enrolador didático de indutores

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enrolador didático de indutores
Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI
ISSN 1809-1636
ENROLADOR DIDÁTICO DE INDUTORES
Winder Teaching Of Inductors
Francisco Antonio Lopes LAUDARES1
RESUMO
Este trabalho descreve a construção de um instrumento que permite enrolar bobinas, a partir de
componentes de baixo custo adquiridos no comércio varejista ou reaproveitados de equipamentos
não mais utilizados. A principal motivação desse trabalho está na possibilidade de construir
bobinas, com uma quantidade considerável de voltas e com espiras regulares e próximas, para
discussão de conceitos eletromagnéticos, tanto qualitativos quanto quantitativos, gerados por
correntes elétricas, através de um componente eletrônico que possui grande relevância, visto sua
aplicação tecnológica. Para a construção da bobina utilizou-se um software livre para calcular o
número de espiras, a partir das dimensões do carretel. O enrolador didático é formado por um rotor
com manivela, um sensor de toque e uma calculadora comum, utilizada como contador da
quantidade de voltas. A bobina produzida foi testada em um multímetro, com a função de teste de
indutores, apresentando excelente resultado para o valor da indutância.
Palavras-Chave: Instrumentação, magnetismo, indutores, bobinas
ABSTRACT
This paper describes the construction of a tool that allows to wind coils from inexpensive
components purchased at retail or reused equipment no longer used. The main motivation of this
work is the possibility to build coils, with a considerable amount of twists and turns with regular
and close, for discussion of electromagnetic concepts, both qualitative and quantitative, generated
by electric currents through an electronic component that has great relevance since its technological
application. For the construction of the coil is used an open source software to calculate the number
of turns, from the dimensions of the spool. The reel is formed by a didactic rotor with crank, a touch
sensor and a common calculator used as a counter of the number of turns. The coil produced was
tested in a multimeter with test function inductors, with excellent results for the value of the
inductance.
Keywords: instrumentation, magnetism, inductors, coils
1. INTRODUÇÃO
A proposta de se construir um instrumento que permita realizar o enrolamento de bobinas
1
Professor do Grupo de Pesquisa em Ensino de Física, Dep. de Física, UFRRJ – [[email protected]]
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tem como objetivo atender uma demanda difícil, e de prática exaustiva, que é a de enrolá-las para
que finalmente possam ser utilizadas em experimentos didáticos que envolvam demonstrações tanto
quantitativamente quanto qualitativamente de fenômenos físicos de eletromagnetismo
(LAUDARES; CRUZ, 2009). A grande dificuldade na produção dessas bobinas está na manutenção
da regularidade entre as espiras e a contagem correta do número de voltas enroladas em seu núcleo,
visto que são elas que produziriam as características de indutância da bobina.
O estudo da construção de bobinas tem extrema importância didática, pois se pode explicar
o funcionamento de componentes eletrônicos que utilizam o magnetismo para seu funcionamento
como relés, transformadores, eletroímãs, campainhas, são encontrados em alto-falantes, filtros de
frequência e outros equipamentos muito utilizados atualmente. No caso das bobinas móveis,
presentes em muitos auto-falantes, ela é responsável pela transformação da corrente elétrica
alternada, que passa pelas suas espiras, em campo eletromagnético, produzindo assim um
movimento característico de vai e vem do cone fixado nela (AUTO SOM, 2006).
No caso dos indutores concebidos de forma artesanal, para auxílio em prática experimentais,
a grande dificuldade está em sua construção física, pois muitas vezes suas espiras são enroladas de
forma não homogênea, prejudicando, tanto no enrolamento das camadas quanto no valor da
indutância final.
A proposta desse trabalho está na apresentação da construção de um enrolador de bobinas
utilizando componentes de baixo custo e de fácil aquisição, como madeiras, fusos, parafusos e
alguns componentes eletrônicos. Para a quantificação do número de espiras será utilizado um
software gratuito onde o valor da indutância depende das dimensões físicas do núcleo da bobina.
