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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA INTERUNIDADES ECA/FAU/FFLCH PAULO CEZAR BARBOSA MELLO HIPERARTE, UMA POÉTICA DO SUPORTE PERCEPÇÃO ESTÉTICA São Paulo 2006 3 4 PAULO CEZAR BARBOSA MELLO HIPERARTE, UMA POÉTICA DO SUPORTE PERCEPÇÃO ESTÉTICA Dissertação apresentada ao Programa Interunidades em Estética e História da Arte - ECA/FAU/FFLCH - da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de Mestre em Estética e História da Arte. Área de concentração: Produção e Circulação da Arte Orientador: Profª Drª Élide Monzéglio / Prof. Dr. Artur Matuck São Paulo 2006 5 AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO MELLO, Paulo Cezar Barbosa. Hiperarte, uma poética do suporte: Percepção estética / Paulo Cezar Barbosa Mello: orientador: Profª Drª Élide Monzéglio / Prof. Dr. Artur Matuck - São Paulo, 2006 xxx f. Dissertação (Mestrado - Programa Interunidades em Estética e História da Arte ECA/FAU/ FFLCH - Universidade de São Paulo. Área de Concentração: Produção e Circulação da Arte. 1. Arte 2. Comunicação 3. Hipermídia 4. Estética 5. Ciberespaço 6 Folha de Aprovação Dissertação apresentada ao Programa Interunidades em Estética e História da Arte - ECA/FAU/FFLCH - da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de Mestre em Estética e História da Arte. Área de concentração: Produção e Circulação da Arte Aprovado em: __________________ Banca Examinadora Prof. Dr. ________________________________________________________________ Instituição: ________________________ Assinatura:____________________________ Prof. Dr. ________________________________________________________________ Instituição: ________________________ Assinatura:____________________________ Prof. Dr. Artur Matuck Instituição: USP / Orientador Assinatura:____________________________ 7 8 Dedicatória Dedico este trabalho a todas as pessoas que com certeza influenciaram direta e indiretamente o conteúdo deste material, alunos e amigos. Dedico e agradeço especialmente a Reinaldo, companheiro dos bons e maus momentos, que além de incentivar muito, ainda acreditou em mim e em meus absurdos. Dedico aos meus pais Ada e Waldir (†), sem os quais eu jamais teria chegado até aqui ou sequer sonharia em continuar. Agradeço ao professores Artur Matuck por sua contribuição na melhoria deste material e na continuidade depois da enorme perda da professora Élide. E, sem qualquer demagogia, dedico esta vitória à Professora Élide, alma bondosa e iluminada que com muita paciência e determinação me trouxe até aqui. 9 10 “(...) SE TUDO JÁ FOI FEITO, NÃO VALE A PENA FAZER MAIS NADA. A ARTE MORREU. – ESTA FRASE ASSIM DITA OU COM OUTROS ARABESCOS, REPETE- SE NA BOCA DE ALGUNS CRÍTICOS E ARTISTAS. MAS O QUE É CERTO, É QUE A VERDADEIRA ARTE TEM A CAPACIDADE DE SE REINVENTAR, APARECENDO SEMPRE IMACULADA DE UM QUALQUER COPISTA BARROCO. A ARTE SOBRE- VIVERÁ À EXTINÇÃO DO PRÓPRIO HOMEM, MESMO SENDO ELE O SEU ÚNICO FRUIDOR.” DELFIM RODRIGUES, ARTISTA PLÁSTICO PORTUGUÊS, EM SEU BLOG DE 25 DE ABRIL 2004. 11 12 “A PALAVRA OU LÍNGUA, ESCRITA OU FALADA, PARECE NÃO TER NENHUMA IM- PORTÂNCIA NO MECANISMO DO MEU RACIOCÍNIO. OS ELEMENTOS PSÍQUICOS BÁSICOS DO PENSAMENTO SÃO SINAIS DETERMINADOS E FIGURAS MAIS OU MENOS CLARAS, QUE PODEM SER REPRODUZIDOS OU COMBINADOS (À VONTA- DE)”. ALBERT EINSTEIN 13 14 Resumo Mais do que a evolução natural das comu- vez melhor colocadas como cognição. nicações, a informática tornou-se um forte aliado. A tecnologia e suas aplicações tornaram-se extensões do ser humano, o ver- Se em um ambiente digital tudo é comunidadeiro braço direito. Sua aplicabilidade tor- cação, tudo é diálogo, tudo é interface, a arte nou-se tão necessária quanto viciante. é necessária, não apenas como validação ou valorização do meio, mas principalmente como referencial estético. A proposta prin- Longe de ser uma crítica, mas sim uma cipal desta pesquisa não é o de apenas aponconstatação de fatos, esta pesquisa pontua tar novos paradigmas, mas também ver os conceitos estéticos oriundos das novas como a integração da arte-tecnologia resultecnologias e da arte e mostra a hipermídia ta – pois ainda tem muito mais potencial a como meio de comunicação, expressão e pro- ser desenvolvido – em novos conceitos esdução artística. téticos, ampliando a percepção e a comunicação contemporânea globalizada. Traçando paralelos de conceitos artísticos, desde os já consagrados como as cavernas de Altamira até as webartes, passando pelas críticas modernistas e contemporaneidade da arte digital, obtém-se dados interessantes para discussões, para parametrização de estilo e novas perspectivas da percepção, tal15 Abstract More than just natural evolution of the If in the digital environment everything is communications, computer science became communication, everything is dialog, an ally. The technology and its applications everything is interface, art is necessary, not had become extensions of the human being, only for validating or valuating the media, a real right arm. Its applicability became so but especially as aesthetical reference. The necessary as addictive. Not even close of aim of this research is not only pointing new being a criticism but just a fact statement, paradigms, but also see how the interaction this essay points aesthetical concepts of art-technology produces – because there deriving from art and new technologies is a lot yet to be developed – new aesthetical showing hypermedia as a communication, concepts, increasing perception and the globalized contemporary communication. expression and art producing media. Comparing consecrated artistic concepts such as Altamira Caves thru web arts, mentioning modern critics and the contemporary digital art, there comes interesting facts for discussions, for parameterize styles and new perspective of perception, better said as cognition perhaps. 16 Índice Introdução ...................................................................................................................................... 20 Hipermídia ..................................................................................................................................... 27 Entendendo A Hipermídia ................................................................................................. 27 História Da Hipermídia ..................................................................................................... 34 Hipermídia Como Suporte Criativo .................................................................................. 39 Percepção Estética: Cognição ....................................................................................................... 44 Arte Digital no Ambiente Hipermidiático ................................................................................... 51 Automatic Drawing ............................................................................................................ 55 Seis propostas para o próximo milênio ............................................................................ 57 Hiperarte - Projeto digital ............................................................................................................. 59 Conclusão ....................................................................................................................................... 61 Anexos ............................................................................................................................................. 63 Projeto Virtus ...................................................................................................................... 63 Cronologia do hipertexto/hipermidia ............................................................................... 65 Depois do hiper ................................................................................................................... 84 Kubla Khan Or, A Vision In A Dream. A Fragment. ....................................................... 88 Percepção - Patologia ......................................................................................................... 89 Bibliografia ..................................................................................................................................... 94 17 Índice de Imagens fig1> Charles Babage .................................................................................................................... 20 fig2> Herman Hollerith ................................................................................................................ 20 fig3> ENIAC .................................................................................................................................. 21 fig4> O surgimento da internet ainda com conexões restritas - Cirandão .............................. 23 fig5> Mais detalhes no anexo - Projeto Virtus ........................................................................... 27 fig6> http://www.cybertown.com - site com as idéias e discursos de Hilf ............................... 33 fig7> páginas dos manuscritos de Da Vinci ................................................................................ 34 fig 8> desenho esquemático do MEMEX .................................................................................... 35 fig 9> nota onde aparece pela primeira vez o termo hipertexto ............................................... 35 fig 10> Montagem baseada na apresentação de Egelbart e o NSL .......................................... 36 fig 11> Livros TRUE NAMES e NEUROMANCER .................................................................... 37 fig 12> http://www.dkolb.org - site particular de David Kolb onde ele mantém suas publicações. ............................................................................................................................. 38 fig 13> O Beijo (1967) de Waldemar Cordeiro - Novos conceitos. ........................................... 40 fig 14> automatic drawing (1) ...................................................................................................... 55 fig 15> automatic drawing (2) ...................................................................................................... 55 fig 16> automatic drawing (4) ...................................................................................................... 56 fig 17> automatic drawing (3) ...................................................................................................... 56 fig 18> seis propostas para o próximo milênio (1) ..................................................................... 57 fig 19> seis propostas para o próximo milênio - escolha da língua ........................................ 57 fig 20> seis propostas para o próximo milênio - menu ............................................................. 57 fig 21> seis propostas para o próximo milênio - apresentação da proposta ............................ 57 fig 22> seis propostas para o próximo milênio - rapidez .......................................................... 58 fig 23> seis propostas para o próximo milênio - exatidão ......................................................... 58 fig 24> seis propostas para o próximo milênio - visibilidade ................................................... 58 fig 25> seis propostas para o próximo milênio - multiplicidade .............................................. 58 fig 26> seis propostas para o próximo milênio - velocidade ..................................................... 58 fig 27> seis propostas para o próximo milênio - finalização .................................................... 58 fig 28> hiperarte - tela de abertura automática ......................................................................... 59 fig 29> hiperarte - introdução ...................................................................................................... 59 fig 30> hiperarte - convite à criação ou colaboração ................................................................. 60 fig 31> hiperarte - área de criação .............................................................................................. 60 18 19 Introdução As “engenhocas” facilitadoras da vida moderna surgem em 1642 com Blaise Pascal e sua máquina de calcular, que com o auxílio de engrenagens e motores mecânicos, conseguia apenas somar. Em 1694 (52 anos depois) Leibniz consegue fazer uma máquina que multiplique, além de somar. A compu- Os avanços tecnológicos certamente causa- tação mecânica tem seu avanço lento, conram, e causam, mudanças significativas no seguindo apenas em 1820 a efetivamente ser humano e em toda a sociedade. Presen- realizar as quatro operações aritméticas báça constante e atuante no dia-a-dia, o com- sicas. O surgimento dos computadores da fig1> Charles Babage putador já é visto como forma de expressão, forma como são conhecidos hoje se deu em registro e comunicação. Marco da 1812 com o projeto de Charles Babbage e contemporaneidade, o computador trouxe sua busca pela “harmonia natural entre máquinas e matemática”, na qual as operações variações às formas de se pensar. matemáticas repetitivas poderiam ser desenvolvidas com mais agilidade e confiabilidade Computador, como definido pelo Dicioná- pelas máquinas do que pelos homens. rio Brasileiro Globo, é “Aquele que faz contas”. Porém, hoje em dia, as operações que podem ser realizadas por um computador Em 1889, com o intuito de reduzir o tempo vão bem além da trivialidade algébrica ex- do censo demográfico nos Estados Unidos pandindo os motivos de sua invenção. de 7 anos para 6 semanas, Herman Hollerith, desenvolveu uma máquina que além da agilidade conferida ao processo, ins- Historicamente, o primeiro artefato humano taurou a idéia de cartões perfurados como utilizado para realizar contas foi o ábaco, com forma de armazenamento de dados. Apesar sua origem na Ásia Menor, 500 anos atrás, de toda evolução, a demanda de espaço para sofrendo grande diminuição na Europa, em estas maravilhas mecânicas era muito granfunção da massificação do papel e caneta. de. Em 1903 surge o conceito binário com a 20 fig2> Herman Hollerith adoção da álgebra booleana, conceito utili- zer ao computador para que ele realizasse zado até hoje. Mas foi apenas a partir da II as funções desejadas. Estebelecia-se então Guerra Mundial que o desenvolvimento dos as linguagens de máquina, algo então computadores eletrônicos cresceu ainda completamente fora dos padrões humanos. mais. Os alemães, de um lado, desenvolve- Porém, a aproximação da linguagem a algo ram o Z3 capaz de projetar aviões e mísseis. um pouco mais palatável, fez com que a poDo outro lado, os britânicos desenvolveram pularidade das máquinas se tornasse mais o Colossus para a decodificação das mensa- real. A popularização das máquinas chegou ao ápice, na década de 80, com a invenção gens nazistas. fig3> ENIAC dos sistemas operacionais gráficos, que permitem diferentes programas serem execuO marco, no entanto, fica com o ENIAC sur- tados simultaneamente – os ambientes gido a partir da Guerra Fria. Seu porte era multitarefa. Esta característica permitiu uma tamanho que consumia energia equivalente flexibilização nos preços e tornaram os coma um bairro inteiro da cidade da Filadélfia. putadores muito mais amigáveis. Sua relevância está na falta de propósito único. Ele era muito mais abrangente. Muito O ambiente gráfico garantiu que o avanço mais próximo da atualidade. tecnológico, a velocidade de processamento e transmissão de dados sejam cada vez maiO salto para a modernidade e a portabilidade or. Isso possibili- deu-se a partir da substituição das válvulas tou que os con- para os transistores, o que definitivamente teúdos acessí- alavancou a idéia do projeto atual dos com- veis pelo compu- putadores, compostos por uma unidade cen- tador não este- tral e diversos periféricos. jam mais subordinados ao textual apenas, po- Esta “modernização” complicou um pouco dendo apresen- mais com a necessidade de saber o que di- tar-se de inúme- 21 ras formas, mais próximas do cognitivo hu- ram e perseguiram aqueles que ousavam mano, como sons, animações e principalmen- compactuar com tamanha heresia, atualte imagens. Esta realidade acontece de tal mente o oposto se dá. maneira que atualmente ícones, interfaces e imagens, que antes eram restritos ao computador estão cada vez mais presentes nas Diante das novas percepções o homem pasexperiências cotidianas. sou a integrar cada vez mais a facilidade gerada pela máquina com seus afazeres mais comezinhos. “O homem social, ser liA expansão dos computadores e suas carac- mitado pelas características do individualisterísticas fizeram com que não só os recur- mo”1 vale-se desta ‘novidade’ e expande seu [ 1 Feuerbach, 1988, p. 194] sos físicos (hardware) crescessem, mas tam- territorialismo. O computador deixa de ser bém a variedade dos dados gerados. As no- um mero aparato, ou simplesmente uma vas informações geradas por estes dados cria mídia e passa a ser mais um ‘ambiente’. Este novas necessidades na comunicação ampli- novo ambiente é repleto de informações, ando as formas de se comunicar. O compu- ações e estímulos, onde o que importa de tador diminuiu a distância entre as pessoas. fato é a comunicação, a expressividade. Criou-se uma rede mundial de modo que o homem passa a ter diferentes necessidades. O termo virtual passa a ter uma outra A digitalidade moderna, o intenso uso e até conotação. Esta é a base do uso das redes certo ponto dependência do computador, de computadores, a Internet. quebrou e ao mesmo tempo criou novos paradigmas. A idéia da rede mundial criou novas possibilidades inclusive pessoais e A sociedade migra suas percepções para a particulares. O conhecimento e experiência nova realidade. Até a década de 70, o com- neste novo lugar2 revelam o mimetismo do putador era tido como vilão, pois substitui- homem com suas criações. A necessidade ria o homem. Atualmente a palavra de or- de que a máquina pense e seja mais próxidem passa a ser “interage” com o homem. ma do ser humano, criou novos processos e Críticas severas contra a tecnologia segui- modelos mentais com desenvolvimento con22 [ 2 refiro-me ao termo literal do utilizado em inglês - site] tínuo, constante, baseada na psicologia diáticos”, surgidos com o advento do comcognitiva e na própria ergonomia humana. putador uniu-se ao “bum” da Internet, a rede mundial, ampliaram a percepção do homem no quesito espaço e atuação. O “reO ambiente digital no qual o homem hoje ceptor” passa a ser “emissor” quebrando vetransita é muito próximo às reações huma- lhos paradigmas de quem faz e quem recenas. Um ambiente onde o termo virtual ga- be. nha vida e forma, pois a informação é constante, tudo é informação. Os mapas mentais, até então restritos à capacidade humana, A ampliação das potencialidades da atuaextrapola seus limites e torna-se parte do ção humana, principalmente através dos noambiente. A restrição do pensamento linear, vos dispositivos de meios de comunicação, já confrontado pela teoria da relatividade resultou em novas formas de conceber o desaparece. O pensamento não é linear, pensamento. A linearidade do pensamento como pode então uma representação men- já não é mais uma alternativa. A leitura não tal ser? A multiplicidade do pensamento de- está mais restrita a uma única direção, mas manda formas diferentes de representação, sim a múltiplas e concomitantes direções. exige principalmente integração e interação. A multimídia, utilização de vários recursos (visual e sonoro, simultâneo) dentro do novo espaço evolui, o assunto é hipermídia, onde A partir da década de 90, o homem passou