Trabalhadores viajantes do século XIX - Morus
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Trabalhadores viajantes do século XIX - Morus
Trabalhadores viajantes do século XIX: utopias e reinvenções do mundo do trabalho Ivone Cecília D’Ávila Gallo U-TOPOS - Universidade Estadual de Campinas (Brasil) Resumo Ao longo do século XIX a classe operária nascente confrontou-se com a instabilidade política e econômica numa Europa convulsionada com a ascensão da burguesia. Na França, sacudida por processos revolucionários, os operários e militantes migraram aos milhares para as Américas e África em busca de esconderijo ou de uma situação de vida melhor, ou ainda, para disseminar a propaganda política de cunho socialista e comunista. Com o objetivo de tratarmos das viagens inusitadas do período selecionamos alguns casos marcantes: o da jornalista e fourierista Louise Bachelet vinda em 1840 para a América do Sul, o de Victor Considérant, chefe da École Sociétaire e realizador do falanstério de Réunion, no Texas, em 1854, e o do operário Norbert Truquin em cujas memórias lega o registro de suas viagens pela Argentina e Paraguai. Palavras-Chave Século XIX, utopia, migração, Louise Bachelet, Victor Considérant, Norbert Truquin. Ivone Gallo é graduada em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1982). Possui mestrado em História Social pela Universidade Estadual de Campinas (1992) e doutorado pela mesma universidade (2002). Em 2010, concluiu estágio de pós-doutorado em Teoria Literária no Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas. É especialista em aspectos sociais e culturais no mundo do trabalho, como movimentos milenaristas no campo no século XX, a militância de socialistas utópicos no Brasil e na América do Sul no século XIX e movimentos sociais urbanos contemporâneos. Atualmente participa do grupo de pesquisa em Utopias U-TOPOS (IEL-Unicamp) com pesquisas sobre Charles Fourier e os operários e militantes fourieristas que vieram ao Brasil em 1840. O resultado destas pesquisas também é comunicado no Grupo de Trabalho “Mundos do Trabalho” vinculado à Associação Nacional dos Professores Universitários de História (ANPUH), bem como em diferentes publicações. Ivone gallo Atirar-se aos mares A epígrafe descortinando o livro clássico de Lewis Mumford The Story of Utopias incita o pensamento: “A Map of the World that does not include Utopia is not worth even glancing at...” Nela parece definitivamente assumido o peso que as geografias devem exercer sobre as utopias para além da mera construção mental de espaços imaginários, pois os utopistas no seu sonhar com a cabeça no ar e os pés no chão, se impõem a tarefa da transposição das fronteiras redesenhando espaços como territórios de esperança. Isto me parece verdadeiro, sobretudo a partir do século XIX, quando o maquinismo destruía de forma avassaladora qualquer expectativa de convivência fraterna entre os homens. As análises de Ernest Bloch (1977) sobre a tragédia humana na era industrial dão conta do problema: privados pelas máquinas de exercermos nossas habilidades, inteligência e emoção nos objetos que se produzem agora à revelia de quem os executa, os trabalhadores se alienaram não apenas da capacidade de um sustento digno, mas alienaram-se de si mesmos. Esta condição deixa de ser uma condição exclusiva de uma classe na medida em que passa a dominar a vida como um todo sob o regime da exploração capitalista. A percepção deste encapsulamento do ser humano em que Ernest Bloch nos leva a pensar me parece essencial porque esclarece sobre a possibilidade de trilharmos novos rumos apenas quando nos abrimos também para as viagens internas em busca do que o filósofo chamou de “um encontro consigo mesmo”, a superação. O século XIX seria o despertar da classe operária nesta busca por uma identidade capaz de remover os obstáculos no caminho para o futuro e felicidade. Neste século que viveu o impacto em ondas sucessivas do terremoto produzido pela Revolução Francesa, os entraves da tradição não impediram, entretanto, que se colocasse uma pedra sobre a exigência de direitos iguais, justiça e liberdade para a humanidade como um todo. Para o proletariado europeu, vencido nas várias tentativas de reversão da ordem social, a hipótese da partida da Europa como forma de esquecer o passado e refazer a vida por sua conta e risco, crescia. Naquele momento, a questão social tomava vulto na obra de pensadores como o conde de Saint-Simon, do caixeiro viajante Charles Fourier, do filho de tanoeiro e depois advogado Étienne Cabet e, na Inglaterra, Robert Owen. Estes, diferentemente dos socialistas revolucionários, pregavam transformações de caráter pacífico, porém, é preciso que se admita, não menos revolucionárias. O movimento social incorporou e adaptou princípios deste socialismo, do comunismo e do cooperativismo nas suas ações e na oratória dos militantes e na imprensa operária, de tal forma a organizar-se não mais por formas de associacionismo espontâneas e que, eu não duvido, tivessem inspirado aqueles pensadores, mas de forma estudada, científica, como alegavam os novos teóricos, vislumbrando resultados práticos a longo prazo ou imediatos. Deste processo nasceram grupos operários auto-organizados como associações, dispostos à travessia dos mares em direção às Américas, para neste novo mundo viverem em comunidades. Ato afirmativo na direção 174 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX das teses levantadas mais tarde por Ugo Fideli (1958) de que a viagem é um ritual iniciático em certo sentido, sobretudo se representa uma busca, em um lugar distante de uma forma perfeita e geral de se viver. A busca pela emancipação produziu entre os anos de 1840 a 1853 ao redor de 30 comunidades fourieristas na América do Norte (Godin, 1889; Noyes, 1961; Rama, 1956). O número cresce se incorporarmos as comunidades ali instaladas nas décadas anteriores por Robert Owen e posteriormente por Cabet. Ao longo dos anos, novos experimentos levados por fourieristas foram realizados e também experiências de caráter hibrido em termos de ideologias apontando para a consumação de uma influência recíproca entre socialismo e experiências tradicionais de comunidades norteamericanas (Guarneri, 1994). Parece consenso entre diferentes estudiosos que os fourieristas foram os responsáveis pelo maior número de experimentos, seja comunais ou cooperativistas, fato significativo para conduzir alguns teóricos ao combate da simplificação das teses sobre um socialismo utópico. Ao contrário, concedeu-se espaço em estudos mais atuais para a visão nesta militância da época de uma alternativa ao capitalismo, malgrado desacertos teóricos e práticos em que se envolveu. Ao mesmo tempo, um entusiasmo em zarpar da França para a América do Norte, ao contrário de representar uma adesão dos socialistas e comunistas ao capitalismo, como foram acusados, na verdade acentuaria a crítica ao liberalismo. Isto porque os projetos comunitários que pleitearam significavam mais um avesso do avanço liberal que fazia da América o emblema da liberdade. No lugar da propriedade privada os fourieristas propunham a propriedade coletiva, no lugar do lucro privado, os benefícios coletivos, e em substituição da liberdade individual, a libertação universal da humanidade em comunhão com a natureza (Guarnery, 1994, Fogarty, 1990). Na América do Sul, apesar da menor