Loulé e Créteil, cidades gémeas. Entrevista com o

Transcrição

Loulé e Créteil, cidades gémeas. Entrevista com o
FOTOS: JOSÉ SÉRGIO
LOULÉ TEM PEDALADA
DINÂMICA, MOBILIDADE, MODERNIDADE, TRADIÇÃO E CULTURA
+
Atrás dos muros onde Ronaldo
e outros "craques" passam férias PÁG 23
Jazz 30m abaixo do nível do mar PÁG 06
A Europa vai dar a volta por cima PÁG 17
Loulé e Créteil, cidades
gémeas. Entrevista com
o presidente da autarquia
PR na homenagem
a Lídia Jorge.
Entrevista com a escritora
PÁG 14-15
PÁG 10-13
467ed5e2-6f51-423a-8082-a489b69c57f6
02 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Abertura
RETRATOS DE UM CONCELHO
(Re)descobrir Loulé
Os louletanos recebem bem quem vem de fora e oferecem-nos alguns
dos prémios turísticos internacionais com que o nosso país
é anualmente reconhecido
Roch
UM DESTINO PARA TODO O ANO
O Algarve dos diminutivos,
do limanito e do panito, da
ruralidade, da descoberta do
mar e da serra esquecida
são quase página virada no
presente de um concelho que
se projecta para o futuro.
Loulé, o maior e mais rico
concelho do Algarve, um dos
maiores no País, lança-se à
conquista de feitos maiores
no aumentativo, aqueles que
acabam em “ão”. Muitos ainda
rimam com a estação quente,
é certo, fruto de maior procura,
mas também com “ambição”
e “superação” de empresários,
operadores, instituições e
louletanos, da terra e de
coração. Os campos de golfe
são primeiros na Europa.
As marinas, portas abertas ao
Atlântico. O aeroporto, às low
cost que permitem que muitos
ingleses, russos e franceses
façam daquele que consideram
um pequeno paraíso a sua
segunda ou até primeira casa.
As infra-estruturas, o sector
imobiliário, o ensino, a saúde,
a oferta cultural, o riquíssimo
património histórico e natural.
O clima ameno e a gastronomia.
O perfume dos campos, a
frescura das ribeiras e o calor
das pessoas. A segurança,
um valor inflaccionado
pelos tempos. São bens
superlativamente maiores
para desfrutar o ano inteiro.
A qualidade da animação da
serra ao barrocal que salpica
de Janeiro a Dezembro e que
se entorna de Junho a Agosto
do barrocal até ao mar. O tapete
de areia fina e branca beijada
por um mar acolhedor.
O Algarve tem o peixe fresco e
o pão da serra. Os restaurantes
de estrelas Michelin, as tascas
reinventadas e as feiras
tradicionais que convocam
milhares de visitantes. Tem os
segredos do mar partilhados
ao final da tarde. A conquilha, a
ostra, o camarão carabineiro. Os
enchidos e os queijos. O vinho
de qualidade internacional.
Os teatros e os cinemas.
A literatura, a música e a dança.
A tia estará orgulhosa. Loulé é
da Anica e de todos os que o
desejam… e merecem! Bem-vindo a Loulé! Marinela Malveiro
Algarve
V
1
3
2
ALTE
SALIR
QUERENÇA
Não perder os doces regionais
e artesanato tradicional
de uma aldeia que já foi
considerada a mais
típica de Portugal.
No séc. XIII as muralhas do
castelo, construídas em taipa,
abrigaram os últimos focos
da resistência árabe
no Algarve
Água fresca a correr nos vales
e uma mesa posta, rica e farta,
para quem queira regalar-se
com a serra algarvia em
pano de fundo.
Abertura | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 03
EDITORIAL | ANTÓNIO SALAVIZA MANSO
O centro e coração
do Algarve
N
4
Ameixial
ha da Pena 5
2
1
Salir
Alte
3
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Querença
Loulé
Vilamoura
oura
Quinta do Lago
Vale do Lobo
5
AMEIXIAL
ROCHA DA PENA
Casas típicas e, no Miradouro
da Serra do Caldeirão,
360º de panorâmicas
do Atlântico ao castelo
de Beja.
Para aventureiros:
escalada e parapente,
com vista de nascente
a poente com o mar
como brinde.
TIÂNGULO
DOURADO
Já se sabe: sol,
praia e 14 campos
de golfe de nível
mundial para todo
o ano.
FOTOS: DR
4
os anos sessenta e setenta
do século passado começou
por projectar Portugal
nos mercados internacionais da
indústria turística com uma marca
de excelência na oferta de praia,
golfe e resorts de luxo: o “Triângulo
Dourado”, sonhado e lançado por
um visionário, André Jordan,
a quem o Algarve muito deve.
Hoje são muitos mais os
argumentos que o concelho de Loulé
apresenta para consolidar a sua
presença em mercados tradicionais,
como o britânico e o escandinavo,
ao mesmo tempo que desperta um
interesse crescente noutros países
europeus, em particular a França,
e em mercados emergentes como a
China e a Rússia.
Dentro dos limites do concelho,
Loulé reúne tudo o que de melhor
a região algarvia tem para oferecer
a nacionais e estrangeiros. O
promontório de Sagres é a excepção,
por razões óbvias. Mas não está
longe porque Loulé, na geografia,
ocupa o centro do Algarve.
Essa centralidade, no mapa, não
se limita às praias do litoral. Da
serra, na fronteira com o Alentejo,
ao mar, passando pelo barrocal,
o concelho oferece uma ampla
diversidade de propostas a quem o
visita ou aí reside.
E para além da geografia, também
nas dinâmicas sociais e económicas
Loulé se afirma cada vez mais como
centro e coração de toda a região.
Apesar de alguns erros do
passado, com uma população mais
jovem que a média regional e uma
densidade populacional superior,
ainda que inferior à do continente,
o concelho alia cada vez melhor as
características de ruralidade que
mantém com o desenvolvimento
acelerado dos centros urbanos.
Com a inestimável ajuda do
clima e das condições de segurança
que o país oferece, Loulé
transformou-se em invejável pólo
de atracção para um crescente
número de estrangeiros.
Chegam como turistas primeiro.
Depois constroem aqui a sua
segunda residência e, em muitos
casos, acabam por promovê-la
a morada definitiva. O censo de
2014 registou no concelho 16%
de estrangeiros numa população
residente de 69.211 almas.
No conjunto do Algarve essa
percentagem é de 12,9 e no País
não ultrapassa os 3,8.
Esta abertura ao mundo
e à modernidade contribui
para a valorização do património
histórico e a dinamização do
ambiente cultural, uma das
prioridades do poder local.
A prová-lo esteve a presença
do Presidente da República, quartafeira passada, na homenagem
prestada pela edilidade à escritora
Lídia Jorge, uma filha da terra
que dá a conhecer a um público
universal, na língua portuguesa
e nas inúmeras traduções da sua
obra, tanto o mundo como a
intimidade do ser humano.
Mais ainda, é na vertente
económica que a dimensão
e dinâmica do concelho colocam
Loulé no coração do Algarve.
Os números disponibilizados
pelas finanças públicas locais
destacam o lugar cimeiro que ocupa
no conjunto dos 16 municípios que
integram a região. E a dimensão dos
investimentos previstos, alguns dos
quais damos nota nestas páginas,
são prova cabal da atractividade
do concelho e da dinâmica
do seu tecido empresarial.
Finalmente no domínio da
política, apesar do saldo positivo
apresentado pela Câmara
contrastar com um valor médio
negativo que ainda há dois anos
o conjunto dos municípios da
região apresentava, a realidade
é mais difícil de contabilizar.
Mas estamos cá para ver como
é que, no plano concelhio e da região
no seu conjunto, os poderes locais
terão o discernimento e a coragem
para, ultrapassando bairrismos e
querelas de capela, afirmar uma
visão capaz de projectar o futuro do
concelho na região, da região no país
e do país no mundo. ¶
04 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Lazer & Cultura
GASTRONOMIA
ILUSTRES
Dieta Mediterrânica
com estrela Michelin
Retratos em falta
Se estiver em Quarteira ou Vilamoura não precisa de fazer muitos quilómetros
para jantar três noites de seguida na companhia de uma estrela
Faltam tantas fotos nesta página…
Rostos de louletanos pelo berço ou coração,
como estes aqui ao lado – objecto de recente
homenagem – que já partiram.
E de tantos outros ainda entre nós
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
O
Guia Michelin anunciou na
sua gala anual, a 25 de Novembro do ano passado em
Santiago da Compostela, a atribuição das suas famosas estrelas a catorze restaurantes portugueses. Metade
dos seis que abrem portas no Algarve estão no concelho de Loulé, uma
verdadeira “capital da boa cozinha”.
Um deles é o Willie’s, uma casa onde,
nas mesas postas no interior ou no jardim, se serve uma cozinha que mistura influências internacionais. Na companhia de uma carta de vinhos de escolha atenta, das entradas de codorniz,
sapateira, carabineiros e vieiras pode
passar-se à sopa de peixe ou aos pratos
de tamboril, peixe-galo, pato, borrego,
novilho e outras sugestões, antes de rematar com as propostas de sobremesas,
variadas e frutadas, e selecções de queijos nacionais e estrangeiros.
A dar o nome ao restaurante e a dirigi-lo está um “chef” alemão. Tinha
22 anos quando se perdeu de amores pelo Algarve. E por cá se ficou.
Hoje Wilhelm Wurger já se considera “meio algarvio” e preza a qualidade da matéria-prima nacional que
leva para a sua cozinha: “é importante usar produtos locais”, diz-nos
com pressa de voltar ao trabalho.
Anunciava-se uma noite de verão
daquelas que só o Algarve nos dá e,
por isso, mais uma vez ia ter a sala e
a esplanada exterior cheias.
Willie chegou a Portugal no início dos anos 80 e em 1990 ganhava
a sua primeira estrela Michelin. Apesar de definir a sua cozinha como internacional, a marca da “dieta mediterrânica” está bem presente no que
serve e, confessa, gosta de comer.
Ofereceu uma das suas receitas
aos leitores do PÚBLICO. ¶
Risotto de amêijoas com
gambas do Mediterrâneo
• 250 g de Risotto Gran Reserva
• 2 chalotas, 5 dentes de alho,
coentro fresco
• 20 g de manteiga
• 10 g de azeite
• 30 g de vinho branco
• 300 g de "fumet" (caldo de peixe)
• 200 g de natas
• 30 g de cenouras e alho-porro
em “brunoise” (cortados em
pedacinhos pequenos e regulares)
• 400 g de amêijoas
• 400 g de gambas
do Mediterrâneo (descascadas)
Coloque as amêijoas no alho salteado
em azeite, refresque com um pouco
de vinho branco e deixe cozinhar
até que abram. Guarde o líquido.
Retire os moluscos das conchas
e reserve.
Para o risotto derreta a manteiga
com o azeite, adicione as chalotas
picadinhas e deixe amolecer
em lume brando.
Adicione o arroz e mexa sem deixar
queimar. Em seguida, acrescente
o líquido onde cozinhou as amêijoas
e o caldo de peixe e deixe ferver
em lume brando durante 12 min.
Adicione as natas e pouco antes
de terminar de cozinhar junte os
legumes em “brunoise”, as amêijoas,
os coentros e corrija os temperos.
Entretanto, numa frigideira antiaderente,
doure as gambas de ambos os até
que cozam e coloque-as sobre o risotto
imediatamente antes de servir.
De cima para baixo:
Manuel da Luz Afonso (Loulé, 1917
– Lisboa, 2000), bem presente na memória dos que há 50 anos vibraram
com o 3º lugar de Portugal no Mundial de Futebol de 66 em Inglaterra.
Foi seleccionador da equipa de Eusébio, Simões e Coluna.
José Bernardo Lopes (Faro, 1882 –
Loulé, 1956), o médico que em meados
do século XX, com empenho e dedicação, transformou o secular hospital de
Loulé no mais moderno do Algarve.
Maria José Cabeçadas (Loulé, 1911 –
Lisboa, 2004), a farmacêutica que, em
1945, fundou a Casa da Primeira Infância de Loulé com o objetivo de proteger, amparar, alimentar e tratar a saúde das crianças mais desfavorecidas.
Manuel Gomes Guerreiro (Querença, 1919 – Lisboa, 2000), o engenheiro
silvícola, docente e primeiro reitor da
Universidade do Algarve (1979), a escola superior há muito ambicionada
pela região sul.
Catarina Farrajota (S. Bárbara de Nexe, 1923 – 2011), a enfermeira formada
no Instituto Português de Oncologia
que anos a fio serviu a população na
Casa da Primeira Infância e depois na
Santa Casa da Misericórdia de Loulé.
António Aleixo (V. R. Sto. António,
1899 – Loulé, 1949), o poeta que, como ninguém, soube reflectir nas suas
estrofes, em tom sarcástico e acutilante, a sabedoria popular e uma enorme perspicácia na análise do mundo
do seu tempo.
Nas montras do comércio local e até
ao final deste mês quem se passeia pelas ruas de Loulé dá de caras com esta
dúzia de rostos e suas histórias de vida.
Estes filhos naturais ou adoptados e
apaixonados pela cidade e os seus conterrâneos – juntamente com outros que
totalizam a dezena e meia – estão assim
a ser lembrados e homenageados em
espaços públicos. Uma iniciativa bem
recebida pelos comerciantes da Praça da República e que teve o apoio da
ACRAL – Associação do Comércio e Serviços da Região do Algarve.
Muitos outros louletanos ilustres se
poderiam juntar a eles. Lembro, por
exemplo, o nome de Maria José Estanco, a primeira mulher portuguesa a licenciar-se em arquitectura. Uma democrata que, nascida em 1905 na freguesia de São Clemente, ao longo dos
seus 94 anos de vida deu lições de vida, integridade e cidadania, apesar de
tão difícil terem tornado a sua vida,
por ser mulher e não abdicar dos seus
direitos. A.S.M. ¶
FOTOS: DR
Lazer & Cultura | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 05
REORDENAMENTO E REQUALIFICAÇÃO URBANA
Um concelho mais
ordenado e mais verde
Enquanto no centro da cidade de Loulé não reabre o histórico Café Calcinha,
na envolvente de Quarteira trabalha-se para melhorar o trânsito
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
As “public bikes” de Vilamoura
FOTO: DR
A
São muitos os que esperam pela
reabertura do "Calcinha"
dquirido há dois anos pela autarquia por 182.599 euros, o
espaço icónico que em tempos idos foi Café Central e depois
Calcinha – petit nom dado ao antigo
proprietário José Cavaco por clientes mais antigos e fiéis – foi renovado e prepara-se para reabrir portas.
Estão a ser valorizados espelhos interiores e mesas com tampo de pedra, mas o convite à tertúlia permanecerá o mesmo de sempre no espaço que integra a rede nacional de
Cafés com História.
No final do ano, sempre com a estátua que na esplanada imortaliza
a figura do poeta António Aleixo,
louletanos e visitantes poderão regressar ao charme da Belle Époque
e aos prazeres contemporâneos de
um folhado de Loulé, do capilé ou
da ginginha.
Mas falar de obras no município
de Loulé é também falar de novas
construções, reabilitação de imóveis seculares, mobilidade e acessibilidades.
Na sede do concelho estão já adjudicadas obras de recuperação do
edifício da Música Nova, que voltará a abrir portas depois de cerca de
duas décadas em silêncio, e do Palácio Gama Lobos, também conhe-
cido como Palácio dos Espanhóis,
um edifício do séc. XVIII.
A Música Nova voltará a ser a casa
da Filarmónica Artistas de Minerva,
que este ano assinala 140 anos, mas
também o novo espaço do Conservatório de Loulé, que recebe alunos
do ensino articulado das três escolas que o integram. “O ensino gratuito da música do 5º ao 9º ano é assegurado pela Academia de Música de
Lagos que ganhou há dois anos uma
extensão em Loulé, em parceria com
o Ministério da Educação”. As duas
empreitadas vão arrancar ainda este ano, com orçamento municipal.
E porque o futuro se escreve entre os jovens, o lançamento da obra
maior que a câmara inscreveu neste mandato é também uma escola:
EB 2,3 em Quarteira.
“Acreditamos que quando o projecto for concretizado, a escola D.
Dinis vai recuperar os alunos que
tem vindo a perder. É a obra com
maior peso orçamental, 5 milhões
de euros. A câmara irá entrar com
cerca de 3 milhões, os restantes provêm de uma candidatura à CCDR Algarve que já tem o compromisso do
Ministério da Educação em como o
projecto será aprovado”, garante Júlio Sousa, director Municipal.