a a preocupação é a informação percebida, se envolver cada vez mais com os recursos não apenas recebida. Em um mesmo “amtecnológicos, fazendo dele uma extensão do biente” é possível expor o “receptor” às mais seu pensamento. Bem antes disso, na déca- diversas formas de informação, através da da de 60 Marshall MacLuhan já havia pre- união de diversas linguagens (escrita, visuvisto esta “aldeia global”. A televisão seria al, sonora etc). A exposição à informação em este ponto de união. A idéia da Tele-Visão, muitos níveis de apresentação e apronão fora modificada, apenas ampliada. Som fundamento privilegia outros modos de fig> 4 O surgimento da internet ainda com conexões restritas Cirandão e imagem à distância, associada à cognição que não apenas o textual. A ênfainteratividade. Os recursos “multimi- se em conceitos como a não-linearidade, a 23 utilização de objetos visuais, confirmando a dência das releituras através do tecnológico preocupação cognitiva aliada ao projeto de permite a migração do real para o virtual, interface reforça o caráter artístico da nova criando uma nova realidade sobre a obra de arte e sua percepção. mídia, a hipermídia. Este novo ambiente – Hipermídia – é exata- “QUANDO mente a resultante de uma ideologia pósmoderna, a qual pressupõe uma reflexão DÊNCIAS E DOS RUMORES TORNA-SE O MUNDO REAL”. sobre o tempo e o espaço. A busca do novo e de novos recursos, não apenas físicos, mas principalmente sígnicos, abrem precedentes para a utilização da hipermídia como forma de fazer arte. A INFORMAÇÃO SE MOVE A UMA VELOCIDADE ELÉTRICA, O MUNDO DAS TEN- (MACLUHAN, 1992 P:98) Como lidar com a nova realidade estética? E como pensar a autoria? Tem “Valor” (entenda-se o Valor definido por Benjamin) a obra feita no e para o Hiperespaço? Existe de verdade uma ruptura entre a estética e o técni- Através do “fazer ” pós-moderno, que se apropria do passado, a tecnologia migra de recurso para linguagem, reafirmando que o meio é sim a mensagem. Esta confirmação denota a relevância artística atribuída ao ambiente surgido. Este discurso, nada inédito, é a repetição das críticas estéticas atribuídas à fotografia, ao cinema e em décadas mais recentes ao vídeo. co? O pensamento sobre o novo ambiente incita a revisão da filosofia do conhecimento. A estética já não está mais atrelada à técnica, mas sim ao meio. A tecnicidade que a contemporaneidade nos presenteia abre debates para questões estéticas infindáveis, novos paradigmas devem ser observados. A arte, que antes era privilégio de poucos faz parte do dia-a-dia de milhares, por que não de milhões de pessoas através da hipermídia. A cena pós-moderna é essencialmente tecnológica (leia-se cibernética, informática e diversos outros rumos tecnocratas). A ten- A facilidade que o computador proporcionou na integração de elementos, mensagens 24 e estímulos através da multimídia, se eleva humano – pinturas, esculturas, música, teà enésima potência com as possibilidades da atro, dança, literatura e cinema – esta prehipermídia, um ambiente totalmente volta- sente na hipermídia também. do à percepção e à comunicação. Uma informação migrada do analógico para o digital ganha repercussões inimagináveis, além de A hipemídia extrapola o conceito de meio de se identificar em uma nova forma do saber a exposição ou publicação, os artistas acabam qual reúne os mais diversos assuntos. Deve- por aproveitar suas características como forse levar em conta neste pensamento estéti- ma estética de composição. Não só artistas, co a união que não só às artes é permitido, mas instituições como museus e empresas inmas a todas as outras ciências. teressadas em cultura e comunicação. A contemporaneidade descortinou, e conti- Com o desenvolvimento tecnológico e parnua abrindo, olhares diferentes sobre a his- ticularmente o aparecimento da internet no tória e sobre a produção, não só artística, mas mundo das telecomunicações, novas formas total. As possibilidades que o novo ambien- de expressão artística surgiram e continute proporciona ao fazer artístico ainda são am surgindo ao longo de mais de trinta anos, ínfimas em função de preconceitos e precei- é a Ciber Arte, é a Arte Eletrônica, é a Web tos teórico-disciplinares que ainda não uti- Arte e muito mais. lizam ou não permitem a expansão do território das artes. Cabe aqui uma distinção entre arte na internet e arte da internet. Enquanto a priA arte contemporânea vem se construindo a meira utiliza formas previamente criadas e partir dos novos referenciais tecnológicos da apenas as disponibiliza na rede, a segunda contemporaneidade. Pode-se observar em depende na sua realização e execução da diversas áreas artísticas, a utilização híbrida existência deste meio, pois toda ela se dede artes e tecnologias. O termo Arte, que senvolve nele. abrange as mais diversas atividades do ser 25 A hipermídia está além de simples meio de comunicação. Há que se entender o que há por trás da hipermídia. Como ela surgiu? Quais são seus paradigmas? Para assim entender um pouco mais sobre como reagimos frente a essa realidade. 26 Hipermídia Entendendo a Hipermídia Baseado em vários autores e diferentes idéias, define-se a hipermídia e as características que definem o ambiente hipermidiático, explicando os processos de comunicações existentes, assim como a intenção de pro- Antes de discorrer sobre as origens da vocar acessos à memória visual do usuário hipermídia é necessário entender sua ação, apoiando em Flusser quando descreve a exsua forma de processamento e o que alguns ploração ao caminhar sem mapa, e o “labiautores definem como sendo este novo am- rinto” de Pierre Rosenstiehl, uma vez que biente e suas características. esta jornada não é linear. Este capítulo, ainda aborda a hipermídia Entende-se então que a hipermídia seja a como ambiente criativo, mesclando à mídia convergência de multimídias interativas e a estética, gerando uma nova linguagem ar- não seqüenciais, a fusão de signos verbais e tística, finalizando com um olhar sobre a arte não-verbais com o texto escrito (livros, perigerada por este novo ambiente. ódicos, jornais, revistas), o audiovisual (televisão, vídeo, cinema) e a informática (computadores e programas informáticos), ou seja, O enfoque apresentado aqui é uma das pos- representações de todas as matrizes da linsíveis linhas de pensamento e entendimen- guagem (matriz sonora, matriz visual, mato sobre o que é a hipermídia. Dada a carac- triz verbal), de acordo com Lucia Santaella. terística comunicacional do meio, é comum encontrar pesquisadores da Semiótica, exfig5> Mais detalhes no anexo - Projeto Virtus plicando o que é e o que deixa de ser este Para efeitos de pesquisa e orientação de estuespaço. A linha aqui escolhida é justamente dos, adotou-se a linha dos conceitos discutia que melhor aborda a questão estética do dos no projeto Virtus, onde um ambiente meio em função da expressão e de seus usos. 27 hipermidiático pode ser definido a partir de as, articula-se e decifra-se gestos, atitudes, quatro características básicas que o determi- movimentos e o deslocamento no espaço, nam como tal e resumem suas peculiarida- onde cada ação diz o que diz por que é tamdes: multiplicidade, acessibilidade, bém resultante de uma história, de interações e de interferências. conectividade e interatividade. Estas características não devem ser enten- A mídia secundária é constituída por meios de didas como etapas a serem seguidas ou itens comunicação que transportam a mensagem ao obrigatórios de ambientes hipermidiáticos, receptor sem que este necessite de um aparato mas como elementos próprios da sua natu- para captar seu significado; apenas o emissor necessita um aparato (ou suporte). São mídias reza do ambiente. secundárias a imagem, a escrita, o impresso, a gravura, a fotografia e seus desdobramentos A multiplicidade está relacionada com a pos- como carta, panfleto, livro, revista ou jornal. sibilidade de se utilizar diferentes estímu- Também são mídias secundárias as máscaras, los para transmitir uma mensagem. Essa ca- pinturas e adereços corporais, roupas, a utiliracterística pode ser bem compreendida zação do fogo e da fumaça (incluindo os fogos de artifício e fogos cerimoniais, velas etc.), os analisando-se a multimídia. bastões, a antiga telegrafia ótica, bandeiras, brasões e logotipos, pinturas e quadros, o carDe acordo com Harry Pross, em taz, o bilhete, o calendário, entre outros. Medienforschung (1971), a multimídia é composta por mídias primárias, secundárias e terciárias. Pross propõe uma classificação dos A mídia terciária “são os meios de comunicação que dependem de aparelhos tanto do sistemas de mediação da chamada mídia. lado do emissor quanto do lado do receptor”. Aí estão a telegrafia, a telefonia, o ciO corpo é a “mídia primária” do homem. Em nema, a radiofonia, a televisão, a indústria comunicações cotidianas com outras pesso- fonovideográfica e seus produtos, compu28 tadores, discos, fitas magnéticas, CDs, fitas ráter de novidade ou por sua natureza lúdica de vídeos, DVDs etc. vertiginosa. As reflexões sobre a mídia terciária têm ocu- Considerando-se a comunicação humana pado grande parte dos estudos da comuni- um sistema e sua complexidade, sabe-se que cação humana. Sobretudo as manifestações a cumulatividade é um de seus princípios mais recentes e os desenvolvimentos da fundamentais, permitindo assim a constituitecnologia da comunicação têm merecido a ção de uma memória. atenção dos investigadores, seja por seu caA evolução das tecnologias da informação e o domínio crescente das tecnologias “multimídias” pela sociedade, possibilitam a produção de material informacional de forma ágil, dinâmica, em grande quantidade e com infinitas possibilidades de combinações e novos significados, tornando a leitura mais rica, diversa e mais próxima do receptor. A acessibilidade trata do acesso distribuído e disseminado aos sistemas de informação que marcaram o século XX. A Grande Rede é o melhor exemplo de sistema de informação e ainda dinâmica, pois permite a interação homem-máquina-homem. 29 Considerando que, segundo Hirsch, siste- quando analisado como um todo, demonsma “é qualquer objeto de estudo composto tra claramente a idéia de estrutura objetiva, por mais de uma parte, e que respeite a con- complexa, sistêmica, assim como a imagidição de que haja interação entre essas par- nação. A metáfora do labirinto poderia ser o tes”, e que sistemas dinâmicos são aqueles próprio pensamento. que têm seu estado alterado com o tempo a partir do relacionamento entre as partes do sistema, pode-se compreender o processo de Vilém Flusser descreveu que a imaginação, comunicação humana como um sistema di- embora limitada por paradigmas, é muito nâmico composto por vários subsistemas elástica sendo capaz de coisas surpreenonde as partes que interagem e se alteram dentes, podendo ultrapassar as limitações são, basicamente, as pessoas e as da chamada ‘ realidade’, e estabelecer, tecnologias. E por fazer parte do sistema, é além, uma multidão de mundos. Os muninevitável que as pessoas tenham acesso dos imaginários serão tão ou mais consisfacilitado à informação e aos sistemas en- tentes do que o mundo da ‘realidade’, desvolvidos. de que a imaginação criadora de mundos seja informada pelo rigor da atividade do intelecto. A conectividade trata das interligações explícitas entre diferentes sistemas e abre portas para uma nova forma de narrativa base- A recuperação de estr uturas de ada em estruturas segmentadas que se fun- memorização, diagramas ou arquétipos dem não apenas a partir da intenção daquele para auxiliar na organização da atividaque as projeta, mas principalmente dos in- de intelectual é uma forma de impor riteresses daquele que a está consultando. gor, estruturando e apoiando diretamente o pensamento, as escalas de valores e o comportamento individual. Descobrir e O labirinto é uma das metáforas da investigar esses modelos ou arquétipos hipermídia.O labrinto denota sempre a idéia não significa, segundo Flusser, render-se de confusão de segredo, de obscuro, porém 30 a eles, mas, muito pelo contrário, trazê- mitação seja ignorada e a interação decorra los à tona do intelecto. Assim sem comprometimentos, possibilitando tam- intelectualizado, o homem não terá sido bém da interação a manipulação da inforaniquilado, nem libertado do seu peso, mação ou mesmo do ambiente. mas sim, terá ampliado o território do seu intelecto, e, com isso, o território da atividade mais característica - e, por que não A navegação é um ato mais próximo de camidizer mais nobre - do homem. nhar e interagir com corredores, escadas, portas e objetos diversos. Recursos que complementam textos e gráficos são sons, Pensar é, num certo sentido, também percor- vídeos, ferramentas de interação e, principalrer um labirinto (de idéias, de memórias, de mente, o hipertexto, utilizados em conjunto criações da imaginação etc), é investigar para uma perfeita ambientação para facilitar exaustivamente e descobrir alternativas, é ain- a experiência do usuário. da explorar as várias possibilidades e examinar o problema de todos os seus ângulos. A tecnologia disponibilizou o aporte técnico. Memórias de acesso aleatório e disposiA interatividade é a pos- tivo de armazenamento não-linear possibisibilidade de fornecer litam a recuperação interativa dos dados e feedback imediato, ou permitem que o processo de leitura seja seja, cada ação corres- cumprido como um percurso definido pelo ponde a uma reação pra- leitor-operador onde todos os dados apreticamente simultânea da sentam-se de forma simultânea. máquina. A interatividade mimetiza a ação homemhomem, prevendo as múltiplas respostas e possibi- “TODAS AS DIREÇÕES SÃO EQUIVALENTES, O lidades de combinação de TERRITÓRIO, VIAGEM A UM ESPAÇO DE DA- ações, para que assim a li- DOS 31 ESPETÁCULO SE TORNA A EXPLORAÇÃO DE UM (...) NÓS NOS DESLOCAMOS NUM ES- PAÇO DE IDÉIAS, NUM MUNDO DE PENSAMENTO E DE IMAGENS TAL COMO AQUELE QUE EXISTE NO CÉREBRO E NÃO NO PROJETO DE UM URBANISTA” - (BILL VIOLA 1988 P.71) leitura foram lançadas sobre o mundo. Um novo alcance para o imaginário, uma nova leva de discursos icônicos, que ao mesmo O leitor da hipermídia é um leitor-ativo, que utiliza uma troca, interativa e multimodal, tempo, que recodificam as imagens dos períodos anteriores. onde ele, a obra e o autor sofrem fortes alterações. De acordo com Couchot, “o triângulo delimitado tradicionalmente pela obra, o autor e o espectador vêem sua geometria questionada. Para conservar a metáfora, dir-se-á que este triângulo tende a se tornar um círculo (...) Sobre esse círculo móvel, a obra, o autor e o espectador não ocupam mais posições estritamente definidas e estanques, mas trocam constantemente estas posições, cruzam-se, confundem-se ou se opõem, contaminam-se (...) Certamente não se vê nunca duas vezes o mesmo quadro, mas a imagem interativa, e o próprio quadro que muda no seu existir sen- O novo leitor deste mundo, é um leitor-ativo, como possuindo duas atitudes de navegação: A primeira é a ‘caçada’. Procura-se uma informação precisa, que deseja obter o mais rapidamente possível. A segunda é a ‘pilhagem’. Vagamente interessados por um assunto, mas prontos a nos desviar a qualquer instante de acordo com o clima do momento, não sabendo exatamente o que se procura, mas acabando sempre por encontrar alguma coisa, deriva-se de site em site, de link4 em link, recolhendo aqui e ali coisas de interesse. [ 4 Link é o terno original em inglês, que manteve-se inclusive em todas as traduções e no seu uso cotidiano. Em um purismo da língua poderiase pensar em termos como ligações, ou mesmo elo mas manterei o termo original.] Esta leitura em forma de mergulho em meio [ 3 LEÃO, 1999 p:42] sível – aos olhos de todos – e não somente na interpretação do observador3”. a informações ligadas entre si pelo usuário, As novas mídias voltadas para a produção audiovisual, baseadas nos meios eletrônicosdigitais, desenvolveu novos paradigmas sobre a cultura “tradicional”. Juntamente com as reformulações oriundas destes novos recursos, novas perspectivas, novas formas de só é permitido em função da arquitetura não linear das memórias de computador, as quais viabilizam informações concatenadas, dotadas de uma estrutura dinâmica que as torne manipuláveis interativamente de forma combinatória, permutacional e interativa. Nesta navegação textos, sons e imagens (es- 32 táticas e em movimento) estão ligados entre fazem deste ser humano um interator em si por elos probabilísticos e móveis, que po- potencial, um possível co-produtor de uma dem ser configurados pelos receptores de di- obra que, por sua vez, tornar-se-a elemento ferentes maneiras, de modo a compor obras para outro leitor-operador que pode acresinstáveis em quantias infinitas. centar outros repertórios e vir a produzir uma nova obra, não inacabada, possibilitando uma infinidade de outras obras. A Hipermídia é considerada como um dos formatos eletrônicos mais interativos, pela intertextualidade entre a forma e o conteú- Um documento hipermidiático não exprime do das linguagens artísticas, antes compar- jamais um único conceito no sentido de uma timentadas como as artes plásticas, o teatro verdade dada através de uma linha de racioe o cinema. cínio; ele se abre para uma experiência plena do pensamento e da imaginação como um processo vivo que se modifica sem cessar, que [ 5 Esta idéia é bem definida em “Beginning, midle, and end - not necessarily in that order ” (http://www.cybertown.com/hilf.html) acessado em fevereiro de 2004. Neste material Hilf explica o processo de comunicação na hipermídia.] Segundo Willian Homer Hilf , o fato de o usu- se adapta em função do contexto, que enfim ário em alguns formatos não poder desfrutar joga com os dados disponíveis. 