repercussão deste tipo de movimentação, tivemos experiências de cunho socialista levadas por militantes fourieristas como Benoît Mure, no Brasil e Eugène Tandonnet, no Uruguai. Seja como viagens de grupos ou individuais, voluntárias ou forçadas pela repressão política na Europa, nas Américas, tornaram-se uma realidade durante o período. A nossa tentativa aqui será a de registrar e interpretar essas experiências inusitadas de viagens sobre as quais, pelo seu caráter peculiar exige-se um olhar mais atento. Em meio aos relatos de viagens e memórias proletárias e militantes elegemos apenas alguns que favorecem uma comparação dentro de um mesmo círculo de relacionamentos. As Travessias Certa vez, folheando documentos acerca do movimento fourierista em arquivos parisienses deparei-me com o seguinte poema: Quittez Paris, la ville ou tout se décrépit, Où l’on use son temps a rien, et sans répit; Allez au terrain neutre, à force de courage, Gagner votre Bonheur, finir votre esclavage! MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 175 Ivone gallo Du droit qu’on vous dénie et qui vous vient de Dieu Prouvez la sainteté! vous ferrez de ce lieu, Si bien choisi par vous, la première alvéole De cette grande ruche ou tout mal se console, Où tout s’épanouit, s’ébat, prend son essor, Et distille, en jouant, un miel aux rayons d’or! De la cité de Dieu, si féconde en merveilles, Où pas un seul frélon ne se mêle aux abeilles, Posez les fondements, sur um tel point d’appui Que le plus rude assaut ne soit rien contre lui. De la Rome nouvelle, illustres prolétaires Dédaignez, sans courroux, ces possesseurs de terres Qui font cas de la chose, et ne voyent pas bien Que sans le producteur tout équivaut à rien! O poema foi publicado no jornal mensal fourierista Le Premier Phalanstère em 15 de outubro de 1841. O periódico é parte do acervo do Institut Français d’Histoire Sociale 14AS7(98). 1 176 Através deste longo poema intitulado “Aux Brèsiliens du 1er départ” e do qual extraímos apenas alguns versos, Eugène Stourm, poeta e fourierista, homenageia seus companheiros de militância, operários franceses vindos ao Brasil em 1840 com a finalidade de fundação de um falanstério¹. Com estas palavras carregadas de emoção o poeta inspira e instiga a virada, a ruptura que a partida da França para terras longínquas e desconhecidas fatalmente ocasionaria. Diante da determinação com que a decisão sobre a partida havia sido tomada não há como nos esquivarmos das perguntas levantadas por Jacques Rancière (1988) quando mergulhou nos arquivos dos sonhos e pesadelos operários, sonhos e pesadelos curtidos ao longo das noites despertas dos inquietos. O que concretamente é a classe operária ao redor dos anos de 1830 em diante e com o que sonha? Somente a partir destas respostas atingimos a compreensão do sentido das viagens ao longo do século XIX de uma forma mais abrangente. Compreender a utopia proletária acerca de novos mundos possíveis prefiguradas em terras distantes é uma capacidade facultada apenas pelo acesso à História, única chave que desvenda a diferença entre as utopias sociais precursoras, desde um Thomas Morus e Campanella até um Diderot e as mais contemporâneas. Se não podemos negar a recorrência de imagens, isto é, o reconhecimento de que nas utopias de um modo geral existe um “itinerário”, algo já posto anteriormente (uma busca, viagem, um paraíso terrestre, uma ilha, etc.) como pontua Ernest Bloch (1982, p. 4546), igualmente somos levados a constatar um colorido diferente de épocas e de individualidades, em suma, peculiaridades que se nos apresentam de uma relação intrínseca entre a personalidade do utopista (sujeito) e o seu tempo e espaço. As viagens representam então, antes de mais nada, relações com o tempo e com o espaço, do indivíduo com a sociedade. De fato, o tema das viagens e viajantes difundiu-se no meio acadêmico mundo afora se tornando objeto de publicações e teses capazes de revelar novos olhares para diferentes interesses como a cultura, a ciência, os povos, os Estados (Bertrand; Vidal, 2002; Adams, 1983; Elsner; Rubiès, 1999; Hahner, 1998). No Brasil não foi diferente e estudos desta natureza ganharam impulso com facilidade dada MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX a farta produção sobre o país visto a partir das lentes de artistas e cientistas que para cá vieram em missões ou movidos por um espírito aventureiro. Sem dúvida nenhuma, os olhares curiosos e exploratórios de um Ferdinand Denis ou de um Richard Burton são perpassados pelo viés elitista e da convicção acerca da superioridade europeia mediante a comparação com os povos sulamericanos. Os não europeus, pelas lentes das elites, em geral são os povos bárbaros, cujo estado de natureza encontra um correspondente análogo na cultura bruta, rústica, símia, se assim podemos dizer. Mas, o processo em que se estabeleceu um padrão de divisão do mundo entre os que mandam e os que se submetem, os de cima e os debaixo já vinha se consolidando muito antes do século XIX através de produções científicas (Duchet, 1995; Gerbi, 1996) e os relatos de viajantes do século XIX apenas redirecionam a questão para as necessidades da época. De toda maneira, a ênfase que emprestamos aos relatos de viagens com este padrão contribuiu para o ocultamento de outras visões sobre as viagens que apesar de documentadas não encontraram a chance da mesma repercussão no mundo acadêmico. Em grande parte, isto se deveu ao interesse, durante muito tempo, em narrativas históricas que contemplassem os grandes feitos e personagens ilustres. Uma historiografia mais crítica iniciaria a demolição gradual deste modelo apenas no século XX. Um exemplo disto é a produção de Jean Maîtron (1960), na França, que incluiu na historiografia o proletariado e o militante como sujeito histórico, ativo, apesar de anônimo e oculto, mas igualmente merecedor de um lugar na história e na memória. O nosso poema representa então a fala destes anônimos do passado. Nele se insinua a visão e a expectativa do proletariado parisiense com a travessia do Atlântico e com o “mundo dos debaixo”, porém de forma positiva: Amérique, Amérique, ouvre tes vertes plaines Ouvre ton sol fécond, tes trésors enfouis. Allez vous rajeunir, vieilles Races humaines Dans l’air pur des grands cieux là bas épanouis². Imagem do europeu em um espelho invertido como no poema acima aparece também na continuação do poema de Eugène Stourm com o qual introduzimos este artigo: Fuyez ces régions ou règne l’imposture Partez vers ces climats ou la belle nature N’a pás été flétrie au nom d’un vain progrès, Où on respire un air et plus vif et plus frais, Où la creation semble encore primitive, Tout son aspect est vaste et sa splenteur naïve! Nous aimons à penser que ces arbres géants Dont le feuillage épais n’a de frémissements Que pour le vents d’orage ou la fureur du tigre, Retentiront bientôt des chants de l’homme libre (idem nota 2). 