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O JOGO DO PERDE-PERDE-PERDE
Seu nome no jargão da cadeia supermercadista é ruptura, ou seja, a falta na
gôndola do produto que o consumidor veio comprar.
Além da frustração ou irritação do consumidor quando não encontra o que
busca na loja, cujos efeitos afetam a imagem do estabelecimento e a
fidelidade à marca, a atitude do shopper tem implicações importantes para o
fabricante e o varejista. São quatro as possibilidades e suas consequências
para o varejista e o fabricante:
Atitude
Desiste da
compra
Adia a compra
Compra outro
produto
Compra em outra
loja
Varejista
Perde receita, margem e imagem1
Fabricante
Perde receita
Difere a receita e perde imagem
Perde parte da receita (o produto
alternativo tende a ser de menor
custo), imagem e pode ter
problemas nos parâmetros de
sistema2
Perde receita e corre o risco da
perda do consumidor se ele
preferir a loja do concorrente
Difere a receita
Perde receita e corre o risco da
perda do consumidor se ele
preferir o produto substituto
Transfere a fonte de receita
As atitudes e comportamentos relacionados à ruptura variam de acordo com:
a categoria de produto e fidelidade à marca, registrando-se índices mais
elevados em itens como alimentos para bebês e cosméticos – raramente
substituídos - e mais baixos em produtos do tipo commodities, como óleo
comestível, farináceos, etc.; e
tipo de compra: planejada / impulso, urgente / sem urgência.
Por outro lado, apesar dos esforços de diferenciação de empresas e redes
varejistas, complementados por investimentos na fidelização de clientes e
consumidores, registram-se em todo o mundo crescentes índices de
“infidelidade”: na Europa e nos EUA quem faz o abastecimento do lar visita
perto de 6 diferentes lojas por mês, enquanto no Brasil, conforme pesquisas
da Latin Panel, este índice é da ordem de 3 visitas.
Não é muito diferente o cenário do lado da indústria: ao longo do tempo, as
marcas líderes procuraram agregar cada vez mais qualidade a seus produtos,
1
Pesquisas internacionais registram que se faltarem cerca de 20% dos itens da lista de
compras do consumidor, ele / ela abandona o carrinho na loja e desiste de comprar. Na 2a
ocasião em que isto ocorre no mesmo estabelecimento, perde-se o consumidor.
2
A substituição do produto leva ao aumento da demanda do item efetivamente comprado, o
que poderá levar à sua falta e/ou ao aumento de compras deste item, por aparente
incremento na demanda, podendo distorcer parâmetros logísticos e níveis de estoques.
1
cada fabricante tentando superar as expectativas do consumidor e a oferta
dos concorrentes. Este esforço, em muitas categorias, resultou na
“commoditização” dos produtos, todos percebidos como excelentes e
igualmente satisfatórios, fazendo com que na decisão de compra os critérios
preponderantes sejam disponibilidade e preço.
Outra faceta do embate de fabricantes pelo espaço na gôndola da loja e na
cesta de compras do consumidor é o frenético ritmo de lançamento de novos
produtos: no Brasil estima-se que cerca de 20%do sortimento das lojas
varejistas é renovado anualmente. Para entender a dimensão desta prática,
basta lembrar que um varejo de vizinhança trabalha em geral com 3.000 a
5.000 itens, um supermercado com 15.000 a 25.000 e um hipermercado
com mais de 50.000 produtos diferentes.
A importância das rupturas é gigantesca: mesmo nas economias mais
desenvolvidas, onde os resultados finais das empresas são da ordem de 1%
a 3% de suas vendas, as cadeias mais eficientes apresentam índices de falta
de 5% a 7%. É comum encontrarmos índices de falta de 10%, 15% ou
mesmo superiores a 20%.
Pesquisa realizada em parceria pela AC Nielsen e a Associação ECR Brasil em
2005, verificando apenas a disponibilidade nas gôndolas das principais lojas
da Grande São Paulo e Grande Rio dos produtos líderes de vendas, registrou
uma média de 8%. Produtos menos importantes nas mesmas lojas, em lojas
menores ou em áreas que não contam com a rapidez e facilidade de
reposição dos principais centros econômicos do país seguramente registram
duas ou três vezes esta taxa.
