As lideranças políticas na era digital: a cibercampanha de Celso

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As lideranças políticas na era digital: a cibercampanha de Celso
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NATASHA BACHINI
AS LIDERANÇAS POLÍTICAS NA ERA DIGITAL: A CIBERCAMPANHA DE CELSO RUSSOMANO
NO FACEBOOK EM 2012
AS LIDERANÇAS POLÍTICAS NA ERA
DIGITAL: A CIBERCAMPANHA DE CELSO
RUSSOMANO NO FACEBOOK EM 2012
Natasha Bachini
Pontifícia Universidade Católica - São Paulo (PUC-SP)
[email protected]
Resumo: Este artigo apresentará os primeiros resultados de uma pesquisa coletiva a respeito de como as
lideranças políticas atualmente têm-se apropriado das tecnologias de informação e comunicação (TIC´s)
para a promoção de suas respectivas imagens nas campanhas eleitorais. Com esse propósito, analisou-se a
campanha realizada por Celso Russomano, candidato do Partido Republicano Brasileiro (PRB) à
prefeitura de São Paulo em 2012, na rede social Facebook. Para trabalhar com esse objeto, criou-se uma
metodologia inspirada nos trabalhos anteriores desenvolvidos pelo núcleo de pesquisa (NEAMP) para
averiguar os usos, apelos e principais temas abordados pelo candidato, além de se verificar quais foram os
principais recursos de comunicação usados pelo perfil e quantificar as diferentes formas de interação
realizadas com os seus amigos do Facebook.
Palavras-chave: Facebook; campanha eleitoral; redes sociais; ciberpolítica.
Abstract: This article will present the first results about how the political leaders currently have
appropriate information and communication technologies to promote their images in the election campaigns.
For this purpose, we analyzed the campaign carried out by Celso Russomano, candidate of Partido
Republicano Brasileiro (PRB) for Mayor of São Paulo in 2012 on the social network Facebook. For
working with that object, created a methodology inspired by earlier work developed by the center for research
(NEAMP) to ascertain the uses, pleas and main themes addressed by the candidate, in addition to check
what were the main features of communication used by the profile and quantify the different forms of
interaction with her friends in Facebook.
Keywords: Facebook, electoral campaigns, social networks, cyberpolitics.
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Introdução
Este artigo apresentará os primeiros resultados de uma pesquisa coletiva a
respeito de como as lideranças políticas atualmente têm se apropriado das
tecnologias de informação e comunicação (TIC´s) para a promoção de suas
respectivas imagens nas campanhas eleitorais. Com esse propósito, analisou-se
a campanha realizada por Celso Russomano, candidato do Partido
Republicano (PR) à prefeitura de São Paulo em 2012, na mídia social
Facebook. Para trabalhar com esse objeto, criou-se uma metodologia
inspirada nos trabalhos anteriores desenvolvidos pelo núcleo de pesquisa
NEAMP – Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política - averiguar os usos,
apelos e principais temas abordados pelo candidato, além de se verificar quais
foram os principais recursos de comunicação usados pelo perfil e quantificar
as diferentes formas de interação realizadas com os seus amigos do Facebook.
A apropriação política das tecnologias de informação e comunicação
(TIC´s) é um fenômeno de avanço crescente. Na última década, em
decorrência da difusão da internet no mundo globalizado e, especialmente, da
criação das redes sociais de internet, podem ser elencados diversos
acontecimentos e mobilizações políticas que se organizaram e se tornaram
realidade por meio do uso da rede. Estas mobilizações podem ser ilustradas
pela eleição de Obama nos Estados Unidos em 2008, a aprovação da Lei
Ficha Limpa no Brasil em 2010, a elaboração da nova Constituição da
Islândia, os movimentos Occupy que se espalharam pelo mundo, os Indignados
da Espanha e a Primavera Árabe em 2011, sendo que estes dois últimos ainda
se encontram em andamento.