O ambiente como causa
Empenhado no combate às alterações climáticas, o executivo camarário adoptou um conjunto de 28 medidas amigas do ambiente que, entre
outros, tem por objectivo reduzir as
emissões de dióxido de carbono. Entre elas a distribuição de 30 bicicletas
para uso dos alunos de três escolas EB
2,3 de Loulé e Boliqueime. “A ideia é
promover a partilha das bicicletas e
estender o que agora se está a fazer
nas escolas à cidade de Loulé, a exemplo do programa “Public Bikes” que
a Inframoura – a empresa municipal
que gere os espaços públicos em Vilamoura – já pôs em prática. Trata-se
de um sistema de mobilidade individual que contempla 200 bicicletas e
está desenhado para que cada utilizador possa, com a leitura de um simples cartão, levantar e devolver duas
rodas num poste de qualquer das 39
estações existentes. Com um custo de
aluguer mensal de 20 euros e anual
de 35, a rede cobre toda a área de Vilamoura e convida a uma vida mais
saudável. Para adquirir o primeiro
cartão, grátis, o cliente da Inframoura só tem de solicitá-lo via Web ou dirigir-se aos escritórios da empresa.
“Também temos um projecto de
aquisição de viaturas amigas do ambiente, à medida que a frota da câmara for sendo substituída”, acrescenta Júlio Sousa.
Ainda no domínio da mobilidade é incontornável o novo Passeio
das Dunas, uma obra recentemente
inaugurada na presença do primeiro-ministro, que apaga a memória
do velho bairro da lata de Quarteira,
desactivado há 20 anos. Uma reabilitação que trouxe um rosto moderno a uma zona que era de risco mas
por onde agora passeiam famílias, a
pé ou de bicicleta, por entre dunas
e as pequenas exposições que por
ali se vão fazendo. Um projecto que
só terminará no cais de Vilamoura.
Mais a Norte, destaque para a circular Vilamoura-Almancil. A Av. Papa Francisco abriu uma alternativa à circulação rodoviária até aqui
só possível atravessando Quarteira.
Melhorias também no eixo serra-litoral, na via que faz a ligação da N125
a Quarteira. A N396 recebe por esta altura obras de requalificação. “É
uma ligação de pequena dimensão
por agora mas o objectivo é trazê-la
até à rotunda do Vila Sol e mais tarde até ao Aquashow. Baptizámo-la
de Av. do Atlântico.” ¶
06 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Lazer & Cultura
O PIANO DE MÁRIO LAGINHA
Nas entranhas de Loulé
As minas de sal-gema de Wieliczka atraem
mais de um milhão de visitantes por ano.
Em Loulé as galerias subterrâneas ainda
só se abriram a alguns eleitos
F
oram quase quatro minutos,
de suspense e receio natural,
a descer até à cota -230. Duzentos metros abaixo das casas de
Loulé, 30 metros abaixo do nível
do mar.
Aos quatro de cada vez, com o capacete dos mais altos a bater em cada descuido no tecto da gaiola a que
chamam elevador, íamos chegando ao aos subterrâneos da mina de
sal-gema. Nesse e no nível -2, ainda
33 metros para baixo, são mais de
40 quilómetros de galerias com a
dimensão de túneis de metropolitano. Estendem-se sob a cidade por
uma área superior a 1.200 campos
de futebol.
Fomos recebidos na “Casa da Mariquinhas”. Foi este o nome dado à sala
que serve de escritório ao “primeiro
piso” da mina, o nível -1, pelo humor
e sarcasmo permanentes que encontrámos em cada um dos que trabalham naquelas profundezas.
Esclarecem-nos a mina é explorada pela CUF, Grupo Mello, e a matéria-prima que dali sai destina-se
a fins industriais – indústria quimíca, rações para animais, plásticos –
e, pricipalmente, à utilização no degelo de ruas e estradas. Os maiores
clientes são autarquias locais portuguesas e espanholas mas, um mercado emergente do sal-gema de Loulé começa a ser o das pedras de sal
para a cozinha “gourmet”.
É para leste da “Casa da Mariquinhas” que se estendem as galerias
desse e do piso inferior porque,
anos atrás, não era fácil a relação
íntima que a “Mina da Campina de
Cima”, assim se chama, mantinha
com o casario da cidade que desce
do Barrocal em direcção ao mar: a
lei não a deixava distender-se à vontade por debaixo dele.
A relação veio a tornar-se mais fácil: o casario foi autorizado a vir para cima da mina. Isto porque antes
o sal era extraído à força de explosivos e alguns dos louletanos mais
antigos ainda se recordam dos pequenos terramotos que faziam cair
a loiça das prateleiras de suas casas. Hoje é explorado com a ajuda
de “roçadoras” que não provocam
esses estragos a céu aberto.
Os “estragos” provocados no subsolo também não têm consequência de
monta: estima-se que o veio de cloreto de sódio – que tem a provecta idade de 300 milhões de anos e é idêntico a um outro explorado numa mina de Barcelona – se estenda por mais
de 500 metros em direcção ao centro
da terra, o que dará ainda para 3.000
anos de exploração a bom ritmo.
Terminadas as explicações saímos para tomar o caminho da galeria principal. Com uma extensão
de 270 metros, liga as únicas “portas” da mina para o exterior: dois
poços com a profundidade total de
São mais de
40 quilómetros
de galerias que
se estendem
por debaixo
da cidade
270 metros, que permitem a circulação do ar nos subterrâneos. Pelo “Poço 1” entra o ar que garante a
ventilação, os mineiros, máquinas
e equipamentos. Pelo segundo, a
“Torre de Extracção”, sai o ar viciado, sugado para fora por potentes ventiladores, e a matéria prima
que vai encontrar um tanque de lavagem logo que sai debaixo da terra.
Por ali, guiados pelo Paulo Serra
e os poucos metros de luz que nos
dava a sua lâmpada de mineiro sempre acesa no capacete, seriam cerca de cem metros até ao “auditório”
onde o Mário Laginha iria actuar.
O caminhar era fácil e suave num
chão plano acabado de ser atapeta-
do por sal de um branco imaculado que contrastava com as tonalidades ocres das paredes das galerias,
enegrecidas pela poeira dos tempos.
A temperatura era agradável: 22º
constantes, 24 horas por dia, nos
364 ou 365 dias de cada ano.
A meio do caminho passávamos
pelas duas primeiras máquinas a
“diesel” que trabalharam naqueles túneis – vindas directamente
da construção da Ponte 25 de Abril
que, com malfadado nome, tinha
sido inaugurada em 1966 – quando
alguém envolto na escuridão, pergunta: “Costumam aparecer muitos
fantasmas por aqui?”
“Não, só um. Eu!”, responde o
Paulo, que é Encarregado na mina.
Rimos com a resposta e a explicação que dá. “É essa a alcunha que
os trabalhadores me deram. Dizem
que, nos momentos mais inesperados, lhes apareço sempre vindo de
onde menos esperam.”
Iniciado o concerto, no auditório
amplo a audiência de amantes de jazz
e novas sensações quedou-se em êxtase com a música que tão bem se fazia
ouvir naquele ambiente extravagante.
O Mário Laginha improvisou no piano e na palavra: tocou como só ele sabe, finalizou com um seu tema dedicado a Carlos Paredes, com um título ali duplamente adequado – “Mãos
na Parede” – e apresentou o programa do Festival Internacional de Jazz
de Loulé que, sob a sua direcção artística, iria ter início dentro de dias.
O músico estava extasiado pelas
condições acústicas que ali encontrou. E sentimentalmente tocado
por, dias antes, ter descoberto que
tinha sido o seu avô que, em 1963,
vendeu a Quinta da Farrajota para,
por baixo, se poder iniciar a exploração da “Mina da Campina de Cima”.
Lá por a queda dos preços do sal e
as estratégias empresariais terem atirado a produção das 120 mil toneladas
/ano para as actuais seis/sete mil, a riqueza que Loulé guarda debaixo do
solo, não deixa de ter um valor inestimável. Oxalá a saiba rentabilizar, seguindo o exemplo de Wieliczka.
É de 3.500, chegando nalguns
dias aos sete mil, o número médio
de visitantes registado por estas minas polacas de sal-gema, classificadas pela UNESCO como Património
da Humanidade.
Só os ingressos nas galerias subterrâneas – de 12 a 20 euros por pessoa – representam uma receita diária superior a 50 mil euros. Contas
feitas por alto, é este o valor que a cidade polaca – com quem Loulé tem
um processo de geminação em curso – retira da sua mina. Que era de
sal e agora de ouro, se considerarmos todos os rendimentos indirectos gerados por esta atracção turística, a fundação cultural mais procurada na Polónia. A.S.M. ¶
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Jazz “a bater no capacete”
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Mário Laginha ficou entusiasmado com
a acústica do “auditório” onde actuou
Lazer & Cultura | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 07
TRILHOS PEDESTRES E CICLÁVEIS
Anda que se faz tarde!
Ténis ou sapatos de caminhada. Aperte os atacadores se os tiver.
Estique os músculos. Chapéu na cabeça. Talvez óculos escuros.
Ah! E a garrafa de água! Em teoria, estamos prontos…
Toca a andar!
Q
uatrocentos metros. Quando nos dizem que é essa a
distância que devemos fazer
a correr, a princípio rimo-nos. Mas
chegados à Rocha da Pena, em Salir, o semblante muda de repente.
Agora faz mais sentido o nome, Ultra. Ultra Trilhos Rocha da Pena, a 7
de Agosto, vai ser o trail mais quente
do ano! Calma. Respire fundo. Apesar do nome, a actividade, promovida pelo Algarve Trail Running, está
inserida num ambiente de convívio
e familiar. E na verdade, sendo uma
competição, se sentir que não está à
altura da Rocha da Pena, pode sempre fazer parte da assistência e “atacar” a subida noutra altura, nem que
seja a andar. A vista, do topo, é absolutamente fantástica!
Se não é do tipo competitivo, Loulé continua a ser um destino obrigatório. Conhece o Ameixial? É uma
pequena aldeia no interior do Algarve Central, na fronteira com o Alentejo. A Estrada Nacional 2, a nossa
“Route 66” que liga Chaves a Faro,
passa por lá. E é um dos pontos de
intersecção do Walking Festival, que
tradicionalmente em Abril atrai residentes e turistas a um peddy paper para fazer a andar e descobrir
os vários pontos ligados à Escrita do
Sudoeste, patente não nas estrelas,
mas nas estelas (rochas com inscrições que herdaram a primeria escrita Ibérica, descendente dos fení-
cios). Os pequenos restaurantes locais e o pão feito localmente, que é
exportado para todo o Algarve, são
uma referência obrigatória.
No Verão, época propensa a passeios, o calor poderá ser um bloqueio para alguns mas Loulé é um
concelho rico em água. Parta à descoberta da Rota da Água. Está integrada na Via Algarviana, um enorme
conjunto de Rotas Pedestres, para
fazer a pé, de burro ou de bicicleta e
que atravessa todo o Algarve. Entre
tanto que há para descobrir, os cinco percursos da Rota da Água, numa
extensão total de 130 km, são uma
opção a considerar… para ir fazendo. Pode começar mesmo no centro da cidade de Loulé, com as Bicas
Velhas. As quatro bicas de metal foram feitas, diz a História, a partir da
fundição de um antigo sino da Igreja
Matriz. A localização e estrutura da
fonte actuais remontam a 1837. Esse poderá ser apenas o começo de
um percurso fresco, em pleno Verão, que nos leva a visitar fontes, noras, tanques e aquedutos, nascentes
e moinhos de água. Um dos locais
obrigatórios, para quem não conhece, é a Fonte da Benémola.
O sítio é classificado, tal como a
Rocha da Pena, ambos áreas protegidas de conservação, devido à
existência de flora pouco comum
no Algarve e diversas espécies exclusivas de animais. O percurso pode
Fonte da Benémola
A Fonte
da Benémola
é um local de
visita obrigatória
para quem
gosta de
Natureza.
Se tiver sorte,
poderá ver
lontras.
até ser feito de carro, em terra batida, mas para melhor “beber” toda a
riqueza não só da vegetação, como
do património hidráulico existente, recomenda-se a caminhada. Se
andar a pé, não se preocupe, o percurso total ronda apenas um quilómetro e vai poder ver o Moinho Velho, um pequeno moinho de rodízio
hoje abandonado, com o respectivo tanque e nora. Um pouco mais à
frente encontram-se as Nascentes
da Várzea. As águas que as alimentam são de características diferentes
e tinham, segundo os antigos, propriedades curativas. São elas as responsáveis pela abundância de água
no Vale da Benémola, verde durante todo o ano. Ali quase ao lado, encontra-se a Fonte da Benémola, uma
das nascentes mais famosas do barrocal algarvio. As suas águas estão
hoje classificadas como minero-medicinais devido ao teor hipossalino
com predominância de iões de cálcio e bicarbonato. Curiosamente,
chegou mesmo a existir em 1932 um
contrato de concessão para a exploração da nascente e futuro uso para
tratamento de doentes reumáticos e
do foro digestivo. O que acabou por
nunca se concretizar.
A Fonte da Benémola era em tempos idos local de peregrinação de
doentes que se acomodavam em
tendas, de modo a fazerem os seus
tratamentos no local. Localizada no
seguimento da Ribeira dos Moinhos,
praticamente seca no Verão, junta-se a sul do vale com a Ribeira da
Tôr, mais adiante chamada Ribeira
de Algibre. Mesmo sem a ajuda da
Ribeira dos Moinhos, a Benémola
mantém um fluxo de água constante que já os árabes conheciam e onde terá sido construído um primeiro
sistema de captação de água. Protegida desde 1991, alberga um ecossistema único proporcionando vida à
rica fauna aquática, tais como cágados, várias espécies de anfíbios,
mas também a borboletas e libelinhas. Nas margens das ribeiras podemos observar um conjunto de espécies arbóreas e arbustivas pouco
comuns noutras zonas do Algarve,
como salgueiros, freixos e choupos.
Entrelaçam posições com loendros,
tamargueiras e canaviais. O cheirinho da vegetação mediterrânica característica do barrocal algarvio não
deixa ninguém indiferente e convida a pequenas paragens para tocar o
alecrim, o rosmaninho ou o medronheiro. Neste passeio mágico, apenas um de entre muitos que também
se podem fazer de BTT, é obrigatório parar, escutar e olhar. É que entre a fauna, existem lontras, um dos
animais aquáticos mais esquivos e
por isso “cobiçados” pelos amantes
da natureza. Ver uma lontra selvagem, ainda que possível, é algo bastante raro. M.L. ¶
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Fazer a subida da Rocha da Pena
não é para todos, pelo menos
a correr…
08 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Lazer & Cultura
HISTÓRIA, PRÉ-HISTÓRIA E CONTEMPORANEIDADE
A cidade que já
foi Al-‘Ulyà
Animais pré-históricos e preceitos religiosos da ocupação
árabe deixaram vestígios nas pedras de Loulé
I
magina-se a passar uma hora por
dia num spa a custos reduzidos?
No séc. XII não só era possível como obrigatório e as evidências estão
em Loulé, o único lugar do País onde
se podem visitar Banhos Islâmicos.
A arquitectura é simples e pode
ser facilmente reconstruída com
o olhar: o chão sobrelevado mostra como o ar aquecido circulava e
aquecia o pavimento. É tão fácil recriar os Hammam de Al-Úlyà (Banhos Turcos de Loulé) que quase
ouvimos o chiar da água a cair no
chão quente enchendo a sala de vapor. O bom estado de conservação
das ruínas permite-nos ver a fornalha, o hipocausto (estrutura subterrânea ligada à fornalha que difunde
o ar quente) e três salas: a quente, a
tépida e a fria, denominador comum
do sistema. Em Loulé, somam-se gabinetes para tratamentos e duas piscinas. O achado ficou ligado ao início do MED, o Festival que coloca a
cultura do mundo em cartaz, pela
necessidade de criar uma casa de
apoio à organização. Isabel Luzia,
arqueóloga há mais de 20 anos, sabe bem o tesouro que Loulé encerra:
“No dia mais forte do MED, em seis
horas recebemos 2002 pessoas. No
mais fraco, 920! Com escavações a
decorrer, chegam a entrar cerca de
mil pessoas por dia.”
Obras recentes de requalificação
na zona continuaram a pôr os banhos a nú. “Descobrimos aquilo que
seria a zona do vestíbulo. Canalizações que separavam as águas limpas
das sujas e até uma latrina! Aqui,
bem à superfície – guia-nos Isabel
pelo entusiasmo da arqueologia –
é a parede interna de uma piscina
interior, que seria a fase final dos
tratamentos.” E acrescenta valorizando a obra de engenharia: “É impressionante ver como uma civilização com pouquíssimos recursos,
chega à Península Ibérica e aproveita o declive da encosta, a existência de água. A canalização dentro das paredes, o sistema de chaminés com efeito exaustor, o chão
radiante, é notável!”
Mais descobertas poderão ser feitas para aferir da história de Loulé-islâmico. As escavações serão retomadas a partir de Agosto.
“Tio-avô” da salamandra
morou em Loulé
Em matéria de escavações pré-jurássicas, 2013 foi o ano em que se
abriu a página do período Triásico em Portugal. Octávio Mateus,
41 anos, é um dos contadores. Na
véspera de ir para a inóspita Gronelândia, onde já assinou a descoberta do Fitossauro (réptil marinho), o
paleontólogo recorda o dia em que
descobriu uma nova espécie de anfíbio, o Metopossaurus algarvensis,
um “tio-avô” longínquo da salamandra. “Esta é das descobertas mais
importantes da minha vida. Trata-se de uma camada de ossos, num
só local, com pelo menos nove anfíbios, crânios completos, ossos articulados, o que é extremamente raro em paleontologia e em termos internacionais.” Estávamos em 2015
mas o trabalho de campo do grupo
internacional de cientistas começou
em 2009. Desde aí o trabalho de laboratório tem sido intenso, no Museu da Lourinhã e na Faculdade de
Ciências e Tecnologia da UNL, onde se encontram os fósseis. “Aguardamos validar algumas conclusões
para só depois divulgar o potencial
das novas descobertas.”