A busca de soluções para este importante problema passa por algumas
etapas:
1. Dimensionar as rupturas
É comum fornecedores e varejistas medirem os índices de serviço logístico,
porém cada qual usa sua própria métrica, o que dificulta enormemente o
entendimento do problema, especialmente quando o mesmo fato é registrado
de forma diferente pelos envolvidos3, e ainda por na maioria das vezes as
estatísticas serem feitas até o ponto de transferência de propriedade da
mercadoria – CD ou depósito de loja – sem chegar até a gôndola.
3
Um exemplo deste tipo de situação ocorreu recentemente entre uma grande rede varejistas
e uma indústria. O varejista havia pedido 10 itens, agendando a data de entrega. No momento
desta entrega – absolutamente pontual – o varejista verificou que tinha se enganado em um
dos itens pedidos, do qual ainda tinha estoque suficiente, e devolveu aquele item. No registro
da indústria lia-se entrega pontual do pedido, enquanto o varejo registrava a devolução de um
item.
2
Importante lembrar que no caso de rupturas as médias apenas servem para
dar idéia do tamanho do problema, mas em nada contribuem com a solução
do problema: é preciso investigar cada loja individualmente, rastreando os
processos envolvidos no abastecimento de cada item de seu sortimento.
A primeira decisão é o que medir. O ideal seria medir todos os itens, mas
dado seu grande número, muitas vezes se trabalha com uma cesta,
representando:
categorias
itens de alto, médio e baixo giro
fornecedores / marcas
O próximo passo é definir quando medir. O melhor sistema é aquele que
opera em tempo real, medindo tudo e sempre, assim capturando as
oscilações do abastecimento ao longo do dia, da semana e do mês. Isto só é
possível com recursos informatizados (discutidos abaixo), na maioria dos
casos sendo necessário estabelecer uma agenda de pesquisa. Esta deve ser
aleatória (sem que os responsáveis pela loja tenham a informação
antecipada, assim evitando que a realidade seja mascarada), e contemplar
tanto dias de semana como finais de semana (estes em geral mais críticos,
pois contam com as maiores vendas, muitas vezes sem a retaguarda
logística disponível nos dias da semana).
A terceira decisão é como medir.
Para isto existem algumas alternativas:
Informática
O ideal seria medir todos os itens todos os dias, o que só é praticável via
sistema, e com limitações, pois a informática no meio varejista apenas infere
o conteúdo da gôndola, registrando o abastecimento pelo que foi transferido
dos estoques de retaguarda e tomando como saída tudo que passou no
caixa. Perdas, roubos, produtos danificados / estragados (situação comum
em frutas, legumes, flores, verduras, etc.) muitas vezes não são registrados.
O recurso mais comum utilizando a informática é analisar as vendas de cada
dia. Produtos que não registraram vendas, ou que tiveram vendas
insignificantes são analisados, apurando se a falta de venda se deveu à falta
do produto na loja.
Sistemas mais sofisticados estimam a venda diária de cada item,
confrontando o realizado com o estimado, e no caso de divergências
significativas sugerem rupturas – com o benefício de quantificar as vendas
perdidas de cada item.
3
Na Europa e nos EUA existem algumas empresas especializadas neste tipo de
problemática, tendo construído sistemas de previsão de vendas bastante
sofisticados, que incluem os conceitos de cross-selling (por exemplo
estimando o aumento de vendas de mussarela quando se faz uma promoção
de discos de massa de pizza pré-assados), e até mesmo dimensionando o
impacto de promoções de lojas concorrentes na área de influência de cada
estabelecimento.
Store-check
O recurso mais comum para verificar a ocorrência de rupturas é a auditoria
do ponto de venda, seja com controles visuais ou por um processo semiautomatizado, fazendo a leitura dos códigos de barras dos produtos
encontrados e confrontando os resultados com o sortimento que deveria
existir.
A questão do sortimento, entretanto, é delicada, pois é comum os cadastros
de empresas e lojas conterem grande número de registros de itens inativos,
que saíram de linha, cujas vendas são sazonais, etc.
Antes de realizar a análise dos resultados encontrados, portanto, é preciso
definir o que se considera o sortimento que a loja deveria ter – de modo
geral pode-se tomar como referência a relação de produtos que passaram
pelo caixa nos últimos 3 ou 4 meses.
Partindo da premissa que a ruptura deve refletir a loja vista pelo consumidor,
é importante também definir onde a pesquisa será feita: no chamado ponto
original (a gôndola onde normalmente é encontrado o produto) e/ou os
pontos promocionais.
