Cadernos - BVS Psicologia Brasil
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Cadernos - BVS Psicologia Brasil
luiz carlos de lima silveira dora fix ventura [orgs.] são paulo: editora ip-usp (nec) cadernos da primeira oficina de estudos da visão claudia feitosa-santana Catalogação na publicação Serviço de Biblioteca e Documentação Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo Simpósio Visão Humana: Fundamentos Básicos; Psicofísica, Eletrofisiologia e Interfaces Clínico-Científicas (1. : 2006 : São Paulo, SP) Cadernos da Primeira Oficina de Estudos da Visão / organizado por Claudia Feitosa-Santana, Luiz Carlos de Lima Silveira e Dora Fix Ventura. São Paulo: IP-USP (NeC), 2007. 105 p. ISBN 978-85-86736-30-8 1. Visão 2. Neurofisiologia 3. Psicofísica 4. Eletrofisiologia 5. Oftalmologia 6. Neurociências I. Feitosa-Santana, Claudia II. Silveira, Luiz Carlos de Lima III. Ventura, Dora Fix IV. Título BF241 De acordo com a Declaração de Berlim sobre Acesso Livre ao Conhecimento nas Ciências e Humanidades (2003), o(s) autor(es) e o(s) detentor(es) dos direitos de tais contribuições concede(m) a todos os utilizadores o direito gratuito, irrevogável e mundial de lhes aceder, e uma licença para copiar, usar, distribuir, transmitir e exibir o trabalho publicamente e realizar e distribuir obras derivadas, em qualquer suporte digital para qualquer propósito responsável, sujeito à correta atribuição da autoria, bem como o direito de fazer um pequeno número de cópias impressas para uso pessoal. http://oa.mpg.de/openaccess-berlin/berlindeclaration.html Que estranha cena descreves e que estranhos prisioneiros, São iguais a nós. Platão, República. Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara. José Saramago, Ensaio sobre a Cegueira. Os que sabem ver, verão e saberão. Orhan Pamuk, Meu Nome é Vermelho. Organizadores Claudia Feitosa-Santana é pós-graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia – USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/claudia.htm e http://www.feitosa-santana.com/ Email: [email protected] Luiz Carlos de Lima Silveira é docente do Departamento de Fisiologia do Instituto de Ciências Biológicas - UFPA. Campus Universitário do Guamá - 66075.900 - Belém – PA e, Diretor Geral do Núcleo de Medicina Tropical - UFPA. Avenida Generalíssimo Deodoro, 92 - 66055.240 - Belém PA. Email: [email protected] ou [email protected] Dora Fix Ventura é docente do Departamento de Psicologia do Instituto de Psicologia – USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/ Email: [email protected] Agradecimentos Ao colaborador e incentivador da realização do Simpósio Visão Humana, o engenheiro José Gil Oliveira (MSc), Chefe da Seção Técnica de Fotometria do IEE-USP, onde foi realizado o simpósio. Às estimadas Aparecida Angélica Z. P. Sabadini, Lilian Leme Bianconi, Maria Marta Nascimento e Maria Imaculada C. Sampaio, da Biblioteca “Dante Moreira Leite” do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Ao caríssimo produtor e editor gráfico, Gerson da Silva Mercês, e à caríssima Joelma Debus, ambos da Editora IPUSP. À Daniela Maria Oliveira Bonci, pela cuidadosa revisão ortográfica. Sumário Apresentação Laboratório de Fisiologia da Cognição Laboratório de Neurobiologia Laboratório de Biologia Celular da Retina Laboratório de Neurofisiologia ‘Eduardo Oswaldo Cruz’ (LNEOC) e Laboratório de Neurologia Tropical (LNT) Laboratório da Visão Simpósio Visão Humana – Fundamentos Básicos; Eletrofisiologia, Psicofísica e Interfaces Clínico-Científicas Os Três Caminhos da Luz Visão, O Primeiro Sentido Visão Binocular Visão de Contrastes Visão de Cores Espaço de Cores Alterações na Visão de Cores Maturidade do Sistema Visual Do Fóton à Consciência Cambridge Colour Test Adaptação do Teste para Crianças Eletrorretinograma Multifocal GTPases Rho na Retina de Vertebrados Doenças da Retina: Anatomia, Propedêutica e Perspectivas Terapêuticas Síndromes Quiasmáticas: Alterações Funcionais e Morfológicas Ressonância Magnética Funcional: Bases e Limitações para Aplicações Clínicas Apresentação A despeito do progresso sem precedentes da ciência durante o século passado, o cérebro permanece uma fronteira do conhecimento humano no alvorecer do Novo Milênio. Atualmente, a Neurociência pode ser considerada um dos mais importantes campos de pesquisa científica que, no futuro próximo, dará origem a mudanças radicais e imprevisíveis na forma como a humanidade vivencia o aprendizado, o envelhecimento, as disfunções cerebrais, a cura de traumas neurológicos, as interfaces mente-máquina e assim por diante. As doenças mentais e neurológicas compõem um grupo de elevada e crescente incidência, alto custo pessoal, econômico e social. O documento da Organização Mundial da Saúde (OMS) “World Health Report 2001. Mental Health: New Understanding, New Hope”, estima que atualmente 450 milhões de pessoas sofrem de distúrbios mentais ou 7 neurológicos, ou de problemas relacionados ao abuso de drogas e álcool, 20 milhões tentam o suicídio a cada ano, 1 milhão com sucesso. Esse panorama tende a agravar-se devido ao progressivo aumento da expectativa de vida. A OMS estima que até 2025 haverá um aumento dos atuais 8% para 23% da população sexagenária, com o aumento proporcional da incidência de doenças neuro-degenerativas como, por exemplo, Parkinson, Alzheimer e Acidente Vascular Cerebral. Em 1990, as doenças mentais e neurológicas eram responsáveis por 10% do total dos gastos do sistema de saúde, taxa que cresceu para 12% em 2000 e atingirá 15% em 2020. Espera-se que essas cifras sombrias possam ser contrabalançadas pelo desenvolvimento da Neurociência. No Brasil, acredita-se que o impacto das doenças crônico-degenerativas é semelhante àquele dos países industrializados, tanto que elas integram a agenda prioritária da saúde e da ciência e tecnologia em saúde, como atestam vários editais de pesquisa fomentados. Portanto, qualquer esforço em reduzir o hiato tecnológico entre o Brasil e o Primeiro Mundo, trazendo para o nosso país a pesquisa em Neurociência aos níveis de estadoda-arte deve ser considerado como prioritário. De acordo com esse panorama foi criada a Rede Instituto Brasileiro de Neurociência (IBN-Net) com 30 grupos de pesquisa do sistema nervoso normal e patológico, oriundos de todas as regiões do país. O IBN-Net funciona em dois domínios de abordagem teórico-experimental: os estudos de processos fisiológicos do sistema nervoso central e os estudos de disfunção e proteção do sistema nervoso central. Dessa forma, o IBN-Net tem como objetivo: a) a investigação da organização do sistema nervoso adulto e em desenvolvimento; b) o estudo da injúria neural e das estratégias de neuroproteção; c) a promoção de intercâmbio para otimização de estratégias para investigação científica dos problemas neurológicos e psiquiátricos relevantes para o país; d) 8 o estudo multidisciplinar para identificação de alvos terapêuticos e estratégias de neuroproteção; e) a interação entre as áreas básicas e clínicas de Neurociência para o diagnóstico, tratamento e prevenção de neuropatologias degenerativas, agressões tóxicas ao sistema nervoso e manifestações neurais de doenças tropicais. No sentido de atuar em alguns dos seus objetivos, apresentamos nesse volume, os laboratórios que integram a Rede Instituto Brasileiro de Neurociências (IBNNet) e são dedicados aos estudos da visão e, os anais do Simpósio Visão Humana – Fundamentos Básicos; Eletrofisiologia, Psicofísica e Interfaces Clínico-Científicas. Luiz Carlos de Lima Silveira Professor Associado do Instituto de Ciências Biológicas e Diretor Geral do Núcleo de Medicina Tropical – UFPA, e Coordenador da Rede Instituto Brasileiro de Neurociência (IBN-Net) e Diogo Onofre Gomes de Souza Professor Titular do Instituto de Ciências Básicas da Saúde – UFRGS, e Vice-coordenador da Rede Instituto Brasileiro de Neurociência (IBN-Net) 9 Laboratório de Fisiologia da Cognição Ricardo Gattass 1 Mario Fiorani Jr 2 O Laboratório de Fisiologia da Cognição (antigo Laboratório de Neurobiologia 3) coordenado pelo professor Ricardo Gattass, com o auxílio do professor Mario Fiorani, faz parte do Programa de Neurobiologia do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Há várias décadas esse laboratório dedica-se aos estudos cognitivos em humanos e outros primatas, e suas linhas de pesquisa têm sido pioneiras na investigação dos processos perceptuais e cognitivos. Primatas não-humanos (macacos) e humanos são estudados principalmente por meio de técnicas eletrofisiológicas assim como anatômicas. O grupo dos professores Ricardo Gattass e Mario Fiorani estuda principalmente a organização do córtex visual, suas áreas, localização, topografia, conexões, organização modular, e a plasticidade dos mapas corticais. As contribuições nessas áreas de 1 Professor Titular do Programa de Biofísica do Instituto de Biofísica Carlos Chagas – UFRJ, e superintendente da FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos. Avenida Brigadeiro Trompowsk, s/n – Bloco G - Ilha do Fundão - Cidade Universitária - 21949.900 - Rio de Janeiro - RJ. http://www.cortex.biof.ufrj.br Email: [email protected] 2 Professor Adjunto do Programa de Biofísica do Instituto de Biofísica Carlos Chagas – UFRJ. Email: [email protected] 10 estudo incluem o entendimento de alguns dos mecanismos que integram o sistema visual, a segregação das vias paralelas do processamento visual, a topografia do corpo geniculado lateral e de estruturas corticais visuais. O grupo vem desenvolvendo um novo método para estudar a organização funcional do córtex visual, através do emprego de arranjos compostos por múltiplos eletródios, denominado imageamento eletrofisiológico (electrophysiological imaging) que está sendo utilizado com a finalidade de revelar organizações colunares ainda não conhecidas do córtex visual, assim como a plasticidade dos mapas corticais e as propriedades dos campos receptivos após a realização de micro lesões na retina de primatas não-humanos. Uma nova linha de pesquisa do loboratório é direcionada para o estudo das atividades elétrofisiológicas em humanos através de eletroencefalografia promediada (potenciais relacionados a eventos). O grupo possui intercâmbios nacionais com outros laboratórios dentro da mesma universidade, a UFRJ, assim como em outras universidades brasileiras, como com o professor João Guedes da Franca do laboratório de Neurobiologia 2 da UFRJ; e com o professor Jerome Baron do ICB da UFMG. Também de extrema importância são os intercâmbios internacionais: como com o Dr. Thomas Albright do Salk Institute, San Diego, CA; com a Dra. Leslie Ungerleider do NIH, Bethesda, MD; com o Dr. Sergio Neuenschwander do Max Plank Institute, Frankfurt, Alemanha; e com a Dra. Leah Krubitzer do Center for Neurosciences, University of California, Davis, CA. O Laboratório de Fisiologia da Cognição recebe financiamento de diversas agências de fomento à pesquisa científica nacionais: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ); Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP). Recentemente, passou a integrar a Rede do Instituto Brasileiro de Neurociências (IBN-Net) juntamente 11 com diversos laboratórios de pesquisa de onze universidades brasileiras, a qual é coordenada por Luiz Carlos de Lima Silveira (UFPA) e vice-coordenada por Diogo Onofre Gomes de Souza (UFRGS). Exemplo de mapeamento simultâneo de campos de resposta visuais na área visual primária com 32 eletródios utilizando o programa 8MB desenvolvido em nosso laboratório. Note que existem campos receptores mapeados (aparecem em vermelho no centro do “asterisco”) em 30 dos eletródios (exceto nos canais 5 e 6). Em cada “mapa” está representa uma região de 30 por 30 graus do campo visual e a escala de cores representa a razão sinal ruído. 12 Referências Padberg, J., Franca, J. G. da, Cooke, D. F., Soares, J. G. M., Rosa, M. G. P., Fiorani-Jr., M., Gattass, R., & Krubitzer, L. (2007). Parallel evolution of cortical areas involved in skilled hand use. The Journal of Neuroscience, 27(38):10106 –10115. Botelho, E. P., Soares, J. G. M., Pereira, S. S., Fiorani-Jr., M., & Gattass, R. (2006). Distribution of calbindin-28KD and parvalbumin in V1 in normal adult Cebus apella monkeys and in monkeys with retinal lesions. Brain Research, 1117, 1-11. Soares, J. G. M., Pereira, A. C. C. N., Botelho, E. P., Pereira, S. S. Fiorani-Jr., M., & Gattass, R. (2005). Differential expression of Zif268 and c-Fos in the primary visual cortex and lateral geniculate nucleus of normal Cebus monkeys and after monocular lesions. Journal of Comparative Neurology, 482(2), 166-175. Gattass, R., Nascimento-Silva, S., Soares, J. G. M., Lima, B., Amorim, A. K. J., Diogo, A. C. M., Farias, M. F., Moura, M. M., Botelho, E. P., Mariani, O. S., Azzi, J. C. B., & Fiorani-Jr., M. (2005). Cortical visual areas in monkeys: location, topography, connections, columns, plasticity and cortical dynamics. Philosophical Transaction of the Royal Society, 360, 709731. Soares, J. G. M., Diogo, A. C. M., Fiorani-Jr., M., Sousa, A. P. B., & Gattass, R. (2004). Effects of inactivation of the lateral pulvinar on response properties of second visual area cells in Cebus monkeys. Clinical and Experimental Pharmacology and Physiology, 31, 580-590. Lima, B., Fiorani-Jr., M., & Gattass, R. (2004). Changes of ongoing activity in Cebus monkey perirhinal cortex correlates with behavioral performance. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 37, 2125. 13 Laboratório de Neurobiologia Silene Maria Araújo de Lima 1 Criado em 2002 com o nome de Laboratório de Neurobiologia, o laboratório tem a finalidade de implentar os trabalhos de morfologia de retina que utilizam técnicas clásssicas e/ou imunocitoquímicas. O surgimento deste laboratório teve apoio e incentivo do Prof. Dr. Luiz Carlos de Lima Silveira, docente-pesquisador do Centro de Ciências Biológicas (CCB; atualmente Instituto de Ciências Biológicas, ICB) da Universidade Federal do Pará (UFPA) e chefe do Laboratório de Neurofisiologia ‘Eduardo Oswaldo Cruz’ (LNEOC). O Prof. Dr. Luiz Carlos com a finalidade de desmembrar a então sala denominada Sala de Preparações e Microscopia pré-existente no Laboratório de Neurofisiologia ‘Eduardo Oswaldo Cruz’ (LNEOC) disponibilizou os equipamentos de morfologia para o recém-criado laboratório. O grande enfoque do Laboratório de Neurobiologia refere-se à análise das Neuropatologias Regionais da Amazônia utilizando como modelo a retina e estruturas celulares do Sistema Nervoso Central afetadas pela intoxicação mercurial. Além disso, o uso de técnicas imunocitoquímicas usando anticorpos monoclonais permite o mapeamento dos circuitos neurais 1 Docente do Departamento de Fisiologia do Instituto de Ciências Biológicas - UFPA. Campus Universitário do Guamá - 66075.900 - Belém - PA. Email: [email protected] 14 envolvidos na visão fotópica, de cores e escotópica de animais amazônicos adaptados a diferentes habitat como, por exemplo, diurno versus noturno. Dentre os animais utilizados no laboratório para realizarmos a análise comparativa do sistema visual estão os primatas do Novo Mundo macaco-prego (diurno) e macaco da noite e, grandes roedores da Amazônia, cutia (diurno) e paca (noturno). O objetivo central da análise da retina desses animais corresponde à identificação de tipos celulares específicos que estão envolvidos em um determinado processamento visual, tal como a visão de cores. Os cones podem ser facilmente identificados através da utilização de anticorpos monoclonais que permitem identificar os cones S (sensíveis aos comprimentos de onda curtos do espectro visível (short wavelength)) e cones M/L (sensíveis aos comprimentos de onda médios e longos do espectro visível (middle/long wavelength)) e assim possamos inferir como o arranjo da retina varia nos animais diurnos e noturnos. Outra abordagem em uso no laboratório, em colaboração com o Laboratório da Visão da Psicologia Experimental da USP, é utilizar animais da fauna aquática e investigar os efeitos da contaminação ambiental in vivo. Para isto, utilizamos espécies de peixes da região amazônica, tucunaré, tambaqui e induzimos contaminação em laboratório utilizando sais de mercúrio e outros metais pesados. A retina, parte do músculo e vísceras são analisadas através da cintilografia para saber os níveis de intoxicaçåo capazes de induzir perda neuronal. As análises são feitas com imunocitoquímica, quantificação morfométrica e análise de marcadores de morte celular para identificar o grau e a intensidade de lesão neuronal. Um número grande de docentes-pesquisadores da UFPA têm participado dos trabalhos desenvolvidos no Laboratório de Neurobiologia, dentre os quais: Luiz Carlos de Lima Silveira, José Luiz Martins do Nascimento, Manoel da Silva Filho, Setsuko Noro dos Santos e Artur Luiz Silva, Amauri Gouveia Junior e Maria Luisa da Silva. Entre os vários colaboradores nacionais e internacionais: Dora Selma Fix Ventura (USP), Carol Fuzetti Elias (USP), Jan Nora Hokoç (UFRJ), Silvana 15 Allodi (UFRJ), Peter Ahnelt (Universität Wien), Manfred Ghar (Max-Planck-Institut). Entre os estudantes de doutorado formados ou em formação pelos dois laboratórios: Fernando Allan de Farias Rocha, André Luiz Wash Monteiro, Soraia Valéria Lameirão, Adelaide Passos, Anderson Manoel Herculano Oliveira da Silva. Muitos outros estudantes, de mestrado, especialização ou iniciação científica, fizeram ou estão fazendo suas dissertações, monografias ou trabalhos de conclusão de curso de graduação nos laboratórios. Dentre eles: Tatiana Figueiredo, Antônio Carlos Bastos da Silva, Évene dos Santos Malheiros, Michele Gonçalves da Silva, Inácio Lemos, Fabiano Lucas e Daniela Maria Oliveira Bonci. Referências Bonci, D., Lima, S. M. A., Grotzner, S. R., Ribeiro, C. A. L., Hamassaki, D. E., & Ventura, D. F. (2006). Losses of immunoreactive parvalbumin amacrine and immunoreactive protein kinase C bipolar cells caused by methylmercury chloride intoxication in the retina of the tropical fish Hoplias malabaricus. