CAPÍTULO 1 A DIFERENÇA ENTRE MORAL E ÉTICA Os conceitos

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CAPÍTULO 1 A DIFERENÇA ENTRE MORAL E ÉTICA Os conceitos
* ATENÇÃO: Copiar é CRIME. Art. 184 do código Penal e Lei n° 5998/73
A educação desenha o futuro – Ensino Médio – Ética: filosofia moral – Prof. Ulisses Vasconcelos
portanto, ao senso moral e à consciência ética
individuais.
CAPÍTULO 1
A DIFERENÇA ENTRE MORAL E ÉTICA
Os conceitos de Moral e Ética, embora
sejam diferentes, são com freqüência usados
como sinônimos. Moral vem do latim mos ou
moris, que significa “maneira de se comportar
regulada pelo uso”; daí relacionarmos o termo
“moral” com “costume”, e de moralis, morale,
adjetivo referente ao que é “relativo aos
costumes”. Ética vem do grego ethos, que tem o
mesmo significado de “caráter”, “costume”. O
sentido que os antigos gregos atribuíam ao
homem de bons costumes era o mesmo do homem
de boa índole, de bom caráter. Por isso, os termos
Moral e Ética se confundem, mas guardam entre
si certas diferenças.
Moral é o conjunto das regras ou normas
de conduta admitidas por uma sociedade ou por
um grupo de homens em determinada época.
Assim, o homem moral é aquele que age bem ou
mal na medida em que acata ou transgride as
regras do grupo.
60
A Moral, ao mesmo tempo que é o
conjunto de regras que determina como deve ser o
comportamento dos indivíduos do grupo, é
também a livre e consciente aceitação das normas.
Isso significa que o ato só é propriamente moral
se passar pelo crivo da aceitação pessoal da
norma. A exterioridade da moral contrapõe-se à
necessidade da interioridade, da adesão mais
íntima.
Os costumes, porque são anteriores ao
nosso nascimento e formam o tecido da sociedade
em
que
vivemos,
são
considerados
inquestionáveis e quase sagrados (as religiões
tendem a mostrá-los como tendo sido ordenados
pelos deuses, na origem dos tempos). Ora, a
palavra costume se diz, em grego, ethos – donde,
ética – e, em latim, moris – donde, moral. Em
outras palavras, ética e moral referem-se ao
30 conjunto de costumes tradicionais de uma
sociedade e que, como tais, são considerados
valores e obrigações para a conduta de seus
membros.
Portanto, o homem, ao mesmo tempo que
é herdeiro, é criador de cultura, e só terá vida
autenticamente moral se, diante da moral
constituída, for capaz de propor a moral
constituinte; aquela que é feita dolorosamente por
meio das experiências vividas. Mesmo quando
queremos manter as antigas normas, há situações
críticas enfrentadas devido à especificidade de
cada acontecimento. Por isso a cisão também
pode ocorrer a partir do enredo de cada drama
pessoal: a singularidade do ato moral nos coloca
em situações originais em que só o indivíduo livre
e responsável é capaz de decidir.
A língua grega possui uma outra palavra
que precisa ser escrita em português com as
mesmas letras que a palavra que significa
costume: ethos. Em grego, existem duas vogais
para pronunciar e grafar nossa vogal e: uma vogal
breve, chamada epsilon, e uma vogal longa,
chamada eta. Ethos, escrita com a vogal longa,
significa costume; porém, escrita com a vogal
breve, significa caráter, índole natural,
temperamento, conjunto das disposições físicas e
psíquicas de uma pessoa. Nesse segundo sentido,
ethos se refere às características pessoais de cada
um que determina quais virtudes e quais vícios
cada um é capaz de praticar. Referem-se,
Ética ou filosofia moral, é a disciplina
filosófica que se ocupa com a reflexão a respeito
das noções e princípios que fundamentam a vida
moral. Essa reflexão pode seguir as mais diversas
direções, dependendo da concepção de homem
que se toma como ponto de partida.
Assim, à pergunta “o que é o bem e o
mal”, respondemos diferentemente, caso o
90 fundamento da moral esteja na ordem cósmica, na
vontade de Deus ou em nenhuma ordem exterior à
própria consciência humana. Podemos perguntar
ainda: Há uma hierarquia de valores ? Se houver,
o bem supremo é a felicidade? É o prazer ? É a
atividade ? É o dever ?
Por outro lado, é possível questionar: Os
valores são essências ? Têm conteúdo
determinado, universal, válido em todos os
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tempos e lugares ? Ou, ao contrário, são relativos?
Ou, ainda, haveria possibilidade de superação das
duas posições contraditórias do universalismo e
do relativismo ? As respostas a essas e outras
questões nos darão as diversas concepções de vida
moral elaboradas pelos filósofos através dos
tempos.

PARA FIXAR
 MORAL: conjunto dos costumes e juízos
morais de um indivíduo ou de uma sociedade que
possui
caráter
normativo
(regras
do
comportamento das pessoas no grupo). Conjunto
de regras que visa orientar a ação humana,
submetendo-a ao dever, tendo em vista o bem e o
mal. Conjunto de normas livre e conscientemente
aceitas que visam organizar as relações dos
indivíduos na sociedade.
 ÉTICA: parte da filosofia que se ocupa com a
reflexão a respeito das noções e dos princípios
que fundamentam a vida moral. A ética é uma
disciplina teórica sobre a prática humana, que é o
costume ou o comportamento humano. No
entanto, as reflexões éticas não se restringem
apenas à busca de conhecimento teórico sobre
valores humanos, cuja origem e desenvolvimento
levantam questões de caráter sociológico,
antropológico, biológico, religioso etc. A ética é
uma filosofia prática, ou seja, uma reflexão sobre
a práxis (ação prática) em todos os setores da vida
30 humana.
 VALOR: algo possui valor quando não permite
que permaneçamos indiferentes (a não-indiferença
é a essência do valor). Frequentemente emitimos
juízos de valor quando os fatos (juízos de fatos –
a existência efetiva – que dizem como são as
coisas, como são e por que são) nos provoca um
sentimento de atração ou de repulsa (juízos de
valor – avaliações sobre coisas, pessoas, situações
que são proferidos na moral, nas artes, na política,
na religião etc.). Juízos de valor avaliam coisas,
pessoas, ações, experiências, acontecimentos,
sentimentos, estados de espírito, intenções e
decisões como bons ou maus, desejáveis ou
indesejáveis. Os juízos éticos de valor são
normativos, isto é, enunciam normas que
determinam o dever ser de nossos sentimentos,
nossos atos, nossos comportamentos. São juízos
que enunciam obrigações, dever, e avaliam
intenções e ações segundo o critério do correto e
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do incorreto. Os juízos éticos de valor nos dizem
o que são o bem, o mal, a felicidade. Os juízos
éticos normativos nos dizem que sentimentos,
intenções, atos e comportamentos devemos ter ou
fazer para alcançarmos o bem e a felicidade.
Enunciam também que atos, sentimentos,
intenções e comportamentos são condenáveis ou
incorretos do ponto de vista moral.
 SENSO OU CONSCIÊNCIA MORAL:
referem-se a valores éticos (justiça, honradez,
60 espírito de sacrifício, integridade, generosidade) e
as decisões que conduzem a ações com
conseqüências para nós e para os outros. Os
sentimentos e as ações, nascidos de uma opção
entre o bem e o mal se referem a algo mais
profundo e subentendido: nosso desejo de afastar
a dor e o sofrimento e de alcançar a felicidade,
seja por ficarmos contentes conosco mesmo, seja
para recebermos a aprovação dos outros.
 ATO MORAL E ATO IMORAL: o ato moral
é constituído de dois aspectos: o normativo e o
fatual. O normativo são as normas ou regras de
ação e os imperativos que enunciam o dever ser.
O fatual são os atos humanos enquanto se
realizam efetivamente. Pertencem ao âmbito do
normativo regras como: “Cumpra a sua obrigação
de estudar”; “Não minta”; “Não roube”; “Não
mate”. O campo do fatual é a efetivação ou não da
norma na experiência vivida. Os dois pólos são
distintos, mas inseparáveis. A norma só tem
sentido se orientada para a prática, e o fatual só
adquire contorno moral quando se refere à norma.
O ato efetivo será moral ou imoral, conforme
esteja de acordo ou não com a norma
estabelecida. Por exemplo, diante da norma “Não
minta”, o ato de mentir será considerado imoral.
O ato só pode ser moral ou imoral se o indivíduo
introjetou a norma e a tornou sua, livre e
conscientemente.
 ATO AMORAL: considera-se amoral o ato
90 realizado à margem de qualquer consideração a
respeito das normas. Trata-se da redução ao
fatual, negando o normativo. O homem “sem
princípios” quer pautar sua conduta a partir de
situações do presente e ao sabor das decisões
momentâneas, sem nenhuma referência a valores.
É a negação da moral.
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60
PARA REFLETIR ou FILOSOFAR
SENSO MORAL E CONSCIÊNCIA MORAL
Por Marilena Chaui *
Muitas vezes, tomamos conhecimento de movimentos
nacionais e internacionais de luta contra a fome. Ficamos sabendo
que, em outros países e no nosso, milhares de pessoas, sobretudo
crianças e velhos, morrem de penúria e inanição. Sentimos
piedade. Sentimos indignação diante de tamanha injustiça
(especialmente quando vemos o desperdício dos que não têm fome
e vivem na abundância). Sentimos responsabilidade. Movidos pela
solidariedade, participamos de campanhas contra a fome. Nossos
sentimentos e nossas ações exprimem nosso senso moral.
Quantas vezes, levados por algum impulso incontrolável
ou por alguma emoção forte (medo, orgulho, ambição, vaidade,
covardia), fazemos alguma coisa de que, depois, sentimos
vergonha, remorso, culpa. Gostaríamos de voltar atrás no tempo e
agir de modo diferente. Esses sentimentos também exprimem
nosso senso moral.
Em muitas ocasiões, ficamos contente e emocionados
diante de uma pessoa cujas palavras e ações manifestam
honestidade, honradez, espírito de justiça, altruísmo, mesmo
quando tudo isso lhe custa sacrifício. Sentimos que há grandeza e
dignidade nessa pessoa. Temos admiração por ela e desejamos
imitá-la. Tais sentimentos e admiração também exprimem nosso
senso moral.
Não raras vezes somos tomados pelo horror diante da
violência: chacina de seres humanos e animais, linchamentos,
assassinatos brutais, estupros, genocídio, torturas e suplícios. Com
freqüência, ficamos indignados ao saber que um inocente foi
injustamente acusado e condenado, enquanto o verdadeiro culpado
permanece impune. Sentimos cólera diante do cinismo dos
mentirosos, dos que usam outras pessoas como instrumento para
seus interesses e para conseguir vantagens às custas da boa-fé de
outros. Todos esses sentimentos também manifestam nossos senso
moral.
Vivemos certas situações, ou sabemos que foram vividas
por outros, como situações de extrema aflição e angústia. Assim,
por exemplo, uma pessoa querida, com uma doença terminal, está
viva apenas porque seu corpo está ligado a máquinas que a
conservam. Suas dores são intoleráveis. Inconsciente, geme no
sofrimento. Não seria melhor que descansasse em paz ? Não seria
preferível deixá-la morrer ? Podemos desligar os aparelhos ? Ou
não temos o direito de fazê-lo ? Que fazer ? Qual a ação correta ?
Uma jovem descobre que está grávida. Sente que seu
corpo e seu espírito ainda não estão preparados para a gravidez.
Sabe que seu parceiro, mesmo que deseje apoiá-la, e tão jovem e
despreparado quanto ela e que ambos não terão como
responsabilizar-se plenamente pela gestação, pelo parto e pela
criação de um filho. Ambos são desorientados. Não sabem se
poderão contar como o auxílio de suas famílias (se as tiverem).
Se ela for apenas estudante, terá que deixar a escola para
trabalhar, a fim de pagar o parto e arcar com as despesas da
criança. Sua vida e seu futuro mudarão para sempre. Se trabalha,
sabe que perderá o emprego, porque vive numa sociedade onde os
padrões discriminam as mulheres grávidas, sobretudo as solteiras.
Receia não contar com os amigos. Ao mesmo tempo, porém,
deseja a criança, sonha com ela, mas teme dar-lhe uma vida de
miséria e ser injusta com quem não pediu para nascer. Pode fazer
um aborto ? Deve fazê-lo ?
Um pai de família desempregado, com vários filhos
pequenos e a esposa doente, recebe uma oferta de emprego, mas
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que exige que seja desonesto e cometa irregularidades que
beneficiem seu patrão. Sabe que o trabalho lhe permitirá sustentar
os filhos e pagar o tratamento da esposa. Pode aceitar o emprego,
mesmo sabendo o que será exigido dele ? Ou deve recusá-lo e ver
os filhos com fome e a mulher morrendo ?
Um rapaz namora, há tempos, uma moça de quem gosta
muito e é por ela correspondido. Conhece uma outra. Apaixona-se
perdidamente e é também correspondido. Ama duas mulheres e
ambas o amam. Pode ter dois amores simultâneos, ou estará
traindo a ambos e a si mesmo ? Deve magoar uma delas e a si
mesmo, rompendo com uma para ficar com a outra ? O amor exige
uma única pessoa amada ou pode ser múltiplo ? Que sentirão as
duas mulheres, se ele lhes contar o que se passa ? Ou deverá
mentir para ambas ? Que fazer ? Se, enquanto está atormentado
pela indecisão, um conhecido o vê ora com uma das mulheres, ora
com a outra e, conhecendo uma delas, deverá contar a ela o que
viu? Em nome da amizade, deve falar ou calar ?
Uma mulher vê um roubo. Vê uma criança maltrapilha e
esfomeada roubar frutas e pães numa mercearia. Sabe que o dono
da mercearia está passando por muitas dificuldades e que o roubo
fará diferença para ele. Mas também vê a miséria e a fome da
criança. Deve denunciá-la, julgando que com isso a criança não se
tornará um adulto ladrão e o proprietário da mercearia não terá
prejuízo ? Ou deverá silenciar, pois a criança corre o risco de
receber punição excessiva, ser levada para a polícia, ser jogada
novamente às ruas e, agora, revoltada, passar do furto ao
homicídio ? Que fazer ?
Situações como essas – mais dramáticas ou menos
dramáticas – surgem sempre em nossas vidas. Nossas dúvidas
quanto a decisão a tomar não manifestam nosso senso moral, mas
põem à prova nossa consciência moral, pois exigem que
decidamos o que fazer, que justifiquemos para nós mesmos e para
os outros as razões de nossas decisões e que assumamos todas as
conseqüências delas, porque somos responsáveis por nossas
opções.
Todos os exemplos mencionados indicam que o senso
moral e a consciência moral referem-se a valores (justiça,
honradez, espírito de sacrifício, integridade, generosidade), a
sentimentos provocados pelos valores (admiração, vergonha,
culpa, remorso, contentamento), que conduzem a ações com
consequências para nós e para os outros. Embora os conteúdos dos
valores variem, podemos notar que estão referidos a um valor mais
profundo, mesmo que apenas subentendido: o bom ou o bem. Os
sentimentos e as ações, nascidos de uma opção entre o bom e o
mau ou entre o bem e o mal, também estão referidos a algo mais
profundo e subentendido: nosso desejo de afastar a dor e o
sofrimento e de alcançar a felicidade, seja por ficarmos contentes
conosco mesmos, seja por recebermos a aprovação dos outros.
O senso e a consciência moral dizem respeito a valores,
sentimentos, intenções, decisões e ações referidos ao bem e ao mal
e ao desejo de felicidade. Dizem respeito as relações que
mantemos com os outros e, portanto, nascem e existem como parte
de nossa vida intersubjetiva, isto é, de nossas relações com outros
sujeitos morais. ©
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* MARILENA CHAUI. Professora na Universidade de São Paulo (USP)
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Juízo de fato e Juízo de valor
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Se dissermos, “Está chovendo”, estaremos
enunciando um acontecimento constatado por nós
e o juízo proferido é um juízo de fato. Se, porém,
falarmos, “A chuva é boa para as plantas” ou “A
chuva é bela”, estaremos interpretando e
avaliando o acontecimento; nesse caso,
proferimos um juízo de valor.
Juízos de fato são aqueles que dizem o que as
coisas são, como são e por que são. Em nossa
vida cotidiana, mas também na metafísica e nas
ciências, os juízos de fato estão presentes.
Diferentemente deles, os juízos de valor, são
avaliações sobre coisas, pessoas, situações e são
proferidos na moral, nas artes, na política, na
religião.
Juízo de valor avaliam coisas, pessoas,
ações, experiências, acontecimentos, sentimentos,
estados de espírito, intenções e decisões como
bons ou maus, desejáveis ou indesejáveis.
Os juízos éticos de valor são também
normativos, isto é, enunciam normas que
determinam o dever ser de nossos sentimentos,
nossos atos, nossos comportamentos. São juízos
que enunciam obrigações e avaliam intenções e
ações segundo o critério do correto e do incorreto.
Os juízos éticos de valor nos dizem o que
30 são o bem, o mal, a felicidade. Os juízos éticos
normativos nos dizem que sentimentos,
intenções, atos e comportamentos devemos ter ou
fazer para alcançarmos o bem e a felicidade.
Enunciam também que atos, sentimentos,
intenções e comportamentos são condenáveis ou
incorretos do ponto de vista moral.
Como se pode observar, senso moral e
consciência moral são inseparáveis da vida
cultural, uma vez que esta define para seus
membros os valores positivos e negativos que
devem respeitar ou detestar.
Qual a origem da diferença entre os dois
tipos de juízos ? A diferença entre a Natureza e a
Cultura. A primeira, como vimos, é constituída
por estruturas e processos necessários que existem
em si e por si mesmos, independentemente de
nós: a chuva é um fenômeno meteorológico, cujas
causas e efeitos necessários podemos constatar e
explicar.
Por sua vez, a Cultura nasce da maneira
como os seres humanos interpretam-se a si
mesmos e as suas relações com a Natureza,
acrescentando-lhe sentidos novos, intervindo nela,
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alterando-a através do trabalho e da técnica,
dando-lhe valores. Dizer que a chuva é boa para
as plantas pressupõe a relação cultural dos
humanos com a Natureza, através da agricultura.
Considerar a chuva bela pressupõe uma relação
valorativa dos humanos com a Natureza,
60 percebida como objeto de contemplação.