Ao vincular a literatura do tema com as experiências recentes, nota-se
que a perspectiva dicotômica entre ciberotimismo e ciberpessimismo não é a
mais adequada para se compreender os desdobramentos desse fenômeno. Os
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atuais estudos empíricos que tratam do assunto revelam que o uso político da
internet abrange elementos de ambas as correntes teóricas: ao mesmo tempo
em que a internet possibilita o desenvolvimento de valores democráticos
como a transparência, o accountability, a participação e a organização política,
estimulando novas formas de engajamento cívico e reduzindo a distância entre
governantes e governados nas democracias liberais (CASTELLS, 1999;
LÉVY, 2000; GOMES, 2011), ela também pode ser utilizada como um
instrumento de controle de informações por parte de governos e empresas, no
sentido que estes podem rastrear e retaliar o conteúdo veiculado pela internet,
ou como uma ferramenta de comunicação que segue a lógica espetacular dos
mass media, onde o sujeito permanece no isolamento e na passsividade dentro
do processo comunicacional (GALLOWAY, 2010).
Especificamente em relação ao uso da internet como veículo de
comunicação política, o que se observa é que as campanhas eleitorais passam a
incorporar a rede como um veículo de comunicação em âmbito mundial a
partir dos anos 2000, acompanhando a difusão das redes sociais de internet
entre a população. Antes disso, a internet era usada mais como uma extensão
da propaganda política realizada em outros meios, caracterizando-se como
uma espécie de painel expositor. Não havia uma estratégia pensada
exclusivamente para a internet. Os candidatos apenas expunham suas
propostas em websites e as divulgavam via e-mail.
No caso brasileiro, embora as pesquisas registrem um uso da internet
nas campanhas a partir de 2002 com a criação do “Pelotão 45” pela campanha
de José Serra a Presidência da República (ALDÉ, 2004; AGGIO, 2010), é a
partir das eleições de 2006 que o ciberespaço ganha destaque nas campanhas.
Naquele momento, 25% da população brasileira estava conectada a rede e
observou-se um ativo uso dos websites, dos blogs e especialmente do Orkut
para se promover ou denegrir as imagens de Lula e Alckimin, então
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candidatos à Presidência em 2006. Entretanto, a parcela da população que se
apropriou da internet para realizar as discussões políticas foram os integrantes
das classes A e B, o que caracterizou apenas uma migração da chamada elite
offline, ou seja, os formadores de opinião dos mass media e dos partidos
políticos, para o ambiente virtual, não estendendo dessa forma o debate a
maioria dos eleitores (BARROS FILHO et al., 2007; SILVEIRA, 2007).
Já nas eleições majoritárias de 2010 o cenário era diferente. Houve uma
reforma na legislação eleitoral que liberou a utilização de sites de
relacionamento, como Orkut, Facebook, Twitter e dos blogs pelos candidatos,
que a partir de então, podem manter páginas pessoais, receber doações
financeiras por cartão de crédito e captar eleitores pela internet. Ademais,
passaram a ser permitidas também as comunicações por meio de mensagens
eletrônicas e envio de SMS via celular. Ao mesmo tempo, o acesso a internet
havia chegado a casa dos 40% (73,9 mi) e novas redes sociais como o
Facebook e o Twitter se popularizaram entre os internautas a ponto de 99%
deles possuir um perfil em alguma delas. (BACHINI, 2011).
As campanhas realizadas pela internet nesse pleito se aproximaram mais
do princípio da isegoria do que nenhuma outra antes. Houve um
estreitamento de laços entre candidatos e eleitores por meio das redes sociais,
onde foi possível ter tanto ter conhecimento da agenda dos candidatos quanto
discutir e propor itens dos seus programas de governos. A rede foi utilizada
também como um importante recurso de visibilidade pelas candidaturas que,
devido ao cálculo previsto em lei, têm pouco espaço nos meios de
comunicação tradicionais. Concomitantemente, os políticos se aproveitaram
das redes sociais para humanizarem-se perante o eleitorado através da
publicização de suas vidas pessoais.
Para as eleições de 2012, a expectativa com relação ao uso da internet
nas campanhas somente aumentou. Além das transformações políticas
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decorrentes da mobilização online no ano de 2011, conforme já citado acima,
chama a atenção o expressivo aumento da penetração da rede social Facebook
entre os brasileiros. Segundo pesquisa do Ibope Nielsen (2012), dos 82,4
milhões de brasileiros que hoje têm acesso a internet, 46 milhões possuem
perfis no Facebook. Vale ressaltar que no ano de 2010 apenas 2 milhões de
brasileiros se conectavam por esta rede social.
