Detecção molecular de vírus entéricos em - CISS
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Detecção molecular de vírus entéricos em - CISS
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ Instituto Oswaldo Cruz - IOC PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO EM SAÚDE PÚBLICA ± PDTSP CAMPUS FIOCRUZ MATA ATLÂNTICA Detecção molecular de vírus entéricos em ambientes aquáticos do Campus Fiocruz da Mata Atlântica: um modelo de análise para previsão de agravos a saúde humana na fronteira entre a Mata Atlântica e a urbanização. RELATÓRIO FINAL 2010 1 1. IDENTIFICAÇÃO DO PROJETO Título: Detecção molecular de vírus entéricos em ambientes aquáticos do Campus Fiocruz da Mata Atlântica: um modelo de análise para previsão de agravos a saúde humana na fronteira entre a Mata Atlântica e a urbanização. Número do projeto: 0151000125 2. PERÍODO DO PROJETO Janeiro 2008 a Dezembro de 2009 3. IDENTIFICAÇÃO DO GRUPO Grupo de Pesquisa em Virologia Ambiental Pesquisador/ Coordenador: Marize Pereira Miagostovich, Ph.D - Pesquisador em Saúde Pública - Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental ± IOC/Fiocruz Tel: 2560 1875 ; [email protected] Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental ± IOC/Fiocruz 1. José Paulo Gagliardi Leite - Doutor, Pesquisador Titular, Chefe do Laboratório 2. Marize Pereira Miagostovich ± Doutora, Pesquisadora Titular 3. Flávia Ramos Guimarães ± Mestre em Vigilância Sanitária 4. Carmen Baur Vieira ± Mestre em Ciências 5. Túlio Machado Fumian ± Doutorando em Biologia Celular e Molecular 6. Matías Victoria ± Doutor em Biologia Celular e Molecular 7. Nilson Porto da Gama± Iniciação Científica Laboratório de Desenvolvimento Tecnológico 1. Ana Maria Coimbra Gaspar - Doutora, Pesquisador Titular 2. Jaqueline Mendes de Oliveira - Doutora, Tecnologista Sênior 3. Anna Carolina de Oliveira Mendes - Mestre em Biologia Parasitária 2 4. OBJETIVOS 4.1. Objetivo Geral Investigar a presença de vírus entéricos em águas do córrego Engenho Novo, objetivando utilizá-los como indicadores de impacto da presença humana, além de gerar um modelo capaz de estimar o impacto à saúde pública causado pela exposição a estes vírus presentes em águas de consumo e recreação. 4.2 Objetivos Específicos - Detectar e quantificar pelo método de reação em cadeia pela polimerase em tempo real (PCR quantitativo - qPCR) rotavírus A (RV-A), adenovírus humanos (HAdV), norovírus (NV) e vírus da hepatite A (HAV) em amostras de água do córrego Engenho Novo. - Obter resultados de parâmetros físico-químicos e número de coliformes fecais a fim de avaliar a adequação destes aos padrões estabelecidos pela Resolução CONAMA nº 274, de 29 de novembro de 2000 e Portaria MS 518 de 25 de Março de 2004. - Relacionar parâmetros microbiológicos e físico-químicos a presença dos vírus entéricos. - Avaliar o risco de infecção, morbidade e mortalidade por RV, HAdV e NV por veiculação hídrica através da ingestão de água em atividades recreacionais no córrego Engenho Novo e água destinada a consumo humano. 