5 de imersão diminui a interatividade, pois o autor, ao desenvolver o tema sobre o desenvolvimento da linguagem do teatro para o cinema, Sendo assim, o labirinto não está pronto. e desse para o cinema interativo, descreve Nunca está pronto. Não se deve esperar que como esses meios progressivamente propicia- o caminho, que se bifurca continuamente, ram a imersão possibilitando à platéia tenha fim. Ele é um espaço que se desdobra experimenciar o que é mostrado na tela. diante dos passos de quem o percorre. O interator só pode exercer sua mobilidade virtual, se existir uma imobilidade no ato de A necessidade natural do ser humano de estar sentado diante de uma máquina. Esta interagir, a curiosidade da criança, a vonta- imobilidade se cria por meio das sensações fig6> http://www.cybertown.com - site com as idéias e discursos de Hilf de de tocar, a riqueza de sensações despertadas nos sentidos deste interator. provocadas em uma experiência interativa, 33 Estas sensações não são de exclusividade pois a leitura é feita de interconexões à meda hipermídia. O ser humano vem, há tem- mória do leitor, às referências do texto, aos [ 7 Ver Cronologia do Hipertexto em anexos para mais detalhes.] pos, desenvolvendo formas de expandir o índices e ao index que remetem o leitor para próprio conhecimento através de recursos fora da linearidade do texto” extras. Há que se ver um pouco mais das origens da hipermídia para tanto. A idéia de textos relacionando com outros ou fazendo diferentes menções a outros externos não é nada novo7. Da Vinci é uma boa referência desta idéia. Seus cadernos História da Hipermídia manuscritos continham as explicações e anotações todas lateralmente de modo a cri- fig7> páginas dos manuscritos de Da Vinci É importante ter em mente que os termos ar novas referências a cada leitura. Ainda hipertexto e hipermídia, dada a sua proxi- confirmando a antigüidade desta metodo8 midade acabam por fundirem-se, até mes- logia podemos lembrar de Aldo Manúcio , mo confundindo suas origens. A hipermídia, o tipógrafo veneziano que inventou o estreito como visto anteriormente e de acordo com caractere itálico, incluindo notas de rodapé a definição de Lucia Santaella, é a junção e referências textuais no próprio livro, simdo Hipertexto com a multimídia, justifican- plificando-os. Antes das notas de rodapéos livros eram grandes e pouco portáveis, pois do até certo ponto esta confusão. [ 8 MANÚCIO (o velho), Aldo (1448-1515) - Famoso impressor italiano nascido em Bassano, o mais ilustre da sua família, que inspirando-se no manuscrito das Rimas de Francisco Petrarca, criou a cursiva itálica, para a obra de Virgílio, impressa em 1501. Um ano depois, esta obra seria aperfeiçoada e divulgada por Cláudio Garamond. Estabeleceu-se em 1494 em Veneza, com 45 anos de idade, com a ajuda do Príncipe Alberto Pio de Capri, onde fundou em 1500 a célebre Academia Aldina, para realizar a revisão de manuscritos gregos e latinos antigos antes de serem impressos.] eram acompanhados de todos os comentá- rios e críticas relevantes dos diversos leitoHipertexto entende-se aqui como uma estrutura textual organizada e inter-relacionada através de itens-chave chamados de links ou nós. A cada link estabelece-se uma linha de res como adendo. Benjamin, já em 1978 também demonstra a idéia da inter-relação textual expandindo a idéia dimensional do texto no fichário. compreensão individual, dando à leitura uma seqüência não-linear. Lemos6 reforça que todo texto escrito é um hipertexto onde “o leitor se engaja num processo também hipermidiático, 34 “O FICHÁRIO MARCA A CONQUISTA DA ESCRI- TA TRIDIMENSIONAL E, DESTE MODO, APRESEN- [ 6 André L. M. Lemos é doutor em sociologia pela Sorbonne, professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas da Faculdade de Comunicação (FACOM), UFBA/CNPq] TA UM EXTRAORDINÁRIO CONTRAPONTO PARA A TRIDIMENSIONALIDADE DA ESCRITA NA SUA FORMA ORIGINAL COMO RUNA E ESCRITA NODULAR. [ 9 Theodor Holm Nelson, nascido em 1937, filósofo mestre em Sociologia pela Harvard na linha de pesquisa de computação para a área de humanas e que recentemente esteve no Brasil para o Festiva Internacional da Linguagem Eletrônica - FILE 2005] [ 10 Nome dado em homenagem ao poema (1798) de Samuel Taylor Coleridge, Kubla Khan a vision in a dream, que se encontra no Anexo Kubla Khan] No entanto, apesar do projeto de Bush, é apenas em 1965 que o termo hipertexto é ofici- E O LIVRO HOJE, TAL COMO O PRESENTE MODO almente utilizado. Ted Nelson9 “cria” o ter- DE PRODUÇÃO ACADÊMICA DEMONSTRA, É UMA ULTRAPASSADA FORMA DE MEDIAÇÃO ENTRE DOIS mo para explicar o funcionamento de seu SISTEMAS DE ARQUIVOS. projeto Xanadu10. O projeto em si não che- POIS TUDO QUE IM- PORTA SE ENCONTRA NO FICHÁRIO DO PESQUISADOR QUE O ESCREVEU, E O ALUNO AO ESTU- ga a existir, mesmo com investimentos na DAR OS TEXTOS ASSIMILA O QUE IMPORTA EM década de 80 por parte da empresa de com- SEU PRÓPRIO FICHÁRIO”. - (BENJAMIN, 1978 P.78) putação gráfica AutoDesk. No entanto o termo hipertexto é o resultado direto dos avanços, até certo ponto, A concepção do termo foi ricamente explicatecnológicos de registro, armazenagem e cir- do em seu artigo para a Association of culação das informações, que permitiram al- Computing Machinery - ACM11 no ensaio gumas mudanças sobre o conceito de ler es- Dream Machines. As definições apresentadas crever e pensar do ser humano. basearam-se nas idéias de Bush (MEMEX) e dão vida, mais recentemente à própria hipermídia. fig 8> desenho esquemático do MEMEX É com esta visão um pouco mais aclarada [ 11 A ACM vale colocar, é ainda hoje referência em tudo que acontece no meio acadêmico em termos de informática e pesquisa. Em 2004 participei do ACM Multimedia em Nova Iorque.] sobre as mudanças conquistadas com a tecnologia que se afirma que Vannevar Bush, Para explicar o conceito, Nelson descreve o em 1945 com seu ensaio “As we may think”, uso de imagens (hipergramas), mapas seja um dos precursores do hipertexto em (hipermapas) e até mesmo filmes interligansuporte eletrônico, pois nesse ensaio ele do-se para estabelecer a informação comapresenta a concepção do MEMEX pleta. Hipertexto é então dividido em três (MEMory EXtension), um dispositivo categorias, sendo a primeira básica ou “peindexador de dados que faria a consulta a daço de hipertexto” que seriam notas de determinados assuntos com base em um ban- rodapé e pequenas observações. O segun- fig 9> nota onde aparece pela primeira vez o termo hipertexto [ 12 Alguns autores atualmente chamam de metatexto] co de dados próprio e microfilmados, confi- do “texto ampliado12” que dá origem a nogurando uma primeira visão para a internet vas idéias e novos links e por fim colateral, que não saiu do papel. que é a ligação simultânea de textos com35 pletos com parte de um “hiperlivro”. Essas PARCS, o qual foi também influenciador dos definições serviram de base para diversas sistemas operacionais da Apple (1977). Tal a importância deste desenvolvimento, que em outras obras na área editorial. 1991 a ACM concedeu a Engelbart o prêmio “software system” em função do NSL. “ESTAS CATEGORIAS CONSISTEM EM ‘TUDO’ ESCRITO SOBRE DETERMINADO ASSUNTO, OU AO MENOS REMOTAMENTE PERTINENTE A ELE, UNIDOS POR EDITORES ( E NÃO PROGRAMADO RES,…), NO QUAL, PODE-SE LER EM TODAS AS DIREÇÕES QUE SE DESEJAR. PODE HAVER CAMINHOS ALTERNATIVOS PARA PESSOAS QUE PENSEM DIFERENTE “ - (DREAM MACHINES 45)13 Ainda em 68 Ted Nelson e seus pesquisadores apresentam o Sistema Editor de Hipertexto (HES15) sem muito sucesso, porém esse mesmo sistema deu origem ao Sistema de Recuperação e Edição de Arquivos 16 Em 1968, Douglas Engelbart14 desenvolveu (FRESS ), que foi amplamente utilizado por o Sistema NSL que era oficialmente o pri- mais de dez anos. Foi a partir do FRESS que meiro recurso tecnológico ao hipertexto, pois surge o Intermedia em 1987, um conjunto contava com, editor de texto, editor de links, de aplicativos, baseados em interfaces gráteleconferencia, e-mail e configuração adap- ficas com o objetivo de montar estruturas tável. Mas isto era apenas uma parte de seu hipermidiáticas, pois já prevê o uso de som, 17 objetivo maior, um espaço colaborativo imagem , hipertexto e filmes. assíncrono, e o principal em diferentes localidades. Ele já visualizava a proposta da [ 13 Tradução livre do autor baseado no material lido no site “Electronic Labyrinth” resultado da pesquisa de Christopher Keep, Tim McLaughlin, Robin Parmar em 1993 na Universidade de Alberta, Canadá.] [ 14 Pesquisador da Stanford Research Institute] grande rede. O desenvolvimento do NSL foi Na década de 70, um período de estudos que o gancho para o desenvolvimento de refletem um cotidiano incauto e acelerado interfaces gráficas e dispositivos de aponta- ao extremo. Um bom exemplo disso é a obra (novela) “A exibição atroz” de J.G.Ballard, mento (mouse). fig 10> Montagem baseada na apresentação de Egelbart e o NSL que quebra todas as regras literárias abandonando o esquema de causa e efeito da narTodo o desenvolvimento desse material foi rativa novelesca, dando ao leitor inúmeras amplamente aproveitado pela Xerox, anos opções para a continuidade. mais tarde (década de 70) com seu sistema 36 [ 15 Hypertext Editor System] [ 16 File Retrieval and Editing System.] [ 17 Ao utilizar o termo imagem refiro-me às imagens vetoriais, bitmaps e 3D] O hipertexto como reflexo da velocidade da tanto é apenas em 1984 com ‘neuromancer’ mente humana passa a ser visto em diversos de William Gibson que o termo ganha notolugares. Seu princípio básico, relacionamen- riedade. Diversos outros seguem o estilo de to de idéias, é incorporado aos mais diferen- leitura/escrita hipertextual. Este período tes usos: além de em livros, passam a ser garantiu a difusão do hipertexto/hipermídia vivenciados em teatros, happenings, insta- fora do meio digital. lações e muito mais. A idéia do hipertexto promove a interatividade. Os BBS – Boletin Board System –, ganham adeptos a partir de 1984. As comunidades A partir de 1975, com o surgimento do primeiro digitais tomam vulto em função da difusão computador pessoal, ALTAIR, a interface gráfi- da idéia ‘hiper’. ca e o inter-relacionamento de idéias são muito mais utilizados. Com o lançamento do APPLE II em 77, o mercado começa a se desenvolver Em 1986 a primeira defesa de tese sobre em torno do mouse e das referências visuais. A hipertexto é defendida na Universidade de programação não é mais o esperado ao se lidar Maryland. Randall Trigg apresenta o TEXTNET: com computadores. A Network Based Approach to Text Handling. fig11> Livros TRUE NAMES e NEUROMANCER Em 1979 acontece o primeiro Ars Eletrônica Com a difusão de computadores pessoais e o em Linz na Áustria. O que a princípio era estrondoso lançamento do Macintosh em apenas o encontro de gênios da informática, 1984, a Apple lança em 1987 o HyperCard, para discutir e mostrar suas criações, tornou- introduzindo de vez o conceito de hipermídia se hoje um dos grandes eventos do meio nos computadores pessoais. A princípio a hipermidiático. multimídia cresce, sendo mais freqüente nos [ 18 Termo muito utilizado até hoje como explicação ao espaço ilimitado atrás da tela do computador, onde tudo vira zeros e uns, o código binário.] [ 19 Landow é referência até hoje. Veja entrevista a Cícero Dias no Anexo – Depois do Hiper] computadores. É também em 1987 que a ACM faz a primeira HYPERTEXT´87 onde No meio literário, surge em 81, na novela surgem pesquisadores como George ‘true names’ o termo cyberespaço18. No en- Landow19 com seu ensaio “A Retórica do 37 Hipertexto”. Em 92 lança o livro ‘Hipertexto: A interatividade proporcionada por essa nova a Convergência da Teoria Crítica e a ‘cultura’ é o alvo de inúmeras literaturas, criando neologismos e conceitos estéticos com- Tecnologia Contemporânea’. pletamente inusitados. Como reflexo desta preocupação, acontece em 1998 a conferênA Grande Rede, a internet, ganha facilida- cia Arte e Cultura Digital na Universidade des, o BBS ganha uma interface gráfica fa- de Bergen, na Noruega, repetindo anualmencilitando a navegação e ganhando mais te o encontro até hoje. Paralelamente a isso adeptos. Surge o Mosaic, em 1993, o pri- acontece em 2000 a Conferência de San Anmeiro navegador (browser). Em 1994 apa- tonio da ACM, com o maior número de enrece o Netscape. A internet ganha mais e saios e artigos sobre o assunto. Nomes como mais espaço, saindo do meio acadêmico. O J.Y. Douglas, Bob Kendall, Jen-Hugues Réty fazem sua participação de forma significatihipertexto passa a ser ‘natural’. va. Questionamentos sobre o que acontecerá com os suportes impressos pululam o meio fig 12> http://www.dkolb.org - site particular de David Kolb onde ele mantém suas publicações. 1995 Sócrates no Labirinto, de David Kolb é acadêmico. Em 2003 o print-on-demand caua primeira apresentação filosófica sobre a sa um certo alvoroço, pois a idéia de que a ‘internet acabará com o papel’ passa a ser hipermídia na hipermídia. uma constante, como foi a fotografia com relação à pintura, como foi a televisão com reA partir de então a preocupação é com o desenvolvimento de interfaces mais amigáveis, lação ao cinema e como tem sido mp320 com os CDs. ferramentas de programação mais próximas da compreensão humana e menos codificadas, dando acesso a todos a criação de Esta linha temporal não foi de forma alguhipertextos, multimídias e hipermídias. É a ma uma tentativa de registro exato sobre os Cultura da Interface de acordo com Steven acontecimentos, mas sim um apanhado dos Johnson, autor do livro com o mesmo nome. 38 [ 20 formato de música digital distribuída comumente pela internet] eventos que marcaram a origem da criação visando e o conceitual forçou as mais hipermídia e que justificam suas caracterís- inovadoras leituras, compreensões e percepções, firmando a obra no qual o material é a ticas estéticas para esta pesquisa. [ 21 Harry Flint Artista do Grupo Fluxus (1940) que tentou definir em um ensaio, “A arte do conceito”, chegando à seguinte afirmação: “A ‘arte do conceito’ é antes de tudo uma arte na qual o material é o conceito, assim como, por exemplo, o material da música é o som. Como os conceitos têm íntima ligação com a linguagem, a arte do conceito é uma espécie de arte da qual o material é a linguagem”.] linguagem, como afirma Harry Flint.21 A hipermídia é sim, como visto nesta linha do tempo, muito utilizada como meio de pro- Os conceitos de renovação modernista impingiram, a todo artista, uma forma nova dução, principalmente no meio artístico. de pensar e fazer arte. Exigiram que a poética não se restringisse ao valor ou a aura de uma obra em si, mas principalmente no diálogo propiciado por ela. A revolução dos suportes – mídias pós-modernas – propor- Hipermídia como Suporte Criativo “AS cionou a expansão da percepção nas artes, mudando a então fruição passiva, para a NOVAS TECNOLOGIAS CONSTITUEM NO- interação. As sensações até então proporci- VAS REFERÊNCIAS PARA AS NOSSAS SOCIEDA- onadas pelos tridimensionais e pelas insta- TORNA UM FENÔMENO SOCIAL DE ACULTU- lações apenas, expandem-se para outras for- DES PÓS-INDUSTRIAIS E SUA UTILIZAÇÃO SE RAÇÃO NESSAS SOCIEDADES MESMAS. É PRE- mas de representação artística. A preocu- CISO QUE A UTOPIA NÃO FIQUE SOMENTE AO NÍVEL TÉCNICO E A ARTE ESTÁ AÍ PARA PARTI- LHAR OUTRAS PARTES DO SENSÍVEL, DESVIAR, CRITICAR, RELER E RELIGAR COM OUTROS UNIVERSOS. pação da contemporaneidade, do perceber/ criar a arte que acontece no momento, pas- É NECESSÁRIO DESENVOLVER A CRI- sou a ser o mote de todas as artes interativas. AÇÃO ARTÍSTICA EM LIGAÇÃO COM A PESQUISA DESSAS TÉCNICAS NA ELABORAÇÃO DE DI- FERENTES FORMAS DE EXPRESSÃO, PARA A CRIAÇÃO DE NOVOS FORMATOS E DE PROJE- TOS ARTÍSTICOS CONJUNTOS COM OUTRAS DISCIPLINAS .” WAWRWT A interatividade passou a ser condice sine qua - G ILBERT TO P RADO 1998: non para as obras contemporâneas. Para tan- to a ambientação deve ser muito bem prepa- A modernidade trouxe o conceitual e o expe- rada. O controle sobre a mensagem está limirimental nas artes. O experimental permitiu tado à percepção do interator, um fruidor que a apropriação de diferentes suportes para a participa ativamente da obra, compondo-a, 39 transformando-a, beirando a co-autoria. Kundera, entre outros –: a aceleração e o aperfeiçoamento das formas de comunicação anulam o conteúdo transmitido. Todo o relato de A arte, que antes tinha todo seu potencial ex- uma época, referências a serem seguidas, perpressivo, baseado nas perversões dos meios tencem não mais aos livros, à escola e à elaexistentes, elocubradas pela engenhosidade boração teórica, mas aos meios de comunicacriativa do artista, passa a contar com um ção, às tecnologias. pouco mais de recursos. A tecnologia cedeu não apenas seu nome, mas principalmente suas formas, seus meios de produção como É fato histórico e conhecido que nenhuma técrecurso extra de expressão e percepção. A nica/tecnologia substituí por completo sua arte-tecnologia é muito mais do que a sim- antecessora, elas se complementam. Longe dos ples utilização dos recursos, é o emprego de clichês tecnicistas apavorantes que apresentam seus ideais, suas mídias. Na maioria das ve- a tecnologia como substituto da criatividade zes, o que antes era apenas uma “extrava- humana, há que se reconhecer a interatividade gância” é hoje quase uma metodologia. homem-máquina, para empregar as novas metodologias como forma estética. fig 13> O Beijo (1967) de Waldemar Cordeiro - Novos conceitos. O que antes era mero registro apoiado na escrita e nas artes é substituído pelo agora. A O que antes era uma ciência exata, para obsertecnologia e a contemporaneidade22 da infor- var, medir, avaliar, registrar tudo com precisão mação que se desvia da escrita para o cálculo, numérica, principalmente dentro dos rigores com a informatização das imagens e da infor- científicos, perdeu-se nas artes. O artista não mação, geram necessidades de representações tem nenhum compromisso com alguma verque tendem para a presença pura. As infor- dade, com o real ou regras préestabelecidas. mações já não se acumulam, sucedem-se em Apenas com a criatividade e com a expressão. um fluxo acelerado. É ainda um assunto em A tecnologia empregada nas artes não são torno do qual giram vários pensadores con- meros aparatos físicos ou recursos prontos, mas temporâneos – Régis Debray, Pierre Lévy, pensamentos materializados, a reprodução huBernard Stiegler, Jean Baudrillard, Paul Virilio, mana de modo criativo. 40 [ 22 No sentido mais que literal do termo contemporis – tempo atual, imediato] A ampliação das potencialidades da atuação humana, principalmente nos meios de comunicação, resultou em novas formas de conceber o pensamento. A linearidade do pensamento já não é mais uma alternativa. A semiótica pierciana contribui com a nova forma de pensar e ver o pensamento. A leitura flui agora em múltiplas direções. A multimídia, utilização de vários recursos (visual e sonoro, simultâneamente) evolui. O assunto é hipermídia, em que a preocupação é a informação percebida, não apenas Neste sentido, pode-se observar até mesmo o recebida. Em um mesmo “ambiente” é possenso estético de uma obra de arte através de sível expor o “receptor” às mais diversas forsuas características tecnológicas. Porém limi- mas de informação, através da união de ditar a análise ao contexto técnico é fechar os versas linguagens (escrita, visual, sonora olhos para o que a história das tecnologias e etc). A exposição à informação em muitos da comunicação há trinta anos vem ensinan- níveis de apresentação e aprofundamento do. O ponto de maior destaque não é o que as privilegia outros modos de cognição que não novas tecnologias têm a oferecer, mas sim quais apenas o textual. A ênfase em conceitos subsídios elas oferecem para sua apropriação como a não-linearidade, a utilização de obgeneralizada e ainda mais, o quão é grande a jetos visuais e a preocupação com a interface intenção de apropriação destas por parte da reforça o caráter artístico da hipermídia, sociedade. Com base nesta idéia é que o artis- confirmando a preocupação cognitiva. ta se apropria não apenas dos recursos materiais mas da representatividade de seu tempo, do ponto mais alto de sua época, construindo Pierre Lévy afirma na coletânea não apenas o agora, mas influenciando um fu- Multimedia: From Wagner to Virtual Reality: turo, ampliando sua abrangência em todos os “Ao invés de distribuir uma mensagem para sentidos (passado, presente e futuro). receptores que estão fora do processo de 41 criação e convidados a darem uma interpre- tecnocratas), trouxe a tendência das tação para uma obra de arte posteriormen- releituras através do tecnológico permitindo te, o artista agora tenta construir um ambi- a migração do real para o virtual, recriando ente, um sistema de comunicação e produ- ou mesmo criando uma nova realidade soção, um evento coletivo que implica seus bre a obra e sua percepção - “Quando a inreceptores, que transforma intérpretes em formação se move a uma velocidade elétriatores, que habilita a interpretação a entrar ca, o mundo das tendências e dos rumores torna-se o mundo real” (MacLuhan:1992). no loop com ação coletiva”. Edmond Couchot explica em como a conversão para a tecnologia influencia a arte: Buscando um enquadramento estético o hiperespaço – termo concebido por Einstein em sua Teoria da Relatividade – é exatamen- “ELAS [TECNOLOGIAS] O FAZEM NA MEDIDA te a resultante de uma ideologia pós-moder- EM QUE SÃO EMPREGADAS PARA CONTROLAR na, a qual pressupõe uma reflexão sobre o TODAS AS IMAGENS AUTOMÁTICAS (FOTOGRAFIA, CINEMA, TELEVISÃO) POIS ESTAS SERÃO, tempo e o espaço. A busca do novo e de no- A CURTO OU