Frequentemente, não notamos a origem
cultural dos valores éticos, do senso moral e da
consciência moral, porque somos educados
(cultivados) para eles e neles, como se fossem
naturais ou fáticos, existentes em si e por si
mesmos. Para garantir a manutenção dos padrões
morais através do tempo e sua continuidade de
geração a geração, as sociedades tendem a
naturalizá-los. A naturalização da existência
moral esconde, portanto, o mais importante da
ética: o fato de ela ser criação histórico-cultural.
Os valores
Mas o que são valores ? Embora a
preocupação com os valores seja tão antiga como
a humanidade, só no século XIX surge uma
disciplina específica, a teoria dos valores ou
Axiologia (do grego axios, “valor”). A Axiologia
não se ocupa dos seres, mas das relações que se
estabelecem entre os seres e o sujeito que os
aprecia.
Diante dos seres (sejam eles coisas inertes,
ou seres vivos, ou idéias etc.) somos mobilizados
pela afetividade, somos afetados de alguma forma
por eles, porque nos atraem ou provocam nossas
repulsa. Portanto, algo possui valor quando não
permite que permaneçamos indiferentes. É nesse
sentido que García Morente diz: “Os valores não
90 são, mas valem. Uma coisa é valor e outra coisa é
ser. Quando dizemos de algo que vale, não
dizemos nada do seu ser, mas dizemos que não é
indiferente. A não-indiferença constitui esta
variedade ontológica que contrapõe o valor ao
ser. A não-indiferença é a essência do valer”1.
Os valores são, num primeiro momento,
herdados por nós.
O mundo cultural é um sistema de
significados já estabelecidos por outros, de tal
modo que aprendemos desde cedo como nos
comportar à mesa, na rua, diante de estranhos,
como, quando e quanto falar em determinadas
circunstâncias; como andar, correr, brincar; como
cobrir o corpo e quando desnudá-lo; qual o padrão
de beleza; que direitos e deveres temos. Conforme
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atendemos ou transgredimos os padrões, os
comportamentos são avaliados bons ou maus.
A partir da valoração, as pessoas nos
recriminam por não termos seguido as formas da
boa educação ao não ter cedido lugar à pessoa
mais velha; ou nos elogiam por sabermos escolher
as cores mais bonitas para a decoração de um
ambiente; ou nos admoestam por termos faltado
com a verdade. Nós próprios nos alegramos ou
nos arrependemos ou até sentimos remorsos
dependendo da ação praticada. Isso quer dizer que
o resultado de nossos atos está sujeito à sanção,
ou seja, ao elogio ou à reprimenda, à recompensa
ou à punição, nas mais diversas intensidades,
desde “aquele” olhar da mãe, a crítica de um
amigo, a indignação ou até a coerção física (isto é,
a repressão pelo uso da força).
1
García Morente, M. Fundamentos de filosofia; lições preliminares.p.296.
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
90
PARA REFLETIR ou FILOSOFAR
A boa e velha ética
Por Paulo Ghiraldelli Jr.*
30
60
Durante os dias do julgamento dos acusados da morte de
Isabela Nardoni, um grupo de pessoas atacou fisicamente o
advogado do casal Nardoni, então responsabilizados pelo
assassinato da garota. O grupo pôs de lado o “direito de defesa”,
pertencente aos nossos costumes e vigente em nossa legislação.
Tudo ocorreu como se quisessem que o advogado abandonasse o
caso. Ora, se o advogado abandonasse os Nardoni, mediante
pressão popular, com este defensor deveria ser entendido ?
Caso o advogado largasse os Nardoni, eticamente ele
teria cometido uma falta grave. Tomada como um todo, nossa
sociedade espera que um advogado acredite na inocência (ou parte
dela) do seu cliente e vá até o fim na defesa. Em termos mais
gerais, nossa idéia básica é que o advogado, mais do que qualquer
outro cidadão, leve a sério o preceito “todos são inocentes até que
se prove o contrário”, vigente como valor, regra e lei em nossa
sociedade. Caso tivesse desistido, moralmente ele também ficaria
em dívida, ao menos consigo mesmo, pois agiria segundo uma
qualidade moral pouco louvável entre nós, a covardia.
Esse assunto nos conduz à seguinte pergunta: qual a
diferença entre ética e moral ?
Ética diz respeito a costumes, hábitos e valores
relativamente coletivos, assumidos por indivíduos de um grupo
social, uma sociedade ou uma nação. No caso, pode-se comentar o
seguinte: os indivíduos que queriam que nenhum advogado
defendesse os Nardoni se mostraram hostis ao nosso costume
social e jogaram pela janela valores caros ao Ocidente. Eles
estavam em dissonância com o ethos de nossa nação,
especialmente porque queriam que o próprio advogado também
atravessasse o comportamento ético.
Moral diz respeito a hábitos, costumes e valores
assumidos por indivíduos de um grupo social, uma sociedade ou
uma nação; todavia, o comportamento desenvolvido por tal
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assunção está diretamente relacionado à psique de cada um e,
também, à sua personalidade e até mesmo ao que chamaríamos de
suas idiossincrasias (do grego Tidios, “próprio de si” + Sunkrasis, “mistura”), termo grego que diz respeito à capacidade de
cada indivíduo de enxergar o universo de uma maneira própria.
Moral tem a ver com o que o indivíduo faz ou deixa de fazer
quanto a situações que a sociedade determina como particulares;
abarca relações de um indivíduo consigo mesmo e com as pessoas
mais queridas, mais próximas. Caso o advogado dos Nardoni
tivesse cedido aos agressores e desistido do caso, talvez estes
mesmos viessem a dizer que ele agiu como um “homem de moral
fraca”. Ele seria, então, caracterizado como alguém que não
honrou o nosso mores.
Ética e moral não são a mesma coisa. Aliás, suas origens
etimológicas assim dizem: ética vem do grego ethos e moral
origina-se do latim mores. Delimitam, respectivamente,
comportamentos sociais universais e comportamentos sociais
particulares. Em sociedades ocidentais modernas e liberais, em que
há um recorte claro e razoavelmente bem definido da esfera
pública e da esfera particular, a ética cai no primeiro campo e
moral no segundo.
Com isso, não se quer dizer que, em uma sociedade
moderna, ocidental e liberal como a nossa, que faz recortes
razoavelmente delimitados entre o que é a esfera pública e o que é
a esfera privada, o que é do âmbito moral não possa vir a público,
ou seja, não possa ser exposto a um público. Em várias situações
notáveis, isto é, em casos polêmicos, o que ocorre é exatamente
essa transposição do que é privado para o âmbito público. Não
raro, é justamente nessa hora que percebemos a diferença entre um
caso e outro, entre situação moral e situação ética.
O caso de Ronaldinho com os travestis foi um episódio
moral, não propriamente ético. Que Ronaldinho tenha preferência
sexual rotineira ou não por travestis é algo da sua psique. É um
gosto dele, uma idiossincrasia sua, digamos assim. Nesse sentido,
em nossa sociedade, é algo do âmbito moral. Em nossa sociedade
– ocidental, moderna e liberal – o gosto sexual tende a ser tomado
como algo da personalidade de cada um e, portanto, deve pertencer
ao campo privado. Dessa forma, a moral que, enfim, encontra-se
na particularidade, adentra uma esfera afinada com a
particularidade, a esfera da privacidade. O gosto por travestis do
Ronaldinho diz respeito a ele e tão-somente a ele. Por isso mesmo,
ele foi para um motel, para o divertimento privado. Quando o caso
chegou à imprensa, ainda assim ele permaneceu um caso moral. ©
* Paulo Ghiraldelli Jr.: é filósofo, escritor e professor da UFRRJ.
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AGORA É COM VOCÊ !
Exercícios Propostos
1) Quais os significados dos termos Moral e Ética ?
2) Estabeleça a diferença fundamental entre os conceitos de
Moral e Ética.
3) Por que Ética é filosofia prática ?
4) Estabeleça a diferença entre ato moral, imoral e amoral.
5) O que é senso moral e consciência moral ?
6) Estabeleça a diferença entre juízo de fato e juízo de valor.
120 7) O que são valores éticos morais ? Cite exemplos.
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8) Leia o texto de Paulo Ghiraldelli Jr e responda: qual a
diferença entre Ética e Moral levando em consideração as
esferas pública e privada de nossa sociedade ?
CAPÍTULO 2
A MORAL EM QUESTÃO
Ética e Metaética
valor estabelecida
1776).
por David Hume (1711-
“A parede da sala é branca” é uma frase factual,
enquanto que “A parede da sala é horrível” é uma
frase valorativa. Sendo um fato da natureza
60 humana pode, então, ser tido como normal e
indicado como o que deve ser aceito – afinal,
quem estaria autorizado a mudar a natureza
humana ?
Por Paulo Ghiraldelli Jr.
A investigação da ética remonta aos
primórdios da atividade filosófica. Sócrates se
caracterizou por fazer perguntas ético-morais.
Todavia, foi Platão quem inventou a discussão
ética, o que denominamos hoje de metaética.
Enquanto campo de estudo e investigação, a ética
se responsabiliza pela discussão das normas e
regras de conduta e, portanto, tem como objeto as
morais vigentes. A metaética, por sua vez, é um
discurso de segunda ordem que se põe
filosoficamente para validar ou não preceitos
ético-morais vigentes. A metaética diz respeito a
fundamentos e/ou justificativas da moral.
Em termos acadêmicos atuais, as posições
metaéticas formam três grandes guarda-chuvas: o
naturalismo, o relativismo e o emotivismo. No
30 âmbito propriamente ético, a tendência é dividir a
normatividade a partir de éticas do dever e éticas
consequencialistas. A ética judaico-cristã e a
Kantiana são do primeiro tipo, o utilitarismo é do
segundo tipo.
Naturalismo
A noção de “natureza humana” já
desfrutou de muito mais prestígio do que hoje
possui entre os filósofos. Todavia, no âmbito do
senso comum, ainda é utilizada como um porto
seguro. Uma boa parte das pessoas se tranqüiliza
quando, diante do relato de uma situação vivida
por outros ou por si mesma, a avaliação moral
recebida vem junto à frase “ah, isso é normal, é
próprio da natureza”. O que é um fato que pode
ser classificado como “da natureza humana”
serve, então, de fundamento ético para o
comportamento moral – por mais esquisito que
este possa parecer em um primeiro momento.
A ideia básica nesse caso está lá no século
XVII, especialmente na distinção entre fato e
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David Hume. Filósofo e historiador escocês (1711-1776), considerado
fundador da escola cética, o chamado Empirismo.
Um exemplo. Recentemente houve estupro
de garotas (inclusive com mortes) e a explicação
dada ao ocorrido foi que elas estavam usando a
“pulseira do sexo”.
A pulseira marca uma atividade de
paquera – nela está escrito “beijo”, “abraço” etc.
A garota que a usa estaria, em princípio,
permitindo uma brincadeira junto aos colegas ou
pretendentes; se eles arrancam a pulseira estão
aptos a realizar o que está gravado no objeto.
Nada além de uma brincadeira pré-adolescente,
como era o “correio elegante”, o bilhete que
meninos e meninas trocavam em festas escolares
há alguns anos passados e que, talvez, ainda
troquem hoje em dia.
Nos Estados em que ocorreu o caso, as
autoridades se preocuparam antes em proibir o
uso da “pulseira do sexo” que condenar veemente
o estupro e nele ficar. Assim, mais uma vez, a
mulher foi punida duplamente. Nessa situação,
90 ocorreu a conhecida posição que imputa culpa à
vítima. No limite, as mulheres que usam um
adorno, no caso a “pulseira do sexo”, são
responsabilizadas pelos ataques que vierem a
sofrer de malfeitores. Elas não deveriam estar
usando aquilo, pois, como concluíram as
autoridades de modo completamente irracional, a
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pulseira seria o chamariz para o ataque. Em suma,
as autoridades que assim pensaram não disseram,
mas, certamente, estavam com a seguinte diretriz
na cabeça: “É um fato da natureza humana que o
homem se sinta excitado por mulheres que
colocam a pulseira chamando para o sexo”.
Alguns endossariam até mais: “É um fato da
natureza humana que homens que são chamados
para o sexo, uma vez rejeitados, ataquem”.
Assim, a valoração moral da situação que
terminou em estupro e, em alguns casos, em
morte, é tomada de modo bem menos negativo
que a princípio poderia parecer. Há um crime e, é
certo, trata-se de um crime que as autoridades
adoram chamar de “hediondo”, mas que, no caso,
cai sob as graças da avaliação moral, pois, afinal,
a atitude dos criminosos não fugiu do que pode
ser derivado de um “fato da natureza humana”.
Esta posição metaética é base para a
fundamentação de avaliações morais. O filósofo
George Moore (1873-1958) fez a melhor crítica
dessa posição. Essa crítica apareceu como uma
denúncia ao qual ele chamou de “falácia
naturalista”.
Ele não contestou a existência de uma
“natureza humana”. Ele foi mais decisivo, pois
questionou a legitimidade da derivação do “dever
ser” a partir do “ser”. O que se pode tomar como
algo que deveria ocorrer (ou não) não é algo que
30 legitimamente se aponte a partir do que se mostra
como o que é. Um fato não está autorizado a gerar
um dever. Um fato dito “da natureza humana” não
está logicamente autorizado a dizer “o homem
deveria ou poderia agir de um modo ou de outro”.
Norma e valor não podem ser obtidos do fato. A
linha entre norma (ou valor) e fato não traz a
implicação legítima, traz uma relação que conduz
a uma falácia (falso raciocínio). Não é difícil ver,
no caso da “pulseira do sexo”, a falácia em que as
autoridades dos lugares que proibiram o uso do
objeto caíram.
Relativismo
A posição relativista, em uma formulação
simplificada, diz que todos os enunciados que
afirmam o certo e o errado não estão sob o crivo
que deriva de uma autoridade universal e
absoluta. É claro que uma posição como esta
precisa ser discutida, pois ela não é o que se pode
pensar dela inicialmente, uma posição de
autorrefutação.
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Pode-se afirmar legitimamente que há
posições melhores e piores em moral, que somos
capazes de decidir sob quais não viveríamos de
modo algum e sob quais poderíamos, ainda que
descontentes, optar por continuar vivendo. Na
maioria das vezes, temos argumentação suficiente
para dizer isso e convencer outros de nossa
60 razoabilidade, mesmo que não tenhamos nada de
universal e menos ainda de absoluto para invocar
em favor de nossa opção.
O filósofo britânico Bertrand Russel
(1872-1970) criticou os pragmatistas americanos
de sua época, em especial William James e John
Dewey, acusando-os de relativistas. Ele entendia
os relativistas de uma maneira um pouco injusta,
como os que podiam dar guarida a toda e qualquer
ação ou enunciado.
Nas discussões filosóficas sobre o
relativismo, ele cai na berlinda, em geral, diante
de Hitler. O genocídio dos judeus é a pedra de
toque. Há para o relativista um modo de condenar
o nazismo pelo Holocausto ? Ou o relativista é
obrigado a confessar que entre a posição dos que
estiveram no Tribunal de Nuremberg (ocorrido
após a Segunda Guerra Mundial), acusando os
nazistas ali julgados, e os próprios nazistas, não
poderia haver diferença? Segundo alguns
ultradireitistas, ainda hoje, os promotores de
Nuremberg não tinham nenhum elemento nas
mãos além daquele devolvido pelos nazistas a
cada acusação, a saber, que eles estavam ali sendo
julgados única e exclusivamente por terem
perdido a guerra – não eram nem mais e nem
menos criminosos que qualquer outro participante
do conflito.
A posição relativista é boa quando tem de
justificar o que parece a uma cultura apenas
90 idiossincracia de outra, e que, na verdade, tem lá
seu valor perante um bom contingente de pessoas
cultas. O relativismo tem menos sorte quando é
cobrado diante de ter de avaliar genocidas.
O relativismo se complica mais, também,
quando se coloca como base para as avaliações
ético-morais a respeito de atitudes de grupos que
colocam seus semelhantes, os mais desprotegidos,
em situação de sofrer dor ou mesmo de morte.
Acontecimentos recentes nas tribos brasileiras
lembram bem isso. Há tribos que enterram vivas
crianças com algum defeito físico ou mental. Não
são tão diminutos os grupos de antropólogos ou
indigenistas que, utilizando o argumento da
importância do respeito à cultura dos povos,
defendem tal prática.
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Mas o relativista sério sabe que o
relativismo não se presta à legitimação de toda e
qualquer prática. O relativismo implica em dizer
que valores, práticas e enunciados não podem ser
colocados, em princípio, fora do contexto da
discussão racional por conta de qualquer lei
“escrita nas estrelas”. Ou seja, tudo merece
discussão. Até a barbárie merece ser discutida. No
caso de barbáries horríveis – o Holocausto é a
pedra de toque aqui –, nós não deixamos de
discuti-la. Aliás, no Tribunal de Nuremberg foi
dado aos nazistas o direito de defesa. Em
determinado momento do julgamento, eles
chegaram a levar vantagem diante da opinião
pública. Só quando os filmes que eles próprios
fizeram da morte de judeus chegaram a ser
encontrados e exibidos durante o período de
julgamento, para todos que formavam ali o júri, é
que o promotor efetivamente ganhou força no
caso. Muitos que viram as cenas não precisaram
evocar nenhum princípio universal para ter
argumentos contra eles. Aliás, depois da Segunda
Guerra Mundial se elaborou uma nova Carta de
defesa dos Direitos do Homem exatamente para
se ter um parâmetro para uma futura
jurisprudência, o que foi tomado por decisão
histórica e, portanto, sem qualquer legitimidade
outra que não a do desejo dos que a elaboraram de
não ver a barbárie repetida sem que se pudesse
30 dizer: “Isso nós não queremos”.
Tribunal de Nuremberg. Ocorrido após a Segunda Guerra Mundial, em
Nuremberg, na Alemanha, julgou os nazistas que cometeram crimes
durante a guerra, desde irregularidades contra o direito internacional até
assassinatos em massa. De 1945 a 1949, 199 pessoas foram julgadas, sendo
que, desse total, 21 eram líderes nazistas. Um dos réus mais famosos foi o
braço direito de Adolf Hitler, Hermann Goering, que foi condenado à
morte. No entanto, antes de a pena ser aplicada, ele cometeu suicídio na
prisão.
