Povoado da Torre - Marinha Baixa - NIA
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Povoado da Torre - Marinha Baixa - NIA
Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos POTOR (Povoado da Torre) RELATÓRIO FINAL (2006) Alexandre Sarrazola Inês Mendes da Silva Índice 1 INTRODUÇÃO 3 2 HISTÓRIA DA INVESTIGAÇÃO 6 2.1 OUTEIRO DA TORRE 7 2.2 MARINHA BAIXA 13 3 ENQUADRAMENTO HISTÓRICO-GEOGRÁFICO 18 3.1 ENQUADRAMENTO GEOMORFOLÓGICO 18 3.2 ENQUADRAMENTO HISTÓRICO 21 3.3 VIAS DE COMUNICAÇÃO 25 3.3.1 VIAS TERRESTRES 25 3.3.2 VIAS FLUVIAIS 26 4 TORRE /MARINHA BAIXA:DIACRONIA DE OCUPAÇÃO/ABANDONO 28 4.1 OUTEIRO DA TORRE 28 4.2 MARINHA BAIXA 30 5 ANÁLISE ARTEFACTUAL 38 5.1 CERÂMICA COMUM 38 5.2 VIDROS 50 5.3 TERRA SIGILLATA 63 5.3.1 OUTEIRO DA TORRE – O ESPÓLIO 67 6 ANÁLISE CONTEXTUAL 69 6.1 CONDIÇÕES PARA A PRODUÇÃO/RECICLAGEM DE VIDRO 70 6.2 MARINHA BAIXA: UM CENTRO DE PRODUÇÃO/RECICLAGEM DE VIDRO NO NOROESTE PENINSULAR? 75 7 CONCLUSÃO 81 7.1 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO-ARQUEOLÓGICA 81 7.2 POTOR: OBJECTIVOS E RESULTADOS 86 8 BIBLIOGRAFIA 90 9 FICHA TÉCNICA 94 Anexo 1 – ACÇÕES DE DIVULGAÇÃO 97 Anexo 2 – CATÁLOGO DE VIDROS / TERRA SIGILLATA 99 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 2 1 INTRODUÇÃO O presente projecto de investigação surgiu na sequência da realização de uma série de trabalhos arqueológicos na área de Cacia desde 19991. e teve como objectivo fundamental a avaliação do potencial arqueológico do Povoado da Torre integrado no contexto da rede de povoamento da região do Baixo Vouga. Neste sentido, e por forma a atingir este fim, propusemo-nos aos seguintes objectivos: Objectivos genéricos • Avaliação do potencial arqueológico do Povoado da Torre, assumida como contributo para o conhecimento da rede de povoamento da região do Baixo Vouga no contexto da ocupação romana do actual território português. • Abordagem interdisciplinar ao conhecimento da evolução da paisagem litoral na zona do Baixo Vouga no que concerne às suas implicações históricoarqueológicas. • Valorização do contributo da investigação arqueológica na construção da memória colectiva/ local, entendida enquanto elemento estruturante de identidade e como garante do exercício da cidadania. Objectivos específicos • Avaliação do grau de preservação das evidências materiais de carácter arqueológico jazentes no sítio da Torre, sabendo que o local foi objecto de uma actividade continuada de extracção de saibro durante a primeira metade do século XX. • Elaboração de um quadro preliminar de caracterização diacrónica da ocupação do espaço da Torre. • Aferição de eventuais relações sincrónicas entre o povoado da Torre e a Marinha Baixa durante o intervalo de tempo que caracteriza cronologicamente a ocupação desta última (séc. IV-VI). Pretendemos, desta forma, testar a nossa hipótese interpretativa de identificação da Marinha Baixa enquanto espaço de funções 1 Para um conhecimento integral dos resultados destes trabalhos cf.ERA Relatório de Trabalhos Arqueológicos. Sistema Multimunicipal de Saneamento da Ria de Aveiro. Prospecções e acompanhamento de obras, n.º 1, Jan. 1999 – n.º 36, Dez. 2001, [textos policop.];. SARRAZOLA, A., BORGES-COELHO, M. (2000) Relatório dos trabalhos arqueológicos. Marinha Baixa / E.E.I.G. 1 (Cacia), ERA, [texto policop.] e SARRAZOLA, A., MENDES DA SILVA, I., MELRO, S. (2001) Relatório dos Trabalhos Arqueológicos. Intervenção Arqueológica de Emergência. Marinha Baixa/ EEIG1 (Cacia). Segunda campanha (Sondagens 4 e 5), ERA, [texto policop.]. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 3 especializadas associado ao sítio da Torre (SARRAZOLA, MENDES DA SILVA, MELRO, 2001). • Confirmação/ infirmação da ocorrência de fases de ocupação da Torre anteriores e posteriores ao intervalo de tempo atestado na Marinha Baixa (séc. IV-VI), através da obtenção de dados estratigráficos. • Aferição de eventuais especificidades do povoado da Torre, no que concerne à sua implantação geográfica e ao seu contexto geomorfológico e respectivas implicações históricas; através da colaboração com especialistas em estudos paleoambientais. • Realização de acções de divulgação dos resultados da investigação arqueológica junto das populações locais, dando continuidade a iniciativas empreendidas em articulação com a Junta de Freguesia de Cacia no decurso do ano 2000. • Determinação de uma estratégia de continuidade do projecto (após a avaliação do potencial arqueológico da Torre), definida em função dos dados decorrentes da sua realização. Dado os resultados obtidos no decorrer da intervenção arqueológica realizada no sítio da Torre (Cf. Relatório Final dos Trabalhos Realizados no sítio da Torre – Cacia, Aveiro), optámos por uma alteração de estratégia no que concerne aos objectivos basilares deste projecto. Desta forma, e tendo em consideração que no decorrer da intervenção realizada no sítio da Torre não foram identificados contextos arqueológicos preservados, tendo-se verificado que grande parte do topo do cabeço terá sido fortemente afectada pela extracção de saibro que aí se verificou durante várias décadas, foi proposto ao Instituto Português de Arqueologia (solicitação enviada a 6 de Maio de 2004) o estudo do espólio exumado no decorrer das intervenções realizadas na Marinha Baixa, sítio por nós interpretado como subsidiário da Torre. Não obstante, foi registada a presença de alguns materiais que apontam para a ocupação do cabeço em época romana tardia, como sejam o caso de alguns vidros e fragmentos de sigillata (embora estes apareçam descontextualizados, num depósito cuja formação terá ocorrido durante a laboração da pedreira, ou na camada de superfície cujas terras se desconhece a proveniência), corroborando, ainda que parcelarmente, a hipótese de trabalho preliminarmente apresentada relativa a uma ocupação tardo-romana do sítio. Contudo, o objectivo de proceder à elaboração de um quadro de caracterização diacrónica de ocupação do espaço da Torre, assim como o de avançar com novos dados para o conhecimento da evolução da linha de costa na região do Baixo Vouga revelou-se, POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 4 na área sondada, impossível de concretizar. Tal facto não invalida, no entanto, que noutras áreas do outeiro não sondadas ainda se encontrem contextos arqueológicos preservados. O trabalho que agora se apresenta pretende expor os resultados obtidos com a análise do espólio exumado de ambos os sítios (Outeiro da Torre e Marinha Baixa), procurando através desta a sua integração na rede de povoamento tardo-romano na região do Baixo Vouga, considerando não só os aspectos artefactuais mas também a evolução geomorfológica daquele espaço e consequente utilização das redes viária e fluvial. Consideramos que a relativa escassez de dados arqueológicos que caracteriza o estado actual dos nossos conhecimentos em relação ao povoamento antigo, nomeadamente no período tardo-romano/alto-medieval, do Baixo Vouga, justifica-se mais pela fraca frequência de iniciativas de investigação neste campo – salvaguardando as excepções que são do conhecimento público – do que por uma efectiva ausência de objectos de estudo. Orientado pelos objectivos que acima apresentamos, este projecto pretende constituir um contributo no quadro do programa de abordagem ao conhecimento da região do Baixo Vouga no contexto da ocupação romana do actual território português. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 5 2 HISTÓRIA DA INVESTIGAÇÃO A assumida associação Outeiro da Torre/ Marinha Baixa constitui, obviamente, uma proposta interpretativa. Fundamentam-na o acervo de dados recolhidos na Marinha Baixa e o estado actual dos nossos conhecimentos a propósito do Sítio da Torre. A título de exemplo, mencione-se a correspondência crono-tipológica entre o conjunto de vidros recolhidos na Marinha Baixa2 e a colecção proveniente da Torre, publicada em 1963 por Jorge e Adília Alarcão (ALARCÃO, J., ALARCÃO, A., 1963: 381-389) e os dados relativos ao estudo de materiais que adiante se expõem neste relatório. Em 1958, Dulce Souto escrevia: “Não há dúvida que o cabeço onde foi outrora o lugar da Torre (...) tem uma configuração que bem nos permitia integrá-lo no número dos castros do litoral, pois aproveita de boa posição natural para a defesa” (ALVES SOUTO, 1958: 18). Em função da bibliografia arqueológica e dos dados disponíveis em 1993, diz-nos António M. da Silva: “(...) em Cacia, (...) não se conhecem com segurança materiais préromanos” (SILVA, A.M., 1993: 435). De facto, não há qualquer informação publicada a propósito da Torre, assim como decorrente das nossas intervenções que ateste uma ocupação pré-romana daquele espaço. Na Marinha Baixa, a aparente ausência de contextos de ocupação doméstica, a presença de estruturas associáveis a actividades de produção e a proximidade à Torre, orientamnos no sentido de a interpretar como espaço industrial associado àquele povoado e, eventualmente, situado na sua imediata periferia. Ao abordar os centros de produção cerâmica romano-britânicos, diz-nos Vivien Swan: “(...) eram frequentemente periféricos em relação aos povoados, por vezes junto aos seus limites exteriores ou, até, em pequenas áreas industriais associadas aos povoados” (SWAN, 1984: 6), aludindo, mais adiante, à cláusula da legislação de Urso (Osuna; Espanha) onde se proibia a produção de cerâmica comum e telha dentro daquela colónia (BRUNS, 1909, pt. I, 128, Lex Ursonis, LXXVI, apud SWAN, 1984: 49), supostamente, segundo a autora, prevenindo a ocorrência de incêndios, mas também pelo facto das receitas de uma colónia advirem parcialmente das olarias municipais concorrentes de produtores privados que, desta forma, não estariam autorizados a estabelecer-se dentro dos limites urbanos. A este respeito, J. Alarcão e R. Étienne afirmam que Conimbriga seguia com certeza a 2 Cf. infra Capítulo 6 Análise Artefactual. Vidros. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 6 legislação romana que exigia que o forno de cerâmica se localizasse fora dos limites do território urbano (ALARCÃO J., ÉTIENNE, R., 1977: 23). Efectivamente, se numa primeira instância se aventou a hipótese de estarmos perante uma unidade de produção cerâmica, o desenvolvimento da nossa investigação e os dados de que actualmente dispomos inclinam-nos forçosamente a admitir a presença na Marinha Baixa de estruturas associadas a actividades de produção secundária (reciclagem) de vidro. A respeito desta temática (em termos gerais), é sabido que, no Noroeste Peninsular, as produções comuns de vidros, relacionadas com o quotidiano e maioritariamente com o mundo doméstico, sem grandes ambições técnicas ou estilísticas, e geralmente de origem regional ou local, se espalham territorialmente, ainda que evidentemente dentro de distância menores [que as das produções de luxo] de acordo com o seu carácter de produtos realizados em oficinas possivelmente muito pouco especializadas (XUSTO, 2001: 84). 2.1 OUTEIRO DA TORRE O conhecimento formal da presença de um sítio arqueológico em Cacia, mais concretamente junto à Igreja de S. Julião, remonta a 1561, ano da publicação da “Chorographia de alguns lugares (...)” de Gaspar Barreiros. O autor da Chorographia identifica o local como os vestígios da antiga cidade de Talábriga (apud ROCHA MADAHIL: 1941; 231), e adianta: “N’a qual villa & igreja de Sanct. Juliã nas ribeiras de Vouga situadas, se acham vestigios antigos. / . os fundamentos da huma torre que na memoria dos homens inda stava quasi inteira, onde em outro tempo segundo ficou fama de huns em outros chegaram navios da foz do mar, porque inda ali se acharam pedaços d’elles & anchoras juncto da dicta torre em huma lagoa. Afora muitos vestigios & ruinas de argamassa que dentro em seu ambito comprehende huma milha pouco mais ou menos.” (sublinhado nosso;apud ROCHA MADAHIL: 1941; 232,233).3 3 Não pretendendo, de forma alguma, submeter os dados da investigação arqueológica à informação historiográfica disponível, nem extraír da leitura do trecho citado qualquer espécie de conclusão prévia, é inevitável constatar que os vestígios arquitectónicos postos a descoberto na Marinha Baixa se localizam dentro dos limites da “milha” referida pelo corógrafo de quinhentos. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 7 Na “Discripção do Reino de Portugal”, de 1599, Duarte Nunes de Leão afirma a propósito de Talabrica: “(…) foi junto de Aveiro, na Ribeira do Vouga, onde agora há um logarinho que se chama Cacia, onde está a Igreja de S. Julião, de que não há mais que esta notícia” (apud Rangel de Quadros: 1911-1916; 4) O sítio é referenciado amiudadas vezes ao longo da história da Arqueologia Portuguesa no contexto da problemática da situação conjectural de Talábriga. No início do nosso século, Félix Alves Pereira afasta definitivamente a hipótese da localização da cidade antiga na zona de Cacia, em artigo publicado no Archeólogo Português (PEREIRA: 1907). Na sequência de uma breve e superficial menção ao sítio em Origens da Ria de Aveiro (SOUTO; 1923: 129), Alberto Souto publica em 1930 A Estação Arqueológica de Cacia. O autor fora alertado para a descoberta de um pondus e um fragmento de cerâmica ornamentada por Sebastião de M. Lima que, em 1929, explorava, no local, uma pedreira (cascalheira). Em visita ao sítio, Alberto Souto identifica “um montão de pedras em granito que logo” constatou “serem de velhas construções e absolutamente estranhas à geologia local” (SOUTO; 1930: 8), assim como no “corte das pedreiras abertas, uma camada de cacos e destroços de habitações” que “se estendia por todo o terreno, a um metro, pouco menos, da superfície do solo arável e cultivado (...) onde abundavam os fragmentos de louça e as pedras de granito e xisto, de construções demolidas”. Refere, mais adiante, a presença de fragmentos de “colo de ânfora, misturados com tegulae, imbrex e tijolo, restos de cozinha, ossos de caça4, cascas de molusco, e uma grande extensão de cinzas e carvão”, e acrescenta a informação indirecta de que “daí se têm desenterrado há muitos anos louça, ancoras, ferragens, moedas de ouro, prata e cobre, mós, fornos, restos de esqueletos humanos, ossos, etc.” (SOUTO; 1930; 9). Com base nas evidências materiais registadas no local, assim como nas informações indirectas a este concernentes, o autor conclui que “ali existiu, em tempos remotos, há 2000 anos, aproximadamente, uma povoação possivelmente lusitano-romana que deve ter desempenhado um papel importante na vida marítima e fluvial da foz do Vouga, uma 4 Note-se que, na Marinha Baixa, a quase total ausência de restos de fauna (uma única amostra relativa a um fragmento de osso proveniente da U.E. 2057) constitui, entre outros, um dos dados que nos conduziu no sentido de afastar a hipótese de uma eventual associação deste espaço a contextos domésticos. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 8 citânia ou um castrum, talvez um oppidum; um povoado do género de Guifões na foz do Leça e Santa Olaia na foz do Mondego (...)” (SOUTO; 1930: 17). Não obstante afirmar que “quase todo o outeiro tem sido revolvido, cortado, desfeito, consideravelmente diminuído, principalmente na sua face sul” (SOUTO; 1930; 17), o Director do Museu Nacional de Aveiro (onde desde então se encontra depositado o espólio) conclui reforçando, a par com Mendes Correia, a “grande importância” da estação “sob o ponto de vista arqueológico” (SOUTO; 1930: 19). Em 1942 é dado à estampa um novo artigo de Alberto Souto, Romanização no Baixo Vouga – Novo oppidum na zona de Talábriga, publicando o aparecimento, em Cacia, “de importantes restos metálicos”, “entre eles um soberbo L de bronze dourado, certamente comprovativo da importância arquitectónica de algum edifício da cidade destruída” (SOUTO; 1942: 288).O mencionado L é documentado fotograficamente (1942: 287), assim como o são uma anforeta (1942: 295), cerâmica comum (1942: 298) e cerâmica de construção (1942:302) provenientes do Sítio da Torre, então nomeado assumidamente como o Castro Luso-Romano de Cacia. Em 1958 Dulce E. Alves Souto publica Subsídios para uma Carta Arqueológica do distrito de Aveiro no período da romanização. A propósito do “chamado castro de Cacia” afirma: “Não há dúvida de que o cabeço onde foi outrora o Lugar da Torre, a poente da Igreja de S. Julião, tem uma configuração que bem nos permitia integrá-lo no número de castros do litoral, pois aproveita de boa posição natural para a defesa” (ALVES SOUTO; 1958: 18). Problematiza, adiante, que “poderá ter sido de facto um castro depois romanizado, ou somente uma ampla villa romana”, tomando o partido da primeira hipótese. E conclui a abordagem ao sítio reforçando que “ainda hoje, em visita ao local, muito revolvido, não é difícil encontrar restos de tegulae e outros vestígios dessa passagem dos romanos por aquela zona cujo antigo topónimo se perdeu.”(no apêndice fotográfico deste artigo é publicada a fotografia de uma lucerna recolhida em Cacia). (ALVES SOUTO; 1958: 19, 34) Em 1963 Jorge e Adília Alarcão publicam na Revista de Guimarães (ALARCÃO, J., ALARCÃO, A.: 1963; 381-393) uma colecção de vidros romanos provenientes da Torre, depositados no Museu de Aveiro por Alberto Souto. A cronologia definida para estes 20 fragmentos (19 taças e 1 copo) incide maioritariamente no intervalo de tempo compreendido entre os séculos IV e V (para 17 casos); entre a primeira metade do séc. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 9 IV e o séc. VI, para 2 das peças representadas; e do séc. IV ao início do séc. VII para um fragmento de taça5. Em 1976 é João Sarabando quem faz regressar o Lugar da Torre ao panorama da bibliografia arqueológica portuguesa publicando Numisma com a efígie de Honório. Contributo para o estudo da presença romana em Cacia. O autor nomeia os efeitos negativos da pedreira que existiu no local, informando que ”no dizer de testemunhas fidedignas, de velhos moradores da freguesia, o outeiro ficou reduzido de dez a doze metros na sua altura primitiva” (SARABANDO; 1976: 37)6. Sarabando faz publicar o registo fotográfico de uma moeda de ouro encontrada “na Torre” durante a limpeza do antigo poço local. Nos anos cinquenta, o autor teve acesso a “fotografias do anverso e reverso da moeda” cedidas pelo seu terceiro proprietário. Remeteu-as “mais tarde ao numismólogo portuense Sousa Oliveira”, redactor do parecer que é transcrito no seu artigo (SARABANDO; 1976: 37). Sousa Oliveira identifica cronologicamente a moeda com o Imperador Honório (395-423), adiantando a hipótese de se tratar de uma cunhagem sueva dos séculos V/VI, conclusão aferível exclusivamente através do seu peso, dado com o qual obviamente não contava, por apenas ter acesso ao registo fotográfico (SARABANDO; 1976: 39). No mesmo artigo são publicadas fotografias de “fragmentos de uma estatueta e de uma armela em bronze encontrados no sítio da Torre” (1976: 37), de cerâmica (1976: 23) e uma fotografia aérea do outeiro (1976: 39). Sarabando conclui afirmando que, não obstante a perda irremediável de um “avultado número de documentos”, “outros ainda existirão, importando rastreá-los sem demora e estudá-los convenientemente(...)”(1976:40). O Sítio da Torre é referenciado por Jorge Alarcão em Roman Portugal, com menção à sua localização e ao seu espólio: “(...)cerâmica e um L de bronze, proveniente de alguma 5 Este enquadramento cronológico foi posteriormente problematizado pelos mesmos autores. 6 De facto, a diferença entre a cota topográfica do topo do Outeiro da Torre registada em fins do século XIX (FOLQUE, F.: 1870) - 10 m – e aquela que consta no levantamento militar de 1972 (C.M.P. f. 174) – 8 m – corresponde, efectivamente, a dois metros. Se tivermos em conta que a mencionada pedreira laborou no local em meados do século XX, a informação de Sarabando é susceptível de algumas reservas.Refira-se que a cota do ponto mais elevado do Outeiro da Torre que topografámos, aquando do início dos nossos trabalhos, apresentava o valor de 7.72 m. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 10 inscrição em elemento arquitectónico; uma armela de sítula, um bronze figurativo e um aureus de Honório; e vidros”. (ALARCÃO; 1988; 92). N’ “As cidades marítimas da Lusitânia”, comunicação apresentada em 1988, Vasco Mantas afirma que a Sul do Porto (Cale) e de Gaia (Cerro Oppido), “o primeiro local identificável com uma povoação de certa importância, junto à costa, é Cacia, na margem esquerda do curso terminal do Vouga. Esta estação pertencia ao território de Talábriga e corresponde provavelmente ao porto de embarque dos minérios provenientes da exploração das minas de cobre e de ferro da zona de Albergaria–a-Velha e de Sever do Vouga”(MANTAS, V.; 1990: 158) Registe-se ainda a importância do texto de divulgação de Bartolomeu Conde – História resumida da milenária povoação luso-romana estabelecida no sítio da “Torre” nas ribeiras do Vouga em Cacia – publicado em 1997 pela Junta de Freguesia de Cacia, reflexo evidente do peso deste sítio arqueológico no âmbito da história regional/local. Finalmente, em prospecções realizadas no Outeiro da Torre em 1999, no âmbito dos trabalhos de acompanhamento arqueológico das obras do Sistema Multimunicipal de Saneamento da Ria de Aveiro, a nossa equipa registou, naquele espaço, a presença de fragmentos de tegulae, imbrex e cerâmica comum (áreas ocidental, setentrional e topo) e um fragmento de fundo de paredes finas (topo do outeiro).Casualmente, numa obra que decorria a cargo da Câmara Municipal de Aveiro no sopé sud-oriental do outeiro, registou-se a presença de uma estrutura de pedra seca, em xisto, “alicerçada no topo do substracto geológico, ao longo de uma extensão de cerca de oito metros e apresentando altura e largura médias de 30 e 40 cm, respectivamente, coerente com as descrições concernentes ao Sítio Arqueológico da Torre patentes na bibliografia que particularmente se lhe refere” (SARRAZOLA, A., 1999), contudo, muito diferente daquelas que foram registadas na Marinha Baixa. Observações posteriores efectuadas sobre uma fotografia aérea da zona permitiram constatar, com alguma segurança, a presença de uma estreita faixa curvilínea localizada a Sul do Outeiro da Torre, orientada no sentido Sudoeste – Nordeste, correspondente – com toda a probabilidade – ao muro que detectámos no local.7 Na mesma imagem fotográfica é possível observar uma linha circular que, aparentemente, circunscreve o espaço da Marinha Baixa. Note-se que já numa fotografia aérea de 1958 havíamos 7 Fotografia aérea consultada em http://geocid-snig.cnig.pt POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 11 constatado a presença na Marinha Baixa de uma faixa de planta subrectangular justaposta a uma outra parabolar (USAF, 1958, 174, Rol. 45, n.