3 5. MATERIAL E MÉTODOS 5.1. Pontos de coleta No período de Junho de 2008 a Maio de 2009, foram realizadas coletas mensais de 2L de água superficial em nove pontos no Campus Fiocruz-Mata Atlântica: oito ao longo do córrego Engenho Novo ± água de recreação - e um na torneira do refeitório do Pavilhão Agrícola ± água de consumo (Tabela 1; Figuras 1 e 2). Estes pontos foram determinados utilizando-se o sistema de posicionamento global GPS (Garmin ® etrex Legend, EUA). Tabela 1. Pontos definidos para a coleta de amostras de água no Campus Fiocruz Mata Atlântica. Número Ponto Observações 01 Cachoeira Ponto controle 02 Represa da cachoeira Eventualmente utilizado para recreação 03 Após Filtro Cano rompido, tubulação posterior ao reservatório com filtro de areia. 04 Início do Fincão Trilha da mata 05 Meio do Fincão Ponte do Fincão 06 Fim do Fincão/ Início da Sampaio Correia Atrás do horto, próximo a Farmanguinhos. 07 Meio Vianna do Castelo Ponto central da comunidade. 08 Fim Vianna do Castelo Início da comunidade Franco da Rocha. 09 Torneira do refeitório Esse ponto é demonstrativo da água que é usada para abastecer o Pavilhão Agrícola. 4 Figura 1. Foto de satélite do Campus Fiocruz Mata Atlântica. Os pontos em vermelho representam a localização dos pontos de coleta. Ponto 1 Ponto 2 Ponto 5 Ponto 6 Ponto 3 Ponto 7 Ponto 4 Ponto 8 Figura 2. Fotos dos pontos de coleta, localizados no Campus Fiocruz Mata Atlântica, Jacarepaguá, Rio de Janeiro. 5 5. 2. Concentração Viral Os vírus foram concentrados por metodologia baseada na adsorção-eluição dos vírus em membrana carregada negativamente, descrita por Katayama e colaboradores (2002), com etapa prévia baseada na remoção de resíduos grosseiros por filtração com pré-filtro AP-20® (Millipore, Brasil). 5.2.1. Determinação da eficiência do método de concentração viral Para a determinação da eficiência do método de concentração viral utilizado, foram feitas inoculações experimentais com concentrações conhecidas de RV-A e NVGII. Após a inoculação, as amostras foram processadas conforme as demais obtidas no estudo. A Tabela 2 demonstra o percentual de recuperação obtido no ensaio variou de 0,5% a 6.2% para RV-A e de 0,5% a 12.1% para NV-GII nas diferentes repetições realizadas. Tabela 2. Eficiência do método de concentração viral por filtração em membrana carregada negativamente descrito por Katayama e colaboradores (2002) na detecção de rotavírus grupo A (RV-A) e norovírus genogrupo II (NV-GII). RV-A cg* inoculadas 3X10 8 1,5X109 cg recuperados NV-GII Taxa de recuperação (%) 7,76x106 2,6% 1,87x107 6,2% 4,89x107 3,3% 7,65x10 6 0,5% cg inoculados 1,6 X 10 6 1,6 X 10 5 8 X 10 * 5 cg recuperados Taxa de recuperação (%) 1,03x104 1,2% 5,23x104 6,1% 9,31x103 2,05x10 4 5,5% 12,1% 7,97x103 0,9% 4,15x103 0,5% cg: cópias de genoma 6 5.3. Detecção e Quantificação Viral O material genético viral foi extraído a partir dos concentrados de água utilizando-VH ³4LDJHQ 9LUDO 51$ .LW´ 4LDJHQ 9DOHQFLD (VSDQKD VHJXLQGR DV recomendações do fabricante. Foram utilizados controles negativo e positivo ao longo de todo o processamento da amostra. A síntese do cDNA foi realizada utilizando-se o iniciador randômico pd(N)6 (Amersham Biosciences, EUA), conforme protocolo previamente descrito (Guimarães et al., 2008). RV-A, HAdV, NV e HAV foram pesquisados a partir de protocolos de amplificação genômica previamente descritos (Heim et al., 2003; Kageyama et al., 2003; Vilar et al., 2006; Zeng et al., 2008). Os ensaios foram realizados por sistema TaqMan da Applied Biosystems. As amostras foram aplicadas em duplicatas em uma microplaca de 96 cavidades (MicroAmp®, Applied Biosystems, CA, EUA) e a reação foi realizada em plataforma ABI 7500 (Applied Biosystem, CA, EUA). 