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Emotivismo
O filósofo britânico Alfred J. Ayer, da
linha dos positivistas lógicos, foi um dos
principais defensores do emotivismo. Ele afirmou
que todo e qualquer enunciado ético é sem
sentido, não possui nenhum literalidade – é
alguma coisa que expressa emoção e não fatos.
Expressões de emoção, mesmo que sejam
sentenças, foram tomadas por Ayer como
equivalentes a grunhidos ou sorrisos e, por isso
mesmo, não poderiam receber os adjetivos “falso”
ou “verdadeiro”. Não estando no campo do que é
literal, não pertenceriam ao âmbito do que pode
ser verificado.
60
Ora, sendo assim, mesmo que se coloque
um enunciado do tipo “a tortura é algo errado” em
um documento solene como, por exemplo, a
citada Carta da Defesa dos Direitos do Homem,
há de se ter em mente que se trata de um
enunciado não verificável. “A tortura é algo
errado” equivale a um grito de emoção, algo
como um “buuu” ou “iahhhaa”.
Os filósofos norte-americano e britânicos
que, entre toda a comunidade filosófica, são os
mais familiarizados com essa doutrina, a
denominaram de teoria ética do Boo/Hooray,
lembrando que se alguém está dizendo algo a
respeito de sentimentos está, efetivamente,
grunhindo de modo a incentivar ou reprovar algo,
com o único objetivo de mobilizar ou
desmobilizar ações e conversas.
Poder-se-ia aqui, no caso, também chamar
Hitler ? Sim, claro ! Mas novamente há saídas.
Dizer “buuu” para alguém pode não ser pouca
coisa. Um grito de reprovação é um grito de
reprovação e, uma vez no ar, identifica seu
emissor. Ora, seu emissor pode, por si próprio, ter
status moral suficiente para que outros digam
“ele é uma pessoa razoável, não está aplaudindo
tal enunciado e, então, vou considerar o que ele
tem a argumentar sobre isso”. Podemos conversar
horas, nesse caso, sem encontrarmos leis “escritas
nas estrelas” para justificar o “buuu”, mas, na
discussão, pode-se encontrar uma série de bons
90 argumentos, sentimentais ou pragmáticos, que
indicam muito bem que não é razoável e nada
bom ficar do lado do vaiado. Por exemplo, talvez
possamos mesmo convencer um nazista, que não
seja o próprio Hitler, que a democracia é melhor
para a família dele e de seus filhos que o regime
de força que ele adotou.
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Ética do Dever
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Um religioso guiado pelos Mandamentos
é, antes de tudo, uma pessoa que segue um código
ético-moral por dever. O nome já diz tudo: não se
trata de sugestões para a vida e, sim, de ordens –
mandamentos. O deus judaico-cristão não pede,
ele manda. Ele pode mandar “por justiça”, como
no Velho Testamento, ou por amor, como no
Novo, mas que ele manda, ele manda.
Sua autoridade para mandar vem, no
Velho Testamento, dele próprio – ele falou o que
era o correto para o povo judeu e, enfim, depois,
por meio deste, para o homem em geral. No Novo
Testamento, Deus se transformou em pai e, então,
reordenou alguns princípios, repostos pelo
discurso de Jesus. Nesse, ele falou o que era o
correto para os judeus e sua autoridade passou a
vir da ideia de que “o amor é a única lei”. Nos
dois casos, o código moral a ser seguido é, antes
de tudo, um conjunto normativo que seguimos
porque devemos seguir.
Com os modernos, em especial com o
filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804),
uma norma deveria ganhar valor moral caso
pudesse ser identificada como um imperativo – o
chamado “imperativo categórico”, assim posto:
“Atue somente de acordo com aquela máxima
que pode ser tomada como que deveria ser
30 uma lei universal, ao mesmo tempo que se está
agindo”. Essa lei depende de um “fato da razão”:
a liberdade. O homem não está preso a agir assim,
ele age porque sua condição é a de ser livre. Ele
se determina (autodetermina) a agir assim,
segundo o imperativo, para poder agir
moralmente, e isso não por sentimento (interesse
ou inclinação) e, sim, por entender que a regra do
imperativo categórico, uma vez não seguida,
resultaria em uma contradição que gritaria ao seu
ouvido racional. Que mundo pouco confortável
(racionalmente) não seria aquele no qual o que
não pode ser tomado como lei universal fosse a
regra seguida por todos e aceita como correta ?
O exemplo aqui é do próprio Kant: mentir
por amor à humanidade não é um ato moral, pois
a mentira como lei universal inviabilizaria nossa
sociedade e a própria humanidade. Caso todos
pudessem mentir e, ainda assim, ter respaldo
moral para a mentira, isso institucionalizaria uma
sociedade que, no limite, já não teria parâmetro
para separar – moralmente, o que não é pouco – o
que é o testemunho falso e o que é o verdadeiro.
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Immanuel Kant (1724-1804). Filósofo alemão autor de uma importante
obra sobre ética intitulada Crítica da Razão Prática.
60 Ética Consequencialista
Diferentemente da ética do dever, John
Stuart Mill (1806-1873) advogou uma ética das
conseqüências a partir de seu projeto denominado
de utilitarismo. Sua idéia básica foi a de tornar
indistintos felicidade e prazer, aceitando para tal
um cálculo a respeito do prazer. O que causa dor e
o que causa prazer foram postos em uma régua de
máximos em pólos opostos, e o que é bom e,
portanto, um valor ético-moral, é o que não traz
dor alguma. Dessa forma, inicia-se no ponto não
zero, positivo, do prazer. O mal é exatamente o
que se inicia em sentido contrário. Uma régua
desse tipo pode avaliar cada enunciado e cada ato,
em suas conseqüências, como útil ou não para o
homem.
Indagados se isso não traria uma
arbitrariedade muito grande no campo das
decisões éticas, os utilitaristas responderam que
essa régua não deveria ser posta em uso sem que
se considerasse a humanidade, o coletivo.
Todavia, ainda assim, a pergunta retornaria, pois
os conflitos ético-morais aparecem não só entre
indivíduos, mas, como já mostrei aqui, também a
respeito de culturas – o que é o coletivo para o
indivíduo.
Apesar dessa objeção, o utilitarismo tem
uma vantagem sobre os dois outros sistemas. Ele
é menos rígido e, por isso mesmo, permite o que é
90 essencial à Filosofia, ou seja, a discussão racional
e não apenas a decisão racional.
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Por exemplo, no caso dos índios que
enterram crianças, um utilitarista iria fazer o que
realmente foi feito por alguns estudiosos: saber se
a dor criada por aquela situação seria
exclusivamente da criança ou de outros também.
O que se descobriu é que alguns irmãos e mesmo
algumas mães preferiam fugir a enterrar seus
filhos, pois a dor que sentiam era insuportável,
mesmo diante do costume arraigado em séculos.
Nesse caso, a régua moral utilitária diz que a
própria tribo tenta sobreviver também por meio
dos que não concordam com o costume, e estes
fogem e sobrevivem, e não deixam de se
considerar daquela tribo por terem optado pelo
exílio nas mais duras condições da floresta. Dessa
observação, a discussão racional reaparece
exatamente porque as conseqüências não foram
pré-julgadas, elas são repostas na mesa de
conservação para os que estão observando o
quadro. 
CAPÍTULO 3
CONCEPÇÕES ÉTICAS
ÉTICA CLÁSSICA
Segundo Sócrates, Platão e Aristóteles
PLATÃO E ARISTÓTELES conviveram por 20 anos na Academia
J.S.Mill (1806-173). Filósofo e economista inglês, e um dos pensadores
liberais mais influentes do século XIX. Foi um defensor do utilitarismo, a
teoria ética proposta inicialmente por seu padrinho Jeremy Bentham.
30
 Referência:
GHIRALDELLI JR., Paulo. A boa e velha ética. O conceito
e suas derivações aplicados aos mais recentes casos
noticiados pela mídia. Conhecimento Prático Filosofia. p.
54-60. São Paulo: escala educacional, 2010.
(Adaptado por Ulisses Vasconcelos)
________________________________________
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O pensamento de Sócrates (470-399 a.C.)
marca o nascimento da filosofia clássica e, foi,
posteriormente desenvolvido por Platão e
Aristóteles. Sócrates não estava mais preocupado
60 com a origem do cosmo (como as pessoas no
tempo da mitologia) nem com o elemento que
seria a essência de tudo (como os pré-socráticos).
Para ele, o fundamental era a reflexão sobre a vida
da pólis (cidade-estado), os costumes e
comportamentos. Juntos, esses fatores formam o
que os gregos chamavam de ethos (estilo de vida).
Sócrates é, então, o inventor da ética, pois foi o
primeiro filósofo a questionar as ações humanas e
os valores subjacentes a elas.
Na mesma época de Sócrates, existiam os
sofistas (mestres de retórica e oratória) que
rejeitavam a tradição mítica ao considerar que os
princípios morais resultam de convenções
humanas. Embora na mesma linha de oposição
aos fundamentos religiosos, Sócrates se contrapõe
aos sofistas acreditando que aqueles princípios
não se originam nas convenções, mas na natureza
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humana, ou seja, é natural do homem guiado pela
razão.
A concepção filosófica de Sócrates pode
ser caracterizada como um método de análise
conceitual. Isso pode ser ilustrado pela célebre
questão socrática “O que é ...?”, através da qual se
busca a definição de uma determinada coisa,
geralmente uma virtude ou qualidade moral.
Inúmeros são os diálogos de Platão (427347 a.C.) em que são descritas as discussões
socráticas a respeito das virtudes e da natureza do
bem. Resulta daí a convicção de que a virtude se
identifica com o conhecimento (com a sabedoria)
e o vício com a ignorância. Para Sócrates, o
homem só é mau porque ignora (desconhece) o
bem. Portanto, a virtude pode ser aprendida.
No diálogo Ménon, cujo tema é o
ensinamento da virtude, encontramos uma célebre
passagem a esse respeito (70a-72b):
Ménon: Você pode me dizer, Sócrates, se a
virtude é algo que pode ser ensinado ou que só
adquirimos pela prática ? Ou não é nem o
ensinamento nem a prática que tornam o homem
virtuoso, mas algum tipo de aptidão natural ou
algo assim ?
Sócrates: (...) Você deve considerar-me
especialmente privilegiado para saber se a
30 virtude pode ser ensinada ou como pode ser
adquirida. O fato é que estou longe de saber se
ela pode ser ensinada, pois sequer tenho idéia do
que seja a virtude (...). E como poderia saber se
uma coisa tem uma determinada propriedade se
sequer sei o que ela é (...). Diga-me você próprio
o que é a virtude.
Este diálogo se desenrola quando Ménon
oferece várias definições de virtude, recusadas
entretanto por Sócrates, dizendo ele que mesmo as
virtudes sejam muitas e de vários tipos, terão pelo
menos algo em comum que faz de todas elas
virtudes.
O método socrático envolve um
questionamento do senso comum, das crenças e
opiniões que temos, consideradas vagas,
imprecisas, derivadas de nossa experiência, e
portanto parciais e incompletas. Nesse sentido a
reflexão filosófica vai mostrar que, com
freqüência, não sabemos aquilo que pensamos
saber. Temos talvez um entendimento prático,
intuitivo, imediato, que contudo se revela
inadequado no momento em que deve ser tornado
explícito. O método socrático revela a fragilidade
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desse entendimento e aponta para a necessidade e
a possibilidade de aperfeiçoá-lo através da
reflexão. Ou seja, partindo de um entendimento já
existente, ir além dele em busca de algo mais
perfeito, mais completo: um conceito.
60
Os sofistas, segundo Sócrates, não
ensinavam o caminho (o método) para o
conhecimento, para a verdade única que resultaria
desse conhecimento, mas para a obtenção de uma
“verdade consensual” (convenção), resultado da
persuasão da oratória.
Sócrates descobriu o problema do conceito
buscando definições corretas para valores morais,
como amizade e coragem; Platão considerou o
conceito como o conhecimento de uma ideia
eterna e inata por parte da mente humana;
Aristóteles reduziu-o ao conhecimento da
essência.
Na célebre passagem de A República, em
que Platão descreve o mito da caverna, reaparece
a ideia de Sócrates de que a virtude se identifica
com a sabedoria: o sábio é o único capaz de se
soltar das amarras que o obrigam a ver apenas
sombras e, dirigindo-se para fora, contempla o
sol, que representa a ideia do Bem.
Portanto, “alcançar o bem” se relaciona
com a capacidade de “compreender bem”. Só o
filósofo atinge o nível mais alto de sabedoria, só a
ele cabe a virtude maior da justiça e portanto lhe é
reservada a função de governar. Outras virtudes
menores, mas também importantes para a cidade,
caberão aos soldados defensores da pólis e aos
trabalhadores comuns, artesãos e comerciantes.
Herdeiro do pensamento de Platão,
Aristóteles (384-322 a.C.) aprofunda a discussão
90 a respeito das questões éticas. Mas, para ele, o
homem busca a felicidade, que consiste não nos
prazeres nem na riqueza, mas na vida teórica e
contemplativa cuja realização coincide com o
desenvolvimento da racionalidade.
O que há de comum no pensamento dos
filósofos gregos é a concepção de que a virtude
resulta do trabalho reflexivo, da sabedoria, do
controle racional dos desejos e paixões.
Além disso, o sujeito moral não pode ser
compreendido ainda, como nos tempos atuais, na
sua completa individualidade. Os homens gregos
são antes de tudo cidadãos, membros integrantes
de uma comunidade, de modo que a ética se acha
intrinsecamente ligada à política.
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Sócrates: conhecimento e felicidade

* ATENÇÃO: Copiar é CRIME. Art. 184 do código Penal e Lei n° 5998/73
Por Ulisses da Silva Vasconcelos e Ricardo Eugênio Lima*
“Conhece-te a ti mesmo” estava escrito no
pórtico do templo do deus Apolo. Esse enigma serviu
como máxima para a vida de Sócrates. O pensador
grego julgava que a felicidade não poderia estar ligada
a coisas exteriores, mas residia no próprio homem que,
guiado pela razão, viveria virtuosamente, e desse
modo seria feliz. Assim, a felicidade seria a harmonia
interior ou ordem espiritual. Sendo interior, ninguém
ou nenhuma situação poderiam removê-la, tal como
explica Platão, discípulo de Sócrates, no Fédon: “(...) e
os mais felizes são aqueles cujas almas vão para os
lugares mais agradáveis, os que sempre exerceram
essa virtude social e civil que se chama temperança e
justiça, que se formaram pelo costume e pelo exercício
(...)”.
Em outro texto, Apologia de Sócrates, Platão,
ao escrever um diálogo em que critica a sociedade
ateniense pela condenação de seu mestre, o apresenta
como personagem. No diálogo, Sócrates pede àqueles
que o julgavam: “Quando os meus filhinhos ficarem
adultos, puni-os, ó cidadãos, atormentai-os do mesmo
modo que eu os vos atormentei, quando vos parecer
que eles cuidam mais das riquezas ou de outras
coisas do que da virtude”.
30
Como pai, Sócrates também desejava a
felicidade aos seus filhos e sabia que eles só poderiam
encontrá-la dentro de si mesmos. Porém, qual caminho
seguir ? A resposta para essa questão se encontra em
outro texto platônico, Críton, no qual Sócrates, como
personagem do diálogo, fala a seu amigo Críton,
quando este tenta convencê-lo a fugir: “Temos, pois,
de examinar se devemos proceder como queres ou
não. Quanto a mim, não é de agora, sempre fui deste
feitio: não cedo a nenhuma outra de minhas razões,
senão à que minhas reflexões demonstram ser a
melhor”.
Você pode não concordar com a concepção
socrática da felicidade, mas de qualquer modo, ao
discordar, é preciso pensar e encontrar argumentos
para construir a própria compreensão do que seja a
felicidade
e
suas
implicações,
vivendo
conscientemente e não passando pela vida sem saber o
caminho percorrido. ©
*ULISSES VASCONCELOS. Graduado em Filosofia (Licenciatura e
Bacharelado) e mestrando em Filosofia pela UFPA;
RICARDO LIMA. Pedagogo, professor da Rede Estadual de Ensino do
Ceará e aluno do 2º período de Filosofia da UERN.
60
AGORA É COM VOCÊ !
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
1) Destaca-se no texto “Sócrates: conhecimento e
felicidade” o conceito de racionalidade introduzido por
Sócrates e difundido por Platão na cultura ocidental. Para
Sócrates, o homem guiado pela razão é aquele que:
a) valoriza os instintos humanos e reflete sobre eles
racionalmente;
b) valoriza a interioridade da razão que domina e imputa
ordens às forças externas – e controla tudo o que lhe é
contrário, principalmente os instintos;
c) deixa perder a lucidez racional em oposição aos desejos;
d) julga o valor da vida, separando o conhecimento sobre a
aparência e o conhecimento sobre a essência, dando
preferência ao primeiro;
e) julga ser verdade a vida dos sentidos, e não a vida
contemplativa por meio da interiorização.
2) Se, como entende Nietzsche (severo crítico da
racionalidade socrática), Sócrates foi conivente como o
veredicto de sua morte, e, como relata Platão na Apologia,
ele não quis tentar uma fuga enquanto esperava a cicuta,
então caminhou conscientemente à sua morte “para
começar um novo dia”; uma outra fase da vida: a da
liberdade da alma para encontro com a verdade. Com isto,
surgiu na Grécia Antiga, ao assassinar o tipo trágico, o
novo tipo de homem: o socrático – sistematizado e
difundido na obra de Platão.
90
(COSTA, Victor. Sócrates: o problema para Nietzsche. Ciência  Vida
FILOSOFIA. n. 47. São Paulo: escala, 2010.p.46)
Para o filósofo Nietzsche, o exemplo da vida de Sócrates
mostra:
a) o fim da tragédia grega pelo domínio da razão sobre os
instintos;
b) o início da tragédia grega pelo domínio dos instintos
sobre a razão;
c) “tornou-se o novo ideal, nunca antes contemplado, da
nobre juventude grega: e o típico jovem heleno, Platão, foi o
primeiro a lançar-se, com toda a ardente devoção de sua
alma arrebatada, aos pés dessa imagem”.
d) a prática da Filosofia socrático-platônica de valorar a
vida.
e) as alternativas a e c estão corretas.
3) Qual é o tema (central) conceitual correspondente ao
socratismo e à moral ?
a) a ética.
b) o conhecimento sensitivo.
c) a virtude.
d) a alma.
e) a justiça .
