pode estar a esconder
interesses inconfessáveis.
17 – A definição do que sejam serviços públicos e dessa
conclusão relacionar os que sejam essenciais, é, à evidência, árdua tarefa,
porque eles são prestados tanto diretamente pela administração - como a defesa
nacional, polícia, higiene, preservação da saúde pública etc -
como são
prestados por terceiros, enfraquecendo o caráter de essencialidade - como
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serviço postal, transporte coletivo, energia elétrica, gás, telefone etc. Não há
como afastar o judiciário ou a prestação jurisdicional do caráter de
essencialidade , dado o quanto da sua legítima e oportuna intervenção depende a
defesa dos direitos fundamentais do cidadão, como a segurança pessoal, a
liberdade de circulação, a defesa do patrimônio etc. Está no artigo 175 da
Constituição que “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob
regime de concessão ou permissão sempre através de licitação, a prestação de
serviços públicos.”
18 - Estudiosos do assunto lembram que nos Estados
Unidos a greve não tem qualquer previsão constitucional. Os funcionários
públicos
americanos
automaticamente
são
proibidos de
fazer
greve.
Os
grevistas
são
exonerados. Consta que o Wagner Act e a Lei Taft-Hartley
(1947) contém disposições gerais sobre a greve, definindo inclusive as
responsabilidades dos sindicatos em greve em atividades essenciais. O direito
de greve, no Brasil, é erigido erradamente como direito humano fundamental, por
parecer buscar melhores condições de trabalho, e, com tal premissa,
teleologicamente falsa, o trabalho privado deve ser equiparado ao trabalho
público. Trata-se de equívoco que faz a liberdade sindical descambar, amiúde,
em licenciosidade político-corporativa.
19 – A proibição da greve nos Estados Unidos (Lei TaftHartley) merece referência destacada, porque lá o grevista servidor público sofre
demissão imediata, após o que não será recontratado senão decorrido três anos.
O grevista poderá, ainda, ser processado e ou multado e ou preso. A tradição
está no conceito de que a proibição da greve se inspira em razões cívicas do
dever de fidelidade do servidor ao Estado. Consta que com a greve dos
controladores de vôo, em 1981, o presidente Ronald Reagan demitiu-os todos e
dissolveu a “Associação dos Controladores de Tráfego”. A orientação legislativa
americana, entretanto, adotante da autonomia estadual sobre o assunto, permite
que alguns Estados admitam a greve de servidores públicos (Minesota, Montana,
Oregan, Pelsivania, Wisconsin).
20 – A inserção do direito de greve na Constituição de
1988 foi fruto de poderoso lobby político, mormente dos que têm nos servidores
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públicos o seu eleitorado cativo. Tudo o que afeta indevidamente a eficiência e a
continuidade de serviços públicos deve ser, em regra, considerado ilícito. Os
interesses da coletividade usufrutuária dos serviços públicos está muitíssimo
acima dos interesses pessoais dos grevistas. Esta conclusão é demais elementar
para ser controvertida. Não é uma questão somente jurídica, mas de elementar
bom senso, com profundas conotações sociais. Merece transcrição a forma
taxativa da seção 305 da mencionada lei americana TAFT-HARTLEY: “É ilegal,
para todo indivíduo empregado pelos Estados Unidos, ou por um dos seus
órgãos, neles compreendidos as corporações totalmente pertencentes ao
Governo, participar de uma greve.”
21 – Na constituinte de 1988, a CUT propugnou,
mediante decisão unânime da sua Executiva Nacional, ideologicamente
embriagada, por um direito de greve incondicional e sem restrições. Tal
irrealismo equivaleu a por em grave risco a segurança de ordem pública,
comprometendo o justo equilíbrio das relações de trabalho e a interdependência
dos complexos interesses da comunidade em todos os seus seguimentos . É de
indignante lembrança a greve nos Hospitais das Clínicas, cognominada de
“greve selvagem”, que deixou a todos perplexos, por representar uma violência
dramática, contra doentes carentes, pacientes graves clamando por assistência
médica urgente. Todos dirigentes sindicais e grevistas saíram impunes dessa
selvageria, que nada valeu a ninguém..