MÉDIO PRAZO, TRANSMUTADAS vos recursos, não apenas físicos, mas princi- EM NÚMEROS PARA PODEREM SER REGISTRADAS, TRATADAS, DIFUNDIDAS, CON- palmente sígnicos, abrem precedentes para SERVADAS, MANIPULADAS : O DESTINO DA a utilização da hipermídia como forma de fa- IMAGEM É DAQUI EM DIANTE NUMÉRICO. ES- zer arte. Através do “fazer” pós-moderno que SAS TÉCNICAS NÃO PODEM DEIXAR DE INTE- mergulha no passado, e serve de instrumen- PERIÊNCIAS E DE NOVAS INVESTIGAÇÕES PER- RESSAR ARTISTAS À PROCURA DE NOVAS EXCEPTÍVEIS. ALIÁS ELAS JÁ CONQUISTARAM AL- to de alteração desse passado, para muito GUNS DESSES ARTISTAS”. mais que a simples reconstrução e preserva- - (COUCHOT, 1993) ção, a tecnologia vale como linguagem, rea- Outra característica fundamental da firmando que o meio é a mensagem. hipermídia é a comunidade à qual ela proporciona conectividade, cooperatividade. Nicholas Negroponte comenta em seu livro A cena pós-moderna, considerada essenci- A Vida Digital: “Comunica-se, coopera-se, almente tecnológica (leia-se cibernética, cria-se em escala mundial e num espaço informática e diversos outros rumos cibernético, onde o próprio espaço e o pró42 prio tempo não são mais os mesmos”. A revisão da filosofia do conhecimento”, como hipermídia permitiu a criação em grupos e diria Pierre Lévy. A estética já não está mais em tempo real sem qualquer, ou com míni- atrelada à técnica, mas sim ao meio. ma, limitação de tempo ou espaço. O [ 23 Utilizo aqui o termo hiperespaço como sinônimo de ciberespaço já definido em comentário anterior como espaço ilimitado atrás da tela do computador, onde tudo vira zeros e uns, o código binário.] hiperespaço23 funciona como um enorme banco de dados, com referências cruzadas e Deve-se levar em conta neste pensamento informações vinculadas, acessível a um nú- estético a união que não só às artes é permero ilimitado de artistas (ou não), que po- mitido, mas a todas as outras ciências. Uma dem se ater à passiva fruição ou a autoria da informação migrada do analógico para o di- obra. Uma rede que permite, e por que não gital pode se identificar em uma nova fordizer estimula a interatividade entre milha- ma do saber a qual reúne os mais diversos res de pessoas nos pontos mais remotos. assuntos. O processo cognitivo nesta realidade interativa é uma nova questão a ser debatida e verificada. Com certeza a hipermídia é um suporte que clama por um artista – engenheiro / progra[ 24 Referência a Vilem Flusser e a síndrome da Caixa Preta.] mador ou não, mas um artista24 – de mente aberta. A tecnicidade/tecnologia que a contemporaneidade nos presenteia, abre debates para questões estéticas infindáveis, novos paradigmas devem ser observados. Este novo suporte não restringe a participação do computador como mero distribuidor de informação, mas como um provedor de conhecimento utilizado como um meio para expansão e apreciação da expressão artística. A mesma arte restrita às minorias é agora apreciada, depreendida e até mesmo feita por milhares de pessoas através da Hipermídia. O pensamento sobre esta Hiperarte “incita a 43 Percepção Estética: Cognição prenuncia sim um singelo apanhado filosófico Kantiano como margem de trabalho relacionando inclusive às poéticas de Bachelar. A estética defendida por Kant vai além do estudo do belo ou do sensível apenas, ele insiste na importância da consciência estética para a vida como um todo. Uma percepção do estado natural do ser humano. Kant pregava que essa capacidade de fruição estética está intimamente ligada às outras faculdades do ser humano, essencialmente as cognitivas26, mes- “(...) O PODER DEFINIDOR DA HIPERMÍDIA ESTÁ mo afirmando que a percepção estética NA SUA CAPACIDADE DE ARMAZENAR INFORMAÇÕES E, ATRAVÉS DA INTERAÇÃO DO RECEPTOR, independe de conhecimento prévio. [ 26 Aqui eu tomo por faculdades cognitivas não apenas o processo cognitivo formal, ditados pela pedagogia/psicologia, mas por junção e de vários autores e conclusão própria, como o processo inerentemente humano de dedução por conhecimento teórico (aprendido) e intuitivo (natural) uma episteme e techne grega.] TRANSMUTA-SE EM INCONTÁVEIS VERSÕES VIRTUAIS QUE VÃO BROTANDO NA MEDIDA MESMA EM QUE O RECEPTOR SE COLOCA EM POSIÇÃO DE CO-AUTOR. ESTRUTURA ISSO DE SÓ É POSSÍVEL DEVIDO À CARÁTER HIPER , NÃO O espaço segundo Kant não pode ser perce- SEQUENCIAL, MULTIDIMENSIONAL QUE DÁ SU- bido, pois não é uma propriedade das coisas, PORTE AS INFINITAS AÇÕES DE UM LEITOR mas sim do tempo . O espaço é então uma IMERSIVO.”25 - (LUCIA SANTAELLA, 2000 P:13) [ 27 “Crítica da razão pura” de 1781] 27 sobreposição às coisas baseada na intuição [ 25 Lúcia Santaella em prefácio do livro Hipermídia: psicanálise e história da cultura de Sérgio Bairon e Luis Carlos Petry] que se tem delas. Extrapolando o conceito Conforme visto anteriormente, toda a retóri- apregoado por Kant sobre o espaço, pode se ca acerca da hipermídia permeia as defini- dizer que a hipermídia é a representação temções de espaço, suas compreensões e até poral de um espaço inexistente e constante, mesmo sua poética. No entanto é necessário pois ele apenas surge no momento da firmar o compromisso com a filosofia estéti- interação. Um memento mori28 digital. ca para perceber a extensão de sua atuação como suporte de criação e não apenas de propagação. Dessa forma o significativo título Esta percepção do espaço kantiano é um 44 [ 28 Mori – do latim e significa ‘lembre-se que vai morrer ’ - “a condição intrínseca do cieberespaço é que praticamente tudo que é feito se desmancha no ar e não deixa a menor lembrança” - colocado por Luli Radfaher em seu texto memento mori (ou da trasitoriedade de nossa condição digital).] pouco do retorno à cultura da oralidade má- te adaptações sem limites; gica, em que a relação do homem com o ambiente – com o mundo talvez – fomenta a • a heterogeneidade que faz das inú- criatividade imagética garantindo uma per- meras conexões, associações colabo- cepção sinestésica, que de acordo com rativas e ecléticas; MacLuhan, é também um reflexo da reorganização dos sentidos, do pensamento e do • multiplicidade e de encaixe de esca- conhecimento humano, proporcionado pelas las, onde cada elemento formador do tecnologias. A sinestesia é uma evidente ca- meio é um ponto de origem, como se racterística do ambiente hipermidiático, pois fosse o originador do meio; propicia, em um espaço momentâneo – o • exterioridade que garante a indepen- agora –, o estímulo aos diversos sentidos. dência do espaço a qualquer forma de Não é, entretanto, uma característica exclu- dispositivo ou elemento, seu cresci- siva da tecnologia digital. mento ou diminuição é associativo e independente; O estimulo aos sentidos acontece na • topologia, a linguagem não tem um hipermídia em função do hibridismo que lhe espaço, ela é o próprio espaço e é peculiar. A gama de recursos de produção de linguagens e processos comunicacionais • a mobilidade, seus múltiplos centros convergem para um mesmo objetivo, a per- de conexão garantem sua expansão cepção. O espaço hipermidiático é o catali- sempre que necessário. zador de todas as linguagens, tornando-se [ 29 Pierre Lévy – 1993 p:25-26] uma própria. Esta linguagem se apropria dos O espaço criado por esta nova linguagem é mesmos princípios 29 que caracterizam o um ambiente de percepção. A informação hipertexto e que norteiam sua existência acir- já não é mais recebida, mas sim percebida. rando ainda mais as formas de hibridismo: Em um espaço em que tudo é linguagem, [ 30 Adaptei esta idéia da discussão que Gui Bonsiepe, em seu livro Design: Do material ao Digital¸trava com Meredith Bricken onde ela postula que “no ciberespaço a aparência é realidade” e ele vai mais além dizendo que “na realidade virtual tudo é interface, tudo é design”] tudo é informação30. A percepção humana é então aqui bombardeada de estímulos – som, • a metamorfose constante que permi45 imagem e em determinadas situações, olfa- É nessa condição de interatividade e to, paladar e tato. A imersão do usuário contemporaneidade que se forma uma nova escomplementa a característica híbrida da tética, ou como diz Couchot, uma tecno31 32 hipermídia, pois é a relação homem-ambi- estética . Uma percepção do sensível que se ente que efetivamente confirma o aspecto expande aos periféricos humano-tecnológicoscontemporâneo – no sentido literal do ter- digitais, dando ao usuário diferentes recursos mo –, a interatividade, principalmente a lin- perceptivos. E de acordo com Roy Ascott, guagem e a existência do meio. Neste espa- “estamos entrando no mundo-mente (Worldço multidimensional – considerando que mind) e nossos corpos estão desenvolvendo a cada sentido ocupe uma dimensão própria faculdade da cibercepção (cyberception) – isto [ 31 Diana Domingues explica em seu artigo “ciberarte:zonas de interação” como sendo “uma denominação empregada por Edmond Couchot e Pier Luigi Capucci, entre outros especialistas em arte e tecnologia, para falar de uma estética que explora a dimensão sensível das tecnologias e seus efeitos sobre os nossos sentidos extendidos por suas capacidades expressivas”.] [ 32 Apesar de falar mais a respeito de percepção, coloquei um texto explicativo sobre sensação, unidade dos sentidos e percepção do ponto de vista patológico em anexo. ] e completa – o usuário é, ao mesmo tempo, é, a amplificação tecnológica e o enriquecimenfruidor passivo, autor, co-autor e mais uma to de nossos poderes de cognição e percepção”. vez fruidor. A estrutura maleável do espaço hipermidiático faz com que a interação seja condição constante, pois o usuário passa a Assim, considerando o ciberespaço, ou oufazer parte da dinâmica espaço-tempo. sando esbarrar na definição de Einstein33 e chamar de hiperespaço, um espaço para “alojar34” lembranças, esquecimentos, arte, história, fatos e até mesmo um novo universo com regras distintas, pode-se facilmente estender todo o ‘ambiente’ hipermidiático à uma extensão da cognição humana. É o espaço de Francastel, no entanto, que surge à mente ao mencionar os processos cognitivos, pois para ele o espaço é uma experiência própria do homem. Um espaço onde a presença o torna existente e o poder criativo não tem limite, pois é atemporal e o processo, seja ele qual for, inicia-se sempre no agora. 46 [ 33 Segundo a Teoria da Relatividade o espaço se dobra em relação direta com o tempo, forçando a existência da 4ª dimensão, um espaço-tempo.] [ 34 Termo literal utilizado por Bachelard em seu livro a poética do espaço] A percepção dentro da hipermídia é uma mes- No viés das poéticas pode-se atribuir à cla das duas abordagens psicológicas conheci- hipermídia a característica onírica do deva[ 35 Acompanhando Bachelard em a Poética do Devaneio, tem-se: “(...) o devaneio é uma atividade onírica na qual subsiste a clareza da consciência” (p:144).] das, a construtivista no qual o a percepção do neio35, em que o tempo se dobra em revemundo é construída a partir das informações rência ao espaço e o único momento é o predo ambiente – o conhecimento prévio transfor- sente, sem trajeto, sem demoras, sem antes ma, distorce, amplia ou descarta o alvo da per- ou depois. O ser humano comunga com o cepção – e da abordagem ecológica que argu- subconsciente e o inconsciente, neste plamenta que a percepção é um processo direto e no de sonhos imaginativos, durante seu continuo que ocorre através da exploração em sono, onde trafega de lugares nunca antes colaboração com os outros sentidos. Aqui se vistos a novas localidades ao virar da face. configura claramente a relação do espaço com Este espaço único é uma metáfora natural à o usuário, pois a interação com o ambiente não imaginação, sem limites, pudores ou mesé apenas um processo passivo de aprendizado, mo receios. É evidente que a hipermídia não mas sim de aquisição de conhecimento e é (até o termino deste material pelo menos) integração da nova informação em sua “rede uma dimensão na qual o usuário possa dosemântica, elaborando e reestruturando seus minar e concretizar todos os seus desejos modelos mentais e suas estruturas cognitivas” físicos, mas onde a única limitação desta [ 36 A casa de Bachelard em “A Poética do Espaço”] (Kozma:1991). “casa36” é efetivamente a imaginação humana. A hipermídia e todas as suas metáforas nada mais são do que a evolução dos conceitos humanos em torno de uma ferramenta, magicamente se transformando em uma habilidade coletiva. Habilidade esta já herdada [ A natureza humana e a própria vida são também participantes ativos das novas tecnologias, estudos e experimentos como a bioinformática, a nanotecnologia, a bioarte, a arte transgênica são caminhos já muito utilizados por artistas e pesquisadores da hipermídia e da arte contemporânea.] 37 pelos próprios códigos genéticos37, que carregam informações e experiências complexas, tornando a cada geração indivíduos mais habituados às tecnologias e seus raci47 ocínios. Poder que apenas a divina alqui- pois é ela que permite uma viagem sensorial, por destinos desconhecidos garantindo mia humana é capaz de prover. uma entrega física e a total imersão psicológica, gerando estímulos novos e experiênAs mídias digitais, computador mais cias perfeitas a cada viagem. A arte hoje é comumente pensado, tornaram-se realmen- feita nas extensões do corpo, conhecido te uma extensão do corpo, um fiel compa- como computador, formas que já nascem nheiro obediente, domesticado, incansável binárias, prontas para serem experimentae sem terminações nervosas que limitem as das em um espaço que desconhece a fronexperiências. A capacidade de fazer e des- teira da distância, pois estão a apenas uma fazer um experimento sempre vai existir. conexão de distância. Nunca mais a primeira vez será a última, mas sempre “única”, singular, todas as vezes serão como primeiras. O ciclo intermi- A propriedade intelectual é, na hipermídia, nável de tentativas e erros dão chances a mais um item que caracteriza a arte. A crianovos acertos, fincando ainda mais a neces- ção nasce em um espaço, mas sua fruição sidade da cabeça pensante humana no es- não necessariamente tende a ser inerte ou passiva, ela tende a ser criativa, colaborativa, paço hipermidiático. a arte não é mais monopólio de um, mas de uma coletividade. A imersão propiciada pelo A tecnologia, mais propriamente dita a meio é a alma da obra, e a participação tecnologia digital, acrescentou uma interes- irrestrita faz com que ela seja sempre sante aceleração ao mundo. A hipermídia é inacabada. Existe sempre mais material para um espaço dentro de um ambiente maior, esta obra, é uma fonte inesgotável de idéias toda uma cultura. Vive-se novamente um e percepções. momento mágico, poético, repleto de metáforas e referências sensórias que cria uma nova percepção, a percepção digital. Nesta A hipermídia é um espelho do homem, um nova percepção é a arte que impulsiona o novo apêndice criativo. O ciberespaço é ensalto evolucionário dentro do hiperespaço, tão um meio de criação sem limitações, no 48 entanto para que se possa ser com ele, é ne- Torna-se então necessário a compreensão [ 38 Refiro-me aqui à definição dada por Arlindo Machado quando diz da digitalização e da transformação de tudo em zeros e uns – código binário.] cessário um diálogo, uma compreensão desta da extensão do termo interface. Segundo linguagem tão dicotômica38. Para que haja Lévy 39 “a palavra ‘interface’ designa um esta interação é necessário uma tradução de dispositivo que garante a comunicação códigos e sinais. No ambiente hipermidiático entre dois sistemas informáticos distintos toda forma de comunicação é possível, pois ou um sistema informático e uma rede de a utilização de textos, orais e verbais, ima- comunicação. [...] Uma interface homem/ gens, sons, cores, formas, referências sensó- máquina designa o conjunto de programas rias é sempre transformada em comunica- e aparelhos materiais que permitem a coção. A chave criadora desse ambiente é en- municação entre um sistema informático e tão a percepção, não apenas dos processos seus usuários humanos”(LÉVY, 1993, de comunicação que se formam, mas princi- p:176). Indo mais além, arrisca-se entenpalmente do ambiente. der interface como recursos utilizados pelo meio, para interação através de comunicação sensorial cognitiva, pois vai utilizar re- É nesta situação que os processos cognitivos cursos já conhecidos, como signos verbais, são provados, reforçados com novidades e imagens, sons e movimento, em uma lindiferentes aprendizados. Em ambientes guagem própria ao mesmo tempo coletiva. hipermidiáticos, utilizam-se interfaces interativas, pois são elas que garantem a contínua vivência do usuário dentro do espaço. Esta seria então uma característica formal Assim, reforça-se a necessidade de uma do processo cognitivo causado pela [ 39 do inglês paterns com o sentido de repetição, constância, diferente de standard que como o próprio texto pode até a levar entender.] interface que permita “ao usuário obter uma hipermídia, pois os novos padrões39 de revisão panorâmica do conteúdo, navegar na conhecimento tendem a uma mescla de inmassa de dados sem perder a orientação e, dividualismo (personalização) e coletivismo, por fim, mover-se no espaço informacional em que as informações são transformadas e de acordo com seus interesses”. (Bonsiepe, entendidas como interfaces. O processo 1997, p:59) advindo das tentativas e erros cria caminhos já conhecidos, demarcando formas de acesso como experiências adquiridas que ga49 nham padrões esperados a cada navegação. bém sujeito às mudanças sociais, pois, as A estética é então ditada a partir das experi- redes de computadores estão prestes a enências bem sucedidas. Esta nova estética golir a televisão e se pulverizar em vários tende então a determinar as próximas pa- objetos-prótese ligados em rede (roupas, dronizações de interfaces, fazendo com que acessórios, veículos, etc), pode-se entender a experiência seja mais uma vez coleti- que os padrões de percepção serão sempre coletivos, garantido, não apenas para uns vizada, reiniciando então o processo. poucos, mas para todos. Em síntese, a percepção do ambiente hipermidiático tende a ser dinâmico, pois este adapta-se a cada nova experiência, criando novos padrões e novas percepções ditando novas características. O dinamismo das experiências aproximam-se cada vez mais à velocidade do pensamento, tornando efetivamente uma extensão do corpo humano, todo e qualquer dispositivo de acesso ou que simplesmente facilite a interação com o meio. Não é de se admirar que a portabilidade seja tão comum entre os dispositivos digitais. Atualmente precisa-se cada vez menos de informações ou recursos extras para se realizar qualquer navegação. A informação sobre o meio, já faz parte do usuário e não mais do dispositivo. O usuário reforça sua união com o meio. Kerckhove40 compreende o meio digital (eletrônico) também como um órgão de controle e análise do corpo social. E um órgão tam50 [ 40 Derrick de Kerckhove. The Skin of Culture (Investigating the New Electronic Reality) foi publicada pela Somerville House Books Limited, Toronto, Ontário, Canadá, em 1995. Tradução: Luis Soares e Catarina Carvalho. Lisboa: Relógio D’Água Editores, março de 1997.] Arte Digital no ambiente Hipermidiático cação e exposição, mas também aproveitam das características específicas do meio para comporem suas obras. Extrapolando um dos muitos conceitos de arte que propõe provocar uma reação no observador, a arte digital permite muito mais que isso, ela tem por característica básica a interatividade. Na conjuntura digital, o espectador tem a oportunidade de interferir diretamente sob o resultado da obra, fazendo de suas ações parte indissociável do conjunto artístico. A arte contemporânea vem se