QUELÓIDE Bernardo Hochman1 Rafael Fagionato Locali2 Leonardo

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QUELÓIDE Bernardo Hochman1 Rafael Fagionato Locali2 Leonardo
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Artigo de Revisão
DISFUNÇÕES CICATRICIAIS HIPERPROLIFERATIVAS: QUELÓIDE
Bernardo Hochman1
Rafael Fagionato Locali2
Leonardo Quicoli Rosa de Oliveira3
Lydia Masako Ferreira4
1. Mestre em Cirurgia Plástica pelo Programa de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica Reparadora da
Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (UNIFESP-EPM). Aluno de PósGraduação em nível Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica Reparadora
da UNIFESP-EPM. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
2. Aluno do 2º ano do Curso de Graduação em Medicina da UNIFESP-EPM.
3. Aluno do 2º ano do Curso de Graduação em Medicina da UNIFESP-EPM.
4. Professora Titular e Chefe da Disciplina de Cirurgia Plástica do Departamento de Cirurgia da
UNIFESP-EPM. Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica Reparadora
da UNIFESP-EPM. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
Introdução
Quelóide é uma cicatriz espessa e elevada, de superfície bocelada ou lisa, e de
coloração variando entre cor de pele, avermelhada e hipercrômica. São lesões
geralmente limitadas à derme cutânea, exceto raros casos em que ocorre no epitélio da
córnea (Síndrome de Lowe).26 Devido ao fato de crescer e invadir tecidos vizinhos, o
quelóide é considerado por pesquisadores como uma neoplasia benigna.
O quelóide foi descrito há mais de três milênios nos Papiros de Smith, o qual
descreve técnicas cirúrgicas usadas em cerca de 1.700 A.C.3 Outras referências ao
quelóide podem ser encontradas no 10o século da nossa era, em escritas da Tribo Yorubá
do oeste da Nigéria, que simbolizaram estas lesões em esculturas. Foram e são
fartamente descritas na Medicina folclórica africana.3 Porém, quem primeiro as descreveu
na literatura científica foi Jean Louis Alibert em 1806, denominando-as de "cancróide",
termo posteriormente substituído por "quelóide" (do grego: kelth = tumor + eidoz = forma),
para evitar confusão com o câncer e suas conotações.5 Desde então, inúmeros têm sido
os esforços da Ciência na tentativa de resolver esse distúrbio importante do processo
cicatricial. Na Cirurgia Plástica é onde o quelóide assume sua maior relevância, apesar da
crescente tendência da maioria das especialidades cirúrgicas também se preocuparem
com a estética dos resultados.
Estatísticas nos Estados Unidos demonstram uma prevalência de 1,5% de pessoas
portadoras de quelóide em relação à população total. Na África as estatísticas chegam a
demonstrar uma alta prevalência que gira em torno de 6%.9 No Brasil, o quelóide é uma
lesão freqüente, apesar de não existir estatísticas precisas sobre o assunto.5
A freqüência maior encontra-se em pacientes jovens, entre 10 a 30 anos, com risco
maior na segunda década de vida.20,26 É raro em crianças e idosos, apesar de existir
relato dessa lesão até em cicatriz umbilical de recém nascido,18 assim como em pessoas
de 73 anos de idade.21,28
2
O quelóide ocorre com predisposição maior em pessoas do sexo feminino em
relação ao masculino.5 Relata-se quase o dobro (1,8/1) de incidência em mulheres em
relação a homens,6 embora alguns pesquisadores não encontraram correlação entre o
risco de desenvolver quelóide em relação ao sexo.3,26
Esse distúrbio de cicatrização é significativamente mais freqüente em pessoas de
etnia negróide (negros e pardos) e mongolóide (amarelos ou orientais). Pesquisas
indicam a prevalência em indivíduos negróides em relação a caucasóides variando de 6:1
até 19:1.9
Fisiopatogenia e fatores de risco
Acredita-se, atualmente, que não existe quelóide espontâneo, e que as lesões sem
causa aparente são provocadas por ferimentos puntiformes, não percebidos pelo