2 Poema “Aux Phalanstériens d’Amérique” de autoria de P.B. publicado na Correspondance des disciples de la science sociale, nº7, Paris, abril e maio de 1846 (Institut Français d’Histoire Sociale, 14AS7(88)). MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 177 Ivone gallo Em todos os sentidos compreendemos a importância dos deslocamentos nos espaços implicados nas ideias e práticas de viagens. Inicialmente, para mim, apresenta-se o problema da classe social, então espaço social e político, como um lugar a partir do qual diferentes expectativas são geradas e ações empreendidas. Porque através do padrão de segregação social entrevemos na literatura e na ação operária e militante da França do século XIX que, no bojo do próprio berço europeu e aos olhos da elite, os proletários também são os bárbaros, as classes perigosas que se deseja exportar. A condição proletária e militante nos obriga a pensar os deslocamentos no espaço não mais como simples deslocamentos no espaço físico, viagens pitorescas e de encontros prazerosos com a alteridade, embora persista no imaginário proletário de viagens a sedução do paraíso terrestre ou de uma idade do ouro que se quer atualizar no tempo presente. O sentido, entretanto, que a classe atribui a estas imagens é o da libertação das correias do trabalho extenuante e não o desfrute do ócio de veraneio; a saciedade da fome e não o prazer inesperado de uma refeição diferente. No contexto analisado aqui, viagem pode representar o exílio, a fuga, a esperança, a liberdade, a reinvenção do mundo. Crétinon, Lacour e Truquin: a odisseia proletária Como bem lembrou Jacques Rancière (1988), a viagem para os operários do século XIX pode dar-se também perfeitamente desprovida de qualquer apego às ideologias dos fourieristas, sansimonianos ou cabetistas, e isto apesar dos esforços da vanguarda em difundir entre o operariado os princípios que regiam cada corrente socialista ou comunista, bem como em assegurar, por meio da firma de um compromisso a aceitação das regras que manteriam os grupos unidos desde a partida. Nenhuma destas ações, é preciso frisar, impediu uma debandada geral de comunidades assentadas nos diferentes lugares diante das primeiras dificuldades, nem adesões oportunistas de alguns que já projetavam tirar proveito próprio do trabalho coletivo ou adquirir riquezas rapidamente envolvendo-se no tráfico de escravos, no contrabando e outras atividades ilícitas. Sobre o choque da realidade diante de altas expectativas há o Souvenir d’un voyage aux États-Unis en 1855, relato cujo conteúdo afasta qualquer dúvida (Rude, 1980). Escrito por dois operários, Jean-François Crétinon e François-Marie Lacour, que estiveram na comunidade cabetista de Nauvoo em plena época de crise, esse documento de valor excepcional informa sobre a peregrinação de discípulos de Cabet em 1855 em busca da terra da liberdade, América do Norte. Era um grupo formado por 56 pessoas que, no Havre, tomaram o navio Bailey em direção ao seu destino. Em poucos dias a bordo o grupo cindiu-se, pois tudo havia se tornado em motivo para discussão. Mas, a travessia em si, de acordo com o testemunho, bem poderia provocar a exaltação dos ânimos a bordo. Noites mal dormidas em virtude do mar revolto pela força dos ventos, os poucos bens levados pelo mar, as desavenças frequentes entre a tripulação, entre os passageiros também, cenas de violência dos oficiais contra os inferiores, sobretudo contra os negros. Diante do quadro terrível 178 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX pintado sobre a viagem em alto-mar, os operários puderam até considerarse em situação privilegiada na comparação com os imigrantes. A visão terrível de velhos doentes, mulheres e crianças famintos, sujos e confinados, cenas que nenhum historiador foi capaz de descrever e que Crétinon e Lacour fizeram questão de registrar. A chegada ao destino não foi mais feliz, pois com a colônia já em estado de desagregação recebia friamente os recém chegados. As dificuldades do cotidiano se encarregariam de minar as últimas forças dos dois amigos. Um simples passeio à beira do Mississipi no dia 17 de junho logo revertera em uma tortura e uma tragédia. Um começo feliz em que a orquestra animou alguns dos convivas a dançarem malogrou em virtude do forte calor que se abateu depois de três horas: o sol esquenta de tal maneira que ninguém quer mais dançar; depois, os músicos cansados deixam sair de seus instrumentos apenas algumas notas desafinadas. Eu, estendido sobre a grama, todo molhado de suor, comentava com Crétinon que o passeio icariano não tinha nenhuma graça” (Rude, p. 166). Para matar a sede, apenas a água morna do rio... A esta cena sobreveio a tragédia com o afogamento no Mississipi de Moureux, encarregado na colônia do cuidado com o rebanho, no momento em que dava de beber aos cavalos no rio. Uma conjunção de fatores, então fez com que Lacour e Crétinon tomassem o rumo de volta para casa, na França. Desde as frequentes intempéries que arruinavam todo o trabalho nos campos, passando pela fome e as desavenças internas. As vicissitudes registradas pelos dois operários não se abateram, todavia, apenas sobre as comunidades inspiradas pelo comunismo de Cabet. Acontecimentos de natureza semelhante tornaram-se uma realidade também na experiência fourierista no Brasil. Desde o desentendimento interno e a recusa, por este motivo, de parte dos colonos em trabalhar para o grupo, até casos de total descompromisso com os engajamentos coletivos previamente acertados, contribuíram, em grande medida, para o término de várias comunidades e de diferentes tipos no período. Três aventureiros que haviam se juntado aos falansterianos que rumaram para o Brasil, por exemplo, já saíram da França com a intenção de enriquecimento com o tráfico de escravos. Firmes neste propósito partiram para a África. Lá, depois de roubados e enganados tiveram problemas com avarias na embarcação e com doenças. O único sobrevivente desta façanha conseguiu retornar ao Brasil e, mesmo alquebrado, prometia retornar à África! (Gallo, 2002). Felizmente, esta não parecia ser a regra geral entre homens que, como Norbert Truquin (2006), operário sem qualificação, lutavam pelo pão num mundo que aprofundava mais e mais o fosso social. Nas suas memórias estão registrados os capítulos do que nos parece ser a vida da maior parte da população na época: um perambular sem destino certo em busca de uma ocupação que apenas garantisse a vida no limite da morte, o corpo coberto por trapos imundos e a preocupação com o desgaste do calçado. Perder o calçado no caminhar sem direção e sem parada representava o signo da condição social mais degradante. MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 179 Ivone gallo A peregrinação em si, sempre havia feito parte do aprendizado de todo artesão na Europa. Depois de sua formação junto a um mestre precisava percorrer diferentes aldeias até conseguir colocação em algum atelier. Fazer o “tour de France” possuía um sentido simbólico importante para os artesãos franceses de concluir uma trajetória dentro do sistema de compagnonage. No século XIX, com o desmantelo da estrutura produtiva artesanal, viagens desta natureza perderam esse sentido. A desqualificação da mão de obra, a sazonalidade de alguns trabalhos, a crise econômica, provocaram um deslocamento dos trabalhadores em massa, de cidade em cidade, em busca de emprego. A reunião de multidões de desocupados nos lugares públicos soava como ameaça e a antiga simpatia pelo artesão que, como o herói, cumpria a sua jornada, transformara-se em rechaço e prevenções. Truquin, operário desqualificado, parece ter sofrido os impactos do tempo. Num dos ateliers em que trabalhou conheceu Constant, companheiro de trabalho mais velho e suficientemente solidário a ponto de dividir suas refeições com