construindo a partir dos novos referenciais tecnológicos da COMO ENXAIMEL (...) NAS CONSTRUÇÕES EM ONDE É O PRÓPRIO CAMPONÊS QUE TALHA A MADEIRA, DEIXANDO NA HABITA- contemporaneidade. Pode-se observar em ÇÃO OS RESQUÍCIOS DE SEU TRABALHO, O MUN- diversas áreas artísticas, a utilização das no- DO DIGITAL COM SUA ESTRUTURA INTERATIVA vas tecnologias em suas formas, formas es- PRATICAMENTE OBRIGA SEU INTERLOCUTOR A tas, híbridas de arte e tecnologia. Longe do DEIXAR ALI SUAS MARCAS”. divórcio arte-ciência previsto – ou agourado - (BAIRON, 1995, P. 207) pelos acadêmicos ortodoxos – a técnica se transformou (novamente) em arte. “A SSIM Isto pode ser considerado de fato, uma nova experiência, que já há algum tempo vem sendo explorada por outros ramos, As artes tradicionais estão presentes no como por exemplo, as instalações e hiperespaço sob diversas maneiras. Escrito- tridimensionais que convergem vários res, pintores, músicos, dançarinos utilizam modelos de arte e que também permitem esta nova mídia não só como lugar de publi- a interferência do público. Com o desen51 volvimento tecnológico e particularmente fruições concomitantes e com diferentes foro aparecimento da grande rede, novas for- mas e meios de interpretação; “No limite, o mas de expressão artística foram surgin- original não é senão uma matriz das suas pródo ao longo destes últimos trinta anos, ba- prias cópias...” conforme afirma Abraham seadas, sobretudo neste desenvolvimento Moles em Arte e computador. (Moles, 1968, tecnológico. É o que hoje se conhece como p:72) a Ciber Arte, Arte Eletrônica ou como esta pesquisa quer, ousadamente influenciar, Hiperarte. É notório nas artes digitais a necessidade do conhecimento teórico do artista. A profusão de linguagens que permeiam o supor- No entanto antes de mesmo de pensar na te requer conhecimentos estéticos específiinteração da obra há que se investigar o cria- cos, o que exige do artista um poder de diádor, o artista que cria e quebra paradigmas e logo entre a ciência41 e a arte. Não é mais paradoxos para usar da melhor maneira pos- apenas a descoberta do que se pode fazer sível o novo suporte, alterando a estrutura com o aleatório, ou ainda a programação de da obra, levando a imprevisibilidade técnica variáveis, como foi no início de Waldemar como guia mestra. As obras no meio digital Cordeiro, mas principalmente de estabeleprenunciam o fim da lógica formal e do diá- cer propostas fundamentadas na estética do logo maniqueísta da imagem. Não se espera meio como forma de fazer arte efetivamenmais do fruidor que ele veja a obra em si, te. A fragmentação do Pós-Moderno influmas principalmente que descortine as estru- enciou em muito a hipermídia, porém é justuras que interligam todo um raciocínio, tamente desta fragmentação que surge o conectando-a a um sem número de outras novo suporte. A informação na hipermídia obras. A interação, característica estética in- é completa e dá origem a diversas outras inclusive, definida anteriormente, não é ape- formações. A arte na hipermídia tende a ser nas na relação fruidor-obra, que cria a cada igualmente completa. As características desnova visita uma nova obra, mas principal- te espaço garantem a complexidade necesmente de como obras conversam e conver- sária para a experimentação, fazendo com gem entre si, formando uma miríade de que a consciência seja apenas mais uma 52 [ 41 Apenas para manter a dicotomia arte-ciência já tão discutidas, no entanto quero realçar o termo tecnologia como ciência.] metáfora no meio de tantas informações, do da pintura, escultura, holografia até a garantindo uma poética única a um suporte projeção de uma imagem, todas harmonicamente organizadas para envolver o “fruidor” tão distinto, e até então único. no seu universo de significação, interagindo em mais de um dos seus sentidos. A possi[ 42 Refiro-me aqui às diferentes obras e mesmo a apropriação de suas características como forma de inovação e técnica.] 42 Resgatando uma consciência estética e aban- bilidade de múltiplas linguagens atuando donando a tecnicidade algorítmica da pro- em harmonia dá a obra um perfil artístico gramação, que exige a parceria entre o ar- interativo, potencializando as formas de tista e o programador, o meio digital deman- percepção e por vezes até ultrapassando as da um toque de ousadia, de inquietação, de barreiras do espaço, pois em se tratando da liberdade criativa, para que o hibridismo não grande rede (internet), pode-se interagir se perca, formando um quebra-cabeça gigan- com a mesma obra em diferentes pontos site com diferentes formatos e linguagens. A multaneamente. característica da ciência exata, a matemática, não invalida sua criação ou mesmo sua aura, apenas a reconfigura para um novo “O que o ciberartista propõe não é mais um patamar. Não é mais a unicidade da obra ou objeto, mas um processo para ser vivido. 43 Diana Domingues em entrevista a jornal. seu suporte que lhe atribui valor, mas sim Você tem de agir com o sistema criado43.” A sua expressividade, a sua forma de “falar” arte digital na hipermídia então libera toda ao interator. Segundo Mônica Tavares, é jus- forma de interpretação, pois o momento tamente a característica numérica da arte único de fruição está restrito à individualidigital que garante a incorporação de “no- dade de cada um; considerando-se ainda a vos signos e novas linguagens, do que de- possibilidade da interatividade e consecorre a possibilidade de sua autotrans- qüentemente da criação, recriação, co-criamutação em novas formas de criação” ção a obra de arte é colocada no patamar de (Tavares, 1996, p. 292). unificadora de idéias e mensagens. Neste meio, uma única obra pode agregar Estas novas experiências não são, de modo diferentes formas do fazer artístico, migran- algum, substitutas para as obras de arte 53 clássicas, mas sim o reflexo de uma nova é a possibilidade de compreensão e recrisensibilidade advinda da utilização de dis- ação simultâneas. positivos do cotidiano, como computadores, como a internet, como os dispositivos digitais de sons e imagens além de um sem No sentido de exemplificar e até mesmo funnúmero de outros recursos tidos e havidos damentar um projeto digital, segue-se aqui como meros aparatos de facilitação do dia- a análise de duas obras que conferem um a-dia. Segundo Lucas Bambozzi, durante pouco do que foi até agora apresentado. As a II Bienal do Mercosul “a idéia da duas obras foram escolhidas em função da ciberarte é ocupar este ambiente novo, este sua proximidade com o discorrido até então. espaço virtual e não-físico que está se con- Não há qualquer intenção de se medir o nífigurando fora das galerias e museus”. vel de interatividade de cada obra, mas sim apontar as características de uma percepção estética contemporânea. Ambas as obras são O Hiperespaço – conseqüentemente a distintas entre si e de forma alguma reprehipermídia – não é um museu ou uma ga- sentam, ou querem ser exemplos perfeitos da leria no sentido conservador ou mesmo pe- arte digital na hipermídia. Existem com cerjorativo do termo, mas sim mais um espa- teza um sem número de outras opções a seço para a divulgação, circulação e mesmo rem avaliadas, mas estas duas por enquanto apreciação da arte. Julio Plaza sabiamen- confirmam um pouco desta pesquisa. te colocou em um de seus textos que a metáfora da arte cede lugar para a metamorfose, que dita um comportamento mais ativo, inquisidor, modelável, interativo e convidativo à experimentação e até mesmo à criação de novas regras estéticas. A arte no meio digital é a transformação da mensagem em função do meio, é a adaptação e o convite a imersão à fruição total, é a troca de lugares entre o artista e o fruidor, 54 Automatic Drawing apropriou das características de um grama- http://www.i-am-ai.net/automaticdrawing/ do para dar uma visão diferenciadora da obra. A multiplicidade de informações garante um tom poético à obra. O vernáculo Baseado realmente na idéia da hipermídia, instrutor é mínimo, deixando que convivênos artistas do Active Ingredient, desenvol- cia com o ambiente seja mais instrutiva do veram um espaço chamado Automatic que um manual de regras. É uma deixa para Drawing, onde o usuário deve desenhar a que o usuário faça as suas próprias regras. resposta a uma pergunta sobre os mistérios da vida, sobre uma tela em movimento, que a tela tem como padrão um gramado. Este A idéia, segundo o grupo, surgiu a partir movimento sugere um passeio pelo parque da escrita automática desenvolvida pelos fig 14> automatic drawing (1) com uma caneta na mão. A hipermídia, nes- médiuns em transe psicográfico. O projete projeto, permite que o espaço seja real- to em sim é fazer com que os usuários, a mente um passeio, mas por uma tela que se partir de determinadas perguntas, façam fig 15> automatic drawing (2) 55 suas obras (desenhos apenas) e registrem- Pode-se perceber a relação meio e criador se em um banco de dados. A partir deste quando da utilização dos recursos de registro, os próximos usuários poderão ver processamento, imagem e vídeo para insas obras já guardadas. Os usuários são pirar ou mesmo estabelecer um vínculo também convidados a deixar uma nova pessoal para o próximo interator. A pergunta que alimentará o banco e poden- hipermídia é aqui utilizada mais uma vez do ser feita a posteriori para um próximo como recurso criativo, disponibilizando o usuário, que por sua vez fará todo o traje- espaço para a co-criação e até mesmo to novamente, vendo obras já existentes, interação, além de estabelecer uma forma fazendo sua própria obra e criando uma única de criação a partir da apropriação nova pergunta. de recursos e meios diferenciados. fig 16> automatic drawing (3) fig 17> automatic drawing (4) 56 Seis propostas para o próximo milênio http://www.mamutemidia.com.br/6propostas/ fig 21> seis propostas para o próximo milênio apresentação da proposta cursos antes limitados à imaginação do leitor. A obra foi então transformada em zeros fig 18> seis propostas para o próximo milênio (1) fig 19> seis propostas para o próximo milênio - escolha da língua e uns, de um modo poético até, sem cercear a liberdade imaginativa do leitor que neste espaço atua como usuário/interator. A preocupação em manter as características do tex- Em 1984 Ítalo Calvino foi convidado a fazer um ciclo de palestras na Universidade de Harvard. Por ser na faculdade de comunicação e poéticas, ele resolveu que cada uma das conferências como Leveza, Rapidez, Exatidão, Visibilidade, Multiplicidade e Consistência. No entanto suas palestras nunca chegaram a acontecer, pois Ítalo veio a falecer antes mesmo de concluir seu último texto – Consistência. Este material deu origem ao livro “Lezione Americane. Sei proposte per il prossimo millennio” e foi editado no Brasil com o nome de Seis propostas para o próximo milênio pela Cia das Letras em 1990.] [ 44 A partir do livro homônimo de Ítalo Calvino to original na tradução hipermidiática, deios profissionais da Mamute Multimídia de- xou a obra com uma poética muito própria. 44 senvolveram uma versão digital do ensaio. A utilização de sons para ambiência, imaEste material fora desenvolvido utilizando re- gem como mensagem e movimento como texto, firmam a peça literária em um mundo pandimensional que migram da imaginação do leitor para um diálogo digital com o leitor. Esta interface homem-máquina mantém os “(...) valores ou qualidades ou especificidades da literatura que (...) são particularmente caros, buscando situa-los na [ 45 perspectiva do novo milênio 45”. A obra citações extraídas das mídias digitais e de reportagens referentes à obra.] fig 20> seis propostas para o próximo milênio menu hipermidiática, que traduziu este livro, confirma e estende a mensagem quando Ítalo diz que “A literatura (e talvez somente a li57 fig 22> seis propostas para o próximo milênio rapidez fig 24> seis propostas para o próximo milênio visibilidade fig 26> seis propostas para o próximo milênio velocidade fig 23> seis propostas para o próximo milênio exatidão fig 25> seis propostas para o próximo milênio multiplicidade fig 27> seis propostas para o próximo milênio finalização teratura) pode criar os anticorpos que coí- de se estar conversando com um amigo bam a expansão da peste da linguagem”. muito próximo que se convida a partilhar algumas experiências. Apesar de existir uma certa linearidade nas opções de navegação, O projeto é relativamente simples, ao en- o projeto é muito rico na diversidade de extrar no site/CD46 o usuário é levado a esco- periências. Tal qual um livro, a jornada é lher o idioma que deseja se comunicar, ten- apenas realizada entre leitor e usuário e todo ainda a opção de conhecer o porque da das as sensações são egoisticamente confiobra, seus realizadores e artistas. As telas nadas a uma pessoa. com sons e imagens, remetem à sensação 58 [ 46 o projeto fora desenvolvido para as duas mídias, reforçando ainda mais a característica híbrida da hipermídia.] Hiperarte Projeto digital Com a idéia de que a hipermídia é um suporte completo para criação e interação, é lógico concluir que o espaço de criação seja o mesmo da circulação. O espaço criador deve ter esta característica inclusa. Para tanto surgiu a idéia de desenvolver um diálogo, colaborativo, onde a criação pudesse ser vista, revista e até mesmo recriada, podendo sofrer diferentes interferências ou colaborações, sem que seu original se perdesse. A obra original será um começo. Uma semente que brotará e dará novos resultados, novas obras. http://hiperarte.pmstudium.com Através de recursos específicos da hipermídia, como imagem, movimento, sons, banco de dados e tudo mais, o usuário pode criar uma obra fig 28> hiperarte - tela de abertura automática qualquer – sendo a princípio desenhos/pinturas, em uma segunda etapa, sons, imagens e filmes. Esta obra será guardada. Um próximo usuário poderá ver a obra anterior. Caso lhe seja interessante ele poderá dar prosseguimento a esta obra, criando a sua a partir da obra já existente. Caso prefira, poderá criar uma nova a partir da tela em branco. Em qualquer das opções o projeto prevê a criação de fig 29> hiperarte - introdução uma “árvore genealógica”, onde o 59 usuário poderá ver a origem e a evolução de uma determinada obra, ou ainda ver todas as outras obras que não sofreram qualquer intervenção, além da original. A fruição, a possibilidade de criação ou mesmo recriação, em um momento e espaço particular e ao mesmo tempo coletivo, pois está na rede, é o que reforça as características da hipermídia como suporte de criação. A idéia não é inovadora muito menos inédita, no entanto, ela confirma os padrões estéti- fig 30> hiperarte - convite à criação ou colaboração cos reconhecidos em função da hipermídia. São padrões não excludentes onde o usuário pode se comportar como melhor lhe convier, quer seja criando, quer seja, observando, quer seja recriando, enfim, a partir da possibilidade de escolha o suporte está ali para lhe dar o resultado desejado. Este projeto foi desenvolvido com base no material elaborado e estudado a partir desta pesquisa de mestrado. Seu objetivo é o de promover a hipermídia como suporte de criação de arte. fig 31> hiperarte - área de criação 60 Conclusão Mesmo com as preocupações difundidas por mestres eternos que questionam a integração dos suportes, a multimídia evoluiu. Existe uma preocupação, uma diferenciação do que é multi e do que é hiper. A colaboratividade, a grande rede, a pluralidade e a velocidade são alguns dos elementos caracterizadores Esta pesquisa conclui então que o desenvol- desta estética hipermidiática contemporânea. vimento da arte através dos meios digitais Os paradigmas, que estabeleciam uma poscomo forma de produção artística, suas lin- tura passiva de fruidor foram revistos, exiguagens, seus novos meios e suportes de- gindo que o usuário, já não tão passivo reaja ram origem a um novo padrão estético, apon- à arte ao ponto de interagir e até mesmo retando características específicas e novas for- criar, co-criar. mas de se fazer e pensar arte. No entanto, a quase eterna briga de valores, reconhecimentos e definições do que é e do que deixa A tecnologia realmente trouxe recursos, meide ser arte, continua relegando a segundo, os de divulgação e ação que ferem um pouterceiros, quartos ou mesmo infinitesimal co os pragmatismos acadêmicos sobre a arte. lugar as artes produzidas digitalmente. O suporte deixa de ser apenas o meio. A liberdade é o mote artístico atual. A hipermídia está além do que se rotula como meio de proO surgimento da arte conceitual/experimental dução. A integração do espaço criativo com nas décadas de 50 a 70 abriu espaços criativos a circulação é uma grande vantagem. independentes de suportes, o que permitiu que a arte como forma de expressão, e não mais como posse de uma elite “sensível” pudesse ser A produção digital influencia os artistas visuapreciada por todos. A arte digital conquistou ais mais tradicionais, das mais variadas forseu espaço e garante uma popularização não mas. Mais do que apenas meio – no sentido só do sensível, mas também do fazer arte, te- comunicacional da expressão – a estética orimor até mesmo de alguns Frankfurtianos. ginada na hipermídia trouxe a tona uma lin61 guagem muito clara do momento contempo- Existe em toda esta pesquisa elementos de râneo, linguagem esta utilizada e referenciada reflexão teórica que fundamentam, pelos artistas atuais. A integração, não ape- conceituam a percepção humana-digital e nas dos suportes, mas principalmente das in- o fazer da arte no viés da tecnologia. Foi atratenções garante uma evolução produtiva. Exis- vés das concepções filosófico-poéticas de tem recursos que podem ser integrados e uti- Gaston Bachelard sobre o imaginário a parlizados das mais diversas formas e podem ex- tir da materialidade dos elementos da natupressar muito mais. reza, que esta pesquisa transversalizou pela ciência exata do computador, passando pela contemporaneidade do hipertexto, chegan- As advertências de Vilem Flusser e a do a arte na sua melhor forma, na expressíndrome da caixa preta foram ultrapassa- são, sem definir qualquer novidade acadêdas, a arte e técnica voltaram a andar a par mica ou a elucidação dos mistérios da vida, e passo, mas garantindo que conhecimen- mas apenas a investigação fenomenológica tos distintos fossem utilizados com parce- de um movimento “artístico” e sua estética. ria. A produção digital aproxima os povos, a mesma forma prevista na década de 60, por Macluhan e sua aldeia global. Grandes Toda esta linguagem – meios, multimeios e obras podem ser apreciadas e até mesmo hipermeios – gera a nova percepção, um trabalhadas a distância estendendo a con- novo deleite. “O poeta, na novidade das suas cepção artística além dos conhecimentos imagens, é sempre origem de linguagem.” teóricos, instigando a percepção do sensí- (Bachelard, 1988 a:97). vel a todos sem restrição. A poética do suporte é amplamente A poética artística permeia a tecnologia, e divagada e explorada baseada na metafísica do ser que migrou de fruidor a causador, é bachelardiana onde o tempo não corre mais. exigido um certo grau de devaneio sobre a Jorra (...) cientificidade exata das mídias. A arte trouxe o lado humano para o tecnológico. 