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 39(3), 405-410. Correa-Jr, J. D., Silva, M. R., Silva, A. C. B., Lima, S. M. A., Malm, O., & Allodi, S. (2005). Tissue distribution, subcellular localization and endocrine disruption patterns induced br cr and mn in the crab Ucides cordatus. Aquatic Toxicology, 73, 139-154. da Fontoura Costa, L. F., Rocha, F. A. F., & Lima, S. M. A. (2005). Statistical mechanism characterization of neuronal mosaics. Applied Physics Letters, 86, 1. da Fontoura Costa, L., Rocha. F., & Araújo de Lima, S. M. (2006). Characterizing polygonality in biological structures. Physical review. E, Statistical, nonlinear, and soft matter physics, 73(1 Pt 1), 011913. Epub 2006 Jan 23. 16 Herculano, A. M., Lima, S. M. A., Lopez, M. E. C., Diniz, D. L. W. P., Nascimento, J. L. M. (2006). Methymercury intoxication activates nitric oxide synthase in chick retinal cell culture. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 39(3), 415-418. Lima, S. M. A., Ahnelt, P. K., Carvalho, T. O., Silveira, J. S., Rocha,F. A. F., Saito, C. A., & Silveira, L. C. L. (2005). Horizontal cells and displaced horizontal cells in the retina of the diurnal rodent, the agouti (Dasyprocta aguti). Visual Neuroscience, 22(6), 707-720. Monteiro, A. L. V. W., Elias, C. F., Silva, A. L. C., & Lima, S. M. A. (2005). Localização de neuropeptideos responsaveis pelo controle de peso corporal no hipotalamo de bufalos (bubalus bubalis). Neurociências, 2(2), 77-83. 17 Laboratório de Biologia Celular da Retina Dânia Emi Hamassaki 1 A retina exerce um papel imprescindível para a percepção sensorial em vertebrados. Sua estrutura estratificada, diversidade de componentes e riqueza de interações refletem sua complexidade funcional. Em contrapartida, exatamente devido a esta estrutura altamente diferenciada e em conjunção com sua posição anatômica, a retina é susceptível a uma variedade de insultos genéticos e ambientais que resultam em patologias que afetam a acuidade visual. Para elucidar os processos que ocorrem em disfunções retinianas é necessário primeiro compreender a formação e funcionamento da retina. Desta forma, estudos dos processos envolvidos na embriologia, estrutura, função e metabolismo da retina normal contribuem para o entendimento dessas degenerações. Estes estudos, em conjunção com a análise de modelos animais de disfunções retinianas hereditárias e induzidas, fornecem uma perspectiva integrada da retina e dos defeitos específicos que estão por trás das patologias retinianas. O Laboratório de Biologia Celular da Retina foi criado em 1993, a partir da minha contratação no Departamento de Biologia Celular & do Desenvolvimento (antigo Histologia & Embriologia) do Instituto de Ciências Biomédicas da USP. Nosso laboratório tem como objetivo principal 1 Docente do Departamento de Biologia Celular e do Desenvolvimento do Instituto de Ciências Biomédicas – USP. Avenida Prof. Lineu Prestes, 1524 - Sala 440 - Cidade Universitária 05508.900 - São Paulo - SP. Email: [email protected] 18 investigar a organização funcional da retina de vertebrados por meio da caracterização dos diferentes tipos celulares no que tange ao seu conteúdo neuroquímico, morfologia e função. Além disso, estamos interessados nos mecanismos que levam a degeneração e possível regeneração da retina em diferentes modelos animais. Para isso temos utilizado retinas de aves e mamíferos in vivo e in vitro, empregando diferentes metodologias para determinar a expressão gênica e protéica (imunohistoquímica, hibridação in situ, Western blotting e PCR em tempo real). Esses estudos devem contribuir para um melhor entendimento dos mecanismos neurais subjacentes às diferentes facetas do processo visual. Além disso, a compreensão dos mecanismos de morte e regeneração celular é de importância fundamental para o desenvolvimento de novas estratégias para a prevenção e tratamento das degenerações retinianas. Esse laboratório recebe suporte financeiro da FAPESP, CNPq e FINEP. Referências Araki, C. M., & Hamassaki-Britto, D. E. (1994). Motion-sensitive neurons in the chick retina: A study using Fos immunohistochemistry. Brain Research, 794, 333-337. Araki, C. M., & Hamassaki-Britto, D. E. (2000). Calretinin co-localizes with the NMDA receptor subunit NR1 in cholinergic amacrine cells of the rat retina. Brain Research, 869, 220-224. Araki, C. M., Pires, R. S., Britto, L. R. G., Lindstrom, J. M., Karten, H. J., & Hamassaki-Britto, D.E. (1997). Differential co-localization of nicotinic acetylcholine receptor subunits with calcium-binding proteins in retinal ganglion cells. Brain Research, 774, 250-255. Belmonte, M. A., Santos, M. F., Kihara, A. H., Yan, C. Y. I., & Hamassaki, D. E. (2006). Light-induced photoreceptor degeneration in the mouse 19 involves activation of the small GTPase Ophthalmology & Visual Science, 47(3), 1193-1200. Rac1. Investigative Bonci, D. M. O., Lima , S. M. A., Grotzner, S. R., Ribeiro, C. A. O., Hamassaki-Britto, D., & Ventura , D. F. (2006). Losses of PV-IR Amacrine and PKC-IR bipolar cells caused by methylmercury chloride intoxication in the retina of the tropical fish Hoplias malabaricus. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 39(3), 405-410. Bredariol, A. S. S., & Hamassaki-Britto, D. E. (2001). Development of ionotropic glutamate receptors in the chick retina. The Journal of Comparative Neurology, 441, 58-70. Hamassaki-Britto, D. E., Hermans-Borgmeyer, I., Heinemann, S., & Hughes, T. E. (1993). Expression of glutamate receptor genes in the mammalian retina: The localization of GluR1 through GluR7 mRNAs. The Journal of neuroscience: the official journal of the Society for Neuroscience, 13, 18881898. Kihara, A. H., Castro, L. M., Belmonte, M. A., Yan, C. Y. I., Moriscot, A. S., & Hamassaki, D. E. (2006). Expression of connexins 36, 43 and 45 during postnatal development of the mouse retina. Journal of Neurobiology, 66(13), 1397-1410. Kihara, A. H., Castro, L. M., Yan, C. Y. I., Moriscot, A. S., & Hamassaki, D. E. (2006). Dark adaptation regulates connexin expression in mouse retina. Journal of Neuroscience Research, 83(7), 1331-1341. Santos-Bredariol, A. S., Belmonte, M. A., Kihara, A. H., Santos, M. F., & Hamassaki, D. E. (2006). The small GTP-binding protein RhoB in glial Muller cells in the vertebrate retina. The Journal of Comparative Neurology, 494, 976-985. Ventura, D. F., & Hamassaki-Britto, D. E. (2005). Neurônios da retina. In H. F. Carvalho & C. B. Collares-Buzato (Eds.), Células - uma abordagem multidisciplinar (278-290). São Paulo: Manole. 20 Laboratório de Neurofisiologia ‘Eduardo Oswaldo Cruz’ (LNEOC) e Laboratório de Neurologia Tropical (LNT) Luiz Carlos de Lima Silveira 1 Criado em 1981 por Cristovam Wanderley Picanço Diniz e Luiz Carlos de Lima Silveira, ambos docentes-pesquisadores do Centro de Ciências Biológicas (CCB; atualmente Instituto de Ciências Biológicas, ICB) da Universidade Federal do Pará (UFPA), sob a orientação de Eduardo Oswaldo Cruz (UFRJ), esse ambiente de pesquisa foi chamado inicialmente de Laboratório de Fisiologia dos Tecidos Excitáveis, nome que foi usado até 1991 quando foi re-batizado como Laboratório de Neurofisiologia ‘Eduardo Oswaldo Cruz’ (LNEOC). O LNEOC foi coordenado por Cristovam W. Picanço Diniz nos períodos de 1981-1986 e 1990-1992, e por Luiz Carlos L. Silveira em 1987-1989 e de 1993 até o presente. O laboratório foi criado visando trabalhos com modelos animais para o estudo da organização morfofuncional do sistema visual e de sua relação com os fatores ópticos e neurais que limitam a acuidade visual. Foram escolhidos para esse tipo de pesquisa dois grupos de animais muito comuns na Amazônia, que se caracterizam por apresentarem adaptações evolucionárias para o uso da visão numa variedade de 1 Docente do Departamento de Fisiologia do Instituto de Ciências Biológicas - UFPA. Campus Universitário do Guamá - 66075.900 - Belém - PA. Diretor Geral do Núcleo de Medicina Tropical - UFPA. Avenida Generalíssimo Deodoro, 92 - 66055.240 - Belém - PA. Email: [email protected] ou [email protected] 21 nichos ecológicos e comportamentais. Inicialmente os estudos se concentraram nos grandes roedores histricomorfos – cutia (diurno), capivara (crepuscular) e paca (noturno). Posteriormente, com o apoio do Centro Nacional de Primatas, localizado em Ananindeua, nas proximidades de Belém, o laboratório voltou-se para o estudo dos primatas neotropicais – macaco-guariba (diurno, tricromata), macaco-prego e sagüi-comum (diurnos, com uma grande variedade de fenótipos tricromatas e dicromatas) e macaco-danoite (noturno, monocromata). Os resultados têm sido muito importantes para verificar que características da óptica do olho, da morfologia e das respostas dos neurônios visuais estão associadas a essas adaptações ecológicas e aos comportamentos exibidos por roedores e primatas. Ao lado dessa linha de pesquisa dedicada a questões básicas sobre como a visão funciona, foi também montada uma linha de pesquisa com uma vertente mais aplicada, procurando desenvolver modelos animais dos fenômenos anátomo-fisiopatológicos subjacentes à neurodegeneração do sistema visual, tanto em primatas como noutros animais. Têm sido estudados os fatores que promovem a degeneração diferencial das várias classes de células ganglionares retinianas após lesão do nervo óptico, tanto em felídeos como primatas. Para a realização desses trabalhos tanto de pesquisa básica quanto aplicada, o LNEOC capacitou-se ao longo dos anos com uma grande variedade de métodos ópticos, anatômicos, histológicos, histoquímicos, imunocitoquímicos e eletrofisiológicos de investigação experimental. Finalmente, a partir de uma avaliação da potencialidade do laboratório, foi iniciada em 1994 uma terceira linha de pesquisa dedicada ao desenvolvimento e aplicação de métodos de avaliação do sistema visual humano os quais usam tanto procedimentos psicofísicos como eletrofisiológicos não invasivos de eletrorretinografia e eletroencefalografia de eventos. A partir de 2002, essa linha de pesquisa envolvendo seres humanos começou a ser paulatinamente transferida para o Laboratório de Neurologia Tropical (LNT), criado e coordenado por Luiz Carlos de Lima Silveira no Núcleo de Medicina Tropical da UFPA. Esse laboratório, inserido na área médica, integra conhecimentos próprios de psicologia experimental, fisiologia, biofísica e ciência da computação para dedicar-se ao 22 estudo das repercussões visuais de neuropatologias tóxicas, degenerativas, inflamatórias e infecciosas de interesse para a Amazônia, visando o desenvolvimento de tecnologia de ponta para a prevenção, diagnóstico precoce, avaliação terapêutica e prognóstica do comprometimento visual em tais afeccções. Essas investigações visam também o desenvolvimento de ensaios biológicos para a compreensão dos processos anátomo-fisiopatológicos a elas subjacentes, que permitam testar em fase pré-clínica novos procedimentos com potencial terapêutico, como o uso de antioxidantes ou bloqueadores de receptores da membrana plasmática neuronal. Os métodos utilizados para a realização desses estudos são diversos, e entre eles, destacam-se: a psicofísica visual, a eletrorretinografia e eletroencefalografia de eventos, análises anatômicas, histológicas e toxicológicas, estando em projeto a introdução de eletrorretinografia multifocal e tomografia de coerência óptica retiniana. Ambos os laboratórios, o LNEOC e o LNT, mantêm intercâmbios nacionais com outros laboratórios dentro da mesma universidade, a UFPA, assim como em outras universidades do Pará e do Brasil. Também de extrema importância são os intercâmbios internacionais que, além da produção científica, contribuem para a formação aprimorada de recursos humanos para a academia, investigação científica e atividade profissional refinada. O LNEOC e o LNT recebem financiamento de diversas agências de fomento à pesquisa científica nacionais: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP); Fundo de Desenvolvimento Técnico-Científico do Estado do Pará (FUNTEC). Recentemente, ambos os laboratórios passaram a integrar a Rede do Instituto Brasileiro de Neurociências (IBN-Net) juntamente com diversos laboratórios de pesquisa de onze universidades brasileiras, a qual é coordenada por Luiz Carlos de Lima Silveira (UFPA) e vice-coordenada por Diogo Onofre Gomes de Souza (UFRGS). Além disso, através dos programas de colaboração internacional, o LNEOC e o LNT têm recebido financiamento em diferentes momentos de várias agências de outros países: The British Council; 23 The Royal Society; Human Frontier Science Program Organization (HFSPO); Max Planck Gesellschaft (MPG); National Science Foundation (NSF); Deutscher Akademischer Austauschdientst (DAAD). Propriedades temporais das células ganglionares retinianas M e P do macaco-prego (Cebus apella). As células foram registradas no LENOC, utilizando-se microeletródios extracelulares inseridos na camada de células ganglionares da retina. A célula M pertencia a uma fêmea dicromata com cones dotados de fotopigmentos com picos de absorção em 440 nm and 563 nm, enquanto a célula P pertencia a um macho dicromata com cones tendo fotopigmentos com pico de absorção em 440 nm and 535 nm. As células foram estimuladas com dois LEDs com picos de emissão em 554 nm and 636 nm, os quais foram modulados em fase para gerar pulsos quadrados de 400 ms com diferentes contrastes de Weber. Estimulação Maxwelliana. As respostas são de uma célula M-on e uma célula P-off cell e são apresentadas como perstimulus time histograms (PSTH) (tempo total de registro = 6 s; duração da varredura = 800 ms; intervalo de classe = 4 ms; barra vertical = 100 impulsos / s). A célula M-on é fásica e mais sensível ao contraste, enquanto a célula P-off é tônica e menos sensível ao contraste. O índice tônico / fásico (TPI) (Purpura et al., 1990) é indicado para cada resposta celular. A diferença fásicotônica nas respostas das células M e P foi uma das primeiras a serem bem caracterizadas utilizando-se registro retiniano extracelular de células ganglionares de primatas (Gouras, 1968). Referência: Silveira et al. (2004). Um número grande de docentes-pesquisadores da UFPA tem participado dos trabalhos desenvolvidos no LNEOC e no LNT ao longo dos anos, dentre os quais: José Luiz Martins 24 do Nascimento, Manoel da Silva Filho, Maria da Conceição Nascimento Pinheiro e Silene Maria Araújo de Lima. Entre os vários colaboradores nacionais e internacionais: Barbara LeVerne Finlay (Cornell University), Barry Buchanan Lee (Max-Planck-Institut für biophysikalische Chemie; State University of New York), Dora Selma Fix Ventura (USP), Jan Kremers (Eberhard-Karls-Universität Tübingen; Universität Erlangen-Nürnberg) e Victor Hugh Perry (University of Oxford; University of Southampton). Referências Costa, L. F., Bonci, D. M. O., Saito, C. A., Rocha, F. A. F., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2007). Voronoi analysis uncover relationship between mosaics of normally placed and displaced amacrine cells in the thraira retina. Neuroinformatics, 5, 59-78. Costa, M. F., Perazzolo, F., Murakoshi, M., Silveira, L. C. L, & Ventura, D. F. (2006). Absence of binocular summation, eye dominance and learning effects in color discrimination. Visual Neuroscience, 23, 461-469. De-Sá, A. L., Herculano, A. M., Pinheiro, M. C. N., Silveira, L. C. L. doNascimento, J. L. M., & Crespo-López, M. E. (2006). Exposição humana ao mercúrio na região oeste do estado do Pará. Revista Paraense de Medicina, 20, 19-25. Elston, G. N., Elston, A., Aurélio-Freire, M., Leal, W. G., Dias, I. A., PereiraJr, A., Silveira, L. C. L., & Picanço-Diniz, C. W. (2006). Specialization of pyramidal cell structure in the visual areas V1, V2 and V3 of the South American rodent, Dasyprocta primnolopha. Brain Research, 1106, 99-110. Feitosa-Santana, C., Oiwa, N. N., Costa, M. F., Tiedemann, K. B., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2006). Espaço de cores. Psicologia USP, 17, 35-62. Gomes, B. D., Souza, G. S., Rodrigues, A. R., Saito, C. A., da-Silva-Filho, M., & Silveira, L. C. L. (2006). Estimativa da sensibilidade ao contraste 25 espacial de luminância e discriminação de cores por meio do potencial provocado visual transiente. Psicologia USP, 17, 63-86. Gomes, B. D., Souza, G. S., Rodrigues, A. R., Saito, C. A., Silveira, L. C. L., da-Silva-Filho, M. (2006). Normal and dichromatic color discrimination measured with transient visual evoked potential. Visual Neuroscience, 23, 617-627. Kozyrev, V., Silveira, L. C. L., & Kremers, J. (2007). Linking lateral interactions in flicker perception to LGN cell responses. Journal of Physiology, 581, 1083-1100. Pinheiro, M. C. N., Oikawa, T., Vieira, J. L. F., Gomes, M. S. V., Guimarães, G. A., Crespo López, M. E., Müller, R. C. S., Amoras, W. W., Ribeiro, D. R. G., Rodrigues, A. R., Côrtes, M. I. T., & Silveira, L. C. L. (2006). Comparative study of human exposure to mercury in riverside communities of Amazon. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 39(3), 411-414. Pinheiro, M. C. N, Crespo López, M. E., Vieira, J. L. F., Oikawa, T., Guimarães, G. A., da Costa, C. A., Amoras, W. W., Ribeiro, D. R. G., Herculano, A. M., do Nascimento, J. L. M., & Silveira, L. C. L. (2007). Mercury pollution and childhood in Amazon riverside villages. Environment International, 33, 56-61. Rodrigues, A. R., Botelho-de-Souza, C. R., Braga, A. M., Rodrigues, P. S. S., Silveira, A. T., Damin, E. T. B., Côrtes, M. I. T., Castro, A. J. O., Mello, G. A., Vieira, J. L. F., Pinheiro, M. C. N., Ventura, D. F., & Silveira, L. C. L. (2007). Mercury toxicity: contrast sensitivity and color discrimination of subjects exposed to mercury. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 40, 415-424. Silveira, L.C.L., Saito, C.A., Lee, B.B., Kremers, J., da Silva Filho, M., Kilavik, B.E., Yamada, E.S., Perry, V.H. (2004) Morphology and physiology of primate M and P cells. Progress in Brain Research, v. 144, p. 21-46. 