Série palavra sem carne # 2
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Série palavra sem carne # 2
O corpo como prótese O corpo como prótese O implante como órgão O implante como órgão Marcelo Peron Pereira (14/08/2008 – versão 08) 1 Série Palavra Sem Carne #2 72 O pornográfico em nossa sociedade se opõe ao erótico. Ele não emula ou investe o corpo, mas o digitaliza. A pornografia corresponde a uma desensibilização do corpo, que assume formas metonímicas, convertendo-se em próteses e implantes para um prazer que é, ao mesmo tempo, desinvetimento do corpo. O caráter obsceno que assume, por conseguinte, nada tem a ver com o sexo ou com a sexualidade. O pornográfico diz respeito ao fato de que o próprio corpo deixa de ser fundamento do prazer e da experimentação erótica, para receber, de fora, implante de sensações, produzidas industrialmente. O ignominioso que querem ver na pornografia não está no sexo, mas na total ausência de sexo. Decorre, a rigor, da mecanização do corpo que passa efetivamente, materialmente, à condição de artefato, máquina. Uma vez perdida, contudo, a dimensão do prazer que emana do corpo, elimina-se igualmente o fundamento da dor e, em particular, da sujeição à dor. O que pretendem chamar de pornografia é algo de muito distinto, portanto. Tratase mais propriamente da obliteração do outro como realidade material, concreta, para converter-se em não mais do que um avatar. 73 *** São Paulo, sábado, 26 de julho de 2008 Texto Anterior | Próximo Texto | Índice foco Arraial do prazer reúne atores e atrizes pornôs, exibicionista e voyeur Paulo Sampaio DA REPORTAGEM LOCAL A noiva seminua responde ao repórter de TV qual a diferença entre filme erótico e sacanagem: "Um é trabalho, coisa séria, o outro é diversão", diz a atriz Márcia Imperator. O repórter então aponta para uma foto de Daniel Dantas em uma revista e pergunta como ela classificaria os episódios que levaram o banqueiro a ser acusado por formação de quadrilha, gestão fraudulenta, evasão e lavagem de dinheiro. "Ah, isso aí é putaria!" Márcia está na festa de lançamento da produtora de filmes eróticos Exxclusive, 74 anteontem, em uma boate da Vila Olímpia (zona sul). Dos 800 convidados do "Arraiá do Prazer", 200 eram atores pornôs. Como tudo foi montado nos moldes de uma festa junina, a produção adaptou o ambiente com barraquinhas de pescaria, roleta e jogos de argola. Na pescaria, os prêmios eram produtos como camisinhas, lubrificantes e algemas; na roleta, duas garotas em trajes sumários giravam uma roda em que se liam nomes de partes do corpo, como "boca", "pé", "bunda", "peito": o participante poderia beijá-las no local apontado, quando a roda parasse de girar; as argolas eram lançadas na direção de vários consolos de borracha, de forma a acertar seu eixo. A ficha custava R$ 2,50. "Garota de programa tem em qualquer balada, o legal daqui é que fica claro", afirma o personal trainer Leandro Gonçalves, 21. A festa foi freqüentada principalmente por rapazes pós-adolescentes de boca aberta, marmanjos estilo "tigrão" e atores seminus com vasto currículo em filmes pornôs. Contam-se poucas mulheres à paisana na fila de entrada. A curitibana Marilise Hickmann, 22, de passagem por São Paulo, diz que está ali a convite de uma prima que organizou a festa. Toda de preto, muito 75 vestida para a ocasião, parece meio deslocada. "Estou tranqüila. Por enquanto não fui confundida", diz ela, que trabalha na área financeira. O cenário apresenta elementos contrastantes. Enquanto o ator Poax, 23, 683 filmes, alisa descompromissadamente os seios da atriz Anne Portilla, 20, recém-introduzida no meio do cine-pornô, um casal de jovens "góticos" observa tudo sem sobressaltos. Alianças na mão direita, o técnico em contabilidade Bruno Penkal, 20, e a noiva, Karen Andrade, 18, muito brancos com roupas muito escuras, dizem com um ar meio entediado que "está tudo bem". A estudante de rádio e TV Andréa Carolina, 19, não acha. "Tô perdidaça, não sabia que a festa era temática", diz ela, acompanhada de cinco amigas. Elas saem logo, rumo à boate Vegas, na rua Augusta. Andréa e as amigas dizem que "até têm uns bonitinhos aqui, mas quando eles vêm na nossa direção andando de perna aberta dá até medo". André, 17, e Rodrigo, 18, não sentem falta do grupo de Andréa. "Cara, olha isso", dizem, às gargalhadas, com latinhas de cerveja na mão, olhando para a "performance erótica" de um casal de atores na pista de dança. O 76 rapaz suspende a moça só de microssaia, sem a parte de cima, e a gira no alto. Do outro lado das barracas eróticas, as de comida estavam às moscas. "Não vendemos uma espiga de milho até agora", diz Telma. O dono da produtora, Salomon Jr., explica que a idéia é fazer filmes eróticos com acabamento de cinema. "Queremos lançar dez títulos por mês", afirma ele. "O que mais vende é o que as pessoas chamam de "bizarrice", como uma senhora de idade transando com um garotão." Segundo o presidente da Abeme (Associação Brasileira de Empresas do Mercado Erótico), Evaldo Shiroma, o Brasil movimenta por ano R$ 800 milhões em produtos do gênero, 30% disso em filmes. "Há cerca de 10 produtoras nacionais, que realizam por ano, em média, 720 filmes", diz. *** O equivalente do operário acorrentado é esse cenodrama vaginal japonês, mais extraordinário que qualquer striptease: moças de coxas abertas à beira de uma estrada, os proletários japoneses em mangas de camisa (é um espetáculo popular) autorizados a meter o nariz e os 77 olhos até dentro da vagina da moça, para ver melhor, - o quê? – trepando uns sobre os outros para alcançá-la, a moça conversando gentilmente com eles o tempo todo ou ralhando por formalidade. Todo o resto do espetáculo, flagelações, masturbações recíprocas, strip tradicional apaga-se diante desse momento de obscenidade absoluta, de voracidade do olhar que ultrapassa de longe a posse sexual. Pornô sublime: se pudessem os tipos meter-se-iam inteiros dentro da jovem – exaltações de morte? Talvez, mas ao mesmo tempo eles comentam e comparam as respectivas vaginas sem nunca rir ou gargalhar, numa seriedade mortal e sem nunca tentar tocá-las, a não ser por brincadeira. Nada de lúbrico: um ato extremamente grave e infantil, uma fascinação integral pelo espelho do órgão feminino, como de Narciso por sua própria imagem. Muito além do idealismo convencional do striptease (talvez lá dentro houvesse até sedução), no limite sublime o pornô converte-se numa obscenidade purificada, aprofundada no domínio visceral – por que deter-se no nu, no genital? Se o obsceno é da ordem da representação e não do sexo, deve explorar o próprio interior do corpo e das vísceras; quem sabe que gozo profundo de esquartejamento visual, de mucosas e de 78 músculos lisos daí pode resultar? Nosso pornô