ele. Era um ex-colono dos empreendimentos militares na Argélia, mas, desiludido com o projeto francês para as colônias na África, voltou para Paris ocupando-se nos ateliers. Entre seus colegas de ofício foi alcunhado de Cabet porque movido pela convicção na urgência de conscientizar o proletariado lia para o público das oficinas o livro Voyage en Icarie³, buscando cativá-los para a ideia do comunismo e de correr o mundo. Truquin, que participava das sessões de leitura como ouvinte, pois na época não sabia ler e escrever, revela o seu potencial de intérprete e co-partícipe na confecção/interpretação do texto abandonando uma suposta passividade daqueles que apenas ouvem (Chartier, 2004). O evidente desagrado com a ideia do comunismo cabetista e com a comunidade mais parecida com uma vida em prisão, vem à tona na frase disparada [na comunidade]: “devia se apagar toda a liberdade individual” (Truquin, 2006, p. 56). Eis um ponto importante, a recepção do texto, para medirmos a influência da literatura utópica sobre as ações deste narrador. Depois de criticar a disciplina de ferro do regime comunista de Cabet, Truquin acrescenta: O livro de Etienne Cabet é encarado como um romance filosófico e literatura utópica em que se esboça a defesa do comunismo como a solução para o problema da miséria, da violência e da conquista de direitos. A primeira edição apareceu em 1839/1840 sob o título de Voyage et aventure de lord William Carisdall en Icarie. As edições posteriores saíram com o título simplificado para Voyage en Icarie. Importante destacar que apenas entre 1840 e 1848 a obra obteve cinco edições, além de ser traduzida para o alemão, o espanhol e inglês. 3 180 Por outro lado, eu refletia também que nós vivíamos em um estado pior que o da comunidade; com a disposição em comum dos bens, se teria apenas três léguas a fazer por dia para cumprir o seu trabalho ou para retomar; não se estaria mais reduzido a tomar apenas sopa, e as crianças não seriam mais obrigadas a trabalhar tão pequenas (p. 56). Ao que parece, os conselhos do amigo foram incorporados e Truquin, movido pela necessidade, mas também pelo desejo de mudança, passou do texto para a realidade, da pregação abstrata para a ação. Primeiro rumou para Paris. Esta viagem adquiria um significado especial porque não parecia apenas interessado em buscar trabalho. Ele pretendia desfrutar das belezas da cidade e instruir-se. Visitou as catedrais, os museus e a cidade divertindose com o fato de destoar do público normal e com a reação variável dos que interpelava sobre as obras de arte com o fim de compreender melhor o que via. Depois de cumprir a sua jornada decidiu-se pela partida para a MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX Argélia. Logo na chegada constatou o esgotamento dos trabalhadores que nas colônias militares voltavam do trabalho no campo exauridos e, para repor as energias, apenas o pão e um caldo magro. Tudo ao que o trabalho havia sido reduzido. Os desafortunados se davam conta então que a África de modo nenhum se assemelhava ao quadro encantador que havia pintado o orador da prefeitura do 8º distrito; os frutos selvagens em abundância, os bois, as vacas leiteiras, os carneiros, as galinhas, enfim tudo o que convém a um colono, todas estas miragens que tínhamos visto em Paris se desvaneceram em fumaça (p. 97). Não bastassem as dificuldades de trabalho e sustento, os colonos viam suas mulheres e filhas abusadas pelos oficiais que as tomavam como amantes e depois as abandonavam nos prostíbulos da região. Depois foi para Buenos Aires e Uruguai dedicando-se a diferentes trabalhos. Na narrativa de Truquin há passagens surpreendentes de transposição de elementos da literatura utópica como a de Voyage en Icarie, para a experiência e necessidade de um proletário. Encaro a questão como um dado importante para a compreensão das utopias para o século XIX. Em virtude das transformações do período, do acelerado processo de industrialização e dos problemas sociais que causou, não havia sobrado muito espaço para uma valorização da utopia como algo distante, sentimental ou quimérico. Os operários, sobretudo, diretamente atingidos moral e materialmente, estavam determinados e pretendiam uma solução imediata das contradições sociais e das instabilidades políticas. Do mesmo modo, esta determinação se apossa dos autores. Vemos em Fourier, por exemplo, o farto uso de imagens ficcionais (o antileão, o mar de limonada), porém com a clara finalidade de abordar uma saída da civilização para a harmonia, agora pelo cálculo obsessivo que leva a associação; Cabet, no seu romance, defende o comunismo, ou a comunidade que para muitos seria a prefiguração da República ideal, cuidando detalhadamente de cada ponto importante para isto4. Então, falar da realidade como ficção literária e fazer da literatura um plano de ação é repor em outra dimensão e num sentido invertido, as ironias disseminadas pelas utopias do passado. O foco da memória de Truquin, por exemplo, é o da luta cotidiana de um trabalhador na busca de situações que permitiam a sua sobrevivência. Cortando lenha, preparando carvão, plantando a terra, oferecendo sua mão de obra a um patrão, enfim, tratava-se de sonhar com uma vida melhor, mas alcançar nada além do alimento e, em alguns momentos, nem isto, assim nos damos conta de que nada ali acontecia por magia ou por acaso, era tudo verdade e havia que se lidar com isto. De um lado do Atlântico ou de outro, a sua vida não foi mais fácil, porém, na América do Sul, acreditava-se ao menos, melhor remunerado e mais livre (já que pode fazer a escolha pela partida), e respeitado. Do relato de suas experiências de viagem não brotam imagens de paisagens oníricas como nos relatos tradicionais, talvez porque o seu objetivo primeiro fosse legar suas memórias, ou ainda porque a visão da vida pelas lentes daqueles que a cumprem nos becos, nos ateliers, nas fábricas, adquirisse uma coloração cinzenta. De toda maneira, o destaque do texto Apesar de pender para o republicanismo, em Voyage en Icarie, 1842, p. V-VI afirma “Uma Monarquia realmente representativa, democrática, popular, pode ser mil vezes preferível a uma República aristocrática, e a comunidade não se torna mais impossível com um Monarca Constitucional do que com um Presidente republicano.” 