Não há consenso sobre o tema, o ideal sendo medir as duas situações, pois é
comum registrar faltas em itens promocionados, especialmente causadas
pela dificuldade de antecipar o seu volume de vendas – lembrando que as
dificuldades de previsão deveriam ser compensadas por estoques e/ou
modelos de reabastecimento especiais.
A quarta decisão trata de quem mede. Na verdade a observação do ponto de
venda não requer especialização, apenas atenção e método. O importante é
assegurar a isenção de quem observa, para o que, preferencialmente, devem
ser evitados profissionais envolvidos com o reabastecimento, para que não
haja qualquer conflito de interesses ou possibilidade de mascarar a realidade
do ponto de venda na perspectiva do consumidor.
Os passos acima permitem registrar a ocorrência de rupturas. Resta
dimensionar o quanto a cadeia de abastecimento perdeu com a falta destes
produtos. O cálculo é bastante complexo, e seu resultado inconclusivo,
conforme discutido a seguir.
4
As vendas perdidas quando falta um produto dependem da atitude do
consumidor diante da gôndola vazia, demonstradas no início deste artigo. Em
essência o produto pode ser substituído por outro (da mesma marca ou de
outra), a compra adiada, feita em outra loja ou cancelada.
Qual das posturas o shopper adota varia conforme a categoria do produto:
O que faz o consumidor quando não encontra o produto que
deseja?
18
21
14
19
18
19
21
18
36
38
18
21
20
29
26
32
35
62
60
58
55
23
13
50
46
48
31
15
64
44
61
34
27
72
51
52
45
35
33
33
27
26
39
39
18
14
Eletroeletronico
19
Têxtil
10
Muda de Marca
Muda de Loja
Pratos Prontos
Ração p/
Animais
Peixaria
Bebidas
Alcóolicas
Bazar
Hortifruti
Carnes/Aves
Padaria
Queijos/Frios
Higiene/ Beleza
Congelados/
Refriados
Alimentos n.
perecíveis
Bebidas n.
alcóolicas
Limpeza
Fonte: LatinPanel
Não leva
As perdas, entretanto, dependem não só da categoria, mas também do
momento de compra: havendo urgência, a atitude muda, ou sendo uma
compra de impulso, esta se perde definitivamente. Para produtos sazonais
(ex. ovos de páscoa) as perdas são mais críticas, muitas vezes inexistindo a
possibilidade de reposição.
O quanto se perdeu de vendas – e quem as perde – depende ainda:
da duração da ruptura: horas ? dias ? semanas ?;
do conhecimento das compras relacionadas ao produto faltante (cross
selling): se faltar, por exemplo, discos de massa de pizza, perder-se-ão
vendas de muzzarela, azeite, orégano, etc.; e
do número de itens da lista de compras que não foram encontrados na
loja (índices elevados podem levar à desistência de toda a compra,
abandonando o carrinho no meio da loja – e com isto gerando trabalho
extraordinário de reposição dos produtos do carrinho nas respectivas
5
gôndolas e descarte dos refrigerados que permaneceram fora do
ambiente frio).
Estas são as consequências imediatas das faltas, cujo impacto se sente no
ponto de venda. Dependendo do volume e duração das rupturas, e que
produtos envolvem, são geradas outras distorções, em especial sobre os
parâmetros de reposição e logística, agravando-se os efeitos quanto mais
longa for a ruptura e quanto maior a demanda / volume de vendas do
produto faltante:
na hipótese de um produto faltante ser substituído por um similar, a
demanda deste similar excederá as previsões, levando-o também à
ruptura;
no momento seguinte, quando o sistema gerar os parâmetros logísticos
de reposição, o item inicialmente faltante poderá ter registrada uma
queda em sua demanda, sendo pedido em menor quantidade, enquanto o
substituto será pedido em maior volume;
se não houve efetiva migração de um produto a outro, teremos, no
terceiro momento, falta mais precoce do primeiro item, e eventual
excesso do segundo, constituindo-se ainda o efeito-chicote ao longo da
cadeia;
no caso da falta de um item de lançamento, na fase em que recebe todo o
apoio de mídia, a má performance pode levar ao fracasso do produto no
mercado ou na loja;
o acúmulo destes problemas em um mesmo ponto de venda podem
favorecer a migração do consumidor para outra loja ou rede.