ainda tem uma definição muito restrita. A obscenidade tem um futuro ilimitado. (BAUDRILLARD, 1991, p.40) *** São Paulo, sábado, 26 de julho de 2008 Próximo Texto | Índice Viva a diferença O mercado quer enfiar todos no padrão que vai do 36 ao 44, e deixa meio mundo a descoberto. Veja o guia de lojas que praticam outros pesos e medidas DANAE STEPHAN COLABORAÇÃO PARA A FOLHA 79 Se o público-alvo das principais grifes do mercado fosse uma representação fiel da população brasileira, todos seriam magros e altos, com pés, pescoço, peito, pernas e braços dos mesmos tamanhos. Também não existiriam canhotos. Infelizmente, para o mercado, as pessoas ainda têm tamanhos diversos e características próprias que impedem tal uniformização. Isso acaba criando nichos nos quais poucas empresas investem no Brasil. Encontrar uma tesoura para canhotos nas lojas de São Paulo é tarefa inglória, embora eles representem cerca de 10% da população. Quem tem pés grandes fica restrito a duas ou três lojas, enquanto quem tem pés muito pequenos precisa se contentar com linhas adolescentes. Lojas de roupa de tamanhos grandes existem aos montes, mas poucas fogem do estilo senhorinha. E os sapatos que têm numeração intermediária, comuns nos Estados Unidos, por aqui ainda são novidade. "A gente vive em uma sociedade que padroniza tudo e não respeita as diferenças", afirma o psicólogo Marco Antonio de Tommaso, ligado à Associação Brasileira para Estudo da Obesidade. "Na Argentina, foi aprovada uma lei que obriga todas as lojas a trabalharem com o tamanho até o 46. Nos Estados Unidos, as lojas montam a roupa de acordo com a anatomia do cliente. Aqui, quem manda ainda são os estilistas. Quem foge à 80 regra cai no serviço sob medida, muito mais caro", diz. Mesmo os considerados "normais" no Brasil sofrem com a padronização, ou melhor, com a falta dela. "Existe uma norma para orientar as empresas com relação à numeração, mas ela não é obrigatória", afirma Silvio Napoli, engenheiro têxtil e gerente de tecnologia da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção). "Cada empresa tem sua própria estrutura de medidas, por isso se usa 38 em uma loja e 40 em outra". Nesse sentido, dá para prever algum avanço. Em setembro, o INT (Instituto Nacional de Tecnologia) iniciará uma pesquisa que pretende fazer uma medição do corpo do brasileiro para redefinir os padrões da indústria. O instituto vai receber scanners especiais que fazem um mapeamento 3D de todo o corpo em 20 segundos. "Poderemos estabelecer padrões de roupa que atendam a todas as pessoas, ou a pelo menos 90% da população", diz Maria Cristina Zamberlan, chefe do Laboratório de Ergonomia do INT. Se é para seguir um padrão, que ele seja, pelo menos, mais democrático. *** A partir de 1936 (...) Benjamin vai reintegrar cada vez mais o momento romântico em sua crítica marxista 81 sui generis das formas capitalistas de alienação. Por exemplo, em seus escritos dos anos 1936-1938 sobre Baudelaire, ele retoma a idéia tipicamente romântica, sugerida em um ensaio de 1930 sobre E. T. A. Hoffmann, da oposição entre a vida e o autômato. Os gestos repetitivos, vazios de sentido e mecânicos dos trabalhadores diante da máquina - aqui Benjamin se refere diretamente a algumas passagens de O capital de Marx - são semelhantes os gestos autômatos dos passantes na multidão descritos pro Poe e Hoffmann. Tanto uns quanto outros, vítimas da civilização urbana e industrial, não conhecem mais a experiência autêntica (Erfahrung), baseada na memória e na tradição cultural e histórica, mas somente a vivência imediata (Erlebnis) e, particularmente, o Chokerlebnis [a experiência do choque] que neles provoca um comportamento reativo de autômatos “que liquidaram completamente sua memória”. (LÖWY, 2005, p. 27-28) *** Houve, durante a época clássica, uma descoberta do corpo como objeto e alvo do poder. Encontraríamos facilmente sinais dessa grande atenção dedicada então ao corpo – ao corpo que se manipula, se modela, se treina, que obedece, responde, se torna hábil ou cujas forças se multiplicam. O grande livro do Homem-máquina foi escrito 82 simultaneamente em dois registros: no anátomo-metafísico, cujas primeiras páginas haviam sido descritas por Descartes e que os médicos, filósofos continuaram; o outro, técnico-político, constituído por um conjunto de regulamentos militares, escolares, hospitalares e por processos empíricos refletidos para controlar ou corrigir as operações do corpo. Dois registros bem distintos, pois tratava-se ora de submissão, ora de utilização, ora de funcionamento e de explicação; corpo útil, corpo inteligível. “O homem-máquina” de La Mettrie é ao mesmo tempo uma redução materialista da alma e uma teoria geral do adestramento, no centro dos quais reina a noção de “docilidade” que une ao corpo analisável o corpo manipulável. É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado. Os famosos 83 autômatos, por seu lado, não eram apenas uma maneira de ilustrar o organismo; eram também bonecos políticos, modelos reduzidos de poder: obsessão de Frederico II, rei minucioso de pequenas máquinas, dos regimentos bem treinados, e dos longos exercícios. (FOUCAULT, 2002, p. 117-118) *** At a certain point of time, the motif of the doll acquires a sociocritical significance. For example: “You have no idea how repulsive these automatons and dolls can became, and how one breathes at last on encountering a full-blooded being in this society. Paul Lindau, Der Abend (Berlin, 1986), p. 17 Apud (Benjamin, 1999, p. 695) In his study “La mante religeuse: Recherches sur la nature et la sgnification du mythe” <The praying Mantis: Investigations into the Nature and Meaning of Myth>, Calois refers to striking automatism of reflexes in the praying mantis (there is hardly a vital function that it does not also perform decapitated). He links it, on account of its fateful significance, with the baneful automatons known to us from myths. Thus Pandora: “automaton fabricated by blacksmith god for the ruin of humankind, for that “which all shall / take to their hearts with delight, an evil to love and embrace” (Hesiod, Works and Days, line 38). We encounter something similar in the Indian Kyrtya 84 – those dolls, animated by sorcerers, which bring about death of men who embrace them. Our literature as well, in the motif of femmes fatales, possesses the concept of a woman-machine, artificial, mechanical, at variance with all living creatures, and above all murderous. No doubt psycho-analysis would not hesitate to explain this representation in its own terms by envisaging the relations between death and sexuality and, more precisely, by finding each ambiguously intimated in the other”. Roger Caillois, “La amante religeuse: Recherches sur la nature et la