Para teste da eficiência do indutor, será utilizado um multímetro que medirá sua indutância após a
construção.
2. BASE CONCEITUAL
Nos estudos dos conceitos eletromagnéticos, sejam eles no Ensino Médio ou Superior, um
dos temas de grande relevância, visto sua aplicação tecnológica, é o magnetismo natural de alguns
materiais e a produção de alterações magnéticas em regiões próximas a condutores quando estes são
percorridos por uma corrente. Os efeitos magnéticos, em função de uma corrente, foram observados
pela primeira vez por Hans Christian Oersted em 1819, ao perceber que ocorria uma deflexão na
agulha de uma bússola localizada nas proximidades de um fio condutor esticado, onde era
estabelecida uma corrente elétrica, figura 1.
Figura 1: Experimento de Oersted (STERN; PENEDO, 2001).
Foi esse fato que impulsionou uma série de descobertas e permitiu unificar os fenômenos
elétricos e magnéticos (STERN; PENEDO, 2001), possibilitando também o surgimento de
instrumentos de medida como os galvanômetros, a construção de motores elétricos e eletroímãs, por
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exemplo.
Se este fio for enrolado de forma a possuir uma sucessão de espiras coaxiais finitas, teremos
o que conhecemos como solenoide finito ou bobina, figura 2.
Figura 2: Solenoide (ARQUIVOS DO AUTOR).
Se estabelecermos uma corrente estacionária nesta bobina, através de seus terminais, surgirá
em seu interior um campo magnético uniforme (B), matematicamente descrita pela equação 1
(MIRANDA, 2010)
B=
µ0
2
ni (cos ( β 1 ) cos ( β 2 ))
(1)
onde 0 é a permeabilidade magnética do vácuo, n representa o número de espiras por unidade de
comprimento (N/l), também chamada de densidade linear de espiras, e i a intensidade de corrente
são definidos como se mostra na figura 3.
elétrica que percorre a bobina. Os parâmetros e
Figura 3: Representação de um solenoide de comprimento finito (MIRANDA, 2010).
No centro do solenoide temos que
=
-
. Substituindo na equação 1, temos
B= µ0 n i cos ( β 1 )=µ0 n i
(
√ℓ 2 +r 2
ℓ
)
(2)
sendo o comprimento do solenoide muito maior que seu raio, teremos que o campo magnético em
seu centro será dado por
B≈ µ 0 ni
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essa equação também pode ser utilizada, com uma boa aproximação, para campos magnéticos
medidos no interior de solenoides reais em pontos afastados de suas extremidades.
Os indutores são componentes eletrônicos simples podendo ter dimensões variadas
dependendo do projeto eletrônico a que está submetido. O conhecimento de seu valor é de extrema
importância, pois o indutor introduz no circuito planejado uma indutância específica, muitas vezes,
dependendo do projeto, ele deverá ser confeccionado.
A indutância é uma grandeza física cujo valor depende apenas da geometria da bobina, mas
ela pode variar diretamente com as propriedades magnéticas de materiais introduzidos em seu
núcleo. Alguns materiais ferromagnéticos podem ser introduzidos para aumentar o valor da
indutância, aumentando o fluxo magnético em seu interior (BOYLESTAD, 2004). Neste trabalho, o
núcleo da bobina construída será de ar.
O valor da indutância de uma bobina, quando submetida uma corrente elétrica i, pode ser
calculada, com boa aproximação, pela equação
L=
NΦ
i
(4)
onde N é o número total de espiras do indutor, e o produto N é chamado de fluxo concatenado, ou
enlaçamento de fluxo magnético (RESNICK; HALLIDAY; WALKER, 2007).