5.4. Determinação de parâmetros microbiológicos Para a quantificação do indicador microbiológico E.coli foi utilizado do Kit Colilert®-18 Quanti-Tray®/2000 (IDEXX Laboratories, Westbrook, EUA), seguindo as recomendações do fabricante. Este método baseia-se na observação de fluorescência gerada pela metabolização de nutrientes presentes no meio de cultura pela E.coli. O processamento das amostras foi realizado dentro de até 2 horas após a coleta e foram necessárias diluições seriadas das mesmas. As amostras coletadas nos nove pontos foram analisadas nas diluições100, 10-1 e 10-2. 5.5. Determinação de parâmetros físico-químicos No momento da coleta, os parâmetros físico-químicos temperatura (°C), condutividade (mS/cm), oxigênio dissolvido (DO) (mg/l), turbidez (UNT) e pH foram mensurados utilizando-se o equipamento Water Quality Checker U-10 (Horiba Ltd, Kyoto, Japão). 7 6. RESULTADOS A tabela 3 apresenta os resultados gerais de detecção viral nas 108 amostras coletadas no período junho de 2008 a maio de 2009. Não foram encontradas amostras positivas para HAV. Tabela 3. Detecção e quantificação de rotavírus A (RV-A), norovirus (NV) e adenovirus humanos (HAdV) nas 108 amostras de concentrados de água obtidos no Campus Fiocruz Mata Atlântica no período de junho de 2008 a maio de 2009. RV-A N (%) 18/108 (16,7%) HAdV NV cg/L 5,23x103 N (%) 13/108 (12,0) cg/L 1,85x103 N (%) Média cg/L 6/108 (5,5%) 1,7x103 Segundo a Resolução CONAMA nº 274, de 29 de novembro de 2000, as águas destinadas a balneabilidade (recreação de contato primário) têm sua condição avaliada nas categorias próprias e impróprias baseando-se nos valores obtidos para E.coli. Em função de as coletas serem realizadas mensalmente, considerou-se o parágrafo 4º do artigo 2º da Resolução 274 para a análise da água por este parâmetro, que considerada amostras próprias aquelas cujos valores obtidos encontram-se abaixo de 2000 NMP(número mais provável) de E.coli/100mL. Seguindo este critério, 48,9% (47/96) das amostras referententes aos pontos de recreação de contato primário (P1 ao P8) foram consideradas impróprias. O ponto 9 refere-se à água destinada ao consumo humano. Logo, a qualidade destas águas deve ser avaliada a partir da Portaria MS 518 de 25 de Março de 2004, que estabelece ausência de E.coli em 100mL de água. Assim, todas as amostras provenientes deste ponto encontram-se em desconformidade à referida portaria (Tabela 4). 8 Tabela 4. Valores absolutos obtidos na análise microbiológica de E.coli em NMP/100mL no período de junho de 2008 a maio de 2009 no Campus Fiocruz Mata Atlântica. Mês da coleta Pontos de coleta 1 2 3 4 5 6 7 8 9 JUN 370 22 22 450 23000 18000 31000 19000 6,3 JUL 3,2 52 4,9 400 3300 42000 3000 5300 24 AGO 5,2 8,5 31 <1 23000 11000 51000 13000 4,1 SET 63 62 45 9,5 2600 4200 5000 3500 25 OUT 21 58 52 63 3800 2300 4300 5200 8,5 NOV 24 39 18 75 2200 9400 16000 15000 12 DEZ 300 250 200 220 1700 8600 11000 9400 29 JAN 34 72 72 6,3 4500 7500 47000 9200 22 FEV 52 27 33 4,1 1400 3100 2000 13000 13 MAR 39 39 27 21 16000 7800 12000 8700 25 ABR 43 54 15 <1 7400 18000 8800 6,3 MAI 12 11 6,3 31 3800 3700 14000 2600 2200 3 (2008/2009) A tabela 5 apresenta os resultados obtidos para detecção viral por amostra de água analisada de acordo com o mês, destacando em vermelho a presença dos vírus em águas consideradas próprias à balneabilidade (<2000NMP/100mL de E.coli) e consumo humano (ausência de E.coli em 100mL). RV-A e/ou NV-GII foram detectados em 14,3 % (7/49) dessas amostras. A análise estatística demonstrou uma relação entre amostras consideradas impróprias e a detecção viral (P>0,95). Entretanto, analisando individualmente cada vírus, não foi observada a mesma associação (RV: p<0,001; NV: p<0,001; HAdV: p<0,01). 