Dessa maneira, em busca de dar prosseguimento aos estudos de
comunicação política realizados pelo núcleo de pesquisa, iniciamos a pesquisa
sobre o uso do Facebook pelos principais candidatos a prefeitura de São
Paulo em 2012. Nesse artigo, serão apresentados os resultados parciais a
respeito da campanha realizada por Celso Russomano (PRB) nesta rede social
entre 01 de agosto de 2012 e 07 de outubro de 2012, data na qual se deu o
primeiro turno dessas eleições.
Tendo em vista o histórico das campanhas eleitorais online no Brasil,
nossas hipóteses iniciais são: i) o candidato utilizará o Facebook para
promover sua imagem de acordo com as últimas tendências de
cibercampanha, no sentido de expandir os canais de participação política para
a ampliação do debate político e ii) o caráter pessoal do perfil do Facebook
propicia que as pessoas se interessem mais pela vida privada do candidato do
que pelas questões de interesse publico, o que faz com que as postagens com
esse tipo de conteúdo tenham uma repercussão maior do que aquelas que
tratam do seu programa de governo.
Com relação à metodologia empregada, o conteúdo veiculado pelo
candidato ao longo de todo período foi analisado na íntegra e classificado de
acordo com as seguintes variáveis, a serem melhor evidenciadas nos gráficos e
estatísticas da próxima sessão: i) os usos do Facebook (se o conteúdo
veiculado tratava do programa de governo do candidato, da sua agenda de
campanha, da sua vida pessoal etc); ii) o tipo de recurso empregado na
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mensagem (vídeo, foto, texto, link etc.); iii) os apelos implícitos nessa (se faz
referência a políticas passadas ou futuras, campanha negativa etc); iv) os temas
das respectivas postagens (saúde, educação, trabalho, segurança etc); e v) a
interatividade estabelecida entre Russomano e seus amigos (qual foi a reação
as mensagens do candidato, se curtiram, compartilharam ou comentaram).
Resultados
Nas eleições municipais de 2012 em São Paulo, a candidatura de
Russomano (PRB) se apresentava como uma terceira alternativa a histórica
rivalidade entre PT (Partido dos Trabalhadores) e PSDB (Partido da Social
Democracia Brasileira), os dois grandes partidos paulistas.
A atual gestão é exercida por Gilberto Kassab (PSD, ex-DEM), que
assumira a prefeitura em 2006, quando era vice do então prefeito José Serra
(PSDB), que abandonou o mandato para ser candidato ao governo do Estado
de São Paulo. Em 2008, Kassab se elegeu como prefeito e permaneceu no
cargo até o fim do mandato. No pleito em questão, Kassab apoiou José Serra,
caracterizando-o como o candidato da situação. Já o principal partido de
oposição, o PT, esteve pela última vez na prefeitura de 2000 a 2004, quando
encerrou-se a gestão de Marta Suplicy. No ano de 2012, o PT lançou um
candidato as eleições paulistanas sem histórico de competições majoritárias, o
ex Ministro da Educação Fernando Haddad.
Nesse contexto, onde José Serra tem sua imagem desgastada perante o
eleitorado pelas suas sucessivas candidaturas (2004, 2006, 2010) e em especial
pelo abandono do cargo em 2006, e Fernando Haddad é um político a
princípio desconhecido pelo eleitorado, Celso Russomano se destacou
inicialmente entre os candidatos por sua trajetória como comunicador de
televisão. Repórter há mais de 30 anos e militante da causa dos direitos do
consumidor, Russomano é um político bastante conhecido pelo eleitorado e
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que desfruta de uma avaliação positiva de uma boa parte desse. Por outro
lado, o eleitorado manifestava-se insatisfeito com a atual gestão da prefeitura e
ansiava pelo novo. Nessas condições, o candidato Russomano começou a
disputa eleitoral liderando as pesquisas de intenção de voto.
Entretanto uma eleição nem sempre é uma disputa previsível e ao
longo do período oficial de campanha o eleitorado tende a mudar de opinião,
estimulado pelo fluxo de informações provenientes dos discursos políticos e
da mídia. Nesse sentido, a internet e as redes sociais se apresentam como mais
um espaço para a disseminação de discursos e realização de campanhas, sejam
estas de cunho positivo ou negativo.
Vejamos a seguir como se desenrolou a campanha de Russomano pelo
Facebook e quais são as associações possíveis entre a atuação do candidato
nesta rede social e seu desempenho nas eleições.