Aguardam também as escavações,
até para o ano, mas está desde já nas
enciclopédias do mundo a descoberta daqueles que já eram fósseis quando os dinossauros da Lourinhã passearam por Portugal, há 150 milhões
de anos. Perante o Metopossaurus algarvensis, voraz predador com dois
metros de comprimento e uns “modestos” 100 quilos, o T-rex fica-nos
a parecer algo recente, ainda que extinto há 60 milhões de anos.
Guten Morgen ou Bonjour
Para quem quiser testemunhar outros tempos da nossa História, basta
seguir pelo labirinto das ruas medievais de Loulé. É aconselhável atravessar o Mercado Municipal e perceber a qualidade dos frutos secos e
dos frescos. A laranja, a batata doce,
as azeitonas temperadas e as compotas, o peixe e o marisco. Os comerciantes trazem nos olhos a alegria do Carnaval e na pele a cultura
da cidade que move milhares por
altura da Festa da Mãe Soberana.
O momento apoteótico acontece
quando a santa padroeira regressa
em procissão à Ermida, no alto de
um cerro, carregada aos ombros dos
Homens do Andor, já homenageados em escultura, na rua da Nossa
Srª da Piedade.
O mercado, de inspiração árabe, é
um concelho inteiro com as suas dife-
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
A Escrita do Sudoeste, herdada dos fenícios não foi ainda decifrada mas está ao alcance da vista em Loulé
renças harmonizadas. Mais de um século depois da inauguração, diminuiram os pregões mas multiplicaram-se
as nacionalidades. Ouve-se o português, o inglês, mas também francês
e alemão. A D. Fernanda reformou-se
aos 75 anos mas, sempre que as amigas a chamam vem abrir-lhes a banca. Como aconteceu hoje. Em vez de
fruta e hortaliças apregoa o miolo de
amêndoa e o queijo de figo. A banca
não é sua, mas o gosto pela vida no
Mercado ninguém lho tira.
Lá fora, os toldos coloridos colocados no topo das ruas estreitas
abrigam-nos do calor e mostram-nos o caminho. As lojas de recordações e os cafés reinventados convidam a entrar. Refrescam-nos galerias e igrejas. Chegamos à alcaidaria
do Castelo que acolhe o Museu Municipal. Salir, Benafim e Ameixial,
freguesias do interior de Loulé, também aqui estão representadas. Foi
de lá que vieram as estelas que falam da escrita adaptada do fenício,
anterior ao latim. A “escrita do Sudoeste” viajou da Idade do Ferro até
à actualidade em grandes blocos de
pedra e só no concelho foram recolhidas 10 estelas. Uma das quatro
expostas no Museu de Loulé (grauvaque), pesa mais de 400 quilos. As
restantes podem ser vistas em Salir,
no Museu de Faro e no Museu Nacional de Arqueologia, Lisboa. Indecifráveis, todas nos falam do mesmo, de pedaços de História brilhantes, escritos ao Sul. M.L. ¶
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Toldo coloridos colocados no topo de ruas estreitas
Lazer & Cultura | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 09
TIME OUT
The good vibes of Loulé
Os milhares que se juntam nas ruas, a multiculturalidade que prevalece
em eventos como o MED ou as Noites Brancas, colocam Loulé
na rota das cidades cosmopolitas com movida,
à escala da Europa
O
FOTO: DR
Festival do Mediterrâneo coroa esta evidência. A massa
de visitantes provinda de todo o Algarve encheu recentemente
as artérias da cidade e colocou vários
idiomas a circular. No centro histórico o público foi constantemente surpreendido por performances, teatro,
música, e até por património imaterial: o cante alentejano. Uma banda
surpreendeu dando música a partir
de um telhado, à temperatura morna das noites que o Algarve oferece.
Música dos quatro cantos do mundo, servida por oito palcos em 55
concertos, Dieta Mediterrânica, chefes e degustações, artesanato e exposições. Em 2004 foram cinco os
dias dedicados aos países do Magrebe. Hoje, depois de limadas as arestas, a viagem à volta do mundo faz-se em três. A edição deste ano foi um
triunfo partilhado por público, músicos, restauração, artesanato, artes,
hotelaria e organização. O MED consolidou-se como peça-chave na estratégia turístico-cultural de Loulé.
Com mais histórico, o Jazz. Vinte e
dois anos de Festival Internacional já
trouxeram a Loulé nomes sonantes
deste e do outro lado do Atlântico.
Com direcção artística de Mário Laginha e organização da Casa da Cultura, a pauta deste ano incluiu os mais
novos e o cinema. "Ascensor para o
Cadafalso" de Louis Malle, com banda sonora de Miles Davis foi exibido
no Cine-Teatro numa parceria com o
Cineclube de Faro e Universidade do
Algarve. Ao longo de três dias, as sonoridades jazzísticas sobem ao palco
da Alcaidaria do Castelo. Ainda vai a
tempo de ouvir o Trio Jazz de Loulé,
a partir das 21h30 deste Domingo.
Magia branca
Poderia ter sido retirada do esplendor dos grandes musicais de
FOTO: DR
Mbongwana Star, uma estreia em Portugal
que veio do Congo para o MED 2016
Hollywood, com uma pitada de
Carmen Miranda. A Noite Branca
de Loulé atingiu um patamar de glamour reconhecido na região e por
todos os que a experienciaram. Para começar, cidade e visitantes vestem-se de branco e, num golpe de
magia, a alegria toma conta. Acompanham a qualidade artística e musical assegurada por mais de 30 artistas. As lojas da baixa abrem portas noite dentro num convite à
dinamização comercial, com descontos especiais para quem entre
de branco vestido.
Pontuada por malabaristas, cuspidores de fogo, homens-estátua,
mágicos e muito improviso, a Noite
Branca transforma Loulé num dos
mais importantes palcos de eventos no final de cada Agosto, agora,
de dois em dois anos para que não
esmoreça o encanto da noite mais
clara da cidade.
Em ano “não”, da Noite Branca,
Loulé recebe em Agosto uma das
mais sonantes vozes portuguesas.
Mariza actuará no próximo dia 15
no palco montado junto ao Monumento a Duarte Pacheco.
Outros ritmos ouvem-se à beira
mar. Sucedem-se os eventos musicais e de animação em locais tão in
como Vilamoura. A presença de Black Coffee é disso exemplo. O sul-africano que dá novos tempos ao deep-house promete uma noite em cheio,
no próximo Sábado.
Uma volta pela animação do concelho que só fica completa com o regresso às origens. Salir do Tempo
é o certame que leva milhares de
pessoas ao interior, 15 quilómetros
a Norte de Loulé. O Castelo de Salir
dá o mote, já que foi ponto de encontro escolhido por D. Paio Peres
Correia para aguardar por D. Afonso
III e, juntos, tomarem o Algarve aos
mouros. Hoje não há mortos nem feridos, o desafio é pacífico, basta circular por entre mouros e cristãos,
nobres e populares, mendigos e representantes do clero, bobos da corte e guerreiros. Bailarinas de dança do ventre e cuspidores de fogo.
A atmosfera da reconquista cristã
serve-se também dos suculentos sabores da serra: o pão de torresmo,
os enchidos e o queijo, o vinho ou
a cerveja fresca, entremeada com a
visita aos animais, da falcoaria aos
dromedários que fazem sempre as
delícias das crianças, as pequenas
e não só. ¶
A magia branca que acontece em Loulé, de dois em dois anos.
10 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Lazer & Cultura
HOMENAGEM MUNICIPAL A LÍDIA JORGE
“Façam deste um lugar de transfiguração”
Não é todos os dias que se recebe homenagens. E ainda que para Lídia Jorge já seja uma de entre várias,
esta teve um sabor especial. O seu talento e carreira moveram e comoveram
o Presidente da República, que aceitou o “irresistível” convite
de entregar o prémio municipal maior à escritora
É
Lídia junta-se aos louletanos nas páginas da vida
O reconhecimento da personalidade e obra com a família por perto
o mais elevado galardão municipal. Lídia Jorge atravessou a
plateia do Cine Teatro no passado dia 21, ao lado do Presidente
da República e ao som das palmas
de uma assistência vibrante com o
reconhecimento da escritora da terra e com a primeira visita de Marcelo Rebelo de Sousa ao concelho, enquanto chefe de Estado.
“É chegado o tempo da escritora
Lídia Jorge e da atribuição da Medalha de Honra do Município porque,
se não o fizéssemos, Loulé não seria merecedor de ter no seu seio esse valor humano que em Lídia Jorge se reconhece inteiramente.” As
primeiras palavras foram as de Vitor Aleixo, autarca anfitrião que não
perdeu a oportunidade para alertar
para o risco da exploração de gás
e petróleo no Algarve, matéria que
na rua ganhava eco através de cerca
de uma centena de manifestantes.
Lídia Jorge acabaria por juntar
a sua à voz do autarca, colhendo o
apoio da assistência. Já Marcelo Rebelo de Sousa, quando interpelado à
entrada do edifício, comentou que
face à descida do preço do barril, o
risco de haver exploração de petró-
Deixo aqui estas palavras
de louvor e homenagem
à grande escritora Lídia Jorge,
a que descobriu prodígios e ouviu
murmúrios, e que constrói nos
seus livros um mundo fascinante
e complexo, enorme “jardim
de caminhos que se bifurcam”
ou aberta alameda de histórias
e de falas, vinda de quem sabe
ouvir os silenciados e dar voz
aos humildes da terra.
Obrigado, Lídia Jorge, pela obra
admirável que deu e continua
a dar à Literatura Portuguesa.
“”
LUÍS FILIPE CASTRO MENDES
Ministro da Cultura
Perto de 300 pessoas assistiram à distinção da escritora louletana
Lazer & Cultura | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 11
LITERATURA
Fundação Manuel
Viegas Guerreiro
Querença é sinónimo de acto ou efeito de querer, de amizade ou amor.
Neste caso de amor pela palavra dita e escrita: poesia e prosa
Quando, no Verão de 2013, Lídia Jorge foi considerada uma das
“10 grandes vozes da literatura estrangeira” pelo Magazine Littéraire,
a revista francesa usava o termo “voz” no sentido habitual de
“autoria” ou “personalidade”, mas talvez indicasse também a
importância das várias vozes nos textos da nossa romancista.
É preciso lembrar que a voz de Lídia Jorge tem procurado sempre
a voz das mulheres, e as mulheres são com frequência protagonistas
destes casos narrados, rasurados, opacos.
Isso é verdade nos romances histórico-trágicos, por assim dizer, mas
também noutros que têm sobretudo uma feição crítica e quase diria
satírica, romances sobre a chamada “mentira social”, nomeadamente
a violência, a corrupção, a desmemória, a subjugação do outro, e as
muitas aparências que, como lhes compete, iludem.
Ao estilo de escrita de Lídia Jorge já chamaram «manuelino»,
pela capacidade de aglutinar criativamente diversos motivos.
Muitos motivos vêem de África, de Lisboa, do mundo inteiro, mas
muitos são desta região, deste concelho, desta terra, aquela a que
tem a honra de pertencer, aquela que se honra com essa pertença.
“”
MARCELO REBELO DE SOUSA
Presidente da República
leo no Algarve nos próximos 10, 20,
30 anos era como o de ele próprio
ir à Lua, admitindo no entanto essa possibilidade.
O ponto alto da cerimónia viria
a ocorrer mais tarde, quando Lídia
Jorge ergueu a Medalha de Honra do
Município de Loulé, compartilhando o momento com todos os que testemunharam a sua distinção.
Aproveitando o painel presente, a
romancista apelou à criação de uma
equipa de “embaixadores” da leitura. “Dir-se-ia pois que nesta sala está constituída uma task force natural para reforçar o plano de leitura
e uma outra proximidade com os livros nesta região. Um plano de reforço que não precisaria de ser vistoso. Precisaria de ser envolvente e
integrado, persistente e criterioso.”
No final do agradecimento, deixou a semente: “Desejo em nome
do amor que tenho por esta terra,
que os jovens criadores de hoje, os
que virão a seguir, façam deste território, um lugar de transfiguração.
Aquilo que só a arte pode fazer: criar
uma nova mitologia e assim se alargar a geografia do mundo.”
Digno de reparo de Marcelo Re-
belo de Sousa, o gesto de Lídia Jorge de partilhar o seu galardão com
o seu “companheiro de viagem”, o
jornalista Carlos Albino, outro filho
da terra. “Só os verdadeiros grandes
do mundo são humildes. Há depoimentos que têm que ser feitos em
certos momentos e em certos lugares. Só poderia ter sido este.” A humildade e a simplicidade da escritora foram de resto nota dominante do discurso de Marcelo Rebelo de
Sousa que justificou a sua presença com o “imperativo categórico”
de Kant, com um sentido de justiça
e com uma intuição: “a intuição de
que poderia viver mais um momento singular, não porque era a homenagem dos grandes no mundo mas,
porque era a homenagem dos grandes da sua terra” – e explicou – “Se
tivesse que escolher dos galardões
que recebi na minha vida, teria escolhido a Medalha de Honra de Celorico de Basto”. O Presidente da República frisou a distinção em Loulé.
“A gratidão dos louletanos por alguém que nunca deixou de ser fiel
às suas raízes, a Boliqueime e Loulé e que, por causa delas, falou e escreveu para o mundo.” ¶
E
m Agosto serão três dias de literatura. Dias de conversas pelo universo das letras, de obras
apresentadas ao cair da tarde. Em
Querença, no I Festival de Literatura da Fundação Manuel Viegas Guerreiro.
O programa inclui espectáculos
de música e de dança, exposições
e feira do livro. A rematar também
haverá degustações da rica gastronomia local. O evento responde ao
desiderato dos organizadores: a promoção da cultura do Algarve.
Também pólo de investigação para o desenvolvimento social e económico da região, a Fundação que
tem a sede em Querença, a apenas
10 quilómetros a norte de Loulé, disponibiliza uma biblioteca e um auditório com capacidade para 132 pessoas, destinado à realização de seminários e eventos culturais como este.
Com uma envolvente paisagística
que alcança o Atlântico, o palco do
I Festival Literário de Querença irá
atravessar os pátios que compõem
a arquitectura moderna e funcional
da Fundação e alcançar o Largo da
Igreja, o Museu da Água, os cafés e
restaurantes, convocando todos, os
de Querença e os de fora, escritores,
instituições regionais e anónimos, a
partilharem a cultura.
A palavra a Luís Guerreiro, presidente da Fundação: “Será um encontro de poetas no auditório, cerca
de 12 entre portugueses e espanhóis,
leitura de poemas e apresentação
pública de livros no jardim sensorial
da Fundação e, também associado
ao Festival de Literatura, a gastronomia, tapas e petiscos portugueses e
espanhóis, além de todos os restaurantes estarem a funcionar. Aliás,
Querença, aldeia típica do concelho de Loulé, ficou conhecida a nível nacional pela sua gastronomia.”
No topo do bolo, a cerejinha. Todos os anos o Festival de Literatura
irá homenagear um escritor. A estreia acontece com a presença do
poeta Casimiro de Brito, filho da terra, que narra os tempos de criança
em que várias vezes ouviu as quadras de Aleixo, ditas pelo próprio,
enquanto sentado ao seu colo. Uma
exposição da vida e obra, com títulos raros, manuscritos do vulto da
poesia contemporânea e várias homenagens decorrerão ao longo do
segundo dia do encontro.
O jornalista Carlos Albino, outro filho da terra, participou das conver-
Ao entardecer regressa a poesia…
sas que fermentaram a indicação do
nome daquela que seria a primeira
personalidade literária convidada.
Casimiro de Brito? Não poderia ser
outro. “Os caboucos do movimento
literário personificado no grupo Poesia 61 foram lançados por ele na sua
terra Natal, num suplemento do jornal local (o Prisma de Cristal), caboucos que teriam definitivo desenvolvimento nos Cadernos do Meio-Dia
que Casimiro de Brito fundou e dirigiu com António Ramos Rosa. Julgo que com as várias e recentes reaproximações de Casimiro de Brito à
sua terra, ele volta a sentir-se sentado nos joelhos de António Aleixo.”
Parte da exposição da vida e obra
de Casimiro de Brito tornar-se-á itinerante, com o apoio da Direcção
Regional da Cultura do Algarve e irá
ao encontro dos alunos de Loulé.
O Festival vai também dar eco do
Centenário da Morte de Miguel de
Cervantes, com uma exposição dos
livros do autor de D. Quixote.
O diálogo será contínuo no primeiro fim-de-semana de Agosto, salpicado por poemas impressos e expostos pelas travessas de Querença, onde não vai faltar animação
de rua, flamenco, jazz e um cair de
tarde distinto da oferta do Algarve.