4 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 181 Ivone gallo fica para as impressões de um proletário acerca de sua vida nos lugares por onde passou. Se a sua luta pela sobrevivência evidencia o propósito individual de ganhar a vida, a sua memória pretendia comunicar um legado, uma experiência para os que, como ele, vivem o presente e a necessidade. Então, não se preocupou em descrever de forma romântica, própria do século, a beleza das cores, costumes prosaicos e outras características dos povos com quem manteve contato na sua trajetória, mas em tratar de situações concretas, dificuldades em se chegar aos termos apropriados para a produção de bens a serem aproveitados por futuras comunidades e formas de solucioná-las e, com isso, alertar a outros imigrantes a respeito do que encontrariam na América do Sul. Neste sentido, o seu propósito é coletivo ao fornecer ao futuro viajante um “itinerário preciso, com escala e visita” (Fideli, 1958) como ele próprio havia herdado de pioneiros. Às páginas finais das memórias Truquin mencionam a necessidade e a urgência dos trabalhadores e sofredores de buscarem por eles mesmos uma saída do caos. Na visão deste proletário a publicação de notas, cadernos, memórias contribuiu para a eliminação das iniquidades e dos vícios da organização social, pois a cada ação desta natureza se assenta uma pedra no edifício para uma revolução social. O esforço de Truquin em registrar a sua experiência representava uma necessidade pessoal de expandir a propaganda da causa social. O seu programa incluía: trabalho necessário para todos até a idade de 40 anos, a administração da vida da comunidade para as pessoas experientes e mais idosas, igualdade de distribuição dos produtos, a infância para ser aproveitada com instrução e divertimento. Apesar de não declarar sua adesão a qualquer das tendências socialistas ou comunistas na época, o vocabulário utilizado por Truquin denuncia algumas das suas possíveis filiações e que, através destes filtros, elabora no seu texto uma crítica social daquilo que vê. De fato, entre os anos de 1830 e 1848, mesmo os proletários não filiados a nenhuma das correntes políticas acabavam militando em virtude das revoluções, das barricadas que se erguiam como barreiras, mas também como lugares de convivência. De alguma maneira havia o transito entre a militância instruída em Saint Simon e Fourier, inicialmente, e depois em Cabet e Proudhon, e os proletários em geral e as concepções sociais dos principais pensadores disseminavamse pelas conversas. Truquin, por exemplo, imagina para o futuro, como Saint Simon, os benefícios da tecnologia para eliminar as distinções de tratamento entre as classes. Os transportes coletivos, para ele, servem com a mesma eficiência e prontidão tanto os ricos como os pobres. As estradas de ferro unem os continentes aproximando as pessoas. Tudo isto, que chama de maquinismo, conduz naturalmente ao comunismo, comprovando trataremse as diferenças entre pessoas de barreiras artificialmente postas (p. 266). Truquin viajante expressa uma visão social como crítica aos projetos de colonização em curso na América do Sul. Para tal lança mão do conceito de associação desenvolvido por Fourier e seus discípulos. Na visão de Truquin, as colônias tendem a malograr porque se distribuem os lotes aos imigrantes como pequenas propriedades privadas, ao mesmo tempo em que se garante aos gerentes e administradores regalias negadas aos demais 182 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX membros (seria isto uma crítica a Cabet e a Considérant?). A ausência de terras comuns para diferentes finalidades que as comunidades exigem torna inviável a colonização. Das observações de caráter histórico o nosso viajante parece taxativo: Que papel desempenharam os conquistadores na América? Eles exterminaram os peles-vermelhas para apossarem-se de seus territórios, eles destruíram os indígenas do México e faz (sic) desaparecer a civilização deles para substituí-la pela sua, que não valia como a deles; eles aniquilaram a nação mais pacífica que jamais existiu, a dos peruanos, e transportaram da África os negros, como sendo mais aptos à subjugação. Os descendentes destes aventureiros estão se utilizando dos coolies indianos e chineses com o mesmo objetivo (besogne), opondo a eles o trabalhador branco” (267). O último capítulo das memórias, que concluiu em abril de 1877, no Paraguai, intitulado “A revolução social”, alerta para o público a quem se dirige mais especificamente no seu relato: o colono socialista. A este aconselha a não lançar mão dos recursos oferecidos pelos governos, companhias de imigração e proprietários. No lugar disto, deve-se formar ainda na França uma colônia para associação. Eis a chave para a revolução social. Os filósofos e os historiadores, na visão deste proletário, nada fizeram para a melhora da condição humana, ao contrário, o seu objetivo é a bajulação dos poderosos ou o interesse próprio. Isto explica porque quando se fala em abolição da escravidão, tema candente tanto na Europa quanto no mundo colonial, propostas concretas permaneciam na sombra enquanto os debates teóricos se eternizavam na imprensa e nos parlamentos. A trajetória de Truquin passou, como a de muitos outros proletários, por um processo de superação das limitações pessoais. Michel de Certeau no Invenções do cotidiano pontua que relatos de viagens e até memórias representam uma “prática do espaço” porque nas formas escritas reside uma “geografia de ações” capazes de organizar o próprio caminhar. Esta conquista de não deixar passar em branco a história dos anônimos só pôde ser alcançada por Truquin porque se alfabetizou já na fase adulta. Então, vejamos quantos obstáculos precisavam ser transpostos pelos proletários e aí verificar se é legítimo ou não incorporarmos a projeção que faziam de si mesmos como heróis. Primeiro, era preciso tomar uma decisão sobre seu destino sem dispor de certezas sobre o que se encontraria do outro lado, depois, era preciso dispor das economias parcas de uma vida apenas para os custos da travessia, em seguida, vencer outros temores como o oceano e reconhecer que desde a sua decisão inicial até o fim estariam sós. Na imprensa operária eram saudados como a vanguarda abnegada em prol dos benefícios futuros para a humanidade e, de fato, seria preciso cumprir os doze trabalhos para se alcançar este objetivo. Victor Considérant: as palavras e as coisas Uma das experiências que merece nosso crédito é a de Victor Considérant, chefe da École Sociétaire, discípulo de Fourier e politécnico. Se MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 183 Ivone gallo inicialmente defendeu que a propaganda da militância deveria ser apenas de caráter teórico para inibir resistências ao socialismo e angariar adeptos primeiro, para futuramente realizar. Depois da revolução de 48 aderiu ao programa proletário de realização de um falanstério como versava a cartilha dos operários adeptos de Fourier. Logo depois de 1848, os socialistas saíram do processo como uma das correntes mais requisitadas para comandar o processo de mudança. A eleição de Bonaparte e os golpes sucessivos levaram à derrocada das forças democ-soc e Considérant, mesmo tendo obtido uma votação expressiva no pleito como candidato a representante do povo, não escapou de um exílio que duraria vinte anos. Aos 41 anos de idade, proscrito, Considérant se depara com a necessidade de deslocamento involuntário e inesperado, o exílio, a impor reflexões sobre a vida e o rumo a seguir depois do banimento que colocava em cheque todas as conquistas alcançadas até então como militante. Sem poder voltar a seu país e sendo vigiado na Bélgica, onde encontrou abrigo, a cada passo, o cotidiano o havia encurralado. Entre Bruxelas, Spa e outras cidades daquele país por que passou na tentativa de manter-se longe do olhar policial, Considérant e a família, mulher e sogra, permaneceram nesta condição errante de 1849 a 1854. Afastado por força das circunstâncias da direção da École Sociétaire, das publicações nos jornais fourieristas e de outras funções impostas pela militância, despertou para a tentativa de estabelecimento de um falanstério na América do Norte. Depois de viagens iniciais exploratórias para o país animou-se a levar adiante os planos que discutia com o fourierista americano Albert Brisbane desde os anos de 1832. Em 1854, publicou Au Texas, um relatório dirigido aos amigos sobre a viagem que