sgnification du mythe”, Mesures, 3, nº 2 (April 15, 1937). (BENJAMIN, 1999, p. 696) *** Homem é descoberto em banheiro com boneca inflável Um americano foi detido na cidade de Cesar Rapids, no Estado de Iowa, ao ser encontrado deitado ao lado de uma boneca inflável, com as calças abaixadas, em um banheiro público de prédio de escritórios. Craig S. McCullough, 47 anos, foi indiciado por exposição indecente e má conduta. Nas acusações contra McCullough, consta que ele foi descoberto em banheiro público por agente da Agência de Imigração e 85 Alfândega dos EUA, que funciona no mesmo prédio. McCullough foi detido e a polícia de Cedar Rapids o levou para a cadeia do condado de Linn. A ficha criminal de McCullough inclui também uma condenação, de 2004, por arrombar loja de noivas. Após o roubo, policiais encontraram McCullough nas redondezas carregando manequim com vestido de noiva. http://noticias.terra.com.br/popular/interna/0,,OI2034089-EI1141,00.html *** Boneca inflável corre o risco de ser trocada por modelo mais novo Da Redação Milla (ai, Milla!) Jovovich como Leeloo; duvido que a boneca seja tão bonita assim Uma nova geração de parceira sexual artificial promete roubar o lugar das tradicionais bonecas infláveis, após ter sido apresentada na 10ª Convenção Erótica de Los Angeles, a grande feira do setor na capital mundial da pornografia. Trata-se de Leeloo, uma boneca de silicone cujo protótipo foi apresentado pela californiana "My party doll". "É a melhor que já experimentei", disse à agência de 86 notícias AFP um "especialista" em bonecas infláveis. Leeloo recebeu este nome em homenagem ao personagem de Milla (ai, Milla!) Jovovich no filme de ficção "O Quinto Elemento" (1997), de Luc Besson. "Leeloo não é como as velhas bonecas (infláveis) que estouram, é tão sólida que até pode servir como macaco para erguer um carro", acrescentou Goldman, entusiasmado com a criação, fruto de dois anos de trabalho do francês Yves Becker. http://noticias.uol.com.br/tabloide/tabloideanas/2006/06/27/ult1594u837.jhtm *** Motoristas usam boneca inflável para escapar de multas Objetivo é trafegar em faixas da Nova Zelândia que exigem três ocupantes no veículo. Alguns colocam no carro cães vestidos ou estudantes que cobram pelo serviço. Da Reuters entre em contato Arte G1 A equipe de arte do G1 imaginou o manequim no carro (Foto: Arte G1) Saiba mais 87 Diversos motoristas de Auckland, a maior cidade da Nova Zelândia, passaram a colocar bonecas infláveis, manequins e até cachorros vestidos de criança no banco de passageiro de seus carros para burlar leis de trânsito. A “moda” surgiu entre aqueles que querem dirigir em faixas restritas a carros com pelo menos três ocupantes – os que desobedecerem à lei podem ser multados em cerca de R$ 180. “Há pessoas estranhas, que realmente usam essa tática”, afirmou Andre Dannhauser, gerente de segurança do tráfego. Os fiscais responsáveis por monitorar essas faixas ouvem os mais diversos tipos de desculpas quando os motoristas são fotografados no flagra. A mais comum, quando não há ninguém 88 no banco ao lado, é de que o passageiro era muito pequeno e, por isso, não foi capturado pela foto. Além das desculpas e dos falsos passageiros, também há estudantes que cobram uma pequena taxa para fazer companhia ao motorista durante o trajeto que exige um número mínimo de passageiros. “O dinheiro que eles ganham com isso não é suficiente para comprar uma cerveja”, afirmou Dannhauser. http://g1.globo.com/Noticias/PlanetaBizarro/0,,MUL600563-6091,00.html *** Homem afirma que já fez sexo com mais de mil carros Americano já 'namorou' o fusca Herbie e carro do seriado 'Supermáquina'. Na internet, ele faz parte de fórum com mais de 500 'amantes' de veículos. Do G1, em São Paulo entre em contato 89 Divulgação O americano Edwards Smith, ao lado de 'Herbie', um de seus antigos 'amantes'. (Foto: Divulgação) "Não sou doente. Sei que já tive mais de mil namoradas, mas amei cada uma delas". Aos 57 anos, o americano Edward Smith se considera, na verdade, um romântico. A diferença é que, em vez de mulheres, Smith tem o hábito de namorar carros. "Eu aprecio a beleza, e tenho uma relação diferente com a beleza dos automóveis... Chego a um ponto onde essa apreciação vira uma expressão de amor", explica Smith, atualmente 'noivo' de um fusca branco batizado de 'Baunilha'. 90 Em entrevista ao jornal britânico 'Telegraph', ele diz que sua primeira experiência sexual com um carro foi aos 15 anos. Desde então, ele nunca mais se sentiu atraído por mulheres ou homens. Curiosamente, assim como a maioria das pessoas, Smith tende a ter mais interesse sexual em celebridades. No caso, ele afirma já ter transado com 'Herbie', da série 'Se meu fusca falasse', e 'K.I.T.T.', mais conhecida como 'Supermáquina'. Ele não esconde o fato de nunca ter sido 'fiel' aos carros que namora. Afirma, inclusive, que sua experiência sexual mais intensa foi com um helicóptero do seriado 'Águia de Fogo', dos anos 80. Smith diz que não está sozinho em seu fetiche. Na internet, ele encontrou uma comunidade que reúne mais de 500 "amantes de carros". "É mais comum do que a maioria das pessoas imagina", diz. *** 91 Romeno reclama de gemido de boneca inflável e sex shop é multado Boneca havia parado de ‘gemer’ e esvaziava muito rápido. A loja foi multada em 600 libras e o homem recebeu um novo produto. Do G1, em São Paulo entre em contato Arte/G1 Equipe de Arte do G1 imaginou a boneca inflável com defeito (Ilustração: Arte/G1) Autoridades de proteção ao consumidor da Romênia receberam uma reclamação inusitada: um consumidor estava indignado pois sua boneca inflável havia ‘perdido o gemido’, noticiou o site Ananova nesta semana. Confirmado o defeito na boneca, o sex shop de Brasov, na Transilvãnia, foi multado em 600 libras (cerca de R$ 2 mil) e obrigado a dar uma nova boneca ao comprador. 92 O homem, que segundo o site tinha por volta de 40 anos, também reclamou que o produto esvaziava muito rápido. Iulian Mara, chefe do centro de proteção ao consumidor, disse que "não importa o quanto a reclamação pareça estranha, nós fomos ao sex shop onde o homem comprou o objeto e vimos que ele estava certo.” Segundo Mara, “a boneca estava perdendo ar rapidamente e devido a falhas no sistema elétrico não fazia os sons específicos esperados.” http://g1.globo.com/Noticias/PlanetaBizarro/0,,MUL293329-6091,00.html 20/05/2008 - 15h53 - Atualizado em 20/05/2008 - 18h17 *** Escocês pelado é acusado de tentar fazer sexo com carro Segundo a polícia, jovem teria abraçado veículo e simulado 'movimentos eróticos'. Acusado diz que não quebrou leis de seu país, e se diz inocente. Do G1, em São Paulo entre em contato 93 Editoria de arte/G1 Tentativa de sexo com carro levou escocês para a delegacia. (Ilustração: Editoria de arte/G1) Um jovem morador da cidade de Kilwinning, na Escócia, foi detido pela polícia sob a acusação de tentar fazer sexo com um carro. O acusado, de 18 anos, teria sido flagrado correndo pelado pelas ruas da cidade. Segundo a polícia, o jovem teria se debruçado sobre a traseira de um carro, e simulado "movimentos eróticos". O caso ocorreu em fevereiro, mas polícia divulgou os detalhes detenção apenas na última semana, acordo com reportagem publicada diário escocês Irvine Times. a da de no Apesar da prisão ter ocorrido em flagrante, o jovem alega ser inocente e 94 nega ter quebrado as leis de seu país. O acusado, que responderá em líberdade, vai ser julgado pela corte de Kilmarnock em agosto. 