paciente, como pequenas pústulas, acne ou até picada de insetos.1,21 A etiologia desse
distúrbio ainda está insuficientemente esclarecida. Apesar da compreensão, até o
presente momento, sobre os mecanismos in vitro a respeito da biologia da cicatrização,
ainda não se sabe o bastante sobre as ações biológicas desses fatores no quelóide in
vivo. Um problema chave que contribui para essa dificuldade reside no fato do quelóide
ser descrito apenas em seres humanos, fator que tem tornado a pesquisa experimental in
vivo do quelóide ainda muito incipiente.13,14,20,24,26
Apesar de ser classificado como uma disfunção cicatricial hiperproliferativa, o
quelóide é caracterizado pela hiperprodução de colágeno, e secundariamente por uma
hiperproliferação de fibroblastos na derme. O fibroblasto, secretando colagenase,
manteria o balanço síntese/degradação da cicatriz regulando seu tamanho, já que a
neoformação colágena pode manter-se normalmente por até 12 meses. O período crítico
do processo de cicatrização, quando o equilíbrio entre a síntese e a lise de colágeno se
desfaz, geralmente ocorre na 3ª ou 4ª semana após a lesão. Nesse momento, por motivo
ainda não esclarecido, nos casos de quelóide a síntese torna-se maior que a lise, ou esta
menor que a síntese, por tempo indefinido.26
A literatura aponta várias modalidades de pesquisa à procura da etiopatogenia do
quelóide. Evidências genéticas definitivas quanto ao quelóide ainda não ficaram
comprovadas. Sugeriu-se a hipótese de que a suscetibilidade ou risco pessoal em
desenvolver quelóide poderia ser apenas um fator predisponente, e não um fator de
herança genética determinante propriamente dita.5
Evidências endócrinas apontam um aumento significativo de incidência de quelóide
na puberdade, num período de exaltação e amadurecimento do eixo hipofisário-gonadal e
a exacerbação do quelóide durante e gestação, com uma relativa regressão na
menopausa.20,26
O Hormônio Estimulante dos Melanócitos (HEM), também conhecido por Hormônio
Melanotrófico ou Melanotrofina, também poderia influir na formação do quelóide.5 O
quelóide é mais freqüente em regiões da pele onde há maior concentração de
melanócitos.20 Áreas pouco pigmentadas e com deficiência de glândulas sebáceas são
raramente locais de quelóide. Essa lesão também é quase inexistente na planta do pé e
na palma da mão, mesmo em pessoas portadoras de cicatrizes queloideanas, apesar
dessas regiões estarem constantemente sujeitas a atritos e ferimentos.21 O quelóide
tampouco foi descrito em pessoas albinas.20 Paradoxalmente, o fator melanocítico,
3
propriamente dito, está ausente ou presente em quantidades ínfimas em lesões
queloideanas.5
Evidências vasculares também demonstram que pacientes com hipertensão arterial
severa, mais freqüentes na população negra, apresentam uma incidência com
significância estatística maior para apresentar quelóide em relação a indivíduos com
pressão arterial normal, tanto em pessoas negróides ou caucasóides.9,25 Esse tipo de
hipertensão arterial, que responde ao enalapril (enzima inibidora da conversão da
angiotensina II), demonstrou resultados favoráveis no sentido de regredir casos de
quelóide durante o tratamento da hipertensão severa pelo medicamento, a despeito
dessas lesões não serem responsivas à maioria dos tratamentos.
As pesquisas envolvendo evidências imunológicas revelam que a IgE também
poderia participar no quelóide, à medida que o nível sérico dessa imunoglobulina está
diretamente relacionado ao nível de histamina mastocitária aumentada no tecido
queloideano; pessoas com alergias são mais freqüentemente encontradas nos portadores
de quelóide, em relação às pessoas com cicatrização normal.19 Ainda, pessoas do grupo
sanguíneo A tem mostrado maior predisposição ao quelóide.20 Entretanto, são os estudos
dos fatores de crescimento que estão atualmente em destaque na literatura médica.