26 Laboratório da Visão Dora Fix Ventura 1 O Laboratório de Psicofisiologia Sensorial foi fundado em 1972 no Departamento de Psicologia Experimental após o retorno de Dora Fix Ventura de seu Ph.D. na Columbia University (Nova York, EUA) e a obtenção do primeiro auxílio à pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Utilizando modelos invertebrados para o estudo de mecanismos visuais, dedicou-se inicialmente a estudar fototaxia negativa em camarão de rio, migração de pigmentos na retina, e a aprendizagem de uma discriminação visual nessa espécie. Datam também desta época os estudos sobre os efeitos farmacológicos no processamento sensorial de vertebrados. Em seguida o laboratório iniciou linha de trabalhos com eletrorretinograma do olho composto de inseto o que proporcionou um relato em grande detalhe do fenômeno ainda pouco conhecido de facilitação retiniana, e a formulação de conclusões que foram confirmadas dez anos mais tarde em trabalhos bioquímicos de transdução visual. De 1983 a 1993 o Laboratório manteve intercâmbio com o grupo de Neurobiologia da Universidade Livre de Berlim para o estudo comparativo de visão de cores e dos mecanismos neurais de processamento de cor em abelhas e vespas tropicais, sem ferrão. Dentro dessa linha passou a trabalhar com métodos neuroanatômicos de microscopia óptica e eletrônica para a marcação de neurônios 1 Docente do Departamento de Psicologia do Instituto de Psicologia – USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/ Email: [email protected] 27 fisiologicamente identificados do sistema visual. Descobriu a existência de ilusão de formas em abelhas, resultado que sugere o caráter básico e geral desta capacidade, provavelmente fundamental para a visão de formas. A partir de 1991 estendeu seu trabalho para o sistema visual de vertebrados: realizando estudos comportamentais de visão de cores no beija-flor, no qual constatou pela primeira vez a capacidade de discriminar cor no ultravioleta, e estudos eletrofisiológicos registrando a atividade de diversos tipos neuronais em retinas de tartarugas e de peixes, também com o objetivo de estudar visão no ultravioleta, tendo descoberto várias evidências neurofisiológicas para o processamento cromático no ultravioleta e feito a primeira descrição fisiológica da sua função de sensibilidade espectral. A partir da década de 1990 foi fundado um novo laboratório, dedicado à avaliação de funções visuais humanas, na área de Psicofísica Clínica. Esta linha de trabalhos teve início com um estudo populacional normativo sobre desenvolvimento da acuidade visual em crianças, realizado entre 1990 e 1995. Em 1998 foi inaugurado em suas atuais instalações o Setor de Eletrofisiologia e Psicofísica Visual Clínica no Instituto de Psicologia da USP, para pesquisa e atendimento de pacientes com patologias oftalmológicas ou neurológicas utilizando eletrorretinografia, potencial visual evocado e exames comportamentais de várias funções visuais, principalmente a visão de cores. O Laboratório da Visão, que reúne o Laboratório de Psicofisiologia Sensorial e o Laboratório de Eletrofisiologia e Psicofísica Visual Clínica, está desenvolvendo o projeto intitulado Perdas sensoriais causadas pela intoxicação mercurial: estudos psicofísicos e neurofisiológicos – em pacientes e em modelos animais, focalizando ambas as áreas de pesquisa: a básica e a clínica. A visão é uma das mais importantes funções para a vida, permitindo o contato com o meio externo para a interação com co-específicos, busca de alimentos, comportamento reprodutivo, de defesa, de ataque, etc. Perdas visuais afetam a capacidade de executar esses comportamentos e podem revelar outras perdas funcionais como memória, atenção, entre outras. Essas perdas podem ser causadas por fatores genéticos (retinose pigmentar, doença de Stargardt, degeneração de cones), por diferentes patologias crônico-degenerativas (diabetes, glaucoma, hipertensão), pelo efeito 28 tóxico de drogas (cloroquina, vigabatrina, Viagra, e muitas outras), ou ainda por contaminantes ambientais (mercúrio, zinco, agrotóxicos, solventes, etc.). Para a avaliação visual existem novas técnicas psicofísicas e novos métodos eletrofisiológicos não-invasivos, possibilitados pelos avanços computacionais, auxiliando a apresentação de estímulos visuais, programação experimental, e análise de dados on-line. Para entender os mecanismos responsáveis pelas perdas, ainda pouco conhecidos, são necessários estudos em modelos animais nos quais é possível acesso direto à retina ou aos centros superiores. O objetivo principal desse projeto é investigar as repercussões causadas por patologias neurodegenerativas no sistema visual humano com métodos não invasivos, comportamentais e eletrofisiológicos. Estão incluídos no projeto grupos com diferentes patologias, dentre os quais: pacientes intoxicados por vapor de mercúrio, por tolueno, usuários de cloroquina, diabéticos tipo 2, pacientes com doença de Parkinson, com esclerose múltipla, com distrofia muscular de Duchenne, assim como voluntários normais. São ainda estudadas alterações neuropsicológicas relacionadas às patologias. Em modelos animais (peixes, tartarugas e roedores), é investigada a intoxicação por mercúrio por técnicas eletrofisiológicas e morfológicas já utilizadas há muitos anos nesse laboratório para o estudo de funções visuais básicas. Estas atividades de pesquisa estão sendo realizadas em colaboração com o Laboratório de Neurofisiologia – dirigido pelo Prof. Dr. Luiz Carlos de Lima Silveira – da UFPA, através de apoio de agências de fomento como a CAPES, CNPq, FAPESP e FINEP dentro de programas de intercâmbio envolvendo colaboração científica e pós-graduação. A colaboração teve início em 2001 com os projetos “Neuropatologias Regionais da Amazônia: Estudo Neurofisiológico das Repercussões Visuais da Intoxicação Mercurial” coordenado por Silveira (RENOR/CAPES), e “Neuropatologias Regionais da Amazônia: Estudo Psicofísico e Neurofisiológico das Repercussões Visuais da Intoxicação Mercurial” coordenado por Ventura (PROCAD/CAPES). Em 2003 foi aprovado o Projeto Temático da FAPESP 29 “Perdas Sensoriais Causadas Pela Intoxicação Mercurial: Estudos Psicofísicos e Neurofisiológicos em Pacientes e em Modelos Animais”, coordenado por Ventura. Prossegue a interação com a aprovação, em 2006, dos projetos “Consolidação de Grupo de Pesquisa e Pós-graduação em Neurociências e Doenças Tropicais” (CASADINHO) por Silveira (coordenador) e Ventura (vice-coordenadora); e do auxílio FINEP “Rede Instituto Brasileiro de Neurociência (IBN-Net)”, que reúne 11 universidades brasileiras. Ao longo dos anos, o projeto agregou novos colaboradores: o Laboratório Bio-Ensaios do Departamento de Biologia Celular dirigido pelo Prof. Dr. Ciro Ribeiro da UFPR, e o Laboratório de Análise do Comportamento do Departamento de Psicologia Faculdade de Ciências da UNESP Bauru, então dirigido pelo Prof. Dr. Amauri Gouveia-Jr que, atualmente, passou a ser docente da UFPA e está transferindo suas atividades o laboratório em construção nessa universidade (UFPA). Após obter seu doutorado no Laboratório da Visão, em 2005, a Profa. Dra. Sonia Regina Grötzner da UFPR orientou seu recém fundado laboratório na direção de uma intensa colaboração com nosso grupo, prosseguindo na linha do doutorado, em estudos de morfologia da retina de peixes e répteis. Referências Aguiar, M. J. L., Ventura, D. F., Silva-Filho, M., Souza, J. M., Maciel, R., & Lee, B. B. (2006). Response of carp (Cyprinus carpio) horizontal cells to heterochromatic. Visual Neuroscience, 23, 437-440. Bonci, D. M. O., Lima , S. M. A., Grotzner, S. R., Ribeiro, C. A. O., Hamassaki, D. E., & Ventura , D. F. (2006). Losses of PV-IR Amacrine and PKC-IR bipolar cells caused by methylmercury chloride intoxication in the retina of the tropical fish Hoplias malabaricus. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 39(3), 405-410. Costa, L. F., Bonci, D. M. O., Saito, C. A., Rocha, F. A. F., Silveira L. C. L., & Ventura, D. F. (2007). Voronoi analysis uncovers relationship between 30 mosaics of normally placed and displaced amacrine cells in the thraira retina. Neuroinformatics, 5(1), 59-78. Costa, M. F., Oliveira, A. G. F., Feitosa-Santana, C., Zatz, M., & Ventura, D. F. (2007). Red-Green Color Vision Impairment in Duchenne Muscular Dystrophy. The American Journal of Human Genetics, 80, 1064-1075. Costa, M. F., Perazollo, F., Murakoshi, M., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2006). The effects of binocular summation, eye-tested order and sensory eye dominance in color discrimination, Visual Neuroscience, 23, 461-469. Feitosa-Santana, C. F., Costa, M. F., Lago, M., & Ventura, D. F. (2007). Longterm loss of color vision after exposure to mercury vapor. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 40(3), 409-414. Feitosa-Santana, C., Oiwa, N. N., Paramei, G., Bimler, D., Costa, M. F., Lago, M., Nishi, M., & Ventura, D. F. (2006). Color space distortions in patients with type 2 diabetes mellitus. Visual Neuroscience, 23, 663-668. Rodrigues, A. R., Souza, C. R. B., Braga, A. M., Rodrigues, P. S., Silveira, A. T., Damin, E. T., Côrtes, M. I., Castro, A. J., Mello, G. A., Vieira, J. L., Pinheiro, M. C., Ventura, D. F., & Silveira, L. C. L. (2007). Mercury toxicity in the Amazon: Contrast sensitivity and color discrimination of subjects exposed to mercury. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 40(3), 415-424. Sadun, A. A., Salomão, S. R., Berezowsky, A., Sadun, F., Denegri, A. M., Quiros, P., Ventura, D. F., Carelli, V., Belfort Jr., R., & Sutter, E. (2006). Subclinical cariers and conversions in Leber´s Hereditary Optic Neuropathy (LHON): A prospective psychophysical study. Transactions of the American Ophthalmological Society Annual Meeting, 104. Tanan, C. L., Ventura , D. F., Souza, J. M., Mela, M., & Ribeiro, C. A. O. (2006). Electrophysiological study of the effects of mercury intoxication in the retina of the thraira (Hoplias malabaricus). Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 39(7), 987-995. 31 Ventura, D. F., Gualtieri, M., Oliveira, A. G. F., Costa, M. F., Quiros, P., Sadun, F., de Negri, A. M., Salomão, S. R., Berezovsky, A., Sherman, J., Sadun, A. A, & Carelli V. (2007). Male prevalence of acquired color vision defects in asymptomatic carriers of Leber's hereditary optic neuropathy. Investigative Ophthalmology & Visual Science, 48(5), 23622370. Zachi, E. C., Ventura, D. F., Faria, M. A. M., & Taub, A. (2007). Neuropsychological dysfunction related to earlier occupational exposure to mercury vapor. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 40(3), 425-433. 32 Simpósio Visão Humana – Fundamentos Básicos; Eletrofisiologia, Psicofísica e Interfaces Clínico-Científicas 33 A idéia de realizar um simpósio sobre os fundamentos básicos da visão teve início na colaboração entre o nosso laboratório – Laboratório da Visão do Instituto de Psicologia (IP/USP), e o Laboratório de Fotometria, dirigido pelo Engenheiro Luiz Carlos Lopes do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE/USP). Em uma de nossas primeiras colaborações, o Engenheiro José Gil Oliveira, que tem prestado um grande auxílio ao nosso laboratório – na área de calibração de monitores de vídeo e de outros equipamentos - expressou seu interesse, em realizar conosco, um simpósio no qual ele e seus colegas do IEE pudessem ter a oportunidade de aprender mais a respeito da visão humana assim como ter contato com as linhas de pesquisas desenvolvidas por nosso laboratório. 34 Começamos, então, a organizar o programa do simpósio que recebeu, por um período breve, o nome: Simpósio Visão Humana – Fundamentos Básicos. Poucos dias depois, pensamos em estender a proposta para os alunos de pós-graduação do Programa de Neurociências e Comportamento e aumentamos o conteúdo do programa com a participação de diversos pesquisadores de outras unidades da USP (EACH, FM e ICB), da UNIFESP e da UFPA. Dessa forma, apresentamos o resultado do que foi exposto e discutido no Simpósio Visão Humana – Fundamentos Básicos; Eletrofisiologia, Psicofísica e Interfaces ClínicoCientíficas, no dia 13 de novembro de 2006, no Auditório do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE/USP). Claudia Feitosa-Santana Mestre em Psicologia Experimental - USP e Dora Fix Ventura Professora Titular do Instituto de Psicologia - USP 35 Os Três Caminhos da Luz Claudia Feitosa-Santana 1 Luiz Menna-Barreto 2 O tempo entra pelos olhos Julio Cortázar A luz, uma vez que atinge a retina, se transforma em informação nervosa através do processo de transdução, que ocorre nas células fotorreceptoras ligadas à rede de neurônios que compõem a retina. Dessa forma, a informação luminosa, que sai da retina pelo trato óptico, percorrerá três caminhos distintos no sistema nervoso central e, todos, funcionalmente importantes. 1 Pós-graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia – USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 São Paulo SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/claudia.htm e http://www.feitosa-santana.com/ Email: [email protected] 2 Docente da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) - USP. Avenida Arlindo Bettio, 1000 - Ermelino Matarazzo - 03828.000 - São Paulo - SP. www.each.usp.br/menna Email: [email protected] 36 O primeiro caminho e o mais conhecido deles é o caminho da visão propriamente dita. Nesse trajeto, a informação luminosa percorre um longo trajeto pelas diversas áreas do córtex visual que, uma vez chegando às áreas associativas, possibilita a percepção visual. O segundo caminho é o que se dirige ao mesencéfalo, onde a informação luminosa desencadeará reflexos visuoposturais, como a retirada da cabeça da trajetória de uma pedra vindo em nossa direção. No terceiro caminho a luz é a fonte da informação temporal, ela compõe, com suas variações, o ciclo claro/escuro do dia e da noite. Esse ciclo é um “doador do tempo” (zeitgeber), sinal sincronizador que atua sobre o sistema de temporização do organismo. Essa informação é responsável pela organização temporal no que se refere aos ritmos biológicos conhecidos como circadianos, cujo período varia entre 20 e 28h em condições de isolamento (conhecidas como expressão rítmica em “livre-curso”) e que tende a ajustar-se às 24h do dia/noite em condições de vida livre. O padrão rítmico circadiano é encontrado em praticamente todos os seres vivos, tanto os de hábitos diurnos como noturnos. Nesse caminho, a informação não está na luz, mas sim na hora da luz ou na hora de sua ausência, ou seja, em seu padrão temporal. Essa transmissão tem início na ação dos raios luminosos sobre a proteína melanopsina, que se encontra na camada de células ganglionares da retina. As primeiras evidências dessa regulação por melatonina em seres humanos foram apresentadas, recentemente, com o trabalho de Brainard et al. (2001). Passando pelo nervo óptico, a informação luminosa se direciona aos núcleos supraquiasmáticos do hipotálamo, uma das áreas envolvidas na gênese e sincronização da ritmicidade circadiana, onde serão acionados mecanismos que promoverão adiantamentos ou atrasos desses ritmos. Os núcleos supraquiasmáticos recebem, então, a informação do padrão de claro/escuro, integrando-a com mecanismos que regulam as oscilações da temperatura corporal, produção de hormônios, estados de consciência e controles metabólicos, entre outras funções. 37 Praticamente todos os seres vivos mostram algum tipo de oscilação, seja em suas funções orgânicas ou em seu comportamento. Pesquisas mostram que, ao contrário do que se acreditava, essas oscilações não são simples reflexos (na forma de reações aos ciclos ambientais), mas sim a expressão dos sistemas de temporização dos organismos. A área de estudo que se ocupa dos ritmos biológicos, seja no que diz respeito à ritmicidade circadiana, seja na investigação de oscilações em outras freqüências (mais rápidas, as ultradianas ou mais lentas, as infradianas) recebe o nome de Cronobiologia. No Brasil, essa área científica foi introduzida em 1981, pelo “Grupo Multidisciplinar de Desenvolvimento e Ritmos Biológicos” da Universidade de São Paulo. Seres humanos que vivem isolados em cavernas ou em laboratórios, com muito pouca pista dos horários de claro e escuro, tendem a expressar seu ciclo sono-vigília com duração de aproximadamente 25 horas. Isso ocorre porque seu ritmo é orquestrado apenas pelos sistemas de temporização, portanto não sincronizado aos ciclos ambientais como ocorre na vida livre. A avaliação do estado de sincronização de um organismo ao seu ambiente nos permite entender melhor seu estado de saúde, bem como alguns processos patológicos como, por exemplo, os transtornos do ciclo vigília/sono. É importante levar em consideração as importantes diferenças individuais na expressão dos ritmos biológicos, como é o caso das tendências humanas à matutinidade ou vespertinidade. Referências Brainard, G. C., Hanifin, J. P., Greeson, J. M., Byren, B., Glickman, G., Gerner, E. et al. (2001). Action spectrum for melatonin regulation in humans: Evidence for a novel circadian photoreceptor. Journal of Neuroscience, 21, 6405-6412. Kay, S. A. (1997). Circadian rhythms: As time passes: The first mammalian clock gene. Science, 276(5315), 1093. 38 Louzada, F. e Menna-Barreto, L. (2007). O sono na sala de aula - Tempo escolar e tempo biológico. Coleção Ciência no bolso. Rio de Janeiro: Vieira&Lent. Marques, N., & Menna-Barreto, L. (2003). Cronobiologia: princípios e aplicações (3a ed.). São Paulo: Edusp. Menna-Barreto, L. (1999). Afinal, porque dormimos?. Ciência Hoje, 25(148), 4. Menna-Barreto, L. (2005a). Relógio biológico – prazo de validade esgotado? Neurociências, 2(4), 190-193. Menna-Barreto, L. (2005b). Vygotsky - inspirador do ensino de neurociências para psicólogos. Viver Mente & Cérebro (Coleção Memória da Psicologia), 2(Vygotsky), 84-88. Menna-Barreto, L., & Marques, N. (2002, outubro). O tempo dentro da vida, além da vida dentro do tempo. Ciência e Cultura, 44-46. 39 Visão, O Primeiro Sentido Paulo Schor 1 A oftalmologia mantém e abre relações com as ciências básicas e, principalmente, com as neurociências. Nos dias atuais, o médico opera instrumentos bastante complexos de diagnóstico e tratamento, e do mesmo espera-se o entendimento dos processos que ocorrem durante seu uso; os tratamentos são mais rápidos, precisos, seguros e, principalmente, muito mais complexos. A oftalmologia é uma área com estreita interface tecnológica e, por essa característica, pode-se constatar a evolução em seus diagnósticos e tratamentos clínicos. Hoje em dia, ferramentas automatizadas de analise óptica permitem a determinação quantitativa de um aspecto importante da percepção visual, a acuidade visual central. Determinam-se limiares de separação de formas. Inicialmente em alto contraste, e depois em baixo contraste. Constroem-se curvas de transferência de contraste (função de transferência modular ou MTF), simulam-se funções de espalhamento de ponto (PSF), mapeiam-se as superfícies ópticas (córnea e cristalino), e determina-se o poder de convergência pontual em cada espaço da pupila de entrada do nosso sistema visual com o auxílio de aparelhos conhecidos como aberrômetros. 