22 – Ives Gandra da Silva Martins e Celso Bastos, nos
comentários à Constituição foram contundentes ante esta realidade indiscutível
do descontrole grevista, quando escreveram “que o direito de greve è limitado
às garantias outorgadas à sociedade pela constituição. O direito ao trabalho é
maior que o direito de greve, e o direito do cidadão a ter serviço prestado por
funcionário do Estado também é maior que seu direito de greve. Ninguém é
obrigado a ser servidor público. Se o for, entretanto, deve saber que a sua
função oferece mais obrigações e menos direitos que na atividade privada O
servidor é antes de tudo um servidor da comunidade, sendo seus direitos
condicionados aos seus deveres na sociedade.”
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23 - O eminente jurista complementa seu
artigo,
dizendo “que, entretanto, não se pode aceitar é o fato de o contribuinte pagar
tributos para a prestação de serviços públicos, a Constituição exigir a
continuidade desses serviços, e os servidores negaram-se a prestar atividades
essenciais a que a população tem direito. Tem-se falado muitos, nos Tribunais,
em direito dos servidores. Infelizmente não se tem falado no direito da sociedade
de receber serviços públicos, principalmente quando paga a mais alta carga
tributária dos países emergentes em todo mundo“. E por tais razões estaria por
desencadeado o movimento “antidescontinuidade” do serviço público, e que
teria respaldo constitucional.
24 – Consta que a Organização Internacional do
Trabalho (OIT), pelo seu Comitê de Liberdade Sindical, se opõe ao direito de
greve no serviço público, porque equivaleria à resistência contra a soberania do
Estado. Quer dizer, seria inadmitido o confronto de forças econômicas em face
do Estado, e nem há de se tolerar a interrupção de serviços essenciais.
Curiosamente a Lei n. 7.783-89, em vigor, ao definir, no artigo 10, as atividades
consideradas essenciais não incluiu as atividades forenses ou judiciárias.
O
projeto de lei não especifica os “serviços essenciais”. A presunção é a de que
seriam essenciais todos os serviços públicos do interesse coletivo, e que não
devem ser interrompidos. Por isso o artigo 7o do projeto dispõe que “durante a
greve deverá ser mantido percentual mínimo de cinquenta por cento de
servidores em atividade, de forma a garantir a continuidade dos serviços ou das
atividades públicas.”
25 – A “Enciclica “Laborem Exercens”, de João Paulo II
(item 20.7) adverte “que a greve continua a ser num certo sentido, um meio
extremo”. “Além disso, não se pode esquecer nunca que quando se trata de
serviços essenciais para a vida da sociedade estes devem ficar assegurados...”
O trabalhador de empresa privada firma com seu empregador um vínculo sob
todos aspectos, no espírito, nas condições, na rescindibilidade, nos interesses,
nas pressões futuras etc, diferente do vínculo que o servidor firma com o Poder
Público, com suas peculiaridades obrigacionais, funcionais, econômicas. Tal
ostensiva e gritante diferença ou desigualdade constitui
uma das razões
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incontestáveis de que a greve no serviço público constitui uma faculdade
ilegítima ou uma violência a que falta o maior requisito: o fundamento moral.
26 – A Declaração Universal dos Direitos Humanos
prevê, no art. XXII, n. 4, que “toda pessoa tem direito a organizar sindicatos e
neles ingressar para proteção de seus interesses”. Não falou em direito de greve.
Posteriormente, em 1966, a ONU, ao instituir o Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais, dispôs (art. 8.1. “d”) que os Estados deveriam
garantir “o direito de greve exercido em conformidade com as leis de cada país”.