Demonstrou-se que o Transforming Growth Factor-beta (TGF-β),4 o Fibroblast Growth
Factor (FGF),27 o Plateled-Derived Growth Factor (PDGF)9 e o Epidermal Growth Factor
(EGF)15 estariam diretamente envolvidos na formação do quelóide. Constatou-se,
também, que há um aumento da produção da Interleukin (IL-6), Interferon-beta (INF-β) e
Tumor Necrosis Factor-alfa (TNF-α), e uma deficiência do Interferon-alfa (IFN-α) nos
fibroblastos de quelóide em relação àqueles de pele com cicatrização normal.16 Contudo,
apesar de todas essas pesquisas, ainda não foi possível elucidar de forma mais concreta
a fisiopatogenia do quelóide.
De fato, apenas conhecem-se fatores de risco para o desenvolvimento do quelóide.
Destacam-se a tensão nas margens de feridas fechadas por primeira intenção, cicatrizes
dispostas contra as linhas de menor tensão da pele, suturas em regiões de pele mais
espessa ou em áreas onde há maior concentração de melanina, suturas com espaços
mortos ou hematomas sob a mesma ou feridas que evoluíram com infecção ou
cicatrização por segunda intenção.22 Nesse sentido, os tipos mais frequentes de lesões
cutâneas iniciais deflagradoras do quelóide são o ferimento acidental (50%), intervenção
cirúrgica prévia (22,9%), referência a infecção em ferida (13,4%), seqüela de queimadura
(11%), e outros fatores não identificáveis (2,4%).6
Quadro clínico
O quelóide caracteriza-se por estender-se lateralmente para os tecidos adjacentes
em relação ao ponto de origem. Essa lesão pode ter crescimento contínuo ou
intermitente, com ausência de regressão significativa, e com tendência à recidiva após a
ressecção. Apresenta uma fase de atividade, exibindo sinais e sintomas, e uma fase de
inatividade ou estável, sem a presença dos mesmos. Na fase de atividade, além de um
objetivo e gradativo crescimento, os sintomas mais freqüentes são o prurido (74%), a dor
(19,1%), presença de infecção (1,5%) e a evolução para ulceração (0,6%).6 Cabe
salientar também a importância da perturbação pessoal em termos de estética (56,8%)
(fig. 1).
4
Figura 1 - Locais freqüentes do quelóide, parede torácica e segmento cefálico.
A. Lesões queloideanas em fase de atividade, causadas por escoriações, apresentando
crescimento referido, hiperemia e prurido.
B. Paciente com cicatrizes queloideanas difusas, principalmente na parede torácica, e também
na abdominal, por depilação com lâmina de barbear; embora as lesões tenham 8 anos,
ainda apresentam prurido referido.
C. Face apresentando quelóide, por seqüela de acne, em fase de atividade.
D. Quelóide ativo em lóbulo de orelha após perfuração para colocação de brinco.
A maioria das lesões (92,3%) localiza-se em posição superior ao abdome. Os
lóbulos das orelhas e a região pré-esternal são os locais mais freqüentes, seguidas pela
região lateral da face, região mandibular e pescoço. Na parede abdominal localizam-se
7,0% das lesões, e nos membros inferiores 1,6%.6 Outras pesquisas divergem em relação
à distribuição topográfica preferencial do quelóide, mas sempre com essas lesões
concentradas na metade superior do corpo. 20
Trata-se de uma lesão de comportamento bizarro, uma vez que pode desenvolver-se
em segmentos parciais de uma mesma cicatriz (fig. 2A). Pode, também, surgir num
ferimento ou incisão e não em outros ferimentos ou incisões ocasionados num mesmo
acidente ou ato operatório, em regiões corporais vizinhas ou distantes. O quelóide
também pode ter um caráter temporal, pois pode desenvolver-se num determinado local
do corpo, a partir de uma incisão cirúrgica e, futuramente, uma nova incisão no mesmo
local, ou imediatamente vizinho, pode não desenvolver esse distúrbio cicatricial. Regiões
da pele com inserções de fibras musculares ou com variações específicas na estrutura da
5
camada dérmica, como a placa aréolo-papilar da mama, pênis, escroto e pálpebras são
raramente afetados por quelóide, por motivos ainda não esclarecidos (fig. 2B).
