À descoberta do Novo Mundo

Transcrição

À descoberta do Novo Mundo
ACABADOS DE PARTIR
O veleiro Sea Cloud fez a primeira
paragem em Oranjestad, um dos
cinco portos de abrigo ao longo
de nove dias. As Caraíbas no seu
melhor, numa viagem inesquecível.
CAR AÍBA S
À descoberta do Novo Mundo
Ao sabor dos ventos das Caraíbas, embarcámos num veleiro com 77 anos de história.
Da animação de Curaçao à natureza da Costa Rica, mergulhámos em Aruba,
embrenhámo-nos na Colômbia e descobrimos uma comunidade indígena no Panamá.
TEXTO
DE
RICARDO
FOTOGRAFIAS
DE
SANTOS
PAULO
BARATA
GRANDES PORMENORES
Içar as velas é apenas uma
das tarefas a bordo. Parte do
veleiro é de madeira, o que exige
tratamento. Os tripulantes não
deixam nada ao acaso e a limpeza
e manutenção são uma constante.
U
ma flûte de champanhe vai sempre
bem. O dia está a terminar, há algumas nuvens que se aproximam
para emprestar um tom alaranjado
ao céu e as luzes das fachadas dos edifícios da frente de mar
de Willemstad, em Curaçao, nas Antilhas Holandesas, começam a acender-se. A recepção aos viajantes do Sea
Cloud começa em terra, com toalhas refrescantes e o tal
champanhe bem fresco. Cada passageiro tem direito a um
cartão magnético no qual está inserida informaticamente
uma fotografia e o nome. Esse será o bem mais precioso durante a próxima semana, a identificação que vai permitir a
entrada e saída do navio em cada escala deste cruzeiro nas
Caraíbas. Depois de Curaçao, Aruba, Colômbia, Panamá
e Costa Rica estão à nossa espera.
O sino toca para jantar às 19h30 em ponto, já os turistas passeiam tanquilamente pela marginal em direcção
aos restaurantes e bares deste porto que ganhou o nome
graças aos navegadores portugueses no século XVI. O nome
não vem de coração, como eventualmente seria de prever,
mas sim de «curação», o acto de curar, já que foi aqui que
os marinheiros encontraram a salvação para o terrível
escorbuto. Ficou como a ilha da cura, graças aos víveres
1.º dia
frescos consumidos. O que se consome agora também passa pelos frutos tropicais, mas, a julgar pelo som da música
e das gargalhadas que sai dos bares da cidade, é do afamado rum das Caraíbas que se fala.
No deck do Sea Cloud, o veleiro de quatro mastros
com 77 anos e uma história recheada de peripécias, o tempo é de preparação para o mar. À nossa frente, na baía de
St. Anna, os edifícios coloniais iluminados despedem-se
dos 45 passageiros e 60 tripulantes. Este não é um cruzeiro
como os outros, garante a tripulação, os organizadores e alguns dos viajantes, repetentes nesta aventura, que iremos
conhecer durante a próxima semana. Não tem nada que
ver com os gigantescos hotéis sobre o mar, dizem, com centenas e até milhares de turistas em prédios flutuantes. Aqui,
IMPÉRIO DA TRANQUILIDADE
Ao final do dia, o porto de Curaçao
apresenta um movimento fora
do normal. Não de barcos,
mas de turistas que passeiam
pelo cais, entrando e saindo
dos bares e restaurantes.
Curaçao
Ficou como a ilha da cura, graças aos víveres frescos consumidos. O que se consome agora
também passa pelos frutos tropicais, mas, a julgar pelo som da música
e das gargalhadas que sai dos bares da cidade, é do afamado rum das Caraíbas que se fala.
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Volta ao Mundo Abril 2009
BONS APETITES
A hora da refeição é sagrada.
Os almoços são ao ar livre,
sempre que o tempo e a ondulação
o permitem. Os jantares
decorrem na sala nobre do
veleiro de quatro mastros.
a mais-valia é sentir as velas abertas ao vento, percorrer os
corredores ao sabor da ondulação e partilhar histórias e momentos com um grupo restrito de pessoas que teimam em
não querer acentuar diferenças sociais. E se as há…
Curaçao, a ilha descoberta em 1499 por Alonso de
Ojeda, um dos capitães que acompanharam Cristóvão
Colombo na descoberta da América, está a ficar para trás.