9 Tabela 5. Associação de detecção de rotavirus-A (RV-A), norovirus (NV) e adenovírus humanos (HAdV) e amostras de água próprias/impróprias à balneabilidade e consumo humano distribuídas por ponto de coleta realizadas no Campus Fiocruz Mata Atlântica no período de junho de 2008 a maio de 2009. Mês da coleta (2008/2009) Pontos de coleta 1 2 3 4 5 6 JUN 7 8 NV NV 9 JUL AGO NV SET HAdV RV OUT RV RV NV NV NV RV RV RV RV HAdV RV RV HAdV RV RV RV NV NV NV RV RV JAN HAdV MAR MAI RV RV DEZ ABR NV NV NOV FEV RV NV HAdV HAdV HAdV NV 10 O risco de transmissão de doenças virais por veiculação hídrica depende da capacidade dos vírus de se manterem infecciosos por um determinado período de tempo até que entrem em contato com um hospedeiro suscetível. Nesse contexto, é fundamental a realização de estudos que determinem os fatores ambientais e os efeitos que estes exercem na persistência de partículas virais em diferentes tipos de água, de modo a se avaliar o potencial risco à saúde pública associado ao uso da água (Ward et al, 1986; Espinosa et al, 2008). A tabela 6 apresenta os valores médios obtidos nos parâmetros físico-químicos no momento da coleta, não sendo encontrado nenhum valor em desconformidade às legislações vigentes, demonstrando a circulação viral em amostras consideradas próprias à balneabilidade e consumo humano, o que indica a não associação entre os mesmos. Tabela 6. Média das medições dos parâmetros físico-químicos dos pontos de coleta no córrego Engenho Novo - Campus Fiocruz Mata Atlântica - no período de junho de 2008 a maio de 2009. Condutividade Turbidez Oxigênio Temperatura (mS/cm) (UNT) dissolvido (mg/L) (ºC) 7,1 0,091 0,2 8,26 21,6 2 7,0 0,080 0,1 8,14 21,5 3 7,0 0,079 0,4 8,33 21,7 4 6,9 0,081 0,5 8,01 21,7 5 6,9 0,096 1,7 8,12 22,3 6 6,7 0,098 2,9 7,57 22,4 7 6,6 0,103 3,7 7,76 22,7 8 6,9 0,104 3,5 7,75 22,6 9 7,0 0,081 0,8 7,37 23,5 Ponto pH 1 11 6. ANÁLISE DE RISCO A análise de risco microbiológico é uma ferramenta que combina sistematicamente as informações disponíveis sobre exposição e dose-resposta de um determinado patógeno para produzir estimativas de infecções e efeitos adversos à saúde após a exposição a microrganismos ou a um meio onde esses estejam presentes. Este processo compreende as seguintes etapas: 1. Identificação do perigo e formulação do problema ± define a que grupos de patógenos e em que cenário a população está exposta; 2. Análise de exposição ± determinação da concentração do patógeno; 3. Dose-resposta - caracteriza a relação entre exposição e a incidência do efeito à saúde e é expressa por modelos matemáticos; 4. Caracterização do risco ± integra as informações obtidas nos itens anteriores visando estimar a magnitude do problema de saúde pública. A presença de vírus no ambiente é um indicador de poluição fecal que representa um risco potencial para a população exposta, uma vez que tais agentes não constituem a microbiota gastrointestinal normal, e só são excretados por indivíduos infectados (Abad et al., 1997). Doenças de veiculação hídrica estão entre uma das causas mais comuns de mortalidade no mundo, afetando especialmente países em desenvolvimento (Straub & Chandler, 2003) e vêm sendo mais freqüentemente associadas à contaminação viral (Cabeli et al., 1982; Bosch et al., 2008). 