_______________________________________________
4) Segundo Nietzsche, tal como a eticidade socrática, a
moral cristã nega o mundo sensorial, para, a partir de um
mundo inteligível, poder afirmar a felicidade da alma
humana. Esta felicidade, ou melhor, essa ética é orientada
por uma dimensão teleológica (do grego telos = fim). A
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finalidade da alma, para a noção socrático-platônica, é
libertar-se da matéria (do conhecimento através dos
sentidos), e para a noção da moral cristã é libertar-se do
pecado (da fruição dos instintos). Em ambas as noções não
há afirmação de um tipo de homem que comporte a batalha
entre princípios racionais e desejante. Há contudo, repulsa
aos desejos humanos em favor da racionalidade, em favor
da lógica de negação do mundo sensorial; em última
instância: da negação da vida.
(COSTA, Victor. Sócrates: o problema para Nietzsche. Ciência  Vida
FILOSOFIA. n. 47. São Paulo: escala, 2010.p.49)
Em que ponto você concorda ou discorda da posição de
Nietzsche ? Faça um breve comentário.
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5) Sobre a racionalidade moral de Sócrates, assinale a única
alternativa incorreta:
a) os princípios morais resultam do consenso entre os
homens, e não da natureza humana.
30 b) a tranqüilidade interior do homem honesto é superior à
morte.
c) a finalidade da vida é a felicidade, que está na capacidade
do homem de estabelecer para si mesmo, por meio do saber,
suas próprias leis e regras de conduta.
d) a sabedoria só pode ser resultado da percepção que temos
da própria ignorância.
e) é a dimensão biológico-cultural o maior obstáculo no
caminho da perfeita realização espiritual.
________________________________________
ARISTÓTELES: A ÉTICA DA FELICIDADE
ARISTÓTELES (384-322 a.C.). Filósofo grego, discípulo de Platão, e
autor de uma grande obra intitulada Ética a Nicômaco
Cid. Nova I, WE 9A, nº121, Coqueiro.
Fone: (091) 3235-1844
Aristóteles dedicou boa parte de sua obra
ao estudo de como o ser humano pode ser feliz
vivendo em sociedade. Assim como Platão,
esboçou um projeto político para solucionar esse
problema, que conheceremos a seguir:
“O homem”, afirma Aristóteles em A
Política, “é naturalmente um animal político”.
Político deve ser entendido como “participante da
pólis”: uma das condições essenciais do ser
humano é o fato de viver agregado a outros
60 homens. Em outras palavras, para esse filósofo
um indivíduo vivendo sozinho é inconcebível: um
homem absolutamente solitário ou auto-suficiente
deixaria de ser homem – seria um “deus” ou uma
“fera” – ou simplesmente não sobreviveria.
Além disso, a pólis era para Aristóteles a
melhor organização social possível, desde que
fosse regida por critérios justos, que visassem ao
bem comum. No mais, as Ciências práticas (a
ética e a política) tinham a finalidade de buscar o
aperfeiçoamento do seu agente, isto é, do homem.
A aplicação dessas ciências, segundo Aristóteles,
leva o desenvolvimento do ser humano na direção
de uma existência melhor.
Aristóteles definia a ética como a ciência
que trata do caráter e da conduta dos indivíduos, e
a política como os estudos que regem a existência
dos homens vivendo numa comunidade autosuficiente, no caso, a pólis. A doutrina aristotélica
afirma que as duas são inseparáveis. Assim, a
perfeição da personalidade individual (que se
mostra através da honestidade, da honra, do
respeito ao próximo, em suma, da virtude) é a
finalidade almejada pela vida comunitária e pelas
leis – e estas seriam os meios pelos quais se
obtém aquele fim.
Para Aristóteles, de fato, a felicidade não
era apenas um estado emocional e passivo, mas
sim uma atividade: o homem feliz era aquele que
praticava incessantemente a virtude, sempre
90 aperfeiçoando seu caráter. Esse seria o campo
específico da ética. No entanto, a conduta justa do
indivíduo só teria sentido dentro da vida em
sociedade.
A política seria tão importante: para que o
indivíduo possa ser virtuoso (ético e, portanto,
feliz), é necessário haver uma organização
política favorável para essa finalidade seja
atingida. Qual é ela ? Para Aristóteles, é a pólis
governada democraticamente, na qual todos os
cidadãos se conheçam pessoalmente e façam parte
de uma grande assembléia que governa a cidade,
determinando seus destinos e redigindo leis que
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garantam uma existência digna para seus
habitantes.
Ser feliz é possível, mas dá bastante
trabalho, segundo Aristóteles, que definiu
felicidade como uma “certa atividade da alma
realizada em conformidade com a virtude”. Em
sua obra, Ética a Nicômaco, o filósofo garante
que a eudaimonia (a palavra que designa
felicidade, em grego) depende de nós mesmos e
precisa ser buscada sempre; o meio para atingi-la
seria a virtude que o homem possui naturalmente.
Para Aristóteles, o homem busca a
felicidade (o sumo bem), que consiste não nos
prazeres nem na riqueza, mas na vida teórica e
contemplativa, cuja plena realização coincide com
o desenvolvimento da racionalidade. Para ser
feliz, portanto, o homem deve viver de acordo
com a sua essência, isto é, de acordo com a sua
razão, a sua consciência reflexiva. E, orientando
os seus atos para uma conduta ética, a razão o
conduzirá à prática da virtude.
(...) o que é próprio de cada coisa é, por natureza, o que há
de melhor e de aprazível para ela. (...) para o homem a vida
conforme a razão é a melhor e a mais aprazível, já que a
razão, mais que qualquer outra coisa, é o homem. Donde se
conclui que essa vida é também a mais feliz. (ARISTÓTELES.
Ética a Nicômaco)
30
Para Aristóteles, a virtude representa o
meio-termo, a justa medida de equilíbrio entre o
excesso e a falta de um atributo qualquer.
(...) a virtude deve ter a qualidade de visar ao meio-termo.
Falo da virtude moral, pois é ela que se relaciona com as
paixões e ações, e nestas existe excesso, carência e um
meio-termo. (...) A virtude é, então, uma disposição de
caráter relacionada com a escolha de ações e paixões, e
consistente numa mediania, isto é, a mediania relativa a
nós, que é determinada por um princípio racional próprio
do homem dotado de sabedoria prática. (ARISTÓTELES. Ética
a Nicômaco)
perseverar no bem. Ou seja, a verdadeira vida
moral se condensa na vida virtuosa.
Para Aristóteles, as necessidades fazem
60 com que o homem sempre adapte uma virtude a
sua respectiva ação. Esse processo era chamado
de variação entre ato e potência, ou seja, o homem
é em ato algo no tempo presente, mas tem
potencialidade para ser outro homem distinto. E
assim por diante, até a morte.
A busca pela felicidade, na visão de
Aristóteles, seria uma eterna corrida, com vários
obstáculos a serem superados, riscos a serem
enfrentados e árduo trabalho, porém, sem
garantias de que no final o objetivo máximo fosse
alcançado.
Para o filósofo grego, a felicidade é uma
satisfação das necessidades e das aspirações
mundanas e, ao atingi-la, outras necessidades
surgirão para o homem; então, ele sempre estará
nessa constante busca.
Os filósofos, em toda a tradição da
Filosofia Ocidental, aproximam a felicidade da
sabedoria, afirmando sua ligação com a reflexão e
a dependência da razão, da virtude, da moderação,
em última análise, o elo íntimo da felicidade com
a própria Filosofia. É o caso do filósofo grego
Epicuro (341-270 a.C.), para quem o prazer
contínuo seria a chave para uma vida feliz. Sua
filosofia tinha uma finalidade prática, ajudando
seus seguidores a encontrar o caminho para a
felicidade através do prazer, que poderia ser
traduzido não por uma indulgência sensual, mas
pelo processo de moderação, leitura e
90 introspecção da vida – o prazer do sábio, que tem
controle de si mesmo. Desta maneira, os temores
seriam eliminados e os homens encontrariam o
sossego necessário para uma vida alegre e
aprazível.
________________________________________
Por exemplo, a virtude da prudência é o
meio-termo entre a precipitação e a negligência; a
virtude da coragem é o meio-termo entre a
covardia e a valentia insana; a perseverança é o
meio-termo termo entre a fraqueza de vontade e a
vontade obsessiva.
Uma vida autenticamente moral não se
resume a um ato moral, mas é a repetição e
continuidade do agir moral. Aristóteles afirmava
que “uma andorinha, só, não faz verão” para
dizer que o agir virtuoso não é ocasional e
fortuito, mas deve se tornar um hábito, fundado
no desejo de continuidade e na capacidade de
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
30
Diferentemente de Platão (427-347 a. C.), que considera
a virtude como inata, ou seja, como uma qualidade que o indivíduo
já traz consigo ao nascer, Aristóteles entende que ela somente pode
ser adquirida como pode ser adquirida como um hábito (ethos).
PARA REFLETIR ou FILOSOFAR
“(...) quanto à excelência moral, ela é o produto do hábito, razão
pela qual seu nome é derivado, com uma ligeira variação, da
palavra ‘hábito’. É evidente, portanto, que nenhuma das várias
formas de excelência moral se constitui em nós por natureza, pois
nada que existe por natureza pode ser alterado por hábito”.
(ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco)
VIRTUDE:
A EXCELÊNCIA EM PROL DA
FELICIDADE
A cada momento que utilizamos o melhor de nós, em justa
medida, ficamos mais próximo do ápice do bem-estar
O saber da virtude não é um saber discursivo, conceitual.
É um saber prático:
Por Rita Foelker*
A virtude é um dos temas da Ética a Nicômaco –
principal tratado de ética escrito por Aristóteles (384 – 322 a.C.) e
supostamente dirigido a seu filho –, de onde foram extraídos os
fragmentos abaixo.
A palavra “virtude”, em um sentido ético, pode ser
entendida como uma qualidade moral ou intelectual positiva do ser
humano, que o leva a agir visando ao bem. Tal virtude em
Aristóteles (areté) costuma ser traduzida como excelência moral e
assim ele a define:
“A excelência moral, então, é uma disposição da alma relacionada
com a escolha de ações e emoções, disposição esta consistente
num meio-termo (relativo a nós) determinado pela razão (a razão
graças à qual um homem dotado de discernimento/prudência o
determinaria). Trata-se de um estado intermediário, porque nas
várias formas de deficiência moral há falta ou excesso do que é
conveniente tanto nas emoções quanto nas ações, enquanto a
excelência moral encontra e prefere o meio-termo (mesotés).
Logo, a respeito do que ela é, ou seja, a definição que expressa a
sua essência, a excelência moral é um meio-termo, mas com
referência ao que é melhor e conforme ao bem ela é um extremo”.
(ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco)
Duas formas de virtude estão presentes na Ética a
Nicômaco: a virtude intelectual e a virtude moral.
A virtude intelectual (dianóia) é representada
principalmente pela sabedoria e pela prudência (phrónesis),
adquiridas pela instrução e que trazem calma e tranqüilidade ao
homem. A virtude moral é uma disposição de espírito ou hábito de
escolher em todas as situações a justa medida que convém à nossa
natureza. As pessoas que têm essa virtude desenvolvem a
moderação e o bom-senso (sophrosýne).
A felicidade é o fim último da virtude, não como
objetivo do indivíduo, mas da polis, razão pela qual se pode dizer
que, para Aristóteles, a ética está subordinada à política. Segundo
David Ross (filósofo americano contemporâneo), “a virtude do
Estado está conforme a virtude de seus cidadãos”. Não se trata,
portanto, de um objetivo religioso nem divino, relacionado à
vontade dos deuses, mas de construir uma vida social feliz e
harmoniosa.
“As coisas que temos de aprender antes de fazer, aprendemo-las
fazendo-as – por exemplo, os homens se tornam construtores
construindo, e se tornam citaristas tocando cítara; da mesma
forma, tornamo-nos justos praticando atos justos, moderados
agindo moderamente, e corajosos agindo corajosamente”
(ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco)
90
Disso se pode deduzir que tal peculiaridade da virtude
moral, certamente, reflete-se no modo de “ensiná-la”, que não
consiste em falar ou escrever sobre a excelência moral, mas em
agir eticamente e, assim, influenciar o educando. A convivência
com um agente virtuoso constitui o melhor meio de aprendizado.
Considerando-se que, para Aristóteles, a virtude não é
um bem do sujeito, ninguém nasce bom ou ruim. A virtude se
relaciona diretamente a uma práxis (ação prática), e aquele que
deixa de praticá-la também deixa de ser virtuoso. ©
* RITA FOELKER. É escritora e aluna da graduação em filosofia da
Universidade São Judas Tadeu, SP.
_____________________________________________________

PARA FIXAR
 VIRTUDE: Virtude vem da palavra latina vir, que
designa o homem, o varão. Virtus é “poder”,
“potência” (ou possibilidade de passar ao ato).
Virilidade está ligada à ideia de força, de poder.
Virtuoso é aquele capaz de exercer uma atividade em
nível de excelência (virtude se refere a idéia de força,
de capacidade). Em moral, a virtude do homem é a
força com a qual ele se aplica ao dever e o realiza. A
virtude é a permanente disposição para querer o bem,
o que supõe a coragem de assumir os valores
escolhidos e enfrentar os obstáculos que dificultam a
ação. Uma vida autenticamente moral não se resume a
um ato moral, mas é a repetição e continuidade do agir
A plenitude do ser humano
moral. Aristóteles afirmava que “uma andorinha, só,
A busca da ética é a busca do fim do próprio homem 120 não faz verão” para dizer que o agir virtuoso não é
(Ética Teleológica). E este fim (télos), não se refere apenas a uma
ocasional e fortuito, mas deve se tornar um hábito,
“finalidade” – como se costuma traduzir em português –, mas
fundado no desejo de continuidade e na capacidade de
também a uma espécie de “plenitude”, o que reforça a idéia de que
perseverar no bem. Ou seja, a verdadeira vida moral se
60 a excelência moral e a conduta ética constituem a realização do
condensa na vida virtuosa.
grande e verdadeiro propósito de nossas vidas, nosso ponto
máximo, nossa plenitude enquanto seres.
O tratamento que Aristóteles confere ao tema da virtude
moral nos permite perceber duas idéias em destaque: 1) as virtudes
se transmitem pelo exemplo e 2) as virtudes são disposições de
espírito que se concretizam em ações.
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Summum bonum (bem supremo)
efetivamente o é para Aristóteles.
ÉTICA MODERNA
Segundo Kant
como

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A LEI MORAL NÃO PODE TER SUA
ORIGEM NA EXPERIÊNCIA – PRAZER,
UTILIDADE, FELICIDADE ETC. –, MAS É
CONDIÇÃO A PRIORI DA VONTADE.
O
agir
moralmente
se
funda
exclusivamente na razão. A lei moral que a razão
descobre é universal, pois não se trata de
descoberta subjetiva (mas do homem enquanto ser
racional), e é necessária, pois é ela que preserva a
dignidade dos homens. Isso pode ser sintetizado
nas seguintes afirmações do próprio Kant:
“Age de tal modo que a máxima de tua
ação possa sempre valer como princípio
universal de conduta”
Immanuel Kant (1724-1804). Filósofo alemão autor de uma importante
obra sobre ética intitulada Crítica da Razão Prática (1788), que exporá a
moralidade a partir da função prática da razão.
KANT: A ÉTICA DO DEVER MORAL
Analisando os princípios da consciência
moral, Immanuel Kant (1724-1804) em suas obras
intituladas Fundamentação da Metafísica dos
Costumes (1785) e Crítica da Razão Prática
(1788), concluiu que a vontade humana é
verdadeiramente moral quando regida por
imperativos categóricos. O imperativo categórico
é assim chamado por ser incondicionado,
absoluto, voltado para a realização da ação tendo
em vista o dever. Por razão prática, Kant entende
a razão na função de ditar à vontade a lei moral.
Kant fundamentou a moral na autonomia
da razão humana. Dessa forma ele recusou todas
as éticas anteriores, fundamentadas em normas e
valores de origens diversas (éticas heterônomas,
ou seja, vindas de fora do sujeito, imposta por
outras fontes que não a razão). Assim, para
30 impedir que os indivíduos se deixem levar pelos
seus desejos, paixões ou motivos particulares, é a
razão que deve indicar quais são os deveres e
normas a serem seguidos de uma forma universal.
Kant rejeita a concepção ética que norteia
a ação moral a partir de condicionantes como a
felicidade ou o interesse. Por exemplo, não faz
sentido agir bem com o objetivo de ser feliz ou
evitar a dor ou punição. A felicidade para Kant é
um bem , mesmo que não seja considerada o
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60

OBEDECE A LEI PELA PRÓPRIA LEI. E
NÃO POR OUTRO MOTIVO.
 EXIGE VONTADE LIVRE.

AGINDO SOB O COMANDO DO
IMPERATIVO
CATEGÓRICO,
UM
INDIVÍDUO AGE SOB UM COMANDO
LIVREMENTE
AUTO-IMPOSTO
SEM
EXPERIMENTAR NENHUMA FORMA DE
COERÇÃO EXTERNA.
“Age sempre de tal modo que trates a
humanidade, tanto na tua pessoa como
na do outro, como fim e não apenas como
meio”
 EXIGE QUE SEJAMOS BENEVOLENTES.

PRINCÍPIO DO RESPEITO PELAS
PESSOAS,
COMO
FORMULAÇÃO
ALTERNATIVA
DO
IMPERATIVO
CATEGÓRICO.
A autonomia da razão para legislar supõe a
liberdade (“independência da vontade com
respeito à coação dos impulsos da sensibilidade”)
e o dever (“necessidade de cumprir uma ação por
respeito à lei”) . A noção do dever prende-se ao
90 caráter inteligível (interno; da razão) e não
empírico (externo; da experiência sensível) do
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sujeito, vale dizer, à sua liberdade. Pois todo
imperativo se impõe como dever, mas a exigência
não é heterônoma – exterior e cega – e sim
livremente assumida pelo sujeito que se
autodetermina.
Vamos exemplificar: Suponhamos a
norma moral “não roubar”. Para Kant, a norma se
enraíza na própria natureza da razão; ao aceitar o
roubo e consequentemente o enriquecimento
ilícito, elevando a máxima (pessoal) ao nível
universal, haverá uma contradição: se todos
podem roubar, não há como manter a posse do
que foi furtado.