Os rebocadores levam o veleiro de 110 metros para fora do
porto. São 22h00 e a próxima noite será passada em navegação. Das Antilhas Holandesas vai ficar apenas a recordação de um final de tarde quente e o desejo de lá voltar, com
mais calma. Curaçao já é só um conjunto de luzes ao fundo.
Próxima paragem: Aruba, a 75 milhas náuticas de distância.
Pouco antes das oito da manhã começa a avistar-se
Oranjestad, em Aruba. Já se imaginam férias de sonho em
praias de areia branca e mar azul-esverdeado de água tépida… E é mesmo isso que Aruba tem para oferecer. Mas
pouco mais. E o pouco aqui é muito. Hotéis, lojas de luxo,
restaurantes, casinos, hotéis, mais hotéis, bares e ainda mais
hotéis decoram esta ilha de 32 quilómetros de comprimento e quase dez de distância no seu ponto mais largo. Comprar uma casa aqui, com vista para o mar, custa cerca de um
2.º dia
milhão de dólares – para quem vem de fora – e o colorido
das moradias tem uma explicação: cada família pinta a casa de acordo com o partido político em que irá votar nas
eleições. A tinta é paga pelos candidatos e as casas verde-seco ou amareladas têm mais saída do que as outras quatro possíveis, correspondentes a um total de seis partidos.
É a bipartidarização colorida entre conservadores e liberais
numa terra onde os ventos do mar degradam constantemente as camadas de tinta que cobrem as moradias.
As praias de Palm e Eagle Beach são as mais populares entre os visitantes. A linha de areia não está demasiado preenchida, a água convida, o sol aquece, a música que
vem do bar ajuda a descontrair. Do primeiro andar da esplanada de um bar na praia, Jorg e Martina acenam para
que subamos. É só tempo de secar os calções de banho e a
HISTÓRIAS PARA CONTAR
Avô e neta, ambos suecos,
gozam os muitos momentos de
paz a bordo, enquanto o Sea Cloud
segue a todo o gás pelo mar das
Caraíbas, impulsionado pelo vento
ou com recurso às máquinas.
Aruba
O colorido das moradias tem uma explicação: cada família pinta a casa de acordo com o partido
político em que irá votar nas eleições. A tinta é paga pelos candidatos e as casas
verde-seco ou amareladas têm mais saída. É a bipartidarização colorida entre conservadores e liberais.
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Volta ao Mundo Abril 2009
AO SABOR DOS SENTIDOS
Elementos indissociáveis do
carácter boavistense: terra
estéril, rocha, areia e mar.
Sem esquecer o factor humano
do ritmo, da música, da ginga
e de um sabor a liberdade.
Os marinheiros sobem aos mastros para
desatar os nós que prendem as velas.
O vento está de popa, coisa boa para
quem anda no mar. A prova chegará
quando o Sea Cloud atingir os 13 nós de
velocidade, apenas com recurso ao vento.
conversa já decorre num banco alto junto ao balcão onde
as piñas coladas se vão fazendo sentir. Têm mais de 60 anos,
são alemães, casados, dois filhos, e é a quinta vez que viajam no Sea Cloud, desta feita por 34 dias. Os seus cartões
pessoais incluem uma fotografia do casal e outra do navio
com a frase «Sea Cloud Fans».
Após a Segunda Guerra Mundial o pai de Jorg, médico,
levou a família para Leipzig na expectativa de uma vida melhor. Um oficial norte-americano avisou-o da iminente chegada dos soviéticos à cidade e a família de Jorg – então com
semanas de vida – andou a fugir durante três meses com o recém-nascido dentro de uma mala de viagem. Acabaram por
ficar na metade ocidental da Alemanha, onde Jorg viria a tornar-se oficial da Força Aérea, piloto de caças. Reformou-se
aos 50 anos e criou uma empresa de gestão de situações de crise, como salvamentos, resgates ou raptos. Enriqueceu, vendeu a companhia, fez ainda mais fortuna e não prescinde do
seu avião particular para viajar pelo mundo. «Não quero ser o
homem mais rico do cemitério», garante sob o olhar embevecido de Martina, a companheira de todos os tempos que
mantém uma beleza invejável quase a chegar aos 65 anos.