É, portanto, extremamente complexo o cálculo do montante de vendas
perdidas pela ruptura. Além da venda não realizada, da substituição de
vendas e dos impactos sobre produtos correlatos, cada uma destas situações
e operações implica em custos que deveriam ser agregados à conta do
montante de perdas, com estoques inativos gerados, descarte de produtos
manipulados, perda de imagem, etc.
2. Identificar as Causas-Raiz
A mera quantificação da ocorrência de rupturas é como um atestado de
óbito: registra um fato passado e não permite resolvê-lo ou evitar que volte
a ocorrer.
Reduzir ou eliminar rupturas demanda uma análise detalhada da cadeia de
abastecimento, identificando as falhas que acontecem em qualquer dos
processos relacionados ao abastecimento, desde a previsão de demanda até
os processos de manufatura, armazenamento, distribuição, controle, etc.
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O desafio é encontrar a causa real da ruptura, a chamada causa-raiz, sem se
ater a causas aparentes, que são meras consequências. Como exemplo,
poderíamos tomar a própria pesquisa feita pela AC Nielsen, citada
anteriormente. Constatada a falta de um item em seu ponto original,
perguntava-se ao gerente da loja ou responsável pelo setor qual a causa
desta falta. Em 37% dos casos as respostas eram “pedi ao CD mas não
recebi”, sinalizando portanto, como causa aparente, o processo de entrega
do CD à loja. Investigando o que acontecia no CD, descobriram-se várias
causas pelas quais os produtos solicitados não eram entregues, destacandose os pedidos feitos com atraso pela loja (não havendo tempo para seu
processamento, separação e carga da mercadoria – causa-raiz portanto) e a
falta de produtos no próprio CD (causa aparente). Seguindo cadeia acima,
verificaram-se as causas das faltas no CD, encontrando-se problemas como
atrasos de entrega dos fabricantes ao CD, negociações comerciais durante as
quais as compras estavam suspensas, problemas de produção
(especialmente quando envolvendo matérias-primas importadas), pedidos
além da capacidade de produção da fábrica, etc.
3. Soluções
3.1. Evitando a Ocorrência de Rupturas
Medidas eficazes contra a ocorrência de rupturas só podem ser adotadas se
conhecidas as causas-raiz, e na maioria dos casos exigem o envolvimento do
fabricante, transportador / operador logístico e varejista (sem esquecer suas
operações internas de reabastecimento, entre o CD e a loja e entre o
depósito da loja e a gôndola). Quanto mais detalhadas as informações sobre
incidência e momento de ocorrência, mais fácil determinar as causas e
propor soluções.
Algumas das soluções são individuais, específicas para a loja, o CD ou as
relações com o fornecedor e o operador logístico envolvido, mas muitas
passam pela necessidade de adotar padrões compartilhados por todos os
agentes da cadeia de abastecimento. Ou seguir padrões estabelecidos.
Vejamos alguns exemplos de situações comuns nesta categoria:
Identificação e Cadastro de Produtos
Tratamos de estoques com milhares de produtos diferentes, que devem ser
registrados e acompanhados desde a fábrica onde são produzidos até o caixa
do varejo onde são comprados pelo consumidor, passando por talvez
algumas dezenas de leituras ao longo da cadeia pela qual trafegam.
A maioria das empresas utiliza sistemas informatizados, nos quais cada
produto deve ser cadastrado de modo único, com um “RG” próprio que evite
quaisquer confusões entre tamanhos, sabores, embalagens, cores ou outros
atributos individuais.
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Como todos sabemos, computadores são excelentes processadores, porém
sem qualquer senso crítico: executam apenas o que lhes é ordenado. Assim,
se por exemplo um achocolatado é cadastrado em um ponto como “achoc” e
em outro como “achocol”, o computador os entende como itens diferentes.
Este ainda é um exemplo fácil: nos CD’s e depósitos vivenciam-se
diariamente centenas de problemas como este, onde o encarregado de
receber as mercadorias deve identificar no cadastro dos milhares de produtos
de sua empresa a correspondência da descrição que vem na documentação
fiscal.
E qualquer dúvida é fatal: o produto pode ser recusado, gerando faltas, ou
pode ser recadastrado como produto novo, gerando duplicidade de estoques
contábeis, que distorcerão todos os parâmetros do sistema, levando a
pedidos desnecessários e/ou faltas.