95 (...) É pelo sexo efetivamente, ponto imaginário fixado pelo dispositivo de sexualidade, que todos devem passar a ter acesso à sua própria inteligibilidade (já que ele é, ao mesmo tempo, o elemento oculto e o princípio produtor de sentido), à totalidade do seu corpo (pois ele é uma parte real e ameaçada deste corpo do qual constitui simbolicamente o todo), à sua identidade (já que ele alia a força de uma pulsão à singularidade de uma história). Por uma inversão que começou, provavelmente, de modo sub-reptício há muito tempo – e já na época da pastoral cristã da carne – chegamos ao ponto de procurar nossa inteligibilidade naquilo que foi, durante tantos séculos, considerado como loucura; a plenitude de nosso corpo naquilo que, durante muito tempo, foi um estigma e como que a ferida neste corpo; nossa identidade, naquilo que se percebia como obscuro impulso sem nome. Daí a importância que lhe atribuímos, o temor reverente com que o revestimos, a preocupação que temos de conhecêlo. Daí o fato de se ter tornado, na escala dos séculos, mais importante que nossa alma, mais importante do que nossa vida; e daí todos os enigmas do mundo nos parecem tão leves comparados a esse segredo, minúsculo em cada um de nós, mas cuja densidade o torna o mais grave de todos. O pacto faustiano cuja tentação o dispositivo da sexualidade inscreveu em nós é, doravante, o seguinte: trocar a vida inteira pelo próprio sexo, pela verdade e soberania do sexo. O sexo bem vale a morte. É nesse sentido, estritamente histórico, como se vê, que o sexo hoje em dia é de fato transpassado pelo instinto de morte. (FOUCAULT, 1988, p. 145-146) 96 97 98 99 100 101 102 103 104 105 106 107 108 109 110 111 112 113 Por conseguinte a clonagem é o último estádio da simulação do corpo, aquela em que, reduzido a sua fórmula abstrata e genética, o indivíduo está determinado à multiplicação em série. Walter Benjamin disse que o que se perdeu da obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica foi sua “aura”, essa qualidade singular do aqui e do agora, a sua forma estética; ela passa de um destino de sedução para um de reprodução e, nesse novo destino, assume uma forma política. Perdeu-se o original, e só a nostalgia pode reconstituí-lo como “autêntico”. A forma extrema desse processo é a dos meios de comunicação de massa contemporâneos; neles o original 114 nunca teve lugar, e as coisas são de imediato concebidas em função de sua reprodução ilimitada. É exatamente o que acontece com o ser humano em relação à clonagem. É o que acontece ao corpo quando concebido apenas como um estoque de informações e de mensagens, como substância informática. Nada se opõe então a sua reprodutibilidade serial, nos mesmos termos usados por Benjamin para os objetos industriais e as imagens. Há uma precessão do modelo genético sobre todos os corpos possíveis. É a irrupção da tecnologia que comanda esta desordem, de uma tecnologia que Benjamin já descrevia como médium total – gigantesca prótese comandando a 115 geração de objetos e imagens idênticas, que nada mais podia diferenciar entre si – mas ainda sem conceber o aprofundamento contemporâneo dessa tecnologia, que torna possível a geração de seres idênticos sem que se possa voltar ao original. As próteses da era industrial ainda são externas; exotécnicas; as que conhecemos ramificaram-se e se interiorizaram: esotécnicas. Estamos na era das tecnologias brandas, software genético e mental. As próteses da indústria, as máquinas, ainda voltam ao corpo para modificar-lhe a imagem, elas mesmas eram metabolizadas no imaginário, e esse metabolismo fazia parte da imagem do corpo. Mas, quando 116 se atinge um ponto sem volta na simulação, quando as próteses infiltram-se no coração anônimo e micromolecular do corpo, quando se impõe ao próprio corpo como matriz, queima-se todos os circuitos simbólicos ulteriores, sendo qualquer corpo possível nada mais que sua imutável repetição, então é o fim do corpo e de sua história, o indivíduo não é mais que uma metástase cancerosa da fórmula de base. (BAUDRILLARD, 1991, p. 193-194) 117 Elegia (Augusto de Campos - Péricles Cavalcanti) Deixe que minha mão errante Adentre atrás, na frente, Em cima, em baixo, entre Minha América Minha terra a vista Reino de paz se um homem Só a conquista Minha mina preciosa Meu império, feliz De quem penetre o teu mistério Liberto-me ficando teu escravo Onde cai minha mão Me selo gravo Nudez total Todo prazer provém do corpo Como a alma em seu corpo Sem vestes, como encadernação cristosa Feita para iletrados A mulher se enfeita, Mas ela é um livro místico E somente a alguns a que tal graça Se consente é dado lê-la. Eu sou um que sabe. 118 Genérico, porém único http://www.estado.com.br/suplementos/ali/2008/02/03/ali-1.93.19.20080203.7.1.xml O corpo sem gorduras tornou-se uma propriedade aristocrática. Como a riqueza e a fama, pertence apenas aos sortudos ou esforçados Mônica Manir (03/02/2008) A Mulher Samambaia estendeu seus ramos para a avenida. Persona do programa Pânico na TV, ela cantou “o meu carnaval ôôô” da escola paulistana Tom Maior, que enalteceu as empresas ecologicamente corretas em tudo. Danielle Souza foi representar a natureza da mulher brasileira. Paira a dúvida, porém, se não significou mais uma das fiéis samambaias de tronco malhado, peitudo e bundudo que dominam os desfiles. Samambaias que vingam como ideais de beleza. Escultura para copiar nas mesas de cirurgia plástica. Espécies-modelo. Corpo padrão. “Quanto mais se impõe o ideal de autonomia, mais aumenta a exigência de conformidade aos modelos sociais do corpo”, afirma a antropóloga Mirian Goldenberg, organizadora do recém-lançado O Corpo como Capital (Estação das Letras e Cores). Quem investe na “boa forma”, banalizada pela mídia, é desejado e admirado, mas não necessariamente feliz. Assume postos reais e por vezes imaginários. “Quanto vale o corpo na busca pela satisfação pessoal?”, perguntam-se outros oito especialistas ouvidos pelo Aliás. O antropólogo Gilberto Freyre, em seu Modos de Homem, Modos de