O fluxo magnético através da área interna do indutor associada às N espiras, é dado por
Φ=BA
(5)
onde A é a área de seção reta do indutor e B o campo magnético em seu interior. A indutância L de
um solenoide, combinando as equações (5) e (3) na equação (4), será dada por
2
L=µ0 n lA
(6)
Portanto, a indutância por unidade de comprimento, próximo ao centro de um solenoide será
L
=µ0 n 2 A
l
(7)
podemos observar que a equação (6) depende apenas da geometria da bobina. No SI, a unidade de
indutância é o T•m2/A, também chamada henry (H). Como um Henry (1 H) é um valor muito
grande de indutância, os indutores utilizados em circuitos reais, possui submúltiplos do henry como
microhenry ( H) e o milihenry (mH).
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2. MATERIAIS E MÉTODOS
Para a construção do equipamento foi utilizada uma base de madeira compensada (13,0±0,5
cm por 21,0±0,5 cm), uma calculadora comum, adquirida no comércio popular, uma haste
rosqueada, adquirida em lojas de parafusos, que servirá de eixo, uma manivela, um esticador para
alinhar o fio esmaltado, conectores e o sensor de toque, figura 4.
Figura 4: Descrição do aparelho utilizado (ARQUIVOS DO AUTOR).
Nesta haste encontram-se dois discos de madeira onde se prenderá o carretel utilizado para
confeccionar a bobina. Em um dos discos encontra-se um dente, figura 5, que tem a função de
acionar o sensor de toque, figura 6c, ao passar por ele. Em uma das extremidades do eixo está
acoplada uma manivela, que girará o carretel para o enrolamento da bobina. Abaixo existe um
esticador, que manterá a tensão no fio quando a bobina estiver sendo confeccionada.
Figura 5: Detalhe do sensor de toque e seu acionamento (ARQUIVOS DO AUTOR).
Para a conexão do sensor de toque na calculadora, será utilizado um plugue P2 fêmea
(também chamada de Jack P2), figura 6a, e um plugue P2 macho (também chamado de conector
P2), figura 6b.
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Figura 6: a) Plugue P2 fêmea, b) plugue P2 macho, c) Sensor de toque.
O plugue P2 fêmea foi colocado na lateral da calculadora. Nele estão soldados dois fios,
provenientes da placa de circuito impresso, isto é, nas extremidades onde o botão de toque do sinal
de igual (=) se conecta, figura 7.
Figura 7: plugue P2 fêmea (Jack P2) e Solda na placa de circuito (ARQUIVOS DO AUTOR).
O plugue P2, figura 6b, está conectado diretamente ao sensor de toque via cabo mono, figura 8.
Figura 8: Sensor de Toque e conexão via plugue P2 com a calculadora (ARQUIVOS DO AUTOR).
Para o início da contagem das espiras, com a calculadora ligada, os botões 1 (um), o sinal de
soma (+) e o 1 (um) novamente, deverão ser pressionados respectivamente. Como resultado, toda
vez que o sensor de toque for pressionado, uma unidade será somada ao número anterior.
O carretel utilizado para construção da bobina, que servirá de teste, foi utilizado para enrolar
esparadrapo e pode ser adquirido em qualquer farmácia ou drogaria. Suas dimensões estão descritas
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na figura 9.
Figura 9: Dimensões da bobina (ARQUIVOS DO AUTOR).
Para testar o equipamento, foi confeccionado um indutor de 0,50 mH, com fio esmaltado de
0,4 mm de diâmetro, ou fio 26 AWG. Para a determinação correta do número de espiras, foi
utilizado um software chamado CalcBob, adquirido gratuitamente via internet (ALMEIDA, 2001).
Este programa foi concebido especificamente para o cálculo da indutância, ou das dimensões, de
bobinas com núcleo de ar, possuindo uma ou mais camadas.
Quando CalcBob é executado, uma janela é aberta como na figura 10.
Figura 10: Programa executável para cálculo do número e espiras (ALMEIDA, 2001).
Inicialmente deve-se marcar “Calcular dimensões da bobina fornecendo L”, isto é,
fornecendo a indutância desejada, figura 11 a), já que necessitamos de um indutor com 0,50 mH.
Logo depois deve-se marcar a quantidade de camadas que a bobina terá: uma camada ou várias
camadas. No caso, foi marcado em camadas de espiras, “Várias camadas”, figura 11 b).