Em teoria o código de barras deveria ser o identificador único e universal de
cada item, porém seu mau uso é comum, com empresas reutilizando códigos
de produtos descontinuados, atribuindo o mesmo código a diferentes
produtos, embalando produtos em caixas de outros, etc. Além de preferirem
códigos próprios de cada empresa, colocando estes na documentação fiscal,
ao invés do código universal.
A falta de cadastros padronizados, com os mesmos campos, em iguais
posições e conteúdos normatizados, cria barreiras intransponíveis para a
automação, exigindo inúmeras leituras e retrabalhos ao longo da cadeia, com
batalhões de digitadores e muitos êrros e dúvidas acontecendo a cada
momento.
Por outro lado, mudar estruturas e conteúdos de cadastros é uma tarefa
complexa, muitas vezes exigindo decisões internacionais de grandes
corporações, além de normas globais.
Assim, é preciso buscar as soluções possíveis para um problema desta
magnitude – muito aquém do nível desejado. O caminho eventualmente
viável passa pela definição de um cadastro mínimo indispensável,
consensado pelos principais players, contendo os campos que com mais
frequência geram problemas.
Um dos grandes problemas, sem dúvida, é a descrição de produtos: existem
pelo menos três versões ao longo da cadeia – a do fabricante, a do varejista
e a da etiqueta de gôndola. Desejável seria normatizar o processo de
descrição, de sorte a levar sempre à mesma forma, para o que seria
necessário também criar um glossário universal de nomes e abreviações.
Frente à complexidade desta solução, o caminho eventualmente possível
seria utilizar apenas o código de barras como identificador, desde que
utilizado corretamente.
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Iniciativas desta natureza não podem ser tomadas por empresas individuais.
É preciso estabelecer o consenso entre dirigentes empresariais, e definir
normas de trabalho seguidas pelas principais empresas, sem o que qualquer
tentativa de solução não passa das boas intenções.
Um fórum técnico neutro que busca alinhar conceitos e propostas é oferecido
pelo ECR (Efficient Consumer Response), movimento internacional que
congrega as principais empresas do segmento conhecido como FMCG (fast
moving consumer goods).
Previsão de Vendas / Demanda
Enquanto nas épocas de elevada inflação os estoques são ativos valiosos,
que resguardam a empresa da corrosão do valor da moeda, em momentos
de estabilidade econômica significam custos indesejáveis para qualquer
cadeia de abastecimento.
Quando estamos em negócios cuja margem sobre vendas é da ordem de 1%
ou 2%, qualquer pequena ineficiência – como manter estoques
desnecessários – pode significar a diferença entre lucro e prejuízo.
Por outro lado, o estoque costuma ser a muleta das ineficiências dos
diferentes processos que são indispensáveis para os produtos serem
produzidos, distribuídos e consumidos. A resposta às perguntas abaixo com
muita fequência costuma ser a mesma: aumentem-se os estoques (de
segurança).
É difícil prever com razoável segurança as vendas de cada produto ?
É pouco confiável o serviço de entrega dos produtos comprados ?
Costumam ocorrer problemas de disponibilidade
fornecedor para entregas nos prazos solicitados ?
de
produtos
do
Será que não faltarão produtos promocionados, face aos investimentos de
mídia que foram feitos ?
Como serão as vendas (dos produtos mais desejados) na páscoa / natal /
dia das mães ... ?
O grande desafio compartilhado pela indústria e comércio é produzir e
distribuir no mesmo volume e ritmo da demanda, sem sobras e sem faltas.
Para subsidiar as previsões, existem ferramentas bastante sofisticadas, em
geral software que trabalha com algoritmos, simulando a demanda conforme
variam diferentes parâmetros que a influenciam.
As previsões da demanda total de produtos específicos realizadas por
empresas individuais, considerando seus clientes principais, têm se
aproximado cada vez mais da realidade. No microcosmo de lojas individuais
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de uma grande rede, por exemplo, ou de praças individuais quando se trata
de vendas nacionais, os êrros continuam relativamente elevados, gerando
sobras em alguns pontos do território e faltas em outros.
Sabedores destas dificuldades, os gestores de unidades de negócio muitas
vezes procuram sobre-estocar produtos – temerosos de cortes ou faltas – de
sorte que a somatória das demandas destas unidades muitas vezes
ultrapassa em muito a previsão total, bem calibrada pelos sistemas.