Vem mais uma rodada de piñas coladas para o balcão,
seguidas por mais umas doses de mergulhos até às 17h45,
a hora marcada para regressar ao Sea Cloud e partir rumo
a Santa Marta, na Colômbia. Aruba e o seu idioma local,
o papiamento (nalguns casos semelhante ao português e ao
crioulo: bon dia, bon tardi, bon nochi) entram para o álbum
das boas recordações da viagem.
Abril 2009 Volta ao Mundo
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CLÁSSICO, DE FACTO
Os jantares do Comandante
são um desfile de elegância.
O formalismo não é obrigatório
a bordo, mas há ocasiões em
que um casaco e gravata são
aconselhados. Para as senhoras,
o vestido de noite é uma boa opção.
«É um privilégio servir com eles», diz Todd Burgman,
o comandante norte-americano do navio, durante o cocktail
de boas-vindas. Refere-se à tripulação, oriunda das Filipinas,
Alemanha, Polónia, Sérvia, Croácia, Roménia, Índia, Itália,
Rússia e Reino Unido. Ergue o copo de champanhe e propõe
um brinde aos novos e velhos amigos. Segue-se o Jantar de
Boas-Vindas do Comandante, na sala de refeições, com uma
decoração que mostra o glamour de outros tempos, com quadros épicos nas paredes, estantes repletas de livros e uma atmosfera típica de restaurante de hotel de cinco estrelas.
E essa é a verdade. A melhor descrição. O veleiro,
além de navio de cruzeiro, é também um hotel com 32 cabinas e capacidade para 64 passageiros e 60 tripulantes. Foi
construído em 1931, tem 96 metros de casco, trinta velas
(equivalentes a três mil metros quadrados de superfície para
aproveitar o vento) e o mastro mais alto mede 55 metros.
Essa noite e o dia seguinte serão passados no mar das
Caraíbas – 275 milhas marítimas até à Colômbia. Às nove
em ponto o comandante dá início ao içar das velas. Tudo é
feito de forma manual, como se de um navio-escola se tratasse, com «18 tripulantes a realizarem o trabalho de quase
cem», nas suas palavras. Os marinheiros sobem aos mastros
4.º dia
para desatar os nós que prendem as enormes velas. O vento está de popa, coisa boa para quem anda no mar. A prova
disso vai chegar nessa noite quando o Sea Cloud atingir os
13 nós de velocidade, apenas com recurso ao vento. «Facto digno de recorde», diz o director de cruzeiro Steffen
Spiegel, alemão, sempre activo, a coordenar actividades, a
chamar a atenção para pormenores, a reunir os passageiros
para momentos de descontracção como o chá das cinco ou
as palestras sobre os destinos do dia seguinte.
O buffet de almoço é servido às 12h30 no Lido Deck, no
convés superior. É assim todos os dias, excepto quando o mar
agitado ou as chuvas tropicais o impedem. Não foi o que aconteceu nesse primeiro dia de (apenas) navegação. A conversa
ia animada na mesa, com o médico de serviço, o alemão Manuel Fichtelscherer, a dissertar sobre os encantos de Portugal
NAÇÕES UNIDAS
Não há lugares fixos à mesa. Cada
passageiro escolhe onde se sentar
e todas as noites há variação para
que as diferenças culturais venham
ao de cima e a discussão amigável
surja entre um copo de vinho e um
prato preparado com classe.
Colômbia
Santa Marta é reconhecida pelas praias de águas cristalinas nas redondezas. Mas não só.
Simón Bolívar morreu aqui, na miséria. Gabriel García Márquez inspirou-se
em Santa Marta para Cem Anos de Solidão. E Carlos Valderrama é um filho da terra.
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JORG E MARTINA
É a quarta vez que o casal embarca
no Sea Cloud. Desta vez foram
34 dias, de Curaçao à Jamaica.