Mulher, de 1987, já anunciava: “Pode-se dizer da mulher que tende a ser, quanto a modas para seus vestidos, seus sapatos, seus penteados, um tanto mariavai-com-as-outras”. Criticava o desejo generalizado das senhouras de rejuvenescer à custa de cosméticos. Mas ele mesmo exaltava um padrão de beleza brasileira: mulher baixa, pele morena, cabelos negros, longos e crespos, 119 cintura afunilada, bunda grande, peitos pequenos. A Sonia Braga, portanto. Queria fazer o contraponto com as alvas, longilíneas e loiras, de cabelos “arianamente lisos”, um modelo macaqueado da Europa. A Vera Fischer, à época. A Gisele Bündchen, hoje. Na planilha de Freyre certamente não constava a massa de silicones que povoa o carnaval. Lançado na avenida, como lembra Mirian Goldenberg, ele virou regra. Até quem é “da comunidade” tem. E, se não tem, parece que tem. “Existe um corpo ideal que virou uma lente, por meio da qual enxergamos além da realidade”, explica Mirian. Ela quer dizer que, de perto, nem todos os peitos, quadris e bumbuns são esculpidos no molde, mas nossa câmera interna entende que sim. A câmera de TV e as revistas de famosidades também dão seu pitaco ao reprisar o padrão. Para Hans Gumbrecht, professor de literatura comparada na Universidade de Stanford, nos EUA, e autor de Elogio da Beleza Atlética (Companhia das Letras), a mídia iguala os gostos da classe média. Se bem que, ao gosto dele, “os minibiquínis são quase antiquados, um ideal dos tempos áureos da Playboy”. Aqui, o vestuário do carnaval está mais para alegoria, por vezes descartada. “O corpo é a verdadeira roupa”, define Mirian Goldenberg. Adriana Bombom, rainha de bateria da Tom Maior e também da Portela, veste um biquíni adornado com pingentes, “para ficar menos vulgar”. Mas também não vai com tudo tapadinho. Reflete: se está podendo, por que se cobrir? “É uma hipocrisia no Brasil. Há liberdade para o corpo na avenida, mas nos 8 mil quilômetros de litoral não se aceita um topless”, compara a editora de moda Lilian Pacce. “Será que brasileiro só agüenta a nudez do que entende como belo?” Bombom diz que pode porque se sacrifica. Três meses antes do desfile, ela se impõe uma dieta diária de oito claras de ovo e 50 gramas de batata cozida de duas em duas horas, adicionados de suplementos e vitaminas, 120 galões d’água e mais 40 minutos de exercício. Sai vitoriosa aos olhos de quem vê na banha caída sinal de desleixo próprio, coisa de preguiçoso, gente fraca. O médico Flávio Gikovate, um estudioso da felicidade, destaca que, antigamente, magreza era sinal de pobreza. Quem era de uma classe social mais baixa encolhia a barriga por falta de opção. Hoje a pouca gordura corpórea se tornou uma propriedade aristocrática. Pertence aos sortudos ou esforçados, como a riqueza e a fama. Assim, os menos favorecidos perdem, aparentemente, grandes chances de ascender socialmente. Perdem felicidade. Mas por que a beleza genérica precisa ser magra? O sociólogo francês Pierre Bourdieu entende que a dominação masculina ditou essa condição. A mulher existe primeiro pelo olhar do homem, que a deseja delicada, submissa, fina, magra. Não à toa elas criticam as regiões de seu corpo que percebem como grandes demais, enquanto eles se irritam com as partes que consideram pequenas além da conta. Aliás, para quem acha que a vaidade masculina é fenômeno recente, a psicanalista Maria Rita Kehl avisa: “Os homens sempre foram vaidosos. A novidade é que estão tão narcisistas que pouco se interessam pelas mulheres. A conquista de uma mulher bonita tem como intenção a confirmação do poder fálico”. A neura para se encaixar na categoria “fêmea com pouca gordura” pode explicar, em parte, por que somos líderes mundiais em uso de medicamentos para emagrecer. No Relatório Anual da Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes, órgão da ONU, divulgado há um ano e referente a 2005, 98,6% do fenproporex e 89,5% da anfepramona, duas das substâncias inibidoras de apetite mais usadas no globo, foram produzidos no Brasil e a maior parte consumida aqui. Confirmando a estatística, estudo divulgado pela Secretaria Nacional Antidrogas em novembro de 2007 revelou que o brasileiro engole quase 90% dos medicamentos para emagrecer feitos no mundo. ‘Preciso ver Cristina’ 121 Para contrabalançar, a bunda. Não aquela murcha, mas a avantajada, de tanajura. Em um questionário aplicado a 444 homens, Mirian Goldenberg confirmou o que Tim Maia cantou pelos sete mares: os homens precisam ver Cristina. A Cristina de Tim Maia era uma mulata voluptuosa, empregada doméstica de uma amiga, que tinha (a mulata) uma super retaguarda. O compositor saía disparado do Grajaú até a cobertura da amiga em Copacabana, aonde chegava trôpego e cantarolando safadamente: “Preciso ver Cristina”. Pois então, o bumbum está no topo da pesquisa de Mirian. Abaixo vêm o corpo como um todo e então os seios. Tudo liso, sem marcas indesejáveis como os sulcos das estrias ou o efeito casca de laranja da celulite. A antropóloga recorre a Bordieu para explicar a tara pelo traseiro das mulheres. Segundo o francês, a parte é sinal preponderante de natureza, sexualidade, animalidade, inferioridade. Do lado oposto, as mulheres apontam o tórax como distintivo de maior atração nos homens, seguido do corpo como um todo e do olhar. O único até então rei de bateria, Daniel Manzioni, que seguiu à frente dos ritmistas da Acadêmicos de São Paulo, malhou bastante o peitoral e mal comeu carboidrato para manter os músculos em dia. Mais do que proteção, ao eleger essa parte do corpo, as mulheres falam de hemisfério norte, de cabeça, de inteligência. “Assim como no caso da magreza”, completa Mirian, “é como se a cultura inscrevesse no corpo as posições que homens e mulheres ocupam na sociedade.” Quando a gordura não cede ao medicamento, nem as coxas à malhação, nem as rugas aos cosméticos, a brasileira e o brasileiro entram na faca. Ou entram na faca direto mesmo, sem pudores. A última pesquisa da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica foi divulgada em 2004 e relata o seguinte: 70% das operações estéticas foram feitas em mulheres. De 2002 a 2003, aumentou em 43% o número de jovens que se submetem à plástica, 15% deles com menos de 18 anos. Quanto à categoria, 54% são 122 lipoaspiração, 32% contornam as mamas e 27% a face. Nos últimos 12 anos, o implante de prótese de silicone cresceu 360%, perdendo apenas para a lipo. Nos últimos dez, o número de cirurgias nos seios entre adolescentes aumentou 300%. No geral, perdemos apenas para os EUA, considerando que as americanas ganham 14 vezes mais dinheiro que as brasileiras. Em Making the Body Beautiful (Tornando o Corpo Bonito), o americano Sander Gilman marca a origem da cirurgia estética na epidemia de sífilis do século 16, quando