M.L. ¶
“A cultura é só uma: tudo o que
aprendemos do nascer ao morrer,
da nossa invenção ou alheia,
sentados nos bancos da
escola ou da vida.”
Manuel Viegas Guerreiro
12 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Lazer & Cultura
LÍDIA JORGE, TECEDEIRA DE PALAVRAS
A Cavalgada do Tigre
Lídia Jorge junto da escada do seu avô Miguel.
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Figura mágica da literatura portuguesa contemporânea, Lídia Jorge descreve o Algarve como um tapete
estendido ao mundo onde não são bem-vindos os interesses petrolíferos. Pede uma nova
cartilha para o planeta. Revela o Capricórnio que ascende à Nação e abre o livro
de memórias. Numa conversa intimista põe tudo em pratos limpos mas
admite que muito fica por dizer
Na sessão fotográfica, comentou:
“Eu faço tudo o que me dizem.”
Sempre foi obediente?
Não, só uma obediência funcional,
para economizar esforços.
Eu era uma rebelde controlada, muito ousada mas tinha a noção do abismo. Fui até muito perto em todos
os domínios mas depois voltava para trás porque tinha a noção de que
era fatal.
Quem é a Lídia quando não está a ler ou a escrever? Gosta de
cozinhar?
Quando muito, gosto de arrumar cozinhas, arrumar coisas. Digo: “cozinhem à vontade que eu depois vou
sozinha e arrumo.” Dá-me um bom
sentimento perceber que as pessoas
ficam a falar em conjunto enquanto
ponho as coisas em ordem.
E como é a relação com a sua neta?
Vive em Edimburgo. Se não tivesse outra razão para viver, ela seria
uma. Fez agora 7 anos e lê, escreve, desenha, dança… é um encanto
de menina. Tenho pouco contacto
com ela, mas estou descansada porque a outra avó é uma avó completa, como nunca conseguirei ser. Espero dar-lhe em intensidade aquilo
que não dou em tempo. Quando ela
vem, fecho tudo para estar com ela.
Eu queria passar-lhe… queria passar-lhe uma mensagem… mas não
sei se consigo. Vamos ver!
Como é que é para si ensinar a
escrever? Interessa-lhe?
Acredito que há uma parte técnica
que se pode passar, mas acho que
o fundamental está no facto de se
dar as obras adequadas aos leitores
adequados que querem escrever. Eu
acho que se escreve sempre por prolongamento.
A Lídia será o prolongamento de
que escritores?
Bom, costumam fazer-me uma pergunta diferente, que é, quem admiro? Admiro muito Virginia Wolf mas
não escrevo como ela, não tenho o
talento que ela tem naquele sentido. Sou mais próxima na escrita de
uma escritora catalã, Mercé Redoreda que escreveu a Praça do Diamante ou da também catalã Carmen
de la Foret que escreveu Nada. Elas
colocam um saber fazer da escrita
em torno de uma experiência humana que não é literária. Virgínia
Wolf dizia que a essência do literário não é literária, é humana, é a vivência. Eu escolho duas perspectivas que são arriscadas no tempo que
corre, mas que são as minhas. Uma
que é a de escrever sobre o factor
humano, uma espécie de intervalo
que existe entre o nosso sonho de
amor e a frustração do amor. Falar
dessa perplexidade grande, de por
que razão as duas coisas não se encontram e que é a tragédia da Humanidade. A outra perspectiva é falar sempre com a História do País
à vista. Interessa-me muito a Portugalidade. O nosso país é misterioso, é difícil. Somos muito orgulhosos e muito resistentes. Talvez
sejamos do signo do Capricórnio:
rudes no primeiro trato, circunspectos, omissos, escondidos, com medo de aparecer mas, resistentes e estóicos. Mostrando que está sempre
tudo bem e não está bem. Debaixo
dos tapetes estão estórias enormes e
por isso parecemos de brandos costumes e não somos.
Por falar em Portugalidade, assistiu aos jogos de Portugal no Euro?
Sim, assisti (risos).
Como viveu os jogos?
Com uma emoção extraordinária.
Quando assisti ao primeiro jogo, com
um empate, aliás numa noite muito
especial, com vários amigos a jantar,
em que entre eles estava o Eduardo
Lourenço e ele dizia: “Isto é o nosso Alcácer Quibir!”. Porque ele achava, e eu também, que iríamos ganhar
por 5-0 à Islândia... e aquilo significou
uma derrota. No jogo frente à Croácia,
ouvi o relato do jogo enquanto comprava plantas e quando percebi que
tínhamos empatado, chorei, de alegria! Há uma espécie de ethos incontrolável, de pertença. Nós pertencemos! É muito curioso ver as reacções
dos portugueses. Muitos disseram: isto não se repetirá, deixem-me ter alegria hoje. É muito comovente, porque
mostra a nossa carência, somos carentes de êxito e de reconhecimento
no mundo. Há cinco séculos fomos alguém e depois passámos cinco séculos a perder em prestígio, em dinheiro, em posição no mundo. Nós somos
feitos desta carga. Tive pena de não
estar em Lisboa, teria ido para a rua.
Qual a sua relação com as novas
tecnologias?
São meios portentosos. Há um grupo de leitores que dá eco aos meus
livros através desses meios e sobretudo na parte da internacionalização é muito importante. Mas eu não
consigo mostrar o meu dia-a-dia, dizer olá a todas as pessoas ao mesmo
tempo. Assusta-me essa dimensão
Lazer & Cultura | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 13
que se torna anónima. Preciso de
ver os olhos das pessoas.
Obras como Alice no País das Maravilhas, A Dama das Camélias e
A Cabana do Pai Tomás fizeram
parte da sua biblioteca de menina. Que influência tiveram no seu
estilo narrativo?
A Cabana do Pai Tomás foi um livro
que me marcou profundamente. Deveria ter uns 13/14 anos quando o li pela primeira vez e percebi uma coisa interessante: na literatura, não existe cor
na pele. Quando cheguei ao final, sabia que havia pessoas que ajudavam e
outras não, desvalidos, pobres, miseráveis, quem tinha e quem não tinha
mas, não tinha noção da cor das pessoas. Vi depois uma edição que tinha
o Pai Tomás desenhado e outras figuras, e percebi que havia uma diferença.
Percebi que a literatura remete para
uma dimensão dos humanos em que
a parte física é o que menos conta. É
o fluxo interior que conta. A literatura
diz que somos todos da mesma etnia.
Há uma espécie de revolta que a
impeliu para a escrita?
Era mais justiça do que revolta. Claro
que justiça tem uma componente de
revolta, voltar contra aquilo que está
a correr. Mas a revolta impele ao movimento imediato. E eu tinha a ideia
que a transformação era lenta, que
exigia um compasso. Aqui, havia comerciantes que tinham duas balanças. Uma para pesar o que vendiam,
outra para pesar o que compravam…
e os meus colegas… os que se sentiam predestinados para serem pobres e aceitavam! Dentro dos cestos,
uma vez o pai ou a mãe pôs pão muito branco. E ele disse: “Ah, este pão
não é meu”. Era, mas ele achava que
era demasiado bom para ser dele…
Que idade tinha quando começou a ler?
Com 5 anos. Aprendi em casa com
a minha mãe. Ela lia-me estórias em
voz alta e um dia disse-me: “Olha já
sabes ler!” Eu tinha a sorte de ter livros em casa, num ambiente em volta que era muito estéril do ponto de
vista cultural. Tinha um bisavô que
deixou uma pequena biblioteca, que
foi o fermento. Aqui lia-se em voz alta, mas na maioria das casas não havia livros, nem havia papel! O único papel era os cartuchos do açúcar,
da massa, do feijão. Era uma cultura
antes do papel. Lembro-me de uma
senhora que sabia romances populares de cor. Mostrou-me uma cultura milenar. Os livros não existiam,
estavam dentro da cabeça.
Já disse sobre Lisboa que é labiríntica e secreta. E o Algarve, o que é?
É um tapete. No bom e no mau sentido mas apetece-me dizer o bem. Ao
menos que não toquem nele! Não
me apetece dizer que destruam as
casas que foram fruto da especulação imobiliária, agora que está tudo em perigo. Não concebo como
se vendeu isto às petrolíferas, longe de nós de forma manhosa ou escondida. Assistimos aos consórcios
em marcha entre os Estados Unidos
e a União Europeia, o célebre TTIP,
tratados e sociedades empresariais
estatais e intercontinentais que vão
ignorar por completo a opinião dos
cidadãos para fazerem só trade, só
negócio. Mas atenção, porque o mar
e o solo são das populações. O País
é uma porta, e o Algarve é o tapete
que diz Welcome. É onde estão pessoas dispostas a abrir a casa, a partilhar o mar e um dos sítios mais extraordinários da Humanidade que é
o Promontório de Sagres. Isto é único. Todas as crianças da Europa deveriam ver Sagres sem luz eléctrica
e perceber o que aqui aconteceu há
500 anos atrás.
Qual a probabilidade de as vivências no Algarve não fazerem parte de uma obra sua?
“A mulher do mundo
que nasceu no campo”
Escreve os sonhos e os ódios, os
santos sem Deus, os heróis sem
pátria e os amantes sem amor. O
memorável e o futuro.
Natural de Boliqueime, Algarve,
estudou Filologia Românica
na Universidade de Lisboa. Foi
professora em Lisboa, Angola e
Moçambique mas sempre à espera
dos intervalos, da hora do almoço,
para escrever, essa natureza
que a move e que a “assaltou”
na adolescência. Que a leva à
descoberta das coisas que não
conhece através da escrita, para
encontrar novos sentidos ou para
ser surpreendida com mais um
inusitado atalho que se revela.
Romances, antologias de contos,
duas peças de teatro e muita
escrita, para além de 30 anos de
caminho interior, muitos traduzidos
em 20 línguas.
Com obra reconhecida na
atribuição dos principais prémios
nacionais, a escritora já recebeu a
Grã-Cruz da Ordem do Infante D.
Henrique. Foi primeira na estreia
do Prémio de Literatura Albatros
da Fundação Günter Grass.
Conquistou o Prémio Latinidade.
Num compasso de espera que
considera necessário, opta pela
“honestidade com o seu tempo”
para ter reconhecimento maior.
Gosta das árvores, do Sol, da noite,
do mar. Perto dele, nasce a cada
romper do dia. E depois há o bem
maior, o belo, a partilha…
Lídia Jorge.
Nenhuma. Haverá sempre pedaços
que dirão: “Olha, esta mulher passou por aqui”.
A Costa dos Murmúrios ganhou
outro volume por ter sido adaptado para cinema?
Sim, tenho de fazer um grande esforço para ver que a Eva Lopo tomou o rosto da Beatriz Batarda, um
rosto tão forte e tão lindo. Não consigo descolar mas é bom. De facto,
noutros livros vejo as personagens
com um rosto menos nítido.
Foi diferente, o sentimento em
relação à adaptação de O Dia dos
Prodígios?
Foi muito belo, muito impressivo.
Cucha Carvalheiro criou uma obra
de uma beleza extraordinária e Os
Memoráveis nasceram por causa dessa peça. No meu livro não há nenhuma Grândola mas ela resolveu introduzir na peça.
Em 2014 lança Os Memoráveis.
Pergunto: quem são hoje as suas
pessoas memoráveis?
Os memoráveis são aqueles que ficam a indicar-nos um caminho. Posso ir para clichés, como o Nelson
Mandela ou o Salgueiro Maia, ou um
homem que admirei como político que foi o Mário Soares. A minha
avó Maria das Dores por tanto que
me ensinou. O meu avô Jorge, um
homem memorável apesar de no
final da vida não se contentar com
a sua terra que era quadrada, e as
suas terras já eram quase redondas
porque ia lavrar na terra dos outros.
Acontece muito às pessoas que têm
idade e não querem perder o seu
território… São figuras marcantes,
que são dignas de memória.
Que memórias guarda da exposição em Loulé, há cinco anos,
a propósito dos 30 anos da publicação de O Dia dos Prodígios?
Gostei muito, fiquei surpreendida.
Ainda foi para Paris, esteve em La Cité e isso foi muito bom mas em Loulé, naquele espaço, foi tornar grande e sério “O Dia dos Prodígios”, o
que eu nunca vou esquecer. Agradeço muito ao Município e a todos os
intervenientes, todos muito cuidadosos. Foi também uma homenagem a
uma população que representa O Dia
dos Prodígios. Ainda hoje me comove
pensar nisso (pausa). Foi muito belo.
E o que significa a atribuição da
Medalha de Honra do Município
de Loulé?
Significa que o Município e os munícipes de Loulé sabem que eu nunca fui infiel a Loulé e ao Algarve, que
nunca tive medo de dizer que nasci
no Algarve e que escrevo com os torrões e as ondas do Algarve. Nunca a
questão da dimensão exterior me privou de afirmar esta raiz muito forte.
A sua obra permite fazer uma leitura das mudanças de paradigma em Portugal e no mundo. Como encara as mais recentes? A
problemática dos refugiados, os
atentados…
No “estúdio” onde trabalha no Algarve,
de onde se pode ascender à açoteia.
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Nós estamos a cavalgar o Tigre. Temos acesso aos transvases e percebe-se que existe uma armadilha a
nível internacional. Há uma Terceira Guerra Mundial larvar e ela é filha das novas tecnologias. Há chefias que estão no deserto mas que
comandam o que está a acontecer
na Europa. Acho que estamos a caminho de emendar a mão, não sei se
vamos a tempo. Basta vermos o que
aconteceu na guerra do Iraque, há
11 anos. Estamos conscientes de que
essa guerra foi forjada e que criou
tudo o que está a acontecer. As pessoas estão aí. Então digam-me se, sabendo isto, não é possível criar uma
nova cartilha? Acho que há necessidade de um novo mundo.
Considera possível com interesses económicos tão elevados?
Nós temos de falar! As associações
de cidadãos que não têm mais nada
para arriscar senão a sua pele... Temos a família e a nossa vida. Arriscamos tudo, mas não temos nenhum
negócio escondido. As pessoas que
são assim devem dar as mãos em nome do futuro.
Tendo em conta o seu distanciamento do “tempo medido”, co-
mo se relaciona com a sua idade?
A idade é um grande presente que
se dilata permanentemente na nossa memória. É como se fosse à janela. Lembro-me perfeitamente da fotografia que tirei no meu triciclo, de
quando a minha mãe me levou aqui
ao lado para ver o nevoeiro. Eu devia ter dois anos e meio. Isso é presente, isso é hoje. Pouco me importo com os anos.
O instante é o mais importante?
Não. É a memória de muitos, cumulativos. Isso é o mais importante.
Lembrar é juntar o passado com
o futuro. Nunca é estar no passado. Olho e gosto da criança que fui
e também da adolescente que fui.
Vejo outros que estão aí e que são
como eu. Quando um dia fechar os
olhos, ficarão a fazer o que eu fiz
noutro mundo, para outro mundo.
Não tenho nada a lamentar. Tenho
maturidade, interpreto, tenho opinião, prevejo o que vai acontecer,
posso avisar. Este é o meu tempo
e interesso-me por ele por inteiro.
Até fechar os olhos vai sempre
retornar ao Algarve?
Espero que mesmo depois de fechar
os olhos. M.M. ¶
14 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Município
ENTREVISTA
Vítor Aleixo,
presidente da câmara de Loulé
Convenceu o Presidente da República a vir até Loulé para prestar
homenagem a uma filha da terra...
Não foi bem convencê-lo.Tínhamos
decidido distinguir a escritora Lídia
Jorge com a maior distinção que o
município atribui aos seus filhos,
mas a nossa conterrânea não podia
receber essa homenagem no Dia da
Cidade. Tinha um compromisso numa universidade alemã. Foi por isso necessário agendar a cerimónia
para outra ocasião e num encontro
fortuito entre um director municipal e alguém da Presidência o convite foi feito. Para grande alegria nossa, o Professor Marcelo aceitou vir
a Loulé presidir à cerimónia. Naturalmente, que ficámos muito felizes.
Há outros filhos desta terra, como o Duarte Pacheco que os portugueses guardam na memória.
Estranhamante o engenheiro que
projectou Lisboa para a modernidade não deixou aqui marca visível, além da estátua que lhe levantaram...
Bom, o monumento é um dos ex-libris da cidade que maior notoriedade exterior lhe confere e é uma incontornável homenagem que está
prestada. E muito bem.
Relativamente à ausência da marca
pessoal na terra que o viu nascer é
preciso ver que tendo ido estudar
para Lisboa, a sua vida foi sempre
por lá e lá morreu, ainda jovem, provavelmente sem ter tido tempo de
dar a sua atenção a Loulé. Mas também poderá ter sido vítima de uma
outra circunstância: ele era um homem que via muito longe, era um
visionário e com uma capacidade
de realização extraordinária. Mas
Loulé, naquele tempo, era pequeno para o talento e a grandeza do
Duarte Pacheco.
Em dimensão?
Sobretudo em relação à mentalidade. Porque sabemos que eram tempos fechados, de Portugal pobre e
subdesenvolvido não só materialmente como até em termos culturais.