º 3515). Figura 1 – Fotografia aérea do Outeiro da Torre (anos 90) Na Carta Arqueológica do Concelho de Aveiro, publicada muito recentemente por Carlos Brochado de Almeida e Francisco Fernandes (2001), os autores atribuem particular destaque ao povoado da Torre, reforçando “sérias dúvidas” em classificar o sítio como “habitat da Idade do Ferro” (2001:24) e, remetendo para as intervenções realizadas pela nossa equipa na Marinha Baixa, afirmam: “Ajudam e de que maneira às nossas interrogações, as escavações que foram realizadas junto à fábrica de Cacia (...)”, acrescentando adiante que os vestígios romanos detectados ocasionalmente na Torre “e agora de forma sistemática com a escavação arqueológica da SIMRIA [Marinha Baixa]” Finalmente, no âmbito de uma tentativa de enquadramento histórico dos contextos de abandono da Marinha Baixa-Torre, propusemos a hipótese de trabalho, numa assumida extensão regional do modelo de López Quiroga (2001) para o Entre Douro e Vouga POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 12 Litoral, da Torre integrar o número de castros (re)ocupados no decurso da Antiguidade Tardia8 (SARRAZOLA, 2003:160). Finalmente, no âmbito do Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos, o Outeiro da Torre foi objecto de uma intervenção arqueológica de prospecções sistemáticas e escavações em curso em Novembro de 2003. Com o objectivo fundamental de avaliar o potencial arqueológico do sítio– perspectivado no contexto da rede de povoamento da região do Baixo Vouga no decurso da ocupação romana do actual território português – o projecto veio dar sequência a uma série de trabalhos arqueológicos realizados em Cacia entre 1999 e 2004 no âmbito das acções de acompanhamento arqueológico das obras do Sistema Multimunicipal de Saneamento da Ria de Aveiro (SIMRIA) a cargo da empresa ERA – Arqueologia SA.. A este objectivo basilar subjaz um programa de intenções que, como já foi mencionado, podemos sintetizar da seguinte forma: • Caracterização arqueológica do Povoado da Torre e respectivas implicações contextuais; • Abordagem interdisciplinar ao conhecimento da evolução da paisagem litoral na zona do Baixo Vouga; • Valorização do património/ conhecimento arqueológico junto das populações locais Através da avaliação do potencial arqueológico do Povoado da Torre (e da aferição do grau do seu estado de preservação) – a realizar no âmbito deste projecto – era nosso objectivo proceder à elaboração de um quadro preliminar de interpretação/ caracterização da diacronia de ocupação da Torre, procurando estabelecer relações sincrónicas entre este espaço e as realidades que já conhecíamos em virtude das intervenções que efectuámos na sua periferia. 2.2 MARINHA BAIXA Na sequência da detecção de contextos arqueológicos em Julho e Outubro de 1999, (no decurso do acompanhamento das obras, a cargo da SIMRIA SA, de implantação do Sistema Multimunicipal de Saneamento da Ria de Aveiro) e por deliberação do Instituto 8 López Quiroga alude à zona costeira do Noroeste como um “âmbito espacial extremamente ligado a uma forte actividade comercial de importação durante toda a Antiguidade Tardia que não se interrompe nem se contrai com a instalação e chegada dos Suevos”, mencionando a existência de “razões de tipo geo-económico para a ocupação ou reocupação dos antigos castros, uma vez que estes contribuiriam para manter e, sobretudo, proteger a intensa actividade comercial que se observa durante este período por meio de uma série de sítios fortificados de altura localizados em antigos castros com relação com os eixos principais da rede viária e hidrográfica” (2001:84). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 13 Português de Arqueologia, a Marinha Baixa (localizada a cerca de 325 m – no sentido Sudeste / Noroeste - do Sítio Arqueológico da Torre: CMP 174;M – 39 340; P 113 740) foi objecto da realização de cinco sondagens arqueológicas, efectuadas em duas fases nos anos de 1999 e 20009. Em 2002, no âmbito dos trabalhos de construção da ETAR Norte, a área das sondagens foi protegida com geotêxtil e aterrada, sendo que, na área da Sondagem 1, se procedeu ao desmonte acompanhado dos muros jazentes naquele espaço (todas estas acções foram realizadas com autorização do IPA). Nas linhas que se seguem, apresentaremos uma breve síntese dos resultados das sondagens realizadas no local. A Marinha Baixa é interpretada como lugar periférico associado ao Sítio arqueológico da Torre (Cacia). Em função dos dados disponíveis, é possível traçar uma diacronia de ocupação do sítio definida em duas fases de cronologia tardo-romana, caracterizadas por um tipo de utilização do espaço especializada e de carácter plurifuncional, e uma terceira fase de cronologia indeterminada. Relativamente às duas primeiras fases, datadas do século IV à primeira metade do século VI, correspondem, com toda a probabilidade, a uma ocupação continuada da Marinha Baixa enquanto área industrial localizada na periferia do Sítio da Torre. A primeira fase corresponde ao momento de construção/ utilização de dois recintos delimitados por muros pétreos sobrepostos por construções de terra amassada, circunscrevendo a área de funcionamento de um forno cujos componentes argilosos e materiais cerâmicos associados foram objecto de análises arqueométricas. Os resultados destas análises conduziram à rejeição de uma hipótese interpretativa que associava o forno à produção de cerâmica. Análises elaboradas sobre amostras recolhidas numa outra estrutura de combustão, localizada em espaço contíguo, produziram resultados similares. 9 Os trabalhos de sondagem arqueológica foram efectuados pela ERA Arqueologia SA sob a responsabilidade científica de Alexandre Sarrazola e Mafalda Borges Coelho nas sondagens 1, 2 e 3 - e de Alexandre Sarrazola, Inês Mendes da Silva e Samuel Melro – nas sondagens 4 e 5, tendo os respectivos relatórios finais sido aprovados pelo IPA. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 14 Estrutura F Estrutura G MB 3 MB 1 Local de recolha das amostras AMOSTRA TEMPERATURA ESTRUTURA F Material argiloso não superior a 450º C Fragmento cerâmico MB3 T < 600º C T > 500º C ESTRUTURA G Material argiloso não superior a 450º C Fragmento cerâmico MB1 T > 900ºC T > 1100º C Fragmento cerâmico MB2 T < 600º C T > 500º C Tabela 1 - Análise mineralógica de materiais cerâmicos e argilosos por difracção de raios –X Avaliação de temperaturas de cozedura (Mª Isabel Marques Dias - Grupo “Património Cultural e Ciências” / I.T.N.) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 15 Note-se que as análises mineralógicas por difracção de raios X realizadas sobre uma amostra de argila proveniente de um componente estrutural do forno - registado in situ - e um fragmento de cerâmica interpretado como procedente de uma peça supostamente cozida naquela estrutura de combustão – produziram resultados que não corroboram a correspondência hipoteticamente estabelecida. I. e., a amostra de argila esteve exposta a temperaturas nunca superiores a 450º C, ao passo que a amostra de cerâmica “pressupõe temperaturas de cozedura não superiores a 600ºC (eventualmente superiores a 500ºC)” (DIAS, M.I., 2001). É possível, face ao exposto, afirmar inequivocamente que o mencionado artefacto cerâmico não foi cozida naquele forno. Se tivermos em conta que a amostra de argila foi recolhida sob a superfície da câmara de cozedura, a identificação desta estrutura como forno de produção de cerâmica (caracterizados por atingir, regra geral, temperaturas superiores a 700ºC/900ºC) torna-se, a partir dos dados disponíveis, dificilmente sustentável10. Na segunda fase de ocupação integrámos as evidências estruturais associadas a uma profunda reorganização dos espaços funcionais. Neste impulso de transformação organizacional inserimos a implantação de um pavimento de terra batida, a edificação e reconstrução de estruturas arquitectónicas e de uma plataforma de tipo empedrado, assim como a abertura de um série de estruturas negativas. Aparentemente, estamos perante um sistema de estruturas inter-relacionáveis, associadas a uma linha de água que o delimitaria a ocidente. A Fase III corresponde a um momento de submersão do espaço da Marinha Baixa, caracterização documentada pelo nivelamento (por acção hidráulica) dos derrubes das construções de terra da fase anterior e pela presença de um vasto conjunto de buracos de poste. Do ponto de vista cronológico, não foi possível mais do que a atribuição de uma datação lata post quem a partir do séc. VI d.C. A cultura material concernente às duas primeiras fases de ocupação (cerâmica comum, vidros e terra sigillata Clara D) é susceptível de datações relativas a um intervalo de tempo entre o século IV e a primeira metade do século VI. 10 A este respeito cf. DIAS, Maria Isabel, Análise mineralógica de materiais cerâmicos e argilosos por difracção de raios x. Avaliação de temperaturas de cozedura, ITN, em Anexo a SARRAZOLA, MENDES DA SILVA, MELRO (2001) Relatório dos Trabalhos Arqueológicos. Intervenção Arqueológica de Emergência. Marinha Baixa/ EEIG1 (Cacia). Segunda campanha (Sondagens 4 e 5), ERA, [texto policop.]; e SARRAZOLA, MENDES DA SILVA, BORGES COELHO; MELRO (2001), Intervenções Arqueológicas na Marinha Baixa. Resultados preliminares, Era. Arqueologia,n.º3. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 16 Para além das realidades acima descritas no decorrer do acompanhamento arqueológico foram detectadas mais cinco estruturas de combustão. Um destes contextos foi intervencionado revelando uma associação directa entre um depósito exclusivamente constituído por fragmentos de vidro tardo-romano e os restos de um pequeno forno11. Estes elementos, em articulação com os dados anteriormente recolhidos no âmbito das sucessivas intervenções, permitiram alargar o nosso conhecimento relativamente aos limites espaciais deste centro de produção. Em suma, a Marinha Baixa só pode ser amplamente perspectivada à escala do seu contexto local/ regional. Um tal enfoque implica a incidência de uma especial atenção sobre um lugar central – o Sítio da Torre – num enquadramento global. Parece legítimo aventar - pelo menos como hipótese de trabalho – a probabilidade da sua implantação geográfica na linha de costa, junto à foz do Vouga, curso navegável até Cabeço do Vouga; este último sobranceiro ao traçado da Via Olisipo – Bracara. 11 Cf. Sérgio GOMES, Alexandre SARRAZOLA, Relatório de Progresso 40, Abril de 2002 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 17 3 3.1 ENQUADRAMENTO HISTÓRICO-GEOGRÁFICO ENQUADRAMENTO GEOMORFOLÓGICO Tanto o sítio da Torre como a Marinha Baixa localizam-se no lugar de Sarrazola pertencente à freguesia de Cacia (CMP, f. 174 - Torre: M: -39340.18; P : 113648.82; Z: 6.90; Marinha Baixa:M – 39 093.55; P 113 434.29; Z 3.10), no concelho de Aveiro. Figura 2 – Localização da Torre e da Marinha Baixa A Torre localiza-se no pequeno cabeço localizado a Este do estradão na margem esquerda do Vouga e sobranceiro a um braço da ria, a uma cota de c. 8 m e, actualmente, os terrenos são utilizados para actividades agrícolas e como pastagens de gado bovino, no entanto, entre os anos 20 e 60 do século passado estes terrenos tiveram intensa extracção de pedra e areia para fabricar brita e adobe utilizados na construção civil. A Marinha Baixa, por outro lado, foi terreno de cultivo até há escassos anos, e está situada na margem esquerda da Bacia do Vouga, a jusante da curva fluvial POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 18 interseccionada pela linha ferroviária do Norte e a montante do Rio Novo do Príncipe. É limitada a Ocidente por uma pequena linha de água, bordejada por renques de salgueiros, que desagua a Norte, na Ribeira do Vouga, realidade geográfica que constitui a sua fronteira setentrional. Nesta direcção estende-se a vasta planura descendente da margem esquerda da bacia fluvial, densamente povoada de vegetação lagunar. É esta uma zona de fronteira entre os terrenos permanentemente alagados da larga faixa ribeirinha e a zona seca – contudo alagável – meridional12. A Oriente e a Sul, numa rotação ascendente, observa-se uma paisagem marcadamente antropizada por campos de cultivo e habitações rurais. Em acentuado contraste com a zona marginal do Vouga e o enquadramento rural, a paisagem é profundamente marcada pela presença do complexo industrial da Portucel, a Este, da ETAR Municipal de Cacia, a Oeste, e da Estação Elevatória IG 1 a Sul. O espaço onde se situa a Marinha Baixa integrou o projecto de execução da ETAR Norte, na zona setentrional dos limites do empreendimento. Geologicamente tanto o sítio da Torre como a Marinha Baixa localizam-se em depósitos de praias antigas do Plio-Plistocénico. “Estes depósitos são formados, essencialmente, por leitos de areias e cascalheiras de calhaus rolados, às vezes muito espessos. (...)As areias podem ser finas ou grosseiras. São habitualmente, claras. (...)Sobre estes depósitos repousa, quase sempre, cobertura areno-pelítica fina, amarelada, às vezes espessa. (TEIXEIRA, C., ZBYSZEWSKI, G., C.G.P. f. 16-A; 1976). A zona da Marinha Baixa é debruada a Noroeste pela faixa de “arenitos e argilas de Aveiro - série “fluviomarinha de Choffat” (Cretácico), que constitui o limite geológico entre o espaço de Cacia, Aveiro, Ílhavo e a Ria. Conforme se pode ler na Notícia Explicativa da Carta Geológica de Portugal (IDEM., C.G.P., Aveiro, f. 16-A; 1976: 13), “estas formações, em grande parte cobertas por depósitos modernos, podem observar-se nos vales das numerosas linhas de água que as sulcam ou nos barreiros em que aquelas rochas são exploradas, sobretudo as argilas, para cerâmica”. Os depósitos em questão, geralmente pouco consolidados, são explorados para a construção civil e para o fabrico de adobes. 12 Segundo informação do Sr. António Maria Fernandes da Silva, habitante de Sarrazola, a Marinha Baixa era, há cerca de trinta/ quarenta anos, um campo de cultivo de arroz. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 19 Figura 3 – Carta Geológica de Portugal Por fim, também é de referir que (...)Na região de Cacia, observa-se nível de praia cuja altitude é, em geral, de 7 ou 8 m, mas pode atingir, no entanto, 10 a 11 m. As cascalheiras e areias repousam sobre os terrenos do Cretácio superior.” (Carta Geológica de Portugal, 1976, Notícia explicativa da folha 16-A – Aveiro). Entre os aspectos concernentes à abordagem ao litoral na época romana13 um tema, em particular, é susceptível de contribuir para o esclarecimento das profundas alterações documentadas na Marinha Baixa entre as Fases II e III14. A esse respeito afirma V. Mantas: “ As alterações geomorfológicas que se verificaram na costa lusitana desde o século I fizeram-se sentir de forma mais evidente em determinados sectores do litoral, englobando numerosas situações de colmatagem de reentrâncias, progressão de cabedelos, alteração de lagunas, assoreamento da parte vestibular de rios e ligação à terra firme de ilhotas. 13 A este respeito cf. Amorim Girão (1922), Bacia do Vouga. Estudo Geográfico ; Vasco Mantas (1990), As cidades marítimas da Lusitânia, Les villes de Lusitanie Romaine, pp. 154-156.; Conceição Freitas e César Andrade (1998), Evolução do litoral português nos últimos 5000 anos, Al-madan, IIª s., 7, pp. 64-70. 14 Cf. infra. Conforme exporemos adiante, a Fase III corresponde a um momento de submersão da Marinha Baixa documentada (nas Sondagens 3, 4 e 5) pelo nivelamento dos derrubes de componentes argilosos das estruturas arquitectónicas da fase anterior e pela presença de um considerável conjunto de buracos de poste, indiciando a existência, na terceira fase, de uma (ou várias) estrutura aérea. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 20 “Estas transformações são particularmente importantes na zona da chamada Ria de Aveiro, onde os cordões litorais e os esteios se avolumaram e multiplicaram enquanto a foz do Vouga se deslocou de forma significativa para jusante da embocadura antiga”. O autor adianta que “parece evidente ter-se verificado um processo geral de transgressão marítima sobre o habitat costeiro da época romana (...). 3.2 ENQUADRAMENTO HISTÓRICO 1 Figura 4 – Localização dos sítios arqueológicos mais próximos da Torre/Marinha Baixa Localizados numa área estratégica do ponto de vista geomorfológico, o sítio da Torre e o seu subsidiário, a Marinha Baixa, enquadram-se numa rede de povoamento em funcionamento no período tardo-romano que só agora começa a ser melhor conhecida. Assim, na envolvência destes sítios e tendo em consideração que as lacunas que este espaço parece apresentar se prendem com factores vários, são de destacar os sítios que POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 21 de seguida se apresentam, tendo como ponto de partida aqueles que mais próximo se localizam deste núcleo arqueológico. O sítio dos Lares, localizado a cerca de 80m a Sudeste da Marinha Baixa, numa planura de terras de cultivo ligeiramente elevada, ficou referenciado neste contexto, não só pelas várias alusões dos habitantes ao aparecimento de vestígios arqueológicos naquela zona como, mais objectivamente, pela detecção de uma estrutura sub-rectangular, constituída por 6 lajes de granito interligadas por argilas, por nós interpretada como uma sepultura de tipo caixa (SARRAZOLA, 2000 Rel. Prog. N.º 14: 5-7). Para além das evidências estruturais apresentadas, não foram detectados em associação quaisquer vestígios de cultura material ou restos osteológicos. Implantada num espaço cujo micro-topónimo merece uma atenção especial – Lares- a presença desta estrutura constitui per se um dado arqueológico interessante. As semelhanças formais patentes entre a estrutura dos Lares e as sepulturas de tipo caixa constituem uma evidência digna de menção. A propósito do forno do Eixo (IPA, CNS 7315) escreve, em 1986, Artur Jorge de Almeida:”(...) é desde já possível afirmar tratar-se de um forno cujo período de utilização vai desde os finais da ocupação romana, até período indeterminado da época visigótica. É de realçar a sua localização junto a uma linha de água, que lhe proporcionava não só a água necessária à produção dos materiais, como a possibilidade de um escoamento dos produtos fabricados [materiais de construção e, eventualmente cerâmica – segundo o autor]” (ALMEIDA, 1986: 26)15. Pelas características pouco cuidadas da construção é possível atribuir esta estrutura a uma época tardia da ocupação romana. O povoado fortificado do Cabeço do Vouga, “com ocupação documentada desde a Idade do Bronze ao Romano/ Medieval” (IPA, CNS, 530) tem sido objecto de inúmeras publicações ao longo da história da arqueologia portuguesa no âmbito da problemática da situação conjectural de Talábriga. “No ano de 1941 realizaram-se as primeiras campanhas arqueológicas no sítio sob a direcção de Rocha Madahíl e Sousa Baptísta, sendo os resultados então obtidos os únicos elementos conhecidos para a história do cabeço do Vouga”16 (IPA, CNS, 530). Entre o conteúdo material procedente desta 15 É importante notar que o forno do Eixo está localizado a escassos 6 km a sul da Torre, na margem esquerda do Vouga. 16 A este respeito cf. Rocha Madahíl, (1941). Estação Luso-Romana do Cabeço do Vouga, Arquivo do Distrito de Aveiro, pp. 227-251 e 313-369. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 22 estação destaque-se a presença de moedas do século III e IV. Segundo Jorge Alarcão “ Talábriga situa-se provavelmente em Cabeço do Vouga, onde os restos de um edifício, incompletamente escavado, parecem dever interpretar-se como um forum.” (ALARCÃO, 1990: 27). Das intervenções aqui realizadas até ao presente, nomeadamente, por Fernando Pereira da Silva, tem-se dado particular atenção às acções de restauro e conservação das estruturas existentes e à realização de escavações arqueológicas que permitam caracterizar este povoado que, até ao momento, assume uma posição de extrema relevância no que respeita à rede de povoamento do Baixo Vouga. Considerando que este sítio seria, efectivamente, a Talábriga a que os autores clássicos se referem, constituiria um dos pontos centrais de maior importância, tanto a nível social como a nível económico e, consequentemente, comercial. A sua localização estratégica num ponto de intersecção entre uma via terrestre (via Emimium – Cale) e uma via fluvial, o rio Vouga, ter-lhe-á permitido assumir um lugar de destaque naquela região, servindo, eventualmente, de plataforma comercial entre o litoral e o interior. É possível que este povoado tenha funcionado em simultâneo com a Torre/Marinha Baixa, no entanto, a falta de elementos publicados relativos à análise artefactual dos materiais aqui recolhidos ao longo destes anos, não nos permite aferir de forma objectiva esta situação. No que respeita ao Cristelo da Branca, não há dados que nos permitam atestar uma ocupação deste eventual vicus (IPA, CNS 81) em época tardia, informando João Vaz que “houve uma grande influência romana no local e o povoado ocupa uma extensa área ainda não totalmente definida” (VAZ, 1982: 14). Na intervenção realizada por Inês Vaz, foram detectadas realidades várias, nomeadamente, uma área passível de ser interpretada como uma área de fundição de ferro e uma eventual sepultura de cronologia romana. Face ao espólio exumado no decorrer desta intervenção a ocupação deste espaço datará dos séculos I-II d.C. (VAZ, 1981-82). Mencione-se ainda a presença, em Verdemilho (Aveiro), da Agra do Crasto. Em Romanização do Baixo Vouga, publicado em 1942, Alberto Souto nomeia o Castro de Verdemilho entre outros que, segundo considera, “experimentaram a romanização” (1942:292), mas que no entanto, “não oferecem qualquer documento ou vestígio de habitação e cultura e que apenas se identificam pela persistência do topónimo nos respectivos locais” (1942: 292). De facto, as informações publicadas na década de POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 23 noventa por Manuel Rodrigues e Manuel Barreira (1994: 167-194), e mais recentemente por Brochado de Almeida (2001: 30), assim como o resultado das prospecções realizadas no local pela nossa equipa em 1999, pouco mais acrescentam às considerações de Souto do que a necessidade de fazer incidir sobre aquele espaço uma especial atenção preventiva. Para além destas referências, são ainda de mencionar, considerando, é certo, o carácter lacunar das informações que dispomos, os seguintes sítios: o Castro de Ossela, ocupa uma posição privilegiada sobre uma linha de água, num trecho do Caima em que se dá um estrangulamento do rio. Possui três ordens de amuralhados e um fosso que o circunda pelo Este e pelo Sul. Intervencionado por Rocha Peixoto em 1908, desconhecem-se por completo os resultados assim como o paradeiro do espólio exumado (sabe-se pela laboração de pedreiras no local, do aparecimento de cerâmicas comuns e industriais de épocas pré-romana, romana e medieval, fragmentos de objectos metálicos, vidros e moedas); o Castro de Recarei ou de S. Martinho da Gândara, um povoado fortificado, tradicionalmente considerado como um acampamento romano, aparenta possuir três ordens de muralhas, de que a mais elevada é a que define o espaço de habitat interno. Apresenta uma posição privilegiada no orla da Plataforma Litoral, na bacia média/inferior do Ul (rio que corre a Este), dominando a linha de costa que, actualmente, fica a uma distância em linha recta de cerca de 15Km. Do espólio ali recolhido, são de referir a cerâmica de construção (tegulae), cerâmica micácia, alguma dela decorada, dois cossoiros, vários bordos e fundos de vasos com vestígios de utilização no fogo, arranques de asa e 1 conta de pasta vítrea; Rio Vouga Norte, onde foi detectada uma área de achados avulsos de cronologia romana que poderá evidenciar a existência nas proximidades de um pequeno casal; Quintas, localizada próxima do local anteriormente referido, onde foi detectada durante a abertura de uma vala, uma sepultura de cronologia romana do século II (MAURÍCIO, MURALHA, 1995). Por fim, é de referir o Castro de Ul, que ocupa um esporão na confluência dos rios Ul e Antuã e no qual foram identificadas várias estruturas, a muralha, um muro de delimitação e uma provável estrutura de fundição associada a escória e cinza. A estratigrafia sugeriu para época de destruição do povoado o último quartel do século IV, possivelmente tendo como causa um grande incêndio. No decorrer das várias intervenções que têm vindo a ser realizadas neste local, tem sido recolhido variado espólio, nomeadamente, vidro, cerâmica castreja, imitações de sigillata, bronzes e cerâmica comum. Para além destas referências são dignos de destaque, pela importância que conferem ao sítio, o miliário de POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 24 Tibério Cláudio Nero que assinala a milha XII da estrada Olissipo-Cale-Bracara Augusta e um provável "Terminus Augustalis". 3.3 VIAS DE COMUNICAÇÃO 3.3.1 VIAS TERRESTRES Figura 5 – Localização das vias romanas (efectivas e eventuais) segundo Seabra Lopes (2000) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 25 No que concerne às vias de comunicação, assumem uma importância fundamental a via Olisipo - Bracara Augusta, dada a proximidade do seu traçado a Cabeço do Vouga e, por sua vez, a ligação fluvial entre este povoado e Cacia, através do Vouga. A respeito da via ad Bracara diz-nos Jorge Alarcão: “O percurso entre Aeminium e Cale não está ainda inteiramente esclarecido. A sua definição liga-se ao problema da localização de Talábriga, abordado por vários autores, designadamente Félix Alves Pereira, sem conclusão definitiva. A situação de Talábriga, nas imediações do Rio Vouga (Vacua, na Antiguidade) parece a mais provável. Talvez o Cabeço do Vouga corresponda a essa cidade; de qualquer forma, a passagem do rio far-se-ia neste ponto” (ALARCÃO, 1988: 91). Discute-se ainda, no âmbito deste tema, a possibilidade da existência de uma ligação entre Travassó, localizada a Sul do Cabeço do Vouga, e Cacia, via Eixo-Aveiro. Esta ligação, poderia constituir a conclusão da via Viseu –Marnel (RODRIGUES, 1959: 10), permitindo um acesso relativamente directo ao litoral e, consequentemente, um mais rápido escoamento dos produtos. Por outro lado, não é improvável que durante o período tardo-romano, face à progressiva deterioração do estado de conservação das vias e crescente clima de insegurança (CANIZAR PALACIOS, 2005.225), se tivessem criado percursos alternativos às vias principais, por forma a manter as vias comerciais activas. Seria neste contexto que vias secundárias, como as referidas anteriormente, fariam sentido, dado que, em circunstâncias normais se evitaria a construção de vias em áreas tão recorrentemente sujeitas a alagamentos (como é o caso do espaço regional a que nos referimos). 3.3.2 VIAS FLUVIAIS A respeito da suposta navegabilidade do Vouga, escreve Mário Saa: “é navegável em maior extensão [do que o Cértima e o Águeda] até ao local das Marridas, junto do Pessegueiro, onde o rio é transposto pela estrada actual [em 1960] de Albergaria-a-Velha a Viseu” (SAA, 1960: 129). Vasco Mantas alude a Cacia como “porto de embarque dos minérios provenientes da exploração das minas de cobre e de ferro da zona de Albergaria-a-Velha e Sever do Vouga” (MANTAS, 1990: 158) e confirma a existência de referências seguras no que respeita à navegabilidade do Vouga (1990: 154), corroborando a afirmação – de 1930 – de Alberto Souto relativamente à Torre: “sobre o POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 26 estuário do Vouga, por onde então as marés subiam sem os embaraços que hoje lhe opõem a cerrada duna costeira e o dédalo das ilhotas da ria e das colmatagens dos fundos e por onde barcos de tonelagem considerável entravam sem dificuldade” (SOUTO, 1930: 17). Tendo em conta os dados publicados por Vasco Mantas (1990), Alveirinho Dias et al. (1997), Conceição Freitas et al. (1998) e Maria Assunção Araújo (2000), a probabilidade da localização de Cacia numa posição costeira ou estuarina, durante a época romana e alto medieval, parece adquirir cada vez mais consistência. A título de conclusão atente-se na seguinte passagem de artigo publicado por Jorge Alarcão na Revista Portuguesa de Arqueologia: “Para o lado do mar, havia povoado importante em Cacia (Alarcão, 1988, estação 3/47; Sarrazola et al., 2001; Almeida e Fernandes, 2001, p.31-34; Sarrazola, 2003). Dada a configuração da linha de costa que, na época romana, era muito diferente da actual (Freitas e Andrade, 1998, p. 69; Lopes, 2000a, p. 198), Cacia seria um porto.” (2004, p. 328) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 27 4 4.1 TORRE /MARINHA BAIXA:DIACRONIA DE OCUPAÇÃO/ABANDONO OUTEIRO DA TORRE A intervenção efectuada em 2003 no Outeiro da Torre não permitiu identificar quaisquer contextos arqueológicos preservados. Em cinco das sete sondagens realizadas detectouse, logo após a camada de superfície, o nível de areias resultante do desperdício da actividade de extracção (sabe-se, quer por fontes escritas quer por relatos orais de antigos trabalhadores da saibreira, que entre os anos 20 e 60 do século passado todo o cabeço esteve sujeito à extracção de saibro; no entanto, desconhecia-se até que ponto essa actividade teria afectado os contextos arqueológicos relacionados com o Sítio da Torre). Na sexta sondagem foi detectada apenas a camada humosa a qual foi escavada até cerca de 1 m de profundidade tendo-se encontrado o nível freático e por fim, a sétima sondagem tinha ainda preservado parte do terraço fluvial sob a camada humosa. Subjacente a este terraço surgiu o substrato geológico composto por argilas. Figura 6– Situação de trabalho na Sondagem 1 do Outeiro da Torre. Nos cortes são bem evidentes as perturbações estratigráficas provocadas pela actividade da saibreira que ali laborou POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 28 Em função do exposto, considerando que um dos objectivos do presente projecto consistia na avaliação do grau de preservação das evidências materiais de carácter arqueológico jazentes no sítio da Torre (sabendo que o local foi objecto de uma actividade continuada de extracção de saibro durante a primeira metade do século XX), constata-se que a laboração daquela saibreira resultou num impacte muito evidente na área intervencionada pelos nossos trabalhos (87m2). Consequentemente, e no que concerne ao tema específico do presente capítulo, a pretensão de aferir eventuais relações sincrónicas entre o povoado da Torre e a Marinha Baixa durante o intervalo de tempo que caracteriza cronologicamente a ocupação desta última (séc. IV-VI), assim como a confirmação/ infirmação da ocorrência de fases de ocupação da Torre anteriores e posteriores ao intervalo de tempo atestado na Marinha Baixa, através da obtenção de dados estratigráficos, resulta, no estado actual dos nossos conhecimentos, inexequível. Figura 7 – Implantação cartográfica dos trabalhos de prospecção e sondagens arqueológicas realizados no Outeiro da Torre POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 29 4.2 MARINHA BAIXA Note-se que a análise/ interpretação estratigráfica decorrente das intervenções arqueológicas realizadas na Marinha Baixa em 2000 está exaustivamente descrita nos respectivos relatórios de escavação (SARRAZOLA, A., BORGES COELHO, M., 2000; SARRAZOLA, MENDES DA SILVA, MELRO, 2001) sendo que o que adiante expomos corresponde a uma breve síntese para os casos das fases I e II. No que concerne à fase III, conforme veremos, apresentamos uma nova hipótese de trabalho. Atentemos diacronicamente em cada uma das fases de ocupação/ abandono da Marinha Baixa assim como nas respectivas especificidades: A primeira fase corresponde ao momento de construção/ utilização de dois recintos delimitados por muros pétreos sobrepostos por construções de terra amassada, circunscrevendo a área de funcionamento de um forno cujos componentes argilosos e materiais cerâmicos associados foram objecto de análises arqueométricas. Conforme referido anteriormente, os resultados destas análises conduziram à rejeição de uma hipótese interpretativa que associava o forno à produção de cerâmica17. Análises elaboradas sobre amostras recolhidas numa outra estrutura de combustão, localizada em espaço contíguo, produziram resultados similares (note-se porém, como já foi mencionado, que para além destes dois fornos – objecto de intervenções arqueológicas – temos conhecimento da existência, na Marinha Baixa, de outras cinco estruturas similares). Figura 8 – Plano da Fase 1 17 A este respeito cf. DIAS, Maria Isabel, Análise mineralógica de materiais cerâmicos e argilosos por difracção de raios x. Avaliação de temperaturas de cozedura, ITN, em Anexo a SARRAZOLA, MENDES DA SILVA, MELRO (2001) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 30 Na segunda fase de ocupação integrámos as evidências estruturais associadas a uma profunda reorganização dos espaços funcionais. Neste impulso de transformação organizacional inserimos a implantação de um pavimento de terra batida (que sela os níveis de abandono de um dos fornos da fase anterior), a edificação e reconstrução de estruturas arquitectónicas e de uma plataforma de tipo empedrado, assim como a abertura de um série de estruturas negativas. Aparentemente, estamos perante um sistema de estruturas inter-relacionáveis, associadas a uma linha de água que o delimitaria a ocidente (embora tenhamos conhecimento de complexos estruturais de decantação/ depuração de pastas em contextos de produção cerâmica– susceptíveis do estabelecimento de paralelos com a realidade que descrevemos (SWAN, 1984: 44) – mantemos em aberto as questões relativas ao seu significado funcional, conforme exporemos adiante). A cultura material concernente às duas primeiras fases de ocupação (cerâmica comum, vidros e terra sigillata Clara D) é susceptível de datações relativas a um intervalo de tempo posicionado entre o século IV e a primeira metade do século VI. Figura 9 – Plano da Fase 2 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 31 A Fase III corresponde a um momento de submersão do espaço da Marinha Baixa, caracterização documentada pelo nivelamento (por acção hidráulica) dos derrubes das construções de terra da fase anterior e pela presença de um vasto conjunto de buracos de poste associáveis a eventuais estruturas aéreas. Do ponto de vista cronológico, não foi possível mais do que a atribuição de uma datação lata post quem a partir do séc. VI d.C. Figura 10 – Plano da Fase 3 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 32 Algumas considerações a propósito da Fase III da Marinha Baixa: Terreno de cultivo até há escassos anos, a Marinha Baixa está situada na margem esquerda da Bacia do Vouga, a montante do Rio Novo do Príncipe. É limitada a ocidente por uma pequena linha de água que desagua a Norte, na Ribeira do Vouga, realidade geográfica que constitui a sua fronteira setentrional. Nesta direcção estende-se a margem esquerda da bacia fluvial. É esta uma zona de fronteira entre os terrenos permanentemente alagados da larga faixa ribeirinha e a zona seca – contudo alagável – meridional18. Figura 11 – Localização de Outeiro da Torre (2) e Marinha Baixa (1) a NO da qual se pode observar a linha de água mencionada no texto (CMP 174) Se a transição entre as Fases I e II se caracteriza a partir de evidências marcadamente antrópicas – i.e. um impulso de transformação/ reorganização dos micro-espaços funcionais operado num intervalo de tempo aparentemente curto e contínuo – o mesmo não parece suceder na transição para a terceira fase. Embora, como referimos, seja 18 Recorde-se que, segundo informação do Sr. António Maria Fernandes da Silva, habitante de Sarrazola, a Marinha Baixa era, há cerca de trinta/ quarenta anos, um campo de cultivo de arroz. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 33 possível atribuir uma datação lata post quem a partir da primeira metade do século VI para a Fase III, nada nos autoriza – no estado actual dos nossos conhecimentos – a propor uma eventual continuidade ocupacional do espaço nem, tão pouco, uma ruptura. Não conhecemos a dimensão do intervalo de tempo contido entre o momento de abandono do sítio no culminar da Fase II e o início da construção da realidade estrutural da Fase III, caracterizada pela presença de um vasto conjunto de buracos de poste e pelas evidências materiais que atestam a ocorrência de uma submersão do espaço. A efectiva transformação, no que concerne à estratégia de ocupação/ utilização do local, constitui um dado antrópico. Contudo, desta vez, as suas causas imediatas parecem advir de fenómenos naturais: provavelmente, a transgressão do leito do Vouga. Podemos afirmar que o estado de submersão da Marinha Baixa contribuiu definitivamente para o nivelamento dos derrubes argilosos das estruturas de terra da Fase II. Determinar a dimensão do intervalo de tempo ocorrido entre derrocada destas construções e a implantação das que lhes sucedem constitui, de momento, tarefa inexequível. Entre os aspectos concernentes à abordagem ao litoral na época romana19 um tema, em particular, é susceptível de contribuir para o esclarecimento das profundas alterações documentadas entre as Fases II e III A esse respeito afirma V. Mantas: “ As alterações geomorfológicas que se verificaram na costa lusitana desde o século I fizeram-se sentir de forma mais evidente em determinados sectores do litoral, englobando numerosas situações de colmatagem de reentrâncias, progressão de cabedelos, alteração de lagunas, assoreamento da parte vestibular de rios e ligação à terra firme de ilhotas. “Estas transformações são particularmente importantes na zona da chamada Ria de Aveiro, onde os cordões litorais e os esteios se avolumaram e multiplicaram enquanto a foz do Vouga se deslocou de forma significativa para jusante da embocadura antiga”20. O autor adianta que “parece evidente ter-se verificado um processo geral de transgressão marítima sobre o habitat costeiro da época romana (...). O carácter geral do fenómeno leva-nos a admitir uma subida do nível médio das águas do mar não superior a 1,5m em relação ao nível do Alto Império” atribuindo a este facto “ a Norte do Tejo, a destruição da arriba e o consequente desaparecimento de uma capela provável sucessora de uma villa romana, na Praia de Santa Cruz”. Acrescenta que “ a Sul do Tejo as consequências da modificação do nível do mar são mais evidentes e abundantes. Para a zona do 19 A este respeito cf. Amorim Girão (1922), Bacia do Vouga. Estudo Geográfico ; Vasco Mantas (1990), As cidades marítimas da Lusitânia, Les villes de Lusitanie Romaine, pp. 154-156.; Conceição Freitas e César Andrade (1998), Evolução do litoral português nos últimos 5000 anos, Al-madan, IIª s., 7, pp. 64-70. 20 Sublinhado nosso. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 34 estuário do Sado dispomos de algumas informações do maior interesse obtidas durante as escavações arqueológicas, em Tróia e em Setúbal, das quais parece possível deduzir que a transgressão marítima teve um pico no século V, descendo em seguida até se fixar no nível actual”, mencionando ainda uma série de sítios romanos algarvios que sofreram destruição no séc. V (MANTAS, 1990: 154-156). A admitir a ocorrência de um processo geral de transgressão marítima com um pico no século V, e tendo em conta os baixos valores das cotas topográficas de implantação da Marinha Baixa, tais dados seriam susceptíveis de uma eventual associação à destruição das estruturas arquitectónicas desta estação no culminar da segunda fase de ocupação (a presença de um exemplar de Clara D/ Hayes 97 nos níveis de abandono da Fase II permite estabelecer uma datação lata post quem para o séc. VI da Fase III) assim como a documentada submersão daquele espaço e a construção de uma estrutura aérea na denominada Fase III21 (as evidências do registo arqueológico que nos orientam no sentido de interpretar a Fase III em associação à presença de uma – ou várias – estrutura aérea consistem numa abrangente camada de derrubes argilosos, aparentemente nivelada por acção das águas, cuja superfície apresenta um conjunto de buracos de poste de plana subrectangular – 22 buracos de poste na Sondagem 3, 22 na Sondagem 4; e 9 na Sondagem 5)22. 21 Note-se que não há qualquer dado do registo arqueológico que nos permita - de momento – aferir a duração do intervalo de tempo contido entre o culminar da Fase II e a construção da(s) estrutura(s) da Fase III. 22 São conhecidas evidências estratigráficas deste tipo no sítio arqueológico da Quinta da Assentada (VALERA A., 2000, Relatório de Trabalhos Arqueológicos/ Quinta da Assentada, policop.), em Papa Uvas/ Huelva (MARTÍN DE LA CRUZ, LUCEA MARTÍN, 2003), associadas a contextos calcolíticos, e também no povoado do Fumo/ Almendra, Vila Nova de Foz Côa (CARVALHO, A.F., 2004) estas últimas em contextos da Idade do Bronze. Contudo, estes paralelos afiguram-se-nos, pelo seu enquadramento contextual, meramente formais. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 35 Figura 12 – Buracos de Poste da Fase 3 (Sondagem 4) Um contributo etnográfico: O acervo de recolhas etnográficas reunido por Bartolomeu Conde (1999:195-208) em Cacia e Sarrazola permite-nos encarar como bastante plausível a hipótese dos buracos de poste registados na Marinha Baixa corresponderem às evidências estratigráficas da realização de tapagens, técnica que consistia na implantação transversal a um curso fluvial de um alinhamento de estacas (de margem a margem) reforçadas, do lado montante, com taipais ou lonas e uma contrafortagem de areia. Tal recurso permitia desviar o curso fluvial e alagar os arrozais dos campos contíguos. Este sistema de rega terá sido praticado até meados do século XX e remonta – a avaliar pelos testemunhos recolhidos por Bartolomeu Conde– pelo menos até 1910, desconhecendo-se a sua efectiva antiguidade. Note-se que constituindo estruturas perecíveis, as tapagens eram frequentemente reconstruídas, sendo, porém, possível observar o que resta de uma dessas pequenas barragens na Ribeira de Vouga. Se somarmos as evidências anteriores ao facto dos buracos de poste da fase III apresentarem, no seu conjunto, uma orientação genericamente perpendicular à linha de água que atravessa este lugar e desagua na Ribeira de Vouga, torna-se fácil admitir a hipótese que aqui aventamos. Contudo, se podemos estar perto da compreensão do seu significado nem por isso a explicação nos POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 36 permite propor uma datação mais precisa para aquelas evidências estratigráficas, já que uma técnica desta natureza pode bem remontar a uma antiguidade cuja baliza cronológica se torna impossível de estabelecer. Figura 13 – Vestígios de tapagem na Ribeira do Vouga Figura 14 – Desenho de Bartolomeu Conde in Cacia e o Baixo Vouga, 1999,p. 207 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 37 5 ANÁLISE ARTEFACTUAL 5.1 CERÂMICA COMUM Ana Sofia Gomes O ESTUDO As cerâmicas de uso comum são, sem dúvida, o maior conjunto de materiais recolhidos no sítio arqueológico da Marinha Baixa. Neste sentido procurou-se fazer um estudo destas, realizando um estudo morfológico e funcional de cada peça tendo em consideração todos os elementos caracterizadores deste tipo de cerâmica: tipo de pastas, tipo de cozedura, a presença de elementos não plásticos, estado de conservação, tipos decorativos, entre outros. É muito importante referir que este conjunto cerâmico se encontra em muito mau estado de conservação o que limitou em muito o seu estudo. O número de peças passíveis de reconstituição total é escasso, só foram identificadas duas peças com perfil completo23 para além de um cossoiro que também se encontrava intacto. Além do elevado grau de fragmentação, as peças apresentam-se em estado avançado de deterioração que condicionou o estudo das pastas assim como a análise das decorações e acabamentos de superfície. Foi necessário o recurso à observação da existência de marcas de fogo nas superfícies externas de forma a agilizar e facilitar a caracterização de algumas peças que, de outra forma, seria inviável. Do contexto total foram apenas passíveis de reconstituição 141 fragmentos. Quanto à selecção de peças para uma análise individual, não foi preponderante o critério da proporcionalidade, já que existem tipos que conferem mais informação, nomeadamente os bordos. TIPOLOGIAS E FUNCIONALIDADE As cerâmicas aqui apresentadas destinavam-se, na sua quase totalidade, ao uso doméstico, à excepção de uma malha de jogo. Predominam as cerâmicas de mesa que representam cerca de 46% do total, seguindo-se os recipientes de cozinha e de armazenamento (ver Gráfico 1). Foi estabelecida uma primeira caracterização formal: 23 O contexto estudado ascende a um total de cerca de 400 espécimes. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 38 formas abertas e formas fechadas ao qual foi associada uma funcionalidade como sejam cozinhar/preparar, servir, comer, iluminar, armazenar, transportar, outros usos. Distribuição Funcional 70 66 60 50 36 40 35 30 20 10 4 0 Mesa Armazenagem Cozinha Outras formas Gráfico 1 – Distribuição funcional do conjunto de cerâmica comum No conjunto das FORMAS ABERTAS podemos observar as taças, pratos, panelas, alguidares. Estas formas surgem associadas a tarefas relacionadas com a confecção e consumo de alimentos. No conjunto das FORMAS FECHADAS podemos observar potes, púcaros, jarros, bilhas e talhas, surgindo estas formas associadas a tarefas relacionadas com a confecção de alimentos e armazenamento. Quanto aos tipos cerâmicos presentes, verificamos que as taças são as formas mais abundantes, representando cerca de 40% do conjunto, seguindo-se os potes, alguidares, pratos, como podemos ver no Gráfico 2. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 39 Distribuição Tipológica 40 35 35 32 30 30 25 21 20 15 8 10 4 5 4 2 2 2 1 Co ad or Bi lh as Ja rro s Ta lh a Pa ne la O s ut ra s fo rm as Pr at os Al gu Ta id ça ar s ca re na da s Po te s Ta ça s sim pl es 0 Gráfico 2 - Distribuição tipológica do conjunto de cerâmica comum LOIÇA DE MESA TAÇAS Foi possível observar a presença de dois tipos distintos, com características morfológicas diferentes. As taças simples apresentam um bordo simples, por vezes, espessado interna ou externamente e um corpo hemisférico, podendo o seu diâmetro variar entre os 14 e os 24 cm. A totalidade destes fragmentos apresenta uma pasta fina, de cor laranja resultando de uma cozedura oxidante. Convém referir que em seis exemplares podemos observar uma leve canelura, por vezes quase imperceptível, na parede externa, logo abaixo do bordo. Encontramos estas taças em níveis tardios de Conimbriga (ALARCÃO, 1975, Estampa XXIX, nºs 611 a 618) e em níveis dos séculos IV-V em São Cucufate (PINTO, 2003, p. 221-228). Importa referir que não foi identificado nenhum exemplar completo deste tipo, mas verificámos a presença de um largo número de fundos côncavos, apresentando também uma pasta fina, de cor laranja. Claramente estes fundos correspondem a bases destas taças. De referir que nenhuma destas peças apresenta marcas de exposição ao fogo, são peças que estariam relacionadas com os actos de servir à mesa e consumo de alimentos. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 40 Figura 15 – Taças simples Ainda dentro do grupo das taças foi identificado um grupo muito homogéneo de peças, as denominadas taças carenadas. Estas formas revelam cozeduras oxidantes onde se verifica uma variação de cores entre os laranjas e os beges. Possuem diâmetros que variam entre os 7,4 e os 34 cm. Observamos taças com carenas médias bem marcadas, parede oblíqua, bordo levemente espessado e fundo plano, que representam a maioria do conjunto. Nestas taças, e apesar do seu elevado estado de degradação, foi ainda possível observar, nalguns casos, vestígios de uma aguada da cor da pasta. Foi identificado um fragmento de taça com carena baixa, de pasta castanha de cozedura redutora, sendo a excepção do conjunto apresentado. As taças de carena alta, estando presentes, são também em valores quase residuais. Encontramos taças carenadas similares em todos os níveis de ocupação em São Cucufate (PINTO, 2003, p. 256) mas atingindo um auge de incidência nos níveis do séc. V. Estas taças apresentam uma base plana, por vezes com um pequeno ressalto, tendo sido identificadas duas peças com perfil completo. Como se verifica nas taças simples também nestas taças carenadas não foram encontradas marcas de fogo o que nos leva a caracteriza-las como cerâmica de mesa. Figura 16 – Taças carenadas POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 41 PRATOS Esta forma surge representada no contexto com valores quase residuais. Possui uma parede oblíqua ou quase recta e um bordo extrovertido formando uma aba. A pasta é muito fina, de cor laranja revelando uma cozedura oxidante, com frequente inclusão de e.n.p., sobretudo quartzos. Estas formas fazem lembrar alguns pratos de terra sigillata clara A. Encontramos estes pratos em São Cucufate (PINTO, 2003, 206). Dentro das formas abertas pretendemos incluir um fragmento de um coador. Trata-se de um fundo muito deteriorado e fragmentado onde se podem observar dois orifícios executados na peça, já depois de cozida. É uma peça de cor laranja, resultante de uma cozedura oxidante mas não foi possível fazer qualquer reconstituição gráfica devido ao seu estado de conservação. JARROS Deste conjunto foram identificados como jarros apenas dois fragmentos de gargalo. Um ligeiramente esvasado com o bordo espessado no exterior, colo alto, ligeiramente côncavo. Apresenta uma pasta bege, muito fina e cozedura oxidante. Possui um diâmetro pequeno, cerca de 4 cm. O outro fragmento apresenta um bordo esvasado com ressalto, colo alto e ligeiramente côncavo. Possui pasta laranja, muito fina resultante de uma cozedura oxidante. Estes fragmentos são muito pequenos, poucos caracterizadores da forma. Desconhece-se a presença de quaisquer asas. Estas formas são bastante persistentes ao longo dos séculos, são peças muito similares às identificadas nas necrópoles alto-alentejanas (NOLEN, 1985, p. 35-65) com cronologias desde o século II até ao século IV. Figura 17- Jarro LOIÇA DE COZINHA PANELAS Neste formato insere-se um conjunto de recipientes destinados à confecção de alimentos ao lume, daí as vulgares marcas de fogo na superfície externa, mas que também podiam POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 42 servir como pequenos contentores de alimentos (frutos secos, conservas, etc.). Apresentam diâmetros do bordo semelhante aos do bojo, sendo assim consideradas formas abertas. Observamos dois tipos: o primeiro correspondendo a panelas de bordo direito ligeiramente esvasado e paredes rectas; a pasta é muito compacta e a cozedura redutora. O segundo tipo apresenta um bordo mais marcado, extrovertido em aba, colo estrangulado bem definido. Um dos exemplares apresenta vestígios de decoração pintada, apesar dos motivos serem imperceptíveis. Esta forma apresenta uma pasta fina, compacta, laranja, resultante de uma cozedura oxidante. Figura 18 - Panelas ALGUIDARES Os alguidares teriam como função a utilização na cozinha, na preparação de alimentos, mas também em tarefas ligadas à higiene e limpeza. Os espécimes identificados apresentam uma grande homogeneidade formal. São peças compostas por paredes troncocónicas, bordo extrovertido de forma amendoada, de pasta laranja, muito compacta. A superfície interna é, na maioria dos casos, brunida, alisada. PÚCAROS Tratam-se de pequenos recipientes destinados a preparar ou aquecer líquidos, podendo também ser utilizados para beber. Este exemplar possui base plana, colo côncavo e bordo esvertido. A pasta é compacta de cor castanha clara, resultando de uma cozedura oxidante. Encontramos formas idênticas em níveis do século IV-V de Conimbriga (ALARCÃO, 1975, Estampa LVI, nº 983). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 43 Figura 19 - Púcaro LOIÇA DE ARMAZENAMENTO POTES Esta categoria surge muito bem representada. Estas formas eram utilizadas na cozinha para guardar alimentos e por vezes também cozinhar. São formas altas, com colos reentrantes, bojos ovóides e, na sua larga maioria, não possuem asas. Os potes aqui identificados dividem-se em três categorias distintas, distinção feita a partir do formato do bordo, pois na maioria dos casos só existe mesmo o bordo. A primeira classe é composta por potes de bordo quase recto, ligeiramente extrovertido, na continuidade da pança. Não existem vestígios de asas. Estas peças apresentam tanto cozeduras redutoras como oxidantes, possuem pastas algo grosseiras com muitos e.n.p. A segunda classe, a mais representativa, é composta por potes de bordo extrovertido em aba com secção circular ou biselados. Possuem colo curto muito estrangulado e pança ovóide ou esférica. As pastas apresentam cores desde os beges até aos castanhos representando cozeduras tanto oxidantes como redutoras. A terceira classe é representada por peças com bordos planos e colos cilíndricos. As pastas são cinzentas e um pouco grosseiras apresentando uma cozedura redutora. Como acontece com outras formas já referidas, estes potes apresentam uma larga diacronia de utilização, podendo ser encontradas nas necrópoles alto alentejanas dos séculos II-III (NOLEN, 1985, p. 113-128) como nos níveis dos séculos IV e V de Conimbriga (ALARCÃO, 1975, Estampa III, Fig. 35, 37, 42 e 43). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 44 Figura 20 - Potes BILHAS Estas peças apresentam dimensões médias, possuem fundos planos, corpos ovóides, colos altos e estreitos. Os dois exemplares estudados apresentam duas asas em fita que partem do ombro da peça e nenhuma das peças apresenta bordo conservado. A pasta é laranja, correspondendo a uma cozedura oxidante, ambas as peças estão em muito mau estado de conservação. Encontramos estas peças nos níveis do séc. V de Conimbriga (ALARCÃO, 1975, Estampa XLV, nº 852). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 45 Figura 21 - Bilhas TALHAS Foram apenas identificados dois fragmentos de bordo de talha/ dolium. Nos dois casos o bordo é horizontal e arredondado, sendo mais espesso que o resto da parede da pança. A pasta é castanha escura resultando de uma cozedura redutora, os e.n.p. são frequentes prevalecendo as micas e os quartzos. Sendo os fragmentos muito reduzidos não foi possível identificar a presença de asas. Estes materiais teriam uma função armazenadora e uma larga amplitude cronológica. OUTRAS FUNÇÕES Para além destas formas acima identificadas foram também estudados outros materiais que não se inserem, claramente, nesta distinção formas abertas/ formas fechadas. É o caso dos elementos de suspensão internos, que apenas dispomos das referidas asas sem qualquer bordo conservado que nos permita identificar o diâmetro e consequentemente a sua representação gráfica. Estes elementos pertencem, sem dúvidas, a recipientes de grande dimensões, onde foram aplicadas estas grandes asas em fita, no bordo, na parede interna da peça. Os dois exemplares identificados revelam uma cozedura oxidante com aguada e evidentes marcas de fogo na superfície externa. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 46 Figura 22 – Recipiente com elementos de suspensão internos O número de fundos encontrados neste conjunto assume valores muito expressivos, cerca de 36 %, mas como foi referido anteriormente, encontram-se muito fragmentados e muito deteriorados. Neste sentido é muito difícil caracterizá-los funcionalmente. A grande maioria das bases identificadas é plana, de cozedura redutora, pertencentes a panelas, potes, bilhas ou taças. Pode-se observar, na grande maioria dos casos, marcas de torno bem vincadas nas superfícies internas. Como já foi referido, identificou-se um número bem expressivo de fundos côncavos, de cozedura oxidante, numa pasta de cor laranja muito fina, sem quaisquer marcas de fogo. Estes fundos correspondem claramente a fundos de taças para as quais identificámos vários bordos, não se conservado, no entanto, nenhum perfil completo. Identificaram-se também dois fragmentos de fundos planos que apresentam um leve ressalto, de pasta bege muito grosseira, idênticos às duas taças de perfil completo acima referidas. Refira-se ainda a presença isolada de um fundo de ânfora, que, sendo o único fragmento recolhido no local, é difícil tecer considerações e ir para além da sua descrição formal. Figura 23 – Fundo de ânfora POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 47 Foi também identificada uma malha de jogo que resultou do aproveitamento de um fundo cerâmico de taça, pois este é em tudo semelhante às bases de taças carenadas. As semelhanças verificam-se também na cor da pasta, bege, e no tipo de cozedura, oxidante. Possui uma forma circular. Do conjunto faz também parte um cossoiro de forma cónica em cerâmica comum de cor cinzento-escuro, resultando de uma cozedura redutora. Possui uma largura máxima de 4 cm. Figura 24 - Cossoiro DECORAÇÃO São muito escassos os fragmentos que apresentam motivos decorativos, cerca de seis. Predominam as caneluras presentes no colo, separando o bordo da restante peça. Foi identificado um pequeno fragmento de pança pintada a vermelho e um outro fragmento de panela com decoração incisa, na pança, paralela ao bordo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Na Marinha Baixa foi identificado um amplo conjunto de cerâmicas comuns onde predominam formas com larga diacronia de utilização. Este é pois um dos problemas que se levantam aquando do estudo de um conjunto cerâmico desta natureza. A larga persistência de formas ao longo de todo o período de ocupação romana dificulta o estabelecimento de datações cronológicas, se compararmos com as cerâmicas finas. A grande maioria dos materiais aqui presentes podem ser encontrados em níveis altoimperiais, assumindo uma maior difusão e utilização durante os séculos IV-V, já no BaixoImério. A análise das pastas, que na maioria dos casos se apresentam muito porosas, evidencia uma produção local/ regional. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 48 Figura 25 – Quadro tipológico da cerâmica comum POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 49 5.2 VIDROS JOSÉ CARLOS QUARESMA O espólio da Marinha Baixa/Torre revelou pouca informação sobre terra sigillata, mas, pelo contrário, uma riqueza significante em vidros, cujas cronologia, tipologia e tecnologia homogéneas lhe conferem um significado especial no âmbito destas produções em época tardo-romana. A sua importância já havia sido notada por Jorge e Adília Alarcão (1963a), que apresentaram um primeiro estudo com os 19 exemplares das escavações de Alberto Souto. No presente trabalho foram estudados 70 exemplares classificáveis vítreos apresentando-se desenho e catálogo de todos eles. Entre estes 70 exemplares, cerca de 60% (43) provêm do espaço contíguo à estrutura de combustão identificada na Área 2, de um depósito a que atribuímos a designação estratigráfica de [6006] e os restantes 27 distribuem-se por quase tantas outras UEs. Tal dispersão espacial orienta-nos no sentido de interpretar aquela área como um espaço de produção secundária/reciclagem de vidro, conforme explanaremos adiante. As cores atribuídas aos vidros seguiram a escala cromática de Beat Rütti (1991). Todas as estampas encontram-se à escala de ½, com desenho de Carlos Lemos e digitalização em Adobe Illustrater do signatário. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 50 Figura 26 – Vidros recolhidos por Alberto Souto na Torre (Alarcão; Alarcão, 1963a, est. III) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 51 1. Formas vítreas Vasos troncocónicos O pequeno grupo presente na Marinha Baixa/Torre não deixa de levantar alguns problemas, pela relativa variedade de perfis. Grosso modo, esta forma impõe-se no século III e torna-se dominante na centúria seguinte, em detrimento do vaso de perfil mais cilíndrico. Ausente na parte oriental do Império, foi bem conhecido na sua parte ocidental, em particular na Gália (Sanchez de Prado, 1984, p.88) e na Germânia, embora estes vasos sejam mais altos, estreitos e ovóides (Rütti, 1991, p. 72-6; Berger, 1960, nºs 1045), em comparação com os perfis mais cónicos e acampanados da área mediterrânea e lusitana (Xusto Rodríguez, 2001, p.349). Sucedem assim às formas mais cilíndricas, assimiláveis aos tipos Isings 12 e 85, dos primeiros séculos do Império, assumindo, em época tardo-romana, formas mais altas (vasos) ou mais baixas (taça) e apresentam sempre altura superior ao diâmetro. Segundo Xusto Rodríguez (2001, p.350), podiam assumir três formas principais, no Noroeste peninsular: - altas com bordo incurvado, esvasado e de aresta viva; - de paredes rectas ou quase, e bordo acabado ao fogo; - de perfil sinuoso e bordo notavelmente esvasado e acabado ao fogo. Esta situação explica as diferenças encontradas na Marinha Baixa/Torre, onde os nºs 1-3 possuem paredes rectas e diâmetros menores, próximos do tipo Isings 106 (Isings, 1957, p. 126); mas os nºs 4-6, com diâmetros maiores, parecem ter paredes mais encurvadas e bordos claramente esvasados, que os aproximam um pouco das taças Isings 116 (Isings, 1957, p.126-43), embora pelo diâmetro e menor esvasamento, tenhamos preferido a sua classificação como vaso troncocónico. Todos os exemplares da Marinha Baixa/Torre, de diâmetros entre 10,5 e 15 cm, são enquadráveis na variante maior, com diâmetros acima de 10,5cm, definida por Xusto Rodríguez (2001, p.355). A forma enquadrável na Isings 106 era já conhecida neste sítio (Alarcão; Alarcão, 1963a, nºs 14-17; ver fig. 26) e encontra-se muito bem representada na área orense do Noroeste peninsular, bem como na necrópole de La Olmeda, na Meseta. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 52 Os nºs 4-6 possuem um atributo que os destaca dos congéneres conhecidos na bibliografia consultada e do primeiro grupo de Xusto Rodríguez, acima descrito: os bordos são engrossados e polidos ao fogo (o nº 4 nem chega a ser engrossado, mas ondulante e polido ao fogo) ao contrário do que sucede noutros sítios, onde os bordos possuem arestas vivas: Santarém (Antunes, 2000, nº21), Conimbriga (Alarcão; Alarcão, 1965, nºs 201 e 203), Tramagal, Monte de Santa Maria (Vila da Feira) e Vila Nova da Talha (Alarcão, 1971, nºs 33, 24 e 36). Os nºs 1-3 encontram bons paralelos em Conimbriga, considerados de século IV ou V (Alarcão et Al., 1976, nºs 226 e 227; Alarcão; Alarcão, 1965, nºs 237-40); nos ambientes funerários da Herdade da Comenda da Igreja (fins de século III/século IV) e do Beiral (Alarcão et Al., 1976, p.196); em Santarém (Antunes, 2000, nºs 15, 16 e 22); no Museu Martins Sarmento (Alarcão; Alarcão, 1963b, nº 34) e no Museu do Instituto de Antropologia da Faculdade de Ciências do Porto (Alarcão, 1971, nº 35). É possível que este grupo mais próximo do tipo Isings 106 pudesse ter uma função cumulativa de iluminação (Isings, 1957, p. 126). Taças em calote Este é o maior grupo tipológico presente na Marinha Baixa/Torre, com 54 exemplares. A publicação anterior sobre este sítio havia já dado à estampa outros 13 exemplares (Alarcão; Alarcão, 1963a, nºs 1-13; ver fig. 26). É um grupo constituído por taças mais ou menos em forma de calote, com paredes mais ou menos rectas e fundo geralmente onfalado, que, na Marinha Baixa/Torre, possui sempre bordo engrossado e polido ao fogo. A medição dos diâmetros de bordo e a análise do esvasamento, permitiram estabelecer três sub-grupos: - de perfil mais troncocónico, com diâmetros entre 12 e 16,4cm (19 exemplares; nºs 7-25); - de perfil intermédio, com diâmetros entre 13,9 e 17,2 cm (16 exemplares; nºs 26-41); - de perfil acentuadamente esvasado, com diâmetros entre 17 e 19,9 cm (7 exemplares; nºs 42-48). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 53 Em 1965, no estudo sobre os materiais das antigas escavações de Conimbriga, Jorge e Adília Alarcão estabeleceram dois sub-grupos para estas taças: - taças decoradas com linhas horizontais gravadas, variante A: copa de paredes rectas, que não seriam afins à Isings 116 (século IV e inícios do V), mas estariam antes relacionadas com as taças e decoradas com fios de vidro branco, ou linhas gravadas, datadas da segunda metade do século V e primeira do VI (Alarcão; Alarcão, 1965, nºs 171-5); - taças de copa arqueada, lisas (Alarcão; Alarcão, 1965, nºs 205-11). Em 1976, acerca dos materiais das escavações conduzidas no mesmo sítio de Conimbriga, Jorge Alarcão et Al. desenvolvem a descrição tipológica, em face do enorme número de exemplares surgidos nessas campanhas (272 exemplares), definindo-as como taças baixas e muito esvasadas, com bordo espessado ao fogo e, mais raramente, com bordo de arestas levemente polidas ao fogo. Os diâmetros variam entre 12 e 21 cm, sendo os valores mais frequentes entre 14 e 16 cm. As diferenças constatadas na inclinação e andamento da parede levam os autores a definir quatro sub-grupos: - taças de perfil troncocónico, bordo esvasado e parede ligeiramente côncava; fundo onfalado sempre mais espesso a meio. Paredes geralmente lisas, mas podendo ter fios de vidro branco ou linhas gravadas ao torno. Datam-se dos séculos IV/V; - - perfil semelhante, mas parede mais recta, embora possa ser ondulada; na Marinha Baixa /Torre surgem 3 exemplares (nºs 41, 56 e 57) e em S. Cucufate conhece-se um outro exemplar algo semelhante (Nolen, 1988, nº 120); - taças gravadas de tipo Wint Hill (o exemplar de Conimbriga é liso e de bordo em aresta, esvasado, de perfil em S, próximo do perfil da Isings 116); - taças menos profundas. Segundo os autores, não parece haver qualquer relação tipológica ou cronológica entre tipos e decorações (Alarcão, et Al., 1976, p.193-4). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 54 Em 1984, no estudo sobre os materiais de Lucentum, Sanchez de Prado (1984, p.93), assimila esta forma de taças pouco profundas à Isings 11624, datando-a dos séculos IV-V. Tal como no estudo sobre Conimbriga, enuncia vasos lisos e decorados com linhas gravadas ou fios branco fundidos, negando qualquer diferenciação cronológica. Apresenta 4 sub-grupos: - lisos (refere muitos exemplares incolores ou verde-oliva, e patines negras); - decorados com linhas incisas (refere igualmente muitos exemplares); - decorados com fios brancos fundidos; - com decoração soprada (Sanchez de Prado,1984, fig.9, 8-9). Os nossos nºs 53 e 54 apresentam decoração idêntica; um outro exemplar é conhecido em Conimbriga (Alarcão; Alarcão, 1965, nº 170, em vidro transparente cinzento Caran d’Ache). Mais uma vez, o estudo recente de Xusto Rodriguez (2001, p. 361) sobre o vidro no Noroeste peninsular vem trazer novas descrições. O autor aventa o conceito de “taça em calote”, mas acha preferível a denominação de taça/prato e considera esta forma afim à Isings 116, e idêntica a vasos de baixelas em bronze tardo-romanas. Define dois sub-grupos relacionáveis com o espólio de Marinha Baixa/Torre, tendo a maior parte dos diâmetros valores ligeiramente superiores a 15 cm.: • bordo em aresta viva e perfil em S, esvasado; • perfil de calote esférica e bordo engrossado ao fogo, podendo assumir uma forma pequena (taça) ou grande (prato), com diâmetros acima de 15 cm. (Xusto Rodriguez, 2001, p. 361). É consensual que o bordo espessado tem uma cronologia algo posterior ao bordo em aresta: segundo Isings (1957) e Nolen (1994, p.178), o bordo em aresta é comum no século IV; enquanto que o espessamento ao fogo começará na segunda metade dessa centúria (Nolen, 1994, p. 178), sendo característico na segunda metade do século IV e século V, em níveis estratigráficos de São Cucufate ou Conimbriga (apud Xusto Rodriguez, 2001, p. 361). Surgem essencialmente em contextos dos séculos IV e V, embora haja dados mais recentes, como é o caso da necrópole de Aldaieta (Alaves), datada de meados/finais do 24 O facto do texto referir Isings 11 não deve passar de um lapso. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 55 século VI a inícios do VIII. Os níveis atribuídos exclusivamente aos séculos IV e V, situam-se no depósito de Santomé, a Norte; ou, a Sul, em Alconetar, onde vários exemplares surgem em conjunto com terra sigillata hispânica tardia dos séculos IV-V (Xusto Rodriguez, 2001, p. 361). Exemplares desta forma são conhecidos, no território actualmente português, em Balsa (Nolen, 1994, nºs 89, 91 e 92), São Cucufate (Nolen, 1988, nºs 118, 119, 120, 121 e 124), Santarém (Antunes, 2000, nºs 17-19), no Tramagal, Abrantes (Alarcão, 1971, nº 29), no Museu Machado de Castro (Alarcão, 1971, nºs 30-31). No espólio de Marinha Baixa/Torre, vários exemplares de fundo deverão pertencer a esta forma, tendo já sido feita referência aos nºs 53 e 54, pela sua decoração soprada. Os nºs 49-52, também onfalados, e de parede mais espessa a meio, pertencerão a diversas variantes, de maior ou menor diâmetro. Esta forma não tinha necessariamente fundo onfalado, podendo assumir superfície convexa, como acontece com o exemplar inteiro de Lucentum (ver figura 27); ou bases praticamente planas, como propõe Xusto Rodríguez (ver figura 28). Contudo, o fundo onfalado parece associar-se mais à taça de parede mais ou menos recta e bordo espessado, enquanto que a taça de bordo em S, de aresta viva, parece ter um fundo convexo: na villa de Toralla (Coruxo, Pontevedra) surge um exemplar inteiro desta forma, análogo ao de Lucentum (Vasquez Marínez; Caamaño Gesto, 2004, nº 19). O bojo nº 55 possui decoração soprada, formando facetas fitomórficas, para as quais não encontrámos paralelos na bibliografia consultada. Figura 27 - Taça de perfil em S de Lucentum (Sanchez de Prado, 1984, fig. 8-24) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 56 Figura 28 - Taças de Santomé (a, b, c), A Trinidad (d, e). Taças de perfil em S (a, b) e taças de calote (c, d, e) (Xusto Rodríguez, 2001, fig. 66) Frascos tipo AR 146.3 (Isings 133) e Isings 104b Não é fácil classificar os nºs 61-64, pela exiguidade dos fragmentos. O primeiro é claramente o bordo de um frasco e os restantes dois, gargalos. A classificação proposta baseia-se nos materiais apresentados por Rütti (1991, p. 123), considerados frascos de fundo muito onfalado, equiparáveis às formas Trier 79b e Isings 133. É igualmente possível que o nº 64 seja o corpo bojudo de um exemplar da mesma forma, embora a secção ondulante da parede do exemplar da marinha Baixa/Torre seja um aspecto singular. Os dados de Augst e Kaiseraugst apontam para uma cronologia de finais do século III/inícios do IV, que é minimamente compatível com o espólio da Marinha Baixa/Torre. Os nºs 62 e 63 apresentam decoração por fios horizontais de vidro branco aplicados (mas sem se fundirem com a parede), formando finas molduras na superfície externa, que também não encontram paralelos exactos na bibliografia consultada, mormente os exemplares germânicos apresentarem decoração com linhas espiraladas no gargalo POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 57 (Rütti, 1991, nºs 2444-47). Este mesmo tipo de decoração também surge em jarros tipo Isings 121 da necrópole de Montañar (Jávea), no século IV (Sanchez de Prado, 1984, p. 98). Os nºs 65-67 deverão classificar-se na forma Isings 104b, também ela um frasco, que surge no século III, e apresenta cronologias centradas nos séculos IV e V. O fundo destas peças é onfalado e o corpo geralmente globular, embora alguns exemplares mais tardios possam ter perfil acampanado ou corpo quase quadrangular. O nº 67 é um fragmento de bojo com a esquina que denuncia esta morfologia tardia da Ising 104b (Isings, 1957, p.122-23). Os exemplares mais comuns são feitos em vidro verde e existem vasos com superfícies decoradas por pintura ou incisão ao torno: os três exemplares da Marinha Baixa/Torre possuem uma canelura soprada que não cerca a totalidade do frasco, a ver pelo nº 65. É possível que o nº 68, com fio de vidro aplicado sobre a superfície, também pertença a este tipo. Outros exemplares podem ter fio de vidro aplicado à volta do gargalo (Isings, 1957, p.122-23), o que tornaria também plausível a classificação dos nºs 62 e 63 neste tipo (Isings, 1957, p.122-23). Copo com pé alto O nº 69 é um fragmento de fundo classificável na Isings 111, produzida nos séculos IV a VII (Isings, 1957, p.139-40). Surge um exemplar em Santarém (Antunes, 2000, nº 25) e vários em Lucentum. Embora o exemplar de Santarém e os apresentados por Isings possuam pé-de-anel oco, em Lucentum são todos de pé-de-anel compacto. Sanchez de Prado (1984, p. 93) confirma as cronologias propostas por Isings, mas refere a existência de centros produtores em Alexandria e Colónia, o que torna este tipo não exclusivo da área mediterrânea, como defendera Isings (1957, p.139). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 58 Figura 29 – 1 a 6 – vasos troncocónicos; 7 a 20 – taças em calote POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 59 Figura 30 – 21 a 44 - Taças em calote POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 60 Figura 31 – 45 a 48 – taças em calote; 49 a 52 – fundos onfalados; 53 e 54 – fundos com decoração soprada; 55 a 60 – fragmentos decorados POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 61 Figura 32 – 61 – bordo de frasco; 62 e 63 – gargalos; 64 a 68 – frascos; 69 – base de copo de pé alto; 70 – fragmento de asa POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 62 5.3 TERRA SIGILLATA JOSÉ CARLOS QUARESMA O espólio da Marinha Baixa/Torre revelou pouca informação sobre terra sigillata (3 fragmentos). As cores atribuídas à terra sigillata seguiram a tabela de cores de solos A. Cailleux. Terra Sigillata africana O nº 1 é um fragmento de bordo de Hayes 91A, fabricada em C3, revelando um fabrico muito próximo da produção de C3 de relevos aplicados, oriunda da Bizacena, e não tanto da produção D, da região de Cartago. A forma Hayes 91A foi produzida entre meados ou finais do IV (Atlante, p. 82) e pode atingir a primeira metade do século VI (Bonifay, 1983, p. 307); contudo, sendo este fragmento produzido em C3, a sua cronologia de fabrico não ultrapassa os meados do século V (Atlante, p. 59). O nº 2 é uma peça quase completa de Hayes 97, produzida em D2-1ª fase, da área de Cartago, produzida entre finais entre finais do século V e meados do VI; como a produção em D2 se situa entre finais do IV e inícios do VI (Atlante, p. 78 e 97), este fragmento deve ter sido produzido em finais do século V ou inícios do VI. Figura 33 – Pormenor da Hayes 97 in situ (peça nº72) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 63 Terra Sigillata foceense tardia O nº 3, fragmento de bordo com decoração roletada, aproxima-se da variante E da forma Hayes 3, com um fundo mais saliente, e datará de finais do século V (Atlante, p. 232). Figura 34 – 1 - Sigillata Hayes 97; 2 – Sigillata Hayes 91 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 64 Vidros e Sigillatas: uma visão de conjunto A primeira grande referência do conjunto vítreo da Marinha Baixa/Torre é a sua homogeneidade, tanto a nível de fabrico como tipológico e cronológico. Ao nível cromático, temos a seguinte situação: Cor (Rütti, 1991) Quantitativo (exemplares classificáveis) Incolor, muito levemente esverdeado, 1 transparente Pantone 310 (blaugrün), transparente 1 Pantone 563 (blaugrün), transparente 1 Pantone 356 (grasgrün), transparente 2 Pantone 378 (saftgrün), transparente 1 Pantone 390 (hellgrün), transparente 1 Pantone 153 (braun), transparente 5 Pantone 577 (saftgrün), transparente 22 Pantone 125 (gelboliv), transparente 8 Pantone 582 (olivgrün), transparente 30 Tabela 2 - Cores presentes nos vidros da Marinha Baixa /Torre A monotonia cromática, reforçada pela forte presença dos tons verdes e em particular de verde oliva são um excelente indicador do carácter baixo-imperial do espólio, quando estas cores se tornam dominantes. (Rütti, 1991, p.111 e 116). As formas descritas enquadram-se perfeitamente no ambiente tardio, a partir da segunda metade do século IV - já que não existem bordos em aresta viva, recorrendo-se sempre ao engrossamento e / ou polimento ao fogo -, estendendo-se pelo século V. O século VI continua interrogado, pela ausência de dados relevantes nesse sentido, embora o exemplar de terra sigillata africana (Hayes 97) possa atingir uma cronologia de fabrico de inícios do século VI. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 65 Forma Quantitativo (exemplares classificáveis) Copo troncocónico 6 Taça em calote (=Isings 116?) 60 Frasco AR 146.3 (=Isings 133) 4 Frasco Isings 104b 4 Copo de pé alto (=Isings 111) 1 Indeterminável 1 Tabela 3- Formas vítreas presentes na Marinha Baixa/Torre A taça em forma de calote, com paredes mais ou menos rectas e mais ou menos esvasadas, domina esmagadoramente o quadro tipológico do conjunto e deixa antever a importância desta forma na vivência das gentes dos finais do Império. Não deixa de ser curioso ver a adopção desta morfologia vítrea, numa época em que algo semelhante se passa como outros artefactos como a terra sigillata africana, que, no Baixo-Império, por razões de facilidade de comercialização, mas também por possíveis novos hábitos comensais, relacionados com o avanço do cristianismo, adquire uma forte tendência para a apresentação de pratos ou formas muito abertas (Hawthorne, 1997). Este fenómeno não é tão forte no comércio de vidros, apresentando um registo menos acentuado e talvez mais diverso. Na villa de Toralla (Pontevedra), com um espólio vítreo de mais de 100 peças, a variedade é maior e apenas um exemplar corresponde à taça em calote de bordo espessado, enquanto que outros exemplares são de bordo em S e bordo de aresta viva; mas o mais importante deste conjunto é o de fazer um certo contraponto à Marinha Baixa/Torre, na mesma área geográfica, apresentando uma importância bem maior de vasos troncocónicos em face das taças em calote. Este conjunto foi datado dos séculos IV/V e os autores o estudo levantam a hipótese de a villa de Toralla ter sido um centro produtor local (Vasquez Marínez; Caamaño Gesto, 2004, p.89). Centro produtor ou consumidor, denota a variabilidade dos espólios e um mosaico de gostos subjacente. Outro atributo recorrente nas peças desta época, em particular nos vasos troncocónicos e taças em calote, são os fios de vidro da mesma cor da peça, ou fios de cor branca, POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 66 fundidos ou semi-fundidos com a parede que decoram. Na Marinha Baixa Baixa/Torre, praticamente metade do espólio de copos e taças apresenta esta decoração originária da Síria, em finais do século II e generalizada na parte ocidental do Império de finais do século IV, prolongando-se até ao século VI (Sanchez de Prado, 1984, p.93). O Ocidente formula um gosto próprio para os vasos em vidro, a partir do século III, marcando-se pela produção de copos de pé alto, vasos troncocónicos, taças em calote (Sanchez de Prado, 1984, p.93), enfim, formas presentes na Marinha Baixa/Torre. Possível centro produtor de vidros tardo-romano, este sítio do Noroeste peninsular possui um excelente paralelo na área oposta peninsular, o Sudeste: em Lucentum (Alicante) terá existido um outro centro produtor de vidros, a ver pela quantidade de material sem estratigrafia aí conhecido e pelos resíduos indicadores de actividade oficinal. O espólio tardo-romano deste sítio é também marcado pela forte presença de taça em calote, lisa ou decorada, bem como por semelhantes técnicas decorativas. Tendo o seu início ainda no Alto-Império, apresenta, contudo, algumas diferenças na qualidade dos produtos baixo-imperiais: enquanto que na Marinha Baixa/Torre, os vidros indicam uma excelente qualidade de fabrico, com pouca bolhas de ar, sem patines e até com escassa irisão; os materiais de Lucentum decrescem de qualidade a partir do século III, surgindo muitos exemplares com estrias e bolhas de ar no interior e superfícies muitas vezes com patina negra. Contudo, também aqui, o conjunto denota uma grande homogeneidade de qualidade, tipologia e cronologia. Marinha Baixa/Torre e Lucentum são dois exemplos de um fenómeno progressivo de desenvolvimento de oficinas de vidros, com um gosto próprio, no Ocidente do BaixoImpério (Sanchez de Prado, 1984, p.99). 5.3.1 OUTEIRO DA TORRE – O ESPÓLIO Os materiais arqueológicos documentados durante a intervenção no sítio da Torre são provenientes exclusivamente das camadas de superfície ou das bolsas de lodo que se encontravam misturadas nas areias. Uma vez que as camadas correspondentes a estas foram interpretadas como sendo o resultado da extracção da saibreira, os materiais documentados nestes lodos estão POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 67 descontextualizados. No entanto, existe uma forte probabilidade de serem provenientes das áreas de onde foram exumados. Já quanto aos que estão documentados nas camadas de superfície as dúvidas da sua proveniência são grandes, uma vez que após o fim de laboração da pedreira, todo o terreno foi regularizado de modo a que ficasse apto para a agricultura. Este facto levanta o problema da origem dos artefactos ali encontrados dado que se desconhece a proveniência das terras aí depositadas. CERÂMICA, SIGILLATA E VIDRO Ainda assim, é de notar a existência de alguns fragmentos de recipientes cerâmicos de época moderna e contemporânea juntamente com outros que parecem apontar para cronologias mais antigas (como é o caso do fragmento de bordo de terra sigillatta Late Roman C recolhido na UE 17, da sondagem 5, cuja cronologia – séc V-VI – é consentânea com o conjunto artefactual recolhido na Torre por Alberto Souto, actualmente depositado no Museu de Aveiro, assim como com os materiais provenientes da Marinha Baixa. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 68 6 ANÁLISE CONTEXTUAL No decurso do processo de investigação a hipótese inicialmente aventada de vincular as estruturas da Marinha Baixa a actividades de produção cerâmica foi progressivamente matizada. À fragilidade de tal hipótese veio somar-se a detecção de uma nova estrutura de combustão associada a um depósito constituído exclusivamente por fragmentos de vidro e cinzas (Cf Figura 35 - Sondagem 6, Área 2). Como não será difícil de compreender, estes dados alteraram o nosso ponto de focagem a propósito do sítio, suscitando a seguinte questão: sem descartar a possibilidade de se tratar de um espaço industrial de carácter plurifuncional, terá estado a Marinha Baixa associada a actividades – ainda que eventualmente episódicas – de produção/reciclagem de vidro? É o que se pretende problematizar nas linhas que se seguem. Figura 35 - Sondagem 6, Áea 2 (UE 6006 – concentração de vidros junto a estrutura de combustão) POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 69 6.1 CONDIÇÕES PARA A PRODUÇÃO/RECICLAGEM DE VIDRO Citando M. Xusto Rodríguez, podemos dizer (tendo em conta a informação dos textos clássicos e o resultado de análises físico-químicas) que o vidro romano é uma substância rígida não cristalina, resultante do amolecimento a alta temperatura duma mistura complexa na qual intervêm três componentes principais: elementos vitrificantes – sílice -, elementos fundentes – carbonato de sódio – e elementos básicos ou estabilizantes – cal. Assim, para nos aproximarmos ao conhecimento das condições que presidem à implantação de fábricas de vidro, assume uma importância vital conhecer o potencial de abastecimento dos componentes maioritários (sílice e carbonato de sódio), assim como de madeira, combustível imprescindível consumido em grandes quantidades para alimentação dos fornos vidreiros (2001: 89-90). Tanto no mundo romano como durante a Idade Média a sílice era obtida predominantemente a partir e areia (elemento fundamental para a produção de vidro). “Isto explica, pois, que na officina vidreira da vila romana de Torre Llauder (Marató, Barcelona), ademais de documentarse catro fornos e abundantes residuos de fabricación de vidro, aparece tamén “depositada unha importante cantidade de area silicosa de cor branca lixeiramente verdosa que estaba disposta para a fabricación de vidro” (RIBAS, 1972, 175)” (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001:90). É sabido que a areia silícea alcançava o seu ponto de fusão ou amolecimento a temperaturas muito altas (1700ºC), o que, para a fabricação do vidro, implicava a necessidade de a misturar com fundentes, destinados a permitir o amolecimento a temperaturas mais baixas (c. 1000º C no vidro de base sódica) assim como a manter a massa vítrea maleável o maior tempo possível durante a manufactura (XUSTO RORÌGUEZ, M.,: 94). Com a ressalva de que as actividades de reciclagem são susceptíveis de fragilizar os dados disponibilizados por análises químicas, Xusto Rodríguez menciona os resultados provenientes dos vidros romanos de Augusta Emerita e Segobriga que demonstram que os mestres vidreiros romanos usavam, pelo menos até ao século VI, a soda ou o carbonato sódico como matéria fundente (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001 :94-95).Podendo a soda ser de origem vegetal ou mineral, sabe-se que esta última, proveniente do Mediterrâneo Oriental, foi utilizada até ao século VI (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001: 95). Contudo, “no caso da Península Ibérica, debemos ter en conta que a súa costa mediterránea e, sobre todo, o val do Ebro ofrecían plantas POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 70 herbáceas lacustres da família das quenopodiáceas, tales como a salicornia e a salsola, que crecían naturalmente sobre terras lamacentas improprias para cultivos tradicionais e que presentaban unhas cinzas cun elevado contido sódico” (2001: 96). Acrescenta ainda que “como fundentes, se podia recorrer ós cereais (…), ás leguminosas (…), á vexetación pantanosa (canas e xuncos) e á propia matogueira de ericáceas (breixo) (2001: 96,97). Manuel Xusto Rodríguez refere que muito embora os antigos vidreiros considerassem apenas dois componentes na mistura vitrificável (areia e soda), procediam, contudo, de forma aparentemente involuntária à adição de estabilizantes constituídos por cálcio, sob a forma de cal ou óxido de cálcio, obtido a partir dos restos conquíferos presentes nas areias utilizadas, assim como “as análises ata agora realizadas parecen igualmente indicárno-la presencia involuntaria do cálcio nos álcalis procedentes de cinzas vexetais.” (2001: 98-99). O óxido de ferro estava presente de forma natural nas diferentes areias utilizadas como vitrificante, conferindo ao vidro romano a típica coloração esverdeada ligeiramente azulada dominante na produção de uso quotidiano; coloração que esverdeada que se torna escura – verde azeitona – ou amarelada nas produções comuns tardo-romanas e medievais (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001: 100). Para além disso, na coloração e descoloração do vidro haveria que contar com um outro factor: a atmosfera oxidante ou redutora do forno. Se uma atmosfera oxidante permite obter um vidro incolor a partir de uma mistura com conteúdo normal de ferro, já duma atmosfera muito redutora resulta um vidro de cor verde azeitona. Esta afirmação de Xusto, baseada em informações de S. Frank (1982) e M. Sternini (1995) parece, de alguma forma, matizada pela observação de Jackson quando refere que a predominância de matizes verdes (para os vidros), associada ao fabrico de contentores cerâmicos para produção vidreira caracterizados por tons vermelhos oxidantes é representativo de manufacturas vidreiras em ambientes oxidantes (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001: 101; JACKSON et al., 2003: 448-449). A lenha era o combustível dos fornos romanos de produção vidreira. Sabendo que o amolecimento ou fusão da mistura vitrificável implicava elevadas temperaturas (1000º a 1200º C) e que para se conseguir a fusão era necessário mantê-las durante um amplo intervalo de tempo (no mínimo um dia, ainda que pudesse durar vários), o consumo de madeira atingiria uma escala de dimensões muito avultadas. Nem todos os tipos de lenha seriam adequados para a produção de vidro (por produzirem demasiado fumo ou calor insuficiente), sendo que as fontes escritas medievais italianas recomendavam o uso de POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 71 lenha de amieiro, azinheira; havendo também conhecimento da utilização de álamo, castanheiro e salgueiro (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001: 105). A este propósito Xusto afirma que os resultados dos estudos palinológicos da vegetação galega durante a época romana (atestando a presença de amieiro, bétula, castanheiro, aveleira, choupo, carvalho e salgueiro) indiciam que o abastecimento de combustível não constituiria uma condicionante para os centros de produção do NO peninsular. Ressalva-se contudo, de forma muito veemente, que “no estado actual dos nossos coñecementos referido ó NO penínsular tan só podemos movernos no ámbito da supusición, posto que a concreta identificación das especies mencionadas pasa pola imprescindible realización de análises dos carbóns descubertos na cámaras de combustión dos fornos” (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001: 107). Citando R. W. Smith, Xusto adianta que a composição básica do vidro não se altera nas províncias ocidentais com a desintegração do poderio romano no século IV d. C. (2001: 97). Na sequência da realização de inúmeras análises de fluorescência de raio x, observação por microscópio electrónico de varrimento, análises petrográficas, de espectrometria, e difracção de raio x, sugere-se, por exemplo, que as argilas (ou contentores cerâmicos) que apresentam uma elevada proporção de inclusões de sílica eram usualmente seleccionadas para serem utilizadas como cadinhos de fundição na manufactura do vidro (JACKSON et al., 2003: 441). É referido o caso de oito amostras de quartzo e vidro intersticial seleccionadas para análises de difracção de raio x, destacando-se que três minerais se encontravam invariavelmente presentes nas amostras analisadas: quartzo alfa (predominante) em associação com tridymite e cristobalite (esta última em muito menor quantidade). Afirmase que as análises realizadas reflectem claramente o resultado da exposição de sílica a temperaturas extremamente elevadas. A presença de quantidades relativamente abundantes de tridymite indica que estas amostras atingiram temperaturas superiores a 870º C, mantidas durante um considerável espaço de tempo. A parca presença de cristobalite pode sugerir que foram atingidas temperaturas próximas dos 1250º C, porém mantidas durante um curto período temporal. Conclui-se que embora estas evidências pareçam apontar para produções de vidro a partir de matérias primas, não é possível afirmar com segurança se estes materiais são o resultado de fabricos realizados em uma POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 72 ou duas etapas. As temperaturas excederam os 700º-900ºC usualmente necessários para atingir a cocção dos elementos constituintes do vidro, assim como atingiram aquelas que permitem a sua produção – superiores a 1100º.25 Contudo, não é claro se estamos perante um caso de sobreaquecimento durante o processo de cocção, ou face à evidência do resultado de uma tentativa falhada de produção numa única etapa (JACKSON et al., 2003: 448). Refere-se, a propósito dos materiais de Coppergate que todos os vidros seleccionados eram verdes ou verdes/ azuis, o que corresponde à cor natural do vidro produzido a partir de matérias primas nas quais o ferro é um elemento constituinte, sendo que a predominância de matizes verdes (para os vidros), associada ao fabrico de contentores cerâmicos para produção vidreira caracterizados por tons vermelhos oxidantes é representativo de manufacturas vidreiras em ambientes oxidantes (JACKSON et al., 2003: 448-449). Num exaustivo estudo de arqueometria a propósito da produção de vidro em Coppergate (York, Reino Unido) durante o período romano (JACKSON et al., 2003: 436), os seus autores constatam que, actualmente, as evidências arqueológicas para a produção de vidro na Britânia estão representadas por um limitado número de centros de produção de pequena escala, nos quais o vidro era fabricado a par de outras manufacturas26. As evidências materiais registam-se por vezes sob a forma de fornos de fundição, forjas ou áreas de piso queimado, acompanhadas por vestígios de desperdícios de vidro derretido e, nalguns casos, restos de cadinhos, embora raramente se registem estes elementos em associação, correspondendo frequentemente a achados isolados. Na esteira de Freestone (2002, apud JACKSON et al., 2003: 436) admite-se que muito deste material não constitui necessariamente uma evidência de efectiva produção vidreira, podendo representar a presença de actividades de reciclagem de vidros produzidos noutros locais, importados sob a forma de lingotes ou mesmo desperdícios. Em si mesmos, estes sítios constituiriam assim indicadores da presença de unidades de fabrico secundário (ou reaproveitamento) e não propriamente centros de produção primária. Face a este panorama, é enfatizada a importância dos vestígios registados em Coppergate, uma vez que podem corresponder às únicas evidências materiais de produção vidreira a partir de matérias primas detectadas até ao momento presente em território britânico relativas ao período romano. O conjunto material deste sítio inclui cerâmica comum de tipologia 25 Sublinhado nosso. 26 Sublinhado nosso. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 73 doméstica contendo resíduos de vidro derretido e parcialmente fundido e restos de peças inacabadas, em associação a restos de peças eventualmente produzidas a sopro, assim como fragmentos de quartzo e vidro semi-derretidos. Entre o acervo de materiais descrito, os autores consideram que é esta mistura de quartzo e vidro parcialmente alterados que constitui a base para a compreensão, em termos arqueométricos, dos processos de produção de Coppergate. A propósito dos vidros de Coppergate enuncia-se a hipótese destes constituírem o resultado de uma acção de reciclagem (não necessariamente utilizando vidros manufacturados a partir de matérias primas) ou, em alternativa, corresponderem a produtos de reciclagem de vidros fabricados no próprio local (JACKSON et al., 2003: 453,454). Os autores concluem que os contentores cerâmicos usados na produção de vidro foram fabricados com recurso às mesmas argilas e técnicas utilizadas para manufacturar alguns exemplares da cerâmica doméstica local27, muito embora certas formas e certos fabricos tenham aparentemente sido concebidos ou escolhidos especificamente para o propósito de derreter vidro, já que tinham capacidade para suportar elevadas temperaturas. As análises realizadas indicam que estes fabricos não se decompunham quando sujeitos a temperaturas de 1150º C, e as estruturas de vitrificação aparentam ter sido aquecidas até 1200ºC, uma temperatura suficientemente elevada para produzir vidro (de sódio, cal e sílica) a partir de matérias primas, sem necessidade recurso a uma etapa intermédia de cocção. No que concerne à actividade de reciclagem no âmbito da produção de vidro (fragmentos de recipientes e refugo), sabe-se que facilitava o rendimento da fabricação, não só por implicar uma forma de recuperar matéria prima, mas principalmente porque constituía um processo de reduzir as temperaturas do ponto de fusão ou amolecimento do vidro, já que os fragmentos reciclados (derretendo a temperaturas mais baixas) actuavam como catalizador, acelerando o amolecimento dos restantes ingredientes da mistura vitrificante a uma temperatura não demasiado elevada (XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001: 102). 27 Sublinhado nosso POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 74 6.2 MARINHA BAIXA: UM CENTRO DE PRODUÇÃO/RECICLAGEM DE VIDRO NO NOROESTE PENINSULAR? Denota-se no panorama do Noroeste da Península Ibérica uma considerável escassez de contextos arqueológicos preservados inequivocamente associáveis à produção vidreira (XUSTO, 2001:111), sendo evidente uma cada vez mais manifesta a existência de oficinas locais ou regionais tardo-romanas destinadas ao abastecimento de uso comum de âmbito doméstico, nomeadamente, em Tui e Lugo. Porém, afigura-se como cada vez mais provável a hipótese de alguns destes centros terem funcionado como espaços de reciclagem e não propriamente como núcleos de produção primária. Esta realidade é visível não só no espaço galaico-romano como também na área de Mérida, onde está atestada a presença de unidades oficinais extra-muros, entre as quais se registou a presença de evidências materiais de reciclagem de vidro datáveis do séc IV (XUSTO, 2001:120). Relativamente ao actual território português tal ausência de estruturas industriais associadas à produção de vidro é também, no estado actual dos nossos conhecimentos, uma realidade, como se torna patente nas lacunas de informação decorrentes das publicações relativas a Conímbriga e Bracara Augusta. No entanto, nada obsta a que este panorama não se venha a alterar. No que respeita à produção vidreira, torna-se claro que “as probas máis fiables están, evidentemente, no descubrimiento dos fornos …” (FOY e SENNEQUIER, 1991, 6 apud XUSTO RORÌGUEZ, M., 2001: 113), facto que confere aos contextos arqueológicos da Marinha Baixa inegáveis potencialidades para o esclarecimento da questão. Esta realidade, no entanto, não é forçosamente vinculável a uma estruturada e contínua actividade produtiva, podendo estar relacionada com episódios esporádicos de utilização daquele espaço por vidreiros ambulantes, hipótese de trabalho já aventada por Manuel Xusto Rodríguez para a região galaico-romana. Esta hipótese afigura-se-nos tanto mais provável para o caso da Marinha Baixa quanto o parece corroborar a presença muito significativa de fragmentos vítreos depositados em áreas contíguas a estruturas de combustão, e a ausência absoluta de evidências materiais de produção primária. Como já se referiu anteriormente, as condições para o processo de reciclagem de vidro são muito menos exigentes que para a sua produção a partir de matérias-primas, implicando, por exemplo, a possibilidade de vitrificação a temperaturas mais baixas, realidade POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 75 consentânea com os resultados das análises realizadas sobre dois dos fornos ali identificados (vide supra Tabela 1). É de destacar, no que se refere aos dados disponíveis para a Marinha Baixa, que não obstante as baixas temperaturas atingidas pelos fornos analisados, estes representam uma pequena amostra dentro das evidências ali identificadas (existem sete estruturas de combustão no espaço da área sondada). Por outro lado, é conhecido o método de produção encadeada numa série de fornos contíguos correspondendo às várias fases de fabrico (XUSTO, 2001: 115). Tratar-se-iam, hipoteticamente, de fornos de recocção ou acabamentos destinados ao processo de arrefecimento gradual das peças para evitar que uma busca mudança térmica as quebrasse, cujas dimensões não teriam que ser muito amplas e compreenderiam só o espaço necessário para arrefecer gradualmente os recipientes elaborados durante uma jornada de trabalho. Note-se que para identificar realidades desta natureza nos deparamos com a necessidade de escavações em área para privilegiar uma visão horizontal que permita identificar as diferentes unidades de trabalho numa oficina (XUSTO, 2001:119); na Marinha Baixa estávamos condicionados pelos objectivos inerentes a uma intervenção de salvaguarda e diagnóstico. Porém, sondou-se uma área total de 224m2 (dividida por 6 sondagens) e intervencionou-se em acções de limpeza na área envolvente que, embora caracterizada por uma série de truncamentos, nos permite uma visão, se bem que parcelar e eivada de lacunas, significativamente interessante. No que concerne às evidências arqueológicas susceptíveis de associar a Marinha Baixa a actividades de produção/reciclagem vidreira, assumem particular relevância os aspectos que se passam a enunciar: a) existência de mercados potenciais: para o caso de eventuais contactos entre a Marinha Baixa/ Torre e outros povoados contemporâneos, assume particular importância (pelo menos em termos teóricos) o sítio arqueológico do Cabeço do Vouga; b) vias de comunicação: para além da eventual localização costeira da Torre, mencionese a navegabilidade do Vouga daqui até Cabeço do Vouga, por sua vez situado no traçado da via Ad Bracara. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 76 c) disponibilidade de silica: para além da natural proximidade de areias associáveis às acumulações sedimentares do Vouga, note-se o registo, na Marinha Baixa, de níveis geológicos de terraços fluviais. Note-se ainda a presença de níveis de oxidação ferruginosa presentes nestes terraços, eventualmente associáveis às tonalidade verdes tão características da colecção da Marinha Baixa/Torre; d) eventual disponibilidade de sódio de origem vegetal através da presença de espécies arbóreas como sejam o salgueiro e o amieiro. Contudo, se estas espécies são observáveis actualmente no local, não há nada (face à ausência de análises palinológicas) que nos permita assumir que também ali se encontravam em época tardoromana. Tais considerações são igualmente válidas quando se trata de colocar em hipótese a presença de espécies arbóreas utilizáveis como combustível; e) água: conforme expusemos em capítulo concernente ao enquadramento geomorfológico, a Marinha Baixa está situada na margem esquerda do Vouga e é sobranceira, a Oeste, a uma pequena linha de água; f) estruturas de combustão/ fornos: como já foi amplamente descrito nos relatórios de trabalhos arqueológicos e em artigos e comunicações realizados a propósito da Marinha Baixa/Torre, são actualmente conhecidas no local sete estruturas de combustão. Desta forma, restringiremos aqui o nosso enfoque a três aspectos ilustrativos: a presença de uma significativa concentração de fragmentos vítreos contígua a uma estrutura de combustão (Figura 36); o carácter aparentemente vitrificado da película de revestimento de uma das estruturas negativas aí expostas (Estrutura D); e a desconcertante (contudo parcelar) ausência de resultados analíticos reveladores de temperaturas atingidas pelos fornos superiores a 450º (inoperantes para a produção vidreira, mas não para as respectivas fases de acabamentos). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 77 Figura 36 – Concentração de vidros junto a estrutura de combustão da Sondagem 6 (UE 6006) A título de conclusão, faça-se alusão a dois paralelos interessantes: a presença de um forno tanque tardorromano em Castor St. Edmund (Reino Unido) coberto na base por uma película vítrea de 25 mm (como parece suceder na Estrutura D da Marinha Baixa não obstante estarmos aqui face a dimensões muito menores quer no que respeita ao tamanho da estrutura em si mesma, assim como à espessura da película vitrificada). Contudo, note-se que aqui a calcinação não requereria cadinhos, realizando-se directamente na câmara de cocção e sendo transvasada para o forno-tanque por uma espécie de caleira. É interessante notar a presença de uma caleira numa das extremidades da Estrutura D (Figura 37), assim como, no estado actual dos nossos conhecimentos, a total ausência de cadinhos/crisóis no conjunto total exumado. Destaque-se, finalmente, a existência de paralelos em em Salona (Croácia) Séc III-IV; Autun (França), séc III-IV; Varna (Bulgária) séc VI. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 78 Figuras 37 e 38 – Estruturas D e H Por fim, a título de curiosidade, comparem-se as plantas da Marinha Baixa e da oficina vidreira baixo-medieval de Germagnana, Itália (Figuras 39 e 40). Não obstante a considerável dimensão do intervalo de tempo que as separa (com todos os anacronismos históricos e tecnológicos que daí advêm), é por demais evidente a semelhança que as aproxima no que à organização espacial concerne. Tal asserção, de carácter eminentemente conjectural, pretende tão somente frisar a consistência da hipótese de trabalho em que se assume que na Marinha Baixa poderá ter ocorrido produção secundária/reciclagem vidreira num período em que a organização administrativa do Império Romano se desagregava na Península Ibérica, suscitando concomitantemente, como explanaremos adiante, fenómenos centrífugos de restruturação territorial. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 79 Figura 39 – Planta e proposta de reconstituição da oficina vidreira baixo-medieval de Germagnana (Itália) Fonte: STIAFFINI, 1994, pp204 e 205 apud XUSTO, 2001: 128 Figura 40 – Fases 1 e 2 da Marinha Baixa POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 80 7 7.1 CONCLUSÃO CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO-ARQUEOLÓGICA Conforme já afirmámos noutro lugar, “o intervalo de tempo correspondente ao século V no Ocidente Peninsular, tem sido ao longo da história da Arqueologia portuguesa associado, não raras vezes, a situações de abandono decorrentes da introdução e permanência no actual território português de populações exógenas. Não obstante, a noção simplista de uma situação generalizada de ruptura com o passado durante aquele período tem vindo a ser reiteradamente rejeitada na última década (Fabião, 1992; Maciel, 1996; Jorge, 2002)” (SARRAZOLA, 2002, 151). De facto os dados que fomos expondo ao longo deste texto conduzem-nos mais à assunção de um fenómeno de continuidade do que a rupturas com formas de produção, contactos e intercâmbios; permanências que, efectivamente, o nosso acervo documental parece reflectir. No presente capítulo pretende-se explanar esta asserção, do geral para o particular, partindo de modelos recentemente propostos para a realidade histórico-arqueológica do NO Peninsular, abordando subsequentemente, a temática da produção vidreira à luz destes modelos, para incidir, finalmente, na problemática da inserção da Torre / Marinha Baixa nesta realidade. Atentemos pois, nos modelos propostos para o NO Peninsular: a propósito da Gallaecia, Gutiérrez González fala-nos de “tendências centrífugas de grupos campesinos desde os latifúndios mesetenhos até aos rebordos montanhosos do Noroeste (..) relacionadas com a desintegração das estruturas políticas e dos sistemas de produção tardo-romanos e em consonância com uma maior tendência para a produção de subsistência que com anteriores práticas agrícolas excedentárias” (2001:21), alertando, porém, para a complexidade do fenómeno e para a necessidade de evitar explicações simplistas. Note-se que a propósito do Norte peninsular são conhecidos casos de continuidade de ocupação de castros sem refortificação entre os séculos III e V-VI, enquanto que noutros se documenta a erecção de muralhas entre o século IV e inícios do V ou entre o V e o VI, alertando Gutiérrez González para o facto de “a diferença em termos de contexto sócioeconómico e a diversa cronologia obrigarem a não considerar este processo de “acastelamento” tardo-antigo como uniforme e homogéneo, para além do mais escassamente conhecido e caracterizado arqueologicamente”(2001: 21). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 81 No que concerne a fontes de natureza arqueológica, López Quiroga (2001: 83) informanos da presença de 31 castros que apresentam uma continuidade ou uma reocupação nas primeiras décadas do século V – no espaço entre o Cantábrico e entre Minho e Douro. O autor considera que “a distribuição espacial destes castros permite observar como a zona costeira entre o Ulla e o Douro juntamente com o sistema montanhoso conhecido como a Dorsal Galega constituem as áreas que apresentam uma maior concentração de ocupações deste tipo para a primeira metade do século V”, constatando o facto de o maior número de achados de terra sigillata clara D e de tesouros monetários com exemplares de Arcádio e Honório se encontrarem na zona costeira (2001:83); precisamente o tipo de evidências materiais que conhecemos na Torre (solidus de Honório) e na Marinha Baixa (terra sigillata clara D Hayes 91 e 97). Não obstante o carácter fragmentário da informação disponível (para uma interpretação satisfatória da distribuição espacial) L. Quiroga arrisca-se a algumas reflexões conducentes à consideração da manutenção do castro como unidade fundamental de povoamento (2001: 84), i.e. a constatação de uma “ocupação ou reocupação de castros anterior à instalação dos suevos em 411(...) especialmente significativa em torno de Braga, Porto, Tui, Orense, Iria e Lugo. Isto é: as capitais politico-administrativas da Gallaecia (Braga e Lugo), um núcleo portuário importante e estratégico na desembocadura do Douro (Porto) e outros núcleos posicionados no curso médio-final do Minho (Orense e Tui) ou a entrada na Ria de Arosa (Iria Flavia)” (2001: 84). Tais considerações – a propósito de uma área regional e provincial diversa - colocam-nos a questão da importância estratégica de Cacia, do seu posicionamento costeiro na desembocadura do Vouga, e da sua ligação fluvial a Cabeço do Vouga, povoado fortificado sobranceiro à via ad Bracara Augusta. Quiroga alude à zona costeira do Noroeste como um “âmbito espacial extremamente ligado a uma forte actividade comercial de importação durante toda a Antiguidade Tardia que não se interrompe nem se contrai com a instalação e chegada dos suevos” - destacando a presença em núcleos deste espaço de TS clara D – e supondo a existência de “razões de tipo geo-económico para a ocupação ou reocupação dos antigos castros, uma vez que estes contribuiriam para manter28 e, sobretudo, proteger a intensa actividade comercial que se observa durante este período por meio de uma série de sítios fortificados de altura localizados em antigos castros com relação com os eixos principais da rede viária e hidrográfica” (2001:84). Os paralelos com a Torre, em particular, e genericamente as suas implicações 28 Sublinhado nosso. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 82 com o Baixo Vouga parecem, ainda que hipoteticamente, susceptíveis de uma extensão regional do modelo de Quiroga para o Entre Douro e Vouga Litoral. Em função do exposto, afigura-se-nos pertinente colocar duas questões: Será lícito conjecturar, para a Torre, o seu enquadramento, salvaguardando as suas especificidades regionais e intrínsecas, numa tendência centrífuga desta natureza? Pelas evidências materiais provenientes do povoado sabemos que é muito provável que este se encontrasse ocupado já no século III (Silva, 1994: 46), assim como é de crer numa idêntica continuidade ocupacional para o Cabeço do Vouga (CMA, s.d.), aliás ambos com evidências de ocupação desde o período pré-romano até à alta idade média. Por outro lado, fará sentido perspectivar a Torre enquanto povoado continuadamente ocupado durante o período romano e a antiguidade tardia, desempenhando funções portuárias e um papel activo no âmbito de um processo centrífugo de gestão territorial supostamente ocorrido no Noroeste peninsular no decurso dos complexos e heterogéneos processos de transformação e mudança (Gutiérrez González, 2001:19) que aparentemente caracterizam a época em foco? Manuel Xusto Rodríguez afirma que o NO hispânico durante os séculos VI e VII continuou também dentro da ergologia vítrea assim como noutras manifestações plásticas aparentado com a tradição tardo-romana local. Adianta que o vidro que caracteriza o período suevo e hispano-visigodo (na Galiza alto-medieval ou de hegemonia germânica) será, portanto, um vidro enraizado no mundo clássico, interpretável como produto da perduração e/ou reactivação da tradição vidreira galaicoromana (2001: 61). Ainda segundo este autor, também as produções comuns de vidros, relacionadas com o quotidiano e maioritariamente com o mundo doméstico, sem grandes ambições técnicas ou estilísticas, e geralmente de origem regional ou local, se espalham territorialmente, ainda que evidentemente dentro de distância menores [que as das produções de luxo] de acordo com o seu carácter de produtos realizados em oficinas possivelmente muito pouco especializadas. Desta forma, os objectos de vidro, sejam ou não de uso diário, conheceram uma distribuição territorial dominada pela maior ou menor distância ao centro de produção de acordo com a sua função e qualidade (2001: 84). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 83 No que concerne ao carácter plurifuncional de alguns espaços oficinais, é sabido que nos casos do vidro e da cerâmica, tendo em conta a proximidade dos seus centros de produção, torna-se plausível admitir que partilhariam a mesma rede comercial. Xusto cita mesmo o modelo proposto por PRICE e COOL (1991, 27 apud XUSTO RODRÍGUEZ, 2003: 145) para a Grã-Bretanha romana: um modelo de produção de vidro em pequena escala associado à produção de cerâmica, sugerindo a possibilidade de que as mesmas agências de distribuição de produtos finais ou acabados em vidro e cerâmica fossem também as encarregadas de recuperar e proceder ao retorno do vidro fracturado aos centros de produção vidreiros para a sua reciclagem (XUSTO,145). Para o autor galego, tudo parece indicar que as oficinas de Lugo, Mérida, La Maja (Rioja) e provavelmente Braga puderam conhecer uma situação muito similar à realidade saxónica de Mancetter, Castor e Sheepen Colchester baseada na associação entre fornos cerâmicos e de vidro, frisando que esta possibilidade deve manter os investigadores atentos, no decurso de intervenções arqueológicas em oficinas galaicoromanas de produção cerâmica, em torno das quais, provavelmente se possam vir a deparar com a aparição e novas officinae vidreiras. É mencionada a frequente associação de centros vidreiros a locais onde existem também centros oleiros: Lugo (Galiza); Castor e Mancetter (Grã Bretanha) neste último local coexistindo produção vidreira com uma das principais unidades de produção de tijolos; La Maja (Calahorra, Espanha). Tal facto justifica que tenhamos mantido em aberto a hipótese de um carácter plurifuncional para a Marinha Baixa. Contudo, os casos citados por Xusto aparentam corresponder a coexistências a uma escala que não a do local específico de produção mas sim da localidade. Não nos podemos esquecer da presença, em período tardio, dos fornos do Eixo (produção de cerâmica de construção) a escassos quilómetros da Marinha Baixa. A comparação remete-nos mais para uma unidade de produção (e/ ou reciclagem de vidro) do que uma olaria. Esta chamada de atenção parece reforçar as nossas reservas aquando da caracterização funcional da Marinha Baixa. Isto é, se num primeiro momento lhe atribuímos um significado plurifuncional, deixando em aberto a sua interpretação definitiva e rechaçando uma conclusão que apresentasse esta oficina como um centro de produção cerâmica, as novas informações que nos fazem agora inclinar para uma caracterização da Marinha Baixa enquanto centro de produção vidreira não devem ser tomadas sem precauções. Daí que apresentemos os mesmos dados materiais à luz das duas hipóteses (olaria ou POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 84 oficina vidreira?) e consideremos que valerá a pena continuar as testar a plausibilidade de ambos os caminhos interpretativos, não obstante o facto de assumirmos que, no estado actual dos nossos conhecimentos, se nos afigura podermos com mais segurança admitir que nos inclinamos para uma caracterização da Marinha Baixa enquanto oficina de produção vidreira de carácter secundário durante o período tardo-romano. Alargando a abordagem a uma escala social/ espacial mais abrangente, embora posicionamentos teóricos actuais e trabalhos analíticos suportem a hipótese, para o mundo tardo-romano, da existência de um escasso número de importantes centros de produção (FREESTONE et al. 2002, apud JACKSON et al., 2003: 454) as evidências provenientes de York desafiam-nos a considerar a presença de um movimento de artesãos qualificados e, consequentemente, do vidro enquanto mercadoria (JACKSON et al., 2003: 454). Fazendo incidir o nosso enfoque à escala intra-sítio, e importando a ideia de que o abandono de estruturas ou áreas de actividade é um processo constante em muitos sítios, constituindo acções como a limpeza e a reutilização dois dos mais importantes processos legíveis no registo arqueológico (Cameron, 1993: 5) constatamos que o tipo de estruturas existentes na Marinha Baixa reflecte de forma inequívoca um processo continuado de gestão do espaço: i. e. fornos que são recorrente e sistematicamente destruídos e reconstruídos assim como estruturas arquitectónicas tornadas inoperacionais e reconstruídas num curto intervalo de tempo segundo os mesmos moldes arquitectónicos e com recurso às mesmas técnicas tradicionais (Sarrazola, Mendes da Silva, Borges Coelho, Melro, 2001). Tal constatação entronca na noção de que, não obstante possam ocorrer em sítios abandonados, processos como reutilização e limpeza encontram-se especialmente pronunciados em sítios habitados onde áreas de actividades ocupadas e abandonadas se encontram em estreita proximidade (Cameron, 1993: 5). Em suma, um tentame de síntese dos dados arqueológicos e das perspectivas teóricas/modelos que expusemos ao longo deste texto conduz-nos a assumir, no estado actual dos nossos conhecimentos, três conclusões fundamentais: • O povoado da Torre, enquanto espaço ocupacional tardo-romano/alto-medieval, é susceptível de ser interpretado como uma unidade territorial enquadrável no modelo norte-ocidental vinculado à ideia da permanência, após a desagregação administrativa do Império Romano na Península Ibérica, de uma rede de POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 85 comunicações associada ao movimento de produtos, populações e ideias. A título ilustrativo recorde-se a ideia de Vilella Masana relativa à perduração até ao século VI das rotas mediterrânicas e norte-atlânticas, destacando “um leque de relações não comerciais muito mais alargado e complexo: relações que implicam aculturação” (1990: 59). • A ideia supra exposta parece viabilizar a assunção da existência em época tardia de grupos de artífices vidreiros itinerantes que num determinado local fariam uso das estruturas oficinais disponíveis para a produção do vidro, independentemente da função para que teriam sido concebidas, desde que permitissem uma efectiva operacionalidade. Tal asserção pode sustentar a heterogeneidade formal identificada no espaço da Marinha Baixa e o carácter plurifuncional que lhe atribuímos. • A ausência de evidências materiais de carácter arqueológico que permitam identificar sem reservas a ocorrência de produção primária (a partir de matériasprimas) de vidro na Marinha Baixa, associada à inequívoca presença de estruturas de combustão conectadas com unidades estratigráficas caracterizadas por uma considerável profusão de fragmentos vítreos de qualidade e tipologia amplamente conhecidas no mundo tardo-romano, contribuem para que apresentemos este sítio como um espaço de produção secundária/reciclagem de vidro em funcionamento relativamente prolongado ou episódico. O que acabámos de explanar parece fazer sentido num território e num tempo em que cada vez mais se nos afigura pertinente, sem embargo das suas complexidades, constatar que a tónica dominante incide não na ruptura mas, manifestamente, na ideia de continuidade. 7.2 POTOR: OBJECTIVOS E RESULTADOS No que concerne aos objectivos inicialmente delineados, que adiante se reenumeram, vejamos ponto por ponto de que forma foi possível concretizar aquilo que houvera sido proposto. Objectivos genéricos • Avaliação do potencial arqueológico do Povoado da Torre, assumida como contributo para o conhecimento da rede de povoamento da região do Baixo Vouga no contexto da ocupação romana do actual território português. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 86 Consideramos ter concretizado este objectivo genérico, já que se procedeu efectivamente a uma avaliação do potencial arqueológico do sítio. Sem embargo de termos constatado que a área intervencionada foi profundamente afectada pela saibreira que ali laborou largos anos, redundando tal constatação numa avaliação claramente deficitária do ponto de vista patrimonial, o facto de termos sido forçados pelas circunstâncias a reequacionar a agenda científica do projecto conduziu a uma efectiva contribuição para o conhecimento histórico-arqueológico da região, reforçada pelo carácter singular dos dados objectivos. • Abordagem interdisciplinar ao conhecimento da evolução da paisagem litoral na zona do Baixo Vouga no que concerne às suas implicações histórico-arqueológicas. Condicionado pelo facto do sítio da Torre se encontrar amplamente afectado pelos motivos já expostos e relacionados pela sua história recente, redireccionamos as nossas intenções de interdisciplinaridade para um outro campo: no âmbito da nossa participação nas Jornadas Nacionales – Vidrio de la Alta Edad Media y Andalusí (San Ildefonso, Segovia – 2006), foram enviadas para a Universidade Autonoma de Madrid (Prof. Angel Fuentes) amostras de vidros para análises arqueométricas (cujos resultados se aguardam e serão publicados nas respectivas actas e, posteriormente, entregues ao Instituto Português de Arqueologia). Em suma, manteve-se o carácter interdisciplinar do projecto adaptado aos seus novos objectivos. Contudo, aquilo que foi exposto a propósito do estado actual dos nossos conhecimentos relativamente à localização de Cacia na linha de costa em época romana não deixa de significar um contributo para conhecimento da evolução da paisagem litoral na zona do Baixo Vouga no que concerne às suas implicações histórico-arqueológicas. • Valorização do contributo da investigação arqueológica na construção da memória colectiva/ local, entendida enquanto elemento estruturante de identidade e como garante do exercício da cidadania. A respeito deste objectivo destaque-se a estreita relação com a Junta de Freguesia de Cacia em sede da qual procedemos a uma comunicação pública dos resultados que à data da sua realização dispúnhamos, assim como, a publicação de dois artigos no Boletim oficial daquele organismo autárquico. Finalmente, na sequência de uma solicitação da Junta de Freguesia de Cacia e após a apresentação ao Instituto Português de Arqueologia do presente documento, será disponibilizada on-line uma síntese dos resultados do POTOR no site oficial da Junta de Freguesia. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 87 Objectivos específicos • Avaliação do grau de preservação das evidências materiais de carácter arqueológico jazentes no sítio da Torre, sabendo que o local foi objecto de uma actividade continuada de extracção de saibro durante a primeira metade do século XX. Como já referido, a avaliação da preservação do sítio foi concretizada e os seus resultados constam do respectivo relatório de progresso. • Elaboração de um quadro preliminar de caracterização diacrónica da ocupação do espaço da Torre. Em virtude da já mencionada afectação do sítio durante o século XX este objectivo específico revelou-se inexequível. • Aferição de eventuais relações sincrónicas entre o povoado da Torre e a Marinha Baixa durante o intervalo de tempo que caracteriza cronologicamente a ocupação desta última (séc. IV-VI). Pretendemos, desta forma, testar a nossa hipótese interpretativa de identificação da Marinha Baixa enquanto espaço de funções especializadas associado ao sítio da Torre (SARRAZOLA, MENDES DA SILVA, MELRO, 2001). Não obstante os condicionalismos expressos no ponto anterior, são evidentes as relações de sinconia crono-tipológica entre os materiais da Torre e os da Marinha Baixa, assim como a inequívoca associação entre estes dois espaços em período tardoromano. Esta constatação decorre da análise comparada dos conjuntos artefactuais provenientes de ambos os sítios que, na nossa opinião, terão constituído uma só ocupação espacial. • Confirmação/ infirmação da ocorrência de fases de ocupação da Torre anteriores e posteriores ao intervalo de tempo atestado na Marinha Baixa (séc. IV-VI), através da obtenção de dados estratigráficos. Pelos motivos já expostos não foi possível dar resposta a este objectivo. • Aferição de eventuais especificidades do povoado da Torre, no que concerne à sua implantação geográfica e ao seu contexto geomorfológico e respectivas implicações históricas; através da colaboração com especialistas em estudos paleoambientais. Pelos motivos já expostos não foi possível dar resposta a este objectivo. • Realização de acções de divulgação dos resultados da investigação arqueológica junto das populações locais, dando continuidade a iniciativas empreendidas em articulação com a Junta de Freguesia de Cacia no decurso do ano 2000. Este objectivo foi eficazmente alcançado nos termos acima descritos. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 88 • Determinação de uma estratégia de continuidade do projecto (após a avaliação do potencial arqueológico da Torre), definida em função dos dados decorrentes da sua realização. A alteração estratégica dos objectivos do projecto conduziu a uma solução de continuidade que se materializará na publicação dos resultados decorrentes das análises acima referidas (Universidade Autonoma de Madrid). POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 89 8 BIBLIOGRAFIA AA.VV. - Enciclopedia dell’ Arte Antica Classica e Orientale. Atlante delle Forme Ceramiche. II (Ceramica Fine Romana nel Bacino Mediterraneo. Medio e tardo Impero). Roma. ALARCÃO, J. (2004) – Notas de Arqueologia, Epigrafia e Toponímia – I, Revista Portuguesa de Arqueologia, vol. 7 nº1, pp. 317-342. ALARCÃO , J. (1988) - Roman Portugal; Vol. II, Warminster, Aris & Phillips. ALARCÃO, J. 