6.1. Identificação do perigo Rotavírus Membros da família Reoviridae, os RV são vírus não-envelopados, de simetria icosaédrica, medem aproximadamente 100nm de diâmetro e são compostos por 11 segmentos de RNA fita dupla. Os RV são classificados em grupos (A-G) e subgrupos (SG) em função da especificidade antigênica da sua principal proteína estrutural, a VP6. Os grupos A, B, e C têm sido encontrados em humanos e animais, enquanto os grupos D-G somente em animais. Os RV do grupo A (RV-A) são epidemiologicamente os mais 12 importantes, uma vez que são os principais responsáveis pelos episódios de diarréia aguda em crianças em todo o mundo (Kapikian et al., 2001). Descritos como os principais agentes etiológicos da gastrenterite aguda (GA) em crianças em todo o mundo (Estes & Kapikian, 2007), estima-se que, a cada ano, os RV sejam responsáveis por cerca de 2 milhões de hospitalizações e aproximadamente 611.000 óbitos em crianças menores de 5 anos de idade em todo o mundo (Parashar et al., 2003; 2006). As infecções por RV produzem uma gama de respostas que vão desde casos assintomáticos, principalmente em adultos, a casos graves de diarréia, que acometem principalmente bebês e crianças menores de cinco anos. A diarréia é a principal manifestação clínica, porém sintomas como vômito, dores abdominais e desidratação, sendo este último o principal fator de mortalidade do hospedeiro, podem ser observados. O período de incubação pode variar de 19 horas a dois dias e a doença é autolimitada, normalmente após cinco dias do início da infecção, podendo chegar a 10, o quadro se resolve (Estes & Kapikian, 2007; Greenberg & Estes, 2009). As vias de transmissão mais comuns são a fecal-oral, em função da sua resistência a inativação e ao contato com superfícies contaminadas (Estes & Kapikian, 2007). Estudos com voluntários demonstraram que os RV também podem ser adquiridos pela ingestão de água contaminada (Ward et al., 1986) e a superfície contendo a água evaporada também pode causar infecção em contato com a mão ou boca (Ward et al., 1991). Diversos estudos utilizando diferentes metodologias de concentração demonstraram a presença de RV em esgoto, águas superficiais, subterrâneas, potáveis e marinhas (Pusch et al., 2005; Espinosa et al., 2008; Hamza et al., 2009; He et al., 2009; Rutjes et al., 2009; Wong et al., 2009). Norovírus (NV) Os norovírus, pertencentes à família Caliciviridade, gênero Norovirus, são vírus não-envelopados, de simetria icosaédrica e medem aproximadamente 40nm de diâmetro e seu genoma é constituído de um RNA fita simples (RNAfs) de polaridade positiva. O gênero Norovirus está dividido em cinco genogrupos (GI a GV), sendo os genogrupos I, II e IV responsáveis por infecções em humanos. Os G são constituídos 13 de genótipos (GG), que representam a unidade mínima de classificação dos NV (Zheng et al., 2006; Patel et al., 2009). As infecções por NV são caracterizadas por diarréia e vômito e sua principal via de transmissão dos NV é fecal-oral. A infecção