Agir de acordo com o dever é, em última
análise, agir de acordo com os princípios
racionais. A formação da vontade conforme a
razão é que produz a qualidade moral das ações
humanas.
Mas não basta, para uma ação ser
considerada moralmente boa, que ela esteja de
acordo com o dever. É preciso mais do que isso: é
necessário que ela seja feita por dever. Ou seja, é
necessário não apenas que a ação se conforme ao
dever, mas também que o indivíduo reconheça
naquele dever o princípio racional que o sustenta
como tal.
Essa intenção bem determinada em relação
à aceitação e ao cumprimento do dever é o que ele
designa boa vontade. Para Kant, a boa vontade é o
30 que caracteriza a ação moralmente correta.
A boa vontade e o dever
A inteligência, a faculdade de julgar, a
coragem etc., não são coisas boas absolutamente;
seu valor depende do uso que delas se faça. Cabe
dizer o mesmo quanto à felicidade: não é um bem
em si; pode mesmo ser uma fonte de corrupção
para quem não dispõe de uma boa vontade. Até
mesmo certas qualidades superiores, como o
domínio de si ou a reflexão, não podem
considerar-se verdadeiramente boas, salvo se
estiverem ao serviço de uma boa vontade.
Mas o que, afinal, torna uma vontade boa
? Não certamente, os seus êxitos, nem a aptidão
para levar a bom termo os seus propósitos; é a
própria natureza do querer.
Qual é o conteúdo dessa boa vontade que
seria boa em si mesma ? É o conceito de dever.
Este, com efeito, contém em si o da boa vontade,
mas acrescenta-lhe certos entraves subjetivos,
provindos de nossa sensibilidade, os quais põem
em relevo a boa vontade às voltas com certas
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dificuldades. Poder-se-ia dizer até que a boa
vontade é a vontade de agir por dever, mas não
o agir conforme o dever por qualquer interesse ou
inclinação sensível.
Por exemplo, o comerciante que atende
lealmente aos fregueses, age em conformidade
60 com o dever, mas não por dever, se não tem em
vista senão o seu interesse bem compreendido. Do
mesmo modo, a pessoa que leva uma vida feliz e
se esforça em conservar a vida, age
conformemente ao dever, pois a conservação da
vida é um dever; mas não age por dever. Ao
invés, quem se esforça por conservar uma vida a
quem já não tem amor, este sim, age por dever.
Ser benfazejo por prazer é, igualmente, agir
conformemente ao dever, mas não por dever. Por
outro lado, quem pratica a beneficiência, mesmo
sem sentir-se inclinado a isso, possui um valor
moral maior do que aquele que é benevolente por
temperamento; e isto, no sentir de todos. Este
valor maior lhe vem precisamente do fato de que
“ele faz o bem, não por inclinação, mas por
dever”.
Para ter verdadeiro valor moral, não basta
para Kant que a ação seja conforme ao dever; é
mister, além disso, seja executada por dever. Agir
sob a influência da sensibilidade, ainda que a ação
seja concorde ao dever, é algo de patológico.
Prático, ou moral, é só o que depende direta e
exclusivamente da razão.
“Assim devem, sem dúvida, ser compreendidos
também os passos da Escritura, onde se ordena
amar o próximo e até os inimigos. Com efeito, o
amor, como inclinação, não pode ser comandado;
mas praticar o bem por dever, quando nenhuma
90 inclinação a isso nos incita, ou quando uma
aversão natural e invencível se opõe, eis um amor
prático e não patológico, que reside na vontade, e
não na tendência da sensibilidade, nos princípios
da ação e não uma compaixão emoliente. Ora, é
este o único amor que pode ser comandado”.
(KANT.
Fundamentação da Metafísica dos Costumes)
Evidencia-se assim a oposição entre o
ponto de vista da legalidade, ou da conformidade
com a lei, e o ponto de vista da moralidade
verdadeira, que reside na pureza da intenção. Eis,
pois, um primeiro princípio: o valor moral de um
ato reside na intenção. Um segundo princípio é o
seguinte:
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A educação desenha o futuro – Ensino Médio – Ética: filosofia moral – Prof. Ulisses Vasconcelos
“Uma ação cumprida por dever tira seu valor
moral não do fim por ela deve ser alcançado, mas
da máxima que a determina. Este valor não
depende, portanto, da realidade do objeto da
ação, mas unicamente do princípio do querer,
segundo o qual a ação é produzida, sem tomar em
conta nenhum dos objetos da faculdade apetitiva
(de desejar).

UMA ÉTICA ABAIXO DO CÉU
60
Por Valerio Rohden*
Kant escreveu diversas obras de filosofia prática, entre as
quais Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785), A
Metafísica dos Costumes (1797) e Crítica da Razão Prática
(1788).
(...) Aqui só poderemos abordar sinteticamente alguns
dos temas principais da Crítica da Razão Prática, a começar pelo
título. “Prático” significa tudo o que se faz com base na liberdade e
por obra dela. Ela chama-se igualmente de “crítica”, porque
constitui a crítica a uma forma de razão que impede a prática da
liberdade, ou seja, uma razão empírica.
Uma razão pragmática e empírica é uma razão
calculadora de interesses, com base em inclinações. A inclinação é
o hábito de seguir o prazer. A propensão a elevar o prazer ou a
inclinação a um princípio assume a denominação de princípio do
amor de si ou da felicidade própria.
(KANT. Fundamentação da Metafísica dos Costumes)
Não é o objeto que desejo atingir que faz o
valor moral do meu ato, mas a razão pela qual eu
quero atingi-lo. O mercador honesto é moral se é
honesto por dever; carece de valor moral se é
honesto por interesse. Por outras palavras, o valor
moral do ato está na intenção, mas é preciso
considerar a intenção prescindindo do fim visado,
ou seja, unicamente como intenção de fazer o que
se deve fazer.
Desses dois princípios decorre a seguintes
definição do dever: “O dever é a necessidade de
cumprir uma ação por respeito à lei”.
O homem necessita de móveis para poder
agir; e como nenhuma ação procedende de um
móvel tirado da sensibilidade merece ser
qualificada por moral, não resta outro móvel para
a ação de quem queira agir por dever senão o
respeito à lei que lhe ordena cumprir o dever. É
30 pois somente a representação da lei, num ser
racional, que pode determinar a boa vontade.
Nesta altura surge, naturalmente, o
problema de saber em que consiste essa lei:
Ética formal da liberdade
90
“cuja representação, sem qualquer espécie de
consideração pelo efeito que dela se espera, deve
determinar a vontade, para que esta possa ser
denominada boa absolutamente e sem restrição”
do Brasil (Ulbra) e pesquisador do CNPq.
________________________________________
Em toda lei pode-se considerar a forma,
isto é, a universalidade do preceito, e o conteúdo,
isto é, o objeto a ser colimado. Mas, como vimos,
a ação moral não tira o seu valor do fim que se lhe
propõe; vale dizer que a obediência à lei deve
independer do conteúdo da lei. Portanto, para a
vontade
(KANT. Fundamentação da Metafísica dos costumes)
Cid. Nova I, WE 9A, nº121, Coqueiro.
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A ética kantiana de maneira nenhuma é adversa à
inclinação, ao prazer ou à felicidade – que constituem a matéria
empírica de leis práticas. Nem tampouco existe forma sem matéria.
Mas no momento em que é dada prioridade à matéria e não à
forma, a razão torna-se heterônoma, isto é, determinada desde fora
e não por si própria. Então, que fique marcado: o mal não reside
nas inclinações, no prazer, na matéria, mas na própria máxima ou
na própria razão que, contraditoriamente eleva a matéria ou a
inclinação a princípio de si mesma. j
A filosofia moral kantiana não se restringe – como
acontecia entre os antigos até a tradição racionalista anterior a
Kant – a uma ética material da felicidade, mas se constitui como
uma ética formal da liberdade. Enquanto tal, ela se apresenta como
uma ética de princípios, fundada, com a exclusão de uma razão
determinante empírica, em uma razão pura. Pura é uma razão que,
sem mescla de interesses, se constitui como razão prática. Trata-se,
pois, de uma razão livre ou, melhor, autônoma. Liberdade
significa, negativamente, independência de determinações
estranhas e, positivamente, autodeterminação. ©
* VALÉRIO ROHDEN é professor de filosofia da Universidade Luterana
(KANT. Fundamentação da Metafísica dos costumes)
“nada mais resta do que a conformidade
universal das ações a uma lei em geral que deva
servi-lhe de princípio; noutros termos, devo
portar-me de modo que eu possa também querer
que minha máxima se torne em lei universal”.
PARA REFLETIR ou FILOSOFAR
A CONSCIÊNCIA MORAL OU RAZÃO PRÁTICA
Por M. García Morente*
120
Existe uma forma de atividade espiritual que podemos
condensar no nome de “consciência moral”. A consciência moral
contém dentro de si um certo número de princípios em virtude dos
quais os homens regem sua vida. Ajustam sua conduta a esses
princípios, e, de outra parte, tem neles uma base para formular
juízos morais acerca de si mesmos e de quanto os rodeia. Essa
consciência moral é um fato, um fato da vida humana, tão real, tão
efetivo, tão inabalável como o fato do conhecimento.
Nesse conjunto de princípios que constituem a
consciência moral, encontra Kant a base que pode conduzir o
homem à apreensão dos objetos metafísicos. A esse conjunto de
princípios de consciência moral dá Kant um nome. Ressuscita,
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A educação desenha o futuro – Ensino Médio – Ética: filosofia moral – Prof. Ulisses Vasconcelos
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para denominá-lo os termos de que se valeu para isso mesmo
Aristóteles. Aristóteles chama a consciência moral e seus
princípios “razão prática” (nous practikós). Kant ressuscita essa
denominação, e ao ressuscitá-la e aplicá-la à consciência moral o
nome de razão prática, faz precisamente para mostrar, para fazer
patente e manifesto que na consciência moral atua algo que, sem
ser a razão especulativa, se assemelha à razão. São também
princípios racionais, princípios evidentes, dos quais podemos
julgar por meio da apreensão interna de sua evidência. Portanto,
pode chamá-lo legitimamente razão. Porém, não é a razão
enquanto se aplica ao conhecimento (especulativa); não é a razão
encaminhada a determinar a essência das coisas, aquilo que as
coisas são, mas é a razão aplicada à ação, à prática, aplicada à
moral.
Pois bem. Uma análise desses princípios da consciência
moral conduz Kant aos qualificativos morais; por exemplo, bom,
mau, moral, imoral, meritório, pecaminoso etc. Estes qualificativos
morais, estes predicados morais que nós muitas vezes costumamos
estender às coisas, não convêm todavia as coisas. Dizemos que
esta coisas ou aquela coisa é boa ou má; mas, em rigor, as coisas
não são boas nem más, porque nas coisas não há mérito nem
demérito. Por conseguinte, os qualificativos morais não podem
predicar-se das coisas, que são indiferente ao bem e ao mal; só
podem predicar-se do homem, da pessoa humana. Somente o
homem, a pessoa humana é verdadeiramente digno de ser chamado
bom ou mau.s As demais coisas que não são o homem, como os
animais, os objetos, são aquilo que são, porém não são bons nem
maus.
Por que é o homem o único ser do qual pode, em rigor,
predicar-se a bondade e a maldade moral ? Pois é porque o
homem realiza atos e na realização desses atos o homem faz algo,
estatui uma ação, e nessa ação podemos distinguir dois elementos:
aquilo que o homem faz efetivamente e aquilo que quer fazer.
Feita esta distinção entre aquilo que faz e aquilo que quer fazer,
notamos imediatamente que os predicados bom, mau, os
predicados morais, não correspondem tampouco àquilo que o
homem faz efetivamente, mas corresponde estritamente àquilo que
quer fazer. Se uma pessoa comete um homicídio involuntário, por
exemplo, este ato evidentemente é uma grande desgraça, porém
não pode qualificar-se de bom nem de mau aquele que o cometeu.
Não, pois, ao conteúdo efetivo; não, pois à matéria do ato que
convêm os qualificativos morais de bom ou mau, mas à vontade
mesma do homem.
Esta análise conduz à conclusão de que a única coisa que
verdadeiramente pode ser boa ou má é a vontade humana. Uma
vontade boa ou uma vontade má.
90
IMPERATIVO HIPOTÉTICO E IMPERATIVO
CATEGÓRICO
60
Então o problema que se apresenta é o seguinte: que é,
em que consiste a vontade boa ? Que chamamos uma vontade boa
? Aprofundando-se nesta direção, Kant adverte que todo ato
voluntário se apresenta à razão, à reflexão, na forma de um
imperativo. Com efeito, todo ato, no momento de iniciar-se, de
começar a realizar-se, aparece à consciência sob a forma de
mandamento: há que se fazer isto, isto tem que ser feito, isto deve
ser feito, faz isto. Essa forma de imperativo, que é a rubrica geral
em que se contém todo ato imediatamente possível, especifica-se
segundo Kant em duas classes de imperativos; os que ele chama
imperativos hipotéticos e os imperativos categóricos.
A forma lógica, a forma racional, a estrutura interna do
imperativo hipotético, é aquela que consiste em sujeitar o
mandamento, ou imperativo mesmo, a uma condição. Por
exemplo: “Se queres sarar de tua doença, toma o remédio”. O
imperativo é “toma o remédio”; porém esse imperativo está
limitado, não é absoluto, não é incondicional, antes está colocado
sob a condição “de que queiras sarar”. Se me respondes, “Não
quero sarar”, então não é válido o imperativo. O imperativo “Toma
120
o remédio” é, pois, válido somente sob a condição de que “queiras
sarar”.
Pelo contrário, outros imperativos são categóricos:
justamente aqueles em que a imperatividade, o mandamento, o
mandado, não está colocado sob condição nenhuma. O imperativo
então impera, comanda, como diz Kant, incondicionalmente,
absolutamente; não relativa e condicionalmente, mas de um modo
total, absoluto e sem limitações. Por exemplo: os imperativos da
moral costumam formular-se desta maneira, sem condições:
“Honra teus pais”, “Não mates outro homem”, enfim, todos os
mandamentos morais bem conhecidos.
A qual desses dois imperativos corresponde o que
chamamos moralidade ? Evidentemente, a moralidade não é o
mesmo que a legalidade. A legalidade de um ato voluntário
consiste em que a ação seja conforme e esteja ajustada à lei.
Porém, não basta que uma ação seja conforme e esteja ajustada à
lei para que seja moral; não basta que uma ação seja legal para que
seja moral. Para que uma ação seja moral é mister que aconteça
algo não na ação mesma e na sua concordância com a lei, mas no
instante que antecede à ação, no ânimo ou vontade daquele
daquele que a executa. Se uma pessoa ajusta perfeitamente seus
atos à lei, porém os ajusta à lei porque teme o castigo,
consequentemente ou apetece a recompensa conseguinte, então
dizemos que a conduta íntima, a vontade íntima dessa pessoa não é
moral. Para nós, para a consciência moral, uma vontade que se
resolve a fazer o que faz por esperança de recompensa ou por
temor de castigo, perde todo o valor moral. A esperança de
recompensa e o temor do castigo menoscabam a pureza do mérito
moral. Pelo contrário, dizemos que um ato moral tem pleno mérito
moral quando a pessoa que o realiza determinou-se a realizá-lo
unicamente porque esse é o ato moral devido.
Se agora traduzimos isto à formulação, que antes
explicávamos, do imperativo hipotético e do imperativo
categórico, advertimos desde já que os atos em que não há a
pureza moral exigida, os atos em que a lei foi cumprida por temor
do castigo ou por esperança de recompensa, são atos nos quais, na
interioridade do sujeito, o imperativo categórico tornou-se
habilmente imperativo hipotético. Em lugar de escutar a voz da
consciência moral, que diz “Obedece a teus pais”, “Não mates teu
próximo”, este imperativo categórico converte-se neste outro
hipotético: “se queres que não te aconteça nenhuma coisa
desagradável, se queres não ir ao cárcere, não mates teu próximo”.
Então o determinante aqui foi o temor; e esta determinação de
temor tornou o imperativo (que na consciência moral é categórico)
um imperativo hipotético; e o tornou hipotético ao colocá-lo sob
essa condição e transformar a ação num meio para evitar tal ou
qual castigo ou para obter tal ou qual recompensa.
Então diremos que para Kant uma vontade é plena e
realmente pura, moral, valiosa, quando suas ações estão regidas
por imperativos autenticamente categóricos.
Se agora quisermos formular isto em termos tirados da
lógica, diremos que em toda ação há uma matéria, que é aquilo que
seser faz ou aquilo que se omite, e há uma forma, que é o por que
se faz ou o por que se omite. E então a formulação será: uma ação
denota uma vontade pura e moral quando é feita não por
consideração ao seu conteúdo empírico, mas simplesmente por
respeito ao dever, quer dizer, como imperativo categórico e não
como imperativo hipotético. Mas este respeito ao dever é
simplesmente a consideração à forma do “dever”, seja qual for o
conteúdo ordenado nesse dever. E essa consideração à forma pura
proporciona a Kant a fórmula conhecidíssima do imperativo
categórico, ou seja, a lei moral "universal, que é a seguinte: “Age
de maneira que possas querer que o motivo que te levou a agir
seja uma lei universal”. Esta exigência de que a motivação seja lei
universal vincula inteiramente a moralidade à pura forma da
vontade, não ao seu conteúdo. ©
* García Morente, M. Fundamentos de filosofia; lições preliminares.
p.252-255.
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Cid. Nova I, WE 9A, nº121, Coqueiro.
Fone: (091) 3235-1844
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PARA FIXAR
DOUTRINAS MORAIS FUNDAMENTAIS:
TELEOLOGIA E DEONTOLOGIA
 TELEOLOGIA: Doutrina ética cujos
princípios repousam principalmente na avaliação
de modos de agir e condutas que se conformam a
um determinado fim (telos) a ser alcançado e tido
como um bem, seja ele a felicidade (pretende que
o motivo central de nossas decisões e ações é a
busca da felicidade) – a excelência humana (o
sumo bem) –, ou mesmo o prazer. Aqui é
concedida uma prioridade ao conceito de bem.
Principais representantes:
- Aristóteles (384-322 a.C.): o homem busca a
felicidade, que consiste não nos prazeres nem na
riqueza, mas na vida teórica e contemplativa cuja
realização coincide com o desenvolvimento da
racionalidade.
