Climatização, uma abordagem Pub. Contimetra

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Climatização, uma abordagem Pub. Contimetra
estudosemdestaque
por | João Manuel Vinhas Frade - e-mail: [email protected]
Instituto Superior de Engenharia de Lisboa - Dept.º de Engenharia Mecânica
Climatização, uma abordagem
fundamental (IBERAVAC&R - 2º WORKSHOP)
RESUMO
A climatização, enquanto área integradora de conhecimentos de várias disciplinas, tem vindo a ser objecto de
renovado interesse por parte de investigadores e especialistas um pouco por todo o mundo. O seu desenvolvimento
e correspondente aplicação têm tido como consequência
a construção e comercialização de ferramentas de cálculo
automático, de simples utilização, cujo objectivo é facilitar o
dimensionamento de sistemas.
Pretende-se, com este trabalho, proporcionar aos alunos
e docentes das disciplinas relacionadas com a Climatização,
uma abordagem integradora dos conhecimentos obtidos
ao longo do seu percurso de formação, explicitando-se, em
simultâneo, os princípios subjacentes à elaboração dos já
referidos programas de cálculo existentes.
Palavras-chave: Sistema; Volume de controlo; Estacionaridade;
Unidimensionalidade; Integração.
1. INTRODUÇÃO
A abordagem será efectuada segundo uma perspectiva
Euleriana, recorrendo à aplicação do cálculo integral a um
sistema de climatização e respectivos elementos constituintes,
utilizando os conceitos da Termodinâmica e da Mecânica de
Fluidos.
Para este efeito foi concebido um sistema de climatização
aplicável à generalidade dos sistemas de climatização – Sistema
de Climatização Genérico.
2. SISTEMA DE CLIMATIZAÇÃO GENÉRICO
Consideremos um sistema de climatização genérico, sobre
o qual serão explicados os mecanismos de transferência de
calor, as funções de cada um dos seus órgãos constituintes e
a quantificação das potências em jogo que permitam o seu
dimensionamento.
Com o esquema da figura que se segue (Figura 1.) tentarei
representar simbolicamente qualquer sistema de climatização,
independentemente do seu tipo, os volumes de controlo a
considerar e os fluxos necessários ao seu funcionamento.
VC1
Volume de controlo envolvente do ar do local a climatizar,
limitado pela superfície de controlo SC1, através da qual o ar
húmido do local trocará cargas térmicas com o meio exterior,
que designaremos por .
Note-se que a carga térmica comunicada ao ar contido
no volume de controlo considerado, englobará, para além
da carga fornecida através da fronteira exterior SC1 pelos
mecanismos de condução convecção e radiação, designada
por
, a carga que lhe for fornecida internamente por
equipamentos ou pessoas designada por , as cargas
transportadas pelo ar exterior através da secção 3 de admissão de ar novo e ainda a carga térmica,
, dissipada
pelo motor do ventilador de eventuais unidades de fluxo
(Ventiladores integrados nas unidades de tratamento de ar
ou ventiloconvectoras).
VC2
Volume de controlo correspondente ao sistema de climatização encarregue da transferência da carga , para o exterior,
através da respectiva superfície de controlo SC2.
Pub.
Contimetra
O sistema de climatização, para além dos diferentes componentes mecânicos e de controlo, será constituído pelos
equipamentos de permuta de calor com os meios exterior e
interior representados pelos volumes de controlo VC3 e VC4,
respectivamente.
PAINEL TÁCTIL
VC3
Volume de controlo, limitado pela superfície de controlo SC3,
correspondente à unidade de permuta de calor do sistema com
o meio exterior, através de condensador de circuito frigorífico
em unidades de expansão directa, torres de arrefecimento
em sistemas centralizados, etc. Neste volume de controlo
incluiremos os componentes do ciclo frigorífico a utilizar, tais
como compressores, bombas e ventiladores de ar exterior.
VC4
Figura 1 Sistema de Climatização Genérico
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Volume de controlo, limitado pela superfície de controlo SC4,
correspondente à unidade de permuta de calor, e eventualmente vapor, do sistema com o local a climatizar – Unidade
de Tratamento de Ambiente – A carga térmica
será retirada ao volume de controlo VC1, correspondente ao local a
climatizar, através das secções 1 e 2, de insuflação e retorno,
respectivamente.
estudosemdestaque
A carga térmica do local será permutada na unidade correspondente a este volume de controlo, sendo transportada pelo
fluido térmico do sistema, para a unidade de permuta exterior
representada pelo volume de controlo VC3.