realizara. A preocupação de Considérant se voltava, sobretudo para a criação das condições ideais no terreno antes da chegada dos associados. Para isto, em 1854, foi criada a Société de Colonisation Européo-Américaine du Texas com um capital de cinco milhões e quatrocentos mil francos. Como pretendia pôr em prática uma experiência fourierista com grande margem de sucesso, precavendo-se do fragoroso desastre que se abateu sobre todas as tentativas anteriores levadas pelos dissidentes, Considérant procurou cercar-se de todos os cuidados. Ciceroneado por Brisbane em 1852, quando partiu da Bélgica para Nova Iorque em viagens exploratórias, Considérant visitou em New Jersey a North American Phalanx, depois Boston, e ao norte de Nova Iorque passou algumas semanas na comunidade Oneida. Rumou depois para Cincinnati onde conheceu Benjamin Urner, líder de um pequeno grupo de fourieristas com quem visava contar para a formação de um falanstério no Texas. Mais do que um pensador, Considérant possuía um veio militante, articulador que conferiu ao fourierismo o perfil de um movimento organizado e centralizado, como apontam Michel Vernus (1993) e Jonathan Beecher (2001), e que lutou contra as correntes dissidentes, pois via nelas o perigo do esfacelamento do movimento. Esse perfil de estrategista talvez o tivesse mobilizado para o projeto de estabelecer falanstérios no Texas relacionados entre si, no Novo México e em Oklahoma. Idealista como nunca, foi tomado de fascínio quando, em viagem com Brisbane, descendo o vale do Rio Vermelho, deparou-se com os limites do Texas: 184 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX Subitamente, no quarto dia, depois de quatro ou cinco horas de marcha, o horizonte alargou-se, a floresta abriu-se e nós saímos na cabeça do vale cuja graciosidade confundiu todas as minhas noções prévias sobre a realidade terrestre. O vale estendia-se diante de nós em sua profundidade. Para a direita e esquerda, ricas pradarias surgiam em elegantes ondulações na direção das linhas das montanhas arborizadas, cujos cumes se encadeavam em diferentes planícies, todas verdejantes e azuis vistas à distância emoldurando a paisagem (apud Guarneri, p. 328). Se sobrava em Considérant a verve faltava-lhe o veio do administrador e o falanstério de Réunion que havia iniciado em Dallas em 1854 com colonos franceses, poloneses, suíços e belgas teve curta duração, apesar de ver-se formalmente extinta a Société de Colonisation Européo-Américaine du Texas apenas em 1875. Em nada nos auxiliaria a compreensão do impulso de viagem de Considérant abordar as razões determinantes para o fracasso da sua tentativa. No lugar disto, busquemos a motivação das suas ações. Por que teria ele escolhido a América do Norte? Uma resposta ele próprio teria fornecido no The Great West. New social and industrial life in the fertle regions, livro de cunho propagandístico, uma simplificação de Au Texas, que fez publicar em Nova Iorque com o fim de preparar os espíritos dos norte-americanos para o fourierismo. A publicação deste material em 1854, quase simultânea à publicação na França do seu relatório Au Texas, fez Vernus (1993) acreditar na hipótese de Considérant pretender atrair atenções para o falanstério nos dois países ao mesmo tempo. No texto, Considérant reafirma a convicção de Fourier, sobretudo na necessidade de um destino feliz para a sociedade, algo pronto a tornar palpável pela síntese, na América, de dois mundos diferentes dos quais se aproveitariam as coisas boas de cada um. A América como o berço da liberdade, terra de trabalhadores intrépidos e empreendedores, de um lado, e a vocação europeia pela intelectualidade, de outro. Para ele, na América a liberdade não é apenas um fato geral, é também a doutrina nacional. A liberdade é a vida, a alma, a honra, a conquista e a verdadeira razão da existência do povo americano. Este povo sente que representa atualmente a ideia de liberdade no mundo e que é depositário do futuro coletivo da humanidade (1854, p. 2). Aqui nos aparece a América como o próprio emblema da Liberdade a revitalizar a crença do militante na democracia perdida para a França em 1848. Menos poética do que dramática, a sentença de Considérant aparece como um virar a página e esquecer o passado, algo difícil para um francês formado sob o peso da história de seu país, embalada desde 1789 pelo lema Liberdade, Igualdade e Fraternidade. A este lema ergueu-se a crítica dos socialistas e proscritos, pois a liberdade deixou de ser a do cidadão perante a lei para converter-se em emancipação e livre-arbítrio, como frisou Fourier. Mas por que a mitificação da América como terra da liberdade se o próprio Fourier desdenhava da possibilidade de execução das seitas progressivas5 nas Américas ou entre sociedades cujo desenvolvimento ainda Os conceitos utilizados por Fourier são pouco claros, pois não chegou a desenvolvê-los plenamente. Pierre Leroux, sansimoneano e crítico de Fourier, por exemplo, retoma o conceito de seitas nos seguintes termos: “grupos que ele [Fourier] supõe dever se formar em virtude da atração das paixões, e substituir a família e todas as associações que a civilização apresentou até aqui”. Ver Leroux 1846, p. 18. 5 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 185 Ivone gallo permanecesse estagnado no estado de selvageria ou barbárie em que faltam os meios de trabalho? Na conclusão de Fourier, não existe preconceito contra os povos primitivos, aliás, as suas reflexões parecem pautadas em Diderot que, no Supplément au Voyage de Bougainville, ressalta uma imagem positiva dos povos primitivos. A leitura desta obra de Diderot tornou-se corrente na época, popularizou-se, mas também fez parte da formação intelectual de toda uma geração. Dali Fourier parece retomar as concepções acerca de um estado ideal de natureza. Diderot via no Tahiti a única hipótese de felicidade para os homens, isto é, no estado de civilização, quando o homem se afasta da natureza acaba por se corromper, então seria preciso um retorno ao estado primitivo para o resgate da felicidade perdida no passado. Fourier, por seu turno, percebe no Tahiti de Diderot os germes da ordem societária (seitas confusas) conforme havia projetado, mas para alcançá-la seria preciso ir além e aplicar as ferramentas adquiridas ao longo da história pelo homem (ciência) e desenvolver o que antes se apresentava apenas como um esboço com o fim de produzir no futuro um destino de harmonia. Para Fourier, o futuro glorioso é predestinação de toda a humanidade, portanto, é preciso superar também os vícios da civilização. Os fourieristas, por seu turno, reinterpretaram o mestre e fizeram da América a concretização do Tahiti. Considérant, por exemplo, imaginou que a liberdade e as condições naturais necessárias para se chegar lá estão na América, mas o europeu dispõe de ciência e este trânsito deve garantir a unidade necessária para produzir um bem desfrutado pela humanidade como um todo. Não foi o único a ver assim. Um falansteriano, incitando a imigração para a África ou para a América, vislumbrava nesta ação rumo aos projetos de colonização a chance do proletariado libertar-se aplicando a teoria da associação nas terras férteis da América do sul ou África6. Louise Bachelet: o novo mundo, um porto seguro “Un Phalanstérien”, 1846. O ponto central do artigo seria a defesa da abolição do proletariado pela associação: “Enfim, cada parte do Mundo possuirá logo fragmentos de todas as famílias da terra, e é sobre os colonizadores que recairá a gloria de ter constituído a Unidade no Mundo” (p. 2). Não se trata, portanto, de procurar vantagens para os europeus, como na colonização no passado, mas de unir esforços em prol da humanidade. Assim, percebemos no movimento social a retomada do tema da colonização como crítica à civilização européia, algo já debatido anteriormente no Supplément de Diderot. 