- Epicuro (341-270 a.C.): principal representante
dos hedonistas (do grego hedoné, “prazer”). O
bem se encontra no prazer. Considera que os
prazeres do corpo são causas de ansiedade e
sofrimento. Para permanecer impertubável, a alma
precisa desprezar os prazeres materiais, o que leva
30 Epicuro a privilegiar os prazeres espirituais,
dentre os quais aqueles referentes à amizade.
 DEONTOLOGIA: Doutrina ética que
privilegia, entre as prioridades da interação
pessoal, a conformidade a certas normas de
caráter obrigatório e universal, onde a idéia de
respeito recíproco assume um valor intrínseco,
revestindo-se da dignidade de um dever moral a
ser cumprido. Aqui é concedida uma prioridade
ao conceito de justiça.
Principal representante:
- Immnuel Kant (1724-104): “O respeito, e não o
prazer ou a fruição da felicidade, é pois algo para
o qual nenhum sentimento precedente, posto
como fundamento da razão, é possível (porque
este seria sempre estético e patológico); a
consciência do constrangimento imediato da
vontade pela lei (imperativo categórico)
dificilmente é um análogo do sentimento de
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prazer porque, em relação à faculdade de desejar,
produz justamente o mesmo sentimento, mas a
partir de fontes diferentes; porém só mediante este
modo de representação se pode alcançar o que se
procura, a saber, que as ações têm lugar não
apenas em conformidade com o dever (em
conseqüência de sentimentos agradáveis), mas por
dever, o que tem de ser o verdadeiro fim de toda
60 formação moral”.
(KANT. Crítica da Razão Prática).
LEIS NATURAIS E LEIS MORAIS
(Instituídas pelos homens para regular suas relações)
 LEIS NATURAIS: leis nas quais todo o ser
vivo está submetido. Necessariamente nascemos,
vivemos e morremos, como todos os demais
animais. As leis naturais não estão subordinadas à
nossa vontade. Para o empirista inglês David
Hume (1711-1776), “a lei natural é resultado de
uma experiência fixa e inalterável”. Assim, todos
nós estamos submetidos a leis naturais invariáveis
cuja descoberta precisa e a redução ao mínimo
possível constituem os objetivos dos cientistas.
 LEIS MORAIS: O reino das leis morais é o
reino da práxis, no qual as ações são realizadas
racionalmente não por necessidade causal, mas
segundo a nossa vontade. Apesar de existirem
milhares de leis ou regras morais que variam de
sociedade para sociedade, segundo Kant (17241804) o dever é uma forma que deve valer para
toda e qualquer ação moral. Assim, o dever é o
respeito à lei ou ao imperativo categórico, que
ordena incondicionalmente a razão (de forma
90 absoluta), e vale, sem exceção, para todas as
circunstâncias das ações verdadeiramente morais.
O imperativo categórico é uma lei moral
universal.
PRINCIPAIS JUSTIFICAÇÕES PARA
AS NORMAS MORAIS
 PERSPECTIVA RELIGIOSA: os valores das
normas morais são considerados transcendentes,
porque resultam de doação divina, o que
determina a identificação do homem moral com o
homem temente a Deus.
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 PERSPECTIVA JUSNATURALISTA: a
norma moral se funda na lei natural (teses
jusnaturalistas). Para os teóricos jusnaturalistas,
como Rousseau, ela se funda no direito natural,
comum a todos os homens.
 PERSPECTIVA EMPIRISTA: a norma
moral se funda no interesse (teses empiristas, que
explicam a ação humana como busca do prazer e
evitação da dor). Para os empiristas, como Locke
e Condillac, a norma deriva do interesse próprio,
depois o sujeito que a desobedece será submetido
ao desprazer, à censura pública ou à prisão.
 PERSPECTIVA KANTIANA: a norma moral
se funda na própria razão. Para Kant, a norma se
enraíza na própria natureza da razão. Por
exemplo, ao aceitar o roubo e consequentemente o
enriquecimento ilícito, elevando a máxima
(pessoal) ao nível universal, haverá uma
contradição: se todos podem roubar, não há como
manter a posse do que foi furtado.
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AGORA É COM VOCÊ !
Exercícios Propostos
30 01) A palavra “ética” tem origem em dois termos
gregos que, pela falta de uma letra em língua
portuguesa para designar como fonema distinto o
“e” longo e o “e” curto, são referidos como ethos.
Os sentidos que mais bem expressam os
significados destes termos são:
a) finalidade e dever;
b) costumes e normas;
c) bem e dever;
d) costumes e caráter.
02) O que ‘realmente justifica’ a Ética ser
denominada “Filosofia Prática” é a ocupação
desta disciplina filosófica com a reflexão:
a) dos costumes e comportamentos humanos;
b) da razão e sensibilidade humana;
c) das leis naturais que instituem a moral humana;
d) dos valores éticos-morais que fundamentam a
ação prática (práxis) humana.
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03) “(...) há duas espécies de virtude, a
intelectual e a moral. A primeira deve, em grande
parte, sua geração e crescimento ao ensino, e por
isso requer experiência e tempo; ao passo que a
virtude moral é adquirida em resultado do hábito,
de onde e seu nome se derivou, por uma pequena
modificação dessa palavra1”.
(ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Livro II)
60
1
Do grego: ethos, e sua derivação ethiké.
Em relação a ética de Aristóteles, podemos
afirmar:
a) trata-se de uma deontologia, pois visa a
felicidade;
b) é baseada nas virtudes dianoéticas que
dependem do hábito;
c) tem por finalidade última o exercício da virtude
da justiça;
d) considera a instrução e o hábito fundamentais
para a virtude.
04) Aristóteles, em Ética a Nicômaco, afirma que
a natureza dá ao homem duas armas: a prudência
e a virtude. Acerca da phronesis, que pode ser
traduzida como prudência ou discernimento, o
filósofo afirma que:
a) é uma qualidade racional que leva à verdade no
tocante às ações relacionadas aos bens humanos;
b) é uma virtude moral que leva ao meio-termo
entre duas formas de deficiência moral;
c) é impossível ser uma virtude intelectual porque
não é conhecimento científico nem arte;
d) é a virtude intelectual que permite contemplar a
idéia de bem e aplicá-la às situações humanas.
05) De acordo com a ética aristotélica, o Bem
supremo é:
a) Deus, sumamente bom e poderoso que concede
90 a graça da fé aos que poderão encontrá-lo em sua
própria alma.
b) a liberdade, característica do eu puro de
ultrapassar a causalidade da natureza e forjar seu
próprio destino;
c) a boa vontade, regida pela consciência moral,
que se submete ao dever na obediência aos
imperativos;
d) a felicidade, buscada por todos os homens, e
que necessita ser conquistado numa atividade
dirigida pela razão;
e) a vontade de poder, que se realiza no eterno
retorno e na possibilidade de superar os valores do
cristianismo.
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06) Em sua obra Ética a Nicômaco, Aristóteles
sintetiza as virtudes que constituíam a excelência
moral grega. Assinale a alternativa em que a
virtude, o vício por excesso e o vício por falta
estão corretos:
a) amizade – bufonaria – grosseria.
b) coragem – temeridade – covardia .
c) moderação – exagero – insensibilidade.
d) liberalidade – luxúria – insensibilidade.
07) “A filosofia de Aristóteles pode parecer uma
catedral abandonada, uma construção a ser
visitada aos domingos, a respeito da qual
perguntaria, com certa curiosidade, que pessoas
a teriam habitado. Um exame mais atento da
filosofia do nosso século, porém, atesta o
contrário. Aristóteles foi continuamente discutido,
analisado, debatido, e isto nas mais diferentes
correntes, em momentos decisivos de suas
elaborações. Em particular, a ética aristotélica
ocupa uma posição privilegiada nos atuais
debates sobre a moral. A razão disso consiste
muito provavelmente no fato de que a ética
contemporânea buscou atenuar os elementos
demasiadamente rígidos que herdou do que
podemos considerar a ética por excelência da
época moderna – o formalismo kantiano. As
reflexões de Aristóteles sobre a ação, a moral e a
razão foram corretamente vistas por um bom
30 número de autores como podendo servir de
contrapeso a esta herança”.
(dianóia) e a virtude moral. Sobre a virtude moral,
podemos afirmar:
a) é representada principalmente pela sabedoria e
pela prudência (phrónesis), adquiridas pela
instrução e que trazem calma e tranqüilidade ao
homem;
60 b) é uma disposição de espírito ou hábito de
escolher em todas as situações a justa medida que
convém à nossa natureza;
c) é considerada como inata, ou seja, como uma
qualidade que o indivíduo já traz consigo ao
nascer;
d) é uma disposição de espírito que se concretiza
em ações e hábitos, porém não pode ser
transmitida pelo exemplo.
09) “(...) quanto à excelência moral, ela é o
produto do hábito, razão pela qual seu nome é
derivado, com uma ligeira variação, da palavra
‘hábito’. É evidente, portanto, que nenhuma das
várias formas de excelência moral se constitui em
nós por natureza, pois nada que existe por
natureza pode ser alterado por hábito”.
O texto acima foi extraído da obra de
Aristóteles Ética a Nicômaco, e pode ser
compreendido como este filósofo é contrário:
a) ao inatismo de Platão;
b) a análise conceitual de Sócrates;
c) a ideia de virtude como excelência moral;
d) a ideia de que a essência da excelência moral é
um meio-termo (mesotés).
(Marco Zincano. Prefácio. In: Hobuss João. Eudaimonia auto-suficiência
em Aristóteles. Pelotas: Ed. Universitária, UFPel, 2002, p. 9 (com
adaptações)
A partir do texto acima e de conhecimento acerca
da ética clássica, assinale a opção correta:
a) a ética de Kant é uma atualização da ética
aristotélica.
b) a ética contemporânea reconhece a necessidade
de recorrer à ética de Aristóteles, pois seus
conceitos parecem-lhe mais apropriados do que os
da ética moderna.
c) a filosofia aristotélica é um edifício em ruína,
relevante somente para fins arqueológicos.
d) a ética é o estudo das normas clássicas de
convivência social.
08) Aristóteles, em Ética a Nicômaco, afirma que
existem duas formas de virtude (qualidade
intelectual ou moral positiva do ser humano, que
o leva a agir visando o bem): a virtude intelectual
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10) “Age de tal modo que a máxima de tua ação
possa sempre valer como princípio universal de
conduta”.
90
(IMPERATIVO CATEGÓRICO. Immanuel Kant, filósofo alemão do
século XVIII)
Esta frase de Kant traduz os princípios
fundamentais da ética kantiana e significa que:
Assinale a(s) alternativa(s) correta(s):
a) devemos agir sempre pensando em nós
mesmos, sem nos importar com os outros;
b) devemos sempre agir pensando nos outros, sem
nos importar com nós mesmos;
c) nossa ação deve sempre estar fundamentada em
nossos desejos, exclusivamente;
d) nossa ação deve ser racionalmente decidida, de
forma que possa valer para todos e não apenas
para nós mesmos.
e) nossa ação deve ser decidida instintivamente,
de forma tal que valha tanto para nós mesmos
como também para todos os outros.
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11) O conceito de dever, na ética kantiana,
significa:
a) a necessidade de realizar uma ação conforme a
lei moral, relacionando-a com um objeto da
faculdade de desejar;
b) a ação objetivamente prática, isto é, a
coincidência entre a intenção do agente e os
efeitos da ação;
c) a ação objetivamente prática, isto é, a
coincidência entre a máxima que determina a
vontade e a lei moral;
d) a necessidade de realizar uma ação por respeito
à lei moral, sem relação com a motivação da
vontade.
12) Com relação à boa vontade em Kant,
podemos dizer que ela é a única coisa que
podemos considerar como um bem em si mesmo.
Sendo assim, é correto dizer que a boa vontade:
a) é algo que podemos notar através das atitudes e
dos resultados das ações alheias;
b) pode ser resumida na vontade de agirmos por
dever;
c) depende de uma série de circunstâncias
empíricas que a direcionem;
d) nos impele a escutarmos o que o nosso coração
tem a nos dizer, nos tornando mais sensíveis.
13) A separação entre a ética kantiana e as outras
30 é claríssima. Enquanto todas as outras concepções
morais – com exceção da estóica (Kant
reapresenta, por meio do imperativo categórico,
os
conceitos de
autonomia estoicistas,
delimitando a liberdade individual em conexão
com a sua universalidade) – especialmente o
hedonismo (defendia a busca do prazer como o
segredo da felicidade), o utilitarismo e o
eudemonismo, se fundam num imperativo
hipotético (p.ex., se queres ser feliz, bem sucedido
etc., observa esta lei), a moral de Kant funda-se
num imperativo absoluto, categórico: deves
obedecer sempre à lei, prescindindo de qualquer
preocupação com o útil ou o prejudicial.
De acordo com o texto acima, podemos
dizer que a concepção ética kantiana é chamada
de:
a) Teleológica;
b) Jusnaturalista;
c) Deontológica;
d) Empirista;
e) Estoicista.
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14) Segundo os estóicos, o mundo era governado
por um determinismo implacável do qual não se
podia fugir, e a receita da felicidade estava em
aceitar o que a vida nos dava. Uma anedota ajuda
a compreender esse ponto de vista. Dizem que
Zenão (336 – 264 a.C.), criador do estoicismo,
castigava um escravo por sua falta quando
60 argumentou que não tinha culpa, pois, segundo a
filosofia de seu senhor, ele estava condenado, por
toda a eternidade, a cometer aquela falta. Zenão
replicou que, da mesma forma, ele estava
destinado a bater no escravo. Epicuro (341 – 270
a.C.) discordaria dessa visão determinística e
argumentaria que nós mesmos somos guias de
nosso destino, pois podemos formá-lo com nosso
raciocínio. Aqui temos a ideia de Epicuro de que
o homem é livre e responsável sobre seu próprio
destino.
A música de Raul Seixas Um Messias
Indeciso poderia exemplificar bem a visão
epicurista sobre o destino: “Quem faz o destino é
a gente, na mente de quem for capaz”.
(Por Ivan Carlo A. de Oliveira. Mestre em comunicação pela Universidade
Metodista de São Paulo e professor universitário em Macapá)
Analise reflexivamente o texto acima e
faça um breve comentário sobre liberdade e
determinismo, concordando ou discordando
dessas duas posições. Resuma o seu comentário.
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15) “Encontro-me em grave apuro e me pergunto
se posso fazer uma promessa falsa, isto é, uma
promessa que não pretendo cumprir. A prudência
me aconselha a que não a faça, em vista das
conseqüências desfavoráveis que uma promessa
pode me acarretar. Mas, se me abstenho por
mera prudência, não se pode dizer que esteja
agindo moralmente. Ser sincero por medo de
alguma conseqüência desfavorável e ser sincero
por dever são duas coisas muito diferentes”.
(PASCAL, Georges. Compreender Kant. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes,
2005.p.123)
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Diante das duas situações apresentadas no texto
acima e com base na concepção ética kantiana,
assinale a alternativa que contém a máxima
pessoal que corresponde ao imperativo categórico
(lei da moralidade):
a) “é lícito, por prudência, tirar-me de uma
dificuldade com promessas mentirosas”.
b) “é lícito, por dever, tirar-me de uma dificuldade
com promessas mentirosas”.
c) “não devo fazer promessas mentirosas para não
perder o crédito quando se descobrir o meu
procedimento”.
d) “não fazer promessas mentirosas por dever
deve valer como lei universal (tanto para mim
como para os outros)”.
e) “ tirar-me de uma dificuldade por meio de uma
promessa mentirosa deve valer como lei
universal”.
17) “(...) um hipotético dono de mercearia, ao
deparar com um comprador inexperiente, uma
criança, por exemplo, não cobra um preço maior
do que o praticado normalmente. Essa ação foi
realizada por dever ? Kant dirá: depende. Caso o
merceeiro tenha feito isso para não perder outros
60 fregueses – já que o fato de cobrar mais caro de
uma criança poderia chegar ao conhecimento de
seus fregueses, e incomodá-los – a ação tem uma
intenção egoísta, e foi realizada com base em um
cálculo da relação entre meios e fim (“não vendo
por um preço mais alto para não perder
fregueses”). Caso o dono da mercearia tenha
agido por dever, ele se comportou de um ponto de
vista estritamente racional”.
(Por Maurício Keinert. Doutor em Filosofia pela USP).
No exemplo dado, é possível perceber, que
segundo a ética kantiana, é incorreto afirmar:
a) as ações humanas reguladas por meio de uma
intenção egoísta, não podem se caracterizadas
como livres, pois estão ancoradas em inclinações
(desejos, intenções, impulsos).
b) uma ação por dever não está fundada na
conseqüência da ação, no objeto do querer, mas
no princípio formal e racional (ligado à intenção)
que a determina.
c) para pensar uma ação por dever, é necessário
pensar em um princípio formal da vontade, que
deve ser compreendido como uma lei da razão
(“dever é a necessidade de uma ação por respeito
à lei”).
d) o uso prático da razão, na sua relação com a
vontade, é dependente de um fator empírico;
sendo assim, a própria lei racional poderá ter um
conteúdo predeterminado.
16) “Uma pessoa, por uma série de desgraças,
chegou ao desespero e sente tédio da vida, mas
está ainda bastante em posse da razão para poder
perguntar a si mesma se não será talvez contrário
ao dever para consigo mesma atentar contra a
própria vida. E procura agora saber se a máxima
da sua ação se poderia tornar em lei universal da
natureza. A sua máxima, porém, é a seguinte: Por
amor de mim mesmo, admito como princípio que,
se a vida, prolongando-se, me ameaça mais com
30 desgraças do que me promete alegrias, devo
encurtá-la”.
(KANT. Fundamentação da Metafísica dos Costumes)
De acordo com a concepção ética kantiana, e
supondo que tal maneira de pensar (a máxima
apresentada no texto) se transforme em lei
universal da natureza, assinale a alternativa
incorreta:
a) não poderia de forma alguma dar-se como lei
universal da natureza.
b) é absolutamente contrária ao princípio supremo
de todo o dever.
c) por amor de si mesmo, é perfeitamente possível
que uma lei universal da natureza possa subsistir
segundo aquela máxima.
d) conservar a vida, não por amor de si mesmo,
mas por dever, deve ser a máxima sem
contradição com a lei universal da natureza.
e) com o suicídio infringimos a lei moral com a
ideia de estarmos apenas abrindo uma exceção em
nosso favor.