Figura 2 - Aspectos peculiares do quelóide.
A. Paciente no qual foi realizado toracotomia, coexistindo na mesma cicatriz, simultaneamente,
um segmento cicatricial de aspecto normal e hipertrófico na metade cranial, e outro de aspecto
queloideano na metade caudal.
B. Detalhe da preservação da integridade da placa aréolo-papilar de uma paciente durante o
crescimento do quelóide; observe-se que a pele da placa foi "empurrada" e não invadida.
Diagnóstico diferencial clínico / histológico
O principal diagnóstico diferencial do quelóide a ser considerado é a cicatriz
hipertrófica. Porém, alguns pesquisadores consideram o quelóide e a cicatriz hipertrófica
como diferentes estágios de um mesmo processo.21 Este fato poderia ser refletido pela
dificuldade, às vezes existente, em diferenciar clinicamente o quelóide da cicatriz
hipertrófica, onde apenas o exame histopatológico pode fazer o diagnóstico. No quelóide
as fibras colágenas ficam dispostas em nódulos e de forma aleatória, estando
entremeadas com abundante mucina e praticamente com ausência de fibras elásticas,
enquanto na cicatriz hipertrófica as fibras se dispõem de forma mais ordenada e formando
feixes paralelos.11 Porém, na periferia do quelóide comumente observam-se fibrilas
colágenas dispostas similarmente a uma cicatriz normotrófica.
O estudo histológico do tecido queloideano revela abundante colágeno do Tipo I
(colágeno adulto) e uma proporção aumentada do colágeno Tipo III (colágeno fetal). Em
quelóides com 2 ou 3 anos de evolução não há mais um aumento significativo da
produção de colágeno.20 Os folículos pilosos e as glândulas sebáceas estão ausentes ou
bastante diminuídas (fig. 3).1,15 Na microscopia eletrônica, os quelóides apresentam sinais
de serem hipóxicos, como evidenciado pela exuberância da camada endotelial dos vasos
sanguíneos.
6
Figura 3 - Exame histopatológico do quelóide. (HE, x 200)
A. Epitélio queratinizado, tecido conjuntivo pouco vascularizado e ausência de
melanócitos.
B. Tecido conjuntivo pouco vascularizado e fibras colágenas dispostas em nódulos e de
forma aleatória. (E = Epitélio; Q = Queratina; TC = Tecido Conjuntivo).
Clinicamente, após alguns meses, a cicatriz hipertrófica tende à regressão, enquanto
o quelóide aumenta suas dimensões ou as mantêm inalteradas por tempo indeterminado.
Outros diagnósticos diferenciais a serem considerados são os dermatofibromas1 e alguns
casos de acne queloideana.10 Cicatrizes hipertróficas, quelóides e dermatofibromas
poderiam ser consideradas lesões resultantes de formas diferentes dos fibroblastos
reagirem a ferimentos cutâneos.1
Tratamento
A ressecção operatória da lesão, que há mais de um século tem sido praticamente o
único tratamento do quelóide, já se mostrou ineficaz como método isolado. A exérese sem
outra associação terapêutica apresenta um índice de recidiva que varia de 45% a 100%.3
Atualmente, a melhor opção de associação é a complementação por beta-terapia, após
24 a 48 horas da excisão, com o intuito de atenuar a fibroplasia. No serviço de
radioterapia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina utilizase, após 48 horas, a beta-terapia com o estrôncio (90Sr), numa carga total de 2.000 cGy
na cicatriz de cada quelóide ressecado, fracionada em 10 sessões de 200 cGy em dias
alternados. O efeito adverso mais comum da beta-terapia é a discromia da cicatriz,
geralmente representada pela hiperpigmentação.