É a sua segunda casa e na carteira
até têm cartões-de-visita pessoais
com uma fotografia do veleiro.
em tom bem-humorado. O café está quase a chegar para culminar a sobremesa quando algumas dezenas de visitantes inesperados decidem chamar a atenção dos passageiros. Uma família de golfinhos nada agora ao lado do Sea Cloud, saltando
da água, surfando nas ondas, cruzando a embarcação por baixo dela. As palmas e os assobios parecem incentivá-los ainda
mais neste espectáculo gratuito da natureza, longe de aquários
ou espectáculos com animais amestrados. O resto da tarde
é passado a ler, a escrever, a conversar, a pintar, a ver o mar,
a dormir, a namorar. Cada um escolhe a melhor opção.
Pequeno-almoço a partir das sete da manhã,
chegada a Santa Marta, Colômbia, às oito. Meia hora depois sai o primeiro grupo para o Parque Nacional de Tayrona, uma reserva natural à beira da Sierra Nevada, a mais alta cadeia montanhosa junto ao mar em todo o planeta, com
5700 metros de altura. Mas Santa Marta é reconhecida
também pelas praias das redondezas, procuradas por quem
não dispensa águas cristalinas. Além disso, foi aqui que Simón Bolívar, inspirador da independência dos estados sul-americanos, veio a morrer em 1830, doente e na miséria.
Santa Marta serviu também de inspiração a Gabriel García
Márquez para criar a cidade de Macondo, onde decorre
7.º dia
Cem Anos de Solidão. E esta é também a cidade natal de
Carlos Valderrama, o médio ofensivo da selecção colombiana durante os anos oitenta e noventa do século passado.
O mítico jogador de futebol tem uma estátua no centro da
localidade, retratando também, e como não poderia deixar
de ser, a sua enorme cabeleira loura. Uma imagem de marca que teve seguidores um pouco por todo o mundo.
Uma caminhada, misto de trekking e de passeio pelo
meio da densa selva, ocupa este meio dia na Colômbia.
À hora de almoço, o Sea Cloud liga os motores para abandonar Santa Marta e preparar-se para mais 305 milhas de
mar até El Porvenir, no arquipélago de San Blas, no Panamá. Pela frente, mais uma tarde e uma noite de navegação.
O céu está carregado de nuvens. A chuva e o vento
forte fazem que a noite não seja calma e algumas ondas
AO SABOR DO VENTO
Este é o cruzeiro ideal para quem
gosta de velejar e essa é a grande
vantagem do Sea Cloud em
relação às outras embarcações
que cruzam as Caraíbas. Além
disso… aqui há apenas lugar
para 64 passageiros.
Panamá
Os indígenas aproximam-se em pirogas tradicionais, a remos, tentando vender búzios,
colares, brincos e panos típicos. Os kuna são uma tribo de quase trinta mil
indivíduos dispersos pelas cinquenta ilhas de um arquipélago com cerca de 365.
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Volta ao Mundo Abril 2009
Uma família de golfinhos nada agora
ao nosso lado, saltando da água, surfando
nas ondas, cruzando a embarcação
por baixo dela. As palmas parecem
incentivá-los ainda mais neste
espectáculo gratuito da natureza.
atingem altura suficiente para invadir o convés. Os tripulantes sobem aos mastros para recolher as velas. Estas e eles
ficam ensopados num instante. É um navio habituado a dificuldades, com uma história recheada de intempéries e
convulsões. Marítimas, políticas e sociais.
Marjorie Merryweather Post nasceu em 1887,
filha única de um empresário norte-americano. Divorciada, rica e mãe de dois filhos, conheceu Edward F. Hutton,
um banqueiro de Wall Street com a paixão pelos iates. Casaram, compraram uma casa com 53 quartos e mandaram
construir um veleiro de quatro mastros para ser diferente
dos outros, quando o comprimento da embarcação apenas
justificava a utilização de três. Construído em 1931, em
Kiel, na Alemanha, o navio foi levado para os EUA e na
primeira viagem o casal passou pelo Panamá, Cuba, República Dominicana e ilhas Galápagos. Tinham 72 tripulantes para servir três passageiros: o casal e a filha, Dyna Myrrell, hoje com 87 anos e antiga estrela de Hollywood.