primária ocorre, predominantemente, através da ingestão de água e alimentos contaminados. Porém a transmissão via vômitos, por superfícies (através da mão/contato com a boca) e formação de aerossol, poderia gerar infecções secundárias e explicar a disseminação rápida e extensa de surtos de doenças em ambientes fechados, como hospitais, hotéis, cruzeiros e creches (Fankhauser et al., 2002; Widdowson et al., 2005). Responsáveis por 60 a 80% dos surtos de gastrenterite em todo o mundo, correspondendo a aproximadamente 93% das gastrenterites não-bacterianas, os NV infectam indivíduos de todas as idades, uma característica que os difere de outros vírus responsáveis pela etiologia das gastrenterites, (Glass et al, 2000; Zheng et al, 2006) e foram detectados em águas superficiais, subterrâneas, potável e mineral, águas recreacionais de rio, mar e lago (Kappus et al., 1982; Kukkula et al., 1999; Beuret et al., 2002; Abbaszadegan et al., 2003; Parshionikar et al., 2003; Laverick et al., 2004; Miagostovich et al., 2008; Hamza et al., 2009). Adenovírus Humanos (HAdV) Os adenovírus humanos (HAdV) são vírus DNA dupla fita, não envelopados, de simetria icosaédrica, com aproximadamente 90nm de diâmetro e pertencem a família Adenoviridade, gênero Mastadenovirus. Seus 51 sorotipos são divididos em seis espécies (A a F), de acordo com suas propriedades biológicas. A sua importância para a saúde pública está ligada a uma variedade de manifestações clínicas associadas aos tratos gastrointestinal, respiratório e urinário, bem como os olhos. A infecção inicial pode ocorrer por via respiratória, mas a transmissão fecal-oral está associada à maioria das infecções por adenovírus em crianças. Surtos de infecções oculares causadas por HAdV não entérico têm sido associados à piscina. Isto sugere a possibilidade de transmissão pela água quando a mesma é utilizada para fins recreativos. Além disso, os HAdV entéricos podem representar um potencial risco à saúde na água destinada ao 14 consumo humano, uma vez que esses vírus são transmitidos pela via fecal-oral (van Heerden et al., 2005) Os adenovírus foram detectados em um grande número de ambientes aquáticos e são extremamente resistentes aos processos de tratamento e desinfecção da água (Papapetropoulou & Vantarakis, 1998; Choi & Jiang, 2005; Fong & Lipp., 2005; Haramoto et al., 2005; van Heerden et al., 2003, 2005a, 2005b). Por terem genoma DNA dupla fita, o que os torna mais resistentes à luz UV que vírus RNA de fita simples, como vírus da poliomielite e o vírus da hepatite A, e serem encontrados em elevadas concentrações nos esgotos e apresentarem maior resistência frente aos indicadores bacterianos, estes vírus têm sido foco de estudos que os apontam como possíveis indicadores virais de contaminação humana em ambientes aquáticos (Puig et al., 1994; Pina et al., 1998; Boffil-Más et al., 2006; Jiang et al., 2006; Albinana-Gimenez et al., 2009). 6.2. Análise de exposição, dose-resposta e caracterização do risco Para análise de exposição são avaliados a concentração viral, o percentual de partículas infecciosas, o volume e a duração da exposição. Para este trabalho, foi considerado um volume diário de ingestão de água de 30mL por pessoa ao se banhar nas águas destinadas a recreação (P1 ao P8) e um consumo diário de 1,2L de água (P9) e um percentual de 50% de infecciosidade das partículas (van Heerden et al., 2003, 2005a,b; USEPA, 2004). Para NV, foi considerado que 10 partículas infecciosas e ingeridas pelo indivíduo são suficientes para causar infecção (Masago et al., 2006). Assim, a tabela 7 apresenta os resultados das concentrações virais por ponto considerando os itens previamente descritos. 