Como a beta-terapia provoca uma diminuição da fibroplasia, é conveniente, às
vezes, retardar a retirada dos fios de sutura a fim de evitar deiscências parciais, que
poderiam precipitar a recidiva do quelóide pela cicatrização por segunda intenção. Por
isso, pelo maior tempo de permanência dos fios de síntese, é prudente realizar suturas
intradérmicas visando favorecer o aspecto estético final da cicatriz.
É preferível ressecar uma lesão queloideana na fase de inatividade. Nesse caso, a
excisão do quelóide pode ser total e justalesional, ou seja, imediatamente na transição
com a pele íntegra, com retirada do tecido fibroso excedente, seguida de beta-terapia. Se
7
a lesão estiver em fase de atividade, é mais conveniente aguardar até a fase de
inatividade para ressecá-la. Para isso, deve-se explicar detalhadamente ao paciente o
motivo dessa espera, e se necessário, orientá-lo a utilizar outras medidas para amenizar o
desconforto, como aplicação tópica de cremes a base de corticosteróide, infiltrações
intradérmicas dessa substância e compressão elástica. Nos casos em que houver
necessidade de ressecar o quelóide em plena fase de atividade, excisa-se internamente a
lesão deixando intacta a margem periférica do quelóide (cerca de 2 mm), isto é, fazendose uma ressecção intralesional e não uma retirada total (excisão) da lesão. Assim sendo,
as margens da lesão já não teriam, teoricamente, um potencial de atividade proliferativa.
A infiltração intralesional do corticosteróide acetonido de triamcinolona, numa dose
de até 40 mg por sessão, tem adquirido importante papel na profilaxia e no tratamento do
quelóide. Apesar da melhora relativa, freqüentemente não ocorre uma regressão
completa da lesão. O corticosteróide inibe a síntese protéica e a migração dos
fibroblastos, mas o exato mecanismo da redução do colágeno ainda permanece não
completamente esclarecido. Contudo, essas infiltrações acarretam, num curto período,
uma significativa regressão dos sintomas como prurido e dor, além de reduzirem o volume
da lesão. Podem ser realizadas, de preferência sob anestesia local em nível do tecido
subcutâneo, por meio de seringa comum com agulha do tipo hipodérmica (13 x 4,5).
Alternativa ideal seria a injeção mediante seringa especial para injeção intradérmica, sem
agulha, sendo injetado o medicamento, sob pressurização, por disparos de pequenos
jatos do mesmo. A vantagem deste tipo de dispositivo é a possibilidade de aplicar, de
forma uniformemente fracionada, o medicamento em todo o quelóide e na profundidade
adequada (subepitelial) (fig. 4).
8
FIGURA 4 - Infiltração de corticosteróide, por injeção sob pressurização, em quelóide
recidivado na região escapular.
A. Componentes da injeção intradérmica por pressurização: 1- corpo principal; 2- botão
disparador; 3- alavanca acionadora da pressurização; 4- corpo menor contendo o
recipiente de vidro armazenador do medicamento; 5- protetor plástico do bico injetor que
delimita o setor do quelóide a ser injetado; 6- bico injetor do medicamento sob pressão.
B. Aspecto da seringa contendo o medicamento.
C. Disposição da seringa no ato da injeção.
D. Detalhe do setor infiltrado do quelóide, evidenciado pela acentuação do brilho ocasionado
pela presença intradérmica do corticosteróide (seta).
A associação da ressecção cirúrgica com a infiltração intralesional de corticosteróide
reduz o índice de recidiva para menos de 50%. Porém, os principais efeitos colaterais
locais são atrofia, despigmentação e telangiectasias da cicatriz tratada, principalmente
depois de repetidas infiltrações. Alternativamente, utiliza-se o acetonido de triamcinolona
de forma tópica, veiculado em pomadas ou cremes, como suporte coadjuvante na
prevenção ou regressão do quelóide.