Era a Loulé da tia Anica…
Da tia Anica (sorriso aberto), da estratificação social fortemente marcada
na consciência do dia-a-dia dos seus
cidadãos. E o engenheiro Duarte Pacheco transcendia e estava muito para além dessa realidade, do seu torrão
natal. Especula-se até, que se desenvolveu um relacionamento de Duarte Pacheco com a elite local louletana
que não foi fácil nalgumas situações.
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
O avô deixou-lhe um património riquíssimo que muitos, porque o desconhecem, não chegam a invejar:
o amor pela cultura e as artes, que tem norteado a sua acção na presidência do município de Loulé
Era essa elite e a sua mentalidade
retrógrada que o poeta António
Aleixo tanto gostava de fustigar.
O legado deste seu avô marca claramente a ênfase que na condução de política autárquica atribui
aos valores da cultura e arte...
Estamos de facto muito envolvidos
nesses domínios, que para nós são
estratégicos. Repare que essa nossa orientação é estratégica, porque
num contexto de crise e num município que, apesar de algarvio, está
um pouco encrustado no barrocal
e na serra, com problemas de falta
de dinamismo económico e social,
a reabilitação e a disponibilização
ao público do nosso legado histórico material e imaterial, quando recuperado e estudado é muito importante até do ponto de vista turístico.
Não tenho dúvidas de que o património é um factor de atractividade
económica. E nós estamos apostados em valorizá-lo.
Quer destacar algumas das iniciativas nesse sentido?
Várias e posso começar por um projecto de que muito me orgulho e vivo com grande entusiasmo: a reabilitação dos Banhos Islâmicos. Foram descobertos no centro histórico
de Loulé e entraram já numa segunda fase de escavações. São de grande dimensão, estão muito bem conservados e prestam-nos informação muito rica sobre o quotidiano
do período histórico em que populações islâmicas e islamizadas viveram aqui.
Esse legado arqueológico abre periodicamente ao público. Vamos
musealizá-lo para o que estamos a
fazer um trabalho com o professor
Cláudio Torres e o Alto Patrocínio
científico do Campo Arqueológico
de Mértola.
Outra jóia que temos, em Salir, é
uma descoberta verdadeiramente entusiasmante: uma jazida onde
uma equipa de paleontólogos liderada pelo cientista português Octávio Mateus encontrou várias ossadas de quatro espécies diferentes de
anfíbios do período Triásico, datadas entre 220 e 223 milhões de anos
atrás. São anteriores aos próprios
dinossáurios. Estou a falar do Metopossaurus algarviensis, e do Fitossaurus, espécies anfíbias, salamandras gigantes que foram predadoras
das primeiras espécies de dinossáurios. E essa enorme riqueza científica e patrimonial está no nosso mu-
Município | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 15
nicípio. Decorrem ainda escavações
regulares por equipas internacionais e o passo seguinte é também
a musealização e o aprofundamento do estudo científico desses achados. Para tal já criámos uma bolsa
de Doutoramento em conjunto com
a Fundação António Aleixo.
Mas temos ainda mais, na serra algarvia: a escrita do Sudoeste, no
Ameixial, onde há vários legados
de um alfabeto que ainda não foi
possível identificar.
Desde tempos imemoriais até à actualidade temos uma história riquíssima, que passa também pela
influência árabe e posterior período Medieval.
Por isso, nos dias de hoje em que,
como se sabe, Loulé é um importantíssimo destino turístico no país com
notoriedade internacional, procuramos fazer com que se internacionalize muito para além dos domínios
apontados pela economia tradicional. Queremos ir também pelos caminhos da cultura, do património
e de outras actividades como o Turismo de Natureza, ganhando assim
uma expressão de completa abertura ao Mundo.
Que valor acrescentado pode esse “Turismo de Natureza” trazer
a uma região que tão bem vende
o produto tradicional: sol, praia,
golfe e ‘resorts’ de luxo?
É uma actividade económica que
nos desperta um grande interesse
porque, em primeiro lugar, nós colocamo-nos aqui sempre na perspectiva da sustentabilidade e, no passado, se nem tudo esteve mal, alguns
erros foram cometidos no modelo
de desenvolvimento turístico do Algarve. Foi excessivamente construtivo nalguns pontos. E nós não queremos replicar esses erros no interior.
As autoridades públicas municipais
já têm uma cultura apreciável de administração do seu território e assumiram que continuar a apostar no
turismo sem ter presente a sustentabilidade da actividade económica
e o respeito pelos valores ambientais é qualquer coisa que está à partida excluída.
Em segundo lugar porque o turismo de Natureza, que tem a ver com
a contemplação da flora, das aves –
o birdwatching – , as caminhadas e
os passeios de bicicleta em territórios que do ponto de vista da preservação são praticamente puros, não
afectados pela mão humana, só nos
pode valorizar o interior da região.
Finalmente, queremos valorizá-lo
porque do ponto de vista económico começam a manifestar-se já sinais
de que é um segmento capaz de se
afirmar como interessante para os
investidores estrangeiros.
Mas junto dos investidores estrangeiros não tenciona abandonar a promoção do produto tradicional deste destino turístico?
Não, e queremos conquistar novos
mercados. Um deles, que ganha relevância crescente na região, é o
mercado francês.
Mas, mais do que isso e num campo
bem mais vasto entendemos que os
municípios são também chamados
a envolver-se no fomento de uma
cultura de bom relacionamento entre os povos.
Mas voltando à economia e à procura de mais meios financeiros
para o crescimento económico...
Estamos a dar passos muito positivos nesse sentido e acreditamos que
podemos captar mais investimento
para a nossa região.
Estivemos recentemente em França, um mercado novo que de repente descobriu que Portugal por muitas e fortes razões. Este interesse dos
franceses pelo nosso país vem abrir
novas oportunidade à indústria hoteleira e também ao imobiliário. Loulé,
com uma oferta muito diferenciada
em termos de preços e localizações
pode fazer o gosto a qualquer tipo
de cliente deste segmento.
Já existem alguns portugueses com
uma vida bem sucedida em França
que adquiriram as suas segundas habitações no nosso concelho.
Um deles é o Comendador Armando Lopes que, dadas as suas excelentes relações com as autoridades
franceses, sobretudo de um município da Grande Paris, Créteil, me
lançou o desafio de nos geminarmos
com essa cidade.
Pelo segundo ano consecutivo, estive lá recentemente. Desta vez, na
companhia do nosso primeiro-ministro e do senhor Presidente da República, participei numa cerimónia
em que a Mairie de Créteil homenageou o nosso compatriota Armando Lopes atribuindo o seu nome a
uma Praça da cidade, o que é algo
de excepcional. O recurso a personalidades estrangeiras é raro na toponomia francesa.
Aí nasceu uma relação estreita com
um dos políticos franceses mais emblemáticos. Julgo que é o autarca
que mais vezes terá ganho sucessivas eleições, Laurent Cathala, maire (presidente da câmara) de Créteil.
Formalizei em Portugal o entendimento entre as nossas duas cidades e só me desloquei a Paris para
acertarmos o programa conjunto.
A cerimónia de geminação decorrerá aqui nos Paços do Concelho de
Loulé na primeira semana de Outubro deste ano.
Uma das condições que estabelecemos por mútuo acordo – sem reservas de parte a parte – foi estimularmos o conhecimento mútuo entre
franceses e portugueses, sobretudo na juventude.
Em França há vários exemplos de
jovens de ascendência portuguesa,
cujos pais trabalhavam na construção civil, que hoje estão a dar cartas em várias áreas: no cinema, na
cultura, no mundo empresarial, no
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
mundo. E na vida política francesa
são já cerca de 2.000 os autarcas
eleitos de origem portuguesa.
No contacto com investidores é-nos muita vezes referido que a
burocracia, tanto a nível da administração central como local
é, no nosso país, um travão ao
investimento...
Muitas vezes, uma das dificuldades
com as quais os investidores se confrontam é a de os instrumentos de
gestão do território serem pouco flexíveis na hora em que querem desenvolver os seus projectos. Se não
estiver planeado, às vezes com antecipação de cinco, dez ou mais anos,
torna-se muito difícil dar resposta a
esse investimento o que nos deixa a
todos, investidor e autoridades públicas, um pouco frustrados.
Mas eu gostaria de me manifestar
um pouco contra a corrente. Também têm aparecido investidores estrangeiros que nos dizem que também no país deles há trâmites a seguir. Uma coisa lhe digo, os nossos
cuidados têm-nos garantido uma região turística que se está a desenvolver e que hoje é valorizada mundialmente. Exactamente porque fomos
capazes de compaginar impulso investidor com salvaguarda de valores
e regras que têm de estar presentes.
Dito isto, importa dizer que há um
caminho a fazer ao nível de simplificar os procedimentos administrativos. Há também a necessidade de
haver mais estabilidade ao nível da
moldura legal que gere e está presente nos processos de investimento. Um quadro de expectativa ao longo do tempo é importante para um
empresário. Mas num período de
crise, o que é estável? Em Loulé pretendemos ser um oásis, no que depende só de nós. IMI baixo, esforços
ao nível da segurança de pessoas e
bens, qualidade das infraestruturas
e espaço urbano. Julgo que isso fazemos bem. Não só no meu município, mas ao nível de todo o Algarve.
Que futuro espera viver em Loulé
quando se retirar da vida activa?
Se quer que lhe diga olho à minha
volta, olho para o Mundo, e tendo
esperança, sou um homem angustiado com o que vou vendo. Mas nunca perco a esperança de que é possível fazer melhor.
Gostaria que Loulé fosse uma cidade em que as pessoas vivessem uma
vida menos apressada, mais tranqui-
la, que fossem mais felizes, que convivessem mais entre elas, que consumissem menos.
Gostava de ver uma cidade, um território menos desigual. E é por isso,
e sempre numa perspectiva de futuro, que queremos, cada vez mais
e desde muito cedo, proporcionar
aos nossos jovens o acesso ao Desporto e à Cultura, armas poderosíssimas de integração e coesão social.
Das muitas quadras que o seu avô
nos deixou, quer-nos declamar uma
das que mais o tenham marcado?
Quem prende a água que corre
É por si próprio enganado
O ribeirinho não morre
Vai correr por outro lado.
A.S.M. ¶
Um regresso com
o voto dos eleitores
Vítor Aleixo nasceu há 60 anos
em S. Clemente, uma freguesia
urbana da sede do concelho a que
hoje preside. Aí se preservam dois
ex-libris do património histórico
e arquitectónico que a edilidade
reabilitou: o castelo medieval
de Loulé e a ponte dos Álamos,
construída na via romana
que ligava Salir a Milreu,
hoje ruínas em Estoi que
são Monumento Nacional.
Licenciou-se em História e
Ciências Sociais na Universidade
de Rostov/Don, depois de ter
passado pela Faculdade de Letras
da Universidade Clássica de Lisboa
e o Instituto de Engenharia
de Petróleos de Baku, no Azerbaijão.
Politicamente empenhado em
causas públicas e sociais desde
os tempos de juventude e deputado
municipal a partir de 1986, em
1999 ocupou pela primeira vez
a presidência da edilidade depois
da renúncia de quem o tinha
antecedido. Há três anos regressou
ao cargo após ter vencido
as eleições autárquicas de 2013.
No executivo municipal detém
os pelouros da Cultura, Bibliotecas
e Arquivo; Ordenamento do Território
e Urbanismo; Obras Municipais;
Edifícios e Equipamentos; Relações
Públicas e Comunicação; Relações
Institucionais.
16 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Economia
FRUTOS DA TERRA PARA A INDÚSTRIA
SAÚDE
A alfarroba.
Mais o figo e a amêndoa
Hospital
de Loulé
Na rua o calor aperta e dentro da fábrica o cheiro a cacau é intenso. Parece África,
mas não é. Estamos na freguesia de Boliqueime, concelho de Loulé
O diagnóstico está feito: a “dilatação” da esperança
média de vida exige outra resposta clínica
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Portugal detém uma quota de 15% da produção mundial de Alfarroba.
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
E
m pleno barrocal algarvio – assim se chama a zona entre o
litoral de praias e a serra que
nos separa do Alentejo – a matéria-prima processada nas instalações
é criada na região: muita alfarroba,
alguns figos e amêndoas.
Também natural da região é a gente que criou e continua a administrar um negócio que fica assim com
dois bons argumentos para se manter sólido: a matéria-prima, produto endógeno de qualidade e a gestão familiar.
Mercado também não tem faltado: concentrada no Algarve, a produção nacional de alfarroba, cerca
de 45 mil toneladas em 2015, representa 15% da produção mundial.
Ainda vinham longe os dias de hoje quando na região onde a cultura
de frutos secos está arreigada desde há séculos, Gregório Chorondo
começou a comprar aos agricultores locais amêndoas, figos e principalmente alfarroba que depois levava para vender aos industriais do ramo. O seu filho Joaquim Chorondo
deu continuidade ao negócio instalando na localidade de Tenoca, onde se mantém a sede da empresa,
uma pequena fábrica de transformação do Pão de São João, como
era conhecido o fruto da alfarrobeira nos primórdios do cristianismo.
Para responder ao aumento da
procura as instalações e o negócio
cresceram e em 1988 Joaquim fundou, com os filhos Isaurindo e Angelina, a sociedade por quotas Chorondo & Filhos. Seis anos depois ad-
quiriu a “Industrial Farense, Lda”
que veio acrescentar à actividade
uma segunda unidade fabril, instalada então em São Brás de Alportel.
Na quarta geração da famíla Ismael Chorondo é um jovem de 34
anos que finalizou uma licenciatura em Gestão na Universidade
do Algarve. Não se deixou seduzir
por apelos que vinham do exterior:
“Nascemos neste meio e ficamos
sempre com gosto pelo negócio”.
Na qualidade de gerente esclarece-nos: “Dispomos actualmente de
uma capacidade de transformação
na ordem das 30 mil toneladas/ano.
Nesta fábrica processamos a polpa
da alfarroba e, a jusante, a semente é tratada nas novas instalações da
nossa outra empresa.”
O fruto da alfarrobeira representa 99% dos inputs da matéria-prima
utilizada. O valor residual, composto por amêndoas e figos, é comprado apenas para fidelizar e responder às expectativas e necessidades
de centenas de fornecedores, médios e pequenos agricultores desde sempre agarrados à trilogia dos
três frutos tradicionais do Algarve.
“Empregamos quase trinta pessoas e o volume de negócios rondou,
em 2014, os dez milhões de euros –
sete dos quais gerados aqui na Chorondo & Filhos e o restante na Industrial Farense”, esclarece o jovem
gerente que acrescenta: “As nossas
vendas, cerca de metade agora, cada vez mais são feitas no exterior
porque o mercado interno está estagnado. A nossa produção concor-
Ismael Chorondo
re com a espanhola e marroquina,
também, que com uma qualidade
inferior à nossa aparece nos mercados com preços “esmagados”, altamente competitivos”.
A semente, a parte mais valorizada, sai da fábrica de Faro em farinha
para as indústrias cosmética – cremes, bâtons – e alimentar, como por
exemplo o espessante sem efeitos
adversos E410, utilizado nos gelados para lhes dar mais consistência.
Da Tenoca, onde estamos, a polpa
da alfarroba sai quase que em exclusivo para a indústria que a incorpora
nas rações para animais: vacas, coelhos e na sua maioria... hamsters!
“Os nórdicos são loucos por estes animaizinhos que, por sua vez,
adoram a alfarroba!”, surpreende-nos o Ismael. A.S.M. ¶
A
profilaxia vem aí e promete
sanar os desafios que o futuro da região antecipa. “Somos muito fortes em Imagiologia e
na Cirurgia Endoscópica. Na Oftalmologia somos a única unidade privada a sul de Setúbal que faz cirurgia de retina.” Filipe Vieira assume
uma missão que vai além da prestação de cuidados médicos no hospital que administra. “Cada operador tem tentado à sua maneira fazer
um rebranding da saúde em Portugal. Os nossos serviços são bons e
temos de ter consciência disso. Toda a gente elevou muito a fasquia.”
Instalado no maior e mais rico concelho do Algarve, uma região que vê
triplicar a sua população no Verão,
o Hospital de Loulé é mais um aliado na resposta à procura estrangeira. “Temos clientes que vivem cá ou
que estão alojados nos empreendimentos turísticos de primeira da região e que estão habituados a serviços de excelência. Nós elevámos o
patamar a esse nível. Contribuiu o
currículo internacional dos nossos
médicos e o reconhecimento do serviço que aqui é prestado.”
Com uma percentagem de cirurgias a expatriados na ordem dos 20%
do total das intervenções, as perspectivas são para aumentar, não só porque a unidade vai crescer, mas porque o aumento da esperança média
de vida transformou o quadro clínico da população. As doenças que antes conduziam à morte são hoje crónicas e essa cronicidade exige novas
soluções. José Estevens, director clínico do Hospital, faz a radiografia:
“Temos serviços para responder ao
conjunto de patologias associadas
à ‘mais idade’ ao nível da urgência
e do tratamento contínuo, como as
de origem cardíaca, osteoarticular,
de reabilitação pós-AVC…”
Geriatria, Oncologia e Reabilitação
Física são três áreas de aposta deste
hospital que passará a contar, a partir do próximo ano, com duas salas
cirúrgicas, 37 consultórios e 48 camas, além do atendimento domiciliário que já disponibiliza, imbuído
do espírito da antiga Santa Casa, espaço que ocupa. Para os louletanos,
a reabertura há cinco anos traduziu-se num direito reposto. A história do
Hospital da Misericórdia remonta ao
séc. XV, tendo ficado ligada ao Carnaval no último século, quando o velho edifício precisou de obras. Nessa
altura, foram os louletanos que reergueram o “hospital da terra” com os
lucros daquele que é hoje considerado o Carnaval mais emblemático
a sul do Tejo. Depois do apogeu, seguiu-se novo período difícil na vida
da instituição, no pós-25 de Abril, até
que a Misericórdia e duas empresas
da área da saúde vieram a relançar o
hospital, com o apoio do município.