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Figura 11: a) escolha do modo de cálculo; b) Escolha da quantidade de camadas (ALMEIDA, 2001).
Nos campos vazios, figura 12, serão inseridos os dados da indutância desejada, diâmetro do
núcleo, diâmetro do fio esmaltado que será utilizado para construção do indutor, e a largura do
enrolamento, com na figura 9.
Figura 12: Dados da construção do indutor (ALMEIDA, 2001).
Na figura 13, o carretel está posicionado e a bobina sendo confeccionada com os dados
fornecidos pelo software.
Figura 13: Enrolando a bobina com o enrolador didático (ARQUIVOS DO AUTOR).
A figura 14 representa a bobina já confeccionada com 166 espiras bem próximas umas das
outras.
Figura 14: Bobina já enrolada uniformemente (ARQUIVOS DO AUTOR).
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3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A construção deste equipamento proporcionará ao aluno, além de um contato com as novas
tecnologias, pois utiliza softwares livres, como embasamento teórico para o cálculo da quantidade
de espiras, uma aproximação com a prática de instrumentação para ensino, já que a construção
cuidadosa do componente eletrônico mostra, como resultado, a necessidade de procedimentos
experimentais mais apurados.
Logo após a confecção da bobina, utilizou-se um multímetro da marca ICEL-Manaus,
modelo MD-6130, que possui a função de medir indutâncias, figura 15, para medir o valor da
indutância da bobina.
Figura 15: Seletor do multímetro posicionado em Indutância(20 mH) (ARQUIVOS DO AUTOR).
Ao fixar as extremidades da bobina nos terminais do multímetro, podemos observar que o
valor indicado no visor digital é praticamente a mesma que, de início, foi proposto, 0,50 mH, figura
16.
Figura 16: Multímetro MD-6130 indicando a indutância da bobina enrolada (ARQUIVOS DO AUTOR).
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4. CONCLUSÕES
Considerando que o enrolamento de indutores de forma manual é exaustiva e, por sua vez,
não resulta em bobinas de qualidade, a construção de um aparelho que quantifique o número de
espiras é de extrema importância para compor os equipamentos de um laboratório didático, que
tenha como principal objetivo o ensino de eletromagnetismo.
Utilizando o equipamento, foi observado que o enrolamento da bobina ocorreu com rapidez
e que suas espiras se posicionaram bem próximas umas das outras, figura 12. O auxílio do software
CalcBob, mostrou-se bastante eficaz, já que desejava-se de início construir uma bobina de 0,50 mH,
e o resultado obtido, medido, foi de 0,49 mH. Com erro de aproximadamente 2%, no valor da
bobina construída, portanto o equipamento mostrou-se eficiente.
Sendo assim, a utilização do enrolador de indutores, proporcionou um ótimo resultado final,
dentro do aspecto didático. Como esperado, este equipamento poderá ser utilizado para auxiliar no
ensino dos conceitos eletromagnéticos, produzindo visões qualitativas e quantitativas do
componente eletrônico chamado Indutor.
5. AGRADECIMENTOS
Agradeço ao coordenador do Grupo de Pesquisa em Ensino e Física, do Departamento de Física da
UFRRJ, Frederico Alan de Oliveira Cruz, por suas valiosas observações e sugestões.
6. REFERÊNCIAS
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<http://goo.gl/bYI2W>, acesso 05 jun. 2012.
AUTO SOM. Tudo Sobre Bobinas de Alto-Falantes: Bobinas Móveis e as suas principais
características. 2006. Disponível em: <http://goo.gl/4Cwv2>, Acesso em: 28 out. 2012.
BOYLESTAD, R. L. Introdução a Analise de Circuitos. ed. Pearson Prentice Hall, São Paulo.
2004, 10° ed.
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LAUDARES, F. A. L., CRUZ, F. A. O. Lei de Faraday-Lenz: Uma demonstração usando a entrada
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MIRANDA, P. C. Estudo do Campo Magnético no Interior de um Solenóide. Lisboa: Universidade
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