Ao longo do período analisado foram publicizadas 287 mensagens no
perfil de Russomano. No entanto, poucas postagens foram realizadas pelo
próprio candidato. Observou-se um predomínio de postagens escritas em 3ª
pessoa ou com a assinatura da equipe da campanha.
Outro indicativo dessa constatação foi o modo como o perfil interagiu
na rede social. Russomano utilizou-se do Facebook mais como um veículo
expositor, no sentido de dar visibilidade a sua candidatura pela postagem de
fotos da visitas de campanha e pela divulgação de propaganda do que se
permitiu a um debate mais amplo do seu programa de governo. O candidato
fez uso intenso de recursos visuais em suas mensagens. Fotos, vídeos e
ilustrações estiveram presentes em 79% das postagens.
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Gráfico 1 – Usos do Facebook por Russomano nas eleições municipais de 2012
Usos do Facebook - Russomano
1 - mobilização
2 - propostas
8%
3 - propaganda
31%
20%
4 - pessoal
1%
6%
5 - fatos contemporâneos a
campanha
6 - crítica a outros candidatos
3%
5%
26%
7- apoios e agradecimentos
8 - agenda do candidato
Fonte: Autora, 2012.
De acordo com o gráfico 1, somadas, as categorias “propaganda” e
“agenda do candidato” respondem por mais de 50% das postagens de
Russomano. Embora a potencialidade da rede social não tenha sido priorizada
pelo candidato, no sentido de mobilizar simpatizantes e debater propostas,
essas categorias (“mobilização” e “propostas”) juntos representam 28% do
conteúdo veiculado. O candidato realizou uma série de postagens
publicizando suas propostas entretanto o conteúdo dessas tinham um caráter
mais genérico e as discussões sobre estas não foram aprofundadas junto aos
eleitores, fato que pode ser identificado na análise do gráfico 2. Enquanto
referências abstratas a agenda da campanha respondem por 50% das
postagens, o debate acerca das áreas de atuação do candidato e necessidade
real da população como saúde, trabalho e educação não ultrapassam o índice
dos 10%.
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Gráfico 2 – Temas presentes nas redes sociais de Russomano nas eleições de 2012
Temas - Russomano
1 - trabalho
2 - educação
3 - transporte
4 - segurança
2%
7%
4%
5% 1%
7%
2% 3%
8%
5 - saúde
3%
7%
6 - campanha
7 - desigualdade social
8 - crítica aos outros candidatos
1%
9 - habitação
10 - esporte
50%
11 - cultura
12 - acessibilidade
13 - outros
Fonte: Autora, 2012.
Na realidade, foi quase o nulo o debate de Russomano com seus
amigos via Facebook. Raramente o candidato respondeu as perguntas e
comentários postados em seu perfil. Esse comportamento se reflete também
no gráfico 3. Como se observa, o comportamento dos amigos de Russomano
no Facebook foi mais passivo do que ativo. Seus amigos mais visualizaram e
reproduziram suas postagens, comportamento esse representado pelos índices
de “curtiu” e “compartilhou”, do que de fato dialogaram com elas a partir da
criação de um novo conteúdo, relativo ao índice “comentou”.
As postagens mais comentadas foram aquelas relacionadas às visitas de
Russomano aos bairros da cidade e o maior índice de compartilhamento foi
das pesquisas de intenção de voto. Já as mensagens mais curtidas pelos amigos
de Russomano foram aquelas nas quais ele dizia que, se eleito, eliminaria
impostos como a taxa da controlar, as multas de transito, e os impostos pagos
pelo micro-empreendedor. Apesar disso, de modo curioso, as postagens
menos compartilhadas foram aquelas que o candidato pediu para que fossem
compartilhadas (“mobilização”).
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Gráfico 3 – Tipos de interatividade no perfil do Facebook de Russomano em
2012
Interatividade do Perfil
42367
50000
29414
40000
30000
10382
20000
10000
0
Curtiu
Comentou
Compartilhou
Fonte: Autora, 2012.
Talvez
esse
comportamento
por
parte
de
Russomano
seja
fundamentado numa estratégia de poupar o candidato à exposição demasiada.