15 Tabela 7. Média de concentração viral e fração de amostras positivas por ponto de coleta no córrego Engenho Novo - Campus Fiocruz Mata Atlântica - no período de junho de 2008 a maio de 2009. Ponto de coleta Média de concentração (fração de positivos) RV-‐A NV-‐GII NV-‐GI HAdV 1 ND ND ND 14,12 (1/12) 2 1,03 (2/12) ND ND ND 3 5,24 (1/12) ND ND ND 4 1,37 (2/12) ND ND 17,87 (1/12) 5 17,75 (1/12) 8,94 (2/12) ND ND 6 9,86 (3/12) 6,20 (4/12) ND 1,64 (2/12) 7 28,95 (6/12) 1,63 (2/12) 0,61 (1/12) ND 8 28,49 (2/12) 0,84 (2/12) 2,88 (2/12) 9 ND ND 650 (1/12) 2,50 (2/12) ND RV-A ± rotavírus grupo A; NV-GI ± norovírus genogrupo I; NV-GII ± norovírus genogrupo II; HAdV ± adenovírus humano; ND ± não detectado Para caracterização de risco fora utilizados os modelos exponencial para HAdV e 19 H ȕ-Poisson para RV, descritos como os mais adequados para estes vírus por estudos já publicados (Crabtree et al., 1997; Gale et al., 2001; van Heerden et al., 2005a,b; Masago et al., 2006). Pelo modelo exponencial, o risco diário de infecção por HAdV e NV é: 16 Onde, Pi/Day = probabilidade de infecção; N = números de vírus ingeridos; r= parâmetro dose-resposta ± HAdV: r = 0,4172 e NV: r = 0,069 (Crabtree et al., 1997; van Heerden et al., 2005a,b; Masago et al., 2006). Onde, C = média de concentração viral na água; R = eficiência de recuperação do método; DR = remoção ou inativação pelo processo de tratamento (=0 quando não se tratar de fonte de água); V = consumo de água (van Heerden et al., 2005a,b). C = Ȝ / média de volume de água; onde Ȝ = distribuição de poisson Ȝ = ln [P(0)]) [P(0)] = 1 ± média da fração de positivos detectados por PCR (van Heerden et al., 2005a,b). Pelo modelo ȕ-Poisson, a probabilidade de infecção por RV é: Onde, N = dose/número de partículas virais ingeridas; N50 = 5,6 e Į DPERV referentes a curva de dose-resposta (Gale et al., 2001; Haas et al., 1999). Para determinar-se o risco de morbidade, deve-se multiplicar a probabilidade de infecção pela taxa de morbidade. Para determinar-se o risco de mortalidade, deve-se multiplicar a probabilidade de morbidade pela taxa de mortalidade. Foram assumidas as taxas de morbidade e mortalidade por HAdV, NV e RV de 0,5 e 0,01%, respectivamente (Haas et al., 1999; van Heerden et al., 2005b; Patel et al., 2009). Assim, a tabela 8 apresenta os resultados gerais obtidos para a probabilidade de infecção, morbidade e mortalidade diários por RV, HAdV, NV-GI e NV-GII nas amostras 17 coletadas no córrego Engenho Novo ± campus Fiocruz Mata Atlântica. Vale ressaltar que neste trabalho não foram considerados a idade e o estado imunológico do indivíduo que entra em contato com estas águas. 