A Carta Social Européia, de 1961, admite o exercício de greve (art. 6, n. 4) e a
Organização Internacional do Trabalho - OIT – faz referência à greve somente por
“verbetes” do seu Comitê de Liberdade Sindical (n. 394), com recomendações
severas para as restrições quando se tratar de serviços públicos ou serviços
essenciais.
27 – Existem várias modalidades de greves, sendo mais
conhecidas: “de advertência”, “de curta duração”, “política”, para pressionar o
Poder Público ou o Estado; “de zêlo”, visando a exagerar nos cuidados; “de
braços caídos” ou “cera”, com a execução morosa do trabalho; “por turnos”,
para prejudicar a produção em série; “selvagem”, sem aviso prévio; “de braços
cruzados”, presente no trabalho mas sem trabalhar; “de solidariedade”, para
defesa de interesses de terceiros, “andorinha”, deflagrada sucessivamente em
localidades diversas. A invasão ou ocupação do estabelecimento por grevistas,
“com o intuito de impedir ou embaraçar o curso normal do trabalho, ou com o
mesmo fim de danificar o estabelecimento ou as coisas nele existentes ou delas
dispor”, constitui crime do art. 202 do C. Penal.
28 – A abusividade em greves em serviços públicos no
ano de 2001 teve configuração de desobediência civil, à semelhança da greve de
60 dias dos professores; da greve de 90 dias dos servidores do INSS; da longa
greve dos professores das universidades públicas federais, da greve recente de
82 dias no judiciário paulista. Há 12 meses o Secretário-Geral da Presidência da
República já anunciava a remessa ao Congresso do referido projeto sobre greve.
O Ministro do Planejamento advertia, sobre o projeto: “Não estamos inibindo-a
ou restringindo-a. Estamos pensando no cliente do Estado, o cidadão, que não
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pode ficar desprotegido” E concluiu, reconhecendo ser o projeto polêmico, que
“tem de haver uma regra para as greves no serviço público. É preciso um
equilíbrio entre os servidores e a população.”.
29 – São ainda lembradas as malfadadas greves dos
metroviários de São Paulo; dos funcionários dos correios (cinco em dois anos),
dos petroleiros nacionais, e que trouxeram imensos prejuízos ao povo. Os
interesses da coletividade foram postos em planos inferiores aos dos interesses
particulares
dos grevistas.
Ao
serem admitidos
como
funcionários ou
prestadores de serviços públicos, os funcionários devem conscientizar-se de que
estão assumindo, por natureza e por força de lei, atividades contínuas e
inadiáveis, coletivamente relevantes, que envolvem amplos e inegociáveis
interesses da população. Greves há instigadas em articulações da políticalha
sindical, que delas faz a ribalta para o aplauso consagrador de suas lideranças
pessoais, sem buscar solução de nada.
30 – Nos umbrais de uma universidade americana está
inscrito, de John Adams: “As grandes crises inspiram-nos muitas virtudes que
não temos e corrigem muitos males que ameaçam perturbar-nos e destruir-nos”.
A impunidade dos mandatários do povo nos seus atos de
improbidade
administrativa tem sido, no Brasil, estimulo aos excessos e abusos dos
detentores do poder. O mestre Aguiar Dias bem ressalta que “não é novidade
alguma o que estabelece, no tocante à responsabilidade pessoal do funcionário,
porque a solidariedade deste com o Estado, em todo e qualquer caso, de prejuízo
que cause e empenhe responsabilidade da Fazenda, é indeclinável, constituindo
até o objeto de reiterada consagração do nossos legislador”.