A energia térmica
, dissipada pelos motores de eventuais
ventiladores, será incluída na carga térmica
do local a
climatizar uma vez que os respectivos motores estão usualmente inseridos no escoamento do ar do local a climatizar.
Todos os volumes de controlo anteriormente referidos vão ser
considerados “fixos”, relativamente a um mesmo referencial
de inércia, sendo desprezado o trabalho das forças viscosas
em todas as secções de admissão ou descarga dos diferentes
volumes de controlo.
Circuito A
Fluxos de permuta com o meio interior – ar do local a climatizar.
Circuito B
Secção 2
Secção de Retorno de ar do local a climatizar, ao sistema de
tratamento de ambiente VC4, para que nele sejam obtidas
as condições de insuflação. À semelhança da anterior secção,
tratando-se de uma secção de recirculação, não foi considerada
como sendo uma secção de descarga.
Nota: Nos sistemas de tetos arrefecidos ou pavimentos aquecidos, uma vez que as permutas de calor do ambiente a
climatizar serão efectuadas através de parte da superfície de
controlo SC1, estas secções não existirão.
Secção 3
Secção de admissão de ar novo, necessário à renovação do
ar ambiente no local a climatizar. Esta secção está normalmente inserida no circuito de retorno (Secção 2), com o
propósito de se minimizarem os gradientes de temperatura
internos do local a climatizar.
Fluxos de fluido térmico – fluido frigorigéneo, nos casos de
sistemas de expansão directa, ou água, nos casos de sistemas
centrais a água.
Secção 4
Circuito C
Secção de admissão de fluido exterior ao VC3, para transferência da carga térmica do sistema para o exterior.
Fluxos de permuta com o meio exterior – usualmente ar ou
água.
Secção de descarga de ar viciado para o exterior.
Secção 5
Secção 6
Consideremos ainda as secções do sistema genérico representado na figura 1.
Secção de descarga de fluido exterior transportando a carga
térmica do sistema de climatização.
Secção 1
Secção 7
Secção de Insuflação de ar ao local a climatizar, em condições
capazes de absorver o efeito das cargas térmicas , que
actuam sobre o ar nele contido. Não foi considerada uma
secção de admissão no volume de controlo mas sim uma
secção de recirculação do ar do local a climatizar.
Secção de admissão e de descarga de fluido refrigerante dos
VC3 e VC4, respectivamente.
Secção 8
Secção de descarga e de admissão de fluido refrigerante dos
VC3 e VC4, respectivamente.
3. EQUAÇÕES FUNDAMENTAIS
A cada um dos volumes de controlo do sistema de climatização genérico, representado na figura 1, vamos aplicar os
princípios de conservação da massa e da energia:
Ambos os princípios estão expressos na sua forma integral - Pretendemos efectuar uma análise global das trocas
de energia. Atente-se no significado físico dos dois termos
do 2.º membro de ambas as expressões.
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estudosemdestaque
4. PRESSUPOSTOS SUBJACENTES
Às equações em consideração aplicaremos os pressupostos
que permitem a sua simplificação:
Estacionaridade;
Unidimensionalidade dos escoamentos nas secções de
admissão e descarga;
Princípio de não escorregamento e igual tempera-
tura;
Ar húmido considerado como mistura de gases per feitos.
n
n
n
n
5. LOCAL A CLIMATIZAR - CARGAS TÉRMICAS EM JOGO
Figura 2 Local a Climatizar
Aplicando a equação da energia ao volume de controlo VC1
obtemos:
O termo , corresponderá ao trabalho dos ventiladores
do circuito A, contemplando o trabalho efectuado pelas forças
de atrito viscoso em condutas, grelhas, baterias de filtragem
ou de permuta de calor, estando integrado na forma de calor
, no termo
.
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O termo
, correspondente ao trabalho das forças
viscosas, será considerado nulo uma vez que o volume de
controlo é limitado por uma superfície sólida – princípio de não
escorregamento e igual temperatura – e sendo negligenciável
o trabalho efectuado pelas forças viscosas nas secções de
entrada e saída do volume de controlo.