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90
18) Segundo a ética kantiana, a “ação moral” é
definida por meio do(a):
a) virtude somente.
b) virtude e da felicidade.
c) interesse e do imperativo hipotético.
d) razão e do imperativo categórico.
e) direito natural.
19) O imperativo categórico kantiano (“Devo
proceder sempre de maneira que eu possa querer
também que a minha máxima se torne uma lei
universal”) está vinculado:
a) ao dever, a uma obrigação imposta pela razão.
b) a uma ação possível como um meio de alcançar
um determinado fim.
c) a regras de destreza ou conselhos de prudência.
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A educação desenha o futuro – Ensino Médio – Ética: filosofia moral – Prof. Ulisses Vasconcelos
d) às conseqüências da ação – do objeto do querer
– e do contexto em que são utilizados.
e) ao arbítrio humano sob a influência de
impulsos sensíveis.
20) Kant trata da questão da caridade no exemplo
a seguir:
“Se uma pessoa ajuda outra porque se sente bem
com isso, porque isso a torna mais feliz, há uma
intenção egoísta por trás de sua ação”.
O que denota que esta ação:
a) não foi realizada por dever.
b) é livre e inteiramente de boa vontade.
c) é moralmente correta.
d) é determinada pela razão.
e) não se baseia em um fator empírico.
________________________________________
CAPÍTULO 5
LIBERDADE E DETERMINISMO
INTRODUÇÃO
Quando nos referimos ao conceito de
liberdade, podemos fazê-lo a partir de diversas
30 perspectivas. No sentido mais comum, uma
pessoa livre é aquela que pensa e age por si
própria, não é constrangida a fazer o que não
deseja nem é escrava ou prisioneira. Mas
podemos considerar liberdade em outros sentidos
mais amplos, por exemplo, no âmbito da política,
da economia, das leis, da sociedade, dos espaços
específicos em que os indivíduos se relacionam
entre si no exercício do poder, dos negócios, do
direito, no convívio pessoal. Embora esses
campos tenham suas características próprias, em
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todos eles perpassa a ideia de liberdade ética, que
diz respeito ao sujeito moral, capaz de decidir
com autonomia em relação a si mesmo e aos
outros. Sabemos que, assim como somos
determinados pela natureza, somos submetidos à
regras
sociais
que
determinam
nosso
comportamento desde o nosso nascimento. É
preciso considerar os dois pólos contraditórios do
pessoal e do social como uma relação dialética, ou
seja, uma relação em que se estabeleça o tempo
todo a discussão da implicação recíproca entre
determinismo e liberdade, entre aceitação e recusa
da interdição.
O QUE É DETERMINISMO ?
Segundo o determinismo científico, tudo
que existe tem uma causa, ou seja, todo efeito tem
uma causa. O mundo explicado pelo princípio do
60 determinismo é o mundo da necessidade, e não o
da liberdade. Necessário significa tudo aquilo que
tem de ser e não pode deixar de ser. Nesse
sentido, necessidade é o oposto de contigência,
que significa “o que pode ser de um jeito ou de
outro”. Exemplificando: se aqueço uma barra de
ferro (causa), ela se dilata (efeito), pois a dilatação
é necessária, no sentido de que é um efeito
inevitável, que não pode deixar de ocorrer. No
entanto, é contingente que neste momento eu
esteja usando roupa vermelha ou amarela.
Como vimos, do ponto de vista moral,
somos determinados a herdar os valores do grupo
social a que estamos inseridos, mas a dimensão
social da moral passa pelo crivo da dimensão
pessoal. Ou seja, somos livres, e enquanto seres
capazes de agir de forma autônoma, podemos
alterar ou modificar totalmente essas regras, caso
contrário, as regras seriam eternamente válidas.
No campo moral, é importante refletirmos neste
item: se nossas ações e decisões dependem apenas
do nosso querer (da nossa vontade), da nossa
liberdade, ou são definidas e determinadas por
condições
que
nos
obrigam
a
agir
independentemente de nossa escolha consciente ?
CONTINGÊNCIA OU ACASO
A liberdade é a capacidade para darmos
um sentido novo ao que parecia fatalidade,
90 transformando a situação de fato numa realidade
nova, criada por nossa ação. Essa ação
transformadora, que torna real o que era somente
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30
possível e que se achava apenas latente como
possibilidade, é o que faz surgir uma obra de arte,
uma obra de pensamento, uma ação heróica, um
movimento anti-racista, uma luta contra a
discriminação sexual ou de classe social, uma
resistência à tirania e a vitória contra ela.
O possível não é pura contingência ou
acaso. O necessário não é fatalidade bruta. O
possível é o que se encontra aberto no coração do
necessário e que nossa liberdade agarra para
fazer-se liberdade. Nosso desejo e nossa vontade
não
são
incondicionados,
mas
os
condicionamentos não são obstáculos à liberdade
e sim o meio pelo qual ela pode exercer-se.
Se nascemos numa sociedade que nos
ensina certos valores morais – justiça, igualdade,
veracidade, generosidade, coragem, amizade,
direito à felicidade – e, no entanto, impede a
concretização deles porque está organizada e
estruturada de modo a impedi-los, o
reconhecimento da contradição entre o ideal e a
realidade é o primeiro momento da liberdade e da
vida ética como recusa da violência. O segundo
momento é a busca das brechas pelas quais possa
passar o possível, isto é, uma outra sociedade que
concretize no real aquilo que a nossa propõe no
ideal.
necessárias que regem a realidade conhecida e
controlada pela ciência e, no caso da ética, para
referir-se ao ser humano como objeto das ciências
naturais (química e biologia) e das ciências
60 humanas (sociologia e psicologia), portanto, como
completamente determinado pelas leis e causas
que condicionam seus pensamentos, sentimentos
e ações, tornando a liberdade ilusória.
O par contingência – liberdade também
pode ser formulado pela oposição acaso –
liberdade. Contingência ou acaso significam que
a realidade é imprevisível e mutável,
impossibilitando deliberação e decisão racionais,
definidoras da liberdade. Num mundo onde tudo
acontece por acidente, somos como um frágil
barquinho perdido num mar tempestuoso, levado
em todas as direções, ao sabor das vagas e dos
ventos.
Necessidade, fatalidade, determinismo
significam que não há lugar para a liberdade,
porque o curso das coisas e de nossa vida já está
fixado, sem que nele possamos intervir.
Contingência e acaso significam que não
há lugar para a liberdade, porque não há curso
algum das coisas e de nossa vida sobre o qual
pudéssemos intervir.
(Marilena Chauí, do livro Ensino Médio/2ª Série,
editora SER Abril Cultural)
(Marilena Chauí, do livro Introdução à Filosofia, editora Ática)
________________________________________
A liberdade como questão filosófica
Filosoficamente, a questão da liberdade se
apresenta na forma de dois pares de opostos:
1 – o par Necessidade – Liberdade.
2 – o par Contingência – Liberdade.
O par necessidade – liberdade também
pode ser formulado em termos religiosos, como
fatalidade – liberdade, e em termos científicos,
como determinismo – liberdade.
* Necessidade: é o termo empregado para referirse ao todo da realidade, existente em si e por si,
que age sem nós e nos insere em sua rede de
causas e efeitos, condições e conseqüências.
* Fatalidade: é o termo usado quando pensamos
em forças transcendentes superiores às nossas e
que nos governam, queiramos ou não.
* Determinismo: é o termo empregado, a partir
do século XIX, para referir-se às relações causais
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
PARA REFLETIR ou FILOSOFAR
 Thomas Hobbes (1588 – 1679): Para este filósofo, o
90 Direito de natureza, direito natural ou jusnaturalismo é o
conjunto de regras que se supõem existir em decorrência da
própria natureza do homem, ou da natureza em geral, e que,
por isso, independem de qualquer legislação feita pelo
homem, opondo-se, portanto, ao conceito de direito
positivo, que é o conjunto de regras estabelecidas pela
sociedade. Hobbes faz, no Leviatã (seu livro mais
conhecido), uma distinção interessante entre direito de
natureza e lei da natureza: “embora os que têm tratado
deste assunto costumam confundir jus e lex, o direito e a lei,
é necessário distingui-los um do outro. Pois o direito
consiste na liberdade de fazer ou de omitir, ao passo que a
lei determina ou obriga a uma dessas duas coisas. De modo
que a lei e o direito se distingue tanto como a obrigação e a
liberdade, as quais são incompatíveis quando se referem à
mesma matéria. A lei natural seria, assim, uma regra
imperativa, mesmo que decorrente da natureza das coisas”.
(CHALITA, Gabriel. Vivendo a filosofia. Volume único. São Paulo: Ática,
2005. p. 210)
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 Jean-Jacques Rousseau (1712-1778): Este filósofo
queria uma sociedade em que as pessoas fossem apenas
livres e iguais, mas também soberanas, isto é, que tivessem
um papel ativo dentro do contexto geral. Para isso, além de
um contrato justo, seria preciso ensiná-las a ser livres
(realizar o que o coração manda), autênticas (reconhecer e
mostrar verdadeiros sentimentos) e autônomas (conduzir o
próprio destino). E essa tarefa de “civilizar a civilização”
deveria partir da educação das crianças. O filósofo se
dedicou a ela escrevendo um tratado pedagógico em forma
de romance cujo título é Emílio, o nome da personagem
principal. A tese fundamental de Rousseau é a de que o
homem é naturalmente bom mas foi corrompido pela
sociedade.
A Liberdade para Aristóteles
(CHALITA, Gabriel. Vivendo a filosofia. Volume único.
São Paulo: Ática, 2005. p. 282)
____________________________________________________________
LIBERDADE EM HOBBES, MAQUIAVEL,
LOCKE E ROUSSEAU:
Filósofos apostam no exercício da crítica como
única forma de ser livre.
________________________________________
HÁ RECOMPENSA POSSÍVEL PARA QUEM
RENUNCIA À LIBERDADE ?
30
fatalismo a sua contraparte religiosa. No fatalismo existem
forças transcendentes, superiores às nossas, que nos
governam, quer queiramos ou não. Tanto no fatalismo
quanto no determinismo a liberdade é meramente ilusória.
Outro modo de refletir sobre a realidade, que deixa
pouca margem para a liberdade, é aquele no qual todos os
acontecimentos são atribuídos ao acaso, isto é, tudo é
imprevisível e mutável, impossibilitando qualquer tipo de
decisão ou escolha por parte do ser humano. Seremos,
então, todos impotentes e a liberdade humana mera ilusão ?
Seremos apenas peças no jogo dos deuses, subjugados à
Moiras e à Fortuna ?
Por José Antonio Rodrigues Porto*
Dizer que “renunciar à liberdade é renunciar à
qualidade de homem” exige que expliquemos o que é
liberdade e de que maneira ela participa da definição de ser
humano a que Jean Jacques Rousseau (1712-1778) nos
remete quando faz essa afirmação. O problema do
delineamento do campo da liberdade humana deve-se aos
restritos limites impostos à liberdade, tanto pela necessidade
quanto pela contigência.
Na vida cotidiana, o homem é oprimido por
situações adversas, contra as quais nada pode fazer, pois
essas são regidas por regras obrigatórias, tanto naturais
quanto culturais, que independem da vontade humana para
alterar-lhes o rumo ou direção. Essas regras são, assim
sendo, necessárias, e os homens se vêem impotentes para
lutar contra elas. Temos clara amostra delas, tanto nas
ciências quanto nas religiões.
Para a maior parte dos cientistas do final do século
XIX, as leis da natureza eram invariáveis, podendo ser
medidas por instrumentos muito precisos e independendo da
vontade de quem realizava a experiência. Hoje em dia,
podemos até fazer chover, mas as leis que regem a chuva
são próprias da natureza e ao cientista basta apenas saber
aplicá-las. Alguns cientista mais radicais do fim do século
XIX e início do século XX, conhecidos por fisicistas,
acreditavam na inteira determinação dos seres humanos,
inclusive dos seus pensamentos, sentimentos e ações de
acordo com a configuração física de seus corpos (genótipo)
e dos estímulos externos a que eram submetidos. Tal linha
60 de pensamento é conhecida por determinismo e tem no
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É em Aristóteles (384-322 a.C.) que encontramos o
primeiro teórico da liberdade. Para ele, a liberdade se opõe
ao que é condicionado externamente (necessidade) e ao que
acontece sem escolha deliberada (contingência). Aristóteles
distingue as ações voluntárias e involuntárias. As
involuntárias ocorrem por compulsão (força externa) ou
ignorância , ou seja, aquelas em que o “princípio motor se
encontra fora de nós e para o qual em nada contribui a
pessoa que age e que sente a paixão” . As voluntárias, em
contraposição, são todas aquelas ações nas quais o princípio
motor está no próprio agente. Aristóteles vai mais além, de
forma a tornar a análise mais precisa, e distingue as ações
voluntárias entre aquelas em que há escolha e aquelas em
que não há. As ações guiadas unicamente pelas paixões não
90 são ações orientadas por escolha, pois se assim fossem, os
próprios animais escolheriam, o que Aristóteles não pode
aceitar. A escolha, portanto, “envolve um princípio racional
e o pensamento”. Entretanto, não acaba aí a busca
aristotélica. Há ainda que se pesquisar o que pode ser objeto
de deliberação. Aristóteles nos mostra que só podemos
deliberar sobre coisas que estão ao nosso alcance e que,
efetivamente, podem ser realizadas . Assim, podemos dizer
que na concepção aristotélica a liberdade é o princípio que
rege a escolha voluntária e racional entre alternativas
possíveis.
A liberdade para Hobbes e
o Contrato Social no direito civil
Thomas Hobbes e o seu leviatã
Thomas Hobbes (1588-1679) acrescentou à
definição aristotélica mais uma restrição, qual seja, que
nosso poder de escolha entre possíveis não é incondicional,
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depende do nosso poder para realizá-los. Isso quer dizer que
nossa escolha é condicionada pelas circunstâncias naturais,
psíquicas, culturais e históricas em que vivemos . Note-se
que isso não é o mesmo que ser guiado pela necessidade, o
que seria novamente perda total da liberdade, ao contrário, o
possível se encontra no seio da necessidade, mas de alguma
forma temos o poder de alterar-lhe o curso, sob certas
condições. Os limites para a liberdade humana são, desse
modo, tanto internos quanto externos. Nesse sentido,
podemos dizer que a “a liberdade é a consciência
simultânea das circunstâncias existentes e das ações que,
suscitadas por tais circunstâncias nos permitem
ultrapassá-las” .
Apesar de nos movermos no mundo da necessidade
e da contingência – isto é, de não escolhermos as condições
e circunstâncias materiais que nos cercam, nem mesmo as
coisas imprevisíveis que nos podem acontecer – podemos,
contudo, mudar o rumo de determinados acontecimentos em
certas condições, surgindo um campo de possibilidades
objetivas, dentro do qual a liberdade humana é real. Nicolau
Maquiavel (1469-1527) expressou de forma bem clara essa
concepção quando disse: “’Já que nosso livre-arbítrio não
desapareceu, julgo possível ser verdade que a fortuna seja
árbitro de metade de nossas ações, mas que também deixe
ao nosso governo a outra metade, ou quase”. “Onde não há
lei não há liberdade” – um paradoxo ?
Anteriormente, definimos liberdade como sendo o 90
princípio que rege a escolha voluntária e racional entre
alternativas possíveis. Vimos, também, que sendo a escolha
30 um processo racional, o princípio de liberdade deve ser
exclusivamente humano. Como todos os homens só são
livres quando agem movidos unicamente por si mesmos, a
dificuldade da conciliação entre liberdade e sociedade reside
no fato de que nas sociedades os homens estão submetidos
às leis e, portanto, o motor de suas ações é externo.
Thomas Hobbes, na introdução do seu Leviatã, diz
claramente que o principal objetivo de qualquer sociedade
civil é a segurança de seu povo, Salus Populi, e que, para
tanto devem ser adotadas leis que expressem a vontade
artificial do corpo político. Para Hobbes, apesar de
pequenas diferenças, a natureza fez os homens tão iguais em
capacidade que nenhum deles pode aspirar a qualquer
benefício que o outro também não possa. Disso segue que
homens que possuam as mesmas esperanças possam, muitas
vezes, disputar os mesmos objetos, pois esses são os únicos
meios de alcançarem os seus fins. Quando isso acontece, um
homem verá o outro como um inimigo e o tratará como tal.
Ora, como todos os homens são iguais, basta que algum
deles perceba um único outro homem como inimigo para
que infira todos os demais como igualmente adversários,
formando assim um estado de desconfiança geral, pois todos
eles são capazes da mesma inferência. “Desta igualdade
quanto à capacidade deriva quanto à esperança de
atingirmos nossos fins. Portanto, se dois homens desejam a
mesma coisa, ao mesmo tempo em que é impossível ela ser
gozada por ambos, eles tornam-se inimigos”.
Um estado de tamanha insegurança levará esses 120
homens, que também são igualmente prudentes, a
conceberem que é muito mais sensato atacar antes de ser
60 atacado, o que é, inclusive, justificado como questão de
sobrevivência, pois não se pode manter uma posição
defensiva indefinidamente. Um tal estado não pode ser
descrito de forma mais exata do que um estado de guerra de
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todos contra todos, em que os homens igualmente só podem
ter uma vida solitária, pois não confiam em ninguém; uma
vida pobre, pois não há tempo para se produzir riquezas ;
sórdida e embrutecida, pois só visam a luta; e curta, pois
qualquer descuido pode resultar em morte.
Em tal estado não há sociedade, portanto, não há
leis comuns que regulem o justo e o injusto, ou, nem
mesmo, o meu e o teu. Não há lugar para qualquer tipo de
desenvolvimento material, pois o fruto do trabalho nunca é
seguro. Um tal estado, segundo Hobbes, só pode ser
mediante outras paixões que superem as anteriores, pois não
é uma faculdade da razão do homem hobbesiano regular as
paixões. Estas paixões são três: a) medo da morte violenta,
b) desejo das coisas necessárias a uma vida confortável, e c)
esperança de consegui-las através do trabalho. A superação
de um estado tão terrível só pode se dar por meio de um
acordo firmado com base em um contrato entre os homens.