1 Professor do Departamento de Oftalmologia da Escola Paulista de Medicina - UNIFESP. Avenida Indianópolis, 2272 - Planalto Paulista - 04063.003 - São Paulo - SP. http://55812020.net/paulo.htm Email: [email protected] 40 Também progredimos na alteração de características refrativas do sistema visual, alterando a forma do nosso principal dioptro, a córnea, por meio de lasers (excimer laser) ou pela introdução de lentes que modificam o índice de refração do sistema como um todo (lentes intra-oculares). Hoje em dia temos métodos diagnósticos com precisão de até 5 micra e dispomos de lasers guiados por dados individuais que permitem “esculpir” superfícies irregulares com a mesma precisão. O entendimento progressivo sobre a cicatrização corneana e a inflamação intra-ocular permite que se tratem as porções refrativas do sistema visual quase como um material inerte ou, pelo menos, como um material previsível. Sabemos que existe uma regressão refracional frente a tratamentos de hipermetropia, e temos uma idéia de quanto essa regressão representa. Conseguimos, portanto, programar uma cirurgia refrativa hipermetrópica para que em alguns meses a refração final seja previsível. Temos domínio sobre drogas que modulam os processos inflamatórios, os anti-inflamatórios, os hormonais e os não hormonais. Com esses minimizamos efeitos adversos e buscamos a precisão física que a tecnologia nos oferece. Tantos avanços e estamos somente no início do entendimento da visão. Poderíamos dizer que dominamos parcialmente (talvez adequadamente) o trajeto que a luz percorre até atingir a retina. A física envolvida no processo. A primeira barreira foi ultrapassada. A segunda barreira poderia se traduzir em “processo foto-químico”. A transformação da luz em mediadores químicos. Quando a luz atinge as células foto-sensíveis da nossa retina (fotorreceptores), é absorvida por um composto denominado rodopsina. Esta substância, por sua vez, inicia uma série de eventos químicos que, por fim, resultam na transmissão de um impulso nervoso ao cérebro. Quando a rodopsina absorve um fóton de luz, o cromóforo do 11-cis-retinal sofre isomerização para a forma todo-trans. O primeiro foto-produto é um intermediário chamado batorodopsina, um composto que possui cerca de 150kJ.mol-1 de energia a mais que a rodopsina. A batorodopsina, passando por uma série de etapas, transforma-se na metarodopsina II (também all-trans). A alta energia da combinação proteína-cromóforo todo-trans provoca uma alteração em sua geometria. Como resultado, 41 uma miríade de reações enzimáticas culmina na transmissão de um impulso neural ao cérebro. George Wald recebeu o Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina, em 1967, por tal caracterização. Passamos essa segunda barreira, que nos oferece os meios para que a visão seja iniciada. Ainda temos que entender o caminho que a energia percorre e, atualmente, métodos como a ressonância magnética funcional, auxiliam o mapeamento de locais do sistema nervoso responsáveis por essa ou aquela deficiência visual. Entretanto, mais intrigante do que os caminhos são as conexões e funções que células e sinapses realizam, de modo a formar uma percepção. A percepção da visão. Os estudos sobre o processamento visual prometem revolucionar o modo como entendemos o nosso relacionamento com o meio que nos cerca. Referências Carvalho, L. A. V., Stefani, M., Romao, A. C., Carvalho, L., Caiado, J. C., Tonissi, S., Schor, P., & Chamon, W. (2002). Videokeratoscopes for dioptric power measurement during surgery. Journal of Cataract and Refractive Surgery, 28, 2006-2016. Guirao, A., & Williams, D. R. (2003). A method to predict refractive errors from wave aberration data. Optometry Vision Science, 80, 36-42. Howland, H., & Howland, B. (1977). A subjective method for the measurement of monochromatic aberrations of the human eye. Journal of the Optometric Society of America, 67, 1508-1518. Jankov, M., Mrochen, M., Schor, P., Chamon, W., & Seiler, T. (2002a). Frentes de ondas (Wavefronts): e limites da visão humana - Parte 1 Fundamentos. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia, 65, 679-684. 42 Jankov, M., Mrochen, M., Schor, P., Chamon, W., & Seiler, T. (2002b). Frentes de ondas (Wavefronts): e limites da visão humana - Parte 2 Aplicações. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia, 65, 685-690. Miller, D., & Schor, P. (1997). Physiological optics. In T. Duane & E. Jaeger (Eds), Clinical ophthalmology (pp. 36-49). Philadelphia: Lippincott. Nunes, L. M. B. Triagem de pacientes candidatos à cirurgia refrativa baseada em questionário de qualidade de vida. Departamento de Oftalmologia, UNIFESP, São Paulo. Tese de Doutorado em andamento. Schor, P., & Carvalho, L. A. V. (2000). Introdução e histórico da topografia de córnea. In P. Polisuk (Ed), Topografia de córnea (pp. 1-6). Rio de Janeiro: Cultura Médica. 43 Visão Binocular Marcelo Fernandes da Costa 1 Dora Fix Ventura 1 A visão binocular nos permite uma série de vantagens sobre a visão monocular. Dentre elas está a capacidade de perceber o mundo em tridimensionalidade e de realizar julgamentos de distâncias com grande precisão. Estas informações em três dimensões (3D) se originam nas imagens em duas dimensões que o objeto ou a cena visual projeta em cada uma das retinas dos 2 olhos. A distância que existe entre os olhos faz com que cada olho receba imagens com ângulos e distâncias entre o objeto e o olho ligeiramente dispares, e esta disparidade é codificada por áreas visuais específicas do sistema nervoso central como profundidade ou a tridimensionalidade (Cumming & DeAngelis, 2001; King & Zhou, 2002; Oguchi, 1998). O termo utilizado para caracterizar o julgamento de profundidade proveniente desta disparidade binocular é estereopsia e seu refinamento é tal que podemos perceber disparidades da ordem de 15 a 40 segundos de arco de ângulo visual (King & Zhou, 2002; Wong et al., 2002). 1 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia – USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/ Emails: [email protected] e [email protected] 44 No entanto, existe um limite para esta disparidade proporcionar o julgamento desta distância. As diferenças entre as imagens devem estar presentes dentro de um limite imaginário do espaço chamado de área de Panum. Esta área envolve o objeto em todas as direções (Cisarik & Harwerth, 2005). Assim, estímulos que são ligeiramente díspares mas que se localizam dentro desta área podem ser fundidos em um único estímulo e as diferenças integradas pelo nosso cérebro em uma unidade tridimensional. A partir desta integração as disparidades são então vistas como distâncias e profundidade (Parker & Cumming, 2001). Assim como muitas das outras funções visuais, a estereopsia se degrada com a idade, principalmente após os 60 anos de idade, quando os limiares de visão estereoscópica caem drasticamente (Zaroff et al., 2003), ou seja, nossa capacidade de julgar distâncias e de perceber profundidade fica mais grosseira. Com a visão monocular, nós também somos capazes de estimar distâncias entre objetos e até de julgar profundidade, porém, com muito menos precisão e confiabilidade do que em situação de visão binocular. Quando estamos com apenas um olho aberto, nosso julgamento se baseia em pistas (chamadas de pistas monoculares), que inclui o conhecimento do tamanho relativo dos objetos, perspectivas lineares, gradiente de textura, posição de sombras, claridade e elevação, a velocidade e a direção de movimentos do objeto visual (Day, 1995). Uma pessoa com ausência de visão binocular pode não apresentar dificuldades para subir degraus, enfiar a chave no buraco da fechadura, por água dentro do copo mas, pode apresentar grandes dificuldades para atividades que exijam maior precisão nos julgamentos de profundidade como, por exemplo, colocar uma linha no buraco da agulha ou em situações de trabalho como olhar em um microscópio (imaginem a importância do julgamento preciso de profundidade para um médico neurocirurgião que está operando o cérebro!). Outras informações a respeito das distâncias ocorrem por mecanismos fisiológicos como a acomodação e os movimentos oculares não conjugados (convergência e divergência) 45 uma vez que eles ocorrem quando objetos se aproximam ou se afastam de nós (Hainline & Riddell, 1995; King & Zhou, 2002). Referências Cisarik, P. M., & Harwerth, R. S. (2005). Stereoscopic depth magnitude estimation: Effects of stimulus spatial frequency and eccentricity. Behavioural Brain Research, 160, 88-98. Cumming, B. G., & DeAngelis, G. C. (2001). The physiology of stereopsis. Annual Review of Neuroscience, 24, 203-238. Day, S. (1995). Vision development in the monocular individual: Implications for the mechanisms of normal binocular vision development and the treatment of infantile esotropia. Trans. Am. Ophthalmol. Soc., 93, 523-581. Hainline, L., & Riddell, P. M. (1995). Binocular alignment and vergence in early infancy. Vision Research, 35, 3229-3236. King, W. M., & Zhou, W. (2002). Neural basis of disjunctive eye movements. Neurobiology of Eye Movements: From Molecules to Behavior, 956, 273-283. Oguchi, Y. (1998). [Visual information processing and the mechanism of vision. Clinical application]. Nippon Ganka Gakkai Zasshi, 102, 850-875. Parker, A. J., & Cumming, B. G. (2001). Cortical mechanisms of binocular stereoscopic vision. Vision: From Neurons to Cognition, 134, 205-216. Wong, B. P. H., Woods, R. L., & Peli, E. (2002). Stereoacuity at distance and near. Optometry and Vision Science, 79, 771-778. 46 Zaroff, C. M., Knutelska, M., & Frumkes, T. E. (2003). Variation in stereoacuity: Normative description, fixation disparity, and the roles of aging and gender. Investigative Ophthalmology & Vision Science, 44, 891900. 47 Visão de Contrastes Marcos Lago 1 Claudia Feitosa-Santana 2 Cézar Akiyoshi Saito 3 Luiz Carlos de Lima Silveira 4 Dora Fix Ventura 5 A função fundamental do sistema visual é a medida do contraste luminoso, que lhe permite realizar sua principal tarefa, a localização de objetos. Essa medida é feita tanto na dimensão espacial quanto temporal e, além disso, o sistema visual usa duas estratégias para efetuá-la as quais são diferentes na sua essência, no seu significado físico e na sua implementação neural, mas servem 1 Colaborador do Laboratório da Visão do Instituto de Psicologia - USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.marcoslago.com.br Email: [email protected] 2 Pós-Graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia USP. 3 Colaborador do Departamento de Fisiologia do Centro de Ciências Biológicas - UFPA. 4 Docente do Departamento de Fisiologia do Centro de Ciências Biológicas e, Diretor Geral do Núcleo de Medicina Tropical - UFPA. 5 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia - USP. 48 ao mesmo objetivo da localização de objetos. Uma dessas estratégias é a medida da diferença de luminância entre dois pontos vizinhos ou dois momentos sucessivos, ou seja, a medida do chamado contraste de luminância espacial (ou simultâneo) e do contraste de luminância temporal (ou sucessivo). Outra estratégia é a medida da diferença de refletância espectral entre dois pontos vizinhos ou dois momentos sucessivos, ou seja, a medida do chamado contraste de cor espacial ou temporal. Os diferentes aspectos da visão espacial humana nas três dimensões cromáticas – branco-preta ou de luminância, verde-vermelha e azul-amarela – têm sido muito mais explorados nos aspectos clínicos do que as características temporais. Assim, alguns testes extremamente difundidos da função visual humana, com a medida da acuidade visual, dizem respeito à avaliação da visão espacial, ou seja, da sensibilidade ao contraste espacial. A sensibilidade ao contraste espacial corresponde à habilidade de perceber diferenças entre um objeto e o meio circunvizinho, sendo uma medida de quanto contraste uma pessoa requer para essa tarefa. Sua importância clínica deve-se ao fato de a vida diária de uma pessoa compreender uma série de atividades que exigem boa sensibilidade ao contraste. Os indivíduos com essa capacidade visual afetada enfrentam grandes dificuldades para a leitura de livros, a observação de placas de rua e outras sinalizações, a apreciação de pinturas e outras obras de arte, assistir televisão, cinema e teatro, e a realização de atividades visuomotoras por excelência como pintar, tecer, escrever, dirigir veículos entre outras (Owsley, 2003). Essas tarefas estão todas relacionadas à resolução de detalhes (acuidade visual) e à percepção de bordas, padrões, formas e texturas (Schwartz, 2004). O processamento neuronal responsável pela visão de contraste de luminância envolve a presença de inibição lateral, com produção de picos de sinais de saída perto das regiões onde a intensidade do sinal de entrada muda rapidamente. A amplitude desses picos depende da freqüência espacial do estímulo; quanto mais gradual a mudança de intensidade, menor o sinal de saída. Os picos positivos são conseqüências do fato dos neurônios que recebem informação dos receptores situados no lado mais claro da borda do estímulo receberem relativamente menos inibição por estarem 49 próximos a uma área pouco iluminada. Simultaneamente, aqueles neurônios correspondentes ao lado escuro da borda recebem inibição maior vinda da área mais iluminada e geram picos negativos no sinal de saída. Quando a transição entre as áreas clara e escura é gradual, os picos são reduzidos em amplitude devido às diferenças entre receptores vizinhos serem pequenas, tanto em relação à excitação como à inibição (Cornsweet, 1970; Schwartz, 2004). A visão com baixa sensibilidade ao contraste é geralmente ilustrada com um par de fotografias em branco-e-preto, uma contendo a gama completa de contrastes percebida pela visão humana (superior à esquerda) e outra uma versão menos contrastada (superior à direita). No entanto, a visão humana normal é também tricromática (inferior à esquerda) e na maioria das situações em que sua sensibilidade ao contraste é afetada, a visão continua retendo sua tricromacia (inferior à direita). Fotografia: Luiz Carlos de Lima Silveira, Prefeitura de Kagoshima (2004). 50 O estudo da visão espacial pode ser feito tanto no domínio do espaço quanto no domínio das freqüências espaciais. Para sistemas lineares, esses domínios são transformações Fourier um do outro, de tal forma que as medidas realizadas num domínio ou noutro são entre si equivalentes (Bracewell, 1986; Silveira & de Mello Jr., 1998). Essas medidas são feitas a partir das respostas do sistema visual a estímulos especiais, os quais têm como propriedade fundamental o fato de ocuparem regiões restritas no domínio correspondente; essas respostas caracterizam o desempenho do sistema visual no domínio estudado. Assim, no domínio do espaço são usados estímulos luminosos sob a forma de pontos, linhas, bordas ou barras. Um parâmetro importante para especificar esses estímulos é o seu espalhamento espacial, uma vez que na prática não é possível gerar pontos infinitésimos e assim por diante. No domínio das freqüências espaciais são usados padrões periódicos extensos no espaço, mas com freqüência espacial definida (em geral especificada em ciclos por grau de ângulo visual), os quais podem ser unidimensionais (e.g.: faixas claras e escuras) ou bidimensionais (e.g.: quadrados claros e escuros) e têm perfil senoidal. A descrição de um estímulo periódico espacial senoidal requer a especificação de determinados parâmetros como freqüência, fase e orientação. Como não é possível gerar um estímulo espacial infinitamente extenso, nalguns casos é importante especificar o número de ciclos nele presentes. Seja no domínio do espaço ou nas freqüências espaciais, o parâmetro mais importante para definir o estímulo utilizado é o contraste. Contraste espacial é a diferença entre a luminância duas regiões do espaço ou uma forma de especificar amplitude de uma periodicidade. Matematicamente pode ser definido como a diferença entre a maior e a menor luminância dividida pela luminância menor, chamado contraste de Weber, ou a relação entre a diferença e a soma das luminâncias, chamado contraste de Michelson. Esta definição é tipicamente usada para determinar a qualidade do sinal relativamente ao nível de ruído. No contexto da visão, tal ruído poderia ser causado por espalhamento da luz introduzido no caminho da visão por um elemento translúcido, obscurecendo parcialmente a cena (Campos Filho, 2005). 51 Para discorrer sobre o contraste cromático precisamos especificar as cores, que no sistema visual humano tem que ser feito em três dimensões. Uma abordagem é o uso de três cores primárias e exprimir as cores como combinações dessas três primárias. Outra é exprimi-las com combinações de brilho, saturação e matiz. Brilho é o nível percebido de luz emitida em relação a uma região que parece branca. Saturação é a diferença percebida entre a cor e o branco, apesar do brilho. Matiz é a aparência característica de uma luz monocromática de comprimento de onda único. O matiz e a saturação percebidos dependem dos estímulos adjacentes. No contraste cromático, a aparência de uma luz muda na direção oposta da luz indutiva. Por exemplo, uma faixa que parece branca quando vista sozinha, torna-se esverdeada na vizinhança de uma luz vermelha. A direção da indução cromática, em direção ao contraste, depende das propriedades do estímulo, particularmente da freqüência espacial (Shevell, 2003). Esses fenômenos mostram a complexidade da malha neural que processa contraste e dão uma dimensão do muito que precisa ser estudado para a sua compreensão. Referências Bracewell, R., N. (1986). The Fourier Transform and its Applications. (2nd ed.). New York: McGraw-Hill. Campos Filho, M. L. C. (2005). Sensibilidade ao Contraste de Luminância e Cromático em Pacientes Intoxicados por Vapor de Mercúrio: Evolução em Dois Anos. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo. Canto-Pereira, L. H. M. C., Lago, M., Costa, M. F., Rodrigues, A. R., Saito, C. A., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2005). Visual impairment related to occupational exposure in dentists. Environmental Toxicology and Pharmacology, 19, 517-522. 52 Cornsweet, T. (1970). Visual Perception. Oxford: Academic Press. Owsley, C. (2003). Contrast sensitivity. Ophthalmology Clinics of North America, 16, 171-177. Schwartz, S. H. (2004). Visual Perception: A Clinical Orientation. 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H. M., Tomaz, S., Lago, M., Costa, M. T. V., Costa, M. F., Souza, J. M., Faria, M. A. M., & Silveira, L. C. L. (2005a). Color vision and contrast sensitivity losses of mercury contaminated industry workers in Brazil. Environmental Toxicology and Pharmacology, 19, 523-529. 53 Visão de Cores Claudia Feitosa-Santana 1 Daniela Maria Oliveira Bonci 1 Luiz Carlos de Lima Silveira 2 Dora Fix Ventura 3 A luz, ao atravessar os meios ópticos oculares, excita moléculas fotossensíveis presentes nos cones e bastonetes. Dependendo do nível de iluminação, a atividade de uma dessas duas classes de células fotorreceptoras origina uma seqüência de eventos na retina, no tálamo e no córtex cerebral que levam à percepção da cor (Backhaus, 1998; Kaiser & Boynton, 1996). A visão de cores tem forte influência em nossa percepção do mundo. Ela facilita enormemente a distinção entre objetos, a escolha do alimento adequado e a apreciação estética, 1 Pós-Graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia USP. Primeira autora: Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.feitosa-santana.com/ e http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/claudia.htm Email: [email protected] 2 Docente do Departamento de Fisiologia do Centro de Ciências Biológicas e, Diretor Geral do Núcleo de Medicina Tropical - UFPA. 3 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia - USP. 54 dessa forma contribuindo para o curso das ações que tomamos e o nosso estado emocional (FeitosaSantana et al., 2006; Gouras, 1991). Chamamos de visão mono, di, tri ou tetracromática aquela mediada por um número equivalente de cones com processamento neural independente. Isso pode ser demonstrado por métodos eletrofisiológicos ou psicofísicos. A maioria dos mamíferos é dicromata e, até onde sabemos, apenas certas espécies de primatas possuem visão de cores tricromática. Outros vertebrados como peixes, répteis e aves são, em sua grande maioria, tetracromatas (Gouras, 1991; Gregory, 2005). Podemos considerar como marco inicial do estudo científico da visão de cores os experimentos de Isaac Newton, descritos no seu livro Opticks, publicado pela primeira vez em 1704. Nesse trabalho, ele demonstrou que a luz branca é formada por todas as cores espectrais e criou um espaço de cores contendo vários aspectos daqueles usados até hoje, embora sem representar a gama de púrpuras. Newton deixou por escrito uma referência a essa limitação para a qual hoje temos a resposta: a gama de púrpuras é composta pela mistura das cores das duas extremidades do espectro visível (FeitosaSantana et al., 2006). A teoria tricromática para a visão de cores humana foi proposta por Young, em 1801. A tricromacia depende da presença na retina de três tipos de cones – os cones do tipo L, M e S, cujos picos de sensibilidade situam-se relativamente em comprimentos de onda longos, médios e curtos – e de que os sinais de saída desses cones sejam processados separadamente em circuitos neurais específicos. Brown e Wald (1964), com a utilização da microespectrofotometria, apresentaram as curvas de sensibilidade espectral dos fotorreceptores humanos e seus picos de absorção. O espectro de absorbância dos fotopigmentos dos cones L, M e S têm o seu pico em 558 nm, 530 nm e 420 nm, respectivamente; quando medidos in vivo esses valores deslocam-se para comprimentos de onda mais longos, 565 nm, 545 nm e 440 nm, respectivamente (Sharpe et al., 1999). A teoria da oponência de cores para a visão humana foi proposta por Hering, em 1874. Ela descreve suas propriedades pela interação de três canais cromáticos oponentes: 55 verde-vermelho, azul-amarelo e branco-preto, os quais podem ser quantificados através de procedimentos psicofísicos (Hurvich & Jameson, 1957). Os primeiros estágios com oponência cromática ocorrem nos circuitos neurais retinianos, tendo sido mostrado em primatas a existência de células ganglionares distintas para o processamento dos sinais de luminância (branco-preto), verde-vermelho e azul-amarelo (Silveira et al., 2005). A informação retiniana é retransmitida para células com propriedades semelhantes no tálamo e daí para o córtex cerebral. Entretanto, no córtex cerebral, apesar de terem sido encontrados compartimentos seletivos para os canais cromáticos nas áreas visuais V1, V2, V3 e V4, e de haverem experimentos que mostrem um papel importante de V4 no processamento cromático de ordem superior (Zeki, 1993), existem muitas lacunas importantes a serem preenchidas. Por exemplo, poucos neurônios de V1 preenchem o critério de terem suas propriedades cromáticas estáveis quando são variadas outras propriedades do estímulo como orientação, tamanho e contraste, um requisito importante para que eles possam estar envolvidos na análise das cores (Solomon & Lennie, 2007). Assim, a ligação entre a organização morfofuncional do sistema visual e os complexos fenômenos comportamentais que envolvem a visão de cores está muito longe de ser completamente compreendida. Espera-se que a combinação de técnicas poderosas, como a estimulação e registro eletrofisiológico de neurônios ou grupos de neurônios ao longo da via visual e os métodos modernos de neuroimagem, venham a explicar os fenômenos da visão de cores que têm sido tão meticulosamente quantificados pela psicofísica, através de séculos de estudo que se estendem pelas vidas de Newton, Young, Maxwell, von Helmholtz, Hering, Hurvich e muitos dos nossos contemporâneos. Referências Backhaus, W., Kliegl, R., & Werner, J. S. (Eds.). (1998). Color vision Perspectives from different disciplines. Berlin: Walter de Gruyter. 56 Brown, P. K., & Wald, G. (1964). Visual pigments in single rods and cones of the human retina. Science, 144(3614), 45-52. Feitosa-Santana, C., Oiwa, N. N., Costa, M. F., Tiedemann, K. B., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2006). Espaço de cores. Psicologia USP, 17(4), 3562. Gouras, P. (1991). The perception of colour. Great Britain: Macmillan Press. Gregory, R. L. (2005). Eye and brain: The psychology of seeing (5th ed.). New York: Oxford University Press. Hurvich, L. M., & Jameson, D. (1957). An opponent-process theory of color vision. Psychological Review, 64, 384-404. Kaiser, P. K., & Boynton, R. M. (1996). Human color vision (2nd ed.). Washington, DC: Optical Society of America. Sharpe L. T., Stockman, A., Jägle, H., & Nathans, J. (1999). Opsin genes, cone photopigments, color vision, and color blindness. In K. R. 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O que existe em comum entre as definições: espaço de cores designa a representação gráfica das relações entre os estímulos 1 Pós-Graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia USP. Primeira autora: Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.feitosa-santana.com/ e http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/claudia.htm Email: [email protected] 2 Pesquisador do Laboratório da Visão do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia – USP. 3 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia - USP. 4 Docente do Departamento de Fisiologia do Centro de Ciências Biológicas e, Diretor Geral do Núcleo de Medicina Tropical - UFPA. 58 cromáticos. Essa representação inclui desde os desenhos esquemáticos da Antigüidade, os espaços de cores obtidos por experimentos fisiológicos, até os espaços de cores construídos através de métodos psicofísicos (Feitosa-Santana, 2005). A sistematização do espaço de cores pode ser feita por diversos métodos e, de acordo com Brainard (2003), o sistema de cores pode ser criado para a especificação da aparência das cores ou da diferença entre as cores. Dentre os sistemas de aparência de cores, o mais conhecido e utilizado é o Sistema de Cores de Munsell (Munsell Color System). Nesse sistema, as cores são arranjadas cilindricamente com as coordenadas descritas a seguir. O eixo vertical representa value (V), uma dimensão associada à luminosidade, entre preto (V = 0) e branco (V = 10), para as cores localizadas respectivamente nos extremos – inferior e superior – do eixo vertical. Perpendicularmente ao eixo vertical estão dispostas as outras dimensões representando os outros dois atributos das cores. O ângulo polar e a distância, representam, respectivamente, o hue ou matiz (H) e o chroma (C), dimensão associada à saturação. No caso do matiz, o círculo de cores do sistema é dividido em 100 partes iguais, identificadas no círculo externo, H variando de 0 a 100. Grande parte dos sistemas de diferenças de cores foi desenvolvida a partir daquele criado pela Comission Internationale de l’Eclairage de 1931 (CIE 1931) (Brainard, 2003; FeitosaSantana, 2006). O sistema de cores CIE 1931 (XYZ) é conhecido pelo seu diagrama de cromaticidade. A forma tridimensional do sistema pode ser obtida calculando-se as coordenadas do terceiro eixo (Y), o eixo de luminância, somadas às coordenadas dos dois eixos de cromaticidade (x e y). No diagrama estão representadas não apenas as cores puras ou monocromáticas como, também, as misturas delas para cada coordenada cromática. As coordenadas para as cores puras são representadas no locus espectral, o qual ocupa mais de dois terços da borda do diagrama, correspondendo aos comprimentos de onda entre 380 nm e 780 nm. O branco, por sua vez, está localizado em sua porção mais central (x = 0,33; y = 0,33) e a sua determinação resulta da combinação dos três comprimentos de onda adotados como primárias, 700 nm, 546,1 nm e 435,8 nm. No sistema, X, Y e Z representam cada um dos valores absolutos da mistura de cores 59 das três primárias necessárias para a equiparação com cada uma das cores espectrais. Os valores de x, y e z representam as coordenadas de cromaticidade e são obtidas pelas fórmulas: x = X/(X+Y+Z), y = Y/(X+Y+Z) e z = Z/(X+Y+Z). Na representação gráfica do diagrama, as informações são representadas em x, y e Y. As coordenadas x e y são os coeficientes correspondentes às quantidades relativas de dois das três primárias e a da terceira, z, é obtida por diferença, uma vez que x + y + z = 1, ou seja, z = 1 – x – y. Estas três coordenadas correspondem às proporções de cada uma das três primárias para constituir cada cor espectral. Desta forma, as cores têm informações nas três dimensões, enquanto o branco e o preto estão apenas no eixo Y que representa o nível de luminância expresso em cd / m2 (Kaiser & Boynton, 1996). Existem vários outros sistemas de cores, sejam de aparência ou de diferença de cores: o Swedish Natural Colour System (NCS), o OSA Uniform Color Scale (OSA/UCS), o DIN Color System (DIN), RGB, Gerritsen, MacLeod-Boyton, DKL, CIELAB, CIE Rösch, CIE MacAdam, CIE Walter Stiles, CIE 1976, entre outros (Backhaus, 1998; Brainard, 2003; Kaiser & Boyton, 1996). Na construção do espaço de cores, as propriedades físicas dos estímulos cromáticos são especificadas pela composição espectral do estímulo e pela intensidade medida em unidades de energia ou número de quanta. A composição espectral é traduzida nos sistemas de representação de cores em coordenadas tricromáticas que correspondem ao matiz e à saturação. A intensidade corresponde ao brilho. Matiz, saturação e brilho são atributos psicológicos influenciados não apenas pelos atributos físicos do estímulo, como também por vários outros fatores como, por exemplo, pelos demais estímulos presentes no campo visual. A proximidade de outros estímulos modifica a percepção de cor. O sistema visual também exibe constância de cor, ou seja, a despeito de mudanças no iluminante, atribui-se a mesma cor a um objeto (Feitosa-Santana, 2006). Pesquisadores de diversas áreas estudam os caminhos pelos quais se possa construir um espaço de diferença de cores capaz de abranger as diversas variações perceptuais da visão de cores, seja humana ou animal (Paramei & Bimler, 2001; Shepard & Cooper, 1992). Para tal, as unidades métricas de seus sistemas devem estar associadas às magnitudes de suas diferenças: a mesma distância 60 entre quaisquer dos dois pontos representaria igual capacidade de discriminação ou igual diferença perceptual. Para que a relação entre as sensações de cores seja representada em sua totalidade, é preciso conhecer completamente os mecanismos fisiológicos do sistema visual. Alguns autores referem-se a esse processo como uma reconstrução, uma vez que se estaria procurando recriar o espaço perceptual que cada indivíduo possui para representar as cores (Feitosa-Santana, 2005; Paramei, 1996). Na reconstrução de espaços de diferenças de cores, a dificuldade na sistematização está na reprodução das diferenças minimamente perceptíveis existentes entre os estímulos de cores. Feitosa-Santana (2005, 2006) estudou espaços de cores de pacientes com deficiência adquirida na visão de cores devido a diabetes e a intoxicação por mercúrio. Esses espaços puderam ser visualizados como uma deformação do espaço de cores de sujeitos normais. A adoção de tal método para as análises individuais, além de pouco dispendioso, pode ter impacto nos testes de diagnóstico ou acompanhamento clínico de diversas doenças que afetam o sistema visual, tais como: a diabetes, a doença de Parkinson, a esclerose múltipla, as intoxicações por metais pesados e outras. Referências Backhaus, W. G. K. (1998). Physiological and psychological simulations of color vision in humans and animals. In: W. G. K. Backhaus, R. Kliegl, J. S. Werner (Eds.), Color Vision: Perspectives from different disciplines. Berlin; New York: de Gruyter. Brainard, D. (2003). Color appearance and color difference specification. In: S. Shevell (Ed.), The science of color. Oxford: Optical Society of America. Cornsweet, T. (1970). Visual Perception. Oxford: Academic Press. 61 Feitosa-Santana, C. (2005). Reconstrução do espaço de cores de pacientes com discromatopsia adquirida: diabéticos tipos 2 e intoxicados por vapor de mercúrio. Dissertação de Mestrado. Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo. Feitosa-Santana, C., Oiwa, N., Paramei, G., Bimler, D., Costa, M. F., Lago, M., Nishi, M., & Ventura, D. F. (2006). Color space distortions in patients with type 2 diabetes mellitus. Visual Neuroscience, 23(3-4), 663668. Feitosa-Santana, C., Oiwa, N., Costa, M. F., Tiedemann, K. B., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2006). Espaço de Cores. Revista Psicologia USP, 17(4), 35-62. Helm, C. (1964). Multidimensional ratio scaling analysis of perceived color relations. Journal of the Optical Society of America, 54(2), 256-262. Kaiser, P. K., & Boynton, R. M. (1996). Human color vision. Washington DC: Optical Society of America. Paramei, G. (1996). Color space of normally sighted and color-deficient observers reconstructed from color naming. Psychological Science, 7(5), 311-317. Paramei, G. V., & Bimler, D. L. (2001b). Is color space curved? A common model for color-normal and color-deficient observers. In: W. G. K. Backhaus (Ed.), Neuronal coding of perceptual systems. Proc. of the International School of Biophysics, Series on Biophysics and Biocybernetics, 9. Casamicciola, Napoli, Italy, 12-17 Oct. 1998 New Jersey: World Scientific, pp 102-105. Shepard, R. N. & Cooper, L. A. (1992). Representation of colors in the blind, color-blind, and normally sighted. Psychological Science, 3(2), 97104. 