6 186 Sobre estas expectativas vejamos ainda um último relato de viagem muito singular e sobre o qual gostaria de me deter porque me oferece, além do mais, a chance da comparação com os dois outros casos sobre os quais me debrucei até aqui. Agora estamos diante do olhar feminino. Sobre o assunto, trabalhei diferentes aspectos em encontros científicos, mas o retomo aqui acrescentando novos elementos. Trata-se da trajetória de uma militante fourierista francesa nas suas aventuras na América do Sul. O único vestígio que restou da sua história foi uma brochura em que narra sua experiência na Argentina, Uruguai e Brasil, intitulada Phalanstère du Brèsil. Voyage dans l’Amérique méridionale, datada de 1842. O registro das transformações que mudavam a história da América espanhola foi feito por Bachelet na forma de uma carta enviada a alguns amigos. Alguém se deu conta da importância da carta e decidiu publicá-la se desculpando com a autora, pois via nisto uma ação “em favor de nossa causa que é a sua” (Bachelet, 1842, p. 3). Bachelet teria saído da Europa em direção ao Uruguai na condição de jornalista, no intuito de buscar informações sobre a disseminação das ideias do filósofo Charles Fourier na América do Sul. MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX Imersa nos acontecimentos que conduziam ao poder o ditador Rosas, ela tomou conhecimento do fato de que, no Brasil, se realizava uma experiência socialista nos moldes de Charles Fourier pelas mãos de operários franceses. A notícia inesperada a fez mudar os planos de sua viagem, e rumar para o Brasil com o fim de acompanhar e relatar os caminhos do falanstério brasileiro. As informações coletadas por ela foram publicadas em forma de um relato de viagem no qual foram registrados aspectos interessantes a respeito da disseminação do fourierismo no Uruguai, bem como as impressões causadas à autora pelo movimento de ideias e pelo contexto político do Uruguai duramente criticado no texto. Uma parte significativa da brochura é dedicada ao relato minucioso da viagem que a conduziu ao Brasil e à experiência socialista brasileira levada por operários franceses liderados pelo dr. Benoît Mure nos anos de 1840. Além disto, destacase no relato a personalidade da militância de Louise Bachelet permeada por um idealismo frenético, num sentido positivo, e uma crença inabalável na capacidade humana de transformação da realidade, inclinações muito características do século XIX. Este ímpeto a fez vislumbrar no falanstério do Saí o início de uma era de paz e harmonia, sobretudo porque o palco daquelas experiências era o Brasil, país do Novo Mundo, ainda não corroído pelos males da civilização moderna. A natureza virgem das florestas do Saí, com sua vegetação densa e beleza luxuriante tornaram-se o pano de fundo sobre o qual Bachelet desenvolveu hinos laudatórios ao trabalho, alguns deles herdados de Berranger, o renomado literato da época e entusiasta de Fourier a quem dedicou também um poema. Como narradora, Bachelet deixa transparecer o fascínio por “ver realizada a comuna-modelo de Fourier, que parece entretanto ter sido concebida para estas terras virgens, onde as sociedades humanas podem se formar a revelia de todos os precedentes e de todos os abusos do velho mundo” (p. 4). O cenário parecia perfeito até o cerco de Oribe aumentar e investir contra a banda oriental, algo que, na visão de uma fourierista, estava em total desacordo com o que devia acontecer. Um desvio no destino, na história. Para fugir dos massacres foi ao Paraguai e lá pode constatar a coincidência entre pontos da teoria de Fourier e o regime de Francia, que nada mais fez do que aprimorar o sistema social dos antigos jesuítas. Fourier no seu Fausse industrie parecia completar a lacuna destes sistemas. No Peru, igualmente, o regime patriarcal historicamente facilita, na opinião de Bachelet, a passagem para a fase do garantismo e do sociantismo porque os Incas impunham a produção nos campos pelas massas, mas em benefício das viúvas, dos velhos e doentes. Bachelet parece adepta das teses polêmicas e que predominaram em segmentos da dissidência fourierista de que não havia como passar da civilização diretamente para o período de harmonia. Mesmo na América do Sul, predestinada à harmonia, a transição, que discípulos de Fourier interpretaram como o garantismo era condição fundamental para a construção do novo mundo. As colônias fourrieristas e empreendimentos de economia social aparecem para Bachelet como os detonadores de mudanças mais substanciais capazes de levar ao sistema de Fourier realizado na íntegra: o sistema de falanstérios em relação uns com os outros. Foi com estas ideias MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 187 Ivone gallo na cabeça que Bachelet surpreendeu-se com a notícia de um falanstério no Brasil. Sem perda de tempo zarpou para Santa Catarina para testemunhar os acontecimentos. Na chegada, recebida na praia ainda por companheiras fourieristas, Bachelet desabou de emoção, mas secundada pelas pessoas ao redor logo recuperou-se do impacto e passou ao relato sobre a vida no falanstério. A construção de casas, a abertura de caminhos, a pesca, o cultivo, tudo parecia ser exercido com prazer pelos colonos do Saí que, entretanto, naquele momento, usufruíam apenas “imperfeitamente das vantagens da associação” (p. 10). Segundo aponta a própria Bachelet, o entusiasmo que a acompanhava não tocou os companheiros de Paris, sede da École Sociétaire, que permaneceram indiferentes ao que se passava no Brasil, mas apesar da “falta de simpatia” pelas realizações do Saí, ela estava convicta de que a semente havia sido lançada e que “um dia se escreverá a história do primeiro falanstério, e se saberá o que o Brasil e a humanidade lhe devem” (p. 11). Numa comparação, as características dos escritos de Louise Bachelet nos reportam às diferenças marcantes com os demais relatos de viagem conhecidos e publicados até o momento sobre o mesmo período, pois nos dela não se trata de apresentar um mero récit de voyage vulgarizado até como um gênero literário menor, destinado ao simples entretenimento. Na visão de Louise Bachelet, ao contrário, reside uma crítica contundente aos vícios das civilizações europeias que despertaram nela uma representação do Brasil e da América do Sul como os lugares a partir dos quais poderia ser realizada uma nova história, agora regenerada e recomeçada, para toda a humanidade. Do ponto de vista formal, por outro lado, poderíamos dizer que no relato de Bachelet encontramos as características que definem a literatura de viagem. Há um narrador onisciente que seleciona e constrói o texto que pretende se passar por um testemunho, atestando, portanto, a veracidade do acontecimento, ao mesmo tempo em que há a intenção de prender a atenção do leitor, inserindo-o no delicado jogo entre ficção e realidade, verdadeiro e