31 – A greve em serviço público é quase sempre injusta
e arbitrária, sobretudo se há soluções alternativas menos ruinosas. Inegável que
muitas reivindicações sejas justas em face da lei e de fatos de maus
administradores, mas, faltará embasamento moral, pelos prejuízos que a greve
causa ao povo ou à nação. Serviço público e greve são duas noções visivelmente
antagônicas. O eminente SEGADAS VIANNA (in “Greve – Direito ou Violência”,
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1959), menciona uma peça teatral “de Grand-Guignol, onde se simula a operação
de uma menina, filha de um grevista da companhia de eletricidade. Quando o
cirurgião acaba de praticar a incisão apaga-se a luz e ele tem de parar a
intervenção. Nesse instante um operário entra triunfalmente na sala exibindo um
cartaz dizendo: “Conseguimos fazer a greve ! ”, ao que o médico responde : “E
mataste tua filha !”
32 – O Brasil vem sendo submetido nos últimos anos
aos reiterados efeitos de greves de funcionários públicos e nos serviços
considerados essenciais. E são greves açodadas, sem respaldo legal, com a
exibição arrogante de força e mediante ameaças, para coação ilegítima da
autoridade constituída, como se esta fosse despojada de direitos. Tais greves
priorizam interesses particulares, em detrimento de bens públicos, ao arrepio das
recomendações democráticas de livre debate, fomentando antipatia popular e
sem assunção de qualquer responsabilidade pelos prejuízos causados. Há um
enorme contra-senso em o Estado tolerar o direito de greve, o que equivale a
reconhecer o direito de paralisar as suas próprias atividades.
33 - São instigantes as razões políticas que têm levado
o legislador a omitir-se na disciplinação da greve no setor público e nas
atividades essenciais, cujos excessos são tolerados impunemente. A liberação
da greve, sem lei ou restrições, coloca-a acima da ordem jurídica da nação. O
princípio da liberdade com responsabilidade deve prevalecer acima do direito de
recusa de trabalhar em face do dever social do trabalho. O ideal seria a
prevalência do principio da Constituição de 1946, pelo qual era vedado a greve
nos serviços públicos, mormente nos serviços essenciais. A sociedade não pode
ficar vulnerável quanto ao funcionamento das suas atividades básicas, de
proteção à vida, à saúde, a integridade física e defesa dos direitos do cidadão.
34 – Consta no STF a decisão da Adin n. 492-1-DF (Rel.
Min. Carlos Veloso, DJU 12-3-1993) de que servidor público não pode entabular
negociação coletiva, celebrar convenção ou acordo coletivo ou organizar dissídio
coletivo na Justiça do Trabalho. Tais obstáculos se justificam em face do
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princípio da legalidade e do orçamento público. É da competência do chefe do
Executivo a iniciativa do processo legislativo que acarrete aumento das
despesas com funcionários públicos. Nada
está a impedir a realização de
negociações, visando ao aperfeiçoamento de um protocolo de intenções, pelo
qual o legislativo passaria a dispor de elementos ilustrativos para uma legislação
mais realista, equânime, no justo equilíbrio dos interesses públicos e privados.
35 – O povo, usufruário do serviço público, é o
empregador. A greve, em geral, é deflagrada contra administradores públicos,
autores, amiúde, do desajuste
administrativo detonador da greve. Amauri
Mascaro Nascimento ressalta que “seria sumamente injusto afetar a comunidade
em suas necessidades básicas de contar com determinadas atividades, como se
fosse parte do conflito entre trabalhadores e os empregadores quando se sabe
que não o é.” O art. 11 da Lei 7.783-89 diz que “são necessidades inadiáveis da
comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a
sobrevivência, a saúde ou a segurança da população.” Quer dizer, a greve há de
ser proibida em atividades ou serviços que afetem a sobrevivência, a saúde ou a
segurança do público.
36 – Não tem faltado greves abusivas, instigadas por
líderes mais insolentes, que buscam, mais especialmente, o espalhafato e o
fortalecimento da sua liderança. Todos se lembram da danosíssima greve dos
pretoleiros contra a Petrobrás, em 1990, que o TST declarou de extrema
abusividade, com a improcedência das reivindicações, perda dos salários do
dias parados e aplicação de pesadíssima, porém, justa multa pecuniária à
Federação Nacional de Petroleiros. O país sofreu, com a falta de combustíveis,
momentos dramáticos com essa greve. A multa, porém, nunca foi paga, porque,
tempos depois, uma lei veio exonerar a Federação do pagamento. Com isso, o
ilícito foi abonado e a impunidade estimulada.