Marjorie descobriu que o marido gostava de manter relações com outras mulheres. Não lhe agradou a ideia, divorciou-se e casou, pela terceira vez, com um político norte-americano, embaixador na URSS. O barco ficou para ela.
O Sea Cloud rumou a São Petersburgo onde foi palco de
inúmeras festas da alta sociedade. Imediatamente antes do
eclodir da Segunda Guerra Mundial, o casal mudou-se para a Bélgica e Marjorie, patriota, cedeu o navio à marinha
norte-americana. IX-99 foi o nome dado ao Sea Cloud durante dois anos e meio, a comissão de serviço no decorrer
do conflito. Os mastros foram retirados, com excepção do
principal, e a embarcação teve papel de destaque nos Açores e na Gronelândia, recolhendo informações meteorológicas que ajudaram a planear o decisivo desembarque na
Normandia. Chegou a afundar um submarino alemão.
Nos anos cinquenta, Marjorie, já casada pela quarta vez,
vendeu o Sea Cloud a Rafael Trujillo, antigo ditador da República Dominicana, que mudou o nome do veleiro para Angelita e o ofereceu a um dos filhos. Los Angeles foi o poiso seguinte. As socialites de Hollywood, entre elas Joan Collins, foram
as frequentadoras das festas megalómanas organizadas pelo incorrigível herdeiro a bordo do Angelita. O ditador não gostou
das loucuras do primogénito e chamou-o de volta a casa. Já em
desgraça, a família tentou fugir para a Europa a bordo do iate,
mas as novas autoridades dominicanas capturaram-no, incorporando o actual Sea Cloud na marinha do país sob o nome de
Pátria. Seguiu-se um período de várias compras e vendas até se
tornar navio-escola para jovens de famílias ricas que procuravam descobrir o espírito de equipa. Mas o dinheiro para esse
projecto acabou e a embarcação foi arrestada no Panamá até
ao pagamento das dívidas. Eram os anos setenta do século XX.
Durante cerca de dez anos, as condições do navio deterioraram-se, até que um grupo de empresários alemães o
descobriu, perdido no Panamá. Na travessia para a Europa,
o Sea Cloud parou nos Açores, onde foi retido novamente
para pagamento de dívidas. Chegado a Hamburgo, em
1979, os actuais proprietários recuperaram-no e transformaram-no num navio de cruzeiro especial. O mesmo que veleja agora em direcção ao Panamá.
A manhã é de muito sol. E a paisagem é surpreendente.
Centenas de pequenas ilhas aguardam o Sea Cloud. Os indígenas aproximam-se em pirogas tradicionais, a remos, tentando vender búzios, colares, brincos e panos típicos. Os kuna são
uma tribo de quase trinta mil indivíduos dispersos pelas cinquenta ilhas de um arquipélago com cerca de 365. Chegaram
a San Blas, na costa do Panamá, no século XIX, e defenderam
a sua autonomia de forma feroz. Vivem dos cocos, da pesca e
agora, também, do turismo. Na ilha principal, El Porvenir,
uma pista de aviação com 450 metros de comprimento pode
receber voos internacionais. De um lado e outro do asfalto,
relva e palmeiras. Depois, areia branca e água. Snorkeling e banhos de mar são as melhores opções para passar o tempo. De
resto, é como se se estivesse no paraíso. Um pequeno restaurante serve arroz de polvo, marisco e cerveja fresca a pouco
mais de oito dólares. Há quem volte a bordo para não perder
o almoço do Sea Cloud. Não é a melhor opção, apesar da qualidade da comida no navio. Aqui, no areal, a qualidade de vida é mais importante. Jorg, Martina, o médico Manuel e um
amigo também optaram pelo programa mais simples. Entregam-se aos prazeres da conversa, interrompendo-a apenas para mais um mergulho no mar ou um passeio na praia.
Nessa noite vai decorrer a Festa dos Piratas, com direito
a máscaras, palas nos olhos, ganchos em vez de mãos, cicatrizes maquilhadas e muito rum. No Sea Cloud tudo parece ser
possível. Pela noite dentro, a tripulação vai entoar canções de
marinheiros em várias línguas. Os passageiros vão acompanhar com palmas e seguindo as letras num livro fotocopiado.