62 Anexos produção, e do uso da hipermídia. Agrega pesquisa avançada no desenvolvimento, aplicação, acompanhamento, avaliação e análise integrada de soluções nas áreas de educação, tecnologia da informação e bibliotecas virtuais. Tomando como ponto de convergência na Projeto Virtus transdisciplinaridade a educação e os pro- O VIRTUS surgiu em 1996, no Centro de cessos que utilizam a tecnologia como insArtes e Comunicação – CAC, da Universida- trumento de inclusão social e acesso ao code Federal de Pernambuco, com a missão de nhecimento em suas variadas interfaces. investigar a instalação social do ciberespaço. Trabalhando cooperadamente o VIRTUS se Criado sob princípios transdisciplinares, en- estabeleceu como espaço integrador de provolveu inicialmente as áreas de Ciência da gramas de Pesquisa & Desenvolvimento Informação, Design e Comunicação, com P&D. Atualmente é reconhecido como um uma forte presença da informática e disci- dos principais grupos nacionais de produplinas conexas como telemática, redes, inte- ção científica e provimento de serviços nas ligência artificial, multimídia e certificação áreas citadas. Desenvolve pesquisas e ferramentas na área de Tecnologia de Infor- digital. mação, Comunicação e Educação, incluindo EAD e produção de conteúdos digitais. Foi instituído oficialmente em 03 de maio de 2001 com o nome de VIRTUS - Laboratório de Hipermídia, com a finalidade de desen- Após 1998 a educação à distância se volver soluções em sistemas de informação, consolidou como campo comum, sendo escomunicação, na perspectiva de inclusão pecialmente viva a atividade de desenvolsocial, além de promover estudos e pesqui- vimento de ferramentas aplicadas à sas de caráter transdisciplinar no campo da disponibilização de conteúdos, à preserva63 ção e ao acesso do conhecimento; instru- lóquios, programas, seminários, cursos, treimentos web facilitadores de ambiência pe- namento e outras atividades análogas, bem dagógica (ambientes virtuais de estudo) e a como promover estudos, pesquisas e atividades de extensão que intensifiquem con- comunicação on-line. tatos de pesquisadores, docentes e alunos da Universidade, relacionados com a sua C o m p e t e a o Virtus: induzir a área de atuação. integração da pesquisa avançada, do desenvolvimento de protótipos e do espírito empreendedor, na área de sua atuação; estimu- Nessa estrutura circulam diariamen- lar a associação do laboratório com outras te dezenas de colaboradores entre mestres, universidades, com a iniciativa privada e doutores, alunos de graduação e pós-gracom o conjunto da sociedade em torno das duação e professores visitantes de diversas questões levantadas pelas novas tecnologias instituições internacionais. da comunicação e da informação; promover a melhoria da qualidade e a expansão do ensino, buscando a inclusão de parcelas da população ainda socialmente marginalizadas e trabalhar pelo fim da exclusão tecnológica. Está ainda na esfera de suas atribuições: induzir a criação de empresas de base tecnológica; promover a integração e o intercâmbio de experiências com outros órgãos ou instituições que atuam na mesma área; prestar assessoria e consultoria a órgãos públicos e privados e organizações não governamentais; realizar conferências, co64 Cronologia do hipertexto/hipermídia 900 – O EVANGELHO DE LINDISFARNE – A incidência das iluminuras nos manuscritos criaram novas referências entre textos e imagens. O Lindisfarne (Evangelho) é uma das obras de arte sob a responsabilida- 367 A FESTA DE ENTREGA DO NOVO de da British Library, famoso pela extrema TESTAMENTO – Sabe-se que a bíblia é um qualidade na decoração das suas páginas. apanhado de manuscritos que se entrelaçam Escrito entre 710 e 720, é uma obra de arte e formam os testamentos (Ver a Bíblia Sa- de impressão e um documento histórico e grada do Rei Jamesi). A bíblia como é co- artístico de enorme valor. nhecida hoje, é dividida em 3 partes, o antigo testamento – escrituras antigas do povo hebreu –, o novo testamento – que reconta a 1440 – A BÍBLIA DE GUTENBERG É vida de Jesus Cristo – e os textos apócrifos – PUBLICADA que não entraram no antigo testamento em função de dúvidas quanto a autenticidade. 1590 – PRIMEIRO ROMANCE PUBLICADO DE EDMUND SPENSER “A RAINHA O novo testamento foi compilado por um DAS FADAS” – A caracterização de romancomitê eclesiástico liderado por São Ataná- ce e não mais de novela ou épicos é o que sio1, que além de compilar e estabelecer re- torna esta data tão relevante. A possibilidalações intertextuais – antigo e novo testamen- de de múltiplos encerramentos e entendimentos que o romance permite e se pauta, to – ainda conferiu oficialidade ao livro. leva à contextualização pessoal do texto lido, oferecendo um texto que tende mais para a 868 – O LIVRO IMPRESSO “SUTRA DIA- viagem do que a chegada em particular. MANTE” – O primeiro livro impresso em xilografia: Sutra Diamante, secção das escrituras budistas, com ilustrações xilográficas, im- 1603 – O ALBUM AMICORUM DE presso por Wang-Chieh, em 11 de Maio. KLESHEIM – Começo das questões de au65 toria. Muito comum até hoje o livro da ami- a escrever cartas e todo o desenrolar da hiszade (livro de amigos em algumas regiões) tória dá-se através de cartas. é muito mais do que simples brincadeira de estudante. A idéia nasceu na Alemanha do século XVI e tornou moda entre os estudan- 1760 – A PUBLICAÇÃO DE “A VIDA E tes e professores. A idéia consiste na cria- OPINIÕES DE TRISTAM SHANDY” DE ção de um caderno onde os amigos e inte- LAURENCE STERNE. Uma mega saga ressados possam deixar suas contribuições. composta de nove livros, descrevendo não O melhor exemplo deste tipo de obra é do apenas a vida do heróis, mas principalmenBispo Gervasius Fabricus zu Klesheim, que te suas relações desde antes de seu nascio começou em em 1603 em Würzburg e con- mento. O marco desta obra é a forma que cluiu em 1637 como Arcebispo de Salzburg. foi escrito, sem uma linearidade constante ou mesmo uma relação fixa de espaço narrativo. Um clássico exemplo de ficção 1611 – A VERSÃO DA BÍBLIA SAGRADA hipertextual antes mesmo do hipertexto. DO REI JAMES I – A partir da ordem do Rei James I é que houve uma tradução específica da bíblia para o Inglês. Houve en- 1787 – CARTAS ORIGINAIS DOS ARQUItão a preocupação de realmente estabele- VOS DA FAMÍLIA PASTON, PRIMEIRO cer todas as ligações de textos entre os li- LIVRO INGLÊS PUBLICADO POR MEIvros que compõem os evangelhos. OS MECÂNICOS. As cartas e documentos da família Paston são referências histórias da Inglaterra do Século XV em função de 1740 – PUBLICAÇÃO DA NOVELA “VIR- sua sistematização e de sua ampla referênTUDE RECOMPENSADA” – OU PAMELA cia cruzada por todo o território saxão. – DE SAMUEL RICHARDSON – resultado de uma época muito menos sonhadora e muito mais racional este épico da novela 1790 – O MATRIMÔNIO ENTRE O CÉU E neoclássica marca o hipertexto, pois surgiu O INFERNO DE WILIAN BLAKE. Blake, da necessidade de ensinar às jovens moças avesso à revolução industrial e os derivados 66 do “inferno mecânico”, trouxe à tona, mais ficamente que este lay out não é o mais adeuma vez, a graça da Iluminura. Neste livro quado e mesmo assim permaneceu até os escrito e ilustrado pelo próprio, é segundo dias de hoje, por hábitos e costumes. ele mesmo uma fusão de estímulos – imagem e texto – para melhor percepção. Segundo muitos autores é uma das possíveis 1892 – ROMANCE “NOTÍCIAS DE LUantecipações ao hipertexto mutimidiático. GAR NENHUM” É PUBLICADO PELA KELMSCOTT PRESS. Mais uma vez a obra textual tem seu espaço dividido com as ar1854 – TEMPOS DIFÍCEIS DE CHARLES tes visuais. William Morris, era poeta, esDICKENS É PUBLICADO. Muito mais do critor, designer e artista e um fiel defensor e que um final feliz espera-se um final em um até mesmo precursor das artes e ofícios, e livro. Este obra em particular de Charles conseguiu em sua própria editora imprimir Dickens marca seu espaço na cronologia do e ilustrar seu próprio romance, estabelecenhipertexto, não pela ausência de um final, do uma relação hipertextual entre imagem mas porque este final exige uma atitude, uma e texto. nova forma de pensar. 1922 – TERRA DESOLADA (THE WASTE 1872 – O LAYOUT DE TECLADOS LAND) DE T.S. ELLIOT É PUBLICADA. Em QWERTY É PATENTEADO POR uma constante interrogação teórica pelo des- CRISTOPHER SHOLES. O layout anterior- tino da humanidade, Elliot cria sua primeira mente utilizado causava problemas às pes- obra com jogos de imagens, paralelismos e soas realmente velozes na datilografia, pois correspondências. Terra desolada trata de era comum o travamento das hastes com as temas como a metamorfose, a ambigüidade letras. A idéia de Sholes a princípio era en- signica e a eterna e constante procura. Toda tão reduzir a velocidade da escrita, separan- a obra é baseada no mito da busca pelo Sando as letras em pares (dígrafos) para que to Graal. A hipertextualidade desta obra está determinadas seqüências fossem mais facil- nas características semióticas, literárias e vimente datilografadas. É comprovado cienti- suais, além de como ele mesmo descreve a 67 obra, em seus três pontos de vislumbre: O considerado ainda hoje o pai da concepção poeta falando para o poeta, o poeta para um da tecnologia a serviço do hipertexto. Em seu público e do poeta ator que se vê como um tratado “as we may think” ele descreve o dispositivo MEMEX (MEMory EXtension), um personagem dramático. indexador de dados que estabeleceria a consulta a determinados assuntos com base em 1925 – NOTAS SOBRE O TABLETE DE ES- um banco de dados próprio e microfilmados CRITA MÁGICO (A NOTE UPON THE gerando a possibilidade de expansão e atua‘MYSTIC WRITING-PAD’) DE FREUD É lização. A relação do pensamento com o PUBLICADO. Neste material Freud começa hipertexto fica muito claro com o MEMEX seu discurso a respeito da percepção humana, e demonstra nesta metáfora como o ser entende e utiliza seus conhecimentos adqui- 1959 – O LABIRINTO DE ROBBEridos. O brinquedo de criança, onde se escre- GRILLET É PUBLICADO - Como caracteve sobre uma película, e ao se levantar a es- rística básica Robbe-Grillet é um moderniscrita some. Freud compara esta “mágica” à ta. Suas novelas são tão cheias de compreensão humana, em que a informação detalhamento que são facilmente adaptados a outras mídias, como cinema (L’année continua ali, apenas não está mais visível. dernière à Marienbad - Ano passado em Marienbad) e teatro. É esta característica 1939 – “O DESPERTAR DE FINNEGANS”, que coloca “Dans Le Labirinth” como marPOR JOYCE É PUBLICADO. Este livro é con- co na história do hipertexto, a habilidade do siderado o exemplo da literatura moderna In- autor de transformar o conhecido em algo glesa, e apresenta todos os traços estéticos do completamente inédito, através de objetos hipertexto e suas características de inter-rela- e referências pontuais que o texto apresencionamento de idéias em uma obra realista. ta. O raciocínio não linear da obra é um reforço a própria novela. 1945 – VANNEVAR BUSH PUBLICA O TEXTO “AS WE MAY THINK”. Vannevar Bush é 1962 – VLADIMIR NABOKOV PUBLICA 68 “PALE FIRE” – “Pale Fire” é considerada 1963 – ENGELBART PUBLICA “AUMENobra precursora do pós-modernismo e o me- TANDO O INTELECTO HUMANO: UMA lhor exemplo da “literatura da exaustão”. Os ESTRUTURA CONCEITUAL” – Trabalhando produtores e leitores de hipertextos se inte- com William K. English e John F. Rulifson, ressarão pela obra. Dividida em 4 seções, o Engelbart cria as bases do “Sistema On-line” leitor tentará em vão encontrar a verdade (NLS – oN Line System), a primeira versão do entre dois pontos de vista contidos na histó- que viria a ser o hipertexto. O foco principal do ria, até se dar conta de que o que Nabokov sistema, constituído por editores de esquemas fez foi construir um labirinto extremamente para desenvolvimento de idéias, linkagem encomplexo, que estabeleceu alguns dos meca- tre hipertextos, teleconferências, processadores nismos formais do hipertexto hoje utilizados. de palavras, e-mail e uso de programação e configurações, era a “colaboração entre grupos distribuídos geograficamente”. 1962 – “CEM MIL MILHAS DE POEMAS” POR RAYMOND QUENEAU - Raymond Queneau escreveu Cent Mille Milliards de 1965 – TED NELSON CRIA O TERMO Poèmes onde se podiam juntar os versos das “HIPERTEXTO” – o termo “hipertexto” foi estrofes para formar múltiplos sonetos, de cunhado por Nelson em ensaio entregue para a conferência anual da Association of acordo com as opções do leitor. Computing Machinery (ACM), após cinco anos testando o programa “Xanadu”, editor de tex1963 – COMPOSIÇÃO Nº 1 DE MARC to que possibilitava revisão, comparação e a SAPORTA É PUBLICADA - Considerada um reescrita de forma rápida, desenvolvido por ele dos clássicos da literatura francesa em fun- como projeto de conclusão de mestrado. ção de seu formato. Novela escrita em folhas soltas que permitem sua leitura a esmo, criando sua compreensão a partir do inte- 1966 – CORTÁZAR PUBLICA resse particular do leitor. Foi escrita em 62 e “HOPSCOTCH” – Constituído por 155 capublicada e traduzida em 63. pítulos, o livro “Hopscotch” pode ser lido da forma convencional, mas na verdade foi 69 construído como um “guia de instruções”, sibilitou a escolha dos elementos em tela cujo objetivo é conduzir o leitor por um la- através de cliques sobre eles com seu cursor, birinto de hipertextos, mostrando ao final de a seta. cada capítulo qual deve ser o próximo. 1968 – HES É DESENVOLVIDO POR NEL1967 – “LITERATURA DA EXAUSTÃO” DE SON E VAN DAM – Em 1968, Ted Nelson, BARTH É PUBLICADO - Neste ensaio, Andries van Dam e um grupo de estudanBarth afirmou que as formas convencionais tes implementaram na Universidade Brown de literatura, oriundas do século XIX, já es- o Sistema de Edição de Hipertexto tavam esgotadas e que as inovações moder- Hypertext Editing System (HES). Nelson se nistas não poderiam continuar sendo siste- decepcionou e abandonou o projeto logo maticamente ignoradas. A obra gerou polê- depois. mica e deixou uma importante reflexão a respeito da relação entre meio e mensagem: mudar o meio pode nos fazer encontrar no- 1969 – FRESS É DESENVOLVIDO – um vas mensagens, ou novas formas de ano após o abandono do Sistema de Edição reutilizar as antigas, nos levando a repen- de Hipertexto, um novo sistema foi sar as tradições culturais. implementado na Universidade Brown: o File Retrieval and Editing System (FRESS). O FRESS era um sistema multi-usuários e 1968 – ENGELBART IMPLEMENTA O foi utilizado durante cerca de 10 anos. Seu NLS E INVENTA O MOUSE– o desenvol- objetivo era permitir que informações fosvimento do “Sistema On-line”, cuja ênfase sem trocadas entre os participantes. Clasestava em criar um ambiente predominan- ses inteiras poderiam escrever ao mesmo temente visual numa época em que as pes- tempo num mesmo ambiente e cada aluno soas mal tinham contato com o computador, construía seu próprio espaço manipulando exigiu a criação de mecanismos que possi- textos, gráficos, imagens e vídeos, conecbilitassem a manipulação desse ambiente. tando-os uns aos outros e disponibilizandoA solução encontrada foi o mouse, que pos- os para outros alunos. O programa possuía 70 ainda um rico ambiente de navegação, com e Ed Roberts e em Abril do mesmo ano foi aberta a empresa “Micro-Soft”, que mais mapas e histórico. tarde teve sua grafia alterada. No mês de Julho do mesmo ano surgiu, em Los 1970 – A EXIBIÇÃO ATRÓS É PUBLICADA Angeles, a primeira loja de varejo de com- “Atrocity Exhibition” é formado por peque- putadores. nas histórias, linkadas temática e estruturalmente. Retratam a desestruturação psicológica causada pela sobrecarga mental sofri- 1976 – APPLE I – STEVE WOZNIAK (1950 da pelas pessoas na modernidade, em dife- ) E STEVE JOBS (1955 -) terminam o projeto rentes ambientes e situações, resultando do micro Apple I, o primeiro microcomputador numa estrutura hipertextual, composta por feito para ser vendido em grande escala, e fundam a Apple Computer Company. material heterogêneo e não-seqüencial. 1972 – DESENVOLVIMENTO DO SISTE- 1977 – APPLE II – utilizando discos de MA ZOG – Em uma equipe cujos dois prin- inicialização (floppy discs), melhores do que cipais pesquisadores eram Donald fitas cassetes, e gráficos coloridos quando McCracken e Robert Akscyn começou a de- ligados e um monitor de tv a cores. senvolver na Carnegie-Mellon University o ZOG, um software administrativo destinado a aeronaves munido de manuais de proce- 1977 – “COMPUTADORES DE MESA” LIdimento. NHA TRS80 – É lançado o Radio Shack TRS 80, classificado como “computador de mesa”. 1975 – ALTAIR, O PRIMEIRO COMPUTADOR PESSOAL – Em Janeiro de 1975, foi 1978 – ASPEN MOVIE MAP – Este talvez lançado Altair 8800, o primeiro computador tenha sido o primeiro sistema hipermídia. pessoal. O termo “PC” foi cunhado mais tar- Foi desenvolvido por Andrew Lippman e code por um de seus inventores, Stewart Brand legas no grupo de arquitetura de máquinas 71 do MIT, que atualmente junto com outros a Microsoft a construção dos PCs, que degrupos formam o laboratório de mídia. O sis- vem ser fabricados pela primeira companhia tema é uma aplicação em turismo que per- para rodar de acordo com os programas mite ao usuário simular uma viagem pela Microsoft. Em 1983, a IBM lança o PC-XT cidade de Aspen, estado do Colorado - USA, 370, com 10 megabytes de memória. A Apple na tela do computador. Ele foi implementado anuncia o Macintosh, que é infinitamente através de um conjunto de videodiscos con- mais simples de operar que qualquer comtendo fotografias de todas as ruas da cida- putador existente à época; e a Microsoft de. Os filmes foram obtidos com câmaras apresenta o programa de interface Windows. montadas em carros que foram dirigidos A IBM recusa o Windows até ser obrigada a através da cidade. A característica aceitá-lo para poder concorrer com o hipermídia do sistema foi obtida através do Macintosh. acesso destas fotos de uma base de dados tradicional, mas que permitia a conexão com um conjunto de outras informações. O sis- 1981 – INÍCIO DO DESENVOLVIMENTO tema não foi uma aplicação de fato, no sen- DO KMS – Dois dos principais pesquisadotido de auxiliar a alguém realizar algo. Mas res do ZOG, Donald McCracken e Robert ele estava muito adiante do seu tempo e foi Akscyn, formaram a Knowledge Systems em de grande significância histórica por mos- 1981 e começaram a trabalhar em um protrar o caminho de aplicações futuras. Mes- duto comercial, baseado nas pesquisas reamo agora, passados mais de vinte anos, ele lizadas, denominado Knowledge ainda é um dos mais sofisticados sistemas Management System (KMS). O KMS foi dede hipermídia construídos senvolvido procurando satisfazer às necessidades dos usuários. Era uma base de dados compartilhada num sistema muito sim- 1980 – A DÉCADA DOS MICROS – Os ples, sem menus retráteis, botões, janelas, microcomputadores fazem sucesso desde o mapas de navegação ou barras de rolagem, início, mas conquistaram casas, escritórios, pois “quadros” foram considerados mais efisupermercados e bancos a partir dos anos cientes. A navegação era realizada utilizan80. No começo de 1980, a IBM negocia com do-se um mouse de três botões, cujo cursor 72 mudava de acordo com o tipo de informação 1982 – DESENVOLVIMENTO DO SISTEsobre a qual era posicionado. Importação, MA GUIDE – Guide começou a ser desenagrupamentos, traduções, pesquisas simples volvido por Peter Brown na University of Kent em 1982 e inicialmente deveria ser uti- e ajuda on-line estavam disponíveis. lizado em estações de trabalho que rodassem UNIX; foi o primeiro sistema hipertexto 1981 – A IBM ANUNCIA EM NOVA YORK para computadores pessoais. O LANÇAMENTO DO PC 5150, o antecessor de todos os micros que hoje dominam o mercado mundial. Ele tinha 64 quilobytes de 1982 – ZOG INSTALADO NO USS CARL VINSON - O ZOG foi instalado nas aerona- memória e velocidade de 4,77 megahertz. ves da empresa USS Carl Vision em 1983 usando 28 estações de trabalho PERQ em rede. 1981 – “MÁQUINA LITERÁRIA” de NELSON - após cunhar o termo hipertexto em 1942, Nelson descreveu longamente o fun- 1983 – ENCICLOPÉDIAS INTERATIVAS cionamento do Xanadu em Literary – TIES - Em 1983, Ben Scheiderman coMachines, chamando-o de “local mágico de meçou a desenvolver na Universidade de memória literária”. Quando a edição de 1987 Maryland o “Sistema de Enciclopédia da obra foi lançada, o desenvolvimento do Interativa”. O produto seria lançado comerXanadu havia ganhado impulso e mais tar- cialmente e suas primeiras versões aceitade a Xanadu Operating Company foi com- vam apenas texto DOS e usava “cursor ” para navegação. As versões posteriores pas- prada pela Autodesk saram a aceitar vídeos, sons, links, mapas de navegação e touch-screen, ideal para qui1981 – IBM PC - o primeiro PC da IBM foi osques de informação. chamado de XTs. Possuía monitor monocromático e apenas 640 kb de memória, que poderiam ser expandidos para 1 MB. 1983 – PRIMEIRO PHD EM HIPERTEXTO - Em 1983, foi defendida, por Randall Trigg, 73 na University of Maryland, a primeira tese 1985 – INTERMEDIA – Desenvolvido na Brown University o sistema para documen- de PhD sobre hipertexto tos multimídia projetado pelo Institute for Research and Scholarship (Iris). Nesse sis1984 – O “GUIDE” É LANÇADO CO- tema, os links pertenciam a webs (redes), MERCIALMENTE - Guide tornou-se o pri- de tal forma que, para visualizar um documeiro sistema de hipertexto a ser desenha- mento, o usuário devia selecionar uma web específica. Os links eram, assim, dependendo e utilizado em estações de trabalho. tes de contexto 1984 – SURGE O NOTECARDS NA XEROX PARC (PALO ALTO RESEARCH CENTER) 1985 – A MICROSOFT LANÇA NO MER- Randall Trigg depois de apresentar uma CADO O PROGRAMA DE INTERFACE tese sobre hipertexto em 1983, foi trabalhar WINDOWS - e a primeira versão do prona empresa Xerox, desenvolvendo com grama de texto Word para rodar em micros Frank Halasz e Thomas Moran o NoteCard, Macintosh. Em dois anos, o Windows veninicialmente idealizado como uma ferra- de 1 milhão de cópias. menta para analistas de informação. NoteCard rodava em LISP nas estações de trabalho da Xerox D, que suportavam gráfi- 1986 – WE - WRITING ENVIRONMENT – cos de alta resolução em grandes tamanhos. Universidade da Carolina do Norte – projeto Cada janela era a reprodução de um fila de baseado em modelo de processos cognitivos cartões. Seu tamanho podia variar, mas não envolvidos na autoria de textos, cujo objetihavia barra de rolagem. Vários tipos de vo era suportar todas as fases do processo de mídia eram suportados e mapas de navega- escrita de textos (conteúdo e estrutura). ção globais e locais eram disponibilizados, além de pesquisa. Também era possível formar porta-cartões. O NoteCards inspirou em 1986 – GUIDE LANÇADO PELA APPLE parte a construção do HyperCard. A Apple começa a produzir o Guide comercialmente em 1986. 