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Carta Militar de Portugal; Escala 1:25 000; Murtosa– Folha 174 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 93 9 FICHA TÉCNICA Responsáveis científicos Alexandre Sarrazola Inês Mendes da Silva Equipa Técnica Ana Patrícia Madeira Ângela Ferreira Beliza Vilar Iola Filipe Eunice Gomes Trabalhadores não especializados António Maria da Silva Carlos Ferreira da Silva Tiago Silva Bruno Fernandes Elaboração do Relatório Alexandre Sarrazola Ana Sofia Gomes Inês Mendes da Silva José Carlos Quaresma Desenhadores José Pedro Machado ________________ Alexandre Sarrazola ______________________________ Inês Mendes da Silva POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 94 Índice de Figuras Figura 1 – Fotografia aérea do Outeiro da Torre (anos 90) 12 Figura 2 – Localização da Torre e da Marinha Baixa 18 Figura 3 – Carta Geológica de Portugal 20 Figura 4 – Localização dos sítios arqueológicos mais próximos da Torre/Marinha Baixa 21 Figura 5 – Localização das vias romanas (efectivas e eventuais) segundo Seabra Lopes (2000) 25 Figura 6– Situação de trabalho na Sondagem 1 do Outeiro da Torre. Nos cortes são bem evidentes as perturbações estratigráficas provocadas pela actividade da saibreira que ali laborou 28 Figura 7 – Implantação cartográfica dos trabalhos de prospecção e sondagens arqueológicas realizados no Outeiro da Torre 29 Figura 8 – Plano da Fase 1 30 Figura 9 – Plano da Fase 2 31 Figura 10 – Plano da Fase 3 32 Figura 11 – Localização de Outeiro da Torre (2) e Marinha Baixa (1) a NO da qual se pode observar a linha de água mencionada no texto (CMP 174) 33 Figura 12 – Buracos de Poste da Fase 3 (Sondagem 4) 36 Figura 13 – Vestígios de tapagem na Ribeira do Vouga 37 Figura 14 – Desenho de Bartolomeu Conde in Cacia e o Baixo Vouga, 1999,p. 207 37 Figura 15 – Taças simples 41 Figura 16 – Taças carenadas 41 Figura 17- Jarro 42 Figura 18 - Panelas 43 Figura 19 - Púcaro 44 Figura 20 - Potes 45 Figura 21 - Bilhas 46 Figura 22 – Recipiente com elementos de suspensão internos 47 Figura 23 – Fundo de ânfora 47 Figura 24 - Cossoiro 48 Figura 25 – Quadro tipológico da cerâmica comum 49 Figura 26 – Vidros recolhidos por Alberto Souto na Torre (Alarcão; Alarcão, 1963a, est. III) Figura 27 - Taça de perfil em S de Lucentum (Sanchez de Prado, 1984, fig. 8-24) 51 56 Figura 28 - Taças de Santomé (a, b, c), A Trinidad (d, e). Taças de perfil em S (a, b) e taças de calote (c, d, e) (Xusto Rodríguez, 2001, fig. 66) 57 Figura 29 – 1 a 6 – vasos troncocónicos; 7 a 20 – taças em calote 59 Figura 30 – 21 a 44 - Taças em calote 60 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 95 Figura 31 – 45 a 48 – taças em calote; 49 a 52 – fundos onfalados; 53 e 54 – fundos com decoração soprada; 55 a 60 – fragmentos decorados 61 Figura 32 – 61 – bordo de frasco; 62 e 63 – gargalos; 64 a 68 – frascos; 69 – base de copo de pé alto; 70 – fragmento de asa 62 Figura 33 – Pormenor da Hayes 97 in situ (peça nº72) 63 Figura 34 – 1 - Sigillata Hayes 97; 2 – Sigillata Hayes 91 64 Figura 35 - Sondagem 6, Áea 2 (UE 6006 – concentração de vidros junto a estrutura de combustão) 69 Figura 36 – Concentração de vidros junto a estrutura de combustão da Sondagem 6 (UE 6006) Figuras 37 e 38 – Estruturas D e H 78 79 Figura 39 – Planta e proposta de reconstituição da oficina vidreira baixo-medieval de Germagnana (Itália) Fonte: STIAFFINI, 1994, pp204 e 205 apud XUSTO, 2001: 128 80 Figura 40 – Fases 1 e 2 da Marinha Baixa POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 80 96 ANEXO 1 – ACÇÕES DE DIVULGAÇÃO Poster apresentado no âmbito das Jornadas sobre vidrio de la Alta Edad Media y Andalusi (La Granja, Segovia; Novembro de 2006) Jornal “Ecos de Cacia”, nº 11, 26 de Novembro de 2003 (p3) Jornal “Ecos de Cacia”, nº 12, Janeiro de 2004 Outeiro da Torre Projecto de investigação arqueológica em curso Alexandre Sarrazola Inês Mendes da Silva O Outeiro da Torre foi objecto de prospecções e escavações arqueológicas durante o mês de Novembro do ano em curso, no âmbito de um projecto de investigação, da responsabilidade dos signatários, subsidiado pelo Instituto Português de Arqueologia (Ministério da Cultura) integrado no Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos e apoiado pela Junta de Freguesia de Cacia. Refira-se que o apoio da Junta de Freguesia, nomeadamente na logística, no fornecimento de mão de obra, no estabelecimento de contactos com os proprietários dos terrenos intervencionados, mas também na hospitalidade manifestada para com a equipa de arqueologia, constituiu um dado basilar para o sucesso dos trabalhos. Conforme foi anunciado na última edição do Ecos de Cacia (nº 11, 3ª série, 26/11/2003), subjazem ao mencionado projecto três objectivos fundamentais: • • • Caracterização arqueológica do Povoado da Torre e respectivas implicações contextuais; Abordagem interdisciplinar ao conhecimento da evolução da paisagem litoral na zona do Baixo Vouga; Valorização do património/ conhecimento arqueológico junto das populações locais Concluída a campanha de escavções arqueológicas no Outeiro da Torre, não obstante se vá proceder a partir de agora ao estudo dos dados recolhidos, é possível adiantar preliminarmente que, em virtude do amplo impacte provocado pela saibreira que laborou no Outeiro durante o século XX, não foi detectada, na área dos 87 m2 escavados, qualquer vestígio de estruturas arquitectónicas. Contudo, se não bastassem os elementos conhecidos da história da arqueologia local, a somar aos resultados das nossas intervenções na Marinha Baixa (Cacia), o tipo de vestígios artefactuais registados durante a campanha de Novembro de 2003 (fragmentos de cerâmica comum e de cerâmica de construção e artefactos em ferro) confirma bem a existência de uma ocupação romana naquele local. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 97 Cumprindo o calendário de trabalhos do projecto, proceder-se-á, durante o ano de 2004, ao estudo de materiais arqueológicos provenientes da Marinha Baixa e do Outeiro da Torre, assim como à realização de análises paleoambientais (a efectuar no âmbito de um protocolo com o Departamento de Geociências da Universidade de Aveiro). No sentido de dar resposta ao terceiro dos objectivos que enunciámos, está prevista para Fevereiro do próximo ano a realização, nas instalações da Junta de Freguesia de Cacia, de uma comunicação pública dos resultados decorrentes das campanhas de escavação arqueológica realizadas na Marinha Baixa e no Outeiro da Torre. No último trimestre de 2004 far-se-á, no mesmo local, nova comunicação de resultados. Apresentação da Comunicação “Marinha Baixa (Cacia, Aveiro) na Junta de Freguesia de Cacia em Junho de 2004 Posters da exposição temporária realizada em Cacia, nas instalações da Junta de Freguesia, em 2004 POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 98 ANEXO 2 – CATÁLOGO DE VIDROS / TERRA SIGILLATA EP=espessura da parede; DB=diâmetro de bordo; DF=diâmetro de fundo; DBJ=diâmetro de bojo; H=altura O número de inventariação é composto pelo acrónimo; pela UE e pelo número de peça. Vidros Vaso troncocónico 1 - MB[6006]0 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro branco opaco aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Fragmento de bordo. EP:0,7-1,1mm. DB:11cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 2 - MB[5043]66 – Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar pequeníssimas e redondas. Fragmento de bordo espessado. EP:1mm..DB:10,5cm.. Pantone 310 (blaugrün), transparente. 3 - MB[-]50 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar pequeníssimas e redondas. Fragmento de bordo. EP:1,1mm. DB:14cm.. Pantone 153 (braun), transparente. 4 - MB[-]55 - Vidro soprado, com bordo polido ao fogo. Superfícies caneladas junto ao bordo. Bolhas de ar alongadas. Fragmento de bordo. EP:0,9mm. DB:14,1cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 5 - MB [4040]101 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar pequeníssimas e redondas. Fragmento de bordo. EP:0,7mm. DB:15cm.. Pantone 153 (braun), transparente. 6 - MB[-]16 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:14,9cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 99 Taça em calote 7 - MB[-]33 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Fragmento de bordo. EP:0,5-1,5mm. DB:15,9cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 8 - MB[-]43 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Fragmento de bordo. EP:0,6-1mm. DB:14cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 9 - MB[-]45 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Parede com linha de vidro da mesma cor aplicada a quente e semi-fundida com a parede abaixo do bordo. Algumas bolhas de ar alongadas. Fragmento de bordo. EP:0,9mm. DB:12cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. 10 - MB[-]44 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Raras bolhas de ar, muito pequenas e redondas, junto ao bordo. Fragmento de bordo. EP:0,5-1mm. DB:14 cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 11 - MB[-]41 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linha de vidro da mesma cor aplicada a quente e semi-fundida com a parede, abaixo do bordo. Algumas bolhas de ar muito alongadas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:15cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. 12 - MB[-]42 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linha de vidro da mesma cor aplicada a quente e semi-fundida com a parede. Algumas bolhas de ar longas no bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:14cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 13 - MB[-]9+10 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:14cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 100 14 - MB[-]11 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro branco opaco aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:14cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 15 - MB[48]20 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Bolhas de ar, pequenas e alongadas, junto ao bordo, dispostas em fiada. Fragmento de bordo. EP:0,7mm. DB:13,9cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 16 - MB[120]141 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Algumas bolhas de ar longas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:13,8cm.. Pantone 153 (braun), transparente. 17 - MB[81]26+[57]32 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Fragmento de bordo. EP:0,7mm. DB:12cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 18 - MB[33]139+[128]150 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Algumas bolhas de ar longas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:13,4cm.. 19 - MB[162]164 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Bolhas de ar, pequenas e alongadas, junto ao bordo, dispostas em fiada. Fragmento de bordo. EP:0,91,1mm. DB:13,9cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 20 - MB[104]66+[66]55 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Fragmento de bordo. EP:0,8mm. DB:15,1cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 21 - MB[104]64+[66]60 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar longas. Um pouco irisado. Fragmento de bordo. EP:0,8mmmm. DB:15,5cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 101 22 - MB[125]140 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolha de ar redondas, pequeníssimas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:16,4cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 23 - MB[50]25 – Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Muitas bolhas de ar muito pequenas e longas. Fragmento de bordo espessado. EP:1mm..DB:12,8cm.. Pantone 563 (blaugrün), transparente. 24 - MB[-]161 - Vidro soprado, com bordo ligeiramente espessado e polido ao fogo. Bastantes bolhas de ar alongadas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:ind.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 25 - MB[-]48 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro branco opaco aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, possivelmente helicoidais e terminando com uma gota mais espessa, abaixo do bordo Raras bolhas de ar pequeníssimas e redondas. Fragmento de bordo. EP:1,1mm. DB:ind.. Pantone 153 (braun), transparente. 26 - MB[155]163 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:17,2cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 27 - MB[-]27 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Algumas bolhas de ar muito longas. Fragmento de bordo. EP:1-1,4mm. DB:14,9cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 28 - MB[-]51 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede abaixo do bordo. Raras bolhas de ar pequeníssimas, redondas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:17,1cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 29 - MB[-]18 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Parede com linha de vidro da mesma cor aplicada a quente e semi-fundida com a parede abaixo do bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:15cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 102 30 - MB[-]19 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linha de vidro da mesma cor aplicada a quente e semi-fundida com a parede. Fragmento de bordo. EP:1,1mm. DB:14cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 31 - MB[-]30 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Raras bolhas de ar, muito pequenas e alongadas, junto ao bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:16,1cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 32 - MB[-]31 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Fragmento de bordo. EP:0,6-1,1mm. DB:16,1cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 33 - MB[-]32 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:15,1cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. 34 - MB[-]28 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar, pequenas e alongadas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:15,1cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 35 - MB[-]29 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede, abaixo do bordo. Algumas bolhas de ar longas, grandes e muito pequenas, redondas. Fragmento de bordo. EP:0,8mm. DB:16,1cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 36 - MB[-]52 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Algumas bolhas de ar, pequenas e alongadas. Fragmento de bordo. EP:0,6mm. DB:14,1cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 37 - MB[-]53 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar, muito pequenas e alongadas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:14,1cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 38 - MB[-]54 - Vidro soprado. Fragmento de bordo espessado e polido ao fogo. EP:1mm. DB:ind.. Pantone 582 (olivgrün), transparente POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 103 39 - MB[-]26 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar, muito pequenas e alongadas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:13,9cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 40 - MB[-]20 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:16cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 41 - MB[-]23 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Parede ondulante, com linha de vidro da mesma cor aplicada a quente e semi-fundida com a parede, abaixo do bordo. Bolhas de ar alongadas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:17cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 42 - MB[-]22 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Algumas bolhas de ar alongadas junto ao bordo. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:17cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. 43 - MB[34]31 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar pequeníssimas, redondas. Fragmento de bordo. EP:0,6mm. DB:19,2cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 44 - MB[34]22 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar pequeníssimas, redondas. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:19,5cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 45 - MB[24]15 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Fragmento de bordo. EP:0,5mm. DB:21,7cm.. 46 - MB[45]36 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar pequenas, alongadas. Fragmento de bordo. EP:0,9mm. DB:17,4cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. 47 - MB[24]14 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Raras bolhas de ar pequenas e longas. Fragmento de bordo espessado. EP:1mm.. DB:18,5cm.. Pantone 378 (saftgrün), transparente. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 104 48 - MB[29]29 - Vidro soprado, com bordo espessado e polido ao fogo. Muitas bolhas de ar longas. Fragmento de bordo espessado. EP:0,6mm..DB:19,9cm.. Pantone 356 (grasgrün), transparente. 49 - MB[6006]5+7 - Vidro soprado. Bastantes bolhas de ar, muito pequenas e redondas. Fragmento de fundo onfalado. EP:1,2-5mm. DF:7,6cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 50 - MB[-]47 - Vidro soprado. Bolhas de ar redondas, pequenas. Fragmento de fundo onfalado. EP:1-5mm. DF:4,6cm.. Pantone 125 (gelboliv), transparente. 51 - MB[6006]2 - Vidro soprado. Bastantes bolhas de ar, grandes e redondas. Fragmento de fundo onfalado. EP:1,1-4mm. DF:8,2cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 52 - MB[4076]158 – Vidro soprado. Bastantes bolhas de ar redondas e longas. Fragmento de fundo onfalado. EP:1mm..DF:6m.. Pantone 390 (hellgrün), transparente. 53 - MB[-]12 - Vidro soprado. Fundo externo decorado com caneluras formando uma espiral, realizadas a sopro. Fragmento de fundo onfalado. EP:1-3mm. DF:5,6cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 54 - MB[-]8 - Vidro soprado. Fundo externo decorado com caneluras formando uma espiral, realizadas a sopro. Fragmento de fundo onfalado. EP:1,1-3mm. DF:4,7cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 55 - MB[-]38 - Vidro soprado. Superfície externa com decoração vegetalista através de facetas realizadas a sopro e linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede . Fragmento de bojo. EP:1mm. DBJ:ind.. Orientação indeterminável. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 56 - MB[-]39 – Fragmento de parede levemente curva canelada. Algumas bolhas de ar longas. EP: 0,6mm.. DB:ind.. Orientação indeterminável. Incolor, muito levemente esverdeado, transparente. 57 - MB[-]36 - Vidro soprado. Superfície externa canelada. Fragmento de bojo. EP:1,8mm. DBJ:ind.. Orientação indeterminável. Pantone 577 (saftgrün), transparente. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 105 58 - MB[-]40 - Vidro soprado. Superfície externa com linhas de vidro da mesma cor aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Fragmento de bojo. EP:1mm. DBJ:ind.. Orientação provável. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 59 - MB[-]46 – Vidro soprado. Superfície externa com linhas de vidro branco opaco aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Raras bolhas de ar pequeníssimas e redondas. Fragmento de bojo. EP:1mm. DBJ:ind.. Orientação indeterminável. Pantone 153 (braun), transparente. 60 - MB[48]18 – Vidro soprado. Superfície externa com linhas de vidro branco opaco aplicadas a quente e semi-fundidas com a parede. Fragmento de bojo. EP:1,1-2mm. DBJ:8cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. Frascos tipo AR 146.3 (Isings 133) e Isings 104b 61 - MB[-]35 - Vidro soprado, com bordo curvado para dentro, de diâmetro irregular. Fragmento de bordo. EP:1mm. DB:3,5cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente 62 - MB[-]14 - Vidro soprado. Parede externa decorada com fio de vidro branco aplicado sobre a superfície, formando duas finas molduras, sem se fundirem com a parede . Fragmento de gargalo. EP:0,9mm. DBJ:4cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 63 - MB[-]15 - Vidro soprado. Parede externa decorada com fio de vidro branco aplicado sobre a superfície, formando uma fina moldura, sem se fundir com a parede . Fragmento de gargalo. EP:0,9mm. DBJ:4cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 64 - MB[6006]1 - Vidro soprado. Superfícies interna e externa caneladas. Algumas bolhas de ar alongadas. Fragmento de bojo. EP:1mm. DBJ:8,1cm.. Pantone 577 (saftgrün), transparente. 65 - MB[-]37 - Vidro soprado. Decoração soprada na superfície externa, formando uma moldura que não atinge todo o diâmetro da peça. Fragmento de bojo. EP:1mm. DBJ:ind.. Pantone 582 (olivgrün), transparente. 66 - MB[-]34 - Vidro soprado. Decoração soprada na superfície externa, formando uma moldura. Fragmento de bojo. EP:1mm. DBJ:11,5cm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 106 67 - MB[6006]6 - Vidro soprado. Decoração soprada na superfície externa, formando uma moldura. Fragmento de bojo formando uma esquina curva. EP:1,3mm. DBJ:ind.. Pantone 582 (olivgrün), transparente. 68 - MB[6006]3+4 - Vidro soprado. Superfície externa decorada com fios de vidro aplicados sem se fundirem com a parede. Algumas bolhas de ar, grandes e redondas. Fragmento de bojo. EP:0,91,1mm. DBJ:ind.. Pantone 582 (olivgrün), transparente. Copo com pé alto 69 - MB[8]12 – Vidro soprado. Raras bolhas de ar muito pequenas e redondas. Fragmento de fundo em pé-de-anel. EP4mm.. DB:4,7cm.. Pantone 356 (grasgrün), transparente. Forma indeterminável 70 - MB[-]13 - Vidro soprado. Fragmento de asa. L.:6mm.. H:4mm.. Pantone 582 (olivgrün), transparente. Terra Sigillata 71 – MB[52]27 – Terra Sigillata africana C3. Fragmento de bordo com lábio um pouco descaído. Pasta dura, algo compacta, cor N20 (=10 R 6/8 = rouge clair) e verniz bem conservado, fino, polido, um pouco brilhante no bordo, cor M39 (=2,5 YR 6/8 = rouge clair). DB:17,3mm.. 72 – MB[4079]165 - Terra Sigillata africana D2-1ª fase. Perfil quase completo: lábio um pouco descaído, com canelura no topo, de planta com onze faces; pé-de-anel de secção subrectangular; sulco no fundo interno da taça. Pasta dura, algo compacta, mas menos fina que a do exemplar anterior, cor M39/N39 (=2,5 YR 6/8 = rouge clair; =2,5 YR 6/8 = rouge clair) e verniz muito mal conservado, algo espesso, cor P39/N39 (=2,5 YR 5/8 = rouge; = 2,5 YR 6/8 = rouge clair). DB(lábio incluído):20,5cm.. DF: 10,3cm.. H:5,4cm.. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 107 73 – MB[-]81 - Terra Sigillata foceense tardia. Fragmento de bordo vertical com decoração roletada. Fragmento não observado para descrição de pasta e verniz. DB:25,7cm.. POTOR – Povoado da Torre (Cacia, Aveiro) Relatório Final 108