se inventaram técnicas de enxerto de pele para reparar a degeneração do nariz dos sifilíticos. Três séculos depois, cirurgiões criaram procedimentos para mascarar o nariz novamente, mas o nariz amassado dos irlandeses, visto como marca inerente à raça. Daí Gilman associar as cirurgias plásticas à impostura, ao se fazer passar pelo que não se é. No centenário da imigração japonesa, a modelo Ângela Bismarchi quer se passar pela gueixa Madame Butterfly na função de rainha da bateria da Porto da Pedra. Desfila de hoje para amanhã com olhos puxados no bisturi. Até lá, seu nariz restaurado duas vezes apoiará uma máscara ocular de cristais, para manter o suspense. Essa é a 42ª cirurgia estética de Ângela. Entre as incisões, aumentou as mamas cinco vezes, o bumbum duas, furou o queixo mais duas e alterou a intimidade outra dupla de vezes. Ela quer tirar o recorde da americana Cindy Jackson, que passou por 47 intervenções. A modelo, detida pelas autoridades em 2000 por ter desfilado nua com a bandeira brasileira estampada no corpo e em 2002 por ter “homenageado” o presidente Lula com as bochechas e o bigode dele desenhadas em si mesma, também nua em pêlo, foi objeto de comentário de sites estrangeiros pelos olhos puxados. O blog Dlisted disse, sem piedade, que a última cirurgia foi “a mais idiota que ela fez”. Guinness à parte, o psicanalista Jorge Forbes usa o caso 123 para tratar de identidade e da reação do povo às mudanças radicais. Para Forbes, a identidade atual é múltipla. “Foi-se a época em que era relacionada a um único valor.” Hoje as pessoas se transformam e se reafirmam mudando roupa, cabelo, leituras, vocabulário. Quando, entretanto, alguém intervém sobre o corpo por um aspecto “leviano”, pequeno no tempo e na importância, quebra o pacto social. Até pouco tempo, lembra Forbes, existiam limites naturais à manipulação. Se mexesse demais no corpo, a pessoa poderia morrer. Mas a tecnologia se superou. E, se a natureza não bota freio nisso, o homem o faz. Ainda que Ângela Bismarchi diga que o corpo é dela, o povo rebate que ele pertence à humanidade. “Submeter-se a riscos de infecção e afins para modificar a aparência por motivo temporário, que a priori duraria até a quarta de cinzas, é arriscar em grande potência a sobrevivência do ser humano”, afirma. Ivo Pitanguy, o cirurgião dos cirurgiões plásticos brasileiros, classifica a operação estética como ramo nobre da cirurgia geral, “pois busca restituir ao corpo em sofrimento sua função e dignidade”. Aos que passam por sua clínica implorando o queixo de uma celebridade acoplado à barriga de outra, ele vê o que pode fazer. Dependendo do caso, não opera, mas encaminha para tratamento psicológico. Em novembro, no lançamento de sua autobiografia, Aprendiz do Tempo (Nova Fronteira), Pitanguy disse que a última moda é a boca à Angelina Jolie. Mas confidenciou: “A Angelina é uma mulher bonita, mas da boca eu não gosto. Fazer boca grande com enchimento fica feio”. O gosto mediano vai na mão contrária. A atriz lidera a preferência das mulheres que querem fazer plástica nos lábios. Se o nariz não agrada, dá-lhe Nicole Kidman. A bunda dos sonhos é a de Jennifer Lopez, mas Juliana Paes também ganha 10 nesse quesito. Essas referências constam de pesquisa da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética com 20 mil cirurgiões plásticos de 84 países, entre eles o Brasil, divulgada nessa semana. 124 Ninguém cogitou o nome de Preta Gil, a bocuda da vez na reclamação contra a tirania dos corpos esbeltos. Preta levou um caldo dia desses no mar. “Disseram que eu sou uma baleia e fizeram uma montagem na internet com um trator amarrado a mim, me puxando da areia.” Ela vai processar o autor da montagem. “Quando era jovem, queria ser magra, muitas vezes indo contra a minha natureza. Nem todo mundo tem estrutura para viver esse massacre. Não sou gorda, sou uma referência.” Fica para os especialistas o dilema da samambaia. Até onde buscar um corpo perfeito é eficaz para o sucesso no ambiente que se quer conquistar? Para Forbes, o corpo padrão vale pouco sem o charme. “Hoje em dia, ou a pessoa oferece um efeito-surpresa, ou é genérica.” Quem deseja fugir da cultura do rebanho precisa saber quem é, requisita a filósofa Marcia Tiburi. O fotógrafo J. R. Duran resgata São Tomás de Aquino para dizer que tudo está na intenção, “não só de quem se expõe mas também de quem observa”. No carnaval, duas pessoas podem estar despidas, mas uma é vulgar e outra, não. O que torna uma mais cativante, ainda que ambas tenham as medidas parecidas, é a linguagem do corpo. Autônoma, exclusiva, única. *** 'O corpo tornou-se um simples acessório' http://www.estado.com.br/suplementos/ali/2008/02/03/ali-1.93.19.20080203.9.1.xml? Design não é mais exclusividade de objetos e o consumismo torna obsoleta a sacralidade física, diz antropólogo Flávia Tavares (03/02/2008) 125 O antropólogo francês David Le Breton é conhecido como o maior especialista do mundo em corporeidade - a análise do corpo no contexto social. Para ele, o corpo não pode ser visto apenas como um suporte da alma. “Corpo e ser são indissociáveis. Tanto que não dizemos ‘olha, ali vai aquele corpo’. Dizemos ‘ali vai aquele homem, aquela mulher, aquela pessoa’.” Autor de Adeus ao Corpo (Ed. Papirus) e A Sociologia do Corpo (Ed. Vozes), Le Breton é professor de sociologia na Universidade Marc Bloch, em Estrasburgo, na França, e é membro do Institut Universitaire de France. Confira trechos da entrevista que ele concedeu ao Aliás. O que é o corpo e o que ele representa nas interações sociais? A condição humana é corporal. O corpo não é apenas um suporte. Ele é a raiz identificadora do homem ou da mulher, o vetor de toda a relação com o mundo, não só pelo que o corpo decifra através das percepções sensoriais ou da sua afetividade, mas também pela maneira como os outros nos interpretam diante dos diferentes significados que lhes enviamos: sexo, idade, aparência, movimentos, mímicas, etc. Por meio do corpo, o indivíduo assimila a substância da sua vida e a traduz para os outros por meio de sistemas simbólicos que ele divide com os membros de sua comunidade. O corpo é a expressão máxima de raça, origem e ancestralidade? Hoje, num contexto de individualização do sentido e de mercantilização do mundo, o corpo tornou-se um simples acessório. Sua antiga sacralidade ficou obsoleta, ele não é mais o suporte inquebrantável de uma história pessoal, mas uma forma que se recompõe incansavelmente ao gosto do momento. O consumismo em que estão mergulhadas as sociedades, e particularmente as jovens gerações, fez do corpo um objeto de investimento pessoal. Agora, o que importa é ter um corpo seu, assinado. O design não é mais exclusividade dos objetos. 