Hoje, sob gestão privada, prepara-se
para fortalecer relações com a Universidade do Algarve, no intercâmbio com os alunos de enfermagem.
À escala da Europa, vai disseminar
pacotes cirúrgicos competitivos no
quadro da Estética, dos Implantes
Dentários e da Oftalmologia, numa
parceria com os operadores turísticos locais. Agarrar a ideia do turismo de saúde e a geminação de Loulé com Créteil, comuna francesa dos
arredores de Paris com cerca de 87
mil almas, está também na linha do
horizonte. M.L. ¶
FOTO: DR
Economia | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 17
ILUSTRE NA “GRAND PARIS”
Armando Lopes
Encheu-se de coragem e “deu o salto” para França.
Como muitos outros portugueses construiu um
futuro que o país de então
lhe negava
FOTO: DR
FOTO: DR
Fachada da "Médiathèque de l'Abbaye – Nelson Mandela" o único estrangeiro que,
a par de Armando Lopes, deu o nome a um espaço público de Créteil.
FOTO: DR
Armando Lopes com o Presidente da República e o primeiro-ministro
na cerimónia em que foi homenageado pelo Maire de Créteil,
Laurent Cathala, um “dinossauro” da política francesa.
Radicado há tanto tempo em
França, como sentiu a vitória
da nossa selecção no Europeu
de futebol?
Desportivamente foi um grande sucesso e, nestes 55 anos que já levo
em França, guardo dessa vitória
uma imagem que nunca tinha tido
antes: muito, muito orgulho na comunidade portuguesa em França
e sobretudo na região de Paris, onde somos cerca setecentos mil portugueses. Pelas manifestações de
união, pelo seu apoio à equipa nacional – desde o estágio em Marcoussi, ao acompanhamento de todos os
jogos – e sobretudo na final.Foram
de facto momentos de alegria e honra que senti e recordações que nunca esquecerei. Sobretudo quando o
Éder marcou o golo da vitória. Não
tenho de facto palavras para descrever a emoção sentida nestas terras
de França, por mim e por todos os
meus compatriotas.
Hoje a imagem que os franceses
têm dos “Portugais” é a mesma
que tinham quando, com 17 anos
de idade, desembarcou na Gare
de Austerlitz?
É totalmente diferente. Eu faço parte da primeira geração de portugueses que chegaram a França nos anos
60 e durante muitos anos a imagem
dos portugueses era a de mulheres
de limpeza, pedreiros e carpinteiros, olhados como aqueles que vi-
nham fazer o serviço que os franceses não sabiam ou não queriam
fazer, porque o consideravam degradante. Mas ao longo dos anos os emigrantes souberam impor-se, mostrando o que valem.
Veio depois a segunda e a terceira
geração e, felizmente, já há muitos
anos que encontramos tantos portugueses e seus descendentes formados e com altos cargos de direcção em muitas empresas francesas
– como Carlos Tavares, presidente
da Peugeot – ou em profissões liberais, advogados, médicos, enfermeiros, notários, presidentes de câmara, engenheiros informáticos, gestores de empresas, etc.
E não é por acaso que, em França
e por esse mundo fora, muitos portugueses são convidados para desempenhar altos cargos ou para fazer pesquisa científica, médica e em
muitas outras áreas.
Soubemos mostrar aos franceses
que, tal como eles, éramos capazes de ocupar cargos de grande importância. Lá por virmos de um país
pequeno, quando o sol brilha, brilha para todos.
O primeiro-ministro e o Presidente da República Portuguesa
estiveram recentemente a seu lado quando foi homenageado pela Mairie de Créteil, uma comuna
da metrópole parisiense. Porque
mereceu essa distinção?
É evidente que me sinto muito orgulhoso por ter sido o primeiro português em França a receber esta distinção com vida mas, como disse na
altura aceitei-a em nome de todos
os familiares e compatriotas radicados no país.
Penso que se tratou do reconhecimento pelos cinquenta anos que levo de vida associativa, ajudando aqueles que
mais necessitam. A somar ao trabalho desenvolvido pela Rádio Alfa para informar os portugueses do que se
passa no nosso país, com noticiários e
programas de desporto e cultura. Possivelmente também, pelo tempo que
dediquei ao desporto durante os 40
anos em que cheguei a ser presidente
de dois clubes de futebol. Primeiro o
clube US Lusitanos de Saint-Maur, fundado em 1966, e depois, desde 2002,
o U. S. Créteil Lusitanos. Creio que foi
por essas razões que deram o meu nome a uma rotunda da cidade.
Confirma-me que, além do seu,
apenas mais um estrangeiro –
Nelson Mandela – teve a honra
de ver o seu nome atribuído a um
equipamento público da cidade
francesa que agora se vai geminar com Loulé?
Sim. Créteil inaugurou no dia 13 de
Dezembro 2014 a Médiathèque de
l'Abbaye – Nelson Mandela e eu sinto-me muito feliz por me fazerem
ombrear com o homem que combateu para conquistar a democracia na Africa do Sul.
Para mim foi uma honra e uma imagem inesquecível ter sido, em vida, o
segundo estrangeiro e primeiro português a receber esta honra em França.
Sendo um ribatejano, natural da
vila de Caxarias, o que o liga a
Loulé para que esteja tão empenhado nesta aproximação entre
as duas cidades?
No Algarve, que vim a descobrir nas
férias de 1977 com a minha família,
Loulé foi sempre uma cidade de
que gostei imenso. Bem como todo
o concelho: Quarteira, Vilamoura,
Vale de Lobo, Vale Garrão, Quinta
do Lago e Almancil. Pelos seus óptimos restaurantes, que tão bem representam a nossa gastronomia algarvia e as suas belíssimas praias.
Foram terras que se souberam desenvolver ao nível de outras cidades
europeias. Sempre adorei a região
do Algarve e a aposta que faz no turismo e na política cultural.
Nesta bela região, tenho também o
prazer de ser amigo do actual presidente da câmara, Dr. Vitor Aleixo, com quem eu tive contactos
extraordinários para desenvolver
a ideia da geminação de Loulé com
Créteil, onde tenho as minhas empresas – que ficam assim ligadas a
Loulé. Tudo faremos para fortalecer laços culturais, desportivos e comerciais entre ambas as cidades como também para canalizar investimentos de Créteil e Paris para Loulé
e a sua região.
Apesar de ter nascido em Caxarias
e manter uma grande amizade com
Leiria, onde tenho uma estrutura
empresarial montada, é no Algarve
que está a minha segunda cidade-pátria, onde descanso e gozo momentos de lazer: Vilamoura, “Loulé”!
O interesse dos franceses por
Portugal, como destino de férias e até de residência permanente, tem estado a crescer de
forma surpreendente. Porquê?
É uma outra época. Nos anos sessenta eram os portugueses a emigrar para o estrangeiro, hoje são os
franceses a vir para Portugal duma
maneira diferente. Vêm usufruir das
suas reformas e é evidente que o go-
verno português criou um estatuto muito especial para os europeus
e especialmente para os franceses
que podem investir no país não pagando impostos sobre as suas reformas durante dez anos. Mas não são
só os reformados que vêm para Portugal. Fruto também de uma campanha enorme, feita em França há
alguns anos, são outros cidadãos e
empresas francesas que apostam no
investimento, não só no Algarve como também em Lisboa, Porto, Caldas da Rainha, Peniche, Leiria e outras localidades do centro do País.
Tudo isto vai no bom sentido e esperamos que, como é um país do
sul da Europa, um país de sol que
sabe receber, cada vez haja mais estrangeiros a radicarem-se em Portugal para que assim possamos beneficiar de um maior desenvolvimento. Temos todas as condições para
os poder receber.
Já provou ser um empresário de
visão a longo prazo. Olha para
esse interesse como mera consequência de uma conjuntura internacional passageira ou acha
que é um fenómeno que veio para ficar?
Estou convencido que a presente
crise sentida pelos portugueses será passageira visto que já estamos
há alguns anos a sofrer. E é evidente que os países mais pequenos como Portugal sofrem mais.
Em Portugal, como na Europa, o desemprego é um problema mas acredito que vamos conseguir vencê-lo
apoiando as pequenas e médias empresas que criam postos de trabalho. E quanto menos desemprego
houver, maior será a estabilidade.
Espero que os novos empresários possam acreditar no nosso País porque
a Europa vai dar a volta por cima. ¶
18 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Qualidade de Vida
REINALDO TEIXEIRA, ADMINISTRADOR DA ENOLAINVEST, SA
Loulé é a capital económica do Algarve.
Está bem e recomenda-se
Natural de Salir, Reinaldo Teixeira ergueu e administra um grupo de empresas que já ganhou dimensão
nacional e internacional. Mas mantém as suas raízes firmadas no concelho de Loulé
Em que geografias e áreas de negócio já está presente o grupo de
empresas que dirige?
Começámos esta caminhada em
1983 e hoje, centrados no turismo,
hotelaria e imobiliário, apresentamos soluções chave na mão em todas as áreas do sector dos serviços.
Começámos em Quarteira e agora,
com a sede do grupo em Vilamoura, temos 38 empresas sedeadas neste concelho.
Com os nossos postos de venda em
quase todo o Algarve e em Lisboa,
temos parceiros em todo o Mundo.
Quer clientes nossos, que são nossos amigos e embaixadores nos quatro cantos do Mundo, quer agentes
e parceiros de negócio, em Inglaterra, França, Suíça, Bélgica, Angola,
Brasil, Rússia, Suécia, Holanda e Irlanda, onde temos um peso significativo. Temos também parcerias na
China e alguns investidores, mais
em Lisboa do que no Algarve.
Estes últimos anos levaram-nos a criar
empresas complementares de modo
a que possamos estar ao longo de todo o ciclo de vida do imobiliário.
Como colaboradores contamos no
período de Verão com cerca de 700
colaboradores. O volume de negócios atinge, nos serviços, cerca de
30 milhões mas há anos em que esse valor sobe.
Lutou duro e viu finalmente licenciado o seu projecto “Algarve Cluster Multiusos”. Quais as
valências e dimensão do investimento? Porquê em Loulé?
Porque Loulé é, de facto, a capital
económica do Algarve, está bem e
recomenda-se.
O projecto ocupa cerca de 40 hectares, 60 se incluirmos as acessibilidades. Terá várias valências e será complementar do que vai existir
no nó seguinte com o investimento do IKEA.
Situado na Zona Industrial da Loulé – junto ao nó de Loulé Centro
que serve Vilamoura, Vale do Lobo
e Quinta do Lago – vai revitalizá-la
prolongando-a para sul. Estenderá
a sua zona de influência a todo o Algarve, de Barlavento a Sotavento, e
porque está numa zona central da
região também vai contribuir para
projectar a força económica do litoral para o interior.
Prevê a criação de 2 a 3 mil postos de
trabalho e será constituído por uma
grande área de serviços; um Parque
Temático; um Centro de Eventos; al-
gum comércio e um Pólo de Saúde.
A dimensão do investimento, que
se estima situar entre os 300 a 400
milhões, dependerá dos parceiros
que se venham a instalar em cada
uma das suas áreas.
Espera trazer indústrias para
um projecto instalado numa zona em que o turismo e os serviços são dominantes. E os riscos
ambientais?
Pretendemos atrair serviços e indústrias não-poluentes, nomeadamente as chamadas TIC, tecnologias de
informação e comunicação.
A nossa região tem esta beleza, esta
luz, este clima e qualidade de vida
desejados por toda a gente. Cada vez
mais sentimos que grandes investidores querem transferir as suas residências para a nossa região. E quanto mais conseguirmos criar aqui novas empresas, atrair para cá a sede
de empresas de outros países que
– apenas a 2-3 horas de voo do aeroporto de Faro – estão agora em
zonas frias, onde o Sol raramente
existe e chove com frequência, tanto melhor.
Queremos trazer para o “Algarve
Cluster Multiusos” as tecnologias
de informação, um centro tecnológico, infra-estruturas logísticas e
empresas de logística. Com o Centro de Eventos e o Centro de Inovação Empresarial temos a intenção
de criar uma articulação entre este tipo de oferta e o comércio local,
um Centro de Distribuição do Comércio Local. Facilitará a vida dos
comerciantes e o desenvolvimento
do comércio com o apoio de tecnologias modernas e inovadoras, mantendo com os produtos, a tradição
e o comércio original.
No domínio da Saúde, onde hoje temos já uma boa oferta, quer no sector público quer no privado, continuamos a sentir um aumento e diversificação de procura nesta área.
Com o aumento generalizado da
esperança de vida, o nosso clima e
perto do centro da Europa, o Turismo de Saúde é uma realidade que
já cá está e vai continuar a crescer.
Mantém contactos com investidores de todo o mundo. Como é
que eles olham para as condições
de investimento em Portugal?
De 2008 a 2013 o nosso país e a nossa região passaram por grandes dificuldades. Depois, foi o crescimento
do turismo e o projecto dos “Golden
Visa” que também sofreram.
Mas agora o Brexit motivará cada
vez mais ingleses a optarem pela
nossa região. Cada vez mais, também, a atractividade fiscal e os incentivos do “Golden Visa” terão impactos positivos.
Mas é, fundamentalmente a qualidade da oferta da nossa região que os
atrai a vários níveis. São as praias, o
território, o clima, a segurança, a gastronomia, as nossas gentes. Por isso,
cada vez mais as pessoas quando cá
vêm, gostam. Ainda há dias um avião
cheio de franceses aterrou aqui em
Faro e todos ficaram surpreendidos.
Enquanto que o mercado inglês já está connosco há uns 50 anos ou mais,
este mercado francês, por exemplo,
começou a surgir há uns três anos
mas está a crescer muito rapidamente . Quanto mais cá vêm, mais gostam. Sentimos, no imobiliário, que
há uma grande apetência pelo retalho. Os clientes que cá vêm em turismo gostam, depois investem.
Mas esta realidade também traz
grandes investidores. Temos o caso recente do Fundo americano que
comprou Vilamoura e vai investir
mais para levar esse destino a todos os cantos do Mundo.
Diria que os mercados tradicionais se mantêm com cada vez mais
apetência pela nossa região, com a
procura dos mercados emergentes
a crescer em simultâneo. Haja paz,
vontade de fazer melhor, uma boa
relação entre o tecido empresarial,
autarquias e governos, desconcentrados e em parcerias para melhor
servir os nossos turistas.
Quanto mais assim for melhor será a nossa oferta de segurança e de
qualidade de nível internacional no
plano dos serviços de saúde e até de
educação, a todos os níveis do ensino Desde o secundário, onde temos
o Colégio Internacional de Vilamoura, ao superior com a Universidade
do Algarve, que tem um slogan feliz:
“Estudar onde é bom viver”.
Com toda esta oferta de qualidade queremos aumentar o número de residentes estrangeiros no Algarve: passar dos
450 mil para os 600 ou 700 mil.
E penso que não será difícil. O Algarve consegue atingir e captar residentes com facilidade. Mas temos de
deixar de pensar que já somos muito conhecidos. Essa imagem é falsa.
Ainda somos muito pouco conhecidos no mundo. Temos os mercados inglês, alemão, holandês, irlandês, francês mas, mesmo aí, a nos-
“A nossa quota nos mercados internacionais
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
sa quota de mercado no turismo e
imobiliário é insignificante.
E por isso o factor promoção é determinante. Promoção nas várias vertentes: enquanto destino de férias,
de investimento, para trabalhar, estudar e viver. A promoção é determinante nestas quatro vertentes.
Que medidas poderiam ser tomadas, pela Administração Central
e o Poder Local, para facilitar,
“olear”, essa vaga de investimento estrangeiro?
Tenho o privilégio de ser acarinhados e convidados pelas estruturas
associativas na região. Tenho aprendido muito com os meus colegas,
temos um diálogo muito construti-
vo e o tecido empresarial da região
tem desenvolvido um trabalho importante nas várias áreas que aqui
represento. Uma palavra de reconhecimento por esse trabalho desinteressado. E o que se pode fazer? Turismo do Algarve, AMAL e
CCDR, quanto mais próximas estiverem melhor é, e hoje existe um
entendimento e uma reflexão conjunta sobre isso. A voz e o entendimento dessas entidades é determinante para que depois possam
ser interlocutores de peso junto do
Governo a nível nacional. Também
sinto que essa realidade é cada vez
mais aceite, quer pela região, quer
pelo Governo. Não vejo os Gover-
Qualidade de Vida | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 19
ENSINO
Uma Babel de línguas
Só por si o amor e uma cabana não bastam, mesmo que o clima,
a qualidade de vida e as acessibilidades sejam as melhores.