18 Tabela 8. Probabilidade de infecção, morbidade e mortalidade diários por rotavírus grupo A (RV-A), norovírus genogrupo I (NV-GI), norovírus genogrupo II (NV-GII), adenovírus humano (HAdV) nas amostras coletadas no córrego Engenho Novo ± campus Fiocruz Mata Atlântica ± no período de junho de 2008 a maio de 2009. Ponto HAdV Infecção -‐3 Morbidade -‐3 RV -‐7 5,4 x 10 2,7 x 10 2,7 x 10 0 2 0 0 0 2,8 x 10 4 0 0 -‐3 5,4 x 10 2,7 x 10 0 0 -‐1 -‐1 0 -‐3 4,9 x 10 -‐7 2,7 x 10 0 -‐1 3,1 x 10 -‐1 5,5 x 10 5,6 x 10 7 0 0 0 6,6 x 10 8 1,1 x 10 -‐2 5,5 x 10 9 5,4 x 10 -‐3 2,7 x 10 2,7 x 10 1,5 x 10 3,3 x 10 5,5 x 10 -‐3 -‐1 -‐1 1,1 x 10 5,5 x 10 2,4 x 10 2,8 x 10 6 -‐3 -‐1 -‐1 6,2 x 10 -‐7 -‐1 1,4 x 10 3,1 x 10 0 -‐3 0 -‐1 5 -‐2 NV-‐GII Mortalidade Infecção Morbidade Mortalidade Infecção Morbidade Mortalidade 1 3 NV-‐GI Infecção Morbidade Mortalidade 0 0 0 0 0 0 -‐5 0 0 0 0 0 0 -‐5 0 0 0 0 0 0 -‐5 0 0 0 0 1,4 x 10 2,4 x 10 1,5 x 10 -‐1 3,1 x 10 -‐1 2,8 x 10 -‐1 3,3 x 10 -‐1 0 -‐5 0 0 0 7,9 x 10 -‐5 0 0 0 1,7 x 10 -‐5 3,8 x 10 -‐5 -‐4 1,9 x 10 -‐4 1,9 x 10 -‐5 -‐4 0 -‐4 3,9 x 10 -‐2 8,7 x 10 -‐4 3,9 x 10 -‐5 -‐8 7,9 x 10 -‐8 -‐4 3,9 x 10 -‐8 -‐4 8,7 x 10 -‐4 3,9 x 10 -‐4 -‐8 -‐8 -‐7 6,6 x 10 3,3 x 10 3,3 x 10 7,9 x 10 3,9 x 10 3,9 x 10 7,9 x 10 3,9 x 10 3,9 x 10 -‐8 -‐7 0 0 0 0 0 0 0 0 0 RV-A - rotavírus grupo A; NV-GI - norovírus genogrupo I; NV-GII - norovírus genogrupo II; HAdV - adenovírus humano 19 No Brasil, ainda não foi estabelecido um padrão para risco de infecções por microrganismos patogênicos nas legislações vigentes, o que aponta a necessidade de serem realizados estudos de avaliação de risco à saúde pública aplicável a ambientes aquáticos de acordo com os dados de detecção e quantificação viral obtidos. Entretanto, a USEPA determina que o risco de infecção por um patógeno pelo consumo de água não deve ser maior que 1 a cada 10000 consumidores por ano. Seguindo este critério a água do ponto 9 obtida para consumo da população local apresenta risco de infecção para HAdV, sendo necessário que se tome medidas de descontaminação desta água. O risco para balneabilidade é definido pela ocorrência de 1 infecção a cada 1000 banhistas. Neste caso, todas os pontos apresentaram um risco acima do estabelecido pelo órgão de proteção ambiental americano, demonstrando a necessidade de medidas de prevenção de contaminação e remediação do corpo hídrico avaliado, especialmente nos pontos 5, 6, 7 e 8, que correspondem a área de maior ocupação humana. 7. DIVULGAÇÃO DE RESULTADOS 7.1. Encontro Nacional de Virologia ± Brasília ± DF ± 2009 Assessment of adenovirus as a marker of viral contamination along a creek at the Fiocruz Atlantic forest campus. Guimarães FR, Vieira CB, Fumian TM, Montero MV, Mendes ACO, Gama NP, Leite JP, Miagostovich MP. 7.2. I Simpósio Latino Americano de Virologia ± Rio de Janeiro ± RJ 2010 Gastroenteric viruses in aquatic environments at the border between the Forest Atlantic and urbanization in the Fiocruz Atlantic Forest Campus. Flávia Ramos Guimarães, Carmen Baur Vieira, Tulio Machado Fumian, Matias Victoria, Nilson Porto Gama, José Paulo Gagliardi Leite, Marize Pereira Miagostovich. 20 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abad FX, Pintó RM, Villena C, Bosch A: Astrovirus survival in drinking water. Appl Environ Microbiol. 1997; 63 (8): 3119-22. Abbaszadegan M, LeChevallier M, Gerba CP. Ocurrence of viruses in US ground water. JAWWA. 2003; 95 (9): 107-20. Albinana-Gimenez N, Miagostovich MP, Calga B, Huguet JM, Matia L, Girones R. Analysis of adenoviruses and polyomaviruses quantified by qPCR as indicators of water quality in source and drinking-water treatment plants. Water Res. 2009; 43 (7): 2011-9. 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