A cultura empresarial brasileira, por outro lado, ainda é bastante reticente no
que tange o compartilhamento de informações ou o alinhamento de
previsões, dentre as barreiras encontrando até mesmo o sistema de
remuneração e incentivo da maioria das equipes de vendas, das quais se
espera crescer sempre, e também ultrapassar as metas estabelecidas –
postura corroborada pela cultura de compras de oportunidade, buscando
menores preços e prazos de pagamento mais dilatados para grandes
volumes.
Deste modelo instituído resultam práticas logísticas perversas, quando em
muitas grandes indústrias se observa que mais de metade das vendas do
mês ocorrem nos últimos dias de cada período, exigindo custos elevados de
estocagem de produtos acabados ao longo do mês e distribuição cara em
vista da ociosidade da frota durante 3 semanas e sobrecarga no início do
mês. Este quadro é ainda agravado quando se considera que muitas destas
vendas – com os maiores custos – são feitas oferecendo ao comprador
elevados descontos e prazos de pagamento dilatados.
A redução de custos e de rupturas pode ser obtida mudando o foco comercial
de vendas de oportunidade para cadeias que produzem para satisfazer a
demanda efetiva do consumidor (sem prejuízo do uso de todos os recursos
de estímulo ao crescimento da demanda), alterando as práticas de vendas de
grandes volumes concentradas em poucos dias e ainda compartilhando e
alinhando previsões de venda por praça e loja, evitando as distorções na
distribuição dos estoques ao longo de cada cadeia.
Tamanho de Embalagens da Indústria / Pedido Mínimo
As embalagens de venda da indústria agregam uma quantidade variável de
unidades de consumo (aquelas compradas pelo consumidor).
As principais funções da embalagem de venda (ou logística) é acondicionar e
proteger os itens vendidos, assegurando sua integridade até que cheguem à
gôndola e também facilitando sua manipulação (movimentação e
armazenagem) ao longo do sistema de distribuição.
Para varejos de pequeno porte, entretanto, as embalagens de venda de
alguns produtos da indústria – que representam a menor unidade
comercializada – podem significar vários meses de vendas da loja,
10
inviabilizando sua compra e, portanto, deixando de oferecer ao consumidor o
que ele gostaria de encontrar na loja.
Alguns atacadistas eventualmente suprem esta lacuna, quando fracionam as
embalagens da indústria, abrindo as caixas de despacho originais e reembalando os produtos de acordo com o sortimento desejado pelos seus
clientes. Esta é uma operação ineficiente e arriscada, quando comparada à
facilidade de se trabalhar com embalagens fechadas desde a origem até o
destino final. O inevitável manuseio exigido pelo reagrupamento de itens põe
em risco a integridade da embalagem de venda e do próprio conteúdo, além
de envolver considerável empenho de mão de obra.
A revisão das quantidades de unidades de venda em cada caixa fornecida
pela indústria, eventualmente estabelecendo módulos para o pequeno, médio
e grande varejo poderia agilizar as operações logísticas e facilitar o acesso de
pequenos comércios a muitos produtos com os quais hoje não trabalham.
Ainda no quesito embalagens, é importante salientar uma importante
tendência que se consolida tanto nos EUA como na Europa: são as
embalagens logísticas que vão até a gôndola, conhecidas como shelf-ready
package.
São embalagens concebidas para aliar as tradicionais funções de proteção e
manuseio, este último indo até a prateleira de venda, onde a caixa funciona
como unidade de reposição e mesmo display, expondo os produtos e
contendo itens de comunicação.
Na medida em que este tipo de embalagem venha a ser adotado, o problema
das embalagens mínimas tende a se agravar, além de se alterar a modulação
do uso do espaço de exposição de produtos, que passará a ter como unidade
mínima a caixa logística ao invés da unidade de consumo.
Do lado das oportunidades, a criação de novas embalagens / unidades de
exposição enseja a modulação de suas medidas, de sorte a otimizar o uso do
espaço de exposição.