Enquanto as entidades
promotoras das greves abusivas não forem punidas pelos excessos que
cometem contra o povo, a sociedade, incapaz de indignar-se, haverá de conviver
com tais dramas.
37- Se inatingível for o ideal da proibição da greve no
serviço público, a compensação há de ser o aperfeiçoamento dos processos de
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negociação, pelos quais os direitos dos cidadãos sejam mais respeitados e mais
privilegiáveis os princípios da legalidade e da democracia participativa, visando à
harmonização construtiva nas relações entre servidores e Poderes Públicos. A
greve costume transpirar uma reação tendente a formentar a indignação dos
grevistas e a tornar mais intransigente o administrador público, no final do que o
povo é o grande recheio desse sanduíche de contrariedades recíprocas. Quando
a greve, pelos danos que causa, assume proporções de comoção pública, ela se
converte naturalmente numa greve política, senão também inconsequente.
38 – O histórico das greves dos servidores públicos
indica que a regulamentação do seu direito de greve poderá instigar ou estimular
as greves políticas, com objetivos revolucionários ou reacionários, cujo
conteúdo costuma ser estranho aos interesses profissionais concretos, diretos
ou imediatos. É o fenômeno que alimenta ou inspira as greves de solidariedade,
pela qual trabalhadores ou servidores, sem interesses profissionais próprios,
visam a apoiar reivindicações de outras categorias em greve. Este perigoso
processo
de
banalização
dos
movimentos
grevistas,
de
componentes
emocionais, gera, sempre, por natureza, excessos e abusos, em relação aos
quais a autoridade tem sido incapaz de reprimir e acabam por se converter num
festival de impunidades.
39 – A doutrina diferencia serviço público executado por
funcionários públicos, e o serviço público executado por pessoas contratadas e
estranhas ao funcionalismo público. É-nos irrelevante a diferenciação, porque o
fundamento da danosidade da greve nos serviços públicos está nos imerecidos
danos e prejuízos sofridos pelo povo com a interrupção dos serviços públicos.
O contrato de trabalho contém definidas condições previstas nas leis sociais e
em vasta jurisprudência consagradora dos tribunais. As dúvidas ou os conflitos
suscitados na interpretação ou no cumprimento do contrato não podem ser
solucionados com as próprias mãos. No Estado de Direito existe um Poder
Judiciário que a todos abriga para a justa distribuição de Justiça.
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40 –O nosso velho mestre Cesarino Junior, paladino do
justrabalhismo no Brasil, dizia que a greve, mesmo a do trabalhador da empresa
privada, é “fazer justiça com as próprias mãos”, sob o fundamento de que a
existência de uma Justiça do Trabalho paritária à disposição do trabalhador está
apta para solucionar, com equidade, os dissídios coletivos e econômicos, com
mais presteza e neutralidade. A greve de funcionários públicos, apesar do
amparo constitucional, deveria estar, mais acentuadamente, submetida a
rigorosas restrições, assim como
proibida nos serviços considerados
essenciais, porque equivale, neste caso, a uma autêntica violência, isto é, a uma
criminosa indiferença à repercussão pública e social dos seus maléficos efeitos.
41 - Tem sido alardeada a teoria de que a greve nos
serviços públicos pode ser desencadeada sem que exista a lei específica
regulamentadora, que estipule suas condições e limitações. Resulta dessa
doutrina, que, enquanto a nova lei, ora projetada, estiver em discussão, aplicarse-iam, por analogia, as disposições da lei de greve de 1989. Somos contra o
direito de greve no serviço público porque ela, na sua essência, é contra o
Estado, e portanto contra o povo e os interesses da coletividade, que em nada
contribui para as causas geratrizes das greves. É gritante e profundamente
incongruente, por exemplo, uma greve de médicos de hospitais públicos; dos
policiais, de servidores do judiciário, dos correios, da limpeza pública.