O termo
correspondente à taxa de variação da energia no interior do
volume de controlo, será considerado nulo uma vez que se
pretendem manter constantes os valores de temperatura e
humidade, no interior do volume de controlo correspondente ao
local a climatizar, durante o período de tempo em análise.
Obtemos então:
Considerando, como anteriormente foi referido, o escoamento
estacionário e unidimensional nas secções de admissão e
descarga;
Reescrevendo a equação em função do caudal mássico
de ar novo (
), e agrupando os termos de igual forma
de energia:
Considerando que, com os critérios usualmente utilizados
no dimensionamento de grelhas e difusores, utilizando normalmente velocidades baixas e de valor aproximado nas
secções de admissão e descarga, e que o volume específico
varia de forma pouco significativa, podemos concluir que as
diferenças correspondentes aos balanços de energia cinética
e potencial são negligenciáveis relativamente aos balanços
de entalpia.
O facto de o segundo termo da equação ser negativo, significa
que o calor é fornecido ao volume de controlo, adicionan
do-se ao calor transferido
, tendo ambos de ser removidos pelo sistema de tratamento de ambiente.
6. SISTEMA DE TRATAMENTO DE AMBIENTE
Desenvolvendo a anterior equação obtemos:
Tendo em conta que pelo princípio da conservação da
massa:
Figura 3 Sistema de Tratamento de Ambiente
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7. SISTEMA DE TRANSFERÊNCIA DE ENERGIA
PARA O EXTERIOR
Caudal de insuflação
Obtemos então a expressão:
A carga térmica fornecida pelo escoamento ao sistema termodinâmico constituído pelo ar contido no local a climatizar,
será obtida pelo somatório dos fluxos de energia, transportados através da superfície de controlo SC1, representado pelo
integral, ao longo da superfície de controlo, dos fluxos de
energia através das superfícies elementares dA.
Note-se que o volume de controlo, e consequentemente a
superfície que o limita, apenas têm escoamentos através das
duas secções 3, de admissão de ar novo, e 4 de descarga de
ar viciado, uma vez que as secções 1 e 2 apenas são utilizadas
para recirculação do ar interior ao volume de controlo.
Considerando ainda que os escoamentos nas secções 3 e 4 se
processam duma forma unidimensional a expressão anterior
toma a seguinte forma:
Procedendo de modo análogo ao seguido para o volume
de controlo VC1 obteríamos as equações aplicáveis ao VC4,
correspondentes ao sistema de tratamento de ambiente:
Caudal de fluido refrigerante
Expressão geral que relaciona a potência útil do sistema de
refrigeração, representada pelo primeiro membro da expressão,
e consequentemente o caudal de fluido refrigerante do circuito
B da Figura 3., com as cargas térmicas do local a climatizar,
e ainda com os caudais a utilizar no circuito A, de remoção
da carga térmica do local a climatizar.
Figura 4 Sistema de Transferência de Energia para o exterior
Procedendo de modo análogo ao seguido para o volume
de controlo VC1 obteríamos as equações aplicáveis ao VC3,
correspondentes ao sistema de transferência de energia para
o exterior:
estudosemdestaque
Caudal de fluido exterior de arrefecimento
Caudal de fluido refrigerante
Consideremos agora o volume de controlo VC2, referente ao
sistema de climatização, que recebendo energia, através do
Circuito C, removerá para o exterior a quantidade de calor ,
absorvida no local a climatizar, obtendo-se sucessivamente:
Considerando que
Obtemos:
Considerando que o segundo termo do primeiro membro da
equação representa o calor total a retirar ao local a climatizar
VC1, e recebido pelo VC2:
Considerando que com os critérios usualmente utilizados
no dimensionamento de secções de admissão e descarga,
utilizando normalmente velocidades baixas e de valor aproximado nas secções de admissão e descarga, e que o volume
específico varia de forma pouco significativa, podemos concluir
que as diferenças correspondentes aos balanços de energia
cinética e potencial embora negligenciáveis relativamente
aos termos da entalpia, terão os seus contributos englobados
no termo
:
Considerando que
sões:
, obtemos finalmente as expres-
Ou ainda
9.1. Sistemas Ar - Ar
Fluido do Circuito A - Ar ambiente interior
Fluido do Circuito B - Fluido frigorigéneo
Fluido do Circuito C - Ar ambiente exterior
n
n
n
negligenciáveis relativamente aos
valores dos termos da entalpia
Considerando agora que o calor fornecido ao sistema,
,é
o calor transportado pelo fluido do circuito A, obtemos:
Como
Expressões essas que permitem relacionar as potências em
jogo entre os diferentes volumes de controlo, e os caudais
dos respectivos circuitos.