Outras modalidades de tratamento do quelóide incluem a operação com laser de
dióxido de carbono ou argônio, a criocirurgia com nitrogênio líquido, o uso do 5-fluoruracil, do tamoxifeno e do ácido retinóico.26 Também estudam-se os efeitos de campos
eletromagnéticos sobre fibroblastos oriundos de quelóide e de pele normal.17 Verificou-se
uma inibição na proliferação de fibroblastos e uma diminuição da produção de colágeno.
Evidências corroboram que a eletropositividade pode retardar o crescimento biológico dos
9
componentes necessários à cicatrização hiperproliferativa. Posicionando o eletrodo
positivo na lesão, é descrita a redução do crescimento de cicatrizes hipertróficas e
quelóides, inclusive com redução na densidade de mastócitos, aumentada nessas
lesões.29,30 Esses resultados sugerem que a exposição do quelóide a campos
eletromagnéticos, ou correntes elétricas, poderá ser um recurso terapêutico eficaz no
tratamento e até na prevenção do quelóide.
Prognóstico
O quelóide recidivado, as vezes, é maior que a lesão original.11 A recidiva ocorre em
37% dos casos até o 6o mês após a ressecção, 29% entre o 7o e 12o mês, 9% entre o 13o
a 18o mês e 10% do 19o ao 24o mês. Portanto, o pico de incidência de recidiva ocorre,
aproximadamente, até o 13o mês. Por isso, vários pesquisadores preferem esperar 3 a 5
anos antes de considerar que a operação foi definitivamente curativa.6
Cicatrizes queloideanas que se originaram a partir de feridas infectadas, apresentam
maior índice de recidiva que as oriundas de cicatrizes operatórias.6 Porém, não existe
diferença significante na relação sucesso/recidiva pós-operatória em relação ao tamanho
original da lesão (para semelhantes graus de tensão na sutura), em relação à idade da
lesão para quelóides já inativos, e em relação à etnia da pessoa já operada.
Entretanto, o índice de recidiva é maior quando são ressecadas lesões ativas, isto é,
que estavam em crescimento ou com sintomas à época da operação. Portanto, prurido
e/ou dor representam prognósticos mais desfavoráveis. Também, a presença de vários
quelóides simultâneos piora o prognóstico, em relação à presença de um único quelóide.6
De qualquer forma, recidiva(s) anterior(es) não representa(m) necessariamente uma
contra-indicação para uma nova excisão.
Prevenção
As modalidades terapêuticas propostas até hoje são ainda bastante diversas, em
virtude da falta de compreensão da verdadeira fisiopatogenia do quelóide. Em termos de
profilaxia, há pouco disponível, merecendo destaque a compressão mecânica de uma
ferida operatória recente em paciente com tendência a desenvolver quelóide. A
compressão deve ser contínua, e pode ser exercida por vestes elásticas excedendo 24
mm/Hg, a qual reorientaria os feixes de fibras colágenas.2,21
Lâminas de silicone tem obtido um sucesso relativo no tratamento preventivo do
quelóide. Embora o mecanismo ainda não esteja completamente esclarecido, cogita-se,
em virtude de sua impermeabilidade sobre o estrato córneo, numa contínua hidratação
cutânea, com redução da hiperemia e fibrose incipientes (fig. 5).26 Todavia, essas
lâminas não seriam indicadas sobre cicatrizes queloideanas (ou hipertróficas) inativas ou
antigas.
10
Figura 5 – Modelos de lâminas de silicone utilizados na prevenção do quelóide.
Existem modelos prontos apropriados conforme o formato da cicatriz, como em
mastoplastias redutoras, e tiras ou blocos para serem esculpidos conforme a
necessidade.
A literatura mostra que nenhum método isolado é satisfatório, e que a combinação
de métodos é mais eficaz. Porém, nenhuma dessas estratégias tem aprovação
generalizada. Portanto, apesar das várias modalidades de tratamento e prevenção, o
quelóide ainda é um desafio.
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