42 – O direito de greve de servidor público acabou por
adquirir, enganosamente, status de princípio consagrado e pacífico, chegando
doutrinadores ao extremo de verberar que a proibição de greve nos serviços ou
atividades essenciais estaria a representar um retrocesso jurídico e até cultural.
E costumam invocar a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948,
que dispõe que o direito de greve deve ser “exercido de conformidade com as
leis de cada país, sendo que elas podem prever limitações no interesse da
segurança
nacional ou da ordem pública, ou para prestação dos direitos e
liberdade de outrem.” Tal disposição genérica não pode e nem deve ser
interpretada como tolerância para a greve nos serviços públicos ou muito menos
nas atividades essenciais.
ELIAS FARAH - advogado
43 - Afinal, o que é a greve: um mero ato de represália;
uma forma facultada de reivindicação; um direito de auto-defesa, no equilíbrio
das forças em confronto; um instrumento–meio para a conquista de um fim
jurídico. O trabalho é prestado mediante contrato que estipula obrigações
recíprocas. A greve representa a transgressão do contrato, sobretudo se de
inspiração ideológica ou política, sem conteúdo trabalhista. Por isso temos
defendido a orientação de que os movimentos paredistas, que violentam a
Constituição e a lei, devem necessariamente sujeitar os sindicatos mentores ao
ressarcimento dos danos causados. Inegavelmente o Tribunal Regional do
Trabalho de São Paulo tem sido ágil na apreciação das greves e respectivos
dissídios coletivos.
44 – A greve nos serviços públicos gera o confronto de
dois fatores: um, a greve conflita com a elementar noção da imprescindível
subordinação hierárquica; outro, infringe o princípio relevante da continuidade
da prestação dos serviços, de amplíssimos interesses da coletividade, na qual o
próprio grevista está incluído. A greve é colocada, pelos mais insolentes, acima
dos interesses públicos e da lei. O Estado deveria ficar responsável pelos
prejuízos causados por greve, quando abusiva e
deflagrada pelos seus
funcionários, ou deflagrada em direta represália aos desmandos do próprio
Estado. É principio constitucional que as pessoas jurídicas de direito público
responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causarem a
terceiros.
45 – Sempre admitimos que a acolhida pela Constituição
de 88 do direito de greve nos serviços públicos foi uma decisão imprudente é
infeliz. Os constituintes se renderam à pressão dos interesses sindicais e
corporativos. Fez-se a exibição inconsequente de um trabalhismo demagógico,
divorciado da realidade viva e conhecida. Esta previsão constitucional veio
estimular várias greves abusivas, eivada de violências contra o patrimônio,
ocupação de estabelecimentos, desobediência a decisões judiciais etc. O
fortalecimento da abusividade decorreu também da autorização para a
sindicalização de funcionários públicos, incluindo os da administração indireta e
fundacional em todos os níveis.
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46 – Greve em serviço público é uma incongruência. A
população não pode arcar com o sacrifício de greves às vezes geradas pela
incompetência ou teimosia de um governante inabilitado, técnica ou emocional
ou politicamente para o cargo. Greve em serviço público é retrocesso
democrático, uma agressão à cidadania. Renomados juristas repudiam a
coexistência de greve com a Justiça do Trabalho ou, enfim, com o Poder
Judiciário. A solução judicial dos conflitos nas relações de trabalho, público ou
privado, deve ser sempre preferível porque mais hábil, com presumida equidade
e equidistância. A inconveniência das greves mais se evidencia quando elas
prosseguem, teimosamente, em forma de desacato,
após já definitivamente
decidido o dissídio pelo Poder Judiciário.