Também é preciso educar os filhos para o mundo,
ainda que longe da pátria
P
do turismo e imobiliário é insignificante”
nos a tomarem medidas sem ouvirem as regiões. O que é importante é que a região se faça ouvir, mas
que haja uma linha e uma estratégia de comunicação e entendimento para a região e que essa voz seja
transmitida ao Governo. E acho que
isso acontece. O que foi feito nos últimos 30 anos foi determinante, no
espaço público. As ofertas que temos hoje, a qualidade das infraestruturas são totalmente diferentes,
para melhor, do que tínhamos no
passado. Há zonas e cidades que foram massacradas pela construção,
o caso de Quarteira por exemplo,
que na altura tinha uma imagem negativa mas hoje está totalmente recuperada. Tem uma Avenida exemplar, o Calçadão, espaços verdes e
proximidade ao mar com uma cota quase plana.
Porque é preciso dizer o seguinte:
por mais que as empresas invistam
e mantenham níveis de qualidade
nos seus empreendimentos, se o espaço público não acompanhar esses
níveis de qualidade as coisas não resultam. Por isso queria deixar uma
palavra de reconhecimento a todos
os autarcas, pela sua acção, desde
os presidentes de Câmara aos presidentes de Junta, que têm feito um
trabalho exemplar. Também quero
dizer que se é uma realidade que
há entendimento entre essas enti-
dades, esse entendimento também
é cada vez maior entre elas e as várias associações da região e o tecido
empresarial. Concertam estratégias,
quer ao nível de grandes projectos,
quer ao nível da comunicação, quer
ao nível da gestão do espaço, do território e da região. Há sempre coisas
a melhorar, mas é preciso uma estratégia que dote a região com cada vez
melhores acessibilidades, nomeadamente a nível da internet, com uma
boa “autoestrada digital”. Hoje as ligações rodoviárias, ferroviárias são
importantes mas as virtuais são determinantes. Algo foi feito mas há
muito mais para fazer.
A oferta de recursos humanos também tem de crescer. Precisamos de
conseguir atrair quadros e recursos
humanos para servir a região. Fala-se em mas eu digo que cada vez
mais é difícil encontrar pessoas para trabalhar. Todos os meus colegas
empresários se queixam que há falta de recursos humanos. E essa falta acentua-se mais nesta época alta
de Verão. Temos talvez de começar
a pensar em criar residências para
atrair pessoas à região e fortalecer
os períodos de maior pico, de Junho
a Setembro. É uma área que é determinante, quer na captação quer na
formação. Por outro lado, o Algarve ainda é muito visto apenas pelo
Sol, Praia e Golfe. A.S.M. ¶
ara qualquer família a educação dos mais novos é um ponto-chave e o Algarve consegue
estar à altura. Para muitos estrangeiros, o Colégio Internacional de Vilamoura foi a solução encontrada.
Na maturidade da sua acção pedagógica junto da comunidade portuguesa, o Colégio Internacional de
Vilamoura (CIV) tem vindo, nas últimas três décadas, a positivar a decisão de muitos estrangeiros que ponderam a deslocação de toda a família
para o Algarve. A oferta de um projecto educativo multicultural onde
as línguas estão presentes, do Jardim
de Infância ao Secundário, conquistou 650 alunos inscritos só no ano
passado, 30% dos quais estrangeiros.
“Não posso deixar de referir a satisfação de quem nos visita, pelo facto de poder inscrever os filhos no
Colégio. Encontrar o local perfeito
para viver, a casa dos seus sonhos,
uma zona tranquila, junto ao mar,
com proximidade ao aeroporto não
chega! Ter uma escola com um currículo internacional é uma condição no momento da escolha.” Cidália Bicho é directora pedagógica do
CIV há quatro anos, mas conhece a
orgânica da escola há 12, altura em
que leccionava português.
O universo estudantil estrangeiro
é representado por 44 países, com
maior expressão para os ingleses
(10%), russos (5%) e chineses (3%).
Mas uma nova nacionalidade começa a ganhar dimensão na vida deste
colégio. Nos últimos dois anos, o CIV
foi abordado por cerca de 40 famí-
lias francesas, devido a uma potencial mudança de residência. Um aumento de 167% na procura, relativamente ao biénio anterior.
“Actualmente temos 14 famílias inscritas para o próximo ano lectivo, o
que representa um aumento significativo face ao ano que agora terminou.”
A língua francesa é obrigatória para todos os alunos a partir dos 10
anos e, ao longo do percurso escolar, o CIV providencia os exames da
Alliance Française, tornando-o num
dos principais centros no Algarve.
“Somos a escola algarvia que
propõe mais alunos a exames e
com uma taxa de sucesso de 100%.
Além disso, há 18 anos que realizamos anualmente um estágio em
França que envolve os alunos do 7.º
ano e ‘Year 8’”.
Também tem morada no CIV e é
aberto ao público em geral. O único
Centro de Certificação de língua inglesa a sul do Tejo, Cambridge English
Language Assessment, recebe adultos
e crianças para aferir o seu nível de
proficiência e realizar exames.
Conhecido por ousar, o Colégio de
Vilamoura tem apostado no ensino
de Mandarim ao nível do Jardim de
Infância e na Filosofia para crianças e jovens. Apostas ganhas, tal como os vários projectos de aproximação às associações e instituições locais, regionais e internacionais, que
pretendem fomentar os pressupostos humanistas nos alunos e abrir janelas para a comunidade exterior.
Também o uso de laptops em contexto de sala de aula se revelou um
sucesso. “Ainda me recordo de um
conselho pedagógico em que aprovámos, com muita preocupação, o
projecto de laptops na sala de aula. Foi em 2007. Estávamos divididos, parecíamos Velhos do Restelo a
enfrentar Adamastores, mas juntos
conseguimos superar os nossos medos e implementar um projecto que
nos retirou da nossa zona de conforto e que tem conduzido os alunos
a patamares de desempenho que
muito nos orgulham.” – lembra Cidália Bicho, que já se habituou a receber ex-alunos que retornam à escola. Vêm inscrever os filhos na casa que os ajudou a trilhar o caminho
do conhecimento.M.L. ¶
No Colégio de
Vilamoura há
alunos de 44
nacionalidades.
Aos ingleses,
russos e
chineses
começam agora
a juntar-se os
franceses.
FOTO: DR
A aula de Mandarim no Jardim de Infância
20 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Qualidade de Vida
ENTREVISTA
Aqui temos tudo.
É portanto o sítio ideal para investir
Vilamoura e Vila Sol têm uma "diversidade concentrada" sustenta Fátima Catarina,
presidente da Inframoura, Empresa Municipal
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Qual é estrutura accionista da
empresa por quem dá a cara?
São dois accionistas, a Câmara Municipal de Loulé com 51 por cento do capital social, assim o exige a Lei, e a Vilamouraworld, com
49 por cento.
Que missão e funções lhe foram
atribuídas?
Prestar um serviço de excelência na
gestão, conservação e manutenção
de todos os espaços públicos que garantam elevados padrões de vida nos
territórios de Vilamoura e Vila Sol.
Para garantir essas exigências
que infra-estruturas já foram levantadas e que serviços são prestados pela Inframoura?
As nossas competências incidem no
abastecimento da água, na recolha
de resíduos sólidos, na manutenção
das áreas verdes, cumprindo com tudo aquilo que a ERSAR – Entidade
Reguladora dos Serviços de Águas e
Resíduos – nos obriga, em particular
não podermos fazer investimentos
cruzados, ou seja, as receitas que temos com a venda da água não podem
ser investidas senão na água, as dos
resíduos nos resíduos, etc. A consequência disto é que somos obrigados
a investir muito mais nas infra-estruturas enterradas do que nas visíveis.
E o que é facto é que temo-lo feito,
até porque as infraestruturas enterradas já têm 40-50 anos, o que nos
causa imensos problemas de rupturas, abatimentos, etc. E temos investido imenso na reabilitação dessas
infra-estruturas. Dou-lhe um exemplo: vamos investir meio milhão no
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Uma intervenção da Inframoura num espaço público que até há pouco era um terreno de matos
final do Verão para reabilitar e enterrar uma estação elevatória que está
agora ali em frente ao Hotel Ampalius, junto à praia, e as pessoas não
vão ver este investimento.
Mas quanto menos virem, melhor...
Claro, é sinal de que estamos a funcionar bem. Mas também é necessário que façamos alguma coisa que
seja visível porque Vilamoura tem
que mostrar qualidade. Temos de
ter os espaços verdes bem tratados,
tendo o cuidado de investir em plantas que sejam o menos consumidoras de água possível e que ocupem
o mínimo tempo disponível dos nossos 133 funcionários, dos quais mais
de cem são operacionais.
Muitos dos projectos em que estamos a trabalhar tornam-se possíveis
porque o fazemos em colaboração
com os nossos stakeholders.
E que projectos são esses?
Posso-lhe referir o projecto, que vamos desenvolver em conjunto com
a câmara municipal, da alameda lindíssima que vai ser construída levando o conceito que existe no anel dos
hotéis, na Avenida Tivoli, para mais
perto do mar, fazendo a transição
para a segunda fase do Passeio das
Dunas, ligando Vilamoura a Quarteira ao longo da orla marítima.
Entre outros refiro uma intervenção
que fizémos no Pinhal Velho, a melhor área de Vilamoura, com urbanizações de grande qualidade e vivendas lindíssimas, que tinha uma
entrada horrível, de matos e onde fizémos uma requalificação paisagística que ficou muito bonita.
Qualidade de Vida | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 21
ENTREVISTA
Queremos trazer o mundo
para Portugal
O CEO de um dos maiores investimentos feitos no Algarve
quer duplicar a dimensão de Vilamoura
Face a qualquer outra alternativa de investimento que argumentos pode apresentar a um fundo
nacional ou internacional, ou até
mesmo a uma família, em favor
de Vilamoura?
Vilamoura e Vila Sol têm uma diversidade concentrada. Aqui temos tudo: campos de golfe dos melhores
do mundo, a marina mais premiada da Europa, animação, diversão
nocturna, espaços verdes, um parque ambiental, escolas privadas e
públicas em todos os graus do ensino, clínicas, o aeroporto a 20 quilómetros, boas ligações rodoviárias
que estão a ser melhoradas, um território de qualidade. É portanto o sítio ideal para investir.
Pode apontar um par de investimentos recentes nestes territórios?
Temos um que acabou de ser inaugurado e outro que está em construção.
No primeiro trata-se da abertura de
um hotel, o Vilamoura Garden, num
edifício devoluto, completamente
abandonado há décadas. Foi totalmente reabilitado e está espectacular. A sua inauguração veio dar
resposta a uma procura que se fazia sentir. Tínhamos uma boa oferta de hoteleira de cinco estrelas mas
um défice de unidades de 4 estrelas
que agora foi minimizado.
O segundo é a urbanização L’Oran-gerie, um empreendimento imobiliário de qualidade em que o nosso accionista privado está a dar passos muito seguros para a sua rápida
concretização. A.S.M ¶
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
A
História do turismo no Algarve, e do desenvolvimento do
sector no país passa por este edifício no centro de Vilamoura,
onde já esteve instalado o casino e
agora é a sede da Vilamouraworld. O
último inquilino, que ainda dá o nome à Praça Fronteira, foi a Lusotur.
Quem nos recebe aqui é Paul
Taylor, um cidadão britânico que
já era proprietário e gestor do Monte
da Quinta, na Quinta do Lago. Hoje
accionista e CEO da Vilamouraworld
onde tem como sócio um dos maiores fundos de investimento do mundo, a Lone Star, que além do turismo e imobiliário, está presente noutras áreas de negócios em Portugal.
Com esta entidade financeira, com
que já trabalha há muitos anos, em
26 de Março do ano passado comprou ao Catalunya Banc, intervencionado, os activos da Lusotur em Vilamoura. Incluiam na altura um empreendimento turístico com dois mil
hectares e a concessão da Marina.
Paul Taylor recorda que o investimento foi bem recebido pelo governo anterior e que o actual continua
a vê-lo com muito bons olhos. Não
se queixa do regime fiscal em vigor,
mas sustenta que os níveis de burocracia com que se defronta, o “red
tape” como diz, ainda é pior do que
aquilo que esperava encontrar. “Temos que arranjar paciência para nos
habituar ao tempo que a decisões levam até que sejam tomadas. Em Inglaterra não é assim...”, queixa-se.
O negócio, segundo a imprensa,
rondou os 210 milhões de euros, um
valor que não confirma, tal como diz
não estar autorizado a divulgar a repartição do capital entre os actuais
accionistas. Paul Taylor e o Fundo
norte-americano a que está associado não tencionam abri-lo ao público com uma entrada nas Bolsas de
Valores. Apesar de terem anunciado futuros investimentos que se elevam a um montante total de mil milhões de euros querem continuar a
ser uma companhia fechada à entrada de novos sócios accionistas.
Pedimos-lhe para apontar as
razões que determinam um investimento dessa dimensão em
Vilamoura:“Primeiro porque adoro Portugal. As suas gentes, o sol, a
gastronomia, o vinho. Em segundo
lugar porque, tanto nas ruas como
do ponto de vista político, é consi-
derado o quinto país mais seguro do
mundo e, talvez, o primeiro da Europa. Vilamoura em si mesma é o
terceiro argumento. Não tem aquilo que nós designamos por ‘border
and greenfileld risks’, isto é, por um
lado temos a certeza que não vamos
ficar cercados por cimento, porque
o que temos nos limites de Vilamoura são as praias, o mar e zonas protegidas onde não é possível construir
e, em simultâneo, porque quando
chegámos não encontrámos um deserto. Já existia um centro urbano
ordenado e infraestruturado, com
restaurantes, hotéis, duas excelentes praias, cinco campos de golfe,
dos melhores da Europa. Metade de
Vilamoura já estava construída. E
nós queremos agora erguer o resto.”
Para isso, o que designa como segunda fase do projecto, poderá vir
a contar com o “apport” de outros
investidores de todo o mundo, interessados em estabelecer parcerias e
desenvolver os seus próprios projectos nos limites do “resort”.
De imediato já está em marcha o
empreendimento L'Orangerie, um
condomínio fechado de luxo, rodeado pelos fairways de dois campos de
golfe: Millennium e Victoria.
Mas o “master plan” de um anunciado investimento de um bilião contempla um empreendimento turís-
tico de 400 hectares que prevê a
criação de milhares de postos de trabalho directos e indirectos num “resort” com uma área de total de 1.700
hectares, o equivalente a oito vezes a
dimensão do principado do Mónaco.
“Queremos trazer o mundo para
Vilamoura e para Portugal, trazer
os melhores serviços e marcas internacionais, que criam emprego e
geram receitas fiscais.”
No que toca às perspectivas para o
futuro, Paul Taylor revela-se optimista. Constata que neste momento a Vilamouraworld mantém uma clientela
fiel de holandeses, escandinavos e britânicos, “que com o Brexit podem vir a
aumentar”, mas afirma que o seu melhor mercado já é, agora, o francês. Refere que o Aeroporto de Faro registou
no corrente ano um aumento de 164%
nas chegadas de cidadãos franceses.
A concluir, e quanto ao objectivo
do investimento que está a desenvolver com a Lone Star, Paul Taylor revela-se ambicioso: “Queremos que,
no prazo de cinco anos Vilamoura,
se torne no mais importante ‘resort
da Europa”, afirma confiante e seguro. “Gosto de desafios”, sublinha.
E quando se reformar, onde é que
se vê a passar o resto dos seus dias?
Responde novamente seguro de si:
“Somewhere in the Algarve, for
sure!” ¶
A paixão do Golfe
Faça sol ou caia chuva, vê-se
sempre gente nos “greens”
do Algarve.
Custo? Romeu Gonçalves,
“golf manager” do grupo Oceânico
dá-nos valores aproximados:
350 euros por pessoa para cinco
voltas ao campo, incluindo buggie
e aluguer de saco. Isto na época
baixa, que aqui corresponde aos
meses de Dezembro, Janeiro,
Julho e Agosto. Na época alta
– Março, Abril, Outubro e Novembro
– o valor sobe para os 650€.
No caso dos estrangeiros, estes
valores, somados ao custo do
alojamento, refeições e todas
as outras despesas feitas em
Portugal, entram nas contas
nacionais como exportações…
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
Oceânico Victoria, considerado um dos melhores e mais sofisticados
campos de golfe da Europa era um terreno de matos
22 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Qualidade de Vida
OPINIÃO | MICHAEL R. REEVE, AFPOP*
ANNE-MARIE: “LE PORTUGAL? C’EST ‘COOL’ ”
Direito de voto
Os Muti e os Loustalot
O autor dirige a associação
que reivindica ser
“Portugal's largest Foreign
Residents' Association”
O fluxo migratório do século passado inverteu-se.