Mas o que é um contrato ? Contrato é a “transferência
mútua de direitos” Direito é “a liberdade que todo homem
possui para utilizar em suas faculdades naturais em
conformidade com a razão reta”. Logo, devemos saber quais
direitos o homem possui em seu estado natural e que, ao
firmar um contrato, transferirá para outro.
Todo homem tem o direito natural, jus naturale,
que é a liberdade que cada homem possui de usar seu
próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de
sua própria vida; consequentemente, como “o direito ao fim
confere o direito aos meios necessários para aquele fim”,
tem também o direito de fazer tudo aquilo que julgar
necessário para alcançá-lo. Logo, todos terão iguais direitos
a todas as coisas, o que é absurdo e inútil, pois ninguém
poderá usufruir coisa alguma, pois não há diferença entre o
meu e o teu. O Estado natural hobessiano é, portanto, um
estado de tanta igualdade (faculdades e direitos) e liberdade
entre os homens, que as liberdades individuais acabam se
anulando umas às outras por falta de limites claros que as
distingam.
É somente através da cessão desse direito a todas
as coisas, através de um contrato, que o homem natural
poderá superar esse estado em que não tem como usufruir a
liberdade que possui. Entretanto, como a sociedade não
objetiva a preservação da liberdade, mas a segurança do
povo, o Estado civil hobessiano se caracterizará pela perda
total da liberdade, o que não contraditório, pois como o
direito a todas as coisas não pode ser exercido de fato, os
indivíduos não perdem nada e ainda ganham, entre outras
coisas, a segurança necessária à preservação de suas vidas.
O Estado civil hobbesiano se caracteriza, portanto, por uma
cessão total de direitos que todos os homens contratam entre
si em favor de um terceiro – homem ou assembléia –, que
por não participar do contrato, deteria todos os seus direitos,
submetendo todos à sua vontade – que “terá tanto poder
que, pelo terror que este suscita, poderá conformar as
vontades dos particulares à unidade e à concórdia”. A
vontade do corpo político é a vontade do soberano que,
como tem o poder de fazer as leis, se encontra acima delas.
Só o soberano é realmente livre no Estado hobessiano.
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Liberdade para Locke:
liberdade natural e civil
JOHN LOCKE (1632-1704)
Muito embora a doutrina hobessiana tenha
influenciado sobremaneira os pensadores de sua época,
felizmente não atingiu o mesmo êxito na prática. Nesse
sentido, se faz necessário a análise da liberdade nos escritos
de John Locke (1632-1704), outro pensador do século XVII,
que influenciou e fundamentou a política de seu tempo,
tendo seguidores até os dias de hoje. Encontramos a melhor
exposição sobre liberdade na sua obra Dois tratados sobre o
governo, no capítulo referente à escravidão. Nele, Locke
define as liberdades natural e civil: liberdade natural
“consiste em estar livre de qualquer poder superior sobre a
Terra e em não estar submetido à vontade ou à autoridade
30 legislativa do homem, mas ter por regra apenas a lei da
natureza”, e liberdade civil “consiste em não estar
submetido a nenhum outro poder legislativo senão àquele
estabelecido no corpo político mediante consentimento, nem
sob o domínio de qualquer vontade ou sob a restrição de
qualquer lei afora as que promulgar o legislativo, segundo
o encargo a este confiado”.
Analisando a definição de liberdade natural, notase que como todos os homens estão somente submetidos à
lei da natureza, o Estado de natureza lockiano é um Estado
onde há igualdade. Essa igualdade se dá porque todos os
seres humanos adultos e sadios têm na razão a faculdade
que permite o acesso a lei natural, que em parte alguma se
encontra escrita. Parece, pois, que a lei natural impõe ao
homem que viva segundo a regra da razão e da equidade,
donde podemos concluir que todos os homens nascem
iguais e livres, tal qual em Hobbes, mas de maneira muito
diversa, pois, para Locke, a razão “ensina a todos aqueles
que a consultam que, sendo todos iguais e independentes,
ninguém deveria prejudicar a outrem em sua vida, saúde,
liberdade ou posses”.
O ponto mais importante aqui é que a liberdade do
homem já se encontra, mesmo no estado de natureza,
limitada pela razão. Muito embora os limites possam não
ser claros para todos os homens, todos os homens sabem
que existem limites impostos pela pessoa do outro. A
liberdade não consiste em poder fazer tudo que se queira,
mas estar livre de restrições e violências por parte dos
outros homens, o que não pode existir onde não existe lei.
Em Hobbes, vimos que uma liberdade ilimitada era o
60 mesmo que liberdade alguma. Agora, em Locke, já é
possível compreender que a finalidade da lei não seja abolir
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ou restringir a liberdade, mas, ao contrário, conservá-la e
ampliá-la.
Locke não chega a discutir o assunto das paixões,
mas implicitamente admite ser provável que algum homem
talvez queira ultrapassar os limites da sua liberdade, quer
isso seja resultado de paixões ou ignorância. De qualquer
modo, como sua própria razão lhe dita uma regra e este
homem age de maneira diferente, obviamente não pode ser
a razão que o move, tornando-o, à vista dos demais, um ser
irracional, que deve ser impedido ou destruído para a
segurança de todos. É a própria razão que, mais uma vez,
dita a regra pela qual todos devem agir, e, nesse caso,
quando um homem ameaça aos demais, ela fundamenta o
direito que os homens têm de serem os executores da lei da
natureza, podendo punir o agressor proporcionalmente à
infração cometida. Há uma jurisdição recíproca entre todos
os homens, que são igualmente interpretadores e executores
da lei da natureza, entretanto, por terem a tendência de
interpretar a lei natural em seu próprio benefício, os homens
são levados a unirem-se em sociedade, onde haveria leis
escritas e um juiz para dirimir eventuais dúvidas. Para tanto,
cederão somente os seus direitos de interpretadores e
executores da lei natural, mantendo intacta a sua pessoa, no
que se refere à sua vida, liberdade e bens. O que Locke quer
dizer exatamente é que os homens são levados a abandonar
o Estado de natureza para estabelecer uma fonte de poder
comum de forma a regular, proteger e conservar as suas
propriedades.
90
Ora, vimos, anteriormente, que a igualdade entre os
homens é imprescindível para a sua liberdade. Dessa forma,
em sociedade, ou a igualdade é mantida ou um homem
poderá, arbitrariamente, submeter outro a sua vontade.
Como o que garante a igualdade no estado de natureza é a
submissão de todos à lei natural, em sociedade, todos, da
mesma maneira, devem estar submetidos a um mesmo
conjunto de leis. Desse modo, se algum homem detiver o
poder de fazer as leis, terá poder supremo sobre os demais,
eliminando a igualdade e a liberdade. A solução sugerida
por Locke é o estabelecimento de um poder legislativo,
escolhido e nomeado pelos cidadãos, de tal forma que só as
leis que forem sancionadas por esse poder teriam força de
obrigação para os indivíduos. Todavia, como o corpo
legislativo sempre será constituído por homens, para que o
capricho dos mesmos não exerça influência na elaboração
das leis, deve haver “limites para o poder legislativo”. São
eles: o governo deve ser exercido através de leis que não
poderão variar nos casos particulares, mas segundo uma
mesma regra para ricos e pobres, para o favorito na corte e o
camponês no arado; as leis devem sempre visar o bem do
povo; não deve ser imposto tributos sobre a propriedade do
povo sem o seu consentimento; não transferir o poder de
fazer leis para quem quer que seja.
De Hobbes a Locke, vimos como é possível
entender e superar o aparente paradoxo habilmente expresso
por Locke na frase “onde não há lei não há liberdade”. É
estranho pensar que para que haja liberdade é preciso que
haja também limites, mas se tratarmos os termos de forma
dialética ou sob o prisma da teoria das formas, talvez tudo
120 se torne mais claro. A liberdade humana sempre é limitada
e, à luz do prisma proposto, dar claros contornos a esse
limite torna também a liberdade mais clara. A lei, quando
bem estabelecida, é que dá os limites para a liberdade, é o
fundo sobre o qual a liberdade se destaca e, desta forma, em
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vez das leis contribuírem para a aniquilação da liberdade, na
verdade elas fazem, ao lhe dar contornos nítidos, com que a
liberdade adquira toda a sua amplidão. Será, então, que
simplesmente basta a elaboração de um perfeito conjunto de
leis para promover uma sociedade perfeita ?
Liberdade para Rousseau:
“Liberdade é não estar submetido à vontade de um outro homem”
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)
Rousseau diz que a liberdade e a igualdade são os
maiores bens e finalidades de uma legislação. Isso se dá
principalmente por que na sociedade civil de Rousseau
30 todos os súditos alienam todos os seus direitos em prol da
comunidade, tornam-se membros de um todo indivisível, de
tal forma que, não se alienando a ninguém em particular,
não se submetem a ninguém; por isso, podem ser livres,
pois, para Rousseau, liberdade é não estar submetido à
vontade de um outro homem.
O contrato social que vigorava seria, de acordo
com a visão de Rousseau, uma burla, uma enganação. Como
legitimar, isto é, tornar direito e justo aquilo que um dia não
passou de uma armadilha ? A resposta de Rousseau a essa
questão é formulada na obra Do contrato social. Dada a
impossibilidade de o homem voltar a seu estado primordial,
o filósofo se empenha em conceber um contrato social, ou
forma de associação, “que defenda e proteja a pessoa e os
bens de cada associado com toda a força comum, e pela
qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si
mesmo, permanecendo assim tão livre quanto antes”.
Para que isso ocorra, o pacto social deve nascer da
entrega total de cada indivíduo à comunidade, com o que ele
não perde nada, pois, diz Rousseau, “cada um dando-se a
todos não se dá a ninguém”. E ainda sai ganhando, porque,
como todos fazem o mesmo, ele recebe de volta todos os
direitos que cedeu e “maior força para conservar o que se
tem”. Assim todos se mantêm livres e iguais ao ingressar na
sociedade civil, isto é, o corpo político. Rousseau concebe,
pois, o corpo político como um todo, uma unidade orgânica,
com vida e vontade próprias. E o que dá vida ao corpo
político é a própria união de seus membros, ou seja, a
coletividade. As leis desse corpo político devem ser, desse
modo, o reflexo da vontade geral, que é aquela que busca o
60 melhor para a sociedade como um todo, ou seja, deve ser
aquela que satisfaz o interesse público, e não o de
particulares. E todo cidadão deve se subordinar a essa
vontade geral, mesmo que, como indivíduo (e não como
cidadão), entenda que ela contraria seu interesse particular.
Cid. Nova I, WE 9A, nº121, Coqueiro.
Fone: (091) 3235-1844
Na sociedade rousseauniana, o poder legislativo é
exercido por todo o corpo de cidadãos, de forma muito
semelhante aos comícios romanos, pois não há
representação. Cada cidadão participa do processo de
votação a diretamente, contribuindo tão estreitamente na
formação das leis, que podemos dizer que as leis que ele
segue foram feitas por ele mesmo, de tal forma que, ao
obedecer às leis, obedece a si mesmo, sendo, portanto, livre.
O que torna todos iguais, além da igual participação
política, é o fato das leis sempre serem gerais, atingindo a
todos igualmente, sem diferenciação, de tal forma que se,
individualmente, cada particular possa tender para a
desigualdade, a legislação o faz tender novamente para a
igualdade e, consequentemente, para a liberdade.
A autoridade soberana é exercida por todo corpo
político, e o governo, quer seja monárquico, aristocrático ou
democrático, está sempre submetido a ela. A manutenção da
liberdade, por isso, depende da atuação de todos os
cidadãos. Seria tudo muito simples em uma sociedade de
deuses, mas uma sociedade de homens fatalmente degenera,
pois os seus integrantes já se encontram degenerados. O
bom selvagem se encontra escondido debaixo de uma
espessa crosta de cobiça, ou seja, de aspiração “por todas as
coisas que, uma vez adquiridas, os tornariam felizes e
contentes”; de ilusão, porque uma vez nascidos sob um
90 governo, adotam a postura servil como natural,
principalmente movidos pelos costumes que a preservam
através do seu ensino; e de covardia, pois “o povo nem
sequer admite que se toque em seus males para destruí-los,
como aqueles doentes, tolos e sem coragem, que tremem em
presença do médico”. Tal qual o corcel que uma vez
domado se curva às ordens do seu dono e que, quando por
este é ornamentado com belas vestimentas, desfila
orgulhoso com os sinais do seu jugo.
Rousseau percebe que “não é aos escravos que
compete raciocinar sobre a liberdade”, mas aos homens
livre. Uma vez perdida a liberdade, ela não pode ser
recuperada, pois tal qual os senhores precisam de escravos,
os próprios escravos precisam de senhores e é da vontade
de servir que o senhor se alimenta. Pobres tolos, que cegos
de cobiça caem de joelhos voluntariamente diante de um
senhor que lhes tira tudo. Vemos, assim, que a manutenção
da liberdade requer prontidão. Não basta ser cidadão apenas
elegendo deputados ou votando em leis sob influência de
algum grupo. Há necessidade de se ter consciência de que a
liberdade deve ser defendida em cada ato e que tudo que
temos depende disso. Com a perda da liberdade tudo se
perde e “não há recompensa possível para quem a tudo
renuncia”. A eleição de representantes, nesse sentido,
colabora para o afastamento do povo na elaboração das leis,
tornando-o vítima da sua própria indolência. Dessa maneira,
é possível entender por que a religião civil de Rousseau
inclui a aceitação de alguns dogmas, tais quais: a felicidade
dos justos, o castigo dos maus e a santidade do contrato
social e das leis.
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É nesse espírito de fé, e tendo em vista o bem
comum, que os cidadão devem participar ativamente da vida
política. Não flertando com a servidão, por melhor que ela
esteja vestida. O ato de obedecer deve, portanto, sempre ser
uma decisão crítica. ©
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A educação desenha o futuro – Ensino Médio – Ética: filosofia moral – Prof. Ulisses Vasconcelos
AS CONCEPÇÕES FILOSÓFICAS DA LIBERDADE
DE ARISTÓTELES E DE SARTRE
* ATENÇÃO: Copiar é CRIME. Art. 184 do código Penal e Lei n° 5998/73
A primeira grande teoria filosófica da liberdade é
exposta por Aristóteles em sua obra Ética a Nicômaco e,
com variantes, permanece através dos séculos chegando até
o século XX, quando foi retomada pelo filósofo francês
Jean-Paul Sartre (1905-1980).
Nessa concepção, a liberdade se opõe ao que é
condicionado externamente (necessidade) e ao que acontece
sem escolha deliberada (contingência). Diz Aristóteles que é
livre aquele que tem em si mesmo o princípio para agir ou
não agir.
A liberdade é concebida como o poder pleno e
incondicionado da vontade para determinar a si mesma, isto
é, para autodeterminar-se. É pensada, também, como uma
capacidade que não encontra obstáculos para se realizar
nem é forçada por coisa alguma para agir. Trata-se da
espontaneidade plena do agente.
Além de distinguir entre o necessário e o
contingente, Aristóteles também distingue entre o
contingente e o possível: o primeiro é o puro acaso; o
segundo é o que pode acontecer desde que um ser humano
delibere e decida realizar uma ação. Assim, na concepção
aristotélica, a liberdade é o princípio para escolher entre
alternativas possíveis, realizando-se como decisão e ato
voluntário.
Contrariamente ao necessário ou à necessidade e à
contingência, sob as quais o agente sofre a ação de uma
30 causa externa que o obriga a agir de determinada maneira,
no ato voluntário livre o agente é causa de si, isto é, causa
integral de sua ação. Sem dúvida, poder-se-ia dizer que a
vontade livre é determinada pela razão ou pela inteligência
e, nesse caso, seria preciso admitir que não é causa de si ou
incondicionada, mas é causada pelo raciocínio ou pelo
pensamento.
No entanto, como disseram os filósofos posteriores
a Aristóteles, a inteligência inclina a vontade para certa
direção, mas não a obriga nem a constrange, tanto assim que
podemos agir na direção contrária à indicada pela
inteligência ou razão. É por ser livre e incondicionada que a
vontade pode seguir ou não os conselhos da consciência. A
liberdade será ética quando o exercício da vontade estiver
em harmonia com a direção apontada pela razão.
Em sua obra O ser e o nada, Sartre levou essa
concepção ao ponto limite. Para ele, a liberdade é a escolha
incondicionada que o próprio homem faz de seu ser e de seu
mundo. Quando julgamos estar sob o poder de forças
externas mais poderosas do que nossa vontade, esse
julgamento é uma decisão livre, pois outros homens, nas
mesmas circunstâncias, não se curvaram nem se resignaram.
Em outros termos, conformar-se ou resignar-se é
uma decisão livre, tanto quanto não se resignar nem
conformar, lutando contra as circunstâncias. Quando
dizemos que não podemos fazer alguma coisa porque
estamos fatigados, a fadiga é uma decisão nossa, tanto assim
60 que uma outra pessoa, nas mesmas circunstâncias, poderia
decidir não se sentir cansada e agir. Da mesma maneira,
quando dizemos estar enfraquecidos e por isso não temos
força para fazer alguma coisa, a fraqueza é uma decisão
nossa, pois um outro poderia, nas mesmas circunstâncias,
não se considerar fraco e agir.
Por isso Sartre faz uma afirmação aparentemente
paradoxal, dizendo que estamos condenados à liberdade.
Qual o paradoxo ? Identificar liberdade e condenação, isto
é, dois termos incompatíveis, pois é livre quem não está
condenado.
O que Sartre pretende dizer ? Que, para os
humanos, a liberdade é como a necessidade e a fatalidade,
não podemos escapar dela. É ela que define a humanidade
dos humanos, sem escapatória. ©
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Um só pensamento
Nos meus cadernos de escola
Minha carteira e nas árvores
Nas areias e na neve
Gravo o teu nome
Em cada página lida
Em cada página em branco
Papel pedra sangue ou cinza
Gravo o teu nome
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[...]
Na ausência sem mais desejos
Na solidão toda nua
Em cada degrau da morte
Gravo o teu nome
Na saúde que voltou
No perigo que passou
Na esperança sem saudade
Gravo teu nome
Graças a uma só palavra
Reconheço a minha vida
Nasci para conhecer-te
E chamar-te
Liberdade.
Paul Éluard (trad. Guilherme de Almeida)
In: ALMEIDA, Guilherme de. Poetas de França. 4. Ed. São Paulo:
Nacional, 1965.
Cid. Nova I, WE 9A, nº121, Coqueiro.
Fone: (091) 3235-1844
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