Falta um dia de navegação para se chegar ao destino
final: Puerto Limón, na Costa Rica. Na última noite a bordo,
o Jantar de Despedida do Comandante. A primeira vez que
Todd Burgman, natural do Nebraska, viu o mar, tinha 18 anos.
E rendeu-se. À cabeceira da mesa, conta histórias de travessias e do encanto pelo Sea Cloud. Tem 45 anos e garante que
a sua viagem preferida é a da travessia entre a Europa e as Caraíbas, todos os anos antes do Verão. Faz mais um brinde,
acompanhando a lagosta servida ao jantar. No final, «rouba»
mais um chocolate para adoçar o gosto do café e retira-se.
Às oito da manhã, o Sea Cloud chega à Costa Rica, o país
que aboliu as Forças Armadas em 1949 e resolveu apostar o dinheiro empregue nessa área na saúde e na educação. É a terra
do ecoturismo e um dos melhores exemplos de progresso na
América Central e do Sul. Em Puerto Limón, um gigantesco
barco de cruzeiro está aportado junto ao Sea Cloud. Milhares de
passageiros britânicos saem em fila indiana para as excursões,
atrás de um guia turístico. No convés do Sea Cloud, os viajantes bebem chá e café, despedem-se uns dos outros e da tripulação. Saem no seu próprio ritmo. Do imenso prédio flutuante ali
ao lado, debruçam-se as máquinas fotográficas que não querem
perder o momento de guardar uma recordação do Sea Cloud.
Quem lá viajou, sabe que dificilmente o esquecerá. ■
CARAÍBAS
Esta não é uma viagem qualquer. É preciso gostar de velejar, respeitar o mar e não enjoar. Ou, pelo menos, ter alguns
comprimidos à mão caso se sinta mal. De resto, imagine-se no paraíso, aproveitando os mesmos ventos que levaram os
descobridores portugueses e espanhóis até ao Novo Mundo. Com a vantagem de estar a bordo de um hotel de cinco estrelas.
COMO IR
A KLM (www.klm.pt) voa para
Curaçao a partir de mil euros.
CURAÇAO
ARUBA
NICARÁGUA
SANTA MARTA
METEOROLOGIA
O clima nas Caraíbas é bastante peculiar.
Evite os meses de Outubro e Novembro,
já que o risco de tempestades e furacões
é elevado. No resto do ano, há calor
para todos os gostos. Mais informações
em www.wunderground.com.
COSTA PUERTO
RICA LIMÓN
EL PORVENIR
VENEZUELA
PANAMÁ
Oceano Pacífico
COLÔMBIA
FUSO HORÁRIO
PORTA-MOEDAS
O euro e o dólar são aceites a bordo como
meio de pagamento, bem como os cartões
de crédito VISA, Master Card e American
Express (e ainda os Travellers Cheques). Antes das paragens em cada porto é possível
trocar dinheiro a bordo. Em Curaçao, Aruba,
Santa Marta e Puerto Limón é fácil o acesso
a bancos e caixas ATM. No arquipélago de
San Blas, no Panamá, convém ir munido
de dinheiro em notas pequenas, para as
possíveis compras que queira fazer e para
os serviços de piroga-táxi entre as ilhas.
Área em destaque
PALESTRAS
Em cada dia de navegação, antes da chegada aos portos, estão preparadas palestras
sobre o destino a visitar, em inglês e alemão.
História do local, tradições, curiosidades,
dados económicos e culturais são alguns
temas abordados. A meio da viagem é escolhido um dia para contar as aventuras deste
veleiro histórico, seus anteriores proprietários e agruras sofridas ao longo de 77 anos.
SURPRESAS NA COZINHA
O SEA CLOUD
O Sea Cloud (www.seacloud.com) tem 32
cabinas e capacidade para 64 passageiros
e 60 tripulantes. O pavilhão é de La Valetta,
em Malta, e está equipado com Internet, ar
condicionado, bar, loja, lavandaria, biblioteca, restaurante, posto médico, serviço de
entrega de jornais e material para desportos
náuticos. O programa de uma semana inclui
todas as refeições a bordo, com direito a vinho e cerveja. Fora do horário das refeições,
apenas água e refrigerantes estão incluídos
no valor total (a partir de 2.735 euros).