Agora são os franceses que escolhem
Portugal como destino
das suas vidas
FOTO: DR
S
Um dos factores que atrai
estrangeiros a
Portugal, particularmente do
Norte da Europa, é
certamente o clima e
consequentemente o estilo de vida mais saudável. Outro
factor é uma maior sensação de
segurança. Portugal tem um índice de violência e criminalidade
mais baixo do que muitos outros
países. O facto do povo português
ser acolhedor e normalmente disposto a falar-lhes em inglês é um
factor importante para britânicos
e para nacionais de outros países
que poderão não falar português,
mas terão pelo menos um conhecimento básico de inglês.
Portugal tem um charme próprio
que muitos acham enriquecedor. É
ainda um país de orientação familiar,
mas mais do que isso, tem raízes, tradições e ligações ao seu passado, o
que muitos acham não só agradável
mas também interessante.
Recentemente organizámos, em
colaboração com a Universidade
do Algarve, um curso para os associados da afpop chamado 'Discover
Portugal'. Outros cursos estão planeados para um futuro próximo.
A história e a cultura deste país
é fascinante para a comunidade
estrangeira e é algo que muitos
gostariam de conhecer melhor.
Os residentes estrangeiros, na generalidade, sentem-se bem acolhidos pelos portugueses, mas há ainda uma divisão em muitas áreas. Isto é em parte devido ao facto dos
estrangeiros terem comprado propriedades em comunidades já estabelecidas e a interacção entre estes e os seus vizinhos portugueses
concretizou-se mas essencialmente a um nível superficial, em lojas e
restaurantes, por exemplo. É também de notar que, sendo o Algarve
uma região particularmente baseada no turismo, os portugueses muitas vezes têm dificuldade em distinguir quem está de férias, e quem cá
está durante todo o ano. Não é fácil construir relacionamentos, mas
isso não significa que os residen-
tes estrangeiros
não se sintam
bem-vindos.
O Turismo de
Portugal e as Câmaras locais poderiam envolver mais a
população residente como parte da sociedade. Estas pessoas são muitas vezes ignoradas,
quando na verdade são um potencial na publicidade do país lá fora, através de amigos e familiares.
Muitos concelhos já incluem estrangeiros nas suas organizações
e isto deve ser incentivado. Os estrangeiros que já cá estão contribuem grandemente e poderiam
fazer ainda mais, na verdade muitos querem fazer mais. Fazer uso
de um recurso tão disposto a promover Portugal e a ajudar nas suas
áreas de residência, não só iria fazê-los sentir-se parte da sociedade
como também beneficiaria o país.
Há muito que Portugal pode
aprender com os seus residentes
estrangeiros, tanto quanto os estrangeiros podem aprender com os
portugueses. A promoção de um
cruzamento cultural é algo que deve ser activamente encorajado.
Também ajudaria se os estrangeiros residentes em Portugal tivessem direito de voto nas eleições nacionais e presidenciais. Actualmente só é possível fazê-lo
adquirindo cidadania, mas o alargamento dessas regras para os estrangeiros residentes há mais de
cinco anos e que votaram em, pelo menos, uma eleição local poderia ser considerado. ¶
A História
e a cultura
deste país é
fascinante para
a comunidade
estrangeira
ão dois casais. O primeiro,
sem nunca perder a ligação à
pátria, andou pelo continente africano a trabalhar, antes de regressar a França. O segundo ainda
vai tendo de se apresentar ao serviço em Paris. Mas, para seu descanso, todos os quatro já encontraram
os espaços de privacidade onde pretendem viver o resto das suas vidas.
No Algarve. O destino eleito por estes franceses com quem falámos.
Em 1962 Anne-Marie e Jacques já
eram expatriados. De origem europeia, ela com antepassados franceses e espanhóis, italianos os dele,
vindos da Argélia encontraram um
primeiro porto de abrigo em França. Anos depois estavam de novo a
fazer as malas com bilhetes de passagem para um regresso a África.
Desta vez os Camarões e depois a
Costa do Marfim, onde viram os filhos crescer até se tornarem adolescentes, altura em que regressaram a
França. Nice primeiro, Toulose depois e, finalmente, Aix-en-Provence.
Agora, com três filhos e sete netos, Jacques confessa-nos: “Passámos toda a vida a viajar de um lado para o outro e, chegada a reforma, decidimos que era finalmente
o momento de ‘pousar as malas’”.
Mas não em França, “onde se vive
hoje com muito ‘stress’”.
“Foi o clima que nos atraíu a Portugal. É o que mais se aproxima do clima africano, onde nos sentimos bem,
mas que não nos obriga a ficar longe da família”, constata Anne-Marie.
Chegaram a Loulé por um erro
de GPS, confessam-nos entre risos,
mas o que viram decidiu-os a comprar o apartamento no centro da cidade onde se instalaram há 15 dias.
Em Outubro já cá terão filhos e netos de visita e dizem-nos que os amigos que deixaram para trás sentem
inveja por ainda não terem podido
seguir os seus passos.
“Encontrámos aqui tranquilidade, segurança, gente muito prestável, mesmo que não compreenda o
francês – mas esforçam-se por o fazer – uma cidade muito limpa e dinâmica, campos e paisagens lindas e
com o mar e as praias por perto. Encontrámos aqui a tranquilidade de
espírito que procurávamos”.
Os Loustalot são outro casal de
franceses que também acabou de
se instalar no sul de Portugal.
“Como vejo o Algarve? Como
um pequeno cantinho do Paraíso.
Anne-Marie e Jacques Muti
"Encontrámos
aqui a
tranquilidade
de espírito que
procurávamos”
É uma região muito aberta, muito
cosmopolita, e para nós é importante existirem várias nacionalidades,
várias culturas.”
Apaixonaram-se pela paisagem,
pelo clima, pelas casas e decidiram
que Vilamoura era o local perfeito
para passar a fase madura da vida.
“Hoje somos mais selectivos, mais
abertos às coisas simples, para viver bem, procurar momentos verdadeiros… Sabemos que o nosso
tempo não é eterno e por isso mes-
mo procuramos que cada momento seja especial e único.” Christine,
parisiense, recebe-nos na casa que
adquiriu com o marido, Philippe,
no final do ano passado. Assume o
comando da conversa para contar
como ambos descobriram a região:
“Foi por acaso! Andávamos à procura de um local para a nossa reforma. Primeiro pensámos no Sul
de Espanha, mas há um ano e meio
viemos pelo Natal ao Algarve. Alugámos um apartamento nas residências Victoria, em Vilamoura e achámos que era magnífico. Depois alugámos um apartamento por um ano
inteiro na Quinta do Lago e daí pensámos em comprar”, recorda-se, orgulhosa da aquisição.
Apesar de passarem por cá muito
tempo, as viagens entre Paris e o Algarve ainda se cumprem, facilitadas
pela proximidade ao aeroporto, a 25
Kms de Vilamoura. “Amanhã vou
trabalhar... em França (risos), porque ainda trabalho, numa pequena
empresa. A 1 de Outubro entro na reforma!” Philippe faz consultoria para companhias francesas que constroem campos de ténis. Em Outubro, também ele entrará na reforma.
A razão para deixar Paris é clara.
A cidade tornou-se opressiva e ape-
Qualidade de Vida | Caderno Extra Loulé | Domingo, 31 JUL 2016 | 23
JANE: “PORTUGAL? IT’S ‘COOL’ ”
Peter e Jane compraram um lote
onde Ronaldo passou férias
Nas traseiras fica a propriedade de Rio Ferdinand, que na defesa do United
tantas vezes jogou com CR7 à frente, balanceado para o ataque
É
uma casa de Vilamoura com
história e histórias. Jane e Peter são um casal que, longe ainda da idade de reforma, criou uma
meia dúzia de filhos que já lhes deram uma neta. Vivem na região de
East Midlands, em Inglaterra, onde
ele já foi director de uma das maiores
multinacionais de bebidas não alcoólicas. Com uma carreira profissional
no sector da distribuição é agora CEO
de uma empresa que na área do “homestyle” gere várias marcas de prestígio para a jardinagem e acessórios
domésticos para o jardim, animais de
estimação e aves ornamentais.
Amante dos desportos náuticos
decidiu-se há uns anos atrás pela
compra de uma residência de férias
nas costas do sul da Europa, junto
ao Mediterrâneo. Nos limites do orçamento que definiu, a Côte d’Azur
era a sua primeira opção: o Mónaco ou qualquer outra localização,
desde que servida por uma marina
de qualidade, equipamento de que
não prescindia.
Entretanto conheceu o Algarve
e a alternativa inicial foi perdendo
argumentos em favor das propostas que lhe iam sendo apresentadas
pela Ana Abrantes, “foreign investment manager” da Garvetur.
Até que após duras negociações,
que se arrastaram de Dezembro de
2013 a Fevereiro do ano seguinte,
acabou por se sentar para assinar o
contrato-promessa de compra e venda que iria colocar no seu património a moradia onde, no Verão anterior, Cristiano Ronaldo tinha passado as suas férias algarvias.
CR7 deixou-lhe Rio Ferdinand como vizinho e uma propriedade, hoje avaliada em 3,5 milhões, um valor
irrisório quando comparado com os
46 milhões que em 2002 o Manchester United pagou ao Leeds pelo passe do defesa central.
No dia dos namorados de 2014,
em Vilamoura e com o contrato assinado, Peter tirou Jane do hotel de
5 estrelas onde estavam alojados e
disse-lhe: “Tenho uma prenda paFOTO: JOSÉ SÉRGIO
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
sar de fazer parte do seu ADN, Christine sente que de momento não é segura. Outras há que a fazem deixar
tudo para trás e dar uma nova face à
vida. Mas Christine tem dificuldade
em hierarquizá-las: “Não sei se gosto
mais do golfe, da gastronomia, das
pessoas, que são muito acolhedoras.
E o clima, claro… – diz, levantando
a palma da mão para o céu. “Já para não falar dos impostos, que também são mais apelativos aqui do que
em França.”
Deslumbrados com Vilamoura, de
momento não mudariam nada na
região. Depois de uma vida de trabalho admitem ter aqui o triângulo
perfeito: o Sol, o golfe e o barco, que
há-de chegar de França em Novembro. Futuramente, querem descobrir o interior do Algarve e Lisboa.
Até lá, e enquanto não chegam à reforma, deliciam-se com o que consideram o maior prazer de todos:
“De manhã, abrir as cortinas e ver o
sol aqui neste jardim. Sinto tranquilidade.” Philippe assina por baixo.
Os dois filhos, já grandes, virão
mais tarde conhecer a nova casa. Os
amigos já foram convidados a visitar o local onde Christine e Philippe
nunca se sentem sós. “Aqui? Não. Há
vida a toda a hora!” ¶
ra ti”. Apresentou-lhe a propriedade que tinha acabado de adquirir e
antes que o dia terminasse levou-a
de volta à Marina.
Aí, quando tinham pela frente
uma embarcação de recreio acabada de chegar de Cascais deixou cair:
“Acho que também mereço um presente!”. O “bote” está avaliado em
800.000 euros.
Peter e Jane agora passam férias
rodeados de filhos, neta, familiares
e amigos que dão vida a uma casa
de piso térreo e seis lugares de estacionamento na cave, com uma volumetria de 1500 m3 e uma área de
construção de 465 m2. A moradia,
os jardins envolventes e a piscina
ocupam 4200 m2 de um condomínio envolvido pelo pinhal.
Junto à janela rasgada para o exterior interrogamos Jane, a porta-voz do casal.
“Que mais lhe agrada em Portugal?”
“A minha casa!” é a resposta pronta, com um sorriso rasgado. Mas
acrescenta de seguida: “Os portugueses são gente simpática e quando
saímos para a marina com as crianças vemos tudo limpo e sentimo-nos
em segurança”.
“No pós-Brexit aconselharia os
seus amigos ingleses a comprarem
também as suas casas de férias em
Portugal?”
“NÂO! Eles já têm a minha”. ¶
FOTO: JOSÉ SÉRGIO
24 | Domingo, 31 JUL 2016 | Caderno Extra Loulé | Informação Útil
OPINIÃO | JOÃO LUÍS CALÇADA CORREIA, EMPRESÁRIO E CONSULTOR
Um clima muito positivo para
o investimento no Algarve
Os projectos em curso no concelho têm um impacto
positivo na economia nacional
FOTO: DR
N
uma altura em que se vive uma
crise económica e financeira global muitos investidores
procuram “activos de refúgio”: activos de qualidade superior, normalmente menos elásticos a flutuações
resultantes da conjuntura económica.
O Algarve tem esse activos: uma
oferta de qualidade superior no turismo ocasional e no turismo residencial, ambiental, de saúde e desportivo.
Os pilares que atestam essa quali-
dade e têm potenciado o crescimento do investimento são reconhecidos internacionalmente: um clima
extraordinário numa costa mediterrânea e atlântica com excelentes praias e boas marinas; campos
de golfe ao nível dos melhores do
mundo; uma elevada qualidade de
vida; excelentes hotéis e boas infra-estruturas; serviços de saúde e educação também de qualidade e uma
gastronomia apreciada dentro e fora de fronteiras.
Aliado a estes atributos regionais,
a segurança no território nacional
assume hoje uma importância determinante para quem nos visita ou
para quem investe. Adicionalmente,
o custo de vida bastante acessível,
conjugado com alguns benefícios
fiscais e com a política dos “Vistos
Gold” também potencia a nossa região como destino de investimento.
No rótulo de qualidade que o Algarve possui, o concelho de Loulé
assume uma posição de destaque.
Concentrando o melhor da oferta
turística do Algarve, beneficia de
uma ampla percentagem do investimento canalizado para a região.
Apesar da sua grande diversidade
territorial (serra, barrocal, e litoral),
o protagonismo na captação de investimento têm-se concentrado no
chamado Triângulo Dourado: Vilamoura, Quinta do Lago e Vale do Lobo, um conjunto de empreendimentos de referência mundial.
Mas o poder local tem-se preocupado com a sustentabilidade do seu
modelo de desenvolvimento, apostando forte na requalificação de infra-estruturas, na criação de condições para a diferenciação da sua
oferta e para a atenuação da sazonalidade turística. É de destacar o golfe, com a perspectiva de desenvolvimento de dois novos campos na zona interior, o que representará um
grande passo em termos do desenvolvimento das zonas mais afastadas do litoral.
A saúde e a educação são outros
dois sectores com relevência. Apresentam uma oferta sólida de nível
superior, muito suportada na iniciativa privada. São inquestionavelmente áreas de qualidade diferenciadora que podem ser potenciadas
porque representam mais-valias pa-
ra quem aqui investe, reside, trabalha ou passa férias.
O presente clima de investimento
na região é muito positivo. Atesta-o
o sector imobiliário, que continua a
dar sinais de extrema vitalidade com
o desenvolvimento de projectos como a Quinta da Umbria (Golfe, Hotel
e Vivendas) no montante de 210 milhões de euros, a aquisição da entidade gestora de Vilamoura pelo grupo Lonestar, que prevê um investimento de 1.000 milhões de euros
nos próximos anos, o projecto de
Vale do Freixo (Golf & Country Estate) com um investimento previsto de 125 milhões de euros, o projecto em marcha do grupo IKEA no
montante de 200 milhões de euros
– que se espera que venha a dinamizar os concelhos de Loulé e Faro
com a criação de 3000 novos postos de trabalho – e ainda o desenvolvimento de um grande complexo
multiusos, Algarve Cluster Multiusos, que comporta um investimento de 300 milhões de euros.
Pelas razões apontadas, a região,
e em particular o concelho de Loulé,
revela grande capacidade de atrac-
ção de capital reprodutivo. Isto porque além de todas as razões estruturais acima referidas oferece ainda
atractivos no domínio fiscal, nomeadamente benefícios fiscais para determinados investimentos (PIN –
“Vistos Gold”) assim como a redução do IRC. É igualmente importante
assinalar a política da atracção e fixação de população por parte do município com a redução da taxa de IMI
em 5% nos últimos dois anos, situando-se actualmente em 0,38% e com a
expectativa de nova e substancial redução no próximo ano. A reversão,
para o contribuinte residente no concelho, de 1% do valor do IRS cobrado
é outra medida com grande impacto.
Os instrumentos fiscais têm sido
assim utilizados pelo município de
Loulé como alavancas de desenvolvimento, captando investimento e
promovendo a coesão territorial
com resultados expressivos.
Os projectos em curso no concelho têm um impacto positivo na economia nacional e traduzem o reconhecimento, por parte dos investidores, das condições de excepção
que Loulé oferece. ¶
FOTO: MELANIE MAP'S
ALGARVE
CENTRAL
Servida por uma boa rede de ligações
rodoviárias e ferroviárias, entre dois
dos mais importantes aglomerados
urbanos da região, Loulé e Faro, e
junto ao aeroporto internacional e aos
pólos de investigação da Universidade
desta última cidade, a zona envolvente
do Estádio do Algarve constitui uma
plataforma logística e de serviços
capaz de acolher investimentos de
grande dimensão como o projectado
Hospital Central do Algarve e,
em breve, o IKEA.
FOTO: DR
Ficha Técnica | PÚBLICO • CADERNO EXTRA da responsabilidade da Direcção Comercial
Editor António Salaviza Manso | Textos Mário Lino | Paginação João Pedro Mota | Dir.-G. Comercial Mário Jorge Maia | Publicidade Guerra Ferreira, Cláudia Martins
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