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Práticas Comerciais
Uma das causas de ruptura muito comuns em nosso meio são as práticas
comerciais, em seus mais variados aspectos, destacando-se:
Compras suspensas por não haver acordo comercial e/ou durante o
período em que as negociações são conduzidas;
Compras “oportunísticas”, quando o varejista não compra as mesmas
marcas a cada vez que repõe seu sortimento, a cada vez comprando os
produtos com menores preços (mudando, por exemplo, a marca de arroz,
sabão ou óleo);
Venda de espaço de gôndola: no decurso do tempo, os varejistas
(especialmente as redes de maior porte) passaram a incorporar mais uma
fonte de receita a seu cardápio, vendendo à indústria os espaços de
prateleira onde é maior a visibilidade dos produtos e a propensão de
serem comprados. A indústria, por sua vez, paga por estes locais
privilegiados tanto para alavancar as vendas de suas marcas, como
também para bloquear o acesso a este espaço a seus concorrentes. A
venda de espaço obedece a uma espécie de leilão, no qual o maior
ofertante “adquire” o espaço por determinado período de tempo – o
sortimento acaba sendo definido mais pela receita do leilão do que pelos
desejos do consumidor;
Concentração de vendas da indústria no final do mês, impactando a
logística e muitas vezes gerando dificuldades no abastecimento.
3.2. Minimizando o Impacto das Rupturas
Se falharam todos os esforços ao longo da cadeia para evitar a ocorrência de
faltas, é preciso pensar em medidas que amenizem seu impacto sobre o
shopper e as consequências de suas atitudes sobre as empresas.
O mínimo que se pode fazer no ponto de venda é assinalar a falta
involuntária, com os devidos pedidos de desculpas, e desejavelmente
informações da duração desta falta.
É claro que isto só se aplica a faltas mais demoradas e de causas conhecidas
– e que apenas explica mas não justifica a falta, não gerando qualquer
satisfação a quem procura o produto.
Para a maioria dos itens em falta em uma loja de auto-serviço, como um
supermercado, a maneira mais usual de detectar o que o shopper não
encontrou é perguntando-lhe quando passa pelo caixa.
Diante do comentário que não encontrou algo que buscava, são três as
possibilidades:
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1. o produto não faz parte do sortimento da loja: dependendo da incidência
da demanda, o varejista deve considerar sua inclusão;
2. o produto está na loja mas o shopper não o encontrou: deve haver
alguém disponível para buscar o produto enquanto os demais itens da
compra são processados (daí a importância de perguntar sobre faltas
antes de proceder ao check-out); ou
3. o produto está em ruptura: diversas atitudes podem ser tomadas
(dependendo da duração prevista para a ruptura e do valor dos itens
faltantes – algumas das situações aplicáveis principalmente a bens
duráveis, como eletroeletrônicos, etc.)
a. anotar os itens não encontrados e avisar quando estiverem
disponíveis;
b. anotar os itens não encontrados e as quantidades desejadas e
providenciar a entrega (possível apenas se a falta for de curta
duração, havendo os produtos desejados nos depósitos de
retaguarda);
c. verificar a disponibilidade em outras lojas da rede deixar a
mercadoria separada e reservada;
d. no caso de itens promocionais, fazer um vale garantindo o preço
promocional;
e. oferecer similar;
f. oferecer produto superior (upgrade) pelo mesmo preço do item
faltante.
É claro que este tipo de atitude pode minorar a frustração de quem busca um
produto, e eventualmente resguardar a imagem da loja de danos maiores.
Desde que a ocorrência seja eventual. Se a cada vinda do consumidor à loja
houver a necessidade de tomar providências desta natureza, os custos da
operação e a eternização do modelo de negócios seguramente
comprometerão a continuidade do relacionamento.
Outra consideração importante é a gestão do momento de “resgate” do
cliente:
de um lado, a operadora do caixa pode não ter a informação e/ou o poder
de decisão para gerenciar a situação. É preciso estruturar um sistema de
atendimento ágil e simples, que de fato procure compensar o cliente pelo
dissabor – e pelo tempo adicional da busca de uma solução;
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de outro, a implementação da solução deve ser impecável, procurando
entregar ao cliente mais de que ele esperava, tentando compensar a falha
havida.
Gestos mecânicos, atitudes burocráticas e falta de resultados perceptíveis
são a pá de cal que sela o fim de uma relação de confiança e reciprocidade.
Por fim, o problema ocorre no ponto de venda, mas suas causas – e
principalmente suas soluções - vão até a origem das matérias-primas
envolvidas na produção dos bens desejados pelo consumidor, suas
embalagens, transporte, etc. É um esforço que deve ser compartilhado por
todos os envolvidos, oferecendo enormes compensações tangíveis (basta
comparar os índices de rupturas com os percentuais de resultado dos
demonstrativos financeiros das empresas) e intangíveis (imagem, fidelidade,
satisfação, etc.), que perenizam a preferência do consumidor.
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