126 O que mudou na nossa relação com o corpo ao longo da história? Durante muito tempo, o corpo não foi muito questionado, ele não representava nenhuma preocupação. Numa frase famosa, Freud fala da anatomia como um destino. As pessoas assumiam a forma de seu corpo e ninguém era julgado pela sua aparência, porque ninguém tinha realmente influência sobre ela. Agora, o importante é modificar as partes essenciais do corpo, para deixá-las conforme a idéia que a pessoa tem de si própria. O corpo se tornou um alter ego, uma duplicata, uma projeção de si mesmo, um pouco decepcionante, mas pronta para modificações. Sem isso, seu corpo seria uma forma incapaz de abrigar suas aspirações. Que uso fazemos do nosso corpo socialmente? O corpo é modelado por um contexto social e cultural. É o primeiro objeto de comunicação porque, antes de começar a falar com o outro, nós o olhamos e prestamos atenção a uma infinidade de dados físicos e de vestuário que, por um lado, condicionam o tom da conversa. Quem não se desvalorizado? cuida ou se deixa envelhecer é O culto ao corpo atinge as categorias sociais de maneira desigual. Os homens, por meio do culturismo por exemplo, valorizam o seu “sobrecorpo” , mas eles nada têm a perder. Não é o caso das mulheres, que têm a obrigação social de manter sua sedução, e consideram o envelhecimento uma deformação. A cirurgia estética atinge uma população feminina composta cada vez mais de jovens. A mulher é julgada impiedosamente com base em sua aparência. A busca por um padrão de beleza é conseqüência de uma sociedade em que somos interessantes mais pelo que parecemos ser do que pelo que somos? 127 É preciso se colocar fora de si para se tornar você mesmo, tornar mais significativa sua presença no mundo. A interioridade é um trabalho de exterioridade, que exige retrabalhar ininterruptamente seu corpo para aderir a uma identidade efêmera, mas essencial num momento do ambiente social. Assim, a tirania da aparência força os indivíduos a uma disciplina constante, a um trabalho sobre si mesmo. Uma atitude paradoxalmente puritana. As disciplinas outrora exteriores aos indivíduos, segundo a famosa análise de Michel Foucault, hoje estão nas mãos de pessoas que as impõem a si próprias. As disciplinas estão sob a égide do marketing. Mas é claro que o culto do corpo é, em primeiro lugar, um desprezo pelo corpo de origem. Quem faz intervenções extremas no próprio corpo deve ser visto como um caso patológico? Nem o corpo, nem o sexo, nem a orientação sexual são vistos hoje como essências, mas como construções pessoais e revogáveis. Decorrem de uma decisão própria e de uma prática cosmética adaptada. Alguns indivíduos vão, portanto, longe demais na vontade de se transformar e possuir um corpo que pertença apenas a eles. Não há nada de patológico nisso, simplesmente o desejo de uma pessoa de criar uma identidade, uma aparência, tornando-se enfim dona de si mesma. *** A apoteose de corpos insubmissos http://www.estado.com.br/suplementos/ali/2008/02/03/ali-1.93.19.20080203.8.1.xml O carnaval é um acerto de contas. O momento do físico contra o espírito, do desejo contra a continência. Ele desveste o que os poderes vestiram José de Souza Martins* 128 (03/02/2008) Sempre houve uma certa expectativa quanto a quem será desancado ou quem será bajulado na relativa surpresa dos nossos desfiles carnavalescos e na ordem invertida que representam. O carnaval nos chegou de Portugal, como entrudo. Trouxe-nos a medieval cultura das inversões simbólicas das identidades e dos poderes nos três dias da festa. Na cultura do avesso, assimilou manifestações centradas na tensão do corpo com sua dominação social e política, vindas de grupos negros e indígenas. O carnaval tornou-se o momento da pública exposição dos acontecimentos do ano e de suas figuras à mordacidade da crítica popular ou à sua bajulação. É o momento da manifestação do corpo insubmisso, como instrumento de um discurso gestual da contrariedade. Momento em que os grandes pagam pelos desaforos feitos aos pequenos. Mas, também, hora em que o puxa-saquismo se torna monumental, na visibilidade de uma gratidão material ou política carregada de malícia. É a hora do troco, em que a força subversiva do imaginário do povo se dá a ver nos enredos dos sambas, nas cores e nas alegorias de carros e fantasias, nos desfiles de cordões e escolas de samba, no Rei Momo, monarca do faz-de-conta, o antipoder de três dias. É o momento dos fracos contra os fortes, da sociedade contra o Estado, da rua contra as instituições. O carnaval é um acerto de contas anual, o intervalo de um corrosivo tempo de deboche. Não é só o presente que cai na pancadaria simbólica dos carnavalescos. O passado inteiro está sujeito a apreciações sem cerimônia, em que nunca se sabe se a narrativa dos sambas-enredo são irônicas por intenção ou por desinformação. De qualquer modo, é sempre prudente recomendar aos estudantes que a melhor fonte do conhecimento histórico ainda é o livro. Mas é também o momento do corpo contra o espírito, do desejo contra a continência e a repressão, do proibido contra o permitido. Não é apenas feliz acaso que o nome da 129 primeira escola de samba do Rio de Janeiro tenha sido Deixa Falar, uma insurgência contra a língua comprida e a dominante sociedade dos linguarudos, da polícia e dos comentadores da vida alheia, da “decência” oficial contra a “indecência” popular, da repartição pública contra a rua e o povo. Não é à-toa que, em carnavais de outros tempos, e hoje menos, as pessoas se fantasiassem, ou se fantasiem, de seus contrários, homem vestido de mulher, mulher vestida de homem, adultos vestidos de bebês, de “mamãeeu-quero-mamar”, mascarados vestidos de demônio nesse tempo ritual de anjos decaídos. É o embaralhamento das identidades, no vestuário e nas máscaras carnavalescas em que traços do antagônico são ressaltados para expor as fisionomias reais, do perverso, do sovina, do corrupto, do oportunista, que se ocultam nas dissimuladas fisionomias cotidianas. É a personificação crítica das alteridades que demarcam repressivamente nossa nem sempre fácil vida de todo dia. É a máscara que permite transgredir sem ser reconhecido nem ser punido. A transfiguração de cada um naquele que ele não é. É, sobretudo, o duplo sentido do dizer oculto. O carnaval é o momento mais forte e significativo de exposição da centralidade do corpo na nossa cultura, como referência problemática da realidade social. O corpo nu e natural é apenas adjetivo, apenas ponto de reparo e referência da construção do corpo imaginário e social, o corpo que pode ser “lido”, situado e compreendido. Desde o nascimento, as crianças são trajadas de maneira a adquirirem a identidade que as situará no mundo, a cor da roupa, o brinco da menina, os brinquedos. Os ritos de casamento