74 1986 – SURGE A LINHA 80386 DE COM- cartões de visita. O conjunto destes cartões PUTADORES PESSOAIS – Os computado- (pilhas) permitem a navegação entre as inres pessoais saem da asa da IBM e come- formações O criador do HyperCard, Brian çam a ser desenvolvidos por diferentes em- Atkinson admitiu que o sistema não foi propresas tendo como precursora a Compaq. Os jetado como um verdadeiro hipertexto no iníPCs 386 também abriram frente com os avan- cio. Ele originalmente construiu o HyperCard como um ambiente de progra- ços da multimídia. mação gráfico e muitas aplicações obtidas com ele nada tem a ver com hipertexto. Mes1987 – CANON CAT – Considerado como o mo assim, este sistema é, atualmente, talvez, Macintosh original este computador surgiu da um dos mais conhecidos produtos de cabeça de Jef Raskin. No entanto a maior ca- hipertexto. Existem alguns motivos para esta racterística diferenciadora do CAT é a não uti- popularidade. A mais pragmática delas foi a lização de mouse ou ícones, mas simplesmen- distribuição sem custos adicionais com cada te um teclado especial no qual a combinação computador Mac vendido a partir de 1987. de teclas o usuário navegaria no hipertexto Um segundo motivo é que ele incluí uma linguagem de programação geral denominada HyperTalk que é muito fácil de ser aprendi- 1987 – AUTHORWARE – Surge um dos pri- da e é bastante poderosa na construção de meiros softwares de autoração eletrônica que interfaces gráficas. pensa hipermidiaticamente e permite a confecção de apresentações multimídias e cd-roms. 1987 – GUIDE LANÇADO PARA O MSWINDOWS - Em Julho de 1987, além da 1987 – HYPERCARD PARA O MACINTOSH versão da Apple, começou a ser produzida – Verdadeira revolução no hipertexto surgiu também uma para a Microsoft. Sua versão com o software criado para a Appel, o 3.05 suportava gráficos, vídeos, indicadores HyperCard. Como já prenuncia o próprio externos e importação e exportação de arnome é um sistema baseado em cartões e quivos. Havia também pesquisa de docuframes (como o KMS), porém na versão de mentos e histórico, além de poder-se utili75 zar itálico para referências, negrito para vencedor e logo depois desapareceram.. O notas e underline para links. Os links eram conceito principal do texto enfatiza a discriados em Pascal e podiam ser modifica- tância, the ineluctable lacuna entre a escridos para outra tipografia. O ponteiro do ta e o que se procura representar; a lacuna entre textualidade e a representação em si mouse mudava quando estava sobre link. mesma. O volume se divide em 3 dicionários, um para cada religião que participou da 1987 – “HIPERTEXTO: INTRODUÇÃO E interpretação do sonho, com verbetes em PESQUISA” – Em setembro de 1987 Jeff ordem alfabética. O formato do livro, com Conklin escreveu o artigo já demonstrando vários dos termos representados por ícones a evolução dos recursos e o avanço na utili- numa referência direta aos hipertextos perzação de hipertextos e hipermídia no coti- mite que o livro seja ser lido de muitas maneiras diferentes e é uma crítica de Pavic à diano. passividade criada pelo modo tradicional de leitura. É importante dizer, ainda, que o 1988 – DICIONÁRIO DE KHAZARS POR Dictionary of Khazars está disponível em PAVIC - O dicionário de Milorad Pavic so- duas edições, uma masculina e uma femibre os Khazars foi traduzido para o inglês nina. Apenas 17 linhas diferem uma edição pela primeira vez em 1988. O texto trata de da outra, mas estão numa carta crucial do um enigma histórico real: a conversão e o livro hebreu e a diferenciação da narrativa subseqüente desaparecimento do império visa levar o leitor à reflexão. Khazar, uma tribo guerreira e nômade que vivia entre os mares Cáspio e Negro no século XVII. Seu poderoso império entrou em 1989 – APOSTILA SOBRE HIPERTEXTO colapso após a decisão de seu líder de ter DE SCHNEIDERMAN E KEARSLEY-Lisum de seus sonhos interpretados por 3 sábi- ta de regras e formas de criação/organizaos: um judeu, um cristão e um muçulmano. ção de hipertextos torna-se o primeiro livro Apesar de não se saber qual das 3 interpre- a efetivamente normatizar o hipertexto. tações foi a mais satisfatória, os Khazar aparentemente se converteram à religião do 76 1989 – LINKWAY IBM – Desenvolvido por 1989 – AFTERNOON PUBLICADO- O texLarry Kheriaty na University of Western to “Afternoon” de Michael Joyce foi conceWashington’s Western Educational Software bido em 1989 para o software criador de Tools Centre, o objetivo do projeto Linkway hipertextos Storyspace. Atualmente, está era implementer um HyperCard para o sitema disponível no Eastgate Systems. “Afternoon” DOS. A IBM licenciou o software, que acei- se estabeleceu como um “clássico” do novo tava texto, gráficos e sons, animação e con- gênero, recebendo elogios do New York trole de vídeo através de um mouse, em 1989 Review of Books e do The Washington Post, entre outros. Há tantos modos de interpretar a obra de Joyce quanto há possibilida1989 – MACROMEDIA DIRECTOR – A des de leituras. software house produtora do Authorware lança uma versão mais voltada ao usuário final do seu software de autoração. Utilizando metáforas 1989/1990 – WORLD WIDE WEB – O pesbaseado em teatro o director age como um di- quisador europeu Tim Berners-Lee desenretor com seu elenco “atuando” volve a World Wide Web (ou WWW, sigla em multimidiaticamente no palco, através de scripts inglês para rede de extensão mundial) para permitir o compartilhamento de documen- e regras bem próprias às suas necessidades. tos entre cientistas. Essa rede – que dá origem à Internet – utiliza uma tecnologia que 1989 – IRIS INTERMEDIA 3.0 – Em abril liga um texto a outro e facilita as consultas, de 1989, Intermedia foi lançado comercial- ligação que recebe o nome de “hipertexto”. mente numa versão que permitia importa- Berners-Lee também desenvolve o primeição e exportação de um número seleciona- ro programa para leitura de páginas em do de tipos de arquivos (ASCII, Microsoft hipertexto (ou “browser”), chamado Lynx, Word, DIF) e trazia um dicionário on-line que não exibe imagens. completo. Infelizmente, após sua versão 4.0, incompatibilidades com o sistema Apple e o corte dos subsídios para pesquisa levaram 1991 – GOPHER – Gopher é um protocolo ao abandono do projeto. de redes de computadores que foi desenha77 do para indexar repositórios de documen- 1991 – BÍBLIA ELETRÔNICA – Além de ter tos na Internet. Foi especificado em 1991 sido o primeiro livro impresso, a Bíblia talvez por Paul Lindner e Mark McCahill da Uni- tenha sido o primeiro livro a ser transportado versidade do Minnesota.O Gopher perdeu para a versão digital. Não se sabe quem digitou popularidade com o crescimento da WWW, sua primeira versão. Outras foram lançadas, devido à sua falta de flexibilidade quando como a da “Franklin Products” contendo dicionário, localizador de conteúdo e guia de pro- comparado com o HTML. núncia, tornando-a um hipertexto e mostrando mais uma vez que livros e hipertextos não 1991 – LINUX – O finlandês Linus Torvald são incompatíveis, e sim complementam uns cria o sistema operacional Linux, programa aos outros, abrindo novas possibilidades de leiem que o código-fonte é liberado, permitin- turas e interpretações, e de novos livros. do a qualquer programador modificar o software. Tradicionalmente, os programas aparecem na forma binária e são entendi- 1992 – WINDOWS AGREGA MULTIdos apenas pelo computador. Em 1999, já MÍDIA – A Microsoft lança o sistema tendo passado por milhares de testes e mo- operacional Windows versão 3.1. Ele facilidificações, o Linux atinge cerca de 10 mi- ta a utilização de recursos multimídia, o que possibilita uma rápida expansão dos produ- lhões de usuários em todo o mundo. tos em CD-ROM para os usuários de computadores pessoais. Empregados em progra1991 – DISCMAN DE DADOS– A Sony es- mas educativos e de entretenimento, os CDcolheu o CD-ROM como suporte para lan- ROMs podem trazer, além de texto, som, çar, em 1991, o Data Discman, que reproduz vídeo, foto e animação. cds de áudio e CD-ROMs e inclui um pequeno teclado com cursor. Sua tela comporta até 10 linhas de texto e o aparelho funcio- 1993 – MOSAIC E OS PRIMEIROS na com bateria cuja duração é de 3 horas. BROWSERS – Surge o primeiro browser (programa de navegação) capaz de exibir imagens, o NCSA Mosaic, desenvolvido por 78 alunos do Centro Nacional de Aplicações tificar um tipo específico de coleção de dopara Supercomputadores (NCSA) da Univer- cumentos em hipertexto ou o software sidade de Illinois. Na equipe de pesquisa- colaborativo usado para criá-lo. “Wiki wiki” dores estava Marc Andreessen, que funda- significa “super-rápido” no idioma havaiano. ria a empresa Netscape Communications um É também a forma diminutiva de Wikitoria, ano depois. O software torna-se popular sen- versão Maori do popular nome cristão, do distribuído gratuitamente via internet. Victoria. Chamado “wiki” por consenso, o software colaborativo permite a edição coletiva dos documentos usando um singelo sis- 1993 – INTERNET ANARQUICA – A Fun- tema e sem que o conteúdo tenha que ser dação Nacional de Ciência (NSF) retira-se revisto antes da sua publicação. Wiki (com da administração da internet e deixa que um ‘W’ maiúsculo) e WikiWikiWeb são por empresas particulares se conectem e vendam vezes usados para se referir ao Portland acesso à rede. A partir daí o uso da rede cres- Pattern Repository, primeiro wiki. ce velozmente em todo o mundo. 1998 – E2* – Everything2, ou simplesmente 1993 – “THE ELECTRONIC LABYRINTH” E2, é uma grande comunidade de colaboÉ ESCRITO – É um estudo realizado por ração na Internet. Ela se autodenomina Christopher Keep, Tim McLaughlin e Robin como tendo “um crescimento por ser uma Parmar a respeito das implicações do enciclopédia editável muito simples para hipertexto junto a escritores criativos que uma comunidade ‘’online’’ focada na espretendem ir além das noções tradicionais crita, publicação e edição de um banco de de linearidade. Este projeto nasceu a partir dados de qualidade com conteúdo informade pesquisas realizadas no Canadá, e tem tivo, de introspecção e de humor. sua versão publicada na web em 1995. 1998 – XML* – eXtensible Markup 1993 – WIKI* – Os termos wiki (pronunciado Language é uma recomendação da W3C “wiquie”) e WikiWiki são utilizados para iden- para gerar linguagens de marcação para 79 necessidades especiais. XML é um subtipo pode ler então estes mesmos dados. de SGML (Standard Generalized Markup Language - Linguagem Padronizada de Marcação Generica) capaz de descrever di- 1999 - PEER TO PEER - Apesar da relevânversos tipos de dados. Seu propósito princi- cia do P2P apenas se fortificar a partir de pal é a facilidade de compartilhamento de 2002, é em 1999 que as primeiras transainformações através da Internet. Estimula- ções “ponto a ponto” começam a aparecer. do pela insatisfação com os formatos exis- Esta metodologia de comunicação e troca tentes (padronizados ou não), um grupo de de arquivos ampliou fortemente a atuação empresas e organizações que se dos usuários na troca de arquivos e inforautodenominou World Wide Web mações mais generalizadamente. Consortium (W3C) começou a trabalhar em meados da década de 1990 em uma linguagem de marcação que combinasse a flexibi- 1999 - ICQ e IM - ICQ (ou iCQ) é um prolidade da SGML com a simplicidade da grama de comunicação instantânea pela HTML. O principio do projeto era criar uma Internet que foi o mais popular durante anos. linguagem que pudesse ser lida por A sigla é um trocadilho feito baseado na prosoftware, e integrar-se com as demais lin- núncia das letras em Inglês (I Seek You), em guagens. Sua filosofia seria incorporada por português, “Eu procuro você”. O ICQ foi o vários princípios importantes: Separação do pioneiro desta tecnologia tendo sua primeiconteúdo e da formatação; legibilidade tan- ra versão lançada em 1997 por uma empresa to por humanos quanto por máquinas; pos- israelense chamada Mirabilis, fundada por sibilidade de criação de tags sem limitação; Yair Goldfinger, Arik Vardi, Sefi Vigiser e criação de arquivos para validação de es- Amnon Amir. Em 1999 a AOL adquiriu a trutura; com seu uso pode-se interligar ban- Mirabilis englobando o serviço. A empresa cos de dados distintos; Simplicidade; XML nunca se definiu sobre seu mensageiro insconcentra-se na estrutura da informação e tantâneo padrão e desenvolveu seu próprio: não na sua aparência. - Um banco de dados AIM ou AOL Instant Messenger. Esse é oupode, através de uma aplicação escrever em tro motivo da queda no número de usuários um arquivo xml, e um outro banco distinto do ICQ e do crescimento e hegemonia do 80 MSN Messenger nos últimos anos. Porém o tribunal, Eldred v. Ashcroft. A primeira proICQ continua ativo com uma equipe apresen- posta de licenças Creative Commons foi putando novas versões regularmente e com op- blicado em 16 de Dezembro de 2002. O ções inovadoras como a troca de mensagens projecto foi premiado com o Golden Nica Award no Prix Ars Electronica na categoria SMS de telefones celulares. “Net Vision” em 2004. 2001 - CREATIVE COMMONS E GNU - A preocupação com a liberdade de criação e o 2001 – WIKIPEDIA* – é uma enciclopédia colaborativismo gerado pela web. As licen- multilingual on-line livre e colaborativa, ou ças Creative Commons foram precedidas pela seja, escrita por várias pessoas, todas elas Open Publication License (OPL) e pela GNU voluntárias. Foi criada em Janeiro de 2001. Free Documentation License (GFDL). A Por ser livre, entende-se que qualquer artiGFDL foi criada principalmente como uma go dessa obra pode ser copiado, modificado licença para documentação sobre software, e ampliado, desde que os direitos de cópia mas é também utilizada por projectos como a e modificações sejam preservados, visto que Wikipedia. A OPL está agora defunta e o seu o conteúdo da Wikipédia está sob a licença criador sugere que os novos projectos não a GNU/FDL (Free Documentation License é utilizem. Quer a OPL quer a GFDL contêm uma licença para documentos e textos livres partes opcionais que, na opinião dos críticos, publicada pela Free Software Foundation). as tornavam menos livres. A GFDL diferen- O modelo wiki é uma rede de páginas web cia-se das licenças CC no requisito que a obra contendo informações das mais diversas que licenciada seja distribuída numa forma que podem ser modificadas e ampliadas por seja transparente, ou seja, que seja possível qualquer pessoa através de navegadores de editar utilizando software open-source. O comuns, tais como o Mozilla Firefox, Creative Commons foi lançado oficialmente Internet Explorer, Safari, Netscape, ou qualem 2001. Lawrence Lessig, o fundador e pre- quer outro programa capaz de ler páginas sidente da Creative Commons, começou a or- em HTML e imagens. Este é o fator que disganização como um método adicional de con- tingue a Wikipédia de todas as outras enciseguir os objectivos do seu caso no Supremo clopédias: qualquer pessoa com acesso à 81 Internet pode modificar qualquer artigo, e 2003 - SMS E MMS - Serviço de mensacada leitor é um potencial colaborador do gens curtas ou Short message service (SMS) projeto. A enciclopédia sem fins lucrativos, é um serviço disponível em telefones celulagerida e operada pela Wikimedia res (telemóveis) digitais que permite o envio Foundation que organiza 3,5 milhões de ar- de mensagens curtas (até 160 caracteres em tigos e mais de 720 milhões de palavras em GSM e 255 em CDMA) entre estes equipa205 idiomas e dialetos, contém mais de um mentos e entre outros dispositivos de mão milhão de artigos em língua inglesa, segun- como palm e handheld, e até entre telefones do dados de Fevereiro de 2006, e 140.778 fixos (linha-fixa). SMS originalmente foi proartigos em língua portuguesa. A maioria das jetado como parte do GSM (Sistema de coentradas tratam-se de artigos, mas o núme- municação móvel global) padrão digital de ro total de entradas inclui imagens, páginas telefone celular, mas está agora disponível de usuários, páginas de discussão, etc. Des- num vasto leque de redes, incluindo redes de seu início, a Wikipédia tem aumentado 3G. Já se discute e planeja-se sua evolução firmemente sua popularidade, e seu suces- através do MMS (Multimedia Messaging so tem feito surgir outros projetos irmãos. Service). Com o MMS, os usuários poderão enviar e receber mensagens não mais limitados aos 160 caracteres do SMS, bem como 2002 P2P - Colaborativismo na troca direta poderão enriquecê-las com recursos de arquivos.P2P ou Peer-to-Peer é uma audiovisuais, como imagens, sons e Tecnologia para estabelecer uma espécie de gráficos.O primeiro SMS foi projetado em derede de computadores virtual, onde cada es- zembro de 1992 de um computador pessoal tação possui capacidades e responsabilida- (PC) a um telefone celular na rede da GSM des equivalentes. Difere da arquitetura cli- de Vodafone no Reino Unido. Apesar de ter ente/servidor, no qual alguns computado- iniciado o projeto em 1992 é apenas em 2003 res são dedicados a servirem dados a ou- que sua aplicação começa a ser utilizada de tros. Esta definição, porém, ainda é dema- outras maneiras. Esta tecnologia expandiu siado sucinta para representar todos os sig- a atuação do hipertexto e da hipermídia atranificados do termo Peer-to-Peer. vés de suas possibilidades de atuação sem limitações impactantes. 