Líder das pesquisas de intenção de voto praticamente até o dia do primeiro
turno, Russomano era constantemente atacado por seus adversários, que ora
argumentavam a respeito do financiamento de sua campanha por parte de
grandes igrejas evangélicas e ora questionavam a atuação profissional duvidosa
do candidato em seu passado como repórter, sua suposta ligação com
Carlinhos Cachoeira, a composição do seu partido por lideranças evangélicas,
sua filiação a Organização dos Advogados Brasileiros (OAB) e o seu suposto
veto a aprovação da lei Ficha Limpa. A respeito dessas insinuações,
Russomano utilizou-se do Facebook como um instrumento de defesa
mediante a opinião pública. Em contrapartida a ação de seus adversários,
Russomano prometeu aos seus eleitores que não desceria o nível da campanha
atacando-os de volta por meio da prática de campanha negativa, promessa
esta que o candidato cumpriu praticamente até o fim do primeiro turno,
quando começou a criticar o candidato Fernando Haddad pela rede.
Nesse período, registrou-se também um aumento significativo de
mensagens sobre o seu programa de governo ao mesmo tempo em que a
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audiência do seu perfil crescia devido a dois fatos contemporâneos à
campanha comentados por Russomano em suas postagens: o nascimento de
sua filha Katherine, cuja foto foi a campeã em número de “curti” durante toda
a campanha; e o falecimento da apresentadora Hebe Camargo.
Considerações Finais
Essa análise inicial da campanha de Russomano pelo Facebook permite
fazer comparações com as pesquisas realizadas nos pleitos eleitorais
anteriores, no sentido de fazer um balanço do atual estado das
cibercampanhas no Brasil hoje.
De acordo com os dados apresentados, observa-se que no caso de
Russomano a primeira hipótese desse estudo sobre a extensão da participação
política pelas redes sociais foi negada ao passo que a segunda hipótese sobre
uma cultura política que mescla as concepções de público e privado se
afirmou.
Assim como Dilma Rousseff no Twitter em 2010 (BACHINI, 2011),
Russomano enquanto líder das pesquisas de intenção de voto buscou expor-se
o mínimo possível na tentativa de preservar-se na primeira colocação. Por
isso, embora tenha explorado com eficiência o potencial da visibilidade da
rede, não desenvolveu um debate abrangente sobre a atual situação da cidade
e suas propostas, dando ao seu perfil um caráter unidirecional de
comunicação. Entretanto essa tentativa fracassou devido a inconsistência de
sua candidatura e a sua opção por não combater publicamente seus
adversários.
Os seus principais adversários, Haddad e Serra, conseguiram através da
campanha negativa, inclusive realizada pelas redes sociais, desestabilizar
Russomano perante o eleitorado, que acabou mudando de opinião na reta
final do primeiro turno por temer que um candidato de um partido com
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tradição menor na cidade e com o apoio das igrejas evangélicas assumisse a
prefeitura da cidade. Além disso, o fato do PRB não contar com uma vasta
militância em São Paulo, diferentemente do PT e do PSDB, não incentivou
uma defesa pública de Russomano por parte do eleitorado e, por ter agido na
contramão do que se observou no comportamento dos eleitores de maneira
geral, que fizeram uso intenso do Facebook no período eleitoral, o candidato
não conquistou também novos eleitores, e muito menos, criou uma rede de
militância digital ativa.
A composição desse cenário e a não ida de Russomano para o segundo
turno, que fora disputado por José Serra e Fernando Haddad, demonstra
também a postura conservadora do eleitorado paulistano, que mesmo
clamando pelo novo, temeu inovar colocando no poder um partido que nunca
tinha assumido a gestão da cidade, o que levou a vitória o candidato do PT.
Em suma, por não conseguir comunicar-se com o eleitor de modo
multidirecional, a candidatura de Russomano tendeu mais a espetacularização
pelo Facebook, no sentido da intensa exploração da imagem do candidato em
si, do que a expansão do debate político e, considerando a atual conjuntura
política, esse foi um dos motivos decisivos que conduziram sua candidatura ao
insucesso. Embora a internet ainda perca para a televisão como principal
veículo de comunicação política e não realize completamente o potencial
democrático ansiado pelos ciberotimistas, não se fazer presente nela de modo
dialógico pode significar a perda de um espaço importante de contato com o
eleitor, que se bem utilizado pelos outros adversários, pode mudar os rumos
de uma eleição.
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