são, basicamente, ritos de fecundidade, sacralização da troca biológica de sangue entre os esposos, modo de assegurar a antecipação cultural e social dos corpos que serão gerados, simbolicamente concebidos desde antes de existirem. Nesses processos, o corpo é situado nas tensões da vida e da morte, do transitório e do eterno, do mortal e do imortal. O carnaval desveste o que os poderes vestiram. Ele é bem mais do que crítica social e política. Nele se 130 expressam essas tensões constitutivas do humano, no pouco caso das fantasias de caveira e de demônio, na exorcização do medo e da morte, na negação do sobrenatural no corpo liberto, até mesmo no extremo da nudez em desfiles de escolas de samba. No fundo, o carnaval é um contra-rito religioso. Inscrito na véspera da Quaresma e do tempo do luto e da dor, é o tempo do desejo e da euforia, que precede um tempo de jejum e de punição ritual do corpo, um tempo de purgação da pecaminosa carnalidade do homem. Antes desse recolhimento litúrgico, a licença do carnal, não só o da sexualidade, mas também o do apetite, sujeitos às interdições rituais e à fria temperança da Quaresma. O carnaval é um intervalo cíclico de transgressão consentida, que no temporário da festa liberta o corpo desordenador e a desordem consentida que dele resulta. Não por acaso, o carnaval é o tempo da folia, da loucura e da multidão. Embora seja um intervalo no tempo herdado da liturgia religiosa, da qual muitos estão cada vez mais distantes, é no carnaval que a crise social e as mudanças de longa duração, quase imperceptíveis, se manifestam no curto tempo do desabafo. Na perspectiva desse tempo longo é possível notar que, na sua substância, o carnaval está acabando lentamente. Não só porque se torna progressivamente um empreendimento comercial sujeito a regras empresariais, que em tudo negam a insurreição livre do corpo e do desejo. Mas, também, porque no cotidiano elementos de identificação carnavalesca do corpo estão agora presentes e não só entre jovens. É muito significativo quando tatuagens e piercings, adornos corporais permanentes, se tornam cada vez mais complementos de uma nudez semi-oculta, mas proclamada. Uma negação explícita da transitoriedade ritual do carnaval e uma desconstrução do corpo submisso, uma forma de dizer que a insurreição de três dias se torna a insurreição visual de um ano inteiro - e se esvazia. * José de Souza Martins é professor titular de Sociologia da Faculdade de Filosofia da USP 131 'Pátina de juventude' é mais um êxito do universo da reciclagem http://www.estado.com.br/suplementos/ali/2008/02/03/ali-1.93.19.20080203.10.1.xml Aceitar um corpo recosturado ou com partes postiças tem menos a ver com o mundo da cirurgia do que com o da ecologia Vicente Verdú* (03/02/2008) Uma nova cosmética somada ao dinheiro proporcionou a imagem da reciclagem ideal. Essa cosmética se revelou tão assombrosa que não só devolve à pessoa a imagem de sua foto guardada carinhosamente, mas faz ressurgir essa imagem como procedente de um ser que durante anos se manteve ausente ou mascarado numa injusta enfermidade facial. A referência não se esgota nos diferentes casos de Ana Rosa Quintana, Lola Herrera, Isabel Preysler ou Victoria Abril (celebridades espanholas). Os efeitos dessa fórmula, introduzida magicamente na pele, vão reajustando a cútis do nascimento do cabelo à linha do decote, do fulgor dos peitos à consistência do braço. Uma pátina de juventude, da Rua Serrano de Madri ao passeio barcelonês de San Gervasio, está transformando a relação entre idade e aparência, entre a vida e seu desgaste, entre beleza e extinção. Ou seria preciso, conforme a lenda, que a idade fosse matando o brilho, e a morte não fosse outra coisa senão a encarnação do horror? Cadáveres jovens e formosos contribuíram para melhorar o prestígio de morrer, enquanto qualquer despedida com a cara maltratada piora a consideração de existir. Então, por que não estender integralmente esse bem do mundo do espetáculo e da alta burguesia a qualquer cotista da previdência social? Neste momento, entre um número crescente de amigas 132 que não pertencem aos estúdios, vai se percebendo uma súbita transformação que as faz voltar, como por encanto, a seu porte de 20 anos atrás. Ante o reino da palavra e dos escritos, contra o cortejo oral e epistolar, o triunfo imediato da imagem. Uma imagem com tratamento, é claro, mas o que é ela senão tratamento de estresse, depressão, câncer, agressão do clima ou desilusão? Os receios com a cosmética se justificavam quando ela era tão imperfeita que a manipulação artificial transparecia. Mas como não se render aos resultados dessa nova escola que atua na intangibilidade do natural? Mulheres que haviam ingressado na temida casa dos 50 retornam dessa região para uma plataforma radiante e lisa. Não se trata de garotas imaturas de 20 anos, mas exatamente desse sujeito feminino que brilha no auge de sua constituição, já que a atinada combinação de fatores bioquímicos produz mulheres com uma aparência que lhes permite se aproximar com critério e sensibilidade do profissionalismo, da sexualidade, do viço ou da maternidade. Esse novo tipo feminino continua sem ser computado nos quadros demográficos, mas vai gerando uma nova subespécie reciclada que, de imediato, encontrará sua contrapartida na recuperação do homem. Um número restrito, mas suficiente, de clínicas especializadas, cuidados especiais, moléculas e líquidos selecionados vão fazendo seu trabalho na gestação dessa tendência, que vai além do modismo e cujo desenvolvimento se reflete na ascendência de uma população seguidora dos ditames da sustentabilidade. Além disso, não será preciso muito tempo para que essa notável transformação cidadã ocupe as calçadas, se é que não as está ocupando, já que dezenas de seres reciclados e sem marcas cosméticas são habilitados em menos de 24 horas. Aceitar esteticamente um ser recosturado ou com partes postiças não é fácil para todos, mas o novo fenômeno tem menos a ver com o mundo da cirurgia que 133 com o da ecologia, menos com a reparação que com a recuperação. São rostos (corpos inteiros?) que retornam puros dos espelhos, intactos e transportados até o presente como uma declaração inquestionável de que a atualidade é tudo. É tudo e no ponto exato que não desejaríamos ter perdido jamais. O passado sempre despertou pavor, mas, agora, reelaborado, volta com os frutos de sua melhor época, perfumados, firmes, aromáticos, alardeando o êxito de uma tecnologia de reciclagem que, ao se personalizar, obtém, como um amante perfeito, a máxima excelência da matéria carnal. *Vicente Verdú, escritor e jornalista espanhol, é autor, entre outros, de El Estilo del Mundo. Este artigo foi publicado originalmente no jornal El País 134