47 – São rudimentares ou primários alguns argumentos
de certas lideranças sindicais, que até desfrutam de popularidade na mídia
menos esclarecida. Lembremos da greve dos metalúrgicos, em 1994, chamada
“greve andorinha”, envolvendo 800 mil empregados em várias cidades do
Estado. O grito de convocação era “bagunçar” o processo produtivo, por prazo
indeterminado. Luiz Antonio Medeiros voltava então ao sindicalismo e dizia: “A
população de São Paulo que nos perdoe, mas a zona sul vai ficar intransitável”,
“ainda não queremos conflito total. A intenção é mostrar força”. Aos lideres
pouco importaram os azares do povo. O interesse era a popularidade pessoal
que o levaria à eleição para a Câmara Federal. Admitiu que os meios, embora
sem civismo, justificariam os fins.
48 – No confronto das condições contratuais entre
trabalhador de empresa privada e os servidores públicos há ponderável
distância, que influi decisivamente na liberdade de atuação em relação à greve. O
servidor público goza do direito de estabilidade ou vitaliciedade na função; tem
assegurado generosas vantagens acessórias, como na assistência médica,
licenças prêmios periódicas, abonos especiais, gratificação de função, verbas de
representação, tempo de serviço para aposentadoria suscetível do somatório de
períodos privilegiantes, enfim, o lucrativo prêmio (que às vezes chega ao abuso)
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de receber aposentadoria integral, ou até superior ao que ganha na ativa, como
acontece com militares. Tais vantagens sabidamente não são concedidas aos
trabalhadores. O servidor público, com tantas vantagens,
não tem direito à
negociação coletiva (art. 7o , XXVI da Constituição) e haveria de
não poder
exercer o direito de greve.
49 – É justificável a recusa de trabalhar quando violado
o contrato de trabalho. Os tribunais, nos Estados de Direito, foram exatamente
criados para julgar tais violações. A maioria das greves é precipitada, selvagem,
política, deflagrada, antes de esgotados os meios legais, jurídicos, próprios da
ordem constituída. Somos contra a greve do servidor público porque o
contratante é o povo, sempre alheio à relação de causalidade entre os fatos e a
indignação grevista. O maior equivoco pode estar em admitir como equivalentes,
em prioridade e relevância social, todas as atividades profissionais, sejam
braçais, intelectuais, públicas ou privadas, para efeito de justificar o direito de
greve. Antes do direito de reagir ao que se julgue injusto na relação de trabalho
cumpre discernir o que pode e o que não pode ser interrompido ou a gravidade
dos seus efeitos.
50 – A greve nos serviços públicos, se admitida for, há
de ter por objetivo
interesses relativos ou às condições de trabalho ou à
melhoria dessas condições. A greve política ou de solidariedade a outra
categoria é de intensa abusividade. O servidor público não pode pleitear, pela
greve, reajuste de vencimentos, pois constitui pleito dependente de legislação
própria. Expressivo número de homens públicos, legisladores e magistrados
proscrevem a greve nos serviços públicos pela danosidade coletiva que acarreta.
A omissão sintomática de manifestações de legisladores sobre o assunto está
ligada aos interesses ou aos efeitos eleitoreiros decorrente de uma posição que
poderia ser considerada anti-democrática.
51 – Somos de opinião de que a greve corresponde a
um desapreço à liberdade democrática, esta mesma que garante, em igualdade
de todos perante a lei, o direito ao trabalho e ao progresso. Muitas Greves se
inspiram na arrogância de lideranças despreparadas ou na cegueira do
patrulhismo ideológico. Deserve aos direitos fundamentos do cidadão, ainda de
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modo mais intenso se no serviço público. A greve é uma opção antidemocrática,
que mais deteriora que restaura. Só lucram pessoalmente os seus instigadores,
que se popularizam e buscam espaço no poder. Se a greve tem por ingrediente o
sofrimento de uma injustiça, a recuperação do direito, como todos os demais,
deve ser buscada no Poder Judiciário, instituído exatamente para esta finalidade.

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