falso, ardilosamente construído por um texto-imagem. A montagem de um cenário servindo de moldura para os acontecimentos, no caso de Bachelet, as cidades visitadas e a natureza numa dialética com a própria história completam o jogo de sedução. Infelizmente, as informações sobre a autora são quase inexistentes e as poucas pistas que encontrei contribuem para cercar esta personagem de uma aura de mistério. Além dos testemunhos que ela própria fornece a respeito de sua trajetória, outras poucas pistas foram extraídas da imprensa fourierista de Paris. As fontes consultadas chegaram a pôr em dúvida a existência da autora ao levantar a suspeita de que a brochura escrita por ela teria, na verdade, sido publicada sob um pseudônimo com o intuito de fazer a propaganda do falanstério brasileiro. Por trás da pena de Bachelet estaria a mão do empreendedor da colônia fourierista, o médico homeopata Jules Benoît Mure como o verdadeiro autor. Uma hipótese mais forte é a de que a autoria do texto possa ser atribuída à Mme Dalibert, apresentada na documentação sobre os acontecimentos do Saí de maneira preconceituosa como uma intrigante, cantora de ópera e amante de Mure, pois este, sendo casado na França, abandonara a esposa pela amante com quem se 188 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Trabalhadores viajantes do século XIX refugiara nas florestas do Saí para viver na vergonha longe dos olhares da sociedade. De fato, a ligação de ambos com a brochura pode ter existido porque publicada em 1842, teve duas editoras diferentes, uma a Pommeret & Guenot e outra da Agence Coloniale du Brèsil, rue des Prouvaires, 8, Paris. Talvez esta última possa ter alguma relação com Benoît Mure que patrocinou a vinda dos operários franceses para o Brasil. Como vemos, esta história é instigante até mesmo pela aura de mistério que a cerca. De toda maneira, as imprecisões acerca da autoria e das condições de escrita do texto não são suficientes para apagar o fato de se pretender trazer a público uma visão feminina e militante dissidente da travessia, algo raro. Conclusão Nas experiências de viajantes selecionadas pudemos acessar o mundo dos debaixo: proletários europeus, militantes intelectuais homens e mulheres, povos das Américas. Este ponto de vista incomum apresenta as viagens no período analisado não mais como experiências apenas individuais, mas como deslocamentos em massa e com finalidades político ideológicas na defesa da comunidade e do associacionismo. O viajante nestas condições não é apenas o curioso que se encanta com a visão do Palácio do Imperador e o cotidiano dos escravos e indígenas. O olhar dos viajantes de novo tipo se detém nas formas de organização social dos povos americanos e percebe nelas algo em comum com suas próprias convicções. Desvenda também a natureza na sua exuberância, sem dúvida, mas sobretudo, como instrumento do trabalho que traz a felicidade coletiva. Este viajante desembarca sem o objetivo de explorar o solo até o seu desgaste, como fizeram os primeiros colonizadores e também, recusando a escravidão e buscando formas de eliminá-la, seja pela propaganda abolicionista, como os fourieristas fizeram na América do Norte, seja por outros meios, através de mutuais em benefício da saúde dos escravos, como insistia Benoît Mure no Brasil. Os socialistas e comunistas, os proscritos, mais do que cumprir um roteiro vislumbraram reconstruir o mundo sobre novas bases. Alguns poderiam ver nela a prefiguração da República Democrática e Social derrotada na Europa em 1848. A tarefa que esses homens e mulheres se dispuseram a cumprir exigia a abnegação e o despojamento em favor de outros. Eles se entregavam aos sacrifícios do desbravamento das selvas, dos reveses da travessia, com o heroísmo da vanguarda para provar que seria possível viver de uma forma diferente. Em muitos casos, a decisão pela partida não foi tomada espontaneamente. Operários e militantes envolvidos com as revoluções, com a imprensa militante, com a propaganda tornaram-se alvos fáceis da polícia de seus países, outros, simplesmente não encontravam na Europa do que viver. Seja por um ou por outro motivo, o ato de viajar nestes termos implicou na busca de uma identidade de classe proletária a partir da constatação durante as revoluções de 1830 e 1848 de que as suas necessidades diferiam das da burguesia e por não levarem adiante um programa próprio tornavam-se perdedores. O reconhecimento da distinção de classe levou a uma formula típica de época para a solução do problema: a convicção MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 189 Ivone gallo de que uma verdadeira revolução se realizaria não pela violência, mas pelo rompimento das várias fronteiras artificialmente estabelecidas entre os homens e pela busca da unidade. A primeira das fronteiras seria entre as classes, depois, entre as nações, em seguida entre bárbaros e civilizados em benefício de toda a humanidade. Por mais que idealizassem uma nova vida, conheciam as dificuldades e as incertezas. Como disse Louise Bachelet: Quanto a mim, eu deposito aqui meu bordão e minha capa de pèlerine. Devotada de corpo e alma à realização falansteriana, eu era estrangeira nesta terra, enquanto a teoria permanecia confinada nos livros. Hoje que ela se encarna e lança suas raízes ao solo, eu me agarro ao lugar onde ela deve crescer, florir e perecer. Como uma mãe terna, eu seguiria com amor os desenvolvimentos da semente sagrada, eu sofreria com suas penas, eu me exaltaria com a sua vida, e se algum furacão imprevisível viesse a derrubar seu caule delicado, oh!! Então, eu não teria mais nada a pedir ao mundo que alguns pés de terra para repousar nas regiões onde teriam perecido todas as minhas esperanças (p. 20). Cortar o oceano então, significa negar limites internos e externos. A militância de Bachelet não parecia um caso isolado naquele momento. Na verdade, a contribuição das mulheres no universo da classe operária foi negligenciada por longo tempo na bibliografia, mas também porque já o havia sido antes no bojo da própria classe, apesar de evidências históricas comprovarem que as mulheres assumiram papéis que não foram acessórios nas lutas entre os anos de 1830 e 1850 na França e na Inglaterra. O caso de Bachelet e de outras mulheres do período ilustram como isto se tornou possível também fora da França. Bibliografia ADAMS, Percy G. Travel literature and the evolution of the novel. Lexington: The University-Press of Kentucky, 1983. BACHELET, Louise. Phalanstère du Brèsil. Voyage dans l’Amérique méridionale. Paris: chez tous les libraires et à l’agence coloniale du Brésil, rue des Prouvaires, 8, 1842. BACHELET, Louise. Phalanstère du Brèsil. Voyage dans l’Amérique méridionale. 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Aiming at treating the unusual travels of the period, we selected some remarkable cases: that of Fourierist journalist Louise Bachelet, who came in 1840 to South America; Victor Considérant, chief of the École Sociétaire and accomplisher of the phalanstery of Réunion, in Texas, in 1854; and the worker Norbert Truquin, who leaves in his memoires the account of his travels through Argentina and Paraguay. Key-words 19th Century, utopia, migration, Louise Bachelet, Victor Considérant, Norbert Truquin. 194 MORUS - Utopia e Renascimento, n. 7, 2010 Artigos avulsos
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