62 Alterações na Visão de Cores Claudia Feitosa-Santana 1 Mirella Gualtieri 1 Anderson Raiol Rodrigues 2 Daniela Maria Oliveira Bonci 1 Mirella Telles Salgueiro Barboni 1 Marcelo Fernandes da Costa 3 Luiz Carlos de Lima Silveira 4 Dora Fix Ventura 3 1 Pós-Graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia USP. Primeira autora: Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.feitosa-santana.com/ e http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/claudia.htm Email: [email protected] 2 Pós-Graduando do Programa de Neurociências e Biologia Celular do Instituto de Ciências Biológicas - UFPA. 3 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia - USP. 4 Docente do Departamento de Fisiologia do Instituto de Ciências Biológicas e Diretor Geral do Núcleo de Medicina Tropical - UFPA. 63 O termo tricromacia designa a visão de cores normal humana. Alterações na visão de cores são chamadas discromatopsias e podem ocorrer por diversos fatores, sejam eles congênitos ou adquiridos. A ausência completa da percepção de cores denomina-se acromatopsia (Backhaus, Kliegl & Werner, 1998; Feitosa-Santana et al., 2007; Gualtieri, 2004) (Figura 1). Figura 1. Imagem à esquerda, visão tricromática e, à direita, visão acromática. Foto: Claudia Feitosa-Santana, Arroz com Pimenta na UFPA, Belém do Pará, 2004. As discromatopsias se refletem na dificuldade ou incapacidade de discriminação entre as cores. Existem diversas classificações para essas deficiências e cada uma delas pode ocorrer em diferentes graus, do mais leve ao mais grave. As deficiências podem ser decorrentes de disfunções em um ou mais níveis do sistema visual, incluindo seus elementos ópticos, os fotorreceptores da retina, as vias visuais e os centros de processamento de informação visual situados no mesencéfalo, diencéfalo e nas áreas visuais do córtex cerebral (Birch, 1993/2001; Gouras, 1991; Gualtieri, 2004). Os defeitos congênitos podem ser causados por anormalidades no fotopigmento contido nos cones e bastonetes e têm origem genética. Essas anormalidades são conhecidas 64 por anopsia/anopia e anomalia. A anopsia/anopia é decorrente da ausência da opsina (fotopigmento) de um dos três tipos de cone da retina, S, M ou L, o que impede que a absorção de uma determinada faixa de comprimentos de onda do espectro visível ocorra tal como no tricromata normal (Feitosa-Santana et al., 2007; Gualtieri, 2004). São elas: a protanopsia/protanopia, a deuteranopsia/deuteranopia, e a tritanopsia/tritanopia. Os radicais protan, deutan e tritan são provenientes do grego e significam primeiro, segundo e terceiro, respectivamente. Em qualquer um desses casos, a visão de cores será o resultado do funcionamento de apenas dois cones e, por isso, são sujeitos classificados como dicromatas – sujeitos com dois fotopigmentos funcionais. Um sujeito com protanopsia é um protanope; com deuteranopsia, um deuteranope; e com tritanopsia, um tritanope (Figura 2). A anomalia congênita, por sua vez, é decorrente da substituição de um dos fotopigmentos normais por outro cujo espectro de absorção é alterado (Neitz & Neitz, 2000; Deeb, 2004). Em humanos tricromatas normais, o pico de absorção dos fotopigmentos é de 558nm (cone L), 530nm (cone M) e 420nm (cone S). Nos casos das anomalias, esses valores mudam e quanto menor a diferença entre eles maior será a gravidade da anomalia. A correlação entre a gravidade no defeito da visão de cores e a variação no espectro de absorção é alta quando a diferença é maior que 3 nm. Para variações menores, entre 0 e 2 nm, a correlação é baixa, com casos de tricromacia anômala grave ou dicromacia. Nesses casos, a densidade óptica do fotopigmento dos cones L e M também contribui para a gravidade da anomalia; não existe descrições dessa correlação para o cone S. O sujeito, então, é classificado como um tricromata anômalo: a protanomalia designa o sujeito protanômalo; a deuteranomalia, o sujeito deuteranômalo; e a tritanomalia, o sujeito tritanômalo (Sanocki, Teller & Deeb, 1997; He & Shevell, 1994; He & Shevell, 1995; Deeb, 2005). Algumas descrições sobre deficiências congênitas da visão de cores já haviam sido feitas antes de 1798, mas foi neste ano que John Dalton publicou uma investigação bastante detalhada a respeito do assunto, e seus artigos receberam bastante atenção da comunidade científica. Como resultado, muitas pessoas com deficiências na discriminação de cores foram identificadas e o termo 65 daltonismo foi, desde então, cunhado para descrever essa condição. Como Dalton era também um deficiente congênito, seus olhos foram preservados pela Manchester Philosophical Society e, em 1994, foi possível fazer uma análise genética do material. Essa análise revelou que Dalton era, de fato, um sujeito deuteranope (Birch, 1993/2001; Feitosa-Santana et al., 2006; Hunt, Dulai, Bowmaker, & Mollon, 1995; Mollon, Dulai, & Hunt, 1997). Figura 2. Imagens que simulam a tricromacia (superior à esquerda) e algumas discromatopsias (por anopsias): superior à direita, imagem vista por um tritanope; inferior à esquerda, por um protanope; inferior à direita, por um deuteranope. Foto: Claudia Feitosa-Santana, Essências do Ver-o-Peso, Belém do Pará, 2004. 66 Na população em geral, os defeitos congênitos mais prevalentes são as anopsias e anomalias deutan, seguidas de protan e tritan, respectivamente. As deficiências congênitas protan e deutan são decorrentes de anormalidades nos fotopigmentos dos cones L e M, que são expressos pelo cromossoma X. Por essa razão, esses defeitos são mais prevalentes no sexo masculino. As deficiências congênitas tritan são extremamente raras e, na literatura, o primeiro registro data de 1952. O fotopigmento relacionado aos defeitos tritan encontra-se no cone S e é expresso no cromossoma 7 (autossômico) (Birch, 1993/2001; Gualtieri, 2004). As deficiências na discriminação cromática podem ser representadas em um dado espaço de cores, como o diagrama de cromaticidade da CIE (1931 (XYZ) ou 1976 (Luv)), por um ou mais eixos de confusão (linhas isocromáticas) protan, deutan e/ou tritan (Capilla et al., 1998). Os defeitos encontrados no eixo protan são resultantes de alterações nos cones L, os responsáveis pela absorção da faixa de comprimentos de onda longos (faixa da extrema direita do espectro visível, onde predominam os vermelhos); defeitos do eixo deutan, as alterações nos cones M (médios, onde predominam os verdes); e defeitos do eixo tritan, as alterações nos cones S (curtos, onde predominam os azuis e violetas) (Feitosa-Santana et al., 2006; Gualtieri, 2004; Kaiser & Boynton, 1996). A diferenciação entre as deficiências congênitas e adquiridas é fundamental para os estudos de visão de cores. Os defeitos congênitos estão presentes desde o nascimento e permanecem estáveis ao longo da vida enquanto os defeitos adquiridos, uma vez instalados, podem regredir ou tornarem-se mais graves com o tempo. Dessa forma, enquanto o tipo e a gravidade do defeito permanecem os mesmos para os congênitos, os defeitos adquiridos podem se alterar ao longo do tempo. Outra característica importante é que, normalmente, os defeitos congênitos são expressos igualmente em ambos os olhos; já nos defeitos adquiridos são assimétricos entre os olhos e, por isso, devem ser avaliados monocularmente. Os casos adquiridos diferem qualitativamente dos congênitos uma vez que o mecanismo dos canais de oponência – verde-vermelho e azul-amarelo - pode estar envolvido. Esses casos são, portanto, mais difíceis de serem classificados e, em sua maioria, são inespecíficos e associados a mais 67 de um padrão de deficiência – protan, deutan e tritan. Enquanto nos defeitos congênitos a prevalência é maior no sexo masculino, nos defeitos adquiridos a prevalência é igual entre homens e mulheres ou pode variar de acordo com a doença associada (Birch, 1993/2001; Hart, 1987). Um dos mais antigos registros de defeito adquirido da visão de cores é de Robert Boyle (1688) que descreveu o caso de uma mulher que perdeu a visão por um período e foi gradualmente recuperando-a, mas com completa ausência de percepção de cores. Boyle descreveu que ela era incapaz de distinguir pétalas de violetas de folhas verdes do entorno. Em 1897, Konig observou defeitos da visão de cores relacionados ao tabagismo. Em 1912, Kollner descreveu a evolução das perdas da visão de cores sob o aspecto da teoria dos canais de oponência e classificou as perdas em defeitos do eixo verde-vermelho e do eixo azul-amarelo. Muitas vezes, ainda hoje, suas regras são mal interpretadas e associadas de forma reducionista a doenças da retina em caso de defeitos no eixo azul-amarelo e, doenças do nervo óptico para os defeitos do eixo verde-vermelho (Birch, 1993/2001; Marré, 1973). Uma das causas mais freqüentes de discromatopsia adquirida é o amarelecimento do cristalino com o avanço da idade, que provoca a redução na absorção dos comprimentos de onda curtos e, por conseguinte, um defeito do tipo tritan (Gualtieri, 2004; Hart, 1987). Dentre as condições patológicas que causam a alteração na visão de cores estão doenças como: a diabetes mellitus tipo 1 e tipo 2, a esclerose múltipla, a doença de Parkinson, a distrofia muscular de Duchenne, a neuropatia óptica hereditária de Leber, as intoxicações medicamentosas como, por exemplo, as produzidas por cloroquina e citrato de sildenafil (Viagra), as intoxicações por vapor de mercúrio e por metilmercúrio, entre outras (Feitosa-Santana et al., 2005). Casos de acromatopsias adquiridas são raros e, quando verificados, são conseqüências – na maioria dos casos - de lesões corticais. Estudos destes casos permitem o melhor entendimento da neurofisiologia da visão de cores humana, na qual se verifica um papel importante da área V4 do córtex visual no processamento cromático de ordem superior (Feitosa-Santana et al., 2007; Milner & Goodale, 2005; Zeki, 1993). 68 As patogêneses das diversas deficiências adquiridas da visão de cores ainda não são totalmente conhecidas e, atualmente, estão sendo estudadas por diversos laboratórios de estudos da visão de cores, no Brasil e no mundo. Referências Backhaus, W., Kliegl, R., & Werner, J. S. (Eds.). (1998). Color vision Perspectives from different disciplines. Berlin: Walter de Gruyter. Birch, J. (1993/2001). Diagnosis of defective colour vision. Oxford: Butterworth Heinmann. Capilla, P., Malo, J., Luque, M. J., Artigas, J. M. (1998). Colour representation spaces at different physiological levels: a comparative analysis. Journal of Optics, 29(5), 324-338. Deeb, S. S. (2004). Molecular genetics of color-vision deficiencies. Visual Neuroscience, 21(3), 191-196. Deeb, S. S. (2005). The molecular basis of variation in human color vision. Clinical Genetics, 67(5), 369-377. Feitosa-Santana, C. (2005). Reconstrução do espaço de cores de pacientes com discromatopsia adquirida: diabéticos tipos 2 e intoxicados por vapor de mercúrio. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo. Feitosa-Santana, C., Oiwa, N. N., Costa, M. F., Tiedemann, K. B., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2006). Espaço de cores. Psicologia USP, 17(4), 35-62. Feitosa-Santana, C., Bonci, D. M. O., Silveira, L. C. L., & Ventura, D. F. (2007). Visão de Cores. In C. Feitosa-Santana, L. C. L. Silveira & D. F. 69 Ventura (Org.), Cadernos da Primeira Oficina de Estudos da Visão. São Paulo: IP-USP (NeC). Gualtieri, M. (2004). Visão de cores e sensibilidade ao contraste em indivíduos com diabete melito: avaliação psicofísica e eletrofisiológica. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo. Gouras, P. (1991). The perception of colour. Great Britain: Macmillan Press. Hart, W. M. (1987). Acquired Dyschromatopsias. Survey of Ophthalmology, 32(1), 10-31. He, J. C., & Shevell, S. K. (1994). Individual differences in cone photopigments of normal trichromats measured by dual Rayleigh-type color matches. Vision Research, 34, 367–376. He, J. C., & Shevell, S. K. (1995). Variation in color matching and discrimination among deuteranomalous trichromats: theoretical implications of small differences in photopigments. Vision Research, 35, 2579–2588. Hunt, D.M., Dulai, K.S., Bowmaker, J.K., and Mollon, J.D. (1995) The chemistry of John Dalton’s color blindness. Science, 267, 984–8. Kaiser, P. K., & Boynton, R. M. (1996). Human color vision (2nd ed.). Washington, DC: Optical Society of America. Marré, M. (1973). The investigation of acquired colour deficiencies. Colour 73. London: Adam Hilger, pp. 99-135. Milner, A. D., & Goodale, M. A. (2005). Sight Unseen. New York: Oxford University Press. Mollon, J.D., Dulai, K.S., and Hunt, D.M. (1997) Dalton’s colour blindness: an essay in molecular biography. John Dalton’s Colour Vision Legacy 70 (eds C. Dickinson, I. Murray and D. Carden). London: Taylor and Francis, pp. 15–33. Neitz, M., & Neitz, J. (2000). Molecular genetics of color vision and color vision defects. Archives of Ophthalmology, 118(5), 691-700. Sanocki, E., Teller, D. Y., & Deeb, S. S. (1997). Rayleigh match ranges of red/green color-deficient observers: psychophysical and molecular studies. Vision Research, 37, 1897–1907. Zeki, S. (1993). A vision of the brain. Oxford: Blackwell Scientific Publications. 71 Maturidade do Sistema Visual Mirella Telles Salgueiro Barboni 1 Claudia Feitosa-Santana 1 Dora Fix Ventura 2 O aumento na expectativa de vida ampliou a prevalência de disfunções do sistema visual relacionadas ao avanço da idade. Com o aumento da longevidade, é importante saber como essas alterações afetam as populações que continuam em plena atividade, mesmo em idades avançadas. Durante toda a vida o cristalino – a lente natural do olho – reduz gradativamente sua capacidade de acomodação (focalização) da imagem de objetos que se encontram próximos, mas a partir da quarta ou quinta década de vida isso se torna um problema para a maioria das pessoas e traz dificuldade na realização de tarefas que exigem a visão para perto. Essa condição é denominada presbiopia e, normalmente, requer o uso de óculos para perto (Atchison, 1995). Com o avanço da idade pode ocorrer opacificação do cristalino, a catarata, que é uma importante causa de 1 Pós-Graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia – USP. Primeira autora: Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/ Email: [email protected] 2 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia – USP. 72 cegueira. Entretanto, pode ser eliminada através de cirurgia (West, 2000). Em pessoas mais velhas ocorrem freqüentemente outras mudanças naturais, como a diminuição do diâmetro pupilar (Ball, 2002), redução no número de células da retina (Lovasik, Kergoat, Justino, & Kergoat, 2003), modificação da interação centro-periferia nos neurônios visuais (Betts, Taylor, Sekuler, & Bennett, 2005) ou, ainda, patológicas como, por exemplo, a degeneração macular relacionada à idade (Fine, 2005) ou a retinopatia diabética (Feitosa-Santana, 2005; Ismail & Whitaker, 1998). Estas mudanças causam reduções em funções visuais que podem influenciar as atividades do cotidiano. A sensibilidade ao contraste espacial é a habilidade de perceber diferenças entre um objeto e o meio circunvizinho (Campos-Filho, 2005). Devido às mudanças ópticas e neurais, a função de sensibilidade ao contraste sofre redução durante o envelhecimento natural das estruturas visuais (Pardhan, 2004). A prevalência de tombos em idosos pode estar associada à redução na sensibilidade ao contaste. Grande parte da população idosa demonstra dificuldades para o reconhecimento de faces em ambientes de baixa iluminação e, muitas vezes, necessitam do dobro de contraste para detectar e discriminar faces (Ball, 2002). Entretanto, a acuidade visual medida em exames oftalmológicos de rotina, que se encontra dentro dos limites normais em grande parte da população idosa, possui relação extremamente fraca com acidentes de trânsito. A boa acuidade visual pode auxiliar quando o veículo está se movimentando lentamente, e influencia menos quando dirigimos em velocidade normal (Burg, 1971). A avaliação do campo visual em pessoas com idade mais avançada pode ser um melhor indicador para os riscos de acidentes automobilísticos, uma vez que o desempenho para dirigir um veículo está relacionada com a boa utilização de todo o campo de visão (Johnson & Keltner, 1986). Mudanças do sistema visual relacionadas ao avanço da idade devem ser pensadas globalmente, respondendo às necessidades dessa população que se torna naturalmente prejudicada devido à redução nas funções visuais. É importante estar atento a diferentes tipos de iluminação e contraste necessários para que o idoso possa promover suas atividades com independência e diminuir fatores de riscos de acidentes. 73 Com o aumento no interesse em pesquisas sobre o envelhecimento sensorial, poderemos obter mais informações sobre as conseqüências das reduções visuais na vida de pessoas com idade avançada (Horowitz, 2004). Dessa forma, mais recursos poderão ser úteis para um melhor aproveitamento visual nas tarefas diárias dos idosos. Referências Atchison, D. A. (1995). Accommodation and presbyopia. Ophthalmic and Physiological Optics, 15, 255-272. Betts, L. R., Taylor, C. P., Sekuler, A. B., & Bennett, P. J. (2005). Aging reduces center-surround antagonism in visual motion processing. Neuron, 45, 361-366. Ball, K. K. (2002). The aging visual system. In: Norton, T. T., Corliss, D. A., & Bailey, J. E. (Ed.), The Psychophysical Measurement of Visual Function. Woburn: Butterworth Heinemann, 10, pp. 309-322. Burg, A. (1971). Vision and driving: a report on research. Human Factors, 13, 79-87. Feitosa-Santana, C. (2005). Reconstrução do espaço de cores em pacientes com discromatopsia adquirida: diabéticos tipo 2 e intoxicados por vapor de mercúrio. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo. Fine, S. L. (2005). Age-related macular degeneration 1969-2004: A 35-year personal perspective. American Journal of Ophthalmology, 139, 405-420. Horowitz, A. (2004). The prevalence and consequences of vision impairment in later life. Topics in Geriatric Rehabilitation, 20, 185-195. 74 Ismail, G. M., & Whitaker, D. (1998). Early detection of changes in visual function in diabetes mellitus. Ophthalmic & physiological optics: the journal of the British College of Ophthalmic Opticians (Optometrists), 18, 312. Johnson, C. A. & Keltner, J. L. (1986). Incidence of visual field loss in 20.000 eyes and its relationship to driving performance. Archives of Ophthalmology, 101, 371-375. Campos-Filho, M. L. C. (2005). Sensibilidade ao contraste de luminância e cromático em pacientes intoxicados por vapor de mercúrio: evolução em dois anos. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo. Lovasik, J. V., Kergoat, M. J., Justino, L., & Kergoat, H. (2003). Neuroretinal basis of visual impairment in the very elderly. Graefes Archive for Clinical and Experimental Ophthalmology, 241, 48-55. Pardhan, S. (2004). Contrast sensitivity loss with aging: sampling efficiency and equivalent noise at different spatial frequencies. Journal of the Optical Society of America A-Optics Image Science and Vision, 21, 169-175. West, S. K. (2000). Looking Forward to 20/20: A Focus on the Epidemiology of Eye Diseases. Epidemiologic reviews, 22, 64-70. 75 Do Fóton à Consciência Marcus Vinícius C. Baldo 1 Ao nos emocionarmos com um sol poente ou um antigo retrato, uma cadeia de eventos vincula os fótons que bombardeiam a nossa retina à percepção visual que evoca memórias e emoções. Em nossa tentativa de compreender esses processos, os incluímos em abordagens que vão da biofísica à fisiologia sensorial, e daí à fisiologia da percepção. Cada um desses níveis de abordagem possui seus pressupostos e seus modelos próprios, e uma atitude reducionista enfrenta os mesmos obstáculos que aqueles encontrados em outros ramos da ciência, tais como na física, por exemplo. Essa empreitada rumo ao entendimento dos mecanismos sensoriais e perceptivos fica ainda mais árdua quando incluímos, em nossa descrição, qualquer aspecto que resvale no conceito de consciência. O próprio termo “percepção consciente” torna-se redundante, se considerarmos que qualquer percepção é, em si mesma e necessariamente, consciente. Por isso, o estudo dos processos perceptivos é, forçosamente, também o estudo de aspectos inerentes ao processo consciente. E então a pergunta que se coloca de maneira quase imediata é “quais são os ingredientes necessários e suficientes dos quais emerge a consciência?”. 