É conveniente marcar a viagem com
antedecência, face à elevada procura. Se não
conseguir – ou não quiser esperar – pode
sempre aproveitar os cruzeiros do Sea Cloud
no Mediterrâneo, entre Abril e Novembro.
Tel.: 219 349 590
www.studycruises.com
Aquipa do Sea Cloud não permite
muitos momentos mortos. Além do
tempo destinado a cada passageiro
para descansar, ler, passar pelo bar ou
estender-se numa das espreguiçadeiras
dos vários convés, existe um variado
programa de actividades suplementares.
ESCALAS
Aruba
Em Oranjestad é possível realizar
excursões adicionais a terra, dando
a volta à ilha e visitando uma fábrica
de aloé vera. Pode ainda subir ao farol
Califórnia, o ponto mais alto de Aruba.
Sinceramente, aproveite o tempo para
ir à praia. É a melhor aposta. Pode
sempre optar pelas compras ou
pelos casinos.
Colômbia
GMT - 5 horas (ou 6, dependendo do destino)
ACTIVIDADES A BORDO
O HOMEM DO LEME
Mais que uma onda, mais que uma
maré, Todd Burgman é impelido
pela paixão de velejar. Natural
do Nebraska, nos EUA, tem
45 anos e só aos 18 viu o mar.
Nunca mais o largou.
Mar das Caraíbas
Todos os dias, os cozinheiros deste hotel
flutuante de cinco estrelas preparam
surpresas para os passageiros, seja no
chá das cinco acompanhado de panquecas
ou com outros pequenos mimos para
quem está a bordo. Mais formais são os
dois jantares de gala, o de boas-vindas
e o de despedida, os chamados jantares do
Comandante. Nessas ocasiões é requerido
um traje de gala, fato escuro e gravata
para os homens, e vestido de noite para
as mulheres. Mas o formalismo fica por aí,
faz parte do espectáculo. Todo o ambiente
acaba por ser descontraído, apesar
da excelência da cozinha e do serviço.
MÚSICA E FESTA
Todas as noites há música, graças ao
italiano Mario, o pianista de serviço. Mas
na última noite de cruzeiro tudo é diferente,
com a tripulação a brindar os convidados
com uma sessão de canções de marinheiro.
Outro grande momento ocorre nessa mesma noite, com a tradicional Festa dos Piratas. Não há quem apareça no convés sem,
pelo menos, uma cicatriz pintada na cara
ou uma pala no olho. Os lenços na cabeça
e as garrafas de rum também fazem parte
da lista de adereços para uma noite especial.
Santa Marta oferece-lhe a possibilidade
de conhecer um pouco melhor a
realidade colombiana (e, entre outras
curiosidades, foi aqui que nasceu Carlos
Valderrama, o mítico jogador da selecção
colombiana). Se optar por uma visita à
cidade, a mais antiga do país (fundada
em 1525), irá conhecer a Quinta San Pedro
Alejandrino, onde morreu Simón Bolívar.
O Parque Nacional de Tayrona é outro
dos pontos de interesse, com os seus
trilhos através da floresta tropical.
Panamá
O arquipélago de San Blas é a casa
dos índios kuna. Logo, respeite as suas
tradições e costumes. Regateie nas compras e mantenha um sorriso de cortesia.
Uma viagem de piroga entre as ilhas é uma
experiência quase obrigatória. Fazer mergulho ou snorkeling também são boas opções.
Costa Rica
Puerto Limón é uma cidade portuária
com cem mil habitantes, ponto de
chegada de diversos navios de cruzeiro.
O interesse é diminuto. A solução passa
por sair em direcção à capital, San José
(três horas de autocarro), ou escolher
uma das muitas actividades de ecoturismo
que o país oferece: caminhadas pela
selva, observação de espécies selvagens
ou trilhos pelos vulcões.
AGRADECIMENTOS
A Volta ao Mundo agradece à Study Cruises
o apoio na realização desta reportagem.
www.studycruises.com
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