82 2004 - ORKUT - O Orkut é uma rede social filiada ao Google, criada em 22 de Janeiro de 2004 com o objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos. Seu nome é originado no projetista chefe, Orkut Büyükkokten, engenheiro turco do Google. Tais sistemas, como esse adotado pelo projetista, também são chamados de rede social. 83 Depois do hiper Atualmente, George Landow é professor de Por Cícero Inácio da Silva inglês e história da arte na Brown University, em Providence, nos Estados Unidos. A lista de suas publicações é extensa. Dentre elas Especialista em hipertextualidade, George destacam-se os seguintes livros: Landow fala sobre a escrita na era da “Hypermedia and literary studies” (MIT, 1991) e “Word: text-based computing in the internet humanities” (MIT, 1993), ambos em parceira com Paul Delany, “Hypertext: the George Landow é um dos pioneiros na crítica de textos em suportes eletrônicos conhecidos, na atualidade, como hipertexto ou hipermídia. Seus primeiros artigos e livros sobre o assunto datam de 1991 e têm grande importância como reflexão sobre a escri- convergence of the contemporary critical theory and technology” (Johns Hopkins UP, 1992), “Hypertext in Hypertext” (Johns Hopkins UP, 1994), estudo que foi ampliado e posteriormente publicado como “Hypertext 2.0” (Johns Hopkins UP, 1997). ta e a recepção com o uso das tecnologias digitais. Além disso, Landow é editor de “Hyper/text/ theory” (Johns Hopkins UP, 1994), uma coLandow discute os efeitos da mídia eletrônica na criação literária, dialogando com au- letânea com textos críticos de Gregory Ulmer, Espen Aarseth, entre outros. tores como Paul de Man, Jacques Derrida, James Joyce, Gilles Deleuze, Michel Foucault, entre outros, o que o deixa numa Apesar de ser um autor referencial, nenhum posição diferente daquela que, por exemplo, de seus livros foi traduzido no Brasil. Uma trata de temas como “o fim do livro” pelo explicação possível para essa lacuna seria viés profético e “futurológico” que tem aco- sua postura crítica que não se deixa afetar metido grande parte da crítica a respeito do tão facilmente pelas “transformações” oferecidas/provocadas pela era “tecnologial.” uso da tecnologia. 84 Em entrevista concedida por e-mail, ele fala temática entre conceitos do que propriasobre hipertextualidade, sua obra e, acima mente uma linguagem. Como pensa a relade tudo, a recepção do texto na contempo- ção entre tecnologia e linguagem? Como pensa a questão da máquina? Será possível raneidade. uma máquina escrever? Ou a própria escritura já é uma máquina? No seu livro “Hypertext 2.0”, você defendia a não distinção entre hipermídia e hipertexto. Atualmente você manteria essa Landow: Eu vejo a escritura como uma das primeiras e mais importantes tecnologias posição? Por que? desenvolvidas pelo homem, e cada um dos seus conjuntos de ferramentas -buril e argiGeorge Landow: Os textos de computador - la, pena e pergaminho, talhadeira e pedra, sejam eles hipertextos ou não- podem facil- impressão e papel, teclado e tela de compumente incluir imagens e textos alfanu- tador- afeta a leitura, a escrita e nossas conméricos, já que, em computadores, é possí- cepções destas. vel armazenar tanto palavras como imagens na forma de códigos. A interconexão destes textos ou de combinações de textos e ima- A leitura e a escritura são sempre materiais, gens já é o hipertexto (e a hipermídia). Não mesmo que o texto do computador seja covejo como faria sentido distinguir entre os dificado e virtual. Nós criamos e percebedois. Por outro lado, deveríamos fazer uma mos nele arranjos físicos muito específicos, distinção entre o hipertexto e o texto anima- através de práticas físicas muito específicas. do, como os criados com (os softwares) Flash ou Director. O hipertexto e a hipermídia nas redes (WWW) eram vendidos como a possibilidaA hipermídia, de certa forma, é vista na atu- de de democratização da informação, quaalidade como mais uma ferramenta que per- se como o fim da lógica da propriedade somite um arquivamento e uma relação bre o conhecimento. O que vemos atualmen85 te não é bem isso. Você acha que qualquer cratizada” e o compartilhamento dessa autoria efêmera? informação é “democratizante”? Landow: Sim e não. Weblogs (blogs) apre- Landow: Na minha opinião, o problema não sentam informações técnicas e escolares, de é significativamente agravado pela internet: ótima qualidade, criadas por um grande grandes bibliotecas sempre tiveram grandes número de indivíduos que não estão inseri- quantidades de trabalhos de baixa qualidados em instituições acadêmicas. Além dis- de, ou repletos de falhas. Eu acredito que so, muita informação sobre medicina e as- nós devamos desenvolver diversas classes suntos acadêmicos encontra-se livremente ou níveis de autenticação, dependendo das disponível na WWW, o que democratiza, de necessidades do leitor. Grupos de acadêmicos, cientistas, técnicos e aqueles com co- forma dramática, alguma informação. nhecimento sobre a disciplina deverão dar uma primeira autenticação aos trabalhos O fato de a hipermídia tender a ser mais publicados on-line, ou o valor dos trabalhos democratizante que o material impresso será medido por revisores identificados. não significa que ela automaticamente crie uma democracia política ou mesmo um sistema educacional mais democratizado - Há vários anos cientistas trabalhando no neste último caso, os professores precisam campo da física de alta energia vêm publise abrir para as possibilidades de práticas cando seus trabalhos na WWW, antes de sua educacionais focadas no aluno e para no- impressão. Muitos físicos já me disseram vos métodos de ensino. que o único motivo pelo qual consultam estas versões eletrônicas não-vetadas e préimpressões é por serem capazes de decidir Com a possibilidade de todos os sujeitos no se um ensaio, uma teoria ou um experimenmundo se tornarem “autores” e, portanto, to pareça ser digno de leitura. De forma sitambém editores, como você pensa a ques- milar, muitos indivíduos consultam avaliatão da credibilidade da informação “demo- ções on-line de filmes, ou outras informa86 ções referentes a seu hobby ou lazer, que são criadas de forma muito mais democrática que as versões impressas. Tradução de Priscila Adachi. Cícero Inácio da Silva É professor da PUC – SP e responsável pela disciplina Hipermídia e Interatividade na Pós-graduação em Comunicação, Arte e Tecnologia da Belas Artes de São Paulo. É autor de “As mulheres de Derrida” (Witz Editora), “Hipermidialogia” (Espectros Editorial), entre outros. Site: www.pucsp.br/~cicero 87 KUBLA KHAN Or, A Vision In A Dream. A Fragment. Samuel Taylor Coleridge And from this chasm, with ceaseless turmoil It was a miracle of rare device, seething, A sunny pleasure-dome with caves of ice! As if this earth in fast thick pants were A damsel with a dulcimer breathing, In Xanadu did Kubla Khan A mighty fountain momently was forced: In a vision once I saw: A stately pleasure-dome decree : Amid whose swift half-intermitted burst It was an Abyssinian maid, Where Alph, the sacred river, ran Through caverns measureless to man Huge fragments vaulted like rebounding And on her dulcimer she played, hail, Singing of Mount Abora. Down to a sunless sea. Or chaffy grain beneath the thresher’s flail: Could I revive within me And ‘mid these dancing rocks at once and Her symphony and song, ever With walls and towers were girdled round: To such a deep delight ’twould win me, It flung up momently the sacred river. And there were gardens bright with sinuous That with music loud and long, Five miles meandering with a mazy motion rills, I would build that dome in air, Where blossomed many an incense-bearing Through wood and dale the sacred river ran, That sunny dome! those caves of ice! tree ; Then reached the caverns measureless to And all who heard should see them there, And here were forests ancient as the hills, man, So twice five miles of fertile ground Enfolding sunny spots of greenery. And sank in tumult to a lifeless ocean: And all should cry, Beware! Beware! But oh! that deep romantic chasm which And ‘mid this tumult Kubla heard from far His flashing eyes, his floating hair! slanted Ancestral voices prophesying war! Weave a circle round him thrice, Down the green hill athwart a cedarn cover! The shadow of the dome of pleasure A savage place ! as holy and enchanted Floated midway on the waves; As e’er beneath a waning moon was haunted Where was heard the mingled measure By woman wailing for her demon-lover! From the fountain and the caves. 88 And close your eyes with holy dread, For he on honey-dew hath fed, And drunk the milk of Paradise. Percepção - Patologia dos órgãos internos. Ao conjunto dessas sensações se denomina sensibilidade geral. Discretos receptores sensitivos captam esSensação tímulos proprioceptivos, que indicam a poEm seu significado preciso, a sensação é um sição do corpo e de suas partes, enquanto fenômeno psíquico elementar que resulta da outros, que recebem estímulos denominaação de estímulos externos sobre os órgãos dos dos sinestésicos, são responsáveis pela sentidos. Entre o estado psicológico atual e o monitorização dos movimentos, auxiliando estímulo exterior há um fator causal e na realização outras atividades cinéticas, determinante ao qual designa-se sensação, segura e coordenadamente. Os receptores portanto, deve haver uma concordância entre dessas sensações se acham localizados nos as sensações e os estímulos que as produzem. músculos, nos tendões e na superfície dos diferentes órgãos internos. Portanto, esse As sensações podem ser classificadas em três grupos principais: externas, internas e espe- grupo engloba três tipos de sensações: motoras, de equilíbrio e orgânicas. ciais. As sensações externas são aquelas que refletem as propriedades e aspectos de tudo, humanamente perceptível, que se encontra no mundo exterior. Para tal nos valemos dos órgãos dos sentidos; sensações visuais, auditivas, gustativas, olfativas e táteis. A resposta específica (sensação) de cada órgão dos sentidos aos estímulos que agem sobre eles é conseqüência da adaptação desse órgão a esse tipo determinado de estímulo. As sensações motoras orientam os movimentos dos membros e do corpo. As sensações de equilíbrio provêm da parte interna do ouvido e indicam a posição do corpo e da cabeça. As sensações orgânicas são, de fato, as proprioceptivas, e se originam nos órgãos internos: estômago, intestinos, pulmões etc. Seus receptores estão localizados na face interna desses órgãos. Outros sensores sutis são capazes de captar informações mais As sensações internas refletem os movimentos de partes isoladas do corpo e o estado refinadas, tais como temperatura, excitação sexual e volume sanguíneo. 89 A sensação especial se manifesta sob a for- pende muito do funcionamento conjunto dos ma de sensibilidade para a fome, sede, fadi- receptores do sabor e do aroma. É por isso ga, de mal-estar ou bem-estar. Essas sensa- que a comida parece insípida quando o nações internas vagas e indiferenciadas que riz está entupido. dão a sensibilidade de bem-estar, mal-estar, etc., têm o nome de sinestesia. No processo do conhecimento e do auto-conhecimento Uma determinada qualidade perceptual, objetivo as sensações ocupam o primeiro como por exemplo a grandeza, pode ser a grau. São as sensações que relacionam com mesma para vários sentidos. Dessa forma, o organismo, ao mundo exterior e a todas as um objeto pode ser visto grande, soar granoutras as coisas ao redor. O conhecimento de, dar a impressão de grande ao tato e, taldo mundo exterior resulta das sensações vez, até cheirar grande. Os estímulos devem dele captadas, e quanto mais desenvolvidos ser localizados de maneira idêntica, através forem os órgãos dos sentidos e o sistema dos olhos, dos ouvidos e das mãos, objetos nervoso do animal, mais delicadas e mais podem ser vistos, ouvidos e sentidos em variadas serão as suas sensações. movimento simultaneamente. A tendência de integração, cooperação e concordância dos vários sentidos é tanta que, as vezes, Unidade dos Sentidos apesar das discrepâncias na situação física Para maior eficiência dos sentidos, os vári- real, o sistema sensorial trabalha de forma os órgãos devem funcionar integradamente. que a situação se acomode. Em uma fita de A percepção do mundo objetual não depen- cinema, por exemplo, ouve-se as vozes como de exclusivamente do aparelho sensorial que saídas diretamente dos lábios em moviespecífico, através do qual os objetos são mento dos autores, embora, na realidade, o apreendidos, isto é, não depende exclusiva- som provenha dos alto-falantes colocados mente do sentido da visão, ou da audição, o em lugares inteiramente diferentes. Basicado tato, etc. Geralmente não é apenas um mente, é através da ação cooperativa dos sentido que atua na percepção dos objetos, sentidos que consegue-se um quadro conalém disso, os sentidos funcionam juntos e sistente, útil e realista do ambiente físico. se completam. O gosto de uma comida de- As impressões dos vários sentidos são, de 90 certa maneira, combinadas ou organizadas clui identificação, discriminação, reconhepara apresentar um quadro mais ou menos cimento e julgamento dos objetos por meio da informação sensorial. estável da realidade. Percepção? Abaixo algumas definições e características Resumidamente a percepção é o conheci- da percepção: mento imediato através dos sentidos, ou seja, que ela se forma a partir de informações que chegam ao sistema nervoso superior pelas vias aferentes. Isto equivale a dizer que a percepção do mundo ocorre com base em sensações estas são os reflexos de qualidades separadas dos objetos que atuam diretamente sobre os órgãos de sentido. Segundo Lannoy Dorin (mestre e professor de Psicologia Geral e da Personalidade na Psicopoli, Jundiaí/SP), uma sensação é uma experiência elementar relacionada com um fato físico, com uma laceração da energia ambiental (estímulo que é detectado pelos receptores; visão, audição e etc. Ao contrário da sensa- • é o conhecimento de um sujeito corporal, isto é, uma vivência corporal, de modo que a situação do corpo e as condições deste mesmo corpo são tão importantes quanto a situação e as condições dos objetos percebidos; • é sempre uma experiência dotada de significação, isto é, o percebido é dotado de sentido e tem sentido no cotidiano, fazendo parte do mundo pessoal de das experiências adquiridas. ção, a percepção representa a organização e O próprio mundo exterior não é uma coleinterpretação da experiência que se segue à ção ou uma soma de coisas isoladas, mas recepção dos estímulos, dependendo mais de está organizado em formas e estruturas comprocessos adicionais, como a motivação e a plexas dotadas de sentido. Uma paisagem, aprendizagem, importante é, um fato psico- por exemplo, não é uma soma de coisas que lógico mais complexo, porque é uma resposta estão apenas próximas umas das outras, mas a um estímulo ou um conjunto de estímulos. é a percepção de coisas que formam um todo A percepção difere da sensação porque in- complexo e com sentido: o vale só é vale 91 por causa da montanha, cuja altura e dis- tivo, estruturado e vive-se nele como sujeitância só podem ser avaliadas porque exis- to ativo, isto é, dá-se às coisas percebidas te o céu, as árvores, um rio e um caminho; o novos sentidos e novos valores, pois as coiverde do vale só pode ser percebido por con- sas fazem parte do cotidiano e assim traste com o cinza ou o dourado da monta- interage-se com o mundo; o mundo percenha; o azul do céu só pode ser percebido bido é um mundo intercorporal, isto é, as por causa do verde da vegetação e o mar- relações se estabelecem entre os corpo, os rom da terra; essa paisagem será um espe- corpos dos outros sujeitos e os corpos das táculo de contemplação se o sujeito da per- coisas, de modo que a percepção é uma forcepção estiver repousado, mas será um ob- ma de comunicação que é estabelecida com jeto digno de ser visto por outros se o sujeito os outros e com as coisas; a percepção deda percepção for um pintor, ou será um obs- pende das coisas e do corpo, depende do táculo, se o sujeito da percepção for um via- mundo e dos sentidos, depende do exterior jante que descobre que precisa ultrapassar e do interior, e por isso é mais adequado faa montanha. Em resumo: na percepção, o lar em campo perceptivo para indicar que mundo possui forma e sentido e ambos são se trata de uma relação complexa entre o corpo-sujeito e os corpos-objetos num cam- inseparáveis do sujeito da percepção. po de significações visuais, tácteis, olfativas, gustativas, sonoras, motrizes, espaciais, temA percepção é assim uma relação do sujeito porais e lingüísticas. A percepção é uma com o mundo exterior e não uma reação físico- conduta vital, uma comunicação, uma interfisiológica de um sujeito físico-fisiológico a um pretação e uma valorização do mundo, a conjunto de estímulos externos (como suporia partir da estrutura de relações entre nosso o empirista), nem uma idéia formulada pelo corpo e o mundo. sujeito (como suporia o racionalista). A relação dá sentido ao percebido e ao percebedor, e um não existe sem o outro. A percepção envolve toda a personalidade, a história pessoal, a afetividade, desejos e paixões. Tudo é percebido de modo positivo O mundo percebido é qualitativo, significa- ou negativo, como instrumentos ou como 92 valores, reagindo positiva ou negativamen- tais, isto é, orienta para a ação cotidiana e te a cores, odores, sabores, texturas, distân- para as ações técnicas mais simples; a percias, tamanhos. O mundo é percebido quali- cepção é uma forma de conhecimento e de tativamente, efetivamente e valorativamente. ação fundamental para as artes, que são Ao perceber uma outra pessoa, por exemplo, capazes de criar um “outro” mundo pela não existe, pronta, uma coleção de sensações simples alteração que provoca da percepque componham as partes isoladas de seu ção cotidiana e costumeira. corpo, mas percebe-se como tendo uma fisionomia (agradável ou desagradável, bela ou feia, serena ou agitada, sadia ou doentia, A percepção não é uma idéia confusa ou sedutora ou repelente) e por essa percepção inferior, como julgava a tradição, mas uma é definido o modo de relação com ela; a per- maneira de ter idéias sensíveis ou significepção envolve a vida social e cultural, isto cações perceptivas. é, os significados e os valores das coisas percebidas decorrem da sociedade e do modo como nela as coisas e as pessoas recebem sentido, valor ou função. Assim, objetos que para uma sociedade não causam temor, podem causar numa outra sociedade. Por exemplo, na sociedade como conhecemos, um espelho ou uma fotografia são objetos funcionais ou artísticos, meios de vermos registros em imagem; no entanto, para muitas sociedades indígenas, ver a imagem de alguém ou a sua própria é ver a alma desse alguém e fazê-lo perder a identidade e a vida, de modo que a percepção de um espelho ou de uma fotografia pode ser uma percepção apavorante; a percepção oferece um acesso ao mundo dos objetos práticos e instrumen93 Bibliografia Paulo: Global editora. 1995 BAITELLO JUNIOR, Norval – A mídia antes da maquina. JB on line, Caderno idéias, sábado, 16/10/1999. BASBAUM, Sérgio – Sinestesia, Arte e -. – Entenda o Computador: Computação Gráfica. São Paulo: Nova Cultural: Tecnologia - Fundamentos da Cromossonia. São Paulo: Annablume/ 1988 FAPESP, 2002. 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