1 Docente do Departamento de Fisiologia e Biofísica do Instituto de Ciências Biomédicas – USP. Avenida Prof. Lineu Prestes, 1524 - Cidade Universitária - 05509.800 - São Paulo - SP. Email: [email protected] 76 O estudo da fisiologia sensorial já nos mostra que as várias características visuais de um objeto (forma, cor e movimento, por exemplo) são processadas em áreas distintas do córtex visual. De alguma forma essas características se fundem em um percepto único, por meio de processos desconhecidos cuja essência é denominada “problema da fusão” (binding problem). Embora ainda estejamos longe de resolver esse problema, alguns de seus componentes podem ser parcialmente inferidos. Por exemplo, muito provavelmente a percepção (e, portanto, a consciência) requer mecanismos de memória de curto-prazo que funde, em um percepto unitário, uma sucessão temporal de eventos sensoriais. Esse processo, por sua vez, depende de vias neurais pró-alimentadas (feedforward) e também de vias de retro-alimentação (feedback), cuja atividade pode levar a uma sincronização da atividade neural dispersa por diferentes áreas corticais, o que, segundo muitos autores (embora de forma não consensual), é um ingrediente básico do processo consciente. Uma atividade neural sincronizada estaria na base da competição de múltiplos estímulos sensoriais por um processamento mais refinado, operação esta que é, em muitas instâncias, associada à atenção. De qualquer forma, uma compreensão mais profunda da percepção exige que a observemos de uma perspectiva mais ampla, onde se incluam suas interações com as ações de um organismo. O nosso repertório cognitivo é o resultado de um processo de co-evolução com os repertórios motor e comportamental. Portanto, entender a percepção - e a consciência - é entender, em essência, como ela é utilizada. Referências Baars, B. J. (1997). In the theater of consciousness. New York: Oxford University Press. 77 Crick, F. (1994). The astonishing hypothesis: The scientific search for the soul. New York: Scribner. Crick, F., & Koch, C. (1998). Consciousness and neuroscience. Cerebral Cortex, 8, 97-107. Damasio, A. (1999). The feeling of what happens, body and emotion in the making of consciousness. New York: Harcourt Brace Jovanovich. Dehaene, S., & Naccache, L. (2001). Towards a cognitive neuroscience of consciousness: Basic evidence and a workspace framework. Cognition, 79(1-2), 1-37. Edelman, G. (1989). The remembered present: A biological theory of consciousness. New York: Basic Books. Singer, W., & Gray, C. (1995). Visual feature integration and the temporal correlation hypothesis. Annual Review of Neuroscience, 18, 555-586. Tononi, G., & Edelman, G. (1998). Consciousness and complexity. Science, 282, 1846-1851. Weiskrantz, L. (1997). Consciousness lost and found. Oxford, UK: Oxford University Press. Zeki, S., & Bartels, A. (1999). Towards a theory of visual consciousness. Consciousness and Cognition, 8, 225–259. 78 Cambridge Colour Test Adaptação do Teste para Crianças Paulo Roney Kilpp Goulart 1 Marcio Leitão Bandeira 2 Daniela Tsubota 2 Nestor Norio Oiwa 3 Marcelo Fernandes da Costa 4 Dora Fix Ventura 4 O Cambridge Colour Test (Mollon & Reffin, 1989, 2000; Regan, Reffin, & Mollon, 1994) permite testar a visão de cores medindo limiares de discriminação cromática. O teste apresenta, na tela de um monitor, um mosaico de pequenos círculos, variados aleatoriamente em tamanho 1 Pós-Graduando do Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento – UFPA. Avenida Conselheiro Furtado, 1776/206 - Nazaré – 66040.100- Belém - PA. Email: [email protected] 2 Bolsista de Iniciação Científica do Laboratório da Visão do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia – USP. 3 Pesquisador do Laboratório da Visão do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia – USP. 4 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia – USP. 79 e luminância – parâmetros que, juntos, compõem o chamado ruído espacial e de luminância – de forma a eliminar a possibilidade de artefatos de borda e de luminância. Uma parcela dos círculos, definidos com valores de cromaticidade diferentes dos do fundo do mosaico, formam um alvo na forma de um “C”. O sujeito é instruído a indicar a orientação da abertura do “C” (esquerda, direita, superior ou inferior) que varia de uma apresentação para outra. No início do teste, o alvo é apresentado com máximo contraste em relação ao fundo e, no decorrer da sessão, a diferença cromática entre o alvo e o fundo é aumentada ou diminuída durante o teste, de acordo com o desempenho do sujeito, o que permite a determinação dos limiares de discriminação de cores. O trabalho aqui relatado visa criar condições favoráveis para a avaliação psicofísica da visão de cores em bebês e crianças e, posteriormente, em sujeitos não-verbais ou com compreensão limitada de instruções como, por exemplo, pessoas portadoras de necessidades especiais ou primatas não-humanos. Para esses sujeitos, a tarefa de indicar a abertura de um C colorido, como na versão comercial do Cambridge Colour Test, pode ser pouco intuitiva e de difícil compreensão. Com essa finalidade, procedimentos de treino operante e a técnica do olhar preferencial (observação da direção do olhar) estão sendo implementados paralelamente ao desenvolvimento de uma versão adaptada do Cambridge Colour Test. As principais modificações realizadas para a aplicação em bebês e crianças foram: 1. O tamanho máximo dos círculos que compõem o ruído foi reduzido, sua quantidade aumentada e a distância mínima entre eles reduzida, o que resulta em arranjo relativamente mais homogêneo; 2. O alvo foi redefinido para assumir a forma aproximada de um quadrado, apresentado em qualquer uma das quatro posições em que antes era apresentada a abertura do C (esquerda, direita, superior ou inferior). A resposta requerida ao sujeito passou a ser a identificação do alvo na tela do monitor, ficando a cargo do experimentador emular a resposta do participante na caixa de resposta; 3. Os parâmetros de definição da duração das tentativas foram alterados de modo a permitir que cada tentativa permaneça em vigor por tempo indeterminado; 4. Tratamento semelhante foi dado ao controle da duração do intervalo entre 80 tentativas (IET), permitindo a programação de IETs mais duradouros (e.g., para que o participante possa manipular a recompensa). Testes preliminares foram realizados em 4 sujeitos até o momento. Crianças de 3 anos (n=2) e 5 anos (n=1) de idade foram acomodadas diante da tela do monitor e receberam instruções verbais para indicar a área colorida (com um toque na tela do monitor), com reforço positivo no caso de acertos. Para a criança de 1 ano de idade, foi utilizado o procedimento do olhar preferencial. Os resultados mostraram limiares compatíveis com os resultados obtidos em adultos testados com o teste original, o que demonstra que o programa desenvolvido até o momento tem boa aplicabilidade e reproduz os resultados dos dados normativos (Ventura, Silveira, Rodrigues, Gualtieri, Souza, Bonci, & Costa, 2003). Referências Mollon, J. D., & Reffin, J. P. (1989). A computer-controlled colour vision test that combines the principles of Chibret and Stilling. Journal of Phisiology, 414, 5P. Mollon, J. D., & Reffin, J. P. (2000). Cambridge Colour Test Handbook. London, Cambridge Research Systems (www.crsltd.com). Regan, B. C., Reffin, J. P., & Mollon, J. D. (1994). Luminance noise and the rapid determination of discrimination ellipses in colour deficiency. Vision Research, 34, 1279-1299. Ventura, D. F., Silveira, L. C. L., Rodrigues, A. R., Gualtieri, M., Souza, J. M., Bonci, D., & Costa, M. F. (2003). Preliminary norms for the Cambridge Colour Test (pp. 327-334). In J. D. Mollon, J. Pokorny & K. Knoblauch (Orgs.). Normal and defective colour vision. Oxford, UK: Oxford University Press. 81 Eletrorretinograma Multifocal Mirella Gualtieri 1 Dora Fix Ventura 2 Desenvolvida por Sutter e colaboradores (Sutter & Tran, 1992) a técnica de eletrorretinograma multifocal (mfERG) ao invés de fornecer um sinal de onda composto que reflete a atividade média de toda a retina, como outros tipos de eletrorretinograma, permite o mapeamento e registro da atividade de múltiplas áreas da retina. As respostas do mfERG são eliciadas pela apresentação de uma matriz com múltiplos hexágonos (a quantidade de elementos pode variar de 2 a 512) (Figura 1). A apresentação dos estímulos componentes da matriz é coordenada por uma seqüência binária e pseudoaleatória chamada seqüência m. 1 Pós-graduanda do Programa de Neurociências e Comportamento (NeC) do Instituto de Psicologia – USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cid. Universitária 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/ Email: [email protected] 2 Docente do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia – USP. Avenida Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A - Sala D9 - Cidade Universitária - 05508.900 - São Paulo - SP. http://www.ip.usp.br/laboratorios/visual/ Email: [email protected] 82 Figura 1. Exemplo de estímulo utilizado no mfERG. Hexágonos pretos estão apagados e hexágonos brancos estão acesos - instante T. A combinação de uma configuração particular de estímulos e de uma ferramenta matemática potente que caracteriza o mfERG permite a análise de múltiplas áreas da retina em período curto de tempo e principalmente de forma a evidenciar interações temporais e espaciais que ocorrem na retina em resposta a um estímulo luminoso. Figura 2. Exemplo de um mapa de respostas obtido com mfERG. Seta indica posição do nervo óptico. 83 Como resultado, temos um mapa topográfico das respostas locais da retina, abrangendo a área de estimulação, que é de aproximadamente 50 graus (Figura 2). Usando o recurso de localização topográfica da resposta da retina, a técnica do mfERG permite gerar um mapa tridimensional quantitativo da atividade da retina, mostrando mais claramente quais os pontos em que há redução da resposta. A Figura 3 mostra exemplos de mapas com resposta normal e alterada por retinopatia diabética. Figura 3. Mapa de densidade de resposta da retina (nV/grau2). Superior, resposta de sujeito controle e, inferior, paciente com retinopatia diabética. 84 A identificação de componentes na resposta que revelam interações temporais, relacionadas a processos de adaptação e interações espaciais, relacionadas ao efeito de áreas vizinhas na resposta de uma área particular, deve-se também à forma de extração de um sinal multifocal. As respostas obtidas no mfERG são extraídas em kernels. No mfERG, kernels são agrupamentos de sinais extraídos a partir do conjunto total de respostas registras durante o exame. A extração dos kernels é feita segundo regras que podem envolver um ou mais estados observados na área da qual se deseja analisar. De acordo com o número de estados considerados para a extração de um sinal mudamos a ordem do kernel observado. Assim, por meio do mfERG podem ser analisadas respostas de primeira, segunda, terceira ou enésima ordem. (para detalhes, Sutter, 1991; Sutter, 2000; Sutter, 2001). Ao analisar efeitos de alta ordem nas respostas do mfERG entra-se no domínio da não-linearidade. Como conseqüência disto tem-se um imenso campo de possíveis estados, efeitos e respostas a serem considerados e, na medida do possível, controlados. Desta forma, é possível indicar alguns desafios e ganhos que o uso do mfERG pode trazer no campo das ciências visuais. Os principais estão relacionados à identificação de: - bases anatômicas de diversos processos fisiológicos revelados na resposta eletrofisiológica com a utilização do mapeamento topográfico das respostas do mfERG em conjunto com informações morfológicas; - variabilidade normal na topografia e dinâmica das respostas não-lineares com a finalidade de se obter a reprodução dos dados; - saber como os mecanismos de interações na retina são alterados em casos patológicos. 85 Referências Sutter, E. E. (1991). The fast m-transform: A fast computation of crosscorrelations with binary m-sequences. SIAM Journal for Computing, 20, 686–694. Sutter, E. E., & Tran, D. (1992). The field topography of ERG components in man – I. The photopic luminance response. Vision Research, 32, 433-446. Sutter, E. E. (2000). The interpretation of kernels. Documenta Ophthalmologica, 100, 49-75. multifocal binary Sutter, E. E. (2001). Imaging visual function with the multifocal m-sequence technique. Vision Research, 41, 1241-1255. 86 GTPases Rho na Retina de Vertebrados Kelly Cristina Saito 1 Dânia Emi Hamassaki 2 As GTPases Rho (Ras homology) são proteínas de baixo peso molecular (2025kDa) que foram amplamente descritas em processos de organização do citoesqueleto (EtienneManneville & Hall, 2002; Govek et al., 2005). Estas proteínas ciclam entre os estados ativo e inativo, através da ligação de um GTP ou GDP, respectivamente. Esta troca é realizada por intermédio dos fatores de troca de nucleotídeo de guanina (GEFs) que ativam essas GTPases, enquanto que proteínas ativadoras da atividade GTPásica de Rho (GAPs) e inibidores da dissociação dos nucleotídeos de guanina (GDIs) inibem a troca de GDP por GTP (van Aelst & D´Souza-Schorey, 1997; Takai et al., 2001; Hoffman et al., 2000; Schmidt & Hall, 2002; Bos et al., 2007). Uma vez ligada ao GTP, as GTPases Rho podem ativar uma série de efetores intracelulares, tais como: ROCK, PAK, NFkB e ciclinas (van Aelst & D´Souza-Schorey, 1997; Coleman & Olson, 2002; Govek et al., 2005). Os principais membros pertencentes a esta família são: 1 Pós-Graduanda do Programa de Biologia Celular e Tecidual do Instituto de Ciências Biomédicas - USP. Avenida Prof. Lineu Prestes, 1524 - Sala 440 - Cidade Universitária 05508.900 - São Paulo - SP. Email: [email protected] 2 Docente do Departamento de Biologia Celular e do Desenvolvimento do Instituto de Ciências Biomédicas – USP. Avenida Prof. Lineu Prestes, 1524 - Sala 440 - Cidade Universitária 05508.900 - São Paulo - SP. Email: [email protected] 87 RhoA, RhoB, Rac1 e Cdc42, sendo responsáveis por desencadear diversos processos celulares, como por exemplo regulação da transcrição gênica, ciclo celular, apoptose e sobrevivência (Aznar & Lacal, 2001; Boettner & Aelst, 2002). As GTPases Rho atuam na retina de diferentes espécies, tais como nos fotorreceptores de cefalópodes, onde elas participam da organização do tamanho dos rabdômeros (equivalente ao segmento externo dos fotorreceptores de humanos) e auxiliam na movimentação de proteínas durante a adaptação claro/escuro (Miller et al., 2005). Em Drosophila, a morfogêse de fotorreceptores pode ser promovida por Cdc42 (Schneenberg, et al., 2003) e nos animais mutantes de rodopsina, os fotorreceptores resistem à degeneração, após a expressão da forma contitutivamente ativa, Drac1 (semelhante a Rac1) (Colley, 2000). O papel desempenhado por estas GTPases Rho ainda é pouco conhecido na retina de vertebrados. Em bovinos, Balasubramanian and Slepak (2003) demonstraram a presença de Rac1 associada às membranas dos segmentos externos de fotorreceptores e sendo ativada pela luz, sugerindo a existência de uma nova via de ativação pela rodopsina. Em nosso laboratório, a expressão de RhoA, RhoB, Rac1 e Cdc42 foi observada na retina de camundongos (Belmonte, 2005) e de pintos (Santos-Bredariol et al., 2002) durante os estágios iniciais de desenvolvimento , o que sugere uma possível correlação com a diferenciação neuronal e possível sinaptogênese (Malosio et al., 1997; Belmonte, 2005; Santos-Bredariol et al., 2002). A expressão de RhoB é transitória durante o desenvolvimento, sendo observada predominantemente nas células gliais de Müller de animais adultos (Santos-Bredariol et al., 2006). Em cultura purificada de células de Müller a utilização de ácido lisofosfatídico (LPA, ativador de GTPases) e Toxina A (bloqueador de GTPases) demonstrou um papel potencial desempenhado por RhoB na manutenção da morfologia das células de Müller, fundamental para a formação e preservação da organização retiniana. 88 Além da interação com o citoesqueleto, essas GTPases podem ser relevantes em alguns processos neurodegenerativos, como os que ocorrem nos modelos animais de retinose pigmentar. Nesses modelos, a GTPase Rac1 foi ativada durante o processo de apoptose dos fotorreceptores e isso parece envolver os efetores PAK3 e PAK4 (Belmonte et al., 2006). Entretanto, o papel específico de Rac1 e seus efetores ainda está sendo estudado em nosso laboratório. Em outros tipos de degeneração, como p.ex. na excitotoxicidade induzida por NMDA, foi observada a participação de RhoA; a utilização do fasudil (bloqueador de ROCK) promove a redução dessa lesão (Kitaoka et al., 2004). Resultados adicionais sugerem que a utilização do bloqueador de ROCK pode ser um tratamento promissor para o glaucoma (Rao & Epstein, 2007), pois sua ação pode promover ainda a regeneração dos axônios de células ganglionares presentes no nervo óptico da retina de gatos (Sagawa et al., 2007). Desse modo, a investigação sobre o papel das GTPases Rho na retina, assim como dos efetores e vias de sinalização envolvidas nos processos de desenvolvimento, diferenciação, sobrevivência e morte neuronal se torna crucial para que, futuramente, algumas dessas proteínas possam ser alvos para o tratamento de diversas patologias retinianas. Referências Aznar, S., & Lacal, J. C. (2001). Rho signals to cell growth and apoptosis. Cancer Letters, 165(1), 1-10. Review. Balasubramanian, N., & Slepak, V. Z. (2003). Light-mediated activation of Rac-1 in photoreceptor outer segments. Current Biology, 15, 1306-1310. Belmonte, M. A., Santos, M. F., Kihara, A. H., Yan, C. Y., & Hamassaki, D. E. (2006). Light-Induced photoreceptor degeneration in the mouse involves activation of the small GTPase Rac1. Investigative Ophthalmology & Vision Science, 47(3), 1193-1200. 89 Boettner, B., & Van Aelst, L. (2002). The role of Rho GTPases in disease development. Gene, 286(2), 155-174. Bos, J. L., Rehmann, H., & Wittinghofer, A. (2007). GEFs and GAPs: critical elements in the control of small G proteins. Cell, 129(5), 865-877. Review. Coleman, M. L., & Olson, M. F. (2002). Rho GTPase signalling pathways in the morphological changes associated with apoptosis. Cell Death and Differentiation, 9(5), 493-504. Colley, N. J. (2000). Cell biology. Actin' up with Rac1. Science, 290(5498), 1902-3. Diana, G., Valentini, G., Travaglione, S., Falzano, L., Pieri, M., Zona, C., Meschini, S., Fabbri, A., & Fiorentini, C. (2007). Enhancement of learning and memory after activation of cerebral Rho GTPases. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, 104(2), 636-41. 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A fóvea é uma região de grande consumo de oxigênio e metabolismo, e por isso é mais sujeita as doenças distróficas e degenerativas. A propedêutica da retina é muito rica, permitindo avaliações morfológicas e funcionais. A oftalmoscopia binocular indireta (OBI) é a visualização da retina. Como o olho é o único órgão no qual vasos sangüíneos podem ser visualizados diretamente, a OBI auxilia no diagnóstico e acompanhamento do tratamento de doenças, como: diabetes melito, hipertensão arterial, fenômenos 1 Colaborador do Departamento de Oftalmologia da Faculdade de Medicina – USP. Rua Barata Ribeiro, 414/11 - Bela Vista - 01308.000 - São Paulo - SP. Email: [email protected] 93 trombo-embólicos e intoxicação por drogas. Além disso, é importante nas doenças primárias do olho, como: degeneração macular relacionada à idade (DMRI), descolamento de retina, distrofias e degenerações retinianas. A angiofluoresceinografia é um exame que permite avaliar a hemodinâmica da retina. A fluoresceína é injetada na veia periférica do antebraço e após chegar aos vasos retinianos auxiliam no diagnóstico de áreas de isquemia retiniana e neovascularização, geralmente decorrentes de retinopatia diabética, retinopatia hipertensiva, oclusões vasculares e DMRI. Um dos mais novos exames é a tomografia de coerência óptica (OCT) (Costa et al., 2006). Através do laser de diodo, são produzidos cortes transversais de alta definição da retina. O OCT é muito útil no diagnóstico de doenças da mácula e da interface vítreo-retiniana, e permite estimar a espessura da retina e o volume da mácula, dados muito úteis na monitoração do tratamento de edema macular e DMRI. Nos últimos anos, temos vivido a era do tratamento farmacológico das doenças da retina. A injeção de medicamentos diretamente no vítreo é um procedimento seguro e permite acesso rápido e prolongado de quantidades grandes de droga à retina. No entanto, o risco de toxicidade retiniana deve ser considerado (Manzano, Peyman, Khan, & Kivilcim, 2006; Yu, Damico, Viola, D'Amico, & Young, 2006). Todas as drogas são tóxicas à retina dependendo da concentração injetada. Se o uso clínico for guiado pelos estudos experimentais, as chances de complicações locais são muito minimizadas (Chakravarthy et al., 2006). Para minimizar os riscos do uso intravítreo de drogas, têm sido desenvolvidos implantes de liberação lenta de drogas no vítreo. Os implantes ideais devem ser de fácil implantação, degradáveis enquanto a droga é liberada e de longa duração (Damico, Young, & Oréfice, 2005). Outras alternativas terapêuticas ainda estão em fase de estudos experimentais. O transplante de células do epitélio pigmentado da retina é muito promissor para doenças 94 degenerativas e distróficas (Liang, Yan, Ma, Zhang, & Wang, 2006; Treumer, Bunse, Klatt, & Roider, 2007), assim como os implantes eletrônicos substitutos da retina ou do nervo óptico. No entanto, várias dificuldades ainda devem ser transpostas para que sejam utilizados em olhos humanos (Rodrigues & Avila, 2004). Por fim, a terapia gênica também tem grande potencial nas doenças da retina, mas ainda está longe de se tornar uma realidade. Referências Chakravarthy, U., Adams, A. P., Cunningham Jr, E. T., Goldbaum, M., Guyer, D. R., Katz, B. et al. (2006). VEGF Inhibition Study in Ocular Neovascularization (V.I.S.I.O.N.) Clinical Trial Group.Year 2 efficacy results of 2 randomized controlled clinical trials of pegaptanib for neovascular age-related macular degeneration. Ophthalmology, 113, 1508-1521. Costa, R. A., Skaf, M., Melo Jr, L. A., Calucci, D., Cardillo, J. A., Castro, J. C. et al. (2006). Retinal assessment using optical coherence tomography. Progress in Retinal and Eye Research, 25, 325-353. Damico, F. M., Young, L. H., & Oréfice, F. (2005). Tratamento com corticóide intravítreo. In F.Oréfice (Ed.), Uveíte Clínica e Cirúrgica - Texto & Atlas. Segunda Edição. 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Retina, 26, 531-536. 96 Síndromes Quiasmáticas: Alterações Funcionais e Morfológicas Mário Luiz Ribeiro Monteiro 1 As síndromes quiasmáticas estão entre as causas mais importantes de perda da função visual por compressão da via óptica. O déficit visual geralmente é reversível quando tratado precocemente. Por outro lado, tais afecções podem também acarretar seqüelas em indivíduos relativamente jovens com grande repercussão funcional. Com raras exceções, o acometimento quiasmático é decorrente de tumores na região selar e supraselar, incluindo: adenoma hipofisário, craniofaringioma, meningioma, glioma, disgerminoma, aneurisma suparaselar, etc. Do ponto de vista funcional, as compressões quiasmáticas se traduzem quase sempre em perda lenta e progressiva da visão. Podem acometer todas as funções visuais incluindo acuidade visual, campo visual, visão de cores e sensibilidade ao contraste. Na maioria dos casos a acuidade visual de início se mostra preservada enquanto que o campo visual revela o característico defeito bitemporal, que permite suspeitar a lesão. Em decorrência disto, poucos são os estudos avaliando em detalhes funções visuais como a visão de cores e a sensibilidade ao contraste (Grochowicki, Vighetto, Berquet, Khalfallah, et al., 1991). Em estudo realizado em 1994, avaliando apenas olhos com acuidade 1 Docente do Departamento de Oftalmologia da Faculdade de Medicina – USP. Avenida Angélica, 1757/61 - Higienópolis - 01227.200 - São Paulo - SP. Email: [email protected] 97 visual preservada, no entanto, observamos que a sensibilidade ao contraste pode ser um método útil na diferenciação entre pacientes com defeitos campimétricos sequelares daqueles causados por compressão ativa da via óptica (Monteiro, 1994). Apesar da avaliação de campo visual ser amplamente utilizada no diagnóstico e acompanhamento das síndromes quiasmáticas, poucos são os estudos avaliando-se os métodos modernos de perimetria nestas condições. O perímetro de Goldmann é considerado o padrão de excelência para estudo de pacientes neuroftalmológicos. No entanto, o método mais utilizado atualmente é a perimetria computadorizada, especialmente pela dificuldade de se encontrar na atualidade, médicos ou técnicos bem treinados na realização da perimetria manual. Em dois estudos recentes observamos falhas na perimetria computadorizada tanto na identificação de lesões quiasmáticas discretas como avançadas quando comparada a perimetria manual (Monteiro & Pereira, 2003; Pereira & Monteiro, 2005). Esses estudos mostram a necessidade de se desenvolver novos programas e estratégias para investigação de exame para afecções da via óptica que são diferentes do glaucoma. Da mesma forma, poucos são os estudos que avaliam a perimetria de freqüência duplicada nessas afecções (Monteiro, Cunha, & Moura, 2007; Thomas, Thomas, Muliyil, & George, 2001; Wall, Neahring, & Woodward, 2002). Alterações estruturais no disco óptico e na camada de fibras nervosas retiniana (CFNR) frequentemente acompanham o desenvolvimento de perda do campo visual em pacientes com compressão quiasmática e indicam dano permanente da via visual anterior. Pacientes com lesões medianas do quiasma que afetam as fibras cruzadas com hemianopsia bitemporal, mas com campo visual nasal preservado, geralmente demonstram alterações distintas na área peripapilar. Nesses casos, as fibras cruzadas são perdidas com preservação das não cruzadas, que se originam na retina temporal e penetram o disco óptico através dos feixes arqueados superiores e inferiores. Assim, a perda da CFNR ocorre predominantemente nos setores nasal e temporal do disco óptico. Este padrão de perda é identificado à oftalmoscopia como atrofia em banda (AB) do nervo óptico e da CFNR (Unsold & Hoyt, 1980) e é importante no diagnóstico da compressão quiasmática e ao se estimar as chances de melhora do 98 campo visual após a descompressão da via óptica. Esse padrão característico de perda da CFNR pode também ser utilizado como modelo para avaliar a capacidade de um instrumento em medir, de forma acurada, a CFNR e, particularmente, nos setores nasal e temporal do disco óptico. Utilizando pacientes com defeitos campimétricos sequelares e AB do nervo óptico, iniciamos uma linha de pesquisa que permitiu avaliar várias tecnologias de estimativa da perda neural. Demonstramos que o polarímetro de varredura a laser (GDx com compensador fixo de córnea) falhou na identificação desse padrão de perda neural (Monteiro, Medeiros, & Ostroscki, 2003; Leal, Moura, & Monteiro, 2006). Recentemente, avaliamos a nova versão do mesmo aparelho com compensador variável de córnea (GDx VCC) que evidenciou melhora na performance do aparelho, embora ainda deixando a desejar na avaliação do setor temporal (Monteiro & Moura, 2007). Por outro lado, a tomografia de coerência óptica, mesmo na sua versão inicial (OCT-1), apresentou desempenho muito melhor na identificação do defeito (Kanamori, et al., 2005; Leal, Moura, & Monteiro, 2006; Monteiro, Leal, Rosa, & Bronstein, 2004). Estudos posteriores mostraram desempenho ainda melhor quando se avalia a sensibilidade e a especificidade pela área da curva ROC com a nova versão do aparelho (Stratus OCT, OCT-3) (Monteiro, Leal, Moura, Vessani, et al., 2007; Monteiro & Moura, 2007) . Essa nova versão permite também a avaliação da perda neural através da estimativa da espessura da mácula. Em estudo recente, mostramos que esta metodologia também pode também diferenciar pacientes com AB do nervo óptico de indivíduos normais. Demonstramos, ainda, que vários parâmetros maculares se correlacionam muito bem com a gravidade da perda de campo visual no setor temporal destes pacientes (Moura, Medeiros, & Monteiro, 2007). Estamos prosseguindo nessa linha de pesquisa para aprimorar as estratégias de avaliação da CFNR e da espessura macular através do OCT e, assim, compará-lo com a avaliação através do eletrorretinograma de padrão reverso. 99 Referências Grochowicki, M., Vighetto, A. Berquet, S., Khalfallah, Y., & Sassolas, G. (1991). Pituitary adenomas: Automatic static perimetry and Goldmann perimetry. A comparative study of 345 visual field charts. The British Journal of Ophthalmology, 75(4), 219-221. Kanamori, A., Nakamura, M. Matsui, N., Nagai, A., Nakanishi, Y., Kusuhara, S., Yamada, Y. & Negi, A. (2005). Optical coherence tomography detects characteristic retinal nerve fiber layer thickness corresponding to band atrophy of the optic discs. Ophthalmology, 111(12), 2055-2056. Leal, B. C., Moura, F. C., & Monteiro, M. L. R. (2006). Comparison of Scanning Laser Polarimetry, Optical coherence tomography 1 and Stratus OCT for the detection of axonal loss in band atrophy of the optic nerve. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia, 69(4), 531-537. Monteiro, M. L., Leal, B. C., Moura, F. C., Vessani, R. M., & Medeiros, F. A. (2007). Comparison of retinal nerve fibre layer measurements using optical coherence tomography versions 1 and 3 in eyes with band atrophy of the optic nerve and normal controls. Eye, 21(1), 16-22. Monteiro, M. L., Leal, B. C., Rosa, A. A., & Bronstein, M. D. (2004). Optical coherence tomography analysis of axonal loss in band atrophy of the optic nerve. The British Journal of Ophthalmology, 88(7), 896-899. Monteiro, M. L., Medeiros, F. A., & Ostroscki, M. R. (2003). Quantitative analysis of axonal loss in band atrophy of the optic nerve using scanning laser polarimetry. The British Journal of Ophthalmology, 87(1), 32-37. Monteiro, M. L., & Moura, F. C. (2007). Comparison of the GDx VCC Scanning Laser Polarimeter and the Stratus Optical Coherence Tomograph in the Detection of Band Atrophy of the Optic Nerve. Eye. Jan 26 [Epub ahead of print]. 100 Monteiro, M. L. R. (1994). Sensibilidade ao contraste em portadores de defeitos campimétricos atribuídos a tumores hipofisários. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia, 57, 339-347. Monteiro, M. L. R., Moura, F. C., & Cunha, L. P. (2007) Frequency doubling perimetry in patients with mild and moderate pituitary tumorassociated visual field defects detected by conventional perimetry. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia, 70(2), 323-329. Monteiro, M. L. R., & Pereira, A. (2003). Perimetria computadorizada na detecção de defeitos campimétricos discretos (ao perímetro de Goldmann) causados por tumores hipofisários. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia, 66, 803-809. Moura, F. C., Medeiros, F. A., & Monteiro, M. L. R. (2007). 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Investigative Ophthalmology & Visual Science, 43(4), 1277-1283. 101 Ressonância Magnética Funcional: Bases e Limitações para Aplicações Clínicas Edson Amaro-Jr. 1 A ressonância magnética funcional (RMf) é um método de imagem relativamente não invasivo que permite a localização da atividade cerebral, baseado na comparação de imagens adquiridas durante diferentes estados comportamentais. O indivíduo desempenha determinada tarefa enquanto são adquiridas imagens consecutivas do cérebro, e as diferenças entre estas são imputadas à variações de atividade cerebral relacionada a atividade de interesse. Os princípios físicos são dependentes da técnica, pode-se produzir imagens sensíveis ao fluxo sanguíneo regional cerebral, ao volume sanguíneo regional cerebral, ou à taxa metabólica de oxigênio. Todas estas formas são avaliações indiretas da função neuronal, baseadas na resposta hemodinâmica. E destas, a técnica mais utilizada é chamada BOLD – blood oxigenation level dependent, termo cunhado para designar as seqüências de pulso sensíveis à susceptibilidade magnética causada pela presença de desoxi-hemoglobina. No local da atividade elétrica neuronal, ocorre aumento de fluxo, volume e por consequinte, de oxigênio transportado pelo sangue. Porém, este acoplamento neurovascular é desproporcional, com aumento da oxigenação sangüínea maior (cerca de 30%) que o aumento do consumo de oxigênio (cerca de 5%). Assim, a concentração de desoxi-hemoglobina 1 Docente do Departamento de Radiologia, LIM-44, da Faculdade de Medicina – USP. Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 - 3º andar - Cerqueira César - 05403.001 - São Paulo - SP. http://www.nif.com.br/ Email: [email protected] 102 diminui, com conseqüente aumento do sinal em imagens BOLD (áreas que aparecem mais brilhantes). Desta maneira, a atividade cerebral é identificada pelas áreas de maior sinal através de cálculos estatísticos (o efeito é de cerca de 0,3 a 1,5 % em aparelhos de campo magnetico de 1,5 Teslas). Para realização de um estudo de RMf o instrumento (aparelho de ressonância magnetica) deve ser cuidadosamente ajustado, além do uso de programas necessários para aquisição das imagens BOLD e pós-processamento dos dados, e conhecimento das características dos indivíduos a serem submetidos ao exame . Comportamentos simples, como movimentação das mãos, sensibilidade, estímulos visuais simples podem ser avaliados adequadamente. Porém há dificuldades para aplicações clínicas e na avaliação de processos cognitivos mais elaborados. Isto ocorre devido à variação de resposta comportamental do paciente e conseqüente menor reprodutibilidade, alem da alta complexidade do experimento. A variação inter-individual e intra-individual observada em testes realizados para este fim mostra que ambas respondem por cerca de 70~80% da variação total de sinal entre sessões diferentes de RMf . Ou seja, uma mesma pessoa pode produzir resultados diferentes, a depender, por exemplo, de estratégias mentais utilizadas. Por outro lado, quanto mais complexa for a atividade realizada, maior a chance de que pessoas utilizem estratégias mentais diferentes. Ainda, a citoarquitetura cerebral é variada, e não representa as variações macroscópicas e existem diferenças morfológicas entre etnias diferentes, o que dificulta a caracterização da relação entre micro e macroscopia. Uma pessoa que fala português e realiza uma tarefa de linguagem, possivelmente produzirá atividade cerebral detectada à RMf que pode apresentar padrões diferentes de outra pessoa que fala inglês apenas porque o código de escrita é diferente. Por outro lado, desnecessário dizer que há motivações culturais diferentes para realizar determinada tarefa cognitiva, além do código (língua) de comunicação destas tarefas – o significado da palavra ' lambada' não deve ter o mesmo sentido para um brasileiro e para um chinês. 103 Desta maneira, se torna necessária a criação de bancos de dados para que aplicações clínicas de RMf possam ser embasadas . Esperamos determinar o grau de variabilidade em uma população determinada, e assim criar critérios de interpretabilidade dos dados individuais. Este desafio está sendo tratado por diferentes grupos mundo a fora, esperamos em breve resultados de esforços locais. Referências Amaro E., Jr., & Barker, G. J. (2006). Study design in fMRI: Basic principles. Brain and Cognition, 60(3), 220-232. Burgel, U., Schormann, T., Schleicher, A., & Zilles, K. (1999). Mapping of histologically identified long fiber tracts in human cerebral hemispheres to the MRI volume of a reference brain: Position and spatial variability of the optic radiation. Neuroimage, 10(5), 489-499. Buxton, R. B., Uludag, K., Dubowitz, D. J., & Liu, T. T. (2004). Modeling the hemodynamic response to brain activation. Neuroimage, 23(Suppl.1), S220-233. Fernandez, G., Specht, K., Weis, S., Tendolkar, I., Reuber, M., Fell, J., Klaver, P., Ruhlmann, J., Reul, J., & Elger, C. E. (2003). Intrasubject of presurgical language lateralization and mapping using fMRI. Neurology, 60(6), 969-675. Fox, P. T., & Raichle, M. E. (1986). Focal physiological uncoupling of cerebral blood flow and oxidative metabolism during somatosensory stimulation in human subjects. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, 83(4), 1140-1144. 104 Friedman, L. & Glover, G. H. (2006). Report on a multicenter fMRI quality assurance protocol. 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