8. SISTEMA DE CLIMATIZAÇÃO
Figura 5 Sistema de Climatização
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9. CLASSIFICAÇÃO DE SISTEMAS DE CLIMATIZAÇÃO
Dada a variedade de critérios de classificação de sistemas
e unidades do mercado, em função do tipo de ciclo frigorífico,
de compressores, de ventiladores das unidades de permuta de
calor com o exterior, do tipo de refrigerante, do tipo de unidades
de permuta de calor com o meio interior, etc., limitar-nos-emos
nesta exposição à classificação dos sistemas fundamentais,
segundo os tipos de fluidos usados nos circuitos A, B e C do
sistema de climatização genérico apresentado na Figura 5.
negligenciáveis relativamente aos
valores dos termos da entalpia
A expressão obtida é geral, aplicando-se a qualquer sistema
de climatização, permitindo o relacionamento dos diferentes
fluxos de calor em jogo.
Note-se que a quantidade de calor removida pelo sistema,
representada pelo primeiro termo do primeiro membro da
equação, é superior à carga térmica a retirar ao local a climatizar, representada pelo último termo, respectivamente
transportadas pelos circuitos C e A, da Figura 5.
É usual definir coeficiente de performance da instalação –
COP, como sendo a razão entre a energia térmica removida
do local a climatizar e a energia fornecida ao sistema de
climatização:
9.2. Sistemas ÁGUA - AR
Fluido do Circuito A - Ar ambiente interior
Fluido do Circuito B - Fluido frigorigéneo
Fluido do Circuito C - Água proveniente de sistema
de arrefecimento exterior, como por exemplo torre de arrefecimento, do mar, ou outro.
n
n
n
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9.3. Sistemas AR - ÁGUA
Fluido do Circuito A - Ar ambiente interior de cada um dos locais
Fluido do Circuito B - Água proveniente da unidade correspondente ao volume de controlo VC3 usual
mente designada por “chiller”, condensado por ar
Fluido do Circuito C - Ar ambiente exterior
n
n
n
9.4. Sistemas ÁGUA - ÁGUA
Fluido do Circuito A - Ar ambiente interior
Fluido do Circuito B - Água proveniente da unidade
correspondente ao volume de controlo VC3 usual
mente designada por “chiller” condensado por água
Fluido do Circuito C - Água proveniente de sistema
de arrefecimento exterior, como por exemplo torre
de arrefecimento, ou outro.
n
n
n
10. PROGRAMAS DE CÁLCULO AUTOMÁTICO
- CONCLUSÃO
As novas ferramentas de cálculo automático utilizadas no
cálculo de cargas ou simulação do comportamento térmico
dos edifícios assentam na utilização das equações fundamentais:
Tendo em conta os pressupostos simplificativos, estacionaridade e unidimensionalidade nas secções de entrada e saída,
referidos no ponto 4, construíram-se fundamentalmente dois
tipos de programas de cálculo automático:
Programas de cálculo de cargas térmicas que, anulando
o termo transitório das equações fundamentais, prevêem
a potência térmica a retirar de cada um dos locais ou de
um conjunto de locais a tratar, permitindo o dimensio namento dos equipamentos a instalar, de forma a manter
as condições de estacionaridade pretendida nos locais
em consideração.
n
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Programas de simulação dinâmica do comportamento
térmico de edifícios que quantificam o termo transitório
das equações fundamentais, quantificando o termo
transitório em função do termo correspondente ao balanço
dos fluxos de energia, prevendo o estado final no interior
dum determinado local ou conjunto de locais.
n
A energia necessária, nestes últimos, para repôr as condições
internas pretendidas será equivalente à potência calculada
pelos primeiros, sendo, portanto, quando correctamente
utilizados, conducentes a resultados equivalentes. n
climatização Julho/Agosto | 69